www.industriaeambiente.pt ENTREVISTA Fernando Leite INVESTIGAÇÃO Tratamento de Águas Residuais Domésticas em Leitos de Macrófitas REFLEXÃO O homem inesgotável OPINIÃO por João Levy Resíduos o lixo é um luxo número 80 maio/junho 2013 publicação bimestral 6.50 € ISSN 1645-1783 9 771645 178003 FICHA TÉCNICA Número 80 | MAIO/JUNHO 2013 Diretor António Guerreiro de Brito [email protected] Diretora Executiva Carla Santos Silva [email protected] Conselho Editorial Alexandre Cancela d’Abreu, Ana Malheiro, António Gonçalves Henriques, António Joyce, Carlos Alberto Alves, Carlos Pedro Ferreira, Isabel Rosmaninho, Luís Fonseca, Luís Rochartre, Pedro Santos e Rui Rodrigues 2 Redação Cátia Vilaça [email protected] Marketing e Publicidade Vera Oliveira Tel. 225 899 625 [email protected] ISSN 1645-1783 Depósito Legal 165 277/01 Tiragem 3000 exemplares Os artigos assinados são da exclusiva responsabilidade dos seus autores. A Indústria e Ambiente adotou na sua redação o novo acordo ortográfico. A Indústria e Ambiente é impressa em papel proveniente de florestas com Certificação da Gestão Florestal Responsável. Capa © Creative Loafing / Tampa Bay A Indústria e Ambiente é o membro português da European Environmental Press Revista Oficial Entrevista | Fernando Leite 24 Dossier “Resíduos” Gestão de Resíduos Sólidos como Recursos – mário russo Os desafios da privatização da EGF no futuro da gestão de resíduos em Portugal – joão pedro rodrigues Os desafios dos SMAUT e as novas metas de reciclagem de embalagens – paulo praça O papel da ERSAR na Regulação do Setor dos Resíduos Urbanos em Portugal - Avaliação da Qualidade do Serviço – filomena lobo A política de gestão de resíduos no Brasil: Desafios e oportunidades de negócio – walter plácido teixeira junior Novas licenças de gestão de resíduos de embalagem 26 Reflexão O Homem inesgotável – rui moreira de carvalho 22 29 SUMÁRIO Publicação Periódica Registo no ICS n.o 117 075 6 18 Assinaturas Tel. 225 899 625 | Fax 225 899 629 [email protected] Propriedade e Administração PUBLINDÚSTRIA, Produção de Comunicação, Lda. Praça da Corujeira, 38 – Apartado 3825 4300-144 Porto – Portugal www.publindustria.pt | [email protected] O Setor dos Resíduos em Portugal: desafios e a oportunidade quase única, por Luís Marinheiro 16 Design avawise Redação e Edição Engenho e Média, Lda. Grupo Publindústria Tel. 225 899 625 | Fax 225 899 629 www.engenhoemedia.pt 4 10 14 Editor António Malheiro Editorial, por António Guerreiro de Brito Lixo Investigação Tratamento de Águas Residuais Domésticas em Leitos de Macrófitas – sandra francisco pascoal e helena pala d. sousa 35 36 37 38 39 Notícias Água Alterações Climáticas e Conservação da Natureza Resíduos Energia Gestão e Economia 42 Tecnologia 44 Produtos e Tecnologias 46 Estante 47 Crimes e Contraordenações Ambientais ”Armazenagem” e ”recolha” de resíduos para transporte são conceitos diferentes – isabel rocha 48 Pessoas e Empresas 50 Eventos 51 Vozes Ativas Indique, com base na sua experiência, qual o país/região que considera mais interessante e o menos interessante para a internacionalização das empresas portuguesas do setor do Ambiente e as respetivas razões (eleja apenas um para cada caso e o principal motivo). – maria joão martins, pedro araújo e nuno lopes Nortada De pernas para o AR – carlos pedro ferreira 52 Opinião, por João Levy PRÓXIMA EDIÇÃO DOSSIER › Ar: Qualidade e Tratamento INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 1 editorial © Augusto de Campos – 1965 António Guerreiro de Brito, Diretor [email protected] Augusto de Campos, autor brasileiro contemporâneo integrado no movimento “poesia concreta”, escreveu um poema em que a palavra-chave é luxo. A substituição do fonema u pelo i concretiza, visualmente, a palavra lixo e, considerando que lixo é um substantivo e luxo um adjetivo, podemos entender que “o lixo é um luxo” (blogaleradocoracao.blogspot.pt). Há uma estranha dimensão no lixo, ou nos resíduos, como nós o apelidamos, que as sociedades humanas produzem. Com efeito, os números podem variar de ano para ano mas poderemos reter a sua ordem de grandeza: entre trinta e cinco a quarenta mil toneladas por dia, esse é o montante de resíduos produzidos em Portugal. É um valor importante, mas mais é se o extrapolarmos para a escala mundial, onde então impressiona o facto de ser muito superior a mil milhões de toneladas por dia. Certamente por isso, na proposta de plano nacional de gestão de resíduos 2011-2020, defende-se uma visão moderna de gestão de resíduos integrada no ciclo de vida do produto, centrada numa economia circular e na garantia de eficiência na utilização dos recursos naturais. Como indicador da assimilação da política de resíduos em Portugal pela economia real, o plano estabeleceu metas para a preparação para reutilização e reciclagem de resíduos, 55% em 2016 e 70% em 2020 (a partir de 42% em 2009). A definição destes valores tem subjacente uma trajetória de convergência com os países que apresentam níveis mais elevados de valorização de resíduos na Europa. Estaremos a conseguir palmilhar esse ambicioso desafio? Em parte, mas não pode ser apenas um bom desejo. Teremos mesmo que o fazer e o problema não se resume à quantidade pois, ainda que ela impressione, a questão é também a tipologia de resíduos. Temos estado concentrados na prioridade de melhorar os sistemas convencionais de valorização de resíduos, mas queremos ir mais além: reequacionar os ciclos de vida dos materiais que são recursos escassos no sentido de tornar, um dia, todos os produtos reutilizáveis. Importa também recordar que o problema é mais vasto que o elemento tecnológico. A questão social ligada à gestão dos resíduos é igualmente determinante. Parece que há uma telenovela brasileira de sucesso que decorre num “lixão”, ou seja, numa zona onde coabitam lixo e pessoas, situação da qual resulta o aproveitamento e reciclagem dos resíduos. Contudo, por enquanto, parece que vivemos no lixão Planeta Terra. Essa é a verdade ao retermos os números da deposição final de resíduos sem aproveitamento. Hoje, muito locais ainda estão contaminados, ainda não existem tecnologias facilmente disponíveis para reciclar todos os resíduos, ainda não acertamos com perspetiva de sub-produto e, sem dúvida, a segurança das infraestruturas de transporte e processamento poderia ser melhor. Por exemplo, o transporte transfronteiriço de resíduos e a respetiva disposição final, algures, em especial no caso dos equipamentos elétricos e eletrónicos, tem originado problemas sociais e ambientais lentamente catastróficos. 2 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 “ As taxas de recuperação multimaterial subiram bastante e muitas indústrias fizeram esforços significativos para prevenir a poluição e a toxicidade das rejeições Mas sejamos otimistas. Nos últimos 20 anos fizemos um enorme progresso na gestão de resíduos, especialmente evidente nas cidades. Reduzimos descargas não controladas, acabámos com lixeiras e fizemos aterros seguros. Encaminhámos muitos resíduos perigosos para processamento e procurámos encontrar soluções para alguns passivos ambientais, procurando salvaguardar a saúde pública. As taxas de recuperação multimaterial subiram bastante e muitas indústrias fizeram esforços significativos para prevenir a poluição e a toxicidade das rejeições. Assim sendo, como serão os próximos anos? Por aquilo que temos conseguido realizar, acredito que assentarão numa maior capacidade de reutilização de materiais e no sentido estratégico de uma produção de baixo carbono. editorial O Setor dos Resíduos em Portugal: desafios e a oportunidade quase única Luís Marinheiro Eng.º do Ambiente (U. Aveiro) Em Portugal, o setor dos resíduos é um setor económico importante e que vive um momento decisivo para a sua sustentabilidade e desenvolvimento num futuro próximo. Em 2012 foram produzidos em Portugal Continental 4,5 milhões de toneladas de resíduos urbanos (RU), o que representa um decréscimo de cerca de 8% face ao ano de 2011. Para esta circunstância concorre a recessão económica que se regista no país, com a consequente alteração dos padrões de consumo, e, de forma mais ténue, a adoção de políticas assentes nos princípios da prevenção da produção de resíduos. A redução da produção de resíduos urbanos é um sinal positivo mas a preocupação com a problemática da gestão de resíduos é uma realidade que se agrava à medida que se aproximam as datas para o cumprimento das metas comunitárias a que o País se obriga. O cumprimento da meta de desvio de resíduos biodegradáveis de aterro e o aumento da reciclagem são os principais desafios para o período 2014-2020. No estado atual, para a meta de desvio de resíduos biodegradáveis de aterro continua a subsistir a incógnita sobre a eficácia da opção tomada e centrada na construção e operação de unidades de tratamento mecânico-biológico. A incógnita prolonga-se a jusante com a qualidade e a capacidade de escoamento de produtos como os materiais recicláveis recuperados nas etapas de tratamento mecânico e o composto, principalmente o produzido a partir de resíduos urbanos provenientes da recolha indiferenciada. Acresce ainda como evoluir para a melhor valorização de refugos e rejeitados e dos combustíveis derivados de resíduos produzidos a partir de materiais oriundos daquelas unidades. “ esta será uma oportunidade que se antevê como quase única nos próximos tempos para o auxílio da realização de importantes investimentos Relativamente ao aumento da reciclagem, esta terá que ser seriamente promovida no sentido de se evoluir de forma objetiva e de se garantir, em 2020, uma taxa de 50 % na preparação para reutilização e reciclagem dos resíduos urbanos. Note-se, por exemplo, que em 2012, cerca de 20% dos resíduos urbanos confinados em aterros sanitários em Portugal Continental eram resíduos de embalagem. A este cenário acresce que os recursos financeiros disponíveis ao abrigo do Quadro Estratégico Comum, que integra os fundos estruturais da União Europeia para o período de 2014-2020, que possam ser alocados ao setor serão certamente escassos e, por conseguinte, terão de ser usados de forma criteriosa. E esta será uma oportunidade que se antevê como quase única nos próximos tempos para o auxílio da realização de importantes investimentos, como por exemplo na otimização das linhas de processo e na ampliação de unidades existentes e no apoio ao tecido industrial nacional na área da reciclagem. Neste contexto, o futuro do setor implicará necessariamente a procura de sinergias tendentes à partilha de infraestruturas entre os sistemas de gestão de resíduos, ao aumento da recolha seletiva, à construção de novas unidades de tratamento mecânico para a recuperação de materiais recicláveis, à potenciação da indústria recicladora em território nacional e ao reforço da capacidade de valorização energética, sendo que nesta última parcela a ampliação das centrais de valorização energética por incineração da VALORSUL e da LIPOR deverá ser inequivocamente uma prioridade. O país confronta-se com um problema sério a resolver e, neste sentido, é aguardada com alguma expectativa a nova estratégia para a gestão de resíduos urbanos e que será materializada através do PERSU 2020. 4 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 ENTREVISTA Fernando Leite O administrador delegado da Lipor fala das causas para o decréscimo da quantidade de resíduos para reciclagem e propõe medidas para combater essa diminuição. Refere também a importância do estabelecimento de sinergias nos sistemas de gestão de resíduos. Fernando Leite alerta também para a necessidade de as empresas que operam neste setor se focarem na recolha seletiva, ao invés da indiferenciada e descreve o mecanismo e condições de aplicação do sistema Pay-as-You-Throw. Entrevista e Fotografia por CÁTIA VILAÇA | Coordenação Técnica por António Guerreiro de Brito 6 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 ENTREVISTA Indústria e Ambiente (IA) – As mais recentes orientações estratégicas da União Europeia em matéria de gestão de resíduos, visam, entre outros objetivos, fomentar o crescimento da “sociedade para a reciclagem” e, nessa estratégia, a recolha seletiva multimaterial tem um papel importante. Qual a importância dessa orientação nos panoramas atual e futuro de gestão de resíduos em Portugal? Fernando Leite (FL) – Essa orientação comunitária é muito importante porque sendo importante para a União Europeia, sê-lo-á, com toda a certeza, para Portugal. O problema é que ao contrário do que se está a verificar na Europa, onde se está a enfatizar muito a questão da reciclagem multimaterial e o estabelecimento de recolha seletiva, em Portugal tem-se notado que há um abrandamento ou uma não focalização no domínio do reforço da reciclagem multimaterial a partir de recolhas seletivas. IA – A LIPOR integra uma série de organizações internacionais e tem participado ativamente em fóruns de reflexão sobre a gestão de resíduos urbanos. Que projetos e casos práticos pode mencionar como mais relevantes em termos de recolha seletiva multimaterial na Europa? FL – Nós efetivamente fazemos parte da Associação das Cidades e Regiões para a Reciclagem, que agrega cerca de 100 cidades e regiões na Europa, e aquilo que estamos sistematicamente a verificar é a tentativa de desenvolvimento de cada vez mais soluções de reciclagem, volto a dizer, muito fundadas em recolhas seletivas. Ou seja, já se diminuíram os projetos de implantação de ecopontos, porque isso já está muito disseminado na Europa. No entanto, chegou-se à conclusão, provavelmente, que nós precisamos de estar mais próximos dos cidadãos e, como tal, estamos neste momento a desenvolver variadíssimas iniciativas que têm a ver com recolha porta a porta. Eu acho que o sentido no qual a Europa está cada vez mais a caminhar é o de intensificar ainda mais a recolha seletiva porta a porta e em certa medida abandonar, ou pelo menos deixar sem grande desenvolvimento, as recolhas de proximidade. Portanto, essa é a tendência, e depois, associada a essa tendência, há esquemas de incentivo à separação de resíduos e à orientação para os tradicionais fluxos de materiais recicláveis, em detrimento sempre dos resíduos indiferenciados, cujo destino final é um problema. IA – Quais desses projetos considera desejável aplicar em Portugal? FL – Nós estamos a seguir muito uma experiência ou um conjunto de experiências (elas existem em toda a Europa, portanto há vários exemplos) que os nossos colegas de Barcelona estão a seguir, bem como os de Turim e Milão, que consiste no desenvolvimento progressivo de projetos de recolha porta a porta, muitos deles associados a estratégias de PAYT (Pay-As-You-Throw). Os resultados, em termos de recolhas e de material desviado para reciclagem multimaterial, são notoriamente significativos. Eu diria que se nós quisermos ter um padrão do que pode ser um projeto em Portugal, basta avaliar o projeto que o município da Maia está a desenvolver desde o último trimestre do ano passado. Verificamos que os valores de crescimento dos principais materiais são valores impressionantes, o que vem, em certa medida, dar cobertura a este pensamento, que é o de que se o cidadão tiver um ecoponto dentro de casa, obviamente não tem nenhuma desculpa para dizer que não recicla ou não separa. IA – Em Portugal tem-se assistido, nos dois últimos anos, a um decréscimo significativo da produção de resíduos urbanos. Considera que esta tendência se manterá no próximo período 2014-2020? FL – Há uma questão importante na qual temos de refletir. É preciso ver que nós ainda separamos poucos resíduos. Neste momento estamos a sofrer dois efeitos: o abaixamento do consumo das pessoas, que faz com que, globalmente, se estejam a produzir menos resíduos. Isto é muito interessante e muito importante porque nós temos de baixar o per capita da produção de resíduos mas ao mesmo também estamos a decrescer nos quantitativos de materiais para reciclagem, quando eles existem nos resíduos indiferenciados. Portanto aqui há que atender a esta questão. Nos próximos anos, se nada fizermos, a tendência vai ser continuar a descer por duas ou três razões muito evidentes: por um lado a baixa de consumo (seis, sete, oito por cento), portanto a quantidade de resíduos vai diminuir. Depois o fraco rendimento das pessoas faz com que elas sejam muito mais assertivas nos produtos que compram, e portanto vão evitar produtos que tenham muita embalagem, diminuindo-se o quantitativo de embalagens. Mas depois existe, nalguns materiais, um potencial de serem valorizados e portanto aparecem, devido à questão económica, os catadores, o que faz com que o material também seja desviado. Esses fenómenos todos conjugados levarão a pensar que, ou alteramos o sistema de recolha dos resíduos ou vamos continuar a perder resíduos na área da reciclagem multimaterial. É necessário alterar o padrão de recolha. Aquilo que podemos ver é que em termos globais Portugal está muito bem servido de infraestruturas para valorização de resíduos, só que nunca se olhou, provavelmente, com o devido cuidado, para a primeira parte do ciclo dos resíduos, que é a deposição e a recolha. Se nós não alterarmos a metodologia de deposição e de recolha vamos continuar a perder materiais para a reciclagem. IA – Que impactos tem esse decréscimo da produção de resíduos na sustentabilidade de operações de montante na cadeia processual, como é caso da operação de recolha seletiva? FL – Temos aqui um outro fenómeno que nos vai provavelmente acontecer: nós mantemos uma alta taxa de deposição em aterro porque temos resíduos indiferenciados, e portanto essa é uma realidade objetiva. O governo, seguindo também orientações e pensamentos comunitários para alterar esta posição vai, com toda a certeza, incrementar as taxas de gestão de resíduos, ou seja, os valores que se paga como “penalização” para depositar em aterro ou para tratar em centrais de valorização energética. A questão, nesse aspeto, é perversa, porque em vez de atuarmos na metodologia de deposição e de recolha estamos a utilizar um expediente financeiro que vai levar a que os resíduos, em vez de terem um caminho certo, para os atuais aterros, possam vir a fazer aumentar as deposições clandestinas incontroladas. Nós vamos regressar, se assim for, a um panorama de que já não tínhamos memória. Fizemos um trabalho excelente no domínio da erradicação das antigas lixeiras e de um momento para o outro podemos voltar “ o sentido no qual a Europa está cada vez mais a caminhar é o de intensificar ainda mais a recolha seletiva porta a porta INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 7 ENTREVISTA a ter esse fenómeno. O impacto vai ser significativo porque estamos a perder dinheiro e riqueza ao desviarmos para aterro materiais que podem ser valorizados de uma outra maneira. Numa altura em que o país não tem recursos deveríamos apostar numa tentativa de obter mais recursos. IA – Considera viável que, numa ótica de aproveitamento de sinergias, a recolha seletiva multimaterial possa ser uma operação partilhada entre sistemas confinantes de gestão de resíduos? FL – Sim, com toda a certeza. Eu acho também que uma das grandes experiências dos últimos anos foi que o facto de olharmos para os sistemas de gestão de resíduos de uma maneira muito estanque não permitiu efetivamente termos sinergias, e de um momento para o outro temos uma estrada que nos separa um município de outro, e de um lado temos um sistema e do outro lado, outro sistema. Isso para países pobres é dramático. Portugal não pode aspirar a ser um país rico, portanto eu acho que haverá muitas sinergias, embora também ache que ainda é preciso, em termos mentais, que os decisores tenham a capacidade de poder apostar nesse domínio, que é quebrarmos barreiras e começarmos a partilhar mais as nossas infraestruturas e os nossos sistemas de gestão de resíduos. Nós damos sempre como exemplo a CM Viana do Castelo, que está a mais de 50 quilómetros e que vem aqui à Lipor entregar os seus resíduos orgânicos para valorizar porque tem uma estratégia muito bem conseguida do ponto de vista ambiental. Eu louvo a Câmara porque, em vez de depositar esses resíduos em aterro, vem trazê-los a uma central que os valoriza e que a partir daí produz um produto (um fertilizante ou um composto para a agricultura) que serve para enriquecer as terras.. IA – Que papel pode ter futuramente o setor privado na cadeia de valor que envolve a recolha seletiva multimaterial de resíduos urbanos? FL – Eu diria que o setor privado tem um papel fundamentalíssimo porque começam a escassear as entidades públicas neste campo, portanto a nível da recolha, muitas autarquias já estão neste momento com os serviços concessionados a privados. Todo o trabalho que vai sendo feito é a partir de entidades de iniciativa privada. No futuro, o setor vai estar cada vez mais nas mãos da iniciativa privada. Oxalá o setor privado olhe com outros olhos para esta área dos resíduos. Sendo uma área 8 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 “ “ onde potencialmente pode haver uma grande criação de valor, ultimamente e com alguma preocupação nós temos visto que as empresas privadas não se estão a vocacionar para desenvolver sistemas de algum valor acrescentado, portanto estão a investir muito em sistemas de recolha de deposição coletiva, de recolha de resíduos indiferenciados, de canalização dos resíduos sanitários para aterro, e isso não cria, obviamente, valor. Estamos a falar de operações de muito baixo valor e portanto não é por aí que se vai aumentar a importância do setor em termos da economia nacional. IA – E há condições para esses investimentos? FL – As empresas têm de criar aquilo que é a tendência. Se nós olharmos para França, as grandes empresas que lá operam têm filiais em Portugal e se nós virmos, em França estão muito focados em operações de recolha seletiva, de exploração e de operação de ecocentros, tudo sistemas que levam a que as operações sejam mais valorizadas, portanto que haja maior canalização para reciclagem multimaterial e para valorização orgânica, ao contrário do que acontece em Portugal, onde se está a trabalhar a partir de resíduos indiferenciados. Isso é uma orientação que na maioria dos países estrangeiros está a ter uma inversão, ou seja, estão a começar a trabalhar tudo a partir de resíduos recolhidos seletivamente para aumentar a qualidade dos produtos finais que estamos a canalizar para a indústria. IA – Que importância tem, no seu entendimento, o mecanismo PAYT (Pay-As-You-Throw) na componente da recolha seletiva multimaterial e em que condições tal pode ser um sucesso ou, pelo contrário, um fracasso? FL – Eu diria que nós, quando avançamos para um projeto de PAYT (Pay-As-You-Throw) temos de definir a priori um conjunto de condições que são anteriores à ideia do PAYT. A filosofia do PAYT é incentivar quem tem boas práticas e penalizar quem tem más práticas. Subjacente a este conceito é forçoso pensar que soluções individuais de deposição de resíduos têm de ser a nossa principal preocupação. Nós temos que disponibilizar aos cidadãos as várias soluções para uma deposição diferenciada dos seus resíduos. Ou seja, se há condições nas habitações para ter um grupo de contentores diferentes para promovermos a deposição separativa dos resíduos, é o sistema mais fácil. Se estamos perante Fizemos um trabalho excelente no domínio da erradicação das antigas lixeiras e de um momento para o outro podemos voltar a ter esse fenómeno. Nós temos que disponibilizar aos cidadãos as várias soluções para uma deposição diferenciada dos seus resíduos. ENTREVISTA PERFIL Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia do Porto, Fernando Leite exerce, atualmente, funções de AdministradorDelegado na Lipor – Serviço Intermunicipalizado de Gestão de Resíduos do Grande Porto, entidade responsável pela gestão, valorização e tratamento dos resíduos urbanos de oito municípios: Espinho, Gondomar, Maia, Matosinhos, Porto, Póvoa de Varzim, Valongo e Vila do Conde. Todos os anos, a Lipor trata cerca de 500 mil toneladas de resíduos urbanos, produzidos por cerca de 1 milhão de habitantes. situações de habitação coletiva, nós temos que ter nos prédios algumas condições, como sejam a existência da casa do lixo, que nos permite colocar contentores coletivos mas de utilização apenas daquele prédio. Se mesmo assim não temos casa do lixo, nós temos de ter na via pública sistemas de deposição para acesso da população mas com um sistema de fecho que permita que quando eu vou ao equipamento ele lê quem é o utente que vai lá e portanto pode valorizar se ele leva material reciclado e pode penalizar se ele leva material indiferenciado. E portanto, a questão é: não pode implementar sistemas PAYT quem quer, pode implementar sistemas PAYT quem trabalha um conjunto de pré-condições. Na nossa opinião, e é o que temos defendido na Lipor, devemos intensificar cada vez mais os sistemas de deposição individual e separativa de resíduos, e os exemplos da Maia dizemnos que são esses que estão a ter um maior acrescento. A Maia neste momento já recicla 30 por cento dos seus resíduos, quando temos municípios na nossa área de influência que apenas separam 10 por cento dos seus resíduos. Se formos ver o que diferencia, é que enquanto um tem soluções individuais de deposição de resíduos, os outros têm sistemas de proximidade. Ao termos um sistema de deposição de resíduos de proximidade e de utilização liberal, qualquer cidadão de outro município pode passar por uma rua, abrir uma tampa e meter lá os resíduos. Isto é um princípio que não aproveita a ninguém porque podemos estar a receber resíduos de outros municípios, até resíduos perigosos, e é aquele município que está a ter um per capita de produção de resíduos artificial. O PAYT é muito importante para nós podermos incentivar e a utilização do sistema é muito importante porque, também em nosso entender, o incentivo que a publicidade ou a sensibilização ambiental promove funciona muito bem em alturas de fulgor económico. Quando nós não temos problemas económicos, começamos a dizer às pessoas que elas têm os seus problemas de trabalho resolvidos, de habitação resolvidos, de saúde resolvidos, portanto podemos fazer com que se apele à consciência ambiental. Em alturas de crise, as pessoas, passe a expressão, estão-se a “marimbar” para o ambiente porque as suas preocupações são o emprego, a saúde, a educação, todo um conjunto de outras áreas, e o ambiente será uma que aparece depois. Nós para incentivarmos as pessoas temos de ir pela outra via: temos de ir pela via do incentivo financeiro. A partir do momento em que o cidadão paga uma tarifa para a recolha dos resíduos, se aderir mais à reciclagem e menos à deposição indiferenciada recebe uma bonificação ou uma penalização. Só com o PAYT é que é possível fazer isso. Nós estamos a avançar para a implementação do sistema numa zona do município da Maia. Essa zona tem recolha seletiva porta a porta, tem soluções para todo o tipo de habitação, quer seja individual, quer seja habitação coletiva, quer tenha casa do lixo quer não tenha. Cada utente tem um cartão que lhe permite aceder ao sistema. Há uma base de dados em poder da empresa municipal. A partir do momento em que uma pessoa, podendo ir duas vezes depositar resíduos indiferenciados, vai apenas uma vez, ela tem um incentivo. Se ela cumulativamente aumentar a deposição de resíduos reciclados e diminuir os resíduos indiferenciados, tem uma bonificação. Ou seja, o sistema começa a ser muito automatizado e portanto no fim do mês uns cidadãos começam a pagar menos e outros a pagar mais. INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 9 dossier resíduos © Nino Barbieri Mário Russo Engº Civil, Mestre em Hidráulica e Doutor em Engenharia Civil Professor Coordenador do Instituto Superior Politécnico de Viana do Castelo [email protected] Gestão de Resíduos Sólidos como Recursos A produção de resíduos sólidos tem sido cada vez mais elevada em todos os países do mundo, como consequência do modelo de consumo estabelecido na atual sociedade. Mais de 4 mil milhões de toneladas todos os anos, sem considerar os quantitativos que o setor mineiro, da energia e das águas produzem, que elevaria a mais de 6,4 mil milhões de toneladas. Isto tem como consequência uma rápida depleção de recursos naturais, podendo levar à exaustão de vários recursos minerais em relativamente pouco tempo. No entanto, continuamos a desperdiçar esses recursos através da gestão ineficiente dos resíduos e a preocuparmo-nos apenas com o fim do petróleo. Com efeito, a perceção geral do público é que os resíduos sólidos são de fácil solução e algo muito simples. Depois de gerar os resíduos, camiões recolhem-nos e acabam-se os problemas. Na verdade é muito mais complexo e requer a participação de todos os atores envolvidos, dado haver interação e componentes de ordem social, económica, política, institucional e financeira, que importa equacionar/compatibilizar para uma solução com- 10 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 patível com os requisitos hoje considerados fundamentais na preservação ambiental e salvaguarda dos recursos naturais. Neste artigo são abordados os problemas dos resíduos, desde a geração às consequências da sua gestão, boa ou má. 1. O Problema A geração de resíduos começa com a mineração, para se obter a matéria-prima bruta, e em todos os passos da transformação desta matéria-prima até ser transformada em bens de consumo, continuam a ser produzidos resíduos. Aparentemente poderia ser simples o equacionamento dos resíduos sólidos, por um lado com a diminuição da utilização desta matéria-prima e, por outro, com o aumento da taxa de recuperação/reciclagem de produtos dos resíduos (Figura 1). No entanto, tais medidas seriam dificilmente aplicadas na nossa sociedade. Deste modo, a sociedade tecnológica tem de procurar novas formas de gerir os resíduos que produz, bem como procurar por locais adequados para os tratar e depositar. Ao contrário dos líquidos e dos gases, que se diluem no meio recetor, os sólidos permanecerão no local onde forem depositados, mesmo que venham a sofrer transformações físicas e bioquímicas, como veremos mais tarde. A Gestão de resíduos sólidos hoje em dia está associada ao controlo, produção, armazenamento, recolha, transferência e transporte, processamento, tratamento e destino final dos resíduos sólidos, de acordo com os melhores princípios de preservação da saúde pública, economia, engenharia, conservação dos recursos, estética e outros princípios ambientais. Deste modo, a gestão de resíduos envolve uma inter-relação entre aspetos administrativos, financeiros, legais, de planeamento e de engenharia, cujas soluções são interdisciplinares, envolvendo ciências e tecnologias provenientes da engenharia, economia, sociologia, geografia, planeamento regional, saúde pública, demografia, comunicações e conservação. 1.1. Consequências da má gestão dos resíduos Quando o homem não cuida dos resíduos que produz causa disfunções ambientais e sociais PUB. FIGURA 2.1 Diagrama do fluxo de geração dos resíduos sólidos na atualidade (Adap. Russo, 2012). Fluxo dos Materiais na atualidade Produtos / Materiais Resíduos Poluição Recicla Reuso Matéria-prima Design e Manufaturação Uso Recuperação de energia Fim de vida Repensar, Redesenhar, Reduzir, Reparar Prevenção de resíduos com consequências para a saúde pública e perda de recursos naturais e biodiversidade, como as Figuras 2 e 3 sugerem. Composto Recuperação ATERRO Deposição 1.2. Alguns números sobre a gestão de resíduos no mundo Hoje geram-se anualmente no mundo mais de 4 biliões de toneladas de resíduos de origem municipal, industrial e perigosos. Os resíduos municipais gerados são entre 1,6 e 2 biliões de toneladas. Destes, a maior parte são resíduos orgânicos putrescíveis, alimentos e restos de alimentos e resíduos verdes, cujo crescimento se estima ser de 44% até 2025 devido ao crescimento da população e do consumo. Representará um acréscimo da emissão de gases de efeito de estufa (GEE) de 8 a 10% relativamente à atualidade. Estima-se que a indústria dos resíduos valha anualmente 433 biliões de USD$. Cerca de 70% dos resíduos municipais são depositados em lixeiras ou em aterros sanitários, 11% são tratados por métodos térmicos em incinerações com produção de energia elétrica e os restantes 19% são reciclados ou tratados por tratamentos mecânico-biológico (TMB), que inclui a compostagem (ver Figura 4). Estima-se que cerca de 3,5 biliões de pessoas no mundo não tenham acesso a sistemas de gestão de resíduos, o que representa cerca de 52 % da população da Terra (dados de 2008) e inclui população sem recolha para fora das suas áreas de residência e menos ainda tratamento. O crescimento rápido da população sugere que o problema se agravará com a rápida urbanização das populações. Isto acontecerá igualmente em África. Esta situação, entre outras, acarreta a deposição de plásticos no oceano num volume de cerca de 7 milhões de toneladas por ano, que com o tempo se degradam em pequenas e mais tóxicas partículas de petropolímeros. Estes dados sugerem claramente o agravamento dos problemas de saúde pública FIGURA 2 Plásticos flutuam em rios e desembocam no mar. (fonte: Projeto FADE/BNDES, UFPE, Recife) (fonte: CNN.com/tecnhology November 16, 2007) FIGURA 3 Resíduos num rio no Amazonas dossier resíduos FIGURA 5 Evolução da população, produção de resíduos e custos de gestão 2002-2025. FIGURA 4 Destino dos resíduos no mundo (fonte: ISWA, 2012). TRATAMENTO DE RESÍDUOS NO MUNDO (2009) Reciclagem 19% WtE 11% Lixeiras e aterros 70% 2. Perda de recursos A reserva de vários recursos é ilustrada na Figura 6, que apresenta um conjunto de elementos minerais essenciais à vida nos nossos dias e o tempo de existência, considerando as reservas conhecidas e um consumo anual a crescer 2%. A perda destes elementos pode causar a impossibilidade de se construir máquinas e ferramentas de écrans táteis tão utilizados nos modernos telefones e computadores. Vários dos aparelhos que usamos hoje não poderão ser construídos no futuro. Muito dos recursos estão nos resíduos que são enterrados todos os anos à razão de 70% do total gerado anualmente. Razões de sobra para se encarar os resíduos como recursos e gerir de forma diferente o seu destino final. 3. Soluções para os problemas dos resíduos As opções são diversas e muito particulares para cada caso. Não há uma única Rota Tec- 12 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 nológica, mas um conjunto apropriado para cada caso, respeitando-se sempre os meios, a cultura e a capacidade técnica e económica das comunidades, sem ferir o ambiente. Há soluções mais robustas que outras. Há soluções que servem numa cidade e são inadequadas para outra, dependendo de vários fatores que devem ser convenientemente apreciados e avaliados. É precisamente no âmbito desta abordagem que os modernos conceitos de gestão de resíduos sólidos assentam a sua estratégia baseada na seguinte hierarquia de gestão: • Redução e Reutilização de resíduos; • Reciclagem; • Digestão anaeróbia e Compostagem; • Incineração energética; • Aterro sanitário (confinamento técnico) 3.1. Reciclagem A reciclagem deve ser fomentada e incentivada ao mais alto nível, pois muitos dos produtos residuais da atividade de certas indústrias, estabelecimentos comerciais e das residências podem ser reutilizados, recuperados ou usados como matéria-prima para outras indústrias. A legislação com metas quantitativas e qualitativas é o melhor meio de se conseguir atingir este objetivo. 3.2. Digestão anaeróbia e compostagem A digestão anaeróbia é um processo biológico processado na ausência de oxigénio em que microrganismos transformam a matéria orgânica biodegradável em compostos finais de que se destacam o biogás e o material digerido. Após a digestão anaeróbia deve proceder-se à compostagem do material recalcitrante não degradado, corrigindo-se o rácio C/N com material rico em carbono, higienizando assim o material digerido. A compostagem é um processo biológico aeróbio de reciclagem da matéria orgânica biodegradável, que está presente nos resíduos sólidos urbanos em quantidades maioritárias em relação aos restantes componentes FIGURA 6 Anos de existência das reservas de vários elementos (fonte: UNFPA, 2011) 50 40 Years e riscos ambientais que exigem uma tomada de posição de todos os governos na solução do problema de forma ambiental e socialmente adequada. Acresce que estimativas do Banco Mundial apontam para um agravamento da produção de resíduos e do seu custo superior ao aumento da população, que já é uma das preocupações políticas dos nossos dias. Apresenta-se na Figura 5 a evolução estimada da população, resíduos e custos no mundo até 2025. 30 20 10 0 Sr Ag Sb Au Zn As Sa In Zr Pb Cd Ba Hg W Cu Tl Mn Ni Mo Re Bi Y Nb Fe Element PUB. (cerca de 50%). Trata-se de um processo aeróbio controlado, em que diversos microrganismos são responsáveis, numa primeira fase, por transformações bioquímicas na massa de resíduos e humificação, numa segunda fase. As reações bioquímicas de degradação da matéria orgânica processam-se em ambiente predominantemente termofílico, também chamada de fase de maturação, que dura cerca de 25 a 30 dias. A fase de humificação em leiras ou pilhas de compostagem processase entre 30 e 60 dias, dependendo da temperatura, humidade, composição da matéria orgânica (concentração de nutrientes) e condições de arejamento. É um processo eficaz de reciclagem da fração putrescível dos resíduos sólidos urbanos, com vantagens económicas, pela produção do composto, aplicável na agricultura (não está sujeito a lixiviação, ao contrário dos adubos químicos), ótimo para a contenção de encostas e para o combate da erosão, etc. Quando incluído numa solução integrada, tem a vantagem de reduzir ou mesmo eliminar a produção de lixiviados e de biogás nos aterros sanitários, o que torna a exploração mais económica. 3.3. Incineração É outra das tecnologias utilizadas para tratamento dos resíduos sólidos, tanto urbanos como industriais, utilizada em especial nos países nórdicos, devido à necessidade de diversificação das fontes energéticas para aquecimento, à densidade populacional elevada e devido à falta de terrenos apropriados para outras soluções. Para o tratamento dos resíduos hospitalares perigosos para a saúde e certos resíduos industriais perigosos é, porventura, um dos métodos mais seguros (registam-se experiências com autoclavagem e micro-ondas muito interessantes que poderão vir a alterar o panorama dos tratamentos deste tipo de resíduos hospitalares). A incineração tem vantagens na redução dos volumes a depositar em aterros, que pode chegar a 85 %, na eliminação de resíduos patogénicos e tóxicos e na produção de energia sob a forma de eletricidade ou de vapor de água. Tipicamente, a incineração envolve a combustão de resíduos tal qual, sem qualquer preparação prévia, realizada a temperaturas superiores a 850ºC e tempo de residência superior a 2 segundos, com produção de CO2 e água sob a forma de vapor a alta temperatura, aproveitando a energia contida nos RSU, de 8 a 11 MJ/kg. 3.4. Aterros sanitários Os processos ou métodos de tratamento anteriormente descritos não são concorrentes com o aterro sanitário, mas complementares a este. Efetivamente, o aterro sanitário é um órgão imprescindível porque é comum em toda a estrutura de equacionamento dos resíduos sólidos. A incógnita é a quantidade de resíduos a serem ali depositados para tratamento e destino final. Quanto maior for a taxa de valorização conseguidas nas fases anteriores, menores serão as quantidades a aterrar, prolongando-se a vida útil do AS e diminuindo-se o custo de exploração. Se a escala do aterro for adequada, disposição de uma quantidade mínima de cerca de 200 toneladas por dia, pode haver o aproveitamento do biogás produzido no aterro. Sem esta disposição mínima não é rentável o aproveitamento energético, e o biogás terá de ser queimado em tocha com tempo de residência mínima de 0.3 segundos na câmara de combustão, a uma temperatura de pelo menos 850 ºC, para minimizar a libertação dos gases de efeito de estufa. Bibliografia • Russo, M (2012) – Gestão Integrada de Resíduos Sólidos. Publicação IPVC/ESTG. • Tchobanoglous, G et all (1993) – Integrated solid waste management, McGraw Hill. • Diretiva Aterros e Diretiva Incineração da UE. • The Economist, 2012, em http://www. economist.com/blogs/graphicdetail/2012/06/daily-chart-3 • Mavropoulos, A. (2011) – Globalization and Recycling markets. http://www.iswa2012. org • http://www.snide.fr/virtuelle.php/page/ traitement_thermique_procede • https://www.unfpa.org/webdav/site/ global/shared/documents/publications/2011/EN-SWOP2011-FINAL.pdf. • ISWA, 2012 “Globalization and Waste Management”. dossier resíduos © Theresa Iovcheva João Pedro Rodrigues Presidente da EGF Grupo Águas de Portugal Os desafios da privatização da EGF no futuro da gestão de resíduos em Portugal A EGF, subholding do grupo Águas de Portugal para a área dos resíduos, está prestes a entrar num nova fase dos seus 65 anos de vida. Uma nova fase que visa aproximar o País das práticas europeias, onde o peso da gestão privada neste setor é muito significativo. Em Portugal, a gestão privada nos resíduos representa apenas 3%, enquanto em França é de 91%, no Reino Unido 83%, em Espanha 76%, na Alemanha 65% e na Holanda 36%. Com a alienação prevista de 51% do capital da EGF, o peso da gestão privada em Portugal passará a ser de 60%. O processo de privatização em curso permitirá fortalecer um setor já maduro e com bons níveis de desempenho, mas que precisa ainda de realizar investimentos. Investimentos estes que foram e deverão continuar a ser limitados por dificuldades de financiamento do Estado e do setor empresarial do Estado. Estes Investimentos são essenciais para continuar a reforçar a aposta da qualidade ambiental em Portugal e cumprir as metas de compromisso com a União Europeia. Estamos a entrar num novo ciclo de investimentos exigentes na área dos resíduos, de- 14 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 signadamente para cumprir os objetivos da diretiva quadro de gestão de resíduos que estabelece metas para 2020. O PERSU está em reavaliação e irá, certamente, objetivar essas metas para o nosso país, com indicadores que permitam estimar o nível de investimentos e programa as atividades. A articulação entre a necessidade de investimento e a capacidade de financiamento é um dos grandes desafios que se colocam ao nosso país atualmente e o setor dos resíduos não é exceção. Esta nova fase de desenvolvimento do setor será certamente um momento importante para Portugal, sendo certo que o objetivo final é reunir as condições para que estes serviços públicos continuem a ser prestados com a maior qualidade às populações. Tratando-se de concessões de titularidade estatal, o Estado continuará a ser responsável pela garantia da prestação deste serviço público, uma vez que não deixa de ser a entidade Concedente. Assim, o Estado continuará a ter um papel ativo e fundamental neste setor. Da mesma forma, os municípios continuarão a ter um papel importante na gestão dos resíduos urbanos, mantendo o seu papel enquanto clientes e acionistas das empresas de tratamento e valorização de Resíduos Sólidos Urbanos (RSU). A nível legislativo, destacam-se as mudanças que irão ocorrer na Entidade Reguladora dos Serviços de Água e Resíduos. A ERSAR vai ver os seus poderes reforçados, sendo acentuada a sua autonomia face ao poder executivo. Após a aprovação da Lei que define os estatutos da ERSAR, esta entidade poderá definir, de modo independente, as tarifas a praticar. O setor dos resíduos assenta em vários anos de crescimento e consolidação, sendo um setor já maduro, como referi, o que é demonstrado por alguns indicadores do universo da EGF. Desde logo, fomos capazes de criar as eficiências necessárias na operação para cumprir com todas as obrigações sociais e ambientais, ao mesmo tempo que criámos as condições que permitem manter as tarifas baixas, respondendo às necessidades dos acionistas e das populações. Destaco também a introdução de mais-valias ambientais, económicas e sociais resultantes do aproveitamento do potencial energético dos resíduos. Ambientais porque permitiram “ o objetivo final é reunir as condições para que estes serviços públicos continuem a ser prestados com a maior qualidade às populações. de eletricidade a partir de fontes endógenas. De destacar que todas as empresas da EGF exportam mais energia elétrica do que a que consomem nas suas atividades, sendo inferior a 10% a relação entre a energia consumida e a energia exportada para a rede pública no ano de 2012. Também o grupo EGF é “energeticamente independente”, representando o consumo de todos os produtos energéticos menos de 40% da energia exportada para o mesmo ano de referência A EGF lidera um conjunto de parcerias estratégicas que têm permitido alavancar a investigação e desenvolvimento em novos conhecimentos e tecnologias inovadoras de tratamento e valorização de resíduos designadamente para a criação de formas de energia limpas e renováveis. A experiência e conhecimentos adquiridos ao longo dos últimos anos em que apoiou, geriu e coordenou a implementação e desenvolvimento dos sistemas multimunicipais de tratamento e valorização de resíduos, impulsionam ainda a EGF para novos e ambiciosos desafios, nomeadamente a aposta na qualificação de todas as empresas do Grupo segundo as mais exigentes normas internacionais nas áreas da gestão, do ambiente, da higiene e segurança e da responsabilidade social. Chegados a esta fase com sucesso, seguese um outro nível de desenvolvimento onde é fundamental que a EGF funcione como um ativo que possa alavancar a trajetória de desenvolvimento de uma “economia verde” em Portugal e que, nas condições certas, possa ajudar à internacionalização das empresas nacionais suportada pelo conhecimento específico que acumulámos nos últimos 15 anos. PUB. reduzir a emissão de GEE, económicas porque geram receitas e sociais porque estas receitas são aplicadas para reduzir o montante a cobrar via tarifa. A energia com origem no biogás produzida nas empresas do grupo EGF tem aumentado de forma significativa nos últimos anos, com especial relevo para os anos 2010, 2011 e 2012, período em que alguns aterros sanitários geridos pelas empresas do grupo que ainda não tinham aproveitamento energético do biogás passaram a fazer essa valorização. Hoje, todas as empresas fazem aproveitamento de energia a partir do biogás, pelo menos num dos seus aterros. De facto, no domínio da valorização orgânica dos resíduos biodegradáveis, a EGF utiliza tecnologias inovadoras para potenciar o aproveitamento energético do biogás produzido pela decomposição dos resíduos e para a produção de composto passível de ser usado como fertilizante agrícola. Além de permitir prolongar a vida útil dos aterros, a valorização orgânica dos resíduos permite também reduzir a emissão de gases com efeito de estufa e promover a produção dossier resíduos INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 15 dossier resíduos © Salisbury Environmental Action Paulo Praça Diretor-Geral da Resíduos do Nordeste Os desafios dos SMAUT e as novas metas de reciclagem de embalagens É inegável que os desafios que se colocam aos SMAUT (Sistemas de Gestão de Resíduos), bem como às entidades gestoras, sobre o licenciamento e as “novas metas de reciclagem de embalagens” e, em contexto de concorrência, são enormes. Elencamos de seguida, de forma sintética, alguns aspetos gerais da problemática em apreço e algumas especificidades da mesma. A promoção da concorrência Na tradição portuguesa, como se sabe, existe uma atribuição de competências de gestão dos serviços de resíduos urbanos (seja às autarquias ou outras entidades, devidamente autorizadas), em regime de monopólios (locais, regionais e nacionais). Assim sendo, a promoção da concorrência é uma temática particularmente controversa em comparação com o que tem sucedido noutros setores. Afigura-se, no entanto, essencial a existência de um organismo regulador para os setores dos serviços de resíduos urbanos capaz de zelar pela promoção da qualidade na conceção, execução, gestão e exploração dos 16 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 sistemas, visando defender os direitos dos consumidores e a promoção da sustentabilidade económica. Nesse sentido, assistiu-se recentemente à universalização da intervenção regulatória da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) a todas as entidades que prestem serviços de resíduos. Por outro lado, nos termos do projeto dos novos estatutos da ERSAR, em apreciação na Assembleia da República, pretende-se reforçar os poderes desta entidade e, nos termos de legislação específica e no quadro das suas atribuições, colaborar com a autoridade nacional de resíduos relativamente aos sistemas integrados de fluxos específicos. Princípio da defesa dos interesses dos utilizadores É indispensável garantir o princípio da defesa dos interesses dos utilizadores, nos termos do qual os tarifários devem assegurar uma correta proteção do utilizador final, evitando possíveis abusos de posição dominante por parte da entidade gestora, por um lado, no que se refere à continuidade, qualidade e custo para o utilizador final dos serviços prestados e, por outro, no que respeita aos mecanismos de sua supervisão e controlo, que se revelam essenciais em situações de monopólio. Importa, pois, acautelar devidamente os encargos económicos com o cumprimento das novas metas para as embalagens. Os resultados alcançados Os últimos dados conhecidos, referentes ao ano de 2011, representam um importante marco na implementação da reciclagem em Portugal pois foi, pela primeira vez, alcançada uma taxa de retoma de 64%, ou seja, 9% acima do que estávamos obrigados a atingir. A Resíduos do Nordeste, com cerca de 600 ecopontos instalados (1 ecoponto para 240 habitantes) e os seus 14 ecocentros em funcionamento, contribuiu, na medida das suas possibilidades, para as metas nacionais (cfr. Figura 1 e gráfico 1). Contudo, no ano de 2012, devido à situação económica e financeira nacional, houve uma diminuição a na recolha seletiva. Assim acon- PUB. FIGURA 1 VINHAIS BRAGANÇA VIMIOSO MACEDO DE CAVALEIROS MIRANDA DO DOURO MIRANDELA VILA FLOR ÂLFANDEGA DA FÉ ECOCENTRO ESTAÇÃO DE TRANSFERÊNCIA ATERRO SANITÁRIO CARRAZEDA DE ANSIÃES MOGADOURO TORRE DE MONCORVO ETAL CVE UTMB VILA NOVA DE FOZ CÔA teceu no sistema da Resíduos do Nordeste em todos os materiais (cf. Gráfico 2). A nova licença do SIGRE (sistema integrado de gestão de resíduos de embalagens) Os SMAUT receberam, recentemente, para efeitos de audiência dos interessados, cópia do projeto de despacho do Senhor Secretário de Estado do Ambiente e do Ordenamento do Território que, neste momento, ainda estamos a avaliar. Contudo, existem focos de preocupações que nos surgem logo a priori: • A possibilidade de, com este novo modelo, a verba de financiamento dos Sistemas para a gestão das emba- FREIXO DE ESPADA À CINTA lagens, nas suas responsabilidades, seja reduzida; • Que não exista igualdade entre Sistemas, de norte a sul e do litoral ao interior, no que respeita ao escoamento dos seus materiais, criando dificuldades acrescidas em função da sua localização; • A diminuição da quantidade de resíduos a recolher seletivamente, devido à crise que afeta Portugal, está a criar dificuldades financeiras aos SMAUT, porque a redução dos custos é muito inferior à redução das quantidades. É do interesse nacional que o País continue a fazer uma clara aposta estratégica no setor, e estamos convictos que o bom desempenho alcançado permite encarar o futuro com confiança. GRÁFICO 1 Evolução do número de Ecopontos GRÁFICO 2 Recolha seletiva 2011/2012 dossier resíduos © constantin jurcut Filomena Rodrigues Lobo Diretora do Departamento de Engenharia-Resíduos da ERSAR O papel da ERSAR na Regulação do Setor dos Resíduos Urbanos em Portugal - Avaliação da Qualidade do Serviço A ERSAR e a sua missão Os serviços de abastecimento público de água às populações, de saneamento de águas residuais urbanas e de gestão de resíduos urbanos constituem serviços públicos de caráter estrutural, essenciais ao bemestar geral, à saúde pública e à segurança coletiva das populações, às atividades económicas e à proteção do ambiente. Estes serviços devem pautar-se por princípios de universalidade no acesso, de continuidade e qualidade de serviço, e de eficiência e equidade dos preços. A Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) é a autoridade reguladora destes serviços, tendo por missão a sua regulação e supervisão, incluindo o exercício de funções de autoridade competente para a coordenação e a fiscalização do regime da qualidade da água para consumo humano, competindo-lhe assegurar a defesa dos direitos dos consumidores e dos utentes dos sistemas multimunicipais e municipais, e assegurar a sustentabilidade económica destes sistemas. A regulação tem, assim, como principal objeti- 18 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 vo a proteção dos interesses dos utilizadores, através da promoção da qualidade de serviço prestado pelas entidades gestoras e da garantia de tarifários socialmente aceitáveis, materializada nos princípios de essencialidade, indispensabilidade, universalidade, equidade, fiabilidade e de custo-eficácia associada à qualidade de serviço. Deve, no entanto, fazêlo tendo em conta a salvaguarda da viabilidade económica e dos legítimos interesses das entidades gestoras, independentemente do seu estatuto - público ou privado, municipal ou multimunicipal -, e considerando ainda a salvaguarda do setor económico através da consolidação do tecido empresarial e a contribuição para a implementação das políticas definidas pelo Governo. Modelo de regulação do serviço de gestão resíduos urbanos A ERSAR desenvolveu um modelo de regulação que passa pela regulação estrutural do setor, pela regulação comportamental das entidades prestadores dos serviços de gestão de resíduos e por atividades complementares. A nível da regulação estrutural do setor, a ERSAR: • Monitoriza as estratégias nacionais para o setor, acompanhando a sua implementação e reportando periodicamente as evoluções e os condicionamentos; • Elabora propostas de nova legislação para o setor, por exemplo a nível dos regimes jurídicos dos sistemas municipais e multimunicipais e do regime jurídico da regulação. A nível da regulação comportamental das entidades gestoras prestadoras dos serviços de resíduos, a ERSAR: • Assegura a monitorização legal e contratual das entidades gestoras ao longo do seu ciclo de vida, nomeadamente através da análise de processos de concurso e contratualizações, de modificação dos contratos, de resolução dos contratos e de reconfigurações e fusões de sistemas, fazendo o acompanhamento da execução dos contratos e intervindo quando necessário na conciliação entre as partes; • Assegura a regulação económica das entidades gestoras, promovendo a regulação dossier resíduos de preços para garantir tarifas eficientes e socialmente aceitáveis sem prejuízo da sustentabilidade económica e financeira das entidades gestoras; • Assegura a regulação da qualidade de serviço prestado aos utilizadores pelas entidades gestoras, avaliando o seu desempenho e comparando as entidades gestoras entre si, através da aplicação de um sistema de indicadores, de forma a promover a sua eficiência e melhoria, em geral, dos seus níveis de serviço. Esta componente da regulação, sendo o alvo principal deste artigo, será um pouco mais desenvolvida de seguida; • Realiza a análise de reclamações de utilizadores e promove a sua resolução entre utilizadores e entidades gestoras prestadoras do serviço. A nível das atividades complementares, a ERSAR: • Elabora e divulga regularmente informação rigorosa e acessível a todos os intervenientes do setor; • Apoia tecnicamente as entidades gestoras, promovendo edição de publicações e a realização de ações de formação, frequentemente em parceria com centros de saber. Nas publicações refere-se, entre outras, o Relatório Anual dos Serviços de Águas e Resíduos em Portugal e os Guias técnicos nº 15 “Opções de gestão de resíduos urbanos”, nº 19 “Guia de avaliação da qualidade dos serviços de águas e resíduos prestados aos utilizadores - 2.ª geração do sistema de avaliação” e nº 20 “Relação das entidades gestoras com os utilizadores dos serviços de águas e resíduos”, as quais se encontram acessíveis em www.ersar.pt; • Dá resposta a questões diversas colocadas por todos os intervenientes do setor. Todas estas valências do modelo de regulação devem ter uma articulação perfeita entre si, permitindo construir um modelo coerente. Avaliação da qualidade do serviço – aplicação de sistemas de indicadores A regulação da qualidade dos serviços de águas e resíduos prestados aos utilizadores pelas entidades gestoras, avaliando o desempenho dessas entidades e promovendo a melhoria dos níveis de serviço por elas prestado, é como atrás referido uma componente importante da regulação comportamental destes serviços. Para assegurar esta componente da regula- FIGURA 1 Sistema de indicadores – 2ª geração Indicadores de Qualidade do Serviço de Gestão de Resíduos Urbanos Alta Baixa RU01 – Acessibilidade física do serviço (%) • • RU02 – Acessibilidade do serviço de recolha seletiva (%) • • RU03 – Acessibilidade económica do serviço (%) • • RU04 – Lavagem de contentores (-) • • RU05 – Resposta a reclamações e sugestões (%) • • • • Adequação da interface com o utilizador Acessibilidade do serviço aos utilizadores Qualidade do serviço prestado aos utilizadores Sustentabilidade da gestão do serviço Sustentabilidade económica RU06 – Cobertura dos gastos totais (-) Sustentabilidade infraestrutural RU07 – Reciclagem de resíduos de embalagem (%) • • RU08 – Valorização orgânica (%) • n.a. RU09 – Incineração (%) • n.a. RU10 – Utilização da capacidade de encaixe de aterro (%) • n.a. RU11 – Renovação do parque de viaturas (km/viatura) RU12 – Rentabilização do parque de viaturas [kg/(m3 . ano)] • • n.a. • • • • • RU15 – Qualidade dos lixiviados após tratamento (%) • n.a. RU16 – Emissão de gases com efeito de estufa (kg CO2/t) • • Produtividade física dos recursos humanos RU13 – Adequação dos recursos humanos (n.º/1000 t) Sustentabilidade ambiental Eficiência na utilização de recursos ambientais RU14 – Utilização de recursos energéticos (kWh/t) (tep/t) Eficiência na prevenção da poluição n.a. – não aplicável ção, a ERSAR definiu um processo de avaliação da qualidade do serviço prestado pelas entidades gestoras, em implementação desde 2004, e que assenta no uso de indicadores de desempenho, os quais têm por objetivo a quantificação da eficiência e eficácia do serviço prestado pelas entidades gestoras. A 1ª geração do sistema de indicadores, composta por 20 indicadores, foi aplicada durante sete anos consecutivos às entidades concessionárias (12 entidades gestoras com serviço em alta, no setor dos resíduos), entidades então reguladas. Com o alargamento do âmbito de atuação da ERSAR, em 2009, a todas as entidades gestoras de águas e resíduos urbanos, passando esta entidade a regular as 282 entidades gestoras de resíduos urbanos a operar em Portugal Continental, procedeu-se à alteração deste sistema de indicadores, de forma a ter em conta, essencialmente, a especificidade do serviço de recolha indiferenciada dos resíduos (serviço em baixa), exercido pelas entidades gestoras agora também alvo de regulação. Este sistema de avaliação (2ª geração de indicadores), aplicado pela primeira vez, em 2012, a todas as EG, inclui 16 indicadores de desempenho que procuram traduzir a adequação da interface com os utilizadores, a sustentabilidade da gestão do serviço e ainda a sustentabilidade ambiental, distribuídos conforme Figura 1. No Guia nº 19 (Guia de Avaliação), atrás referido, pode ter-se acesso à identificação e especificação de todos os componentes deste sistema de avaliação, à descrição do conjunto de indicadores, dados a reportar, forma de cálculo, e bandas de referência a considerar para cada um deles, e à descrição de todos os procedimentos a adotar quer por parte das INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 19 dossier resíduos entidades gestoras, desde o reporte dos dados necessários à avaliação até ao exercício do processo de contraditório relativo à avaliação efetuada pela ERSAR, a que têm direito, quer do procedimento a adotar nas diferentes fases do processo pela ERSAR e/ou pelos auditores que, em seu nome procederem à auditoria aos dados reportados. O processo de avaliação em implementação pela ERSAR inclui, para além da quantificação e avaliação individual de cada uma das entidades gestoras, um mecanismo de comparação dos resultados entre entidades gestoras similares (benchmarking), cujos resultados são divulgados publicamente através do RASARP, constituindo uma pressão positiva no sentido da melhoria da qualidade do serviço. A título de exemplo apresenta-se a comparação da qualidade de serviço de renovação do parque de viaturas (km/viatura) (RU11) prestado pelas 260 entidades gestoras a exercer serviço em baixa (Figura 2), organizada por cluster, e da qualidade do serviço de reciclagem de resíduos de embalagem (RU07) prestado pelas 23 entidades gestoras a exercer serviço em alta (Figura 3). A divulgação pública dos resultados desta avaliação contribui de forma inequívoca para uma maior transparência e confiança no setor, permitindo o acesso dos utilizadores a infor- mação fiável e de fácil interpretação do serviço que lhes é prestado. Não obstante tratar-se do primeiro ano de reporte de dados para a maioria das entidades gestoras, o processo de avaliação da qualidade de serviço prestado em 2011 decorreu com um elevado espírito de colaboração e profissionalismo por parte dessas entidades. Tendo presente que a qualidade dos dados é essencial para que o sistema de avaliação seja transparente, objetivo e aceite por todos os intervenientes, a ERSAR desenvolveu todos os esforços de forma a garantir a auditoria aos dados da totalidade das entidades gestoras, tendo definido procedimentos para a RURAL Mediamente URBANO URBANO FIGURA 2 RU11- Renovação do Parque de Viaturas de recolha indiferenciada (km/viatura) – comparação entre entidades gestoras a exercer serviço em baixa – organizada por cluster Norte 20 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 Centro e Lisboa e Vale do Tejo Alentejo e Algarve PUB. FIGURA 3 RU07 - Reciclagem de resíduos de embalagem (RU07) – Comparação entre as entidades gestoras a exercer serviço em alta uniformização dos critérios de validação desses dados, os quais foram seguidos pelos 35 auditores externos, que procederam, em nome da ERSAR, e em estreita articulação com a equipa técnica desta entidade, à realização de auditorias presenciais aos dados de todas as entidades gestoras. Os resultados da avaliação da qualidade do serviço prestado durante o ano de 2011 ainda não se encontram publicados, prevendo-se para muito breve a sua publicação no RASARP 2012. Pode, no entanto, adiantar-se que mais de 50% das entidades gestoras avaliadas apresentam, para 2/3 dos indicadores, qualidade de serviço considerada boa ou mediana, sendo que os indicadores em que mais entidades com serviço em baixa (serviço de deposição e recolha) evidenciam uma qualidade de serviço insatisfatória são “lavagem de contentores”, “resposta a reclamações” e “cobertura dos gastos totais”. Para o serviço em alta, com 28% de avaliações insatisfatórias, os indicadores em que mais entidades evidenciam qualidade insatisfatória são “Reciclagem de resíduos de embalagem” e “Valorização orgânica”. Este sistema de avaliação da qualidade de serviço permite identificar os aspetos em que as entidades gestoras demons- tram mais dificuldades, devendo estes ser objeto de atenção preferencial tendo em vista a melhoria da prestação destes serviços. Não obstante, é expectável que as entidades gestoras utilizem este processo de avaliação para potenciar a sua gestão interna e não apenas para a melhoria dos indicadores alvo de apreciação pela ERSAR. Com a conclusão deste ciclo de avaliação, os portugueses terão pela primeira vez acesso a um levantamento completo e auditado dos serviços de águas e resíduos em áreas fundamentais como a relação das entidades gestoras com os utilizadores, a sustentabilidade da gestão dos serviços e a sustentabilidade ambiental. De facto, sendo a primeira vez que este sistema é aplicado a todo o universo de entidades gestoras, é legítimo perspetivar uma melhoria constante e sustentada da informação a recolher e consequentemente da informação a prestar aos utilizadores destes serviços. A divulgação da informação apurada permitirá uma melhor perceção da qualidade do serviço prestado aos utilizadores e uma proteção mais adequada dos seus interesses, permitindo aumentar a eficiência e a eficácia das entidades gestoras e apoiar a definição de políticas públicas para o setor. dossier resíduos © André Wermuth Walter Plácido Teixeira Junior Engenheiro Civil Mestre em Ciências Ambientais UFF A política de gestão de resíduos no Brasil: Desafios e oportunidades de negócio Durante muitos anos os lixões proliferaram sem controle, as prefeituras mal davam conta da coleta de lixo de uma forma regular, a reciclagem inexistia e poucas empresas se voltavam para o mercado dos resíduos. Em menos de uma década essa realidade se transformou completamente no Brasil. A promulgação da Lei nº 12.305 em agosto de 2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) foi um marco para o setor e introduziu um paradigma para os Governos das três esferas federativas, setor produtivo e sociedade. É uma legislação bastante atual e abrangente, de forte inspiração europeia, ao mesmo tempo atenta as particularidades, demandas e necessidades brasileiras. Contém instrumentos importantes para permitir o avanço necessário ao País no enfrentamento dos principais problemas ambientais, sociais e econômicos decorrentes do manejo inadequado dos resíduos sólidos, sobretudo os urbanos. A PNRS prevê a prevenção e a redução na geração de resíduos, tendo como proposta a prática de hábitos de consumo sustentável e um conjunto de instrumentos para propiciar o 22 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 aumento da reciclagem e da reutilização dos resíduos sólidos e a destinação ambientalmente adequada dos rejeitos. Institui a responsabilidade compartilhada dos geradores de resíduos: dos fabricantes, importadores, distribuidores, comerciantes, o cidadão e titulares de serviços de manejo dos resíduos sólidos urbanos na Logística Reversa dos resíduos, em seus diferentes fluxos ou fileiras, e embalagens pós-consumo. Cria metas importantes que irão contribuir para a eliminação dos atuais lixões (e “aterros controlados”) e institui instrumentos de planejamento e gestão nos níveis nacional, estadual, microregional, intermunicipal e metropolitano e municipal; além de impor que empresas, comércio, o setor produtivo de um modo geral, elaborem e coloquem em prática seus respectivos Planos de Gerenciamento de Resíduos Sólidos. Também coloca o Brasil em patamar de igualdade aos principais países desenvolvidos no que concerne ao marco legal e inova com a inclusão de catadoras e catadores de materiais recicláveis e reutilizáveis, tanto na Logística Reversa quando na Coleta Seletiva, talvez esse um dos maiores desafios das administrações publicas convocadas a participar ativamente nas políticas de inclusão social dos catadores e suas cooperativas dentro desse novo contexto no gerenciamento dos RSU. Além disso e de forma correlata, os instrumentos da PNRS quando amplamente aplicados ajudarão o Brasil a atingir uma das metas do Plano Nacional sobre Mudança do Clima, que é de alcançar o índice de reciclagem de resíduos de 20% em 2015. Essa é uma tarefa complexa que ainda não possui bases palpáveis de concretização este ano, haja vista que os Acordos Setoriais para os diversos fluxos (fileiras) apontados como prioritários ainda não foram efetivamente implementados. Em fevereiro de 2011, o Governo Federal criou o Comitê Orientador para Implementação de Sistemas de Logística Reversa. O Comitê é formado pelos ministérios do Meio Ambiente, da Saúde, da Fazenda, da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e tem por finalidade definir as regras para devolução dos resíduos à indústria, para reaproveitamento e reciclagem, em seu ciclo ou PUB. dossier resíduos Grupos de Trabalho do Comité Interministerial da PNRS GT01 – Implementação e acompanhamento dos Planos de Resíduos Sólidos e elaboração do SINIR – Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos GT02 – Recuperação Energética dos Resíduos Sólidos Urbanos GT03 – Linhas de financiamento, creditícias e desoneração tributária de produtos recicláveis e reutilizáveis GT04 – Resíduos Perigosos – Plano de Gerenciamento de Resíduos Perigosos e descontaminação de Áreas Órfãs GT05 – Educação Ambiental em outros ciclos produtivos. O Grupo Técnico de Assessoramento (GTA), que funciona como instância de assessoramento para instrução das matérias a serem submetidas à deliberação do Comitê Orientador, criou cinco Grupos Técnicos Temáticos (GTT) que discutem, desde maio de 2011, a Logística Reversa para cinco cadeias (fluxos, fileiras). Inicialmente as cadeias indicadas como prioritárias são: descarte de medicamentos; embalagens em geral; embalagens de óleos lubrificantes e seus resíduos; lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista, e eletroeletrônicos. Esses Grupos têm por finalidade elaborar propostas de modelagem da Logística Reversa e subsídios para os Editais de chamamento para o Acordo Setorial. Alguns desses Editais já foram publicados. Os sistemas “ o Brasil vive um momento impar e promissor no mercado do ambiente em especial no setor dos resíduos de devolução dos resíduos aos geradores serão implementados principalmente por meio de acordos setoriais com a indústria. A lei 12.305/10 ainda prevê o estabelecimento da Logística Reversa para as cadeias produtivas de agrotóxicos, pilhas e baterias, pneus, óleos lubrificantes, lâmpadas e produtos eletroeletrônicos. Nesse momento está em fase final de licenciamento ambiental a primeira unidade WTE do país, que se instalará em Barueri, município da grande São Paulo. O Brasil vive um momento impar e promissor no mercado do ambiente em especial no setor dos resíduos, há quase tudo por se fazer em termos de gestão por fluxos, valorização e reciclagem. Àquelas empresas com produtos e serviços que interessem aos Governos e ao setor produtivo, com apetite ao risco e perspectiva de internacionalização devem se preparar internamente, capitalizar, identificar parceiros brasileiros experientes e confiáveis, conhecer bem o mercado e seus players, se posicionar e explorar esse potencial de investimento que está bem aquecido e certamente movimentará algumas dezenas de bilhões de euros dentro da próxima década. INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 23 dossier resíduos Novas licenças de gestão de resíduos de embalagem Está em curso o processo de atribuição de novas licenças do SIGRE (Sistema Integrado de Gestão de Resíduos de Embalagens). A partir deste ano, é expectável que passe a haver concorrência num processo até aqui a cargo da Sociedade Ponto Verde (SPV). A Novo.Verde, entidade nascida de uma proposta apresentada pela ERP Portugal, em parceria com a Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED), concorre a uma das licenças disponibilizadas pela Agência Portuguesa do Ambiente. A ERP Portugal pertence a uma plataforma pan-europeia, a European Recycling Platform (ERP), fundada em 2002. A sua missão passa por assegurar a implementação mais rentável de um sistema de gestão de Resíduos de Equipamentos Elétricos e Eletrónicos (REEE) e de Resíduos de Pilhas e Acumuladores (RPA), em prol dos utentes e empresas. A ERP Portugal é constituída por quatro sócios fundadores: Electrolux, Grupo Gillette Portugal, Hewlett Packard Portugal e Sony Portugal. Um dos objetivos desta plataforma é precisamente o estabelecimento de concorrência entre sistemas de gestão de resíduos, no sentido de 24 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 promover uma redução dos preços. É também objetivo da ERP sensibilizar os intervenientes e os cidadãos para a problemática da gestão dos resíduos, informando-os acerca dos principais aspetos a considerar na gestão e tratamento de REEE e RPA. Metas de reciclagem De acordo com a informação disponibilizada no seu site, a SPV ultrapassou, em 2011, a meta global de reciclagem, fixada na sua licença em 55 por cento, atingindo uma taxa de reciclagem de 64 por cento. A quantidade de embalagens encaminhadas para reciclagem em 2011 cresceu 6 por cento face ao ano anterior. Nessa altura, Luís Veiga Martins, Diretorgeral da SPV, mostrava-se otimista, prevendo um aumento da taxa de reciclagem nos anos seguintes. A este propósito, recorde-se que os Estadosmembros terão de, até 2020, encaminhar 50 por cento do total de resíduos sólidos urbanos para reciclagem. Luís Veiga Martins acredita que o facto de Portugal ter cumprido, até á data, “todos os objetivos a que estava obrigado em termos de metas de reciclagem” vai pesar na decisão do Estado sobre o futuro do SIGRE. A par disto, “a particular situação de Portugal, a sua dimensão, o seu modelo de responsabilidade partilhada, o seu enquadramento legal e operacional” são fatores que o Diretor-geral da SPV acredita que o Estado terá em conta na hora de decidir o que será melhor para o SIGRE. Por outro lado, Luís Veiga Martins não acredita que a introdução de concorrência torne o processo mais transparente, pois, segundo afirma, o SIGRE tem sido gerido, até ao momento, “com total eficácia, eficiência e transparência”. O responsável justifica a sua posição lembrando que “a SPV é auditada trimestralmente, tem um Conselho Fiscal que emite relatórios com a mesma periodicidade e é auditada periodicamente pela Agência Portuguesa do Ambiente”. Além disso, as transações de resíduos são conduzidas no âmbito do Mercado Organizado de Resíduos, sendo que os procedimentos e resultados são públicos. A futura articulação com os SMAUT, em caso de mudança de cenário, é algo que, segundo Luís Veiga Martins, ainda está por esclarecer. dossier resíduos 2010 2011 Comparação 2010/11 Meta Legal Meta Atingida Desvio em relação à Meta Legal Vidro 191.681 217.158 13% 60% 53% - 7,1pp Papel/Cartão 318.457 321.039 1% 60% 85,1% + 25pp ECAL (embalagens para alimentos líquidos) 6.094 6.380 5% Plástico 65.080 73.773 13% 22,5% 37,1% +15pp Aço 44.777 48.971 9% 50% 83,4% +33pp Alumínio 1467 1.343 -8% Madeira 40.307 42.537 6% 15% 78,1% + 63pp Total 667.863 711.202 6% 55% 64% + 9pp Fonte: Sociedade Ponto Verde O Diretor-geral da SPV salienta, no entanto, que, apesar de haver espaço para melhoria, o “sistema de recolha universal gerido pelos municípios, e que decorre do monopólio legal dos municípios em matéria de recolha de resíduos urbanos, tem permitido que Portugal tenha cumprido as metas a que se encontrava obrigado em 2005 e 2011”. disponibilidade de recursos essenciais às nossas economias, criando, ao mesmo tempo, oportunidades de negócio, valor acrescentado e emprego”. Luís Veiga Martins afirma ser uma convicção da SPV que o país é capaz de reciclar mais, sensibilizar melhor e tornar mais eficiente toda a cadeia de valor da reciclagem”. É esse o modelo defendido pela SPV para o cumprimento das metas estabelecidas para 2020. Ainda assim, a SPV não pretende apenas cumprir as metas, propondo-se, segundo Luís Veiga Martins, a “aumentar, voluntariamente, a meta de reciclagem para 70 por cento”. A Indústria e Ambiente contactou várias vezes a ERP Portugal no sentido de veicular a posição desta entidade em relação ao processo em curso, mas tal não foi possível até ao fecho desta edição. Os Estados-membros terão de, até 2020, encaminhar 50 por cento do total de resíduos sólidos urbanos para reciclagem. PUB. Ultrapassar os objetivos de 2020 O Diretor-geral da SPV defende que, independentemente do modelo de gestão que venha a ser eleito, “a gestão de resíduos de embalagens deve continuar a potenciar uma gestão mais eficiente dos recursos naturais, contribuindo para a redução dos impactes ambientais da extração de novos recursos e para a © TETRA PAK INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 25 reflexão © Khoirul Rui Moreira de Carvalho Assessor da Comissão de Auditoria e da Comissão de Estratégia, Governação e Avaliação da Caixa Geral de Depósitos Autor de “Parcerias” e de “Compreender + África” O homem inesgotável Na história económica a gestão dos recursos (terra, pessoas e capital) é um capítulo controverso. Foi a partir das suas riquezas que alguns países promoveram o denominado desenvolvimento económico. Mas é também a bonança de recursos – petróleo, diamantes, conhecimento sobre a fusão nuclear, etc. –a causa de algumas das maiores tragédias dos nossos tempos. A vida económica pode ser descrita de uma forma simplista, como o modo de combinar recursos, instituições (hábitos, gostos, regras de comportamento, genericamente aceites) e tecnologia e, daí, retirar bens ou serviços. Estes bens destinam-se ao consumo final (para satisfação das necessidades), consumo intermédio ou investimento (regresso à atividade produtiva) ou, então, sob a forma de conhecimento, ajudam a potenciar uma nova tecnologia. A relação de forças de cada um dos players da atividade económica é relativa (concorrência versus eficiência) e transitória (função da geração e difusão da inovação). Denomina-se 26 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 por conhecimento a capacidade de maximizar a performance relativa dos intervenientes dentro de cada contexto específico. Nenhuma espécie, à exceção da humana, utiliza, além dos recursos naturais e do seu próprio esforço, recursos produzidos na sua atividade: a tecnologia. E esta tem o valor de “criar valor”. Contudo, a introdução de novas tecnologias sempre encontrou adversidades para vencer – desde logo os grupos de cidadãos que querem preservar os seus “mesquinhos” interesses. Porém, o tempo é um excelente aliado do homem. Analisar a história da evolução do mercado do petróleo pode ajudar a oferecer pistas de atuação para a sociedade, e para a academia, sobre esta crise. E sobre todas as outras. A crise do Médio Oriente que teve o seu início na Tunísia, em janeiro de 2011, não teve o impacto no preço do petróleo que muitos previam. Esta região é responsável por cerca de 40% do abastecimento de petróleo e dois terços das reservas conhecidas. O temor de uma guerra envolvendo países como o Irão, Israel e a Arábia Saudita alarma todos os analistas. Vale recordar que as últimas cinco recessões mundiais foram, em regra, precedidas por subidas rápidas no preço dos combustíveis de origem fóssil. No final dos anos setenta, com a queda do governo no Irão, o petróleo subiu cerca de 200% num curto período de tempo. À data, a despesa com o petróleo era a equivalente a 9,5% do PIB (hoje, para se atingir esse patamar o preço do petróleo deveria atingir cerca de 200 U$D). Em 2008, o valor da despesa com os combustíveis significava cerca de 6,3% do PIB. Aos preços de hoje, com o barril de petróleo (Brent) a valores de cerca de 100 U$D, o gasto mundial com petróleo oscila nos 4% do PIB mundial. No entanto, mais uma vez a realidade surpreendeu as expectativas. Mas não devemos esquecer as desvantagens de se depender de uma região propensa a conflitos, assim como a dificuldade de substituir situações de monopólio relativo. Será caso para perguntar se “ninguém sabe o que se passa”. Somos tentados a pensar que vivemos num mundo mais compreensível, mais explicável e, logo, mais previsível do que os factos sugerem. reflexão PUB. ticular do gás, alterou-se de forma radical. Em 2007, quando a produção de gás estava estagnada, foi sugerida a extração de gás de rochas de xisto através de uma tecnologia que associou a perfuração horizontal com a técnica da fratura hidráulica. O xisto, formação rochosa que contém uma enorme quantidade de gás e de petróleo poderá ser um desses elementos-surpresa! O resultado é digno de realce. Em 2011, o gás de xisto, nos EUA, representava cerca de 30% do mercado contra cerca de 1% em 2000. A produção na formação rochosa de Bakken, na fronteira com o Canadá, levou o Estado de Dakota do Norte a superar o Alasca no ranking da produção petrolífera. Nos EUA a oferta de gás aumentou cerca de 50% enquanto o preço reduziu cerca de 75% (de 12 para cerca de 3 U$D por milhão de BTU’s). Este facto levou a que a Agência Internacional de Energia sugerisse, no seu relatório de novembro de 2012, que os Estados Unidos da América devem tornar-se em 2017 o maior produtor mundial de petróleo, superando a Arábia Saudita e a Rússia. Em 2030, deverão apresentar excedentes comerciais nesta fileira. No Brasil, assiste-se ao assumir da viabilidade económica da exploração de petróleo extraído de poços pré-sal (sob cerca de três mil metros de água e quatro mil metros de rochas). Um em cada três barris de petróleo descoberto no mundo, nos últimos cinco anos, está no Brasil. Por tudo isto, este país tem uma rara oportunidade diante dos si. A Petrobras, a empresa concessionária da exploração de petróleo no pré-sal, tem um enorme desafio. A empresa tem como metas, até 2020, duplicar as plataformas marítimas (de 45 para 94), triplicar a frota de petroleiros (para 120 navios), duplicar as sondas de perfuração (de 57 para 122), etc. O desafio é muito significativo. Nunca uma empresa do setor construiu uma estrutura de suporte no mesmo intervalo de tempo. A promulgação pelo Brasil da Lei de Conteúdo Local, em 2003, que intenta promover a incorporação de componentes de origem nacional (entre 55 a 65% do total), tem criado dificuldades à manutenção do ritmo de evolução dos objetivos. Trata-se de uma decisão louvável Cempalavras Conta-se que, no final do século XIX, os responsáveis pela cidade de Nova Iorque promoveram um encontro no sentido de lançar um debate sobre a questão do trânsito. Face ao caos provocado pela gestão dos animais de tração (alimentação, sujidade, guarda, etc.) e pela sua circulação, imaginar como seria a cidade dentro de duas décadas era um motivo de grande preocupação. E ansiedade. Todavia, o tempo e a ação do homem resolveram o problema. Inovámos com o automóvel. Hoje, esse contexto (preocupação) faz parte de uma etapa da história. É necessária uma história para sugerir a História. As ideias vão e vêm. As histórias permanecem. O matemático Nassim Taleb escreveu, em 2007. “O cisne negro, o impacto do altamente improvável”. Para o autor, “um cisne negro é um acontecimento altamente improvável que reúne três características relevantes: é imprevisível; produz um enorme impacto; e, após a sua ocorrência, é arquitetada uma explicação que o faz parecer menos aleatório e mais previsível do que aquilo que é na realidade”. Nesta década o mercado da energia, em par- O BUREAU VERITAS GARANTE UMA OFERTA DE SERVIÇOS INTEGRADOS AO LONGO DO CICLO DE VIDA DAS INSTALAÇÕES n Revisão do Projecto n Selecção e Certificação de Fornecedores n Controlo de Qualidade e Garantia da Qualidade n Certificação do Produto (Marcação CE, ASME, etc.) n Inspecção na Origem n Inspecção local em Obra n Gestão da Integridade de Activos n Teste de Materiais, Ensaios de Não Destrutivos (NDT) Bureau Veritas Portugal www.bureauveritas.pt [email protected] 707 200 542 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 27 reflexão na medida em que fortalece o seu parque de Ciência e Tecnologia. Contudo, por vezes, a diferença entre o remédio e o veneno está na dose. Na realidade, o mercado doméstico está com dificuldade em acompanhar as necessidades. Muita da dificuldade emerge da ausência de quadros capacitados para as novas funções, nomeadamente na fileira de construção naval. Os estaleiros navais são, hoje, um dos pontos frágeis da cadeia de valor. O descompasso entre a dinâmica do setor e o volume de construção de origem nacional começou a ficar mais evidente com a descoberta do présal, em 2007, que aumentou de forma significativa as necessidades e o nível de tecnologia (I&D) envolvidos. A falta de concorrência prejudica a estrutura de custos. A abertura de mercados, a promoção de parcerias estratégicas, é apontada como um caminho para dotar o país de competitividade. Será que as competências interiorizadas pela construção naval portuguesa ao longo de séculos poderiam dar um contributo? O impacto geopolítico destas alterações de força no fornecimento de petróleo deverá ser relevante. Países como a Argentina (com as maiores reservas de xisto da América latina), o Canadá (com a descoberta do petróleo nas suas áreas betuminosas), Moçambique (com a quarta maior reserva de gás do Mundo, assim como a maior mina de carvão a céu aberto) podem ajudar a transformar o sempre frágil equilíbrio económico-social dos diversos players mundiais. O gás natural emite 60% menos gás carbónico do que o carvão e menos 30% do que o petróleo. No entanto, diversos ecologistas alegam que a solução de água, areia e produtos químicos injetada nos poços para fraturar a rocha pode contaminar a água e o ar. Também referem que o fraturamento do xisto tende a provocar movimentos sísmicos. Na França o fraturamento hidráulico está proibido. Na Alemanha está suspenso enquanto o governo estuda uma legislação que se pretende rigorosa e eficiente. Entretanto, assiste-se a uma deslocalização de importantes indústrias (vidro, cerâmica, papel e celulose, química, siderurgia e alumínio) para os EUA, à procura de menores custos de energia. O efeito positivo do gás barato poderá permitir que a economia americana cresça a uma taxa média de 4,7%, e criar cerca de um milhão de empregos até 2035. E a Europa? 28 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 “ Devemos estar preparados para aproveitar as oportunidades; para analisar a utopia e recompensar aqueles que conseguem escrever os sonhos. Temos de despertar do sono letárgico do hábito! As justas preocupações ambientais podem reduzir o ritmo de exploração de xisto, mas dificilmente vão alterar uma realidade: o gás natural é um combustível com futuro. Levará tempo. Em regra, a transição entre as fontes de energia é lenta. Muito lentas. Contudo, como é tendencialmente mais competitivo, este produto deverá mudar o mundo (tal como o conhecemos). Mas o combustível do futuro é a eficiência. Importa recordar que cerca de um quarto da população mundial reside no Índico e na Ásia, e que deverá triplicar o seu rendimento per capita até 2031 com um consequente aumento do consumo de energia. Tudo sugere que o fim do petróleo não está anunciado. A produção cresceu cerca de cinco vezes face à registada na década de sessenta. E não para de aumentar. As atuais reservas representam cerca de cinco vezes o petróleo consumido desde o início da sua exploração comercial no século XIX. Novas tecnologias permitem reabilitar jazigos dados como esgotados e iniciar a exploração de outros que não eram do conhecimento científico. Porém, o aumento da procura impõe a demanda de novas soluções. O terramoto que atingiu o Japão, em Fukushima, no final de 2011, teve um enorme impacto no ritmo de crescimento da utilização de energia nuclear. Atualmente, a energia nuclear responde por cerca de 5,6% do consumo energético mundial. Para além do risco ambiental, há que considerar o risco político. Construir novos reatores significa ampliar o acesso a material e a tecnologia nuclear, com o risco de estes caírem em “mãos terroristas”. As energias renováveis estão a fazer o seu caminho. A sua rentabilidade depende da eficiência adquirida quando os preços do petróleo “obrigam” à procura de energias competitivas. Assim é a vida. Mas algo de surpreendente deverá entretanto surgir. Devemos estar preparados para aproveitar as oportunidades; para analisar a utopia e recompensar aqueles que conseguem escrever os sonhos. Temos de despertar do sono letárgico do hábito! As crises são uma das mais poderosas forças na evolução do homem. Não conhecemos o futuro. No entanto, à medida que a concorrência por melhores resultados evolui, ela será a fonte de muita da nossa prosperidade. Esta não depende das riquezas herdadas. Ela é gerada pela energia criativa de cada cidadão, de cada empresa. E por saber colocá-la à disposição do mercado e das comunidades. Perante tantas histórias e cenários, o mais conveniente é a economia de energia. A energia é um bem demasiado precioso para ser esbanjado. O seu pasto é algo que não se esgota. Tal como a nossa criatividade. Seja comum e imperfeito. Na realidade, o homem sabe evoluir. Até parece inesgotável. Bibliografia • Revistas Veja 14/12/2011, de 21/3/2012 da Editora Brasil, • Revistas Exame de 9/3/2011, 31/10/2012 e 27/6/2012 da Editora Brasil • Taleb, Nassim N. (2008), O Cisne Negro, om impacto do altamente improvável, Dom Quichote • Carvalho, Rui M. (2011), Compreender + África, fundamentos para competir no mundo, Temas e Debates investigação Sandra Francisco Pascoal Mestre em Energia e Ambiente Escola Superior de Tecnologia e Gestão Instituto Politécnico de Leiria [email protected] Tratamento de Águas Residuais Domésticas em Leitos de Macrófitas Nas últimas décadas, Portugal registou um desenvolvimento considerável no que respeita ao tratamento de águas residuais domésticas em pequenos aglomerados populacionais. Neste tipo de aglomerados, as unidades de tratamento convencionais apresentam custos per capita muito elevados, sendo por isso frequente a utilização de métodos alternativos, como por exemplo o tratamento através de leitos de macrófitas, processo economicamente vantajoso em relação aos sistemas convencionais e que apresenta eficiências de depuração comparáveis. O presente trabalho consistiu na análise de sistemas de leitos de macrófitas, localizados na zona centro do país, com vista à sua caracterização, avaliação do seu desempenho e identificação de problemas de funcionamento. O trabalho foi efetuado com base na informação recolhida através da realização de um inquérito e da visita aos sistemas de tratamento selecionados. O estudo permitiu concluir que, de um modo geral, as ETAR estudadas apresentam um bom desempenho no tratamento de águas residuais domésticas, sendo no entanto condicionado por fatores como o caudal afluente, o número de habitantes servidos, a concentração de poluentes na água residual, o material do meio de enchimento, a variação das condições meteorológicas e as operações de manutenção. Os problemas operatórios mais frequentes estão relacionados com a colmatação dos leitos e tubagens, as condições meteorológicas e a proliferação de plantas. Helena Pala D. Sousa Professora Coordenadora no Dep. de Eng.ª do Ambiente Escola Superior de Tecnologia e Gestão Instituto Politécnico de Leiria Investigadora no LSRE - Laboratory of Separation and Reaction Engineering , FEUP [email protected] 1. INTRODUÇÃO E OBJETIVOS A área do saneamento tem vindo a progredir de forma significativa em Portugal, sob forte impulso das exigências estabelecidas no Decreto-Lei 152/97, de 19 de junho, que promoveu a publicação do “Plano Estratégico de Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais” (PEAASAR I, 2000), com o objetivo primordial de atingir um nível de atendimento em drenagem e tratamento de águas residuais de 90% até ao ano de 2006. A publicação do PEAASAR II (2007-2013) evidenciou que esse nível ficou cerca de 10% abaixo do previsto, tendo sido necessário implementar novas medidas para alcançar o valor estabelecido. Entre elas, identifica-se a construção de mais sistemas de tratamento, revelando-se essencial promover alternativas de tratamento fiáveis, económicas, com padrões de sustentabilidade e de fácil aplicação à realidade do país, no que respeita, por exemplo, ao tipo de aglomerados populacionais. Destaca-se a problemática relacionada com os pequenos aglomerados populacionais, uma vez que estes apresentam uma dispersão geográfica que exige sistemas de tratamen- INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 29 investigação to descentralizados e se traduz num elevado número de estações de tratamento. Acresce ainda que, nestes aglomerados os recursos financeiros não são, geralmente, compatíveis com as exigências dos sistemas de tratamento convencionais, sendo fundamental a utilização de processos de tratamento simples, sem recurso a grande mecanização e tecnologia, de forma a reduzir os custos de construção e exploração, garantindo níveis de tratamento comparáveis. É neste âmbito que surge a aplicação de leitos de macrófitas que, para além das vantagens mencionadas a nível de custos e eficiência, possui uma característica ímpar no que respeita a enquadramento paisagístico, apresentando-se em perfeita harmonia com o meio rural. O presente trabalho foi desenvolvido com o objetivo de aprofundar a informação relativa a estes sistemas, em particular aos localizados na zona centro do país; avaliar e comparar o seu desempenho; e identificar as suas principais supremacias e problemas, nomeadamente operacionais. Pretende-se verificar a sua eficiência a nível técnico-económico e validar a sua utilização, de modo a impulsionar ainda mais a aplicação a nível nacional. O estudo incluiu visitas a uma amostra de 10 ETAR e a realização de inquéritos direcionados para a sua caracterização e avaliação. 2. CARACTERIZAÇÃO DOS LEITOS Os leitos de macrófitas são classificados com base na forma como se processa o escoamento, podendo considerar-se leitos de escoamento superficial ou de escoamento subsuperficial [1]. Nos leitos de escoamento superficial, o efluente escoa através de um leito impermeabilizado, preenchido com água e plantas aquáticas. As plantas existentes são designadas por: submersas, emergentes e flutuantes. Nos leitos de escoamento sub-superficial, o efluente escoa através de um leito preenchido com um meio poroso, apresentando na superfície uma camada de solo que serve de substrato para as plantas. Estes leitos são geralmente classificados em função da direção predominante do escoamento, isto é, escoamento vertical ou horizontal. Os leitos que integram os dois tipos de escoamento, superficial e sub-superficial, designam-se por híbridos. As plantas presentes em leitos de macrófitas proporcionam o transporte descendente do oxigénio para o substrato, o que suporta 30 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 Figura 1 Plantas com maior utilização em leitos de macrófitas a nível nacional [3]. a atividade metabólica dos organismos aeróbios na depuração; participam diretamente na remoção de alguns nutrientes do efluente (nitratos, fosfatos, sulfatos e carbonatos); possuem a capacidade de fixar vários compostos químicos; e propiciam o desenvolvimento de microrganismos, responsáveis pela degradação dos poluentes orgânicos e inorgânicos. Os tipos de plantas associados à criação de zona húmidas podem ser divididos em dois grupos, as espécies arbustivas e as espécies herbáceas. No grupo das espécies arbustivas incluem-se a Aucuba, Bambus sp, Calycantus floridus, Cornus alba, Cornus florida, Cornus stolonífera , Phragmites communis, Phragmites australis, Scirpus lacustris, Rhamus frangola, Juncus inflexus, Juncus effusus, Typha latifólia, entre outras; e no grupo das espécies herbáceas a Iris pseudacorus, Iris kaempferi, Lythum officinalis, Petasites officinalis, Auruncus silvester, entre outras [2] (Figura 1). 3. ASPETOS CONSTRUTIVOS Os sistemas de tratamento de águas residuais em leitos de macrófitas são constituídos, de um modo geral, por órgãos de tratamento preliminar, tratamento primário e tratamento secundário. O órgão de tratamento preliminar localiza-se à entrada do sistema e é composto por grades e/ou tamisadores que permitem a retenção dos sólidos mais grosseiros, com objetivo de proteger os equipamentos que se encontram a jusante. O tratamento primário tem por objetivo a remoção da carga orgânica associada aos sólidos em suspensão sedimentáveis, evitando assim a colmatação sub-superficial dos leitos. Em regra, é realizado através de fossas séticas ou tanques Imhoff. Os leitos de macrófitas integram o tratamento secundário, sendo responsáveis pela remoção de poluentes, nomeadamente CBO5, CQO, SST, compostos de azoto, fósforo total e microrganismos patogénicos. São constituídos por lagoas impermeabilizadas, parcialmente preenchidas por um leito artificial de materiais permeáveis (solo arenoso, areia grossa, gravilha fina, etc.) e uma camada superficial de solo que serve de substrato às espécies botânicas (Figuras 2 a 9). 4. EFICIÊNCIA DO SISTEMA DE TRATAMENTO A eficiência do processo traduz-se na percentagem de remoção dos poluentes presentes no afluente e pode ser condicionada por aspetos associados às fases de projeto e de funcionamento dos leitos. Na fase de projeto, os critérios de dimensionamento têm forte influência na eficiência, nomeadamente: as opções relativas às espessuras das camadas de enchimento; o tipo de material utilizado como enchimento e a sua granulometria; o tipo de plantas a utilizar e o procedimento adotado na plantação. Na fase de funcionamento, as tarefas de operação e manutenção dos sistemas são particularmente relevantes, devendo ser respeitados procedimentos de inspeção, manutenção e operação adequados em todas as etapas do processo [2]. Em geral, prevê-se que a eficiência do processo esteja compreendida nas gamas: CQO (6090%), CBO5 (40-95%) e SST (60-90%) [4]. 5. METODOLOGIA DE TRABALHO A metodologia de trabalho consistiu na definição de critérios para seleção dos casos de estudo; na identificação e sistematização da informação a recolher; na realização de visitas técnicas para recolha de dados; e na compilação, tratamento e análise da informação obtida. A seleção dos casos de estudo teve em consideração dados do INSAAR (2010), tendo sido aplicados os seguintes critérios de exclusão: 1º ETAR sem informação detalhada sobre o processo de tratamento, pelo facto de não identificarem a função das lagoas de macró- investigação Figura 2 Modelação de terreno para execução de leito de macrófitas (ETAR de Mosteiro de S. Tiago, 2011). Figura 3 Execução de muros de gabião em leito de macrófitas (ETAR de Atalaia, 2011). Figura 5 Colocação de tela de impermeabilização em polietileno de alta densidade (ETAR de Atalaia, 2011). Figura 6 Colocação de camada de brita sobre tela de impermeabilização (ETAR de Atalaia, 2011). Figura 8 Aplicação de turfa (ETAR de Atalaia, 2011). Figura 9 Plantação de macrófitas (ETAR de Vila Facaia, 2011). fitas; 2º Regiões hidrográficas com menor representatividade na aplicação de leitos de macrófitas, pois limitam a análise desta solução de tratamento; 3º ETAR localizadas fora da região Centro do país, de forma a facilitar a deslocação e visita às instalações; 4º ETAR que não utilizam leitos de macrófitas no tratamento secundário, uma vez que o presente estudo recaí sobre a sua utilização como processo de tratamento principal. Para recolha de informação elaborou-se um inquérito organizado em seis campos: 1º identificação da ETAR e respetiva localização; 2º caracterização das infraestruturas; 3º caracterização dos leitos de macrófitas; 4º caracterização do efluente à entrada e à saída; 5º manutenção; e 6º operação e avaliação geral do sistema. 5. METODOLOGIA DE TRABALHO A metodologia de trabalho consistiu na definição de critérios para seleção dos casos de estudo; na identificação e sistematização da Figura 4 Colocação de geotêxtil (ETAR de Atalaia, 2011). Figura 7 Colocação de camada de areão sobre camada de brita (ETAR de Atalaia, 2011). informação a recolher; na realização de visitas técnicas para recolha de dados; e na compilação, tratamento e análise da informação obtida. A seleção dos casos de estudo teve em consideração dados do INSAAR (2010), tendo sido aplicados os seguintes critérios de exclusão: 1º ETAR sem informação detalhada sobre o processo de tratamento, pelo facto de não identificarem a função das lagoas de macrófitas; 2º Regiões hidrográficas com menor representatividade na aplicação de leitos de macrófitas, pois limitam a análise desta solução de tratamento; 3º ETAR localizadas fora da região Centro do país, de forma a facilitar a deslocação e visita às instalações; 4º ETAR que não utilizam leitos de macrófitas no tratamento secundário, uma vez que o presente estudo recaí sobre a sua utilização como processo de tratamento principal. Para recolha de informação elaborou-se um inquérito organizado em seis campos: 1º identificação da ETAR e respetiva localização; 2º caracterização das infraestruturas; 3º carac- terização dos leitos de macrófitas; 4º caracterização do efluente à entrada e à saída; 5º manutenção; e 6º operação e avaliação geral do sistema. 6. CASOS DE ESTUDO A Tabela 1 apresenta as ETAR selecionadas pela aplicação dos critérios definidos e as que efetivamente foram consideradas casos de estudo. A alteração da amostra deveu-se ao facto de não ter sido possível, por diversas razões, recolher informação em algumas das ETAR inicialmente escolhidas e por se ter verificado, por contacto com as Entidades Gestoras, alguma divergência entre a informação presente na base de dados consultada e a situação real. Como se pode verificar, os sistemas analisados encontram-se, na sua maioria, inseridos em meio rural; recebem efluente doméstico; e servem um número de habitantes que varia entre 150 e 1069 (Tabela 2). A configuração mais frequente consiste em: obra de entrada, onde é efetuada a operação de gradagem; tratamento primário através de fossa sética (20% dos sistemas) ou tanque Imhoff (restantes 80%); e tratamento secundário em leitos de macrófitas. A preferência pelo tanque Imhoff está relacionada com a maior facilidade nas operações de manutenção e limpeza do órgão. O número de leitos presente nos sistemas varia entre 1 (ETAR de Borralheira) e 3 (ETAR de Arzila e Penedo), sendo comum a existência de 2. O projeto/operação de leitos múltiplos tem vantagens, nomeadamente no que se refere às operações de manutenção, uma vez que sempre que se procede a este tipo de operação os leitos afetados têm de ficar inativos, pondo em causa a continuidade do tratamento. Apesar disso, desde que o processo permita o cumprimento dos valores de descarga legalmente exigidos, é frequente a opção de construção/utilização de apenas um leito de modo a reduzir os custos de investimento e/ou de manutenção. É o caso das ETAR de Albardo/ Vila Fernando, Quintãzinha do Mouratão e Vela que, apesar de terem leitos múltiplos, têm apenas um em funcionamento. Na primeira, o facto está relacionado com a aplicação de um meio de enchimento (argila expandida) diferente do proposto em projeto (enchimento convencional), o que permite alcançar, com apenas um leito em funcionamento, um desempenho eficaz no sistema de tratamento. Na segunda, verifica-se que o projeto da ETAR considera a receção dos INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 31 investigação efluentes gerados por uma população de 826 habitantes, sendo servidos, à data do estudo, apenas 679 habitantes. Na terceira, verifica-se o sobredimensionamento do sistema desde a fase de projeto, sendo possível, com apenas 1 leito de macrófitas, assegurar a eficiência de tratamento pretendida. Cerca de 50% dos sistemas em estudo utilizam um enchimento constituído por uma única camada de argila expandida; e os restantes, um enchimento convencional, com diferente combinação de camadas de brita, gravilha, areão e terra arável. Não foi possível relacionar o tipo de enchimento com nenhum fator condicionante da operação ou período de construção da ETAR, considerando-se que a opção terá resultado apenas da decisão do projetista. Em 80% das ETAR as plantas utilizadas são as Phragmites australis, espécie comum a nível nacional, e que está descrita como associada a um bom desempenho na depuração de águas residuais domésticas [2]. Como principais problemas de funcionamento foram identificados a colmatação dos leitos, a perda da eficiência causada por variações das condições meteorológicas e a proliferação de plantas (Tabela 2). A colmatação dos leitos, assumida pelas Entidades Gestoras como sendo o problema operatório mais relevante, consiste na diminuição da porosidade do meio ao longo da vida útil dos leitos, devido à acumulação de Tabela 1 Casos de estudo. Entidade Designação do sistema Concelho Anobra (1) Condeixa-a-Nova Arzila (3, 4) Coimbra Borralheira I (3) Covilhã Coutada I (2, 4) Covilhã Cortes do Meio (1) Covilhã Erada (1) Covilhã Orjais (2) Covilhã Ourondo I (1) Covilhã Peraboa Covilhã Sobral de São Miguel (1) Covilhã Vale Formoso (1) Covilhã Águas do Mondego Águas da Serra Vales do Rio (2, 4) Covilhã Zibreira de Fetais (1) Sobral de Monte Agraço Albardo/Vila Fernando (3) Guarda Aranhas (1) Penamacor Bogas do Meio (1) Fundão Águas do Zêzere e Côa Pega (3) Guarda Salvador (1) Penamacor Quintãzinha do Mouratão (3) Guarda C. M. Fundão Vela (3) Guarda São Martinho (1) Fundão C. M. Seia Lajes (1) Seia C. M. Vila Nova de Poiares Vale de Vaíde (1) Vila Nova de Poiares C. M. Vila de Rei Penedo (2, 4) Vila de Rei INOVA – Empresa de Desenvolvimento Económico e Social de Cantanhede Praia da Tocha (1) Cantanhede ETAR selecionada pela aplicação dos critérios definidos (não considerada por indisponibilidade de informação) ETAR selecionada pela aplicação dos critérios definidos (considerada no estudo) ETAR incluída posteriormente no estudo (4) Informação recolhida apenas através de inquérito (não foi realizada visita à ETAR) (1) (2) (3) Tabela 2 Resumo das características dos sistemas de tratamento objecto de estudo. 1 – ETAR de Albardo / Vila Fernando Tabela 2 Resumo das características dos sistemas de tratamento objecto de estudo. 3 – ETAR de ETAR 2 – ETAR de Pega Quintãzinha do Mouratão 4 – ETAR de Vela 5 – ETAR de Borralheira 6 – ETAR de Coutada 7 – ETAR de Orjais 8 – ETAR de Vales do Rio 9 – ETAR de Arzila 10 – ETAR de Penedo Ano de inicio de funcionamento 2007 2008 2008 2007 2008 2005 2008 2005 2005 2000 Meio em que se insere o sistema Rural Rural Rural Rural Rural Rural Rural Rural Rural Urbano Tratamento preliminar Grades Grades Grades Grades Grades Grades Tamisador Grades Não contém Grades Tratamento primário Tanque Imhoff Fossa séptica Tanque Imhoff Fossa séptica Tanque Imhoff Tanque Imhoff Tanque Imhoff Tanque Imhoff Tanque Imhoff Tanque Imhoff Área ocupada pelo sistema [m2] 2.662,0 3.521,0 4.703,0 5.950,0 526,35 i.i. 1.760,0 i.i. 2.970, 0 i.i. Dimensões dos leitos 38 m x 12 m 19 m x 14 m 40,5 m x 20,1 m 37,5 m x 23,3 m 28,5 m x 14,5 m 26,5 m x 13,5 m 36 m x 18 m 40 m x 20 m 14 m x 12 m 30 m x 28, 3 m Área ocupada pelos leitos [m2] 912,00 532,00 1.628,00 1.747,50 413,25 715,50 1.296,00 1.600,00 504,00 2.547,00 Área de leito por habitante [m2/hab.] 1,2 2,2 2,4 2,4 1,5 1,5 1,5 1,5 3,4 6,4 N.º Leitos de macrófitas 2 2 2 2 1 2 2 2 3 3 Plantas utilizadas Phragmites australis Typha Phragmites australis Phragmites australis Phragmites australis Phragmites australis Phragmites australis Phragmites australis Juncus Phragmites australis Argila expandida Terra arável areão grosso brita Terra arável areão grosso brita Terra arável areão grosso brita Argila expandida Argila expandida Argila expandida Argila expandida Areia gravilha brita Terra arável areão gravilha Constituição do leito População servida [n.º hab.] 755 245 679 724 270 475 859 1069 150 400 Caudal médio diário de entrada no sistema [m3/dia] 128,4 129,5 264,3 180,9 33,0 68,4 105,0 153,9 i.i 95,0 Tipo de efluente Doméstico Doméstico Doméstico Doméstico Doméstico Doméstico Doméstico Doméstico Doméstico Doméstico Regularidade das análises efetuadas ao efluente Mensal Bimestral Bimensal Bimestral Mensal Mensal Mensal Mensal Semestral Trimestral Limpeza, desobstrução de tubagens, corte de plantas Limpeza, desobstrução de tubagens, corte de plantas Limpeza, desobstrução de tubagens, corte de plantas Limpeza, desobstrução de tubagens, corte de plantas Limpeza, desobstrução de tubagens, corte de plantas Limpeza Diária Limpeza Diária Limpeza Diária Corte de plantas semestral Limpeza semanal e corte de plantas anual Colmatação de leitos Eficiência condicionada fatores climáticos e colmatação dos leitos Colmatação de leitos Operações regulares de manutenção realizadas Limpeza e desobstrução de tubagens Limpeza e desobstrução de tubagens Limpeza e desobstrução de tubagens Limpeza e desobstrução de tubagens Limpeza, desobstrução de tubagens, corte de plantas Periodicidade de manutenção Limpeza Bissemanal Limpeza Bissemanal Limpeza Bissemanal Limpeza Bissemanal Limpeza Diária Problemas de funcionamento Eficiência condicionada por fatores climáticos e proliferação de plantas Eficiência condicionada por fatores climáticos e proliferação de plantas Eficiência condicionada por fatores climáticos e proliferação de plantas Eficiência condicionada por fatores climáticos e proliferação de plantas 32 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 Colmatação de leitos Colmatação de leitos Colmatação de leitos investigação Figura 10 Valores de precipitação mensal total em 2010 [6]. Figura 11 Eficiências mensais das ETAR de Albardo/Vila Fernando (A) e de Pega (B). Precipitação mensal total em 2010 220 200 Prec. 2010 180 Normal 1971-200 Precipitação (mm) 160 140 120 100 80 60 40 20 Dez-10 Nov-10 Set-10 Out-10 Jul-10 Ago-10 Jun-10 Abr-10 Mai-10 Mar-10 Jan-10 Fev-10 0 sedimentos, raízes e detritos de plantas, que tendem a preencher os interstícios do meio de enchimento. Nestas condições, a capacidade percoladora dos leitos fica consideravelmente reduzida, impossibilita a infiltração do efluente através do meio poroso, provoca a sua inundação superficial e causa a perda de eficiência. A perda de eficiência resultante das condições meteorológicas faz-se sentir essencialmente na época de chuvas, quando o aumento significativo do caudal a tratar condiciona o processo, devido à fraca capacidade de resposta dos leitos de macrófitas à alteração deste fator [5]. Não obstante, a análise da variação dos parâmetros CQO, CBO5 e SST em função do volume de precipitação durante o ano 2010, nem sempre evidencia esta perda de eficiência (Figuras 10 e 11). Na verdade, os valores de precipitação mais elevados ocorreram nos meses de janeiro a março e de outubro a dezembro, não se verificando um decréscimo de desempenho em todos esses meses. Os casos de incumprimento são pontuais e podem identificar-se em meses de menor precipita- ção, como por exemplo acontece no mês de julho na ETAR de Albardo/Vila Fernando; e no mês de maio na ETAR de Pega. Nestes casos, desconhecem-se os fatores que afetaram o funcionamento dos sistemas. Com vista a minimizar os problemas operatórios, todos os sistemas de tratamento realizam operações de manutenção, nomeadamente, a limpeza do sistema de gradagem (diária ou bissemanal), a desobstrução de tubagens (sempre que necessário) e o corte de plantas (semestral ou anual). Em todas as ETAR são efetuadas análises ao efluente antes e depois do tratamento. A regularidade das análises realizadas varia de bimensal (ETAR Quintãzinha do Mouratão) até semestral (ETAR de Arzila) (Tabela 2). Uma maior frequência na realização das análises permitiria melhorar o controlo do processo e garantir a deteção precoce de problemas no tratamento. Os resultados apresentados na Tabela 3 permitem fazer uma avaliação ao desempenho dos sistemas de tratamento, durante o ano 2010, comparando os parâmetros monitorizados com a legislação em vigor. Por comparação com os valores típicos de uma água residual doméstica, as águas residuais brutas recebidas nas ETAR estudadas apresentam concentrações elevadas (CBO5 e CQO), médias (SST e Azoto) e baixas (Fósforo) para os parâmetros analisados. Verifica-se ainda, com exceção dos sistemas de Borralheira, Orjais e Vales do Rio, que os sistemas de tratamento cumprem os valores limite definidos no decreto-lei n.º 152/97 para os parâmetros de CBO5, CQO e SST. Os compostos de fósforo e azoto não têm obrigatoriedade de cumprimento uma vez que a descarga das águas residuais tratadas não se efetua em zonas classificadas como sensíveis em nenhum dos casos. A análise da eficiência global de tratamento revela que os sistemas estudados apresentam um bom desempenho na remoção de CBO5, CQO e SST, tornando evidente o potencial de utilização deste tipo de processo. Todos os sistemas de tratamento respeitam os valores impostos na legislação relativamente Tabela 3 Valores e percentagens médias de redução dos parâmetros monitorizados, no ano de 2010. ETAR CBO5 [mg/l O2] CQO [mg/l O2] SST [mg/l] Fósforo P [mg/l P] Azoto N [mg/l N] Valor limite de descarga: 25* Ef. mínima legal: 70-90%* Valor limite de descarga: 125* Eficiência mínima legal: 75%* Valor limite: 35* Eficiência mínima legal: 90%* Valor limite: 2* V. limite: 15* Urbano Entrada Saída % Redução Rural Rural Rural Rural Rural Rural Urbano 1 - ETAR de Albardo/Vila Fernando 650,0 17,8 97,3 948,6 59,2 93,8 527,4 8,8 98,3 4,3 20,6 2 - ETAR de Pega 392,7 14,5 96,3 660,0 54,3 91,8 295,3 9,2 96,9 3,6 23,6 3 - ETAR de Quintãzinha do Mouratão 920,9 20,7 97,7 1.316,0 61,7 95,3 558,3 14,5 97,4 3,6 20,6 4 - ETAR de Vela 458,0 13,9 97,0 676,4 41,3 93,9 439,2 8,8 98,1 4,0 14,8 5 - ETAR Borralheira I 464,0 49,0 89,4 621,0 106,0 82,9 329,0 18,0 94,5 Não Medido Não Medido 6 - ETAR de Coutada 482,0 16,0 96,7 593,0 32,0 94,6 423,0 16,0 96,2 Não Medido Não Medido 7 - ETAR de Orjais 403,0 30,0 92,6 571,0 58,0 89,8 250,0 11,0 95,6 Não Medido Não Medido Não Medido 8 – ETAR de Vales do Rio 778,0 35,0 95,5 926,0 70,0 92,4 1.004,0 16,0 98,4 Não Medido 9 - ETAR de Arzila 238,0 23,0 90,3 483,0 96,0 80,1 210,0 23,0 89,1 2,6 35 10 - ETAR do Penedo 34,0 <5,0 85,3 120,0 <30,0 75,0 68,0 12,0 82,4 Não Medido Não Medido * Definido no decreto-lei n.º 152/97 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 33 investigação Tabela 4 Valores de eficiência para os leitos de macrófitas das ETAR de estudo. CBO5 [mg/l O2] ETAR CQO [mg/l O2] SST [mg/l] Eficiência % Eficiência* % Eficiência % Eficiência* % Eficiência % Eficiência* % 1 - ETAR de Albardo/Vila Fernando 96,6% 77,3% 91,1% 63,8% 96,7% 48,3% 2 - ETAR de Pega 95,4% 76,3% 88,2% 61,8% 93,8% 46,9% 3 - ETAR de Quintãzinha do Mouratão 97,2% 77,8% 93,3% 65,3% 94,8% 47,4% 4 - ETAR de Vela 96,2% 77,0% 91,3% 63,9% 96,0% 48,0% 5 - ETAR Borralheira I 86,8% 69,4% 75,6% 52,9% 89,1% 44,5% 6 - ETAR de Coutada 95,9% 76,7% 92,3% 64,6% 92,4% 46,2% 7 - ETAR de Orjais 90,7% 72,6% 85,5% 59,8% 91,2% 45,6% 8 – ETAR de Vales do Rio 94,4% 75,5% 89,2% 62,4% 96,8% 48,4% 9 - ETAR de Arzila 87,9% 70,3% 71,6% 50,1% 78,1% 39,0% 10 - ETAR do Penedo 81,6% 65,3% 64,3% 45,0% 64,7% 32,4% Valor Médio 92,3% 73,8% 84,2% 59,0% 89,4% 44,7% * Eficiência dos leitos em relação ao sistema de tratamento global (tratamento primário e secundário). às percentagens mínimas de redução destes parâmetros (decreto-lei n.º 152/97), com exceção das ETAR de Arzila e Penedo, que apresentam incumprimento relativamente ao valor limite de remoção SST, ainda que em percentagem reduzida (Tabela 3). A Tabela 4 apresenta a eficiência dos leitos de macrófitas no que se refere à remoção de CQO, CBO5 e SST. Uma vez que as ETAR estudadas não monitorizam a qualidade do efluente à saída do tratamento primário, esta avaliação considerou os valores médios de eficiência para o tratamento primário indicados por Oliveira (2008): CQO (30%), CBO5 (20%) e SST (50%). Como se pode verificar, a eficiência dos leitos de macrófitas varia entre 81,6 – 97,2% (CBO5), 64,3 – 93,3 % (CQO) e 64,7 – 96,8 % (SST), encontrando-se dentro das gamas apresentadas por Oliveira (2008). Estes resultados evidenciam que os leitos de macrófitas desempenham um papel preponderante na remoção de poluentes, em particular, da matéria orgânica afluente aos sistemas. Segundo a avaliação efetuada, verifica-se uma remoção média de 73,8% de CBO5 e de 59% de CQO, relativamente à eficiência global do processo, sendo o restante eliminado no tratamento primário. 7. CONCLUSÃO O presente trabalho mostra que os sistemas de tratamento com leitos de macrófitas são eficientes no tratamento de águas residuais 34 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 domésticas provenientes de pequenos aglomerados populacionais. Estes sistemas destacam-se pela sua simplicidade e pela reduzida mecanização, o que permite a realização de operações de manutenção por operadores não especializados, contrariamente aos sistemas convencionais, que obrigam a um controlo por operadores com elevada qualificação técnica. As condições de operação dos sistemas de tratamento estudados indiciam falhas no que respeita ao acompanhamento e controle do processo, revelando a necessidade de uma monitorização mais regular por parte das Entidades Gestoras, de forma a avaliar/identificar fatores que influenciem a eficiência de tratamento e a otimizar o funcionamento dos sistemas. A fase de funcionamento assume também grande importância, no que respeita às tarefas de manutenção, sendo necessário a implementação de procedimentos de inspeção e manutenção adequados. Na maioria dos casos, não existem dados relativos ao método de dimensionamento dos leitos. No entanto, é sabido que os fatores condicionantes da eficiência estão frequentemente relacionados com a fase de projeto, pelo que se destaca o interesse da obtenção e análise desta informação para melhorar os critérios de dimensionamento a aplicar em futuras instalações. Por falta de informação, não foi possível conhecer os valores de custo final (conceção e construção) e de manutenção dos sistemas. Agradecimentos Dr.ª Orlanda Carvalho e Eng.ª Sónia Pais - Águas da Serra, S.A. Dr. Renato Craveiro - Águas do Zêzere e Côa, S.A. Eng.ª Patrícia - Câmara Municipal de Vila de Rei Sr. Vasco Gravata - Águas do Mondego, S.A. Referências [1] R. Kadlec, R. Knight, J. Vymazal, H. Brix, P. Cooper, R. Haberl, “Constructed Wetlands for Pollution Control - Processes, Performance, Design and Operation”, IWA Publishing, London, 2000. [2] M. Seco, “Avaliação de leitos de macrófitas no tratamento de águas residuais domésticas em Portugal: sistemas de fluxo sub-superficial horizontal”, Tese de Mestrado, Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, 2008. [3] Consulta dos sites: silverplains.ca, projectomontantejusante.blogspot.pt/, en.wikipedia.org/wiki/ Typha_latifolia, dias-com-arvores.blogspot.com, afloredeau.com, em 10 de março de 2011. [4] J. Oliveira, “Estudo da Influência do Material de Enchimento na Remoção de Matéria Orgânica, Azoto e Sólidos em Leitos de Macrófitas do Tipo ESSH”, Dissertação de Mestrado, Lisboa: Faculdade de Ciências e Tecnologia, 2008. [5] J. Ribeiro, “Estudo do Comportamento Hidráulico de Leitos de Macrófitas”, Dissertação de Mestrado, Instituto Superior Técnico – Universidade Técnica de Lisboa, 2007. [6] Boletim Climatológico Anual 2010, Instituto de Meteorologia, I.P., Consulta do site www.meteo.pt, em 18 de março de 2011. ÁGUA Water JPI: um consórcio transnacional para a Água apoiado pela Comissão Europeia O objetivo do programa é implementar sistemas hidrológicos sustentáveis e eficazes para a economia europeia e mundial. A iniciativa é suportada financeiramente pela Comissão Europeia através da ação WatEUr. A Water JPI é uma das Iniciativas de Programação Conjunta criadas para desenvolver e implementar agendas estratégicas de investigação comuns, visando sobretudo o reforço da cooperação transfronteiriça da coordenação e da integração dos programas de investigação dos Estados Membros em domínios societais considerados essenciais para a Europa. Numa entrevista ao portal Ciência Hoje, Enrique Playán, coordenador do Water JPI (Joint Programming Iniciative), elege cinco principais desafios do programa. O primeiro é a manutenção da sustentabilidade do ecossistema. Neste domínio, serão desenvolvidas atividades nas áreas da engenharia ecológica, ecohidrologia, gestão dos efeitos de ocorrências extremas, como cheias e secas, sobre os ecossistemas. Serão também levadas a cabo ações no âmbito do conceito de serviços ecossistémicos. O segundo desafio é o desenvolvimento de sistemas seguros de água potável para os cidadãos. Aqui, serão focados os poluentes emergentes da água, o seu tratamento e a gestão de riscos. O coordenador do programa revela também preocupação com os milhares de quilómetros de infraestruturas hídricas em processo de envelhecimento, bem como com os efeitos das enchentes urbanas. O terceiro desafio diz respeito à competitividade na indústria da água. Neste âmbito, Enrique Playán esclarece que estão previstas atividades de Inovação, Desenvolvimento e Inovação de apoio à purificação, tratamento, reutilização e dessalinização da água. O quarto desafio relaciona-se com a implementação da economia de base biológica e com o aumento da pressão sobre os recursos das águas resultantes da integração das atividades agrícolas e florestais. Uma das grandes preocupações neste domínio é a prossecução da eficiência dos recursos na agricultura, silvicultura, aquacultura e nas indústrias relacionadas. O alívio da poluição dos recursos naturais daí resultante constitui outra área de atividade elencada por Enrique Playán. O quinto desafio é o fecho do ciclo da água, que se traduzirá em atividades que possibilitem uma gestão sustentável dos recursos hídricos e o fortalecimento de abordagens socioeconómicas na gestão da água. O responsável anunciou também, para 2013, um concurso piloto para apresentação de propostas de projetos de investigação. Enrique Playán explicou que a Water JPI ganhará visibilidade mediante o desenvolvimento de atividades conjuntas, que se prevê venham a materializar-se em “partilha de boas práticas do financiamento de Investigação, Desenvolvimento e Inovação (IDI), partilha de resultados de IDI, financiamento de networking de grupos de IDI em torno de temas específicos, financiamento de projetos de IDI através de consórcios multinacionais, estabelecimento de programas de mobilidade transnacional para cientistas e tecnólogos e desenvolvimento e exploração de infraestruturas de IDI”. Atualmente, a Water JPI conta com o envolvimento de 18 países: Áustria, Chipre, Dinamarca, Finlândia, França, Alemanha, Irlanda, Israel, Itália, Holanda, Noruega, Polónia, Portugal, Roménia, Espanha, Turquia, Reino Unido e Moldávia. Em Portugal, a representação das Iniciativas de Programação Conjunta, nas quais se insere este programa, está a cargo da Fundação para a Ciência e Tecnologia. www.waterjpi.eu Alteração à Lei abre a privados subconcessão total ou parcial dos sistemas de gestão de águas residuais A Lei n.º 35/2013, publicada em Diário da República, determina a possibilidade de subconcessão total ou parcial a privados dos sistemas multimunicipais para captação, tratamento e rejeição de águas residuais, noticiou o portal Dinheiro Digital e a agência Lusa. O documento altera a Lei n.º 88-A/97, de 25 de julho, que limitava “o acesso da iniciativa económica privada a determinadas atividades económicas”. Até agora, apenas as “empresas com capital social maioritariamente subscrito por entidades do setor público”, nomeadamente autarquias, podiam exercer atividades de “captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, recolha, tratamento e rejeição de águas residuais, em ambos os casos através de redes fixas, e recolha e tratamento de resíduos sólidos urbanos, no caso de sistemas multimunicipais e municipais”. Com a nova lei, Estado ou os municípios a quem foi concessionada a gestão de sistemas intermunicipais passam a poder subconcessionar, “total ou parcialmente”, as concessões “relativas à captação, tratamento e distribuição de água para consumo público” e a “recolha, tratamento e rejeição de águas residuais urbanas” a empresas “cujo capital seja maioritária ou integralmente subscrito por entidades do setor privado”. A lei salvaguarda que a “exploração dos recursos do subsolo e dos outros recursos naturais”, que pertencem ao Estado, “será sempre sujeita ao regime de concessão ou outro que não envolva a transmissão de propriedade dos recursos a explorar”. O Governo justificou esta lei com “a necessidade de aumentar a concorrência e a eficiência do setor” e com a necessidade de “uma restruturação do setor das águas e dos resíduos sólidos urbanos, também para superar os problemas vigentes de sustentabilidade económico-financeira”. INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 35 Alterações Climáticas e Conservação da Natureza Testada nova técnica de sequestro de dióxido de carbono A técnica, desenvolvida por cientistas do Laboratório Lawrence Livermore, nos EUA, e divulgada no portal Ciência Hoje, consiste em detetar o dióxido de carbono através de líquidos iónicos. Os líquidos iónicos obtêm-se pela conversão de sal na fase sólida em líquido, que se dá no ponto de ebulição da água. Este processo permite separar o dióxido de carbono da fonte inicial de uma forma mais eficiente e estável em comparação com os processos existentes. A nova técnica, testada em laboratório, permitirá que a separação do dióxido de carbono libertado por combustíveis fósseis seja feita de uma maneira eficaz, de modo a obter melhores resultados para o meio ambiente. De acordo com os especialistas do Laboratório Lawrence Livermore, o uso de líquidos iónicos neste processo apresenta vantagens como “maior estabilidade química, baixa corrosão, e uma grande variedade de escolha de iões, que podem ser otimizados para a solubilidade de dióxido de carbono”. “É uma grande vantagem ter um método que pode rapidamente e com precisão calcular a solubilidade de dióxido de carbono em qualquer solvente”, diz Amitesh Maiti, responsável pela investigação, já publicada na revista especializada ChemSusChem. O investigador salientou também que este processo, além de mais limpo, pode ser também muito mais acessível às empresas. Projeto ZEroCO2 potencia redução das emissões de dióxido de carbono em mais de 20 por cento em cinco municípios do Alto Alentejo Os Planos de Ação para a Sustentabilidade Energética (PASE) dos concelhos de Alter do Chão, Avis, Marvão e Sousel foram aprovados pela Comissão Europeia. A elaboração dos PASE destes cinco municípios contabilizou cerca de 300 medidas de implementação, que se traduziram num investimento de aproximadamente 7 milhões de euros, que potenciará a redução de cerca de mais de 20 cento das emissões de dióxido de carbono. A aplicação da estratégia traduziu-se na identificação de medidas de ação concretas, agrupadas segundo distintos setores de intervenção, nomeadamente: edifícios municipais, edifícios residenciais, edifícios de serviços, iluminação pública, semaforização, transportes municipais e transportes públicos e particulares, repercutidas em estimativas de redução de toneladas de CO2. Estas medidas de ação concretizam um potencial de redução das emissões de CO2 que supera os 20% regulamentados pela UE e pelo Pacto de Autarcas: Alter do Chão (33%), Avis (28%), Gavião (33%), Marvão (30%) e Sousel (24%). O projeto ZEroCO2 contemplou ainda o desenvolvimento de um Contrato de Desempenho Energético sob a forma de concurso público verde para implementação de medidas de promoção de utilização de energias renováveis, nomeadamente instalação de sistemas solares térmicos e de um sistema a biomassa, os quais permitirão reduzir mais de 115 toneladas de CO2, num investimento total de cerca de 170 mil euros. No seu âmbito, teve ainda lugar uma campanha transnacional (“Caravana do Clima”), com o objetivo de alertar para a importância da eficiência energética e da adoção de um estilo de vida mais sustentável e energeticamente mais eficiente. Em Portugal, teve os seus pontos de paragem 36 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 principais nos Concelhos de Avis, Sousel, Alter do Chão, Gavião e Marvão, tendo sensibilizado mais de 1.300 alunos, professores, empresários e técnicos municipais. O projeto teve como parceiros portugueses a AREANATejo e a CIMAA (Comunidade Intermunicipal do Alto Alentejo), tendo sido implementado nos Municípios de Alter do Chão, Avis, Gavião, Marvão e Sousel, tendo terminado em abril. www.medzeroco2.eu/pt-pt Resíduos Renascimento aposta na modernização para reciclagem e tratamento de resíduos de elétricos e eletrónicos A Renascimento verificou a obtenção de uma taxa de reciclagem de cerca de 93 por cento, complementada com uma taxa de valorização energética de 5,5 por cento. Deste modo, foi possível à empresa ultrapassar as metas de gestão previstas na legislação, para além de aumentar a sua de capacidade produtiva, respondendo, assim, às necessidades do mercado e das entidades gestoras com as quais tem contrato (AMB3E e ERP) no que respeita à gestão deste fluxo específico. Tais medidas contribuíram para a consolidação da Renascimento no mercado da gestão de resíduos, tendo sido reconhecida, ao nível da sua atividade global, com o estatuto “PME Excelência 2012”. www.renascimento.pt PUB. Com o objetivo de aumentar a capacidade produtiva e maximizar a reciclagem, a Renascimento modernizou e a automatizou a sua unidade de descontaminação, tratamento e reciclagem de Resíduos de Equipamento de Elétricos e Eletrónicos (REEE) na sua unidade de Loures. Os resultados, de acordo com a empresa, estão a ser positivos, tanto na perspetiva da sua elevada capacidade de produção, como da sua eficiência em termos de triagem e tratamento, atingindo-se índices de reciclagem elevados. Toda a conceção e o desenvolvimento da linha de triagem foram projetados pelos meios internos da empresa, que garante ter obtido índices de reciclagem e valorização sem precedentes. Como prevenir a produção de resíduos? Para responder ao desafio de medir a ausência de resíduos, os autores do estudo “Measuring waste prevention”, da Universidade Aberta de Chipre, analisaram os vários métodos e concluíram que a melhor solução a adotar é combinar o melhor de cada um. A prevenção da produção de resíduos é considerada fundamental para resolver o conflito entre o crescimento económico e os danos causados ao ambiente. Em 2008, a totalidade de resíduos produzida na União Europeia foi calculada em 2.62 biliões de toneladas, ou 5.2 toneladas por pessoa, um volume que tem vindo a aumentar. A prevenção, definida como redução da quantidade e/ou toxicidade dos resíduos, assume-se, portanto, como uma prioridade. A Diretiva Quadro dos Resíduos posiciona, aliás, a prevenção, como uma prioridade, ao invés da reciclagem. Neste sentido, os Estados Membros terão de desenvolver planos de prevenção até ao final deste ano. os autores do estudo sugerem que uma monitorização efetiva e uma avaliação da prevenção devem ser as principais prioridades como parte deste esforço. Concluíram também ser relevante esclarecer alguns conceitos. Foi identificada uma confusão recorrente entre reciclagem e redução. Para definir políticas de atuação é necessário realizar estudos sobre atitudes e comportamentos, aliados a dados como as vendas de recipientes de compostagem, por exemplo. www.amarsul.pt INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 37 energia Ferramenta de planeamento para melhorar fluxo de energia e materiais nas cidades Um estudo conduzido no âmbito do projeto EU Bridge teve em conta o metabolismo de cinco cidades europeias para desenvolver e avaliar um Sistema de Apoio a Decisões (Decision Support System - DSS), uma ferramenta que pode aferir as opções de planeamento para um desenvolvimento urbano sustentável. Uma cidade pode ser equiparada a um ecossistema: um sistema com energia e materiais que circulam na cidade e na sua envolvente. O problema é que, ao contrário do que acontece nos ecossistemas, o fluxo de energia e materiais nas cidades não é autossuficiente. Analisar as atividades humanas e ambientais que definem o “metabolismo urbano” das cidades permite que estes sistemas sejam manipulados através de estratégias de desenvolvimento urbano. O metabolismo urbano considera e quantifica os inputs, outputs e armazenamento de energia, água, nutrientes, materiais e resíduos em regiões urbanas. O estudo “Sustainable urban metabolism as a link between bio-physical sciences and urban planning: The BRIDGE project” foi feito em cinco cidades, usadas como caso de estudo, com perfis muito distintos. Helsínquia tem grandes gastos com aquecimento, Atenas com arrefecimento. Londres é um exemplo de uma megacidade, Florença uma cidade histórica e Gliwice, na Polónia, uma cidade que experi- mentou uma recente e rápida mudança económica, social e política. Os responsáveis pelo planeamento local e desenvolvimento urbano em cada cidade identificaram objetivos de sustentabilidade distintos, como a melhoria da qualidade do ar ou a redução do efeito de ilha de calor. Esta ferramenta permite aferir o impacto de diferentes opções de planeamento concebidas para alcançar esses objetivos em vários domínios ambientais, ou seja, nas relações entre energia, água, carbono e poluentes e fatores socioeconómicos, como custos com habitação e emprego. Cada comité de responsáveis decidiu sobre a importância relativa de cada objetivo e chegou a acordo sobre as medidas a implementar. Identificaram uma parte da cidade que precisava de ser redesenhada e propuseram três soluções alternativas práticas. O DSS analisou dados relativos a padrões locais de energia e atividade humana e aferiu o impacto de cada uma das três soluções para a energia, água, carbono e fluxo de poluentes em cada cidade. Em cada um dos cinco casos de estudo, chegou-se à conclusão que os espaços verdes tinham um efeito positivo para alcançar os objetivos de sustentabilidade, devido aos seus efeitos no arrefecimento, sequestro de dióxido de carbono ou melhoria da qualidade do ar. Em contrapartida, aumentar o número de edifícios e estradas teve efeito negativo. Embora estes resultados fossem esperados, a DSS foi capaz de quantificar os resultados e relacioná-los com objetivos de sustentabilidade. Os diagramas são fornecidos pela ferramenta, e ilustram cada efeito das opções de planeamento nos fluxos ambientais. De acordo com os investigadores, um dos pontos fortes do DSS é o facto de os objetivos poderem ser selecionados para corresponder a diferentes prioridades que podem mudar ao longo do tempo. Foi também focado o facto de o DSS não fornecer, provavelmente, uma solução de planeamento definitiva para uma cidade que vá de encontro a todos os seus objetivos de sustentabilidade, pelo que a ferramenta não vai simplificar o processo de planeamento urbano. www.ec.europa.eu Estudo: desflorestação pode pôr em causa produção de energia hídrica Um grupo de investigadores brasileiros e americanos concluiu que a desflorestação pode reduzir significativamente a quantidade de energia produzida por centrais hidroelétricas na área. Os pesquisadores concluíram que a floresta tem um papel fundamental na formação dos rios que fazem girar as turbinas. Se as árvores da Floresta Amazónica continuarem a ser derrubadas, a energia produzida pela central hidroelétrica de Belo Monte, com conclusão prevista para 2019, pode ficar um terço abaixo do previsto. De acordo com Marcos Costa, da Universidade Federal de Viçosa, em Minas Gerais, e um dos autores do estudo, a novidade trazida por este trabalho consistiu na constatação de que a “desflorestação na Floresta Amazónica como um todo, mesmo fora da bacia do Xingu (onde Belo Monte está a ser construída), pode afetar a geração de energia em Belo Monte”. Os efeitos da desflorestação fazem-se sentir, de acordo com Daniel Nepstad, também autor do estudo, em toda a Amazónia, bem como em África e no Sudeste Asiático. www.energiasrenovaveis.com 38 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 ENERGIA | GESTÃO E ECONOMIA Preço global dos painéis solares baixou em 2012 Os preços das tecnologias de energia solar baixaram de 209 mil milhões de euros em 2011 para 183 mil milhões em 2012. Esta descida ajudou a reduzir o custo global do investimento em energias renováveis. Esta redução tem sido alimentada pelos fabricantes chineses, tendo a União Europeia anunciado novas taxas de importação sobre os painéis solares fabricados naquele país, alegando que estão a ser vendidos a um preço mais baixo do que no país de origem ou abaixo do custo de produção. O ano passado, a China investiu 50 mil milhões de euros em energia renovável, ao passo que o investimento dos Estados Unidos foi de 27 mil milhões e o da totalidade dos países europeus foi de 60 mil milhões. Segundo um relatório elaborado pelo think tank REN21 e apoiado pela ONU, a queda dos preços das tecnologias de energia solar no ano passado ajudou ao crescimento contínuo da energia renovável. A capacidade de criação global de energia a partir de fontes renováveis aumentou em 115 gigawatts em 2012, em comparação com os 105 gigawatts do ano anterior. A capacidade instalada de energia renovável aumentou para mais de 1.470 gigawatts, o equivalente a cerca de 1.500 reatores nucleares. Dois terços de toda a energia renovável criada provém ainda da energia hidroelétrica, mas a eólica e a solar têm vindo a ganhar terreno. A capacidade global das células fotovoltaicas atingiu 100 gigawatts o ano passado, de acordo com o relatório, citado pelo Greensavers e pelo Huffington Post. Cenfim diminui as emissões de dióxido de carbono em 22,26 toneladas O Centro de Formação Profissional da Indústria Metalúrgica e Metalomecânica (Cenfim) registou uma diminuição do consumo de dióxido de carbono em 2012, segundo atesta o relatório de sustentabilidade ambiental da empresa. Apesar de um aumento de 5,67 toneladas de emissões derivadas do consumo de gasóleo, as emissões associadas ao consumo de gasolina e de gás para aquecimento diminuíram, tendo-se mantido o nível de emissões associadas ao consumo de petróleo. O Cenfim assegura também o cumprimento, em todos os estabelecimentos, dos limites mínimos e máximos que definem as condições de monitorização das emissões poluentes para a atmosfera, previstas nos artigos 19º e 20º do Decreto-Lei n.º 78/2004 de 3 de Abril e na tabela n.º 1 da Portaria n.º 80/2006. Além de monitorizar os Efluentes Gasosos, o Cenfim procede também à monitorização de possíveis fugas de água de modo a evitar derrames. Este procedimento é feito semestralmente, embora seja realizado em períodos trimestrais ou mensais quando é detetada uma fuga. Em 2012, e segundo o relatório, houve uma diminuição do consumo de água nos estabelecimentos do Centro de Formação. Essa diminuição deve-se a medidas como a colocação de garrafas cheias dentro dos autoclismos. Também no consumo de materiais houve uma diminuição. Em 2011 houve um consumo de 51,271 toneladas de chapas e perfis de aço, enquanto que em 2012 o consumo destes materiais decresceu para 48,407 toneladas. No que toca à gestão de resíduos, o Cenfim obedece às regras e princípios gerais previstos na legislação nacional no que concerne à separação seletiva e catalogação de resíduos, bem como ao envio dos resíduos a entidades licenciadas para a gestão, às operações de transporte, quantificação dos resíduos produzidos e sua comunicação anual através do mapa de registos do SIRAPA. Em 2012, o CENFIM investiu também 18.110,36 euros em proteção ambiental, tendo este valor sido orientado para a monitorização de emissões gasosas e do ruído ambiental, recolha de resíduos, construção de uma chaminé num dos estabelecimentos, renovação do registo no SIRAPA, auditoria de acompanhamento ISSO 14001 e aquisição de bacias de retenção e ecopontos. Segundo Joaquim Armindo, Diretor do Departamento de Qualidade, Ambiente e Segurança e Saúde do Cenfim, a instituição preocupa-se com o “envolvimento consciente de todos os colaboradores na defesa do ambiente”. “A responsabilidade social de toda a organização e de cada um de per si, a eficiência energética, mas fundamentalmente um crescimento cultural que torne o homem e a mulher fazedores e construtores dessa mesma melhoria ambiental” são as preocupações elencadas por Joaquim Armindo. Já para Manuel Grilo, diretor do Cenfim, o impacto gerado pelo impacto do trabalho da instituição nos clientes, colaboradores, meio envolvente e fornecedores tem sido de “profunda utilidade para o entendimento global da sustentabilidade”. www.cenfim.pt INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 39 GESTÃO E ECONOMIA Comissão Europeia incentiva utilização de infraestruturas verdes A comissão pretende melhorar a investigação e o acesso ao financiamento e apoiar projetos de infraestruturas verdes. A estratégia adotada em maio pela Comissão Europeia visa não só incentivar a utilização de infraestruturas verdes como também assegurar que a melhoria dos processos naturais é sistematicamente tida em conta no domínio do ordenamento do território. A infraestrutura verde é um instrumento que recorre à natureza para criar benefícios ecológicos, económicos e sociais. A título de exemplo, em lugar de construir infraestruturas de proteção contra as inundações, esta solução permite que as zonas húmidas naturais absorvam o excesso de água das grandes chuvadas. Para o comissário do Ambiente, Janez Potočnik, trata-se de «proporcionar à sociedade soluções que lhe permitam cooperar com a natureza, em vez de a prejudicar, sempre que tal faça sentido do ponto de vista económico e ambiental». Além disso, a infraestrutura verde pode ser mais barata e mais resistente do que as alternativas convencionais. Os parques ricos em biodiversidade, espaços verdes e corredores de ar fresco podem, por exemplo, atenuar os efeitos negativos das vagas de calor estivais. Por outro lado, tornam as cidades mais atraentes para viver e trabalhar. Com esta estratégia, pretende-se promover as infraestruturas verdes nos domínios da agricultura, silvicultura, ambiente, água, mar e pescas, política regional e de coesão, atenuação e adaptação às alterações climáticas, transportes, energia, prevenção de catástrofes e políticas de utilização dos solos. Até ao final de 2013, a Comissão vai elaborar orienta- ções para demonstrar como a infraestrutura verde pode ser integrada na aplicação destas políticas entre 2014 e 2020. É também objetivo da Comissão melhorar a investigação, reforçar a base de conhecimentos e promover tecnologias inovadoras que apoiem as infraestruturas verdes, bem como melhorar o acesso ao financiamento para os projetos de infraestruturas verdes, sendo que até 2014, a a Comissão vai criar, juntamente com o Banco Europeu de Investimento, um instrumento de financiamento da UE destinado a apoiar projetos de infraestruturas verdes. A Comissão tenciona também apoiar projetos de infraestruturas verdes a nível da União Europeia, estando prevista a realização de um estudo, até ao final de 2015, para avaliar as possibilidades de desenvolver uma rede de infraestruturas verdes à escala da União. Até ao final de 2017, a Comissão vai analisar os progressos no desenvolvimento da infraestrutura verde e publicar um relatório sobre os ensinamentos obtidos, juntamente com recomendações para a ação futura. www.ec.europa.eu Coberturas verdes podem aumentar custos de abastecimento de água nos climas temperados No estudo “Green roofs in European climates. Are effective solutions for the energy savings in air-conditioning? Applied Energy”, Fabrizio Ascione et al. simularam as necessidades energéticas de um edifício de escritórios, bem isolado, de cobertura plana com vários tipos de vegetação. Estes requisitos foram comparados com os do mesmo edifício com uma cobertura tradicional ou uma cobertura com uma camada altamente refletiva. O estudo focou-se na viabilidade técnica e económica da utilização de coberturas verdes como forma de poupar energia nos edifícios. A eficiência energética e o custo foram avaliados tendo em conta diferentes tipos de condições climáticas na Europa, desde os climas amenos de zonas do Sul como Tenerife, Sevilha e Roma aos mais frios de Amesterdão, Londres e Oslo. Os resultados demonstraram que as cobertu- 40 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 ras verdes reduziram as necessidades energéticas, quando comparados com as coberturas tradicionais, especialmente no verão. A utilização de coberturas verdes diminuiu as necessidades de energia entre 1 e 11 por cento em Tenerife, 0 e 11 por cento em Sevilha e 2 e 8 por cento em Roma, dependendo do tipo de vegetação. Nos climas frios também se registou uma diminuição das necessidades energéticas (4 a 7 por cento em Amesterdão e Londres e até 6 por cento em Oslo). Foram também analisados os custos associados às diferentes coberturas. Nos climas frios, as coberturas verdes revelaram-se mais benéficas em termos de custos do que as tradicionais. No entanto, os custos com o abastecimento de água nos climas amenos superaram os benefícios da diminuição das necessidades energéticas. Em Sevilha, os custos anuais com energia e água com uma cobertura tradicional ficaram apenas 32 euros acima dos custos de utilização da vegetação mais adequada para uma cobertura verde. Os autores sublinham, no entanto, que o uso de sistemas de controlo inteligente poderia otimizar o uso de água e reduzir alguns dos custos associados às coberturas verdes. Os pesquisadores estimaram os custos de instalação de uma cobertura verde e compararam com as poupanças anuais no uso de energia. Em todas as zonas climáticas, o período de retirno foi longo, e no sul da Europa, por exemplo, não chegou a haver retorno do custo de instalação. Os investigadores concluíram que apesar de as coberturas verdes trazerem poupanças energéticas significativas, podem não ser o melhor método, em termos de custo-benefício, para os edifícios na Europa. www.ec.europa.eu GESTÃO E ECONOMIA ”Há [no Brasil] uma procura de melhorar os centros de recolha que existem hoje em dia” Sedimentada a presença no Brasil, a Tnl entrou já noutros mercados da América Latina e também no mercado árabe, com o maior projeto de contentorização enterrada do mundo, em Abu Dhabi. Nuno Lopes, CEO da Tnl A entrada da Tnl no Brasil deu-se há cerca de dois anos. Com um parceiro local, foram estabelecidos os primeiros contactos para a criação da Tnl no Brasil. De acordo com o CEO da Tnl, foi um processo algo “surpreendente”, porque apesar de se tratar de um mercado distinto do português, a receção aos equipamentos da Tnl foi muito boa. Nuno Lopes explica que, apesar de se tratar de um mercado com características próprias, apresenta grande curiosidade por produtos com tecnologia produzida à medida. A entrada no mercado brasileiro foi feita em parceria com alguns agentes locais, de modo a beneficiar do conhecimento que têm do mercado. A partir daqui, a Tnl implementou os seus projetos nas principais cidades do Brasil, nomeadamente São Paulo, Fortaleza e Rio de Janeiro. Trata-se, segundo Nuno Lopes, de projetos “bastante ambiciosos e com objetivos muito interessantes”. O CEO da Tnl reconhece “claramente uma procura de melhorar os centros de recolha que existem hoje em dia e de baixar os custos de exploração”. Nuno Lopes caracteriza os equipamentos da empresa como um “instrumento para otimizar todo o trabalho de logística da recolha dos resíduos”. Além das zonas principais da cidade, a Tnl está também a trabalhar nas comunidades. Aqui, o impacto do projeto-piloto já foi avaliado e o roll-out vai já ser iniciado. Nuno Lopes salienta que apesar de as comunidades serem vistas “um pouco à margem do sistema tradicional”, a Tnl encontrou mais-valias e problemas que os seus equipamentos resolvem. Trata-se de “criar condições para que se faça uma recolha e um aprovisionamento dos resíduos que proteja a saúde pública”. Partindo do Brasil como plataforma de lançamento, a Tnl tem já projetos noutros países sul-americanos. A empresa tem equipamentos no centro de Lima, capital do Peru, e também projectos na Argentina, no Uruguai e no Chile. gentes com várias funcionalidades. Abu Dhabi é, agora, uma plataforma e showroom para a entrada noutros mercados Árabes. Encontrar soluções para as necessidades dos clientes Nuno Lopes define a especialização da Tnl como a procura de soluções para os seus clientes, de modo a resolver alguns problemas de contentorização de resíduos, problemas esses que podem ir dos gastos com a recolha às questões de saúde pública e dos resíduos a céu aberto. Os problemas podem também ser causados por questões de enquadramento paisagístico ou de eficiência. Todos os mercados, seja o português, brasileiro ou de Abu Dhabi, estão conscientes, de que os clientes em todo o mundo têm estes problemas. O CEO explica que os equipamentos da Tnl permitem cumprir objetivos, sendo que a forma como esses objetivos são alcançados vai depender das necessidades das empresas de recolha dos municípios que recorrem aos serviços da Tnl. Por exemplo, em Abu Dhabi o acesso aos equipamentos é condicionado a um cartão, enquanto que na Avenida Faria Lima, em São Paulo, o equipamento é de acesso exclusivo aos condóminos do prédio que o pagaram. A contentorização enterrada é uma das formas encontradas pela Tnl de fazer face aos problemas dos seus clientes, como por exemplo, no que toca ao furto de resíduos. Além do facto de serem equipamentos invioláveis, é possível fazer face ao problema do espaço, dando resposta às questões de enquadramento paisagístico e redução dos custos operacionais, como aconteceu em Abu Dhabi. Contentores inteligentes em Abu Dhabi A Tnl é responsável, segundo Nuno Lopes, pelo maior projeto do mundo de contentores enterrados, localizado em Abu Dhabi. Aqui, a empresa criou uma solução para 80 por cento dos resíduos, dispondo de contentores inteliINDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 41 tecnologia Unidade Separação Metais e Desmantelamento REEE’s da Transucatas na Maia A Transucatas, S.A. tem vindo a capacitar-se com diferentes equipamentos e unidades para a transformação, triagem, reciclagem e limpeza. Neste sentido, foi recentemente instalada na Maia uma unidade de separação de metais e desmantelamento de resíduos de equipamento elétrico e eletrónico (REEE). Com esta unidade, a empresa pretende criar uma mais-valia na valorização de metais recorrendo a moderna tecnologia. A nova unidade assegura o cumprimento de todas as exigências da Diretiva Europeia REEE sobre a reciclagem de resíduos de equipamento elétrico e eletrónico, garantindo, simultaneamente, a otimização de toda a área de implantação. Composição da Unidade O início da linha é composto por um destroçador inicial de correntes para separação grosseira dos materiais constituintes dos REEE. Este equipamento obriga o material no seu interior a grandes velocidades, e por ação do impacto contra a parede deste, provoca a separação/ quebra dos elementos de maior dimensão, sendo que os elementos mais pequenos saem ainda intactos, permitindo que constituintes prejudiciais para o ambiente, como as baterias ou os condensadores, permaneçam intactos. Vista geral da unidade de desmantelamento de REEE’s A linha contempla ainda uma cabine de triagem manual, com capacidade para 12 postos de trabalho, para incremento da qualidade do produto final. A capacidade de processamento da unidade é de 4 a 6 toneladas por hora, consoante a origem e composição do material, permitindo obter materiais mais homogéneos, o que garante um melhor escoamento para o mercado final, pois obtém-se um produto sem qualquer necessidade de triagem. Do processo de triagem manual resultam materiais como metais ferrosos e não ferrosos, plásticos vários, têxteis e também papel/cartão. Desta separação resultam também pilhas e baterias, cabos elétricos e, por vezes, moedas. destroçador Inicial Alimentador da Unidade 42 Um dos fluxos de entrada de resíduos INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 Cabine de Triagem Manual tecnologia Fileiras Triadas e Produtos Finais Além da sucata gerada, as restantes frações metálicas serão separadas no processo. Os materiais plásticos e têxteis são separados dos metais, cujo fluxo é encaminhado para um contentor para posterior classificação. A maior parte segue para a Unidade de Produção de Combustíveis Derivados de Resíduos (CDR) da SGR, ou para valorização de plásticos na Extruplás. Após o destroçador, o material passará por diversos equipamentos, de forma a garantir a separação dos metais ferrosos e não ferrosos, cujos fluxos entrarão em dois tapetes diferenciados. Entre os equipamentos de separação eletrónica, a unidade está capacitada de separadores magnéticos, óticos e separadores de metais não ferrosos (separador de Foucault). Cubas de Armazenamento Monitor do Processo Cabos Elétricos Eletro-íman – separa ferrosos Pilhas e Baterias Metais Ferrosos Separador de Foucault – separa metais ferrosos de não ferrosos PUB. Cabine de Triagem Manual INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 43 PRODUTOS E TECNOLOGIAS Solução de apoio ao processo de recolha de resíduos da Cachapuz Na década de 90, a Cachapuz iniciou uma aposta na investigação, desenvolvimento e no lançamento no mercado de soluções para a automatização dos processos de expedição para áreas da indústria. O setor dos resíduos foi um dos contemplados, inicialmente através da idealização e conceção de software específico para a pesagem de resíduos e soluções de pesagem em self-service e, posteriormente, de um sistema informatizado de apoio à atividade da recolha seletiva de resíduos. O SPAR (Sistema de Planeamento e Análise de Recolha) é uma solução informática de apoio ao processo de recolha de resíduos (seletiva e de indiferenciados). Este permite às empresas realizarem a gestão de ecopontos e pontos de recolha de contentores, e ainda de rotas de recolha, manutenção e limpeza. O sistema realiza a georreferenciação e visualização cartográfica dos ecopontos e dos percursos efetuados pelas equipas de trabalho, gera relatórios de atividades, com referência a quantidades recolhidas, quilómetros e horas gastos por equipa de trabalho e viatura, entre outros, faz uma previsão de níveis de enchimento dos contentores e emite alertas, procedendo ao envio automático de indicadores através de dispositivos eletrónicos móveis. As populações podem ainda dar a sua contribuição através de plata- formas web ou via sms, potenciando a eficácia de resposta às suas necessidades. Esta solução foi desenvolvida de forma modular para que tenha uma adaptação transversal a toda a área de gestão de resíduos. Além disso, o SPAR precipitou a informatização do processo de recolha seletiva, eliminando as folhas de controlo manuais e possibilitando a gestão integrada de toda a informação do processo. Com isto, as empresas reconheceram, segundo a Cachapuz, uma clara redução de custos e de tempo na realização das operações, para além de terem adotado mecanismos eficazes e flexíveis para análise e tratamento da informação obtida. Esta informação passou a ser analisada cruzando várias variáveis e introduziu a visualização em formato cartográfico. A solução de recolha seletiva de resíduos mereceu já o prémio da ValorSul e a atenção do programa televisivo BIOSFERA, transmitido na RTP2, ambos em 2009. A atual implementação no mercado desta solução de recolha e gestão de resíduos é assegurada pela parceria de mais de 20 anos da Cachapuz com a Universidade do Minho. Esta parceria já resultou em várias teses de Mestrado, nomeadamente “Mineração de Dados para suporte à decisão no processo da Recolha Selectiva – Optimização de Rotas” e “Determinação de Frequência de Recolhas aplicando Técnicas de Mineração de Dados”. Fosera – Kit para energia autónoma da FF Solar Novo detetor monogás Tango da industrial Scientific Trata-se de um kit pequeno, portátil e versátil que permite, segundo a empresa, um acesso fácil à energia elétrica, a partir da energia solar. Permite a ligação de lâmpadas led da fosera, de design robusto e com vários tipos de utilização, como por exemplo lâmpadas de mesa, ventiladores, rádio e carregador de telemóveis. Estes sistemas fosera representam nova tecnologia de baterias de lítio e tecnologia de células solares cristalinas (vida útil acima de 20 anos). Para o PSHS, já estão disponíveis várias lâmpadas, um carregador de telemóvel e um rádio. Outros produtos, como por exemplo ventoinhas ou mesmo pequenos projetores, estão em fase de teste. Além da função de carregador de telemóveis, a função principal do fosera PSHS é a alimentação de sistemas de iluminação. Cada módulo PSHS pode alimentar várias lâmpadas de alto brilho durante vários anos sem que seja necessário substituir as baterias ou as lâmpadas. Os dois sistemas fosera (PSHS e LSHS) possibilitam a ligação até quatro consumidores diferentes (por exemplo, quatro lâmpadas de 160 lm cada). O design modular permite a instalação paralela de quatro sistemas para satisfazer o aumento do consumo de energia. www.cachapuz.com A F.Fonseca, representante da Industrial Scientific, apresentou o novo detetor monogás Tango. A F.Fonseca assegura três anos de funcionamento sem troca de bateria, o que, aliado à tecnologia DualSense, incrementa o nível de segurança do operador, independentemente da frequência de realização dos testes de reação, o que contribui para a redução dos custos de manutenção. A tecnologia DualSense inclui dois sensores iguais na deteção do mesmo gás (CO, H2S, SO2 e NO2). As leituras dos dois sensores são processadas por um algoritmo desenvolvido pela Industrial Scientific e apresentadas ao utilizador como uma medição única. Alimentado por uma bateria de lítio substituível, o Tango pode ser utilizado de forma contínua até três anos, mesmo com a configuração opcional always on. Findo este período, a bateria pode ser substituída para mais três anos de operação em contínuo. O equipamento e sensores (CO e H2S) têm uma garantia de três anos, sendo que os sensores de SO2 e NO2 apresentam uma garantia de dois anos. www.ffonseca.com www.ffsolar.com 44 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 PRODUTOS E TECNOLOGIAS Novo site da KSB otimiza-se para telemóvel Convenção de distribuidores BOGE 2013 No segundo semestre de 2012 a KSB reformulou totalmente o seu site, www.ksb.pt, não só em termos de design, que é agora mais moderno e dinâmico, mas também em termos de funcionalidades (acessos rápidos, busca de contactos), apresentação por aplicações (páginas de todas as aplicações em português), documentação técnica (disponível junto às páginas das aplicações) e interatividade (dezenas de vídeos para apresentar aplicações, produtos, características técnicas, etc.). Em termos de velocidade, acesso ao software de seleção, acesso ao catálogo de produtos e informações técnicas, o site mantém as performances e capacidades do anterior. Uma nova e inovadora funcionalidade foi recentemente acrescentada ao site: ao ser acedido através de um telemóvel, deteta imediatamente este tipo de dispositivo e reformata-se, de modo a adaptar-se aos ecrãs mais pequenos, ficando disponível mais rapidamente e sendo mais fácil e rápido navegar nele. Neste formato, mantêm-se as funcionalidades de download de documentação técnica, o acesso às informações técnicas e notícias e a procura pelos contactos, entre muitas outras, sendo mais rápido e fácil realizá-las. O site disponibiliza também uma aplicação para Iphone/Ipad ou Android, que permite calcular a poupança energética de um grupo eletrobomba utilizando um motor de eficiência aumentada (modelo SuPremE, da KSB), face a um motor IE 2 ou IE3. Esta aplicação está disponível para download através do link indicado no artigo técnico sobre motores de eficiência aumentada (http://www.ksb.com/ksb-pt/Informacoes_tecnicas-noticias_ch/Info_tecnicas_e_noticias2/729020/Motores_do_futuro.html). Decorreu a 23 e 24 de maio, na cidade de Elche, em Alicante, a convenção de distribuidores da BOGE. Marcaram presença todos os distribuidores espanhóis e portugueses, bem como a diretora comercial da sede alemã, que apresentou os novos produtos, como os Geradores de Azoto. Ricarda Fleer destacou também o êxito da nova série S-3 com os blocos compressores effilence de fabrico BOGE. Segundo Marcos Raña, diretor-geral da BOGE Ibérica, “nos últimos anos o Marketing e a atenção prestada às necessidades do cliente/utilizador ganharam relevância”, apesar de a palavra mais pronunciada nestas reuniões ser a qualidade, aliada à eficiência, explicou. De acordo com um comunicado de imprensa da empresa, apesar do “panorama geral de crise, a BOGE Compressores encara o futuro com otimismo”. A inovação contínua, a qualidade e a atenção prestada ao cliente/utilizador são, segundo a empresa, “as armas que sustentam o crescimento verificado em Portugal e Espanha”. www.ksb.pt Sistema de controlo preditivo da Ciengis O Plantegrity é um sistema de controlo preditivo utilizado na otimização económica de processos industriais químicos, petroquímicos e de produção de energia, capaz de melhorar o desempenho de unidades de tratamento e valorização energética de resíduos e de produção de biocombustíveis. Permite, segundo a empresa, minimizar desperdícios, custos e perdas na produção, maximizar a utilização da capacidade produtiva, aumentar a qualidade e conformidade do produto final, atingir níveis mais elevados de eficiência energética e melhorar o controlo de emissões e performance ambiental. O Plantegrity utiliza tecnologias de ponta para prever em tempo real o comportamento dinâmico de processos industriais, através do processamento online de dados históricos e correntes, e calcular as alterações ótimas de controlo para obter os melhores resultados. www.ciengis.com Jornada de portas abertas No dia 25 de maio, BOGE realizou uma jornada de portas abertas no Palácio de Congressos de Elche. Empresas da região, clientes e amigos puderam verificar, com a ajuda dos responsáveis e departamento técnico da BOGE, as melhorias tecnológicas dos novos compressores effilence serie S-3. www.boge.com Caudalímetro Ultrasónico não intrusivo PDFM5.0 – a melhor solução portátil para a monitorização de caudais Desenvolvido pela Greyline, o caudalímetro ultrasónico PDFM 5.0 é um equipamento portátil e, segundo a empresa, robusto e de instalação não intrusiva. A Zeben assegura que é o mais indicado para avaliar o desempenho dos caudalímetros já instalados nas condutas, funcionando assim como um aliado no combate a perdas de carga e também na aferição da precisão ou calibragem de outros caudalímetros existentes na instalação. O seu sistema totalmente user friendly permite que sua instalação, calibração e operação sejam feitos em poucos minutos. Está apto a funcionar em todo o tipo de líquidos, inclusive esgotos, lamas e químicos. Além da função de caudalímetro, PDFM5.0 tem também um datalogger integrado com capacidade para 300.000 registos que, entre outras funções, permite a elaboração de caudais com base em hora, data e valores máximos, mínimos, médias, totais e número de vezes do acontecimento. A medição é feita através do método Doppler, que elimina e ignora todo o tipo de ruídos e interferências. Pode, segundo a Zeben, ser montado em qualquer tipo de conduta com diâmetros de 12.5mm a 4500mm (DN12 a DN4500). www.zeben.pt · www.aquacontrol.pt INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 45 estante Ingeniería para la sostenibilidad Este livro proporciona aos engenheiros a informação necessária para conceber processos, produtos e fluxos de valor sustentáveis. Expõe o consenso atual existente sobre desenvolvimento sustentável em quatro níveis de contexto ou subcontexto: Planeta, Sociedade, Empresa e Engenheiro. São também abordadas todas as etapas que um projeto requer: desde a definição do problema, mediante a síntese de possíveis soluções, a análise e melhoria dessas soluções, até à avaliação da solução. Ara cada etapa do projeto, proporcionam-se os métodos e as diretrizes relacionadas com o objetivo de obter uma solução sustentável: uma solução que satisfaça tanto as necessidades das pessoas como todas as restrições específicas do contexto, no que respeita ao planeta e à prosperidade. Autores: Gerald Jonker; Jan Harmsen · ISBN: 9788429179781 · Editora: Reverté Número de páginas: 115 · Idioma: Espanhol · Data de edição: 2013 Preço: 37,21 euros, à venda em www.engebook.com Climate Chance! O livro “Climate Chance! Uma reflexão jurídico-económica do mercado de carbono no combate às alterações climáticas” nasce da inquietude gerada pelas mudanças climáticas. A obra procura também romper o dogma da falta de competitividade da economia verde, relegada para segundo plano pela crise financeira. É dada prioridade à análise das diferentes estratégias de controlo ambiental para combater os efeitos dos Gases com Efeitos de Estufa, colocando o enfoque nos mecanismos de mercado, essencialmente no mercado de carbono. Os “instrumentos de controlo”, para terem efeito sobre as alterações climáticas, têm de assentar numa visão de ambiente como recurso económico. Foi, aliás, neste contexto que o mercado de carbono, lançado no âmbito do Protocolo de Quioto, ganhou força. Não se afigurando como a única solução, é uma opção cost effective que apresenta, em certos casos, vantagens consideráveis face à introdução de impostos. Nas palavras de Carlos Pimenta, autor do prefácio, Climate Chance “consegue conjugar o rigor de um texto de cariz jurídico com a fluência e facilidade de leitura de quem escreve para o “grande público” (...) propõe-nos desafios e apresenta soluções, a cada leitor a responsabilidade de responder.” Autores: Autores: Ivone Rocha, João Quintela Cavaleiro e Paulo Caetano · ISBN: 9789892038469 · Editora: Publindústria Número de páginas: 304 · Idioma: Portugês · Data de edição: 2013 PUB. Preço: 28,90 euros, venda em www.engebook.com 46 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 Crimes e Contraordenações Ambientais ”Armazenagem” e ”recolha” de resíduos para transporte são conceitos diferentes Isabel Rocha é Mestre em Direito e Advogada. Exerce a advocacia desde 1991, sendo Senior Partner na RMV & Associados – Sociedade de Advogados, RI. recolha de resíduos para posterior transporte, ainda que implique deposição e mistura, não constitui armazenamento nos termos legalmente previstos, conforme foi decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa. “ o tribunal afirmou que não se podia concluir que tais resíduos tivessem sido armazenados nas instalações da empresa, mas, pelo contrário, seria forçoso concluir que se tratou de uma operação de recolha (...) No âmbito de uma ação inspetiva, a autoridade ambiental constatou que uma empresa tinha recebido resíduos numa das suas instalações, que não possuía licença de armazenamento, e que os fez transportar, no mesmo dia, para outras instalações devidamente licenciadas, sitas noutro local. Em face disso, a autoridade ambiental entendeu que a empresa procedeu à deposição e armazenamento de resíduos nas suas instalações, sem a necessária licença, e condenou-a numa coima de € 30.000,00 pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelas disposições conjugadas dos artigos 23.º, n.º 1, e 67.º, n.º 1, alínea b) do Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de setembro, com a redação à data dos factos. A empresa não se conformou com a decisão e impugnou-a judicialmente. Porém, o tribunal de 1.ª instância confirmou a condenação, com base no entendimento de que qualquer deposição temporária de resíduos consubstancia uma operação de armazenamento, considerando, assim, que a empresa procedeu a uma operação de gestão de resíduos sujeita a licenciamento. Novamente inconformada, a empresa interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, alegando que, in casu, se estava perante uma operação de recolha e transporte não sujeita ao licenciamento do artigo 23.º, n.º 1, isto é, que não se estava perante qualquer tipo de armazenamento sujeito a licenciamento. O Tribunal da Relação de Lisboa, por Acórdão de 17/02/2011, in www.dgsi.pt, considerou que o Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de setembro, que estabelece o regime geral da gestão de resíduos, tem distintas definições para “armazenagem”, “descarga” e “recolha”, entendendo, assim, que o conceito de “armazenagem” não pode ser coincidente com o de “recolha”, isto é, tem que entender-se que a preparação de resíduos para o seu transporte, ainda que implique deposição, mistura e mudança de transporte, não constitui armazenamento. O Tribunal concluiu, ainda, que “o armazenamento sujeito à licença de que a empresa não dispunha é a deposição temporária e controlada de resíduos, por prazo determinado, antes do seu tratamento, que excluí as operações de apanha, seletiva ou indiferenciada, de triagem e ou mistura de resíduos com vista ao seu transporte, que constituem a recolha de resíduos.” Com efeito, tendo ficado apenas provado que os resíduos em questão foram enviados para instalações duma empresa não licenciadas para armazenamento, e que esta, no mesmo dia, os reenviou para outras instalações suas, o tribunal afirmou que não se podia concluir que tais resíduos tivessem sido armazenados nas instalações da empresa, mas, pelo contrário, seria forçoso concluir que se tratou de uma operação de recolha, que não estava sujeita a licenciamento nos termos do n.º 4 do artigo 23.º, pelo que absolveu a empresa da contraordenação que lhe havia sido imputada. INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 47 PESSOAS E EMPRESAS PRÉMIO CARREIRA Conceição Alvim Ferraz Perita da Comissão Europeia para o Ambiente Percurso de vida Conceição Alvim Ferraz tem o Curso Superior de Piano pelo Conservatório de Música do Porto, é Licenciada e Doutorada em Engenharia Química e Professora Agregada em Engenharia do Ambiente pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP). Foi Professora na FEUP, Diretora Técnica da Comissão de Gestão do Ar da Área Metropolitana do Porto e Diretora Geral do Centro Tecnológico da Cortiça. Atualmente está aposentada, é Professora Convidada da FEUP, Perita da Comissão Europeia para o Ambiente e no Technical Group Steel 9, e colaboradora da Universidade Agostinho Neto, de Luanda. Tem como domínios de especialização a poluição atmosférica, a avaliação e gestão da contaminação de solos e o desenvolvimento de novos processos para produção de biodiesel. É autora de mais de 300 publicações técnicocientíficas, das quais mais de 100 em revistas internacionais com arbitragem científica. Mantém uma forte ligação à música clássica, é colecionadora de Presépios e autora do livro “Nós nos Presépios”. Reside em Santa Maria da Feira; é casada, tem duas filhas e quatro netos. 48 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 “preocupa-me que a crise económico-social que vivemos conduza ao relaxamento do esforço que veio a ser feito, pondo em causa o que foi conquistado a muito pulso” Qualidade do ar e de vida Os estudos de impacte da qualidade do ar na saúde e na qualidade de vida dos portugueses não permitem ainda tirar conclusões que se possam generalizar. No entanto, as concentrações de partículas em suspensão nas zonas urbanas merecem preocupação. Curiosamente, mesmo em áreas remotas com concentrações de ozono elevadas, os estudos efetuados demonstraram que há efeitos no agravamento da asma infantil. Fiscalizar o cumprimento da legislação A legislação portuguesa dispõe dos instrumentos necessários para a preservação da qualidade do ar. É, no entanto, necessário fazer um controlo mais rigoroso da obediência aos parâmetros legislados para proteger a saúde e o ambiente. O papel da escola na consciencialização ambiental A sensibilização da população portuguesa para os efeitos da poluição na saúde e no ambiente tem evoluído muito significativamente. Para isso têm contribuído determinantemente os programas lecionados nas escolas primárias e secundárias, que transferem para as crianças e jovens hábitos culturais que têm vindo a alterar comportamentos errados. O comportamento dos mais novos tem um efeito multiplicador no comportamento dos seus familiares mais velhos, pelo que a evolução dos portugueses tem sido muito positiva. No que diz respeito especificamente à qualidade do ar, para avaliar a consciencialização que foi sendo assumida, basta pensar no sucesso que foi a habituação à proibição de fumar em locais públicos que, contra tudo o que era de esperar, se conseguiu pacificamente em muito pouco tempo. De qualquer modo, este é um assunto perante o qual os responsáveis não podem dar tréguas... A crise e possíveis retrocessos No que diz respeito à qualidade do ar, preocupa-me que a crise económico-social que vivemos conduza ao relaxamento do esforço que veio a ser feito, pondo em causa o que foi conquistado a muito pulso. Prioridade: reduzir os poluentes gerados As medidas profiláticas são quase sempre mais eficientes e económicas do que as curativas, pelo que, no que diz respeito à poluição atmosférica, é prioritário evitar que os poluentes atinjam a atmosfera. Assim, o maior esforço deve ser feito ao nível da redução dos poluentes gerados. Aos estudos dos efeitos da poluição atmosférica na saúde e no ambiente deve também ser dada uma atenção muito especial, pois só assim será possível definir os níveis de risco com mais rigor. A precaução que é necessária quando os níveis de risco não são conhecidos com rigor pode levar ao estabelecimento de exigências desnecessárias, que podem prejudicar o desenvolvimento económico. Na fase que vivemos, em que o desenvolvimento económico tem de ser também protegido tanto quanto possível, é de toda a conveniência não impor exigências para além das necessárias para preservar a saúde e o ambiente. PESSOAS E EMPRESAS Hovione B.I. Hovione Nascimento 1959 Localização da filial portuguesa Loures Foco Substâncias farmacêuticas A perspetiva de uma indústria química que produz substâncias ativas para a indústria farmacêutica. Produção industrial de antibióticos A Hovione é uma empresa química farmacêutica portuguesa, que investiga, desenvolve e produz substâncias ativas farmacêuticas. A empresa foi fundada em 1959 por Ivan Villax, investigador químico, focando-se inicialmente no desenvolvimento de processos industriais para a produção de antibióticos da família das tetraciclinas e corticosteroides anti-inflamatórios. Atualmente, a Hovione emprega cerca de 850 colaboradores, tem presença a nível mundial e cumpre os padrões de conformidade estabelecidos pelo International Conference Harmonisation (ICH), Food and Drug Administration (FDA), pelas Autoridades de Saúde dos países europeus e do Japão. Minimização do impacte ambiental Na fase inicial de cada projeto faz-se uma avaliação de todas matérias-primas que entram nos processos e dos efluentes industriais que eles geram. Avaliam-se também outros aspetos de segurança e ambiente com o objetivo de reduzir o risco/impacte do processo logo desde o início. Nesta fase procura-se, por exemplo, eliminar a utilização de substâncias perigosas, substituí-las por outras menos perigosas, reduzir as quantidades necessárias, reciclar e reutilizar o que for possível. Melhoria da eficiência energética dos produtos A redução do volume dos solventes em todas as operações dos processos (reações, processamento de misturas reacionais, lavagens de sólidos húmidos, etc.) é uma das regras básicas que os químicos da Hovione seguem e que, logo à nascença do processo, é um bom contributo para a eficiência energética do processo. Também não são usadas misturas de solventes nas reações, para facilitar a recuperação de solventes. Há também medidas que passam por eliminar passos de secagem de intermediários, simplificar o processamento de misturas reacionais e reduzir os tempos de operações demoradas (por exemplo, as separações de fases são testadas de modo a evitar formação de emulsões. O tamanho das partículas é avaliado de modo a evitar filtrações que demoram vários dias). Sistema de gestão certificado A Hovione tem um sistema de gestão integrado de segurança, saúde e ambiente certificado segundo as normas NP EN ISO 14001:2004 (ambiente) e OHSAS 18001:2007 (saúde e segurança). O sistema de gestão garante o cumprimento dos requisitos legais e outros aplicáveis e procura a melhoria contínua do desempenho da segurança, saúde e ambiente. É auditado regularmente por entidades externas e está certificado pela ISO14001 e OHSAS 18001. É efetuada formação e sensibilização contínua a todos os colaboradores, incluindo prestadores de serviços, para os aspetos da segurança, saúde e ambiente. Os planos de emergência e os meios de prevenção e resposta a emergências são periodicamente testados com base em cenários reais. As reclamações, acidentes, quase acidentes e outras não conformidades são registadas, investigadas e objeto de ações corretivas e preventivas. São realizadas avaliações de risco e impactes em todas as áreas de atividade. São estudados assuntos como características exo/ endotérmicas, possibilidades de reciclagem, tratamento de efluentes, prevenção da poluição e operações de produção seguras. Está disponível equipamento sofisticado de medida termoquímica para proceder aos estudos necessários para o processo de transposição de escala. Parcerias A Unidade de Evaporação e Permeação Gasosa, destinada à recuperação do etanol, foi instalada em 1998 e o projeto foi conduzido por uma equipa formada pela Hovione, a Sulzer (fabricante da instalação) e o INETI/IPA. O INETI/IPA acompanhou a vertente ambiental do projeto, a demonstração da estratégia de Produção Mais Limpa, através da aplicação do Manual PREPOL, prevenção da poluição nas indústrias (Peneda, 1997). Acompanhou também a ação de divulgação desta tecnologia, com o objetivo de difundir a metodologia utilizada e os resultados obtidos. INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 49 eventos 2ª edição da Conferência Internacional Wastes 8ª edição das Jornadas Técnicas Internacionais de Resíduos Depois do sucesso da primeira edição, esperase que esta conferência seja uma plataforma para cientistas e industriais dos setores da gestão de resíduos e reciclagem de todo o mundo partilharem experiências e conhecimento. A política de resíduos da UE impõe restrições à deposição de resíduos urbanos biodegradáveis (RUB) em aterros e impõe valores mínimos de valorização aos resíduos de embalagens, em que os resíduos são considerados cada vez mais fontes de recursos que devem ser valorizados, caminhandose para uma sociedade da reciclagem e do desperdício zero. Portugal está a proceder à revisão do seu Plano Estratégico de RSU (PERSU II) neste período de crise que assola a Europa. As opções a serem tomadas não podem estar divorciadas desta realidade, sem no entanto, por em causa as questões de preservação ambiental. Espera-se discutir o tema conjuntamente com os planos estratégicos dos resíduos do Brasil, de Angola e de Moçambique, com a presença de decisores técnico/políticos de relevo destes países. No escopo das metas e da estratégia seguida pela UE no que tange à restrição de deposição em aterro dos resíduos urbanos biodegradáveis, emerge a valorização biológica destes resíduos como solução. Para desenvolver o tema da Digestão Anaeróbia será organizada uma masterclass na forma de workshop técnico com orientação do Prof. Michael Kottner, da Alemanha. O equilíbrio entre efeitos económicos, ambientais e sociais será cuidadosamente discutido. O desenvolvimento de técnicas inovadoras, ferramentas e estratégias sobre a forma como os resíduos podem ser transformados em boas ideias, melhorando o desempenho ambiental global e o entendimento acerca do impacto da indústria no ambiente, bem como a análise de opções para a sua melhoria, são os objetivos-chave da conferência. www.jornadastecnicasderesiduos2013.org www.wastes2013.org CALENDÁRIO DE EVENTOS Evento Temática Local Data Informações 8ª edição das Jornadas Técnicas Gestão de resíduos para a Lisboa Internacionais de Resíduos sustentabilidade dos recursos Portugal 16 a 18 www.jornadastecnicasderesiduos2013.org julho 2013 Resíduos Braga 2ª edição da Conferência Internacional Wastes Portugal 11 a 13 www.wastes2013.org setembro 2013 Feira RWM Brasil Gestão de recursos e resíduos São Paulo Brasil 1e2 www.brasil.rwmexhibition.com outubro 2013 Feira internacional de irrigação, São Paulo SMAGUA Brasil saneamento e manejo de água Brasil 1e3 www.smaguabrasil.com.br outubro 2013 Feira tecnológica de bioenergiaValladolid Expobioenergía 2013 Espanha - 8ª edição da Feira Internacional da Bioenergia 22 a 24 www.expobioenergia.com outubro 2013 FIMAI 2013 Feira Internacional de meio ambiente São Paulo industrial e sustentabilidade Brasil 5a7 www.fimai.com.br novembro 2013 ENEG 2013 Encontro nacional de entidades gestoras Coimbra de água e saneamento Portugal 4 a 6 www.apda.pt dezembro 2013 As informações constantes deste calendário poderão sofrer alterações. Para confirmação oficial, contactar a Organização. 50 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 Indique, com base na sua experiência, qual o país/região que considera vozes ativas mais interessante e o menos interessante para a internacionalização das empresas portuguesas do setor do Ambiente e as respetivas razões (eleja apenas um para cada caso e o principal motivo). PARTICIPE seja uma voz ativa e envie-nos questões que queira ver respondidas nas próximas edições! [email protected] Maria João Martins Pedro Araújo Nuno Lopes Administradora da Ecovisão, Elevo Group Chief Executive Officer – Advanced Cyclone Systems CEO da TNL A internacionalização é algo inevitável para as empresas que pretendem crescer na conjuntura atual. Cada País tem as suas condicionantes e pensar de forma estruturada é essencial. Da minha experiência de internacionalização, países africanos em ciclo de crescimento económico e com foco na modernização das suas infraestruturas continuam a ser interessantes, salientando Angola e Moçambique. As grandes alavancas são a língua que partilhamos, as oportunidades e as políticas governamentais que promovem a proteção ambiental. Por outro lado, o Brasil tem vindo a revelar-se um mercado de entrada mais difícil para as empresas portuguesas. Os motivos são diversos mas focamse essencialmente na existência de competências internas reconhecidas mundialmente, na área Ambiental, e em algumas dificuldades burocráticas. No entanto, é um mercado cuja dimensão não deixa de ser aliciante. Simplesmente a estratégia de entrada deve ser muito bem ponderada. Falando da área que conheço melhor - o controlo de emissões gasosas e a geração de energia a partir da Biomassa - a região mais interessante para a internacionalização de empresas do setor do ambiente é a América Latina, com especial destaque para o Brasil, pela sua dimensão, afinidade cultural e crescente interesse pelo cumprimento de normas ambientais. Em países hispânicos do mesmo continente, como o Chile, a Venezuela e a Colômbia, o potencial é também elevado e a entrada nesses mercados tem provado ser até mais fácil para empresas Portuguesas. A região menos interessante é a Europa Central, sobretudo a Alemanha e a Áustria, pela sua enorme competitividade nesta área. Destaco ainda pela negativa a Itália, que é, nesta indústria, o país mais fechado a tecnologias de fora de que tenho conhecimento. No Grupo TNL, temos apostado no Brasil/América Latina enquanto mercados “interessantes”, e menos na Europa e América do Norte. A aposta passa pelas oportunidades que advêm dos níveis de desenvolvimento e sustentabilidade que o Brasil/América Latina pretendem atingir na próxima década. Contudo, este mercado trabalhado sem persistência, capacidade financeira, flexibilidade de operações, produto e parceiros locais, poderá ditar o fim de projetos promissores. A Europa/América do Norte, enquanto mercados maduros e em contexto económico menos favorável, exigem esforços comerciais e de promoção adicionais, com resultados por euro investido menos interessantes. A internacionalização deve ser ponderada e enquadrada à luz dos objetivos de cada empresa, (comerciais, notoriedade, ou outros) e tendo em conta os recursos disponíveis para o projeto, que deverão ser sempre muito inferiores aos existentes na empresa. nortada De pernas para o AR por Carlos Pedro Ferreira, Diretor Geral - Grupo Sondar Estou outra vez do outro lado do mundo e pergunto-me por que não estamos do mesmo lado. Todos percebemos que estamos, se não do outro lado, num outro lado diferente. Existem razões culturais, climáticas, étnicas, mas existem coisas que não consigo perceber, que é complicar procedimentos que deveriam ser aligeirados pelo facto de estarmos longe, por sermos precisos nesse outro lado, por sermos pessoas iguais. Este lado do mundo, bonito, não deixa de o ser pela razão de os homens complicarem o que é fácil, por nos sentirmos muitas vezes a mais, e outras a menos, por saber que meia dúzia de leis criadas ou anuladas fariam deste lugar um melhor lugar para todos. Mas não podemos ser ingénuos e pensar que ė por acaso que é complicado este lado do mundo, para quem vem desse lado, de Portugal e da Europa. Nada é por acaso e tudo se paga, e estamos a pagar anos de complicações para quem veio daqui para aí à procura de um emprego com um canudo na mão. Mas o homem é, sobretudo, um ser inteligente, e essa capacidade deve sobrepor-se aos mais primários instintos que pedem alguma vingança, e hoje este lado precisa muito dos do outro lado, coisa que ja deveríamos todos ter percebido, não só hoje, mas sempre. O crescimento necessita de mão-de-obra qualificada rapidamente, solicitação à qual as universidades não conseguem responder. O conhecimento acumulado que nós temos é útil para fazer crescer este outro mundo, e todos temos a ganhar com uma rápida aceitação dessa necessidade e do reconhecimento mútuo das habilitações académicas entre os dois mundos. No nosso lado do mundo, temos a Europa e Portugal. E Portugal em alguns domínios coisas tem feito coisas extraordinárias, como por exemplo complicar a sua própria vida, exigindo mais aos portugueses do que a própria troika. No que toca aos laboratórios, o IPAC tem exigido mais do que a European Acreditation (EA) exige aos laboratórios de cada país membro. Ja não nos bastavam os entraves, legítimos, é certo, mas dispensáveis e não recomendáveis neste momento do crescimento, deste lado do globo onde me encontro, e temos agora entraves e exigências pedidos a nós próprios, por nós próprios, por coisas desnecessárias e absurdas. Alguns dos pedidos e exigências são de tal forma bizarros, incompreensíveis, ilógicos e sem sentido, que ao serem exigidas aparecem como tendo sido uma exigência da EA, numa circular do IPAC, mas quando se pede a evidência do pedido da EA, ela não aparece. Considero gravoso e com dolo que se peça aos laboratórios coisas, dizendo-lhes que tem de ser porque os senhores da Europa assim o exigem, sabendo-se que não é verdade, ou então, se se acha mesmo que uma coisa é exigência da EA quando não o é, trata-se de desconh ecimento e incompetência. INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 51 opinião As Empresas Consultoras de Ambiente e a Crise Económica João Levy CFO na laboratórios Agroleico o IST lecciono, no Mestrado de Engenharia Civil, uma disciplina denominada de Competências Transversais. Esta disciplina, comum a todos os perfis de formação, tem como objectivo formar os alunos em áreas que em cada ano se considerem pertinentes para a sua integração profissional. Desde há 4 anos que os temas base são o empreendedorismo, a liderança, a competitividade e a inovação, com vista a incentivar os alunos a criar o seu próprio negócio e emprego. É sempre de assinalar que uma das características do tecido empresarial português é que este é constituído por mais de 97% de PME e que são estas que, à data, ainda mantêm viva a economia nacional. Ao longo das aulas a participação dos alunos é muito activa, mostrando que estes estão sedentos de formação em áreas que ultrapassem as tecnologias e que lhes facilitem a sua entrada no Mundo “lá fora”. Nas muitas discussões que vamos tendo e ao debater-se a crise económica, vem sempre à baila o chavão tão repetido por políticos e comentadores económicos: “A crise deve ser vista como uma oportunidade, e que é nestas alturas que se vêem quais são as boas empresas”. Não escondo que engalinho com este chavão e que quando o ouço por parte dos alunos, prontamente o discuto. Primeiro porque ele é geralmente proferido por quem nunca teve empresas, nem arriscou o seu dinheiro na criação de um negócio – são, como no futebol, os treinadores de bancada. Segundo, porque parece que a crise é um evento positivo e que será graças a este que o tecido económico vai 52 INDÚSTRIA E AMBIENTE 80 MAIO/JUNHO 2013 melhorar. A realidade é bem diferente: a crise traduz-se em insolvências, falências e desemprego, e muitos sonhos destroçados por quem arriscou na criação do seu negócio. A oportunidade não surge da crise mas sim da postura e personalidade que caracterizam o empresário: ambição; vontade de construir algo de seu; querer dar corpo às suas ideias; resiliência; optimismo. A crise não mata (às vezes mata!) mas mói, e é aí que o empresário se levanta e vai para a frente – não pela oportunidade mas pela sua maneira de ser. Os erros e a experiência ensinam-no e, isso sim, é bem verdade – o empresário está sempre a aprender. Na área do ambiente tudo aquilo que atrás escrevi é pura realidade; esta crise não é uma oportunidade mas sim um tornado que levou ao fecho de inúmeras empresas, arrastando para o desemprego e desalento muitos dos nossos profissionais. Contudo, concluído o período de luto, é tempo de nos levantarmos e reiniciar a nossa caminhada sem esquecer os erros efectuados. Aqui, devemos pensar um pouco; quais foram as razões principais do nosso falhanço? Certamente que a situação internacional muito contribuiu, mas ela só por si não foi suficiente. E ainda bem pois que então os resultados das nossas empresas não dependeriam de nós mas simplesmente dos outros. Assumindo as nossas falhas, diria que as principais foram a quase total dependência do sector público, a busca de um cliente único, a limitação da actividade ao país e, finalmente, o aceitar honorários inferiores ao custo dos serviços. Para que as empresas do sector se levantem, estas terão que ter uma nova postura e esta começará por procurar negócio, quer no sector privado, quer no público. Esta procura não se deverá limitar ao espaço nacional, pois que a internacionalização é imperiosa. Muito se tem falado dos nossos profissionais terem que emigrar e quão negativo é esse facto. Discordo deste sentimento pois que o Mundo global é uma realidade e da importância das redes que construirmos dependerá o nosso êxito. Desde há 5 décadas que a população portuguesa ronda os 10 milhões de habitantes, umas vezes um pouco mais, outras menos. Mas se a população estagnou, o mesmo não se pode dizer do número de escolas de engenharia que teve um crescimento exponencial: de três passámos a trinta. Para que estes profissionais tenham trabalho na área do ambiente, há que atravessar fronteiras e procurar serviços fora de portas. Os nossos profissionais estarão no estrangeiro, mas em rede, o que garantirá uma estreita relação com a casa mãe e o país. O estar fora permitirá aprender novas atitudes e trazê-las para o país, beneficiando com isso o tecido empresarial e a nossa sociedade. Alargado e diversificado o mercado, haverá que assumir um novo comportamento na apresentação dos honorários – não se podem admitir valores abaixo do preço de custo, nem o ganhar por ganhar independentemente das tarefas a realizar. A postura das empresas face ao Código dos Contratos Públicos (CCP) é inaceitável; o preço da proposta passou a ser metade da base, mais ou menos um cêntimo, mesmo quando a base já por si é ridiculamente baixa. As empresas terão de se juntar, recorrendo às associações empresariais para revisão desta prática. O preço não pode ser o único factor da decisão; para defesa de todos haverá que exigir a avaliação da competência e da valia técnica da proposta. Aprender com os nossos erros é uma virtude e muito nos ensinará a melhorar, a crise será certamente ultrapassada e as nossas empresas ganharão nova vida que passará pela diversificação e internacionalização. Não estou a adivinhar o futuro, estou a constatar: se quiser hoje em dia encontrar os nossos empresários, vou ao aeroporto. João Levy escreve de acordo com a antiga ortografia.