Ergástulo Eterno Danton Medrado ERGÁSTULO ETERNO Poemas São Paulo, 2012 2ª edição Danton Medrado Ergástulo Eterno ERGÁSTULO ETERNO © 2012 - Danton Medrado Proibida a reprodução total ou parcial desta obra, de qualquer forma ou por qualquer meio eletrônico, mecânico, inclusive por meio de processos xerográficos, sem a permissão do editor (Lei nº9.610, de 19/02/1988) Revisão: Vilma Maria da Silva Capa: just beatifull, de Sixty - Bulgária http://www.sxc.hu Diagramação e arte-final: Paginanet Impressão: Perse Primeira edição: 2007 Segunda edição: 2012 Danton Medrado Ergástulo Eterno Para Vilma Danton Medrado Ergástulo Eterno Danton Medrado Ergástulo Eterno ERGÁSTULO ETERNO Mergulho a alma no café Que me abastece e aquece Ao mesmo tempo que arrefece Indícios de qualquer fé. Já que a truculência diária Me atinge, é sempre assim Quem sabe eu possa enfim, Torná-la minha proprietária. Não tenho mais amigos por perto A distância tornou-se um paradeiro, E eu que me achava aventureiro Recriei o meu inferno, decerto. Preocupar-me por quê, se tudo é moderno? Eu só não posso é aceitar Que isso venha a postular Tornar meu sonho ergástulo eterno. Danton Medrado Ergástulo Eterno NUNCA O FOI ASSIM Há uma solidão em mim Advento inusitado de estar só, O que antes tinha como meu Nunca o foi assim, O doce nunca fora tão doce E o que dizer das verdades? Há um pouco de rancor em mim Pode até soar como insensatez, Eu que me achei pioneiro E de fato nunca a tive Muito menos fui o primeiro Dos seus inúmeros prisioneiros. Há uma certa indiferença No que me resta de querer, Nunca tive o que quis Sempre o foi assim. Imaginei formas de te amar Mas no entanto... Somos tão diferentes A ponto de sermos tão iguais? Tão apaixonados somos Que não nos permitimos o toque? Quisera eu acreditar em bobagens, Mas nunca o foi assim. Danton Medrado Ergástulo Eterno COMO SE FOSSE PARA INARA Ocorreu-nos o que jamais se imaginara Sucinta alusão ao improvável, ao impossível; Destempero poético, e querer incontível, Paixão que a nenhuma outra se compara. E se contarmos passa a ser incrível O amor que até então nos resguardara São coisas que ninguém jamais sonhara Brotar em tal distância amor tangível. Se o afã dos deuses a nós dois agraciara Não há porque negar, é tão plausível Essa propulsão que nos outros é rara Que mesmo parecendo incompreensível Sou eu o seu amor distante, Inara E faço-me presente mesmo invisível. Danton Medrado Ergástulo Eterno OPOSTOS Vejo em sua vida Minha morte; No meu azar Sua sorte; No meu sofrer A sua alegria; Nas minhas trevas O seu dia. Meu lado oposto é igual Ao seu lado Nem um pouco normal. Danton Medrado Ergástulo Eterno ORVALHO DA ALMA Choveu após a meia-noite Choveu... E eu na janela da sala Como todo poeta de vida noturna Juntei as gotas que ficaram na vidraça E fiz com elas um poema molhado e sem nome. Choveu após a meia-noite Choveu... E eu a esquecer de mim Dela em mim Entre uma xícara de café E uma lembrança fugaz. Gotas de água na vidraça São como lágrimas de apartamento De apartação, de amor rompido. Vida que escorre lentamente, Gota que rola, desliza pelo rosto... Lágrima, orvalho da alma. Danton Medrado Ergástulo Eterno AGONIA A dor procura meu peito Como se fosse ali um abrigo E se instala fidalga, satisfeita Como sendo um lar antigo. Corrói-me por dentro uma angústia Que me transforma em morto-vivo Tal qual incurável moléstia, E eu sem saber qual o motivo. Morro aos poucos, e que ironia Como se fosse um vírus mortal Que se debate inútil em agonia Contra a vacina cruel e fatal. Danton Medrado Ergástulo Eterno CAPTURA E FUGA A tarde finda nostálgica São Paulo cala-se, esfria-se E lança então sua magia Nos olhos enigmáticos de uma jovem Que parece arredia Com suas olhadelas e sem riso. Chama-me de louco Louco-poeta-só A desejar um álibi, um verso, um beijo A desejar-te somente, Fulgor que cintila e queima Lantejoula acesa, termo oriental. A noite de leve chega Na suavidade da pressa No tentar fugir dos olhos Cabelos, dos gestos e da beleza Impressos no corpo De uma única mulher. Danton Medrado Ergástulo Eterno FELAÇÃO O improvável pecado Negado na confissão E que surge quando pesarosa De joelhos reza Implorando por perdão, O pecado original O mal da carne; O queimar da pele O desejo que a impele Ao contato da boca, da mão. O desmedido prazer O proibido querer Negado, pecado em religião Relacionado à submissão, O insubordinado tesão É fogo divino ou tentação? É sexo na boca, na mão É boca no membro É lábio, é língua é saliva É sexo oral Felação. Danton Medrado Ergástulo Eterno SOBRE MAÇÃS E AMORES Deitada sobre a seda de sua pele Uma maçã repousa apetitosa E toda a imaginação me impele A profanar essa visão majestosa. Fruta sobre fruta, desejo sobre desejo Sei bem que poderia ser meu Todo esse encanto de maçã, amor e pejo Desde que eu pudesse ser apenas seu. Mas não sou merecedor, nunca o fui Foste bem mais que amor, maçã, ensejo Muito mais que um simples beijo Que o amante entre alcovas usufrui. Não é para mim tamanha dádiva Óh! como dói ter que assim falar, Ver esta maçã sobre uma mulher ávida Queimando de paixão e a me chamar. Danton Medrado Ergástulo Eterno ANDARILHO Procuro O que nunca entendi, Caminho a noite nas ruas Metido em jaqueta de couro Bota “carrapeta” e calça “jeans”, Nada discreto Na certa para atrair Sem dinheiro e sem carro Hoje em dia custa caro Procurar se divertir. O jovem Já não é mais tão jovem Eu também envelheci Diferente do vinho que melhora Eu fiquei velho para mim, Dispenso as drogas e o luxo Permaneço no refluxo, Já não se ouve “rock and roll” E se houve, no passado ficou Tatuado em minha mente. Confundo-me com os demais Sou o que restou de uma época Que talvez nem eu mesmo vivi. Danton Medrado Ergástulo Eterno RESISTIR Acordo para um novo dia Como se houvesse possibilidade Mesmo que mínima De sobrevivência digna. Curvo a espinha Subjugando-me ao trabalho, O que resta de escravo em mim Reluta e tenta resistir, O que resta em mim de verme Cede ao impulso burocrático E enfim sirvo de tapete, Eis-me aqui, patrão! Se um dia fui gente Acreditem, não vivi, Mas, como bicho Sempre me encontrei disposto A servir a imbecis Desses que se fizeram grandes Ante a ingenuidade e ignorância. Desconheço o poder E por mais que digam que ele atrai Eu o renego E vou tentando resistir. Danton Medrado