O MERCADO DE ORGÂNICOS NO PARANÁ CARACTERIZAÇÃO E TENDÊNCIAS Estudo financiado com recursos da Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior/ Fundo Paraná CURITIBA 2007 GOVERNO DO ESTADO DO PARANÁ ROBERTO REQUIÃO - Governador SECRETARIA DE ESTADO DO PLANEJAMENTO E COORDENAÇÃO GERAL NESTOR CELSO IMTHON BUENO - Secretário SECRETARIA DE ESTADO DA AGRICULTURA E DO ABASTECIMENTO NEWTON POHL RIBAS - Secretário INSTITUTO PARANAENSE DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL - IPARDES JOSÉ MORAES NETO - Diretor-Presidente NEI CELSO FATUCH - Diretor Administrativo-Financeiro MARIA LÚCIA DE PAULA URBAN - Diretora do Centro de Pesquisa SACHIKO ARAKI LIRA - Diretora do Centro Estadual de Estatística THAÍS KORNIN - Diretora do Centro de Treinamento para o Desenvolvimento INSTITUTO AGRONÔMICO DO PARANÁ - IAPAR JOSÉ AUGUSTO TEIXEIRA DE FREITAS PICHETH - Diretor-Presidente ARNALDO COLOZZI FILHO - Diretor Técnico-Científico ALTAIR SEBASTIÃO DORIGO - Diretor de Administração e Finanças MARIA LÚCIA CRODREMORE - Diretora de Recursos Humanos EQUIPE TÉCNICA Karen Follador Karam (Orientação Técnico-metodológica) Ivo Barreto Melão - IPARDES (Coordenação) Anibal Rodrigues - IAPAR Marina Maruyama Mori - IPARDES Moacir Roberto Darolt - IAPAR Sergio Wirbiski - IPARDES COLABORAÇÃO Marisela Garcia Hernández (pesquisadora externa) Gisele de Lorena Diniz Chaves (pesquisadora externa) EDITORAÇÃO Maria Laura Zocolotti - Coordenação Estelita Sandra de Matias (revisão) Ana Batista Martins, Ana Rita Barzick Nogueira, Léia Rachel Castellar (editoração eletrônica) Stella Maris Gazziero (tratamento de imagens) Lucrécia Zaninelli (geoprocessamento) Maria Dirce Botelho Marés de Souza (normalização bibliográfica) M553 O mercado de orgânicos no Paraná : caracterização e tendências / Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social e Instituto Agronômico do Paraná. – Curitiba : IPARDES, 2007. 188 p. + anexos. Estudo financiado com recursos da Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior/Fundo Paraná. 1. Produtos orgânicos. 2. Agricultura orgânica. 3. Paraná. I. Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social. II. Instituto Agronômico do Paraná. CDD 631.147(816.2) 2 SUMÁRIO LISTA DE QUADROS........................................................................................................................ 4 LISTA DE TABELAS ......................................................................................................................... 6 LISTA DE SIGLAS............................................................................................................................. 7 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................... 11 1 PARA PENSAR O MERCADO DE ORGÂNICOS NO PARANÁ: ABORDAGEM TEÓRICO-METODOLÓGICA DO ESTUDO ................................................................................ 16 1.1 MARCO TEÓRICO: O MERCADO COMO CONSTRUÇÃO SOCIAL ....................................... 16 1.1.1 Os Aportes da Nova Sociologia Econômica.......................................................................... 17 1.1.2 A Abordagem Político-Cultural da NSE e o Mercado de Orgânicos ..................................... 19 1.2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DO ESTUDO DO MERCADO DE ORGÂNICOS NO PARANÁ ....................................................................................................... 22 1.2.1 Coleta Documental ................................................................................................................ 22 1.2.2 Preparação da Pesquisa de Campo ..................................................................................... 23 1.2.3 Realização da Pesquisa de Campo ...................................................................................... 27 2 O MERCADO DE ORGÂNICOS: CONFIGURAÇÃO HISTÓRICO-SOCIAL .............................. 31 2.1 AS RECENTES TRANSFORMAÇÕES NO MERCADO AGROALIMENTAR E OS PRODUTOS ORGÂNICOS ........................................................................................................ 2.1.1 31 As Mudanças na Sociedade Contemporânea e a Emergência da Agricultura Orgânica ................................................................................................................................ 32 2.2 A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA AGRICULTURA ORGÂNICA E A RELAÇÃO COM OS DIFERENTES MERCADOS DE ORGÂNICOS.................................................................... 38 2.2.1 Síntese do Processo de Regulamentação dos Alimentos Orgânicos no Brasil.................... 40 2.2.2 A Institucionalização da Agricultura Orgânica no Paraná ..................................................... 44 2.2.3 A Certificação e o Mercado de Orgânicos............................................................................. 47 2.3 O SISTEMA DE PRODUÇÃO ORGÂNICO: FATORES TECNOLÓGICOS E A RELAÇÃO COM OS TIPOS DE MERCADO ............................................................................. 2.3.1 A Agricultura Orgânica e as Tecnologias de Processo e de Produto ................................... 2.3.2 A Agricultura Familiar e a Produção Orgânica: Potencialidades e Necessidades Tecnológicas ......................................................................................................................... 51 51 56 2.4 O CONSUMO DE PRODUTOS ORGÂNICOS: UMA CARACTERIZAÇÃO A PARTIR DO CONSUMIDOR .................................................................................................................... 62 2.4.1 O Consumidor de Produtos Orgânicos ................................................................................. 63 2.4.2 O Consumo Coletivo: o Papel do Mercado Institucional....................................................... 69 3 O MERCADO DE ORGÂNICOS: SITUAÇÃO MUNDIAL E INSERÇÃO DO PARANÁ ............. 71 3.1 O PANORAMA DO MERCADO MUNDIAL DE PRODUTOS ORGÂNICOS ............................. 71 3 3.2 A INSERÇÃO DO BRASIL NO MERCADO DE PRODUTOS ORGÂNICOS: PRODUÇÃO E PROGRAMAS INSTITUCIONAIS ..................................................................... 78 3.3 A PRODUÇÃO ORGÂNICA NO PARANÁ ................................................................................. 82 3.3.1 A Regionalização da Produção Orgânica no Paraná............................................................ 84 3.3.2 Instituições e Entidades Envolvidas com a Agricultura Orgânica no Paraná ....................... 89 4 MERCADOS E AGENTES DE COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTOS ORGÂNICOS NO PARANÁ................................................................................................................................. 103 4.1 O MERCADO DA VENDA DIRETA: AS FEIRAS....................................................................... 105 4.1.1 Feiras: Um Canal em Expansão ........................................................................................... 105 4.1.2 Algumas Considerações sobre o Mercado da Venda Direta ................................................ 113 4.2 O MERCADO DO VAREJO: OS SUPERMERCADOS E AS LOJAS ........................................ 114 4.2.1 Supermercados e a Comercialização de Produtos Orgânicos ............................................. 115 4.2.2 Lojas: Outro Agente no Mercado Varejista ........................................................................... 121 4.2.3 Algumas Considerações sobre o Mercado do Varejo........................................................... 125 4.3 MERCADO DE TRANSFORMAÇÃO: EMPRESAS E ASSOCIAÇÕES DE PROCESSAMENTO E BENEFICIAMENTO .............................................................................. 126 4.3.1 Empresas de Processamento ............................................................................................... 132 4.3.2 Empresas de Processamento Mínimo .................................................................................. 137 4.3.3 Empresas de Beneficiamento ............................................................................................... 140 4.3.4 Associações e Cooperativas de Agricultores e a Transformação de Produtos Orgânicos .............................................................................................................................. 142 4.3.5 Algumas Considerações sobre o Mercado da Transformação ............................................. 144 4.4 O CENÁRIO DO MERCADO EXTERNO: TENDÊNCIAS E PROCESSOS DE COMERCIALIZAÇÃO COM OS PRINCIPAIS PAÍSES IMPORTADORES ............................... 145 4.4.1 O Brasil e o Mercado Externo de Produtos Orgânicos ......................................................... 145 4.4.2 Café e Soja Orgânicos – principais produtos exportados ..................................................... 148 4.4.3 Algumas Considerações sobre o Mercado Externo de Produtos Orgânicos........................ 151 4.5 O MERCADO INSTITUCIONAL: A AÇÃO DO ESTADO COMO UM AGENTE NO MERCADO DE ORGÂNICOS .................................................................................................... 152 4.5.1 Programa de Aquisição de Alimentos - PAA......................................................................... 153 4.5.2 Programa de Alimentação Escolar: a merenda orgânica...................................................... 157 4.5.3 Algumas Considerações sobre o Mercado Institucional ....................................................... 161 4.6 DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DOS AGENTES QUE ATUAM NO MERCADO DE ORGÂNICOS NO PARANÁ ....................................................................................................... 162 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS – SUGESTÃO DE DIRETRIZES E POLÍTICAS PÚBLICAS .............. 164 REFERÊNCIAS.................................................................................................................................. 179 APÊNDICES E ANEXOS................................................................................................................... 189 4 LISTA DE QUADROS 1.1 - MATRIZ DAS GRANDES REGIÕES PESQUISADAS, SEGUNDO OS PRINCIPAIS MUNICÍPIOS, GRUPOS DE PRODUTOS E AGENTES DE COMERCIALIZAÇÃO PARANÁ - 2006...................................................................................................................... 26 1.2 - PESQUISA DE CAMPO DE ORGÂNICOS, SEGUNDO AS GRANDES REGIÕES E OS AGENTES ENTREVISTADOS - PARANÁ - 2006 ........................................................... 27 2.1 - SISTEMAS DE GARANTIA DE QUALIDADE ........................................................................ 49 2.2 - ORGANISMOS CERTIFICADORES INTERNACIONAIS COM AÇÃO EM AGRICULTURA ORGÂNICA NO BRASIL ........................................................................................................ 50 2.3 - ORGANISMOS CERTIFICADORES NACIONAIS COM AÇÃO EM AGRICULTURA ORGÂNICA ............................................................................................................................ 50 2.4 - ORGANISMOS CERTIFICADORES ATUANTES NO ESTADO DO PARANÁ - 2006.......... 51 2.5 - POTENCIALIDADES E NECESSIDADES DA AGRICULTURA FAMILIAR NO DESENVOLVIMENTO DA AGRICULTURA ORGÂNICA - RMC - PARANÁ......................... 2.6 - PRINCIPAIS MOTIVOS PARA A COMPRA DE ORGÂNICOS PELOS CONSUMIDORES EM PAÍSES DA EUROPA E BRASIL..................................................................................... 63 2.7 - CARACTERÍSTICAS DOS CONSUMIDORES DE PRODUTOS ORGÂNICOS NO BRASIL ................................................................................................................................... 64 3.1 - GRANDES REGIÕES, MESORREGIÕES GEOGRÁFICAS DO PARANÁ E REGIONAIS DA EMATER-PR .................................................................................................................... 82 3.2 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS FEDERAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006...................................................................................................................... 90 3.3 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS ESTADUAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 ............................................................................................................... 91 3.4 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS MUNICIPAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 ............................................................................................................... 94 3.5 - ENTIDADES NÃO-GOVERNAMENTAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 ............................................................................................................... 96 3.6 - OUTRAS ENTIDADES DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 .... 101 4.1 - LOCAL, ESTRUTURA, DIA DE FUNCIONAMENTO E DATA DE ABERTURA DAS FEIRAS ORGÂNICAS EM CURITIBA - PARANÁ - 2006 ...................................................... 106 4.2 - MERCADO DA VENDA DIRETA DE PRODUTOS ORGÂNICOS (FEIRAS, ENTREGA EM DOMICÍLIO E VENDA NA PROPRIEDADE) - CARACTERÍSTICAS, OPORTUNIDADES E RESTRIÇÕES - PARANÁ -2006 ............................................................................................ 112 4.3 - FORNECEDORES DE PRODUTOS ORGÂNICOS PARA AS LOJAS DE CURITIBA PARANÁ - 2006...................................................................................................................... 121 61 5 4.4 - MERCADO VAREJISTA (LOJAS) DE PRODUTOS ORGÂNICOS - CARACTERÍSTICAS, OPORTUNIDADES E RESTRIÇÕES - PARANÁ - 2006....................................................... 124 4.5 - TIPOS DE TRANSFORMAÇÃO DOS PRODUTOS ORGÂNICOS SEGUNDO AS EMPRESAS, LOCALIZAÇÃO E PRINCIPAIS PRODUTOS - PARANÁ - 2006 .................... 131 4.6 - TIPOS DE TRANSFORMAÇÃO DE PRODUTOS ORGÂNICOS, SEGUNDO AS ASSOCIAÇÕES E COOPERATIVAS DE PRODUTORES, LOCALIZAÇÃO E PRINCIPAIS PRODUTOS - PARANÁ - 2006 .............................................................................................. 143 4.7 - PRINCIPAIS PRODUTOS COMERCIALIZADOS NO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS/COMPRA DIRETA NO PARANÁ - PRIMEIRO SEMESTRE DE 2006 ................... 156 6 LISTA DE TABELAS 3.1 - DISTRIBUIÇÃO DE PRODUTOS ORGÂNICOS NOS PRINCIPAIS MERCADOS DOS PAÍSES DE ALTA RENDA ..................................................................................................... 74 3.2 - EVOLUÇÃO DA TAXA DE CRESCIMENTO DA ÁREA SOB MANEJO ORGÂNICO NOS BLOCOS COMERCIAIS - 1999/2003............................................................................ 75 3.3 - EVOLUÇÃO DA ÁREA SOB MANEJO ORGÂNICO COM PRODUÇÃO CERTIFICADA NA AMÉRICA LATINA E CARIBE - 2000/2004 ..................................................................... 76 3.4 - PRODUÇÃO ORGÂNICA NO PARANÁ - SAFRAS 2003/2004 E 2004/2005....................... 83 3.5 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA PRODUÇÃO DOS PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA E LITORAL DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004............... 85 3.6 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA PRODUÇÃO DOS PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO OESTE DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004............................................................................ 86 3.7 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA PRODUÇÃO DOS PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO SUDOESTE DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004 .................................................................... 86 3.8 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA PRODUÇÃO DOS PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO NORTE E NOROESTE DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004................................................... 87 3.9 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA PRODUÇÃO DOS PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO CENTRO-SUL DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004 ................................................................ 88 7 LISTA DE SIGLAS ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas ACEMPRE - Associação Central de Produtores Rurais Ecológicos ACOPA - Associação de Consumidores de Produtos Orgânicos do Paraná ADAO - Associação para o Desenvolvimento da Agricultura Orgânica AFRUHCO - Associação dos Fruticultores e Hortigranjeiros de Cruzeiro D'Oeste AFRUTA - Associação dos Produtores Ecológicos de Porto União AMC - Agricultura Motivada pelo Consumidor ou Community Supported Agriculture AO - Agricultura Orgânica AOPA - Associação para o Desenvolvimento da Agroecologia APAC - Associação de Pequenos Agricultores de Colombo APAVE - Associação dos Produtores Agroecológicos de Verê APEX/BRASIL - Agência de Promoção de Exportações do Brasil APMIS - Associação de Proteção à Maternidade e Infância APOL - Associação dos Produtores Orgânicos de Londrina APOMAR - Associação de Produtores Orgânicos de Marilândia do Sul APOMOP - Associação dos Produtores Orgânicos do Médio Oeste do Paraná ORGANIVIDA APONG - Associação de Produtores Orgânicos de Guaíra APOP - Associação de Produtores Orgânicos de Pato Bragado APRAECOL - Associação dos Produtores Agroecológicos de Barbosa Ferraz APROAP - Associação dos Produtores Orgânicos das Águas do Rio Paraná e Piquiri APROMEDE - Associação de Produtores Orgânicos de Medianeira APROMIS - Associação de Produtores Orgânicos de Missal APROSMI - Associação de Produtores Orgânicos de São Miguel do Iguaçu APROVIDA - Associação de Produtores Orgânicos de Pato Branco ASPTA - Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Orgânica ASSESSOAR - Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural BIOVALE - Associação Regional dos Produtores Orgânicos do Vale do Ivaí BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social CAC - Conselho de Alimentação Escolar CAE - Conselho de Alimentação Escolar CAMEX - Câmara de Comércio Exterior CAPA - Centro Paranaense de Apoio ao Pequeno Agricultor 8 CDEEP - Coordenadoria de Programas Especiais de Enfrentamento à Pobreza CEAO - Conselho Estadual de Agricultura Orgânica do Paraná CEASA - Centrais de Abastecimento do Paraná CEDRAF - Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural e Agricultura Familiar CEE - Comunidade Econômica Européia CEPORG - Comissão Estadual de Produção Orgânica CLAF - Cooperativa de Leite da Agricultura Familiar CME - Campanha de Merenda Escolar CNME - Campanha Nacional de Merenda Escolar CNPORG - Comissão Nacional da Produção Orgânica CODAPAR - Companhia de Desenvolvimento do Paraná COFAECO - Cooperativa das Famílias de Produtores Agroecológicos CONAB - Companhia Nacional de Abastecimento CONSEA-PR - Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional COOAVI - Cooperativa Agroecológica do Vale do Ivaí COOPAFI - Cooperativa de Comercialização de Agricultores Familiares de Capanema COPAVI - Cooperativa de Produção Agropecuária de Vitória COREDES - Conselhos Regionais de Desenvolvimento CPEEP - Coordenadoria de Programas Especiais de Enfrentamento à Pobreza CPRA - Centro Paranaense de Referência em Agroecologia CRESOL - Cooperativa de Crédito Rural com Interação Solidária CSAO - Câmara Setorial de Agricultura Orgânica EBAA - Encontro Brasileiro de Agricultura Alternativa ENA - Encontro Nacional de Agroecologia FAO - Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação FIEP - Federação das Indústrias do Estado do Paraná FINAME - AGRÍCOLA - Agência Especial de Financiamento Industrial FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação FNECDC - Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor FUNDEPAR - Instituto de Desenvolvimento do Paraná GAO - Grupo de Agricultura Orgânica GEAE - Grupo de Estudos de Agricultura Ecológica IAF - Instituto Agroflorestal Bernardo Hakvoort IAPAR - Instituto Agronômico do Paraná 9 IAPAR - Instituto Agronômico do Paraná IBD - Instituto Biodinâmico IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IDEC - Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor IFOAM - International Federation of Organic Agriculture Movements (Federação Internacional dos Movimentos de Agricultura Orgânica) INSTITUTO EMATER - Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural IPARDES - Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social IPD - Instituto Paraná de Desenvolvimento ISO - International Organization for Standardization (Organização Internacional para Padronização) IVV - Instituto Verde Vida de Desenvolvimento Rural MAELA - Movimento Agroecológico para América Latina e Caribe MAPA - Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento MDA - Ministério do Desenvolvimento Agrário MDIC - Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior MDS - Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome MOA - Fundação Mokiti Okada NAFTA - Acordo de Livre Comércio da América do Norte NEAD - Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural NSE - Nova Sociologia Econômica OCN - Órgãos Colegiados Nacionais ONG - Organização Não-Governamental OTA - Organic Trade Association PAA - Programa de Aquisição de Alimentos PEAE - Programa Estadual de Alimentação Escolar PFZ - Programa Fome Zero PMISA - Programa de Manejo Integrado de Solos e Águas PNAE - Programa Nacional de Alimentação Escolar POMAR - Associação de Produtores Orgânicos de Maringá PROGER - Programa de Geração de Emprego e Renda PRONAF - Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar PROSOLO - Programa de Recuperação de Solos RMC - Região Metropolitana de Curitiba SAF - Secretaria da Agricultura Familiar SEAB/PR - Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento SEBRAE - Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas SECEX - Secretaria de Comércio Exterior 10 SEMA - Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos SETI - Secretaria da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior SETP - Secretaria Estadual do Trabalho, Emprego e Promoção Social SGP - Sistema de Garantia Participativo SISCOMEX - Sistema Integrado de Comércio Exterior SMAB - Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento de Curitiba TECPAR CERT - Instituto de Tecnologia do Paraná UEL - Universidade Estadual de Londrina UFPR - Universidade Federal do Paraná UNCTAD - United Nations Conference on Trade and Development (Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento) USDA - United States Department of Agriculture 11 INTRODUÇÃO O Projeto "O mercado de Orgânicos no Paraná: caracterização e tendências", desenvolvido no âmbito do Convênio SETI/IPARDES/IAPAR-TC 06/05, iniciado em setembro de 2005 e concluído em outubro de 2006, tem como objetivo geral identificar e caracterizar o mercado dos produtos orgânicos no Estado do Paraná e os principais agentes de comercialização que atuam nesse mercado, bem como subsidiar a formulação de políticas públicas de ciência e tecnologia para o desenvolvimento do setor. Esse estudo torna-se oportuno num cenário em que são crescentes a produção, a comercialização e o consumo de produtos orgânicos não só no Estado do Paraná, mas também nos âmbitos nacional e mundial. Cada vez mais se confirma que tal expansão não reflete uma situação conjuntural, mas um quadro com características estruturais, na medida em que se intensifica a busca por mais qualidade de vida, tanto para os homens como para o meio ambiente em geral, traduzindo-se, neste caso, na produção e consumo de alimentos "limpos e saudáveis". Tal busca vem se intensificando desde os anos 70 do século passado, decorrente das críticas e inquietações de diferentes segmentos da sociedade contemporânea com relação ao tipo e ao ritmo de desenvolvimento adotado pelas sociedades capitalistas. Dentre as principais conseqüências deste desenvolvimento evidenciavam-se a degradação intensa e acelerada dos recursos naturais, as rápidas transformações técnicas e sociais nos distintos sistemas produtivos, a ocupação e aglomeração desordenada e precária nas cidades, bem como um conjunto de mazelas no meio rural. Neste último caso destacavam-se a concentração fundiária, o êxodo rural, as transformações nos sistemas de produção e de relações sociais, a massificação e a dependência produtiva de insumos industriais (maquinários, sementes, agroquímicos em geral), bem como a uniformização e homogeneização dos processos produtivos de bens alimentares. Em conseqüência, constatava-se não só a desarticulação sociocultural rural, como também a perda da diversidade cultural e dos sistemas de cultivo, além do esgotamento e até extinção da biodiversidade em diversas regiões. Em decorrência desse cenário tornou-se evidente a emergência da preocupação pela sustentabilidade ambiental e social por parte da sociedade em geral. No caso específico do rural, essa condição foi uma das principais alavancas para a ampliação de práticas agrícolas produtivas com base sustentável, a valorização do conhecimento de populações do campo – agricultores familiares, populações indígenas e tradicionais –, a busca pelo manejo produtivo em distintos ecossistemas. Nesse contexto destacam-se diferentes formas de 12 produção já conhecidas, como a agricultura biodinâmica, a orgânica, a biológica, a natural, a permacultura e a agroecologia,1 sendo que, para efeito deste estudo, será utilizada a agricultura orgânica para abarcar todas as formas consideradas de agricultura sustentável. Esse processo encontrou eco no Estado do Paraná, na mesma época em que a discussão ocorria em nível planetário. Inicialmente como um movimento que propagava a "agricultura alternativa", organizado a partir de grupos que reuniam agricultores, técnicos de organizações não-governamentais (ONGs) e de instituições governamentais, entidades de apoio e organização de agricultores, militantes em geral, consumidores urbanos, pesquisadores de universidades e de institutos de pesquisa. Era a combinação de fatores socioeconômicos, tecnológicos, ambientais e políticos o que caracterizava tal movimento, que desembocava na manifestação e contraposição ao tipo de agricultura praticada e estimulada pelo modelo tecnológico da Revolução Verde2, grande responsável por inúmeros processos de degradação ambiental e de desarticulação social, cultural, política e econômica vivenciados no meio rural. Esse movimento deixou de ser de poucos e de ser isolado ao longo das três últimas décadas, de tal forma que na atualidade o Paraná destaca-se como um dos estados com representatividade nacional no que se refere à produção de orgânicos. Embora as 1 Darolt (2000) define a diferença entre as formas de produção mencionadas. Para situar brevemente: a agricultura biodinâmica está baseada em princípios da Antroposofia, instituída por Rudolf Steiner, na Alemanha, nos anos de 1920, que entende a propriedade agrícola como um organismo, integrando produção animal e vegetal à paisagem natural, orientando-se por um calendário astrológico biodinâmico, que visa reativar as forças vitais da natureza. A agricultura orgânica nasce em meados de 1920, com o inglês Albert Howard, e se desenvolve nos Estados Unidos, a partir de 1948, com J. I. Rodale. Está baseada na melhoria da fertilidade do solo por processo biológico natural, pelo uso de matéria orgânica, sendo totalmente contrária à utilização de adubos químicos solúveis. A agricultura biológica foi desenvolvida em 1930 pelo suíço Hans Peter Muller. É praticada na França, e seu princípio é de que a saúde do solo garante um maior valor biológico e a saúde das plantas. A agricultura natural tem origem no Japão, em 1938, com as idéias de Masanobu Fukuoka, tem vínculo religioso com a Igreja Messiânica, e seu fundamento é o de que as atividades agrícolas devem respeitar as leis da natureza, sem revolvimento do solo e sem a utilização de compostos orgânicos com dejetos animais. A permacultura, desenvolvida pelo australiano Bill Mollison a partir da agricultura natural, tem como princípio alternar cultivo de gramíneas e leguminosas e manter a palha como cobertura do solo. E, por fim, a agroecologia, desenvolvida nos anos de 1980 por Miguel Altieri, nos EUA, adquire status de ciência e propõe a compreensão dos agroecossistemas segundo princípios agronômicos, ecológicos e socioeconômicos. 2 O termo Revolução Verde refere-se ao modelo tecnológico concebido e implementado nos países do norte, a partir dos anos de 1950, visando à transformação da agricultura a partir das premissas do sistema industrial. O pacote tecnológico da Revolução Verde foi concebido como de aplicação universal, visando maximizar o rendimento dos cultivos em situações ecológicas profundamente distintas. Destinou-se a elevar ao máximo a capacidade dos cultivos a partir da criação artificial de condições consideradas "ideais", utilizando os agrotóxicos para eliminar competidores e predadores naturais e os fertilizantes sintéticos para fornecer nutrientes considerados necessários. A utilização desse "pacote" no Brasil, a partir dos anos 60, levou à homogeneização das práticas produtivas, à simplificação e à artificialização do meio natural, bem como à desestruturação das relações sociais no campo. 13 estatísticas sejam frágeis e precárias, tanto em termos nacionais como estaduais, acreditase que o Estado congrega o maior número de produtores do País, a maioria pertencente à agricultura familiar, com expressiva representatividade na produção, tanto em quantidade quanto em diversidade, segundo as especificidades das regiões do Estado. Ao longo desse período, grande parte das ações esteve voltada ao processo de conversão do sistema produtivo para a agricultura orgânica, desenvolvida pelos próprios agricultores e suas entidades, apoiados principalmente por ONGs da área em atividades de assistência técnica, planejamento da produção, capacitação, assessoria e organização social. Foram poucos, e na maior parte das vezes pontuais, as ações e/ou programas desencadeados pelas instituições públicas no período, predominando nesse sentido o engajamento pessoal dos técnicos das instituições de pesquisa e extensão rural identificados com a temática. A combinação das relações entre esses agentes é que efetivamente permitiu o processo de construção da agricultura orgânica no Paraná. Se no campo da produção vários passos puderam ser dados, no que se refere ao ambiente da comercialização dos produtos orgânicos as ações e/ou atividades são pontuais e pouco conhecidas, indo desde aquelas desencadeadas pelos próprios agricultores e suas entidades de apoio, até, mais recentemente, o ingresso da iniciativa empresarial neste campo. O poder público classicamente tem se mantido à distância nesse aspecto, com intervenções ainda tímidas e incipientes. Entretanto, é importante destacar que não são poucos os processos de comercialização que marcam o atual mercado de produtos orgânicos no Paraná. Ilustrativas da própria diversificação que caracteriza o processo produtivo e seus produtores, as transações econômicas também apresentam um largo espectro de situações, evidenciando diferentes tipos de mercado. Dentre eles estão o mercado da venda direta, representado pelas relações face a face entre o agricultor e o consumidor por meio das feiras, entregas de sacolas, vendas na propriedade etc.; o mercado do varejo, onde ocorrem as transações através de equipamentos de comércio varejista, como supermercados, lojas especializadas etc.; o mercado do beneficiamento e processamento de produtos orgânicos; o mercado institucional, que inclui os programas de merenda escolar e o de aquisição de alimentos para programas de abastecimento; e, por fim, há as transações voltadas ao mercado externo, em que atuam agentes inclusos nos demais mercados mencionados acima. Este estudo identifica e caracteriza os três principais tipos de mercado de produtos orgânicos no Estado do Paraná na atualidade: o mercado da venda direta, do varejo e da transformação, sendo que os dois outros mercados – institucional e externo – são abordados de maneira mais geral, visando contextualizar a situação no País e no Estado. Para tanto, assume-se aqui que mercado é uma construção social, constituído a partir de um conjunto de relações sociais desencadeadas por diferentes agentes. Buscar-se-á identificar esses diferentes agentes envolvidos e, sempre que possível, destacar o papel que a 14 agricultura familiar desempenha nesse mercado, com o propósito de apontar futuras políticas públicas destinadas a fortalecer esses agentes. Isso decorre do reconhecimento da condição histórica e precursora desses agentes no processo da produção propriamente dita, não só no Estado do Paraná como no próprio País, buscando agora apoiá-los na esfera da comercialização, a partir dos tipos de mercado existentes. Os tipos de mercado e as transações neles contidas são o ponto de partida deste estudo. E é com esta perspectiva que se buscará identificar e caracterizar o atual mercado de produtos orgânicos no Paraná, a partir dos seguintes objetivos específicos: a) analisar as restrições e oportunidades ao desenvolvimento do mercado de produtos orgânicos no Estado, considerando as especificidades das principais regiões produtoras e consumidoras do Paraná; b) realizar um estudo prospectivo dos principais produtos orgânicos para o mercado paranaense, com apreciação sumarizada para os mercados nacional e internacional; c) identificar e caracterizar os principais agentes envolvidos na produção, comercialização e distribuição, bem como na agroindustrialização e na demanda de produtos orgânicos no Paraná; d) apontar o perfil do consumidor de produtos orgânicos no Paraná; e) identificar e caracterizar os tipos de mercado de produtos orgânicos no Paraná; f) caracterizar os principais problemas de funcionamento das entidades de apoio (públicas, privadas e da sociedade civil) ao desenvolvimento dos mercados de orgânicos no Paraná; g) apresentar os resultados do estudo em seminário e debater com interessados as proposições de ações e políticas públicas ao mercado de orgânicos do Paraná. Espera-se que tais procedimentos possam resultar na proposição de políticas públicas voltadas ao mercado de orgânicos do Paraná, destacando-se ações direcionadas à agricultura familiar, e em subsídios para a tomada de decisão por parte dos distintos agentes envolvidos nesse mercado. Também se espera estimular e fomentar estudos e projetos, de caráter científico e/ou tecnológico, em instituições de pesquisa, universidades e outras. O projeto, em sua concepção original, pretendia também levantar subsídios para a constituição de uma rede eletrônica de informações que desse suporte e apoio às ações de comercialização. Entretanto, o estudo constitui um diagnóstico com sistematização de informações dispersas, tendo, dentre seus resultados, um cadastro dos principais agentes de comercialização e de apoio que poderá contribuir para a constituição de uma rede eletrônica de informações. Os resultados do estudo que se apresentará a seguir decorrem de distintos procedimentos de pesquisa, tanto na coleta de dados primários como de dados secundários. 15 Destaque-se que este trabalho assume as características de uma pesquisa qualitativa e de caráter exploratório, decorrente da incipiência e fragilidade dos dados e informações oficiais, tanto em termos gerais como no caso do Paraná. Além da presente introdução, o trabalho está estruturado em quatro partes. Na primeira apresenta-se a abordagem teórico-metodológica que orientou a realização do estudo. Tem-se como pressuposto que o mercado é uma construção social decorrente dos agentes e de suas posições e das relações sociais estabelecidas, segundo o entendimento proposto pela Nova Sociologia Econômica (NSE). Nesta seção também estão indicados os procedimentos metodológicos adotados no decorrer da pesquisa. A segunda parte traz alguns elementos que permitem verificar como se tem dado a configuração histórica e social do mercado de orgânicos, utilizando principalmente informações da literatura contemporânea. Para tanto, abordam-se as recentes transformações no mercado agroalimentar e como se processa a inserção dos produtos orgânicos neste ambiente; em seguida, contextualiza-se o processo de institucionalização da agricultura orgânica no País e no Paraná e a relação com os diferentes tipos de mercado; também se apresenta o sistema de produção de orgânicos, procurando distinguir as tecnologias de processo e de produto que influenciam a concepção e institucionalização; por fim, trata-se da questão do consumo, considerando, de um lado, o perfil do consumidor individual e, de outro, o papel do consumo coletivo, que passa pelo mercado institucional. A terceira parte do estudo contempla informações sobre o atual mercado de orgânicos, a situação mundial, a nacional e, mais detalhadamente, sobre o Paraná. Ainda, contextualiza-se o papel da agricultura familiar e a relação desta com a agricultura orgânica. Os resultados empíricos da pesquisa de campo são apresentados na quarta parte do trabalho. Destacam-se os cinco tipos de mercado estudados: inicialmente o mercado da venda direta, em que predominam as feiras; segue-se o mercado varejista, com os supermercados e lojas; o mercado de transformação de produtos orgânicos, em que se têm as empresas, associações e cooperativas de agricultores; o mercado institucional, que inclui os programas de merenda escolar e o de aquisição de alimentos; e, por fim, alguns elementos do mercado externo. No final desta quarta parte apresenta-se um cadastro, elaborado no decorrer da pesquisa, sobre os diferentes agentes envolvidos em cada um dos mercados pesquisados. Finalmente têm-se as considerações finais, bem como algumas proposições direcionadas a ações, programas e políticas públicas a serem estimulados e desenvolvidos pelo Estado. Indicam-se também possibilidades de novas pesquisas, estudos e projetos, sejam eles de caráter científico ou tecnológico, voltados à compreensão e promoção da agricultura orgânica no Paraná. 16 1 PARA PENSAR O MERCADO DE ORGÂNICOS NO PARANÁ: ABORDAGEM TEÓRICO-METODOLÓGICA DO ESTUDO Esta primeira parte do trabalho apresenta a abordagem teórico-metodológica que orientou a realização do estudo. Parte-se do pressuposto de que o mercado é uma construção social decorrente dos agentes envolvidos e das relações sociais estabelecidas, segundo o entendimento proposto pela Nova Sociologia Econômica (NSE). Nesta parte também estão indicados os procedimentos metodológicos adotados para a realização da pesquisa de campo. 1.1 MARCO TEÓRICO: O MERCADO COMO CONSTRUÇÃO SOCIAL Os estudos e investigações relativos ao tema mercado têm sido realizados fundamentalmente a partir do suporte teórico e metodológico da ciência econômica. A Economia, em particular a teoria neoclássica, parte do princípio de que há um homo economicus como ser abstrato e genérico, o qual é dirigido sempre por um mesmo tipo de comportamento econômico, independentemente de seu lugar no tempo histórico e no espaço/lugar em que habita. Tal assertiva está baseada nos pressupostos do individualismo metodológico, em que o indivíduo (as empresas, as firmas) é o ponto de partida e de chegada da análise, cujo principal objetivo é a maximização do lucro. Para tanto, pressupõe-se que tal indivíduo atua sempre segundo a racionalidade econômica, em que suas escolhas resultam de uma combinação de fatores voltados a otimizar suas ações e, por conseqüência, seu próprio lucro. O mercado é o locus onde se processam tais escolhas maximizadoras. Resumidamente, para a economia neoclássica o mercado é entendido e definido como um mecanismo abstrato e asséptico onde ocorre a determinação dos preços das transações econômicas, definidas e realizadas livremente pelos indivíduos. A idéia é de que há um "ambiente" – o mercado – que exerce um papel de coordenação entre oferta e demanda, ou seja, entre a transferência do direito de propriedade daquele que vende para aquele que compra, segundo a noção de um tipo de comportamento universal do homo economicus, baseado na racionalidade econômica. Tal perspectiva explicativa das transações econômicas predominou como hegemônica desde o final do século XIX e várias décadas do XX. Nas últimas três décadas, a partir dos anos 1970, a crítica a tal posição tem resultado em outros marcos analíticos, tanto na própria economia (como a nova economia institucional) como em outras áreas do conhecimento, como é o caso da sociologia. É a partir desta última, e da sua vertente 17 conhecida como a Nova Sociologia Econômica, que se estará abordando a concepção teórica deste projeto, buscando apreender e estudar o mercado de produtos orgânicos no Paraná como um mercado construído por diferentes atores sociais. 1.1.1 Os Aportes da Nova Sociologia Econômica No final dos anos 70 e início dos 80, sociólogos dos Estados Unidos e da Europa recuperaram as idéias, conceitos e métodos de autores clássicos da Sociologia, particularmente de Max Weber e Karl Polanyi, para fazer a crítica à abordagem da economia neoclássica sobre a autonomia da esfera econômica no conjunto da sociedade. Tais autores destacam a centralidade da dimensão socializadora nas relações econômicas, e por conseguinte nas relações mercantis, em detrimento da perspectiva da relação individual e intimista. Com eles se restaura a compreensão dos fenômenos econômicos como sociais, e, em decorrência, o mercado deixa de ser visto como uma "entidade" à parte e abstrata, passando a ser visto como algo construído socialmente. Karl Polanyi é um dos autores mais críticos com relação à economia de mercado, considerada por ele como um sistema institucional único e peculiar que se consolidou no Ocidente no século XIX, e que resulta em uma crise que assola as primeiras décadas do século XX. Ao escrever o livro A Grande Transformação (2000), em 1947, sua motivação estava na busca por uma "orientação em termos de instituições humanas", a fim de suplantar tal período e descortinar possibilidades vindouras. Nesse sentido, dedica-se a analisar os sistemas econômicos e as sociedades, e destaca que "anteriormente a nossa época, nenhuma economia existiu, mesmo em princípio, que fosse controlada por mercados. Embora a instituição do mercado fosse bastante comum desde a Idade da Pedra, seu papel era apenas incidental na vida econômica" (POLANYI, 2000, p.62). E prossegue afirmando que as pesquisas históricas e antropológicas mais recentes, à sua época, revelam que "a economia do homem, como regra geral, está submersa em suas relações sociais" (p.65). Polanyi faz uma crítica contundente das teses formalistas da economia sobre a visão generalizante do indivíduo como maximizador de lucro, e defende que haja a superação do naturalismo histórico na apreensão do mercado, uma vez que tanto este como aquele estão submersos no todo social, do qual fazem parte. Para o autor, a idéia de um "mercado auto-regulável" é uma utopia elaborada por economistas, pois o mercado só existe como construção social e está enraizado na vida social a partir de elementos fundamentais como as regras, as normas e as paixões. A noção de "enraizamento", apreendida de Polanyi por Granovetter (2003), será um dos alicerces para os estudos do mercado na atual sociologia econômica. Em 1985, 18 Granovetter publica um artigo no American Journal of Sociology, onde menciona pela primeira vez o termo Nova Sociologia Econômica. Embora tal noção tenha sua pertinência e venha contribuindo na orientação de várias pesquisas, autores como Swedberg (2004) consideram que ainda há que se fazer um expressivo esforço na fundamentação teórica da nova sociologia econômica. Nesse sentido, tem-se recorrido com freqüência ao trabalho empreendido por Max Weber em Economia e Sociedade (1999), publicado pela primeira vez em 1921,3 após a morte do autor, particularmente quando aborda "as categorias sociológicas da ação econômica". Em Weber, o homo economicus definido nos termos da economia não existe, dado seu caráter genérico e abstrato. Para ele o que existe é o ator econômico, produto da história, o qual, embora atue a partir de uma dada racionalidade econômica, marcadamente a partir do próprio capitalismo, só pode existir porque é fruto de condições sociais e históricas. Em Weber, a racionalidade econômica não é um dado e sequer um pressuposto, uma vez que está definida pelas condições históricas e sociais, mas deve e pode ser objeto de investigação. Raud (2003), ao analisar as contribuições de Weber para a Nova Sociologia Econômica, destaca que se na teoria econômica somente se trata da ação econômica racional, em Weber o que se aborda é "a ação econômica social, ou seja, a ação econômica que leva em conta o comportamento de terceiros. Neste sentido, a ação econômica sofre a influência das expectativas relativas ao comportamento dos outros membros da sociedade" (p.11). É o mercado que representa, para Weber, o arquétipo da ação econômica social. Nele se exprime fundamentalmente a ação racional, mas não só ela. E a crítica do autor à economia está em que ela é míope ao enxergar somente a ação racional, desconsiderando completamente as demais racionalidades existentes, resultantes da cultura, do direito, da política, da religião, entre outras. É nesse sentido que Weber introduz a idéia de interesse/interesses que movem o ator social, destacando-os como produto de construção social e balizado por instituições – como o direito e a política –, responsáveis por normatizarem os aspectos éticos e morais do processo de "regateio", fenômeno específico do mercado para o autor. As formulações de Weber serão importantes dentro da nova sociologia econômica na medida em que não apenas contribuem com os aspectos já mencionados, mas também 3 Economia e Sociedade é uma obra póstuma – Weber faleceu em 1920 –, organizada por sua viúva Marianne Weber a partir de manuscritos do autor. A edição brasileira resulta da tradução da quinta edição, que tem origem na versão padrão da obra. A versão original, de 1921, foi organizada a partir de escritos de períodos distintos da produção weberiana, ordenada segundo temas. Segundo o revisor da tradução brasileira, "houve uma tradução dentro da tradução" da terminologia de 1913, quando Weber desenvolveu o quadro conceitual sobre a "Sociologia Compreensiva", publicado sob o título Economia e Sociedade, para a terminologia de 1918, quando trabalhou os "conceitos sociológicos fundamentais", que constituem o primeiro capítulo do volume 1 da obra. 19 introduzem a dimensão política à visão do mercado, por meio da noção de luta. O autor entende que há uma pluralidade de interessados no mercado que competem e que lutam por oportunidades de troca. Diz ele: "a troca é um compromisso de interesse entre os participantes pelo qual se entregam bens ou possibilidades como retribuição recíproca. Toda troca racionalmente orientada é a conclusão mediante um compromisso de uma prévia luta de interesses aberta ou latente" (RAUD, 2003). Tal dimensão política inspirou o sociólogo Pierre Bourdieu (2005) na elaboração da proposta de campo econômico, onde ocorre a ação entre dominados e dominantes, formulação relevante para a atual sociologia econômica, cuja discussão será retomada mais adiante, dada a sua importância para este trabalho.4 Outro autor que merece destaque nesta perspectiva é Neil Fligstein (2003), cuja abordagem se aproxima da de Bourdieu no que se refere à noção de campo econômico, ao propor que a emergência de mercados passa pelo entendimento das relações internas e externas às empresas e suas relações formais com o Estado. A fim de sintetizar a compreensão da NSE para o estudo de mercados, a qual balizará este estudo, vale a pena registrar a definição proposta por Swedberg: A sociologia econômica pode ser definida de modo conciso como a aplicação de idéias, conceitos e métodos sociológicos aos fenômenos econômicos – mercados, empresas, lojas, sindicatos, e assim por diante. Apoiando-se no enfoque de Max Weber, a sociologia econômica estuda tanto o setor econômico na sociedade ("fenômenos econômicos") como a maneira pela qual esses fenômenos influenciam o resto da sociedade ("fenômenos economicamente condicionados") e o modo pelo qual o restante da sociedade os influencia ("fenômenos economicamente relevantes") (SWEDBERG, 2004, p.7). 1.1.2 A Abordagem Político-Cultural da Nova Sociologia Econômica e o Mercado de Orgânicos Após quase vinte anos de revigoramento da sociologia econômica, alguns enfoques têm sido contemplados para se estudar o mercado. A teoria do enraizamento proposta por Granovetter (2003), a partir de Polanyi, precursora neste empreendimento, tem merecido críticas e já não é mais tão hegemônica como nos primeiros anos. Isso se deve 4 Como a Nova Sociologia Econômica não é ainda um campo teórico unificado, dado seu tempo de existência e pluralidade de abordagens, cabe mencionar que os estudos sobre o mercado têm sido realizados a partir dos seguintes enfoques: o estrutural, o cultural, o cognitivo e o político. Sumariamente: o enfoque estrutural define os intercâmbios econômicos como padrões de relações interpessoais concretas; o enfoque cultural analisa o papel dos significados coletivos na definição das estratégias econômicas; o enfoque cognitivo está dirigido à regularidade estrutural dos processos mentais que limitam o exercício da racionalização econômica; e, o enfoque político privilegia as lutas pelo poder entre instituições sociais e políticas, como o Estado e as classes sociais. (ver autores como Wanderley (2002), Lopes Junior (2002), Swedberg (2004)). 20 principalmente ao fato de apresentar limites para lidar com outros fatores relevantes, dentre eles "com a cultura, com as instituições, com os macrofenômenos e com a política – os quais, tomados em conjunto, constituem uma parte considerável da economia" (SWEDBERG, 2004, p. 25). Dessa forma, outros enfoques têm sido desenvolvidos dentro da NSE. Para o estudo do mercado de produtos orgânicos no Paraná utilizar-se-á principalmente a abordagem político-cultural, a partir das reflexões desenvolvidas por Pierre Bourdieu (2005), fundamentadas na noção de campo econômico. O mercado de produtos orgânicos no Paraná será pesquisado como um campo de ação construído por diferentes atores sociais, procurando verificar o papel e o lugar da agricultura familiar no seu interior. Para tanto, está-se assumindo a proposição de Bourdieu quando afirma que a idéia de campo é central para delimitar um espaço de ação, entendendo que são os agentes e suas relações que criam um espaço como produto da história coletiva, o qual se reproduz nas histórias individuais. É pressuposto para este projeto que as disposições econômicas dentro de tal campo "não têm nada de natural e de universal", sendo produto de construção social. Importa a este estudo conhecer, identificar e caracterizar no campo econômico de produtos orgânicos no Paraná o peso de cada agente que dele faz parte. Isso se torna relevante na medida em que, como afirma Bourdieu, é o peso de cada um que vai conferir uma certa estrutura ao campo – neste caso o mercado de produtos orgânicos – e a força de cada agente vai depender de seus recursos e do volume e estrutura de capital nas suas diversas formas5. Tal tarefa é importante na medida em que permite que se conheça, no interior do campo, aqueles que são os dominantes, e os agentes, que são os dominados. Condição relevante em tal abordagem, na medida em que se entende que um campo econômico é também um campo de tensão e de luta permanente, a partir das relações sociais que o constituem. A utilização da teoria do campo, proposta em Bourdieu, permite que se estude o mercado de produtos orgânicos no Paraná como uma estrutura de relação de forças, entendendo-o não como abstrato ou genérico, estático ou acabado, mas como um campo econômico dinâmico com permanente ação e embate entre agentes, que visam conservar ou transformar o campo de forças. Como afirma o autor, é fundamental que se mantenha claro que "longe de estarem em um espaço sem gravidade e sem pressões – os agentes estão diante de um espaço de possibilidades que dependem muito estritamente da posição que ocupam no campo" (BOURDIEU, 2005, p.34). 5 Quando Bourdieu está falando de capital está considerando-o a partir de suas diversas formas: capital financeiro, cultural, tecnológico, jurídico, organizacional, comercial e simbólico. Para conhecer com maior detalhe o que o autor entende por cada uma dessas formas, ver Bourdieu, 2005, p.25. 21 Interessa conhecer quais recursos e estratégias estão mobilizados no presente e quais já foram mobilizados na construção de tal mercado localizado (neste caso no Paraná), quais possibilitaram e têm possibilitado a introdução de mudanças. Para tanto, lança-se o olhar não só para dentro do mercado construído no Paraná, mas também para os elementos que o articulam a macrofenômenos econômicos, políticos e sociais. Para tanto, assume-se que grande parte das transformações que ocorrem em um campo econômico "são freqüentemente ligadas a mudanças nas relações de troca com o exterior do campo", o que Bourdieu denomina transformações a partir de redefinições das fronteiras (grifo do autor). Ou seja, o campo econômico relaciona-se com suas fronteiras e, muitas vezes, as trocas com elas são muito mais relevantes em processos de mudança do que as que ocorrem internamente ao campo econômico. Dentre as transformações (ou até mesmo revoluções, nas palavras de Bourdieu), o autor destaca como muito importantes aquelas que decorrem das trocas estabelecidas com o Estado6, mas também considera como mobilizadoras as que se originam das "transformações das fontes de abastecimento [...] (das) mudanças determinadas por mudanças na demografia [...] ou (das) mudanças nos estilos de vida"7. Bourdieu assinala que muitas vezes é a partir dessas trocas com as fronteiras que os agentes que são dominados dentro de um campo assumem a posição de "desafiadores", construindo "redutos" e/ou mercados especializados, os quais podem ser a entrada para o seu próprio desenvolvimento. Parece muito oportuna a abordagem acima para a reflexão sobre o mercado de orgânicos. A partir dela se pode trabalhar com a hipótese de que as mudanças nos estilos de vida das últimas décadas do século passado propiciaram que se gerassem determinadas 6 Vale a pena transcrever a citação a seguir, a qual elucida significativamente a relevância da relação com o Estado: "A competição entre as empresas assume freqüentemente a forma de uma competição para o poder sobre o poder do Estado – notadamente sobre o poder de regulamentação e sobre os direitos de propriedade – e para as vantagens asseguradas pelas diferentes intervenções do estado, tarifas preferenciais, patentes, regulamentos, créditos para pesquisa-desenvolvimento, compras públicas de equipamento, ajudas para criação de emprego, inovação, modernização, exportação, habitação etc. Em suas tentativas para modificar a seu favor as 'regras do jogo' em vigor e valorizar assim algumas de suas propriedades suscetíveis de funcionar como capital no novo estado do campo, as empresas dominadas podem utilizar seu capital social para exercer pressões sobre o Estado e obter dele uma modificação do jogo a seu favor. Assim, o que se chama de mercado é apenas, em última instância, uma construção social, uma estrutura de relações específicas, para a qual os diferentes agentes engajados no campo contribuem em diversos graus, através de modificações que eles conseguem lhe impor, usando poderes detidos pelo Estado, que são capazes de controlar e orientar". (BOURDIEU, 2005, p.40). 7 No primeiro caso o autor cita como exemplo as grandes descobertas petrolíferas do começo do século XX; com relação à demografia, exemplifica com a queda da natalidade ou o aumento da expectativa de vida; e no que tange aos estilos de vida, destaca o crescimento do trabalho das mulheres, ocasionando a queda de produtos e criando outros, como, por exemplo, os dos produtos congelados e dos fornos de microondas etc. (BOURDIEU, 2005, p.41). 22 condições que levaram a um processo de construção social desse mercado. Nesse sentido o ponto nevrálgico foi a crise ambiental e, em decorrência, os questionamentos sobre o tipo de desenvolvimento nas sociedades capitalistas contemporâneas. A constatação da degradação, da poluição e da finitude dos recursos naturais – água, solo, fauna e flora – expôs os aspectos negativos dos sistemas produtivos mantenedores dos mercados de produtos agroalimentares. Em contrapartida há uma mobilização de contracultura que, entre outras tantas coisas, aposta na produção e no consumo de alimentos "limpos e saudáveis" como uma das possíveis estratégias para a conservação não só ambiental, mas também de qualidade de vida para os homens em geral. Enfim, conhecer o mercado de produtos orgânicos no Paraná coloca-se como um desafio e também como um aprendizado, segundo a perspectiva ora adotada e apresentada sumariamente. Trata-se de um percurso que vale a pena iniciar, pois traz o vigor de desfazer a idéia de autonomia e de auto-regulação do mercado em relação à vida social, apontando-o como palco de ação e construção, onde agentes sociais, instituições e políticas públicas têm parte e responsabilidade. 1.2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DO ESTUDO DO MERCADO DE ORGÂNICOS NO PARANÁ Este estudo sobre o mercado de produtos orgânicos no Paraná caracteriza-se como uma pesquisa qualitativa e de caráter exploratório. Tal caráter advém da incipiência e fragilidade de dados e informações básicas, seja dos processos de comercialização seja dos agentes no campo econômico, tanto na situação específica do Paraná como em termos mais gerais. De outro lado, a abordagem qualitativa permitiu a necessária abertura metodológica na realização deste estudo, cujos procedimentos e instrumentos eram construídos à medida que se obtinham dados e informações e que se deparava com as limitações para obtê-los, tendo sempre presente que o interesse está em conhecer os processos que apontem para a construção social do mercado, ou seja, sobre quem são os agentes e como se desenvolvem as transações econômicas entre os mesmos. A seguir apresentam-se os principais procedimentos que dão origem a este estudo. 1.2.1 Coleta Documental O procedimento de coleta documental permaneceu constante no transcurso do projeto, visando identificar elementos na literatura que contribuam na compreensão da estrutura, do funcionamento e das transformações do mercado de produtos orgânicos, considerando-o como um campo econômico, segundo a abordagem teórica adotada. A busca na literatura focou a produção no País e no Paraná, dirigiu-se à temática geral dos orgânicos, e particularmente àquela que abordasse as questões de mercado e 23 comercialização dos produtos. Em geral o que se verifica é que o estudo da temática é ainda recente, a maioria da última década, mais precisamente dos últimos cinco anos, fruto sobretudo de trabalhos acadêmicos, resultante de estudos específicos e localizados, apresentados em artigos esparsos em revistas científicas ou de divulgação institucional. Percebe-se que os estudos estão mais direcionados à pesquisa sobre a produção propriamente dita, o que não implica a utilização da perspectiva de sistema de produção. Muitos trabalhos estudam culturas ou grupos de culturas específicas, ora salientando a dimensão agronômica, a ambiental, a econômica, a sócio-organizacional, a político-institucional, entre outras, sem, contudo, uma efetiva interligação entre tais dimensões. Também se verifica a existência de trabalhos relativos a certificação, ao perfil de consumidores urbanos de produtos orgânicos, a programas institucionais, em particular sobre a merenda escolar. Os estudos que tratam do tema "mercado" em geral o fazem sob distintas perspectivas. De um lado há os trabalhos genéricos, que mencionam estatísticas nem sempre comprovadas sobre número de produtores, diversidade e quantidade produzida, volume comercializado, canais de comercialização e valores nas transações, desde o nível local ao mercado externo. De outro, há os que descrevem situações particularizadas ou localizadas, comparando custos e desempenho dos produtos orgânicos com similares da produção convencional, a maioria abordando os produtos in natura (principalmente as hortaliças), ou detalhando aspectos de algum canal de comercialização, normalmente as feiras e/ou supermercados. Embora se constatem as limitações na literatura e nas fontes de dados oficiais, foi possível estabelecer, ainda que preliminarmente, os tipos de mercado onde ocorrem as transações econômicas de comercialização de produtos orgânicos, os quais se buscará analisar neste estudo. São eles: o mercado das relações face a face, onde ocorrem as transações econômicas diretas entre produtor e consumidor; o mercado varejista, em que predominam os supermercados; o mercado de beneficiamento e transformação; o mercado institucional, decorrente de programas de governo; e, ainda, o mercado externo. 1.2.2 Preparação da Pesquisa de Campo A partir da literatura e em face da fragilidade da base de dados e informações oficiais, verificou-se a necessidade de buscar outros dados que contribuíssem para a definição dos procedimentos a serem adotados para a realização da pesquisa de campo. Dentre eles, foi fundamental identificar as regiões a serem pesquisadas, os tipos de mercado predominantes ou existentes, bem como os agentes envolvidos na comercialização. Os itens a seguir mostram os passos que orientaram a construção do cenário voltado à pesquisa. 24 Definição das regiões a serem pesquisadas Inicialmente recorreu-se aos dados disponibilizados pelo Instituto EMATER, órgão que, em princípio, reúne e divulga as informações pertinentes à produção e comercialização de produtos orgânicos no Estado. Constatou-se que os dados disponíveis referiam-se à produção, indicando genericamente, nas regiões, os principais produtos produzidos, bem como o número de agricultores envolvidos. Percebeu-se que havia uma incongruência com relação ao número total de agricultores por região e para o Estado, uma vez que um mesmo produtor estava contabilizado segundo cada um dos produtos produzidos, o que resultava em uma sobrecontagem no número de agricultores e, em decorrência, no total apresentado. Diante dessa situação buscou-se obter uma melhor identificação da realidade estadual, por meio de um mapeamento sumário da produção e dos produtores de orgânicos no Estado, considerando os produtos e os canais de comercialização, segundo regiões do Paraná. Para tanto foram elaboradas questões com a finalidade de levantar dados específicos sobre orgânicos, as quais passaram a compor o questionário aplicado anualmente pela coordenação estadual junto aos técnicos das 19 regionais da EMATER. Esse questionário tem o propósito de coletar informações sobre as atividades desenvolvidas, tanto no que tange à extensão rural como ao acompanhamento dos resultados da agricultura orgânica. As questões referentes aos dados sobre orgânicos foram discutidas e preparadas em parceria entre a equipe deste projeto e os técnicos da coordenação estadual do Instituto EMATER e da Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento (SEAB/PR), e visam levantar dados sobre: produção; beneficiamento e transformação; número de agricultores; identificação dos canais, das estratégias, das potencialidades e limites atuais de comercialização. Os questionários foram encaminhados pelo escritório central do Instituto EMATER para todas as regionais e escritórios no início de novembro de 2005, retornando preenchidos no final de dezembro do mesmo ano. Entretanto, a tabulação dos dados sobre os itens referentes aos orgânicos só foi possível no final de fevereiro de 2006. Os dados coletados nos questionários frustraram as expectativas, uma vez que muitas questões não foram respondidas, e outras só o foram parcialmente. De qualquer maneira, processaram-se os dados disponíveis, os quais, acrescidos de informações de outras fontes, possibilitaram a elaboração de uma matriz que serviu de referência para a organização da pesquisa de campo. A matriz teve como ponto de partida a regionalização das informações segundo as dez mesorregiões do Paraná, definidas pelo IBGE (1989), procurando compatibilizá-la com a regionalização dos 19 Escritórios Regionais do Instituto EMATER. Para a elaboração da matriz, foram consideradas as seguintes variáveis: a) produto orgânico predominante; b) participação 25 do produto no total da produção orgânica do Estado; c) área média em hectare do produto orgânico; d) número de produtores orgânicos por produto; e) canais de comercialização por produto orgânico; f) entidades, instituições e organizações com interface na produção e comercialização de orgânicos; g) principal município produtor do produto orgânico; h) tipificação do agente de mercado orgânico (quadro A.1.1 do Apêndice 1). No decorrer da elaboração da matriz verificou-se a insuficiência de dados relativos às variáveis e à respectiva regionalização. Por esta razão julgou-se pertinente agregar tais dados não mais por mesorregiões, mas, sim, adotar a noção de grandes regiões, a fim de tornar factível a operacionalização da pesquisa. As grandes regiões são as seguintes: 1. Metropolitana e Litoral - congregam a Mesorregião Geográfica Metropolitana de Curitiba, abrangendo os Escritórios Regionais do Instituto EMATER de Curitiba e Paranaguá; 2. Oeste - congrega a Mesorregião Geográfica Oeste, estando aí contidos os Escritórios Regionais do Instituto EMATER de Cascavel e Toledo; 3. Sudoeste - congrega a Mesorregião Geográfica Sudoeste, estando aí contidos os Escritórios Regionais de Francisco Beltrão e Pato Branco; 4. Norte e Noroeste - congregam as Mesorregiões Geográficas Norte Central, Norte Pioneiro, Noroeste e Centro-Ocidental, e nela estão contidos os Escritórios Regionais do Instituto EMATER de Londrina, Maringá, Ivaiporã, Apucarana, Campo Mourão, Cornélio Procópio, Jacarezinho, Paranavaí e Umuarama; 5. Centro-Sul - congrega as Mesorregiões Geográficas Centro-Oriental, CentroSul e Sudeste, e nela estão contidos os Escritórios Regionais de Ponta Grossa, Guarapuava, União da Vitória e Irati. O quadro 1.1, a seguir, apresenta as cinco grandes regiões pesquisadas, destacando-se os principais municípios, grupos de produtos e agentes de comercialização de orgânicos em cada uma das regiões. 26 QUADRO 1.1 - MATRIZ DAS GRANDES REGIÕES PESQUISADAS, SEGUNDO OS PRINCIPAIS MUNICÍPIOS, GRUPOS DE PRODUTOS E AGENTES DE COMERCIALIZAÇÃO - PARANÁ - 2006 GRANDES PRINCIPAIS MUNICÍPIOS PRINCIPAIS GRUPOS DE PRINCIPAIS AGENTES DE REGIÕES PRODUTORES DE ORGÂNICOS PRODUTOS ORGÂNICOS COMERCIALIZAÇÃO Metropolitana e Mandirituba, São José dos Hortaliças, plantas medicinais e Associações de produtores, Litoral Pinhais, Balsa Nova, Colombo, frutas varejistas, empresas Antonina, Morretes, Campo Largo processadoras e distribuidoras e Campina Grande do Sul Oeste Marechal Cândido Rondon, Leite, milho, suínos, hortaliças e Entidades de apoio e Cascavel e Jesuítas café assessoria, e associações de Francisco Beltrão e Pato Branco Soja, aves, leite e hortaliças Entidades de apoio e produtores Sudoeste assessoria, varejistas, associações de produtores e empresas Norte e Noroeste Londrina, Maringá, Paranacity, Café, açúcar mascavo, melado, Processadoras, assentamentos, Loanda, Cruzeiro do Oeste, mandioca, frutíferas, soja e atacadistas, feiras, associações Campo Mourão e Ivaiporã hortaliças de produtores, entidades de Guarapuava, União da Vitória, Feijão, plantas medicinais, Prefeituras, ONGs, empresas São Mateus do Sul, Irati, Lapa, mate, mel e hortaliças distribuidora e processadora, e apoio e assessoria Centro-Sul Turvo, Ponta Grossa e Palmeira associações de produtores FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR Elaboração de formulários e calendário da pesquisa de campo Considerando os tipos de mercado, foram definidos os agentes envolvidos na comercialização, alvo, portanto, da presente investigação. São eles: a) associação ou cooperativa de agricultores orgânicos; b) empresas de beneficiamento e transformação; c) varejistas; e d) instituições de apoio e extensão: EMATER, ATERs, ONGs e prefeituras. Em seguida elaborou-se um formulário para a pesquisa, com perguntas abertas, orientando as principais questões a serem investigadas. Mesmo considerando a especificidade de cada agente, buscou-se manter uma base comum, havendo variações segundo a característica do agente. Os formulários estão estruturados em quatro seções: 1) identificação do agente; 2) informações específicas do agente no que se refere à forma de atuação e aspectos relativos à certificação; 3) informações relativas à comercialização: produto, número de produtores, canais utilizados, origem e destino, formato da venda, restrições e oportunidades, perspectivas, sugestões; 4) informações gerais sobre o sistema de produção (Apêndice 2). Em março de 2006 foi realizado um pré-teste do instrumento, aplicado junto aos diferentes agentes de comercialização, o qual foi ajustado em seguida. A partir daí organizou-se um roteiro e calendário para a realização da pesquisa de campo. 27 1.2.3 Realização da Pesquisa de Campo A pesquisa de campo ocorreu entre os meses de março a junho de 2006. Foram realizadas 142 entrevistas em 60 municípios, sendo 32 com associações e/ou cooperativas de agricultores, 22 com empresas de beneficiamento e processamento, 33 com varejistas (lojas e supermercados), 5 feiras, 12 organizações de apoio não-governamentais e 38 instituições de governo (quadro 1.2). QUADRO 1.2 - PESQUISA DE CAMPO DE ORGÂNICOS, SEGUNDO AS GRANDES REGIÕES E OS AGENTES ENTREVISTADOS - PARANÁ - 2006 GRANDES REGIÕES AGENTES Centro-Sul Agentes de Apoio RMC e Litoral Norte e Sudoeste Noroeste Oeste TOTAL 12 13 25 12 20 82 Governo 4 8 13 3 10 38 ONGs 4 2 2 2 2 12 Associações e Cooperativas 4 3 10 7 8 32 Agentes de Comercialização 6 25 15 5 9 60 Supermercados 1 11 6 1 5 24 Lojas - 3 4 1 1 9 Feiras 2 1 2 - - 5 3 10 3 3 3 22 Total 18 38 40 17 29 142 N.º de Municípios 10 10 17 5 18 60 Empresas de processamento e beneficiamento FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR O quadro A.3.1 (Apêndice 3) apresenta a pesquisa realizada nas grandes regiões e respectivos municípios, com a identificação dos agentes entrevistados, tanto os de apoio como aqueles diretamente envolvidos na comercialização. O mapa 1, a seguir, mostra as grandes regiões definidas para este estudo, bem como localiza os municípios visitados durante a realização da pesquisa de campo. $% ! &# # # $ &# ' ' & &# ) & , . *+# *+ ! /# " * 0 1 &2 !/ " ! $# &/# - , , ' &2 3 . $ 0 , .2 $' & $ &/ / # $ + $ # 2. 0 % " " / 5 3" & /' 4+ + /' " $ 2. 6 $ & $% ' & & + 0 $ * $/# " , " & /# ' & # $" # /' " *(. # ' 2 * ' /' ,# . $ " $ & " 7 + " ! # $% &" ' 8 " ' $ " & , $ & . -# &.. / 9 0#/ 3 &/ & 7 0 & / 0 4+ / & ' % &2 :/ ' 4. / 2 6 " 0 ' - / 0 ; ' < 02 " , # ,= ' &2 $ % / 0 1 . ' 02 / ' ' ,= $ &( 0/ " &2 ,2 2 ! ' $ , ! & ' $ &/" 7 $ 1 , *) $ * 0 6 * *" = 0 0/ ' , - . 4+ # $ &# 0 " > " $. " $' / !2 " " /( # $ " / &./ / 3/' . - $ &6 & &6 $/ / ! 3 ) $.) 0 ' &( & 6 4 &/ $ 1 ' $ & 0) # &/" & $2 0 1 ! & ' 7 ' > 0 # + 8 " 2 1 &2 & + 0 7. 6 *= & ' 0( / *+ * * / 6 *7+/ & ! & * & $ & / = & $2 ! & 4' $ $ & ! * 6 ! + - 0 ' 1 0 . + - !( 1 $ 0 +( &/ &' 7 # 2. !% 7 , & $2 0 0 . + + # $# ' ,2 + 0 + 0 &2 + ' . 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Contudo, cabe salientar que, ao se tomar contato com a realidade de comercialização de orgânicos em cada região, naquelas situações em que se identificaram novos agentes ou outros informantes relevantes, também se buscou entrevistá-los. Com relação às empresas de beneficiamento e transformação, a partir de um primeiro contato direto, via telefone, houve a indicação e o agendamento da entrevista, normalmente realizada com o responsável pela área de comercialização. No caso do comércio varejista, principalmente o supermercado, ao se chegar em cada região procedeuse à visitação daqueles considerados mais relevantes a fim de confirmar a existência de produtos orgânicos em comercialização. A partir daí, mas também contando com a indicação dos informantes chaves, agendava-se uma entrevista, a qual, na maioria dos casos, ocorria com o responsável pelo setor de FLV – frutas, legumes e verduras. Aqui cabe uma reflexão e avaliação do instrumento de pesquisa elaborado. Embora este tenha sido previamente testado, a diversidade de situações encontradas em campo e a pouca precisão dos dados disponíveis, dada a dinâmica constante no que tange à produção, produtores e comercialização dos produtos, mostraram que o instrumento utilizado serviu basicamente como um roteiro de questões. Tal situação ficou mais evidente a partir do momento em que se passou a tabular os dados coletados, verificando-se que em grande parte das situações o que se obteve na pesquisa foram relatos gerais, permitindo uma idéia geral dos processos de comercialização. A fim de organizar os resultados das entrevistas, estruturou-se uma ficha-síntese de cada uma delas, na qual estavam contidas as informações resultantes do trabalho de campo. Com relação à comercialização de produtos orgânicos do Paraná com o mercado internacional, embora na pesquisa de campo se tenha levantado informações relativas a tais transações com os diferentes agentes pesquisados, este tópico recebeu um tratamento à parte, fazendo-se uma investigação direcionada para dois dos produtos, considerados os mais relevantes nas estatísticas oficiais, o soja e o café. Para tanto, foram realizadas entrevistas abertas, a partir de um roteiro de questões, com os agentes que transacionam esses produtos. Também fez parte da estratégia de levantamento de dados e informações de campo entrevistas informais com alguns informantes chaves afins ao tema da comercialização, como a APEX no Paraná (Agência de Promoção de Exportações), a informantes ligados ao mercado institucional, como os responsáveis pelo programa da 30 merenda orgânica no Estado, e ao Programa de Aquisição de Alimentos, tanto no nível federal como estadual. Foram informalmente entrevistados, ainda, técnicos de instituições governamentais, como a SEAB (Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado do Paraná), do Instituto EMATER (Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural), IAPAR (Instituto Agronômico do Paraná), TECPAR (Instituto de Tecnologia do Paraná), bem como do SEBRAE (Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas). Complementarmente, participou-se como observador em alguns eventos relativos ao tema dos orgânicos, visando perceber o estado da arte no que se refere às questões de mercado e comercialização de produtos orgânicos. Dentre eles destaca-se o "III Congresso Brasileiro de Agroecologia", realizado em Florianópolis-SC, em outubro de 2005; o "Seminário sobre Comercialização de Produtos Orgânicos do Vale do Ivaí", em Ivaiporã-PR, em outubro de 2005; o "1º Paraná Orgânico", encontro realizado no início de dezembro de 2005, no Centro Paranaense de Referência em Agroecologia (CPRA), situado na Região Metropolitana de Curitiba-PR; e a "Oficina de Documentação do PAA - Região Sul", em Quatro Barras/Curitiba-PR, no Centro de Referência em Agroecologia, de 26 a 28 de abril de 2006. O evento foi organizado pela Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), órgão do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, em parceria com o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). 31 2 O MERCADO DE ORGÂNICOS: CONFIGURAÇÃO HISTÓRICO-SOCIAL Visando compreender o mercado de orgânicos como um campo econômico, segundo os pressupostos teóricos orientadores do estudo, apresenta-se sucintamente, nesta segunda parte, o cenário atual com alguns elementos que permitem sua configuração histórico-social, segundo reflexões da literatura contemporânea. Para tanto, apresenta-se, no primeiro item, a constituição do mercado de orgânicos a partir da discussão das recentes transformações no mercado agroalimentar, abordando-se, em seguida, a institucionalização da agricultura orgânica e a relação com os diferentes tipos de mercado, neste caso considerando desde o panorama mundial até a situação atual no Paraná. O terceiro item discute o sistema de produção da agricultura orgânica, enfatizando os fatores tecnológicos e suas diferenças quando se adotam tecnologias de produto e/ou tecnologias de processo, bem como a relação das mesmas com os tipos de mercado. Por fim, discute-se o papel do consumo na constituição histórica e social do mercado de orgânico, caracterizando inicialmente o consumidor individual, voltado a demandar o produto orgânico em si, abordando-se em seguida o consumo coletivo de orgânicos através do mercado institucional. 2.1 AS RECENTES TRANSFORMAÇÕES NO MERCADO AGROALIMENTAR E OS PRODUTOS ORGÂNICOS O mercado de produtos orgânicos é um campo econômico em construção. Para apreendê-lo é importante situar o contexto em que ele se insere, ou seja, identificar os principais elementos que fundamentam a "história social de sua emergência", como destaca Bourdieu (1989). Para tanto, apresentam-se alguns elementos, ou pelo menos aqueles considerados mais importantes para este estudo. Parte-se do princípio de que a emergência do mercado de orgânicos se dá no interior de um campo mais amplo e hegemônico, qual seja, o do mercado de produtos agroalimentares. Nesse sentido, busca-se percorrer sumariamente as principais transformações nas últimas décadas que retratam a atualidade do mercado agroalimentar, destacando as condicionantes macrossocietárias, e, diante delas, a possibilidade de ver emergir o mercado de produtos orgânicos como um campo desafiante, para utilizar a expressão de Bourdieu (2005). 32 2.1.1 As Mudanças na Sociedade Contemporânea e a Emergência da Agricultura Orgânica Um dos aspectos relevantes para refletir sobre o processo de construção do mercado de orgânicos situa-se no curso das recentes transformações que marcaram o campo econômico do mercado de produto agroalimentar. Para a apreensão de tal processo será feita aqui uma breve reflexão sobre as principais mudanças ocorridas, evidenciando a relação que se estreita entre a indústria, a agricultura e o comércio varejista. De um modo geral os estudiosos que analisam as transformações no mercado agroalimentar destacam o caráter mundializado que o mesmo adquiriu no decorrer da última metade do século XX nas sociedades de mercado, particularmente nas ocidentais. As mudanças não ocorreram linearmente nos continentes e países. Os tempos históricos, além de distintos, são marcados por diferentes condicionantes socioeconômicos e políticos. Enquanto nos países do hemisfério norte as mudanças foram se delineando no decorrer da primeira metade do século XX, nos países do sul, e no Brasil em particular, as características de mundialização ocorreram rapidamente a partir da segunda metade do mesmo século. As mudanças que caracterizam o mercado agroalimentar, no caso brasileiro, refletem as mudanças estruturais no conjunto da sociedade. No meio rural os reflexos se fazem sentir na transformação dos sistemas de produção, seja na base tecnológica seja nas relações sociais de produção, na estrutura agrária, nos processos de industrialização da agricultura, bem como nos processos de distribuição e comercialização dos produtos agrícolas. Acirra-se no período o embate que permanece atual e que tem origens históricas, expresso no confronto histórico sobre o destino da produção agrícola nacional: de um lado, produzir para exportar, a fim de garantir divisas para a balança comercial, e, de outro, produzir para o abastecimento interno, a fim de garantir alimento para a população, principalmente a urbana. Como as mudanças são de natureza societária, além dos reflexos no meio rural o que se verifica é uma nova configuração no padrão urbano-industrial, que contribui na formatação de novas estruturas no mercado de produto agroalimentar. Se até então o capital agrário havia tido importância fundamental, rapidamente o predomínio se dá a partir das relações entre o capital industrial e o comercial, à luz do que já ocorria nos países hegemônicos, que se articulam para suprir as demandas originadas pela concentração urbana. O adensamento da população no meio urbano implica mudanças no padrão alimentar, e os resultados imediatos e mais visíveis se verificam, de um lado, no fortalecimento e intensificação da industrialização dos alimentos e, de outro, no crescimento e predomínio comercial do setor varejista, o qual se desvincula cada vez mais do setor atacadista. Até a década de 1970, o que caracterizava o mercado agroalimentar era a produção de alimentos em escala. Esta produção decorria da rápida absorção do modelo 33 tecnológico da revolução verde, consolidado e conhecido como "Padrão Técnico Moderno", em que passou a predominar o estreitamento nas relações entre agricultura e indústria, fosse pelo uso e consumo intensivo de insumos e maquinaria, por perseguir altos rendimentos e pela ênfase na quantidade de produção. O alimento deixa de ter um significado sociocultural e rapidamente passa a compor o arranjo de produtos agroindustriais, imerso em cadeias de produção globais. Perde a característica de bem de consumo final e adquire principalmente a condição de matéria-prima para a indústria de alimentos processados. Tal condição irá garantir o que Friedman (1993) aponta como os dois princípios da agricultura industrial: durabilidade, o que permite ao alimento permanecer "bom para o consumo" por longo tempo; e distância, o que lhe permite chegar a lugares distantes do ambiente da produção da matéria-prima. Os estudos que abordam os sistemas agroalimentares nesse período se dedicam mais fortemente a analisar os aspectos referentes à produção propriamente dita. De um modo geral as análises relativas à distribuição e à comercialização, bem como às relações ali implicadas, são secundarizadas. Aqueles que tratam do tema destacam principalmente os serviços de distribuição, mostrando que neles predominava até então o setor atacadista, que era exigente em capital fixo e estrutura administrativa e funcional, concentrada e extensa. A consolidação da agricultura industrializada corresponde ao crescimento que se verifica no setor do varejo. Este se rearranja a partir da relação com a indústria e, em decorrência, consolida-se uma rápida organização e fortalecimento em grandes estruturas varejistas, baseadas sobretudo em redes de super e hipermercados. No decorrer dos anos 70 essa condição imprime uma nova estruturação no mercado agroalimentar, tanto em nível mundial como no Brasil. A literatura pertinente aponta vários elementos que contribuíram para que houvesse tal processo, dentre os quais se destacam: a consolidação da articulação entre a indústria e a agricultura, com a transformação nos sistemas de produção; a saturação do padrão de consumo alimentar, impulsionado principalmente pela população dos países centrais, que, ao ampliarem o poder aquisitivo, passam a incorporar novos hábitos de consumo; a fragilização do papel de intervenção direta do Estado; a crise do modelo fordista de produção, que se espalha por todos os setores, exigindo maior flexibilização e diversificação tecnológica. Os agentes que assumiram papel relevante nesse cenário foram aquelas empresas que permanecem dominando até hoje o campo econômico do mercado de produto agroalimentar, lideradas pela indústria de alimentos, que passam a atuar como holdings transnacionais. Não menos relevante nesse cenário é o papel normativo e regulatório que o Estado assume, criando condições favoráveis ao ambiente institucional, por meio da legislação, favorecendo a atuação do setor varejista. 34 As transformações no processo de comercialização dos alimentos, através das redes varejistas e da industrialização, são concomitantes àquelas ocorridas nos sistemas de produção agrícola e nas relações sociais de produção. Nesse sentido, o Estado também desempenhou um papel efetivo no que se convencionou denominar modernização conservadora da agricultura8 ou expansão do capitalismo no campo, atuando principalmente por meio das empresas de pesquisa e de extensão rural, na promoção do projeto modernizador baseado na transferência de tecnologias, com alto consumo de insumos e especialização da produção. No que se refere às relações sociais de produção, a modernização conservadora da agricultura resultou num forte impacto no campo, sendo que um dos mais expressivos deveu-se à implantação de relações de trabalho assalariado na agricultura, nas grandes e médias propriedades. Tal condição desarticulou formas anteriormente existentes, como o colonato e a parceria, em que os trabalhadores, embora não fossem proprietários da terra, mantinham condições de produzir alimentos para o consumo e, ainda, transacionar excedentes em mercados locais. Esta reconfiguração implicou o surgimento de uma nova categoria, a dos trabalhadores rurais conhecidos como bóias-frias, e, sobretudo, resultou no êxodo rural que marcou profundamente a sociedade brasileira e particularmente a paranaense. No Paraná, nas décadas de 70 e 80 do século passado, cerca de 1,1 milhão de pessoas tiveram que sair do meio rural, estimando-se que, em conseqüência, desapareceram 100 mil estabelecimentos com menos de 20 hectares. Paradoxalmente, ao mesmo tempo em que se consolidava o desenvolvimento do capitalismo agrário no Brasil, como já ocorrido e em curso em outras partes dos países capitalistas, verificava-se que o peso das unidades produtivas baseadas no trabalho assalariado e no uso intensivo de capital era relativo. Estudos realizados no final dos anos 80 e início dos 909 passaram a mostrar que em praticamente todos os países do capitalismo central a base social de desenvolvimento agrícola esteve assentada na unidade familiar de 8 Guilherme Delgado (2001) destaca que "a chamada ‘modernização conservadora' da agricultura nasceu com a derrota do movimento pela Reforma Agrária [...] foi também uma maneira de responder aos intensos desafios da industrialização e urbanização, combinados com uma necessária diversificação e elevação das exportações primárias e agroindustriais do Brasil [...] significou a efetiva integração técnica da indústria com a agricultura que ocorreu no Brasil nas décadas de 60 e 70, estando apoiada na articulação do Sistema Nacional de Crédito Rural, a partir de 1965, e no fortalecimento das estruturas fomentadoras da produtividade e funcionalidade do crescimento capitalista no setor [...] perseguiu-se na política agrícola a concepção de planejamento induzido dos mercados de produtos rurais [...] estimulou-se a adoção de pacotes tecnológicos da 'Revolução Verde', então considerados sinônimos de modernidade, e incentivou-se um enorme aprofundamento das relações de crédito na agricultura mediando a adoção desses pacotes com volumosas subvenções financeiras". 9 Veiga (1991); Lamarche (1993); Abramovay (1992), para citar alguns. 35 produção, ou seja, na agricultura familiar, conceito que passou a vigorar no decorrer da década de 90.10 Destacar a agricultura familiar no contexto deste trabalho é importante dadas as três principais funções que definem sua lógica de atuação diante da unidade produtiva, qual seja, a inter-relação entre produção, consumo e acumulação do patrimônio. São essas condições, segundo Lamarche (1993), que permitem a produção/reprodução em cada geração, visando assegurar um nível de vida estável para o conjunto da família e a reprodução dos meios de produção. Assim, diferentemente da agricultura industrial/empresarial, a família é o centro da exploração familiar, seja no que tange à decisão sobre a gestão financeira dos recursos como do trabalho total disponível. O significado da remuneração não se direciona pelo "lucro puro", como em uma empresa, mas está relacionado ao projeto familiar que atribui significado à remuneração do seu capital, da terra e dos meios de produção, o qual vai lhe permitir viver e dar continuidade à família (CARMO, 1998). Outro aspecto que distingue a agricultura familiar da empresarial é o fato de ela não poder ser entendida como homogênea, uma vez que comporta diferentes graus de relações produtivas que se expressam nas transações econômicas mais ou menos intensas com os distintos tipos de mercado. Tal condição chama a atenção não só para a diversidade neste segmento específico, mas também para a observância da diferenciação social existente na agricultura, e, conseqüentemente, nas relações com os distintos mercados. A título de ilustração, cabe destacar a importância da agricultura familiar no ambiente da modernização conservadora da agricultura brasileira. O estudo realizado por Kageyama e Bergamasco (1989/1990) mostrou que, em 1980, dos 5,1 milhões de estabelecimentos rurais existentes no País, 70% utilizavam o trabalho da família total ou parcialmente, quando comparados aos estabelecimentos que empregavam mão-de-obra assalariada. No que se refere à produção, os dados censitários de 1985 mostraram que grande parte dos alimentos produzidos para o consumo da população brasileira vinha da produção da agricultura familiar, por exemplo, 64% do feijão e 86% da mandioca. Cabe destacar que grande parte dessa produção é realizada por agricultores que não se incorporaram à modernização conservadora, obtendo sua produção com baixo nível tecnológico, empregando sementes próprias ou associadas a práticas agronômicas tidas como inadequadas (CARMO, 1994). 10 Esta constatação tem inúmeras implicações e permanece envolta num debate acadêmico e político- institucional acirrado. Entretanto, como destaca Abramovay, "esta característica da agricultura, no plano internacional, contribuiu para ao menos colocar em dúvida a idéia de que, tanto quanto na indústria, as unidades produtivas fundadas no trabalho familiar estavam, na agricultura, condenadas ao desaparecimento e só existiam ali onde o capitalismo não se desenvolver no campo" (1996). 36 Contudo, os estudiosos do tema mostram que a agricultura familiar não é refratária à adoção de tecnologias, como já se mencionou. A verdade é que o pacote do "Padrão Técnico Moderno" nunca foi adequado à realidade socioeconômica, cultural e ambiental da maioria dos agricultores familiares. Além disso, afirmam que a modernização tecnológica promovida desconsiderou, e ainda desconsidera, o fato de os agricultores familiares não dissociarem a unidade de produção da unidade de consumo, como ocorre na agricultura empresarial (BRAVO; DORADO; CHIA, 1995). Com relação às mudanças no sistema de produção reflexas àquelas no mercado de produtos agroalimentar, um dos aspectos que assumiram grande proporção refere-se aos impactos negativos da agricultura industrial no meio ambiente. Tais impactos adquiriram um caráter ampliado, de tal sorte que se tornou a mola propulsora capaz de mobilizar distintos segmentos da sociedade internacional e nacional. No final dos anos de 1960 e nos anos 70, em várias partes do mundo, eclodiram movimentos na sociedade civil para contestar os processos produtivos em vigor na agricultura industrial, responsabilizando-os por inúmeras das degradações dos recursos naturais. Este momento ficou conhecido como Pós-produtivista e, a partir dele, emergem as propostas de desenvolvimento de sistemas de produção agrícola sustentável, com nenhum ou baixo uso de insumos químicos e industrializados. Em consonância, está na pauta o apelo por alimentos de qualidade, diversificados em seu estado – alimentos frescos e in natura –, garantidos pela produção sazonal e regional (FRIEDMAN, 1993). No Brasil esses "novos ares" não demoram a chegar, sendo que a partir dos anos 70 e ao longo dos 80 são inúmeras as denúncias que se fazem, grande parte delas apontando o uso intensivo de agrotóxicos, a poluição e contaminação dos solos e das águas, o desmatamento de vastas áreas em vários ecossistemas brasileiros. Não menos importantes são as denúncias relativas às seqüelas à saúde da população. Tanto aquela diretamente atingida, como os agricultores e suas famílias, em que predomina a intoxicação por uso intenso de agroquímicos, causando inúmeros tipos de cânceres, abortos, suicídios, problemas neurológicos e psicológicos, nos adultos e nas crianças. As seqüelas sobre a população urbana associam-se principalmente ao aumento crescente dos tipos de câncer, atingindo cada vez mais a população mais jovem, e ao aumento nos tipos e intensidade de alergias. Além disso, há estudos que mencionam seqüelas relacionadas às condições reprodutivas tanto dos homens como das mulheres (AZEVEDO, 2003). Todo esse processo é consonante com os questionamentos sobre o tipo de desenvolvimento urbano-industrial em curso nas sociedades ocidentais, cuja face mais visível se traduzia na acelerada e intensa degradação ambiental. Ele se inscreve no 37 contexto das discussões sobre o meio ambiente que ocorriam na década de setenta11, permaneceram nas décadas seguintes e culminaram no evento da Eco-9212, mantendo-se como questões desafiadoras neste século. A envergadura que assumiram as questões ambientais pode se associar à idéia de mudança societária. Esta mudança oportuniza refletir sobre a noção de campo, trabalhada por Bourdieu (2005), em que as conseqüências ambientais e os debates em torno dela configuram-se em ameaças às fronteiras do campo hegemônico do mercado agroalimentar, propiciando a emergência dos alimentos orgânicos no seu interior, e, em conseqüência, a construção social de um mercado com suas particularidades. Associando-se às discussões em curso acirra-se o debate que põe em xeque o modelo de produção de alimentos padronizada. Dentre as questões levantadas está aquela que evidencia o fato de os alimentos perderem a identidade com seus locais de origem, uma vez que o lugar da produção é somente uma contingência no elo da cadeia produtiva, orientada principalmente pelas relações entre a indústria e o varejo. A diversidade alimentar torna-se reduzida e, dadas as características da produção para a indústria, alimentos que anteriormente dependiam de condições ambientais específicas e que obedeciam a ciclos de sazonalidade são produzidos em condições controladas tecnologicamente, definidos como parte de uma cesta de alimentos padrão. Nessas condições estão incluídos não só os alimentos destinados ao processamento industrial, mas vários dos alimentos frescos e in natura, a exemplo do tomate, batata, laranja, manga e uva, entre outras frutas e hortaliças. Como destaca Khatounian, o "alimento moderno não tem mais identidade, se internacionalizou [...] não pertence a lugar nenhum, não tem sabor de coisa alguma, enche o estômago, mas não alimenta a alma no contexto dos aromas, história, de vínculo com o meio ambiente. Enche o estômago, mas a alma percebe o seu vazio" (2001, p.48). 11 Naquela oportunidade foi promovida pela ONU a primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano (1972), conhecida como Conferência de Estocolmo, na cidade de Estocolmo, Suécia. O evento trouxe ao debate global a discussão do tema da segurança ecológica, acrescentando-o às demais questões consideradas prioritárias, como a paz, os direitos humanos e o desenvolvimento com igualdade. A conferência tornou-se um marco de referência para as discussões sobre o que, na seqüência, viria a se constituir numa das questões mais complexas e mais cruciais da história recente da humanidade, ou seja, a questão do desenvolvimento sustentável (VOGT, 2003, p.10). 12 A segunda Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUCED), também conhecida como ECO-92, reuniu representantes de 175 países e de Organizações Não-Governamentais (ONGs), tendo sido considerada o evento ambiental mais importante do século XX. Foi a primeira grande reunião internacional realizada após o fim da Guerra Fria e a maior reunião de chefes de Estado da história da humanidade. Governantes de quase todos os países de todos os continentes encontraram-se para discutir o maior dos desafios de interesse global: como reverter o atual processo de degradação ambiental – incluindo perda de florestas e redução da biodiversidade – e de mudanças climáticas globais, garantindo, ao mesmo tempo, um desenvolvimento que resulte na melhoria da qualidade de vida das populações mais carentes do planeta. 38 É nessa busca por alimentos que possam também "encher a alma" que emerge a demanda por produtos com sabor e qualidade, ou seja, alimentos produzidos "naturalmente". Uma das primeiras denominações para este outro sistema de produção era a chamada agricultura alternativa ou sustentável13, e sob este "guarda-chuva" também estava a agricultura orgânica14. Cabe destacar, entretanto, que as críticas ao "Padrão Técnico Moderno" já existiam mesmo antes de sua consolidação e expansão mundial no pós-segunda guerra. Tanto é assim que a maior parte das correntes que se abrigavam sob aquele "guardachuva" corresponde às primeiras décadas do século XX, à exceção da agroecologia. Contudo, foi somente com o ambiente histórico das últimas décadas do século passado que aqueles movimentos puderam emergir, encontrando espaço para se manifestar e se tornar efetivamente públicos. O conjunto das críticas não se restringia às questões relativas ao sistema de produção, às relações sociais de produção e às questões ambientais. Também acompanhava o debate a distinção de formas diferenciadas de comercialização da produção, enfatizando o estreitamento nas relações entre o agricultor/produtor e o consumidor urbano. Era a busca pela construção social de um outro tipo de mercado, onde predominassem as relações do tipo face a face, rompendo a lógica do atual mercado de produtos agroalimentares, baseada em relações anônimas e impessoais. Nos itens a seguir situa-se o cenário de construção do mercado de orgânicos. Iniciase abordando o processo de institucionalização da agricultura orgânica e a relação com os tipos de mercado, apresentando-se, a seguir, alguns elementos que particularizam o sistema tecnológico da produção orgânica. Por fim, trata-se da situação do consumo de orgânicos, destacando-se o consumidor individual e um novo consumidor, que é o mercado institucional. 2.2 A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA AGRICULTURA ORGÂNICA E A RELAÇÃO COM OS DIFERENTES MERCADOS DE ORGÂNICOS No Brasil, durante quase duas décadas, os alimentos orgânicos prescindiram da normatização ou institucionalização para serem transacionados comercialmente. A autenticidade e a garantia dos produtos nas relações de comercialização eram asseguradas e estabelecidas diretamente entre produtores e consumidores, os quais mantinham laços com as organizações e entidades que, direta e indiretamente, estavam ligadas ao movimento orgânico 13 Sob o guarda-chuva da agricultura alternativa ou sustentável encontravam-se, num primeiro momento, os vários sistemas de produção conhecidos como: agricultura orgânica, biodinâmica, natural, biológica, permacultura e agroecologia. 14 A agricultura orgânica é uma das denominações que compõem o chamado movimento da agricultura sustentável, estando aí inseridas também a agricultura natural, a biodinâmica, a biológica e, recentemente, a agroecologia. Entretanto, a denominação agricultura orgânica adquiriu um status de maior abrangência quando, em 1972, foi criada a IFOAM (Federação Internacional dos Movimentos de Agricultura Orgânica). 39 e, por conseguinte, àqueles movimentos contestatórios às práticas de produção e consumo da agricultura industrial. Os produtos orgânicos eram comercializados principalmente através de canais onde prevaleciam as relações face a face entre o agricultor e o consumidor, como as feiras e as entregas diretas, baseando-se em relações de conhecimento e confiança. Essa condição caracterizou o período inicial de construção do mercado de orgânicos, entre os anos de 1970 até meados da década de 90, tanto no País como no Estado do Paraná. Entretanto, as preocupações societárias com as questões ambientais e, em conseqüência, a busca por alimentos "naturais" e com "qualidade", fizeram crescer rapidamente a procura por alimentos orgânicos. Em consonância, também se expandiram o número de agricultores produtores, a produção, as entidades e organizações de apoio aos orgânicos e, ainda, novos tipos de transações comerciais passaram a ocorrer, o que veio a caracterizar diferentes tipos de mercado e sua relação com os processos de institucionalização de orgânicos. Além do mercado das relações face a face, os produtos orgânicos passaram a ser incorporados no ambiente hegemônico do mercado de produtos agroalimentares, a partir de meados da década de 90. Nas redes de super e hipermercados o produto orgânico simboliza o apelo pelo produto natural e com qualidade, por parte do consumidor urbano. Contudo, pesquisas15 têm mostrado que, para esses agentes comerciais, os produtos se caracterizam menos por seus atributos socioambientais e mais por oferecerem uma oportunidade econômica, como parte de um "nicho de mercado"16. Somado à situação anterior, há o crescimento da procura de alimentos orgânicos pelos países do hemisfério norte, o que estimulou o desenvolvimento de um outro tipo de mercado, o da exportação de produtos orgânicos brasileiros. Como esses mercados caracterizam-se pelo distanciamento na relação entre quem produz e quem consome, tornam-se necessários outros atributos que possam substituir o sentimento de confiança implícito nas relações face a face. A "garantia" de que os alimentos são então "saudáveis, limpos, naturais" será dada por um "selo", originário de um processo de certificação da originalidade dos produtos orgânicos. E é neste contexto que se inicia o processo de institucionalização17 dos produtos orgânicos no País. 15 Ver o estudo A dinâmica da comercialização dos produtos orgânicos em Santa Catarina" (ZOLDAN; KARAM, 2004). 16 Weinstein (1995, p.222-223) refere-se ao conceito de nicho de mercado da seguinte forma: "Nichos de mercado são pequenos segmentos que oferecem oportunidades de negócios incrementais [...] a escolha de nichos é o processo pelo qual a empresa integra marketing e atividades de planejamento para otimizar sua competitividade e posição no mercado. Uma estratégia de posicionamento derivada de segmentação para um consumidor-alvo focalizado é a parte principal da escolha de nichos". [grifo nosso]. 17 A discussão sobre a institucionalização de orgânicos no Brasil pode ser melhor conhecida nos trabalhos de Ormond et al. (2002); Fonseca (2005); Medaets e Fonseca (2005). 40 2.2.1 Síntese do Processo de Regulamentação dos Alimentos Orgânicos no Brasil Fora do Brasil a institucionalização da agricultura orgânica deu-se no início dos anos 90, procurando não só regulamentar a atividade produtiva mas também definir procedimentos para a comercialização nos diferentes tipos de mercado. Em junho de 1991, o Council Regulation da CEE - Comunidade Econômica Européia, no documento 2.092/91, instituiu um programa para seus estados-membros que estabelecia as normas e os padrões de produção, processamento, comercialização e importação de produtos orgânicos de origem animal e vegetal. Dessa forma, para que os produtos fossem comercializados nos países da Comunidade Européia era necessário um selo de garantia, uma certificação, emitida por alguma certificadora credenciada pela Comissão Européia. A este tipo de certificação, que se denomina "Certificação de Terceira Parte", as normas e procedimentos verificados pelas certificadoras foram regulamentados pela norma internacional ISO18/IEC Guide 65/1997, além daquelas já apregoadas e aceitas pela IFOAM19, as quais formam a base para que organizações certificadoras confiram a acreditação/certificação20 aos produtos como orgânicos. As exigências internacionais21 vão estimular os debates, o que resulta na regulamentação da agricultura orgânica no Brasil. Serão principalmente as entidades e 18 A ISO (International Organization for Standardization) é a confederação internacional de órgãos nacionais de normalização de todo o mundo. Trata-se de uma entidade não-governamental, criada em 1947, com sede em Genebra, Suíça. O seu objetivo é promover o desenvolvimento da normalização e de atividades relacionadas, com a intenção de facilitar o intercâmbio internacional de bens e serviços e desenvolver a cooperação nas esferas intelectual, científica, tecnológica e de atividade econômica. 19 A IFOAM (International Federation of Organic Agriculture Movements), organização não-governamental criada em 1972, sediada na França, tem padrões estabelecidos e publicados no Basic Standards for Organic Production and Processing, os quais, embora privados, têm aceitação pelo movimento orgânico mundial. Abriga mais de 770 organizações, incluindo certificadoras, processadores, distribuidores e pesquisadores de mais de 107 países, sendo que os padrões estabelecidos têm servido como referência para as regulamentações nos diversos países. 20 Segundo a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), "a certificação é um conjunto de atividades desenvolvidas por um organismo independente da relação comercial, e tem como objetivo atestar publicamente, por escrito, que determinado produto, processo ou serviço está em conformidade com os requisitos especificados. Estes requisitos podem ser: nacionais ou internacionais. Considera-se que a certificação não é uma ação isolada e pontual, mas parte de um processo voltado a garantir a qualidade de um produto, para a manutenção da competitividade e conseqüente permanência no mercado, passando pela utilização de normas técnicas e pela difusão do conceito de qualidade por todos os setores da organização, abrangendo seus aspectos operacionais internos e o relacionamento com a sociedade e o ambiente". 21 No âmbito internacional, a publicação das diretrizes pela Comunidade Européia impulsionou outros países à regulamentação. A Argentina regulamentou em 1994, os EUA iniciaram em 1990 e finalizaram em 2002, o Canadá publicou em 1999, o Japão regulamentou em 2000, e a Austrália e a Tailândia estão desenvolvendo normas nacionais. (NEVES, 2003b) 41 organizações ligadas ao movimento orgânico que, ao resistirem à definição de normas por organismos externos ao País, tornarão este debate mais amplo e público. Na sua maioria são organizações não-governamentais, entidades assessoras de associações de agricultores familiares, que se posicionam em defesa da produção orgânica voltada para qualificar o abastecimento alimentar interno, focada nas características socioambientais das regiões onde os alimentos são produzidos. Grande parte dos representantes, nas décadas de 80 e 90, estava na Região Sul do País e mantinha relações estreitas com os produtores de alimentos orgânicos, majoritariamente agricultores familiares. Uma das principais preocupações na época, e ainda hoje, é com a possibilidade de exclusão dos agricultores do processo em curso, tal qual ocorreu nas décadas anteriores quando da modernização conservadora na agricultura. Tal preocupação consolidou-se na 9ª Conferência da IFOAM, realizada em São Paulo, em 1992, quando aquelas entidades marcaram sua posição com relação aos processos de acreditação/certificação dos produtos orgânicos. Em decorrência da prática em curso, reivindicavam garantir o processo da certificação participativa, o qual já ocorria nos estados do sul do Brasil e em outros países latino-americanos. A posição assumida consolidou-se na criação do MAELA (Movimento Agroecológico para América Latina e Caribe). Dessa forma, ao longo da década de 90 as organizações e entidades afins ao movimento orgânico passaram a se articular e a participar ativamente do debate sobre a institucionalização da agricultura orgânica no Brasil. O marco oficial desse debate ocorreu em setembro de 1994, quando o Ministério da Agricultura (MA) reuniu-se com representantes das ONGs, do setor privado e do setor público, ligados à produção e ao consumo de alimentos orgânicos, visando criar normas tanto para a produção no País como para a exportação. Uma das preocupações que se colocava naquele momento, como destacam Medaets e Fonseca (2005), era o fato de, nos anos de 1995 e 1996, vários organismos certificadores internacionais terem passado a programar sua vinda para o Brasil, sendo que os mesmos se norteavam pelas normas empregadas e vigentes principalmente para os países da Comunidade Européia. O resultado do processo de discussão iniciado em 1994 culmina em maio de 1999, quando o Ministério da Agricultura e do Abastecimento publicou a Instrução Normativa nº 007 (IN 007/99), criando um selo de qualidade para os produtos orgânicos brasileiros (Anexo 1). Dentre outras definições, a IN 007/99 previa a criação de Órgãos Colegiados Nacionais (OCN) e Estaduais, com composição paritária entre agentes públicos, privados e ONGs, e, entre outras atribuições, tinha a função de credenciar instituições certificadoras, que 42 seriam responsáveis pela certificação e controle de qualidade orgânica no Brasil. Cabe destacar, entretanto, que o foco da IN 007/99 estava no processo de produção e industrialização, e, quanto à comercialização e/ou distribuição, o aspecto destacado era a certificação. Nesse sentido, determinava que as entidades certificadoras seriam pessoa jurídica e sem fins lucrativos, as quais deveriam estar credenciadas junto aos Órgãos Colegiados Nacionais (OCN). Para que se procedesse à importação de produtos orgânicos, instruía que estes deveriam ser certificados em seu país de origem, porém condicionados às leis fitossanitárias do Brasil e com a análise prévia e anuência de uma certificadora registrada no OCN. Entretanto, um aspecto que permanece preocupando as entidades, organizações e agricultores que atuam no movimento orgânico refere-se aos interesses distintos entre certificadoras, processadores e agricultores familiares. Pois, como o custo da certificação tem variado de 0,5% a 2,5% do valor da produção orgânica, é praticamente impossível para pequenos agricultores e pequenas agroindústrias arcarem com tal desembolso, limitando suas transações comerciais com distintos tipos de mercado ou mesmo inviabilizando-as. Isto se torna particularmente importante quando se trata da comercialização com os mercados de circuito longo, como os grandes equipamentos do varejo, e também com o da exportação, em que a garantia através da certificação por selo evidencia que a relação é unicamente com o produto. O que predominava na época, contudo, eram os processos que envolviam a "certificação participativa", também denominada informal ou local, afinados aos princípios que orientam a prática orgânica. A Rede Ecovida de Agroecologia é provavelmente a principal representante desta proposta de certificação. Ela se constituiu em 1998, no Estado de Santa Catarina, e rapidamente abrangeu os outros dois estados do sul do País, Paraná e Rio Grande do Sul. O fundamento dos procedimentos está no processo de construção da certificação segundo seus principais interessados, agricultores e consumidores, respeitando as características sociais, culturais e ambientais, bem como o contexto político e os tipos de mercado em que se inserem. Neste caso a certificação não é individual, mas sim para o grupo organizado em famílias de agricultores, sendo que estes grupos estruturam-se em núcleos, os quais são filiados à Rede. A continuidade do processo do marco legal da agricultura orgânica no País se dá em 2002, com a criação do Grupo de Agricultura Orgânica (GAO), durante a realização do I Encontro Nacional de Agroecologia (ENA). O grupo foi composto por representantes das entidades e organizações ligadas ao movimento orgânico de todo o País, e tinha como principal objetivo acompanhar, debater e influenciar o processo de institucionalização, o qual tramitava no Congresso Nacional, como Projeto de Lei (1999) para a regulamentação da agricultura orgânica. No ano seguinte, em 2003, o GAO propôs mudanças no texto original do projeto de lei, tanto no que se referia à definição sobre agricultura orgânica como com relação aos critérios 43 de regulamentação e registro de produtores, comercialização e certificação de produtos. As mudanças foram quase que integralmente acatadas pelo relator do projeto na Câmara dos Deputados, e em dezembro de 2003 a Lei 10.831 foi promulgada (Anexo 2). Ainda como decorrência da articulação política do GAO, em 2003, houve a aprovação no Plano Plurianual 2004-2007 de um pequeno orçamento para o setor de orgânicos, direcionado a seis ações de fomento nas áreas de transferência de tecnologia, certificação, capacitação e publicidade específica. Entretanto, as discussões não se encerraram com a promulgação da lei, uma vez que esta precisava ser regulamentada. Desse modo, em 2004, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) criou a Câmara Setorial de Agricultura Orgânica (CSAO), que se organizou em grupos temáticos para formulação de propostas para regulamentação da Lei 10.831. Tais grupos respondem pelas seguintes áreas: produção vegetal, produção animal, processamento da produção, extrativismo sustentável, certificação, comercialização, estruturas governamentais, justiça social e certificação participativa. Os dois últimos temas foram abordados no âmbito do GAO e, posteriormente, discutidos e negociados com representantes dos ministérios envolvidos. Segundo Karam et al. (2006), a discussão acerca da certificação, que ainda é um ponto bastante polêmico, ficou dirimida na medida em que houve a admissão legal da não obrigatoriedade da certificação em caso de venda direta dos produtos orgânicos por agricultores familiares. Esta condição, ao oficializar as práticas de certificação participativa, viabilizou a abertura de um novo tipo de mercado para a agricultura orgânica – o mercado institucional –, em que os agricultores familiares produtores de alimentos orgânicos podem participar dos programas de compra governamental, como o PAA (Programa de Aquisição de Alimentos), a merenda escolar, entre outros. No âmbito da certificação participativa cabe destacar que no mesmo período, em abril de 2004, representantes de mais de 20 países se reuniram na cidade de Torres, Rio Grande do Sul, para discutir os sistemas de garantia "alternativos" àqueles propugnados pela Certificação de Terceira Parte (IFOAM, ISO 65). O Taller de Certificación Alternativa para la Producción Orgânica, organizado pela IFOAM e MAELA, chegou a um consenso para abarcar as distintas nomenclaturas utilizadas para a garantia de produtos orgânicos (participativa, local, informal, apropriada), sob uma única designação: os Sistemas de Garantia Participativos (SGPs), reconhecendo como SGPs aqueles que incluem a participação dos agricultores, consumidores, ONGs, agências governamentais etc. na construção da garantia orgânica.22 22 Sobre o texto que detalha os SGPs, ver Taller... (2004). 44 No ano seguinte, em 2005, a partir do conjunto das propostas trabalhadas nos grupos temáticos, foi sistematizada uma minuta de regulamentação da lei, para discussão na Câmara Setorial de Agricultura Orgânica, onde foram votados os principais pontos de desacordo e o texto final, que seguiram para consulta pública para posterior regulamentação. Ainda em 2005, o NEAD (Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural), órgão do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA),voltado para a produção e difusão de conhecimentos que subsidiem políticas para o desenvolvimento rural, publicou um estudo23 sobre a regulamentação da agricultura orgânica. Com o objetivo de levar informações à agricultura familiar, público-alvo da Secretaria da Agricultura Familiar (SAF), do Ministério do Desenvolvimento Agrário, o trabalho sistematiza dados referentes aos procedimentos regulamentares e o aparato legal sobre a agricultura orgânica no Brasil e no mundo, para servir de referência para técnicos e lideranças de produtores. 2.2.2 A Institucionalização da Agricultura Orgânica no Paraná A institucionalização da agricultura orgânica no Paraná desenrolou-se concomitantemente aos debates em curso em âmbito nacional. Um dos marcos ocorreu em 1981, em Curitiba, com a realização do Primeiro Encontro Brasileiro de Agricultura Alternativa (EBAA), estimulado pelas manifestações críticas à modernização da agricultura, apontadas no 11º Congresso de Agronomia, em 1979, também realizado na cidade. Ao longo da década de 80 um conjunto de iniciativas foi desencadeado visando promover o desenvolvimento da agricultura orgânica no Estado. Karam (2001), no seu estudo sobre a agricultura orgânica como estratégia para novas ruralidades, realizado na região metropolitana de Curitiba (RMC), mostra que dentre as iniciativas à época destacam-se tanto algumas da sociedade civil como do próprio governo do Estado. Entre as da sociedade civil é relevante a fundação do GEAE (Grupo de Estudos de Agricultura Ecológica), em 1981, por alguns alunos e professores da faculdade de Agronomia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), voltado a promover o debate sobre a temática; como decorrência desta experiência alguns membros do grupo se envolveram diretamente na produção de alimentos orgânicos, principalmente hortaliças, os quais eram comercializados por meio da venda direta de sacolas, da entrega em domicílio e da venda em restaurantes naturais e vegetarianos; ainda, no período organiza-se uma cooperativa de consumidores de produtos naturais, a COOPERA (Cooperativa de Consumidores de Produtos Integrais), fundada entre 1983 e 1984, que aproxima consumidores de produtores. 23 Medaets e Fonseca (2005). 45 Do lado das iniciativas governamentais cabe destacar a ação da SEAB (Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado do Paraná), do Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR) e do Instituto EMATER. Na segunda metade da década de 80, tais iniciativas se apresentaram mediante programas de cunho conservacionista, como o PMISA (Programa de Manejo Integrado de Solos e Águas), desenvolvido pela SEAB, que visava estimular métodos produtivos com atenção aos recursos naturais, como o solo e a água. Uma iniciativa governamental voltada especificamente à agricultura sustentável ocorreu também na primeira metade daquela década, no município de Agudos do Sul, situado a 60 quilômetros ao sul de Curitiba. Na oportunidade, a EMATER, empresa de extensão rural, apoiou o trabalho de um técnico local com uma associação de agricultores, voltado à conversão da produção de olerícolas do sistema convencional ao sistema de produção biodinâmico. Toda a comercialização da produção se dava por meio da venda direta de sacolas, entregues principalmente para grupos de consumidores de algumas instituições públicas, como a própria SEAB, a EMATER e o IPARDES. Esta experiência foi interrompida com a saída do responsável, em 1986. O ano de 1989 representou um marco no processo, particularmente na região de Curitiba, quando, a partir de atores da sociedade civil, iniciou-se naquele ano o que hoje se conhece como Feira Verde de Produtos Orgânicos. A primeira barraca de venda direta de produtos orgânicos foi instalada ao lado da Feira de Artesanato de Curitiba, realizada aos domingos pela manhã, no Largo da Ordem, região central da cidade. Entre 1989 e 1995 vários agricultores juntaram-se à iniciativa, sendo que a feira representava o principal tipo de mercado para a comercialização dos seus produtos, os quais eram garantidos pela relação de confiança entre agricultor e consumidor. Cabe destacar que várias propriedades dos agricultores eram certificadas, na época, pelo Instituto Biodinâmico (IBD). Em 1991, parte daqueles que participaram da criação do GEAE fundou o IVV Instituto Verde Vida de Desenvolvimento Rural, com sede em Curitiba, com dois objetivos principais: prestar assessoria técnica a projetos em agricultura orgânica no Paraná e estimular o Estado a desenvolver políticas públicas para tal segmento. Naquele ano iniciouse um processo de articulação e organização em torno da agricultura orgânica na RMC, quando membros do IVV, os agricultores da Feira Verde e outras pessoas ligadas direta ou indiretamente, somando mais de 60 pessoas, reuniram-se na prefeitura do município de Quatro Barras, na RMC, apoiadas pelo técnico24 do escritório local do Instituto EMATER do município, para discutir propostas e ações. 24 O técnico, Geraldo Deffune, era quem havia desenvolvido o trabalho com os agricultores do município de Agudos do Sul. 46 Os resultados fizeram-se sentir em 1993, quando a Feira Verde foi oficialmente criada e obteve o financiamento da SEAB/EMATER para a instalação de oito barracas, que reuniam quinze famílias de agricultores. Em março de 1995, após várias negociações, a Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento de Curitiba (SMAB) destinou à Feira Verde um dia e local específicos. A feira passou então a funcionar dentro do Passeio Público, na região central, aos sábados pela manhã. Para lá se transferiram 10 barracas, reunindo a produção de cerca de 25 famílias de agricultores, de diferentes municípios da RMC. Ainda como resultado das ações daquele grupo, o Governo do Paraná, através da SEAB/Instituto EMATER, e o Instituto Verde Vida de Desenvolvimento Rural estabeleceram um convênio para que se desenvolvessem ações voltadas à produção orgânica, dentro do Programa Paraná Rural, continuidade do Programa de Manejo Integrado de Solos e Águas (PMISA). Além da relação com o nível estadual, outros convênios se deram entre o IVV e algumas prefeituras municipais, tanto na RMC (olerícolas) como na região do norte velho (açúcar mascavo, maracujá e acerola), no centro (plantas medicinais) e na região sudoeste (soja). Entre 1997 e 1998, em consonância com o marco oficial de institucionalização da agricultura orgânica no País, e com a realização do II Seminário Nacional da Agricultura Orgânica, realizado em Curitiba, foi criado no Paraná o CEAO (Conselho Estadual de Agricultura Orgânica do Paraná), por iniciativa dos atores da sociedade civil e das instituições governamentais envolvidos com a temática. A composição desse conselho era paritária, sendo formado por cinco representantes de instituições governamentais, dentre eles a SEAB, SEMA, EMATER, IAPAR e ASEMA, e outras cinco entidades não-governamentais: Associação para o Desenvolvimento da Agroecologia (AOPA), Centro Paranaense de Apoio ao Pequeno Agricultor (CAPA), Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural (ASSESSOAR), Associação dos Produtores Orgânicos de Londrina (APOL) e a empresa Terra Preservada. O CEAO, visando institucionalizar sua atuação, colaborou na proposição do Projeto de Lei nº 013/200025, A criação do Conselho Estadual de Agricultura Orgânica do Estado do Paraná CEAO, órgão normativo, deliberativo e regulador da política agrícola estadual para a agricultura orgânica, integrante da estrutura organizacional básica da Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento - SEAB.26 25 O Projeto de Lei foi apresentado à Assembléia Legislativa do Paraná pela deputada estadual do Partido dos Trabalhadores (PT) Luciana Guzella Rafagnin. 26 As atribuições do CEAO estão inscritas na Lei no seu artigo 2º, a saber: I - Definir as políticas públicas e formular diretrizes de programas e projetos a nível estadual, destinados ao desenvolvimento da agricultura orgânica; II - acompanhar o processo de definição das diretrizes e normas para a produção orgânica no Paraná, a serem estabelecidas através do Ministério da Agricultura e do Abastecimento; III - promover estudos, pesquisas e publicações de temas relativos à produção, à industrialização e à comercialização de 47 Embora a Lei tenha sido debatida e aprovada pela Assembléia Legislativa, foi vetada pelo governador em exercício, Jaime Lerner. Em 1999, quando o Ministério da Agricultura instituiu a Instrução Normativa nº 007/99, criou-se o CNPOrg - Órgão Colegiado Nacional e havia a previsão de criação dos colegiados estaduais (CEPOrg) pelas Delegacias Estaduais do Ministério da Agricultura. No Paraná o mesmo não teve a necessidade de ser criado, pois à época estava em funcionamento o CEAO, o qual cumpria as funções previstas pela IN 007/99. O CEPOrg-PR só foi criado oficialmente no Paraná após a promulgação da Lei 10.831, em 2003, que regulamenta a agricultura orgânica no País, e o "patrimônio" do CEAO foi incorporado a tal instância.27 O CEPOrg-PR é desde então coordenado pela Superintendência Federal da Agricultura no Paraná, órgão do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, e conta com a participação de instituições governamentais estaduais e de entidades nãogovernamentais representantes dos agricultores orgânicos do Estado. 2.2.3 A Certificação e o Mercado de Orgânicos A certificação é uma expressão do processo de institucionalização, catalizadora de grande parte das discussões que envolvem o marco legal dos orgânicos, uma vez que, através dela, apregoa-se a garantia de qualidade dos produtos para que estes sejam comercializados. Para tanto, formalizam-se normas e procedimentos a serem verificados, os quais devem estar em conformidade e ser reconhecidos pelas partes envolvidas, o que implica a relação com os diferentes tipos de mercado que se constroem. Neste item não se fará uma discussão aprofundada sobre a certificação, mas apresentam-se os sistemas de garantia da qualidade orgânica vigentes no Brasil e como eles evidenciam os distintos mercados dos produtos orgânicos. Tomar-se-á como base o recente estudo realizado por Medaets e Fonseca (2005), em que os autores destacam a existência de dois sistemas de garantia: o de terceira parte, e a certificação participativa ou solidária. O sistema de garantia de terceira parte é a certificação por auditoria externa. Neste caso a garantia quanto à qualidade do produto não é dada pelos produtores nem produtos orgânicos; IV - realizar e/ou apoiar a realização de seminários e outros eventos objetivando a divulgação, fortalecimento e desenvolvimento da agricultura orgânica; V - cooperar e realizar convênios com órgãos federais, estaduais, municipais e com instituições da sociedade civil organizada na consecução de meios para o fortalecimento e desenvolvimento da agricultura orgânica; VI - fomentar intercâmbios com outras organizações congêneres nacionais e internacionais, e contribuir com iniciativas pertinentes à área da produção de alimentos orgânicos; VII - manter atualizada a documentação e a legislação pertinente à área da agricultura orgânica; VIII - instituir o seu regimento interno. 27 As informações sobre o processo de criação do CEAO e sua destituição foram fornecidas em entrevista por Rogério Rosa, em outubro de 2006, na época presidente da AOPA, entidade não-governamental criada em 1995, na RMC, a qual teve papel ativo durante todo o tempo de vigência do Conselho. 48 tampouco pelo Estado, mas sim por uma terceira parte. Esta parte é representada por organismos certificadores, que, a partir de inspeção externa feita nas propriedades e de análises laboratoriais, verificam se a produção está em conformidade com o padrão ISO definido. Neste caso não é o inspetor quem certifica, mas todos os protocolos são encaminhados ao organismo certificador, e é ele que atesta por certificado a qualidade. Nesse sistema de avaliação o que ocorre é "um processo de intermediação da confiança". Não são os produtores/agricultores que asseguram aos compradores a qualidade de seus produtos, mas sim um organismo certificador. Este sistema responde de maneira efetiva à estrutura do hegemônico mercado agroalimentar nacional e internacional. Distinta da certificação de terceira parte é a certificação participativa. O fundamento deste sistema está na confiança e participação dos envolvidos no processo para que haja a garantia da qualidade do produto, desde a produção até o consumo. A este tipo de garantia se denomina atualmente de "conformidade social", o qual está mais próximo do mercado das relações diretas, seja na relação com o consumidor final individual ou coletivo, seja com determinados programas do mercado institucional (merenda escolar, compra direta de agricultores e associações). A certificação participativa pode ser melhor conhecida a partir da definição da Rede Ecovida de Agroecologia, entidade que deu início ao sistema no Brasil, em 1998, no Estado de Santa Catarina: A certificação participativa é um sistema solidário de geração de credibilidade, onde a elaboração e a verificação das normas de produção ecológica são realizadas com a participação efetiva dos agricultores, consumidores, buscando o aperfeiçoamento constante e o respeito às características de cada realidade. O selo Ecovida é obtido após uma série de procedimentos desenvolvidos dentro de cada núcleo regional. Ali ocorre a filiação à Rede, a troca de experiências e verificação do Conselho de Ética. A certificação participativa é uma forma diferente da certificação que, além de garantir a qualidade do produto ecológico, permite o respeito e a valorização da cultura local através da aproximação de agricultores e consumidores e da construção de uma Rede que congrega iniciativas de diferentes regiões (REDE ECOVIDA DE AGROECOLOGIA, 2006). Medaets e Fonseca (2005) apresentam o quadro que se segue, em que se verificam as diferenças entre os dois sistemas: 49 QUADRO 2.1 - SISTEMAS DE GARANTIA DE QUALIDADE COMPONENTES DO SISTEMA DE GARANTIA SOLIDÁRIA GARANTIA DE QUALIDADE Padrões GARANTIA DE TERCEIRA PARTE Construção em processo de revisão Construção em processo de revisão periódica. periódica. - Inspeção - Não existe inspetor externo. - Existe inspetor externo. - Registros - Realizados de maneira sistemática. - Realizados de maneira sistemática. - Documentação - Mantida descentralizada. - Mantida centralizada. - Integrada - Separada - Decisão de certificação - Descentralizada - Centralizada - Técnico - Residente na comunidade - Externo Comunicação de qualidade Selo, reputação do produtor e da Selo, reputação do produtor e organismo assessoria técnica e influência dos certificador Meios de verificação Organismo certificador - Funções de certificação e assessoria técnica componentes de avaliação social FONTE: Medaets e Fonseca (2005) Há dados controversos sobre o número e a origem de organismos certificadores em operação no Brasil. O estudo realizado por Ormond et al. (2002) identificou que havia 19 organismos certificadores – 12 de origem nacional e 7 de origem internacional –, sendo que na época da pesquisa todos estavam em processo de regularização junto aos colegiados estaduais e nacionais. O estudo identificou a localização de 17 deles, mostrando que a maioria tinha sede nos estados do Sul e Sudeste: 11 em São Paulo, 01 no Espírito Santo, 01 em Minas Gerais, 02 no Rio Grande do Sul, 01 em Mato Grosso e 01 em Pernambuco. Os dados mais atuais referem-se a 2003 e são apresentados no recente estudo elaborado sobre a regulamentação da agricultura orgânica, de Medaets e Fonseca (2005). Esse trabalho aponta que, naquele ano, havia 10 organismos certificadores internacionais operando no País, sendo que 60% deles eram de origem européia, e que, do total, muitos atuavam sem conhecimento das autoridades brasileiras. Tal situação é bastante preocupante, segundo os próprios autores, pois a grande maioria não tem qualquer participação nas discussões com o movimento orgânico brasileiro, tampouco sobre o marco legal da agricultura orgânica no País. O quadro 2.2 traz os organismos internacionais mencionados no referido trabalho. 50 QUADRO 2.2 - ORGANISMOS CERTIFICADORES INTERNACIONAIS COM AÇÃO EM AGRICULTURA ORGÂNICA NO BRASIL CONTINENTES PAÍSES DE ORIGEM Europeu Norte-americano ORGANISMOS CERTIFICADORES França Ecocert Alemanha Naturland, BCS Holanda SKAL Suécia KRAV Suíça IMO EUA FVO OCIA Sul-americano Asiático Argentina OIA Japão JONA TOTAL 10 FONTE: Medaets e Fonseca (2005) Com relação aos organismos certificadores nacionais (quadro 2.3), o referido estudo identificou que estes, na sua maioria, são originários de associações de produtores orgânicos e de organizações criadas para a difusão das práticas das diferentes escolas, como é o caso do IBD (Instituto Biodinâmico)28, ligado à agricultura biodinâmica, e da MOA (Fundação Mokiti Okada), ligada à agricultura natural. QUADRO 2.3 - ORGANISMOS CERTIFICADORES NACIONAIS COM AÇÃO EM AGRICULTURA ORGÂNICA REGIÕES DO PAÍS ORGANISMOS CERTIFICADORES ESTADOS (SEDES) Norte Associação de Certificação Socioparticipativa Florestal (ACS) Acre Nordeste Cepema Ceará Centro-Oeste Instituto Holístico Mato Grosso Sudeste AAO Certificadora; ANC, APAN; CMO; IBD; OIA Brasil São Paulo Chão Vivo Espírito Santo Certificadora Sapucaí; Minas Orgânica Minas Gerais Abio Rio de Janeiro Aprema Paraná Ecovida, A Orgânica, Fundagro, Biocert, Ecocert Brasil Santa Catarina Certifica RS Rio Grande do Sul Sul TOTAL 20 FONTE: Medaets e Fonseca (2005) O levantamento realizado para este estudo mostrou que atualmente, no Paraná, há 10 certificadoras atuantes, das quais somente 4 são nacionais e as outras 6 são internacionais, como se verifica no quadro 2.4, a seguir. 28 O IBD-Instituto Biodinâmico, empresa brasileira sem fins lucrativos, iniciou seus trabalhos de certificação em 1990 e opera em todo o território brasileiro e em alguns países da América do Sul. Em 1995 obteve o credenciamento IFOAM; em 1999, o ISO 65 (Alemanha); e em 2002 teve a aprovação do USDA (United States Department of Agriculture). É a única entidade brasileira habilitada internacionalmente a conceder a certificação para produtos orgânicos e biodinâmicos. É o representante no Brasil do "Demeter International". 51 QUADRO 2.4 - ORGANISMOS CERTIFICADORES ATUANTES NO ESTADO DO PARANÁ - 2006 ORIGEM ORGANISMOS CERTIFICADORES Nacional IBD, Rede Ecovida, CMO, TECPAR CERT Internacional IMO, OCIA, ECOCERT, SKAL, OIA, BCS FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR A discussão apresentada neste item procurou evidenciar a relação existente entre o processo de institucionalização da agricultura orgânica e os tipos de mercado. Esta relação fica mais explícita quando se analisam os sistemas de garantia de qualidade, em que se verifica que a garantia solidária está voltada muito mais a abranger o processo nas suas distintas dimensões, enquanto a garantia de terceira parte tem como prioridade o produto. Na busca de melhor compreender tais diferenças é que se apresenta, a seguir, o sistema de produção na agricultura orgânica, a partir dos fatores tecnológicos que distinguem as tecnologias de processo e as de produto. 2.3 O SISTEMA DE PRODUÇÃO ORGÂNICO: FATORES TECNOLÓGICOS E RELAÇÃO COM OS TIPOS DE MERCADO Dentre o conjunto de elementos que se interligam no processo de construção do mercado de orgânicos está a produção dos alimentos propriamente dita, e refletir sobre ela implica necessariamente considerar os aspectos tecnológicos aí envolvidos. De um modo geral verifica-se que o processo de produção de alimentos orgânicos está orientado por duas amplas vertentes que resultam em diferentes encaminhamentos tecnológicos: a produção orgânica que adota tecnologias de processo e aquela baseada nas tecnologias de produto. Embora uma situação não exclua a outra, o que se observa é que tais procedimentos tecnológicos têm uma correspondência com o contexto socioeconômico e institucional daqueles que os adotam, bem como estão intrinsecamente relacionados aos objetivos e às relações mercantis envolvidas. 2.3.1 A Agricultura Orgânica e as Tecnologias de Processo e de Produto Segundo o estudo de Hernández (2005), a produção orgânica que adota tecnologias de processo caracteriza-se por ser uma inovação de caráter sistêmico, que afeta todo o sistema de produção e não somente seus elementos. Neste encaminhamento tecnológico a unidade de produção é vista como um sistema que deve ser analisado e trabalhado de acordo com o conjunto de suas características, considerando a relação existente 52 entre as partes, ou seja, a compatibilidade e complementaridade das partes integrantes do conjunto produtivo (agricultura, floresta e animais), permitindo o maior aproveitamento do potencial da unidade de produção. Nesse enfoque, a produtividade, a qualidade dos produtos e a sustentabilidade da agricultura estão diretamente ligadas à qualidade e ao equilíbrio da fertilidade do solo (manutenção de níveis de matéria orgânica, promoção da atividade biológica, reciclagem de nutrientes e intervenção controlada sem destruição do recurso natural), que é considerado como um organismo vivo. De acordo com Weid (2001), o sistema de produção orgânico baseado em tecnologias de processo busca explorar a diversidade dos ambientes29, requerendo a procura de desenhos específicos de sistemas produtivos para a situação específica de cada agroecossistema e até de cada agricultor, sendo uma abordagem intensiva no uso de conhecimento, ao mesmo tempo em que é econômica no uso de insumos externos à propriedade. Kathounian (2001) também destaca tal tipo de encaminhamento tecnológico, ressaltando particularmente que, além do fato de a produção orgânica utilizar menos insumos materiais que a produção convencional, ela é resultante do uso de um produto não tangível, o conhecimento. Dessa forma, as peculiaridades nesse encaminhamento fazem com que o processo de produção e adoção seja mais complexo, tanto na compreensão do conjunto de elementos e atributos para além da produção em si como também para aqueles intrínsecos a ela, como a exigência de maiores conhecimentos técnicos e agroecológicos, seja no planejamento, avaliação e organização da produção, seja na observação permanente das plantas, dos animais, das condições do solo e clima durante todo o processo produtivo.30 Diferentemente do encaminhamento tecnológico de processo, a produção orgânica baseada na adoção de tecnologia de produto caracteriza-se pelo uso de insumos alternativos, na maioria das vezes externos à propriedade, como adubos orgânicos e defensivos naturais, cujo objetivo concentra-se na produção de um produto que não contém agrotóxicos. Neste encaminhamento, a compatibilidade e complementaridade das partes integrantes do conjunto produtivo (agricultura, floresta e animais), assim como do equilíbrio agroecológico, não possui um lugar central. 29 Segundo Romeiro (1997, p.64), na natureza, diversidade é sinônimo de estabilidade. Quanto mais um ecossistema é simplificado, maior a necessidade de transferências exógenas de energia para mantê-lo equilibrado no curto prazo. 30 De acordo com Darolt (2000), a maioria dos trabalhos de investigação, bem como as orientações técnicas, são direcionadas a componentes do sistema. Entretanto, as maiores carências estão na compreensão do sistema no seu conjunto. Cabe salientar que não somente são poucos os técnicos formados para atender às demandas da agricultura orgânica baseada nas tecnologias de processos, como são ainda em menor número aqueles preparados para utilizar as abordagens participativas para a geração e difusão de práticas agrícolas voltadas às especificidades de cada unidade produtiva. 53 Em relação com o paradigma tecnológico "convencional", derivado da Revolução Verde, este tipo de produção orgânica diferencia-se quase que exclusivamente pelo uso de insumos "limpos", o que caracteriza este tipo de produção como uma agricultura de substituição de insumos, pois pouco altera a lógica de produção da agricultura convencional31. A questão que se coloca, então, é como diferenciar e valorar os distintos encaminhamentos tecnológicos quando o produto orgânico passa a ser objeto de transações comerciais. O que tem se verificado em termos gerais é que há a coexistência de produtos orgânicos derivados desses dois encaminhamentos tecnológicos nos distintos mercados de orgânicos. Contudo, de um modo geral o que também vem se observando na atualidade é que há uma tendência a submeter os produtos orgânicos à mesma lógica que orienta o sistema hegemônico do mercado agroalimentar, qual seja, a lógica baseada nas tecnologias de produto. De certa forma o próprio processo de institucionalização da agricultura orgânica tem contribuído para tal situação. No caso brasileiro esta condição pode ser verificada na adoção da definição legal de agricultura orgânica, a partir da Lei n.o 10.831, adotada pelo Ministério de Agricultura e Abastecimento. No mercado mundial essa coexistência está também relacionada à conceituação dada por organismos reconhecidos internacionalmente na área da produção orgânica, tais como a Comissão do Codex Alimentarius (FAO) e a Federação Internacional dos Movimentos de Agricultura Orgânica (IFOAM). No Brasil, segundo a Lei n.o 10.831, de 23 de dezembro de 2003, publicada em 24/12/2003, Art. 1.o, a produção orgânica passa a ser definida como: toda aquela em que se adotam técnicas específicas, mediante a otimização do uso de recursos naturais e socioeconômicos disponíveis e o respeito à integridade cultural das comunidades rurais, tendo por objetivo a sustentabilidade econômica e ecológica, a maximização dos benefícios sociais, a minimização da dependência de energias não-renováveis, empregando, sempre que possível, métodos culturais, biológicos e mecânicos, em contraposição ao uso de materiais sintéticos, a eliminação do uso de organismos geneticamente modificados e radiações ionizantes, em qualquer fase do processo de produção, processamento, armazenamento, distribuição e comercialização, e a proteção do meio ambiente. Na definição da Comissão do Codex Alimentarius, a agricultura orgânica é: um sistema global de gestão da produção que fomenta e realça a saúde dos agroecossistemas, inclusive a diversidade biológica, os ciclos biológicos e a 31 A produção convencional caracteriza-se pela mecanização do processo de produção, monocultura, ocupação de extensas áreas de produção, utilização de um conjunto homogêneo de práticas tecnológicas, de variedades vegetais geneticamente melhoradas, muito exigentes em fertilizantes químicos de alta solubilidade, de agrotóxicos com maior poder biocida, de irrigação e motomecanização. A adoção deste modelo de produção também supõe a implementação de novos métodos de gestão administrativa, técnica e de apropriação do meio ambiente. 54 atividade biológica do solo. Isto se consegue aplicando, sempre que possível, métodos agronômicos, biológicos e mecânicos, em contraposição à utilização de materiais sintéticos, para desempenhar qualquer função específica dentro do sistema. (CODEX ALIMENTARIUS, 1999, p.9) Segundo a IFOAM, a agricultura orgânica ou ecológica é definida como: todos os sistemas agrícolas que promovem a produção sadia e segura de alimentos e fibras têxteis desde o ponto de vista ambiental, social e econômico. Estes sistemas partem da fertilidade do solo como base para uma boa produção. Respeitando as exigências e capacidades naturais das plantas, os animais e a paisagem, procura otimizar a qualidade da agricultura e do meio ambiente em todos os seus aspectos. A agricultura orgânica reduz consideravelmente as necessidades de aportes externos ao não utilizar adubos químicos nem praguicidas ou outros produtos de sínteses. No seu lugar permite que sejam as poderosas leis da natureza as que incrementem tanto os rendimentos como a resistência dos cultivos. (INTERNATIONAL FEDERATION OF ORGANIC AGRICULTURE MOVEMENTS, 1995, p.12) Como se observa, essas definições permitem contemplar, em maior ou menor medida, a existência de estabelecimentos de produção orgânica nos quais as práticas agrícolas visam à substituição de insumos sintéticos, baseando-se nas tecnologias de produto, através do aporte de insumos alternativos geralmente externos à propriedade, como adubos orgânicos e defensivos naturais, com produção orgânica inclusive monocultural. Da mesma forma que se contemplam as tecnologias de processo, em que a agricultura orgânica tem por objetivo o manejo integral da unidade de produção agrícola, os princípios de promoção da agrobiodiversidade e os ciclos biológicos visam à sustentabilidade social, ambiental e econômica da unidade. Segundo Assis e Romeiro (2002, p.18), citando Fonseca (2000), para os objetivos gerais relativos ao mercado o que se percebe é que se tem utilizado uma restrita definição de agricultura orgânica, normatizando os padrões orgânicos na medida em que se estipula a proibição do uso de alguns insumos e se dita uma gama de práticas a serem seguidas. Constata-se, assim, uma sobrevalorização do produto em si em detrimento da importância da forma como este é produzido, o que, em certa medida, implica um reducionismo na visão do necessário equilíbrio do agroecossistema, em que se passa a enfocar o que é ou não permitido. Do ponto de vista do processo de difusão tecnológica, o cumprimento das normas de produção e a consideração das técnicas recomendadas para a produção orgânica com ênfase no uso de tecnologias de processo estabelecem as necessidades de aprendizado de técnicas de produção coerentes com esse enfoque produtivo. Para Weid (2001), dadas as peculiaridades desse enfoque produtivo, particularmente a necessidade de desenhos específicos de produção para cada situação em particular, os conhecimentos não podem ser produzidos de forma homogênea para uso massivo pelos agricultores. Esta peculiaridade é contrária às características dos paradigmas dominantes na 55 pesquisa e na extensão rural, que buscam produzir e disseminar pacotes tecnológicos a serem aplicados com baixo índice de diferenciação.32 Cabe destacar, também, que a adoção da produção orgânica baseada nas tecnologias de processo exige pesquisa e, particularmente, experimentação. Segundo Padel (2001), na implantação do sistema de produção orgânico é essencial a informação e conhecimento de como usar essa tecnologia, ou seja, o domínio prático dessa tecnologia, assim como as informações de avaliação do desempenho da inovação. A aquisição de conhecimentos e habilidades para o desenho desses sistemas é mais eficiente na medida em que existe tanto uma maior incorporação dos conhecimentos científicos como uma mobilização de conhecimentos e habilidades dos próprios agricultores. Nesse sentido, observa-se que os agricultores que já tiveram experiência com práticas nãoconvencionais possuem maior facilidade e demandam menor tempo para o aprendizado e organização do manejo orgânico, o que facilita em grande medida o processo de conversão. Por outro lado, segundo Darolt (2000), os agricultores convencionais, que têm maior contato com o mercado, caracterizam-se por não terem dificuldades de organização e obtenção de informações técnicas e comerciais. Suas dificuldades estão mais relacionadas às perdas iniciais de produtividade em face da mudança para a agricultura orgânica. Embora se saiba das limitações de formação e informação existentes entre os próprios técnicos que atuam apoiando a produção orgânica, seja no nível governamental como no não-governamental, Ruault (2002) destaca alguns elementos a serem considerados quando do processo de conversão da agricultura convencional à orgânica, principalmente quando se trata das tecnologias de processo: - necessidade de ações de formação, diante do papel essencial do conhecimento; - desenvolvimento de formas de trabalho baseadas na troca de experiência entre agricultores e técnicos; - multiplicação dos programas de experimentação, com o objetivo de produzir referências técnico-econômicas, sociais e ambientais. Cabe destacar ainda um outro fator relevante para abordar o sistema de produção da agricultura orgânica, que é a inovação tecnológica. Veiga (1996) aborda esta questão quando discute as possibilidades atuais de os sistemas de produção agrícola passarem por um processo de transição para uma agricultura com base na sustentabilidade ambiental, 32 As abordagens participativas para a geração e difusão de tecnologias de produção orgânica apostam na capacidade individual e coletiva dos agricultores de reavaliar os seus conhecimentos herdados, ou próprios, e de apreender as técnicas de agricultura orgânica, de modo a construírem eles mesmos novos desenhos de sistemas agrícolas por meio de experimentação e aprimoramento, em permanente processo de socialização de conhecimentos. 56 denominada pelo autor como a possibilidade da transição. O autor trabalha a idéia de inovação como estando inserida num quadro onde mudanças tecnológicas são decorrentes de mudanças socioculturais, ou seja, há nas tecnologias a "marca social" do momento histórico e dos conflitos presentes.33 Ao tratar da possibilidade da transição agroambiental, por meio da agricultura orgânica, o autor destaca que foram as exigências sociais relativas às questões ambientais que impulsionaram os processos de transição em curso. Mais ainda, corroborando outros autores, menciona que é a agricultura familiar que possui vantagens comparativas nesse processo de transição, em comparação à agricultura patronal, pois esta última, além de especializada, tem alta concentração de renda e exclusão social. Quanto à agricultura familiar, "além das vantagens socioculturais, dado seu perfil distributivo, também sob o prisma da sustentabilidade (estabilidade, resiliência e eqüidade) são muitas as vantagens apresentadas desde a diversificação e a maior maleabilidade no seu processo decisório" (VEIGA, 1996). No item a seguir procura-se identificar quais são as potencialidades e os limites da agricultura familiar com relação ao sistema de produção da agricultura orgânica. 2.3.2 A Agricultura Familiar e a Produção Orgânica: Potencialidades e Necessidades Tecnológicas Antes de abordar as potencialidades e necessidades tecnológicas da agricultura familiar para desenvolver a agricultura orgânica, é importante explicitar brevemente o que se entende por agricultura familiar. A agricultura familiar é tratada na literatura especializada como uma noção em processo de construção, e seu reconhecimento está baseado em três elementos centrais que se articulam: a família, o trabalho e a propriedade. A partir de um amplo estudo realizado em cinco países, Lamarche (1993, p.15) diz que a agricultura familiar corresponde a uma unidade de produção agrícola onde propriedade e trabalho estão intimamente ligados à família. A interdependência destes três fatores no funcionamento da unidade engendra necessariamente noções mais abstratas e complexas, tais como a transmissão do patrimônio e a reprodução da unidade. Desde meados dos anos 90 do século passado muitos estudos têm sublinhado o caráter familiar de inúmeros estabelecimentos agrícolas, tanto no Brasil como em outros países, o que tem conduzido a um debate que possa caracterizar as diferenças desta forma 33 Tal debate decorre do trabalho de dois autores franceses, Pierre Dockès e Bernard Rosier (1992), apresentados por José Eli da Veiga (1996, p.7). 57 de produção com relação à forma camponesa à agricultura patronal.34 Um dos aspectos centrais que diferenciam e dão corpo à noção é o papel que a família ocupa no trabalho da unidade e como gestora das decisões, da organização e dos rumos do estabelecimento, nem sempre orientando-se por premissas econômicas, mas reportando-se a outras lógicas e estratégias. A partir dos elementos centrais, o que os estudos mostram como essencial é que não se está diante de uma categoria homogênea, ao contrário, trata-se de uma categoria que comporta em si mesma a diversidade, resultando em diferentes combinações e formas, dependendo dos aspectos sociais, históricos e políticos em que se inserem os agricultores. Para compreender a diversidade, Lamarche (1993) propõe que seja tomado como eixo orientador o grau de integração das explorações familiares com o mercado, bem como o grau de dependência do trabalho da família no processo de produção agrícola. Isso permite evidenciar distintas situações, desde aquelas unidades agrícolas regidas exclusivamente pela produção para a reprodução da família, até aquelas cuja produção se norteia por uma racionalidade empresarial capitalista. O autor salienta que se deve considerar que cada situação desdobra-se "numa determinada relação com a sociedade de consumo, um determinado modo de vida e de representação" (LAMARCHE, 1993). Buainan e Pires (2003, p.34), ao analisarem a agricultura familiar no Brasil e contemplarem o plano técnico-econômico, destacam que a metade dos estabelecimentos de tipo familiar (49,8%) depende exclusivamente da força física dos seus integrantes para realizar as tarefas agrícolas necessárias para a produção, como arar, semear, capinar e colher. Todas essas atividades são realizadas praticamente com o uso de apenas dois instrumentos – foice e enxada –, acrescido do uso de fogo para queimar e limpar a floresta ou os pastos, revelando a simplicidade tecnológica no manejo produtivo. Evidenciando a diversidade nas formas de produção e relação com o mercado, ressaltam que no caso da Região Sul do País, considerada a principal área de concentração da agricultura familiar no Brasil, além desses dois instrumentos, outros meios de produção, como a tração mecânica e animal, são mais usados, sendo que para parcela significativa dos agricultores familiares a força manual é combinada com o uso de outras tecnologias. Nessa região a maioria dos agricultores familiares pratica, com distinta intensidade, a policultura, a complementaridade entre atividades pecuárias e agrícolas, e o uso de insumos próprios durante o processo de produção. A maioria desses agricultores observa sistemas diversificados que incluem desde a produção/comercialização de suínos, leite, aves, milho, feijão, até soja e fruta. 34 Ver, para o caso brasileiro, Abramovay (1992) e Wanderley (1996), bem como Lamarche (1993), que coordenou um estudo sobre o tema em cinco países: Canadá, França, Turquia, Polônia e Brasil. 58 Nesse contexto é que se tem considerado que a agricultura familiar é aquela que reúne as condições mais favoráveis ao desenvolvimento da produção orgânica35, tanto no Brasil como nos demais países. Mas é importante ter em mente que também aqui se está tratando da diversidade, ou seja, os agricultores familiares que praticam a agricultura orgânica também não são uma categoria homogênea. Embora não se pretenda aprofundar a discussão sobre as características ou o perfil do atual agricultor orgânico, o objetivo aqui é destacar a heterogeneidade das formas presentes, no sentido de estimular o aprofundamento do conhecimento sobre tais agricultores, não só com relação ao perfil e características, mas principalmente no que tange à relação com os diversos tipos de mercado. Embora a literatura não apresente uma tipologia para categorizar os agricultores familiares que praticam a agricultura orgânica, vai-se partir de estudos realizados no Paraná com agricultores familiares orgânicos para se sugerir que se está tratando de pelo menos três grupos distintos36 – agricultores familiares orgânicos tradicionais, neorurais37 e migrantes: - agricultor familiar orgânico tradicional: é considerado como uma certa 'condição camponesa', cuja vida se reproduz material, social e culturalmente no meio rural, o que o diferencia dentre outros segmentos sociais; - agricultor familiar orgânico neorural38: é aquele que, por livre escolha, bem precisa e particular, decide não mais morar na cidade e não mais trabalhar em profissões urbanas, resolvendo mudar para o campo e trabalhar na agricultura ou criação de animais; - agricultor familiar orgânico migrante: é aquele que migra para a cidade, vive um período de experiências urbanas e retorna posteriormente à agricultura. 35 Ver artigo de Carmo (1998) que explora a temática. 36 Esta tipologia é proposta a partir do trabalho de Karam (2001), que, ao estudar os agricultores orgânicos da região metropolitana de Curitiba, adotou como principal critério para diferenciar os grupos de agricultores que pesquisaram a trajetória de vida do responsável pela unidade produtiva, diferenciando dois grupos, o dos agricultores tradicionais e o dos neorurais. Hernández (2005), além de adotar a tipologia, identificou ainda um terceiro grupo, propondo mais uma categoria, a de agricultores orgânicos migrantes. 37 Karam (2001, p.140-141), para estabelecer a tipologia proposta – agricultor orgânico tradicional e agricultor orgânico neorural –, estudou 57 famílias da região metropolitana de Curitiba, e construiu um indicador de diferenciação dos dois grupos a partir de cinco variáveis aplicadas ao responsável pela produção de orgânicos. São elas: local de nascimento do responsável; tempo na atividade agrícola; história de migração do responsável; antepassados do responsável na atividade agrícola; e origem da atual propriedade rural. 38 A noção de neorural utilizada é proposta por Giuliani (1990, p.60), a partir de referência a estudos na França. 59 Tal tipologia parece útil para se refletir sobre o perfil e as características dos agricultores familiares orgânicos do Paraná, bem como sobre as distintas relações que possam existir entre eles e os tipos de mercado. Com relação aos mercados é importante considerar a proximidade ou distância dos agricultores de aglomerações urbanas. Bianchini (2001) chama a atenção para tal condição, destacando que a proximidade com centros urbanos parece propiciar ao agricultor familiar mais oportunidades de acesso aos diferentes mercados para produtos; maior disponibilidade de recursos humanos, em especial de profissionais qualificados em diversas áreas, inexistentes em municípios mais isolados; facilidades para encaminhar reivindicações e negociar demandas junto às estruturas regionais do governo estadual, assim como maiores possibilidades de participar de estruturas sociais de cooperação. Os elementos apresentados até o momento indicam a potencialidade social da agricultura familiar à prática da agricultura orgânica. Contudo, é importante refletir sobre tais potencialidades verificando quais são os elementos facilitadores e quais as necessidades. Em relação às potencialidades, cabe ressaltar a importância da centralização da gestão da produção e do trabalho numa mesma figura que possui os mesmos interesses: a família. Esta característica permite estabelecer uma relação mais estreita entre ambos os processos, diminuindo o custo de gestão e supervisão de mão-de-obra, necessários ao controle da qualidade do processo de produção.39 Dado que a propriedade familiar é tanto um espaço de produção como um espaço de estabelecimento e reprodução da família, isto é, a terra e seus recursos não são apenas uma fonte objetiva de renda, mas também uma fonte de vida, existe a preocupação pela preservação dos recursos naturais. Esta preocupação facilita a incorporação dos princípios ecológicos, fazendo da agricultura familiar o principal veículo de transição para a agricultura baseada nestes princípios. A vida da família na propriedade também possibilita o conhecimento detalhado dos diversos ambientes da propriedade, o que, sem dúvida, facilita o desenho específico de sistemas produtivos. Uma outra característica da agricultura familiar que se apresenta como um elemento facilitador na adoção da agricultura orgânica é o tamanho da propriedade familiar. A agricultura orgânica, que enfatiza o uso de tecnologia de processos, dada a sua complexidade, é dificilmente adaptável a operações agrícolas de larga escala, já que não admite mecanização pesada e exige uma gestão do uso do espaço e do tempo bastante elaborada.40 39 Como já se mencionou, a gestão do uso do espaço e do tempo na agricultura orgânica é bastante elaborada e pouco adaptada ao emprego de mão-de-obra contratada, normalmente despreparada para os cuidados do manejo ambiental, ou desinteressada por eles. 40 Cabe ressaltar que, segundo Weid (2001, p.63), teoricamente nada impede a adoção da agricultura orgânica em grandes propriedades, mas a prática mostra que as exigências de conhecimentos no manejo de ambientes diversificados tornam o uso de assalariados pouco eficiente. Apesar dos limites estruturais para a 60 Outras peculiaridades da produção familiar, como a diversificação da produção, a integração entre produção animal e vegetal, a cultura de policultivo e utilização de insumos internos, também facilitam a adoção da visão sistêmica da unidade de produção, a qual, como já se mencionou, está baseada, entre outros fatores, na integração e diversificação das atividades produtivas, assim como no uso de insumos internos no processo de produção. Cabe mencionar também a grande habilidade de observação e de experimentação, e inclusive de experiência com técnicas de produção orgânica que caracteriza os agricultores familiares, o que facilita a receptividade, a capacidade de absorção de conhecimento tecnológico e o domínio prático da tecnologia. No que diz respeito às necessidades, dentre os fatores limitantes destacam-se o conhecimento sobre os sistemas de garantia – a certificação –, sejam os participativos ou por auditagem, o acesso e o aprimoramento de informações e conhecimentos técnicos relativos ao próprio sistema de produção orgânico baseado em tecnologias de processo.41 Ressalta-se também a necessidade do conhecimento e uso de tecnologias de gestão, em especial de ferramentas de planejamento estratégico do processo de produção, assim como dos serviços financeiros disponíveis no mercado para agricultura orgânica42, particularmente para a conversão tecnológica, pois sabe-se que, à medida que o tempo e a intensidade de adoção do sistema convencional forem maiores, maiores serão os recursos financeiros necessários para a conversão. Destaca-se ainda a necessidade de conhecimento sobre as diferentes possibilidades de mercados e o funcionamento destes. O agricultor, via de regra, dada a hegemonia do sistema do mercado agroalimentar, sente-se subordinado e inseguro em estabelecer outras condições e demandar novas relações, tornando-se um ator relevante no processo de construção social de mercados, onde as regras não necessariamente estão todas dadas, havendo as condições para novas negociações e disputas. plena adoção desta agricultura orgânica nas grandes propriedades, qualquer mudança nos padrões de produção que represente de fato menos perda de solo, menos desperdício de água, menos consumo de energia, menos perda de biodiversidade e menor contaminação deve ser considerada positiva no processo de transição para a produção com maior grau de sustentabilidade. 41 Segundo Padel (2001), o obstáculo maior, do ponto de vista técnico-organizacional, é a falta de informação e conhecimento tanto no que se refere às normas e técnicas do sistema de produção orgânico – particularmente ao modo como usar essa tecnologia e ao domínio prático desta – como às tecnologias de gestão, em especial as ferramentas de planejamento. 42 Cabe mencionar que, apesar do crescimento da produção orgânica, existem poucas linhas de crédito específicas para esta agricultura. Isto faz com que o agricultor tenha duas dificuldades de distinta ordem: existência limitada de financiamento e desconhecimento de instrumentos de financiamento. 61 O quadro 2.5, a partir do estudo de Hernández (2005), traz uma síntese das potencialidades e necessidades da agricultura familiar no desenvolvimento da agricultura orgânica no que se refere a aspectos socioeconômicos e técnico-organizacionais. QUADRO 2.5 - POTENCIALIDADES E NECESSIDADES DA AGRICULTURA FAMILIAR NO DESENVOLVIMENTO DA AGRICULTURA ORGÂNICA - RMC - PARANÁ ASPECTOS POTENCIALIDADES - A gestão e o trabalho da unidade estão NECESSIDADES - Conhecimento dos serviços financeiros centralizados numa mesma figura: a família. disponíveis para a conversão tecnológica. À Esta característica facilita a qualificação e medida que o tempo e a intensidade de adoção Aspectos ajuste entre a gestão e a realização do do sistema convencional forem maiores, maiores socioeconômicos processo de produção. serão os recursos financeiros necessários para A propriedade é uma fonte de renda e de vida, o a conversão. - que facilita sua preservação e seu conhecimento. - Conhecimento de mercados específicos e de seu funcionamento. - Aspectos técnico- - organizacionais Tamanho da unidade de produção. O pequeno - Conhecimento e adequação às normas para a e médio portes das unidades de produção obtenção do selo orgânico. familiar facilitam o conhecimento, gestão e uso do espaço, requisitos indispensáveis para o conhecimentos técnicos adequados ao sistema desenho específico de sistemas produtivos. de produção orgânico. Diversificação da produção, integração entre - Acesso e aprimoramento de informações e Uso de tecnologias de gestão, particularmente produção animal e vegetal, cultura de policultivo de ferramentas de planejamento estratégico e utilização de insumos internos. Esta do processo de produção. característica facilita a visão sistêmica da unidade. - Facilidade na aquisição de conhecimentos a partir da observação e experimentação. FONTE: Hernández (2005) É preciso destacar o que menciona Hernández (2005), que toda necessidade de aprendizado traduz-se em um ponto de ruptura, e que este também advém das necessidades de des-aprendizado de determinados conceitos, técnicas e práticas culturais, como o uso de insumos e defensivos agrícolas. Nesse sentido, é fundamental exercitar a capacidade de desaprender, suplantando o aprendido pela aquisição de novas ferramentas. E, a capacidade de aprender, por sua vez, é necessária para adquirir novos conhecimentos, para ajustar e atualizar o conhecimento existente. As reflexões apresentadas aqui têm um impacto no que se refere aos tipos de mercado e ao consumo de orgânicos. O item a seguir procura mostrar que a temática relativa ao consumo tem enfatizado o consumidor individual, o qual se relaciona de forma mais direta com os produtos orgânicos em si, muitas vezes desconhecedor dos processos que envolvem o sistema de produção. Ao mesmo tempo destaca-se a emergência de um outro tipo de consumo, o consumo coletivo, estimulado por ações e programas do poder público, como a merenda escolar e o programa de aquisição de alimentos, capitaneado pelo mercado institucional. 62 2.4 O CONSUMO DE PRODUTOS ORGÂNICOS: UMA CARACTERIZAÇÃO A PARTIR DO CONSUMIDOR O consumo e o consumidor de alimentos orgânicos constituem mais um dos elementos relevantes para se conhecer o mercado de orgânicos. Entretanto, grande parte dos estudos sobre o tema tem sido direcionada apenas ao conhecimento sobre o consumidor individual, focando as atitudes, motivações e freios para a aquisição dos produtos. Reconhecidamente o consumidor urbano tem desempenhado um papel relevante na construção do mercado de orgânicos, particularmente a partir dos anos 70, mobilizado por inúmeras denúncias sobre os efeitos negativos da agricultura industrial ao meio ambiente. A atuação de vários movimentos sociais propugnando a necessidade de se apoiar sistemas de produção agrícola sustentável ambiental e socioeconomicamente contribuiu substantivamente para o apelo dos consumidores por alimentos de qualidade, benéficos à saúde humana e dos recursos naturais. Contudo, embora a maior parte dos movimentos visasse tratar a produção alimentar sustentável numa perspectiva das tecnologias de processo43, destacando também a identidade dos alimentos com seus locais de origem, a não padronização alimentar e a relação entre produção, produtores e consumidores, o que tem se verificado é que o consumidor permanece fixado no produto orgânico em si. Esta condição se ressalta à medida que se analisam os estudos relativos ao tema, os quais, em sua maioria, abordam o consumidor no que tange ao perfil e características, bem como as razões que o estimulam ao consumo dos produtos orgânicos. Schmidt (2004), ao estudar o consumidor "entre a intenção e o gesto" de comprar, menciona que, ainda que as idéias e o discurso sejam importantes, ou seja, as razões de consumo, é somente pelo ato da compra consciente – informada, refletida – que o consumidor torna-se, de fato, propulsor do sistema de produção da agricultura orgânica. Nesse sentido, a autora atenta para o fato de que estudar o consumo de alimentos orgânicos desta perspectiva é, portanto, uma tarefa complexa e multifacetada. Apesar de tais limitações, julga-se pertinente, no contexto deste estudo, apresentar uma breve análise que permita apreender a perspectiva do consumidor de alimentos orgânicos a partir de alguns estudos já realizados, oferecendo pistas para se pensar em novos estudos sobre a questão do consumo. Além disso, inclui-se também uma breve reflexão sobre um outro consumidor, o qual denominou-se consumidor coletivo, isto é, aquele que tem acessado os produtos orgânicos através de programas pelo mercado institucional, como a merenda escolar orgânica e o Programa de Aquisição de Alimentos – PAA (MDS/Programa Fome Zero/CONAB). 43 Ver o item 2.3 deste trabalho, onde se apresenta esta discussão. 63 2.4.1 O Consumidor de Produtos Orgânicos Nos últimos anos os estudos vêm mostrando interesse crescente pelas atitudes e preocupações dos consumidores relacionadas aos alimentos orgânicos. Naspetti e Zanoli (2005) mostraram que existem percepções diferenciadas para a compra, dependendo do país. O quadro 2.6 resume os três principais motivos para a compra de orgânicos em alguns países da União Européia, comparados com as tendências no Brasil. QUADRO 2.6 - PRINCIPAIS MOTIVOS PARA A COMPRA DE ORGÂNICOS PELOS CONSUMIDORES EM PAÍSES DA EUROPA E BRASIL PAÍSES MOTIVOS PARA A COMPRA Áustria Saúde Suíça Melhor sabor dos alimentos Responsabilidade com a alimentação Contribuição para o das crianças desenvolvimento regional Saúde Preocupação com o meio ambiente, bem-estar animal, remuneração dos agricultores Alemanha Saúde própria e das crianças Dinamarca e Estilo de vida, proteção Finlândia ambiental França e Itália Saúde Inglaterra Saúde Apoio aos agricultores e às lojas de Melhor sabor dos alimentos orgânicos Saúde própria Contribuição para um mundo melhor, consciência, bem-estar animal Melhor sabor dos alimentos Respeito à vida Apoio à agricultura local e comércio Proteção ao meio ambiente justo Brasil Saúde própria e da família Segurança alimentar (menos Filosofia de vida agrotóxicos) FONTES: Sylvander et al. (2005), Darolt (2005) De forma geral, as pesquisas realizadas em diferentes países44 apresentam tendências semelhantes, apontando em primeiro lugar preocupação com aspectos relacionados à própria saúde e à saúde da família e sua ligação com a segurança dos alimentos, principalmente em relação à saúde contaminação por agrotóxicos e outros agentes químicos. Em seguida, aspectos como cuidados com o meio ambiente e qualidades organolépticas do alimento (sabor, cheiro, frescor) são citados como fatores que impulsionam as vendas. O estilo e filosofia de vida são fatores complementares que motivam a compra de orgânicos. 44 Alemanha e Inglaterra (WOODWARD; MEIER-PLOEGER, 1999 e MAKATOUNI, 2002, respectivamente); Austrália (PEARSON, 1999); Estados Unidos (HENDERSON, 1999); França (SYLVANDER, 1998; SYLVANDER et al., 2005); Dinamarca e Noruega (DUBGAARD; HOLST, 1994 e SOGN; PERSILLET; SYLVANDER, 2002, respectivamente); Polônia (ZAKOWSKA-BIEMANS, 2002); Espanha (SOLER; GIL; SÁNCHEZ, 2002) e Costa Rica (AGUIRRE; TUMLTY, 2002) e Argentina (RODRIGUEZ; LACAZE, 2005). 64 No Brasil, a principal razão para a compra de alimentos orgânicos também está ligada à preocupação com a saúde. Uma pesquisa realizada nos estados do Sul e Sudeste do País mostrou que 53% das pessoas entrevistadas responderam que têm o hábito de consumir alimentos orgânicos, principalmente aqueles consumidores com maior poder aquisitivo (60%). Declararam que os principais motivos para o consumo desses alimentos são a preocupação com a saúde e o receio de consumir produtos com agrotóxicos (DATACENSO, 2002). Fonseca (2005), em pesquisa realizada com consumidores da Região Sudeste, confirma o interesse destes quanto à questão da saúde. A autora mostra que, entre as informações mais procuradas pelos consumidores, estão as referentes à composição e ao valor nutricional dos alimentos orgânicos, bem como informações sobre o auxílio na prevenção de doenças. Ainda nessa região, Vilas Boas et al. (2005), ao realizarem uma pesquisa em feiras orgânicas de Belo Horizonte, identificaram que valores como "viver bem a vida", "harmonia/equilíbrio", "qualidade de vida" e "longevidade" também fazem parte dos argumentos dos consumidores para a compra de alimentos orgânicos. As atitudes dos consumidores de produtos orgânicos, comparadas com as da população de modo geral, aproximam-se muito das de um consumidor consciente. Segundo pesquisa do Instituto Akatu (2004), um consumidor consciente apresenta diferença no ato de ir às compras em relação à maioria da população, mostrando disposição em transformar em prática os valores com os quais se identifica, tende a se preocupar com a comunidade em que vive e usa o seu poder de consumidor cidadão. Numa tentativa de tipificação, pode-se identificar dois tipos de consumidores orgânicos no Brasil (quadro 2.7). O primeiro é o dos consumidores mais antigos, que são motivados, bem informados e exigentes em termos de qualidade biológica do produto. Normalmente são os freqüentadores das feiras e lojas especializadas de orgânicos e têm maior nível de consciência ambiental em relação à população. QUADRO 2.7 - CARACTERÍSTICAS DOS CONSUMIDORES DE PRODUTOS ORGÂNICOS NO BRASIL CARACTERÍSTICAS Ato de ir à compra de produtos NOVO CONSUMIDOR Ocasional ANTIGO CONSUMIDOR Regular (fidelidade) orgânicos Tempo de consumo Menos de 5 anos Mais de 5 anos Preferência de local de compra Supermercados Feiras e lojas Preço suplementar (disposição para Até 15% Até 30% Saúde e segurança alimentar (menos Saúde, preocupação com o meio pagar mais) Qualidade percebida pelo consumidor agrotóxicos) ambiente, qualidade de vida Limitantes para a compra Preço, falta de informação Procedência (origem do produto) Valores Comprometido (1) Consciente (2) FONTE: Darolt (2005) (1) Trata-se de consumidores preocupados com a coletividade, porém existe uma distância entre seu discurso e sua prática. (2) Trata-se de consumidores preocupados com a coletividade e a melhoria da comunidade em que vivem, transformando discurso em prática. 65 Um segundo tipo, mais recente e ainda pouco estudado, é o consumidor das redes de supermercados, que, de acordo com os estudos, embora também mencione preocupações com a questão ambiental, compra mais por impulso e de forma menos regular, comparativamente com o grupo anterior. Uma outra pesquisa de opinião pública, desta vez direcionada aos alimentos orgânicos, foi realizada pelo Instituto Gallup45 no município de São Paulo. Os resultados mostraram que os compradores de legumes e verduras já têm consciência da toxicidade dos produtos cultivados com agrotóxicos e da dificuldade de produzi-los sem agrotóxicos. Por isso, segundo a pesquisa, esses consumidores admitem pagar entre 20% e 30% a mais pelos produtos orgânicos, desde que devidamente assegurados de que estes são mais saudáveis que os produtos convencionais. No que se refere ao perfil dos consumidores de produtos orgânicos, algumas pesquisas realizadas no sul do Brasil (DAROLT, 2002a; KARAM; ZOLDAN, 2003; e KIRCHNER, 2006) mostraram que o consumidor orgânico é predominantemente do sexo feminino, atua como profissional liberal ou funcionário público, sua idade varia entre 31 e 50 anos, com famílias de 3 a 4 membros. Os dados mostram ainda que a maioria é usuária de internet, com renda entre 9 e 12 salários mínimos, apresentando nível de instrução correspondente ao ensino superior completo. Com relação aos jovens com menos de 20 anos, os estudos têm apontado que a presença deles nos locais de vendas de orgânicos é praticamente insignificante, menos de 2%. De um modo geral também se aponta como características dos consumidores de orgânicos o hábito de praticar esportes com freqüência e, mesmo morando na cidade, procurarem um estilo de vida que permita o contato com a natureza, o que os faz freqüentadores de áreas verdes urbanas e rurais. Além disso, são pessoas que privilegiam terapias e medicina alternativas, tanto no tratamento da saúde como na manutenção da qualidade de vida. Fatores limitantes apontados pelo consumidor de orgânicos Ao estudar quatro países da Europa (Itália, Inglaterra, França e Alemanha), Sylvander (1998) mostrou que entre as principais razões para o baixo consumo de produtos orgânicos estão, em primeiro lugar, os preços, em seguida a oferta insuficiente e, em terceiro, a dúvida em relação à procedência do produto. A pesquisa indicou ainda a necessidade de maior sensibilização dos consumidores quanto aos benefícios dos alimentos orgânicos, visto que, 45 A pesquisa, patrocinada pelo Sítio "A Boa Terra", uma empresa agrícola que produz e comercializa hortaliças orgânicas no município de São Paulo, foi realizada entre novembro e dezembro de 1996, com o objetivo de conhecer a aceitabilidade dos legumes e verduras orgânicos que estavam sendo comercializados na cidade de São Paulo. 66 em 72% dos casos, as informações sobre o processo de produção e comercialização eram insuficientes ou inadequadas. Karam e Zoldan (2003) chegaram a conclusões semelhantes ao investigarem o consumo de orgânicos na região da grande Florianópolis, no Estado de Santa Catarina. Em estudo realizado em Curitiba, Kirchner (2006) mostrou que o problema de preços altos de produtos orgânicos é verdadeiro quando se comparam redes de supermercados e feiras orgânicas. Para uma cesta de treze produtos, a diferença de preços chegou a valores médios superiores de 118% nos supermercados. A média de preços por produto na feira orgânica é de R$ 1,75, enquanto no supermercado este valor é de R$ 3,82. Por outro lado, quando se comparam os preços de uma mesma cesta de produtos em feiras orgânica e convencional, constata-se que não existe diferença significativa entre os preços dos produtos. No caso dos supermercados, como o sistema de comercialização agroalimentar está hegemonicamente concentrado nas redes de varejo (super e hipermercados), constituindo o local predominante de abastecimento alimentar da população urbana, a idéia de que o produto orgânico é mais caro fica evidente quando este é comparado ao produto convencional. Entretanto, na maioria das vezes as razões para essa diferença de preços são desconhecidas pelo consumidor, uma vez que poucos conhecem as relações mercantis46 que se estabelecem entre os supermercadistas e os comerciantes e/ou produtores de alimentos orgânicos. Os estudos mostram também que, além do alto preço praticado pelos supermercados, há o problema da oferta insuficiente, traduzida na falta de produtos em termos de quantidade e regularidade. Outro ponto a ser considerado refere-se à falta de informações a respeito dos alimentos orgânicos. Normalmente misturados com produtos hidropônicos, convencionais higienizados e minimamente processados, os orgânicos acabam por receber tratamento semelhante ao dos convencionais, gerando confusão e desconfiança por parte do consumidor. Ainda com relação à oferta insuficiente dos produtos orgânicos, Darolt (2002a) aponta que os consumidores mencionam como problema principal a falta de regularidade, a pouca diversidade e, em seguida, a pouca quantidade. Embora considerem a qualidade de "boa a excelente", afirmam que a pouca variedade de produtos, sobretudo frutas, cereais e produtos de origem animal, dificulta a manutenção de uma dieta orgânica no dia-a-dia. Quanto ao terceiro fator limitante apontado por Silvander (1998), isto é, a dúvida em relação à procedência do produto, resultados da pesquisa realizada no Brasil pelo Datacenso (2002) mostraram que, apesar de a maioria das pessoas ser favorável à certificação, cerca de 54% não se preocupa em comprovar ou não considera relevante o selo de certificação nos produtos orgânicos. Resultados semelhantes foram encontrados no estudo conduzido na Região Sudeste do País por Guivant et al. (2003). 46 Ver item 3.3 deste trabalho, que trata da questão. 67 Em face dos aspectos limitantes apontados pelos consumidores, os agricultores contra-argumentam apresentando os fatores que lhes são impeditivos para atender às demandas. Dentre estes está a falta de políticas públicas direcionadas ao setor, a falta de crédito para o período de transição e a ausência continuada de assistência técnica, não só no planejamento da produção mas também nos processos que envolvem a comercialização. Mencionam também aspectos relacionados à escala de produção, bem como à logística que envolve o transporte e a distribuição, como fatores que acabam por onerar o preço dos produtos orgânicos, principalmente quando estes são destinados aos supermercados. Estratégias de sensibilização para o consumo de orgânicos Para Fonseca (2005), a demanda por produtos orgânicos acaba por pressionar diferentes organizações no sentido de sensibilizar, satisfazer e proteger os consumidores, dando-lhes garantia de que o produto está em conformidade com o que é apresentado. Dadas as características predominantes do atual mercado agroalimentar, é por meio da certificação, do selo e da rotulagem que vem se dando a garantia dos produtos orgânicos aos consumidores, em particular naqueles estabelecimentos do varejo onde esses desconhecem completamente a origem e o processo de produção. Outros estudos têm mostrado que a questão da certificação é bastante flexibilizada naqueles ambientes em que predominam relações características de circuitos locais de comercialização. Nestes, as estratégias baseiam-se em relações de confiança que, normalmente, têm raízes em um processo histórico ou de reconhecimento de competência técnica e reputação em âmbito local, como é o caso das feiras, da distribuição de cestas, das lojas de produtos naturais e outras redes sociais. Algumas estratégias de fortalecimento do mercado orgânico local e regional vêm sendo desencadeadas em vários locais do País, não só nas grandes como nas médias e pequenas cidades, envolvendo uma rede de atores que abrange produtores, consumidores, ONGs, iniciativa privada e poder público. A materialização de tais ações se expressa na comercialização de produtos orgânicos em feiras mistas ou exclusivas, associações de produtores, organizações de consumidores, restaurantes, lojas e pequeno varejo, bem como em outras iniciativas de comércio justo e solidário. Darolt (2005) descreve algumas experiências que estão ocorrendo na RMC47 envolvendo diretamente os consumidores e agricultores. Dentre elas destaca a visita orientada de consumidores às propriedades orgânicas, ocasião em que é possível informar e dirimir dúvidas dos consumidores a respeito de diversos aspectos, desde as dificuldades encontradas pelos agricultores, sistema de produção, beneficiamento, comercialização e certificação. Dentre 47 Tais experiências estão sendo executadas pela Associação dos Consumidores de Produtos Orgânicos do Paraná (ACOPA). Para mais informações, consultar o sítio www.acopa.org.br 68 os objetivos de ações dessa natureza está o de buscar contribuir para mudanças de atitude do consumidor, bem como do próprio produtor, por meio do diálogo e do conhecimento. Também faz parte dessa estratégia possibilitar a relação de comercialização direta na propriedade, por meio do sistema "colha-e-pague", que permite uma maior aproximação do consumidor com o alimento. Além disso, no momento da visita valoriza-se a identidade dos alimentos, que se expressa por meio da culinária, seja mediante um almoço com produtos orgânicos na propriedade, seja pela degustação nas feiras livres ou em outros estabelecimentos, situação que ganha significado para além da palavra. O que tem se verificado em tais situações é que há uma troca de informações entre as pessoas envolvidas nessa rede. Novos sabores, receitas e alimentos, com funções de nutrir e curar, transformam-se em uma forma de sensibilização e comunicação, envolvendo valores e o conjunto dos sentidos – paladar, olfato, tato, visão. A venda direta na propriedade, face a face, também tem se revelado uma importante estratégia de comercialização para muitos agricultores, fortalecendo a comunicação entre estes e os consumidores. O resgate dos costumes e tradições locais na forma de produzir, complementado com preços compensadores, qualidade biológica do produto, frescor e sabor são algumas das vantagens desse processo. Contudo, neste caso têm sido essenciais investimentos em infra-estrutura por parte do agricultor (estacionamento, banheiros, placas indicativas) para a recepção de pessoas, situação bastante limitante para a maioria dos agricultores orgânicos. Nessa direção vêm se verificando também estratégias que visam à integração das propriedades orgânicas em circuitos de turismo rural, em que aos processos produtivos agroecológicos soma-se a valorização, pelos consumidores urbanos, da "redescoberta" do meio rural, em que o ambiente natural, os rios com águas limpas e o ar puro integram a paisagem. Uma outra estratégia que tem sido desenvolvida é a de motivar pessoas a formar e participar de organizações de consumidores. Iniciativas têm sido registradas em vários estados brasileiros, as quais têm se desenvolvido e mantido, seja através da divulgação e informação sobre os produtos orgânicos, seja através de processos de comercialização. Na Região Sul a pioneira nesse quadro foi a Cooperativa Ecológica COOLMEIA, fundada em 1978, em Porto Alegre-RS (em 2006 encerrou suas atividades), seguida da COOPET Cooperativa dos Consumidores de Produtos Ecológicos de Três Cachoeiras, fundada em 1999, no município de Três Cachoeiras-RS, e da ACOPA - Associação dos Consumidores de Produtos Orgânicos do Paraná, fundada em 2000, em Curitiba-PR. As feiras exclusivamente de produtos orgânicos, bem como as feiras mistas, têm sido também uma importante estratégia de divulgação e ampliação no consumo de orgânicos. Grande parte dos estudos que têm abordado a temática mostra que a feira tem sido um lugar de encontro, de troca, um espaço privilegiado de educação para o consumo e de ampliação nas relações de confiança para construção do mercado de orgânicos como um projeto de cunho sustentável, colocando como um desafio a expansão desses espaços (feiras/mercados fixos) em todas as cidades. Nesse sentido, é importante salientar aqui a 69 escolha do local para as feiras, pois tem-se verificado que aquelas situadas em parques, praças e bosques têm se mostrado como locais ideais para o sucesso de uma feira de orgânicos, principalmente nas grandes cidades. Muitos dos estudiosos que têm trabalhado na perspectiva do consumidor de orgânicos apontam a necessidade de tornar o consumidor um protagonista e articulador de mudanças, como a estratégia fundamental para a consolidação do mercado de orgânicos. Nesse sentido, o conhecimento, a educação para o consumo e a conscientização não só sobre o produto mas também sobre o processo que envolve a agricultura orgânica torna-se um dos principais desafios, lembrando-se que um dos maiores obstáculos para uma vida sustentável é o aumento contínuo do consumo material, segundo tem destacado Capra (2003). Motivar o consumidor individual a participar de processos organizativos tem sido uma tarefa de grupos interessados. Contudo, é estratégico também que as políticas públicas direcionadas ao desenvolvimento da agricultura orgânica contemplem a ação para e com esses atores, apoiando os grupos já constituídos e estimulando a formação de novos grupos. A seguir apresenta-se sinteticamente algumas considerações sobre a importância de se considerar os consumidores de um ponto de vista coletivo, principalmente por meio de iniciativas que envolvam a ação do Estado como um agente relevante no mercado institucional. 2.4.2 O Consumo Coletivo: o Papel do Mercado Institucional O consumo coletivo manifesta-se por meio da ação do poder público, na implemen- tação de programas institucionais, os quais caracterizam o que se denomina mercado institucional. De maneira ampla está-se considerando aqui como consumidor coletivo aqueles ambientes onde a ação do poder público destina-se a grandes contingentes de pessoas, seja através de programas como a alimentação escolar, seja pela aquisição de alimentos para programas sociais, como o Fome Zero. Uma das primeiras iniciativas para atender a esse consumidor coletivo ocorreu recentemente, a partir de iniciativas na Região Sul do País, quando se introduziram na alimentação escolar os produtos da agricultura orgânica. Tal iniciativa não tem representado meramente um programa alimentar, mas vem sendo encarada como parte de um amplo processo educativo, com o objetivo de fazer conhecer o que são esses alimentos que chegam até os alunos, como são produzidos e quem os produz. O potencial dos produtos orgânicos com este tipo de consumidor é muito amplo, uma vez que a alimentação escolar48 é distribuída para cerca de 36,3 milhões de estudantes em todo o País, segundo dados da 48 Segundo o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação/Programa Nacional de Alimentação Escolar - PNAE/MEC, em 2006, no Brasil, foi destinado R$ 1,5 bilhão à merenda escolar de alunos da pré-escola e do ensino fundamental e de crianças mantidas por entidades filantrópicas com registro no Conselho Nacional de Ação Social. Para os alunos do ensino fundamental e da pré-escola, o valor da merenda escolar é de R$ 0,22 por aluno/dia. 70 FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação/Programa Nacional de Alimentação Escolar (BRASIL, 2006b). Alimentação mais saudável e nutritiva para as crianças, introdução de novos hábitos alimentares, educação e proteção ambiental, permanência dos agricultores no campo, valorização da produção regional e resgate da cultura do meio rural são algumas das vantagens desses programas que priorizam o alimento orgânico na alimentação escolar. No Paraná, a FUNDEPAR é o órgão responsável pela operacionalização do Programa Estadual de Alimentação Escolar (PEAE). Segundo dados da FUNDEPAR (2006), é possível adquirir alimentos orgânicos perecíveis por meio do Projeto Escola-Cidadã, que disponibiliza R$ 0,50/aluno/mês para a compra de alimentos. Em 2006 foram repassados 3 milhões de reais, abrangendo 1.830 estabelecimentos em 320 municípios paranaenses, atendendo cerca de 1 milhão de alunos da rede estadual de ensino (ensino fundamental, médio e supletivo). A compra no local é realizada pelos diretores das escolas, que devem ser sensibilizados para a importância do alimento orgânico. Outros espaços pouco trabalhados que poderiam impulsionar as vendas são instituições e empresas públicas (hospitais, creches, instituições beneficentes), as quais apresentam um público cujo perfil é bastante recomendado para a compra de orgânicos. Ademais, esse tipo de estratégia pode funcionar como uma forma de aproximar o público que consome e o público que produz, o que conduziria à reflexão conjunta sobre questões relativas ao consumo, ao meio ambiente, à sustentabilidade em suas diversas dimensões. As ações desenvolvidas pelo poder público, através do mercado institucional, podem ser entendidas como estratégias para potencializar o consumo de orgânicos por um público mais amplo, em que o foco central é a segurança alimentar e nutricional para a população de menor renda. Precisam ser incentivadas políticas públicas para ampliar o acesso dos diversos segmentos da população a alimentos de qualidade. Essas políticas devem assegurar a qualidade e regularidade do abastecimento interno e estimular processos de transação mercantil que garantam a produção, eliminando ou reduzindo as formas abusivas de intermediação. Tais iniciativas podem estimular o surgimento de redes solidárias de produção, processamento, distribuição e consumo, por meio de associações e cooperativas envolvendo populações rurais e urbanas, produtores e consumidores. 71 3 O MERCADO DE ORGÂNICOS: SITUAÇÃO MUNDIAL E INSERÇÃO DO PARANÁ Nesta terceira parte do estudo são apresentadas informações relativas ao mercado de orgânicos no mundo e no Brasil, para, em seguida, contextualizar a produção de orgânicos no Paraná. 3.1 O PANORAMA DO MERCADO MUNDIAL DE PRODUTOS ORGÂNICOS Dados confiáveis sobre o comércio internacional de produtos orgânicos são escassos e pouco consistentes, porém a direção do comércio é bastante clara, destacando-se as trocas intra-regionais. Os Estados Unidos, a Alemanha, o Japão e o Reino Unido são pólos centrais de importação, ressaltando-se a Alemanha, que, embora produza 80% do seu consumo interno, é um grande país importador, e está se tornando um entreposto de produtos orgânicos na Europa. O mercado alemão é extremamente exigente, já que eles se interessam tanto pelos métodos de produção quanto pelos métodos de processamento e embalagem, enfim, por todo o processo. A Holanda também se destaca como país importador, sendo a maior porta de entrada dos produtos orgânicos na Europa. Como fornecedores intra-regionais importantes na União Européia ressaltam-se a Espanha, que exporta 75% de sua produção, a Itália e a Dinamarca, que exportam 67%, além da Áustria e de Portugal. Na década de 90 os mercados de produtos orgânicos certificados por auditagem apresentaram taxas de crescimento elevadas na Europa, nos Estados Unidos e no Japão, bem como em muitos países de baixa renda. O consumo na França aumenta 15% ao ano, e na União Européia a taxa média anual de crescimento girou em torno de 25% nos últimos 10 anos. Com relação à composição por tipo de produto orgânico certificado, a tendência é crescer a diversidade de produtos ofertados. Dados de Sylvander (1998) sobre a evolução desse cenário na França, entre os anos de 1994 e 1997, mostram que houve principalmente um crescimento proporcional do setor de produtos lácteos (10% para 32%), uma queda do setor FLV (30% para 12%), das carnes (3% para 1%), da soja (7% para 3%) e dos cereais (50% para 40%). Em 1997, surgiram os setores de café (1%), refeições prontas (2%), condimentos (6%) e ecoprodutos (4%). O gráfico 3.1, a seguir, mostra o cenário da área total sob manejo orgânico certificado no mundo. 72 O Acordo de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA), firmado em 1995,49 é composto por países produtores e exportadores de um amplo leque de produtos orgânicos. O valor estimado do mercado de orgânicos, em 2000, foi da ordem de 10 a 12 bilhões de dólares, sendo que os EUA saltaram de um mercado de 4,2 bilhões, em 1997, para 6,6 bilhões de dólares em 2000 (WILLER e YUSSEFI, 2001) e para 11,4 bilhões de dólares em 2003 (SAHOTA, 2005, p.20). O Canadá exporta 80% de sua produção, a maior parte para os Estados Unidos, e o México tem, nos Estados Unidos, seu maior comprador. Os EUA têm o maior mercado nacional de produtos orgânicos e as maiores taxas de crescimento, alcançando 20% anualmente. Um terço dos consumidores americanos compra regularmente produtos orgânicos e o setor representa 2% do mercado de alimentos (HAUMANN, 2003). O acelerado crescimento da indústria norte-americana de alimentos orgânicos atraiu investimentos de grandes corporações de alimentos, como Kraft Foods, Pepsi-Cola, Dean Foods e Danone, que adquiriram agroindústrias orgânicas já existentes. Os Estados Unidos são um importante exportador de matérias-primas orgânicas para a Alemanha, que as processam e embalam em suas indústrias. Ali, os principais pontos de venda desses produtos são as grandes redes de supermercados, que viram nos orgânicos uma oportunidade de diferenciação no seu mix de produto e de valorização da imagem da empresa frente ao consumidor. Supermercados como o Wal-Mart, principalmente nos grandes centros urbanos, foram os primeiros a oferecer os produtos em suas gôndolas, estimulando um grande número de produtores. O Japão tem o maior mercado da Ásia, e seus consumidores têm conhecimento dos produtos orgânicos e de seus métodos de produção. O país produz arroz, chá japonês, saquê (bebida obtida de arroz fermentado artificialmente), vinagre de arroz, mas é um grande importador de uma enorme variedade de alimentos orgânicos. É o maior importador de orgânicos na região, com os preços alcançando entre 20% e 50% a mais que os 49 Este Acordo comercial foi firmado entre Canadá, Estados Unidos e México. 73 convencionais. O país importa principalmente: massa, cereais, café (do Brasil, da América Latina), chá preto, erva-mate (Paraguai), vinho, cerveja, óleo, presunto, mel, vegetais congelados (EUA, Nova Zelândia, Austrália, Canadá), nozes secas, frutas secas, frutas frescas – kiwi, banana (México e Filipinas), laranja, carne bovina e de aves, açúcar, pão, molhos, grãos e produtos à base de soja (China e EUA), salmão (Noruega). Os três principais mercados no Japão são: (i) o sistema Teikei50; (ii) supermercados e restaurantes; e (iii) cesta em domicílio. O sistema Teikei ("caixa") começou em 1971, coordenado por dois grupos: a Associação Japonesa de AO (JONA51) e a Fundação Internacional de Pesquisa em Agricultura Natural, baseada numa aliança entre produtores e consumidores. Dos supermercados que vendem extensa linha de produtos naturais, verdes, os que têm orgânicos adquirem seus produtos via brokers52 de alimentos, exportadores e atacadistas. Segundo dados do Ministério da Agricultura Japonês para 2001 (MURAYAMA, 2003, p.25), a participação dos supermercados e restaurantes na comercialização de produtos orgânicos é quase igual à participação das cooperativas de consumidores mais as vendas diretas (cerca de 24%). Os outros mercados existentes são: cooperativas agrícolas (33%), processadores de alimentos (14%), atacadistas (3%) e para consumo próprio (2%). Nos países de alta renda, os produtos certificados da agricultura orgânica são transacionados em diferentes mercados, podendo ser encontrados em diversos pontos de comercialização. Nos grandes centros já existem supermercados só de produtos orgânicos, como o Biogros, na França, o Bioethic, na Alemanha, a rede Planet Organic, no Reino Unido, ou a cadeia de supermercados naturais Whole Foods, nos EUA. Cresce também o mercado da venda direta, com transações entre "produtor-consumidor", como os Farmer Street Market (Mercado dos Produtores) e CSA53. Esse tipo de mercado, de venda direta, também tem crescido com as Feiras Ecológicas nos países da América Latina e Caribe. Nestes países, além dos supermercados também se identificam outros locais de venda, como as lojas de produtos naturais, restaurantes, spas, hotéis, empresas aéreas e também o mercado institucional (merenda escolar, hospitais etc.). 50 Sistema Teikei: distribuição direta, em caixa, do produtor para o consumidor. 51 JONA - sigla em inglês para Associação Japonesa de Agricultura Orgânica. 52 Brokers: sistema que substitui ou incorpora os diversos agentes envolvidos com a distribuição de alimentos, quais sejam: o representante comercial, o distribuidor e o atacadista. A indústria e o atacado realizam a venda por meio eletrônico e os fabricantes terceirizam o trabalho de ponto de venda com os brokers, que passam a administrar as vendas. 53 CSA - Community Supported Agriculture, esquema de cooperação entre pequenos produtores e consumidores urbanos, em que estes últimos apóiam com recursos financeiros e humanos a produção e distribuição de seus alimentos. 74 A tabela 3.1 apresenta uma visão dos diferentes tipos de mercado para a comercialização dos produtos orgânicos certificados nos principais países importadores. Observa-se que a importância que cada canal representa depende de cada país, de cada cultura, história de fomento, e está ligada também à estrutura já montada para abastecer esses locais com produtos convencionais. TABELA 3.1 - DISTRIBUIÇÃO DE PRODUTOS ORGÂNICOS NOS PRINCIPAIS MERCADOS DOS PAÍSES DE ALTA RENDA MERCADO DO VAREJO PAÍSES Supermercados Convencionais (%) Lojas de Alimentos Naturais, Especializadas (%) MERCADO DA VENDA DIRETA (E OUTRAS FORMAS DE VENDA) (%) Estados Unidos 31 62 7 Alemanha 26 46 28 Grã-Bretanha 74 15 11 Itália 23 60 17 França 38 46 16 Suíça 57 21 22 2 96 2 90 2 8 Holanda Dinamarca FONTE: Willer e Yussefi (2001) Observa-se, na tabela acima, que na Alemanha, maior país consumidor de produtos orgânicos entre os europeus, a comercialização através da venda direta e nas pequenas lojas de varejo representa cerca de dois terços de todo o processo de transação comercial de produtos orgânicos. Diferentemente, no Reino Unido o principal mercado é o varejo, por meio das grandes redes. Nos últimos anos, os varejistas deste último país estenderam sua influência até o produto original, e não apenas ditam as especificações de produção e qualidade, mas definem também o plantio, a colheita, a embalagem, o transporte e a entrega dos produtos. Maiores restrições e rigor em relação aos produtos e maior poder de compra pressionam os seus fornecedores a adotar a mecanização e o sistema "industrial" de produção. A maioria dos varejistas acredita no potencial dos produtos orgânicos, mas tem outras preocupações além das normas, em particular a segurança, a continuidade na oferta e exigências de qualidade e preço. No Oriente Médio o destaque é para países produtores, como Turquia e Israel (principalmente de nozes, frutas e vegetais, frescos e secos). Embora tenha cerca de 60% da população mundial, a Ásia possui o menor mercado de produtos orgânicos, o qual, entretanto, aponta para um crescimento constante. No Leste da Ásia, destacam-se China, Índia, República da Coréia e Sri Lanka, que exportam cacau, café, óleos essenciais, ervas, especiarias, amendoim, arroz, chá e baunilha. A Oceania compreende quase a metade da área orgânica certificada mundial, embora o tamanho das transações de mercado seja uma fração do mercado total. As vendas de alimentos e bebidas orgânicas foram estimadas em cerca de 240 milhões de dólares em 2003, com a maior parte sendo da Austrália. A indústria de alimentos orgânicos na Austrália e na Nova Zelândia foi tradicionalmente orientada para a exportação. 75 No norte da África, cresce particularmente o mercado doméstico para produtos orgânicos certificados no Egito. Na África do Sul, a venda dos orgânicos acontece em lojas especializadas e supermercados. Na Tunísia, a venda de citrus, vinhos, azeite de oliva e plantas medicinais para exportação também vem aumentando. Em relação ao comércio de produtos orgânicos entre os blocos comerciais, podese observar, pela tabela 3.2, que o MERCOSUL tem se destacado pela elevada taxa de crescimento da área certificada para produtos orgânicos. Contudo, assim como ocorre no comércio agrícola mundial de commodities, no caso dos produtos orgânicos esses países são predominantemente exportadores de matéria-prima. TABELA 3.2 - EVOLUÇÃO DA TAXA DE CRESCIMENTO DA ÁREA SOB MANEJO ORGÂNICO NOS BLOCOS COMERCIAIS - 1999/2003 TAXA DE CRESCIMENTO (%) BLOCOS COMERCIAIS 1999 (62 países) 2000 (71 países) 2001 (82 países) 2002 (98 países) 2003 (108 países) União Européia 100 19,1 33,7 68,8 41,9 NAFTA 100 (39,9) (32,0) 15,7 (5,3) MERCOSUL 100 548,3 652,9 866,8 825,5 Oceania 100 337,9 342,5 473,7 546,6 TOTAL 100 113,5 131,6 224,9 257,2 FONTE: Adaptado de Fonseca (2005) O comércio mundial de produtos orgânicos entre os países do Sul-Norte caracteriza-se pela predominância do Sul como exportador de matéria-prima orgânica certificada. Por outro lado, no comércio Norte-Norte são transacionados produtos de maior valor agregado. Dois fatores podem ter estimulado a concentração da demanda dos consumidores nos países de alta renda. Primeiro, o prêmio no preço dos produtos orgânicos é menos restritivo de demanda para países onde os consumidores têm alto poder de compra. Segundo, o maior acesso à informação pelos consumidores naqueles países em relação às questões ligadas à produção e comercialização agrícola favorece o maior consumo de produtos orgânicos devido a fatores como segurança alimentar, preocupações ambientais e razões de saúde (SAHOTA, 2005, p.22-23). O crescimento acentuado no volume de área orgânica certificada na Comunidade Européia a partir de 1991 de mais de 3 milhões de hectares até 2000 coincide com a implantação de sua regulamentação (EC 2092/91) (WILLER; YUSSEFI, 2002). Embora sejam muito importantes para explicar esse crescimento, o estabelecimento do marco regulatório e o apoio à certificação não foram os únicos elementos dinamizadores deste processo, como será visto mais adiante. Outras políticas (pesquisa, extensão, assistência técnica, capacitação, comercialização e informação aos consumidores), públicas e privadas, também explicam o crescimento da produção, da comercialização e do consumo. Em relação ao cenário e à dinâmica dos mercados de produtos da agricultura orgânica, incluindo a evolução da produção e dos tipos de produtos certificados, bem como 76 do comércio, verifica-se que existe uma complementaridade de oferta e oportunidades para os países menos desenvolvidos. Na produção, cada vez mais as grandes áreas certificadas de pastagens se destacam, o que fez com que, desde 2000, a Austrália e a Argentina assumissem a liderança no mundo em termos de áreas certificadas (primeiro e segundo lugares, respectivamente, desde 2001). Mais recentemente, Brasil e Uruguai aumentaram as áreas dedicadas à produção animal sob manejo orgânico (maioria de pastagens extensivas), estando hoje entre os 10 países com maior área orgânica certificada no mundo (WILLER e YUSSEFI, 2005). Em relação ao tipo de produtor, apesar de ter se iniciado em pequenas unidades de produção, somente nos sistemas de produção orgânicos da Europa e da Ásia ainda podemos dizer que é característico da pequena produção, com pouca quantidade média de área por unidade certificada. Diferentemente, por exemplo, da Argentina, onde 5% dos produtores, em 2003, detinham 98% das áreas certificadas eram de produção de pecuária extensiva. Já quanto à área sob manejo orgânico certificada na América Latina e Caribe, destacam-se, em termos de crescimento, a Argentina, o Brasil, o Uruguai e o Chile, como se observa na tabela 3.3. TABELA 3.3 - EVOLUÇÃO DA ÁREA SOB MANEJO ORGÂNICO COM PRODUÇÃO CERTIFICADA NA AMÉRICA LATINA E CARIBE - 2000/2004 ÁREA COM PRODUÇÃO PAÍS CERTIFICADA (ha) 2000 Argentina CRESCIMENTO (%) 2004 169.200 2.960.000 Belize - 1.810 1.649 - Bolívia 35.720 364.100 919 Brasil 50.000 841.769 1.583 Chile 15.450 285.268 1.746 Colômbia 44.583 33.000 (26) Costa Rica 2.860 13.967 388 Cuba 6.686 10.445 56 República Dominicana 3.910 14.963 283 El Salvador 1.564 4.900 213 Equador 8.129 60.000 638 Guatemala 4.512 14.746 127 Guiana - 109 - Honduras - 1.769 - Jamaica - 1.332 - 50.133 215.843 330 Nicarágua 7.384 10.750 46 Panamá 2.135 5.111 139 Paraguai 23.975 91.414 281 Peru 12.000 130.246 985 181 México Suriname Trinidad Tobago Uruguai Venezuela TOTAL 89 250 133 - - 14.824 760.000 4.127 21.870 - - 475.157 5.821.792 1.125 FONTE: Fonseca (2005), baseada em Willer e Yussefi (2000; 2004) 77 As políticas públicas, principalmente, tiveram um papel decisivo no desenvolvimento da agricultura orgânica nos países europeu, americano e japonês. Já a iniciativa privada apóia a produção quando há especificidade e carência da matéria-prima no mercado global, bem como aos produtores, para cobrir os custos da certificação de um produto específico. Mesmo com todo esse apoio, tem diminuído o número de unidades de produção orgânica certificadas em alguns países da União Européia. As razões apresentadas para isso podem ser de ordem estrutural, em função de o custo da certificação de produtos não ser compatível com a pequena produção agrícola, ou de ordem social, relacionadas à necessidade de muitos registros e excesso de burocracia. A respeito da certificação, Mutersbaugh (2004) observou que evidências estatísticas e documentais de pesquisa em 29 organizações e 129 vilas engajadas na agricultura orgânica certificada em Oaxaca, México (1998 a 2003), mostraram que a taxa de saída dos produtores aumentou de um número insignificante, em 1998, para 12 e 14%, respectivamente, em 1999 e 2000. Entre 2000 e 2002 a situação melhorou, mas em 2002-2003 o número de famílias que saíram superou de novo a marca dos 10%. Em parte, a situação no México reflete a combinação de maiores exigências com relação às normas internacionais, o cancelamento de programas de ONGs que custearam as despesas iniciais e a deterioração da situação econômica da área rural mexicana. Em países ainda em fase de estruturação da agricultura orgânica os processos de regulamentação encontram-se em fase de implantação, pressionados pela necessidade de cumprir as exigências para exportação, visando aos mercados consumidores já regulados. Hoje há mais de 60 países no mundo com regulamentos técnicos para agricultura orgânica em alguma fase de discussão ou implantação. Entretanto, a adoção de normas internacionais não adaptadas à realidade de cada país (clima, estrutura social e econômica) leva à geração de barreiras técnicas, pois tais normas prejudicam o desenvolvimento da produção e do mercado interno nesses países. Vale lembrar que os países de baixa renda participam das negociações internacionais no âmbito do Codex Alimentarius. Contudo, muitos governantes destes países consideram ser melhor atender às normas internacionais sem muito questionar, por não disporem de especialistas no tema ou por considerarem que é melhor, para seus países, exportar, mesmo que se excluam agricultores não capacitados nesse processo de acesso a mercados diferenciados como o dos produtos orgânicos (ITC, 2003b). Em 1996, um relatório da UNCTAD (Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento) reconheceu o papel que a agricultura orgânica pode ter no comércio, no melhoramento ambiental e no desenvolvimento social dos países de baixa renda, embora expressasse algumas dúvidas sobre a viabilidade econômica e a exeqüibilidade técnica (TWAROG; VOSSENAAR, 2003). Os objetivos das agências de desenvolvimento incluem: a intensificação da segurança alimentar, o aumento da renda dos produtores e a interrupção (ou reversão) da degradação ambiental, priorizando a maximização do uso dos recursos e 78 conhecimentos locais para atingir esses objetivos. Essas agências têm promovido ações no sentido de incentivar e garantir o acesso dos agricultores familiares aos mercados locais. A FAO, em 1999, incluiu a agricultura orgânica no seu programa de agricultura sustentável, desenvolvendo um plano de médio prazo para traçar o perfil e apoiar o desenvolvimento dos sistemas de agricultura orgânica (FAO, 2001). Contudo, preocupações foram expressas pela UNCTAD no sentido de que as altas taxas de crescimento da demanda por produtos orgânicos não sejam sustentáveis no longo prazo, e que os objetivos dos governos europeus para o crescimento da produção podem não ser realistas. Acredita-se que serão necessários maiores subsídios para atingir as metas ambiciosas da União Européia. Pode haver um risco de saturação do mercado, embora isto dependa dos preços dos produtos orgânicos certificados nos mercados (VOSSENAAR; JHA; WYNEN, 2004). Segundo dados da ITC, o mercado varejista mundial de alimentos e bebidas orgânicos aumentou de US$ 10 bilhões de dólares, em 1997 (ITC, 1999), para 17,5 bilhões em 2000, tendo sido estimado para 2003 entre US$ 23 e 25 bilhões, tendo por base a taxa média de crescimento anual de cerca de 20%. Os mercados que mais cresceram nos dois últimos anos foram do Reino Unido e dos EUA. Embora o mercado esteja crescendo a taxas consideráveis (10 a 20% nos países de alta renda), indicando um enorme potencial, ainda é pequena a fatia que os produtos orgânicos alcançam no market share total de vendas de alimentos (1 a 3%, com destaque para Suíça e Dinamarca). 3.2 A INSERÇÃO DO BRASIL NO MERCADO DE PRODUTOS ORGÂNICOS: PRODUÇÃO E PROGRAMAS INSTITUCIONAIS As informações sobre a produção da agricultura orgânica no Brasil são ainda relativamente escassas, encontrando-se dispersas nos arquivos de organizações certificadoras, associações de agricultores e ONGs. Não existe controle sistemático dos dados por parte de nenhum órgão federal. Em alguns estados esse controle está se iniciando, através das secretarias estaduais de agricultura, com destaque para o Estado do Paraná, que há seis anos realiza anualmente esse levantamento, embora, como já se evidenciou, as informações sejam ainda escassas e necessitem de uma metodologia mais apurada de coleta e tratamento de dados. Segundo o IBD (Instituto Biodinâmico), a produção orgânica no Brasil, com um crescimento estimado em 30% ao ano, ocupa atualmente 6,5 milhões de hectares de terras, compostas por área de produção agrícola e área de extrativismo, colocando o País na segunda posição dentre os maiores produtores mundiais de orgânicos. O número de propriedades orgânicas saltou de 14.866, em 2003, para 19.003, em 2004, sendo que, destas, pelo menos 80% são de agricultores familiares. 79 O ritmo de crescimento da produção orgânica certificada no Brasil vem sendo limitado por vários problemas, desde aqueles já mencionados, como a regularidade e disponibilidade na oferta de produtos, como a organização dos diferentes mercados, acrescida da necessidade de políticas de estímulo à conversão e à produção. Desde as primeiras experiências de cunho prático com a agricultura orgânica no Brasil, na década de 1970 até 1995, quando os produtos orgânicos, além de estarem no mercado da venda direta, passaram a entrar no mercado do varejo, principalmente por meio das grandes redes de supermercados em São Paulo (em 1996 no Rio de Janeiro, e em 1997 em Curitiba), o seu desenvolvimento ainda se apresenta lento, quando comparado ao dos demais produtos do mercado agroalimentar (DAROLT, 2000). A agricultura orgânica, que era praticada quase que exclusivamente por agricultores familiares, hoje está na pauta, também, da agricultura patronal, em grandes propriedades. Contudo, como já se evidenciou, a agricultura familiar, além de ter sido pioneira na produção orgânica, apresenta vantagens em sua adoção, seja pela sua característica de diversificação, pela gestão dos sistemas produtivos agrícolas e agroflorestais, ou pelo conhecimento acumulado sobre os ecossistemas onde atua. Um dos fatores que indicam o crescimento do número de unidades orgânicas no Brasil (cerca de 10 vezes maior), tendo a agricultura familiar como protagonista, parece ter uma relação direta com a prática da certificação em grupo, conhecida como participativa, a exemplo daquela desenvolvida pela Rede Ecovida54. O governo brasileiro tem adotado, muito recentemente, estratégias para promover a agricultura orgânica, articulando-a a processos de desenvolvimento rural. O Ministério da Agricultura, junto com governos locais e regionais, ONGs e associações de classe, tem promovido atividades visando estimular e desenvolver a agricultura orgânica. Dentre tais iniciativas destaca-se a atuação de alguns estados (Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Rio de Janeiro) onde as agências oficiais de extensão rural têm atuado de maneira mais enfática. Os recursos do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento para o setor de produção de orgânicos atingiram cerca de R$ 2 milhões em 2005. De acordo com o Plano Agrícola e Pecuário 2006/2007, serão alocados R$ 10 bilhões para a agricultura familiar na safra de 2006-2007, ante R$ 9 bilhões na safra passada. No entanto, o documento não especifica quanto será gasto exclusivamente com a agricultura orgânica. O Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) lançou o Programa Nacional de Apoio à Agricultura de Base Ecológica nas Unidades Familiares de Produção (Programa Nacional de Agroecologia) em 2005, cujo objetivo é fortalecer as iniciativas realizadas pela agricultura familiar, criando condições de estímulo à transição da produção tradicional para 54 Ver item 2.2 deste trabalho. 80 modelos sustentáveis, por meio da implementação de políticas, programas e projetos da Secretaria da Agricultura Familiar (SAF), em parceria com os Ministérios do Meio Ambiente, Agricultura e Ciência e Tecnologia. Já o Programa de Desenvolvimento da Agricultura Orgânica – Pró-Orgânico, lançado em 2004, busca apoiar e fortalecer a produção, o processamento e a comercialização de produtos orgânicos, bem como estimular o crescimento deste segmento. O Pró-Orgânico é composto por um conjunto articulado de ações do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, em parceria com entidades do setor público e privado. Essas ações visam ao desenvolvimento e à capacitação organizacional e tecnológica, ao aprimoramento e adequação de marcos regulatórios, à promoção e fomento à produção e à comercialização de produtos orgânicos. Outro esforço é o Projeto Orgânics Brasil, lançado em julho de 2005, que visa promover a exportação dos produtos orgânicos e tem um grande potencial para o desenvolvimento da agricultura orgânica no País. É uma iniciativa da APEX-Brasil (Agência de Promoção de Exportações do Brasil) e da FIEP (Federação das Indústrias do Estado do Paraná), sendo o IPD (Instituto Paraná de Desenvolvimento) o órgão proponente e gestor do projeto. A Embrapa Agrobiologia vem apoiando pesquisas em agricultura orgânica. Sob sua coordenação, são 135 pesquisadores de 15 centros de pesquisa da Instituição, que se organizaram num projeto em rede nacional em que parcerias locais e regionais foram estabelecidas com diversas instituições. Quanto ao financiamento, vale dizer que o acesso ao crédito oficial está condicionado à obtenção de certificação orgânica junto a uma certificadora. A Resolução 2.879, de 08/08/01, do Banco Central do Brasil, determinou o recebimento de tratamento prioritário para o financiamento de projetos que contemplem a produção agroecológica ou orgânica, conduzidos por produtores que se enquadrem no grupo C do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF). Este grupo inclui agricultores familiares com renda anual entre R$ 1,5 mil e R$ 10 mil. O crédito é concedido por três bancos: Banco do Brasil, Banco do Nordeste e BNDES. O Banco do Brasil utiliza todas as suas linhas de crédito convencional à agricultura e opera, em especial, um plano denominado programa BB Agricultura Orgânica. Seu plano de financiamento para a agricultura orgânica foi instituído com base nos recursos do PRONAF e do Programa de Geração de Emprego e Renda (PROGER). O plano inclui convênios de integração rural, crédito para a agricultura familiar, cédula de comercialização para o produtor rural, leilão eletrônico com as bolsas de alimentos do País, e parceiros com empresas do agronegócio. O Banco do Nordeste possui dois programas de financiamento para agricultores orgânicos, o FNE Verde – Financiamento à conservação e controle do meio ambiente, que utiliza o Fundo Constitucional do Nordeste e impõe limite ao crédito de acordo com o porte do empreendimento, e o Programa de Desenvolvimento da Agropecuária Orgânica do Nordeste. 81 O BNDES oferece financiamento através de suas linhas tradicionais, como FINAME - Agrícola (financiamento de máquinas e equipamentos) e BNDES - Automático, além do Prosolo (Programa de Recuperação de Solos), que financia adubação "verde". Por meio do Pronaf Agroecologia, o governo fornece pequenos empréstimos para a agricultura familiar visando facilitar-lhe a conversão da produção convencional para a orgânica, ou seja, oferece suporte financeiro na fase de transição para a produção agroecológica. Nesse programa, a mesma unidade de produção pode ter até dois créditos consecutivos, desde que pelo menos uma prestação tenha sido paga e com laudo de regularidade. Além disso, o Pronaf prevê o custeio de até R$ 4.500,00 (com juros de 4% ao ano e desconto de R$ 200,00, para pagamento em dia), desde que a proposta seja para a produção agroecológica e projetos em transição para a agroecologia. Porém, diferentemente de outros países, o Brasil não possui nenhum tipo de subsídio para a atividade. O governo tem assumido basicamente dois papéis no que tange à agricultura orgânica no País. De um lado, tem atuado na regulamentação do mercado, por meio da criação de normas específicas a ele aplicadas; de outro, atua no financiamento à agricultura orgânica através de concessão de linhas de crédito, devendo-se lembrar que nem sempre os agricultores familiares que já têm história na atividade têm tido oportunidade de acessar o crédito. Existem também iniciativas de crédito "informal", ainda raras no Brasil, não condicionadas a uma instituição financeira propriamente dita, mas originadas em arranjos da sociedade civil, que tenta contribuir na resolução do problema de financiamento da produção orgânica, principalmente para a conversão. Um exemplo é a Agricultura Motivada pelo Consumidor (AMC), ou Community Supported Agriculture, que teve origem na Europa e hoje se espalha por vários países. No Ceará há o exemplo da ADAO (Associação para o Desenvolvimento da Agricultura Orgânica), que produz para 330 famílias. Os consumidores têm participação ativa nesse processo, pois são eles que financiam a produção dos agricultores e planejam a produção conjuntamente (ALCÂNTARA; SOUZA, 2005). Na Região Sul do Brasil foi criada, há mais de uma década, a Cooperativa de Crédito Rural com Interação Solidária (CRESOL), um sistema de crédito desenvolvido de acordo com a realidade e as necessidades dos agricultores familiares, que apresentam, na maioria das vezes, dificuldades históricas de acesso ao crédito oficial, devido às exigências de garantias.55 A CONAB (Companhia Nacional de Abastecimento) executa o PAA (Programa de Aquisição de Alimentos), como parte do Programa Fome Zero, do Ministério do Desenvolvimento 55 Para maiores informações, ver Conselho Estadual de Agroecologia Orgânica do Paraná (2002). 82 Social. Nele tem sido incentivada a produção de orgânicos por meio da compra de produtos da agricultura familiar. Para isso, a CONAB possui uma linha especial de compras de produtos oriundos da agricultura familiar para produtos agroecológicos ou orgânicos, desde que seja atestada a origem do produto por entidade credenciada ou publicamente aceita como apta. Aos produtores são pagos até 30% a mais por um produto agroecológico ou orgânico. O conjunto das informações apresentadas permite afirmar que o Brasil ainda não dispõe de ações programáticas e ordenadas para a agricultura orgânica. Constata-se isto quando se verifica que há várias iniciativas que se encontram dispersas em diferentes programas, desenvolvidas por diferentes ministérios. Tal situação indica a necessidade de políticas mais contundentes e melhor orquestradas, evitando sobreposições e permitindo que se vislumbre um efetivo desenvolvimento da agricultura orgânica no País. 3.3 A PRODUÇÃO ORGÂNICA NO PARANÁ As informações relativas à agricultura orgânica no Paraná são provenientes da consolidação dos dados da safra 2004/2005, que totalizam os números para o Estado a partir do levantamento elaborado pela SEAB e Instituto EMATER. Entretanto, para poder apresentar a produção regionalizada, foram utilizados os dados disponíveis, referentes à safra 2003/2004. Cabe lembrar que este estudo considerou cinco grandes regiões, agregando as mesorregiões geográficas do IBGE (1989), conforme está detalhado na Parte 1, item 1.2, deste trabalho, que explicita os procedimentos metodológicos. O quadro 3.1 mostra as Grandes Regiões, as Mesorregiões Geográficas e as Regionais do Instituto EMATER consideradas neste estudo. QUADRO 3.1 - GRANDES REGIÕES, MESORREGIÕES GEOGRÁFICAS DO PARANÁ E REGIONAIS DA EMATER-PR GRANDES REGIÕES (1) MESORREGIÕES GEOGRÁFICAS REGIONAIS DA EMATER-PR Metropolitana e Litoral Metropolitana de Curitiba Oeste Oeste Cascavel e Toledo Sudoeste Sudoeste Francisco Beltrão e Pato Branco Norte e Noroeste Centro-Sul Curitiba e Paranaguá Noroeste Paranavaí e Umuarama Centro-Ocidental Campo Mourão Norte Central Apucarana, Ivaiporã, Londrina e Maringá Norte Pioneiro Cornélio Procópio e Jacarezinho Centro-Oriental Ponta Grossa Centro-Sul Guarapuava Sudeste União da Vitória e Irati FONTES: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR; IBGE (1989); SEAB/PR (1) Grandes regiões consideradas neste estudo. 83 Segundo os dados da SEAB/PR e do Instituto EMATER, o Paraná tem aproximadamente 4 mil produtores envolvidos na produção orgânica.56 Mais de um quarto dos produtores, cerca de 1.200, tem como principal cultura o grupo das hortaliças; a maioria dos estabelecimentos é formada por agricultores familiares que cultivam orgânicos em propriedades cuja área média não ultrapassa três hectares. No sentido de mostrar os resultados da produção, área e número de produtores dos principais produtos orgânicos do Paraná, buscaram-se os dados das duas últimas safras (2003/2004 e 2004/2005), que são apresentados na tabela 3.4. TABELA 3.4 - PRODUÇÃO ORGÂNICA NO PARANÁ - SAFRAS 2003/2004 E 2004/2005 SAFRA 2003/2004 PRODUTOS SAFRA 2004/2005 o o Área Produção N. de Área Produção N. de (ha) (t) Produtores (ha) (t) Produtores Soja Milho 4.523 9.295 625 3.586 5.772 500 812 2.848 374 1.229 3.518 308 Trigo 300 494 75 72 103 30 Feijão 521 674 298 343 485 323 Arroz 522 3.072 34 565 2.562 113 Café 983 473 181 1.102 934 164 Mandioca 401 8.721 151 1.105 20.787 376 Frutas 994 7.752 582 940 8.071 647 1.048 12.244 962 1.231 14.633 1.208 Hortaliças Plantas medicinais 269 419 182 322 609 244 Cana (açúcar mascavo) 471 19.486 217 407 13.095 172 89 - 23 178 6.630 93 248 663 51 372 648 68 Fumo 38 55 22 42 70 24 Girassol 18 30 3 1 1 1 0 1 1 22 28 50 Cana (cachaça) Erva-mate Amendoim Algodão TOTAL 15 30 8 12 25 10 11.250 66.256 3.789 11.530 77.971 4.331 FONTES: SEAB, EMATER Os dados da tabela permitem destacar algumas questões com relação aos produtos que se seguem: - soja: houve um decréscimo nas três variáveis consideradas, mesmo sendo este produto bastante procurado no mercado internacional (Estados Unidos, Europa e Japão), e mesmo com preço 35% a mais que o convencional. A menor produção 56 Os dados referentes ao número de produtores apresentados pela SEAB/PR e EMATER/PR mostram problemas de consolidação, uma vez que se percebeu, no decorrer da pesquisa de campo, que na maior parte das vezes o mesmo produtor é contabilizado mais de uma vez, a partir dos diferentes cultivos existentes no estabelecimento. Desta forma, não é possível considerar o número total de produtores para o Estado, embora se tome como verossímil a informação relativa ao número de produtores para cada produto, a área e a produção. 84 em relação à safra anterior deve-se principalmente às condições climáticas desfavoráveis, notadamente a estiagem, nas regiões produtoras; - café: a produção praticamente dobrou de uma safra para outra, em razão da qualidade do produto produzido, do preço pago pelos países importadores (Europa, Estados Unidos e Japão) de até 50% sobre o produto convencional e por se tratar de um produto diferenciado para os produtores tradicionais, que buscam novos mercados (em termos de preço, o café é mais estável se comparado com os grãos convencionais); - mandioca: foi o produto que mais cresceu em termos de produção (138,0%), impulsionada também, a exemplo do café e da soja, pela procura do mercado externo da fécula de mandioca (Estados Unidos, principalmente); - plantas medicinais: é crescente o número de empresas, no Estado, que vêm atuando na produção de chás por meio da produção em parceria com produtores individuais, associações e cooperativas de produtores, com vistas a atender ao mercado externo; - açúcar mascavo: embora a área tenha decrescido pouco entre as safras, a queda da produção foi mais acentuada devido ao longo período de estiagem nas principais regiões produtoras. Ainda assim, trata-se de um produto bastante valorizado pelos mercados interno e externo e de conhecimento tecnológico de produção acessível aos produtores em geral; - hortaliças: representaram o produto com maior número de produtores envolvidos, tendo sido crescente em termos de área (19,5%). O mercado interno absorve a totalidade da produção, seja através da venda in natura diretamente pelos produtores (feiras) ou por meio de empresas que fazem o processamento mínimo (supermercados). No que se refere à quantidade da produção orgânica, os resultados da safra 2004/2005 indicam um total de quase 78 mil toneladas produzidas, numa área total de 11,5 mil hectares. Com relação à produção animal, os dados da safra 2003/2004 da SEAB e EMATER/PR destacam como principais produtos a produção de aves (frango de corte), com 31 mil cabeças ou 65 toneladas de carne, 2 milhões de litros de leite e 53 toneladas de carne de suínos. 3.3.1 A Regionalização da Produção Orgânica no Paraná A regionalização da produção orgânica no Paraná foi ordenada segundo as cinco grandes regiões definidas para o trabalho, a partir dos dados da safra 2003/2004, para produtos de origem vegetal e animal (os dados por Mesorregiões Geográficas e por regional 85 do Instituto EMATER encontram-se no Anexo 3. A caracterização de cada grande região apresenta os dados segundo a produção dos principais produtos, considerando: número de produtores, produção, área média, produção do Paraná, participação da grande região na produção estadual. Metropolitana de Curitiba e Litoral Nesta grande região, a principal produção orgânica é a do grupo de hortaliças. As áreas de cultivo concentram-se nos municípios do entorno de Curitiba, conhecido como cinturão verde da metrópole. A participação deste grupo representa mais de 60% da produção estadual e é produzida por mais de 400 agricultores familiares. Do mesmo modo, é significativa a produção de frutas, a qual, entretanto, está mais concentrada no litoral, representando 58% do total no Estado, sendo o cultivo da banana a produção de maior destaque de frutífera. No litoral também é expressiva a produção de arroz, responsável por 1/3 da produção estadual (tabela 3.5). Praticamente toda a produção da grande região é comercializada na cidade de Curitiba. O mercado da venda direta é bastante expressivo, principalmente através das feiras orgânicas, com produtos in natura e alguns produtos beneficiados e minimamente processados. Há também a comercialização com supermercados, por meio de duas empresas que se situam na região. E, em menor escala, os produtos são comercializados por meio da venda direta com entrega de sacolas, abastecimento de algumas lojas e restaurantes. TABELA 3.5 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA PRODUÇÃO DOS PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA E LITORAL DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004 PRINCIPAIS NÚMERO DE ÁREA MÉDIA PRODUTOS PRODUTORES (ha) PRODUÇÃO DA PRODUÇÃO DO GRANDE REGIÃO (t) PARANÁ (t) A B PARTICIPAÇÃO DA GRANDE REGIÃO/PARANÁ B/A (%) Hortaliças 411 1,4 7.844 12.244 Frutas 300 1,3 4.490 7.752 64,0 58,0 Arroz 15 33,3 3.000 9.295 32,2 55 1,0 2.640 19.486 13,5 1.131 1,9 19.377 66.256 29,2 Cana-de-açúcar (açúcar mascavo) TOTAL GERAL FONTES: SEAB, EMATER NOTA: Os valores totais referem-se ao total dos produtores da grande região e ao total da produção da grande região e do Estado. Oeste Nesta região a produção orgânica concentra-se em dois pólos situados nas cidades de Cascavel e Toledo, os quais apresentam diversificação em termos de produtos cultivados, embora a participação no total do Estado seja de apenas 8,7%. Os principais produtos são o milho, que tem a maior participação estadual (21%), seguido da cana-de-açúcar, destinada à 86 produção de açúcar mascavo, e da soja (tabela 3.6). Na produção animal a região também se diversifica, com a produção de aves (frango para corte), suínos, piscicultura e, principalmente, com a produção de leite, com mais de 1,1 milhão de litros no ano de 2004, metade da produção do Estado. A comercialização dos produtos é praticada local e regionalmente, nas feiras e supermercados. TABELA 3.6 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA PRODUÇÃO DOS PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO OESTE DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004 PRINCIPAIS NÚMERO DE PRODUTOS PRODUTORES ÁREA MÉDIA (ha) PRODUÇÃO DA PRODUÇÃO GRANDE REGIÃO (t) DO PARANÁ (t) A B PARTICIPAÇÃO DA GRANDE REGIÃO/PARANÁ B/A (%) Cana-de-açúcar (açúcar mascavo) 32 1,6 2.366 19.486 Soja 66 8,7 1.123 9.295 12,0 Mandioca 18 3,0 904 8.721 10,3 Milho 69 2,3 607 2.848 21,3 Hortaliças 75 0,6 452 12.244 3,7 Frutas 35 0,5 132 7.752 1,7 366 2,8 5.799 66.256 8,7 TOTAL GERAL 12,1 FONTES: SEAB, EMATER NOTA: Os valores totais referem-se ao total dos produtores da grande região e ao total da produção da grande região e do Estado. Sudoeste A grande região Sudoeste tem uma produção orgânica agrícola e pecuária bastante diversificada, com alto grau de organização dos agricultores familiares, sendo que a produção é comercializada em feiras, em equipamentos varejistas locais e regionais. A região é responsável por 43% da soja orgânica produzida no Estado, sendo comercializada por empresas processadoras da região ou mesmo de fora, em geral para exportação. Além da soja, a região participa com 1/5 da produção estadual de mandioca e milho (tabela 3.7). TABELA 3.7 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA PRODUÇÃO DOS PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO SUDOESTE DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004 PRINCIPAIS PRODUTOS Soja NÚMERO DE PRODUTORES ÁREA MÉDIA (ha) PRODUÇÃO DA GRANDE REGIÃO (t) A PRODUÇÃO DO PARANÁ (t) B PARTICIPAÇÃO DA GRANDE REGIÃO/PARANÁ B/A (%) 341 6,3 3.979 9.295 42,8 (açúcar mascavo) 46 1,2 2.520 19.486 12,9 Mandioca 38 2,2 1.770 8.721 20,2 Frutas 57 0,7 752 7.752 9,7 Hortaliças 119 0,6 577 12.244 4,7 Milho 107 1,4 551 2.848 19,3 TOTAL GERAL 741 3,6 10.290 66.256 15,5 Cana-de-açúcar FONTES: SEAB, EMATER NOTA: Os valores totais referem-se ao total dos produtores da grande região e ao total da produção da grande região e do Estado. 87 Quanto à produção animal, a região é a principal responsável pelo frango de corte, representando 88% da produção estadual. São importantes também as produções de leite e mel, embora com menor expressão. Norte e Noroeste Nesta grande região a cana-de-açúcar destinada à produção de açúcar mascavo é o principal produto, seguida da mandioca, hortaliças, frutas, soja, milho e café (tabela 3.8). Com menor expressão aparece a produção de outros grãos (trigo e feijão) e de erva-mate. Na produção animal destaca-se a do leite, com 347 mil litros, e 145 toneladas de mel no ano de 2004. A produção do açúcar mascavo está mais concentrada na região do chamado norte velho (região de Cornélio Procópio e Jacarezinho). Em geral a transformação ocorre em grupos de pequenos produtores ou através de suas associações. A produção da mandioca apresenta uma maior concentração no noroeste do Estado, sendo que o destino são as fecularias para produção de fécula para atender ao mercado externo. A produção de frutas, por sua vez, apresenta uma distribuição mais eqüitativa em toda a região, com leve concentração no noroeste para a produção de acerola. No caso do café, são as regiões do norte velho e novo as principais produtoras e, em menor proporção, a região do arenito (noroeste). Pelos dados da tabela observa-se que a região é responsável por mais de 1/3 de toda a produção orgânica do Estado, com participação expressiva na produção do café, mandioca e cana-de-açúcar. TABELA 3.8 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA PRODUÇÃO DOS PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO NORTE E NOROESTE DO PARANÁ SAFRA 2003/2004 PRINCIPAIS NÚMERO DE ÁREA MÉDIA PRODUTOS PRODUTORES (ha) PRODUÇÃO DA PRODUÇÃO DO GRANDE REGIÃO (t) PARANÁ (t) A B PARTICIPAÇÃO DA GRANDE REGIÃO/PARANÁ B/A (%) Cana-de-açúcar (açúcar mascavo) 64 4,4 10.972 19.486 56,3 Mandioca 22 9,0 5.757 8.721 66,0 Hortaliças 227 1,0 2.406 12.244 19,6 Frutas 165 3,1 2.255 7.752 29,0 99 9,3 2.089 9.295 22,4 Milho 26 4,7 472 2.848 16,5 Café 152 6,0 428 473 90,4 TOTAL GERAL 853 4,0 24.826 66.256 37,4 Soja FONTES: SEAB, EMATER NOTA: Os valores totais referem-se ao total dos produtores da grande região e ao total da produção da grande região e do Estado. 88 Centro-Sul Embora esta grande região participe com menos de 10% do total da produção orgânica do Estado, em termos de produtos tem participação importante na produção de grãos, principalmente do feijão orgânico, nas regiões de Guarapuava e Ponta Grossa, e do trigo, nesta última região (tabela 3.9). No caso do feijão, é expressivo o número de produtores da região, representando cerca de 1/3 do total de agricultores familiares do Estado. Do mesmo modo, também é significativa a produção de erva-mate nas regiões de União da Vitória e Guarapuava, onde o produto é beneficiado para consumo na forma de chás. Dentre os produtos de origem animal a produção de mel merece destaque, com 46% da produção do Estado concentrada na região de Irati. Com menor representatividade seguem as produções de frango para corte, suínos, peixe e leite. TABELA 3.9 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA PRODUÇÃO DOS PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO CENTRO-SUL DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004 PRINCIPAIS NÚMERO DE ÁREA MÉDIA PRODUTOS PRODUTORES (ha) Soja PRODUÇÃO DA PRODUÇÃO DO GRANDE REGIÃO (t) PARANÁ (t) A B PARTICIPAÇÃO DA GRANDE REGIÃO/PARANÁ B/A (%) 69 11,5 1.954 9.295 21,0 5,0 Cana-de-açúcar (açúcar mascavo) 20 1,3 988 19.486 Hortaliças 130 0,7 965 12.244 7,8 Milho 112 2,3 748 2.848 26,2 Feijão 72,8 200 2,0 491 674 Erva-mate 19 7,1 268 663 40,4 Trigo 22 5,5 234 494 47,3 698 2,8 6.191 66.256 9,3 TOTAL GERAL FONTES: SEAB, EMATER NOTA: Os valores totais referem-se ao total dos produtores da grande região e ao total da produção da grande região e do Estado. Como se verifica, a produção orgânica do Paraná apresenta-se bastante diversificada, abrangendo todo o seu território, com destaque para: soja, nas regiões oeste e sudoeste; hortaliças, na região metropolitana de Curitiba; frutas, no litoral, norte e noroeste; açúcar mascavo, no norte pioneiro; café, no norte; feijão, milho e plantas medicinais, na região central; e erva-mate, na região centro-sul. É expressiva também a produção de origem animal orgânica: na safra 2003/2004 foram mais de 2 milhões de litros de leite, 53 toneladas de carne suína e 65 toneladas de carne de aves, sendo a região oeste a principal produtora, além do mel na região centro-sul (União da Vitória). Verifica-se ainda o crescimento no número de produtores e na área de cultivo a cada nova safra. 89 3.3.2 Instituições e Entidades Envolvidas com a Agricultura Orgânica no Paraná Um dos propósitos deste item é identificar as instituições governamentais e entidades não-governamentais que desempenham atividades ligadas ao desenvolvimento da agricultura orgânica. Com base no levantamento de campo realizado e na coleta de informações por telefone, internet e pesquisa bibliográfica, são apresentadas, nos quadros 3.2 a 3.6, as principais entidades que compõem o cenário da agricultura orgânica do Estado. O objetivo principal da organização desses dados é demonstrar a diversidade de instituições e entidades envolvidas no processo, a partir das atividades, restrições e problemas levantados. Instituições governamentais Nos últimos anos, o poder público em todos os níveis – federal, estadual e municipal – tem tido participação importante no desenvolvimento da agricultura orgânica, por meio de algumas ações, programas e políticas de incentivo ao desenvolvimento da agricultura familiar. Os quadros 3.2, 3.3 e 3.4, a seguir, destacam essa participação. Entidades não-governamentais As entidades não-governamentais historicamente têm atuado de maneira mais sistemática e direta junto aos agricultores familiares orgânicos do Paraná, conforme já se registrou na Parte 2, item 2.2, deste trabalho. Os quadros 3.5 e 3.6 destacam as entidades contatadas na pesquisa de campo, consideradas as mais representativas no Estado. Como se poderá observar, a maior parte das atividades é direcionada a processos de organização dos agricultores, de formação e capacitação, de assistência técnica, de apoio a demandas e políticas públicas, bem como de apoio a processos de comercialização, particularmente aqueles em que o agricultor encontra maior autonomia nas transações comerciais, como as feiras, as entregas de sacola e o comércio justo nas transações com o mercado externo. QUADRO 3.2 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS FEDERAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 INSTITUIÇÕES ATIVIDADES RESTRIÇÕES - Apoio a projetos de implantação de sistemas de - Falta de produção regular, qualificada e confiável produção - Estudo de mercado - Pesquisa de extensão e capacitação OPORTUNIDADES Mercado potencial - Falta de assistência técnica aos produtores - Falta de pesquisa para o desenvolvimento da agricultura orgânica - Industrialização/transformação de produtos agrícolas Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) - Aquisição de bancas para feiras de produtos orgânicos - Projetos em parceria com entidades públicas e privadas - Construção do mercado permanente de produtos orgânicos, com recursos do MDA Programa de Apoio a Projetos de Infra-estrutura e Serviços em Territórios Rurais, bem como do Estado e Prefeitura Municipal - Projeto Cultivando Água Boa - apoio ao desenvolvimento da agricultura orgânica na região da Bacia Hidrográfica Paraná III Itaipu Binacional (30 municípios do oeste paranaense) - Parcerias com entidades públicas, privadas e ONGs - Ausência de pesquisa na área da produção (universidades e instituições de pesquisa) - Falta de crédito específico para a agricultura orgânica - Ampliação do Programa de Compra Direta - Programas instituídos pelos governos federal e estadual para apoiar o desenvolvimento da agricultura orgânica - Falta de assistência técnica - Preço elevado dos produtos em estabelecimentos como supermercados Realização do curso de Agroecologia pela INCRA Escola Técnica Federal do Paraná, com recursos do PRONERA (Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária) Comissão da Produção Orgânica Instituída no Paraná em 2002, sua função é o do Paraná (CEPOrg- PR), credenciamento da certificação e aplicação da vinculada ao Ministério da Lei. Preço elevado para o consumidor - Aumento do consumo - Várias entidades estão engajadas no desenvolvimento da agricultura orgânica. Agricultura, Pecuária e Pesca FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR 90 QUADRO 3.3 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS ESTADUAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 continua INSTITUIÇÕES Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento (SEAB/DERAL) ATIVIDADES OPORTUNIDADES - Elevado custo da certificação - Falta de assistência técnica - Dificuldades de comercialização - Ausência de pesquisa - Mercado em expansão - Segurança alimentar - sustentabilidade ambiental - Estrutura fundiária (proporciona boa rentabilidade em relação ao tamanho da área) - Preocupação da população com a qualidade de vida - Atendimento a 2.000 produtores no ano de 2005 - Parcerias: SEBRAE, Instituto Maytenus - Número de técnicos: 103 técnicos, que atuam em tempo parcial, abrangendo 92 municípios - Falta de definição de um programa - Necessidade de tecnologia apropriada - Falta de divulgação do produto orgânico - Dificuldade de trabalhar de forma associativa - Falta de formação/capacitação por parte dos produtores - Baixa qualidade dos produtos, em alguns casos - Ausência de logística de distribuição - A comercialização ainda é um dos entraves para os produtores. - Falta de técnicos especializados para atender aos produtores - Mercado promissor, principalmente nos grandes centros urbanos - Mercado institucional - Existência de várias áreas de proteção ambiental, onde só é permitido o desenvolvimento de agricultura livre de agrotóxicos e agroquímicos - Planejamento para o período 2007/2010 - o plano de ação prevê a capacitação de 56 novos grupos de agricultores, em que cada grupo terá entre 20 e 30 produtores - Pesquisa agrícola - Desenvolvimento rural - Falta de quadro técnico de pesquisadores, de pessoal de apoio - Fraca integração de programas e projetos institucionais - Faltam estudos de mercado, logística, comercialização e distribuição de produtos. - Ausência de definição de uma política de Estado para identificar competências regionais para produtos orgânicos - O mercado de varejo de massa (supermercados) e de venda direta passou de potencial a francamente real. - O mercado institucional (merenda escolar, compra direta) está definido por lei e não é minimamente atendido. - Há definição institucional para ações de apoio ao desenvolvimento da atividade (CPRA, Programa Agroecologia/IAPAR). - Há método, estratégia e ações de desenvolvimento da Pesquisa/ATER/ONGs, com indicativos favoráveis à expansão das ações/projetos. 91 - Levantamento e acompanhamento da conjuntura da produção orgânica - Projeto Paraná 12 Meses (1998-2005) financiamento de projetos, cursos, seminários, capacitação, apoio a produtores através de melhorias na propriedade, além de atividades para o desenvolvimento da agricultura orgânica no Paraná por meio de entidades como AOPA, PUC, UEM e IAPAR Instituto EMATER Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR) RESTRIÇÕES QUADRO 3.3 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS ESTADUAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 continua INSTITUIÇÕES ATIVIDADES - Geração de conhecimentos científicos e tecnológicos através de pesquisa e validação - Promoção da reinserção social aos reclusos da - Pesquisa insuficiente e inadequada para a visão - Exigência de processos produtivos sustentáveis Adauto Botelho instituído pela Lei 14.980 de 28/12/2005 necessidade de melhoria da alimentação e - Falta de assistência técnica aos pacientes do Hospital Psiquiátrico Colônia em Agroecologia (CPRA), deficiente. OPORTUNIDADES - A população está cada vez mais consciente da - Promoção de ações de ensino e extensão rural Colônia Penal agrícola e terapia ocupacional Centro Paranaense de Referência RESTRIÇÕES - A Legislação para produtos de origem animal é - Produção de alimentos, plantas aromáticas, condimentares e medicinais - Produção de sementes, mudas, compostos, biofertilizantes, coberturas mortas, adubos ecológica - Dificuldade ao acesso a insumos permitidos - Produto com preço diferenciado produtos veterinários) - Múltiplos canais de comercialização (local, - Apoio deficiente e insuficiente na fase de conversão comercialização do CPRA - Ainda há desconhecimento, por parte dos estabelecimento de parcerias com instituições estadual, outros estados e externo) - Necessidade de fortalecimento de canais de - Falta capacitação em organização rural do Parque Prof. Newton Freire Maia; para preservação dos recursos naturais - Crescente demanda por alimentos orgânicos (sementes, mudas, fertilizantes, fitoterápicos e verdes, húmus e insumos para sustentabilidade - Apoio a ações em educação ambiental na área qualidade de vida. consumidores, das vantagens do alimento orgânico. - Elevado custo da certificação públicas e privadas promotoras da agricultura ecológica Responsável pela administração de recursos - A falta de certificação dificulta a rastreabilidade Companhia de Desenvolvimento financeiros do subcomponente implantação dos - Falta ATER Agropecuário do Paraná módulos agroecológicos e fiscalização e - Ausência de pesquisa (CODAPAR) acompanhamento do Projeto Paraná - O mercado encontra-se em expansão, com a crescente procura por produtos orgânicos. - O preço diferenciado comparativamente ao produto convencional é um dos motivadores ao Biodiversidade desenvolvimento da agricultura orgânica. - Em Curitiba há o Mercado do Produtor, - Irregularidade na oferta de produtos - Mercado em expansão destinado a permissionários e produtores, local Centrais de Abastecimento do Paraná S.A. (CEASA) onde são comercializados produtos agroecológicos - Realização de Feira de Produtos Orgânicos e Artesanato Rural, em Curitiba, aos sábados pela o manhã (com início no 2. semestre de 2006) 92 QUADRO 3.3 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS ESTADUAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 conclusão INSTITUIÇÕES ATIVIDADES - TECPAR CERT - certificadora de produtos orgânicos RESTRIÇÕES - Falta de regulamentação da Lei 10.831 orgânica em função de fatores como confiabilidade dos empresários para investir no sustentabilidade, oportunidade aos agricultores, - Elevados preços dos produtos orgânicos, pois a oferta é pequena e a demanda é grande. - Falta fiscalização das certificadoras (sabe-se (TECPAR) - Desenvolvimento extraordinário da agricultura (definição mais clara sobre o segmento e maior setor) Instituto de Tecnologia do Paraná OPORTUNIDADES que há aquelas que procuram obter clientes a qualquer custo). - É necessário que a certificação seja reconhecida por outro organismo certificador com o objetivo de diminuir a burocracia e o retrabalho (para o reconhecimento da origem e empresários, entidades públicas - Construção do mercado fixo de orgânico em Curitiba - Ampliação das feiras verdes em Curitiba - Existência de um órgão público atuando na certificação - Apoio de secretarias municipais de agricultura ao desenvolvimento da agricultura orgânica - Existência de um plano estadual de desenvolvimento da agricultura orgânica identidade dos produtos). - Faltam técnicos capacitados para acompanhamento e assessoria aos produtores orgânicos. FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR 93 QUADRO 3.4 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS MUNICIPAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 continua INSTITUIÇÕES Prefeitura Municipal de Curitiba/ Secretaria Municipal de Abastecimento (SMAB) ATIVIDADES RESTRIÇÕES OPORTUNIDADES - Feiras orgânicas - regulamentação e apoio - Produção não profissional - Há mercado potencial de 507 mil consumidores. - Mercado Permanente de Orgânicos - área para - Educação sanitária (garantia da qualidade do - Dentre os entrevistados na pesquisa realizada comercialização de produtos in natura, produto) restaurantes e locais para eventos pela SMAB, 72% realizam compra semanal e afirmaram que estão preocupados com a saúde. - Parceria com entidades públicas, privadas e - Diversificação de atividades para o produtor ONGs familiar, como o desenvolvimento da agroindústria, lácteos, carnes e cosméticos. - Diversificação de produtos e serviços. - Apoio a feiras de produtores com barracas exclusivas de produtos orgânicos identificados por meio de banners Prefeitura Municipal de Maringá - Pequeno número de produtores - Mercado em expansão - A produção é pequena, dado o tamanho do - Apoio ao produtor mercado. - Projeto de instalação de um Centro de - Merenda escolar, pela segurança alimentar - Difusão do alimento orgânico na Feira da Referência em Agroecologia e Desenvolvimento Agroindústria Familiar e Manualidades Sustentável, nos moldes do CPRA - Parceria com entidades públicas e ONGs - Implantação de programa de inclusão com 420 famílias de pequenos agricultores Prefeitura Municipal de São Roque - Projeto de horta, apicultura e frutas de Boa Ventura - Disponibilização de 5 técnicos para atender aos A produção é insuficiente para atender a todas as escolas. - A Prefeitura atende à rede municipal com merenda escolar. - Incentivo ao Programa de Semente Crioula produtores rurais - Parceria com o Instituto EMATER - Apoio para realização de feiras (mista, com produtos coloniais e orgânicos), com a Prefeitura Municipal de Pato Branco - Falta de assistência técnica Mercado em expansão - Falta de informação ao consumidor participação de uma agrônoma da Prefeitura de Pato Branco - Disponibilização de horas/máquina aos produtores rurais - Apoio a feiras (feiras mistas) Prefeitura Municipal de Borrazópolis - Contratação de um agrônomo e um técnico agrícola para desenvolver a agricultura orgânica no município 94 QUADRO 3.4 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS MUNICIPAIS DE APOIO à AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 conclusão INSTITUIÇÕES ATIVIDADES - Apoio à atividade com corpo técnico especializado em agroecologia RESTRIÇÕES OPORTUNIDADES A produção para merenda escolar é restrita a A produção orgânica é um dos objetivos da algumas escolas. Prefeitura. - Programa Sementeiro - resgate da semente Prefeitura Municipal de Francisco Beltrão crioula - Parceria com o Instituto EMATER para capacitação de produtores - Merenda escolar (escolas rurais com produção orgânica) - Atuação na área de formação e capacitação, Prefeitura Municipal de Missal Prefeitura Municipal de Santa Terezinha de Itaipu basicamente na produção de leite - Falta de divulgação - Mercado institucional favorável - Baixa escala de produção - Há demanda do mercado em geral. - Parcerias com Instituto EMATER e ITAIPU - Problemas técnicos na produção a campo - Desenvolvimento de agricultura orgânica por 4 - Faltam técnicos - Possibilidade de realizar projetos com a ITAIPU - Dificuldade na comercialização - O mercado regional é favorável (Foz do Iguaçu). produtores Prefeitura Municipal de Vera Cruz - Parcerias com CAPA e ITAIPU - Falta de um projeto regional Possibilidade de realizar projetos com a ITAIPU. do Oeste - Oportunidade: mercado institucional favorável - Faltam técnicos O mercado regional é favorável (Foz do Iguaçu). FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR 95 QUADRO 3.5 - ENTIDADES NÃO-GOVERNAMENTAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 continua ENTIDADES Associação para o Desenvolvimento da Agroecologia (AOPA) ATIVIDADES RESTRIÇÕES - Falta de assistência técnica. Falta de pesquisa. Falta de crédito ao produtor. A comercialização é um dos gargalos. OPORTUNIDADES - Mercado de orgânicos em expansão. - O potencial de mercado pode ser viável ao produtor familiar. 96 - Desenvolve trabalhos em agroecologia através de três eixos: articulação políticointerinstitucional, processos de organização dos agricultores e fortalecimento de sistemas agroecológicos. - Faz parte da Rede Ecovida, através do Núcleo Maurício Burmester, que congrega municípios da RMC e Litoral. - Atualmente desenvolve os seguintes projetos: Programa de Inclusão Social, financiado pela TRIAS (entidade belga), com o objetivo de inclusão de agricultores em risco de exclusão social, nos municípios do Vale do Ribeira. Projeto Florestando a Agricultura Familiar, com o objetivo de recuperação de recursos naturais a partir da agroecologia e agricultura familiar, em 5 municípios da RMC, Vale do Ribeira em PR e SP, com financiamento da Petrobrás e em parceria com a CCA (Cooperativa Central de Reforma Agrária do Paraná Ltda), FETRAF/Sul-Cut (Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar do Sul do Brasil), Embrapa Florestal (Centro Nacional de Pesquisa em Florestas) e FNMA (Fundo Nacional do Meio Ambiente). Projeto Trilhares, com recursos do MMA/PDA visa desenvolver sistemas agroflorestais, gerando referências de indicadores para outras regiões, na região do Vale do Ribeira, principalmente em Barra do Turvo/SP e Adrianópolis/PR, em parceria com as prefeituras, Cresol's, Parque Estadual do Jacupiranga, entre outras. - Entre 2004 e 2005, coordenou o Curso PósMédio de Agroecologia, realizado na Fazenda Camguiri, campus da UFPR, voltada à formação de agricultores e agricultoras do Paraná, através da UFPR e DESER, com recursos do MDA. QUADRO 3.5 - ENTIDADES NÃO-GOVERNAMENTAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 continua ENTIDADES Rede Ecovida de Agroecologia ATIVIDADES RESTRIÇÕES OPORTUNIDADES - Através de grupos de pessoas, a Rede procura organizar e consolidar a agricultura familiar. - Atua nos três estados do Sul. - Desenvolve iniciativas em agroecologia. - Promove o desenvolvimento de associações. - A população ainda não está esclarecida sobre as diferenças entre produtos orgânicos/ agroecológicos e convencionais. - Faltam pontos de venda (não aquele mercado convencional, mas principalmente locais como feiras etc.). - Não há recursos financeiros para os agricultores na fase de conversão. - Os agricultores não conhecem o mercado. - Falta relação com o consumidor. - Há pouca organização por parte dos produtores. - Falta apoio financeiro - PROAGRO, para sementes crioulas. - Falta experiência de ação conjunta (associação). - Falta apoio da pesquisa. - Conscientização de parcela da população quanto os benefícios de consumir produtos orgânicos/agroecológicos. - A preocupação das pessoas com relação à saúde tem favorecido o desenvolvimento da agricultura orgânica/agroecológica. - Programa de Aquisição de Alimentos da CONAB. - Merenda escolar. - Apoio a programas de fruticultura temperada. - Políticas públicas para conversão. - Formação de maior número de profissionais em agroecologia. - Intercâmbio entre grupos de agricultores. - Articulação de ações de produção com comercialização. - Atua no Centro-Sul do Estado e também em nível nacional. - Visa à promoção do desenvolvimento da agricultura, baseado na agroecologia e no fortalecimento da agricultura familiar. - Realiza cursos de formação e capacitação. - Presta assistência técnica. Assessoria e Serviços a Projetos - Atua na organização da produção agroecológica. em Agricultura Alternativa (ASPTA) - Na região onde atua, atende diretamente a 40 grupos de produtores, com atendimento direto e indireto a 500 famílias. - Parceiros: IAPAR, UEL e EMBRAPA. - É uma das entidades organizadoras das Jornadas Paranaenses de Agroecologia. - Participa da Rede Ecovida. - São 380 associados no sudoeste paranaense. - Em 2006, a prioridade é a formação de filhos de agricultores, com enfoque em todas as dimensões: cultural, produção e vida. É uma formação de referência, envolvendo o produtor no processo de construção. Associação de Estudos, - Parcerias: CAPA, DESER, Sindicatos de Orientação e Assistência Rural Trabalhadores, FETRAF, entidades de (ASSESSOAR) articulação (MST, Via Campesina, MAS, MPA, MMC). Utiliza-se da Pedagogia da Terra para Assentados - PRONERA. - Participa da Rede Ecovida. - Atualmente não presta assistência técnica aos agricultores. - Fortalecimento do mercado institucional. - Falta crédito diferenciado. - O modelo da produção orgânica poderá ser a - Não há legislação própria para produção e mudança da matriz tecnológica. comercialização. - É necessária maior infra-estrutura no meio rural. - Criação de alternativas de comercialização (canais alternativos, mercado justo). - Burocracia nos processos de licitação. 97 QUADRO 3.5 - ENTIDADES NÃO-GOVERNAMENTAIS DE APOIO à AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 continua ENTIDADES ATIVIDADES - Trabalha a produção e a comercialização de forma associativa, solidária e agroecológica. - Atua em oito municípios da região Oeste. RESTRIÇÕES - Irregularidade na produção. - Falta de critério da classificação dos produtos pelo mercado comprador. OPORTUNIDADES - A Associação é uma oportunidade de comercialização para o produtor. - Fortalecimento do Programa Fome Zero. - Apoio à ACEMPRE - Associação Central dos Produtores Rurais Agroecológicos - Mal. Cândido Rondon, que comercializa produtos (olerícolas, frutas e produtos de origem animal) dos associados. - Apoio à APAVE - Associação dos Produtores Agroecológicos de Verê, que comercializa Centro Paranaense de Apoio ao produtos (hortaliças, frutas e produtos de Pequeno Agricultor (CAPA) - origem animal) dos produtores assistidos pelo Marechal Cândido Rondon e Verê CAPA. - Incentivo ao agricultor para agroindustrializar os produtos com o objetivo de agregar valor (geléias, doces, biscoitos, queijos etc.). - Parcerias: entidades públicas - municipal e estadual, sindicatos, universidades, MDA, entre outras. - Participação na elaboração e execução de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento rural. - Participa da Rede Ecovida. - Atua principalmente na região norte paranaense e também na região oeste, em Comitês Gestores de Agroecologia. - Presta assistência técnica. Fundação Mokiti Okada - Na data da pesquisa, a instituição atendia a 15 famílias diretamente e a mais de 40 famílias de forma indireta. - Parcerias: IAPAR, SEBRAE, EMATER, CAPA e Prefeituras. - Falta capacitação ao produtor. - O mercado para produtos orgânicos é grande. - É necessário que a atuação do CPRA seja - Há procura por alimentos sem produtos descentralizada. químicos. - Falta conscientização do consumidor quanto aos benefícios em consumir produtos orgânicos/naturais. - Necessidade de melhorar os preços pagos pelo PAA. - Não há apoio (crédito) ao agricultor no período de conversão. 98 QUADRO 3.5 - ENTIDADES NÃO-GOVERNAMENTAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 continua ENTIDADES ATIVIDADES - Atua na região central paranaense, com o objetivo de fortalecer a agricultura familiar, assentados, sem-terra e categorias de produtores como arrendatários e parceiros. - Atua no desenvolvimento da produção agrícola, gestão econômica, capacitação e formação de recursos humanos, gestão participativa nos grupos e comunidades. Fundação RURECO - Atua no desenvolvimento da olericultura, grãos, frutas, plantas medicinais e mel junto aos RESTRIÇÕES - Necessidade de maior apoio para extensão rural e assistência técnica. - Necessidade de formação de profissionais - OPORTUNIDADES - Implantação do tema agroecologia no currículo escolar. - Fortalecimento do sistema ATER. inclusão, no currículo, dos cursos técnicos e superior de agronomia, com enfoque à agroecologia. - Necessidade de organização da produção e comercialização. - Necessidade de incentivar o produtor a agregar valor aos produtos (agroindustrialização). agricultores. - Trabalha em cooperação com organismos internacionais, com entidades como FUNBIOMDA-SAF_SDT e UNICENTRO. - Os agricultores comercializam seus produtos em feiras, mercado institucional, supermercados, CERCOPA, lojas, sacolas e na propriedade. - Participa da Rede Ecovida. - Atua na região central do Estado, principalmente no município de Turvo, na - Necessidade de pesquisa. Mercado em crescimento. - Necessidade de crédito. preservação das florestas. - Presta serviços de assistência técnica, planejamento da produção, comercialização, Instituto Agroflorestal Bernardo Hakvoort (IAF) certificação e processamento dos produtos. - Atende a 80 famílias de agricultores, que trabalham basicamente com plantas medicinais. - Mantém parceria com a Fundação RURECO. - Os recursos para desenvolver as atividades são provenientes de cooperação internacional e organismos nacionais. - Participa da Rede Ecovida. 99 QUADRO 3.5 - ENTIDADES NÃO-GOVERNAMENTAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 conclusão ENTIDADES ATIVIDADES - Atua na formação e capacitação e na assistência técnica. Instituto Os Guardiões da Natureza (ING) - Auxilia os agricultores na comercialização. RESTRIÇÕES - Falta assistência técnica. OPORTUNIDADES O mercado para produtos orgânicos é grande. - Falta pesquisa para o desenvolvimento da agricultura orgânica. - Realiza estudos e projetos com recursos de entidades ligadas ao desenvolvimento da biodiversidade. - Participa da Rede Ecovida. - Atua em nível regional. - No município de Turvo, atende a 11 grupos compostos por 4 a 5 famílias que desenvolvem a fruticultura. Em Irati, atua com oito grupos que exploram a olericultura, fruticultura e grãos. Instituto Equipe de Educadores Populares (IEEP) - Atua nas áreas de formação, capacitação e gestão para agroindústria com base no método - Preferência, por parte do consumidor final, - Capacitação de agricultores através do "Método pelos produtos convencionais, em função do de Educação Popular" (troca de experiências padrão de apresentação destes. entre grupos, a lógica do mercado é solidária e não-mercantil). - Incentivo à agroindustrialização. - Apoio à organização de grupos de consumidores. de educação popular. - A comercialização dos produtos é realizada através da associação AGAECO, com orientação dos técnicos do Instituto. - Participa da Rede Ecovida. FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR 100 QUADRO 3.6 - OUTRAS ENTIDADES DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 continua ENTIDADES ATIVIDADES PROJETO ORGANICS BRASIL - - Atua em nível nacional. entidade ligada à Agência de - Aproximação dos potenciais mercados Promoção de Exportação e Investimento (APEX), do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior SEBRAE-PR RESTRIÇÕES - Faltam produtos. - Mercado interno e externo de orgânicos em crescimento. compradores e vendedores. - Há demanda do mercado internacional por - Presta serviço de organização de feiras frutas tropicais. internacionais, realizando o trabalho de logística. - Atua no desenvolvimento da agricultura orgânica desde 2000, com participação no Projeto PROCAXIAS. - Realizou vários eventos sobre agricultura orgânica - Com a coordenação da entidade, criou-se o Comitê Estadual de Agricultura Orgânica, para, entre outras atividades, capacitar técnicos e agricultores. - Faltam estudos de mercado. - Estabelece e fomenta as relações de parcerias - Problemas de acesso a mercados (regularidade - Tendência de crescimento do mercado. - Falta capacitação em gestão e gerência. - Falta logística de distribuição de produtos. - Falta assistência técnica. - Falta pesquisa na área de produção. - Em função do momento difícil pelo qual tanto com a organização da agricultura familiar de vários produtos, falta de organização de atravessa a agricultura (estiagem, alta dos como com instituições públicas e privadas. entidades de agricultores). preços dos insumos, queda nos preços dos - Orienta e monitora o produtor e realiza o controle e avaliação dos projetos financiados. - Sistema bancário elitizado e pouco capilarizado produtos agrícolas, endividamento pelos para ações locais em nível do crédito modelos de financiamento tradicionais), a agroecológico. agricultura orgânica seria fundamental para a - Necessidade de serviço de ATER efetivo para a agroecologia. A ATER estatal ocupa-se de Cooperativa Central Cresol Baser OPORTUNIDADES sustentabilidade desses agricultores. - Necessidade de aproximar os financiamentos às programas governamentais (está engessada propostas agroecológicas. Alguns avanços na com outras funções, como, por exemplo, área do crédito já são vistos, apresentando bons efetivar o Pronaf em muitos municípios). resultados. - A ATER não-governamental possui pouca - Organização dos segmentos sociais, a exemplo estrutura (humana e de infra-estrutura). das cooperativas e associações de pequenos - Aspectos tecnológicos, principalmente relacionados à penosidade do trabalho (a agricultura convencional tem larga vantagem, produtores na área da produção e comercialização. - Os mercados consumidores estão consolidando comparada à agroecológica). Faltam pesquisas a necessidade de produtos saudáveis, embora e tecnologias que potencializem trabalhos e nas pequenas cidades isto seja mais difícil. 101 produtos no sistema agroecológico. QUADRO 3.6 - OUTRAS ENTIDADES DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 conclusão ENTIDADES PROCAXIAS - Localizado em ATIVIDADE - Principais produtos desenvolvidos - plantas Quedas do Iguaçu, foi implantado medicinais, banana-passa, soja, hortaliças e em 1999, através de uma frutas. associação de municípios da tem prestado serviço visando ao Jorge d'Oeste, Capitão Leônidas desenvolvimento agroecológico e ambiental e à Cruzeiro do Iguaçu, Boa Vista d'Aparecida, Boa Esperança, Nova OPORTUNIDADES - Falta assistência técnica. - Mercado de orgânicos em crescimento. - Falta crédito para os agricultores. - Venda através do PAA. - Na área do assentamento a ONG WWF-Brasil região centro-sul paranaense: São Marques, Três Barras do Paraná, RESTRIÇÕES capacitação técnica de produtores. - Tem recebido apoio institucional de prefeituras e do SEBRAE. Prata do Iguaçu, Salto do Lontra e Quedas do Iguaçu FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR 102 103 4 MERCADOS E AGENTES DE COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTOS ORGÂNICOS NO PARANÁ Nesta quarta parte do estudo são apresentados os resultados relativos à pesquisa de campo, com o objetivo de caracterizar os agentes atualmente envolvidos diretamente nos processos de comercialização, procedendo a uma descrição de como se organizam os três principais tipos de mercado dos produtos orgânicos pesquisados: o da venda direta, do varejo e da transformação. Também apresentam-se, de forma geral, algumas informações relativas aos dois outros tipos de mercado de orgânicos existentes no Paraná, o externo e o institucional, ressalvando-se que estes últimos não tiveram o mesmo tratamento e aprofundamento que os anteriores. A seguir explicita-se o entendimento sobre cada um dos tipos de mercado que comercializam produtos orgânicos no Paraná: a) mercado da venda direta: predominam como agentes o agricultor/produtor e o próprio consumidor, os quais estabelecem uma relação face a face no processo de comercialização, situação típica em feiras livres, entrega de sacola e venda direta na propriedade; b) mercado do varejo: os principais agentes são os equipamentos do varejo – redes de hiper e supermercados, supermercados locais e regionais, lojas especializadas e outros –, as empresas de transformação e distribuição de produtos orgânicos, os agricultores individuais e as associações de agricultores; c) mercado de transformação: os principais agentes são as empresas de transformação – processadoras e beneficiadoras –, os agricultores como fornecedores de matéria-prima, e os demais tipos de mercado onde os produtos são comercializados, seja no varejo, na relação face a face ou no mercado externo. Aqui também têm papel importante associações e/ou cooperativas de agricultores que atuam na transformação de alimentos; d) mercado externo: é voltado para a exportação, em que estão envolvidos como agentes empresas comerciais que atuam segundo demandas preestabelecidas por compradores externos, e os agricultores, direta ou indiretamente, através de entidades representativas; e) mercado institucional: os agentes envolvidos são instituições governamentais, desde as federais às municipais, bem como organizações de agricultores. A seguir tem-se o mapa 2, que situa os agentes de comercialização pesquisados no Paraná. 1% & 4 *. *9 % )+ 74 $ %% # ( 6- * % % % ! *! )4" * 4 *! $ *! )4 - 4 - / $4 *! % % " $ / 0/ & 0 2 $ % 4 %% % $9 & $ / . $ : $! 2 )5 2*/ . */ ) 4 < 4 / " ! % % % % $ -! )% . 5 *9 *9 * . - ).! $ .9 8 *! % % 4 " %% % ' ! 3! % %% %% % . % 3 $ - 1" ) &! % $ . ) / $5 )7 1 " $ 4 & " !" * $4 ( ! % " . *5 *! ) 5 )8 * 4 $4 ! * . *! ( ': 2 ) ! # 9 . *9 3+ 1 *! !/ !9 ! ! 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A partir dos resultados da pesquisa de campo, aborda-se a atuação dos atores envolvidos no processo e apontam-se algumas restrições e oportunidades identificadas. Para efeito da pesquisa de campo, visitou-se uma feira em cada uma das cinco grandes regiões, situada nos seguintes municípios: Curitiba, Francisco Beltrão, Borrazópolis, Maringá e União da Vitória. 4.1.1 Feiras: Um Canal em Expansão Com base nos dados coletados na pesquisa de campo elaborou-se uma tipologia das feiras de orgânicos no Estado do Paraná considerando dois aspectos principais: modo de estruturação e funcionamento. Em todas as feiras predomina a comercialização dos produtos pelos próprios agricultores familiares produtores de orgânicos. Contudo, as diferenças podem ser explicadas por um conjunto de fatores que envolvem forma de produção, processo de certificação, organização dos produtores, fatores socioculturais e apoio institucional (municipal, estadual e federal). Nesse sentido, três tipos de situações foram observadas: as feiras orgânicas, as agroecológicas e as mistas (orgânicas e convencionais). As feiras orgânicas são caracterizadas pela presença de produtores certificados, que comercializam produtos in natura e processados no próprio estabelecimento ou de terceiros também certificados, seguindo as normas da Lei 10.83157. A barraca e a propriedade recebem o selo de certificação, com validade de um ano, que pode ser por auditagem ou participativa.58 Este tipo de feira é característico de municípios com maior número de habitantes, a exemplo de Curitiba, que atualmente conta com seis locais de comercialização na cidade. O quadro 4.1 mostra que esse tipo de feira tende a se estabelecer em capitais e municípios de maior porte, como já acontece em outros estados do País. Dos seis locais de feiras orgânicas em Curitiba, quatro foram abertos nos últimos cinco anos. Entretanto, a análise do contexto das feiras livres, quanto à representatividade e abrangência, mostra que o número de pontos de feiras orgânicas ainda é pequeno em relação às feiras convencionais, que contabilizam 40 pontos de vendas em 75 bairros da cidade. Vale lembrar que todos os pontos funcionam em bairros de maior poder aquisitivo no centro da cidade e entorno. 57 A Lei 10.831 estabelece normas para produção, processamento, transporte e comercialização de produtos orgânicos. 58 A diferenciação nos formas de certificação são discutidas neste trabalho na Parte 2, item 2.2, que trata da institucionalização da agricultura orgânica. 106 QUADRO 4.1 - LOCAL, ESTRUTURA, DIA DE FUNCIONAMENTO E DATA DE ABERTURA DAS FEIRAS ORGÂNICAS EM CURITIBA - PARANÁ - 2006 (1) LOCAL/BAIRRO NÚMERO DE BARRACAS (2) DIA DA SEMANA/PERÍODO DATA DE ABERTURA Passeio Público - Centro 22 Sábado de manhã 18/03/1995 Campina do Siqueira - Champagnat 10 Terça-feira de manhã 13/01/1998 Jardim Botânico 07 Sábado de manhã 27/01/2001 03 (orgânicas) Quarta-feira de manhã 30/09/2003 Praça do Expedicionário - Centro 08 Quarta-feira de manhã 20/10/2004 Praça do Japão - Batel 12 Quinta-feira à tarde 20/02/2005 Emater (Mista) - Cabral FONTES: SMAB, ACOPA (1) Segundo a Prefeitura Municipal, outros dois pontos de feira devem ser abertos: no Cabral, às quintas-feiras, e na Praça da Ucrânia, no bairro Champagnat, aos sábados pela manhã. (2) Há repetição de produtores nos locais de venda. Alguns permissionários atendem a dois pontos de venda. São comercializados 67 itens nas diferentes feiras, entre produtos in natura (a maioria deles) e processados. A feira orgânica de Curitiba, conhecida inicialmente como "Feira Verde", foi inaugurada em 1989, com uma barraca junto à feira de artesanato no Largo da Ordem, na Rua Jaime Reis, ao lado da Sociedade Garibaldi. Foi criada oficialmente em 06/06/1993, com oito barracas, e depois transferida para o Passeio Público, em 18/03/1995, com 10 barracas. Em 2005, este espaço de comercialização passou a ser denominado "Feiras Orgânicas"59. Segundo dados da Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento (SMAB) de Curitiba, em 2006 foram contabilizados 39 permissionários nos seis locais de feiras orgânicas, sendo 34 produtores certificados e 5 distribuidores, que trabalham com revenda de produtos certificados. Os dados de acompanhamento da comercialização mostram que o consumo nas feiras orgânicas passou de 156 toneladas/ano, em 1997, para 470 toneladas/ano, em 2005, segundo informações obtidas junto à Secretaria Municipal do Abastecimento de Curitiba. No gráfico 4.1, a seguir, observa-se que o incremento maior na comercialização ocorreu entre 2000 e 2001, mantendo-se relativamente estável nos anos seguintes. Alguns fatores contribuíram para o aumento nas vendas das feiras orgânicas, como a frustração das associações na comercialização com os supermercados, a abertura de novos pontos de feira, a expansão do número de agricultores e de barracas nas feiras, acrescidos da maior divulgação a respeito dos produtos na mídia. Nesse mesmo período ocorreu também a fundação da Associação de Consumidores de Produtos Orgânicos do Paraná (ACOPA)60, que tem como um de seus objetivos a divulgação da agricultura orgânica. 59 Ver item 2.2, Parte 2, deste estudo, que aborda a institucionalização da agricultura orgânica no Paraná. 60 A ACOPA foi fundada em 15 de julho de 2000 com o objetivo de aproximar agricultor e consumidor, e apoiar o consumo responsável e o mercado justo e solidário. Possui uma barraca na feira do Passeio Público para divulgar e apoiar a abertura de novos pontos de venda de orgânicos na cidade, estimulando o consumo consciente. 107 O crescimento indica uma mudança de comportamento e de decisão políticoeconômica das associações de produtores em relação à escolha de canais para comercialização de orgânicos. Estudo realizado por Darolt (2002a) mostrou que, no período de 1998 a 2001, as associações de agricultores tiveram como importante estratégia de comercialização a venda de produtos para algumas redes de supermercados, tanto as regionais como outras fora do Estado do Paraná. Naquele período verificou-se um crescimento na demanda por orgânicos 35% superior à oferta. Retomando o quadro 4.1, constata-se que, no período, Curitiba contava com apenas dois pontos de feiras, que permaneceram com um crescimento pequeno no volume de vendas até 2001 (ver gráfico 4.1). Essa fórmula de comercialização via supermercado mostrou-se insustentável para as associações de produtores, havendo um desgaste na imagem dos alimentos orgânicos por parte da população. Pesquisa de Darolt, acompanhando cerca de 40 produtos orgânicos comercializados basicamente via supermercado, mostrou que, do valor total (100%) deixado no caixa pelo consumidor, 30% em média foi destinado ao agricultor, 33% para cobrir os custos dos distribuidores com classificação, embalagem, transporte e pessoal, e o restante (37%) ficou com os supermercados. Ademais, os descartes nas gôndolas de supermercados eram assumidos integralmente pelas associações, o que aumentava a margem dos supermercados e encarecia demasiadamente o produto final para o consumidor. O quadro atual mostra uma tendência diferenciada, em que empresas orgânicas integradas assumem a negociação com as redes de supermercados e as associações operam em circuitos mais curtos, fortalecendo as feiras e o pequeno varejo. Outra tendência para os grandes centros, que se dará em Curitiba em breve, é a abertura de Mercados Públicos Fixos de Orgânicos. A idéia inicial é estruturar um espaço para comercialização tanto de produtos in natura quanto de orgânicos industrializados, não só do Paraná mas também de outros 108 estados brasileiros e mesmo de outros países. Encontrar a equação ideal entre a participação das associações de agricultores e as empresas nesse empreendimento será um desafio para todos os envolvidos no processo. Para diminuir a margem de erro, o apoio institucional da Prefeitura Municipal tem sido decisivo, realizando pesquisas com os consumidores, os produtores e os distribuidores. Tomando como base o Mercado Municipal de produtos convencionais, a tendência é de que os produtos in natura e processados, provenientes da região, sejam comercializados pelas associações, enquanto produtos orgânicos processados de outras regiões e países seja tarefa das empresas. Em relação à divulgação, o estudo de campo mostra que não existe uma estratégia de marketing que permita aos consumidores diferenciarem a feira orgânica de uma feira convencional, por exemplo. Apesar de a feira orgânica apresentar barracas diferenciadas (confeccionadas em bambu) e o selo de certificação (pouco reconhecido pelos consumidores), as informações ainda são insuficientes para sensibilizar a grande massa de consumidores em potencial, o que faz com que o aumento do número de clientes seja gradual, ocorrendo principalmente na forma de comunicação direta (boca-a-boca). Em pesquisa recente, Kirchner (2006) observou que a média de público que passa pela maior feira orgânica do Estado, a do Passeio Público, é similar à média da feira convencional, cerca de 600 pessoas/feira, com pico entre 10 e 12 horas. A pesquisa revelou também que o perfil do público em feiras orgânicas e convencionais também é semelhante, formado por profissionais liberais e funcionários públicos com famílias de 3 a 4 membros, nível de renda entre 9 e 12 salários mínimos e instrução superior. É interessante observar que os consumidores de produtos convencionais mostram-se motivados a adquirir produtos orgânicos, porém consideram como entraves o preço alto e a dificuldade de encontrá-los. Muitos consumidores desconhecem o local da feira orgânica próximo à residência, bem como as diferenças entre as feiras orgânicas e as convencionais. Um dos motivos principais para o baixo consumo dos orgânicos está relacionado aos altos preços destes. Nesse sentido, o tipo de canal tem influência preponderante. O gráfico 4.2 mostra uma comparação de preços, para uma cesta de 13 produtos hortifrutigranjeiros, entre a feira convencional e a orgânica. Os resultados indicam uma similaridade em relação ao preço e qualidade dos produtos. Assim, pode-se concluir que o fator preço, normalmente apontado como motivo para o não-consumo de orgânicos, não é relevante neste tipo de canal – as feiras – para uma mudança de atitude do consumidor. 109 Por outro lado, quando se comparam os preços dos orgânicos nas feiras e supermercados, as diferenças são muito significativas, apontando uma variação superior a 100% (gráfico 4.3). Como a maior parte das pessoas freqüenta os supermercados, a imagem predominante é a de que os produtos orgânicos são caros, difíceis de encontrar e destinados à população com alto poder aquisitivo. Quanto à origem dos produtos, a maior parte das hortaliças e frutas in natura encontradas na feira orgânica é proveniente de produção própria e colhida num raio que varia entre 30 e 100 km do local dos estabelecimentos dos agricultores familiares. Alguns produtos processados, com destaque para sucos de frutas e geléias, são provenientes de outras regiões e também de outros estados, como Santa Catarina, Rio Grande do Sul e São Paulo. 110 Entre as dificuldades apontadas pelos agricultores orgânicos cabe citar a falta de assistência técnica continuada, dificuldade de acesso ao crédito para financiamento da produção e comercialização, logística, transporte das mercadorias, falta de divulgação para os consumidores e poucos locais de venda. Alguns produtores comercializam em dois pontos de feiras, além de fazerem entrega em domicílio e restaurantes e venderem no próprio local de produção. A atividade de comercialização restringe o tempo dispensado à produção, levando à necessidade de contratação temporária de pessoal, nem sempre qualificado para a produção de orgânicos. Para melhorar a comercialização, os feirantes trocam produtos entre si e com grupos de outras regiões visando aumentar a oferta de suas barracas. Possuem também um acordo para uma política de preços, que equipara o preço da maioria dos 67 itens comercializados, privilegiando a cooperação e minimizando a concorrência entre eles. O segundo tipo de mercado de produtos orgânicos identificado na pesquisa são as feiras agroecológicas, que se caracterizam por comercializarem produtos certificados e não certificados. Os produtos não certificados são considerados coloniais e/ou artesanais. Essas feiras ocorrem principalmente em municípios de menor porte no interior do Estado, sobretudo nas regiões Centro-Sul, Sudoeste e Oeste do Paraná. A maioria dos produtos também é produzida na região pelos próprios agricultores, grupos ou associações. No caso dos produtos in natura, como hortaliças e frutas, a forma de produção costuma seguir as normas da agricultura orgânica. Entretanto, para alguns alimentos processados produzidos de forma artesanal, utilizam-se insumos convencionais no processo (por exemplo, pão produzido com farinha de trigo convencional e fermento em pó químico, frango alternativo tratado com ração convencional, queijo produzido com leite convencional). Observou-se que esse tipo de feira caracteriza-se, em muitos casos, pela existência de uma barraca, gerenciada por um agricultor responsável que representa um grupo de 3 a 7 agricultores. Esta situação foi verificada nas regiões Centro-Sul, Sudoeste e Oeste, em municípios de pequeno porte. Esses espaços de comercialização aproximam-se muito do que podemos chamar de comércio justo e solidário, pois estimulam a diversificação da produção vegetal e animal, além de possibilitar o acesso ao alimento agroecológico para a maior parte da população. Os preços são similares aos dos produtos convencionais e bastante acessíveis, apresentando uma diferença acentuada com relação às feiras orgânicas dos grandes centros. O público é diversificado, incluindo praticamente todas as classes sociais. Os agricultores estão organizados em grupos ou associações e a certificação predominante é a participativa, por meio da Rede Ecovida. Outra forma de certificação é a que garante que o agricultor está de acordo com as Normas da Agricultura Orgânica (Garantia de Conformidade). Neste caso, como acontece em União da Vitória, as propriedades recebem a certificação através da Secretaria da Agricultura Municipal, podendo usar um selo de qualidade que permite comercializar os produtos agroecológicos em feiras e estabelecimentos do município e região. 111 O terceiro tipo de feira encontrado na pesquisa é a feira mista, que possui barracas de venda de produtos certificados (orgânicos e/ou agroecológicos) e produtos convencionais e hidropônicos (com uso de agrotóxicos e adubos químicos). Este tipo de feira ocorre no Paraná em cidades-pólo, como Maringá. A estrutura e o funcionamento das barracas orgânicas seguem as mesmas regras da feira convencional, ocupando uma pequena parte (de 10% a 15%) em relação ao total de barracas. A diferenciação básica se dá por meio de cartazes e faixas, que identificam as barracas como certificadas. Os preços praticados apresentam uma pequena diferença em relação aos dos similares convencionais, cerca de 5 a 10% superiores. Em termos de divulgação, esse formato acaba por confundir ainda mais o consumidor, por nivelar os produtos orgânicos com os convencionais e hidropônicos. Outro ponto a ser observado é que, nos grandes centros, parte dos produtos convencionais é proveniente das Centrais de Abastecimento Atacadistas (CEASAs), fazendo o agricultor mais o papel de intermediário do que de produtor. Neste caso, a maior parte dos produtos é proveniente de outros estados, com destaque para São Paulo, que possui o maior centro atacadista da América Latina, distribuindo para as regiões Norte e Oeste do Paraná, além de Curitiba. Ressalte-se que esta concorrência acaba prejudicando os produtores orgânicos. Segundo os agricultores entrevistados as dificuldades estão relacionadas, sobretudo, à falta de assistência técnica na produção, e de assistência administrativa na comercialização, o que resulta na pouca diversidade de produtos oferecidos. No caso de Maringá, as 13 barracas de orgânicos acabam ofertando os mesmos tipos de produtos, destacando-se alface, almeirão, rúcula e cenoura, evidenciando uma falta de planejamento conjunto da produção. Os dados da pesquisa mostram uma aparente contradição. Se por um lado a demanda dos consumidores aumenta, há pouco interesse por parte de novos agricultores de se inserirem no processo, o que pode ser explicado pela gestão inadequada do processo e pela falta de apoio para a diminuição dos riscos inerentes à fase de conversão. A pesquisa identificou ainda outras dinâmicas de comercialização de orgânicos, como a entrega de cestas em domicílio, restaurantes e pequenos varejos, e o mercado ambulante, que circula com veículo identificado (em bairros de Marechal Cândido Rondon, por exemplo). Outras oportunidades têm surgido com as vendas institucionais para merenda escolar e instituições públicas. Além do trabalho dos próprios agricultores familiares e de suas entidades de apoio, o que se verificou é que o apoio institucional tem sido decisivo, situação que ficou evidente em alguns municípios do Oeste do Paraná. No quadro 4.2, a seguir, apresentam-se algumas características do mercado face a face, destacando-se as feiras, a entrega em domicílio e a venda direta, apontando-se também algumas oportunidades e restrições identificadas. QUADRO 4.2 - MERCADO DA VENDA DIRETA DE PRODUTOS ORGÂNICOS (FEIRAS, ENTREGA EM DOMICÍLIO E VENDA NA PROPRIEDADE) - CARACTERÍSTICAS, OPORTUNIDADES E RESTRIÇÕES - PARANÁ -2006 MERCADO FACE A FACE CARACTERÍSTICAS - Barraca apropriada e diferenciada (por exemplo, bambu), desmontável ou móvel - Certificação da propriedade e dos produtos comercializados - Preparação do local, em termos de divulgação, Feiras Orgânicas considerando a clientela que se deseja atingir - Respeito à regulamentação sanitária (sobretudo OPORTUNIDADES RESTRIÇÕES - Contato direto com o consumidor - Deslocamentos e horários fixos - Divulgação do trabalho e da filosofia - Desconforto, sobretudo no inverno e em orgânicos locais abertos - Pagamento à vista - Pouco tempo disponível para a produção - Abertura de novos pontos de venda - Exigências sanitárias (principalmente os - Formação de clientela - Direito ao local, formação de "ponto" quanto aos produtos de origem animal) produtos de origem animal) - Necessidade de grande diversificação de produtos - Respeito aos horários de funcionamento - Necessidade de pessoas com sensibilidade para lidar com o público Deslocamentos regulares ao encontro do consumidor - Conhecimento com antecedência mínima dos produtos a comercializar - Regularidade no sistema de produção - Possibilidade de contato na casa do consumidor Entrega em Domicílio - Pouca flexibilidade de horários - Número insuficiente de entregas para compensar o deslocamento - Dificuldade de criar, manter e renovar a clientela - Venda de toda a mercadoria - Falta de tempo para a produção - Maior margem líquida de comercialização - Necessidade de grande diversificação de - Recebimento do dinheiro à vista ou no curto produtos para atender aos pedidos prazo - Formação de clientela fiel - Recepção de grupos em épocas determinadas ou com horário marcado - Respeito aos horários para abertura e Venda na Propriedade Sistema "Colha-e-Pague", com prova e degustação fechamento do ponto de venda - A colheita é realizada pelos próprios consumidores - Exigência de proximidade com a clientela e de fácil acesso - A publicidade e a sinalização são indispensáveis - Permite sensibilizar os turistas e consumidores - Valorização do tempo pelo custo do produto degustado - Permite a elaboração de uma lista de visitantes para encaminhamento de produtos - Não há custos diretos de colheita - Possibilidade de diversificação, visando tornar a clientela fiel - Necessidade de pelo menos duas pessoas: uma delas para acompanhar as visitas e a outra para a degustação e venda - Maior logística, sobretudo nos finais de semana (estacionamento, acesso, banheiros, sinalização) - Abertura obrigatória nos finais de semana, feriados e férias - Perdas de produtos por pisoteio - Baixo rendimento com grupos escolares FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR 112 113 4.1.2 Algumas Considerações sobre o Mercado da Venda Direta O mercado da venda direta de produtos orgânicos é o mais antigo do Paraná. O processo de construção desse mercado iniciou-se na primeira metade da década de 1980, quando predominava a comercialização através da entrega de sacolas, tanto entre agricultores e consumidores individuais, como entre grupos/associações de agricultores e grupos de consumidores. Embora esta forma ainda exista em várias cidades do Estado, o que predomina atualmente são as feiras de produtos orgânicos. A primeira iniciativa ocorreu no final dos anos 80, na cidade de Curitiba, quando foi inaugurada a "Feira Verde", oficializada como uma feira específica em meados de 1990. É na cidade de Curitiba que está o maior número de feiras. Constatou-se, pela pesquisa, que as feiras do mercado da venda direta podem ser consideradas a partir de três tipos: as feiras orgânicas, as feiras agroecológicas e as feiras mistas. O que diferencia os dois primeiros tipos é a existência ou não da comercialização de produtos com certificação, seja ela por auditagem ou certificação participativa. No primeiro caso, todas os produtores e as barracas exibem um selo de certificação. No caso das feiras agroecológicas os produtos podem exibir ou não um selo de certificação, sendo que a principal garantia de procedência é dada pela própria relação de confiança estabelecida entre o agricultor e o consumidor no momento da compra. As feiras mistas são aquelas que originariamente comercializavam somente produtos convencionais e, com o passar do tempo, foram agregando barracas que comercializam produtos orgânicos, sejam eles certificados com selo ou tenham a garantia do produtor. Os três tipos de feira estão espalhados por vários municípios do Estado do Paraná. Na capital, Curitiba, o tipo que predomina é a feira orgânica, que exibe a certificação em cada uma das barracas. Em Curitiba também se encontra o maior número de feiras – atualmente são seis –, situadas em bairros distintos da cidade, funcionando em dias e horários diversos. Nas cidades menores do interior do Estado predominam as feiras agroecológicas. O que possibilita esta condição é o fato de o agricultor e o consumidor viverem próximos física e socialmente, o que muitas vezes dispensa a certificação. As feiras mistas, por sua vez, também ocorrem no interior, predominando, contudo, nas cidades de porte médio, como Maringá, seja pelo ainda limitado número de produtores e de produção como também pelo número de consumidores, o que inviabiliza a existência de uma feira única de orgânicos. As feiras comercializam principalmente produtos in natura do grupo das hortaliças, mas também ofertam grãos, produtos de lavoura temporária, frutas e produtos transformados, desde os beneficiados aos processados. De um modo geral uma barraca oferece mais de 20 itens, cuja produção é dos próprios agricultores responsáveis pelas barracas ou do grupo de 114 agricultores a eles ligados. Alguns produtos são trazidos de outras regiões do Estado e também dos demais estados do sul do País. Entretanto, em sua expressiva maioria são originários da produção de agricultores familiares individuais ou de organizações de agricultores. Para o presente estudo, uma das principais características a ser consideradas é que neste mercado as transações comerciais são estabelecidas mediante a relação face a face entre o produtor e o consumidor. Em todos os tipos de feiras mencionados são os próprios agricultores familiares os comerciantes dos produtos orgânicos, e, como já se mencionou, uma mesma barraca pode oferecer produtos de uma única família de agricultor ou reunir a produção de mais de uma família e mesmo de um grupo de agricultores familiares. Esse tipo de mercado oportuniza, de um lado, que o consumidor tenha um maior conhecimento sobre os produtos que está comprando, o que de certa forma amplia sua compreensão de que, para além do produto, há um processo que envolve o sistema de produção, e, do lado do agricultor, há a oportunidade de desenvolver habilidades no âmbito das transações comerciais, o que certamente contribui para a apreensão do mercado como um ambiente fundado em relações sociais. 4.2 O MERCADO DO VAREJO: OS SUPERMERCADOS E AS LOJAS As recentes pesquisas relativas à comercialização de produtos orgânicos têm enfatizado a relevância do mercado do varejo na quantidade de venda dos produtos. Esta afirmativa decorre do fato de a maioria dos estudos ter sido realizada na Região Sudeste do Brasil, na qual concentram-se a maior parte da população urbana e as maiores redes de super e hipermercados, que representam as estruturas de abastecimento hegemônicas no mercado agroalimentar nas últimas décadas. Uma pesquisa realizada nessa região (ALCÂNTARA; SOUZA, 2005) mostrou que "as grandes redes de varejo concentram atualmente 80% da oferta de hortícolas orgânicas ao consumidor final, no Estado de São Paulo, e 73% da oferta no Estado do Rio de Janeiro". E identificou, na estrutura desse mercado, as principais formas de aquisição de produtos orgânicos, sendo que a última é a que vem se consolidando. São elas: - compras com base única e exclusivamente no preço; - obtenção dos produtos por produção própria (integração vertical); - aquisição por meio de formas intermediárias entre a integração vertical e a compra em "alianças estratégicas" ou por contratos, formais ou não. O presente estudo identificou que esse último formato também predomina na cidade de Curitiba, cujas características de abastecimento assemelham-se àquelas dos grandes centros urbanos da Região Sudeste do País. Como se mostra a seguir, as grandes redes da capital só transacionam com fornecedores já estruturados empresarialmente, os quais mantêm 115 relações de integração vertical e/ou horizontal, denominadas parcerias, com os agricultores familiares de orgânicos. Nas demais regiões do Estado o mercado do varejo é bastante incipiente. Quando existe a comercialização de orgânicos o que se verifica é que os fornecedores são de menor porte, ofertando tanto produtos convencionais como orgânicos, com produção própria, às vezes integrados com outros produtores, cujas transações se dão na maioria das vezes mediante contratos informais. Os dados da pesquisa sobre o mercado do varejo no Paraná são apresentados a seguir, abordando-se inicialmente as características que este mercado adquire nos supermercados e, em seguida, nos equipamentos do varejo de menor porte, como lojas e restaurantes. 4.2.1 Os Supermercados e a Comercialização de Produtos Orgânicos A comercialização de produtos orgânicos pelos supermercados no Paraná tornou- se mais significativa a partir dos últimos cinco anos, e está concentrada praticamente na cidade de Curitiba. Antes de 2000 ocorreram as primeiras iniciativas, estabelecidas em associações de agricultores e gerentes de setor de FLV (frutas, legumes e verduras) de determinadas lojas de redes de supermercado regionais. A produção em maior escala, a definição de alguns itens de logística – acondicionamento, regularidade da entrega –, as formas de contratação (prazos de pagamento, consignação, devolução etc.) estavam se estruturando, num processo de construção deste mercado para os orgânicos. Atualmente é na capital que a atividade está de fato estruturada e onde a comercialização de orgânicos teve um impulso definido e sustentado. Este processo iniciou-se entre os anos de 1995 e 1997, com a criação da Associação de Agricultura Orgânica do Paraná - AOPA61, por agricultores familiares, técnicos e consumidores de produtos orgânicos da região metropolitana de Curitiba. As primeiras iniciativas de comercialização com supermercados não foram no Estado do Paraná, mas sim na cidade de São Paulo, através de uma empresa paulista, com lojas da rede Carrefour e Pão de Açúcar. Em 1997 a AOPA estabeleceu uma parceria com a Associação de Pequenos Agricultores de Colombo (APAC), 61 A AOPA foi criada em 1995 tendo como um de seus objetivos viabilizar processos de comercialização da produção de orgânicos para os agricultores a ela associados. A comercialização de alguns agricultores já ocorria no mercado face a face, na Feira Verde e na entrega de sacolas, mas o objetivo da Associação era encontrar novos canais a fim de dar vazão à produção que crescia em volume à medida que se ampliava o número de novos agricultores. A primeira iniciativa da AOPA na relação com supermercados ocorreu fora do Paraná, em 1996, resultando de uma parceria com uma empresa paulista, fornecedora de produtos orgânicos no mercado varejista de São Paulo, atendendo lojas do Carrefour e da rede Pão de Açúcar. Frustrados nesta primeira iniciativa, voltaram, em 1998, a estabelecer nova parceria com outra empresa, Sítio "A Boa Terra", para também entregar produtos às redes de supermercados (KARAM, 2001, p.123-130). 116 do município de Colombo, na RMC, e transferiu sua sede junto a esta entidade, que passava por dificuldades de manutenção. Embora a APAC e seus agricultores já comercializassem a produção de hortaliças com algumas redes de supermercados da cidade de Curitiba, foi a AOPA que desencadeou as negociações com os supermercados para comercialização de produtos orgânicos na RMC, através das gerências de FLV. Em 1997 começaram a ser atendidas quatro lojas da rede Mercadorama de Curitiba. Em 1998 a relação comercial ampliou-se para 12 lojas, e em 1999 este número cresceu para 16 lojas de supermercados que ofertam produtos orgânicos em Curitiba, sendo a maioria da rede Mercadorama (KARAM, 2001, p.128-129). Cabe destacar que os agricultores familiares envolvidos não se restringiam somente àqueles situados nos municípios da RMC, mas também participaram deste processo grupos de agricultores associados à AOPA da região centro-sul do Estado (principalmente União da Vitória e entorno, Palmeira, Irati, São João do Triunfo, Lapa, entre outros). Ao mesmo tempo em que a AOPA acompanhava tecnicamente a produção orgânica, para atender ao mercado varejista foi necessário montar e organizar toda uma estrutura de recebimento, seleção, embalagem dos produtos, bem como a logística de distribuição às lojas dos supermercados. Os dois principais embates, na época, eram a dificuldade em efetivar o planejamento da produção, garantindo a produção demandada pelas lojas, e arcar com o processo de devolução dos produtos não comercializados pelos supermercados, que tratavam os produtos orgânicos nos mesmos termos da relação contratual com os fornecedores de hortaliças convencionais. Entre 2000 e 2001, a relação entre a associação e os supermercados, já bastante tensionada, chega no limite, e os agricultores, em assembléia, decidem desistir de se relacionar por meio da AOPA com os supermercados. As razões que levaram à decisão passavam pelas novas relações contratuais impostas pelo grupo Sonae, como aquisição do espaço, devolução integral, taxa sobre cada produto cadastrado, e, a mais perversa, o pagamento à Associação passou a ser feito mensalmente, chegando a ocorrer, porém, 120 dias após a entrega dos produtos.62 A partir desse período as relações entre os fornecedores e os supermercados passaram a ocorrer nos moldes que predominam no mercado agroalimentar, tendo, de um lado, os próprios equipamentos, e, de outro, empresas estruturadas para tal fim. A exceção ficou por conta de algumas lojas de supermercados locais e regionais, que permaneceram 62 A AOPA, após ter deliberado pelo fim da relação com os supermercados, transferiu sua sede para Curitiba, com o propósito de instalar uma loja de produtos orgânicos. A loja funcionou até 2003. Os produtos eram entregues no local, onde havia um barracão para recepção, seleção e armazenagem dos produtos, sendo vendidos prioritariamente a granel, tanto aqueles in natura como os grãos. A diversidade ofertada era bastante expressiva, com produtos tanto da RMC como de outras regiões do Paraná, e também de outros estados. 117 negociando com a APAC, a qual, além dos produtores de hortaliças convencionais, tinha já agricultores produzindo orgânicos. Duas empresas estruturaram-se e mantêm-se como as principais fornecedoras para os supermercados de Curitiba: Fruto da Terra e Rio de Una. A primeira é de propriedade de uma família agricultora do município de Colombo, tradicionais produtores de hortaliças, que em 1995 destinaram uma parte das terras para o cultivo de orgânicos. Como a empresa já era fornecedora e transacionava com os supermercados, a partir de 2000 estrutura-se como uma fornecedora empresarial de orgânicos. A segunda é uma empresa instalada no município de São José dos Pinhais, que antes de 2002 já era fornecedora de hortaliças para os supermercados, atuando principalmente com embalados e minimamente processados. A partir dessa data deixa de produzir e ingressa no ramo de orgânicos como uma empresa agrícola.63 Essas empresas obtêm grande parte da produção de agricultores familiares, com os quais mantêm relações de integração vertical e, por vezes, horizontal, denominadas parcerias. Atualmente, segundo informações dos gerentes das maiores redes de supermercados da região de Curitiba, no setor de FLV o percentual das vendas de hortícolas orgânicas em relação às convencionais varia de 8% a 15%, contra menos de 3%, há dois anos. As hortaliças são, sem dúvida, o grupo de produtos orgânicos de maior comercialização nos equipamentos varejistas, sendo que o percentual de vendas dos produtos orgânicos de mercearia seca (produtos não-perecíveis e que não precisam de refrigeração) em relação aos similares convencionais é irrisório.64 Os supermercados em Curitiba Atualmente, as grandes redes em Curitiba – Wal-Mart65, Condor, Carrefour, Extra, Muffato, Angeloni – ofertam produtos orgânicos em todas as lojas da capital. Quando não o fazem, é por falta de produtos ou problemas de logística. As redes de porte médio – Festval, Super Dip, Jacomel e outras – procuram seguir a tendência das grandes redes. Nas lojas de bairro, de redes menores (Fantinato, Gasparin), ou em supermercados de loja única há pouca oferta de orgânicos, normalmente os produtos da mercearia seca mais comuns (açúcar mascavo, farinhas). 63 A empresa Rio de Una iniciou suas atividades em 1996 como uma empresa de alimentos, trabalhando com hortaliças de produção convencional. Inicialmente dispunha de produção própria e aquisição fidelizada de agricultores locais e seu objetivo era produzir legumes e verduras selecionados, lavados e embalados em atmosfera especialmente controlada, empregando tecnologias de processamento. Somente em 2002 estrutura-se para atuar no mercado de orgânicos (RIO DE UNA, 2006; PLANETA ORGÂNICO, 2006). 64 Não foi possível obter dados das planilhas dos supermercados. 65 O Wal-Mart é uma empresa varejista americana que atua também no ramo supermercadista. Em 2006 a empresa comprou a rede de supermercados do grupo Sonae, em Curitiba, sendo que este último havia adquirido a rede regional Mercadorama, atuante em Curitiba, em 2000. 118 Nas grandes redes, até o ano de 2004 as negociações e o recebimento dos produtos hortícolas eram definidos e realizados pelos responsáveis do setor de FLV, diretamente nas lojas. Mais recentemente os procedimentos são feitos pelas centrais de compras e distribuição.66 Os fatores que motivaram essas mudanças foram principalmente o aumento da demanda, das vendas no varejo e do volume, e a concentração da oferta em duas grandes empresas fornecedoras em Curitiba (Fruto da Terra e Rio de Una), o que permitiu aos supermercados empregar a mesma logística aplicada aos demais grupos de produtos comercializados. Também contribuiu para isso o movimento recente e acentuado de concentração no setor supermercadista em Curitiba e no Paraná, com aquisições de redes de médio e grande portes por grupos maiores (o Wal-Mart adquiriu o Sonae, em 2005), os quais têm aberto um número significativo de novas lojas nas principais cidades do Estado. Nas demais redes, de médio e pequeno portes,67 predomina o modo anterior de aquisição de produtos pelas lojas, com tendência a centralizar os processos à medida que crescem e ajustam a logística. Em termos de estrutura desse tipo de mercado, os produtos orgânicos estão inseridos nos processos de transação comercial da mesma forma que os demais produtos do mercado agroalimentar. Entretanto, há algumas iniciativas nas redes maiores, que atualmente mantêm um mesmo profissional para negociar a aquisição dos produtos com os fornecedores atuais e buscar novos fornecedores, quer se trate de produtos convencionais ou orgânicos, declarando a atenção ao crescimento da demanda destes últimos. Porém, de modo geral não há qualquer diferença nas negociações por se tratar de produto orgânico – os prazos de pagamento, a consignação, as formas de desconto e a devolução são semelhantes aos que se aplicam aos demais produtos. Os supermercados no interior do Paraná No interior do Estado, a comercialização de orgânicos nos supermercados é relevante apenas na região Oeste, onde, nos últimos cinco anos, ocorreram ações mais definidas, aparentemente comandadas pela rede de supermercados Muffato, uma empresa de origem regional. 66 No Wal-Mart o processo é coordenado pelo Clube do Produtor, uma gerência responsável pela negociação com os produtores/fornecedores de FLV convencionais e orgânicos, fiambreria, padaria, açougue e peixaria. Nos demais, há os encarregados pelas negociações nos diferentes setores de produtos, nas Centrais de Compras e Distribuição (CDs). 67 Segundo a tipificação dos formatos de loja elaborada pela Abras/Nielsen, um supermercado pequeno possui até 250 m² de área de vendas, em média 3 check-outs (caixas de saída) e número médio de 5.000 itens de venda. Nos supermercados médios, esses indicadores situam-se em 1.001 a 2.500 m² de área de venda, 12 caixas e média de 14.464 itens ofertados. Os grandes, classificados como supermercados ou hipermercados compactos, têm uma área de venda de 2.501 a 5.000 m² de venda, 22 check-outs e média de 19.880 itens ofertados. Finalmente, os hipermercados possuem acima de 5.000 m², 49 caixas e média de 36.716 itens. 119 Nesse caso, a estratégia era iniciar a oferta de produtos orgânicos em lojas de bairros com população de maior renda, em Cascavel e Foz do Iguaçu. Para isso pensava-se em desenvolver formas de apoio à produção e aos produtores, e definir a logística de entrega e comercialização, de contratos de fornecimento etc. Contudo, passado o período inicial de organização das atividades, em 2001/2002, e apesar das intenções de todos os gerentes de supermercados em dinamizar a comercialização nas suas lojas, o que se observa é a estagnação, refletida na ausência de produtos à venda nos supermercados. A situação diferenciada que se identificou no interior do Estado foi a do supermercado da Cooperativa COPAGRIL, de Marechal Cândido Rondon, cujos produtos orgânicos são fornecidos na sua maioria pela ACEMPRE68, a associação de comercialização dos produtores orgânicos com sede no município. Ali se ofertam hortícolas, frutas (acerola, banana, carambola), farinhas e farelos (centeio, fubá, soja, trigo, arroz), açúcar mascavo e guaraná em pó. Uma particularidade que aparece de forma mais significativa no Oeste são as iniciativas de algumas associações e de agricultores para negociar com os proprietários de supermercados das redes locais ou regionais (2 e 3 lojas, respectivamente) e com supermercados de loja única. Isto ocorre devido à possibilidade de menor burocratização nas negociações com os proprietários dos supermercados, à intermediação de pessoas do poder local (secretários de agricultura, prefeitos), às vantagens de logística de transporte e entrega, de comunicação etc. Fora a capital e a região Oeste, a comercialização de produtos orgânicos nas demais regiões é pouco significativa atualmente. Em Londrina, apenas em um supermercado havia oferta de hortícolas, oriundas da empresa Rio de Una, de Curitiba, e alguns produtos de mercearia seca. Em Guarapuava, uma rede regional comercializa hortícolas, também de Rio de Una, bem como frutas, café, suco, arroz, feijão, soja em grão, farinha de trigo, que provêm de associações de agricultores da região e de outras regiões do Estado. Em Francisco Beltrão, uma rede local comercializa orgânicos desde 2002, principalmente hortícolas, e açúcar mascavo, fornecidos por uma associação de produtores de orgânicos do município de Verê. A visão dos supermercados sobre os produtos orgânicos A visão dos supermercados com relação aos orgânicos é apresentada a seguir, a partir de algumas entrevistas realizadas com gerentes ou responsáveis por setores de frutas, legumes e verduras. Em geral, esses referem-se aos produtos orgânicos de forma positiva quanto: - às suas peculiaridades (por serem isentos de agrotóxicos, pela qualidade alimentar); 68 A ACEMPRE (Associação Central de Produtores Rurais Ecológicos) comercializa produtos de uma "rede" de associações de agricultores familiares orgânicos, estruturada há uma década, e atende aos supermercados locais, porém de forma intermitente. 120 - ao potencial de atração de clientes de renda elevada; - ao potencial futuro de vendas dos produtos orgânicos em geral (hortifrúti, sucos, farinhas, grãos etc.). Relativamente aos pontos negativos, afirmam que o principal deles está na esfera da produção, referindo-se ao fato de a atividade não estar estruturada tal como a produção convencional, o que resulta em dificuldades para atender aos parâmetros ditados pelo mercado agroalimentar. Segundo esses mesmos gerentes, a comercialização de produtos orgânicos ainda não se firmou no grande varejo pelas seguintes dificuldades: a) pouco volume e diversidade - alega-se que os clientes demandam a mesma variedade de produtos orgânicos durante todo o ano, por estarem habituados a consumir os produtos convencionais sem muita variação no suprimento; afirmam também que, além das hortaliças, há poucos produtos disponíveis, como frutas e produtos de origem animal; b) preço elevado - o preço pago ao produtor seria muito superior ao dos produtos convencionais, acima de uma variação admitida pela maioria como razoável (em torno de 30% a mais). Contudo, em nenhum dos casos solicitados os entrevistados dispuseram-se a apresentar a planilha de preços pagos aos produtores. Em consulta aos produtores, a afirmação geral é de que os seus produtos são mais caros que os convencionais, mas com variações para mais que raramente excedem os 50%.69 c) insuficientes divulgação institucional/campanhas educativas da população - os produtos orgânicos são divulgados na mídia apenas em ocasiões especiais, como a Semana de Alimentos Orgânicos; mesmo os consumidores de renda elevada e outros, como os profissionais da saúde, são pouco incentivados a consumir orgânicos; d) atuação dos fornecedores - segundo os entrevistados, os fornecedores de orgânicos devem responsabilizar-se pela promoção, exposição, arrumação e reposição dos produtos nas gôndolas, a exemplo dos demais fornecedores de produtos convencionais. O que se verificou no decorrer da pesquisa é que efetivamente não há uma atenção diferenciada por parte dos supermercados com relação aos produtos orgânicos, seja na apresentação destes nas lojas e gôndolas, seja na relação com os produtores ou 69 É o caso dos produtos fora de época ideal da espécie, de produção extemporânea, em situações bastante adversas de clima etc. Um fornecedor em Curitiba afirmou que, em diversas ocasiões, quando os produtores baixam o preço dos produtos, os supermercados não fazem o mesmo, acarretando aumento das margens de lucro. 121 fornecedores nas esferas da produção ou circulação (apoio à produção e/ou assistência técnica, logística de transporte etc.), nas transações comerciais (formas de pagamento), ou ainda nas outras formas de apoio, como divulgação/propaganda (ver informações complementares no Apêndice 4). 4.2.2 Lojas: Outro Agente no Mercado Varejista Outro equipamento do mercado varejista considerado na pesquisa foram as lojas especializadas e restaurantes, embora sejam ainda pouco representativos na comercialização de orgânicos no Paraná. Foram identificadas e pesquisadas nove lojas nas cidades de Curitiba, Londrina, Maringá e Francisco Beltrão. Esses equipamentos foram localizados principalmente nas cidades de maior porte, como Curitiba e Londrina. De forma geral, são estabelecimentos abertos recentemente, a maioria a partir de 2002. Segundo um dos entrevistados, pioneiro no ramo, o negócio começa a apresentar maior estabilidade a partir do momento em que o número de fornecedores aumenta. Em 2002, a diversidade da loja era atendida por cerca de 10 fornecedores, enquanto no momento são aproximadamente 30 fornecedores. Diferentemente de equipamentos como os supermercados, no caso das lojas especializadas os fornecedores são principalmente as associações de agricultores familiares de produtos orgânicos, ou mesmo agricultores individuais. Todos têm que ter algum tipo de certificação, sendo que a maioria é certificada pelo sistema da garantia participativa da Rede Ecovida, mas também pelo IBD e pela ECOCERT. No quadro 4.3 são identificados alguns produtos e fornecedores para a capital, Curitiba. QUADRO 4.3 - FORNECEDORES DE PRODUTOS ORGÂNICOS PARA AS LOJAS DE CURITIBA - PARANÁ - 2006 FORNECEDORES Grupos da Rede Ecovida do Litoral e Adrianópolis REGIÕES/ESTADOS (1) Região Metropolitana e Litoral PRODUTOS frutas (banana e citrus) do Paraná APOMOP AFRUTA (1) Norte e Noroeste do Paraná (1) Associação do Verê - ACEMPRE (1) (1) APOL Oitavo Mar Ecocitrus (2) (1) Cooperativa Aécia Korin (1) (2) (2) Native frutas (kiwi), batata e cebola Oeste do Paraná tomate Norte e Noroeste do Paraná frutas e legumes Oeste do Paraná peixe (tilápia) Rio Grande do Sul sucos Rio Grande do Sul sucos e molhos São Paulo frango São Paulo açúcar FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR (1) São associações ou organizações de agricultores familiares que comercializam. (2) Trata-se de empresas privadas. café Centro-Sul do Paraná 122 A pesquisa mostrou que a maioria das lojas trabalha com o esquema de entrega de sacolas em domicílio. Este serviço, ainda pouco explorado, permite que o consumidor receba os produtos orgânicos em casa com preços inferiores aos dos supermercados e um pouco superiores aos da feira. A operacionalização desse sistema de venda ocorre de diferentes maneiras: pela internet, com opção de escolha de produtos pelo cliente, ou por meio de telefonema a cada um dos clientes, fornecendo-lhes a lista dos produtos disponíveis naquele dia. A maioria das lojas procura valorizar suas vendas oferecendo material educativo sobre os orgânicos, como fôlderes, panfletos, distribuídos nas sacolas ou durante as vendas no balcão. Outra constatação do estudo é que a procura dos consumidores por orgânicos está crescendo e que este canal ajuda na divulgação e conscientização do trabalho das associações. O trabalho de certificação também oferece uma garantia ao consumidor e auxilia nas vendas. A aquisição dos produtos pelas lojas segue alguns critérios. São eles, em ordem de prioridade: - o produto deve ser certificado, o que aumenta a credibilidade e facilita a comercialização; - diversidade de produtos (mix) (para o abastecimento da loja, o que permite oferecer diversificação ao consumidor); - preço e prazo (pois possibilitam capital de giro); - negociação do frete (relação custo/benefício). As condições de compra funcionam de acordo com o tipo de produto. No caso dos alimentos in natura a compra é realizada à vista, com cheque para 7 ou no máximo 10 dias. Em relação aos processados a compra é efetuada a prazo (15-45 dias), com média de pagamento para 28 dias. É importante destacar que não há devolução de produtos para o produtor e o estabelecimento responsabiliza-se pelas perdas. Para minimizá-las, uma das estratégias é trabalhar em parceria com algumas associações para processamento das frutas que estão passando do ponto ideal para venda, o que contribui no relacionamento entre loja e agricultor. A análise dos principais produtos orgânicos comercializados mostra que a procura é maior, em primeiro lugar, por hortaliças folhosas, sendo a alface americana a mais procurada, seguida pela rúcula e espinafre. Para hortaliças de flores, a maior procura é por brócolis e, depois, pela couve-flor. Entre os tubérculos, a batata, cenoura e beterraba apresentam boas vendas, nessa ordem. Entre as hortaliças de fruto, o campeão de vendas ainda é o tomate, seguido do pepino japonês e abobrinha. Entre os meses de setembro e novembro, há falta de tomate, em função da sazonalidade do produto. Para o grupo dos grãos o produto orgânico mais vendido é o feijão carioca, seguido do feijão preto e adzuki. Em seguida aparece o arroz integral dos tipos agulha e cateto. No caso do cateto, considerado mais saboroso, o preço é 50% superior ao do tipo agulha. 123 O terceiro produto mais comercializado deste grupo é a soja em grão. Por último, tem-se o fubá (amarelo e branco, respectivamente). Um dos pontos que podemos destacar neste grupo é a falta de milho orgânico ranço no mercado. Passando para a análise da venda de frutas orgânicas, ficou evidente, na pesquisa, a dificuldade de aquisição deste produto no Estado do Paraná, mostrando o grande potencial para as diferentes regiões do Estado, que têm a possibilidade de trabalhar com frutas orgânicas tropicais e temperadas. A procura maior é por laranja, seguida de mamão papaia, que apresenta preços muito altos (R$ 12,00/quilo), caqui, abacaxi e banana. Em relação à venda de produtos de origem animal, os mais procurados são os derivados de leite (queijo, manteiga e iogurte), o frango, o peixe e o porco. Para os suínos, o fornecimento foi interrompido em função da perda de certificação e descredenciamento do fornecedor, por falta de ingredientes orgânicos na ração. Outro grupo importante de produtos para sustentação de uma loja é o alimento processado. A venda maior ocorre com os sucos de frutas, com destaque para o suco de uva, citrus e amora preta. Neste grupo, seguem as geléias de frutas, como a de morango, e novidades como a geléia de melancia sem açúcar. Por último, têm-se as farinhas de trigo, soja e arroz. Quanto à origem dos produtos, os resultados da pesquisa mostram que a maioria deles é adquirida de produtores individuais ou de associações de produtores locais. No caso de Curitiba, 100% das hortaliças folhosas são provenientes de municípios da RMC que se encontram num raio de até 60 km da loja. Para os legumes, 60% vêm da RMC e os outros 40% do Norte, Oeste e Centro do Paraná. No caso da cenoura, por exemplo, a região Norte apresenta um clima bastante favorável à adaptação desta cultura ao sistema orgânico. As frutas são originárias da RMC (Adrianópolis, Cerro Azul) e Litoral, que respondem por 25% do total comercializado, seguidos de municípios das regiões Norte e Oeste do Paraná, que respondem por 50%, e o restante, 25%, é proveniente de outros estados (15% de Santa Catarina - maçã, kiwi, maracujá; 5% do Rio Grande do Sul Ecocitrus; 5% de São Paulo - manga, laranja, tangerina morgote). Os grãos comercializados são originários do próprio Estado do Paraná (60%) e do Rio Grande do Sul (40%). Os feijões são provenientes do grupo da Rede Ecovida do município da Lapa, e o arroz tem origem na região do litoral do Paraná e do Rio Grande do Sul. Para os processados, a pesquisa mostrou que o Paraná tem um grande potencial de investimento nas agroindústrias orgânicas. A maior parte (60%) deles vem do Rio Grande do Sul (doces e geléias sem açúcar), 20% do Paraná, 10% de Santa Catarina (Cooperativa Afruta) e 10% de São Paulo. O perfil do consumidor das lojas é semelhante ao que foi identificado nas feiras. A maioria dos clientes são mulheres que buscam, normalmente, produtos orgânicos in natura. Os homens procuram mais os processados, como bebidas (vinhos e cachaças). A faixa de idade dos compradores está entre os 35 e 50 anos, e o nível de renda situa-se acima dos 10 salários mínimos. 124 As motivações dos consumidores para compra, segundo os resultados da pesquisa, estão relacionadas à melhoria da qualidade de vida, considerando aspectos como saúde e meio ambiente, e ao consumo consciente. Segundo os resultados, a influência da mídia e o processo de divulgação nas feiras contribuem para reforçar a imagem dos orgânicos também nas lojas. Entretanto, uma constatação importante é a de que nem sempre são consistentes as informações sobre os orgânicos por parte dos funcionários das lojas, o que pode comprometer a credibilidade dos produtos frente aos consumidores. Em relação ao preço, os informantes declararam que o ideal é manter os preços o mais próximo possível dos similares convencionais. Quando a diferença ultrapassa os 10%, já se notam dificuldades para venda. A certificação dos produtos comercializados em lojas e restaurantes do Paraná é proveniente, na grande maioria, da Rede Ecovida, IBD e ECOCERT. Apenas um restaurante apresentou certificação da ECOCERT. Observa-se, contudo, que o alto custo da certificação do estabelecimento, no estágio atual, apenas diminui as margens, pois o consumidor ainda não reconhece este atributo como diferencial. A pesquisa permitiu destacar alguns produtos com potencial de venda nas lojas, como: massas orgânicas, derivados de leite (iogurte de frutas), derivados de carne (bovinos, suínos), frutas exóticas (lixia, romã, melão de São Caetano, pitanga e fruta-do-conde). O quadro 4.4 apresenta, no que tange às lojas no contexto do mercado varejista, algumas condições, oportunidades e restrições. QUADRO 4.4 - MERCADO VAREJISTA (LOJAS) DE PRODUTOS ORGÂNICOS - CARACTERÍSTICAS, OPORTUNIDADES E RESTRIÇÕES - PARANÁ - 2006 MERCADO VAREJISTA Características Oportunidades Restrições Atendimento ao consumidor Boa margem de lucro; Alto custo de manutenção (energia, funcionários, aluguel, oferecendo uma grande forma rápida de conseguir transporte-frete) diversidade de produtos novos clientes, se o ponto for (in natura, processados e bem localizado outros) Investimento em equipamentos (expositores refrigerados) Necessidade de grande diversificação de produtos Troca de mercadorias com vida de prateleira maior Investimentos em material de divulgação para fixação no local (cartazes, fôlderes, folhetos com receitas culinárias, brindes promocionais) Pagamento antecipado nas primeiras compras FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR Por fim, apesar de existirem particularidades entre as regiões de estudo, em função das características dos grupos de agricultores e canais de comercialização, os resultados da pesquisa mostram que as lojas são ainda pouco expressivas no conjunto do mercado varejista. Contudo, como se identificou, do ponto de vista dos agricultores familiares essas 125 constituem um importante equipamento no mercado do varejo, uma vez que as possibilidades de definir as bases das transações comerciais estão em processo de construção. 4.2.3 Algumas Considerações sobre o Mercado do Varejo O estudo mostrou que a comercialização de produtos orgânicos no mercado do varejo é muito recente em todo o Paraná, iniciando-se de maneira mais estável a partir de 2000, tendo como os dois principais agentes que atuam nas vendas dos produtos as redes de supermercados e as lojas especializadas. Esses agentes estão situados predominantemente em Curitiba, sendo os equipamentos das redes de supermercados em maior número que as lojas especializadas. No interior do Estado verificou-se que a presença de tais agentes e do próprio mercado do varejo é bem menos relevante. A situação excepcional que se observou foi na região oeste do Paraná, no município de Marechal Cândido Rondon, onde os produtos orgânicos são comercializados pelo mercado do varejo. Entretanto, trata-se de um supermercado local vinculado a uma cooperativa de produtores. No caso de lojas especializadas, no interior foram identificadas somente três lojas, duas delas na região Norte (uma em Londrina e outra em Maringá) e a terceira na região Sudoeste, em Francisco Beltrão. Quanto à oferta de produtos orgânicos no mercado do varejo, a pesquisa mostrou que, no caso dos supermercados, são as hortaliças o principal grupo comercializado. Os produtos de mercearia seca, como os processados em geral, são ofertados em menor escala, sendo praticamente inexistentes em alguns casos. No caso das lojas especializadas, os principais produtos comercializados são os processados em geral, particularmente os sucos, geléias, grãos e farinhas. Contudo, também são comercializadas hortaliças e frutas, embora com diversidade limitada, verificando-se ainda, em alguns casos, a oferta de produtos de origem animal, como queijo, manteiga e iogurte, bem como frango, peixe e suínos, cabendo destacar que, para estes últimos, há alguns limitantes quanto às exigências da legislação sanitária. Nos supermercados os produtos orgânicos são ofertados somente embalados, na maioria das vezes em gôndolas com algum tipo de identificação, embora se tenha observado que muitas vezes esses são encontrados misturados com produtos hidropônicos e convencionais, sendo reconhecidos somente pelo selo de certificação na embalagem. Já nas lojas os produtos embalados são em sua maioria processados, aqueles de mercearia seca, enquanto as hortaliças, frutas e alguns grãos são ofertados a granel em sua maior parte. Com relação à estrutura de relações sociais que envolvem as transações comerciais entre os agentes do mercado do varejo, identificou-se que há diferenças bastante significativas entre os dois tipos de equipamento. Os supermercados atuam com os produtos orgânicos empregando a mesma lógica com que transacionam com os demais produtos do mercado agroalimentar, seja em termos de exigências de padronagem, embalagem, custos e prazos de pagamento. Não 126 negociam com agricultores produtores de orgânicos. Todo o processo de negociação se dá com empresas constituídas para tal fim, as quais são apresentadas a seguir, quando se abordam as características do mercado da transformação de produtos orgânicos. A pesquisa mostrou que, no Paraná, há duas empresas que transacionam produtos orgânicos do grupo das hortaliças com as redes de supermercados, ambas situadas em dois municípios da RMC. Embora essas duas empresas mantenham áreas próprias de cultivo (cerca de 25%), a maior parte da produção que negociam é oriunda de mais de 100 agricultores familiares produtores de hortícolas orgânicas (a grande maioria da RMC), com os quais estabelecem contrato do tipo parceria ou de integração, dependendo da situação. Com relação às lojas especializadas a situação encontrada é distinta. Nestes equipamentos a relação de compra de produtos se dá diretamente de produtores individuais ou de associações de agricultores familiares produtores de orgânicos, sendo que as condições são estabelecidas diretamente entre os dois agentes, produtores e compradores. Os produtos são originários na sua maioria das próprias regiões das lojas, no caso de hortaliças e frutas, e os demais produtos de mercearia seca são provenientes também de outras regiões e estados. Quanto ao processo de garantia de procedência dos produtos orgânicos, a pesquisa mostrou que o mercado do varejo só opera com produtos que têm o selo de certificação de terceira parte, sendo que os dois principais certificadores são o IBD e a ECOCERT. A exceção é o caso do supermercado da região Oeste, que, dadas as suas características, trabalha com produtos orgânicos certificados pela Rede Ecovida de Agroecologia, que se baseia no sistema de garantia participativo (SGP). Finalmente, o estudo verificou que o mercado do varejo é um dos tipos de mercado onde se transacionam os produtos orgânicos, predominando aí as estruturas que caracterizam o mercado agroalimentar, com as redes de supermercados. Neste mercado os produtos parecem ser mais importantes que o conhecimento e a valorização do processo de produção, o que de certa forma não só obscurece a importância da agricultura familiar como ator fundamental da produção, mas limita sua atuação como um agente de comercialização. 4.3 MERCADO DE TRANSFORMAÇÃO: EMPRESAS E ASSOCIAÇÕES DE PROCESSAMENTO E BENEFICIAMENTO As empresas de processamento e beneficiamento de produtos orgânicos são analisadas neste estudo como mais um tipo de mercado para os produtos orgânicos do Paraná. O que se constatou foi uma diversidade de formatos, envolvendo o tamanho das empresas; produtos; formas de contrato, tanto com os agricultores como com os compradores; tipo de clientela a ser atendida nos níveis local/regional, nacional ou internacional; tecnologia envolvida no processamento ou beneficiamento etc. 127 A pesquisa de campo possibilitou uma visão geral deste segmento. Os dados e informações coletados destinaram-se a investigar alguns aspectos, tais como: agregação de valor nos produtos processados ou beneficiados; fornecedores de matérias-primas; formas de aquisição e origem dos produtos primários; existência ou não de serviços de apoio aos produtores; destino dos produtos comercializados; vantagens e restrições apontadas no mercado de orgânicos; perspectivas das empresas em relação à comercialização, dentre outras questões. As primeiras empresas começaram a atuar há pelo menos 10 anos e estão localizadas em praticamente todo o território paranaense (mapa 3). Os produtos com os quais trabalham são provenientes em sua maioria da agricultura familiar e apresentam uma significativa diversificação com relação aos grupos de produtos. Dentre eles destacam-se os grãos (principalmente soja e café), hortaliças, frutas, mandioca (fécula), cana-de-açúcar (açúcar mascavo e cachaça), mel, ervas medicinais (chás), erva-mate e alguns subprodutos (geléias, barras de cereais, biscoitos). No que se refere à relação das empresas com os seus produtores de matéria-prima, observou-se que esta pode ocorrer tanto com produtores individuais como com associações de produtores e cooperativas de produtores, podendo a matéria-prima ser proveniente, ainda, de produção própria. De um modo geral as empresas adquirem os produtos de origem certificada. A pesquisa de campo permitiu que se identificassem três formas de relação entre as empresas e os produtores fornecedores, independentemente dos produtos e de estar formalizada ou não a relação. Os formatos de relacionamento apresentados a seguir foram adaptados de Alcântara e Souza (2005), verificando-se, de um modo geral, a predominância de relacionamento informal entre as partes envolvidas: a) relação contratual - ocorre quando existe um acordo/contrato formal, em que os agricultores assumem o compromisso de entrega da produção e a empresa compromete-se com a aquisição da produção (situação semelhante ao sistema de integração); b) relação independente - não existe vínculo entre as partes e a compra pode ocorrer a qualquer momento; os agricultores escolhem o produto que desejam oferecer de acordo com o interesse da empresa; c) relação de parceria - o agricultor não possui terra, mas planta na propriedade da empresa que comercializará os produtos; a parceria viabiliza a renda pelo trabalho do agricultor, enquanto a empresa tem garantia da produção. (. *. *,( .9( , 8 * 4 *(6 (*( -* ,( ./01 (. *( (. (.7( (3 6 (06 (. 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Outro aspecto mencionado refere-se à certificação, quando, via de regra, a empresa contribui com os agricultores na viabilização da acreditação, particularmente naquelas situações em que o produto final é destinado à exportação. Por fim, cabe citar a maior estabilidade financeira do agricultor, desde que a empresa efetivamente cumpra com os acordos estabelecidos previamente. À exceção de situações bastante particulares, onde estão envolvidos agentes relacionados ao mercado justo (fair-trade), também neste tipo de mercado o que se verifica é uma maior ênfase nas tecnologias de produto do que nas de processo. Do ponto de vista da gestão da produção processada ou beneficiada, o resultado da pesquisa de campo possibilitou a construção de tipos de empresas, tomando por base a proposta de Alcantara e Souza (2005): a) empresas de processamento: produzem produtos que passam por algum processo de transformação, mudando as características físicas, químicas e fisiológicas do produto original, resultando em maior valor agregado. São empresas com grau de investimento e tecnologia de processo de produção conhecidos, e pouco exigentes em termos de mão-de-obra especializada. No caso dos orgânicos, são exemplo dessas empresas as que processam canade-açúcar para fabricação de cachaça ou de açúcar mascavo, e mandioca, para a produção de fécula; b) empresas de processamento mínimo: os produtos permanecem em sua forma in natura, apenas com leve modificação em suas condições iniciais (são eliminadas as partes não comestíveis, com redução de tamanho ou montagem de mix diversos). Os produtos são menos elaborados e, portanto, com menor agregação de valor. Tais empresas necessitam fazer investimentos em equipamentos, como câmaras frias, transporte refrigerado, técnicas de processo de produção (saladas higienizadas e preparadas diretamente para o consumo em embalagens com atmosfera modificada) e mão-de-obra especializada. Este é o caso, principalmente, das empresas que atuam com hortaliças e frutas; c) empresas de beneficiamento: os produtos não sofrem nenhum processo de transformação e não ocorre agregação de valor, passando apenas por procedimentos mais simples que não alteram suas características como produto natural. A retirada de impurezas que acompanham o produto do campo, a 130 lavagem e a secagem são exemplos de procedimentos do beneficiamento. Foram identificadas como empresas de beneficiamento de orgânicos as que atuam com alguns grãos (soja, arroz, feijão) e outros produtos de origem animal (mel e ovos). Das 22 empresas pesquisadas, 15 foram enquadradas como de processamento, 2 como de processamento mínimo e 5 como de beneficiamento (quadro 4.5). De modo geral, constata-se que a relação com os compradores é praticamente a mesma, independentemente do tipo de produto oferecido, sejam os processados, minimamente processados ou beneficiados, salvo aquelas que estão direcionadas ao mercado exportador. Os principais compradores dessas empresas, em âmbito nacional, são os supermercados, seguidos das lojas especializadas, eventualmente das feiras, da venda direta e também do mercado institucional. Quanto à comercialização com os supermercados, as empresas de produtos orgânicos processados e beneficiados estabelecem relações diretamente com a central de compras, como é o caso das redes supermercadistas como Wal-Mart, Carrefour, Angeloni, Extra, Mufato), ou com as lojas de supermercados de redes menores, como o Festval, Super Dip, Superpão, Condor. Há situações específicas em que a relação das empresas com os supermercados pode ocorrer por um intermediário atacadista. Um fato que chamou a atenção foi o de que a maior parte das empresas de processamento e de beneficiamento identificadas e pesquisadas não atua exclusivamente com produtos orgânicos, operando também com produtos convencionais, utilizando-se das mesmas plantas industriais para ambos os processamentos. Verificou-se que, nessas situações, são realizados procedimentos de limpeza das máquinas e equipamentos, para evitar a mistura com as sobras do produto convencional, garantindo, ao mesmo tempo, a rastreabilidade do produto orgânico. Segundo as empresas há também uma particular atenção com relação à mão-de-obra, que passa por treinamento e qualificação para atuar em tarefas específicas exigidas na transformação dos produtos orgânicos. A seguir apresenta-se a análise de cada um dos tipos de empresas identificadas, destacando-se os produtos transformados em cada uma delas. QUADRO 4.5 - TIPOS DE TRANSFORMAÇÃO DOS PRODUTOS ORGÂNICOS SEGUNDO AS EMPRESAS, LOCALIZAÇÃO E PRINCIPAIS PRODUTOS - PARANÁ - 2006 TIPOS DE NÚMERO DE TRANSFORMAÇÃO EMPRESAS Processamento Processamento mínimo Beneficiamento 15 2 5 EMPRESAS MUNICÍPIOS PRINCIPAIS PRODUTOS Gama S/A Ponta Grossa/Londrina Soja e açúcar mascavo Lapinha Alimentos Orgânicos Lapa Geléias, sucos e conservas Quina Amarela Campina Grande do Sul Geléias Porto Morretes Morretes Cachaça Terra Verdi Café Orgânico Curitiba Café Tribal Brasil Campo Largo Chás, erva-mate e açúcar mascavo Nutrimental São José dos Pinhais Barra de cereais Fruto da Terra - Chác. Oliveira Antonina Banana passa Fecularia Yamakawa Amaporã Fécula de mandioca Fecularia Loanda Loanda Fécula de mandioca Gebana do Brasil Capanema Soja, farinhas (trigo, milho) Matraga Planalto Cachaça Moinho D'Alegria Medianeira Soja, fubá e farinhas Alimentos Marechal Paulínea Mal. Cândido Rondon Açúcar mascavo e melado Açucarita Medianeira Rio de Una S. José dos Pinhais Hortaliças Fruto da Terra Colombo Hortaliças Indústria Breyer União da Vitória Mel, pólen e cera de abelha Tozan Alimentos Orgânicos Ponta Grossa Soja Gama S/A Ponta Grossa/Londrina Arroz, feijão, milho e trigo Agroorgânica Campo Largo Soja Gralha Azul Avícola Francisco Beltrão Ovos FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR 131 132 4.3.1 Empresas de Processamento As empresas de processamento de produtos orgânicos são bastante recentes no Estado, tendo iniciado as atividades a partir da segunda metade dos anos 90, sendo o soja o principal produto transformado. Foram visitadas 14 empresas privadas na pesquisa de campo, e mais 6 outras de entidades de agricultores, entre associações e cooperativas (mapa 4). No que se refere ao relacionamento com os fornecedores de matéria-prima, predominam as relações comerciais tal como indicado anteriormente. Em geral são contratos informais estabelecidos diretamente com os agricultores ou suas associações, garantindo-lhes, ao mesmo tempo, a compra da produção e a oferta de insumos e serviços – assistência técnica, apoio para a regularização da certificação, entre outros. São exemplos marcantes dessa prática as indústrias de processamento de soja, hortaliças, fécula de mandioca, chás e erva-mate, café e açúcar mascavo. A seguir, detalham-se as particularidades das empresas a partir dos principais produtos. Soja As primeiras plantas industriais de soja orgânica foram instaladas na região sudoeste do Paraná, na década de 90, por uma questão estratégica, uma vez que a produção da matéria-prima concentrada na agricultura familiar é bastante expressiva naquela região. A pesquisa constatou a presença de empresas voltadas ao processamento da soja para alimentação humana – soja grão, óleo, lecitina de soja, farinha de soja integral (kinako), soja descascada, tofu (queijo de soja) e até o gérmen de soja, que entra na composição de medicamentos. Do mesmo modo, foi possível observar a presença de empresas que se dedicam à produção de farelo de soja para alimentação animal. O mercado exportador é o principal destino da soja processada (90%), principalmente para a Europa, Estados Unidos e Japão, e em menor escala para a Ásia, Oriente Médio e Oceania. De um modo geral o mercado na Europa tem sido mais atraente para as empresas nacionais, em razão dos preços vantajosos comparativamente aos dos Estados Unidos, pois, para este último, além de o frete marítimo ser mais alto, observa-se que as necessidades de consumo para alimentação animal vêm sendo supridas internamente. Quanto à constituição de capital das empresas, apenas uma delas tem a participação de capital externo (50%), enquanto as demais são constituídas exclusivamente de capital nacional. ( & * & 5 3 - *!+/ $ 5 *+5 *% *5 3 $ 5 & " 5 + 3 * .5 9 4 3. 9 3 .5 $5 1% / ! & '7 " 4 $! / "4 $ $ ./ *. & $ $ 5 4" *9 5 ?! *9 ) . ! / *. & 0 '9 *! . 9 $ / 4" $! $ & & ! $ / $.5 *9 9 */ ( ) .5 !5 $9 5 *9 & . & " 5 ! -4 . 5 " $! -9 $ *9 2 ! * 9 3 )5 $ 9 ( ) / # 9 $ 9 1!5 ! $ " & !"" *. 5. > ' . 7 2*/ )+ ) * ./ 0 . 4 = .% 0!" ! & . & */ ) 4 - * 9 *. 1 ) < ;/ / 4 ! *9 5 ) - %8 / 74 $ . " 4 . *9 8 $ . 4 4 4 3 * $ 3 $ .9 2 $ : $! -! % 9 ) 8 )% . 0 * 1 " 5 $! - 5 !/ * *9 6- !9 $" *9 $ .% 34 *9 9 * . & 5 * $ 9 & ). - ". . '. & " 1 $ $. ! ).! 3! ( ': $": ) 7 & ! ) *! 0 - ./ $ - $ !: / - 5 .9 $4 3+ - ( 2 6- ) 5 *! # *9 ( )4 *! - 4 ) - * 2" 8 *. ! * . * 2 . ! & 3+ $ )8 / $4 3 ! . 0! ) / $ $ 3! 3+ *! 1 ! " )% *! 1 3 $ *! . 2 * 5 )4" 3 2 $ 4 & * " *! *! !5 & $5 4 / 4 *! *! *! ! " . *5 0 5 4 6- )7 4 4 *! $4 *! 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Por sua vez, os fornecedores da matéria-prima em sua grande maioria são produtores individuais, com propriedades que variam de 1 a 30 hectares (excepcionalmente existem propriedades maiores em outros estados), associações de produtores e algumas cooperativas, estabelecendo-se, em geral, uma relação de parceria com a empresa (similar ao formato de uma integração), em que são fornecidos ao produtor a assistência técnica, os insumos básicos (sementes, defensivos naturais), a certificação, e, em alguns casos, o transporte, havendo, em contrapartida, o compromisso da garantia de compra da safra. Esses produtores têm sido praticamente os mesmos nos últimos dois anos, o que sugere uma relação estável e de confiança com as empresas. Ainda assim, quando há a entrada de novos fornecedores, as exigências apresentadas pelas empresas são bastante rigorosas: treinamento do produtor, histórico da área a ser cultivada, disponibilidade de mão-de-obra e fidelidade com a empresa. Uma das empresas estabeleceu com o produtor a formação de um fundo de reserva quando o produto é exportado, visando reverter na forma de capacitação/formação técnica do produtor. As certificadoras mais presentes são o IBD/Demeter, Ecocert, OCIA, Jas, Nop-Usda, Soil Association e IMO. Por outro lado, as empresas vêem o atendimento ao mercado externo com bastante otimismo, em razão dos preços e da menor carga tributária em relação ao mercado interno, bem como do padrão de qualidade exigido para o produto, pelos países importadores. Já no mercado interno, a soja e seus derivados, incluindo aí a produção animal orgânica, alimentada à base de soja, encontram um mercado pouco atrativo (algumas empresas consideram-no ainda como um nicho de mercado), pois além da carga de impostos ser mais elevada, não existe uma conscientização por parte da população quanto aos benefícios do consumo desses produtos, nem tampouco renda por parte desta. Café Uma empresa e uma associação de produtores representam as experiências levantadas pela presente pesquisa em relação à produção e comercialização de café orgânico. A empresa, situada em Curitiba, tem seu funcionamento baseado na compra da produção dos agricultores ou de suas associações, visando atender ao mercado interno mas principalmente à exportação (trata-se de uma traiding). No entanto, o maior volume de compra é originário de produção de fora do Estado, de Minas Gerais, o qual é exportado via "mercado justo". As exportações ocorrem para os mercados europeu e asiático (Japão, principalmente) e, em menor escala, para os Estados Unidos. Nesses casos, o produto é processado e até liofilizado pronto para o consumo. De outra parte, a associação de produtores, localizada no oeste do Estado, congrega 135 outras 6 associações de municípios em seu entorno, com um total de 70 produtores, sendo 51 em processo de conversão, embora apenas 12 estejam envolvidos com a produção do café orgânico. A produção é certificada pelo IBD, e o produto final comercializado já é preparado e pronto para o consumo, embalado em pacotes de 500 gramas para atender às lojas e ao pequeno varejo local/regional. Algumas dificuldades foram encontradas nesse processo, tais como: obtenção de preço diferenciado, pequeno volume de produção orgânica e baixa qualidade da bebida, o que tem dificultado a exportação. Fécula de mandioca O principal país produtor de fécula orgânica no globo é a Tailândia, que apresenta custos bastante reduzidos em comparação com os demais países. Porém, de acordo com as fecularias pesquisadas neste estudo, trata-se de um produto de qualidade inferior. No Brasil, são poucas as empresas que fazem a transformação da mandioca orgânica em fécula, não ultrapassando meia dúzia, sendo que, dentre elas, duas fecularias situam-se no Paraná, na região noroeste do Estado. Ambas iniciaram a atividade com orgânico recentemente, em 2000, visando atender ao mercado externo. A transformação da produção ainda é muito pequena quando comparada à convencional, pois, segundo uma das fecularias entrevistadas, o produto orgânico representa apenas 5% do total das vendas. Em decorrência, o que se verifica é que há um número muito reduzido de agricultores que se dedicam à produção da mandioca orgânica. O principal importador das empresas paranaenses são os Estados Unidos, que utilizam o produto principalmente para atender à indústria alimentícia em produtos como baby-food, barras de cereais, biscoitos, glicose, doces e sorvetes, mas também há compradores da indústria farmacêutica, que utilizam a fécula na fabricação de xarope. Um dos compradores dos EUA importa do Brasil e exporta para a Europa, que emprega a fécula para as mesmas finalidades. Hoje começa a surgir uma demanda, ainda pequena, pela fécula orgânica no mercado nacional, para atender a demandas da indústria alimentícia. A matéria-prima utilizada pelas fecularias é oriunda da produção de mandioca orgânica da própria região. As empresas transformadoras mantêm com os produtores o compromisso de compra da safra, oferecendo, em contrapartida, a prestação de assistência técnica e a certificação da produção, cujo certificador é o IBD, responsável, também, pela certificação do processo industrial. O produtor de mandioca orgânica chega a receber pela sua produção até 30% a mais que o valor da mandioca produzida no sistema convencional. No entanto, como a indústria opera na área de orgânicos segundo a demanda dos compradores, a demanda de produção é correspondente. Um aspecto que chama a atenção é o fato de a empresa relacionar-se com pouquíssimos produtores, entre seis e dez, os 136 quais fazem a produção em áreas mais extensas (entre 10 e 100 hectares por produtor), situação bastante diversa daquela que se verifica na maioria dos demais cultivos de orgânicos. Outro fato observado é que uma das empresas produz parte de sua própria demanda de matéria-prima, o que indica um processo de verticalização entre produção e transformação. Com relação ao processamento da matéria-prima para a produção de fécula, trata-se de um processo bastante simples: inicialmente a mandioca, ao ser descarregada, passa por uma lavagem para retirar as impurezas vindas do campo; em seguida é transportada para um picador para retirada da camada mais fina e, depois, para um secador; depois, este produto é ralado e prensado para separar a fibra do leite; o leite passa por um secador até atingir 13% de umidade, quando então é transformado na fécula de mandioca, cuja validade é de dois anos. Chás e Erva-Mate Existem pelo menos quatro empresas que vêm processando chás ou erva-mate orgânicos no Estado do Paraná. Para este estudo pesquisou-se somente uma delas, situada na região metropolitana de Curitiba. De um modo geral a produção de chás e erva-mate orgânicos é bastante recente. A empresa entrevistada iniciou suas atividades em 2000, com uma linha de produtos que apresenta oito variedades. Os chás têm como base a própria erva-mate, a qual é misturada a outras ervas ou essências naturais que originam sabores específicos. A matéria-prima vem tanto de produção própria como do sistema de parceria, este último estabelecido com produtores individuais, cooperativas e associações de produtores, chamados de fornecedores. A relação entre ambos tem se mantido estável, segundo a empresa, sendo que, além do cultivo, os parceiros fazem a limpeza do produto colhido. A empresa oferece aos seus parceiros capacitação na produção orgânica e intermedia os serviços das certificadoras – a ECOCERT, que certifica para o mercado interno, e a USDAOrganic e JAS, para os produtos destinados à exportação. Segundo a empresa há também um trabalho voltado à organização dos agricultores e um trabalho de conscientização sobre a relevância de se produzir um produto limpo e saudável. O processamento se dá a partir da erva-mate seca e desidratada – etapa realizada nas unidades de produção dos parceiros –, a qual é encaminhada posteriormente à empresa. A partir deste ponto, a erva-mate é picada e misturada às outras ervas, que também passaram pelo mesmo processo (secagem/desidratação/picagem). Após, o produto é colocado em embalagens prontas para o consumo em forma de sachês ou a granel (a empresa prioriza o layout da embalagem, em latinhas ou pacotes em papel kraft metalizado e embalado a vácuo). Por ora a produção está sendo destinada ao mercado externo, mas a empresa acredita que em breve estará lançando o produto no mercado interno. 137 Açúcar mascavo Em quase todas as regiões do Estado está sendo produzido o açúcar mascavo orgânico, principalmente por meio das associações ou cooperativas de agricultores, de produtores individuais ou, ainda, por empresas. No entanto, as produções ainda são baixas, oriundas da agricultura, e atendem, em geral, às necessidades locais, com algumas exceções de empresas que estão exportando. A transformação do produto é bastante simples: inicia-se com a moagem da cana, cujo caldo é fervido até encontrar o ponto ideal (brix); em seguida retira-se do fogo e continua mexendo até sua solidificação, visando, então, ao resfriamento e à embalagem. Outros produtos: geléias, cachaças, peixes, barras de cereais, grãos – feijão, arroz, milho Tanto agricultores individuais ou reunidos em associações e/ou cooperativas quanto empresas processadoras têm produzido outros produtos, como geléias, cachaças, barras de cereais, bem como beneficiado alguns grãos, principalmente feijão, arroz e milho. De acordo com as características de quem produz e do destino final dos produtos, o processo pode se realizar de forma artesanal ou mediante industrialização. Todos esses produtos já se encontram disponíveis no mercado interno, alguns há mais tempo, como geléias, cachaça, arroz, derivados do milho, e outros em fase de prélançamento, como barras de cereais, ovos e peixe. Independentemente do processo pelo qual passam os produtos, a demanda por estes é que tem orientado as empresas e mesmo as organizações de produtores a atender ao mercado interno ou ao externo. O que se verificou é que são direcionados à exportação e ao mercado interno produtos como os grãos beneficiados, a cachaça (EUA e Europa) e, recentemente, o peixe (EUA). Outros produtos, como geléias e barras de cereais, têm sido produzidos e comercializados sobretudo no País e regionalmente, inclusive por enfrentarem algumas dificuldades, como é o caso da barra de cereais, para cuja composição falta matériaprima. Entretanto, as empresas e organizações de agricultores apostam na ampliação de mercados para seus produtos. 4.3.2 Empresas de Processamento Mínimo As empresas de processamento mínimo que atuam no Paraná transformam fundamentalmente produtos que são comercializados no setor de frutas, legumes e verduras dos supermercados. Elas têm se especializado na oferta de produtos pré-lavados, embalados ou prontos para o consumo. Para este estudo foram ouvidas duas empresas situadas na RMC, consideradas de médio e grande portes (Fruto da Terra e Rio de Una), as quais atuam no setor de legumes e verduras, e duas associações de produtores que estão trabalhando com frutas: acerola, no noroeste do Estado, e banana-passa, no litoral. 138 As empresas que atuam com processamento mínimo requerem investimentos em equipamentos e tecnologias aprimoradas, além de mão-de-obra qualificada, instalações higienizadas e de refrigeração, embalagens especiais e transporte adequado. A seguir comenta-se a atuação dessas empresas, a partir dos produtos. Hortaliças As duas empresas pesquisadas trabalham no processamento de hortaliças convencionais e orgânicas, sendo que, atualmente, mais de 90% da sua produção é com orgânicos. Ambas atuam fundamentalmente no mercado do varejo, atendendo grandes equipamentos, como as redes de hiper e supermercados, sendo que 90% destes estão situados em Curitiba e, em menor proporção, em outros centros maiores do Estado e também nos Estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e na cidade de São Paulo. Em função disso as empresas estruturaram-se para atender às demandas e exigências organizacionais desse mercado, produzindo alimentos de consumo rápido e prático, prélavados, cortados e embalados com higienização recomendada. São produtos considerados de maior valor, uma vez que a eles estão agregados os procedimentos de processamento. As empresas dedicam-se à integralidade do processo, atuando desde a produção da matéria-prima, processamento, distribuição e comercialização de hortaliças orgânicas. Ambas trabalham com uma gama bastante diversificada de produtos. São mais de 30 espécies, como alface americana, brócolis, couve-flor, tomate comum, tomate cereja, cenoura, couvemanteiga, cenoura baby, rúcula, repolho e beterraba, entre outras. No que se refere à obtenção da matéria-prima, ambas trabalham tanto com produção própria como com a produção de agricultores familiares, denominados parceiros, e, ainda, com produção vinda do sistema de integração. Em ambas as empresas a produção própria corresponde a 23%, a de produtores individuais a 47%, e a das associações de produtores a 30%. A produção por parceria é estabelecida em 20% da produção para o produtor, ou a R$ 0,50 a R$ 0,70 por caixa de produto, com fornecimento dos insumos por conta da empresa, assistência técnica, certificação, embalagem e transporte. No sistema de integração, em que o cultivo ocorre nas terras do próprio agricultor e a empresa também oferece as mesmas condições de apoio, o preço para o produtor é estabelecido em função dos custos de produção calculados pela empresa. As duas empresas têm seus fornecedores concentrados na RMC, porém uma delas também busca a produção com 22 produtores do norte do Paraná. No total trabalham com cerca de 100 agricultores, seja no formato de parceria ou de integração. Outra característica em relação aos fornecedores diz respeito ao planejamento da produção. Uma das empresas o faz quatro vezes ao ano, de acordo com as estações do ano, organizando e monitorando cada produtor e o índice de produtividade. Na outra empresa 139 o planejamento inicialmente foi de sua responsabilidade, mas atualmente são os próprios produtores que elaboram seu planejamento, de acordo com o ciclo de produção e a responsabilidade assumida com a empresa. Na linha de processamento, os produtos podem ser classificados de três formas: - produtos acabados (PA): vêm embalados diretamente do produtor (por exemplo: aipim, broto de alfafa, morango); - produtos embalados e cortados (PEC): são lavados e embalados in natura ou lavados e cortados para compor o mix-salada ou para sopas; - produtos minimamente processados: são lavados, cortados e higienizados (folhas) e requerem estocagem sob refrigeração. É importante ressaltar que há um domínio, por parte das empresas, na área da tecnologia do processamento das hortaliças, sendo apontada a logística de frios como principal gargalo nessa área. Dentre as oportunidades que podem ser vistas por essas empresas estão o atendimento a cozinhas industriais, o fornecimento a granel para supermercados, o aumento de vendas de frutas orgânicas, e a exportação de hortaliças e processados (batata-palito) e de congelados (biofrozen). Frutas Identificou-se, como processadora de frutas, uma associação de produtores no litoral do Estado que agroindustrializa a banana, transformando-a em banana-passa. A produção destina-se principalmente para o mercado externo, em particular a Suíça. No noroeste do Paraná, no município de Cruzeiro do Oeste, situa-se uma outra associação de agricultores que faz o processamento mínimo de frutas, desta vez com a acerola. Iniciou a produção da matéria-prima convencional no final da década passada, e, no início de 2002, a partir da demanda de uma indústria alimentícia do Ceará, iniciou a conversão do sistema de produção para o de acerola orgânica. No processamento mínimo a acerola é lavada, acondicionada e mantida sob baixa refrigeração, sendo que em dois dias a indústria deve estar com o produto para realizar outros procedimentos. A acerola é utilizada principalmente para a produção de polpa de suco, mas também há demanda da indústria farmacêutica para o produto. Atualmente existem cerca de 45 produtores distribuídos em vários municípios da região noroeste do Estado, cultivando, em média, 3 hectares com a fruta. A certificação é realizada pelo IBD, responsável também pela garantia no processo industrial. A associação está com projeto para implantação de uma agroindústria de polpa congelada de acerola orgânica, com demanda de 200 toneladas para o mercado europeu. Outras frutas estão sendo testadas pelos produtores: laranja, limão, abacaxi e uva. 140 4.3.3 Empresas de Beneficiamento O processo de beneficiamento é bastante simples e compreende as etapas de limpeza do produto, secagem, classificação e acondicionamento para expedição. O produto beneficiado não passa por nenhum tipo de transformação. Na pesquisa realizou-se o levantamento de informações em três empresas de beneficiamento: uma delas de soja, na RMC; uma de mel, na região centro-sul; e uma empresa que beneficia ovos, no sudoeste. Soja A empresa Tozan Alimentos Orgânicos atua no setor desde 1999. Criada na região sudoeste, em 2004, transferiu a planta industrial para Ponta Grossa por uma questão de logística, para atender à demanda do mercado exportador pelo porto de Paranaguá. O custo do frete foi o fator decisivo para tal mudança. Atua basicamente com soja, tanto para o consumo humano quanto animal, trabalhando em menor escala, também, com arroz e fécula de mandioca. Cerca de 80% de seus principais fornecedores estão localizados nos Estados do Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, São Paulo e Santa Catarina. No Paraná estão cerca de 10% dos demais agricultores fornecedores, e os outros 10% estão situados no Paraguai, onde a relação se estabelece a partir de uma associação de produtores com 500 famílias. O relacionamento que mantém é de contrato e integração com pequenos e grandes produtores (existem áreas de até 2 mil hectares), com vínculo de fidelidade comercial. As exportações da empresa são destinadas principalmente aos países europeus. A Bélgica adquire em torno de 80% dos produtos. Em menor proporção, a empresa destina os produtos para países asiáticos, e não comercializa com países norte-americanos. Mel Pesquisou-se somente uma empresa que beneficia mel, a saber, a Indústria Breyer, situada no município de União da Vitória, na região centro-sul do Estado. A empresa comercializa, como orgânico, o mel, vendido em tambores de 200 litros, o própolis, o pólen e a cera de abelha. Além destes, comercializa também outros produtos com a designação de naturais, por não ter certeza de serem de origem orgânica. São eles: mel, geléia real liofilizada, propolinaextrato, shampoos e condicionadores, mel com própolis, sabonete, protetor solar, entre outros. Os produtos orgânicos são exportados principalmente para a Europa, com destaque para a Alemanha, Espanha, França e Inglaterra, e também para os EUA e Japão. A exigência dos países compradores é a qualidade do produto, e para tanto são avaliados mais de 100 itens que determinam essa qualidade, como, por exemplo, a existência de resíduos de agrotóxicos ou antibióticos. 141 O relacionamento com os agricultores se dá mediante contrato, que caracteriza a integração vertical, em que a empresa disponibiliza assistência técnica especializada, certificação, fornecimento de equipamentos, embalagens etc., além de fazer o acompanhamento do processo de qualidade dos produtos com rastreabilidade. A empresa mantém relacionamento com um grupo de 120 produtores, somando cerca de 30 mil colméias, espalhados nos municípios da região centro-sul do Paraná, próximos da sede da empresa, além de municípios de Santa Catarina. Com relação à certificação ela é realizada pela IMO-Control do Brasil (ISO 65), sendo que os produtores associados não pagam a certificação diretamente, pois o valor é diluído nos custos finais. O processo de beneficiamento do mel é bastante simples e envolve as seguintes etapas: primeiramente o produto (mel) que vem do campo é recepcionado e passa por um controle de qualidade (passa pela centrifugação e filtragem); sendo aprovado, é encaminhado para o depósito de matérias-primas, passando para o setor de fabricação com controle de qualidade; setor de envase; rotulagem; depósito de produto acabado e, finalmente, expedição. Segundo a empresa entrevistada, a produção melífera orgânica apresenta ainda algumas restrições do ponto de vista da produção, pelo fato de não existir um zoneamento apícola no Estado que evite a contaminação por transgênicos, por exemplo, ou que possibilite a manutenção e ampliação de áreas de preservação permanente, reserva legal, impróprias para o cultivo e APAs (ambiental). De outro lado, há dificuldades com relação à capacitação dos agricultores/produtores para a atividade apícola; à legislação própria; e, ainda, questões ligadas à comercialização com o mercado externo, que precisaria contar com uma política cambial mais estável. Contudo, o setor pode vir a ser promissor à medida que essas restrições sejam sanadas, que a questão da rastreabilidade possa minimizar os riscos e haja a possibilidade de expandir a ação para outros mercados, como o mercado institucional (merenda escolar). Ovos Trata-se de um produto novo no mercado de orgânicos, o qual vem sendo produzido dentro de um padrão tecnológico diferenciado, principalmente no que diz respeito ao sistema de manejo dos animais. A empresa Gralha Azul Avícola, situada na região sudoeste do Paraná, obtém a matéria-prima de apenas três produtores com os quais estabeleceu um contrato, caracterizando uma relação do tipo de integração. Os agricultores foram treinados para a atividade de recria das aves, uma vez que, no período de criação (15 semanas iniciais), os animais ficam aos cuidados da própria empresa. Para o produtor, a vantagem está no preço recebido de até 40% acima do produto convencional. A produção ainda é pequena e as relações de comercialização são estabelecidas somente com duas regiões. Uma delas situa-se no Rio Grande do Sul e a outra é a de 142 Curitiba, cujo produto é ofertado em uma única loja de supermercado. Neste último caso, as relações comerciais são estabelecidas através de outra empresa que não a produtora. Como principal restrição para a atividade a empresa aponta o preço elevado do milho orgânico (R$ 32,00 a saca), que encarece o custo de produção, resultando em um produto final de R$ 4,35 para meia dúzia de ovos. 4.3.4 Associações e Cooperativas de Agricultores e a Transformação de Produtos Orgânicos Embora a maioria das associações e cooperativas não atue diretamente nos processos de comercialização – particularmente as associações, por não disporem de condições legais para efetuar transações comerciais, uma vez que não podem emitir nota fiscal, dadas as características jurídicas –, a maior parte delas desenvolve trabalhos com este propósito. Via de regra as associações contam com algum técnico ou articulam-se com entidades de assessoria, normalmente ONGs, que realizam trabalhos de organização, formação e capacitação junto com os agricultores, tanto voltada ao sistema de produção como à própria comercialização. Outras associações procuram acercar-se de orientação técnica por meio de convênios com instituições públicas, como a EMATER e as prefeituras que atuam na região. Na maioria das vezes a associação é a principal responsável por equacionar a questão da certificação, atuando desde a orientação, a organização e o acompanhamento do processo junto com os agricultores. No que tange diretamente à comercialização, algumas associações viabilizam a venda dos produtos in natura ou transformados, em lojas próprias, nas feiras de produtores, e outras o fazem em lojas e supermercados da região. Os produtos transformados, também chamados de artesanais ou coloniais, em geral são etiquetados com o rótulo da associação, da certificadora oficial, e, em alguns casos, com o nome do produtor e do próprio técnico que presta a orientação. São exemplos: APAVE - Vereda Ecológica (município de Verê/ região sudoeste), APRAECOL - Alimentos Orgânicos (Barbosa Ferraz/sudoeste), BIOVALE (São João do Ivaí/norte), BIOSABOR - Associação Alternativa Pé na Terra (Maringá/norte), POMAR - Associação dos Produtores Orgânicos de Maringá, na região norte (nesta consta o nome do produtor e do técnico). De outra parte, verificou-se que, de modo geral, os produtos transformados pelos filiados às associações e cooperativas são elaborados na própria unidade de produção dos produtores e, em alguns casos, em instalações próprias dessas entidades. O quadro 4.6 mostra a relação das associações e cooperativas pesquisadas que elaboram algum tipo de processamento e beneficiamento, sendo que 14 delas voltam-se mais ao processamento e 18 ao beneficiamento. QUADRO 4.6 - TIPOS DE TRANSFORMAÇÃO DE PRODUTOS ORGÂNICOS, SEGUNDO AS ASSOCIAÇÕES E COOPERATIVAS DE PRODUTORES, LOCALIZAÇÃO E PRINCIPAIS PRODUTOS - PARANÁ - 2006 TIPOS DE TRANSFORMAÇÃO Processamento Beneficiamento NÚMERO DE EMPRESAS ASSOCIAÇÕES E COOPERATIVAS Biscoitos União da Vitória Erva-mate e fumo São Mateus do Sul Porto União - SC; União da Vitória - PR Suco de uva, molho de tomate e geléias 14 COAVI COFAECO AFRUTA Associação dos Produtores Rurais Batuva AFRHUCO COOPAVI COOPERTERRA Associação Central Capanema Associação Verde Vida APOP APROMIS APOMOP APAVE ACEMPRE Guaraqueçaba Cruzeiro do Oeste Paranacity Jaboti Capanema Serranópolis Iguaçu Pato Bragado Missal Iracema do Oeste Verê Marechal Cândido Rondon Banana-passa e bala de banana Acerola Cachaça, açúcar mascavo e melado Açúcar mascavo Açúcar mascavo, sucos, derivados de leite e farinhas (milho, soja) Melado e açúcar mascavo Derivados de leite, de cana e defumados Processados em geral (animal e vegetal) Açúcar mascavo, conservas e doces Processados em geral (animal e vegetal) Processados em geral (animal e vegetal) União da Vitória São Mateus do Sul São João do Ivaí 18 COOAVI COFAECO BIOVALE Associação dos Produtores do Turvo APROVERDE APROPAR APOMAR APOL Associação Central Capanema APOP APOMOP APROMIS APROSMI APROMED APONG APRAECOL APAVE ACEMPRE Arroz, feijão e quirera Feijão e milho Arroz, café, cana-de-açúcar, citrus, frutas, hortaliças, mandioca, soja e bucha Hortaliças Banana Mandioca, soja, frutas (laranja, banana), pupunha e hortaliças Hortaliças, grãos (soja, milho, feijão) e frutas (morango, uva, maçã) Grãos (soja, feijão, milho) e hortaliças Hortaliças, mel, abacaxi e leite Hortaliças Soja, café e hortaliças Hortaliças, mandioca, frutas e leite Hortaliças, grãos (soja e feijão) e frutas (goiaba, morango) Hortaliças e grãos (soja, milho) Frutas (morango, abacaxi, banana) e frango Hortaliças e grãos (feijão, milho) Hortaliças, frutas e mandioca Hortaliças e grãos (soja, milho) MUNICÍPIOS Turvo Guaraqueçaba Paranavaí Marilândia do Sul Uraí Capanema Pato Bragado Iracema do Oeste Missal São Miguel do Iguaçu Medianeira Guaíra Barbosa Ferraz Verê Marechal Cândido Rondon PRINCIPAIS PRODUTOS FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR NOTAS: Para as associações/cooperativas, as hortaliças e frutas foram consideradas como produtos que passam por algum tipo de beneficiamento, diferentemente das empresas, que fazem o processamento mínimo desses produtos. Algumas associações/cooperativas aparecem repetidas nos tipos de transformação dos produtos (processamento e beneficiamnto), pois atuam em ambos os processos. 143 144 4.3.5 Algumas Considerações sobre o Mercado da Transformação A pesquisa mostrou que, entre os agentes que atuam na transformação de produtos orgânicos, encontram-se as seguintes situações: empresas voltadas especificamente para atuar com os orgânicos; empresas que atuam com produtos convencionais, mas que estão também trabalhando com orgânicos; e associações e/ou cooperativas de agricultores que fazem a transformação de produtos orgânicos. Cada um desses agentes estabelece relações distintas, seja na aquisição da matériaprima, em que os agricultores familiares são um dos agentes, seja na comercialização do produto final, quando se relacionam com os outros tipos de mercado – do varejo, da venda direta, o mercado externo e o mercado institucional. Verificou-se que as empresas de transformação que trabalham com hortaliças transacionam comercialmente, de um lado, com os agricultores fornecedores, e de outro com o mercado do varejo, principalmente as redes supermercadistas. Por sua vez, as associações/ cooperativas de agricultores não necessariamente compram a matéria-prima dos agricultores, mas esta será remunerada após a comercialização dos produtos transformados, sendo que, no caso das associações, a relação de venda dos produtos se dá principalmente para o mercado da venda direta, ou institucional, e eventualmente o mercado externo. No que se refere ao mercado externo, as empresas transformadoras têm um papel fundamental, seja nos processos que envolvem somente o beneficiamento dos produtos, como é o caso do soja e do café, seja naquelas situações de transformação total, como é o caso das fecularias. Para se relacionar com o mercado externo verificou-se que outros agentes entram no circuito, por meio de compradores diretos de outros países ou por meio de uma trading (processadoras de soja), que faz a intermediação entre os futuros compradores e as empresas locais. Já as associações/cooperativas têm uma menor participação no mercado exportador. Normalmente o interesse pelos produtos que podem comercializar desperta interesse de compradores, sendo que, em boa parte das vezes, estas iniciativas inserem-se no chamado comércio justo e solidário, onde se focalizam as tecnologias de processo, em vez das tecnologias de produto. Tal situação verificou-se, por exemplo, no caso da cachaça exportada pela Cooperativa Vitória da Conquista, no município de Paranacity, para organizações não-governamentais da Espanha, apoiadoras da reforma agrária e da agroecologia. Por fim, cabe destacar que são crescentes a diversidade e a quantidade de produtos orgânicos que têm passado por processos de transformação. Em geral, quem está atuando nesse mercado de produtos transformados têm sido as empresas processadoras/beneficiadoras, incluindo as de pequeno a grande portes e associações e cooperativas de agricultores familiares. Ou seja, é um ambiente que comporta desde uma empresa como a Rio de Una, que montou a mais moderna processadora de legumes e verduras da América do Sul, a grupos de agricultores que conduzem processos de transformação com tecnologia de menor complexificação e com interesses que não se reduzem a transações econômicas. 145 4.4 O CENÁRIO DO MERCADO EXTERNO: TENDÊNCIAS E PROCESSOS DE COMERCIALIZAÇÃO COM OS PRINCIPAIS PAÍSES IMPORTADORES Neste estudo não se aprofundou a pesquisa sobre o mercado externo de produtos orgânicos do Paraná por se entender que ele não está entre os três principais tipos de mercado no cenário da agricultura orgânica paranaense, abordados anteriormente. Entretanto, julgou-se relevante apresentar o cenário atual do mercado externo de orgânicos, destacando a situação do Brasil nesse contexto e evidenciando algumas iniciativas em curso no Estado do Paraná. 4.4.1 O Brasil e o Mercado Externo de Produtos Orgânicos O Brasil está entre os seis maiores exportadores mundiais de orgânicos. Cerca de 75% da produção nacional em volume é exportada, especialmente para Europa, Estados Unidos e Japão. Os principais produtos exportados são a soja, o café e o açúcar, sendo que o café orgânico brasileiro figura entre os cafés especiais premiados em importantes concursos internacionais. Para exportar, os produtores brasileiros seguem as regras estabelecidas no mercado importador, atendendo às exigências de certificação de produtos orgânicos estabelecidas segundo o país importador. Na Europa, a Alemanha é o maior consumidor dos produtos orgânicos brasileiros, seguida pela Holanda. Outros países que compram do Brasil são os Estados Unidos, Japão, Canadá, Dinamarca, Itália, Espanha, Áustria, Austrália, Suíça, França, Reino Unido, Nova Zelândia, Portugal, China, Israel, África do Sul, Uganda, Coréia, Taiwan, Uruguai, Bolívia e Argentina. A produção orgânica brasileira exportável, ou seja, aquela que atende às exigências de certificação dos países demandantes, é bastante diversificada, sobretudo a dos produtos in natura. Os principais produtos orgânicos exportados têm sido: soja (em grãos e derivados), café (em coco, torrado e moído), açúcar, castanha de caju, suco concentrado de laranja e tangerina, óleo de palma e de babaçu, e, em volumes menores, manga, melão, uva, derivados da banana, fécula de mandioca, feijão adzuki, gergelim, especiarias (cravo da Índia, canela, pimenta do reino e guaraná), óleos essenciais e cogumelo agaricus. O principal comprador até o momento foi a América do Norte (51%), seguido da Europa (46%). A APEX (Agência de Promoção de Exportações do Brasil) estima que, em 2004, as exportações dos produtos orgânicos tenham atingido a cifra de U$ 115 milhões de dólares. O Brasil vem dando passos importantes para estimular o crescimento do setor de orgânicos no mercado externo. A partir do 2º semestre de 2006, pretende-se obter dados sobre o tamanho real das transações que ocorrem neste mercado, investigando quem exporta, para onde exporta, quais os principais produtos, entre outras informações, visando construir uma base de dados estatísticos para acompanhar a exportação de produtos orgânicos do País. 146 Para tanto, a Secretaria de Comércio Exterior (SECEX), do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), já enviou comunicado às empresas e empresários informando da criação de um campo específico a ser preenchido no registro de exportação. No entanto, como a opção de declaração de orgânico ou convencional é opcional, o dado a ser obtido pode não expressar a realidade sobre o mercado externo de orgânicos. Ainda em 2006 (no mês de junho), a Câmara de Comércio Exterior (CAMEX) publicou a Resolução Camex n.º 13, que cria classificação especial para produtos orgânicos dentro do Sistema Integrado de Comércio Exterior (SISCOMEX). Quanto ao posicionamento do País no mercado internacional, a possibilidade de intensificar a participação da agroindústria, ampliando a oferta de produtos processados, bem como as condições climáticas nacionais, favorecem a produção de produtos de clima tropical para fins de exportação. No entanto, no processo de negociação tem sido o lado comprador aquele que tem imposto as condições às transações comerciais, utilizando para tanto os sistemas de certificação, rastreabilidade e, por vezes, critérios definidos como de sustentabilidade, os quais são impostos aos produtores. Para alcançar mercados de países desenvolvidos, as exportações brasileiras de orgânicos enfrentam as mesmas barreiras impostas à exportação de produtos convencionais, a saber: a) subsídios agrícolas daqueles países aos seus produtores, o que tem criado distorções comerciais; b) limitado acesso à informação sobre as regras exigidas para regulamentação, fatores de qualidade, práticas de demanda, práticas de mercado e aspectos logísticos no atendimento aos mercados estrangeiros; c) limitado acesso ao crédito e financiamento, especialmente para agricultores familiares, principais produtores de orgânicos. Além desses há um outro aspecto fundamental que se apresenta como limitante: as exigências para importações, que diferem de um país a outro, devido à falta de harmonia entre as diversas agências certificadoras, bem como de confiança no outro agente da negociação. Este é considerado um dos principais obstáculos para o desenvolvimento contínuo e rápido do setor de orgânicos dos países em desenvolvimento, devendo, portanto, ser gerenciado para a garantia do sucesso do setor. Aqui também é o lado comprador que impõe as condições que estruturam o mercado externo. Os compradores norte-americano e europeu exigem que os processos e produtos orgânicos sejam certificados por organizações reconhecidas por eles. O uso de sistemas de rastreabilidade e de sustentabilidade, definido pelos países compradores, é outra exigência básica para produtores de orgânicos brasileiros que pretendem transacionar seus produtos junto aos países desenvolvidos, lembrando-se que os padrões e exigências são diferentes para cada país. 147 Com relação à sustentabilidade, Aragão (2006) destaca que os países importadores têm utilizado este conceito para expressar a preferência por produtos provenientes de empresas que tenham responsabilidade social e ambiental, além daqueles oriundos do comércio justo. Nesta última categoria enquadram-se prioritariamente os produtos produzidos por agricultores familiares, organizados em associações e/ou cooperativas, via de regra com atenção especial para o sistema de produção que privilegie o processo, e não o produto em si.70 De outro lado, também se constata que, entre os compradores do mercado externo, busca-se discriminar aquelas situações em que a produção de orgânicos possa estar utilizando práticas como trabalho infantil, salário vil etc. Com um mercado de alimentos orgânicos que fatura US$ 350 milhões anuais e que importa 90% dos alimentos consumidos, o Japão é outro país que deseja ampliar a compra do produto brasileiro (CARDOSO, 2002). Segundo Julia Yamagushi, inspetora internacional de certificação orgânica, a pauta de exportação brasileira inclui, hoje, banana, soja e café. Para entrar no mercado japonês, é preciso obter o Jas (selo de certificação para o mercado japonês), mesmo para produtores que já possuam registro de exportação de orgânicos para a Europa e os Estados Unidos. Algumas empresas brasileiras já estão atentas a essa grande demanda por orgânicos no mercado mundial. A Native, certificada desde 1997 para vender açúcar orgânico, exporta 80% da produção mensal de 25 mil toneladas. A marca é do Grupo Balbo, que tem as Usinas de São Francisco e Santo Antonio, localizadas no município de Sertãozinho, no interior de São Paulo. Da produção anual de 200 mil toneladas de açúcar orgânico só três mil destinam-se ao mercado interno. Além do açúcar, a Native também exporta café, suco de laranja e achocolatados. Os produtos são transacionados com a Europa, Estados Unidos, Canadá, Japão, Coréia do Sul e Arábia Saudita (DANIEL, 2005). O representante da empresa Chá Campo Verde do Paraná, que há anos vendia apenas a erva orgânica, recentemente passou a comercializar o chá beneficiado no mercado externo. Esta situação representou um aumento em torno de 60% nos negócios da empresa. Para ele, investimentos do setor, como o da união de parcerias que resultou no Projeto Orgânicos Brasil, são de extrema importância para o setor. Na visão do empresário, um bom contrato com uma grande rede pode dobrar as vendas de um ano para o outro. Uma outra empresa, a Jasmine Alimentos, de Curitiba, que já oferece produtos orgânicos como açúcar mascavo, arroz, farinhas, feijão adzuki, soja e chá, também está interessada em crescer nesse segmento. As vendas estão pulverizadas por todo o Brasil e 70 Fair trade: movimento internacional, notadamente ativo na Europa, pela ampliação do acesso ao mercado de agricultores familiares, economicamente em desvantagem estrutural. 148 já chegam a outros países da América Latina, como Venezuela, Chile, Paraguai e toda a América Central. Participante do programa Organics Brasil, a empresa afirma que campanhas educativas são a melhor forma de conscientizar as pessoas em relação ao consumo de alimentos orgânicos. 4.4.2 Café e Soja Orgânicos – principais produtos exportados A comercialização de café orgânico é predominante para a exportação. Segundo Pedini (2000), isto ocorre pela reduzida demanda no mercado interno voltada aos cafés diferenciados, incluindo-se aí o orgânico. No entanto, esse cenário tende a mudar devido ao crescimento do mercado de café orgânico no Brasil, na ordem de 20%, segundo Gomes e Macau (2003), e de 100% ao ano, segundo Ricci et al. (2004). Tradicional exportador de café em grãos e de café solúvel, o Brasil ingressa aos poucos na disputa pelo mercado internacional de café orgânico com demanda crescente, sobretudo por parte da Europa, dos Estados Unidos e do Japão. Estes são os principais importadores, que pagam 50% a mais pelo grão sobre o produto convencional. Os volumes destinados ao mercado externo em 2002 representaram 70% da produção brasileira do grão orgânico, de 100 mil sacas (HERBÁRIO, 2002). Apesar do crescimento, os volumes exportados são pequenos, se comparados aos grandes negociadores internacionais, como o México, os países da América Central e o Peru, que concentram mais de 50% das vendas mundiais, avaliadas em 1 milhão de sacas por ano. Contudo, o Brasil tem um potencial ainda a ser explorado e pode ficar entre os três maiores exportadores mundiais nos próximos anos. Algumas empresas brasileiras já se destacam na exportação de café, como o Café Bom Dia (MG), o Café Santa Clara (MG), o Café do Ponto, São Braz Alimentos (PB), Café Maratá (SE), Ipanema Agrícola (MG), Sassi Alimentos (SC), Café Bom Jesus (RS) e Gazzola Chierighini Alimentos (SP). Não há ainda nenhuma empresa paranaense atuando neste mercado. Considerado um produto diferenciado, o café orgânico tornou-se uma alternativa atraente numa época em que boa parte dos cafeicultores tradicionais enfrentava uma das piores crises de preço da história. No entanto, percebe-se que quando há uma recuperação das cotações internacionais da commodity no mercado internacional, ocorre uma evasão de parte dos produtores ainda pouco comprometidos com a filosofia do cultivo orgânico. Porém, Rodrigues (2005) afirma que os preços do café orgânico são mais estáveis se comparados com os dos grãos convencionais, que oscilam muito mais nas bolsas. Quanto à soja orgânica, a produção é voltada para o mercado externo, onde o grão é destinado ao consumo humano e à transformação em ração, a ser adquirida por produtores de carne orgânica. O preço da soja orgânica é elevado. O grão é vendido até 35% 149 a mais que o convencional, o que torna sua utilização ainda restrita no mercado brasileiro. Essa aparente desvantagem é compensada pelo interesse despertado pelo produto brasileiro nos vários países europeus. Segundo o representante da ONG Agriterra, a Holanda tem interesse em estabelecer parceria com a agricultura familiar brasileira no incentivo à produção de soja orgânica. O país compra 12% (aproximadamente 50 mil toneladas) da soja orgânica exportada no mundo e vem demonstrando interesse pelo produto ecologicamente correto. Conforme os levantamentos da ONG, a Holanda consome 5,145 milhões de toneladas de soja por ano. O país alimenta, com o produto, um rebanho suíno de 15 milhões de cabeças e tem preocupações de ordem sanitária e ambiental, provocadas, principalmente, pelo aparecimento de doenças como o mal da vaca louca. De acordo com especialistas na área entrevistados para este estudo, os países europeus preferem comprar produtos orgânicos in natura aos produtos industrializados. Para a venda de produtos orgânicos processados, as empresas necessitam de um agente do país europeu comprador para facilitar a entrada dos mesmos. Aqueles países são grandes compradores de soja e café. No entanto, a maior parte dos grãos é vendida sem processamento, sendo que, no caso do café, algumas vezes vende-se o grão torrado. Segundo o representante da APEX, verifica-se uma situação diferente com relação aos EUA, pois neste país os compradores têm se mostrado dispostos a adquirir os produtos orgânicos brasileiros com a marca desenvolvida aqui no país. Haveria, por parte deles, interesse pela busca de produtos que mantenham uma boa relação socioambiental, uma vez que os consumidores norte-americanos desejariam saber a origem do produto orgânico, como e por quem foi produzido, entre outras informações. Tais fatores têm levado a uma maior atividade da APEX na relação com aquele país. Para tanto, alguns produtores brasileiros se uniram, sob a supervisão da APEX, e contrataram uma trading no Brasil para fazer o trabalho de adequação da embalagem, rotulagem, desembaraço alfandegário etc. e entregar os produtos ao importador norte-americano. Este agente é o responsável pela distribuição dos produtos orgânicos brasileiros aos pontos de venda, geralmente o mercado do varejo dos grandes equipamentos – hiper e supermercados. No caso da importação por países europeus, a estrutura de transação ocorre a partir de grandes importadores, que consolidam os produtos e os distribuem para agentes de outros mercados, como o de processamento, da distribuição e do varejo. Nestes países não há interesse na marca brasileira. Os produtos são vendidos com a marca de um produtor ou distribuidor local, já que os consumidores europeus valorizam a produção orgânica local. Portanto, é mais difícil para a APEX ou produtores e processadores venderem produtos com a marca brasileira naqueles países. Entretanto, há situações em que as empresas brasileiras contratam tradings para vender seus produtos orgânicos aos importadores europeus, como há também algumas 150 empresas que trabalham com representantes de vendas (da própria empresa ou não) para tal. Esta é a situação da empresa paranaense Tozan, cujo carro-chefe é o soja, que negocia diretamente com clientes internacionais. A empresa possui apenas um cliente em cada país importador, dentre distribuidores, processadores e tradings. Segundo declarações do proprietário da Tozan, os importadores europeus são mais estáveis, tanto para a compra de soja para alimentação animal quanto para alimentação humana. E menciona que a responsabilidade da empresa é entregar o produto até o porto do país comprador e, a partir daí, o agente responsável (trading, processador ou distribuidor) encarrega-se do produto. Tal situação implica uma rede de relações na qual os produtores brasileiros nem sempre estão preparados para atuar, uma vez que exige que se diferencie a transação de acordo com sua destinação, como é o caso do soja. No caso dos EUA, o tipo de relação que a Tozan mantém é outra, sendo ela a responsável pela entrega do produto até o comprador. Para auxiliar neste processo, a empresa contrata uma trading ou distribuidor. No entanto, a empresa ressalta que o mercado de soja orgânica nos EUA é altamente competitivo e os custos logísticos são muito elevados. Com relação à negociação com o Japão, as vendas de soja pela empresa são esporádicas, pois, segundo o entrevistado, o produto brasileiro perde em qualidade e preço para o soja chinês. Dessa forma, afirma, a exportação para o Japão não é o foco para a Tozan. Ainda com relação ao Japão, segundo se verificou na pesquisa, a entrada no país dos produtos orgânicos ocorre, via de regra, por meio de uma trading. Além do selo específico para o país (JAS), a trading também representa uma entidade creditadora para os compradores japoneses. Para esses clientes não basta a certificação. Eles querem saber como esta certificação é feita e são bastante sensíveis às questões relacionadas à saúde, e principalmente às questões socioambientais. Com essa perspectiva é que a empresa paranaense Café Terra Verdi, situada em Curitiba, trabalha com aquele país via comércio justo. Além de exportar o café em grão, também negocia o produto processado, com maior valor agregado, exportando o café torrado, o verde, o moído e o solúvel. A empresa trabalha com o mercado japonês desde 1992, como processadora e como uma trading no Brasil. Trabalha a divulgação de seus produtos com a estratégia "boca-a-boca", baseando-se na concepção de comércio justo, produtos orgânicos e rastreabilidade. Com outros países importadores a empresa atua como intermediadora (trading), vende produtos fora do comércio justo, mas com certificação para produtos orgânicos, por pressão dos produtores. No entanto, o dirigente da empresa ressalta que esta forma de comercialização é pouco expressiva, e que o foco da empresa é o comércio justo (80% das vendas). 151 4.4.3 Algumas Considerações sobre o Mercado Externo de Produtos Orgânicos Durante a Conferência do Organic Trade Association (OTA), em maio de 2005, em Chicago/EUA, vários empresários e consultores apontaram que a diferença entre o preço do produto orgânico e o do convencional tende a se reduzir, ao passo que o preço dos alimentos orgânicos embalados e processados ainda terá uma maior disparidade quando comparado ao dos convencionais. Empresas agroalimentares multinacionais já tendem a incorporar os produtos orgânicos ao seu mix de produtos processados, por acreditarem que este é um mercado de crescimento rápido. Ademais, a imagem desse produto ajusta-se ao compromisso da companhia de nutrição e bem-estar. Essas empresas acreditam que os ingredientes orgânicos se tornarão mais disponíveis, o custo declinará e a qualidade continuará a melhorar. O foodservice ainda é um mercado restrito para alimentos orgânicos, mas este cenário tende a mudar. Em alguns locais de Curitiba já existem restaurantes e cafés que servem especificamente alimentos orgânicos, a exemplo do Restaurante Chauá e Terra Verdi Café. Os analistas são cautelosos e avaliam que, no longo prazo, a indústria orgânica terá um crescimento anual otimista, predizendo o crescimento dos mercados orgânicos em torno de 20% no médio prazo (FAO, 2002). O crescimento da agricultura orgânica certificada dependerá das relações que se estabelecerem nos próximos anos entre governos, produtores e demais agentes envolvidos nas transações comerciais. Também são importantes os agentes envolvidos nos processos de transformação, havendo o interesse crescente de várias empresas nos produtos orgânicos, inclusive multinacionais. Além disso, há o papel relevante e propulsor da sociedade, que cada vez mais se mostra interessada com a segurança alimentar, sobretudo no que se refere aos efeitos negativos do uso de agrotóxicos, por exemplo, nos sistemas de produção convencional. O mercado orgânico certificado de alimentos compreende uma parte pequena, mas crescente (1 a 2%, em 2003), do mercado total de alimentos. Segundo a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação - FAO (2002), para 2010 o mercado pode crescer até US$ 61-94 bilhões nos países com mercados orgânicos certificados, ou entre 3,5 e 5% no mercado global de alimentos. Esta previsão pode ser maior se os mercados orgânicos não-certificados forem incluídos. Se as vendas de produtos orgânicos têm crescido rapidamente nos últimos anos devido às questões de segurança alimentar, pode ser que taxas de crescimento mais lentas sejam mais prováveis de ocorrer a partir de 2010 (FAO, 2002). Em países industrializados, a demanda por produtos orgânicos certificados deve continuar a aumentar, talvez acima da taxa de crescimento de 20% registrada atualmente. Entretanto, o crescimento futuro da agricultura orgânica certificada dependerá mais de restrições no fornecimento do que de mudanças na demanda. A tendência, portanto, é de 152 que a demanda cresça mais rapidamente que o fornecimento desses produtos, mas esta diferença pode ser equacionada com o ingresso de maior número de produtores no processo produtivo, apoiados no processo de transição, na produção propriamente dita e, posteriormente, nos processos que envolvem a comercialização dos produtos orgânicos. De um modo geral considera-se que os países em desenvolvimento estão começando a se beneficiar com as oportunidades do mercado de produtos orgânicos. Porém, sob as circunstâncias atuais, não são os agricultores familiares mas sim os grandes produtores que têm se mostrado mais estruturados para atuar nos mercados internacionais. Entretanto, o que se verifica é que ainda é limitada a quantidade de produtos orgânicos brasileiros no mercado externo, e é ainda menor a participação dos orgânicos do Paraná neste mercado. Os principais limitantes parecem estar relacionados principalmente às exigências e padrões impostos por aqueles países, bem como às normas que regulamentam os processos de certificação em cada país importador. Cabe ao Brasil regulamentar rapidamente todo o processo que envolve a agricultura orgânica, estimular e apoiar a produção, em particular aquela já praticada pela agricultura familiar, incentivar e desenvolver novas formas de processamento dos produtos orgânicos. Estes são apenas alguns dos desafios que se colocam, mas que necessitam de ações rápidas e efetivas que envolvam todos os atores e agentes interessados no mercado de produtos orgânicos. 4.5 O MERCADO INSTITUCIONAL: A AÇÃO DO ESTADO COMO UM AGENTE NO MERCADO DE ORGÂNICOS Neste estudo entende-se como mercado institucional aquele em que o Estado é um agente fundamental no processo de comercialização de produtos agroalimentares, atuando por meio de programas institucionais que operacionalizam políticas públicas voltadas à "política de segurança alimentar e nutricional". É neste contexto que se apresentam a seguir dois programas em que os produtos orgânicos têm sido comercializados dentro do mercado institucional: o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Na atualidade, a comercialização de alimentos e produtos orgânicos pelo PAA no Paraná é ainda pouco expressiva, não ultrapassando 5% do total da quantidade comercializada pelo Programa. Contudo, como se verá mais adiante, além do expressivo potencial desse tipo de mercado para aquisição de orgânico e ampliação do número de produtores, nele se verificam processos de relações mercantis que se estabelecem para além dos aspectos meramente econômicos, na medida em que envolve agricultores produtores, beneficiários recebedores de alimentos, entidades e instituições intervenientes e o próprio Estado, na gestão sociopolítica do programa. 153 Com relação ao Programa de Alimentação Escolar, as informações disponíveis mencionam que, em 2006, cerca de 5% dos alunos paranaenses foram atendidos com alimentos orgânicos nas escolas da rede pública. Embora ainda seja incipiente em termos de valores, o fundamental são as potencialidades desta política pública para a produção orgânica, estimulando a interação e/ou participação dos agricultores nos Conselhos de Alimentação Escolar (CAE), instituídos em cada município, a fim de garantir a aplicação obrigatória de 70% dos recursos transferidos pelo governo federal na aquisição exclusiva de alimentos e produtos básicos semi-elaborados e in natura, respeitando os hábitos alimentares regionais e a vocação agrícola do município, fomentando o desenvolvimento da economia local. O que se considera importante destacar, no que se segue, é a relevância do mercado institucional para a comercialização da produção de orgânicos dos agricultores familiares paranaenses, ao mesmo tempo em que se estreita a relação social entre esses agentes, o Estado e demais atores da sociedade civil, visando atender parcelas da população em vulnerabilidade alimentar e/ou nutricional. 4.5.1 Programa de Aquisição de Alimentos - PAA O Programa de Aquisição de Alimentos é um instrumento de política pública, instituído pelo artigo 19 da Lei n.o 10.696, de 2 de julho de 2003, e regulamentado pelo Decreto n.o 4.772, de 02 de julho de 2003, o qual foi alterado pelo Decreto n.o 5.873, de 15 de agosto de 2006. Foi definido no âmbito do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), e constitui uma das ações que compõem o Programa Fome Zero (PFZ), instituído em outubro de 2001, considerado prioridade do atual governo federal. A implementação do PAA é realizada por um Grupo Gestor coordenado pelo MDS e composto, ainda, pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e Ministério da Fazenda. A coordenação do Programa está sob a responsabilidade do MDS e do MDA, e é executado pelos governos estaduais e municipais e, em âmbito federal, pela Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), órgão do MAPA. Segundo o MDS, o Programa de Aquisição de Alimentos tem como objetivos: garantir o acesso aos alimentos em quantidade, qualidade e regularidade necessárias às populações em situação de insegurança alimentar e nutricional e promover a inclusão social no campo por meio do fortalecimento da agricultura familiar. Os alimentos adquiridos pelo Programa são destinados às pessoas em situação de insegurança alimentar e nutricional, atendidas por programas sociais locais e demais cidadãos em situação de risco alimentar, como indígenas, quilombolas, acampados da reforma agrária e atingidos por barragens. 154 A CONAB tem a tarefa de executar ações do PAA, por ser a empresa pública responsável pelo abastecimento agroalimentar e por dispor de unidades em todas as regiões do Brasil. Através do Programa a CONAB compra produtos da agricultura familiar "de maneira rápida e descomplicada" e os encaminha aos grupos sociais em situação de insegurança alimentar e nutricional. Os mecanismos do PAA têm sido considerados como um programa relevante para o agricultor familiar, particularmente aquele com limitações para a comercialização da sua produção, possibilitando que acesse um tipo de mercado, neste caso o institucional. Segundo informações obtidas junto à CONAB, "ao comprar a produção familiar, o governo assegura preço remunerador aos produtos, gera renda ao agricultor [...] permite valorizar o produto regional, dinamizar a produção nas diversas regiões, resgatar a cidadania, preservar o meio-ambiente e a cultura gastronômica local". A aquisição de alimentos pelo PAA é efetuada como segue: - com isenção de licitação; - são definidos preços de referência, que não podem ser superiores nem inferiores aos praticados nos mercados regionais; - o limite atual é de R$ 3.500,00 ao ano por agricultor familiar que se enquadre no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), exceto na modalidade Incentivo à Produção e Consumo do Leite, cujo limite é semestral. A aquisição dos produtos pelo PAA é praticada segundo quatro modalidades: Compra Direta da Agricultura Familiar (CDAF); Compra Antecipada Especial da Agricultura Familiar (CAEAF); Compra Antecipada da Agricultura Familiar (CAAF); e Compra Direta Local da Agricultura Familiar (CDLAF). Para operacionalizar a modalidade CDLAF são estabelecidos convênios entre o Ministério do Desenvolvimento Social e as administrações municipais e os governos estaduais. As demais modalidades são operacionalizadas pela CONAB sem a participação de mediadores ou intermediários, em que a aquisição da produção se dá com base nos preços de referência, segundo a avaliação baseada nos mercados locais e regionais. Mattei (2006) destaca, em recente estudo, o impacto do programa: a lei que instituiu o PAA também desburocratizou o processo de aquisição de produtos da agricultura familiar para o atendimento aos programas públicos, dispensando as regras de licitação requeridas pela Lei 8.666, de 1993. Com isso, se criou um marco jurídico capaz de possibilitar a presença mais efetiva do Estado no apoio a processos de comercialização desenvolvidos por esta categoria específica de produtores. No Estado do Paraná a operacionalização do PAA é realizada tanto pela ação direta da CONAB/PR como por meio de um convênio específico celebrado em 2003 entre o Governo do Estado e o Ministério do Desenvolvimento Social, para implementação e execução 155 das ações da modalidade CDLAF. Este convênio entre o nível federal e o estadual constituiuse como um projeto-piloto, inicialmente envolvendo dois estados – Paraná e Piauí –, sendo que em 2005 este projeto foi ampliado para os Estados do Tocantins, Rio Grande do Norte e Santa Catarina. A coordenação estadual do PAA no Paraná é realizada pela Secretaria Estadual do Trabalho, Emprego e Promoção Social (SETP), Secretaria de Estado da Agricultura e Abastecimento (SEAB), Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER), Central de Abastecimento (CEASA) e Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA-PR). Os executores do Programa no Estado são as associações de utilidade pública com apoio das prefeituras, CONSEA-PR e CEDRAF-PR. Dentro da SETP quem coordena o Programa é a Coordenadoria de Programas Especiais de Enfrentamento à Pobreza (CPEEP), que, com recursos do governo federal, faz a compra de alimentos produzidos por agricultores familiares enquadrados no PRONAF (DAP Declaração de Aptidão do Pronaf - do A ao D), também de agroextrativistas, quilombolas, famílias atingidas por barragens, trabalhadores rurais assentados, comunidades indígenas. Os alimentos adquiridos são doados simultaneamente para instituições sociais, consideradas beneficiárias consumidoras. Essas instituições devem possuir o Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) e desenvolver trabalhos publicamente reconhecidos de atendimento às populações em situação de risco social, prioritariamente: creches, asilos, hospitais, associações beneficentes, cozinhas comunitárias, bancos de alimentos, APMs das escolas municipais e estaduais, entre outros. Segundo técnicos das duas instituições que operacionalizam o PAA no Estado do Paraná – CONAB/PR e CPEEP/SETP –, embora o PAA também atue junto aos agricultores familiares que praticam a agricultura orgânica e remunere de forma diferenciada os produtos, com 30% a mais, é ainda insignificante a quantidade adquirida, que não ultrapassa 5% do total dos produtos adquiridos no Estado. Segundo dados da CPEEP/SETP, o PAA no Paraná tem tido um crescimento significativo nos três anos de atuação. Em abril de 2004, o Programa iniciou com 41 municípios participantes, um recurso disponível de 5 milhões de reais e um investimento de 1,7 milhão de reais. Naquele ano eram 943 agricultores fornecedores, 341 entidades beneficiadas e mais de 96,5 mil pessoas atendidas. Em 2006 esses números cresceram expressivamente. Os recursos disponíveis passaram para 6 milhões de reais. A expectativa é de se atingir 210 municípios, com previsão de que mais de 6.000 famílias agricultoras sejam fornecedoras, atendendo a cerca de 3.000 entidades beneficiadas que, por sua vez, atendem aproximadamente 650 mil pessoas, segundo informações obtidas junto à SETP. Como se mencionou anteriormente, segundo os técnicos envolvidos na execução do PAA no Paraná a participação dos produtos orgânicos não ultrapassa os 5% do total de 156 alimentos e produtos adquiridos, embora tenham um valor diferenciado em até 30% dos produtos convencionais. Entretanto, os dados disponíveis não permitem que se identifique o número de agricultores familiares orgânicos que são fornecedores, onde estão situados, quais os produtos orgânicos que são adquiridos, tampouco quais as quantidades comercializadas. Contudo, é interessante considerar que, dentre os 20 principais alimentos e produtos adquiridos pelo PAA no primeiro semestre de 2006 (quadro 4.7), verifica-se que há um enorme espaço para que muitos deles venham a ser adquiridos dos agricultores orgânicos do Paraná, pois praticamente todos os produtos mencionados, como se vê a seguir, também são produzidos pelo sistema da agricultura orgânica, tanto os alimentos in natura como os transformados, em praticamente todas as grandes regiões envolvidas na pesquisa para este estudo. QUADRO 4.7 - PRINCIPAIS PRODUTOS COMERCIALIZADOS NO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS/COMPRA DIRETA NO PARANÁ - PRIMEIRO SEMESTRE DE 2006 PRODUTOS QUANTIDADE (kg) Arroz 225.216 Feijão 208.667 Carne de frango 30.173 Carne de gado 175.504 Carne de porco 45.286 Peixe Verduras e legumes 7.442 1.283.026 Frutas 821.346 Milho verde 121.945 Açúcar mascavo 14.986 Mel 26.229 Melado de cana Polpa de fruta 8.127 17.423 Queijo 6.240 Doce de leite 8.547 Doce de frutas Conservas 23.509 2.138 Bolacha caseira 71.182 Macarrão caseiro 24.092 Cuca 23.923 FONTE: Informativo (n.25, 2006) Embora se saiba que a produção da agricultura orgânica é ainda limitada, tanto em número de agricultores envolvidos no processo produtivo como em termos da quantidade produzida, o mercado institucional constitui um ambiente importante em termos de construção social de mercado, uma vez que envolve diretamente os próprios agricultores e suas organizações, agentes do Estado e parcelas da população urbana. Esta condição pode ser verificada em recente evento de avaliação do PAA, promovido pela CONAB, realizado em abril de 2006, em Curitiba (Apêndice 5). 157 4.5.2 Programa de Alimentação Escolar: a merenda orgânica O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) é um dos instrumentos da política de segurança alimentar e nutricional voltados a atender à população escolar. Seu objetivo é "atender às necessidades nutricionais dos alunos durante sua permanência em sala de aula, contribuindo para o crescimento, o desenvolvimento, a aprendizagem e o rendimento escolar dos estudantes, bem como a formação de hábitos alimentares saudáveis" (BRASIL, 2006b). É considerado um dos maiores programas na área de alimentação escolar no mundo e é o único com atendimento universalizado. A alimentação escolar, comumente denominada merenda escolar, visa suprir, parcialmente, as necessidades nutricionais da população escolar. Para tanto, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), que operacionaliza o programa, transfere recursos financeiros aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios, em caráter suplementar, para que estes façam a aquisição de alimentos que compõem a alimentação escolar. O Programa foi instituído em 1955, pelo Decreto n° 37.106, através da Campanha de Merenda Escolar (CME), subordinada ao Ministério da Educação, passando a se denominar, no ano seguinte, Campanha Nacional de Merenda Escolar (CNME), com a intenção de promover o atendimento em âmbito nacional, e somente em 1979 passou a se chamar Programa Nacional de Alimentação Escolar. A partir da promulgação da Constituição Federal, em 1988, é que efetivamente ficou assegurado o direito a todos os alunos do ensino fundamental à alimentação escolar, por meio de programa suplementar oferecido pelos governos federal, estaduais e municipais. A execução do programa era centralizada até 1993, o que dificultava a aquisição de alimentos e produtos diretamente pelas escolas, municípios e/ou estados. Era o órgão gerenciador que planejava os cardápios, adquiria os gêneros alimentícios (através de licitação), controlava a qualidade dos alimentos e fazia a distribuição destes em todo o território nacional. A descentralização só ocorreu em 1994 (Lei n.o 8.913, de 12/7/94), com os recursos sendo repassados para os municípios, através de convênios, e com o envolvimento das secretarias de educação dos estados e do Distrito Federal, para atendimento dos alunos das suas redes e das redes municipais das prefeituras que não haviam aderido à descentralização. Em 1998 mais de 70% dos municípios brasileiros tinham aderido à descentralização, e com a gerência do Programa pelo FNDE o repasse de recursos passou a ser feito diretamente aos municípios e secretarias de educação, sem convênios ou quaisquer outros instrumentos similares. Contudo, foi entre 2000 e 2001, quando ocorrem duas importantes mudanças no PNAE, que efetivamente se abrem as condições para que os alimentos orgânicos fossem incorporados à pauta da alimentação escolar. A partir daí novas relações sociais se estabelecem neste mercado institucional, permitindo processos de negociação no nível local e entre atores diretamente interessados. 158 A primeira mudança deu-se em 2000, com a instituição do Conselho de Alimentação Escolar (CAE) em cada município brasileiro. Tal fato é considerado uma conquista, uma vez que o conselho é formado por membros da comunidade, professores, pais de alunos e representantes dos poderes Executivo e Legislativo, como um órgão deliberativo, fiscalizador e de assessoramento para a execução do programa. A segunda mudança resultou da Medida Provisória n.o 2.178, de 28/6/2001 (reedição da MP anterior), que determinou a obrigatoriedade de que 70% dos recursos transferidos pelo governo federal sejam aplicados exclusivamente na aquisição de alimentos e produtos básicos semi-elaborados e in natura, respeitando os hábitos alimentares regionais e a vocação agrícola do município, com o objetivo de fomentar o desenvolvimento da economia local. Além do PNAE, no Estado do Paraná também há o Programa Estadual de Alimentação Escolar (PEAE), que vem acompanhando as mudanças instituídas em nível nacional. Criado em 1983, é operacionalizado pelo Instituto de Desenvolvimento Educacional do Paraná (FUNDEPAR), de duas formas: 1) municipalização parcial - o município recebe os alimentos da FUNDEPAR e os distribui às escolas estaduais, e recebe recursos para atender às escolas municipais e filantrópicas; 2) municipalização integral - o município recebe o recurso, planeja, executa a aquisição e a distribuição dos gêneros alimentícios, acompanha o recebimento, a distribuição às Escolas Municipais, Estaduais e Filantrópicas (quando for o caso), conforme guia emitida pela Prefeitura. Cabe à FUNDEPAR fazer o acompanhamento mediante análise de relatórios e supervisões às escolas, promovendo ações complementares ao Programa Merenda Escolar. Em 2001 instituiu-se o Conselho Estadual de Alimentação Escolar (CEAE), com representantes do poder executivo, legislativo, professores, pais e outros segmentos da sociedade, como um órgão deliberativo, fiscalizador e de assessoramento para a execução do programa. Embora não se disponha de dados precisos sobre alimentação escolar orgânica no Estado do Paraná, o que se sabe é que foi a partir de 2001, com as mudanças mencionadas, que alguns municípios71 implementaram a merenda orgânica. Entretanto, em muitas situações, tanto no Paraná como nos demais estados, a decisão de instituir a merenda orgânica tem se caracterizado muito mais como ato de governo do que como política de Estado. O resultado tem sido a descontinuidade das ações na direção de aperfeiçoar os mecanismos relativos ao processo, ao mesmo tempo em que, para os agricultores, isto resulta em prejuízos monetários e em desconfiança com relação a programas similares. Os dados mais atualizados para o Estado referem-se àqueles divulgados para os anos de 2005 e 2006, para o Projeto Escola Cidadã, gerenciado pelo Instituto de Desenvolvimento Educacional do Paraná (FUNDEPAR). Este projeto prevê o atendimento e repasse de 71 Ver Apêndice 6 deste estudo, extraído do artigo de Darolt (2002b), onde se aborda a experiência de implantação do programa de merenda orgânica no município de Palmeira/PR, que atualmente não existe mais. 159 recursos financeiros às escolas da rede estadual, através de um fundo rotativo, em duas situações, sendo que uma delas é a que interessa destacar neste projeto, qual seja: - repasse para 311 municípios com estabelecimentos de ensino atendidos pelo Programa Estadual de Alimentação Escolar, para a aquisição de alimentos in natura, preferencialmente cultivados por métodos orgânicos, de forma a promover práticas alimentares saudáveis através da inclusão de gêneros perecíveis. [grifo nosso] É importante destacar, para efeito deste projeto, que, dentre os objetivos propostos, está o de "tornar o estado do Paraná referência na distribuição de merenda agroecológica", além de visar: - incrementar a economia local, através da aquisição de gêneros cultivados pelo pequeno produto; - incentivar a implantação de hortas escolares com técnicas agroecológicas; - estimular e organizar a agroecologia no estado. Para poder alcançar esses objetivos, o Projeto previu, para 2006, a ampliação do atendimento com a merenda agroecológica de 45 mil crianças (em 2005) para 75,7 mil crianças, de 185 escolas, em 24 municípios. Estima-se que os alimentos e produtos envolverão pelo menos 350 propriedades de agricultores familiares. Embora não se disponha de dados para confirmar a previsão do início de 2006, caso esta se confirme o atendimento passará de 5% de alunos/dia com merenda orgânica para mais de 9% (atualmente são cerca de 830 mil crianças/dia atendidas com alimentação escolar, em 320 municípios do Paraná). Se se confirmar tal fato, caberá conhecer os efeitos de tal ação sobre a produção de alimentos e produtos orgânicos, bem como sobre o incremento no número de agricultores, além de estudar com mais profundidade como se estabeleceram as relações comerciais entre os agentes envolvidos. Dentre os alimentos e produtos que compõem a pauta alimentar72, vários são produzidos pelos agricultores orgânicos no Paraná. Para se ter uma idéia dos produtos e da dimensão que envolve este mercado, relacionam-se, a seguir, os alimentos e produtos (não- 72 Segundo dados da FUNDEPAR (2006), atualmente os gêneros que fazem parte da pauta são: achocolatado em pó, açúcar cristal, almôndega bovina, amido de milho, arroz, bebidas lácteas, biscoito coco ou leite, biscoito cream craker/água e sal, biscoito tipo "it sal", biscoito Maisena, biscoito Maria, biscoito rosquinha, biscoito recheado, biscoito sortido, biscoito wafer, carne bovina em cubos, carne de frango ao molho, carne moída, carne suína, cereais de milho enriquecido com ferro, chá-mate, charque bovino, ervilha em conserva, extrato de tomate, farinha de milho, feijão carioca e preto, fubá de milho comum, leite em pó integral, macarrão espaguete, macarrão padre-nosso, conchinha ou letrinha, macarrão parafuso, milho para canjica, milho verde em conserva, mistura para preparo de molho à bolonhesa, mistura para preparo de picadinho, mistura para preparo de sopa (diversos sabores), óleo de soja, pão de mel, pescado em conserva, preparado para refresco, sagu, sal refinado iodado, salsicha Viena e tempero em pó. 160 orgânicos) adquiridos no ano de 2006, e a respectiva quantidade: carne bovina - 145 toneladas; carne de frango - 115 t; carne suína - 105 t; charque bovino - 82 t; pescado - 75 t; fubá (farinha de milho) - 92 t; milho de canjica - 64 t; feijão carioca - 155 t; feijão preto - 58 toneladas. Segundo informações da responsável pelo Projeto na FUNDEPAR, também fazem parte da pauta as hortaliças, arroz e chá-mate, podendo ser acrescidos outros produtos locais, desde que sejam realizados os procedimentos legais necessários para tanto. Esse talvez seja um dos principais entraves para os agricultores familiares estabelecerem relações nesse mercado institucional, uma vez que a aquisição de alimentos e produtos para o Programa de Alimentação Escolar é feita normalmente por meio de procedimentos licitatórios, os quais exigem que os participantes sejam pessoas jurídicas, situação nem sempre adequada aos agricultores, com exceção daqueles que estão mais organizados, via de regra em cooperativas, já prevendo situações desta ordem. Recente estudo73 sobre esse mercado tem mostrado um esforço de desburocratização por parte do poder público de muitos municípios. Como exemplo pode-se citar o fato de os editais de licitação especificarem a aquisição por produto e não por pauta, uma vez que empresas que participavam desse mercado entravam com mandato de segurança ou qualquer processo de contestação legal sobre um produto, trancando todo o processo. Outra medida para a simplificação do processo de aquisição tem sido o uso de instrumentos como carta-convite ou nota do produtor, quando o valor é inferior ao limite mínimo propugnado pela Lei de Responsabilidade Fiscal n.º 8.666, de 21/06/93 (em 2004 este valor era inferior a R$ 8.000,00). Por fim, cabe mencionar que o Programa Nacional da Alimentação Escolar, bem como o Programa do Estado do Paraná, ampliaram, desde 2003, o benefício da merenda escolar para creches públicas e filantrópicas e alunos das comunidades indígenas e, em 2005, passaram a contemplar também os estudantes matriculados em escolas localizadas em comunidades quilombolas. Além disso, nestes últimos dois anos foram efetuados reajustes significativos no valor da merenda escolar. Atualmente o valor é de R$ 0,22 por aluno/dia do ensino fundamental e da pré-escola, bem como para crianças de creches e instituições filantrópicas; para os estudantes indígenas e quilombolas o valor é de R$ 0,44 aluno/dia. Para 2006, o orçamento do programa foi de R$ 1,5 bilhão, para atender 37 milhões de alunos brasileiros. No Paraná, a previsão total do PEAE é de atender a 830 mil alunos/dia de 1.863 estabelecimentos, em 320 municípios, com um orçamento de R$ 3 milhões. 73 Estudo realizado pela AOPA, em 2004, com o título Um Olhar sobre a Alimentação Escolar Ecológica no Sul do Brasil, com recursos da Secretaria da Agricultura Familiar e Ministério do Desenvolvimento Agrário. 161 Diante desse quadro é possível visualizar um amplo cenário positivo para os produtos orgânicos no mercado institucional, em ambos os programas – PAA e PNAE/PEAE, influenciando positivamente nas possibilidades de comercialização da produção. Como decorrência poderão ser estimuladas a produção e ampliação no número de agricultores, promovendo, além disso, um importante espaço de aprendizado para os agricultores e demais agentes envolvidos neste mercado no sentido de estabelecerem, em conjunto, não só valores, mas procedimentos para as transações. Tem-se, ainda, o aspecto positivo de se atender com qualidade, pela oferta de alimento orgânico, populações em situação de risco alimentar e nutricional. 4.5.3 Algumas Considerações sobre o Mercado Institucional As informações apresentadas até aqui mostraram o papel relevante que o Estado vem tendo como agente no mercado institucional, não necessariamente como um comercializador direto, mas propiciando que se simplifiquem os procedimentos em programas onde há comercialização de alimentos e produtos orgânicos, como é o caso do PAA e do PNAE. Mais que isso, o que se pode verificar é que a definição de uma política pública voltada à segurança alimentar e nutricional, além de ter como público central as populações em risco alimentar, também é capaz de articular atores sociais no campo da produção, por vezes com limitações para se relacionar com outros tipos de mercado, ou, ainda, que prioriza a ação num tipo de mercado como o institucional. A análise sobre os dois programas evidenciou que a participação dos orgânicos é incipiente. Contudo, em ambos, o potencial de crescimento e consolidação para a comercialização desses alimentos e produtos é muito amplo. Como se verificou, trata-se de um mercado que permite que os alimentos sejam vistos não só como produtos, mas inseridos num contexto de proximidade entre o ambiente da produção e do consumo, em que os processos produtivos são melhor conhecidos e interligados a outras questões locais e regionais, como as ambientais, as sociais, as culturais e as referentes ao desenvolvimento econômico. Ademais, esse tipo de mercado é importante como espaço de aprendizado na construção de relações sociomercantis, uma vez que nele estão envolvidos muitos agentes, exigindo acordos entre as partes, ajustes de procedimentos etc., situação que favorece os produtores de orgânicos e aprimora a própria ação do Estado e a definição de novas políticas públicas para os alimentos e produtos orgânicos. 162 4.6 DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DOS AGENTES QUE ATUAM NO MERCADO DE ORGÂNICOS NO PARANÁ O mapa 5, a seguir, mostra a situação atual dos agentes envolvidos no desen- volvimento da agricultura orgânica no Estado, no qual se pode perceber que a concentração dos agentes ocorre no Oeste, Sudoeste e na RMC/Litoral, sendo pouco expressiva nas demais macrorregiões.74 Quanto às feiras orgânicas, chama a atenção a quantidade destas existente nas macrorregiões Centro-Sul, Oeste e Sudoeste. No Norte e Noroeste do Estado ainda é pequeno o número de feiras desse tipo. As associações estão presentes nas regiões onde se mantém o trabalho das ONGs no desenvolvimento da agricultura orgânica. As empresas que comercializam ou exportam grãos orgânicos estão localizadas estrategicamente na região próxima ao Porto de Paranaguá. Observa-se, ainda, que o serviço de assistência técnica e extensão rural para produtos orgânicos está presente em quase todas as macrorregiões do Estado, havendo ainda algumas regiões onde não se constatou atividade ligada à agricultura orgânica. 74 O mapa foi elaborado a partir das informações constantes do Cadastro de Agentes de Comercialização e de Apoio, que pode ser consultado no Apêndice 7 deste estudo. 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Os alimentos "limpos e saudáveis" da agricultura orgânica destacam-se nesse contexto, pela exigência de cuidados específicos às questões ambientais no sistema de produção, pela qualidade nutricional dos alimentos, bem como pela importância social que se confere à agricultura familiar como principal produtora de tais alimentos. O Estado do Paraná tem sido pioneiro no País com relação à agricultura orgânica. Desde os anos de 1970, tanto iniciativas de instituições públicas, de organizações nãogovernamentais e de movimentos sociais, como também da iniciativa privada, têm contribuído principalmente no estímulo e apoio técnico à produção de orgânicos no Estado. Embora os dados sobre a produção sejam frágeis e precariamente sistematizados, acredita-se que no Paraná concentra-se o maior número de famílias produtoras de orgânicos do País, cultivando uma ampla diversidade de produtos, segundo as características socioambientais das regiões onde estão inseridas. No decorrer destes últimos anos, a maior parte das iniciativas das instituições públicas e organizações não-governamentais tem sido direcionada à esfera da produção, visando apoiar e estimular o processo de conversão do sistema convencional para o sistema de produção da agricultura orgânica. Contudo, no ambiente da comercialização, isto é, no mercado dos produtos orgânicos, as iniciativas têm se restringido aos próprios agentes envolvidos, sendo ainda precário o conhecimento sobre quem são efetivamente os agentes, como se organizam e quais os tipos de mercado em que atuam. O poder público, em particular, tem se mantido à distância da esfera do mercado, com intervenções voltadas às questões legais e normativas que envolvem a agricultura orgânica, seja nos aspectos referentes ao processo produtivo seja com relação à certificação. Entretanto, há uma preocupação recente do Estado em contribuir para o desenvolvimento do mercado de orgânicos, estimulando a formulação de algumas políticas públicas, sendo esta uma das razões deste estudo, a saber, oferecer subsídios para que haja políticas específicas, em particular no âmbito da ciência e tecnologia. Com base nesse cenário é que se desenvolveu este estudo, em que se assumiu como norteadora da análise a concepção do mercado como resultado de relações sociais, 165 desencadeadas por agentes envolvidos nos processos de transações mercantis. Esta perspectiva insere-se na abordagem proposta pela Nova Sociologia Econômica (NSE), que vê o mercado como uma construção social e não como um ambiente de domínio meramente econômico. Um dos autores da NSE, Pierre Bourdieu (2005), ligado à abordagem políticocultural, sugere que os estudos sobre o mercado devem ser pesquisados como um campo de ação, ou seja, um lugar onde há agentes sociais concretos, onde há situações históricas específicas, onde há disputas políticas para garantir estruturas. Destaca ainda que o Estado tem um papel relevante, pois, como diz o autor, a competição entre as empresas assume freqüentemente a forma de competição para o poder sobre o Estado – notadamente, sobre o poder de regulamentação e sobre os direitos de propriedade – e para as vantagens asseguradas pelas diferentes intervenções do Estado (BOURDIEU, 2005, p.41). Partindo dessa perspectiva, buscou-se tratar o mercado de produtos orgânicos no Paraná como um campo de ação, procurando entender como este campo se constituiu histórica e socialmente. Além disso, procurou-se verificar qual o papel que a agricultura familiar desempenha neste mercado, ator fundamental na produção orgânica no Estado, atuação, porém, pouco conhecida nos processos de comercialização. A principal constatação deste estudo é que no Estado do Paraná o mercado de orgânicos é um campo de ação que não possui uma estrutura hegemônica. Diferentemente disso, está organizado em diferentes tipos de mercado, quais sejam: mercado da venda direta, mercado do varejo, mercado da transformação, mercado externo e mercado institucional. Essa situação é muito positiva para a agricultura familiar e para a ação do Estado, na implementação de diretrizes, políticas, programas e ações diferenciadas, apoiando a perspectiva de construção social de mercado, segundo os tipos de mercado, reforçando estratégias apoiadas em relações sociais existentes ou a se constituírem. A seguir apresenta-se a síntese dos resultados para cada um dos mercados de orgânico estudados, apontando para possíveis diretrizes e políticas públicas. Mercado da Venda Direta Os resultados deste trabalho mostraram que o mercado da venda direta estruturase a partir de dois agentes, de um lado o agricultor familiar – produtor e comerciante – e de outro o próprio consumidor. As transações mercantis dão-se por meio das relações face a face, sendo a feira o principal canal de comercialização neste mercado, embora incipientemente se verifique iniciativa de entrega de sacolas e venda direta na propriedade. Este tipo de mercado orgânico é o mais antigo no Paraná. Começou a se estruturar no final de 1980, em Curitiba, e sua oficialização na cidade ocorreu em meados de 1990, com a inauguração da "Feira Verde". 166 O estudo de campo mostrou que as feiras podem ser caracterizadas segundo três tipos: as feiras orgânicas, as feiras agroecológicas e as feiras mistas. O que diferencia as feiras orgânicas das agroecológicas é a certificação. No primeiro caso, todos os produtores e barracas exibem um selo de certificação, seja por auditagem ou pelo sistema de garantia participativa. Nas feiras agroecológicas pode ou não ser exibido um selo de certificação (caso haja, é o da Rede Ecovida de Certificação Participativa), pois a principal garantia é firmada pela relação de confiança estabelecida entre o agricultor e o consumidor. As feiras mistas são aquelas que originariamente comercializavam produtos convencionais e, com o passar do tempo, foram agregando barracas que comercializam produtos orgânicos, sejam eles certificados com selo ou tenham a garantia do produtor. Embora os três tipos de feira ocorram em vários municípios do Paraná, é em Curitiba que predomina a feira orgânica. Atualmente existem seis espalhadas em vários bairros, e mais duas estão previstas para o ano de 2007. Nas cidades de menor porte predominam as feiras agroecológicas, em razão da proximidade física e social entre agricultor e consumidor. As feiras mistas predominam nas cidades de porte médio, a exemplo de Maringá. A pesquisa mostrou que, nas feiras, os principais produtos comercializados são os produtos in natura, do grupo das hortaliças, notadamente as folhosas. Também se ofertam grãos, produtos de lavoura temporária, frutas e produtos transformados, desde os beneficiados aos processados, embora em menor quantidade e diversidade, havendo uma grande demanda por estes produtos pelos consumidores. Em todas as feiras a grande maioria dos produtos vem da produção dos próprios agricultores, que são também os comerciantes nas barracas, ou do grupo de agricultores aos quais estão ligados. Verificou-se também que há intercâmbio de produtos de outras regiões e de agricultores e/ou associações do Paraná e demais estados do sul do País, que são comercializados nas barracas. Outro aspecto que merece destaque neste tipo de mercado é o perfil do consumidor de produtos orgânicos. O estudo mostrou que o consumidor da feira orgânica, em particular em Curitiba, tem renda acima de 10 salários mínimos, possui formação de 3.o grau, muitos são profissionais autônomos e a maioria são mulheres. A principal motivação de consumo é a saúde da família e o meio ambiente. Entretanto, embora a maioria conheça o agricultor comerciante, pouco sabe do seu papel como ator fundamental para a expansão deste tipo de mercado, bem como para a própria agricultura orgânica. O estudo mostrou também que em municípios onde ocorre a articulação entre os diferentes atores ligados a esse mercado, a possibilidade de este se estruturar e fortalecer é maior. Esta situação é visível na cidade de Curitiba, onde se verifica uma estreita interação entre o poder público municipal, por meio da Secretaria de Abastecimento, entidades nãogovernamentais, como a AOPA, organizações de agricultores dos municípios produtores e participantes da feira, bem como a associação de consumidores, a ACOPA. O resultado 167 desta ação integrada aparece quando se constata que em dez anos o número de feiras expandiu-se significativamente: de 1 feira, em 1995, hoje já funcionam 6, com a projeção de mais 2 para janeiro de 2007. A partir desses resultados, são apontadas, a seguir, diretrizes e orientação de políticas públicas para o fortalecimento do mercado da venda direta no Paraná. Diretriz - Promover apoio institucional ao mercado da venda direta de produtos orgânicos. Sugestões de Políticas Públicas - estimular e apoiar financeiramente (custeio e investimento) a criação e melhoria de estruturas de comercialização do mercado da venda direta em todas as regiões do Paraná, em particular feiras orgânicas e agroecológicas, mas também estruturas locais como mercados públicos e outras; - desenvolver e implementar programas de formação e capacitação em gestão para comercialização, logística e distribuição para associações de agricultores familiares; - estruturar uma rede de informações – eletrônica ou de tipo acessível –, destinada ao intercâmbio de produtos orgânicos das diferentes regiões do Paraná, para a comercialização no mercado da venda direta; - apoiar e estimular a diversificação da produção para o abastecimento do mercado da venda direta, segundo as características regionais, com destaque para sistemas de produção animal, fruticultura e transformados; - apoiar estudos e pesquisa sobre o mercado da venda direta, segundo as particularidades dos sistemas de produção de cada região. Sugestões para ações específicas - ampliar o espaço das feiras orgânicas em municípios onde já ocorrem, como Curitiba, Maringá e União da Vitória, com a participação ativa dos governos municipais em articulação interinstitucional com outros atores; - apoiar a abertura de Mercados Municipais de Orgânicos fixos, possibilitando a compra durante toda a semana em regiões metropolitanas do Paraná (por exemplo, Curitiba); - apoiar a abertura de boxes fixos de associações em mercados públicos, notadamente em municípios de menor porte (a exemplo de União da Vitória); - apoiar a implantação de lojas de associações, mantidas pelas prefeituras e associações (por exemplo, ACEMPRE, em Marechal Cândido Rondon, Pato Bragado e Missal); - criar uma marca social que identifique os produtos orgânicos e os pontos de venda direta (como barracas de bambu nas feiras orgânicas de Curitiba); 168 - apoiar mecanismos de garantia/certificação do produto orgânico, oferecendo garantias ao consumidor na venda direta (a exemplo da Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento de Curitiba); - apoiar a realização de eventos para uma agenda de discussão das restrições e oportunidades na venda direta, sobretudo em feiras. Mercado do Varejo O estudo mostrou que a comercialização de produtos orgânicos no mercado do varejo é muito recente em todo o Paraná, tendo se iniciado de maneira mais estável a partir de 2000, e os dois principais canais de comercialização que atuam nas vendas dos produtos são as redes de supermercados e as lojas especializadas, situadas na sua maioria em Curitiba, com o predomínio das redes de supermercados. No interior do Estado verificou-se que a presença de tais agentes e do próprio mercado do varejo é bem menos relevante. A situação excepcional que se verificou foi na região Oeste, no município de Marechal Cândido Rondon, onde os produtos orgânicos são comercializados pelo mercado do varejo. Entretanto, trata-se de um supermercado local, vinculado a uma cooperativa de agricultores. No caso de lojas especializadas, no interior só foram identificadas três lojas, duas delas na região Norte – uma em Londrina e outra em Maringá (esta com produtos agroecológicos) – e a terceira na região Sudoeste, em Francisco Beltrão. No que se refere aos agentes envolvidos nas transações comerciais, o que predomina nas redes de supermercados é, de um lado, a própria rede, e, de outro, empresas intermediárias de fornecimento de produtos orgânicos. Trata-se de uma situação típica em Curitiba, semelhante à de outros grandes centros urbanos do País, onde as redes de supermercados só transacionam com fornecedores já estruturados empresarialmente, os quais mantêm relações de integração vertical e/ou horizontal com os agricultores familiares produtores de orgânicos. Os supermercados de Curitiba operam com os produtos orgânicos com a mesma lógica com que transacionam com os demais produtos do mercado agroalimentar, seja em termos de exigências, padronagem, embalagem, custos e prazos de pagamento. Com relação aos fornecedores para o mercado do varejo, a pesquisa identificou que são duas as empresas no Paraná que trabalham com os produtos orgânicos, ambas situadas em municípios da região metropolitana de Curitiba. Trabalham exclusivamente com hortaliças, processadas minimamente. Embora as duas empresas mantenham áreas próprias de cultivo (cerca de 25%), a maior parte da produção que negociam é oriunda de mais de 100 agricultores familiares produtores de hortícolas orgânicas (a grande maioria da RMC), com os quais estabelecem contrato de parceria ou de integração, dependendo da situação. 169 Nas demais regiões do Estado o mercado do varejo é bastante incipiente. Quando existe a comercialização de orgânicos o que se verifica é que os fornecedores são de menor porte, ofertando tanto produtos convencionais como orgânicos, com produção própria, às vezes integrados com outros produtores, cujas transações se dão, na maioria das vezes, mediante contratos informais. Com relação às lojas especializadas a situação encontrada é distinta. Nestes equipamentos a relação de compra de produtos se dá diretamente de produtores individuais ou de associações de agricultores familiares produtores de orgânicos, sendo que as condições são estabelecidas diretamente entre os dois agentes, produtores e compradores. Os produtos são originários na sua maioria das próprias regiões das lojas, no caso de hortaliças e frutas, porém os demais produtos de mercearia seca são provenientes também de outras regiões e estados. Os principais produtos orgânicos transacionados nos supermercados são as hortaliças, e os transformados são praticamente inexistentes, diferentemente das lojas especializadas, que comercializam em maior escala os processados em geral, sobretudo os sucos, geléias, grãos e farinhas. Quanto à garantia de procedência dos produtos orgânicos comercializados, a pesquisa mostrou que o mercado do varejo (supermercados e lojas) só opera com produtos que têm selo de certificação de terceira parte, sendo que os dois principais certificadores são o IBD e a ECOCERT. A exceção é o caso do supermercado da região Oeste, que, dadas as suas características, trabalha com produtos orgânicos certificados pela Rede Ecovida de Agroecologia, que se baseia no sistema de garantia participativo (SGPs). Por fim, no mercado do varejo a relação do consumidor é exclusivamente com o produto orgânico, desconhecendo, na maior parte das vezes, o processo de produção que deve caracterizar a agricultura orgânica. Diretriz - Promover os alimentos e produtos orgânicos no mercado do varejo. Sugestões de políticas públicas - estabelecer parceria com o setor privado para a promoção e divulgação dos produtos orgânicos, a exemplo da Semana da Alimentação Orgânica; - estabelecer um canal de comunicação com agentes do mercado do varejo para discussão permanente de restrições e potencialidades dos produtos orgânicos neste mercado; - apoiar iniciativas de associações/cooperativas de agricultores familiares para o estabelecimento de lojas especializadas com produtos orgânicos em cada região paranaense. 170 Mercado de Transformação O mercado de transformação de produtos orgânicos é entendido, neste estudo, como aquele que envolve as empresas de transformação – processadoras e beneficiadoras –, os agricultores como fornecedores de matéria-prima e os demais tipos de mercado onde os produtos são comercializados. Com este estudo constatou-se que as empresas de transformação de produtos orgânicos apresentam uma diversidade de formatos, que envolve desde o tamanho, produtos, formas de contratos – tanto com os agricultores como com os compradores –, tipo de clientela a ser atendida (seja no nível local/regional, nacional ou internacional), tecnologia envolvida no processamento ou beneficiamento etc. As primeiras empresas começaram a atuar no Paraná há menos de 10 anos e estão localizadas em praticamente todas as regiões paranaenses. Os produtos com os quais trabalham são provenientes em sua maior parte da agricultura familiar e apresentam uma significativa diversificação com relação aos grupos de produtos. Dentre eles destacam-se os grãos (principalmente soja e café), hortaliças, frutas, mandioca (fécula), cana-de-açúcar (açúcar mascavo e cachaça), mel, ervas medicinais (chás), erva-mate e alguns subprodutos (geléias, barras de cereais, biscoitos). No que se refere à relação das empresas com os seus produtores de matéria-prima, verificou-se que ela pode ocorrer tanto com produtores individuais quanto com associações de produtores, cooperativas de produtores, podendo os produtos ser provenientes também de produção própria. De um modo geral, as empresas adquirem produtos de origem certificada. A pesquisa de campo permitiu que se identificassem três formas de relação entre as empresas e os produtores, independentemente dos produtos e de estar formalizada ou não a relação. São elas: relação contratual, relação independente e relação de parceria. Do ponto de vista do processo de transformação, o estudo verificou que as empresas agrupam-se em três tipos: as de beneficiamento (em que os produtos não sofrem processo de transformação); as de processamento mínimo (os produtos permanecem em sua forma in natura, apenas com leve modificação das condições iniciais); e as empresas de processamento (os produtos passam por transformação, que altera as características físicas, químicas e fisiológicas). A pesquisa mostrou que, entre as empresas pesquisadas, há aquelas que trabalham exclusivamente com produtos orgânicos e aquelas que trabalham com produtos convencionais e também com orgânicos. Identificou-se ainda que, no mercado da transformação, estão atuando associações e/ou cooperativas de agricultores familiares que fazem a transformação de produtos orgânicos. No mercado da transformação é fundamental considerar quatro aspectos que estão inter-relacionados: o tipo de mercado comprador do produto transformado – mercado 171 da venda direta, do varejo, externo e o institucional; o tipo de processo de transformação; a relação com o produtor da matéria-prima, e o produto a ser transformado propriamente dito. Para o estudo foram investigadas 22 empresas. Com exceção de uma cooperativa de agricultores, as demais são de propriedade privada. Deste total, a maioria (15 delas) atua com o processamento, ofertando uma gama diversa de produtos transformados: geléias, sucos, conservas, cachaça, açúcar mascavo, chás, barras de cereais, farinhas, melado, féculas, derivados de soja e café torrado e moído. Apenas duas empresas trabalham no processamento mínimo, com as hortaliças, e outras cinco somente beneficiam os produtos, como: mel, soja, ovos, arroz, feijão, milho e trigo. Grande parte dos produtos transformados é comercializada por meio do mercado externo. Predominam aqueles produtos destinados somente ao beneficiamento, como é o caso do soja e do café, e em menor escala estão os processados, como a fécula de mandioca. Para atuar no mercado externo as empresas privadas do mercado da transformação têm que estabelecer relações com outros agentes que entram no circuito, sejam compradores diretos de outros países ou através de uma trading (processadoras de soja), que faz a intermediação entre os futuros compradores e as empresas locais. No caso das associações/cooperativas, estas têm uma menor participação no mercado exportador. Na maioria das vezes os produtos que podem comercializar despertam interesse de compradores, sendo que em boa parte das vezes estas iniciativas inserem-se no chamado comércio justo e solidário, onde se focalizam as tecnologias de processo, em vez das tecnologias de produto. Tal situação se verificou, por exemplo, no caso da cachaça exportada pela Cooperativa Vitória da Conquista, situada no município de Paranacity, para ONGs da Espanha, as quais apoiavam a reforma agrária e a agroecologia. O que merece ser destacado é a crescente diversidade e quantidade de produtos orgânicos que têm passado por processos de transformação, onde predominam as empresas privadas de grande a pequeno portes. A presença das associações e cooperativas de agricultores familiares é praticamente inexistente neste mercado, e, quando transformam os produtos, estes são destinados ao mercado da venda direta, comercializados como artesanais. Diretriz - Apoiar a agricultura familiar no mercado da transformação de produtos orgânicos. Sugestões de Políticas Públicas - criar um programa de apoio e incentivo financeiro à transformação da produção de orgânicos pelos agricultores familiares (Fábrica do Agricultor Orgânico); - desenvolver e implementar ações de capacitação em processos de transformação de produtos orgânicos, considerando não só os processos produtivos mas também sanitários, de gestão etc., destinados a agricultores orgânicos; 172 - apoiar e diversificar a rede de intercâmbio de produtos orgânicos entre as regiões do Paraná (conforme proposta do mercado de venda direta), estimulando a aquisição de produtos, insumos etc., para os processos de transformação; - desenvolver um programa para regularizar/legalizar os processos de transformação de produtos orgânicos artesanais. Mercado Externo O estudo demonstrou que existe uma demanda crescente por produtos orgânicos não atendida no mercado mundial. Alguns produtores ou empresas brasileiras que já conseguiram atender às exigências de certificação e padrões de qualidade impostos pelos países importadores estão exportando regularmente produtos orgânicos beneficiados e alguns processados para o atendimento desta demanda insatisfeita. No entanto, a pesquisa revelou que não são os agricultores familiares e nem mesmo suas organizações que estão se beneficiando desta situação, mas sim grandes produtores ou empresas que se mostram mais estruturadas para atuar no mercado internacional. Esta situação não é diferente no Estado do Paraná. Em função disso, cabe aos organismos nacionais, e também aos organismos estaduais dedicados à promoção das exportações, desenvolver ações efetivas para democratizar o acesso ao mercado externo de produtos orgânicos, disponibilizando informações e oportunidades de negócios, indicando produtos com potencialidade para exportação, incentivar e capacitar produtores ou associações de produtores para desenvolverem tecnologias de processamento dos produtos orgânicos mais demandados pelo mercado de outros países. Diretriz - Democratizar o mercado externo de produtos orgânicos, promovendo a participação da agricultura familiar. Sugestões de Políticas Públicas - criar uma unidade de informação e divulgação sobre o acesso ao mercado externo de produtos orgânicos, acessível a todos os agentes, em particular à agricultura familiar; - estimular as transações mercantis do Mercado Justo e Solidário, desburocratizando os processos de exportação; - desenvolver uma marca social para os produtos orgânicos paranaenses e divulgá-la entre os agentes que atuam no mercado externo. 173 Mercado Institucional Neste estudo tratou-se como mercado institucional aquele em que o Estado é um agente fundamental no processo de comercialização de produtos agroalimentares, atuando por meio de programas institucionais que operacionalizam políticas públicas voltadas à "política de segurança alimentar e nutricional". Nesse contexto identificaram-se dois programas em que os produtos orgânicos têm sido comercializados: o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). O PAA é um programa voltado à aquisição de alimentos e produtos da agricultura familiar, e é um dos componentes do Programa Fome Zero, destinado a atuar junto a populações em situação de insegurança alimentar e nutricional. Os produtos orgânicos comercializados pelo PAA recebem um diferencial de 30% em relação àqueles da agricultura convencional, valorizando a qualidade nutricional e demais aspectos socioambientais envolvidos. O PNAE, ou a merenda escolar/orgânica, é destinado a atender crianças do ensino fundamental e pré-escolar, de creches e de instituições filantrópicas. A decisão da pauta de alimentos e produtos para o programa é da alçada dos municípios e estados, envolvendo, para tanto, os Conselhos de Alimentação Escolar (CAE), instituídos em cada município. A possibilidade de se ampliar a aquisição de orgânicos pela merenda é muito grande, uma vez que há a obrigatoriedade de os municípios e estados aplicarem 70% dos recursos transferidos pelo governo federal na aquisição exclusiva de alimentos e produtos básicos semi-elaborados e in natura, respeitando os hábitos alimentares regionais e a vocação agrícola do município e fomentando o desenvolvimento da economia local. No Paraná, na atualidade, em ambos os programas a comercialização de alimentos e produtos orgânicos não ultrapassa 5% do total das quantidades comercializadas. Entretanto, verifica-se que há um expressivo potencial para a ampliação dos alimentos e produtos orgânicos neste mercado, sendo necessário, contudo, apoio para a ampliação da produção, da organização dos agricultores, da conscientização dos gestores públicos locais, de articulação interinstitucional, entre outros. É relevante destacar que o estudo apontou que, além das transações mercantis, os programas têm atuado como importantes catalisadores no desenvolvimento econômico e social local e territorial, promovendo a articulação entre diferentes atores sociais interessados. No mercado institucional há possibilidades de os alimentos não serem vistos somente como produtos, dada a proximidade entre o ambiente da produção e do consumo. Também tem-se apontado que há, neste mercado, um ambiente para a concertação das relações mercantis, onde tanto os agricultores, as entidades intervenientes e os agentes do poder público têm buscado soluções para chegar a acordos e ajustes nos procedimentos, os quais, muitas vezes, devido ao trâmite burocrático, dificultam a implementação dos programas localmente. 174 Diretriz - Incrementar as ações dos programas institucionais (PAA) e Merenda Escolar Orgânica. Sugestões de Políticas Públicas - divulgar informações sobre os programas para todos os municípios paranaenses; - desenvolver mecanismos de facilitação/desburocratização aos programas para as organizações de agricultores familiares orgânicos; - divulgar sistematicamente os resultados dos programas em nível local, regional e estadual; - ampliar programas institucionais para o atendimento de outros consumidores coletivos estaduais, como hospitais públicos, entre outros. A realização deste estudo, além de identificar aspectos específicos relativos aos mercados de orgânicos existentes no Paraná e de apontar diretrizes e sugestões de políticas públicas para os mesmos, também verificou que há aspectos restritivos ao desenvolvimento de tais mercados, os quais, se solucionados, podem incrementar os diferentes tipos de mercado de orgânicos. Com este intuito é que se apresenta, a seguir, um conjunto de orientações para diretrizes, políticas públicas e ações, destinadas a potencializar o mercado de orgânicos no Paraná. Necessidade de estabelecer uma base de dados e de divulgação de informações sobre a agricultura orgânica A pesquisa verificou que, embora se tenham dados sobre a produção orgânica no Paraná, esta precisa estar melhor organizada, estruturada e disponibilizada, no sentido de garantir a confiabilidade nos dados e informações sobre os produtores, os produtos, as regiões produtoras e os processos de comercialização nos mercados de produtos orgânicos. Isso implica definir um programa institucional voltado a apoiar ações de pesquisa e tecnologia para a construção de uma base de dados, estabelecendo metodologia de coleta de dados, definição de indicadores e variáveis de acompanhamento de dados, marco referencial de análise dos dados e produção de informação, bem como definir estratégias de divulgação sistematizada, organizada, periódica e, fundamentalmente, de fácil acesso e compreensão para os agentes envolvidos, em particular aqueles da agricultura familiar. Para tanto, entende-se como indispensável a constituição de coordenação colegiada, com atribuição definida e específica, que envolva os interessados no processo – instituição pública, entidades dos agricultores, ONGs, iniciativa privada e de consumidores. 175 Apoio ao sistema de produção – financiamento, assistência técnica e pesquisa O estudo mostrou que a pauta de produtos orgânicos comercializados no Paraná é relativamente ampla, embora ainda insuficiente para atender aos diferentes tipos de mercado. O que de fato predomina são os produtos in natura, principalmente o grupo das hortaliças, mas também se produzem grãos/cereais, frutas, mel, chás, produtos de origem animal, além daqueles produtos orgânicos que são transformados, passando por distintos processos: beneficiamento, minimamente processado e processado, segundo características e condições regionais. A insuficiência de produtos expressa restrições que ocorrem no âmbito da produção e que afetam diretamente as estruturas dos mercados de orgânicos. Ou seja, além de haver um número ainda pequeno de agricultores produzindo orgânicos, na maior parte das vezes não há subsídios ou financiamento específico e adequado, tanto para aqueles que estão produzindo como para os que desejam fazer o processo de transição da agricultura convencional para a orgânica. Da mesma forma, também se constatou, em todas as regiões do Paraná pesquisadas, que é incipiente o número de profissionais da extensão e assistência técnica oficial dedicados exclusivamente a atender à produção orgânica. Via de regra, os técnicos, em muitos municípios, fazem a assistência aos agricultores orgânicos como mais uma de suas atribuições. Muitos deles demandam processos continuados de formação e capacitação para prestar o serviço de ATER aos agricultores orgânicos, podendo inclusive colaborar nos processos de comercialização da produção. Ainda com relação à assistência técnica, há que se considerar as ações das entidades de assessoria aos agricultores e as ONGs que trabalham com a temática, que também têm restrições com relação ao número de profissionais, e, às vezes, as mesmas debilidades em termos de capacitação. Nesse sentido, seria recomendável que esses profissionais também fossem contemplados nos processos de formação e capacitação, a fim de se criar núcleos regionais/municipais que integrem as ações entre os órgãos, entidades de agricultores, ONGs e outros que trabalham com a agricultura orgânica nas regiões. No que tange à pesquisa na área da produção, o estudo identificou que as mesmas estão dispersas em instituições governamentais, universitárias e ONGs, abordando temas bastante específicos e pontuais relativos ao sistema de produção. O que se constata é a necessidade de se estabelecer uma política de investigação para a área, com apoio e recursos financeiros adequados para a realização de pesquisas e estudos. Mas, para tanto, é essencial que se proceda a um levantamento do que existe, que se estabeleçam linhas de pesquisa de médio e longo prazos, focadas nos agroecossistemas regionais e da agricultura familiar. É importante que seja um programa integrado, articulado e coordenado no nível estadual entre as instituições afins – SETI, IAPAR, CPRA, SEAB, EMATER e universidades –, mas que se mantenha articulado e apoiado no nível federal com os diversos centros de pesquisa da EMBRAPA, bem como com as agências de fomento em suas várias instâncias. 176 Embora a indicação de diretrizes, políticas ou programas voltados à produção não seja objeto deste estudo, entende-se que é um relevante obstáculo para a implementação das políticas direcionadas especificamente aos mercados de orgânicos. O fundamental, no que tange à produção, é que o foco esteja voltado ao sistema de produção como processo e não aos produtos isoladamente, favorecendo posteriores ações no âmbito da comercialização e da divulgação da agricultura orgânica no Paraná. Divulgação, informação e consumo responsável de produtos orgânicos O estudo verificou que são praticamente inexistentes ações direcionadas à divulgação de informações sobre a importância dos produtos orgânicos, para a segurança alimentar e nutricional da população, bem como para a promoção do consumo responsável. A pesquisa mostrou que, de um lado, existe um consumidor individual de orgânicos, que é aquele que freqüenta as feiras orgânicas ou agroecológicas e que tem uma relação de fidelidade na aquisição dos produtos. Via de regra este consumidor tem um poder aquisitivo mais alto que a maioria da população do Estado, concentra-se nas camadas com renda acima de 10 salários mínimos, tem idade superior a 30 anos, e, em sua maioria, são profissionais liberais e mulheres. A motivação para a compra destes alimentos tem como base as preocupações com a saúde da família e com as questões ambientais. Este mesmo consumidor também busca produtos nas lojas especializadas e em restaurantes específicos, que oferecem os alimentos orgânicos. Nem sempre este consumidor está preocupado com a certificação, ou, quando está, é receptivo tanto à certificação participativa como à certificação por auditagem. Embora disponha de informações sobre a agricultura orgânica e sua relevância, pouco conhece sobre o processo que envolve o sistema de produção, bem como sobre a importância do seu ato de consumo para o meio rural, para o meio ambiente e para os agricultores familiares produtores de orgânicos. De outro lado há o consumidor individual que freqüenta os supermercados, que se insere no mercado do varejo de produtos orgânicos. Embora com perfil semelhante no que tange à faixa de renda, profissão, idade e sexo, o que o difere daquele da feira é que ele não tem uma relação de fidelidade na aquisição de orgânicos. Adquire o que está disponível, só compra produtos com selo de certificação, e considera que seu consumo é restrito, devido aos preços praticados pelos equipamentos deste mercado do varejo. Além desse consumidor individual, o estudo mostrou que há uma categoria de consumidores que se denominou consumidor coletivo. O consumidor coletivo é aquele beneficiário dos programas institucionais, promovidos pelo Estado, como o PAA – Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar, vinculado ao Programa Fome Zero, e o PNAE – Programa Nacional de Alimentação Escolar, em particular a merenda orgânica. 177 Tais programas sociais destinam-se a atender à população em situação de insegurança alimentar e nutricional. Na atualidade identificam-se dois grandes grupos no âmbito do consumo coletivo que têm se beneficiado de produtos orgânicos: a população infantil do ensino fundamental, pré-escola, creches e instituições filantrópicas que atendem crianças são abastecidas pelo PNAE; e o PAA tem como público consumidor o das entidades beneficiárias do programa, como creches, orfanatos, APAES (Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais), APMIS (Associação de Proteção à Maternidade e Infância), centros de assistência, entre outras entidades filantrópicas. Entende-se que o Estado tem um papel importante nesse cenário, desencadeando programas ou ações voltadas a produzir e divulgar informação sobre a agricultura orgânica e os aspectos correlacionados a ela. Tais ações devem ser direcionadas para ambos os tipos de consumidores, os individuais e os coletivos, estimulando o consumo responsável. Compreende-se que várias estratégias podem ser adotadas. Dentre elas pode-se apontar a possibilidade de parcerias com entidades que já atuam nesta direção, como, por exemplo, com a Associação de Consumidores Orgânicos do Paraná (ACOPA), o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), o Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor (FNECDC), entre outras. Tais iniciativas podem se amparar no Código de Defesa do Consumidor, em seu capítulo IV, art. 4.o, que prevê que o Estado destine recursos específicos para a educação e informação dos consumidores, apoiando atividades de educação informal desenvolvidas pelas entidades civis de consumidores e campanhas públicas sobre os direitos dos consumidores. Também pode-se considerar como estratégia o estímulo à organização e ao funcionamento de outras associações de consumidores, com o intuito de promover o desenvolvimento local e regional, a partir do estreitamento de relações entre consumidores e produtores de orgânicos. Com relação ao consumidor coletivo, o que se verificou também é que há precariedade de divulgação de informações sobre os produtos orgânicos para a população beneficiária dos atuais programas sociais. Isso se constatou, por exemplo, na oficina de avaliação do PAA/Região Sul, realizada em 2006, em Curitiba. Considera-se que este deveria ser um consumidor privilegiado no acesso aos alimentos e produtos orgânicos, dadas as suas particulares condições de insegurança alimentar e nutricional, e o reconhecimento da qualidade nutricional dos orgânicos. Desta forma, são relevantes não só as informações sobre os alimentos orgânicos, mas também sobre os programas que promovem a compra dos mesmos, através de campanhas junto às entidades, às prefeituras e escolas, entidades e associações de produtores. 178 O conjunto de resultados apresentados neste estudo cumpriu o objetivo de identificar e caracterizar o mercado de orgânicos do Paraná. A partir da constatação de que não se está diante de uma estrutura hegemônica, é que se mostrou que o mesmo deve ser apreendido a partir de diferentes tipos de mercado: o da venda direta, do varejo, da transformação, o externo e o institucional. Essa condição permite que o Estado atue de forma mais contundente e particularizada em cada um dos diferentes mercados, através de diretrizes e políticas, buscando contemplar de maneira particular a agricultura familiar como um ator e agente relevante nos processos mercantis, marcados que são por relações sociais. 179 REFERÊNCIAS ABNT. Certificação. Disponível em: <http://www.abnt.org.br/certificacao.htm>. ABRAMOVAY, Ricardo. Agricultura familiar e capitalismo no campo. In: STÉDILE, João (Coord.). A questão agrária hoje. Porto Alegre: Ed. UFRGS, 2002. ABRAMOVAY, Ricado. Comentário ao texto “A irrelevância prática da agricultura ‘familiar’ para o emprego agrícola”, de Claus Germer. 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