Apelação Cível n. 2011.048910-7, de São Joaquim
Relatora: Desa. Maria do Rocio Luz Santa Ritta
INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. PEDIDO DE EXUMAÇÃO
DO CORPO PARA REALIZAÇÃO DE NOVO EXAME DE DNA.
PRECLUSÃO. ADEMAIS, PROVA DESNECESSÁRIA EM FACE DE
TODO
O
APURADO
NA
INSTRUÇÃO
PROCESSUAL.
PATERNIDADE CORRETAMENTE RECONHECIDA. SENTENÇA
MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.
2011.048910-7, da comarca de São Joaquim (2ª Vara), em que é apelante E. de V. G.
K., e apelado V. G. de L.:
A Terceira Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, conhecer do
recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.
O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des.
Marcus Túlio Sartorato, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Saul Steil.
Florianópolis, 22 de novembro de 2011.
Maria do Rocio Luz Santa Ritta
RELATORA
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação cível interposta por Espólio de V. G. K., contra
sentença que, em ação de investigação de paternidade, desfechou a lide nos seguintes
termos:
Ante o exposto, julgo PROCEDENTE o pedido formulado na inicial para o fim de
declarar a paternidade de Vanderson Gonçalves Küster em relação ao requerente
Vinicius Guanabara de Liz, que passa a se chamar Vinicius Guanabara de Liz Küster,
sendo avós paternos Edson Luiz Küster e Araci de Fátima Gonçalves Küster [...].
O apelante pretende a reforma da sentença, pugnando pela exumação do
corpo de V. G. K. a fim de realizar-se novo exame de DNA, pois, segundo alega, a
investigação contida nos presentes autos é totalmente inconclusiva.
O defensor do infante apresentou contrarrazões (fls. 138-141), nas quais
arguiu a preclusão da prova pretendida e defendeu a manutenção da sentença proferida.
A PGJ, em parecer da lavra do Dr. Tycho Brahe Fernandes (fls. 147/150),
opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso, vindo os autos conclusos.
VOTO
O recorrente requer a produção de contra prova, qual seja, a exumação do
corpo para verificação de compatibilidade do DNA do falecido com o infante.
O pedido não pode ser acolhido em face da preclusão, pois o momento
oportuno para tal ocorreu na contestação - quando deveria arrolar testemunhas, juntar
documentos e enumerar as provas que pretendia produzir, conforme dispõe o artigo 300
do Código de Processo Civil - o que não fez.
Veja-se:
Art. 300. Compete ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa,
expondo as razões de fato e de direito, com que impugna o pedido do autor e
especificando as provas que pretende produzir. (grifou-se)
O apelante não manifestou em nenhum momento o interesse de realizar
contra prova, mesmo quando fora intimado da juntada do referido exame aos autos.
Entretanto, ainda que o fizesse, não há nos autos fato que justifique sua necessidade: a
prova pericial e testemunhal são convergentes; o réu não trouxe fatos modificativos e/ou
extintivos do direito do menor ou ainda qualquer indício capaz de pôr em cheque a
presunção de fidelidade e lealdade da genitora ao falecido, bem como, da filiação do
representado.
Para evitar tautologia, transcrevo o bem lançado parecer da
Procuradoria-Geral de Justiça, da boa lavra do Dr. Tycho Brahe Fernandes, que
emprego como razões de decidir:
[...] Dito isso, entendo que sem razão o apelante.
Isso porque a prova dos autos é mais do que suficiente para estabelecer a
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paternidade do falecido em relação ao autor-apelado.
Pelo que se apurou nos autos, a mãe do autor-apelado e o indigitado pai viviam
em união estável, sendo que a gravidez iniciou-se nessa situação fática, porém, antes
do nascimento do menor, o pai veio a falecer.
A justificar a união estável tem-se nos autos a existência de prole anterior da mãe
e do pai (fl. 7), o fato de a representante legal do autor ter sido reconhecida
como beneficiária do Seguro DPVAT (fl. 27), do Benefício Previdenciário de
Pensão por Morte (fl. 103) e, ainda, perante o PIS/PASEP/FGTS (fl. 104).
Tem-se ainda a justificar a união estável e, por via de consequência, a paternidade
investigada, os depoimentos colhidos em audiência (fls. 119-120 e CD anexo).
As testemunhas Nadir de Oliveira Costa, Cláudia Regina Oliveira e Izalete
Mesquita Pereira confirmam a existência da união estável quando do falecimento do
indigitado pai e a ciência desse da gravidez que levou ao nascimento do autor.
Interessante notar que a testemunha Nadir asseverou que no sábado anterior à
morte do indigitado pai, os parentes e amigos fizeram um mutirão para a construção da
casa em que iriam morar a mãe do autor e o indigitado pai, vez que até então moravam
na casa de familiares, sendo que Vanderson não queria que Joseane carregasse peso
em razão do seu estado gravídico.
Assim, tenho comigo que as provas são seguras a conduzir para a procedência do
pedido.
É bem verdade que o exame de DNA concluiu que "não é possível afirmar
conclusivamente que FERNANDO GONÇALVES KUSTER é tio biológico paterno de
VINICIUS GUANABARA DE LIZ, cuja mãe biológica é JOSEANE GUANABARA DE LIZ
(fl. 97)."
Contudo, não pode passar despercebido que do referido exame se extrai:
"VINICIUS GUANABARA DE LIZ E FERNANDO GONÇALVES KUSTER
apresentam o mesmo haplótipo Y (considerando os 17 loci avaliados, YFiler), que por
ser raro não apresentou nenhuma ocorrência no banco de dados (Frequência inferior a
0,03%).
A presença de um mesmo haplótipo Y é um forte indicador da relação de
parentesco pela linhagem masculina entre os envolvidos, o que corrobora
fortemente com a relação de parentesco proposta. Porém, como todos os indivíduos
de uma mesma linhagem paterna compartilham o mesmo haplótipo Y, não é
possível descartar a hipótese de que o pai biológico seja outro indivíduo da
mesma linhagem paterna" (fl. 97) (grifou-se)
A realização de um novo exame de DNA, desta feita com a exumação do cadáver
do falecido pai é um despropósito.
Primeiro, porque a prova dos autos autoriza o reconhecimento da paternidade, a
qual não foi excluída pela prova pericial já realizada.
Segundo, porque o custo do novo exame, a ser arcado, novamente pelo Estado,
pode ser utilizado em outros processos, com mais proveito, uma vez que no restrito
universo investigado no exame de DNA realizado (tio paterno, filho e mãe), já se atingiu
"um forte indicador da relação de parentesco pela linhagem masculina entre os
envolvidos" (fl. 97)
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Terceiro, não se pode perder de vista que o agora apelante foi regularmente
intimado da juntada do exame de DNA (fl. 100), nada tendo requerido naquela
oportunidade (fl. 106)
Por fim, estivéssemos nós um pouco mais evoluídos em termos legislativos, a
presunção de paternidade de que trata o artigo 1.597, II, do CC seria extensiva aos
casos de união estável.
Mesmo reconhecendo a ausência de previsão legal para tal fim, trago à colação,
acerca do tema, a lição de Maria Berenice Dias (in Manual de direito das famílias. 7. Ed.
Rev., atual. E ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. P. 353):
'De forma absolutamente injustificada a lei não estende a presunção de
paternidade à união estável. Tal leva boa parte da doutrina a afirmar que a presunção
pater est só existe no casamento. Talvez por isso não seja imposto o dever de fidelidade
aos conviventes, somente o dever de lealdade (CC 1.724). A diferenciação é de todo
desarrazoada. Se a presunção é de relacionamento sexual durante o casamento, esta
mesma presunção existe na união estável. Cabe um exemplo. Falecendo o genitor
durante a gravidez, ou antes de ter registrado o filho, esse terá ele intentar ação
declaratória de paternidade. A ação será proposta pelo filho representado pela mãe e
no polo passivo vai figurar sua mãe, na condição de representante do espólio. A saída é
nomear um curador ao autor para iniciar uma demanda que pode levar anos. Enquanto
isso, o filho fica sem identidade. Claro que a melhor solução é admitir a presunção de
filiação. Assim, ainda que a referência legal seja à 'constância do casamento', a
presunção de filiação, de paternidade e de maternidade aplica-se à união estável'.
A corroborar o entendimento defendido no presente parecer encontra-se, mudando
o que tem que ser mudado, a Apelação Cível n. 2007.025034-5, de Concórdia, de que
foi relator o Des. Henry Petry Junior, de cuja ementa se extrai:
'[...]
PRELIMINAR. EXAME DE DNA. CONVERSÃO DO JULGAMENTO EM
DILIGÊNCIA. DESNECESSIDADE. MÉTODO INDIRETO: NÚMERO DE
HERDEIROS QUE NÃO PERMITE GRAU RAZOÁVEL DE CERTEZA. MÉTODO
DIRETO: SUPOSTO PAI MORTO EM 1979. APARENTE IMPOSSIBILIDADE DE
REALIZAÇÃO DO EXAME A PARTIR DA EXUMAÇÃO. PARTE QUE DESISTIU
DA PRODUÇÃO DA PROVA NO MOMENTO ADEQUADO. PREFACIAL
AFASTADA.
10. A eficácia do DNA, no método indireto, está jungido à quantidade de parentes
vivos do falecido: o grau de certeza é maior quanto maior for o número de
parentes. Permanecendo vivos, apenas, uma filha e um neto, a perícia se revela
desnecessária diante do seu inexpressivo grau de confiabilidade.
11. Falecido o pseudo-pai em novembro de 1979, ou seja, há quase trinta anos,
cabia ao interessado na exumação (método direto) demonstrar a possibilidade
concreta de sua realização.
12. Ademais, o robusto cenário probatório (prova oral e documental) permite, sem
perícia, que se alcance a questão de fundo com segurança. Além disso, o próprio
réu desistiu da prova pericial após seu requerimento e deferimento pelo
magistrado, não havendo razão para retardamento do processo com a formulação
Gabinete Desa. Maria do Rocio Luz Santa Ritta
de novo pedido, agora em sede recursal. [...]'
[...]
Diante de todo o exposto, mantém-se incólume a decisão proferida pelo
juiz singular.
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Ap.Cív.2011.048910-7 TJRS Reconhecida a presunção da filiação