Meu nome é Bogdan Tomoyuki Nassu, atualmente sou professor da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). Fui bolsista de doutorado do MEXT na Universidade de Tokyo entre 2005 e 2008, na área de computação, e trabalhei no instituto de pesquisa do grupo Japan Railways (JR) por 3 anos após isso. O que posso adiantar desde já é que nada do que me disseram poderia realmente me preparar para a dimensão que esta experiência tomou na minha vida. E não foi por falta de gente para me dizer que a vida se dividiria em "antes do Japão", "no Japão" e "depois do Japão" - quando decidi tentar a bolsa, acreditava (ingenuamente) que sabia exatamente o que me esperava... Na vida acadêmica e profissional, encontrei práticas diferentes, uma noção diferente de hierarquia, do papel de cada um no laboratório. Foi muito bom para entender os métodos e processos que são usados - com inegável sucesso - no Japão. Profissionalmente, foram anos fantásticos, nos quais aprendi muito e tive acessos a uma estrutura e recursos que no Brasil me parecem ainda distantes. Mas as marcas que trazemos depois de uma experiência dessas são muito mais profundas que títulos e bagagem profissional. São marcas tão profundas que é difícil enumerálas, quanto mais explicá-las em palavras. Ao mergulhar em uma cultura diferente, passamos a olhar com outros olhos para nosso país e para nós mesmos, para o bem e para o mal - e podemos descobrir que aquilo que consideramos "normal" pode ser na verdade uma qualidade, ou então um problema inaceitável em outro lugar. Assim, passamos a ver um Brasil ao mesmo tempo mais bonito e mais feio; e com o tempo o próprio Japão também passa a ser visto como um lugar real, com qualidades e defeitos, vantagens e problemas. E isso não é ruim. Quando somos obrigados a aprender a conviver com as diferenças, e observando a reação dos outros às nossas atitudes, temos a oportunidade de descobrir que existem outros jeitos de encarar a vida, e no fim acabamos nos tornando mais tolerantes. Por isso tudo, se existe um conselho que eu daria para os futuros bolsistas é: deixem-se assimilar. Não tentem viver em um universo paralelo, que não é Japão nem Brasil. Nos mais de 6 anos que vivi no Japão, visitei lugares e tive experiências únicas, mas o que realmente me transformou foi o cotidiano, a vivência diária em um lugar diferente. Alguns casos são emblemáticos das pequenas mudanças que, acumuladas, acabam nos transformando completamente. Por exemplo, fui obrigado a aprender a ouvir mais os outros. Estava acostumado com o jeito brasileiro de conversar, com um "atropelando" a fala do outro, vencendo no grito (uma conhecida japonesa comentou que brasileiros parecem que falam cantando mas conversam brigando). Precisei aprender a esperar a minha vez de falar. Também aprendi a ter um senso maior de coletividade. E vi, nessas pequenas coisas, a transformação também em outras pessoas. Lembro de uma colega brasileira que, ao chegar ao Japão, se incomodou profundamente com a necessidade de separar o lixo em categorias - e despejar cada tipo de lixo em um dia e horário específico. Anos depois, esta mesma colega se mostrava muito mais preocupada com não gerar incômodos - e lixo - para "os outros". Outra coisa que é importante saber é que o retorno não é fácil. É estranho voltar para um Brasil que não é mais o mesmo, e enxergá-lo com olhos que também não são mais os mesmos. Se no Japão às vezes temos saudades de coisas do Brasil - alguma comida, alguma atividade, algum lugar, alguma pessoa - o mesmo ocorre depois que voltamos, mas no sentido inverso. Talvez este "vazio" que fica seja o preço a se pagar... Enfim, no Japão, conheci muita gente, fiz amigos, até minha esposa conheci por lá (é impressionante a quantidade de casais que se formam entre bolsistas!). Mas o mais importante é que acredito que conheci mais a mim mesmo, e tenho certeza que voltei não somente mais capacitado profissionalmente, mas como uma pessoa melhor.