“Breves Considerações Com Relação à Aplicação do Estatuto do Idoso” 1.
Ilan Goldberg, Eduardo Chalfin e Clara Vainboim 2
Muito se tem discutido quanto ao Estatuto do Idoso – Lei 10.741, de 1º de Outubro de 2.003 –
vigente desde 1º de Janeiro de 2.004.
Reconhece-se que este Diploma Legal conferiu aos idosos importantes prerrogativas em nosso
país, sendo nítido o seu cunho social.
O dispositivo inserto no art. 15, § 3º (“É vedada a discriminação do idoso nos planos de
saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade”), por sua vez, vem
despertando o início de acirrados debates nos nossos tribunais, porquanto este assenta vedação
às operadoras e seguradoras que atuam no ramo saúde de reajustarem os valores de suas
mensalidades / prêmios, tendo como fundamento a alteração das faixas etárias de seus
associados / segurados.
Discute-se, também, em virtude do cunho social de que se reveste este Diploma Legal, quanto
à possibilidade de se aplicá-lo a contratos celebrados antes de sua promulgação, ao argumento
de que este tratar-se-ia de norma de ordem pública.
De início, convém aplaudir a iniciativa legislativa que culminou com a promulgação da ‘Lei
do Idoso’. Sem dúvidas, já era tempo de nosso
no país converter as preocupações com a
terceira idade em Lei, o que veio a ocorrer neste momento. Já era tempo de velar pelos
direitos da classe que, por toda uma vida, trabalhou em benefício de toda a sociedade e que,
muitas vezes, encontrava-se marginalizada em momentos nos quais mais precisava da
assistência estatal.
Os aspectos técnicos que envolvem a discussão apresentada neste breve ensaio referem-se,
primeiramente, a algumas características inerentes ao contrato de seguro, e, em segundo lugar,
à interpretação de questões relacionadas ao Direito Intertemporal, o que, em linguagem clara,
significa discutir-se quanto à possibilidade de se aplicar este novo Diploma Legal a contratos
celebrados em momentos anteriores à sua promulgação.
Com relação ao contrato de seguro, é de conhecimento geral que a fixação dos prêmios pagos
pelos segurados não é realizada sem critérios. Muito pelo contrário, ao se determinar que A
deverá arcar com o pagamento de X a título de prêmio, e que B deverá arcar com o
pagamento de 2X, encontram-se por trás destes cálculos notas técnicas atuariais aprovadas
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Este artigo foi publicado nos Jornais Gazeta Mercantil e Valor Econômico em 06.04.2003.
Ilan Goldberg, Eduardo Chalfin e Clara Vainboim são advogados, sócios de Chalfin, Goldberg & Vainboim
Advogados – [email protected]
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pela ANS - Agência Nacional de Saúde Suplemen tar, responsável pela regulação do mercado
de saúde no país.
Raciocinando sobre os riscos relacionados ao perfil dos segurados, tem-se como certo que
para pessoas idosas, estaticamente consegue-se comprovar que estas representam custos
maiores às empresas que atuam no ramo de saúde. Para se chegar a esta conclusão,
necessariamente observa-se o comportamento de um grupo de indivíduos, de maneira que
eventuais oscilações isoladas não representem alterações nos cálculos finais.
Por outro lado, sem que com isto se esteja fazendo uma afirmação preconceituosa ou
discriminatória, o que seria vedado segundo o que dispõe o pré-falado art. 15, § 3º da ‘Lei do
Idoso’, fato é que os riscos decorrentes do at
endimento à classe idosa são mais elevados do
que os relacionados às classes jovens. Trata-se de questão de estatística, não de preconceito.
Nesta linha de raciocínio, ao determinada empresa que opera no ramo de assistência privada à
saúde reajustar o valor do prêmio para determinado segurado que adentra faixa etária cujo
risco é de teor mais elevado, deve-se ter em vista que esta em presa não se porta desta forma
com o fito de discriminar o seu cliente. O que se deseja enfatizar é que a promoção do reajuste
torna-se necessária como a única forma de tornar possível a saudável gestão da carteira de
segurados dentro da qual encontra-se esta pessoa idosa.
Convém lembrar, neste momento, que, a rigor,
a responsabilidade pelo oferecimento de
assistência à saúde da população é da União Federal, segundo o que dispõe a Constituição
Federal. Sendo, também, de conhecimento público que o ‘SUS’ não guarda condições de
atender à população, somente lhe resta recorrer à iniciativa privada, que por tratar de serviço
essencial, sofre forte regulação do Estado.
Neste momento, indaga-se se esta regulação deve chegar ao ponto de inviabilizar a atividade
destas empresas. Não se pretende levar estas razões a um contexto de dramaticidade, mas
apenas demonstrar que o universo pelo qual tramitam estas empresas não é tão tranqüilo
quanto se possa imaginar.
Têm-se tomado conhecimento a respeito de decisões judiciais que, simplesmente, impedem a
promoção de quaisquer reajustes tendo como fundamento a alteração das faixas etárias, ao
argumento de que as cláusulas contratuais que autorizem os reajustes seriam nulas, à luz do
que dispõe o Código de Proteção do Consumidor. Por mais “pró-consumidor” que se possa
ser, não se pode enxergar a realidade de forma ofuscada, reiterando-se os argumentos antes
apresentados, quanto à necessidade de que se promova o reajuste dos prêmios / mensalidades,
sob pena de que as empresas operadoras / seguradoras não mais possam operar de maneira
saudável, o que poderá apresentar, em última instância, conseqüência desagradável,
relacionada à diminuição gradual dos serviços prestados a hoje cerca de 40 milhões de
brasileiros, contratantes dos serviços prestados por estas empresas.
Por fim, têm-se apresentado decisões judiciais reconhecendo a aplicabilidade imediata da ‘Lei
do Idoso’ a contratos celebrados antes de sua vigência, ao argumento de que este Diploma
Legal teria caráter social – norma de ordem pública, restando, portanto, autorizada a sua
pronta aplicação.
Discorda-se deste entendimento. Partindo do que restou decidido pelo Supremo Tribunal
Federal, após o julgamento da ADIN 493-0/DF, entendeu-se que, independentemente do
caráter público ou privado de que pudesse se revestir determinada legislação, esta não poderia
aplicar-se a relações contratuais iniciadas antes de sua promulgação, sob pena de restar
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violado o princípio do ato jurídico perfeito, previsto no art. 5º, inc. XXXVI da Constituição
Federal.
Diante destes elementos, formula-se conclusão no sentido de que as empresas que operam no
segmento de saúde realmente carecem de que seja possível reajustar os valores dos prêmios /
mensalidades cobradas, tendo como base a alteração das faixas etárias de seus consumidores,
sob pena, mais à frente, toda a sociedade vir a enfrentar as conseqüências decorrentes dos
impedimentos que vêm sendo a estas impostos.
No que toca à imediata aplicação da ‘Lei do Idoso’ a contratos celebrados antes de sua
promulgação, o entendimento do STF à matéria representou verdadeira pá de cal, no sentido
de que se deve respeitar as relações pretéritas, aplicando-se, por conseguinte, a legislação que
vigia à época na qual estas foram celebradas.
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