II Encontro Nacional de Estudos da Imagem
Anais
12, 13 e 14 de maio de 2009 • Londrina-PR
APROXIMAÇÕES E APAGAMENTOS ENTRE IMAGENS
Fernanda Cristina Martins Pestana
[email protected]
1
Dra. Susana de Oliveira Dias
[email protected]
2
Prof. Dr. Wenceslao Machado de Oliveira Junior
[email protected]
3
Resumo: As fotografias nos apresentam recortes de uma realidade apagada no ato de
fotografar. Surgem outras realidades, e portanto ficções, nas imagens que chegam ao olhar do
observador. O que pode originar estas novas realidades são as possibilidades de apagamentos
nas fotografias, apagamentos que se dão por diversos fatores, provocados - pelo fotógrafo ou
pelo editor de imagens -, ou imprevistos - que podem aparecer ao acaso nas imagens. Os
apagamentos aparentes nas imagens selecionadas para esta pesquisa se aproximam de outros
presentes nas obras de artistas plásticos e fotógrafos e é interesse dos autores levantar como
esses apagamentos acontecem e como o contexto das imagens pode ser deslocado e percebido
de outras maneiras.
Palavras-chave: Aproximações-apagamentos-imagens
Abstract: The photographs introduce us to pieces of a reality parroted in the act of
photograph. There are other realities, and therefore fictions, in the images that reach the eye
of the observer. which may lead these new realities are the possibilities of erasing in photos,
erasing that occur by various factors, caused - by the photographer or by the publisher of
images -, or unforeseen - which may appear at random in images. The apparent erasing in the
selected images for this research approach to others presents in the works of artists and
photographers and is interest of the authors to research how these erasing happen and how
the context of images can be displaced and perceived in other ways.
Keywords: Approaching-erasing-images
1
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), graduanda no Instituto de Artes, PIBIC/CNPq, Biotecnologias de
Rua/CNPq.
2
Unicamp, Dra. do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo, Biotecnologias de Rua/CNPq.
3
Unicamp, Prof. Dr. Do Laboratório OLHO - Faculdade de Educação, Biotecnologias de Rua/CNPq
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Introdução
Pensar imagens como um comunicador de realidades múltiplas, realidades novas que
surgem a partir de apagamentos e aparições em fotografias é o tema da pesquisa científica
dos autores deste texto, que fazem parte de um projeto maior, multidisciplinar, o
“Biotecnologias de Rua”, financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (Proc. CNPq n. 553572/2006-7), e desenvolvido por pesquisadores e artistas
vinculados ao Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) e à Faculdade de
Educação, ambos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Este projeto tem como
finalidade investigar e realizar ações que articulem, na divulgação da ciência, diferentes
linguagens, espaços, abordagens temáticas e relações com o público. A partir da escolha das
biotecnologias como temática, o projeto aposta na criação de artefatos artísticos (homepage,
performances, mostras de cinema, vídeos, peças de teatro, dentre outros) que propõem uma
interação com o público em ambientes diferenciados, como as ruas. O projeto tem interesse
especial em pensar as relações entre imagens, as produzidas pelos espaços os mais diversos,
ciências, comunicação e educação. Assim, o projeto proporciona espaços de discussão e
reflexão sobre os temas das biotecnologias através da produção artística, atingindo um público
bastante diversificado. O foco deste artigo é uma das atividades criadas pelo “Biotecnologias
de Rua”: a peça “Num dado momento: biotecnologias e culturas em jogo”, que aborda temas
polêmicos, tais como o futuro do homem perante o avanço das pesquisas biotecnológicas. A
peça já foi apresentada para alunos do ensino fundamental de escolas municipais de Campinas
e para estudantes do curso de Especialização em Jornalismo Científico do Labjor, e foi levada
às ruas do centro de Campinas no segundo semestre de 2008. Os pesquisadores optam por
analisar as fotografias de Alik Wunder4 feitas durante as apresentações da peça sem o objetivo
rastrear as possíveis interpretações que as fotografias despertam no público, nem mesmo
buscar respostas sobre o pensamento e as percepções que a fotógrafa teve da peça. Trata-se
de um levantamento de possibilidades de apagamentos nas fotografias, apagamentos que se
dão por diversos fatores, provocados ou imprevistos, e que originam novas realidades do
momento retratado e, ao mesmo tempo, trazem à tona novas percepções. É uma discussão
não de como as biotecnologias estão apagadas nas fotografias, ou seja, não é uma busca
daquilo que não está aparente nas imagens, mas sim de uma biotecnologia que se faz presente
de outra forma, em imagens que se aproximam do tema e que são percebidas de outra
4
Alik Wunder: fotógrafa e pesquisadora junto ao grupo “Biotecnologias de Rua” – Labjor – Unicamp.
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maneira. Esta análise traz obras de outros fotógrafos e artistas plásticos nas quais também é
possível observar os apagamentos.
Ao pegarmos uma fotografia na mão, vemos um pequeno “recorte”, uma seleção
daquilo que por um momento foi luz externa ao equipamento fotográfico, luz tantas vezes
chamada de realidade. Mas nem tudo aquilo que era luz/realidade foi selecionado para
permanecer na fotografia? Digo que “por um momento foi” luz/realidade, porque o papel
fotográfico revelado torna-se outra coisa: imagem. Esta nova coisa, a imagem fotográfica,
situa-se em um tempo suspenso, que não é nem presente, nem passado, e que está paralisado
com a possibilidade de ser eternizado, já que foi materializado em uma superfície plana. A
realidade está apagada na fotografia – ainda que também nela permaneça –, que é captada de
acordo com a percepção do olhar humano e que sofre a interferência dos recursos visuais do
equipamento fotográfico.
Se a fotografia seria, então, algo novo e uma seleção daquilo que um dia foi real,
poderia se afirmar que houve uma síntese da realidade, pois apenas alguns dos elementos
visíveis e percebidos foram captados, selecionados e transferidos para o plano bidimensional.
Diversas possibilidades de apagamento, sendo estas ao acaso ou não, poderiam ocorrer nas
fotografias. O fotógrafo faz escolhas que determinam diversos aspectos da fotografia. Boris
Kossoy cita as seleções que o artista faz ao fotografar: “assunto; equipamentos;
enquadramento; momento; materiais e produtos necessários para o processamento do filme;
possibilidades destinadas a produzir determinada ‘atmosfera’ na imagem final” (KOSSOY,
2002:28). Estas escolhas provocam mudanças nas cores, nos planos que poderiam sair do foco,
palavras e pessoas que poderiam aparecer irreconhecíveis. Alterações imprevistas também
podem ocorrer:
Ao atuar fotograficamente, devemos adotar sempre uma atitude aberta que
nos permita agir ludicamente com relação ao imprevisto. Devemos estar
receptivos às aparições inesperadas, ou mesmo indesejadas, e acolhê-las –
tanto quanto possível – de bom grado. (HUMBERTO, 2000:50).
Porém, tanto estas aparições imprevistas, como as escolhas feitas, fazem parte do
estilo, da poética do fotógrafo, pois este já conhece bem a linguagem fotográfica e as
possibilidades de seu uso.
As possibilidades de transformação da realidade fazem dela algo novo, fixado no papel
fotográfico, algo que sem a fotografia não seria possível ser visto ou percebido, sendo,
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portanto, uma realidade que se dissolve e se modifica, e que poderia ser entendida como uma
ficção. Agregam-se outras realidades à fotografia, que perde sua característica documental
que comprova uma verdade, uma vez que passa a versar sobre múltiplas realidades, ou
diversas ficções, logo: “A fotografia inquieta por sua ambigüidade. Trabalha com a realidade,
mas não é, nem ao menos, um elemento confiável como comprobatório de uma verdade”
(HUMBERTO, 2000:57).
As fotografias permitem perceber o imperceptível. Aquilo que passa aos nossos olhos
como “corriqueiro”, transitório, passageiro, imaginário, que em pouco espaço de tempo se
movimenta à nossa frente e nunca foi visto como algo belo, algo poético, digno de ser
reconhecido esteticamente. Esta percepção estética é papel do artista-fotógrafo que capta e
mostra de outra forma aquilo que aparenta ser insignificante ao olhar rotineiro, um olhar que
está presente não apenas nas imagens da realidade, mas também nas que cruzam com nossa
visão e circulam nos meios de comunicação, que por muitas vezes, seguem um padrão, ou uma
característica documental, que não artística ou poética.
Na série de fotografias de Alik Wunder, feita durante a performance “Num dado
momento: biotecnologias e culturas em jogo”, a fotógrafa registra o movimento do grande
dado em jogo antes de encostar o chão. Na imagem o dado está no ar paralisado em uma
posição que está além da percepção do olho humano.
Alik Wunder, performance teatral “Num dado momento” 2008. Praça Rui Barbosa, Campinas,
SP.
É nesta percepção diferenciada do artista onde se encontra a poética. Por que as
fotografias de Sebastião Salgado, por exemplo, são tão belas sendo que tratam de temas como
a fome e a miséria? Ou ainda os ensaios do fotógrafo mexicano Pedro Meyer, que retratam
manifestações populares e o cotidiano de algumas cidades latino-americanas? A beleza e a
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poética também estão presentes no precário, naquilo que é socialmente desprezado e o
artista é a figura capaz de percebê-las, de olhar com outros olhos. Um objeto inanimado, em
desuso, degradado, banalizado pode adquirir valor estético sob o olhar apurado – e cuidadoso –
do artista.
1.
3.
2.
4.
1. Sebastião Salgado. A luta pela terra: crianças às margens das rodovias, 1996.
2. Sebastião Salgado. Os pobres trabalhadores da terra, 1983.
3. Pedro Meyer. "Rousing from a Car", Cidade do México, México, 1968.
4. Pedro Meyer. "The Night of Tlatelolco", Cidade do México, México, 1968.
Alik Wunder compõe sua poesia recombinando as imagens presentes no cenário da
performance “Num dado momento” com as novas imagens que o momento da apresentação
traz. Em referência à obra de Alexandre Orion, a fotógrafa encaixa asas de anjo nas pessoas
que circulam no centro de Campinas, combinando imagem e realidade, o que resulta na
criação de uma nova realidade, ou uma ficção. Pedro Meyer adota uma poética semelhante ao
fotografar crianças brasileiras fantasiadas com asas de anjo em festas populares.
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2.
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6.
1. Alexandre Orion. Metabiótica, São Saulo, SP.
2 Alik Wunder, performance teatral “Num dado momento”, 2008. Praça Rui Barbosa,
Campinas, SP.
3. Pedro Meyer. Rio de Janeiro, Brasil, 2005.
4. Pedro Meyer. Announcement, Ocumicho, Michoacan, Mexico, 1980.
5. Pedro Meyer. Trindade, Brasil, 2004.
6. Pedro Meyer. Friday,Chalma, Estado de Mexico,1984.
Qual seria a relação entre os três artistas, ou o que os levou a utilizar tal referência
(asas de anjo) nas pessoas que encontraram pelo caminho? Wunder, Meyer e Orion perceberam
algo nessa simbologia, foram sensíveis às conotações que ela carrega, e criaram algo novo,
que ao ser observado pelo público está sujeito a novas percepções e interpretações, ou até
mesmo ao desprezo àquilo que lhe foi apresentado. Esta possibilidade que a fotografia tem de
dialogar por meio de uma linguagem simbólica visual, torna-a diferente da escrita, pois “ao
contrário de um relato escrito – que conforme sua complexidade de pensamento, de
referências e de vocabulário, é oferecido a um número maior ou menor de leitores –, uma foto
só tem uma língua e se destina potencialmente a todos” (SONTAG, 2003:21). Assim a
fotografia está sujeita – e permite isto – a variadas interpretações quando deslocada de seu
contexto original e apresentada a grupos pessoas de diferentes repertórios sociais,
econômicos, políticos, culturais, etc. Cada grupo e/ou indivíduo tem uma percepção singular
das imagens apresentadas, remetendo-as à sua própria memória.
Enfatizo a questão da percepção do fotógrafo por acreditar que, com o apagamento de
alguns elementos, outras coisas são suscitadas, coisas não percebidas, coisas belas, poéticas.
Enquanto no processo fotográfico há uma seleção e muito do que é visto em tempo real é
apagado, outras coisas são potencializadas.
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Nas fotografias da performance “Num dado momento”, Alik Wunder utiliza diversos
recursos fotográficos que possibilitam o apagamento nas imagens. Em algumas delas, foca
somente a visão da lente da lupa que a atriz segura e, assim, o rosto das pessoas que
transitavam nos arredores da performance é desfigurado, ou seja, há o apagamento da
identidade visual dessas pessoas. Além disso, Wunder se apropria da visão gerada pela lente,
que é diferente da máquina fotográfica e inverte a realidade enxergada pelo olho humano
dando força a outros significados que podem surgir. A população desfigurada é transformada
em uma massa homogênea, de formas coloridas, aglomeradas, em contraste com o círculo
nítido da lente, ou vice-versa.
Alik Wunder, performance teatral “Num dado momento”, 2008. Praça Rui Barbosa, Campinas,
SP.
Porém, em outros casos, essa idéia de massa e falta de identidade também é
observada em imagens profusas, complexas, excessivas, em que o grande número de pessoas
já faz a característica de singularidade desaparecer, e consolida-se um todo, sem nome nem
categoria, uma união de vários elementos que formam uma. Isto pode ser observado na obra
do artista plástico Nelson Leiner, que junta diversas pequenas peças encontradas no comércio
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popular, na confecção de uma totalidade homogênea. Neste caso, a desfiguração está na
repetição dos elementos, e não na ausência de detalhamento das imagens.
1.
2.
1. Nelson Leirner. Figurativismo Abstrato (2004).
2. Nelson Leirner. Maracanã (2003).
Wunder explora também a justaposição das imagens do cenário da peça e dialoga com
o jogo de dados proposto aos espectadores. Estabelece relações entre pessoas e imagens
(imagens das ruas, dos atores, dos dados, do cenário), imagens e imagens, pessoas e pessoas,
e assim as fotografias criam novas superfícies a partir das impressões que a fotógrafa tem da
peça. Ou dito da mesma maneira, sendo outra: as fotografias criam novas impressões a partir
das superfícies que a fotógrafa vê na peça. Superfícies associadas ao que não se vê sem a
câmera, dissociadas do tempo e da realidade do local-performance, pois não é o que
aconteceu ou o que está acontecendo, não é passado ou presente, é outra coisa materializada
no papel que multiplica, faceta e fragmenta a realidade em várias outras coisas novas. Não é
uma busca de documentar um fato ocorrido, pois, como Luis Humberto defende:
Nem sempre, ao fotografar, estamos movidos pela intenção de reter
simplesmente o tempo, como uma tentativa inútil de amaciar nossas angústias
de seres perecíveis. Muitas vezes, queremos, apenas, apoiados nesse poder de
congelamento que nos dá a fotografia, recriar uma realidade e remeter à
nossa potencial platéia um produto capaz de agir de modo transformador,
causando encantamento ou mesmo perplexidade, dando às pessoas a
oportunidade – nem sempre bem aproveitada – de pensar quão estranho, rico e
controverso é o espírito do homem. (HUMBERTO, 2000:59)
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Alik Wunder, performance teatral “Num dado momento”, 2008. Praça Rui Barbosa, Campinas,
SP.
E se não há a intenção de documentar a realidade, mas sim de gerar transformações,
novas reflexões, o acaso, bastante presente nas imagens Alik Wunder, pode ser considerado
mais uma das escolhas da artista, que domina as técnicas da fotografia e conta positivamente
com esta possibilidade. Algumas imagens se adensam ao acaso, agrupam-se de maneira a
serem percebidas apenas quando já reveladas como fotografias. O acaso, nas fotos de
Wunder, também surpreende com as diversas conotações inesperadas que podem surgir como
ocorreu na seqüência das imagens das asas do anjo apresentadas acima, onde o rapaz focado
vestia uma camiseta com a estampa de asas. Foi uma repetição – proliferação descoberta pelo
olhar de quem vê a fotografia, a imagem, e não a realidade nela impressa – ao acaso que
agregou poesia à imagem de Alik Wunder.
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Apagamentos e re-criações
Por fim, o propósito desta publicação é aprofundar a reflexão sobre a fotografia e
como ela fornece outras possibilidades de percepção que não remetem apenas à uma retenção
do tempo, ou à memória, ou à idéia de perpetuação da realidade vivida. Os apagamentos que
ocorrem nas fotografias podem estimular novas aparições, diferentes do senso comum
atribuido à produção de imagens que chegam à população por meio da mídia. São
possibilidades de ver o invisível, o não vivenciado, a criação de uma nova realidade, uma nova
verdade a ser considerada, uma verdade particular, correspondente a cada indivíduo que se
comunica com a imagem. A fotografia revelada pode perder seu contexto original,
desvincular-se de suas raízes. Pode apagar multidões, paralizar objetos no ar, e assim,
congelar o tempo e corromper a lógica das leis da física. Pode desfigurar identidades,
transformar pessoas em silhuetas, inverter pés por cabeças, mutilar órgãos e membros. Pode
aglomerar objetos, criar texturas de cores, unir opostos, apaziguar tempestades. Pode
revolucionar, ir a favor, contrariar, convencer, impressionar, ferir, dolorir, contentar. Enfim,
são inúmeras as possibilidades de apagamentos a serem percebidas nas imagens, que tornam
aparentes novas criações, que não reais, mas sim ficcionais, imaginárias, sensoriais, criações
que podem ser uma “maneira de versar a vida e a morte, de cantar as brechas do tempo.
Vozes calejadas que nos gestos diários pairam a pausa, instauram um rítmo persistente,
contínuo e repetitivo de força e leveza. Criam um modo de existência” (WUNDER, 2008:18).
Em conversa com as imagens de Alik Wunder, criei minhas próprias imagens. Fiz
escolhas e apaguei novamente as novas realidades que as fotografias me apresentaram. Juntei
partes, criei novas, e as imagens reapareceram, agora sob um novo olhar, para novos olhares.
Como resultado deste diálogo com as fotografias e os apagamentos, as imagens serão
apresentadas para o público da instalação-evento que o grupo Bioctenologias de Rua montou
com apoio da Pró-reitoria de Assuntos Comunitários (Preac-Unicamp). Esta instalação – “Num
dado e-vento: biotecnologias e culturas em texturas, vão, cores e sons...” – quer potencializar
o uso de imagens e fotografias projetadas que iluminam o ambiente. São as mesmas
fotografias de Alik Wunder, feitas durante a peça teatral “Num dado momento”, porém
reapresentadas de uma nova maneira para o público.
Apago a cidade, foco as lupas que desfocam. As cores que formavam a imagem real e
se diluiram em manchas agora estão mais próximas. Assim, reforço a idéia de uma outra visão
por meio de lentes, uma visão não corriqueira, uma visão apagada pelo efeito ótico do vidro,
associada a frase de Luis Humberto sobre a percepção do cotidiano.
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Imagem produzida por Fernanda Pestana.
Apago as pessoas, mas conservo a forma que a fotografia trouxe. Apago a rua e o
ambiente. Escolho um elemento que me sensibiliza, a “asa do anjo”, que permanece na
imagem e é associada a forma humana sem aparência, sem identidade, sem reconhecimento.
São pessoas, são vidas, são formas, são cores, são criações, são realidades e ficções. As
palavras que coloquei compõem um poema criado pelo público da peça “Num dado
momento”, que é convidado a jogar grandes dados de imagens e palavras que formam os
versos do poema.
Imagem produzida por Fernanda Pestana.
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Apago as cores, crio outra atmosfera. Crio outras cores também. Apago as pessoas, as
lojas, a calçada. Escureço e utilizo cores consideradas primárias, que misturadas podem
formar todas as outras. Selecionei a imagem que anula o tempo e paraliza o dado suspenso no
ar. Estaria o tempo, nesta fotografia, apagado? E que lugar seria esse? Que pessoa seria essa?
Cabe a quem observa a imagem atribuir tais respostas às perguntas, pois se o contexto está
apagado, a imagem é livre está sujeita as escolhas de quem a vê.
Imagem produzida por Fernanda Pestana.
Apresento, portanto, minhas re-impressões sobre as fotografias de Alik Wunder que
olhei. Apontei apenas algumas das possibilidades de apagamentos que ocorrem nas imagens, e
como eles se dão, porém não tenho como finalidade colocar minhas interpretações sobre as
imagens.
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Fernanda Cristina Martins PESTANA