CONJUNTURA DE SAFRAS, OU MAIS DO MESMO: EXPANSÃO DA FRONTEIRA AGRÍCOLA COM SOJA EM 2015/16 A Companhia Nacional do Abastecimento (Conab), divulgou recentemente sua primeira estimativa para a safra brasileira de grãos e fibras 2015/16. De acordo com a mesma, a futura safra será de até 213,5 milhões de toneladas que, se confirmada, representará um aumento de 1,8% no volume produzido. Locupletando-se do maior volume de crédito à sua disposição (R$ 180 bilhões), nunca visto antes na história deste país, a grande produção patronal, via produção de soja no verão e milho, trigo e ou feijão no inverno, dá passos adiante na sua hegemonia no abastecimento alimentar no Brasil. Isto é fruto tanto de aumento da produtividade de 0,2%, quanto da área plantada, que evolui em 877 mil hectares, 1,5% superior à área plantada em 2014/15. Com isto, 59,024 milhões de hectares serão destinados à próxima safra. Mas, como a tradicional vedete, aumenta a produção de soja (já amplamente alardeada e comemorada pelo agronegócio), que deve ultrapassar a marca histórica das 100 milhões de toneladas, precisamente 101,9 milhões. Isto é fruto tanto de aumento da produtividade 2,2% quanto da área plantada, que evolui em 677 mil hectares, 3,6% superior à área plantada em 2014/15. Ou seja, dos 877 mil hectares novos acrescentados à produção nacional, mais de 77% vem da soja. Como de regra, esta expansão da produção vem em lugar da redução na área plantada com milho no verão (-6,7%), fatlamente substituída por área com soja, que resultarão numa produção nacional do cereal na primeira safra em 2015/16 de apenas 82,62 milhões de toneladas, 3,3% inferior ao colhido na safra passada. Ademais, tudo do mesmo, com a estagnação na produção de feijão primeira safra (1,14 milhão de toneladas), redução de até 3,9% na produção de arroz (11,9 milhões de toneladas), cuja área também concorre com a soja no verão. Quanto ao trigo, em 2016, segundo a Conab, ainda não há como prever o comportamento, pois há pouco se colhe a safra de 2015. O que se tem deste, entretanto, é que neste ano, o volume total obtido chega a 6,6 milhões de toneladas, volume recorde para o Brasil pós liberalização agrícola e comercial dos anos 1990 (extinção da Ctrin - Comissão Técnica Nacional do Trigo) em que a abertura para as importações alienígenas (argentinas, principalmente) fez a produção despencar dos 7 milhões de toneladas de meados dos 1980, para menos de 1,5 milhão no final dos anos 1990. Mas o que explica a elevação da produção não é a existência de um mercado interno fortemente demandador do trigo nacional, senão o acoplamento desta cultura com a da soja, construída principalmente a partir dos anos 1990, especialmente devido: i) à esta fixar nutrientes para a cultura da soja no inverno, reduzindo custo com fertilizantes desta última e ii) à adaptação de tratores, máquinas e implementos comuns à estas culturas, fazendo com que a cultura do trigo ajude a pagar o custo de depreciação destes equipamentos. Ou seja, como de costume, num processo já denunciado pelo Deser desde o final dos anos 1990/início dos 2000, a safra brasileira de grãos concentra-se em grandes áreas, sendo responsável pelo aumento da fronteira agrícola e na concentração na produção de soja e milho, especialmente. Se confirmados estes números, os volumes obtidos com estas culturas representarão 86,5% do total da safra que inicia o plantio agora em outubro. De outro lado, os produtos alimentares típicos do mercado interno, arroz, feijão e mandioca, principalmente, seguem estagnados em volume colhidos. Além deste, o fato novo que deve interferir nas intenções de plantio da próxima safra (quando não ainda na temporada 2014/15), são o retorno mais significativo da inflação e a desvalorização do Real frente ao Dólar norte-americano. A partir de agora, qualquer análise acerca de preços pagos e recebidos, bem como no nível de lucratividade e ou não dos agricultores passa a levar em consideração estes fatores. Isto porque a inflação, medida pelo Índice Geral de Preços-Disponibilidade Interna (IGP-DI) já atingiu 7,01% quando contadas de janeiro a setembro deste ano e 9,28% quando anualizado, ou seja, contada a partir dos últimos 12 meses. Com isto, os preços recebidos de um ano atrás devem ser aumentados em 9%, quando comparados aos atuais que, por si só, significa redução da lucratividade dos mesmos. Da mesma maneira, a elevação dos preços do Dólar frente ao Real afeta diretamente perspectivas e lucratividade, uma vez que: i) eleva os preços dos produtos exportáveis, quando da conversão de Dólar/Euro para Real, o que favorece o aumento dos volumes exportados, eleva seus níveis no mercado interno, aumentando assim a lucratividade de sojicultores, cotonicultores, exportadores de carne, de café, de açúcar, de madeira, de fumo, etc, e ii) aumenta os custos dos insumos aos agricultores, especialmente os fertilizantes, agrotóxicos e afins, uma vez que suas matérias-primas são, em boa parte, importadas em dólar que agora custa mais, assim como de sementes e ração, cuja demanda e preços aumentam no mercado interno e ficam mais caros aos agricultores. Neste sentido, já se observa o movimento descrito acima do lado dos insumos. Como pode ser observado na tabela abaixo, no Paraná entre agosto de 2014 e agosto deste ano, os preços de alguns insumos selecionados evoluiu entre 1,8% e 30,7%. agricultores, restavam a estes torcer para uma virada cambial e ou problemas com as safras de outros países, USA e Argentina, em especial, únicas formas de haver uma elevação nos preços. Semente Feijão 1,8 Semente Milho 9,0 Semente Soja 23,0 Semente Trigo 12,9 Adubo 10-20-20 30,7 Uréia 25,0 Ração Suíno Engorda Ração Aves Conc. Vaca Leiteira 3,3 16,6 6,1 Como o Deser adiantou na conjuntura de julho, com: i) externamente, os volumes disponíveis no mercado mundial e a crise econômica mundial e ii) internamente, o aumento do desemprego, o retorno da inflação e à falta de uma política pública de sustentação de preços e renda dos De julho em diante, ambas as coisas ocorreram, pois tanto na Argentina houve problemas com a colheita do trigo, quanto nos USA ocorreu excesso de chuvas no plantio da safra de verão de 2015/16. Estes foram responsáveis por picos de preços nas bolsas internacionais, especialmente em Chicago, que significaram elevação de preços, mesmo que momentâneos, no mercado interno. Entretanto, o principal fator a puxar os preços no mercado interno foi a elevação dos preços do dólar, que passaram de R$ 3,45 do final de julho, para R$ 4,10 no final de setembro e atualmente está em torno dos R$ 3,85, numa elevação de quase 19% em apenas dois meses e de quase 50% num ano, a partir de setembro de 2014. Com isto, houve elevação nos preços da soja, milho, trigo e carnes (especialmente bovina e de frango), haja vista serem estes produtos cada vez mais dependentes da demanda externa e, portanto, têm seus preços cada vez mais dependentes dos níveis externos, em dólar e/ou euro, as moedas ou do mercado mundial e/ou da Europa, um dos principais destinos das exportações agropecuárias brasileiras. Assim, como o quadro abaixo demonstra, os preços da soja aos agricultores aumentaram entre 27,85% no Paraná e 29,51% no Rio Grande do Sul de um ano para cá. Pequenos problemas no desenvolvimento da safra americana, bem como a elevação do dólar frente ao real e o nível elevado de exportações observado neste ano, deram sustentação a este comportamento. A tendência é de novas elevações conforme intensifica-se e entre safra e a chegada das festas de final de ano. Para o milho, os preços também evoluíram significativamente, (entre 7,33% no Rio Grande do Sul e 29,29% no Paraná), basicamente pelos mesmos motivos. Acresce-se o fato de que dado o maior nível de alojamento de aves (para atender o mercado interno e exportações deste produto) os preços encontraram ainda maior sustentação nestes últimos 2 meses. Para frente, é de aguardar-se também intensificação da entressafra e, dada a perspectiva de safra menor no verão de 2015/16, de elementos sustentadores de novas elevações, ao menos até dezembro deste ano. No caso do feijão, os preços atuais, em quase nada dependentes do mercado externo, encontram-se influenciados pela redução da segunda e terceiras safras 2014/15, recentemente colhidas e abaixo dos volumes obtidos no ano passado. Neste sentido, e acrescentando que não haverá oferta adicional de feijão até ao menos a colheita da primeira safra 2015/16, a partir de meados de dezembro, não há expectativa de recuo significativo nos preços. Como a próxima safra, como visto acima, deve ser menor ainda que a obtida neste ano, a expectativa é de que os preços mantenhamse ao menos acima dos níveis históricos até a entrada e ou primeiro trimestre de 2016. Quanto ao trigo, a evolução positiva em seus preços nos mercados dos Estados do Sul do Brasil no último ano, como visto no quadro abaixo, deve-se à evolução do dólar e aos problemas para a safra argentina (que está sendo colhida) e que leva à redução do excedente exportável daquele país. Com isto, os preços estão atualmente entre 13% (no Paraná) e 29,6% (em Santa Catarina) superiores a setembro de 2014. Como somente 45% da safra paranaense e menos de 5% da gaúcha foi colhida, a expectativa é que o aumento da oferta com o avanço destas, não signifique aumento nos preços, ao contrário, devem servir como fortes freios a qualquer movimento de elevação por parte de cooperativas e produtores mais capitalizados que negociam volumes mais significativos. No setor carnes, a evolução significativa das exportações neste ano de frango, aliado à desvalorização cambial, como visto acima, elevaram os preços que estão em aumento há mais de 7 meses. Atualmente, os níveis de preços da carne de frango situam-se entre 8% e 9% em Santa Catarina e no Paraná mais elevados que o preço de um ano atrás. Além destes fatores, não se deve esquecer que há uma evolução positiva também nos preços da carne bovina, alavancada principalmente pelos preços de exportação (entre 8,97% no Rio Grande do Sul e 22,86% em Santa Catarina) que traz para o mercado da carne de frango aumento na demanda via efeito substituição, o que favorece ainda mais o comportamento positivo de suas cotações no mercado interno. A única carne que tem atualmente apresentado recuo nos seus preços é a suína, com níveis entre 3% e 13% (Santa Catarina e Rio Grande do Sul, respectivamente) inferiores aos de um ano atrás. Apesar de haver aumento na quantidade exportada, a produção nacional continua elevada e, dado o efeito substituição por carne de frango, mais barata, há ainda um certo excesso de oferta no mercado interno. A expectativa é que, apesar da crise que o país atravessa na atualidade, a chegada do final de ano e suas festas signifique um aumento de demanda que enxugue mais o mercado interno, mesmo de suíno, e os preços destes se elevem e continuem elevados para o frango e carne bovina. Quanto ao leite, os níveis de preços estão parecidos com os de um ano atrás. Entretanto, nos últimos dois meses, estes vêm aumentando, como pode ser observado no quadro abaixo. Estruturalmente, preços muito parecidos com os de um ano atrás se explicam em virtude da elevação da oferta e estagnação da demanda num ano de crise econômica e no recuo dos volumes exportados. Segundo o Mdic/Sistema Alice, entre janeiro e agosto deste ano saíram do Brasil apenas 45 mil toneladas de produtos lácteos, contra 58 mil em igual período do ano passado, num recuo de 22% em volume. Conjunturalmente, a evolução de preços nos dois últimos meses, a explicação se dá pela intensificação do inverno e o recuo tanto na quantidade quanto na qualidade dos pastos que atinge sazonalmente a oferta de leite no Brasil. A expectativa, com a entrada da primavera/verão, é da melhoria na qualidade dos pastos e a retomada da oferta, o que deve trazer problemas para uma alavancagem maior nos preços, principalmente a partir do início do ano, haja vista a vigência das férias escolares. Feijão Cor 53,23 123,69 132,37 60,00 112,00 86,67 118,99 115,00 -3,35 Milho 17,82 23,04 29,29 21,03 28,00 33,14 24,55 26,35 7,33 Soja 53,38 68,30 27,95 54,68 70,00 28,02 57,48 74,44 29,51 Trigo 29,97 34,02 13,51 29,32 38,00 29,60 27,95 32,04 14,63 Frango 2,23 2,44 9,42 1,87 2,02 8,02 - - - Suíno 3,68 3,47 -5,71 3,58 3,44 -3,91 3,62 3,12 -13,81 125,68 145,09 15,44 22,86 78,00 85,00 8,97 1,01 1,00 -0,99 10,31 0,98 0,88 -10,20 C. bovina Leite 128,19 157,50 0,97 1,07 OBS: Feijão, milho, soja e trigo em R$/sc. Frango e suíno em R$/kg, Leite em R$/litro e carne bovina em R$/@.. Fonte: Seab/Deral, Icepa/SC e Emater/RS. Elaboração: Deser.