A REVOLUÇÃO GENÔMICA: PROPOSTA PARA O ENSINO DE GENÉTICA Jéssica Nayara Basilio Silva, Darlyson dos Santos Silva, Victor Hugo Dantas Guimarães, Fernanda Santana da Silva, Sanny Evelyn Nogueira Alves, Maria Teresa Oliveira Siva Rodrigues, Guilherme Victor Nippes Pereira INTRODUÇÃO O estudo da genética teve seu início em 1865 a partir dos experimentos de Johann “Gregor” Mendel. No fim do século XX surge o Projeto Genoma Humano (PGH), marco fundamental para o nascimento da nova subdivisão da genética ou genômica, contribuindo para acelerar os estudos e conhecimentos sobre um campo da ciência repleto de interrogações. A principal meta do projeto foi o mapeamento completo dos genes e o sequenciamento completo de bases do genoma humano. A partir deste ponto começa o que Arthur Kaplan, diretor do Centro de Bioética da Universidade da Pensilvânia, citado por CORRÊA (2002, p. 286) chama de “Revolução Intelectual”, causando expectativa e curiosidade no meio científico. Muitos cientistas acreditam que as respostas para todos os nossos questionamentos serão encontradas no sequenciamento do genoma humano, todavia este se revelou apenas o começo de um longo caminho, visto que o mais difícil será compreender como esse processo atua no corpo humano. “Os pesquisadores têm em mãos, os códigos dos genes que compõem nosso genoma, mas ainda não sabem qual o papel de um determinado fragmento e qual proteína irá formar ou como irão se interagir com as demais substâncias, responsáveis pelo funcionamento do nosso organismo.” (SOUZA, 2004, p. 10 e 11). Essa nova realidade deve ser mais presente no ensino da genética no ensino médio, porque irá afetar toda a maneira com que interagimos com a natureza, seja na produção de alimentos, seja na produção de medicamentos, seja na obtenção de diagnósticos mais eficientes de doenças humanas. Assim sendo, seus benefícios poderão se estender para toda a sociedade. DESENVOLVIMENTO O código genético representa a sequência completa de bases nitrogenadas contidas na molécula de DNA (ácido desoxirribonucléico) de um indivíduo, responsável por toda a informação que o acompanhará ao longo da vida. O PGH propõe o mapeamento dos genes, ou seja, determinar a posição dos genes nos cromossomos e suas funções. Dentre as principais técnicas conhecidas estão os mapas de ligação e o mapeamento físico, sendo o último o mais utilizado. Terminada essa etapa se inicia o sequenciamento, que será a ordenação das bases nitrogenadas na molécula de DNA. O primeiro método conhecido utilizado foi o método químico de Alan Maxem e Walter Gilbert em 1977, ganhando o prêmio Nobel em 1980. Posteriormente surgiu Frederico Sanger em 1978, com o método dideoxi ou de terminalização, conquistando dois prêmios Nobel em bioquímica e sendo o mais utilizado, por ser mais facilmente interpretado e de maior eficiência. O maior desafio nesta etapa é obter uma sequência consenso, ou seja uma sequência clara e precisa, que se tornará uma referência para determinada espécie. Para isso são construídos mapas de sequência genômica. As principais estratégias para a etapa do sequenciamento são o sequenciamento shotgun de genoma inteiro (WGS) e sequenciamento de clone ordenado, como descreve Griffiths: Para criar um mapa de sequência do genoma, várias cópias do genoma são cortadas em pequenos pedaços que são então clonados e sequenciados. As leituras de sequências resultantes são superpostas comparando sequências idênticas em clones diferentes até que seja produzida uma sequência de consenso de cada dupla hélice do DNA do genoma. (GRIFFITHS, 2008, p. 390). É importante ressaltar que o genoma humano obtido até os dias atuais possui apenas a qualidade rascunho, ou seja, ainda é um procedimento de baixa precisão e ainda há muito trabalho para ser realizado. Para esses processos é de extrema importância a informatização, tornando a bioinformática uma área de destaque no meio científico. Essa nova área auxilia no armazenamento de dados biológicos, geração e gerenciamento das informações relacionadas ao sequenciamento genético. O projeto genoma usa ferramentas computacionais visando tratar adequadamente a informação e inferir sobre os produtos gênicos - proteínas, RNA, DNA e sítios de ligação. Um método importante dentro da bioinformática é o alinhamento de sequências muito utilizado para encontrar genes. Como exemplo de programas que fazem esse alinhamento temos ClustalW (versão web), Multialin, FASTA, BLAST 2 sequences. Todo este estudo trouxe informações que representam um grande passo para a medicina, sendo possível o diagnóstico de 2 inúmeras doenças, podendo tratá-las de maneira específica e com diagnósticos mais precisos, facilitando tanto a reprodução humana quanto o meio farmacêutico, que por sua vez possibilita o advento de novas drogas e terapias. “James Watson, citado por RODRIGUES (2001, p.17), acredita que há inclusive um potencial extraordinário para o melhoramento humano.” Também a produção de alimentos será amplamente afetada pelo desenvolvimento da genômica, visto que as plantas e os animais domesticados serão muito alterados geneticamente, a fim de serem capazes de produzir alimentos mais nutritivos, ou seja, com novos compostos nutricionais que foram introduzidos por novas técnicas, e também em maior quantidade, possibilitando alimentar o aumento da população humana. Por outro lado, os críticos argumentam que todo esse conhecimento fomenta em falta de privacidade individual, visto que empresas têm acessos a dados genéticos dos pacientes; o conhecimento se torna produto, como no caso do patenteamento de genes; distribuição desigual dos recursos obtidos; e remodela o pensamento de uma geração, resultando no que chamamos de “nova eugenia” ou seja, o aperfeiçoamento das capacidades humanas. Neste ponto é relevante a discussão do outro lado da revolução genômica: as implicações éticas e morais desta nova sociedade. “A forma de discriminação mais abertamente praticada, hoje, é aquela que ocorre na seleção para o trabalho e a realizada por seguradoras de saúde e de vida” (GREELY, 1992; MILLER, 1998 apud CORRÊA, 2001, p. 291). Julga-se um indivíduo não pelo que ele representa hoje, mas pelo que ele representará daqui a alguns anos, deixando evidente a importância exclusiva do genótipo. PORCIONATTO (2007, p.13) chama atenção para isso em seu artigo: “As influências do ambiente não podem ser esquecidas ou menosprezadas, principalmente nos seres humanos, onde os efeitos da cultura, da sociedade e da educação são fundamentais para que cada indivíduo seja como é.” A geração desses conhecimentos têm afetado o comportamento das pessoas. Comumente escuta-se pais desejarem optar por determinadas características de seus filhos (cor dos olhos, cor do cabelo) em tratamentos com fecundação in vitro. Ciência em prol do menor sofrimento humano ou Eugenia? Esse debate bioético traz reflexões sobre os limites e as consequências da ciência genômica e como este pode se tornar um caminho perigoso, revelando a bioética não um empecilho, mas sim um ponto de apoio e uma valorização da vida. Esta margem de estudo é amplamente estudada pela ELSI (programa destinado a aspectos éticos, legais e sociais), um dos mais importantes subprojetos do PGH. Percebe-se, portanto, o enorme avanço que a genômica alcançou nas últimas décadas. Conforme foi descrito, esse avanço afetará decisivamente a maneira com que trataremos as doenças, como produzimos os alimentos e até como nos relacionamos. Não obstante, o ensino da genética, que em sua totalidade, contém a genômica, ainda está bastante insipiente no sentido de incorporar poderosamente a genômica e suas potencialidades para conscientizar aos jovens estudantes das mudanças abismais que lhes serão impostas no mundo estudantil que não mais satisfazem as leis Mendelianas. É preciso elaborar mudanças urgentes no ensino da genética, visto que esta, sendo uma ciência nova já modificou completamente a totalidade de seus conceitos, e o ensino da genética continua de forma extremamente conservador em sala de aula do ensino médio, pois não consegue desenvolver no aluno o entendimento desse novo conhecimento. Grande parte do problema encontra-se na atualização do professor. Normalmente, o professor, principalmente das escolas públicas, encontra-se mal atualizado, especialmente quanto à compreensão dos conceitos e técnicas da genômica, consideradas complexas e de “fora da sua realidade”. Porém, como vimos, a genômica já está trabalhando com afinco a fim de implantar as mudanças citadas. Assim sendo, urge que os professores possam passar periodicamente por novas capacitações, nas quais os novos conceitos, técnicas e potenciais serão discutidos e poderão se sedimentar e então o professor entenderá a enorme importância da genômica para a vida moderna e, agora a compreendendo, desenvolver técnicas para interagi-la com seus estudantes de forma densa e harmoniosa. Para que consigamos realmente mudar esses paradigmas genômicos atuais, é preciso uma interação constante e profícua entre as Universidades e as Escolas Públicas e Privadas de Ensino Médio. É preciso que o professor da Escola Pública seja amplamente incentivado a cursar a Pós-Graduação e que possa, junto com o apoio dos docentes universitários, realizar atividades de pesquisa e publicação, para que a realidade científica mundial possa ser acessada mais acuradamente por este profissional e que, assim, ele possa compreender melhor os avanços científicos e seus efeitos na sociedade moderna. 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS O maior desafio do ambicioso Projeto Genoma Humano é saber como todo o conhecimento adquirido será utilizado e para quais fins. As oportunidades de se fazer o bem são enormes e não é necessário ignorar os avanços que essas descobertas significam para toda a atividade humana. Nunca antes estivemos tão próximos de desvendar nossos questionamentos mais profundos, como agora. Walter Gilbert, da Universidade de Harvard, que partilhou o prêmio Nobel pelo sequenciamento do DNA, saudou o desafio como nada menos do que a busca do Santo Graal da biologia. (DAVIES, 2001, p. 21, apud RAMOS, p.02). Em suma, fica evidente a importância de se discutir mais sobre o assunto, principalmente quando entramos no campo da bioética. A ciência avançou um passo fundamental em rumo às respostas, entretanto ainda há muito para ser realizado, uma vez que todo esse conhecimento nos mostra o longo caminho que há para ser trilhado e o quão grande é a nossa ignorância sobre o ser humano. A era pós-genômica possibilita o surgimento de um novo homem e de um novo olhar sobre o mundo, moldado pelas descobertas da ciência. Todavia, à medida que o conhecimento caminha, aumenta também a ansiedade por respostas e neste sentido é importante o discernimento e o senso crítico sobre as explicações genéticas e sua utilização. Optou-se neste espaço por uma discussão da inovação genética em um âmbito de ensino, com o intuito de disseminar tais conhecimentos e reflexões, através do estudo de uma vasta literatura. Entende-se que as análises realizadas neste trabalho devam ser apresentadas também no âmbito das salas de aula, revendo conceitos e formando mentes críticas para o futuro, marcado fortemente pela ciência e pela inovação tecnológica. O papel das Universidades é de extrema importância para a concepção, execução e desenvolvimento dessa melhoria continuada do ensino médio público e privado. REFERÊNCIAS 1. BAEK, D. et al. The impact of MicroRNAs On Protein Output. Nature, 455, p. 64-71, 2008. 2. BRANDÃO, Fernanda Lapa. BIOÉTICA E BIODIREITO – um estudo sobre a manipulação do genoma humano, Florianópolis (SC), 2002. 3. Comissão Nacional Pastoral Familiar – CNPF, et al, Keys To Bioethics, FUNDATION JERÔME LEJEUNE. Keys to Bioethics, 2013. 4. CORRÊA, M. V. O admirável Projeto Genoma Humano. Physis: Revista de Saúde Coletiva. Rio de Janeiro, v. 12, n. 2, p. 277-299. Jul./Dez. 2002.Disponível em:<http://www.scielo.br/pdf/physis/v12n2/a06v12n2.pdf>. Acessado em: 27 out.2011. ISSN 0103-7331.DAL POZ, M. E. S. 5. COYNE, J. A. The gene is dead: long live the gene. Nature, 408, p. 26-7, 2000. 6. DIAS, N. A.; PESSOA, R. F.; BARBOSA, P. P.; et al; A Era Da Bioinformática: Seu Potencial E Suas Implicações Para As Ciências Da Saúde; Estud Biol. 2008 jan/dez;30 (70/71/72): 143-8. 7. DISSERTAÇÃO (MESTRADO EM POLITICA CIENTIFICA E TECNOLÓGICA) – UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS, CAMPINAS, 2000; Da Dupla A Tripla Hélice: O Projeto Genoma Xylella; 2000, p. 171. 8. GRIFFITHS, A. et al. Introdução à Genética. 9.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008. 4 9. JOHN, D. R.; VIEIRA, L. M.; Anotação Funcional Computacional De Proteínas; Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento, v. 25 – março/abril, 2002. 10. MARIA, E. B. D.; ATUALIZAÇÃO EM BIOLOGIA MOLECULAR: A REVOLUÇÃO GENÔMICA; genoma.ib.usp.br/wordpress/wp-content/uploads/.../apostila-Zona-Sul.pd... Abril a junho 2009. 11. Manuel Bioéthique des Jeunes, et al, FUNDATION JERÔME LEJEUNE. 2013, versão também disponibilizada em português. 12. ORGES-OSÓRIO, M. R.; ROBINSON, W. M. Genética Humana. 2.ed. Porto Alegre: Artmed, 2001. ISBN: 978-85-7307-4. 13. PGH, site oficial https://www.genome.gov/ 14. O PROJETO GENOMA HUMANO Traduzido e adaptado de http://www.ornl.gov/sci/techresources/Human_Genome/publicat/primer2001/4.shtml 15. PROSDOCIMI, F.; COUTINHO, G. C.; BINNECK, E.; et al; Bioinformática: Manual Do Usuário; Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento, v. 29. 16. UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO INSTITUTO DE QUÍMICA DE SÃO CARLOS. Sequenciamento de DNA. SQM0416 – Bioquímica II. Douglas Morisue Sartore, n° USP 7144445. São Carlos, novembro de 2012. 17. WILLIAM S. K.; MICHAEL R.C.; CHARLOTTE A. S.; Conceitos de Genética. 18. PORCIONATTO. M. A; Projeto Genoma Humano: Uma Leitura Atenta do Livro da Vida? ; Universidade Federal do Estado de São Paulo/Escola Paulista de Medicina. 19. RAMOS. F.P; Silva. M.R; Arruda. S. M; Passos. M. M; CONTEXTO PÓS-GENÔMICO E O ALCANCE DAS BIOTECNOLOGIAS ENTRE ALUNOS DE GRADUAÇÃO: uma releitura eugênica ou novos benefícios para a vida humana? 20. RODRIGUES. J. E.; Projeto Genoma; Universidade Cândido Mendes. Trabalho monográfico. Rio de Janeiro, dezembro de 2012. 21. NETO. J. A. F.; BENTO. E. S.; ALVARENGA. E. C. Projeto Genoma na Cura do Câncer.