FACULDADE REDENTOR
INSTITUTO DE ARQUEOLOGIA BRASILEIRA
CURSO DE PÓS GRADUAÇÃO EM ARQUEOLOGIA BRASILEIRA
MARCEL IDE
ARQUEOLOGIA NA ESCOLA:
CONSIDERAÇÕES SOBRE O ENSINO DA PRÉ-HISTÓRIA
Belford Roxo – RJ
Janeiro de 2013
MARCEL IDE
ARQUEOLOGIA NA ESCOLA:
CONSIDERAÇÕES SOBRE O ENSINO DA PRÉ-HISTÓRIA
Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado
para obtenção do título de pós-graduado Lato
Senso em Arqueologia Brasileira, pela Faculdade
Redentor e o Instituto de Arqueologia Brasileira.
Orientador: Prof. Dr. JORGE NAJJAR
Belford Roxo – RJ
Janeiro de 2013
MARCEL IDE
RESUMO
O artigo apresenta um diálogo entre história, arqueologia e educação
(metodologia de ensino de história), na construção do conhecimento em sala de aula
com o conteúdo referente à pré-história. Foram discutidas as dificuldades e as
alternativas para uma melhor apreensão desses conteúdos por parte dos alunos do sexto
ano do Ensino Fundamental. Primeiramente foi analisado como foi construído o
conceito de pré-história e a sua historicidade. Após abordar arqueologia o artigo
discorre sobre metodologia de ensino de história e os Parâmetros Curriculares Nacional.
Como fruto das discussões teóricas e os diálogos presentes nesse artigo, Foi elaborada
uma análise de livros didáticos a partir de cinco proposições que tem como fio condutor
a interpretação dos conteúdos da pré-história como um patrimônio.
PALAVRAS CHAVES
Arqueologia. Educação. História. Patrimonio.
ABSTRACT
The article presents a dialogue between history, archeology and education
(methodology of history teaching), on the knowledge construction in de classroom, with
content related to prehistory. It was discussed the difficulties and alternatives for a
better understanding by sixth year class elementary school students. First of all it was
analyzed how was built the concept of prehistory and its historicity. After covering the
archeology this article discusses the methodology of history teaching and National
Curricular Parameters (Brazil). As a result of theoretical discussions and dialogues
present in this article, we present a review of textbooks from five propositions whose
was the direction of interpreting, the prehistory contents as a heritage.
Belford Roxo – RJ
Janeiro de 2013
1
ARQUEOLOGIA NA ESCOLA:
CONSIDERAÇÕES SOBRE O ENSINO DA PRÉ-HISTÓRIA
Introdução
Ao estudar a pré-história, tendo como base a historiografia clássica, comparando com
as novas concepções da história e descobertas da arqueologia, antropologia, bioarqueologia e
outras ciências que transitam pela interdisciplinaridade do tema, deparamos com questões
polêmicas. Por isso, trabalhar esse conteúdo em sala de aula para alunos do Ensino
Fundamental é um desafio para o professor, como por exemplo, cronologia, o que poderia ser
algo palpável e sólido para os alunos, se desfaz nas divisões clássicas das idades que dividem
a história. Como, podemos considerar os povos europeus na Idade Moderna, enquanto os
povos das Américas estão na pré-história? Ainda que consideremos esse termo um préconceito criado por uma historiografia que só considerava os documentos escritos como
válidos para a construção da História, continuaremos com problemas metodológicos de
ensino. Por outro lado as grandes civilizações como os Maias, Astecas e Incas, não
necessariamente se encaixam na antiguidade clássica. Essa cronologia então pode ser
substituída por metodologias de ensino capazes de minimizar essas “contradições”.
Outra dificuldade metodológica de ensino da história refere-se à ocupação das
Américas, que é pensada através dos modelos de unidade nacional, país e região. Segundo
Funari (2009, p. 9) “é necessário trabalhar as unidades nacionais e a idéia de continente
americano como uma construção. É a partir de uma série de conceitos que ainda não muito
consolidados que será possível trabalhar a pré-história e a ocupação das Américas”.
Com essas preocupações o professor de história deve buscar metodologias que melhor
permitam cumprir com a difícil tarefa de fazer os alunos refletirem sobre essas questões.
Sempre considerando as novas demandas da educação e buscando a interdisciplinaridade
como embasamento para diminuir o preconceito gerado pela historiografia clássica europeia.
Neste artigo, inicialmente, dialogamos com as várias disciplinas que abrangem a
construção do conhecimento do tema, em sala de aula. Após as discussões teóricas,
entendemos ser necessário complementar com uma análise de um dos principais instrumentos
metodológicos disponíveis para o professor: o livro didático. Para tanto selecionamos
aleatoriamente 8 dos 16 livros didáticos propostos pelo Plano Nacional do Livro Didático
2
(PNLD). A partir do produto das nossas discussões, analisaremos a apresentação didáticometodológico da pré-história nessas publicações. Como método de análise, escolhemos cinco
questões que surgiram no decorrer do diálogo entre a teoria e a nossa prática pedagógica.
História
No século XIX a preocupação com a formação das nações na Europa, estimulou a
produção histórica com influência romântica. O objetivo era escrever uma história que
buscasse as origens dos Estados e suas etnias. Peter Burke (1992) dizia que a história
tradicional diz respeito essencialmente à política, ao Estado e às guerras. Ainda no século
XIX, o historiador Leopoldo Von Ranke elabora as bases para a metodologia da história
(Wehling, 2001, p.97).
Wehling (2001) diz que, os historiadores positivistas, na época, com a afirmativa de
“apenas mostrar o que realmente aconteceu”(p.97) 1, reforçaram a ideia de reconstruir a
história totalmente objetiva, científica e pautada em documentos tidos como oficiais. Assim a
história só seria possível com documentos escritos, relegando povos ágrafos a não a terem.
Mesmo aqueles povos que possuíam alguma forma de registro2 ou escrita, não eram
culturalmente aceitos como fontes (FUNARI, 2009). Ranke (apud WEHLING, 2001, p. 101)
afirma que a necessidade de basear a história em documentos escritos, em registros oficiais, a
tornaria uma ciência. Assim nas palavras de Peter Burke (1992) “O preço dessa contribuição
foi a negligência de outros tipos de evidência. O período anterior à invenção da escrita foi
posto de lado como ‘pré-história’” (p.15).
Como não podemos voltar ao passado, o historiador se vale dos vestígios, deixados
pelo homem, como método de seu trabalho. Ele sempre considerou as fontes para contar a
história, como por exemplo, as inscrições feitas nas cavernas poderiam ser consideradas
fontes visuais. Heródoto utilizou os relatos de feitos de guerra, e esses são fontes orais. Os
cronistas contavam a história sempre se baseando em alguma fonte e a igreja preocupava-se
com seus arquivos, selecionando documentos verdadeiros dos falsos.
A preocupação com os métodos para interpretar os documentos e tornar a História
1
Com esta frase, segundo o autor, os historiadores do século XIX concluíram suas teorias positivistas.
Povos das Américas faziam uso de escrita ou sinais gráficos. Ao longo deste discorreremos sobre estas formas
de registros. O critério de escrita, aceito pelos europeus, como forma de “remontar” a História, somente
considerava os documentos oficiais.
2
3
uma ciência, levaram os historiadores a supervalorizar o documento escrito, priorizando a
autenticidade. Essa busca por metodologias, sem dúvida era necessária, mas era preciso
avançar mais. Neste sentido Wehling(2001) diz:
Se por um lado a historicização do século XIX foi positiva, no sentido de
dar à história categoria e rigor científicos, por outro lado o triunfo da
ciência física e biológicas após 1850 trouxe sérios problemas para o
pensamento histórico. O evolucionismo, neste sentido, já é um historicismo
absoluto, mas o pensamento científico no qual também se embasa,
experimentalista e em busca de leis continua declaradamente anti-histórico.
Se a história é incapaz de formular leis e de repetir experiências, e se a
ciência é por definição, a contínua aplicação de leis cognoscíveis, o singular
está excluído dela, e naturalmente, o histórico, que seria apenas o “singular
relevante” do passado. (p. 105)
Assim, Ranke (apud WEHLING, 2001) ao propor uma história científica e
metodológica, proporcionou interpretações hierarquizadas e evolucionista da história, por
parte dos historiadores positivistas, aceitando como fonte somente documentos escritos e
oficiais.
Com as idéias de que,
os documentos são traços deixados pelos pensamentos e pelas ações do
homem, escrevem Langlois e Segnobos. E March Bloch, no
Mértier d’historie : A diversidade dos testemunhos históricos é
quase infinita. Tudo quanto o homem di z ou escreve, tudo
quanto fabrica, tudo quanto toca pode e deve fornecer dados a
seu respeito (apud GLÉNISSON 1977, p. 136).
Os historiadores passam a questionar não só a metodologia da história como a sua
objetividade. Estes passam a observar a importância das fontes não escritas, à medida que
ampliam, também, os objetos de pesquisa ao propor uma história popular ou cultural. Por
outro lado, mesmo ao valer-se de documentos oficiais, o historiador começa a empregar
métodos que privilegiam também outras versões diferentes da oficial. A Escola dos Annales,
por não aceitar a historiografia tradicional, que só se preocupava com os acontecimentos
políticos, propunha a História problema, ampliando as modalidades de fontes e suas
interpretações, conforme a subjetividade do historiador. Considerando, então, toda atividade
humana importante para a História (BURKE, 1992, p.8).
4
Arqueologia
A tradição de colecionar raridades é muito antiga. Temos exemplos desde a Babilônia
passando pelas coleções da aristocracia da Itália renascentista. Neste sentido:
Dos séculos XVI e XVII, datam tentativas de por ordem nos “objetos
curiosos, raros e belos” que se amontoavam em gabinetes e galerias. E os
“objetos arqueológicos” greco-romanos: estátuas plenas e relevo,
fragmentos arquitetônicos, metais e cerâmica, colecionados desde o mais
prematuro renascimento italiano... (SANTOS, 2012)
No século XVIII, com a afirmação dos estados nacionais em busca de origens e
identidade, deu-se muito valor as coleções de objetos de arte de povos pretéritos. Assim como
a história, a arqueologia também é influenciada por esse momento, buscando raízes e
identidades. Praticado ou financiado por colecionadores de peças em museus ou em coleções
particulares, patrimônios, de povos subjugados pelo colonialismo e imperialismo, foram parar
em museus como do Louvre e de Londres. No Brasil, por iniciativa do Imperador, foram
organizadas, pelas elites, várias coleções, com o único propósito de enaltecer as origens nobre
do imperador. Não havendo nenhum sentido educacional nessa iniciativa (SANCHES, 2012,
p. 5). A arqueologia, tal como a história, apenas servia às elites e ao poder como forma de
reafirmar “superioridade”.
A arqueologia, com o objetivo de remontar as sociedades através de sua produção
material, reforça a ideia da Nova História apontada pelo historiador Peter Burke (1992). Nela
o objeto e metodologia, são as sociedades humanas e a sua produção material. Nessa linha de
pensamento, “a nova história começou a se interessar por virtualmente toda a atividade
humana. ‘Tudo tem uma história’” (BURKE, 1992, p.3). Assim a proximidade dessas
disciplinas possibilitou um ganho na tentativa da reconstrução das sociedades.
A ideia da história política, das grandes personalidades, reis, generais e guerras pouco
tem a ver com a arqueologia hoje. Neste sentido, Philip Rahtz (1986) diz que a história parece
mais atraente que a arqueologia, pois a história tradicional trabalha com os grandes
acontecimentos e com os heróis. Para ele “a história é muitíssimo mais popular que a
arqueologia porque nela as pessoas identificadas aparecem com muito mais frequência; não
são apenas pessoas, mais pessoas ‘interessantes’ como reis, generais, primeiro ministro,
ditadores, e criminosos” (RAHTZ, 1989 p. 19). Assim a arqueologia, ao remontar uma
sociedade pela sua produção material, corrobora com a ideia da história de todos os Homens,
5
reforçando a opinião anterior de que tudo tem história. Neste caso, os trabalhos de Educação
Patrimonial podem colaborar para minimizar o problema apontado por Rahtz (1989).
Pré-História
Trabalhar qualquer ciência em sala de aula requer certos cuidados no que se refere ao
senso comum. As experiências vivenciadas pelos alunos não devem conflitar com a
construção do conhecimento científico, que é um dos objetivos da escola. Além dos
problemas referentes ao próprio conceito, a pré-história nos remete necessariamente a
discussões sobre evolucionismo e criacionismo, temas polêmicos, cuja abordagem deve ser
feita cuidadosamente. Por isso a pré-história, no contexto evolucionista, deve ser trabalhada
para que se reafirme a importância tanto das ciências como do senso comum. O educador
deve partir da premissa de que as ciências fazem parte da dimensão humana, como a religião e
as experiências culturais. Contudo, a escola tem como principal objetivo a construção do
conhecimento científico.
Se reconhecermos que a pré-história é delimitada pela escrita, então, de acordo com
Funari (2009), esse período corresponde à grande maioria da nossa história. Sendo o período
que talvez tenhamos mais lutado pela sobrevivência da espécie sem identificar os heróis desse
feito, conforme expõe o autor: “Apenas 0,1% do tempo de existência do homem e dos seus
ancestrais na cadeia evolucionária corresponde ao período em que existe a escrita.”
(FUNARI, 2009, p.13).
A diversidade cultural e a ocupação humana nos continentes também são problemas
metodológicos do ensino da história. No século XIX, influenciadas pelo evolucionismo e
cientificismo, a antropologia e a arqueologia propunham uma evolução linear, na qual todos
os povos iriam gradativamente evoluindo, até chegar, obviamente, ao “patamar” dos
europeus.
No século XX, novas teorias passaram a definir que a cultura só poderia ser entendida
na sua especificidade (GOSDEN, 2012). Por isso:
O fato de que o homem vê o mundo através de sua cultura tem como
conseqüência a propensão em considerar o seu modo de vida como o mais
correto e o mais natural. Tal tendência, denominada etnocentrismo, é
responsável em seus casos extremos pela ocorrência de numerosos conflitos
sociais (LARAIA, 993, p.75).
6
Os modelos culturais nada têm a ver com escalas de progresso, porque as escolhas de
cada cultura refletem a sua visão de mundo. “Os seres humanos têm uma gama enorme de
potenciais; as histórias e formas culturais implicam desenvolver algumas dessas habilidades
e negligenciar outras” (GOSDEN, 2012 p. 65).
Podemos considerar a pré-história como um conteúdo essencial na formação da
identidade dos alunos, porque a primeira identidade é a nossa condição de seres humanos.
Conhecer a difícil jornada por que passamos faz entender como essas experiências nos
tornaram humanos. Outra discussão necessária é a nossa proximidade com a natureza, o que
nos leva a refletir sobre nossa responsabilidade com o meio ambiente.
As abordagens, quanto às datações, em diversas regiões, para tratar da pré-história,
apontam para outros problemas metodológicos do ensino de história. Segundo Funari (2009),
a história começa por volta de há 5000 anos na Mesopotâmia e Egito e 3000 anos na Grécia.
A questão da escrita para separar duas fases da “evolução humana”, mesmo vista como um
pré-conceito, pode ser uma solução teórico-metodológica; tanto para história como para
arqueologia. As dificuldades dos estudos sobre a pré-história são sua referência histórica com
a Europa. “A história era e, em certo sentido continua sendo, a história da civilização
europeia (ou ocidental), não indígena” (FUNARI, 2013, p.14).
Para as Américas, foi
adotado tudo que se referia antes da chegada de Colombo como pré-história. Esse conceito
fica inconsistente à medida que nos remete ao legado de outros povos e não dos que somos
descendentes, ou seja, esse período chamado pré-colombiano é a nossa história. Além disso, o
próprio critério da escrita não se apresenta claramente, por que:
Ainda que hoje se saiba que se usava a escrita na América já antes da vinda
dos colonizadores. Os Maias, civilização que se desenvolveu no México e
na América Central, possuíam uma escrita muito elaborada, embora usada
quase sempre em contexto religioso, ainda por ser totalmente decifrada. Os
incas usavam cordas para registrar eventos, chamados quipos. Na verdade,
muitos povos americanos tinham sistemas de registros comparáveis à
escrita, como os povos Nambiquaras e Tupis, - Na forma de pinturas
corporais, adereços e decorações de objetos. (FUNARI, 2013 p.13)
Ao descrever a pré-história do Brasil “não se pode fugir das definições correntes,
mas, ao mesmo tempo, não se deve aceitá-las de forma acrítica” (FUNARI, 2009, p. 16). O
uso conceitual de pré-história das Américas, assim, como o de arqueologia pré-histórica e
histórica na academia não chega a ser um problema. O conflito se dá em sala de aula.
Uma saída interessante foi encontrada no livro didático do 7º ano do fundamental,
7
fundação Araribá. No conteúdo das grandes navegações, a chegada às Américas é dada com o
título “o encontro de dois mundos” (Projeto Araribá, 2007, p.126), abrindo espaço para
resgatar discussões de que mundo eram esses, quais foram suas histórias e suas pré-histórias.
Entretanto, apesar do título, esse conteúdo não é explorado adequadamente. Assim nas
palavras do professor Alencar,
e os povoadores do Brasil? Quase nada se sabe sobre a vida humana até a
chegada dos europeus. Isto é muito ruim, pois passamos a analisar tudo com
noções criadas pelos colonizadores, que sempre se consideraram superiores
aos nativos. O próprio termo índio, por exemplo, é uma criação dos
espanhóis, fruto de um engano dos que se imaginavam nas Índias...
(ALENCAR, 1996 p. 5)
Os estudos da pré-história ao trazer a tona o conceito de que somos homo sapiens
sapiens, não importando a unidade cultural a que pertencemos, podem diminuir os impactos
negativos na leitura de outras unidades culturais, tidas como estranhas a nós.
O professor de história pode se apoiar em outras áreas do conhecimento para fugir das
armadilhas que levam ao preconceito e ao senso comum. Na construção do conhecimento na
escola, assuntos tão polêmicos como a pré-história e a evolução humana podem ser
sustentados pela arqueologia, no auxilio da fundamentação desses conceitos.
Gosden (2012), no capítulo sobre arqueologia do futuro, nos remete a noção de que a
sociedade contemporânea, por ser muito consumista, valoriza demasiadamente a produção
material, sugerindo que possivelmente a fonte não escrita terá muita importância para os
historiadores ou arqueólogos do futuro. Assim como os povos tidos como pré-históricos, esta
nova geração terá na produção material, provavelmente, a melhor forma de interpretar a
sociedade.
Ensino de História
A educação é uma prática exigida, por todas as sociedades, como forma de perpetuar e
aprimorar o conhecimento, bem como para atender as exigências individuais no sentido de
tornar-nos aptos a nossa atuação no meio sociopolítico. Os desafios do trabalho do professor
em sala de aula são proporcionais aos anseios da própria sociedade. E o ensino de História
sempre foi pautado pelas demandas sociopolíticas,
os currículos e programas constituem os instrumentos mais poderosos de
8
intervenção do Estado no ensino, o que significa sua interferência, em
ultima instância, na formação da clientela escolar para o exercício da
cidadania, no sentido que interessa os grupos dominantes (ABUD, 2012,
p.28 )
Uma breve recapitulação do ensino de história remonta a criação do colégio Pedro II e
do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, que tinham como preocupação maior a
formação do país Brasil. O ensino de história, passou por várias reformas que, via de regra,
atendiam aos interesses das elites. Assim sempre se privilegiava a história européia
positivista, cuja principal preocupação era a identidade nacional, os heróis e as imagens
“civilizadoras”, pois as elites acreditavam ser o exemplo a ser seguido pelo Brasil se quisesse
“progredir” como os europeus3. Para as autoridades ligadas ao ensino de história desse
período:
(...) a história do Brasil se iniciou quando os ibéricos se lançaram ao mar,
chegaram às novas terras e plantaram as sementes da civilização cristã.
Nesse momento, os nativos passaram a sofrer o processo histórico, como o
elemento passivo, somente um complemento do real sujeito da história, o
conquistado. (ABUD, ano 2012 p. 171)
Durante os anos do regime militar a lei n. 5.692/71 substituiu o conteúdo específico de
história por estudos sociais, diminuindo o peso das ciências humanas no currículo. Essa
política foi em função do desenvolvimento capitalista no Brasil, levando à criação do que foi
chamada de educação tecnicista. (SCHIMIDT, CAINELLI, 2004).
O incremento considerável da população nas grandes cidades e, consequentemente,
no sistema educacional, gerou uma inflexão, provocando demandas pela universalização do
ensino. A partir desse momento o ensino não era mais somente para as elites. Esse volume de
alunos com diversas experiências, oriundos de vários lugares e com diferentes culturas e
vivências “colocou em xeque a estrutura escolar e o conhecimento que ela tradicionalmente
vinha produzindo e transmitindo” (BITTENCOURT, 2012, p.14).
Na década de 1980 com a retomada do ensino de história de forma autônoma, abremse debates sobre questões como:
(...) o ensino crítico, centrado em discussões sobre temática relacionada
com o cotidiano do aluno, seu trabalho e sua historicidade. O objetivo era
recuperar o aluno como produtor da história, e não como mero espectador
de uma história já determinada, produzida pelos heróis personagens do livro
didáticos. (SCHIMIDT, CAINELLI, 2004 p. 12/ 13)
O ensino de história, aberto agora a discussões, tenta dar respostas a questões que
3
As duas guerras mundiais na Europa mostraram que tipo de progresso que os europeus desenvolveram.
9
demandavam da redemocratização do país. Surgem os Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCN), com o objetivo de traçar um parâmetro mínimo para todo o país, sem prejuízo para a
regionalização. Tendo também, como proposta, os eixos temáticos em substituição à história
linear. Propõem, ainda, novas metodologias de ensino, como por exemplo, trabalhar com
cultura local, história local, análise de fontes, imagens, música e etc..
Hoje, superar todas as demandas é um desafio, na medida em que, a sociedade sempre
apresenta novas questões. É o caso da “informação relâmpago”, da mídia, que concorre, com
as pouco dinâmicas, aulas tradicionais. Além disso, esta sociedade é extremamente
consumista, preocupada com o presente e sua inserção nas mudanças tecnológicas. Assim, a
escola continua sendo o reflexo da sociedade liderada pela elite. O mundo consumista e
tecnológico é,
responsável por ritmos de mudanças acelerados, fazendo com que tudo
rapidamente se transforme em passado, Não um passado saudosista ou
como memória individual ou coletiva, mas, simplesmente, um passado
ultrapassado. Trata-se de gerações que vivem o presenteismo de forma
intensa, sem perceber liames com o passado e que possuem vagas
perspectiva em relação ao futuro pelas necessidades impostas pela
sociedade de consumo que transforma tudo, incluindo o saber escolar em
mercadorias. (BITTENCOURT, 2012 p.14)
Novas metodologias são necessárias para adequar o ensino da história às necessidades
da sociedade contemporânea. Apesar de toda tecnologia, o ser humano desde as suas
primeiras aparições, guarda permanências que, a despeito das mudanças, ainda são essenciais
para sua vida em sociedade. Podemos concluir que o objeto da história são todas as coisas
inerentes ao ser humano através do tempo, no entanto tendo como referência o presente. Neste
sentido Carvalho (1998) explica que,
nada do que é humano será agora alheio ao historiador. Daí a multiplicação
de estudos sobre a cultura, os sentimentos, as ideias, as mentalidades, o
imaginário, o cotidiano. E também sobre instituições e fenômenos sociais
antes considerados de pequena importância, se não irrelevantes, como o
casamento, a família, organizações políticas e profissionais, a igreja, etnias,
a doença, a velhice, a infância, a educação, as festas e rituais, os
movimentos populares. (p.454)
As ferramentas tecnológicas, que transformam as aulas em espetáculos de mídia e os
novos caminhos da historiografia, no qual o ser humano comum é valorizado, podem ser uma
ponte para os atuais desafios. Entretanto, não podemos desconsiderar que as manifestações
culturais, embora mudem com o tempo, são inerentes aos seres humanos.
10
Quanto às dificuldades atuais das profissões de professor e historiador, Hobsbawm
observa que,
A destruição do passado - ou melhor, dos mecanismos sociais que vinculam
nossa experiência pessoal à das gerações passadas - é um dos fenômenos
mais característicos e lúgubres do final do século XX. Quase todos os
jovens de hoje crescem numa espécie de presente continuo, sem qualquer
relação orgânica com o passado público da época em que vivem. Por isso os
historiadores, cujo ofício é lembrar o que os outros esquecem, tornam-se
mais importantes que nunca no fim do segundo milênio. (1995, p.13)
A partir das discussões teóricas e metodológicas analisadas nesse artigo, relativas ao
conteúdo da pré-história, os primeiros questionamentos do professor deverão ser: qual a
importância dela? E como relacioná-la com o cotidiano dos alunos? Talvez não seja um
problema metodológico do ensino de História específico deste conteúdo, e sim da própria
disciplina. Então como contemplar essas ideias na prática em sala de aula? As demandas por
informação e os ritmos acelerados, fazendo tudo se transformar rapidamente no passado
(BITTENCOURT, 2012), potencializa as dificuldades para todos os conteúdos do ensino de
História. Neste aspecto surgem variados questionamentos, como por exemplo, os objetivos do
ensino de História no Ensino Fundamental e quais as abordagens mais adequadas.
Já que as instituições escolares refletem as demandas da sociedade, e nessas últimas
décadas, foi por inclusão social, econômica e democrática, “a manutenção de uma disciplina
escolar no currículo deve-se à sua articulação com os grandes objetivos da sociedade”
(BITTENCOURT, 2012, p.17). Podemos então concluir que estas inclusões devem estar no
centro dos objetivos das dessas instituições e deverão ser a principal preocupação dos
professores de cada área. Bittencourt (2012) afirma que o ensino de História não é uma
simples transposição do meio acadêmico para o escolar. É preciso entender que “nenhuma
disciplina escolar é uma simples filha da ‘ciência-mãe’” (MONIOT apud BITTENCOURT,
2012, p.25). Ou seja, é um processo intermediário entre dimensões como: o saber acadêmico,
os valores culturais, o senso comum, os problemas e desafios da contemporaneidade e ainda a
observação da especificidade de cada comunidade escolar. Essas constatações nos remetem a
outros problemas, como extrair de conteúdos tão complexos e totalmente desconectados com
a realidade dos alunos, como a pré-história, conceitos de cidadania e inclusão social. Uma
saída pode ser considerar a evolução humana como um patrimônio cultural por que,
11
vale ressaltar que o patrimônio histórico-cultural não constitui apenas um
acervo de obras raras ou da cultura de um passado remoto e distante, nem
serve tão só para relembrarmos nostalgicamente os tempos idos. A
valorização e o conhecimento de um bem cultural, que testemunha a
história ou a vida de um país, pode ajudar-nos a compreender quem somos,
para onde vamos, o que fazemos, mesmo que muitas vezes pessoalmente
não nos identifiquemos com o que esse mesmo bem evoque, ou ate não
aprecie sua forma arquitetônica ou seu valora histórico. O importante que
ele faz parte de um acervo histórico que deve ser preservado por toda
comunidade, pois é revelador a referencial para construção de nossa
identidade histórico-cultural (ORIÁ, 2012 p. 134).
A busca pelos valores humanos, seus bens materiais e sua relação com a natureza,
embora possam estar em temporalidades distantes, são dimensões que não podemos ignorar.
As mudanças e permanências podem ser um problema, mas auxiliam na explicação das
dimensões humanas e da sua evolução.
A cultura se realiza conforme as experiências e necessidades de cada sociedade, ou
seja, o Patrimônio Cultural, neste caso, é a própria condição humana e não a escolha por
certas tecnologias ou modo de vida. As experiências humanas, em toda a sua dimensão, são o
que podemos chamar de patrimônio. As primeiras invenções, como por exemplo, o fogo e a
revolução do neolítico são patrimônios tão importantes como a revolução industrial.
Análise de Livros Didáticos
O conteúdo da pré-história é um dos que mais proporciona a interdisciplinaridade com
as outras ciências. Ela permite o debate do sentido de ciência e de sua relação com o senso
comum. Essa é uma discussão relevante e geralmente de bastante interesse entre os alunos.
A construção do conhecimento em sala de aula, especificamente o conteúdo de préhistória, é o objeto catalisador deste artigo. Ao observarmos os debates de ordem teórica e
metodológica, feita até agora, resta-nos pô-los a dialogar com os instrumentos metodológicos
disponíveis para o professor de história: o livro didático e os PCN’s.
A proposta principal, para o conteúdo do segundo ciclo4 do Fundamental, no PCN é a
relação presente-passado com sua coletividade. Um dos objetivos da história para esse ciclo é
“reconhecer algumas relações sociais, econômicas, políticas e culturais que a sua
coletividade estabelece ou estabeleceu com outras localidades, no presente e no passado”
4
A Lei nº. 9.394, de 20 de dezembro de 1966 (Lei Darcy Ribeiro), no seu Art.23 faculta “A educação básica
organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, ....” (p.18). Os Parâmetros Curriculares Nacionais
adotam para o sistema de ensino regular do Fundamental a proposta de ciclos trianuais. O segundo ciclo
englobaria os quarto, quinto e sexto ano do Ensino Fundamental.
12
(BRASIL, 1998, p. 45). O objetivo deste, de trabalhar os conteúdos da pré-história de forma a
aproximar temporalidades distantes e temáticas complexas (como a ocupação humana, a sua
adaptação e a acumulação de conhecimentos) com a realidade dos alunos, contempla os
PCNs, pois
os conteúdos de História para o segundo ciclo enfocam as diferentes
histórias que compõem as relações estabelecidas entre a coletividade local e
outras coletividades de outros tempos e espaços, contemplando diálogos
entre presente e passado e os espaços locais, nacionais e mundiais.
Prevalecem como no primeiro ciclo, os estudos comparativos para a
percepção das semelhanças e das diferenças, das permanências e das
transformações das vivências humanas no tempo, em um mesmo espaço,
acrescentando as caracterizações e distinções entre coletividades diferentes,
pertencentes a outros espaços. (BRASIL, 1998, p. 46)
Analisamos livros didáticos indicados pelo Plano Nacional do Livro Didático (PNLD).
segundo o MEC, o referido material didático
tem como principal objetivo subsidiar o trabalho pedagógico dos professores
por meio da distribuição de coleções de livros didáticos aos alunos da
educação básica. Após a avaliação das obras, o Ministério da Educação
(MEC) publica o Guia de Livros Didáticos com resenhas das coleções
consideradas aprovadas. O guia é encaminhado às escolas, que escolhem,
entre os títulos disponíveis, aqueles que melhor atendem ao seu projeto
político pedagógico.
O programa é executado em ciclos trienais alternados. Assim, a cada ano o
MEC adquire e distribui livros para todos os alunos de um segmento, que
pode ser: anos iniciais do ensino fundamental, anos finais do ensino
fundamental ou ensino médio. À exceção dos livros consumíveis, os livros
distribuídos deverão ser conservados e devolvidos para utilização por outros
alunos nos anos subsequentes. (BRASIL, 2012)
Foram selecionados para análise oito entre os dezesseis livros didáticos da relação do
Plano Nacional do Livro Didático (PNLD). Não houve um critério pré-determinado para
seleção dos livros, apenas utilizamos os que nos foram disponibilizados em diversas escolas.
A bibliografia completa dos livros encontra-se em anexo. Para maior facilidade, foram
numerados na seguinte ordem:
1. História e vida integrada
2. História em documento imagem e texto
3. História sociedade & cidadania – nova edição
4. Novo História
5. Projeto Araribá história
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6. Projeto Radix – história
7. Saber e fazer história – história geral e do Brasil
8. Vontade de saber história
Buscaremos, dentro dos conteúdos dos livros, iniciativas que contemplem os PCNs em
seu objetivo geral para o 2º ciclo do Ensino Fundamental, que é “valorizar o patrimônio
sociocultural e respeitar a diversidade, reconhecendo-a como um direito dos povos e
indivíduos e como um elemento de fortalecimento da democracia” (BRASIL, 1998, p.45).
Serão observadas as formas de aproximar estes conteúdos com a realidade dos alunos, por
que: “Os conteúdos de História para o segundo ciclo enfocam as diferentes histórias que
compõem as relações estabelecidas entre a coletividade local e outras coletividades de outros
tempos e espaços, contemplando diálogos entre presente e passado e os espaços locais,
nacionais e mundiais” (BRASIL, 1998, p.46). Por outro lado, analisaremos, também, quanto
à proposta do próprio artigo de considerar a pré-história e a evolução humana como
patrimônio. Para tanto selecionamos as seguintes proposições de análise dos livros didáticos
acima mencionados: como são abordados,
a- o conceito de pré-história, seu surgimento e suas implicações na interpretação da história
dos povos;
b- o domínio da tecnologia nesses conteúdos e como ela é comparada a outras temporalidades
e espacialidades;
c- a cultura, nas dimensões familiar, religiosa, das artes e representações, organização social,
e sua comparação com as culturas do presente e de outras temporalidades;
d- o conhecimento dos povos, tidos como pré-históricos, e se a proposta deste artigo, de
considerar estes conhecimentos como um patrimônio, foi contemplada.
e- o uso dos conhecimentos arqueológicos como forma de ressaltar as fontes materiais e
relacioná-las com a produção material do presente.
De acordo com o item ‘a’ a discussão do conceito de pré-história é abordada em quase
todas as publicações, exceto nas 5 e 2, que tampouco usam o conceito. Já na 8 é discutida a
linha do tempo como uma construção europeia, baseada em acontecimentos que são próprios
destes povos, não significando nada para os outros. A 4 propõe interessante abordagem do
conceito de tempo à medida que considera vários tipos de periodização, destacando as
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diferentes culturas. Os exemplares 1, 3 e 7 abordam o conceito explicando sua origem no
século XIX, quando os historiadores europeus entendiam que só poderiam “remontar” a
história através de documentos escritos. No geral os livros fazem poucas discussões sobre o
conceito de pré-história e sua relação com a escrita, sua historicidade e como este é aplicado a
outras regiões como as Américas. Nenhum livro analisado levantou a questão da escrita nas
Américas e dos sinais gráficos discutido neste artigo.
De acordo com o item ‘b’, foram abordadas várias tecnologias como ferramentas, uso do
fogo, agricultura, domesticação de animais e até a linguagem. Em nenhum exemplar foi feito
comparações com tecnologias do presente ou outras temporalidades que permitissem, aos
alunos, refletirem sobre a importância dessas na acumulação dos conhecimentos. No segundo
ciclo, onde está inserido o conteúdo de pré-história dos livros do 6º ano do Ensino
Fundamental, um dos objetivos, segundo o PCN, é reconhecer as relações entre presente e
passado. Desta forma, relacionar uma simples ferramenta dos povos do passado, como um
machado de pedra, uma ponta de flecha ou uma vasilha de barro, com a importância que os
jovens dão a tecnologia atual, pode ser um meio de despertar interesse e a compreensão deste
legado.
De acordo com o item ‘c’, foram abordadas as pinturas rupestres e outras artes préhistóricas, como Stonehenge e esculturas em todos os exemplares. No 2, textos em forma de
contos remontam a espiritualidade de povos ágrafos, sugerindo suas possíveis convivências
sociais e relações culturais, comparando-as com outras temporalidades. No exemplar 3 foi
feito uma discussão entre o trabalho da mulher na agricultura do neolítico com o trabalho
delas nos dias de hoje. No 5, fez-se uma interessante discussão sobre se arte rupestre pode ou
não ser considerada arte menor em relação as outras artes. No 6, comparou-se um desenho,
supostamente do cotidiano de um grupo paleolítico, com uma rua da China e com
trabalhadores da construção civil em Jacarta. O 8, embora não faça comparações, aborda
instituições como família e religião. Apesar da maioria dos exemplares terem abordado as
dimensões culturais dentro do que foi discutido, parece que a proposição, na sua totalidade,
não foi contemplada. O uso da interdisciplinaridade envolvendo arqueologia pode ser uma
saída, porque apesar de lidar com a cultura material, essa ao processar os dados, tem como
objetivo reconstruir o modo de vida dos humanos. Assim, a ideia principal da abordagem
multidisciplinar, abrangendo a arqueologia, nos conteúdos dos livros didáticos, seria entender
que o propósito do estudo da cultura material não é a simples coleção de peças, é sim, a única
forma de tentar reconstruir o modo de vida daqueles povos. A partir desta constatação, a
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arqueologia pode ser um poderoso instrumento metodológico para a relação das dimensões
culturais dos alunos com as dos povos pré-históricos.
De acordo com o item ‘d’, quanto à proposta desse artigo de considerar o conhecimento
dos povos, tidos como pré-históricos, como patrimônio, não foi identificada nenhuma
iniciativa que considerasse esse legado. O exemplar 1, na introdução, aborda a acumulação de
conhecimento como legado. Essa idéia é interessante, mas não contempla necessariamente o
proposto aqui. Nenhum período da história talvez tenha sido tão importante, pela forma com
que os seres humanos se empenharam para sobreviver, como a, injustamente chamada, préhistória. A historiografia tradicional esqueceu um fato muito simples, mas relevante, sem os
esforços vitoriosos para sobreviver teríamos extinguido. A criatividade com que nossos
antepassados lidaram com a adversidade deve ser ressaltada como um legado tão ou mais
importante que qualquer outro episódio da história. Por que podemos afirmar que o período
da revolução industrial ou qualquer outro foi o mais importante? Só porque temos mais
informação sobre esses? Deste modo, o professor do Ensino Fundamental tem a possibilidade
de incentivar estas discussões em sala de aula, auxiliados pelos conhecimentos arqueológicos
como forma de apropriação deste patrimônio.
De acordo com o item ‘e’, o uso do conhecimento arqueológico como forma de ressaltar
as fontes materiais foi abordado em todos os exemplares. No 2, fez-se uma comparação com
a produção material do presente usando como exemplo o lixo que dispensamos. Essa proposta
seria mais interessante à medida que aprofundasse as discussões e reflexões sobre a história
como processo, como foi sugerido no trecho deste artigo que aborda sobre arqueologia do
futuro. A essência da proposta não foi retratada em nenhum dos exemplares. Esta seria uma
ideia interessante à medida que traz reflexões entre presente-passado e, de certa forma, futuro.
O diálogo, entre estas três dimensões tão complexas, poderia provocar debates que
permitissem, aos alunos, refletirem sobre o presenteismo (BITTENCOURT, 2012 p.14).
O conceito de pré-história é tratado e/ou resolvido em todos os exemplares. Há muito
que a historiografia aborda este tema. Aqueles que usam o conceito o fazem de modo a
facilitar o entendimento, mas sempre advertindo sobre a origem preconceituosa do termo.
Entendemos que os inventos, descobertas e mecanismos da pré-história são comparáveis em
importância com qualquer outro invento em outras temporalidades, porque foi, na maioria das
vezes, solução para que viéssemos a sobreviver. O que seria mais importante o telefone
celular tanto apreciado pelos alunos no presente ou a invenção da linguagem? Com essas
discussões, podemos chegar à conclusão de que não há hierarquia de importância nesse
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processo.
Diante dessa análise de livros didáticos, constatamos a falta do diálogo entre o presente e
o passado. Compreendemos que são passados tão distantes e tão diferentes e de difícil
comparação com o presente, mas uma das tarefas do professor de História é mesmo tentar
construir um conhecimento histórico, permitindo aos alunos perceber que o presente não é
dado, é sim, um processo de acumulação de conhecimento que veio dos primórdios dos
humanos.
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arqueologia na escola: considerações sobre o ensino da pré