16 - 17 - 18 - 19.pdf 1 04/04/2012 10:49:01 Paulo A. C. Kawasaki O novo homem do café no Governo Com a experiência vivida em 6 anos de trabalho na diretoria agrícola, onde criou as Cédulas de Produto Rural (CPR’s), – além de nove anos como diretor geral da bolsa de físicos na BM&FBovespa, Edilson Alcântara assumiu a diretoria do Departamento do Café do MAPA com o objetivo de estruturar uma política plurianual e desenvolver ações estratégicas de promoção e marketing para os Cafés do Brasil. Confira, abaixo, entrevista exclusiva da Revista do Café com o novo responsável pela cafeicultura no governo federal. Revista do Café – O senhor assumiu o cargo em dezembro e já realizou alguns encontros com o setor privado. Qual análise faz da atual conjuntura do agronegócio café no Brasil? C M Y 16 Edilson Alcântara – A conjuntura do café é favorável, com alguns fatores que podem, de uma forma não estrutural, mas momentânea, preocupar alguns agentes do mercado. Contudo, de todas as cadeias produtivas que conheço, o café é a que tem a melhor estrutura para ser administrada. RC – Qual sua impressão sobre o setor de produção? CM MY CY CMY Alcântara – Nota-se que a produção vem evoluindo de forma sustentável ao longo dos últimos, pelo menos, cinco anos, o que revela uma maturidade do produtor no que diz respeito a ter consciência sobre produzir bem. K RC – Os industriais de café do Brasil vivem uma nova realidade a respeito da tributação desde o dia 1º de janeiro... Alcântara – No caso dos industriais, enxergamos uma postura um pouco melhor depois que foi aprovada a Instrução Normativa nº 1.233 da Receita Federal do Brasil, referente à contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins. Essa, talvez, foi a medida mais acertada do governo, porque traz, tanto para a indústria de torrefação, quanto à de solúvel, um benefício, um bônus de 7,4% na compra do café verde e o produtor poderá vender diretamente às indústrias. RC – O setor exportador reflete as variedades de café que o Brasil oferece ao mundo. Como o senhor analisa isso? Alcântara – Tenho uma experiência muito grande de relacionamento com os exportadores e vejo maturidade na relação entre o exportador, o trader e o produtor, porque, se de um lado a produção vem oferecendo melhores condições de produto, do outro temos o comprador final, que exige dele um maior cuidado na aquisição do café. Já notamos iniciativas de grandes exportadores com produtores para buscar a certificação da sustentabilidade. Acho que estamos num caminho muito positivo para construir essa parceria, a qual chamo, principalmente para a produção, de inclusão de mercado. RC – É possível que todos sejam incluídos nesse mercado? Alcântara – Temos produtores, hoje, no Brasil, que estão em patamares melhores, mas temos muito produtores que estão abaixo dessa linha de qualidade e produtividade. Portanto, o nosso objetivo, aqui no Dcaf, é construir um modelo, juntamente com a Embrapa e todas as instituições que são agregadas ao CDPC para colocar, ou tentar colocar, quase todos os produtores nessa mesma “plataforma café”. RC – Como fazer isso? Alcântara – Desenvolvendo tecnologia e a aplicando na produção. E, exatamente nesse momento do processo, (o governo) ajudar na certificação 16 - 17 - 18 - 19.pdf 2 04/04/2012 10:49:03 da sustentabilidade, que nós vamos buscar, por enquanto, no degrau mínimo, para que haja um menor investimento, mas que coloque o produtor dentro do mercado. Essa preocupação existe porque, amanhã, quando todo mundo estiver comprando somente certificado, o cafeicultor que não estiver nesse patamar, automaticamente estará excluído. E a nossa intenção é incluí-lo. RC – A coordenação desse processo caberia a quem? Alcântara – À Embrapa. Ela coordenaria esse papel do governo de estimular o produtor a buscar a certificação de sustentabilidade. RC – Essa nivelação dos produtores seria realizada através de um trabalho de pesquisa e transferência de tecnologia? C M Alcântara – Não. Em verdade, pelo menos nos últimos seis anos, temos investido bastante em tecnologia. Porém, por deficiência da estrutura financeira ou de financiamento da própria Embrapa Café, essa pesquisa foi para a prateleira. Mas não adianta incentivarmos pesquisa alguma para ficar na biblioteca. Ela tem que ficar na casa do produtor, dentro da fazenda. Esse é o grande diferencial que temos que construir. O maior orgulho para o pesquisador é conseguir aplicar e ver a aplicabilidade daquele trabalho que desenvolveu. Y CM MY CY CMY K RC – Como evitar que os trabalhos de pesquisa vão à biblioteca? Alcântara – Em função de recursos, estávamos tolhidos por essa iniciativa. Agora, queremos que essa aplicabilidade da tecnologia venha em forma de uma espécie de consultoria. Acho que a agricultura brasileira perdeu muito quando deixamos de investir na extensão rural. Falo em aproveitar todo o investimento que fizemos em tecnologia, fazer o repasse da tecnologia para ser aplicada e, nesse momento, instruir o produtor para buscar a certificação. RC – Pode-se afirmar que estamos diante da iminente criação de uma “certificação Brasil” para nossos cafés? Alcântara – Existem vários certificadores no mundo e acho que não é a hora, nesse primeiro momento, de pensarmos em uma certificação em nível de Brasil, porque isso implicará mais recursos a serem investidos e mais preocupação, porque certificar não é simplesmente ir lá, olhar e certificar. Tem que ter acompanhamento e todo um processo de fiscalização, e entendo que o governo, hoje, ainda não está preparado. Então, nesse primeiro instante, o caminho seria focar nas várias certificações no setor privado. Há também a experiência do Certifica Minas Café, que está sendo um exemplo, mas isso é uma experiência que o produtor precisa de apoio para se adequar à certificação. O lado bom é que, vindo ao encontro desse nosso pensamento, existe uma tendência, no CDPC, de se aprovar uma verba específica para apoiar o produtor a se adequar no processo de certificação. RC – Não sendo a intenção criar uma certificação em nível de Brasil, nesse momento, como o produtor usaria esse recurso para se adequar aos processos de certificação? Alcântara – Existem vários níveis de certificação. A intenção inicial é trabalhar com o nível mínimo, objetivando colocar a plataforma cafeeira dentro da inclusão de mercado. Como a gente imagina que deva ser? O consultor ou aquele que estiver trabalhando com a parte de certificação, receberá toda a orientação da Embrapa sobre o processo. A partir daí, essa consultoria ou esse agente certificador fará um projeto para que possa se credenciar junto ao Banco do Brasil ou a outra instituição financeira que integra o programa para, enfim, solicitar o financiamento. Certamente esse será um investimento que “dará um gás”, com prazo adequado para que os envolvidos possam pagar e se adequar. Acredito que um projeto de adequação é algo que sempre deva existir no âmbito da área rural. A intenção, de fato, é o governo, o Funcafé, sinalizar que estamos apoiando essa inclusão de mercado. RC – O CDPC retomou suas atividades após quase três anos. Como o citado amadurecimento da cadeia café pode contribuir? Alcântara – O grande vácuo que notei, em relação ao café, é que, no Ministério, todas as cadeias produtivas têm um assento ou uma câmara setorial. Reúnem-se duas, três, quatro vezes ao ano e discutem uma estratégia, a partir da qual governo e Ministério adotam políticas para atender aos setores que estão aqui. Quando assumimos a diretoria do Dcaf, o CDPC completaria três anos sem se reunir. Surgiram diversas explicações e uma das maiores foi que não existia um ambiente técnico racional para se discutir a cafeicultura. Fomos buscar o consenso de todos os participantes, lembrando que não iríamos discutir o passado, mas sim buscar uma agenda positiva para o futuro do café. RC – A criação de um plano plurianual para a cafeicultura brasileira seria a plataforma estruturadora dessa união? Alcântara – Não há porque separarmos os temas relacionados a café. Precisamos alargar um pouco mais a nossa visão e sentimos a pré-disposição de todos para fazer esse planejamento. No dia 29 (de fevereiro), na reunião dos Comitês Diretores de Planejamento Estratégico e de Promoção e Marketing do CDPC, saímos 17 16 - 17 - 18 - 19.pdf 3 04/04/2012 10:49:08 com a determinação de planejar, de pensar o futuro do café, estabelecendo um raio-x atual sobre como estão produção, exportação, beneficiamento, tecnologia, marketing, enfim, estabeleceremos um retrato do que é a cafeicultura hoje e vamos projetar. Sabemos que o mercado consumidor cresce de 2,5% a 3% ao ano e precisamos estimular o consumo do produto. Tendo como base esse crescimento, e, na condição de principal indutor da produção no mundo, temos que nos preparar para atender nossos mercados interno e externo. Portanto, temos que pensar como estaremos em 2013 e o que precisamos fazer para 2014 e 2015. RC – Porque um plano plurianual projetado até 2015? Alcântara – Temos um ciclo do governo até 2015 e, com base nessa projeção para as outras culturas é que vamos planejar o plano plurianual para a cafeicultura. Apesar de ser este nosso objetivo, nada impede que o setor pense em 2016, 2018 ou um programa de ação até 2020, por exemplo. RC – Em relação a esse planejamento e à oferta que devemos gerar para manter ou ampliar o market share, alguns especialistas dizem que a “máscara da Colômbia caiu”. Isso é fato? C M Y CM MY CY CMY K 18 Alcântara – Tudo tem um interesse econômico. Acho indevido colocar que a máscara da Colômbia caiu, já que estava no lugar que estava porque investiu muito em marketing e foi eficiente na promoção do produto dela. E o Brasil nunca teve essa preocupação. Temos a marca Cafés do Brasil e precisamos investir nessa marca, vender a qualidade do café brasileiro associado a essa marca e mostrar que somos um café de qualidade. RC – De que forma o senhor pretende estruturar essa ação de promoção e marketing dos Cafés do Brasil? Alcântara – Tenho que valorizar o produtor brasileiro, que já está numa linha de frente, pois não há comparação se analisarmos a produtividade da cafeicultura brasileira com qualquer outra. O que temos que vender é a qualidade do café nacional. E, por meio do Funcafé, devemos investir em promoção externa e interna. RC – O Brasil sediará três eventos de porte mundial nos próximos anos. Quais ações a serem desenvolvidas na Copa das Confederações, na Copa do Mundo e nas Olimpíadas? Alcântara – Mesmo um pouco atrasados, com certeza aproveitaremos a Copa das Confederações, a do Mundo e os jogos Olímpicos para promovermos da melhor forma o nosso café. Em 2013, também teremos a Jornada Mundial da Juventude, que acontecerá no Rio de Janeiro. E, nesse sentido, entendo que precisamos colocar o jovem bebendo um pouco mais de café. Esses são eventos que nos permitem pensar, não em nível de governo, mas do setor café como um todo, em um planejamento sobre como evoluir com essa marca. RC – O senhor foi o criador das CPR’s, um dos principais instrumentos de comercialização de café... Alcântara – Quando comecei na área rural do BB, vindo do marketing, fui com a responsabilidade de gerenciar as CPR’s. Fizemos um de parceria muito forte com a BM&F, tanto que, com o lançamento da CPR de café, e por esta ser o colateral perfeito do mercado futuro, as operações envolvendo futuros no Brasil expandiram de forma extraordinária. Para tanto, tivemos que entrar na cultura do produtor, entender como se comporta e tentar mudar a cabeça dele. Dizer: “oh, você planta hoje e quando vai vender todos estão vendendo, então vamos vender agora, ter lucro e, depois, teremos melhores possibilidades”. Fizemos essa mudança de mentalidade ao longo de seis anos, até que a BM&F me convidou para criar uma bolsa de físicos. Fui diretor geral dessa bolsa durante nove anos, o que me permitiu entender mais do agronegócio, e não só do café, porque trabalhávamos com trigo, arroz, feijão, sorgo, soja, boi gordo e outros produtos.