JORNAIS E REVISTAS: RECURSOS
DIDÁTICOS EM AULAS DE ESTATÍSTICA
Eixo Temático: GT4 - PRÁTICAS INVESTIGATIVA
Ana Paula Silva de Almeida*
Gabriele Silva Carneiro**
Maria Cláudia Meira Santos Barros†***
Kelly Araújo Valença Oliveira‡****
RESUMO
Este trabalho objetiva analisar os benefícios da utilização de textos encontrados em jornais e
revistas em aulas de estatística. Para tanto, a fundamentação teórica divide-se em duas partes: o
conteúdo Estatístico que pode ser desenvolvido através da utilização dessas Mídias e a
Educação Matemática que ressalta a importância do desenvolvimento das competências de
leitura e interpretação e da contextualização dos conteúdos trabalhados para uma aprendizagem
significativa no ensino da matemática. Apresenta sugestões para a utilização didática desses
recursos, propondo atividades que trazem um enfoque diferenciado do tradicional,
acompanhadas da análise dos resultados de uma experiência aplicada entre os alunos do ensino
médio de duas escolas dos municípios de Feira de Santana e Vitória da Conquista.
PALAVRAS-CHAVE: Estatística; Leitura e Interpretação; Matemática; Jornais e revistas
ABSTRACT
This paper aims to analyze the benefits of using texts found in newspapers and magazines
courses in statistics. For both, the theoretical foundation is divided into two parts: the statistical
content that can be developed through the use of such media and mathematics education that
emphasizes the importance of developing the skills of reading and interpretation and the context
of content worked for significant learning in mathematics teaching. Make suggestions for the
didactic use of these resources by offering activities that bring a different focus from the
traditional, accompanied by an analysis of results of applied experience among high school
students from two local schools in Feira de Santana, Vitória da Conquista.
KEYWORDS: Statistics, Reading and Interpretation; Mathematics; Newspapers and magazines
*
Mestranda em Educação Científica e Formação de Professores/UESB –Professor auxiliar da Universidade do Estado
da Bahia/UNEB - Grupo de Estudos em Educação Matemática(GEEM)[email protected]
**Mestranda em Educação Científica e Formação de Professores/UESB- Professora do Ensino básico estadual e
municipal- Grupo de Estudos em Educação Matemática(GEEM)- [email protected]
***Mestranda em Educação pela UNIT/SE, Professora da UNEB/BA, Consultora Educacional, e-mail:
em
[email protected]
****
Mestranda em Educação/PPED/UNIT, Assistente Social FHS/SE, Pedagoga da SEED/SE,
[email protected]
INTRODUÇÃO
Ao folhear jornais e revistas de divulgação de notícias encontram-se diversas
informações numéricas, que se apresentam sob formas variadas – textos, tabelas,
gráficos. Para a interpretação dessas informações há necessidade de domínio não apenas
dos conteúdos matemáticos a elas relacionados, mas também de competências e
habilidades ligadas à leitura e interpretação, sem as quais não há garantia de completo
entendimento das mesmas por parte de quem lê.
Freqüentemente percebe-se que muitos alunos do Ensino Médio das escolas
públicas apresentam dificuldades para compreender dados Matemáticos contidos em
jornais e revistas de divulgação de notícias, possivelmente em virtude das suas
deficiências em relação às competências de leitura e interpretação aliadas talvez à
ausência de contextualização dos conteúdos, o que os impossibilita de fazer conexões
entre o que a escola ensina e a sua vida cotidiana.
Existem grandes questionamentos com relação à aplicabilidade e à forma como
são transmitidos os conteúdos matemáticos. O enfoque em conteúdos estatísticos
favorece uma aproximação entre o conteúdo transmitido na escola e as vivências
cotidianas dos alunos, pois, segundo os PCNEM (Parâmetros Curriculares Nacionais do
Ensino Médio) , os mesmos baseiam-se na descrição e análise de dados, realização de
inferências e predições sobre questões do mundo real.
Desse modo, as razões para a elaboração do presente trabalho se justificam na
necessidade de encontrar formas de abordagem dos conteúdos estatísticos que
privilegiem a utilização de jornais e revistas como recursos didáticos.
"O ensino da matemática ainda é marcado pelos altos índices de retenção, pela
formalização precoce de conceitos, pela excessiva preocupação com o treino de
habilidades e mecanização de processos sem compreensão."(PCN's, p. 15). A escola de
hoje não pode apenas transmitir conteúdos de natureza enciclopédica de forma
mecânica. Assim, nosso objetivo principal é analisar os benefícios da utilização de
jornais e revistas de divulgação de notícias como material de ensino em aulas de
Estatística, visando o favorecimento de maior atribuição de significados pelos alunos
aos conteúdos trabalhados, a capacitação dos mesmos para sua atuação no mercado de
trabalho e o exercício da cidadania de forma ética e autônoma. Além disso, é importante
estabelecer relações entre as dificuldades apresentadas pelos alunos e o domínio das
competências de leitura e interpretação, análise crítica e capacidade de contextualização.
Para isso, inicialmente são tratados os conteúdos estatísticos de forma resumida,
que serviram de base para a realização da pesquisa, fornecendo uma fundamentação
teórica com um enfoque mais aprofundado do que no ensino médio, com o objetivo de
ter uma visão mais ampla.
A contribuição de vários autores cujos trabalhos estão voltados para a educação
matemática também é decisiva para estabelecer as bases didáticas e metodológicas da
pesquisa e possibilitar a análise de propostas de trabalho voltadas para a utilização de
recursos pouco comuns em aulas de Matemática, como os textos de jornais e revistas.
Apesar de poucas, as referências encontradas são bastante significativas. Os trabalhos
das professoras Smole e Diniz (2001) apresentam propostas interessantes e coerentes,
desde a educação infantil até o ensino médio e são a principal fonte de inspiração desta
pesquisa.
Tanto os conteúdos específicos quanto os ligados à educação matemática
nortearam a elaboração das atividades das seqüências didáticas aplicadas em turmas do
Ensino Médio, buscando um enfoque diferenciado do tradicionalmente adotado por
alguns livros didáticos, visando ao alcance de mais um dos objetivos propostos: atenuar
o problema da falta de compreensão dos conteúdos. Acreditamos que a realização deste
trabalho de pesquisa poderá auxiliar outros educadores em suas buscas por novos
caminhos na educação matemática, não por sugerir soluções para os problemas, mas por
indicar caminhos para a busca dessas soluções.
ESTATÍSTICA
Para uma melhor compreensão dos tópicos desenvolvidos no trabalho faz-se
necessário que alguns conceitos iniciais sejam dados de forma sintética.
Pode-se definir a estatística como um “conjunto de técnicas que permite, de
forma sistemática, organizar, descrever, analisar e interpretar dados oriundos de estudos
ou experimentos realizados em qualquer área do conhecimento”. (MAGALHÃES;
LIMA, 2004). Os mesmos autores sugerem a divisão da estatística em três grandes
áreas: a estatística descritiva, que é “um conjunto de técnicas destinadas a descrever e
resumir os dados, a fim de que possamos tirar conclusões a respeito de características de
interesse”; a probabilidade, “que pode ser pensada como a teoria matemática utilizada
para se estudar a incerteza oriunda de fenômenos de caráter aleatório” e a inferência
estatística, que se refere às “técnicas que possibilitam a extrapolação, a um grande
conjunto de dados, das informações e conclusões obtidas a partir de subconjuntos de
valores, usualmente de dimensão muito menor”.
Outro conceito que faz parte do vocabulário da estatística é o de população,
que é o conjunto de elementos a serem estudados, na qual cada elemento recebe o nome
de indivíduo. Ao estudar determinada população, o pesquisador interessa-se por algum
aspecto comum a todos os seus indivíduos. A esse aspecto chama-se variável. As
variáveis podem ser de dois tipos: quantitativas, quando os valores utilizados são
numéricos, ou qualitativas, quando são tratados aspectos não numéricos, ou quando
revelam uma qualidade ou atributo. As variáveis quantitativas podem, ainda, ser
classificadas em discretas ou contínuas.
Como nem sempre o acesso a toda a população é possível, por razões
econômicas, éticas ou físicas, em alguns casos é preciso trabalhar com um subconjunto
da população, geralmente de dimensões consideravelmente menores, que são chamadas
de amostras. Essa amostra precisa ser selecionada tendo em vista o trabalho com um
subconjunto o mais parecido possível com a população que lhe deu origem. Isso
significa que, apesar de possivelmente possuir pequenas divergências em virtude da
aleatoriedade da escolha de seus elementos, “a amostra deve possuir as mesmas
características básicas da população, no que diz respeito à(s) variável (is) que desejamos
pesquisar”. (COSTA NETO, 1998)
Para organizar e descrever um conjunto de dados, seja em uma população ou
em uma amostra, podem ser utilizadas as Distribuições de Freqüências; as mais usadas
são as tabelas e gráficos. As tabelas podem apresentar os dados brutos, isto é, da
maneira como foram coletados; mas nem sempre atendem às necessidades do
pesquisador por não serem muito práticas, apesar de apresentarem uma grande
quantidade de informações. A partir da tabela de dados brutos pode ser construída a
tabela de freqüência, que contém informações resumidas a respeito de cada uma das
variáveis consideradas sobre os dados coletados. Elas podem apresentar os dados não
agrupados ou agrupados por faixas ou classes de valores, chamadas de intervalos de
classe. Nesses intervalos são contadas as ocorrências de cada variável de que trata a
tabela de dados brutos, ou seja, é determinada a freqüência para cada variável.
Organizar conjuntos de dados em tabelas de freqüência é uma maneira muito
eficiente de estudá-los. Às vezes, no entanto, representar graficamente as informações
contidas nas tabelas pode apresentar vantagens, como maior facilidade de visualização e
interpretação dos dados apresentados. Existem inúmeros tipos de gráficos, dos quais os
mais comumente encontrados são: gráficos lineares ou de curvas, de setores (também
denominados de gráficos de “pizza”) e de barras.
ENSINO DA MATEMÁTICA
Na sociedade contemporânea, com o ritmo acelerado de produção de
conhecimento e as grandes transformações de ordem científica e tecnológica que vêm
ocorrendo, um dos maiores desafios da escola é construir espaços que permitam aos
educandos selecionar, analisar e contextualizar informações, de modo que elas possam
ser incorporadas às suas próprias experiências, visando prepará-los para a cidadania,
ampliar as possibilidades frente ao conhecimento científico, “permitir-lhes fazer
conjecturas, formular hipóteses, estabelecer relações, processos necessários para a
resolução de problemas” (Lopes e Ferreira, 2004). Daí a necessidade de uma educação
voltada para um trabalho pedagógico investigativo, criativo, dinâmico e interdisciplinar,
ampliando as competências do educando quanto à tomada de decisões.
São
bastante
comuns,
entre
alunos
e
até
mesmo
entre
professores,
questionamentos sobre a aplicabilidade e utilidade de muitos conteúdos matemáticos.
Talvez uma das maiores falhas no ensino de matemática seja a falta de conexões entre
os conteúdos trabalhados, as experiências e vivências dos alunos e as outras disciplinas
e áreas de conhecimento como consta nos PCNEM (1999). No ensino tecnicista, de
algumas décadas atrás, as práticas de cálculo sistemático eram constantes e necessárias.
Não havia a preocupação com a “qualidade da imaginação criadora”. Dos alunos exigiase basicamente habilidade na elaboração de respostas de questões que dependiam de
conhecimentos sobre os conteúdos envolvidos.
No mundo globalizado em que estamos vivendo não há mais espaço para
alunos passivos, sem autonomia para tomada de decisões, apenas ouvintes. É
imprescindível que haja a preocupação com o desenvolvimento da capacidade de um
pensar crítico, da necessidade de preparar jovens dignos, que exerçam conveniente e
conscientemente sua cidadania. Aliada a esses aspectos está à questão das deficiências
em relação à leitura e interpretação, principalmente de textos matemáticos, o que está
ligado, entre outras coisas, à ausência de um trabalho pedagógico específico com o
texto, nas aulas de Matemática. Conforme Smole e Diniz (2001) .
O estilo no qual geralmente os problemas de matemática são escritos,
a falta de compreensão de um conceito envolvido no problema, o uso
de termos específicos da matemática e que, portanto, não fazem parte
do cotidiano do aluno, e mesmo palavras que têm significados
diferentes na matemática e fora dela – total, diferença, ímpar, média,
volume, produto - podem se constituir em obstáculos para que a
compreensão ocorra.(SMOLE e DINIZ, 2001; p 72)
Ainda para Smole e Diniz (2001) é comum professores de matemática
relacionarem as dificuldades que os alunos encontram para resolver um problema
matemático por não conseguir entender o problema proposto, dificuldades de leitura
mesmo, de interpretação, mas não é só isso. O aluno precisa participar de todo o
processo da construção do conhecimento, aproveitando as experiências adquiridas fora
do contexto escolar, numa aprendizagem que seja efetiva. O que se pretende é um maior
aproveitamento dos conhecimentos dos alunos, de suas vivências cotidianas e da
realidade que os rodeia, e não a aplicação alheias a realidade vivenciada por eles e
muitas vezes trabalhados de forma fragmentada. D’Ambrosio (2005), para ressaltar isso,
afirma que:
[...] faz-se necessário uma visão curricular para a Matemática que seja
diferente da linear. A linearidade tem predominado nos currículos
dessa disciplina, sempre
justificando que para ensinar um conteúdo é preciso antes trabalhar
um outro que o antecede. “Esse é o mito da linearidade, a qual implica
uma prática educativa desinteressada e desinteressante, desinspirada,
desnecessária, acrítica e, na maioria das vezes, equivocada. (
D’AMBROSIO, 2005; p...)
Isso pode ser visto quanto ao uso do livro didático, que muitas vezes é
utilizado como recurso único, sem nenhuma ligação com o contexto em que o educando
está inserido. O livro didático é usado em sala de aula seguindo de forma linear,
capítulo após capítulo. Quando se propõe análise de novos livros, novos autores, livros
que muitas vezes problematizam mais, contextualizam mais. Assim torna-se necessário
um trabalho em equipe, pois mudança exige estudo, análise de textos, novas propostas
de trabalho, que não depende apenas do professor. Usualmente trabalha-se conteúdos
matemáticos com base em procedimentos mecânicos rotineiros, repetição de exercícios,
que enfatizam a reprodução de técnicas de cálculo, sem possibilitar o desenvolvimento
do raciocínio lógico na resolução de problemas.
MATEMÁTICA E LÍNGUA MATERNA
Atualmente, encontramos informações referentes a pesquisas e trabalhos
desenvolvidos sobre a influência da leitura e interpretação para a resolução de
problemas matemáticos que mostram que, quando bem utilizados, os textos são
instrumentos que proporcionam aos alunos uma melhoria no desempenho e o
estabelecimento de relações importantes entre a matemática, a língua materna e as
outras ciências.
A crença corrente de que o professor de Matemática não deve preocupar-se com
aspectos relacionados à língua materna e com o estabelecimento de relações com outras
áreas do conhecimento pode ser mudada na medida em que se descobrem os benefícios
de trabalhar com textos, como as tabelas e gráficos que aparecem em jornais e revistas
de divulgação de notícias, materiais interessantes e ricos, pois trazem fatos e
acontecimentos que fazem parte do dia-a-dia dos alunos e podem ser explorados em sala
de aula. Além disso, existem especificidades na escrita da matemática que se organizam
de acordo com algumas regras em que se utilizam símbolos, sinais, letras e palavras,
para expressar idéias, daí a necessidade de trabalhar a leitura, escrita e produção textual
nas aulas de Matemática.
Uma abordagem adequada na utilização de textos em aulas de Matemática,
especialmente de jornais e revistas, pode proporcionar aos alunos inúmeros benefícios.
Entre eles, alguns devem ser destacados: uma melhoria significativa das competências
de leitura e interpretação em decorrência de maior treino dessas atividades; a
possibilidade da visão interdisciplinar dos conteúdos, já que ao trabalhar com esses
materiais encontramos referências a várias áreas de conhecimento, como economia,
geografia, biologia e inúmeras outras, dada a variedade de assuntos com que nos
deparamos; a possibilidade de contextualização dos conteúdos trabalhados não só em
matemática como em outras disciplinas do currículo e, finalmente, devemos considerar
até mesmo que esse tipo de trabalho pode possibilitar uma melhoria da auto-estima dos
alunos já que, possivelmente, ao trabalhar com materiais mais próximos da sua
realidade, eles alcançarão melhores resultados de aprendizagem qualitativa e
quantitativamente.
Aliada a esses aspectos, está à grande dificuldade dos alunos em “enxergar” os
conteúdos de Matemática quando os mesmos são apresentados de forma
contextualizada, como por exemplo, em textos e gráficos de jornais e revistas,
principalmente porque esse tipo de material não se esgota em uma única área do
conhecimento, não são específicos de conteúdos matemáticos. Nesses casos, a leitura e
interpretação são competências indispensáveis para o desenvolvimento de noções e
conceitos matemáticos. Segundo Smole e Diniz (2001)
[...] todas as pesquisas desenvolvidas ao longo dos últimos tempos
sobre como tornar os alunos leitores competentes têm sido unânimes
em afirmar que o ato de ler está alicerçado na capacidade humana de
compreender e interpretar o mundo. ( SMOLE e DINIZ, 2001 p. 70).
Nessa perspectiva, a
leitura é vista como uma atividade que pressupõe
integração entre reflexão, interpretação, análise, síntese e seleção das informações.
Portanto, não é uma tarefa fácil, já que exige do leitor uma tomada de posição em
relação ao que lê. Ainda segundo as mesmas autoras:
A compreensão de um texto é um processo que se caracteriza pela
utilização que o leitor faz, no ato de ler, do conhecimento que ele
adquiriu ao longo de sua vida: o conhecimento lingüístico, o
conhecimento textual, o conhecimento de mundo. Para chegar à
compreensão do que leu e conseqüentemente, para aprender algo novo
a partir da leitura realizada, é preciso que conhecimentos anteriores
sejam ativados durante a leitura e que o leitor indague, questione,
busque e procure identificar os aspectos relevantes de um texto,
encontrando pistas e percebendo os caminhos que o texto sugere.
(SMOLE e DINIZ, 2001 p. 70).
Para que isso seja possível, o ideal seria o desenvolvimento de um ensino
aberto à realidade, um ensino que leve o aluno a pensar e comunicar idéias,
considerando que grande parte das informações de que necessitamos para viver em
sociedade são encontradas na forma escrita. Deve ficar claro que as listas de exercícios
e outras atividades de repetição amplamente aplicadas em aulas de matemática têm um
papel muito importante na aprendizagem dos conteúdos, pois o treino conduz ao
aprendizado de técnicas específicas. Porém, ao destacar a importância da leitura e da
interpretação para o desenvolvimento do raciocínio lógico e realizar atividades que
favoreçam este aspecto, o professor de matemática estará colocando os alunos diante de
maiores possibilidades de compreensão do real significado da matéria.
A IMPORTÂNCIA DO TRABALHO INTERDISCIPLINAR COM A
ESTATÍSTICA
Percebe-se, atualmente, um crescente interesse pelo ensino da matemática,
voltado para a área da estatística. Esse interesse é justificável, pois através do
desenvolvimento do raciocínio estatístico tem-se uma maneira própria de organizar e
analisar informações, possibilitando a compreensão de sua estrutura e interpretações
adequadas. O Ministério da Educação e Cultura (MEC), através do (PCNEM, 1999),
destaca a importância de se trabalhar com um amplo espectro de conteúdos e a
relevância do estudo da estatística:
As habilidades de descrever e analisar um grande número de dados,
realizar inferências e fazer predições, com base numa amostra de
população, aplicar as idéias de probabilidade e combinatória a
fenômenos naturais e do cotidiano são aplicações da Matemática em
questões do mundo real que tiveram um crescimento muito grande e
se tornaram bastante complexas. Técnicas e raciocínios estatísticos e
probabilísticos são, sem dúvida, instrumentos tanto das Ciências da
Natureza quanto das Ciências Humanas. (PCNEM, 1999, p. 257)
De acordo os PCN (1998), apesar de o conhecimento Estatístico estar previsto
para o terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental, dentro do sistema de ensino
brasileiro, a estatística ocupa um lugar muito pouco destacado nos cursos superiores e
praticamente inexistentes no ensino fundamental e médio. As novas propostas para os
livros didáticos estão em conformidade com a proposta dos PCNEM, incluindo
conteúdos estatísticos, desde a leitura e interpretação de tabelas e gráficos até problemas
estatísticos envolvendo probabilidade e combinatória, que são conteúdos de grande
importância “em um mundo no qual a circulação de informações é maior a cada dia”
(SMOLE e DINIZ, 2003). A necessidade do trabalho com a estatística para atender à
demanda social enfatiza o seu caráter interdisciplinar. Ela está ligada a conhecimentos
gerais e na prática existe a necessidade de integração com outras áreas.
Bigode aborda que saber ler gráficos e tabelas contribui para uma compreensão
maior da realidade, ajuda a enxergar detalhes e apura a percepção. Gráficos e tabelas
utilizam a linguagem matemática, mas os conteúdos que eles trazem podem estar
relacionados às mais variadas áreas do conhecimento. Por isso, os especialistas
aconselham que, ao tratar do tema em classe, seja proposto um trabalho interdisciplinar.
Segundo Lopes (1998):
Adotar uma abordagem interdisciplinar requer uma revisão da prática
docente, pois não bastará ao professor o domínio do conteúdo de sua
disciplina; será necessário investigar os assuntos de outras áreas e
integrar conceitos, procedimentos e metodologias, uma vez que o
trabalho interdisciplinar não deve se limitar à integração de conteúdos
programáticos das disciplinas. (LOPES 1998b, p. 44).
Para Hülsendeger (2001) a interdisciplinaridade é uma proposta pedagógica
que objetiva superar dificuldades encontradas, por professores e alunos, no trabalho
desenvolvido em sala de aula. Em um enfoque interdisciplinar, exige-se trabalho em
grupo, um constante aperfeiçoamento do professor, interesse e disposição em realmente
integrar o conhecimento. O grupo deve estar disposto a penetrar em outras áreas,
estabelecendo ligações e relações por meio de estudos sobre as mesmas, num trabalho
colaborativo. É necessário “aprender a aprender novamente”, adaptar-se às novas
propostas pedagógicas de ensino, ou seja, uma mudança de postura frente aos novos
desafios da educação. Vale destacar ainda que as novas propostas educacionais não são
de responsabilidade exclusiva dos professores e das escolas, mas também de mudanças
nas políticas públicas na área da educação, condição necessária, imprescindível e
urgente em nosso país.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Os caminhos metodológicos percorridos para realização dessa pesquisa de
cunho qualitativo teve como suporte a realização de projetos de intervenção, nomeados
de Seqüência Didáticas, aplicados em escolas distintas, buscando atender às
características das turmas envolvidas na pesquisa. Os sujeitos da pesquisa foram alunos
de duas escolas públicas estaduais do 1º e 2º ano do Ensino Médio,sendo 43 e 47
alunos respectivamente. O trabalho teve como objetivo uma tentativa de analisar os
benefícios da utilização de textos e gráficos, encontrados em jornais e revistas de
divulgação de notícias em aulas de estatística. A seqüência didática foram divididas em
quatro etapas diferentes previamente organizadas pelo professore/pesquisador.
Inicialmente foram aplicadas atividades de sondagem, visando à identificação
das possíveis dificuldades que os alunos apresentam com relação à leitura e
interpretação. Posterior a esse processo, se deu início a 1ª etapa que consistia em
permitir ao educando conhecer dados estatísticos em gráficos e tabelas através da
utilização de reportagens de jornais e revistas com o objetivo de conhecer os tipos mais
comuns de gráficos, diferenciando um do outro numa conversa informal sobre
estatística, à medida que o aluno naturalmente se sentia no processo de
questionar/refletir, enfim, relacionar a Estatística com o meio em que vive, organizando
e interpretando estatisticamente informações.
Na 2ª etapa – (Atividade extraclasse), os alunos foram motivados a planejar sua
própria pesquisa de campo com um tema específico (voltado para atualidade),
preparação do projeto de pesquisa (questionário, estudo, etc.).
Na 3ª etapa (em grupo), permitiu ao aluno trabalhar com o material coletado da
pesquisa, ou seja, análise e coleta de dados, tabulação, criação de gráficos e
apresentação para turma.
Na 4ª etapa, o professor desenvolveu uma dinâmica com os erros e acertos
diagnosticados nos trabalhos dos alunos, com o objetivo de sistematizar os conteúdos de
estatísticos presentes em todos os trabalhos. Na verdade, o professor é o mediador de
todo o processo, intervindo durante todas as apresentações, de forma a permitir que os
alunos percebam possíveis erros nas interpretações.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
Ao iniciar a execução da primeira atividade da seqüência didática os alunos
demonstraram certa relutância em trabalhar com textos em aulas de matemática.
Inicialmente procuraram textos curtos que apenas apresentassem algum dado numérico
e, após novos esclarecimentos sobre o objetivo da atividade, conseguiram fazer a
seleção do material de forma mais coerente. A maioria dos grupos conseguiu fazer uma
boa síntese do texto e demonstrando possuir conhecimentos básicos de estatística,
identificando e explicando com precisão as informações matemáticas e estatísticas
encontradas. A atividade funcionou também como uma revisão dos conteúdos sobre os
quais os alunos já possuíam algum conhecimento e a identificação das dificuldades,
além de ser ponto de partida para o levantamento dos tópicos que precisavam de
aprofundamento.
Bastante significativo também foi o enfoque interdisciplinar da atividade. As
discussões se estenderam para as aulas de biologia, onde, a partir do interesse
demonstrado pelos alunos sobre o tema, foram desenvolvidos trabalhos de pesquisa e
discussões bastante proveitosas. Em virtude da necessidade de elaboração de textos e
respostas escritas, a intervenção da professora de língua portuguesa também foi
necessária em vários momentos, tanto durante as aulas de matemática como nas aulas de
língua portuguesa e redação, esclarecendo dúvidas quanto à pontuação, ortografia,
concordância e estrutura textual; foram contribuições significativas para o trabalho, na
medida em que essas necessidades de consulta ressaltavam a importância da leitura e da
interpretação para as atividades que estavam sendo desenvolvidas.
Algumas dos alunos destacaram a compreensão sobre a importância da leitura e,
principalmente, da interpretação para todas as disciplinas do currículo, como por
exemplo:
[...] a interpretação é importante em todas as disciplinas (...), em
matemática e física, principalmente, ninguém responde questões sem
interpretação. (SP01);
[...] a leitura é importante em todas as disciplinas, pois, sejam letras ou
números, é preciso saber ler para entender. (SP02);
[...] para resolver cálculos de matemática, física e química antes de
saber as fórmulas é necessário saber o que a questão pede. (SP03).
Percebeu-se que as atividades envolvendo temas da atualidade e de interesse
para o adolescente, relacionando-os aos conteúdos matemáticos, gera maior
envolvimento com o trabalho e maior compreensão dos conceitos explorados. As
aprendizagens advindas da execução dessas atividades demonstraram-se muito mais
significativas para os alunos, pois estão baseadas em suas vivências e, portanto, dotadas
de maior sentido que os exemplos, problemas e exercícios .
Na segunda etapa, que o aluno tinha que elaborar uma pequena pesquisa de
campo, em que ele seria o entrevistador, o autor da matéria. Os temas propostos para a
realização da pesquisa de campo foram bastante relevantes na vida cotidiana do aluno,
ao mesmo tempo em que as conexões com o conteúdo estatístico foram feitas de forma
natural e coerente. Esse trabalho foi realizado com muito empenho, compromisso e
empolgação , porém demandou mais tempo do que o previsto. De início seria um
trabalho individual, mas por se tratar de turmas com muitos alunos (43 e 47) ,além da
afinidade com os mesmos temas,
resultou num trabalho em grupo. Durante a
elaboração dos questionários foram necessárias algumas intervenções, a fim de imprimir
maior objetividade às questões, garantindo facilidade na quantificação dos resultados.
Apesar das dificuldades percebidas pelos alunos na elaboração das perguntas, na
coerência do texto, é impressionante a criatividade nas estratégias de organização da
pesquisa.
Na terceira atividade os alunos colocaram em prática, sistematizaram os
conhecimentos matemático-estatísticos adquiridos e/ou aprofundados informalmente
durante o desenvolvimento do trabalho. Após a construção, análise e discussão das
tabelas e gráficos construídos, alguns foram escolhidos para as discussões sobre alguns
conceitos de estatística. Em uma análise geral dos relatórios das pesquisas, foi possível
observar grande dificuldade dos alunos em diferenciar a descrição do conteúdo das
tabelas e gráficos com a discussão dos resultados. Este fato talvez se deva à dificuldade
na leitura e produção textual e ainda problemas graves de ortografia, concordância e
redação. Acreditamos que estas atividades venham a contribuir também neste aspecto, e
que as atividades de multidisciplinaridade acabem se incorporando naturalmente no
ensino do 2º grau.
Os alunos elaboraram um grande mural com todas as informações coletadas
durante a pesquisa de campo, representadas pelas tabelas e gráficos construídos por eles,
acrescentando ainda outras informações sobre o tema, obtidas através das pesquisas
feitas durante as aulas de biologia, utilizando-se, inclusive, de outros artigos sobre o
tema, publicados em revistas diversas. Mais uma vez, fica evidente que a utilização de
textos de jornais e revista é uma estratégia que favorece uma aprendizagem significativa
aos alunos e deve ser explorada por todas as disciplinas do currículo. Foi muito
proveitosa essa parte, no entanto ficou visível
a resistência de muitos alunos em
participar da aula quando precisam falar, comunicar-se oralmente, mas que ao mesmo
tempo envolvidos por se tratar de assuntos do dia -a- dia ou comuns a todos.
Um dificuldade específica do conteúdo de estatística apresentada pelos alunos
diz respeito à colocação de títulos nos eixos dos gráficos, na proporção dos gráficos,
que foram recebendo orientação à medida que surgiam. Em uma análise geral das
atividades, os alunos não sabiam diferenciar a descrição do conteúdo das tabelas e
gráficos com a discussão dos resultados. Este fato talvez se deva à dificuldade na leitura
e produção textual, pois encontrei problemas graves de ortografia, concordância e
redação. Acredito que estas atividades venham a contribuir também neste aspecto, e que
as atividades de multidisciplinaridade acabem se incorporando naturalmente no ensino
médio.
Dando continuidade, chegou o momento de o professor comentar e avaliar
cada trabalho, explicando os erros e acertos de cada equipe. Um momento rico de
discussões. Nessa atividade deu para comprovar e reforçar o que Dante (1989) aborda:
[...] uma sala de aula de Matemática onde os alunos, incentivados e
orientados pelo professor, trabalhem de modo ativo na aventura de
buscar a solução de um problema que os desafia é mais dinâmica e
motivadora. (DANTE, 1989)
Esse processo criador do aluno deveria constituir-se em desafios à ação do
professor em sala de aula. Senti-me desafiada à medida que percebia o interesse e
motivação dos alunos na participação das atividades, principalmente quando percebia
que o aluno estava construindo seu próprio conhecimento, trabalhando as dificuldades,
interagindo com o colega, permitindo um espaço aberto às discussões críticas, trocas,
sugestões e descobertas. Um trabalho de atividades produtivas, proporcionando o prazer
em aprender. Acredito que trabalhar com jornais e revistas com aulas práticas e temas
atuais, é que faz com que esse método de ensino seja atrativo e contribua para
construção do conhecimento matemático.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No início da pesquisa para a elaboração deste trabalho, muitas dúvidas foram
postas, até mesmo em relação à validade de sua realização. Durante o processo de
pesquisa, no entanto, percebeu-se o quanto ela é pertinente, especialmente por explorar
a estatística, uma área cuja importância tem aumentado bastante, sendo hoje essencial
não só para a matemática, como também para as outras áreas e, em especial, para a vida
cotidiana. Ao lado desse aspecto, havia também o desafio de, através da utilização de
textos de jornais e revistas de divulgação de notícias, desfazer a imagem de desconexão
entre a matemática e a língua materna e, principalmente, enfocar os conteúdos
estatísticos de forma contextualizada e interdisciplinar. Compartilhar com os alunos
algumas horas de um trabalho diferenciado do tradicional foi uma estratégia que
contribuiu na identificação das dificuldades por eles apresentadas em relação à análise
de
dados
estatísticos;
dificuldades
estas
relacionadas
às
deficiências
no
desenvolvimento das competências de leitura e interpretação. Os resultados obtidos com
a aplicação das atividades propostas nas seqüências didáticas surpreendem no tocante à
sua qualidade. São esses resultados que confirmam que a adoção de um enfoque
diferenciado para os conteúdos matemáticos e, de forma particular, os conteúdos
estatísticos, resulta em maior significação dos mesmos, melhoria das competências de
leitura e interpretação dos alunos, possibilidade de aplicação de um trabalho
contextualizado e interdisciplinar e, até mesmo, o favorecimento da melhoria da
autoconfiança dos adolescentes, por perceber a satisfação com seu bom desempenho nas
atividades. Deve ser preocupação constante de qualquer professor o desenvolvimento de
habilidades e competências que permitam aos alunos desenvolver a capacidade de
continuar aprendendo ao longo da vida, para o efetivo exercício da cidadania. É
imprescindível destacar o papel do planejamento cuidadoso de atividades que atendam a
esses aspectos, visando apagar a imagem distorcida que prevalece entre a maioria das
pessoas – tanto alunos quanto professores – de que as aulas de matemática devem focar
essencialmente os conceitos, através de aulas expositivas e resolução de exercícios
tradicionais. Fica implícito aqui, o convite a uma reflexão sobre as considerações feitas
neste trabalho, na busca pelo desenvolvimento de novas propostas para o ensino da
estatística, que contemplem os aspectos que foram destacados.
REFERÊNCIAS
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Curriculares Nacionais:Matemática, Brasília: Ministério da Educação/Secretaria de
Educação
Fundamental,
1998
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TECNOLÓGICA. Parâmetros Curriculares do Ensino Médio: ciências da natureza,
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Volume 1. São Paulo: Editora Saraiva. 2003.
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Volume 2. São Paulo: Editora Saraiva. 2004.
VIEIRA, Sônia e HOFFMANN, Rodolfo. Elementos de Estatística. 2ª Edição. São
Paulo:
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