ANAIS DO II COLÓQUIO DO LAHES:
MICRO HISTÓRIA E OS CAMINHOS DA
HISTÓRIA SOCIAL
Comissão Organizadora:
Profª Drª Carla Maria Carvalho de Almeida (UFJF)
Profº Dr Cássio Fernandes (UFJF)
Profª Drª Mônica Ribeiro de Oliveira (UFJF)
Profª Drª Sônia Maria de Souza (UFJF)
Promoção:
Laboratório de História Econômica e Social
Programa de Pós-graduação em História da UFJF
Apoio:
Pró-Reitoria de Pesquisa
Instituto de Ciências Humanas
FAPEMIG
CAPES
Editoração:
Bianca Portes de Castro
Ficha Catalográfica:
II Colóquio do Laboratório de História Econômica e Social (2008: Juiz de Fora,
MG). Micro História e os caminhos da História Social: Anais / II Colóquio do
LAHES; Carla Maria Carvalho de Almeida, Mônica Ribeiro de Oliveira, Sônia
Maria de Souza, Cássio Fernandes, organizadores. Juiz de Fora: Clio Edições,
2008, http://www.lahes.ufjf.br.
ISBN: 978-85-88532-29-8
1. História
2. História Econômica e Social.
I. Carla Maria Carvalho de
Almeida. II. Mônica Ribeiro de Oliveira. III. Sônia Maria de Souza. IV. Cássio
Fernandes.
MANCHANDO A TOGA DE SANGUE: A DISPUTA PELO PODER EM
OLIVEIRA 18681
Guilherme Pereira Claudino*
A referente pesquisa pretende analisar a utilização das instituições estatais, mais
precisamente o aparato judiciário, pela elite oliveirense, como forma de resolver suas
querelas. A proposta específica é tentar entender o campo de ação das redes de poder na
esfera pública no oitocentos, bem como suas relações com as disputas partidárias.
Através da leitura de processos criminais envolvendo a elite oliveirense, foi possível
perceber o processo de solidificação das instituições imperiais. As elites locais tiverem de
negociar com a nova ordem centralizadora, estabelecendo, assim, uma ligação direta com a
política da corte. Os processos criminais pesquisados foram lidos a luz do debate sobre o
clientelismo e a política do segundo reinado.
A briga entre dois grupos de prestígio na cidade evidenciou as relações de poder e as
estratégias da elite local, demonstrando redes de sociabilidade com base na família e ligações
entre diversos estratos sociais (promotores, vereadores, fiandeiras, lavradores, escravos e
etc.).
Para esclarecimento conceitual, consideramos política, para este trabalho, como tudo
aquilo que perpassa a administração dos recursos estatais, bem como os mecanismos de
monopólio da força2. Elites como grupos que possuem certa posição estratégica que garante
privilégios. Poder aqui não é tratado simplesmente com a conotação política, mas também
como uma instância existente nas relações familiares e de clientela, que não necessariamente
tem relação direta com o poder público. Estado como o “lugar onde se articula o social e sua
representação, a matriz simbólica na qual a experiência coletiva se enraíza e se reflete por sua
vez.”3.
1
- Projeto de pesquisa desenvolvido no âmbito PIBIC/CNPQ. Orientado pelo professor Dr Ivan Vellasco (
DECIS – UFSJ)
*
Graduando em História – Universidade Federal de São João del-Rei. E-mail: [email protected]
2
- BOBBIO, N. Dicionário de política. Brasília: UNB; São Paulo: Imprensa oficial. Versão CD-Rom, s/d.
3
- PIERRE, Rosanvallon. “Pour une hostories conceptuekke du politique”. Revue Syntese, IV, numero 1, janjuin 1986, p.93-104 apud FERREIRA, Marieta de Moraes. A nova “velha história”: o retorno da história política.
Estudos Históricos, Rio de janeiro, vol.5, n.10, 1992, p265-271.
ISBN: 978-85-88532-29-8 – Clio Edições – 2008
1
Através da pesquisa no acervo de Oliveira, encontramos uma briga entre dois grupos
de elevado prestígio social na cidade, divididos entre Liberais e Conservadores. Tivemos
acesso a dois processos criminais referentes a esses grupos, ambos de 1868. O primeiro
documento é referente ao espancamento e morte de um escravo e, o outro, a uma briga
decorrente de provocações feitas pelos grupos frente à queda do ministério liberal.
A década de 1860 representou para o cenário político imperial, o renascer liberal, já
que a vitória do Regresso4, que, pois fim as esperanças em relação à autonomia provincial,
consolidou a hegemonia Saquarema após o período regencial. Apesar de representar o retorno
dos liberais ao poder, a década de 60 também foi um período de cisões dentro do partido, que
mais tarde gerariam o partido republicano. No ano de 1868, a união de alguns conservadores
dissidentes, como Nabuco de Araújo e Zacarias, que formaram a liga Progressista, aos
liberais, gerou insatisfações dentro deste partido. A queda do ministério de 1868 (Zacarias de
Gois e Vasconcelos), que representava a conciliação de Liberais e antigos Conservadores,
acirraria ainda mais as disputas internas do Partido Liberal.5
No dia 16 de julho de 1868, Joaquim José Rodrigues Torres, o visconde de Itaboraí,
político conservador o qual compôs a trindade Saquarema e que ocupou diversos cargos
importantes durante o império, foi chamado para presidir o conselho de ministros. Era a
entrada dos conservadores no poder, que pela já conquistada centralização, repercutia nos
cargos provinciais por todo país. Nesse período, a justiça local se encontra atrelada ao
Ministério da Justiça, que tem total poder na configuração das instituições locais.
Chegando tal notícia em Oliveira, um grupo de conservadores, entre os quais se
encontravam o delegado Mizael Ribeiro da Silva, dois irmãos bacharéis, Vitor Gonçalves
Diniz e Aurélio Gonçalves Diniz e o major Teodósio da Costa Pereira, se reuniu na casa do
tenente coronel José Ferreira de Carvalho, onde alguns proferiram discursos e deram vivas ao
Visconde de Itaboraí, ao partido conservador e ao Imperador Dom Pedro II. Neste mesmo
instante um outro grupo de liberais passou a vaiar e fazer insultos. Antônio de Pádua
destacou-se de tal grupo e foi em direção aos conservadores, agredindo fisicamente, com uma
faca, Aurélio Gonçalves Diniz.
No mesmo dia da agressão, Vitor Gonçalves Diniz recorreu à justiça, acusando o juiz
municipal da cidade de Oliveira, Benedito Marques da Silva Acunha Filho e o promotor
4
- BASILE, Marcelo Otávia N. de C. Consolidação e crise no Império. In: LINHARES, Maria Yeda (coord).
História Geral. Rio de Janeiro, Campus, 2000. 9ª ed.
5
- ALONSO, Ângela. Idéias em movimento: a geração 1870 na crise do Brasil Império. São Paulo, Paz e Terra,
2002.
ISBN: 978-85-88532-29-8 – Clio Edições – 2008
2
público interino Raymundo Nonato Coutinho de serem os mandantes da ofensa física.
Segundo Vitor, ambos encorajaram Antônio Pádua Severo, a cometer o crime, dizendo que o
livrariam da cadeia através da utilização de seus cargos públicos.
E nesse mesmo dia, para não ser feito corpo de delito, um dos tabeliões foi dispensado
por Benedito Marques da Silva, que tinha assumido a vara de direito. Antônio Pádua Severo
foi solto, sendo algumas testemunhas pressionadas por Raymundo Nonato, como consta na
acusação de Vitor Gonçalves Diniz.
Para deixar o leitor mais íntimo do ocorrido, transcreverei parte da petição inicial feita
por Vitor Gonçalves Diniz:
“ No dia 10 do mês de julho de 1868 chegando a esta cidade a notícia da demissão do
ministério de 3 de agosto e de ter sido chamado para organizar o novo gabinete, o
excelentíssimo visconde de Itaboraí, reunirão-se os conservadores dirigindo-se a casa do
distinto cidadão tenente coronel José Ferreira de Carvalho e ali pronunciaram se alguns
discursos que concluirão com um viva ao imperador, ao visconde de Itaboraí, marques de
Caxias e outros de igual apreço(...) sempre interrompido por (...) assovios e outras
provocações de um grupo no qual foram vistos os denunciados. Saindo o tenente coronel José
Ferreira de Carvalho com os seus amigos dirigirão-se a casa de um outro cidadão Mizael
Ribeiro de Castro, onde foram novamente interrompidos pelo grupo de desordinos que em
pequena distancia os acompanhava (...) Doutor Aurélio Diniz Gonçalves a instâncias de
alguns dos seus amigos principiava a falar quando Pádua Severo destacando-se do grupo
vem colocando-se em sua frente(...) dirigindo-se sobre ele com um punhal e o fere em uma das
6
mãos (...)
O depoimento de Vitor requer atenção, porque mesmo que no campo do discurso,
aparece nele a noção de impessoalidade nas ações organizacionais do Estado.
Isso é
percebido quando o denunciante lamenta a utilização dos cargos públicos pelos denunciados
em benefício próprio, deixando bem claro a dicotomização entre público e privado: “É triste e
medonha a sociedade um exemplo de tanto cinismo: que um juiz tingindo de sangue a toga da
magistratura convertesse a sagrada missão de juiz um instrumento de infames e reprovadas
paixões.”7. Pode-se supor que se trata de um momento especifico, o de formação do Estadonação, de intromissão mais contundente da burocratização. Tal hipótese é levantada por Ivan
Vellasco ao analisar processos criminais na comarca do Rio das Mortes e encontrar várias
denúncias à utilização da máquina estatal em beneficio pessoal. A condenação desse tipo de
prática é no mínimo indicativo de que a afirmação que a sociedade oitocentista era guiada
pelo interesses pessoais de uma oligarquia “toda poderosa” e onipotente deve ser revista e
relativizada. Como afirma Vellasco:
6
7
Arquivo do Fórum de Oliveira, cx. PC 16, 1868
Arquivo do Fórum de Oliveira, cx. PC 16, 1868
ISBN: 978-85-88532-29-8 – Clio Edições – 2008
3
“Os sinais desse embate podem ser percebidos por toda a parte na documentação da época.
Vejam-se as críticas às formas de “patronato” e suas diversas manifestações constantemente
presente nos jornais, correspondências de autoridades e toda a documentação referente às
lutas políticas da época; se o clientelismo era a “ideologia” e o sentido unívoco das práticas
sociais por que aparece com tanta freqüência como o “odioso patronato” a interferir na
esfera do Estado de modo inaceitável?.”8
Duas outras questões nesse processo crime corroboram tal hipótese, sendo o réu
Benedito Marques da Silva juiz municipal da cidade Oliveira, o processo é encaminhado ao
primeiro juiz suplente, Antônio José de Castro, que o encaminha ao segundo juiz suplente,
João José Pinheiro. O primeiro juiz suplente foi citado por todas as testemunhas apresentadas
por Benedito Marques da Silva, como por exemplo o Major José Antônio Teixeira : “...Ao
segundo respondeu que viu ele justificante
(Benedito Marques da Silva) dirigir-se
acompanhado de Antônio Augusto Pinto Coelho a casa de Antônio José de Castro,
demorando-se ali pouco tempo e voltando para a casa dele testemunha...”9. Sendo assim,
Antônio José de Castro estava, mesmo que indiretamente, ligado ao processo, provavelmente,
por isso recusou ser o juiz do caso. Mesmo que essa escolha não necessariamente indique uma
“honestidade” guiada pela crença na impessoalização e na burocratização, abre-se um campo
para a percepção de um cálculo que seria inexistente em uma sociedade patriarcal e familista
como foi apontada por Sérgio Buarque de Holanda. A outra questão, que entra nesse mesmo
sentido, é o fato de um promotor público pedir afastamento do caso por ser advogado de uma
das partes envolvidas.
Tais ações citadas anteriormente mostram que os atores teriam de prestar contas a
outras instâncias, não sendo guiados simplesmente por suas vontades e paixões. Não
necessariamente na prática esse processo era efetivado, mas a preocupação com a “defesa” do
poder público, mostra que os homens de prestígio e com acesso a máquina estatal, teriam de
dialogar com outra realidade diferente da do seu círculo de influências. Aqui pode-se pensar a
nova forma como os agentes devem se relacionar no campo das disputas de poder e quais são
suas expectativas em relação as práticas institucionais, já que o Estado entra como mediador
mais preciso e racional, não necessariamente inteiramente imparcial, e acaba por tornar, de
certa forma, incerto os resultados das disputas.
8
- VELLASCO, Ivan de Andrade. “Clientelismo, ordem privada e Estado no Brasil Oitocentista: a trajetória
sinuosa de um debate”. Seminário Internacional do CEO/Pronex Nação e Cidadania no Oitocentos. 2007. p 6.
Nota de rodapé.
9
- Arquivo do Fórum de Oliveira, cx. PC 16, 1868
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Estamos longe de afirmar que a sociedade oitocentista vivia sobe a égide da
burocracia, partilhamos da idéia de que a família era a base social, o que será mais a frente,
corroborado pela análise das fontes, no entanto, a verificação empírica acaba poder derrubar a
idéia clássica de grandes senhores de terra, mandando e desmandando sem prestar contas a
nenhuma ordem legal. Nas palavras de Vellasco:
“No período colonial a “economia do dom” possibilitou uma relação de complementaridade
entre poderes locais e centrais, privados e de Estado, numa lógica de realimentação
recíproca de ambos, a partir das primeiras décadas do Oitocentos a intensificação do
domínio dos poderes do Estado e da lógica diferencial que o sustenta e legitima teria feito
com que as instituições tivessem que se haver com uma “economia moral” referente a
expectativas de grupos sociais mais amplos atentos a determinados aspectos do exercício do
poder e que depositavam esperanças crescentes em sua lógica e fundamento”10
Voltando ao processo, o ministério liberal havia caído, com isso, a organização
político-administrativa da cidade, encontrava-se em transição, o que provavelmente acentuou
a rivalidade entre o grupo liberal e o conservador, que pela repercussão do evento político
ocorrido na corte, se mostra diretamente ligada a ela. Sendo assim, podemos concluir, com
certo grau de precisão, que a elite provincial, também se sente parte das pautas de seus
respectivos partidos na corte, não sendo simplesmente rudes barões isolados em seus
potentados. Elaboram suas estratégias e (re)fazem suas alianças constantemente, num
processo dinâmico, que concede a política provincial, seu próprio modo de “fazer” política.
Uma prova desse processo é encontrado entre dois rivais desse processo, Pedro Justiniano das
Chagas e Augusto Pinto Coelho que, dezenove anos mais tarde, as vésperas da república,
ambos aparecem no jornal Gazeta de Minas, apoiando o mesmo presidente de província.
Usando as palavras de João Fragoso11 “tenho a impressão de que está no momento de se
descobrir que também a casa-grande , os sobrados das diversas ruas Direita e os palacetes
eram povoados por pessoas – não só por brutamontes – que sonhavam e realizavam
estratégias de vida.”
Através da leitura do processo e da tentativa de mapeamento dos participantes,
concluímos que os mesmos e seus aliados, constituem a elite da cidade, visto que possuem os
principais cargos públicos, possuidores de elevado prestigio social na época. Isso é reforçado
10
- VELLASCO, Ivan de Andrade. “Clientelismo, ordem privada e Estado no Brasil Oitocentista: a trajetória
sinuosa de um debate”. Seminário Internacional do CEO/Pronex Nação e Cidadania no Oitocentos. 2007. p 13.
11
- Introdução do livro MARTINS, M. F. V. A velha arte de governar:um estudo sobre política e elites a partir
do Conselho de Estado (1842-1889). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2007.
ISBN: 978-85-88532-29-8 – Clio Edições – 2008
5
quando vinte anos após processo, é possível identificar através da leitura do jornal oliveirense
gazeta de minas, a continuidade da importância social de alguns deles.
Algo importante de se ressaltar, é que essa briga relatada inicialmente, não é um fato
isolado, já que algumas testemunhas afirmam que alguns dos participantes são inimigos
mortais, narrando algumas querelas anteriores. Somando se a isso encontrei um documento
em que grande parte desses homens aparecem novamente brigando, dessa vez pelo
espancamento e morte de um escravo de Pedro Justiniano das Chagas, participante este dos
dois processos e o único o qual tive acesso a uma série de documentos. Pedro Justiniano das
Chagas no primeiro documento faz parte do grupo liberal e é declaradamente “inimigo
mortal” de Benedito Marques da Silva, o juiz municipal acusado de ser o mandante do crime.
Nesse mesmo processo, dois de seus irmãos por parte de pai, Francisco Justiniano das Chagas
e Joaquim das Chagas Andrade, o segundo é também seu cunhado, aparecem como
testemunhas, apoiando o grupo de Pedro Justiniano.
Entramos aqui em um assunto já citado, a importância da família na sociedade
oitocentista. Tanto no processo da queda do ministério liberal, como no da morte do escravo,
o qual será narrado mais a frente, familiares de Pedro Justiniano das Chagas são mobilizados,
principalmente no segundo, no qual ele é o réu. Através da leitura de inventários da família,
encontrei dívidas e sociedades entre os familiares nas quais Pedro Justiniano faz parte de
algumas. Encontrei também casamentos endogâmicos, estamos, assim, diante de um exemplo
clássico de elaboração de estratégias tendo como base a família, no caso retratado, uma
família extremamente importante na cidade, visto que possuem cargos importantes, como
deputado, comendador, presidente da câmera. A família Justiniano das Chagas até certo ponto
é fechada em si mesmo, o que era corrente no período, como tentativa de perpetuar seus
privilégios e reforçar seus laços de solidariedade, tal afirmação é confirmada através das já
citadas dívidas e sociedades, bem como os casamentos endogâmicos
Retornando ao processo da queda do ministério liberal. Depois de ser feito o auto de
corpo de delito e ser constatado a agressão, o delegado Mizael Ribeiro da Silva Castro, que
estava na reunião do grupo conservador, emitiu um auto de culpa no qual intimava Raymundo
e Benedito a ficarem detidos na delegacia. Ambos rasgaram a intimação, desacatando a ação
do delegado, que na hierarquia estatal estava abaixo do juiz municipal. Aqui percebe-se que
ambos tinham total confiança na absolvição.
Uma hipótese que me ocorreu no inicio da leitura, foi confirmada com o fim do
processo, os três acusados teriam o mesmo destino, ou seriam todos absolvidos ou todos
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condenados, já que Benedito Marques da Silva, sendo juiz municipal e tendo grande
possibilidade de mobilizar testemunhas e apoio político, era a peça definidora do processo.
Isso é confirmado pelo depoimento das testemunhas reunidas pelo mesmo, as seis se quer
fazem referência a Raymundo Nonato Coutinho e apenas duas citam Severo, apenas para
afirmarem que o mesmo não esteve em companhia de Benedito Marques da Silva no dia do
ocorrido. Uma outra questão que pode ser abordada aqui é a natureza política do processo,
visto que Pádua Severo quase que é esquecido pelas testemunhas, ficando claro a intenção do
grupo conservador de responsabilizar diretamente seus inimigos políticos Benedito Marques
da Silva e Raymundo Nonato Coutinho.
Benedito Marques da Silva recorreu à acusação ao seu primeiro suplente, levantando
um suposto descrédito de duas das sete testemunhas, justamente as que faziam referência
direta a sua pessoa. O argumento utilizado foi que essas duas testemunhas eram dependentes
de outros; Policarpo de Pedro Justiniano das Chagas (seu inimigo mortal) e Feliciano de José
das Chagas Andrade.
Foram mobilizados por Benedito Marques da Silva algumas testemunhas de relevante
posição social, o vigário José Theodoro Brasilino, que encabeçou o movimento para tornar
Oliveira comarca em 1868, o major José Antônio Teixeira, vereador mais votado de 1860 que
renunciou, por motivos desconhecidos, a presidência da câmara, o escrivão de órfãos Antônio
Augusto Pinto Coelho e o escrivão de coletoria Martinho das Chagas, entre outros.
A sentença final foi dada a favor dos três réus, alegando o juiz municipal segundo
suplente, João José Pinheiro, não existir provas reais contra os denunciados e existir
contradições entre as testemunhas. João José Pinheiro elenca alguns motivos para
desclassificar a acusação contra os três réus.
Primeiramente por apenas a terceira e a quarta testemunha (Policarpo e Feliciano
Borges) acusarem diretamente Benedito Marques da Silva e por as mesmas serem
dependentes de outros, não sendo livres para participação efetiva da cidadania, argumento
esse, central do liberalismo clássico. O argumento de desclassificação das testemunhas não é
coerente com o processo criminal do império, que afirma serem destituídos do direito de
testemunhar apenas os escravos, não fazendo referência a outros subordinados. O depoimento
de inimigos dos réus também é aceito o que reforça a improcedência dessa justificativa que
desqualifica o depoimento das testemunhas já citadas. Também afirma que ficou provado a
embriaguez de Feliciano Borges, como questionado na justificativa de Benedito Marques da
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Silva, no entanto, Pádua Severo também é citado como ébrio no dia do crime por João Batista
de Moura, uma das próprias testemunhas de Benedito Marques da Silva.
O juiz afirma que apenas duas testemunhas acusaram diretamente Benedito Marques,
no entanto, Francisco Justiniano das Chagas, a quinta testemunha, mesmo que não o acuse
diretamente, faz referência ao mesmo, contrariando a afirmação central das testemunhas de
defesa de Benedito Marques, que afirmam que o mesmo não esteve com Pádua Severo no dia
do crime:
“estando na ponta da dita casa diferenciou um grupo junto a torre da Matriz esse cujo grupo
se achava Pádua Severo tanto que dissera a alguns amigos que aqueles homens possivelmente
vinham provocar, e depois disto montando a cavalo e passando pertinho desse lugar
reconheceu o Doutor Benedito Marques da Silva Acunha Filho ali”12.
Ainda em relação a tal depoimento, Francisco Justiniano das Chagas afirmou que em
uma outra ocasião, Aurélio Gonçalves Diniz queixou-se a Benedito Marques da Silva das
ofensas feitas por Pádua Severo, no entanto nada foi feito pelo juiz municipal e no mesmo
momento, Pádua Severo retirou Aurélio Diniz a força da casa de Benedito Marques da Silva,
retratando assim uma possível relação de dependência, “camaradagem” entre os acusados. O
depoimento de Herculano Rodrigues e Joaquim das Chagas corroboram tal hipótese, já que
ambos afirmam que Benedito Marques da Silva e Antônio Pádua Severo são amigos e que
constantemente são vistos juntos, até mesmo depois da soltura de Severo
Feliciano Ferreira Borges, a quarta testemunha, também faz referência às ameaças e
ofensas feitas por Pádua Severo a Aurélio Gonçalves Diniz e diz ter como testemunha Carlos
Justiniano das Chagas e Joaquim das Chagas. Tal depoimento é de suma importância, já que
resume a acusação inicial:
pela casa de doutor Acunha Filho vir ao mesmo com Pádua Severo junto a porta de sua casa ,
existindo outras pessoas dentro entre os quais João Batista de Moura e que nesta ocasião ele
testemunha ouviu o Doutor Benedito dizer a Pádua Severo que fosse ao grupo espancar ao
Doutor Aurélio , e espancasse a gente do grupo, e que se possível for matasse o Doutor
Aurélio que chegando a casa de Pedro Justiniano de onde voltou pouco depois para o lugar
da reunião em casa de Mizael Ribeiro, que ali chegando ouviu o Doutor Aurélio dar vivas ao
partido Conservador, que em seguida vio Pádua Severo atirar-se sobre o Doutor Aurélio com
um punhal (...) neste mesmo ato viu Raymundo Nonato, armado de um pau dar uma porretada
no Doutor Aurélio13
Outra questão levantada é o fato de que o grupo para o qual dirigiu-se Severo para
agredir Aurélio Diniz era muito grande, o que colocaria o réu em grande desvantagem, sendo
assim, é improvável o mesmo ter acatado o possível pedido de Benedito Marques da Silva.
12
13
- Arquivo do Fórum de Oliveira, cx. PC 16, 1868
- Arquivo do Fórum de Oliveira, cx. PC 16, 1868
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Ainda em relação a Pádua Severo, o juiz afirma ser contraditório o papel atribuído pelas
testemunhas ao mesmo no crime, no entanto não explica ou explicita tal contradição.
Em relação a Raymundo Nonato Coutinho, o juiz afirma que a segunda, a terceira, a
quinta e a sexta testemunha depõe contra o mesmo apenas por terem ouvido falar e não viram
de fato a suposta agressão física cometida pelo mesmo e a sétima testemunha nada disse.
Assim apenas a primeira e a quarta de fato o acusam, no entanto, lendo as testemunhas,
percebe-se uma incoerência no julgamento, pois a sexta testemunha, Herculano Rodrigues
Alves, afirma que viu “Raymundo Nonato armado com um pau que (...) não achava no grupo
dizendo a Severo na frente da cadeia que entrasse, pois que ele era o promotor público14”.
Assim, Raymundo Nonato teria deixado claro que Pádua Severo seria solto, já que teria
proteção do cargo de promotor. O que tal testemunha acusou por ouvir falar, foi apenas em
relação a agressão. E sobre as acusações que foram aceitas, ironicamente, o juiz afirma:
o fato ocorreu em noite cerrada, os circunstantes apanharão-se em (...) dos lutadores, fazendo
grande burburinho, como sempre acontece, quando em numerosa reunião da se sucesso de tal
índole, no entanto as duas últimas testemunhas lograrão conservar pelo sangue frio, podendo
descortinar em meio de tamanha confusão o braço de Raymundo desfechando (...) sobre o Dr
Aurélio!.. 15
Aqui faz-se necessário deixar o leitor a parte das dificuldades que a documentação
ofereceu, já que algumas folhas estão coladas, impossibilitando assim a leitura de três das sete
testemunhas de acusação, bem como outras partes do processo
A briga entre liberais e conservadores e a provável manipulação da justiça por
Benedito Marques da Silva, elucida uma questão recorrente na historiografia brasileira, o
clientelismo, conceituado como troca de favores, utilizando-se do Estado em beneficio
próprio. O termo clientelismo é usado muito generalizadamente como aponta José Murilo de
Carvalho16 e o caso aqui relatado mostra tal generalidade, pois a utilização do Estado não foi
em prol de um familismo amoral17 , não foi diretamente o beneficiamento de uma oligarquia
visando o enriquecimento ou aumento de prestígio como normalmente se classifica as redes
clientelares, mas sim tendo como pano de fundo o embate entre projetos, as tensões e as
organizações partidárias, a briga se da na arena política.
14
- Arquivo do Fórum de Oliveira, cx. PC 16, 1868
- Arquivo do Fórum de Oliveira, cx. PC 16, 1868
16
- CARVALHO, José Murilo. Mandonismo, coronelismo e clientelismo: uma discussão conceitual. in Dados,
Rio de Janeiro, vol. 40, n.2, 1997.
17
- HOLANDA, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil. 5ª edição. Rio de Janeiro, Livraria José Olimpio Livraria,
1956
15
ISBN: 978-85-88532-29-8 – Clio Edições – 2008
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Uma questão peculiar ao processo é que ele ocorre em um período de duas transições
administrativas. Em 1868 havia caído o ministério liberal, conseqüentemente, os poderes
locais também tendiam a mudar, já que nesse período a centralização estava consolidada.
Assim, teoricamente a entrada dos conservadores na corte, era também a entrada dos
conservadores nas províncias, em cargos como delegados, promotores, juízes, subdelegados,
presidente de província e etc. A outra transição se dá no âmbito de jurisdição. Nesse mesmo
ano Oliveira pertenceu a três comarcas diferentes, o que gerou de certa forma, um reajuste e
um reordenamento dos poderes locais, acirrando, assim, as disputas entre os grupos.
Agora se faz necessário a análise do processo crime referente a morte do escravo
André, que teria sido espancado por sua dona, Joana de Moura, tendo como cúmplice seu
marido, Pedro Justiniano das Chagas. As testemunhas de defesa alegam que o escravo há
tempos sofria de problemas no fígado e que a morte não teria sido decorrente de castigos
sofridos pelo mesmo. Pedro Justiniano requer corpo de delito para provar que a morte não foi
decorrente de maus tratos executados por sua mulher. O corpo de delito não se encontra
anexado ao documento
Uma questão importante do processo é a preocupação em relação ao escravo falecido
demonstrada por parte de um grupo de homens que pela posição social, provavelmente,
também possuíam escravos e que pela lógica do escravismo, também, possivelmente, os
castigava. Assim, fica claro que os depoimentos desses homens tem a intenção de prejudicar
Pedro Justiniano das Chagas. Essa evidência se tornou ainda mais clara quando conferi os
nomes desses depoentes e encontrei três deles envolvidos na briga da queda do ministério
liberal, o que confirma a existência de uma disputa de poder entre esses dois grupos. Tais
envolvidos eram Raymundo Nonato, Antônio Pinto Coelho e João Batista Moura. Vale
lembrar que Benedito Marques da Silva, o pivô do outro processo, é juiz municipal, por tanto
julga o processo contra Pedro Justiniano das Chagas. Uma outra informação relevante, é que o
delegado de polícia, Antônio José de Castro, que recebeu a denúncia anônima sobre a morte
do escravo, também participou do processo já analisado.
Temos como hipótese que toda a cidade acompanhava e participava dessa divisão,
visto que os cargos ocupados pelos participantes desses grupos possuíam eram extremamente
importantes, provavelmente servindo de coerção e como frutífero campo de alianças para
homens menos favorecidos. Isso se confirma através do depoimento de duas testemunhas,
Américo Brasiliense e Joaquim Gonçalves dos Santos Chaves que quando são reperguntados,
mudam completamente a versão, sendo peças chave para a condenação de Pedro Justiniano
ISBN: 978-85-88532-29-8 – Clio Edições – 2008
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das Chagas e sua mulher. Primeiro depoimento de Joaquim Gonçalves dos Santos Chaves,
que fez sangria no escravo André: “ respondeu que ouviu dizer que o escravo André de que
se trata, foi castigado ou mandado castigar por seus senhor ou senhora ( os grifos são
nossos)”. Segundo depoimento: “ esfoladuras no pescoço, do lado esquerdo, do membro
esquerdo até o meio do braço, no braço direito descendo até meio palmo, todos longos e
extensos (...) sendo o instrumento de tanto a que lhe parece chicote”18. Primeiro depoimento
de Américo Brasiliense: “ respondeu que sabe por ser voz pública que quem perpetuou o
assassinato de André foram seus senhores (os grifos são nossos)”19. Segundo depoimento de
Américo Brasiliense:
respondeu que encontrou-o assentado (o escravo) no portão, fundo do quintal do Tenente
Coronel José Ferreira de Carvalho; que ele apresentava esfoladuras partindo estas do
pescoço parte esquerda até(...) tendendo-se para adiante e para trás, e igual proporção sem
poder dizer qual a gravidade; que ele lhe dissera que fora castigado por seus senhores. 20
Perguntamo-nos, porque omitiram no primeiro depoimento o que verdadeiramente
sabiam?. Possivelmente pela coerção exercida pelo grupo conservador. Américo Brasiliense
era empregado público, e naquele momento, Francisco Justiniano das Chagas, irmão de Pedro
Justiniano, era o presidente da câmara. Através da leitura do inventário de Joaquim Gonçalves
dos Santos Chaves, encontrei dividas com dois dos aliados de Pedro Justiniano, o tenente Pio
e José Ferreira de Carvalho, o que mostra que ambos são homens que estavam ligados aos
ambos o grupos, evitando ao máximo prejudicar qualquer que seja o lado.
Quase todos os depoimentos giram em torno do empregado público Américo
Brasiliense, já que os depoentes souberam do caso através do mesmo em uma reunião na casa
do negociante português Antônio da Silva Campos.
No segundo depoimento de Américo Brasilense, ele diz que o escravo lhe pediu
apadrinhamento e que recomendou que o mesmo fosse a casa do Doutor Antônio Justiniano
das Chagas, irmão de Pedro Justiniano das Chagas, o que mostra mais uma vez a tentativa de
neutralidade por parte de Américo Brasiliense. Em seu depoimento, Doutor Antônio
Justiniano das Chagas disse que conhece o escravo desde quando pertencia ao seu pai e que
sempre sofreu de problemas de saúde. Aqui a mobilização da família é extremamente
importante, outros dois parentes de Pedro Justiniano depõe ao seu favor. Seu tio-cunhado,
José das Chagas Andrade, disse que o escravo sempre foi doente do fígado e que não viu
18
- Arquivo do Fórum de Oliveira, cx. PC 16, 1868
- Arquivo do Fórum de Oliveira, cx. PC 16, 1868
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- Arquivo do Fórum de Oliveira, cx. PC 16, 1868
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nenhum indício de espancamento. João das Chagas, seu tio, disse que não observou
escoriações e que o escravo havia lhe contado que por não agüentar carregar um saco de arroz
que sua Senhora havia pedido, resolveu fugir e ao pular o muro, caiu no chão, agravando seu
problema de fígado.
Francisca, natural da África, escrava de Raymundo Nonato, disse em seu depoimento
que quando foi à casa de Pedro Justiniano das Chagas vender leite, ouviu André sendo
espancado, afirmou também que sua morte foi ocasionada pelos maus tratos. Depois de ouvir
os gritos, foi até João Batista Moura, que se declara inimigo de Pedro Justiniano das Chagas,
pedir apadrinhamento para André.
Pedro Justiniano das Chagas e sua mulher Joana Martinha Moura Chagas foram
considerados culpados pelo Juiz municipal Benedito Marques da Silva.
Percebe-se, assim, a configuração de dois grupos importantes na cidade de Oliveira,
que usam desde a morte de um escravo até a queda do ministério como motivos para recriar as
disputas de poder. Através da luta entre esses dois grupos da elite local, percebe-se que os
grupos dominantes têm de negociar e se adaptar as novas estruturas institucionais da
administração centralizadora. A máquina administrativa em processo de consolidação é
utilizada como meio de resolução dos conflitos emanados da luta partidária.
Através da leitura das correspondências da guarda nacional de Oliveira, encontramos a
informação de que a cidade foi reduto da revolta liberal de 42, sendo assim, podemos concluir
que a briga entre liberais e conservadores é de longa data:
“Partindo de Tamanduá com cento e vinte praças (...) que formaram o total de cento e
quarenta e seis, não entrando os dignos oficiais, no dia 20 do corrente; cheguei nesta vila de
oliveira a 21 do mesmo; a colocar o Dr Juiz de Direito desta Comarca do Rio das Mortes,
afim de restabelecer nesta vila o regime da lei, e as autoridades constituídas que tinham sido
desalojadas de seus postos pelos facciosos que tinham ocupado”
No depoimento acima, dado por um oficial da guarda, percebemos que o movimento
liberal foi significativo na cidade, sendo preciso o envio de mais de cem homens para conter
os “rebeldes intrusos”. Dos homens que faziam parte dos processos já analisados, encontrei
referência apenas a um deles na revolta de 42, José Ferreira de Caravalho, que era Juiz
municipal no período do movimento liberal e foi expulso do cargo pelos conservadores. José
Ferreira de Carvalho mudaria de lado mais tarde, aparecendo nos processos estudados como
conservador em 1868. Outra questão que pode ser levantada é em relação a punição dos
revoltosos, já que mesmo sendo expulso do cargo de juiz e da guarda nacional pelo próprio
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presidente da província, José Ferreira de Carvalho não viveu um ostracismo político, já que
ocupou a presidência da Câmara de 1845 a 1848 e de 1853 a 1857.
Voltando aos processos analisados inicialmente, fica evidente também a mobilização
da família Justiniano das Chagas em ambos os processos, todos em torno da figura de Pedro
Justiniano das Chagas que no primeiro documento é acusado de ser cúmplice do assassinato
do escravo e, no segundo, faz parte do grupo conservador e se declara inimigo mortal do réu
Benedito Marques da Silva.21
Percebemos também a mobilização de diversas camadas sociais nos processos,
participando desde escravos, passando por fiandeiras, ferreiros e parteiras, até juizes e
vereadores. Pode-se pensar aqui a complexidade das relações de poder, que não se baseavam
simplesmente em dicotomias sociais como por exemplo homens livres X escravos. Havia
negociação entre as mais diversas camadas, não havendo um domínio sem restrições por parte
da elite.
Conclusões:
As elites provinciais possuíam sua própria dinâmica e seus próprios modos de “fazer”
política, não sendo mero reflexo das decisões tomadas na corte. No entanto, a adesão ao
partido Conservador ou Liberal, não era meramente uma expressão de querelas locais, já que
a briga estudada se iniciou com a queda do ministério liberal, o que mostra uma ligação direta
entre a política de corte e a política provincial.
A análise da brigas locais demonstra o choque entre redes de influência e questiona o
modelo historiográfico clássico de grandes potentados, chefiados por homens que usam do
estado meramente como instrumento de dominação e perpetuação de privilégios. Ao escolher
a justiça como campo para resolução dos seus conflitos, essa elite tem de aceitar certas regras
referentes ao campo judiciário e prestar contas a outras instâncias, tendo que dialogar com
outra realidade diferente da do seu círculo de influências, não sendo guiada simplesmente por
suas vontades e paixões.
21
- Sobre as redes de sociabilidade e parentesco ver MARTINS, M. F. V. A velha arte de governar:um estudo
sobre política e elites a partir do Conselho de Estado (1842-1889). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2007.
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Essa elite tem a família como base das relações sociais e como fundamento das
decisões e estratégias, fato esse que não impede o reconhecimento da lógica burocrática e da
impessoalização nas instituições estatais. Isso fica claro na condenação feita por algumas
testemunhas, em um dos processos, ao uso do cargo público em benefício próprio.
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Manchando a toga de sangue: a disputa pelo poder em Oliveira 1868