Estudo da Composição e das Fontes Isotópicas de Pb dos Aerossóis em Brasília (DF) – Brasil Central
ESTUDO DA COMPOSIÇÃO
E DAS FONTES ISOTÓPICAS
DE Pb DOS AEROSSÓIS EM
BRASÍLIA (DF) – BRASIL
CENTRAL
1
Simone M.C.L.Gioia, [email protected]
2
Márcio.M.,Pimentel,
3
Américo Kerr,
1
Instituto de Geociências,Universidade de São Paulo
2
LInstituto de Geociências,Universidade de Brasília,
3
Instituto de Física, Universidade de São Paulo,
RESUMO
Este trabalho reportou os primeiros dados do Brasil
sobre a composição de aerossóis, obtidos pela combinação do TIMS, para determinar as concentrações e
composições isotópicas de Pb, com PIXE, para obter-se
concentrações químicas multielementares. O material
particulado foi coletado em Brasília, na Universidade de
Brasília, e em uma área remota para caracterizar a composição background. O particulado atmosférico foi separado em duas frações de diâmetro aerodinâmico médio de (f) - 2.5 µm<f<10 µm (grosso ou PM10-2.5) e
f<2.5 µm (fino ou PM2.5), com 12h de amostragem (dia e
noite). Dois períodos de campanha, um no inverno e outro no verão, possibilitaram a investigação das peculiaridades desses períodos. O objetivo deste projeto foi investigar o impacto decorrente do aumento das atividades antropogênicas nesta área e identificar as principais
fontes locais de poluição do ar.
Houve contribuição dos elementos maiores em ambas as frações, mostrando que a contribuição geogênica foi muito significativa durante o inverno. A presença
de elementos antrópicos na fração PM2.5 (como Pb e S)
representou, principalmente, a combustão de combustíveis fósseis, embora possa também ser atribuída a um
aumento da atividade humana e das queimadas no cerrado. As composições isotópicas de Pb definiram um
diagrama de mistura ternária, indicando contribuição de:
(i) fontes antropogênicas, tais como exaustão de veículos (combustão) (ii) emissões industriais e (iii) rochas e
solos, os quais representam as fontes naturais.
INTRODUÇÃO
A composição química e isotópica do material particulado atmosférico e aerossóis têm sido extensivamente
utilizadas como uma ferramenta confiável para traçar as
fontes de poluição no mundo todo (Chow et al., 1975;
Rosman et al., 2000). No Brasil, são raros os estudos
deste tipo mais detalhados (e.g., Aily, 2001). Em vista
disso, no presente estudo realizamos uma investigação
detalhada da composição isotópica e química dos aerossóis em Brasília.
A construção de Brasília, Capital Federal do Brasil,
começou em 1956, no Planalto Central Brasileiro. O clima é muito seco e temperado, no inverno, e, durante o
verão, úmido e quente. Em 2000, a população do “Plano
Piloto” e de algumas áreas adjacentes chegou a 272.000
habitantes. O progressivo aumento da infra-estrutura
das áreas ao redor da cidade, introduziu muitas mudanças ambientais expressivas em grande parte da região,
como o tráfego de 733.000 veículos (IBGE, 2005;
http://www.ibge.gov.br). A qualidade do ar tem, em geral, sido considerada excelente, entretanto, o crescimento urbano intenso sugere o estabelecimento de um controle rotineiro da qualidade do ar.
– 104 –
Simone M.C.L. Gioia
As partículas atmosféricas foram coletadas em duas
estações (uma urbana e outra remota), em duas frações
de diâmetro aerodinâmico médio de PM10-2.5 e PM2.5, durante períodos de 12h (dia e noite), no verão e no inverno. Foram investigados nos aerossóis a concentração e
composição isotópica de Pb, elementos químicos e massa total, associando com a variabilidade sazonal e a localização das fontes. Dois métodos foram utilizados na
análise dos aerossóis: 1) Particle Induced X-ray Emission
(PIXE), para determinar os elementos químicos com número atômico maior do que 12; 2) Isotopic Dilution-Thermal Ionization Mass Spectrometry (ID-TIMS) para
determinar a concentração e as composições isotópicas
de Pb (204Pb, 206Pb, 207Pb e 208Pb).
EXPERIMENTAL
Geologia Local
A geologia local (Figura 1) é caracterizada pelas rochas metamórficas de baixo grau do Meso- ao Neoproterozóico, representadas por pelitos, metassedimentos
psamíticos e carbonáticos, pertencentes aos Grupos
Canastra, Paranoá, Araxá e Bambuí.
Amostragem
A Tabela 1 fornece informações sobre a coleta das
amostras nas estações urbana e remota em Brasília (Figura1). A área remota está a, aproximadamente, 40 km a
sudoeste da estação de coleta da UNB. Amostras de
combustível, filtros contendo material particulado de
emissões industriais e solos de lixão foram analisadas e
apresentam-se como as principais fontes antropogênicas de poluição. As amostras de rochas e solos foram
analisadas a fim de caracterizar a composição isotópica
de Pb geogênico na região.
Procedimento Analítico TIMS
As amostras de solo, rochas e material particulado
foram tratados com uma mistura de ácidos de HF, HNO3
e HCl para a decomposição total. O procedimento completo para as análises de material particulado, combustíveis, rochas e solo estão detalhados em Gioia (2004). As
razões isotópicas de Pb foram medidas por espectrometria de massa com fonte sólida termoiônica (TIMS), usando-se Finnigan MAT 262 multi-coletor, no laboratório de
Geocronologia da Universidade de Brasília. O branco
analítico de Pb para o procedimento total foi =120 pg.
Procedimento Analítico PIXE
As análises foram realizadas segundo o procedimento analítico montado no LAMFI (Laboratório de análises de matéria por feixe de íons), do Instituto de Física da
Universidade de São Paulo. A redução dos dados foi feita usando-se o programa Axil (Espen et al., 1991), tendo
o ajuste do espectro apresentado c2 menor que 2,0.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Isótopos de Pb
Os aerossóis urbanos (UNB) mostraram razões
206
Pb/207Pb e 208Pb/206Pb variando de 1,1219 a 1,2062 e
2,0094 a 2,1337, respectivamente, formando um trend linear (Figura 2).
A maioria das amostras compreende razões
206
Pb/207Pb no intervalo entre 1,150 e 1,200, aproximadamente, e concentrações entre 10,7 a 0,07 ng/m3, durante
o verão, assim como 25,4 a 0,04 ng/m3, durante o inverno
(Figura 3a). Na área remota (CIAB) o intervalo das razões
206
Pb/207Pb são muito similares ao obtido na estação da
UnB, embora com concentrações baixas de Pb (Figura
3b). Em geral, as composições do particulado são muito
homogêneas, sendo, entretanto, mais radiogênica e tendem a apresentar baixas concentrações durante o inverno e verão à noite; elevadas concentrações de Pb ocorrem durante o inverno, de dia. Isto indica uma importante
contribuição antrópica durante o dia, quando a atividade
humana é elevada, sendo, principalmente, o tráfego de
veículos mais intenso. Composições menos radiogênicas foram observadas principalmente na fração PM2.5
durante o dia.
Comparando-se os dados de aerossol em Brasília
com as composições isotópicas de Pb nos combustíveis
(206Pb/207Pb = 1,1298-1,192) e filtros industriais coletados na estação central de ônibus de Brasília (206Pb/207Pb
Tabela 1 – Estações de amostragem (Brasília, verão e inverno de 2003)
Estações
Ident.
Amostras (12h, dia e noite)
Local
Verão
UNB
Urbana – Campus da Universidade de Brasília (UNB)
CIAB
Remota – Centro de Instrução e Adestramento de Brasília, em
área preservada
– 105 –
Inverno
Período
Amostras
Período
Amostras
01/16-23
01/28-02/21
47
07/14-20
07/28-08/23
56
01/29-02/08
10
08/12-08/23
12
Estudo da Composição e das Fontes Isotópicas de Pb dos Aerossóis em Brasília (DF) – Brasil Central
Figure 1 – Mapa geológico esquemático do Distrito Federal (modificado de Freitas-Silva & Campos 1998)
e localização das amostras (rochas e solos).
Figure 2 – Relação entre as razões Pb/ Pb and Pb/ Pb dos
resultados obtidos neste trabalho.
208
206
206
207
Figura 3a – Relação entre a razão Pb/ Pb e a concentração de Pb
para o inverno e verão nas estação UnB.
206
– 106 –
207
Simone M.C.L. Gioia
Figura 3b – Relação entre a razão Pb/ Pb e a concentração de Pb
para o inverno e verao nas estação CIAB.
206
207
= 1,1682) e em indústrias (206Pb/207Pb = 1,2240-1,2569
ao norte e 1,1740 ao sul), fica claro que a exaustão veicular representa o principal contribuinte na poluição do ar,
ambos na área remota (CIAB) e na UnB, cujas composições isotópicas de Pb se encontram no intervalo das
amostras de particulado atmosférico.
No entanto, não se pode descartar que as fontes
geogênicas também contribuam com Pb nos aerossóis,
que é demonstrado pelas composições isotópicas das
rochas e solos da região (Figura 4). As rochas apresentaram razões de 206Pb/207Pb variando entre 1,1643 a
1,5993 e as razões mais radiogênicas foram obtidas nas
amostras da unidade PPC do Grupo Paranoá, carbonatos, localizados ao norte de Brasília. Os solos apresentaram um intervalo para a razão 206Pb/207Pb
de
1,1762-1,2569; no entanto os solos que foram lixiviados
com ataque de ácido fraco, apresentaram as composições isotópicas menos radiogênicas que o obtido com
ataque total: para lixiado (206Pb/207Pb = 1,1762-1,2228) e
total (206Pb/207Pb = 1,1976-1,2569).
Comparando os dados de aerossol em Brasília
com a composição de combustíveis (gasolina, álcool,
diesel, querosene) e filtros indústriais coletados na estação central de ônibus de Brasília e em industrias, fica
claro que a exaustão veicular representa o principal
contribuinte na poluição do ar, ambos na área remota
(CIAB) e na UnB, cujas composições isotópicas de Pb
se encontram no intervalo das amostras de particulado
atmosférico (Figura 4).
Análises Multielementares por PIXE
Contribuições significativas dos elementos Al, K,
Si, Ti e Fe (Figura 5a) foram observadas durante o inverno e verão, na fração grossa, que é típica da contribuição geogênica. Em ambientes urbanos, os elementos
Pb e S (Figura 5b) estão, normalmente, associados às
fontes antrópicas. Eles estão presentes nas partículas finas e grossas, mas o S é rico na fração PM 2.5, que
representa a queima de combustíveis fósseis, a qual
identifica o aumento da atividade humana e das queimadas naturais, muito comuns no inverno. Os resultados isotópicos mostraram que as fontes antrópicas
são comuns à exaustão dos veículos (combustão de
combustíveis fósseis) e emissões industriais de cimento, enquanto que as fontes naturais são as rochas
e solos.
Embora Brasília tenha uma boa qualidade de ar, as
concentrações de particulado inalável são menores que
24,1±7,2 mg/m3 (inverno) e 11,0±4,3 mg/m3 (verão), mostrando uma evidente influência da urbanização. Na área
da cidade, as concentrações são maiores que na área
remota – 19,7±5,3 mg/m3 (inverno) e 10,1±3,9 mg/m3 (verão) – quando comparados ao mesmo período da amostragem.
CONCLUSÃO
A contribuição dos elementos maiores na fração
PM2,5-10 é muito significativa durante o inverno, mostrando uma elevada contribuição geogênica. Pb e S estavam
presentes nas frações finas e grossas, indicando tanto
ação antrópica quanto geogênica. Pb foi mais abundante durante o inverno na fração grossa, de acordo com os
dados isotópicos.
As composições isotópicas de Pb definem um diagrama ternário de mistura, indicando a contribuição a
partir: (i) fontes antropogênicas, como exaustão de veículos (combustão), (ii) emissão industrial e (iii) rochas e
solos do Grupo Paranoá, Bambuí e Canastra, representando as fontes naturais. Houve um grupo de amostras
menos abundante com composições isotópicas menos
radiogênicas e torogênicas similares ao álcool e aos depósitos de galena da Faixa Brasília (Morro do Ouro, Morro Agudo, Paracatu e Vazante). Provavelmente, o tempo
de residência desse material foi elevado na atmosfera
para transportar o Pb por longas distâncias, depositando-o, principalmente, nos filtros finos.
A diferença sazonal entre as concentrações de
PM10-2.5 e PM2.5 tem uma correlação importante com a
estação de inverno em Brasília, caracterizada por um
período extremamente seco. A presença de elementos
antrópicos (Pb and S) na fração PM2.5 representa, em
especial, a queima de combustíveis fósseis, embora
possa também ser atribuída ao aumento da atividade
humana e queimadas do cerrado. Baixas concentrações de Ca podem ser atribuídas às indústrias de cimento presentes ao norte da cidade. Brasília é totalmente distinta das cidades industrializadas, com uma
elevada contribuição de material geogênico e baixa
ação antrópica.
– 107 –
Estudo da Composição e das Fontes Isotópicas de Pb dos Aerossóis em Brasília (DF) – Brasil Central
Figure 4 – Resultado das análises de PIXE de elementos maiores, no inverno e verão nas estações UnB e CIAB.
Figure 5 – Resultado das análises de PIXE de elementos-traço, no inverno e verão nas estações UnB e CIAB.
– 108 –
Simone M.C.L. Gioia
Estudos adicionais serão necessários para avaliar a
influência do tráfego, assim como de outras fontes antropogências, as quais, provavelmente, aumentarão com a
expansão populacional.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem ao engenheiro da Shell Adair
Narazeth Santos Júnior, que forneceu algumas das
amostras de combustíveis, à técnica Ana e ao Dr. Manfredo, do Instituto de Física da Universidade de São Paulo, e à Dra. Maria de Fátima Andrade, do Instituto Astronômico e Geofísico da Universidade de São Paulo, e à
meteorologista Maria Cristina G. Costa, do INMET.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AILY, C. Caracterização Isotópica de Pb na atmosfera: um
exemplo da cidade de São Paulo. 2001. Dissertação
(Mestrado) - Universidade de São Paulo, São Paulo,
2001.
CHOW, T.J.; SNYDER, C.; EARL, J. Isotope ratios of lead
as pollutant source indicators. Proceedings of the
IAEA-SM-191/14, Vienna, 1975. p. 95-108.
ESPEN, P.V.; JASSENS, SWENTER, S, 1AXIL X-Ray
Analysis software: users manual. Bebelux : Packard,
1991. 72 p.
GIOIA, S.M.C.L. Caracterização da assinatura isotópica
de Pb atual na atmosfera e no sistema lacustre do
Distrito Federal e pré-antropogênica em Lagoa Feia
– GO. 2004. Tese (Doutorado) - Instituto de Geociências, Universidade de Brasília, Brasília, 2004.
ROSMAN, K.J.R.; LY, C.; VAN DE VELDE, K.; BOURTRON, C.F. A two century record of lead isotopes in
high altitude Alpine snow and ice. Earth and Planetary Science Letters, v. 176, p. 413-424, 2000.
VERGARA, M.C. Caracterizações isotópicas e percentuais de material particulado respirável e de matérias fontes afins da cidade de Santiago do Chile
usando Pb Sr e Nd como traçadores naturais.
2001.Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo. 2001.
– 109 –
Download

16. Estudo da Composição e das Fontes Isotópicas de Pb