REMOÇÃO DE ÍONS SULFATO DE ÁGUAS DE DRENAGEM ÁCIDA DE CARVÃO
POR PRECIPITAÇÃO QUÍMICA
Nunes, D.G, Soares, A.C., Rosa, J.J., Rubio, J.
Laboratório de Tecnologia Mineral c Ambiental- Departamento de Engenharia de Minas- PPGEM
Universidade Federal Do Rio Grande do Sul - UFRGS
A v. Osvaldo Aranha 99/512 - 90035-190- Porto Alegre- RS
jrubio@ ufrgs.br; http ://www.lapes.ufrgs.br/Laboratorios/ltm/ltm.html
A drenagem ácida de minas (DAM) é um problema ambiental sério que pode ocorrer próximo a minerações de
carvão c polimctálicos sulfetados. O s minerais sulfetados sofrem oxidação, quando expostos à água c oxigénio e
bactérias, dando origem a DAM. Esta, uma fonte difusa de poluição, pode comprometer seriamente a qualidade
dos recursos hídricos da região . A DAM é um efluente caracterizado por elevada acidez e altas concentrações de
metais, tais como AI, Cu, Fc, Mg, Mn e Zn, e sulfatos. O desenvolvimento de técnicas avançadas para tratamento
de DAM (c seu possível rcúso ), visando à neutralização, a remoção de metais, de compostos orgânicos e de íons
sulfato, é fundamental no caso do tratamento otimizado das DAM da região carbonífera do estado de Santa
Catarina. O presente trabalho insere-se no desenvolvimento de um processo integrado de neutralização c
separação sólido-líquido por !lotação, seguida de polimento final para produção de água industrial. Este estudo
visa, basicamente, à remoção de íons sulfato cm soluções sintéticas, DAM natural e DAM-FAD, que consiste cm
DAM natural tratada por neutralização com cal e flotação por ar dissolvido (FAD) . Para tanto, foi aplicada uma
técnica de precipitação química do sulfato, na forma de Etringita (Ca 6 Al2 (S04 )3(0H) 12 .26H2 0), para soluções de
concentração inicial de sulfatos superior a 1500 mgC 1. Após otimização do processo, foram alcançadas
remoções superiores a 97% de íons s ulfato , cm meio básico, empregando sais de AI c de Ca. Os resultados são
discutidos em termos dos parâmetros envolvidos na reação química para a remoção de íons sulfato, dos insumos,
dos custos gerais c principalmente do potencial desta nova técnica .
Palavras-chave: remoção de sulfatos, DAM, precipitação.
Área Temática: Drenagem Ácida de Minas.
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INTRODUÇÃO
A drenagem ácida de minas (DAM) é um dos problemas ambientais mais sérios que pode ocorrer cm
áreas de minerações de carvão e polimctálicos sulfctados. Os minerais sulfctados sofrem oxidação, quando
expostos a água e oxigênio, dando origem a DAM. Esta geração é catalisada por bactérias oxidantes . A DAM,
uma fonte difusa de poluição, pode comprometer seriamente a qualidade dos recursos hídricos da região de sua
ocorrência, como, por exemplo, na região carbonífera do estado de Santa Catarina.
Devido aos grandes volumes de estéril inerentes à atividade mineira, muitos deles depositados sob
intempérie por décadas durante e depois de extintas as atividades de exploração mineral, a geração da DAM
pode ser muito significativa. Esta condição faz com que as ações mitigadoras sejam extremamente caras, tanto
em termos de investimento como em termos de custos de operação, portanto as medidas preventivas são
preferidas, quando a deposição do estéril ainda está sendo plancjada.
ADAM é um efluente caracterizado por elevada acidez e altas concentrações de sulfato c de metais, tais
como AI, Cu, Fe, Mg c Zn, (Lyew et a/., 200 I). Metais pesados ocorrem na natureza c muitos deles são
essenciais à vida. Entretanto, quando presentes em elevadas concentrações, são tóxicos ao meio aquático e à vida
humana. Os íons sulfato, largamente distribuídos na natureza, podem estar presentes cm águas naturais c cm
minerais, tais como mirabilita, tenardita, barita, entre outros (APHA, 1985). Em elevada concentração na água, o
sulfato pode causar gosto amargo e provocar diarréia e desidratação tanto ao homem quanto a animais .
Problemas de corrosão em encanamentos também estão relacionados aos altos níveis de sulfatos na água.
O tratamento da DAM geralmente inclui combinações de neutralização c precipitação com cal, oxidação
com peróxido, osmose reversa, adsorção e troca iônica e muitas têm mostrado-se economicamente inviáveis ou
tecnicamente deficientes, de tal modo que não têm sido utilizadas cm tratamento de efluentes industriais.
Algumas pesquisas relacionadas ao tratamento de DAM, publicadas recentemente, são listadas na Tabela I.
A neutralização com cal e precipitação sob condições oxidativas tem sido o método economicamente
preferido para tratamento de DAM. A maior desvantagem deste método é o alto consumo de material alcalino
para elevar e manter o pH cm valores superiores a 6,5, condição necessária para a remoção dos metais (Matlock
et al., 2002). A elevação do pH do efluente promove a precipitação da Gipsita (CaS04 .2H 2 0) contaminada com
hidróxidos de metais pesados c, devido a alta solubilidade da Gipsita, a concentração residual de íons sulfato é
quase sempre da ordem de 1400- 1600 mg/L.
A utilização de sais de Bário e Chumbo, para precipitação destes metais como sulfato, tem sido
investigada, uma vez que estes produtos apresentam um baixo produto de solubilidade, porém, tais processos
ainda não são considerados economicamente atraentes . A precipitação química, pela adição de sais de Bário,
Chumbo e Cálcio, é uma alternativa, principalmente se aplicada a tratamento de efluentes com alta concentração
de sulfato. Neste caso, os custos para separação e disposição apropriada dos grandes volumes de lodo gerado,
bem como a toxidade dos resíduos, deverão ser observados.
O emprego de processos de troca iônica, com resinas sintéticas, na remoção de íons sulfato ainda não é
comum, pois tais processos envolvem geralmente altos custos operacionais, além de apresentarem problemas de
disposição das resinas quando saturadas.
592
;,
j
Tabela 1- Alguns estudos , publicados recentemente, para tratamento de DAM.
Autores
Observações
Tyrrcll ct ai., 1997
Redução biológica de SO/- cm wetland piloto para tratamento de DAM de
carvão;
Kol ics ct ai., 1998
Precipitação de SO/- e Cr em alumínio- processo de corrosão;
Mizuno et a/., 1998
Remoção de SO/- por redução biológica e sistema de ultrafiltração com
membrana;
Hcal e Salt, 1999
Tratamento de DAM com wetland .
Chang et al., 1999
Tratamento biológico de DAM com resíduos sólidos orgânicos;
Ghigliazza et a/., 2000
Redução biológica de SO/-;
Visscr et a/., 200 I
Remoção de SO/-, c r, Na+, Ca 2 + de DAM por Nanofiltração;
Matlock et a/., 2002
Precipitação química de metais pesados de DAM;
Burgess e Stuetz, 2002
Tratamento de DAM com lodo ativado ;
Menezes et a/. , 2002
Tratamento de DAM por precipitação c flotação;
Borges , 2002
Adso rção de Sulfato c Molibdato com resíduo do processamento de camarão;
Kamcda et ai ., 2003
Remoção de ácidos minerais diluídos por intercalação em óxidos de
magnésio c alumínio;
Doyc e Duchcsnc, 2003
Neutralização de DAM com resíduos industriais alcalinos;
Laubshcr et a/. , 2003
Tratamento de DAM por precipitação química;
Borges (2002) desenvolveu um material quitinoso adsorventc alternativo para íons sulfato a partir da
qUitma extraída da casca de camarão. Os estudos realizados, cm frascos agitados com soluções sintéticas,
mostraram capacidade adsorção de 3,2 mEq/g da qui tina obtida para uma razão sólido/SO/- de 8,5 mg/g, tempo
de contato de 15 minutos c pH de equilíbrio de 4,3±0,3 . Porém, a não disponibilidade atual deste material cm
grande escala, dificulta sua implementação na indústria.
Filtração usando membranas são alternativas para o tratamento de efluentes contendo sulfatos. Contudo,
os altos custos do processo, bem como o consumo de energia, proporcional a concentração de sulfatos em
solução, devem ser considerados. Se a filtração com membranas for usada como pós-tratamento, a vida-útil da
membrana será prolongada c o gasto de energia reduzido, diminuindo, desta forma, os custos do processo (Silva
et a/, 2002).
O desenvolvimento de técnicas avançadas para tratamento de DAM , visando a remoção de metais e de
sulfato, e neutralização, é fundamental , principalmente considerando as condições ambientais da região
carbonífera do estado de Santa Catarina. A escassez de água em algumas regiões incentiva a busca de
tecnologias capazes de recuperar estes e fluentes possibilitando seu rcúso como água industrial.
Neste contexto, os estudos de precipitação química foram realizados no intuito de precipitar o sulfato
em solução na forma do mineral Etringita, com fórmula química Ca6Aiz(S04 )3(0H)12-26H2 0. O trabalho visou
593
avaliar a influência das concentrações de íons Cálcio e Alumínio, em relação à concentração de Sulfato, o efeito
do pH do meio e os custos gerais envolvidos na remoção de sulfato por esta técnica.
EXPERIMENTAL
Soluções e Efluentes
Os ensaios de precipitação química foram realizados com efluente sintético c dois tipos diferentes de
efluente naturais, denominados DAM e DAM-FAD, cujo demonstrativo simplificado das características
químicas é apresentado na Tabela 2. O efluente sintético foi preparado cm água dcionizada a partir de Sulfato de
Sódio anidro (Merck). O efluente DAM corresponde à drenagem colctada no caixa de embarque da empresa
mineradora de carvão Carbonífera Metropolitana, Siderópolis/SC, e o efluente DAM-F AD, que corresponde à
essa mesma DAM tratada por neutralização com cal, a pH 8, c Dotação F AD para a remoção dos sólidos
gerados, como descrito em Menezes et a/.(2002). Ambos os efluentes foram conservados sob refrigeração.
Tabela 2- Dados químicos dos efluentes estudados.
DAM
DAM-FAD
Efluente sintético
2,3
7,9
6,8
1800
1700
1750
Ferro Total (mg/L)
94
1,3
Zinco (mg/L)
5
0,03
o
o
o
pH (25°C)
Sulfato (mg/L)
Man~anês(rn~/L)
1
*Adaptado de Menezes et a/.(2002).
0,47
Nos estudos foram utilizados Hidróxido de Cálcio (VETEC), Cloreto de Alumínio hexahidratado
(SYNTH), Nitrato de Alumínio nonahidratado (NUCLEAR) e, para controle de pH, hidróxido de sódio e ácido
clorídrico, sendo todos reagentes de pureza analítica.
Análise química de íons sulfato
A concentração de íons sulfato em solução foi determinada pelo método turbidirnétrico descrito em
APHA ( 1985), o qual baseia-se na formação de um precipitado insolúvel de BaS04 cm meio ácido pela adição
de BaCl2 à solução. A análise de turbidez foi realizada com auxílio do turbidírnetro H a eh 21 OON e a leitura em
NTU (unidade nefelornétrica de turbidez) foi transformada em rngL" 1 através de urna curva de calibração. Todas
as amostras analisadas foram previamente filtradas através de membranas com porosidade de 0,2i rn.
Estudos de precipitação química
Nos estudos de precipitação química, foram adicionados ao efluente íons Cálcio e Alumínio em
concentrações variadas a partir da concentração estequiornétrica para formação do mineral. Para tanto, utilizouse Hidróxido de Cálcio e Cloreto de Alumínio de pureza analítica. Os ensaios foram realizados em béqueres,
594
com o auxílio de agitador magnético e, para análise, foi colctado o sobrenadantc após tempo mínimo de 4h de
repouso para sedimentação dos precipitados formados.
Com a finalidade de verificar a influência do pH na precipitação da ctringita, foram realizados testes de
precipitação de sulfato, com Ca(OH)z c AICl3, cm condição de pH controlada. Os reagentes foram adicionados
em concentrações variadas em função da relação estequiométrica para a formação total ou parcial da etringita.
Os ensaios foram realizados com efluente sintético com adição de Ca(OH)z e AlCI3 e posterior ajuste de
pH, empregando HCI c NaOH. As soluções foram mantidas sob agitação magnética até estabilização do pH e o
sobrcnadante foi colhido, após tempo mínimo de 12b de repouso, para aoáJise de sulfato residual.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Qs gráficos são apresentados em função da relação estequiométrica de íons cálcio e alumínio em função
da concentração inicial de sulfato para a formação da etringita, relação que corresponde à razão S04-2 :Ca+2 :Af3
de I :0,8:0,18 em massa.
As Figuras I a 3 apresentam os resultados de precipitação química do sulfato para efluente sintético,
DAM c DAM-FAD, respectivamente e mostram maior remoção de íoos sulfato para valores de pH mais
alcalinos.
Ainda nas Figuras I a 3, é poss[vcl verificar que o pH do efluente tratado diminui com o aumento da
quantidade de AICI) adicionada ao sistema, enquanto que a adição de Ca(OH)2 contribui para a sua elevação. A
condição de adição, cm função da razão mássica de fom1ação da Etringita, de duas vezes a razão teórica para o
Ca+2 c uma vez, para o A 1'"3, garante um intervalo de pH ideal para a precipitação da Etringita. Esta condição
permite obter uma concentração de íons sulfato residual inferior a 250ppm, independente do efluente estudado.
I
J
Figura 1 - Precipitação de ions sulfato como Etringita. Efeito das concentrações de Ca tl e Al+3 , e pH. Efluente
sintético com concentração de íons sulfato de 1750ppm.
595
100
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1
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Figura 2 - Precipitação de íons sulfato como Etringita. Efeito das concentrações de Ca +2 e AJ+3, e pH. Efluente
DAM com concentração de íons sulfato de 1800ppm.
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Figura 3- Precipitação de íons sulfato como Etringita. Efeito das concentrações de Ca +2 c Al+3 , e pH. Efluente
DAM-F AD com concentração de íons sulfato de 1700ppm.
A Figura 4 apresenta a influência do pH, para variações na razão estequiométrica de íons Ca +Z e Al+3, na
remoção de 1750mg/L de sulfato com adição de íons cálcio, em uma c duas vezes a razão estudada, e íons A1+3 ,
em meia e uma vez a razão estudada. A Figura 4 mostra que as máximas remoções de íons sulfato, presentes em
solução sintética, foram alcançadas em pH próximo a 12. Estes resultados estão de acordo com a literatura e são
considerados muito bons, devido à complexidade na remoção destes íons a baixo custo.
Segundo Laubscher et a/.(2003), o intervalo de pH ideal para fonnação da Etringita é de 11,4 a 12,4. A
máxima remoção de sulfato (98% de remoção para 1700ppm de concentração inicial de sulfato) foi alcançada
em pH 12, para a condição de concentração de íons aluminio e cálcio equivalentes a uma e duas vezes,
respectivamente, a relação estequiométrica de formação da Etringita.
O tratamento do efluente com adição de somente alumínio não apresentou redução significativa de
sulfato, para meia e uma vez a razão estequiométrica necessária para a formação de Etringita. Este
comportamento, bem como outros efeitos que concorrem para minimizar os custos dos reagentes e otimizar o
processo de separaçãosólido-líquido, constituem os estudos que seguem à este trabalho.
596
....
100
-0 Cae OAl
-l*Cae O AI
-1 *Ca e 0,5*Al
-l*Cae l*Al
5 -2*Cae0 AI
6 - 2*Ca e 0,5* Al
7 -2*Cae l*Al
1
2
3
4
80
--------------------------------------
~
20
o
o
2
4
8
6
10
Í2
14
pH
Figura 4- Influência do pH c das concentrações de C a +2 e Al+3 na precipitação de íons sulfato como Etringita.
Tratamento de efluente sintético com concentração de íons sulfato de 1750ppm com de Ca(OH)z e AIC1 3 •
CONCLUSÕES
Os resultados mostraram a viabilidade técnica, em escala de laboratório, da remoção de íons sulfato, por
precipitação química com sais de alumínio e Ca(OH)l. Os resultados obtidos, em termos de remoção de íons
sulfato foram, cm condições otimizadas de pH c concentração de íons Ca +2 c Al+3 , superiores a 95%,
independente do tipo de efluente, sintético ou industrial.
AGRADECIMENTOS
Agradecemos aos órgãos financiadores de pesquisa científica, cm especial CAPES , CNPq, UFRGS e
FAPERGS. Agradecimentos à empresa Carbonífera Metropolitana pelo apoio ao projeto integrado UNESC,
USP, UFRGS-LTM. Aos colegas do LTM, estudantes c professores da UFRGS, um especial reconhecimento.
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