Projetos e práticas de formação de professores
PROJETOS E
PRÁTICAS DE FORMAÇÃO
DE PROFESSORES
RELATOS DE EXPERIÊNCIAS
VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005
UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO
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Projetos e práticas de formação de professores
SUMÁRIO
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A ELABORAÇÃO DE UM PROJETO DE FORMAÇÃO
CONTINUADA: RELATO DO PROCESSO DE
APRENDIZAGEM E CONSTRUÇÃO COLETIVA
BRUNO, Eliane Bambini Gorgueira; ABREU, Luci Castor de
(FIZO – Faculdade Integração Zona Oeste)
APRESENTAÇÃO
Este relato se propõe a apresentar o trabalho desenvolvido na disciplina de Gestão:
Articulação do Projeto Político Pedagógico, realizado com o grupo de alunos do oitavo semestre
do curso de Pedagogia da FIZO – Faculdade Integração Zona Oeste, sob minha orientação no
período de Fevereiro à Junho/2005, cuja sistematização e registro foram realizados por uma das
alunas, co-autora deste texto.
Objetivos da disciplina neste semestre:
·
Articular os saberes construídos e os acumulados ao longo do curso
pensando nesses saberes como orientadores de nossa prática como educadores (com
foco no curso de Gestão).
·
Pensar na memória e nas possibilidades futuras, não apenas no
sentido intelectual. Mas também com a emoção, com o sentido da transformação, da
mudança e da busca interior.
Importante destacar que foram significativamente enfatizadas a dimensão
política da gestão participativa bem como a fundamental articulação entre todos os atores
da equipe gestora da escola na condução do cotidiano escolar.
Foi nesta perspectiva que iniciamos o trabalho que resultou na elaboração de um
Projeto Político Pedagógico utilizando como recurso a metáfora da construção coletiva de um
painel que teve por objetivo representar todo o processo do grupo bem como os princípios que o
fundamentaram.
INÍCIO DO TRABALHO: NOSSAS APRENDIZAGENS
A primeira atividade proposta aos alunos foi escrever individualmente sobre suas
aprendizagens (durante todo o curso e mais pontualmente em relação às disciplinas voltadas para
a área de gestão: Direção, Coordenação e Orientação Educacional).
Em seguida os alunos deveriam trocar em duplas de forma que na apresentação
para o grupo-classe, cada um falasse sobre o seu par.
Assim, surgiram as seguintes falas:
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-
Mudar é um processo que pode ser doloroso. Mas é preciso mudar. É preciso
querer mudar.
-
Qualquer coisa que se deseja fazer, começa mesmo é no desejo e na
disponibilidade pessoal.
-
Fui aprendendo sobre a arrogância de pensar que já sabia tudo...
Agora é que eu entendo o quer dizer formação continuada para toda a vida.
-
É fundamental rever a forma com que olhamos as diferenças entre as
pessoas.
-
Às vezes, falamos o que não queremos. É preciso tomar mais cuidado com isso.
Estamos aprendendo mais sobre o “olhar” e sobre o “ouvir”
-
Relações são fundamentais para o auto-conhecimento e para a auto-estima.
Precisamos olhar para o que é micro e para o que é macro.
-
Estou me esforçando para “olhar o olhar do outro”.
Percebi que acontecem retrocessos em coisas que já havíamos aprendido.
-
Não só os conteúdos são importantes. As relações e as vivências também são.
Os alunos é que me ensinam como devo ensina-los.
-
Mesmo que algo pareça eterno, precisamos sempre questionar, propor, querer.
O conhecimento nos torna mais fortes para argumentar sobre o que
-
pensamos.
Agora eu entendo que a formação não pára. É para a vida inteira.
Aprendi a argumentar com as pessoas da minha escola.
-
Aprendi a respeitar os saberes dos outros e aceitá-los com serenidade.
Eu aprendi a aceitar e me sinto grata e segura com o afeto de vocês.
-
Quando a gente erra é porque está querendo acertar.
Aprendi a ouvir mais e julgar menos.
-
Conviver é mais difícil do que parece.
Só o sonho não é suficiente. É preciso lutar.
-
Aprendi a me sentir mais do que um simples número de matrícula.
Já estou pensando no que vou fazer para preencher o espaço que hoje a
-
escola ocupa.
Sinto-me orgulhosa pelo exemplo que sou para os meus filhos.
-
Eu buscava uma coisa que nem sabia o que era.
Nós podemos construir juntos a nossa história.
-
Aprendi que sou capaz de superar obstáculos.
Nesta escola, tudo é muito importante e tudo faz sentido.
-
Aqui eu estou inteira. Este é o meu momento.
Estou aprendendo a me colocar no lugar do outro.
-
Sinto que fiz a escolha certa.
Aprendi como aluna e como pessoa.
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Descobri como é importante dividir as dificuldades com os outros.
A professora comenta que gostaria que os demais professores do curso estivessem conosco para
ouvir todas essas coisas que estamos discutindo... Daí surgiu a proposta do registro para
confeccionar um caderno que contasse sobre todas essas aprendizagens.
Após aprofundamento nessas discussões, a idéia agora era fazer um levantamento sobre o que
faltou (no curso de gestão) e as questões apresentadas pela turma foram:
-
Faltou falar um pouco mais sobre o Orientador Educacional.
Eu queria saber mais sobre a função do Supervisor de Ensino
-
Senti falta de ver Estatística.
Queria ver mais sobre o Projeto Político Pedagógico.
-
Queria saber como a equipe gestora cuida do fracasso escolar.
Queria saber como a Direção trata a questão da alfabetização.
Algumas dessas questões foram tratadas em aulas expositivas (por exemplo,
Orientação Educacional e Supervisão de Ensino). Outras foram discutidas e sintetizadas num
quadro no qual retomamos (em grupo) nossos registros de aula, trabalhos e estágios realizados.
Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo
os papéis de cada ator, as culturas diferentes de cada escola e o que diziam os teóricos sobre
todas essas coisas. Foi interessante discutir com os alunos sobre a forma com que cada um
elabora sua própria vivência, além de favorecer a reflexão sobre o que é a unidade de princípios,
autonomia, a diferença entre unidade e uniformidade, e o exercício de uma crítica sobre o que
vemos hoje e as mudanças que gostaríamos de propor como educadores.
COMPARECEM AS QUESTÕES SUBJETIVAS E AS RELAÇÕES INTERPESSOAIS:
É importante observar que o grupo vivenciava um período bastante tenso por
conta da proximidade das qualificações, ajustes e apresentações dos TCCs e estavam também
envolvidos com algumas outras questões como o final do curso, a separação das pessoas, a
lacuna que já estavam vislumbrando...
Desta forma, o investimento nos fazeres se misturava com a dificuldade de lidar
com esses sentimentos.
A oportunidade de explicitar e refletir sobre a vivência desse momento motivou o
grupo a rever a finalização do curso e aceitar o desafio de reconstruí-lo coletivamente de forma a
valorizar tanto o momento imediato em que compúnhamos questões práticas e objetivas ao mesmo
tempo em que lidávamos com os aspectos mais subjetivos.
Nesta fase já estava em andamento um trabalho de reflexão e análise do texto
“Projeto Político Pedagógico: Considerações sobre sua elaboração e concretização (Vasconcelos,
2002), no qual foram destacadas e discutidas questões como:
Conceito e finalidade,
-
Características e dimensões
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-
Perspectivas de mudança,
Processo de construção coletiva,
-
Construção da identidade da escola,
Princípios e valores privilegiados,
Relações interpessoais.
Compondo esse estudo, inserimos a discussão acerca da identidade do grupo e
suas perspectivas para o futuro.
O resultado dessas discussões foi a elaboração de duas propostas por parte da
professora.
A primeira foi constituir o que decidimos chamar de “Grupo de Referência” que
consiste num grupo formado por todos os alunos e a professora que inicialmente atuará como
coordenadora do trabalho - e que terá como características:
-
A mudança de vínculo. A relação professor-aluno passa a ser agora
uma relação entre pares.
-
Deve ser um grupo no qual nós todos – em parceria – possamos
trocar e refletir juntos.
O elo a nos unir pode ser um estudo sobre as implicações das
relações interpessoais num processo de construção coletiva.
A professora pede aos alunos que pensem em sua disponibilidade interna e externa
tentando viver esta fase final do nosso curso com alegria.
Todo o grupo foi bastante receptivo a esta proposta.
A segunda proposta era fazer o fechamento acerca do Projeto Político Pedagógico
através de uma metáfora, na qual fossem contemplados todos os aspectos discutidos anteriormente
e que além disso fosse um símbolo que refletisse nosso processo e a nossa elaboração sobre ele.
Iniciamos o trabalho com alguns combinados:
-
Todo o processo deve ser registrado.
Deve haver controle e acompanhamento do tempo e das atividades
a que nos propusermos a cada dia.
Discutimos e registramos:
-
Objetivo: Aprender a construir o Projeto Político Pedagógico, fazendo.
Vamos vivenciar esta construção fazendo sempre uma ponte com a
teoria.
As primeiras propostas para a metáfora foram a construção de uma colcha de
retalhos e a pintura coletiva de um quadro que representasse o grupo.
Como se poderá observar, nosso processo a cada aula apresentou idas e vindas,
escolhas, ganhos e perdas.
COMEÇANDO A PENSAR NOS PRINCÍPIOS E NAS REGRAS
Retomamos o trabalho iniciado reforçando alguns combinados e já pensando em
como encaminharíamos daquele momento em diante.
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A professora comenta que o primeiro passo é o desejo. Na concretização do trabalho,
ela terá o papel de dirigir, de direcionar da mesma forma como acontece nas escolas mas é
preciso lembrar que este projeto não é dela. É nosso.
Iniciamos então a reflexão sobre as escolhas que vamos fazendo...e sobre a
identidade que vamos construindo...
Quais são os princípios? O quê vai fundamentar nossa construção?
Além do desejo, precisamos partir da nossa realidade: “Dia 30/06 vocês vão embora
– já não serão mais alunos”.
Aquela realidade mobilizou no grupo o desejo de continuidade e projetou o que
queríamos alcançar.
O grupo não deseja se separar mas constituir-se como um grupo de referência em
Educação, podendo eleger como eixo as relações interpessoais. No início professora vai conduzir
o grupo até que ele seja autônomo. Então seremos parceiros.
A professora comentou que embora ela é quem estivesse falando sobre os princípios,
a proposta estava aberta. Era importante que todos participassem, que fosse valorizado o jeito de
cada um participar. Isso iria ajudando o grupo a se reconhecer. É essa a relevância social.
Sobre os nossos desafios, discutimos:
Como vamos construir esse grupo?
Como vamos construir essa tela? Ou será um painel? Ou uma
colcha de retalhos?
Decidimos que a metáfora a nos representar seria um painel a ser pintado
coletivamente a partir de quadrinhos individuais.
Algumas regras que identificamos:
-
Todos deveríamos socializar o material.
Precisaríamos nos planejar para organizar o ambiente, o material, e
identificar as duplas que fariam o registro de cada encontro...
Existiam várias questões em discussão e a cada momento apareciam outras mais...
Assim é que o grupo foi se reconhecendo e escolhendo o seu caminho.
Para aquele momento, o grupo decidiu pensar sobre o painel e uma das alunas
propôs que cada um desse sua sugestão sobre a imagem que pintaríamos.
Propostas que apareceram:
-
Flores
Vitral
-
Mosaico
Bandeirinhas (como as do Volpi)
-
Um grande aquário cheio de peixes.
Um oceano
-
Arco-íris.
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Sobre essas primeiras propostas, surgiram comentários bem
interessantes:
Se vamos mesmo trabalhar as relações interpessoais, o oceano á
mais interessante pois não teremos a limitação do aquário.
Esse oceano pode representar características do nosso grupo: Ser
forte, agitado, imenso, brilhante, um turbilhão, tem movimento, tem muitas correntes como
o conhecimento.
Era preciso então decidir algumas coisas práticas que viabilizassem a construção
desse painel. Relativamente ao tempo, estávamos pensando em pedir algumas aulas de outros
professores na medida em que eles fossem fechando o semestre conosco.
Quanto à imagem, alguns alunos propuseram que esse oceano tivesse uma base
com algas no fundo. Outros diziam que cada quadrinho deveria ser livre (dentro do tema), para
que cada um pudesse se identificar com sua contribuição individual.
Pensamos ainda sobre se iríamos fazer um esboço do painel ou de cada quadrinho.
Definimos que cada um faria conforme suas possibilidades.
A professora sugeriu que o painel representasse o grupo e que cada quadrinho individual
tivesse algo que fosse do coletivo também. Ficamos pensando em várias possibilidades e vimos que
escolhas sempre implicam ganhos e perdas. Por outro lado, percebemos que o bom é que estávamos
discutindo, argumentando e com isso, construindo o quadro e construindo o grupo.
Ao final da aula, retomamos as regras e os princípios para ver se faltava alguma
coisa. Nesse dia não identificamos nada que precisasse ser acrescentado.
Avaliamos, combinamos de trazer o material para a próxima aula (tintas, pincéis e
telas) e a professora pediu para pensarmos:
É possível articular a estética da produção com o prazer de fazer e ainda garantir a
unidade dos princípios?
SOBRE AS ESCOLHAS – OS DESEJOS INDIVIDUAIS E O DESEJO DO GRUPO
Iniciando, retomamos alguns combinados e discutimos sobre a questão que finalizou
a aula anterior e o foco da discussão acabou sendo mesmo a questão das escolhas.
Relembramos que o nosso eixo era trabalhar a mudança de vínculo (de professoraluno para parceiros).
Apareceu um elemento novo que deve ser representado no painel: esse movimento
de mudança.
Como proposta para o encaminhamento, a professora sugeriu que o grupo tentasse
relacionar durante todo o fazer daquele dia, os seguintes aspectos (simultaneamente):
A construção do painel,
-
A construção do Projeto Político Pedagógico,
A construção do nosso grupo de referência.
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-
Estávamos discutindo ainda sobre o formato do painel:
Vertical ou horizontal?
-
Quadrado ou retangular?
Com base ou sem base?
-
Pode repetir o mesmo desenho?
O fundo deverá ter a mesma tonalidade?
-
Qual será a imagem que dará a unidade ao painel?
Só teremos peixes ou pode ter outros animais e elementos do mar?
Podemos combinar que o Nilson nos ajudará a dar a unidade quando
todos os quadrinhos estiverem prontos?
Começamos o trabalho com os quadrinhos, discutindo, decidindo, registrando e
construindo juntos...
A professora pediu que não perdêssemos de vista o nosso produto e nem o processo.
Precisávamos nos organizar e pensar em cada passo, no tempo, na forma, em que ordem as
coisas deveriam acontecer... Ela ainda explicitou sua preocupação em relação a algumas alunas
que estavam muito quietinhas, lembrando que combinamos que todos deveriam se manifestar
em relação ao seu próprio desejo e ao desejo do outro. Discutimos ainda sobre como poderíamos
tratar as dificuldades de cada um e surgiram as falas:
·
É bom perceber a possibilidade de que cada um de nós escolha um
caminho diferente para pintar seu quadrinho e ao mesmo tempo, algo nele represente o
nosso ponto de referência, a nossa “toca”, a nossa luz;
·
Podemos combinar que a cada encontro, depois que o painel estiver
pronto, vamos fotografa-lo e, a cada encontro faremos troca de quadrinhos;
·
É muito interessante olhar o quadro a partir de vários lugares. Há
mesmo diferentes visões a depender do ponto de que partimos.
Conversamos sobre que nesse início, a professora vai nos conduzir, assim como o
Diretor faz na escola. Ao longo do processo o grupo vai se construindo e se tornando mais autônomo.
Outro assunto que apareceu foi que no total somávamos 29 pessoas e o painel
teria 30 quadrinhos. Desta forma um deles poderia ser “rodiziado” entre nós.
Refletimos, pintamos, decidimos, registramos e construimos juntos...
Em certo momento uma aluna observou e alertou sobre que deveríamos nos apressar
para que o tempo fosse suficiente para terminarmos...
Estávamos “fervendo em idéias” e a professora nos lembrou que – ainda que
existisse um produto a ser construído - era preciso “ouvir” o outro.
A professora propôs fechar a aula com uma breve avaliação, mas não deu muito
certo. O grupo estava “a mil” e não conseguiu interromper a pintura para avaliar a aula.
Esta situação imediata mostrou-se como uma questão importante para reflexão
que se seguiu: tínhamos um produto a concluir e tínhamos uma restrição de tempo. Como garantir
a efetividade do trabalho, sem perder de vista seu caráter coletivo, dialógico e de troca?
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É SEMPRE IMPORTANTE RETOMAR, SEM PERDER A POSSIBILIDADE DE
ACOLHER O “NOVO”
Retomamos os nossos desafios e os princípios que nortearam nosso trabalho.
Relembramos que o painel como um todo, deveria estar representado em cada
parte (cada quadrinho), garantindo as diferenças individuais e a unidade que é coletiva.
Surgiram novas questões que pediam novas decisões.
Como vamos juntar os quadrinhos para compor o painel? Qual será
o critério?
-
O que faremos com o produto final?
-
Quem cuidará do tempo e quem cuidará do registro?
Qual recurso ou imagem utilizaremos para representar a unidade
-
Como fazer para que essa imagem represente também as diferenças,
do grupo?
os vínculos e interesses de cada um?
Decidimos que:
A unidade seria representada por uma luz que partiria do alto do
quadro e iluminaria todos os quadrinhos.
Um dos alunos – bastante habilidoso com os pincéis - nos ajudaria
a operacionalizar essa idéia.
Quanto à forma de composição do painel, decidimos fazer alguns
testes, fotografar e escolher depois.
Estávamos muito felizes com os resultados de cada contribuição individual e com
o processo através do qual estávamos compondo no coletivo.
O painel – o nosso oceano - estava muito bonito.
Enquanto fazíamos esses testes, conversamos sobre questões que atravessaram
o curso de gestão nos quatro últimos semestres:
-
Cada elemento modifica o grupo e é modificado por ele.
É preciso ter clareza sobre a diferença entre regras e princípios.
Regras são recursos temporários, transitórios e adequados para um determinado momento.
Já os princípios são os fundamentos que garantem a sustentação de nossas ações. São
os nossos pilares.
-
Quem dirige o processo precisa estar atento aos ritmos diferentes
de cada um e aprender a lidar com sua própria frustração de forma que possa ajudar a
condução e a construção do grupo.
Às vezes é mais fácil trabalhar com grupos pequenos mas é preciso
lembrar que, quem fica de fora das decisões, acaba não se comprometendo com elas.
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Decidimos como seria a composição final do painel e começamos a dar a ele a
unidade de que já falamos. Além do que já havíamos combinado, foi proposto e aceito pelo grupo,
a inserção de plantinhas, algas e ajustes na tonalidade de fundo de alguns quadrinhos, desde que
fosse mantida a identidade do quadro e do autor.
Decidimos ainda que cada aluno teria uma foto do painel. Ele seria montado no dia
da nossa festa de formatura e projetado em telão.
Uma surpresa:
Uma professora de outra disciplina entrou na sala e nós a convidamos a participar
do trabalho. Ela aceitou e ganhamos a autora e a autoria do nosso trigésimo quadrinho.
Este foi mais um dos movimentos interessantes vivenciados por nós na medida
em que revela o acolhimento afetuoso de um elemento novo ao mesmo tempo em que mostra a
disponibilidade daquela professora – o elemento novo – em ser acolhida por nós e participar do
trabalho.
Estávamos novamente aprendendo...
Enquanto concluíamos a composição do painel, conversamos sobre os nossos
próximos encontros, já na perspectiva do que estávamos chamando de Grupo de Referência.
Propostas:
Periodicidade: Mensal.
1a. reunião: 20/08/2005, na FIZO, das 09:00 às 12:00hs
Combinamos de trazer nossos quadrinhos para fazer a primeira troca.
Local de encontro: Pracinha de alimentação.
2a. reunião: 17/09/2005 – mesmo esquema.
3a. reunião: 22/10/2005 – idem.
CONCLUINDO O TRABALHO – RETOMANDO APRENDIZAGENS
Montamos o painel de acordo com a composição definida na aula anterior e
retomamos os combinados a respeito dos encontros do grupo. Após esses primeiros combinados,
a professora propôs que avaliássemos o resultado do trabalho até aquele momento, pensando
nas nossas expectativas.
Propôs que mergulhássemos um pouco no painel (que já estava quase pronto,
faltando apenas últimos retoques) para contar sobre as nossas aprendizagens, pensando sempre
nas seguintes questões:
-
A construção coletiva do painel,
A constituição do Grupo de Referência,
-
A construção do Projeto Político Pedagógico,
As dimensões envolvidas neste trabalho.
-
As falas que surgiram:
Estamos pacientemente esperando os últimos retoques e ainda
curtindo...
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-
O trabalho revela o que é o nosso grupo: comprometido, muitas
divergências, mas todo mundo muito apaixonado.
-
Mesmo sem saber, todo mundo participou e todos foram se ajudando.
As pessoas se ajudaram e não foi só neste trabalho, mas em outros
-
também.
O painel está alegre, forte mas está leve e tem vida.
-
A arte é uma janela para o mundo. A gente abre uma outra dimensão
na nossa relação com o mundo.
-
Pensando no PPP, como é difícil que todas as pessoas se envolvam
e participem principalmente aquelas que se sentem incapazes.
-
Essas diferenças características de cada pessoa mobilizam-nos
também de formas diferentes.
-
A professora apostou em nós e nós topamos.
Pensei que meu quadro não iria se encaixar em lugar nenhum mas
-
no final deu tudo certo.
É complicado mexer na obra de arte do outra pessoa. É mexer numa
-
coisa que vem lá de dentro...
Ficou mais fácil pedir e oferecer ajuda.
Como resultado do trabalho, considero que houve aprendizagem acerca da
construção do Projeto Político Pedagógico e que concretamente o grupo se revestiu de um caráter
diferente em relação a esse marco que é a formatura, na perspectiva da continuidade, da reflexão,
da mudança de vínculo e com a disponibilidade para se constituir de fato como um grupo de
referência com vistas a investir em sua formação continuada.
Foi desta forma que encerramos o semestre...e preparamos o início de uma nova
fase de nosso aprendizado. Agora como pares...
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
ALMEIDA, Laurinda Ramalho; PLACCO, Vera Maria Nigro de Souza (Orgs). O Coordenador
Pedagógico e o cotidiano da escola. São Paulo, Loyola, 2003.
ÁLVAREZ, Manuel [et all.]; O projeto educatico da escola. Trad. Daniel Angel Etcheverry Burguño.
Porto Alegre. Artmed,2004
VASCONCELOS, Celso dos Santos. Coordenação do trabalho pedagógico. São Paulo, Libertad,
2002.
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A FORMAÇÃO INICIAL DO DIRETOR DE EDUCAÇÃO
INFANTIL: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA
MONÇÃO, Maria Aparecida Guedes (Faculdade Integração Zona Oeste - FIZO)
A educação infantil brasileira passa por um momento de grandes transformações
seja no campo da legislação, seja no campo das práticas educativas. O debate a respeito do
papel da educação infantil na contemporaneidade ocupa lugar nas universidades e nas diferentes
instituições que atendem a criança pequena, na busca da construção de uma Pedagogia da
Infância, que trate das especificidades da educação da criança de 0 a 6 anos. A produção de
pesquisas na área tem crescido e contribuído muito para essa sistematização, no entanto, há
poucos trabalhos que versam sobre a gestão na educação infantil, o papel do diretor e tampouco
a respeito da formação dos mesmos, seja ela inicial ou continuada. Grande parte das produções
discute a formação do educador, o que consideramos de extrema importância, no entanto, embora
o Diretor exerça um papel fundamental nas instituições e, especificamente, na formação da equipe
de trabalho, pouco se discute a esse respeito.
A relevância da temática gestão da educação infantil está pautada na compreensão
de que existe a necessidade da formação inicial e continuada do gestor, uma vez que estes
profissionais precisam dominar conhecimentos específicos sobre o funcionamento das instituições
de educação infantil, bem como as peculiaridades do trabalho com as crianças de 0 a 6 anos de
idade.
Pode-se, inferir que a tendência assistencialista, presente na trajetória da educação
infantil brasileira, legitima a contratação de gestores que, em sua maioria, nunca tiveram um
contato direto ou teórico com as temáticas da área. Neste cenário depara-se com um quadro de
profissionais leigos que, sem formação específica, coordenam outros profissionais para trabalhar
com a criança pequena, revelando um traço perverso do assistencialismo. Por outro lado, diante
as transformações ocorridas na área, em função da incorporação das creches e pré-escolas no
sistema de ensino, assiste-se também a chegada de muitos gestores com experiência no ensino
fundamental que, de forma intencional ou não, constroem um trabalho pautado numa visão escolar,
transpondo propostas e normas inerentes ao segmento do ensino fundamental e médio.
Esta realidade revela a urgência de ampliar o debate sobre a identidade e formação
do gestor em educação infantil, tal como tem sido feito em relação aos professores de crianças de
0 a 6 anos, área que contou com um maior desenvolvimento nos últimos anos, pois, embora
compreendamos que o gestor é um educador, a sua formação comporta peculiaridades, não
contempladas na formação do professor.
Segundo Tronnolone “(...) poucas são as produções específicas sobre gestão em
educação infantil, creche ou pré-escola, em geral, existe um número maior de publicações sobre
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a gestão nos demais níveis de ensino“ (2003, p. 90). Além disso, pode-se também perceber a
escassez do debate sobre o tema quando se analisa as pautas dos seminários e congressos na
área de educação infantil, pois as reflexões sobre gestão, aparecem timidamente, ou mesmo
inexistem.
A concepção de educação infantil adotada no presente trabalho compreende a
instituição de educação infantil como a primeira etapa da educação básica que integra cuidado e
educação numa ação compartilhada com a família. Cabe salientar que a compreensão sobre
cuidado pauta-se numa abordagem ampla:
A base do cuidado humano é compreender como ajudar o outro a
se desenvolver como ser humano. Cuidar significa valorizar e ajudar
a desenvolver capacidades. O cuidado é um ato em relação ao outro
e a si próprio que possui uma dimensão expressiva e implica em
procedimentos específicos. O desenvolvimento integral depende
tanto dos cuidados relacionais, que envolvem a dimensão afetiva e
dos cuidados com os aspectos biológicos do corpo, com a qualidade
da alimentação e dos cuidados com a saúde, quanto da forma como
esses cuidados são oferecidos e das oportunidades de acesso a
conhecimentos variados (BRASIL/MEC,1999, p. 24).
A partir desta visão ampla de cuidado, considera-se que, na educação infantil, o
cuidado relaciona-se às crianças, aos profissionais, às famílias, ao ambiente físico e relacional da
escola.
No âmbito da gestão, o cuidado se desvela na formação contínua da equipe em
busca da construção de uma gestão democrática e participativa que garanta a voz de todos os
sujeitos que compõem o cenário da instituição, ou seja, crianças, profissionais e famílias.
O reconhecimento do papel fundamental da afetividade na relação entre adultos e
crianças na instituição de educação infantil, aponta a necessidade do trato com as questões
relacionais, sem perder de vista o significado do contexto social, político e econômico na formação
dos diferentes atores da instituição. Compreendendo, assim, o contexto escolar como lócus de
educação de todos, de encontros permanentes em que o aprendizado para conviver com as
diferenças é um desafio constante.
A gestão na educação infantil tem que tomar como referência principal o sujeito
criança, considerando suas capacidades e cultura na busca da construção da gestão social que
integra as dimensões políticas, culturais e educacionais.
Neste sentido, adota-se o conceito de gestão social, explicitado por Ghedini (1994),
como norte para a reflexão sobre a especificidade da gestão na educação infantil brasileira:
(...) É preciso explicar o significado da gestão social, porque vai muito
além de uma simples relação entre trabalhadores de creche e os
pais: tem um sentido político, cultural e educativo (...) o significado
político implica a vontade de governar de forma descentralizada,
oferecendo aos cidadãos (neste caso, aos pais) mais poder e
democracia nas decisões.
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Projetos e práticas de formação de professores
O significado cultural corresponde à oportunidade de trocas entre os trabalhadores
de creche, pais e comunidade local, através das quais os trabalhadores de creche e pais não só
socializam e compartilham seus problemas, recursos e estratégias, como também contribuem
para a disseminação de concepções culturais relativas à educação e às necessidades sociais das
famílias. Os serviços tornam-se assim um instrumento de conscientização, promoção e crescimento
cultural, em questões gerais relevantes para as crianças.
O significado pedagógico implica a necessidade de um plano educacional bem
elaborado, que seja voltado não para uma criança abstrata, mas para crianças que são uma complexa
combinação de suas características psicológicas e do contexto social e cultural onde seu
desenvolvimento ocorre (Ghedini, 1994, p.205-6).
Assim, tendo explicitado os conceitos básicos que embasam a reflexão sobre
educação infantil, o presente texto tem por objetivo discutir a importância do processo de formação
inicial de gestores (ou diretores) que atuam na educação infantil, tendo como eixo a socialização
de minha experiência como docente na disciplina de Princípios e Métodos da Educação Básica I,
ministrada na Faculdade Integração Zona Oeste, a qual tem como tema central à discussão da
gestão na educação infantil. O presente trabalho pretende dar visibilidade e incentivar o debate
sobre a especificidade da gestão na primeira etapa da Educação Básica.
APRESENTANDO O CURSO DE PEDAGOGIA DA FIZO
A proposta de formação construída no Curso de Pedagogia da Faculdade Integração
Zona Oeste (FIZO), tem como eixo central à formação do educador reflexivo e pesquisador. Nesta
perspectiva, é de fundamental importância o exercício do pensamento a partir da dúvida, da reflexão
diante de uma realidade educacional dinâmica e complexa que exige tanto dos educadores quanto
dos educandos uma abertura constante para o novo, para a construção de novas estratégias,
novos percursos na busca de novas possibilidades, que favoreçam o rompimento com a perspectiva
determinista que situa a prática pedagógica de maneira racional e única.
Pensar um curso de Graduação em Pedagogia, nesta perspectiva complexa e
interacionista, suscita a necessidade do diálogo constante entre teoria, prática, pesquisa e reflexão,
na busca da formação do educador pesquisador e reflexivo.
Manter uma boa relação com teorias e com a reflexão teórica é fundamental para a formação do educador reflexivo e para se cultivar
uma boa relação com o conhecimento. Estimular no educador o
gosto pelo estudo é tarefa do formador, que por sua vez deve
desenvolver em si próprio este gostar. Uma condição para se cultivar uma boa relação com o ato de estudar está, sem dúvida, na
possibilidade de se encarar o conhecimento como espaço de criação
de hipóteses, de manifestação de dúvidas, de erros e tentativas de
acertos. A impossibilidade de errar ou de se criar hipóteses pode
provocar silêncios no processo de aprendizagem que conduzirão
aquele que aprende para longe do conhecimento e das situações
de reflexão (Bambini, Monção e Tronnolone, 2000, p. 5).
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Projetos e práticas de formação de professores
Assim, o curso de Pedagogia da FIZO contempla em sua grade disciplinas que
privilegiam a prática e a pesquisa, com o intuito de favorecer ao educando um olhar reflexivo a
respeito do campo da educação e a construção de sua identidade profissional. Neste sentido,
reconhecendo a relevância e a especificidade da educação infantil, o curso possui a disciplina de
Princípios e Métodos em Gestão da Educação Básica I, com a finalidade de inserir o aluno na
área, contribuindo para a sua formação enquanto gestor desta etapa da educação.
A disciplina, oferecida no 2o semestre do curso, tem como preocupação central
inserir os alunos nas discussões contemporâneas sobre a educação da criança pequena, seus
desafios e perspectivas, integrando a reflexão sobre a importância da construção de práticas de
gestão democrática na educação infantil.
Os objetivos da disciplina podem ser sintetizados em cinco eixos:
1. Construir com os alunos uma visão sobre educação infantil alicerçada numa
concepção integral de cuidado e educação, bem como o papel social das instituições que atendem
crianças pequenas.
2.
Possibilitar aos alunos conhecer o histórico da educação infantil, inserindoos nas discussões contemporâneas da área, a fim de favorecer a reflexão sobre os conceitos
chaves para a construção de uma educação infantil de qualidade, compreendo a criança como o
foco do trabalho desenvolvido.
3.
Favorecer a construção de uma visão de criança como sujeito de direitos e
foco principal das preocupações da instituição de educação infantil.
4.
Realizar a conexão entre teoria e prática, através das análises dos estágios
e das palestras com diretores e coordenadores pedagógicos, à luz da fundamentação teórica
adotada ao longo do semestre e das reflexões realizadas em sala de aula.
5.
Analisar os diferentes tipos de gestão em educação infantil, refletindo, a
partir das pesquisas realizadas no estágio, sobre o papel do diretor e do coordenador pedagógico,
tendo em vista a especificidade da educação infantil.
COMPARTILHANDO O PERCURSO DA DISCIPLINA
Três anos se passaram desde a primeira turma que cursou a disciplina princípios e
métodos de gestão na educação básica I. Nesse período a sala de aula foi palco de muitas
reflexões envolvendo os alunos, os diretores e coordenadores pedagógicos de educação infantil e
a professora responsável.
A disciplina tem como foco a formação do gestor de educação infantil, numa
perspectiva democrática que ouve e envolve todos os atores que compõem a instituição, ou seja,
crianças, profissionais e famílias. Esse envolvimento se dá desde o conhecimento do trabalho
realizado, até a participação efetiva nas decisões. Desde sua concepção, a disciplina foi pensada
de maneira global, compreendendo a necessidade de articulação entre teoria-prática-pesquisa e
reflexão.
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Projetos e práticas de formação de professores
A sensibilização inicial no inicio do semestre versa sobre a visão de criança e
infância buscando favorecer a reflexão dos alunos sobre a criança como sujeito de direitos e a
importância desta etapa do desenvolvimento na formação da pessoa. Esse processo muitas vezes,
remete a imagens e vivências da infância dos próprios alunos, configurando um momento de
muitas lembranças e reflexões sobre esta fase.
É neste momento que é realizada a discussão sobre a concepção de educação
infantil, como primeira etapa da educação básica, que integra cuidado e educação numa ação
compartilhada com as famílias. Tal perspectiva favorece introduzir a idéia de que o cuidado na
instituição de educação infantil deve ser entendido com relação aos diferentes atores que a
compõem: crianças, profissionais e famílias. Tal temática é desenvolvida, também, por meio das
contribuições de Campos (1994) e Cerisara (1999).
A reflexão aprofundada sobre o cuidado, desvela, também, a dimensão da afetividade
no espaço educativo, buscando entendê-la como fruto das relações interpessoais estabelecidas
no contexto da instituição, pois aqui a escola é compreendida como o lócus de educação de todos
os segmentos que a constituem.
O histórico da educação infantil é introduzido situando as diferentes concepções e
representações sobre a educação infantil e os diferentes lugares que as crianças, profissionais e
famílias ocuparam nesta trajetória. Neste momento, as obras de Haddad (1987); Kishimoto (1988);
Kuhlmann Jr. (1998) e Kramer (1987); e o documento BRASIL (1999) servem como referências
centrais ao desenvolvimento do trabalho. É um momento de muitas descobertas, com vistas a
desenvolver um novo olhar para a educação infantil, mas também é momento em que afloram os
conflitos e tensões explicitando as concepções assistencialistas e escolarizadas que reforçam a
polarização entre cuidar e educar nas práticas educativas.
Neste cenário de muitas inquietações e descobertas, os alunos participam em sala
de aula de encontros com diretores e coordenadores pedagógicos de educação infantil. Os gestores
relatam suas experiências, concepções, questionamentos sobre sua atuação na gestão. Após
cada encontro, é realizada, em sala de aula, a reflexão sobre o mesmo, buscando identificar no
relato dos profissionais os princípios e concepções que sustentam a sua gestão. A diversidade
dos relatos dos profissionais possibilita visualizar a heterogeneidade existente e aprofundar a reflexão
a respeito das diferentes concepções de gestão. Aqui Mello (1987,2000); Ghedini (1994); Campos
(1995) garantem o aprofundamento da reflexão.
O contato com a literatura de educação infantil acontece ao longo de todo o semestre,
em sala de aula é construído um debate permanente buscando articular a fundamentação teórica
explicitada nos textos e os relatos das profissionais e dos estágios, reforçando a concepção de
gestão democrática.
Esse processo é enriquecido pelo fato de existir, dentre os alunos do curso de
pedagogia, uma diversidade entre aqueles que ainda não atuam na área de educação e aqueles
que já atuam na educação infantil, seja no papel de educador seja no papel de diretor. Esta
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Projetos e práticas de formação de professores
multiplicidade de experiências garante a riqueza nas discussões em sala de aula, favorecendo a
aproximação entre a fundamentação teórica e a realidade cotidiana.
A conclusão da disciplina acontece com a produção de uma sistematização das
palestras e sua articulação com os textos estudados. Assim, os alunos dividem-se em pequenos
grupos e a partir dos registros de aula, constroem um quadro com as idéias das palestrantes e um
texto reflexivo que discute, ainda que de maneira preliminar, as convergências e divergências
entre os relatos e sua aproximação ou distanciamento dos textos estudados. É um exercício de
análise e discussão dos alunos sobre o conteúdo trabalhado. A conclusão desta sistematização é
feita com a elaboração de um texto com o título “A gestão na escola de educação infantil dos
nossos sonhos”.
O ESTÁGIO E SEUS DESAFIOS
Concomitantemente, ao longo do semestre os alunos realizam o estágio em
instituições de educação infantil, o qual está organizado em torno da pesquisa e da
observação. Os alunos realizam durante a atividade quatro entrevistas, duas com diretores
e duas com Coordenadores Pedagógicos na rede pública e particular, além de observarem
reuniões de pais e professores e a realizarem a leitura dos documentos da escola, tal
como o Projeto Político-Pedagógico e o Regimento Interno.
A sistematização dos dados ocorre mediante a gravação e transcrição das
entrevistas, os registros de observação do funcionamento da instituição e a síntese dos documentos
da mesma. Quando os alunos terminam a etapa de campo, é iniciada a construção do relatório de
estágio que compreende, primeiramente, os relatos das entrevistas e observações, juntamente
com as reflexões dos estagiários. O próximo passo é a categorização e a análise comparativa das
entrevistas, que é realizada a partir da escolha de algumas questões que servem como guias para
a análise. Monta-se um quadro com os depoimentos dos diretores e coordenadores o que favorece
a construção de um texto analítico com os dados coletados, à luz dos textos discutidos em sala.
A conclusão do relatório se dá com uma reflexão do aluno sobre seu aprendizado ao longo do
estágio.
Os momentos de supervisão de estágio, que ocorrem fora do horário das aulas,
possibilitam refletir sobre as observações dos alunos, aprofundando o olhar sobre os dados obtidos
e também favorecendo a troca de informações entre os discentes, tendo em vista que a socialização
dos mesmos evidencia um repertório amplo de relatos de trabalhos realizados em diferentes
instituições de educação infantil, evidenciando a pluralidade de formas de atendimento à criança
pequena.
Esse momento é rico, pois favorece retomar os conceitos trabalhados em sala de
aula e também, acrescentar novos, a partir dos depoimentos dos diretores e coordenadores
entrevistados e das observações realizadas.
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Projetos e práticas de formação de professores
É importante destacar que se reconhece as limitações que um estágio de pesquisa
e observação se coloca na formação dos educadores, mas considerando as dificuldades encontradas
no âmbito institucional para financiamento e apoio de pesquisas e trabalhos de intervenções nas
instituições, além das dificuldades que os alunos apresentam em conciliar estudos e trabalho,
acredita-se que tal proposta tem alcançado, seus objetivos e favorecido a construção de um novo
olhar para a educação infantil e para a especificidade da gestão neste segmento de ensino.
CONCLUSÕES PROVISÓRIAS
A riqueza da experiência desenvolvida na disciplina Princípios e Métodos em Gestão
da Educação Básica I, permite que os alunos, principalmente aqueles que não têm contato com
instituições de educação infantil, tenham a dimensão do desafio imposto para o gestor da educação
infantil. Da mesma forma, para os alunos que já têm contato com essa realidade, seja como
professores ou gestores, possam compreender a especificidade da gestão nas instituições que
atendem crianças pequenas. O início da disciplina permite acesso a depoimentos de alunos que já
são gestores evidenciando a falta de preparo quando assumiram a gestão da creche ou préescola, conforme exposto a seguir:
“Meu primeiro dia na creche foi assustador, pois foi a primeira vez na
minha vida que entrei em uma creche, tendo como incumbência
seu gerenciamento” (M.L.).
“A minha chegada foi, num primeiro momento, tudo novo, tive pouca orientação,
quanto ao trabalho burocrático, embora já sabia algumas coisas. A parte mais difícil foi em como
administrar um grupo, pois tinha que conduzi-los e ao mesmo tempo me adaptar” (C.L.).
Estes depoimentos revelam a chegada de profissionais nas creches e pré-escola
sem formação anterior, pautando-se unicamente na experiência como processo de apropriação e
aprendizado, o que muitas vezes constituem-se em práticas espontaneístas que reforçam a visão
assistencialista de atendimento à criança pequena.
Conforme já foi apontado em outra pesquisa realizada (Monção, 1999) muitos
profissionais deparam-se com um cotidiano permeado de sentimentos ambivalentes com relação
ao significado da creche, traduzidos em diferentes concepções e expectativas. Tal pluralidade
aflora, muitas vezes, focos de tensão entre profissionais e famílias, revelando as influências tanto
da vertente assistencialista quanto da educacional.
Gerenciar os conflitos inerentes a um contexto marcado por diferentes interesses e
necessidades é uma tarefa difícil e até mesmo árdua, que exige do gestor conhecimentos sobre a
área de educação infantil, reflexão a respeito das diferentes formas de coordenar estas instituições,
e flexibilidade para lidar com uma rotina de trabalho dinâmica e complexa, permeada por emoções.
Se, por um lado, tais dificuldades encontradas no cotidiano podem interferir
diretamente na qualidade do atendimento à criança, impossibilitando, em muitos casos, a construção
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Projetos e práticas de formação de professores
de um ambiente que favoreça o desenvolvimento integral da criança, por outro, a superação e o
enfrentamento das mesmas pode favorecer a consolidação das creches e pré-escolas como um
ambiente educativo favorecendo a re-significação das representações sobre a educação infantil.
O trabalho realizado tem sido constantemente repensado, a partir das questões
suscitadas no estágio e nas avaliações dos alunos, entretanto, podemos visualizar alguns objetivos
que estão sendo alcançados no próprio depoimento dos alunos:
“A matéria prática pedagógica e pesquisa despertou meu olhar para
a necessidade de ser conversar mais sobre as nossas atitudes e
rever a nossa postura perante problemas muitas vezes ditos sem
solução e com um tom fatalista (...) Sem contar com a ampliação de
horizontes através dos textos, livros e discussões feitos em sala de
aula onde confrontamos o parecer de pessoas que trabalham na
área da educação com pessoas que nunca estiveram ligadas
diretamente a educação” (M.G.).
Assim, a intenção de ampliar o repertório de referências na área tem sido o grande
destaque do trabalho, fator considerado pelos alunos bastante positivamente:
“(...) as visitas realizadas foram muito proveitosas, pois me colocaram
próxima a outras realidades, as quais nunca tinha tido oportunidade
de me aproximar que revelaram práticas tão diferentes, as quais a
partir de então pude ter parâmetros para minha atuação” (M.L).
Muitos são os desafios deste trabalho, pois os alunos sentem muitas dificuldades
para a realização do estágio seja em função do tempo, pois na sua maioria, é composta por
estudantes que trabalham, seja na elaboração e construção dos registros e reflexões que o estágio
solicita.
Considerando o percurso realizado ao longo desses anos, os resultados são positivos,
favorecendo à construção de um novo olhar sobre a educação infantil, e sobre a especificidade da
gestão nesta área. Pode-se perceber também, o interesse em aprofundar essa temática,
especialmente nos Trabalhos de Conclusão de Curso, já que há um grande número de trabalhos
que versam sobre a gestão na educação infantil.
A meta é favorecer, através da formação inicial, um processo no qual o diretor
assuma sempre como busca a “outra margem” e que as “pedras” encontradas pelo caminho,
sejam visualizadas como desafios a transpor, a fim de construir uma educação infantil brasileira de
qualidade social e que realmente favoreça a construção de uma sociedade mais justa, com pessoas
autônomas e felizes.
(...) Terás então de ler doutra maneira, Como, não serve a mesma
para todos, cada um inventa a sua, a que lhe for própria, há quem
leve a vida inteira a ler sem nunca Ter conseguido ir mais além da
leitura, ficam pegadas à página, não percebem que as palavras são
apenas pedras postas a atravessar a corrente de um rio, se estão ali
é para que possamos chegar a outra margem, a outra margem é
que importa...” (José Saramago, A caverna, p. 77).
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Projetos e práticas de formação de professores
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Projetos e práticas de formação de professores
A PRODUÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO E O
DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DE
PROFESSORES: UMA APROXIMAÇÃO ENTRE
LITERATURA INFANTIL E MATEMÁTICA
OLIVEIRA, Rosa Maria Moraes Anunciato de;
PASSOS, Cármen Lúcia Brancaglion (DME-UFSCar)
Na formação de professores um tema freqüentemente relegado a segundo plano é
a construção de materiais didáticos. Ao participar de cursos de formação contínua, os professores
em serviço revelam a expectativa de que a utilização de materiais manipuláveis no processo de
ensino pode amenizar as dificuldades de aprendizagem pelo suporte da materialidade. Essa
expectativa nem sempre é atendida, sendo identificada, algumas vezes, como uma busca de
soluções prontas, padronizadas que não consideram o contexto e as individualidades. A construção
de materiais didáticos tem sido considerada como menor no campo da didática. Essa área temse configurado como ciência, abrangendo as diferentes dimensões do processo de ensino e
aprendizagem. Observa-se nas disciplinas de didática grande ênfase nos fundamentos históricofilosófico-sociológicos do processo educativo e menor espaço para a elaboração, aplicação e
avaliação de materiais didáticos, por exemplo. Isso não implica em uma dicotomia entre essas
dimensões do processo de ensino e aprendizagem, o que significaria esquizofrenia pedagógica.
A construção e o uso de materiais didáticos passa primeiramente pela concepção
sobre o papel dos docentes. Esse tema está vinculado a dois aspectos interligados: a formação de
professores e as suas concepções pedagógicas. Fiorentini e Miorim (1990) destacam esse fato
quando analisam esta temática, lembrando que a escolha de um material, pelo professor, nem
sempre é realizada com a devida clareza quanto a sua fundamentação teórica. De modo geral,
enfatizam os autores, sempre que um congresso ou encontro de professor de matemática promove
oficinas, conferências a respeito dessa temática, as salas ficam lotadas, evidenciando o grande
interesse pelos materiais e jogos. Entretanto, essas discussões, muitas vezes, ficam restritas à
utilização de um recurso que se mostrou favorável para a abordagem de um determinado tópico
da matemática, não ocorrendo, naquele momento, reflexões de caráter epistemológico.
Precisamos superar a expectativa que muitos professores têm, quando justificam a
opção pela utilização de materiais concretos, como um fator de motivação tornando as aulas mais
alegres, para que os alunos passem a gostar da matéria.
Ao falar sobre a importância dos materiais concretos na aula de matemática,
Fiorentini e Miorim (1990) salientam que “por trás de cada material se esconde uma visão de
educação, de matemática, do homem e de mundo; ou seja, existe, subjacente ao material, uma
proposta pedagógica que o justifica”. Os autores enfatizam ainda que os professores não podem
“subjugar sua metodologia de ensino a algum tipo de material porque ele é atraente ou lúdico (...)
nenhum material é válido por si só”.
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Projetos e práticas de formação de professores
Esse contraponto apresentado pelos autores indica para a formação de professores
a busca de um equilíbrio entre a teorização da área e a ênfase nos recursos. As concepções de
Castelnuovo (1970) podem ser extendidas para a formação de futuros professores ao enfatizar
que a idéia fundamental da ação deve ser a reflexão:
que o interesse da criança não seja atraído pelo objeto material em
si ou pelo ente matemático, senão pelas operações sobre o objeto
e seus entes. Operações que, naturalmente, serão primeiro de
caráter manipulável para depois interiorizar-se e posteriormente
passar do concreto ao abstrato. Recorrer à ação, diz Piaget, não
conduz de todo a um simples empirismo, ao contrário, prepara a
dedução formal ulterior, desde que tenha presente que a ação, bem
conduzida, pode ser operatória, e que a formalização mais adiantada
o é também (p. 25).
Na formação de professores a questão do domínio do conteúdo é tratada quando
os estudos focam as concepções de estudantes sob a forma de base do conhecimento para o
ensino.
Sem dúvida uma questão fundamental refere-se aos professores iniciantes, que
não tiveram ainda oportunidade de criar sua forma pessoal de lidar com o conteúdo advinda da
aprendizagem do conteúdo em situações de exercício da docência.
Tendo em vista a superação dos dilemas aqui levantados investimos em ações
formativas que procuram aliar literatura infantil, leituras, narrativas e conteúdos matemáticos na
formação de professores.
LÍNGUA ESCRITA E CONTEÚDO MATEMÁTICO: ARTICULAÇÃO POR MEIO
DE NARRATIVAS
A produção de textos nas aulas de matemática cumpre um papel importante para
a aprendizagem do aluno. Diversos estudos envolvendo questões da linguagem e da matemática
vêm sendo realizados. Lopes (2003) tem investigado, desde 1993, a escrita como um instrumento
de avaliação no processo de ensino e aprendizagem da Matemática. O autor ressalta que estudos
com foco em atividades de comunicação, escrita e uso de instrumentos de registros tais como
cadernos, diários, portfólios e outras modalidades de textos têm sido considerados na elaboração
de documentos curriculares.
Utilizar a narrativa aliada ao processo educativo em geral é um meio bastante
difundido desde as tradicionais fábulas e os apólogos aos livros paradidáticos da atualidade. Tratando
de conteúdos matemáticos, ainda na primeira metade do século XX, Monteiro Lobato escreve a
sua Aritmética da Emília, fazendo referência a outra obra bastante conhecida: O homem que
calculava de Malba Tahan, pseudônimo de Júlio César de Mello e Souza. Dalcin (2002) pesquisou
a importância dos livros paradidáticos para o ensino da Matemática no 3o. e 4o. ciclo do Ensino
Fundamental e ao se referir às obras de Lobato e Malba Tahan afirma que “através de suas obras
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Projetos e práticas de formação de professores
mostraram-nos que a matemática pode ser ensinada por meio de nossa capacidade imaginativa
e criativa de contar histórias” (p.15).
Smole e Diniz (2001), Smole et al. (2004) estudam as conexões da literatura infantil
e da produção de textos na aula de Matemática. Outros autores como Bicudo e Garnica (2001),
Gómez-Granel (1996), e Teberosky e Tolchinsky (1996), também mostram a importância do trabalho
integrado, bem como a aproximação da área da matemática e da língua materna.
A literatura é por excelência um espaço de síntese da experiência humana, das
emoções e, por isso, seu uso tem sido destacado em diversos estudos como privilegiado para o
trabalho interdisciplinar. O texto nas aulas de matemática contribui para a formação de alunos
leitores, possibilitando a autonomia de pensamento e também o estabelecimento de relações e
inferências, com as quais o aluno pode fazer conjecturas, expor e contrapor pontos de vista. Pois,
como afirma Smole et al. (2004:2):
Interrogado pelo texto o leitor volta a ele muitas vezes para
acrescentar outras expectativas, percepções e experiências, desta
forma, a história contribui para que os alunos aprendam e façam
matemática, assim como exploram lugares, características e
acontecimentos na história, o que permite que habilidades
matemáticas e de linguagem desenvolvam-se juntas, enquanto os
alunos lêem, escrevem e conversam sobre as idéias matemáticas
que vão aparecendo ao longo da leitura. É neste contexto que a
conexão da matemática com a literatura infantil aparece.
Dalcin (2002:60) referindo-se à importância da ficção na infância, afirma que
as narrativas ficcionais mais conhecidas como “histórias” exercem
forte influência tanto na formação cognitiva como na afetiva e social
da criança. Sejam na forma de antigas lendas, contos de fadas,
histórias infantis ou parábolas bíblicas, independentemente do
gênero, as narrativas de ficção valorizam e ampliam nossa
capacidade imaginativa, desenvolvem várias habilidades e estruturas
do pensamento, além de auxiliarem na construção de significados.
A referida autora enfatiza ainda que, relativamente à Matemática pode-se dizer que
a imaginação tem um importante papel nos processos de compreensão, reflexão e abstração,
pela possibilidade de criação de situações particulares vinculadas a outras conhecidas.
Na mesma direção, os estudos de Alton-Lee, Nuthall e Patrick (1999) indicam que
as experiências das crianças na construção de conhecimentos caracterizam-se como um processo
único envolvendo três fatores concorrentes: a resposta aos tópicos do currículo, o gerenciamento
da cultura da classe e a participação nos processos socioculturais.
O termo “construção de conhecimento” é usado para referir-se a uma unidade do
conhecimento que é construída na memória quando a criança interpreta a experiência escolar em
relação a um conhecimento anterior. Essa construção envolve a criança em uma série de processos
cognitivos: obter informações, criar associações, elaborar o conteúdo, avaliar a veracidade e a
consistência da informação e desenvolver conhecimentos metacognitivos (ALTON-LEE, NUTHALL
e PATRICK, 1999). O ato de ler e entender a história favorece e potencializa esses processos
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Projetos e práticas de formação de professores
cognitivos importantes para capacitar a criança a penetrar no estudo da matemática como uma
área de conhecimento que exige a compreensão da sua linguagem específica e de raciocínios
próprios para a solução de problemas.
Dalcin (2002:62) salienta que
Por intermédio de histórias infantis, as crianças tomam contato com
diferentes situações e realidades. Os personagens, sejam ele
humanos, animais, duendes, fadas, bruxas..., vivenciam conflitos e
tomam decisões. Habitam num universo situado em um contexto
particular que é regido por regras e normas próprias. Nesse universo,
os personagens estabelecem relações entre si e com o seu meio,
relações essas que precisam ser conhecidas e compreendidas por
quem ouve ou lê a história.
Dessa forma, entender como a narrativa opera ou qual sua função na vida cotidiana
ajuda a entender seu potencial educativo em sentido amplo ou em sentido estrito: sua utilização
nas aulas de matemática e seu poder formativo no desenvolvimento profissional de futuros
professores.
Inicialmente, é preciso considerar que uma narrativa envolve elementos como
personagens, enredo, espaço, tempo e, principalmente, a configuração de um conflito relacionado
a mudanças na situação que obrigam à reflexão e/ou ação dos personagens. É a resposta a esse
conflito que leva ao desfecho do enredo. A seqüencialidade é uma característica essencial, ao
contrário, é indiferente que ela seja “real” ou “imaginária”, assim, tanto o historiador como o
romancista partilham a forma narrativa.
Essa estrutura da narrativa advém em grande parte da tradição, mas como
acrescenta Bruner (1997:47-48) é razoável supor que há uma “aptidão” humana para a narrativa
capaz de conservar e elaborar tal tradição: “... eu me refiro a uma aptidão ou predisposição para
organizar a experiência em uma forma narrativa, em estruturas de enredo e assim por diante.”
O autor acrescenta que a essa predisposição para a organização narrativa,
“a cultura logo nos equipa com novos poderes de narração, através
de seu kit de ferramentas e através das tradições de contar histórias
e interpretá-las, das quais nós logo nos tornamos participantes”
(BRUNER 1997:74).
Uma característica crucial da narrativa, segundo Bruner, é que ela se especializa
em forjar ligações entre o excepcional e o comum. Toda cultura assenta-se no canônico, num
conjunto de normas, crenças e comportamentos partilhados. A função da narrativa numa cultura
está relacionada à interpretação do excepcional, do incomum e permite ao narrador lidar
simultaneamente com canonicidade e excepcionalidade. Nas palavras do autor: “As histórias
atingem seus significados explicando desvios do comum de uma forma compreensível...” (BRUNER
1997:49)
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Projetos e práticas de formação de professores
Essa característica é valiosa para pensarmos sobre o material narrativo presente
nas histórias com conteúdo matemático. Cabe-nos indagar: Qual sua utilidade? Parece que a
resposta a essa questão está relacionada de alguma forma ao não canônico, pois esse tipo de
narrativa aborda uma temática disciplinar de uma área do conhecimento e integra-a ao discurso
narrativo. Permite matematizar o mundo no sentido de tematizar o conteúdo matemático e desloca
a prática docente com esse conteúdo da atitude de passar o ponto, ensinar um conjunto de regras
previamente formulado, para a atitude inquieta da pergunta, do conflito narrativo que leva à reflexão,
à aposta na postura de descobrir a matemática mais que na postura de ensinar a matemática que
se conhece.
Dalcin (2002:50-51) afirma que a Educação Matemática começa a buscar um
discurso próprio aliado à compreensão de que a construção de significados próprios dos alunos
na relação com os significados histórica e culturalmente negociados passa pela leitura de novos
textos relacionados ao conteúdo matemático. Segundo ela:
Sem dúvida, a busca por esse novo discurso da Educação
Matemática passa pela necessidade de procurar formas diferentes
de relacionar os vários elementos que, de uma forma ou de outra,
sempre nele (discurso) estiveram presentes: os símbolos
matemáticos, as palavras e as imagens.
O papel das imagens (...) parece fundamental, principalmente no atual momento
histórico, no qual as possibilidades tecnológicas ampliaram consideravelmente as suas funções
nos mais variados setores da sociedade moderna.
O material didático, seja ele de qualquer natureza, para ter efetivo sucesso na
utilização no processo de ensino e aprendizagem deve possuir algumas características
fundamentais para permitir:
ƒ
a expansão da experiência do aluno e do professor;
ƒ
a problematização dos conceitos ou idéias a serem
exploradas;
ƒ
ƒ
o esclarecimento de algum conteúdo ou oferecer pistas;
novas estratégias, revelar heurísticas de resolução.
Enfim, a construção e a utilização de materiais deve permitir tanto ao professor
como ao aluno a possibilidade de dar uma significação pessoal ao tema estudado, ao conteúdo
trabalhado em qualquer nível ou modalidade de ensino, seja um conhecimento conceitual, um
conhecimento procedimental ou atitudinal.
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Projetos e práticas de formação de professores
A PESQUISA
A área de formação de professores no Brasil possui uma produção consolidada
que pode ser comprovada, por exemplo, pela vasta e rica produção apresentada em congressos
nacionais como na Reunião Anual da ANPEd, no ENDIPE e no Congresso Estadual Paulista de
Formação de Educadores. No entanto, são raras as pesquisas envolvendo a análise de materiais
didáticos ou a análise de processos de construção desses materiais por professores ou por futuros
professores. Este trabalho tem como finalidade analisar as contribuições da construção de livros
infantis com conteúdo matemático na perspectiva dos participantes dessa experiência.
O CONTEXTO
O trabalho interdisciplinar relacionando literatura e matemática pode resultar em
um processo de ensino e aprendizagem extremamente rico, dinâmico e significativo,
contribuindo tanto para a aquisição de conceitos matemáticos como para a prática de bons
leitores. A partir da proposta de conectar a literatura infantil com conteúdos matemáticos, em
2004 e 2005 foram oferecidas a ACIEPE (Atividade Curricular de Integração Ensino Pesquisa e
Extensão) “Histórias Infantis e Matemática nas Séries Iniciais” aos cursos de Pedagogia e
Licenciatura em Matemática. Essa ACIEPE possui como objetivos: identificar e analisar obras
de literatura infantil que abordam conceitos e noções matemáticas; produzir livros infantis com
conteúdo matemático integrado a outras áreas do conhecimento; utilizar essas produções em
contextos escolares; analisar a pertinência e adequação das produções nas séries iniciais do
Ensino Fundamental.
Os participantes da pesquisa foram alunos do curso de Matemática e do curso
de Pedagogia. Além de alunos regulares dos cursos da universidade, participaram professores
que atuam em diferentes níveis de ensino cujo contato com a matemática se dá de diferentes
maneiras. Assim, em 2005, tivemos duas professoras de educação infantil, uma professora de
matemática que atua no Ensino Fundamental e Médio e uma psicopedagoga. No total foram 15
alunos.
Os procedimentos para elaboração do livro incluíram levantamento bibliográfico
de produções literárias infantis com conteúdo matemático; análises sobre diferentes conteúdos
matemáticos passíveis de serem temas para narrativas; análises dos contextos, características
de linguagem, adequação à faixa etária e nível de escolaridade necessários para o
planejamento de uma história infantil com conteúdo matemático; discussão junto ao grupo de
participantes das propostas elaboradas; elaboração individual ou em duplas de histórias,
seguida de ilustração e encadernação.
Os depoimentos dos participantes (individualmente ou nos grupos) que ocorriam
nos momentos de reflexão conjunta durante o processo foram registrados. No final da atividade
foi solicitada uma produção de texto avaliando a própria aprendizagem e as possíveis
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Projetos e práticas de formação de professores
contribuições para a prática docente. Esses registros e o livro produzido constituíram-se em
fonte de dados da investigação com a finalidade de analisar as contribuições dessa experiência
para a formação desses professores.
A CONSTRUÇÃO DE HISTÓRIAS INFANTIS COMO INSTRUMENTO DE
FORMAÇÃO DE PROFESSORES
A análise dos depoimentos mostra que os professores iniciantes indicam não possuir
uma forma pessoal de lidar com o conteúdo matemático advinda da ausência de experiência em
situações reais de docência. Dessa forma, consideraram o levantamento bibliográfico realizado e
a catalogação dos livros que pressupunha uma análise de forma e conteúdo dos mesmos como
uma oportunidade para suprir essa defasagem.
O levantamento bibliográfico auxiliou na formulação e na escolha do tema do livro
elaborado (V. I.)
As catalogações foram importantes para a elaboração do livro, pois forneceram
conhecimento sobre: ilustração; linguagem; contexto histórico; conteúdos matemáticos; (T. H.)
Não me senti segura para trabalhar com um tema referente às séries iniciais, por
não ter contato com criança. Assim escolhi o tema “matrizes”. O modo de trabalhar com o tema
foi com o jogo de queimada (J. O.)
No contato diário com estudantes de Pedagogia, observamos a dificuldades de
muitos deles para lidar com o conteúdo da área de matemática. Essa dificuldade é expressa pela
psicopedagoga ao afirmar:
Não conseguia ver muitos conteúdos matemáticos que não estivessem explícitos.
Isso durante o curso mudou muito, pois ao ler livros infantis, procurava qualquer conteúdo
matemático. Tive um olhar mais curioso. (G. I)
Esse “olhar mais curioso” de que fala a participante parece ser o resultado mais
importante da experiência vivida, pois implica em uma atitude de pesquisa que passa tanto pela
busca de conhecimentos, pela experimentação, como pelo sentimento de autoconfiança pela
possibilidade de enfim poder aprender e ensinar esse conteúdo de uma maneira nova, criativa.
Outra participante, professora de matemática destaca as possibilidades de descoberta da leitura:
Uma experiência nova, que possibilita perceber a importância destes livros para o
desenvolvimento do aluno, tendo em vista que sua imaginação e criatividade fluem. Por ter algumas
experiências com material didático–pedagógico (por exemplo, Blocos Lógicos), tive o interesse
de elaborar o texto sobre as formas e conectá-las com a poesia. (L.E.)
Outra possibilidade apresentada pela elaboração do material foi a de permitir a
expansão da experiência seja em quanto aluno ou enquanto futuro professor.
Para a elaboração dos livros procurei ler sobre o tema, visitar sites infantis, pesquisei
temas sobre fração e numerais decimais.(P. A.)
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Projetos e práticas de formação de professores
O tema de meu livro foi retirado de uma aula simulada que apresentei junto com
uma amiga. A elaboração do texto foi relativamente simples, já com o titulo do texto tive dificuldades.
(N. A.)
Os textos ampliaram meu conhecimento sobre o ensino da matemática. A
catalogação foi importante para a criação de uma visão critica sobre os livros, pois analisando os
livros percebe-se o que seria interessante abordar ou não (V.I)
Uma importante contribuição dada pelo material didático é possibilitar o
esclarecimento de algum conteúdo, oferecer pistas tanto ao aluno como ao professor.
O tema foi escolhido devido à dificuldade que algumas crianças apresentam na
identificação de problemas matemáticos e de raciocínio lógico. (T.H.)
A licencianda, assim se expressa tendo como referência sua experiência nos
estágios. Percebe-se que se trata de uma observação mais genérica. Outra participante,
psicopedagoga, acostumada a lidar com as chamadas dificuldades de aprendizagem, retira da
sua experiência o tema para a elaboração do livro e espera que ele preencha uma importante
lacuna e que venha a favorecer a aprendizagem desse conteúdo:
A escolha do tema se deu pela observação fixa da minha clientela. A confusão que
eles fazem com os valores posicionais. (G.I)
Outra professora participante assim se expressa:
Sempre tive dificuldades em trabalhar com os conteúdos voltados para a pré-escola,
e no decorrer do curso através do estudo teórico sobre a temática e com as minhas experiências
pude elaborar um livro com um tema de interesse das crianças, contendo os conceitos mais
utilizados na pré-escola. (R. O.)
Possivelmente, o maior defeito que um material didático pode possuir seja a
tendência à padronização que abafa a individualidade. Essa experiência de construção de um
material a partir da experiência de cada participante, ao contrário, abre a possibilidade para a
atribuição de uma significação pessoal ao tema, aos conteúdos de diferentes naturezas trabalhados
no livro, não importando se trata de um conhecimento conceitual, procedimental ou atitudinal.
Uma participante assim analisa suas opções com relação ao conteúdo matemático
a ser desenvolvido no livro:
Houve modificações na escolha do tema, que acabou sendo limitado aos números
naturais de 1 a 12, para que o livro se voltasse para a 1ª série do Ensino Fundamental, série com
a qual nunca trabalhei, mas tenho curiosidade em trabalhar. (A.L.)
Outra participante destaca as opções relativas ao tratamento do tema:
Os textos estudados foram de grande importância para a elaboração de meu livro,
pois me fizeram compreender que a narrativa deveria ser contextualizada e que muitas vezes o
conteúdo que faz sentido ou parece fácil para o adulto não é para a criança (PA.)
Durante este estudo e a realização da primeira versão do livro, percebi que o melhor
caminho era propor o conteúdo na narrativa e propor várias atividades para não se tornar um livro
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Projetos e práticas de formação de professores
didático. Também utilizei palavras diferentes, adjetivos, diálogo e em apresentar elementos da
cultura oriental pelas ilustrações. (P. A.)
Outra participante ao analisar o percurso para a elaboração do livro nos oferece
pistas sobre a maneira como os futuros professores vão construindo sua maneira pessoal de se
relacionar com o ensino:
Não conseguia idéias para os temas. Apenas os personagens estavam definidos.
Houve muitas mudanças até a elaboração final do livro. No início quis fazer um livro com atividades
que envolvessem as crianças, mas encontrei dificuldades. Conversando com a professora, esta
sugeriu a análise dos livros “Atividades Matemáticas” e foi a partir disso que começou a surgir a
idéia de trabalhar com “quadriláteros”, uma vez que a geometria é uma área pouco abordada e
merece atenção (A.S.)
Finalmente, uma participante, aluna do curso de matemática, faz uma síntese das
dificuldades encontradas no processo de construção de um livro de história infantil com conteúdo
matemático:
Houve dificuldades, pois apesar de saber da diferença entre incógnita e variável,
não conseguia explicar no livro. Para mim foram importantes os textos lidos para “entrar no mundo
da criança”, ver o mundo com os olhos delas, para fazer algo para ela. A troca do livro com uma
aluna da Pedagogia foi importante, pois ela mostrou que o livro não estava claro para uma criança
compreendê-lo, fato que eu não havia percebido (L. I.)
Dessa maneira, a construção do material didático na formação de professores
possibilita uma reconstrução desse conteúdo na perspectiva do seu ensino. Um elemento importante
nessa reconstrução é a percepção dos destinatários desse material, a compreensão de quem são
os alunos aos quais eles devem auxiliar para que se possa interagir com eles.
A pesquisa revelou ainda que a elaboração de histórias infantis
envolvendo conteúdo matemático por alunos de cursos diferenciados da universidade
constituiu-se em uma importante experiência formativa teórico-metodológica e revelou
dados relativos aos saberes matemáticos manifestos pelos participantes sobre suas
concepções a respeito dos processos formativos vividos ainda enquanto estudantes da
educação básica. Durante essas atividades foi possível verificar que o debate
envolvendo os futuros professores e os professores em exercício provocaram reflexões
que iam além da elaboração do material evidenciando a construção pessoal de saberes
próprios à docência.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALTON-LEE, Adrienne, NUTHALL, Graham e PATRICK, John. Reframing Classroom Research:
A Lesson from the Private World of Children. In MINTZ, E. e YUN, J. T. The Complex World of
Teaching - Perspectives from Theory and Pratice. Harvard Educational Review. Reprint Series. No
31, pp. 43-75, 1999.
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BICUDO, Maria Aparecida e GARNICA, Antonio Vicente. M. Filosofia da Educação Matemática.
Belo Horizonte: Autêntica, 2001
BRUNER, Jerome. Atos de Significação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
CASTELNUOVO, Emma. Didática de la Matemática Moderna. México: Trillas, 1970.
DALCIN, Andréia. Um olhar sobre o paradidático de matemática. Dissertação (Mestrado em
Educação: Educação Matemática). Campinas,SP: Faculdade de Educação, UNICAMP, 2002,
162p.
FIORENTINI, Dario e MIORIM, Maria Angela. Uma reflexão sobre o uso de materiais concretos e
jogos no Ensino da Matemática. Boletim da SBEM-SP. São Paulo: SBM/SP, Ano 4, n. 7, 1990, p.
GÓMEZ-GRANELL, Carmen. A aquisição da linguagem matemática: símbolo e significado. In
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avaliação. In Anais do II Seminário Internacional de Educação Matemática. Santos/SP: SBEM,
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SMOLE, Kátia Cristina S. et al. Era uma vez na matemática: uma conexão com a literatura
infantil. São Paulo: CAEM/IME/USP. 2004.(3ª.ed).
SMOLE, Kátia e DINIZ, Maria Inez (org.) Ler, escrever e resolver problemas: habilidades básicas
para aprender matemática. Porto Alegre: Artmed, 2001.
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Projetos e práticas de formação de professores
CAMINHOS POSSÍVEIS DO ENSINAR E DO
APRENDER: EXPERIÊNCIAS DE LEITURA
RIBEIRO, Maria Augusta H. W.1 ; GONÇALVES, Carolina2 - UNESP/Rio Claro
Voltado para a formação de professores, este projeto, Experiências de leitura:
caminhos possíveis do ensinar e do aprender, enfoca a leitura como formação e propõe como seu
objetivo geral criar um espaço social para compartilhá-la. Aprovado pelo Núcleo de Ensino/Rio
Claro e financiado pela Fundunesp, foi desenvolvido nos meses de março a dezembro de 2004,
em parceria com a Secretaria de Educação do Município de Rio Claro, para professores do
Ensino Fundamental I. Integra um projeto maior, Quem conta um conto ... aumenta um ponto,
com início em 1999, no Departamento de Educação da UNESP/ Campus de Rio Claro e ao qual
vêm sendo acoplados outros projetos, diversificados em alguns pontos, mas percorrendo todos o
mesmo caminho investigativo - o do ensino/aprendizagem da leitura - e com a mesma base
teórica.
Preocupadas com essa questão, porque nossos alunos liam apenas para obter
informações, na contra-mão do que pensávamos sobre esse ato, abrimos um caminho investigativo
para refletirmos sobre o que se nos colocava como um problema. Neste caminho encontramos
alguns teóricos dos quais citaremos dois - Jorge Larrosa - que entende a leitura como formação
“(...) para que a leitura se resolva em formação é necessário que haja uma relação íntima entre o
texto e a subjetividade. E se poderia pensar essa relação como uma experiência ...” (LARROSA,
2002, p. 136) - e Paulo Freire - que a concebe como leitura de mundo “Refiro-me que a leitura do
mundo precede sempre a leitura da palavra e a leitura desta implica a continuidade da leitura
daquele.” (FREIRE, 2003, p. 20)
Com base nestes dois teóricos formulamos o projeto aplicado em 2004, com o
objetivo geral de fornecer um curso, aos professores, para estudo de textos teóricos sobre a
aprendizagem da leitura. Do primeiro, selecionamos A Lição (Larrosa, 2003); de Freire (2003), A
importância do ato de ler. Acrescentamos, ainda, de Marisa Lajolo (1993), o texto Tecendo a
leitura, no qual a autora complementa as idéias anteriores, entrelaçando esse conceitos numa
visão coletiva do ato de ler: o texto lido por mim, leitor, é por sua vez produto da leitura /ou das
leituras do autor que leu outros textos lidos por outros autores:
Como a manhã, que no poema de João Cabral se perfazia pelo entrelaçamento do
canto de muitos galos, também a leitura, principalmente a literária, parece constituir-se um tecido
ao mesmo tempo individual e coletivo. Cada leitor, na individualidade de sua vida, vai entrelaçando
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Projetos e práticas de formação de professores
o significado pessoal de suas leituras com os vários significados que, ao longo da história de um
texto, este foi acumulando. Cada leitor tem a história de suas leituras, cada texto, a história das
suas. Leitor maduro é aquele que, em contato com o texto novo, faz convergir para o significado
deste o significado de todos os textos que leu. E, conhecedor das interpretações que um texto já
recebeu, é livre para aceitá-las ou recusá-las, e capaz de sobrepor a elas a interpretação que
nasce de seu diálogo com o texto. (LAJOLO, 2004, p. 106).
Várias intenções permearam a elaboração deste projeto de intervenção na realidade
das escolas, todas elas, no entanto, voltadas para a questão da leitura como Freire a viu: “um
instrumento para o que Gramsci chamaria de ação contra-hegemônica” (FREIRE, 2004, p. 21).
Compartilhando deste sentido revolucionário proposto por Freire, temos Larrosa, que discorre
sobre o ato da leitura como parte do processo formador dos sujeitos, pois “a leitura [...] tem a ver
com aquilo que nos faz ser o que somos” (LARROSA, 2002, p. 134), alertando que a pensar
como formação é pensá-la “como algo que nos forma (ou nos de-forma e nos trans-forma)” (idem,
p. 133). A formação, para Lajolo (2004), amplia-se do individual para o coletivo, pois a autora
coloca que “a história da literatura de um povo é a história das leituras de que foram objeto os
livros que integram o corpus dessa literatura” (LAJOLO, 2004, p. 107).
Com base no pensamento desses três estudiosos do assunto foi, então, elaborado
o projeto em forma de curso sobre leitura para professores das escolas da rede municipal de
Ensino Fundamental I (1ª a 4ª séries), com carga horária de 70 horas, com a finalidade específica
de discutirmos a leitura como formação do professor.
Dividido em três blocos, o curso teve o primeiro dedicado à figura do professor,
com o texto básico A lição; o segundo, dedicado ao ato de ler, com o texto básico de Paulo Freire,
A importância do ato de ler e o último, dedicado à tessitura da leitura, baseou-se no texto de
Lajolo, Tecendo a leitura.
Historicamente, a leitura foi tomando outras proporções, principalmente com o
desenvolvimento da tecnologia, que nos impõe outros tipos de leitura, e não só a tradicional
(papel/leitor). A partir de Gutenberg, tornou-se possível
a massificação da leitura, trazendo para o horizonte dela o risco de alienação, de
fracionamento e esgarçamento do significado do texto e do ato de ler. A atividade de leitura, que,
em suas origens, era individual e reflexiva (em oposição ao caráter coletivo, volátil e irrecuperável
da oralidade de poetas e contadores de histórias), transformou-se hoje em consumo rápido do
texto, em leitura dinâmica que, para ser lucrativa, tem de envelhecer depressa, gerando
constantemente a necessidade de novos textos (LAJOLO, 2004, p. 105).
O contato do leitor com os livros passa, então, a tornar-se relativamente frio, distante;
o que era instrumento principal para a aquisição de outros conhecimentos tem-se tornado exercício
remoto e até mesmo objeto estranho da realidade escolar. Objeto estranho, pois, sendo alto o
custo dos livros, não é considerado um bem para todos. Torna-se freqüente a utilização de cópias
reprográficas, dissimulando a idéia de livro, portanto, dissimulando também a idéia de leitor. O
leitor presente hoje é aquele que não lê as obras em sua totalidade; um leitor econômico que, às
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Projetos e práticas de formação de professores
portas da tecnologia e da difusão rápida da informação, não consegue estabelecer relação nenhuma
entre o que lê e sua subjetividade.
Atualmente, é dada à leitura uma conotação própria, formando-nos justamente
para a efemeridade. Na rapidez da circulação das informações, os sujeitos nem vislumbram mais
a possibilidade da existência de um ócio no qual possam contemplar os fatos ocorridos e ter uma
certa inconformidade: “uma nova forma de miséria surgiu com esse monstruoso desenvolvimento
da técnica, sobrepondo-se ao homem [...]. Porque não é uma renovação autêntica que está em
jogo, e sim uma galvanização” (BENJAMIN, 1987, p. 115).
Concebemos, então, uma proposta de leitura em que os textos, não reproduzidos
em cópias reprográficas, se ofereciam “à nossa inquieta procura” nas páginas dos livros, numa
real possibilidade de resgate de experiências, tornando significativas essas leituras.
Para tanto, foi requisitado no orçamento do projeto verba para a compra de vinte
exemplares de cada um dos livros para ser fornecido um exemplar de cada uma das obras aos
participantes, durante a realização do curso. Foram feitos Termos de Compromisso – individuais
- assinados por cada participante no recebimento das obras. Ao final eles foram entregues à
coordenadora que os mantém, em sua sala do Departamento, para uso coletivo dos professores,
em aulas ou reuniões com alunos ou bolsistas.
Despontava, assim, a importância do ato público da leitura, derrubando as paredes
do individualismo exacerbado e possibilitando trocas por meio da leitura - para que houvesse
reconhecimento e um primeiro processo de significação interna, por parte do leitor – da escuta para que o leitor, ao ouvir a leitura – em voz alta – de outrem, “ouvisse” aquilo que o texto dizia –
e da discussão - para que o texto inicial fosse injetado de outras leituras/escutas. Era preciso ouvir
o que os outros tinham a dizer para, então, considerar esses textos como múltiplos de sentidos,
portanto, de experiências.
Dessa forma, a realização desse projeto atendeu à necessidade de criação de um
espaço social para compartilhar textos que enfocassem a questão da leitura, pela sua importância
na formação do professor, de diferentes formas – dadas as várias “leituras/escutas” de textos
(geradores e gerados) – possibilitando aos professores-leitores andar pelos vários caminhos “do
ensinar e do aprender” oferecidos.
Cabe aqui, também, reconhecer a importância da leitura emplazada, segundo
Larrosa (2003), aquela que, num ato público, tem a chave magna para a experiência de leitura, e
que utilizamos como metodologia, uma vez que os textos foram lidos “em público” tal como a
“lição”: “a lição é convocação em torno do texto: congregação de leitores” (LARROSA, 2003, p.
143).
Pensando na formação desses professores, na articulação universidade-escola, tão
necessária atualmente e na urgência conclamada por vários órgãos de soluções para as questões da
leitura, estabelecemos uma parceria com a Secretaria Municipal da Educação de Rio Claro.
Foi elaborado um folder com informações básicas para a divulgação do curso,
contendo uma pequena introdução ao tema da leitura e especificando os objetivos, o público-alvo,
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Projetos e práticas de formação de professores
o número de vagas, a carga-horária, o programa, a forma de avaliação, a ficha de inscrição, o
período e local das inscrições, a questão dos certificados, o local de realização e telefones para
contato. Além de todas essas informações pertinentes ao curso, também elaboramos uma questão
(“A leitura, para você, é...”), constante da ficha de inscrição, e que implicitamente continha uma
de nossas primeiras inquietações: qual seria, inicialmente, a visão de leitura desses professores?
Recebemos um total de vinte inscrições. As respostas à questão constante da
ficha de inscrição apresentaram diferentes enfoques. Nós os agrupamos em quatro.
Nove pessoas tomaram a leitura como forma de conhecimento. Neste caso, a
leitura assumia conotação informativa: “a base do conhecimento, sem ela não há um aprendizado
completo”; “a chave que abre as portas do saber”; “uma possibilidade de conhecer, aprender e
aprofundar conhecimentos”; “um prazer, uma eterna busca de conhecimentos”; etc. Mas, para
Larrosa,
...não se reduz, tampouco, a um meio de se conseguir conhecimentos [...] No
segundo caso, a leitura tampouco nos afeta dado que aquilo que sabemos se mantém exterior a
nós. Se lemos para adquirir conhecimento, depois da leitura sabemos algo que antes não sabíamos,
temos algo que antes não tínhamos, mas nós somos os mesmos que antes, nada nos modificou.
E isso não tem a ver com conhecimento, senão o modo pelo qual o definimos. (LARROSA, 2002,
p. 133-134).
Paulo Freire também trata sobre esta forma de leitura:
Em minha andarilhagem pelo mundo, não foram poucas as vezes em que jovens
estudantes me falaram de sua luta às voltas com extensas bibliografias a serem muito mais
‘devoradas’ do que realmente lidas ou estudadas. Verdadeiras ‘lições de leitura’ no sentido mais
tradicional desta expressão, a que se achavam submetidos em nome de sua formação científica
e de que deviam prestar contas através do famoso controle de leitura. Em algumas vezes cheguei
mesmo a ler, em relações bibliográficas, indicações em torno de que páginas deste ou daquele
capítulo de tal ou qual livro deveriam ser lidas: ‘Da página 15 à 37’”. (FREIRE, 2003, p. 17).
Duas pessoas tomaram a leitura como forma de comunicação. As respostas foram:
“um meio de comunicação onde posso obter informações e divertimento, possibilitando meu
desenvolvimento pessoal e profissional” e “uma forma de comunicação com o mundo”. Para
Lajolo, “a própria sociedade de consumo faz muitos de seus apelos através da linguagem escrita
e chega por vezes a transformar em consumo o ato de ler, os rituais da leitura e o acesso a ela”
(LAJOLO, 2004, p. 106).
Uma pessoa tomou a leitura como diálogo: “uma maneira de interagir entre o real e
o imaginário – ler é ser capaz de extrair de cada história uma lição, de cada ato um ensinamento,
de cada acontecimento um aprendizado”. Para Zumthor, a recepção decorre do ouvinte (leitor)
receber a mensagem e recriá-la de acordo com as suas expectativas. “A componente fundamental
da ‘recepção’ é assim a ação do ouvinte, recriando, de acordo com seu próprio uso e suas próprias
configurações interiores, o universo significante que lhe é transmitido” (ZUMTHOR, 1997, p. 241242). Ou, como para Larrosa,
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...o comunicar do texto não é a elaboração do comum, mas o estabelecimento de
um “entre” no que os leitores se separam e se dispersam de um modo não totalizável, numa
relação pluralizadora. O comunicar do texto, seu ser-em-comum, é o espaçamento que torna
possível o heterogêneo. O texto comum é o texto no qual os leitores participam, é o texto compartilhado entre os leitores, o que os leitores com-partem, o que os parte em comum, o que não se
com-parte a não ser como partição e re-partição (LARROSA, 2003, p. 144).
Oito pessoas tomaram a leitura de diferentes maneiras, sem estar nenhuma delas
relacionada a uma concepção de leitura bem definida: “fundamental”; “tudo”; “tudo!!!”; “essencial
para a qualificação profissional e um momento de lazer no dia-a-dia”; “entretenimento, prazer,
viagem, enfim voar alto sem sair do chão”; “prazerosa”; “uma porta para a vida, quem tem um livro
nunca está sozinho” e “fundamental, promove o indivíduo em todos os sentidos, oferece recursos
críticos, lúdicos, cognitivos e pessoais”.
No primeiro encontro, foi apresentada a proposta e o programa aos professores. Como
metodologia, a experiência de leitura como travessia (caminho), ou seja, “propor a experiência da
leitura em comum como um dos jogos possíveis do ensinar e do aprender” (LARROSA, 2003, p.
139). Para o desenvolvimento do projeto, foram planejados encontros quinzenais, com duração média
de duas horas, durante os quais foram lidos os diversos tipos de texto. Os comentários surgidos
durante esses encontros foram anotados pelas estagiárias do projeto num diário de campo, para
posterior análise, além do recolhimento das assinaturas dos participantes num livro-ata.
Como forma de avaliação, os professores elaboraram projetos de leitura com base
nos referenciais teóricos com os quais tomaram contato ao longo do curso.
Com o decorrer das atividades, alguns professores deixaram o curso por motivos
diversos.
As reuniões eram sempre permeadas por algo em “comunidade”. Privilegiando os
diversos tipos de textos (teórico, filme, etc), prevalecia no começo da leitura/discussão o silêncio
não tão silencioso, em virtude dos olhares que se entrecruzavam. “Mas uma conversação que
tem também sua face silenciosa, reflexiva, solitária” (LARROSA, 2003, p. 143).
A maior parte dos comentários era sobre a fala de um dos participantes, que se
encorajava para comentar algo no texto que o despertou. Assim, os comentários (textos) surgiam
sobre um outro comentário (texto) dito anteriormente, constatando assim a presença marcante da
oralidade na formação dos professores.
Para melhor entendimento, procuraremos aqui fazer uma descrição da primeira
etapa. Nela, tratamos sobre posturas do professor. Colocamos os participantes em contato com
um referencial teórico quanto a um novo tipo de postura do professor frente a atividades de leitura
(dentro e fora da sala de aula): o texto Sobre a lição, de Jorge Larrosa, que propõe a experiência
de leitura como um jogo.
Primeiramente, fizemos um estudo sobre a capa do livro Pedagogia profana: danças,
piruetas e mascaradas, no qual está contido o texto acima citado. Pedimos aos alunos que
descrevessem as sensações que eram despertadas ao tocarem neste livro. Vários comentários
surgiram, seguidos ainda da análise da capa. A arte da mesma não passa desapercebida. Feita
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Projetos e práticas de formação de professores
por Jairo Alvarenga Fonseca traz aos nossos sentidos a imagem de uma tapeçaria datada de
1703 – El majo de la guitarra, Ramón Bayeu, Espanha; a imagem de um homem tratando seu
violão nos levava a pensar qual seria a relação dessa displicência – contida na imagem – e a
questão da leitura, que nos remete sempre a uma postura séria e regrada.
A capa era um convite para entrar no texto Sobre a Lição, condição que Larrosa
propõe para uma real leitura, imbricando-nos a ele. Essa é uma demonstração de amizade do
leitor para com o texto escrito.
Larrosa ainda toca em dois outros pontos-chave para que a experiência da leitura
proponha-se como jogo: o da liberdade - para que a experiência da leitura resulte em formação é
necessário que o leitor também fale junto com o texto, pois “somente a ruptura do já dito e do dizer
como está mandado faz com que a linguagem fale, deixa-nos falar, deixa-nos pronunciar nossa
própria palavra” (p. 145) - e o da experiência - ou melhor, da experiência como mudança. E a
experiência da leitura, por sua vez, é facilitada por aquilo que “o texto leva a pensar” (p. 142).
Sobre esses três pontos repousa o ato público da leitura. Porque só pelo ato público
dela é que há a possibilidade de diálogo entre as pessoas.
De um diálogo que pressupõe a escuta. A questão da escuta implica em um ato de
ler, do qual é decorrente o de ouvir, de ouvir-se e de fazer-se ouvido, tal como o professor:
O professor lê escutando o texto como algo em comum, comunicado e
compartilhado. E lê também escutando a si mesmo e aos outros. O professor lê escutando o
texto, escutando-se a si mesmo enquanto lê, e escutando o silêncio daqueles com os quais se
encontra lendo. A qualidade da sua leitura dependerá da qualidade dessas três escutas. Porque o
professor empresta sua voz ao texto, e essa voz que ele empresta é também sua própria voz, e
essa voz, agora definitivamente dupla, ressoa como uma voz comum nos silêncios que a devolvem
ao mesmo tempo comunicada, multiplicada e transformada (LARROSA, 2003, p. 141).
Os espaços em branco entre a leitura e a escuta são múltiplos de sentidos: neles
se pode falar, dialogar “com o texto, ou contra o texto ou a partir do texto (idem, p. 142).
A comunidade em torno do texto acima proposta, como uma plaza, traz a idéia de
conversação, pois é na unidade (reunião) das diferenças (pessoas) que ressoa a multiplicidade
(diálogo) do único (texto).
Após a leitura do texto em comum, para que os professores elaborassem os seus
projetos de leitura ao final do curso, previmos no cronograma a apresentação de alguns, já finalizados
e/ou em andamento. Referente a este bloco tivemos aquele a que nos referimos no início deste
artigo -Quem conta um conto... aumenta um ponto3, - desenvolvido no Departamento de Educação
da UNESP/Rio Claro desde 1999, com o objetivo geral de levar a diferentes públicos a proposta
da leitura compartilhada de diversos textos, criando um espaço social, no qual possivelmente
possam ocorrer experiências de leitura.
Em seguida, houve uma palestra sobre o autor e o texto estudado – A leitura na
proposta de Larrosa4.
A última atividade deste bloco foi assistir ao documentário Ser e ter5, de Nicholas
Philibert. O filme discorre sobre a relação professor-aluno e algumas tensões vividas nessa relação.
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Projetos e práticas de formação de professores
Na seqüência, com o Bloco II, o foco foi o ato de ler. Inicialmente, lemos o texto A
importância do ato de ler, de Paulo Freire. Este texto, de importância já amplamente conhecida,
começa com uma explanação do que seria a leitura de mundo de Freire, em sua infância. Discorre
sobre a sua “descoberta do mundo” pela palavra, atentando para vários aspectos: a politização do
ato de ler; a importância do contexto (quando criança, da linguagem dos mais velhos); a relação
medo/conhecimento; a compreensão errônea do ato de ler, como se a quantidade de textos lidos
correspondesse à qualidade dessas leituras. Nesses sentidos, a leitura da palavra não é apenas
precedida pela leitura do mundo, mas por uma certa forma de “escrevê-lo” ou de “reescrevê-lo”,
quer dizer, de transformá-lo por meio de nossa prática consciente.
A próxima atividade foi a apresentação do Projeto Guia de Leitura de Reinações de
Narizinho de Monteiro Lobato6, um guia de leitura em forma de CD-Rom que privilegia uma
articulação entre obras universais citadas na referente obra de Lobato, criando, dessa maneira,
uma rede de intertextos.
Este bloco foi finalizado com o filme Fahrenheit 4517, escrito por Ray Bradbury e
dirigido por François Truffaut, que expõe a falta de liberdade do leitor na escolha dos seus próprios
livros. Lembra muito a Inquisição, pelo fato dos livros serem queimados em praça pública.
O último bloco, III, teve como eixo principal a tessitura da leitura. Para tanto,
lemos o texto Tecendo a leitura, de Marisa Lajolo. Partindo da imagem de artesanato que a leitura
exige, para Lajolo, entrelaçá-las como fios transformando-as em tecidos constitui-se numa “matriz
metafórica da leitura”. A leitura precisa ocorrer num espaço de liberdade. Escola e professor são,
talvez, os únicos pontos de ruptura dessa alienação. É preciso fazer frente ao paternalismo dos
órgãos governamentais e empresariais em suas campanhas de provimento de livros em bibliotecas,
escolares ou não, que ocorrem esporadicamente.
Após a atividade de leitura, houve uma palestra sobre a autora e o texto estudado,
O leitor e o texto8. Em seguida, houve outra palestra – A elaboração de projetos como metodologia
para o trabalho intelectual9 – na qual os professores receberam orientações mais técnicas para a
elaboração de seus projetos de leitura. A elaboração desses projetos foi supervisionada pela equipe
responsável do curso. Os professores tiveram vinte horas como atividades extra-classe para essa
construção. Entregues, eles foram avaliados segundo o aporte teórico utilizado no curso e a
coerência das idéias.
Tomamos os projetos de leitura elaborados pelas professoras como reveladores do
processo de escuta, movimentado nas reuniões com o grupo.
O Projeto O despertar para a leitura é um projeto simples, coeso, abrangendo
todas as propostas de leitura discutidas durante o curso. Centra-se na leitura do livro de Ruth
Rocha, O menino que aprendeu a ver (1998). Propõe uma atividade de leitura com alunos,
compartilhada, a qual se desdobra em outras, tendo como objetivo geral a “formação de leitores
para o mundo”. A metodologia apresentada propõe ações de leitura, além do texto convencional.
Embora aparentemente o projeto contemple os teóricos estudados na elaboração das atividades
percebemos que a professora retoma às antigas práticas de leitura. Como exemplo, temos a
indicação da leitura compartilhada, que foi feita em todas as sessões de leitura do curso. No
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entanto, ao colocá-la como uma das atividades de seu projeto, ela assim se expressa: “fazer a
leitura compartilhada levantando questões de interpretação e entendimento”. No curso nós não
dirigíamos as questões, elas brotavam de cada participante, indicando os diferentes diálogos
produzidos em cada um. Na proposta da professora esse diálogo é conduzido, não se pondo “à
escuta” da voz dos alunos. Esta postura inviabiliza a própria proposta feita inicialmente por ela. O
que percebemos é a manutenção do antigo discurso, incorporado, entranhado, que reaparece nas
colocações quando há qualquer movimento de desatenção.
O Projeto Poesia, um convite à leitura com... Cecília Meireles é extenso, com
muitas informações sobre esta poetisa, mas não contém explícito o aporte teórico e a metodologia
proposta não está ligada ao objetivo, que é o de “criar oportunidades para que o educando se torne
um leitor competente da linguagem poética”. Em seu todo, traz uma proposta de leitura, mas que
não contempla os temas abordados nas reuniões com o grupo. Este projeto, possivelmente, já se
encontrava pronto e foi adequado ao curso. O fato de os teóricos estudados não estarem
contemplados indica a separação entre o que foi escutado e a elaboração do projeto. Esta é uma
postura comum nos professores que não permitem que a leitura seja vista como um instrumento
de “ação contra-hegemônica”.
Dois outros projetos, um simplesmente denominado “de leitura” e outro, Diálogo
com a palavra escrita não apresentaram nenhuma relação com a proposta do curso, indicando
que as autoras não expressaram na elaboração dos mesmos o aporte teórico estudado.
Embora tivéssemos pedido que os projetos fossem individuais, duas alunas o fizeram
em dupla: Poesia... um dos caminhos possíveis do ensinar e do aprender. O projeto enfoca, como
o título diz, a leitura de poesias. Na metodologia, por exemplo, encontramos: “o objetivo é sugerir
que as atividades de leitura propostas aos alunos devam levá-los a observação mais de perto de
procedimentos relevantes para o significado geral do texto, não apenas no que diz e sim no modo
como diz o que diz...” Essa fala nos informa que as autoras não foram capazes de interiorizar as
idéias propostas por Freire, Larrosa e Lajolo.
Esse descompasso entre o discurso e a prática é constante nos projetos
educacionais, nos quais a teoria encanta, mas a prática nem sempre.
Por último, um projeto que atendeu as nossas expectativas: Leitores em formação,
no qual a primeira ação proposta é a aquisição de livros (Reinações de Narizinho, de Monteiro
Lobato) para os alunos da classe. Esta relação aluno/livro precisa ser recuperada para que os
pequenos leitores valorizem este suporte. As relações estabelecidas entre a proposta da autora e
os aportes teóricos indicam, para nós, a qualidade da sua escuta: tomou o lugar de ouvinte
(porque levou em conta todas as discussões) e tomou o lugar de intérprete (porque foi capaz de
criar, na escrita, um novo texto). São exemplos dessa escuta dois trechos que selecionamos de
seu projeto. O primeiro diz respeito ao enfoque dado ao ato de ler:
Em outros momentos os alunos farão a leitura ou a motivação inicial, oferecendo
assim autonomia de escolha aos mesmos, pois os textos desse livro são variados, existem contos,
fábulas, mitologia. É preciso somente despertar, mostrar o caminho, segundo Larrosa... o começo
da lição é abrir o livro, num abrir que é ao mesmo tempo, um convocar. E o que se pede aos que,
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no abrir-se o livro, são chamados à leitura não é senão a disposição de entrar no que foi aberto.
Os leitores, agora dispostos à leitura, acolhem o livro na medida em que esperam e ficam atentos...
(2003, p. 139)” (grifo nosso).
O segundo revela uma leitura crítica da forma como a escola trata a leitura:
É comum vermos nos planejamentos anuais das escolas de ensino fundamental
objetivos destinados à leitura; porém a metodologia para o desenvolvimento desses objetivos
quase sempre não passa da leitura de textos de livros didáticos ou até mesmo preparados pelos
professores para uma posterior cobrança. Não se valoriza a leitura pelo prazer, pelo simples contato
com o livro e as reflexões que se estabelecem a partir da leitura. Partindo dessa concepção de
Larrosa, este projeto pretende avançar para além desse paradigma”.
Em um momento em que há um interesse, até governamental, voltado para as
questões da leitura, este interesse não parece mover tanto as pessoas, pois no início do curso
contávamos com vinte professores e até com outras pessoas interessadas em freqüentá-lo. No
entanto, ao final do curso, contamos apenas com sete professoras. Das sete, como podemos ver
na análise feita, apenas uma conseguiu estabelecer uma co-relação entre a teoria e a prática,
entre o que foi lido e as possibilidades de atuação. Esses resultados nos levam a cogitar se as
bandeiras desfraldadas em prol da leitura são realmente para torná-la crítica ou apenas uma nova
forma de alienação?
REFERÊNCIAS
BENJAMIN, W. Experiência e pobreza. In: Obras escolhidas – Magia e técnica, arte e política. 3ª
ed. São Paulo: Brasiliense, 1987, p. 114-119.
FREIRE, P. A importância do ato de ler. In: A importância do ato de ler: em três artigos que se
completam. 44. ed. São Paulo: Cortez, 2003, p. 11-21.
LAJOLO, M. Tecendo a leitura. In: Do mundo da leitura para a leitura do mundo. 2. ed. São Paulo:
Ática, 1993, p. 104-109.
LARROSA, J. Aprender de ouvido. In: Linguagem e educação depois de Babel (trad. FARINA,
C.). Belo Horizonte: Autêntica, 2004, p. 33-46.
______. Literatura, experiência e formação. In: COSTA, M. V. (org.) Caminhos investigativos:
novos olhares na pesquisa em educação. 2. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2002, p. 133-160.
______. Sobre a lição. In: Pedagogia profana: danças, piruetas e mascaradas. 4. ed. Belo Horizonte:
Autêntica, 2003, p. 139-146.
ZUMTHOR, P. Introdução à poesia oral. São Paulo: Hucitec, 1997.
Notas
1 Coordenadora do Projeto e Professora Doutora do Departamento de Educação da UNESP/Rio Claro. 2 Estagiária do Projeto e
aluna do Curso de Pedagogia da UNESP/Rio Claro. 3 Exposto por Jessé C. Reis, aluno do Curso de Pedagogia da UNESP/Rio Claro.
4 Proferida pela Profª Drª Maria Rosa R. M. de Camargo, docente do Departamento de Educação da UNESP/Rio Claro. 5 Em cartaz,
na época, no Espaço Unibanco Arteplex, em São Paulo – SP. 6 Apresentado por Augustinho Ap. Martins, ex-aluno do Curso de
Pedagogia e por Daniel M. D. Entorno, aluno do Curso de Ecologia, ambos da UNESP/Rio Claro. 7 Com comentários do Prof. Dr.
Jorge L. Mialhe, docente do Departamento de Educação da UNESP/Rio Claro. 8 Proferida pelo Prof. Antonio C. D. Chagas, Coordenador
Pedagógico do Ensino Médio da Escola Puríssimo Coração de Maria, em Rio Claro – SP. 9 Proferida pelo Prof. Dr. Osvaldo Aulino da
Silva, na época, Secretário Geral da UNESP.
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Projetos e práticas de formação de professores
CONTAR HISTÓRIAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL:
UMA APROXIMAÇÃO ENTRE GERAÇÕES
KOBAYASHI, Maria do Carmo Monteiro
(UNESP-Bauru, USC – Universidade do Sagrado Coração -Bauru)
Muitas vezes, ouvimos falar e falamos nas nossas conversas rotineiras sobre as
dificuldades enfrentadas no relacionamento entre as gerações. Os conceitos mudaram, os costumes
já não são mais os mesmos, tudo está mesmo de pernas para o ar...
Nossos avós, pais e nós mesmos sentimos as transformações sofridas no convívio
com nossos filhos, sobrinhos, netos e mais ainda aqueles que têm a felicidade de ver seus bisnetos,
mas devemos ressaltar que algo continua como há muito: o gosto infantil por ouvir histórias. A
criança se desprende da realidade e assume o papel de Emília, chapeuzinho, Rapunzel, Porquinho,
Patinho Feio e tantos outros personagens.
Ao contarmos uma história, estamos buscando no imaginário da nossa cultura
repertório para tanto, ou em outras vezes, estamos conhecendo a cultura de outros povos, pois
essas narrativas estão baseadas no discurso que se encontra no imaginário de um povo. Elas
podem ser fábulas, contos, lendas que são organizados de acordo com o repertório de mitos que
a sociedade produz. Quando são lidas ou contadas por um adulto para uma criança, abre-se uma
oportunidade para a construção de sua identidade social e cultural.
As crianças gostam muito de ouvir histórias, mesmo porque essa é uma parte
importante da infância. Ao brincar ou ao fantasiar, a criança tenta entender o mundo do adulto
cheio de regras, que podem, por vezes, serem mudadas, e ela tem dificuldade em entender tais
regras as quais têm que se submeter. Assim, a história infantil pode ser comparada ao jogo
simbólico “[...] o jogo simbólico pode servir ainda para liquidar os conflitos, mas também para a
compensação de necessidades não satisfeitas, para a inversão de papéis (obediência e autoridade),
para a liberação e extensão do eu etc.” (PIAGET, INHELDER, 1994, p. 54)
Nas histórias da carochinha (contos tradicionais para crianças), tenta-se passar
para a criança um pouco das mazelas do mundo adulto, de forma abrandada: o Chapeuzinho
Vermelho e o lobo, João e Maria e a bruxa, Jeca Tatu e as suas dificuldades, a Tartaruga e a
Lebre... As fábulas, que são narrativas curtas sobre bichos, que transmitem conceitos morais,
como no caso da formiga e da cigarra, exprimem uma versão maniqueísta de olhar uma situação,
passando uma versão única e de um tempo, que pode não ser mais o nosso.
Para Cashdan (2000), os contos de fadas auxiliam as crianças a lidar com seus
conflitos psicológicos, ao projetarem nos personagens das histórias seus próprios conflitos. Assim,
figuras como a do porquinho preguiçoso, do “João Ratão que cai na panela de feijão” por sua gula,
do Pinóquio com sua preguiça e a luxúria da Pequena Sereia apresentam situações pelas quais
as crianças podem lidar com os “pecados capitais”,.
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Projetos e práticas de formação de professores
Hoje, com a correria dos pais, o contato com a família está reduzido por força das
suas atividades profissionais e, portanto, de estarem mais livres para atividades de lazer e por que
não, de contar histórias. Desse modo, contar histórias deixou de ser um momento entre pais e
filhos, ficando restritas às atividades escolares e às vezes em espaços públicos como em livrarias,
shopping center ou esporádicas feiras de livros. Os pais não têm mais tempo ou interesse em
contar histórias. É mais fácil comprar um brinquedo eletrônico que entreter a criança, deixando
pais e avôs mais sossegados.
Pude acompanhar a infância dos meus filhos, pois esse foi um tempo que elegi
para estar com eles e, mesmo sem saber, pois ainda não havia estudado o desenvolvimento
infantil, contava histórias ao pô-los para dormir, pois essa era uma forma de levá-los sem
reclamações e para deixá-los um pouco mais tranqüilos. Esses momentos eram apropriados
para falar dos mitos, do folclore, dos contos de fadas e do dia que havia findado.
Somente pude perceber a riqueza de tais momentos, quando um dia, ao assistirem
um episódio de um seriado infantil, vieram me chamar para que visse “Pandora”, a qual, anos
mais tarde, pude constatar que muitos dos meus alunos da universidade não conheciam.
Deixando de lado as narrativas e as fábulas, as histórias de vida da formação de
nossas famílias devem, também, fazer parte da vida dos nossos filhos. O que eles conhecem
dos seus antepassados? Como foi a vida daqueles que construíram sua história?
Muitas vezes ouvimos que os brasileiros se esquecem facilmente dos fatos. Devo
afirmar que somos um jovem país, que está construindo sua história e sua cultura, mas que
aceita todos os filhos de outras terras de braços abertos. Por outro lado, aqueles que vieram de
terras distantes, como os ancestrais dos meus filhos, muito têm a ensinar para nós, que somos
filhos deste jovem país, para que possamos conhecer e valorizar suas tradições.
Assim, contar histórias é uma forma de conhecer outras culturas, de saber as suas
raízes, de reviver um pouco do passado, de entender e prever o futuro, e quem sabe, essa não
seja uma maneira de minimizarmos as dificuldades, os conflitos das gerações, pois assim nossas
crianças aprendem um pouco e o porquê de seus pais e avôs acharem que tudo está tão diferente.
Falamos que tudo está de pernas para o ar... mas nos esquecemos, muitas vezes, de contar
como era antes e como tudo se foi transformando..
PARA QUE CONTAR HISTÓRIAS?
Se contar histórias é algo espontâneo e que as pessoas precisam somente ter algo
de interessante a contar ou a ler, por que são necessários estudos e oficinas para se aprender
contar a histórias? A razão para isso é que contar histórias também pode ser uma arte, que
possui seus segredos e técnicas, quando conhecemos (narrador), o que contar (história escolhida),
como contar (técnicas e os recursos) e, principalmente, quais as características de quem vai
ouvir (ouvinte). Estaremos mais seguros e poderemos usar essas ações de maneira mais adequada
para o crescimento dos ouvintes.
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Projetos e práticas de formação de professores
Sendo uma arte que lida com matéria prima especialíssima, a palavra, prerrogativa
das criaturas humanas, depende, naturalmente de certa tendência inata, mas pode ser desenvolvida
e cultivada, desde que se goste de crianças e se conheça a importância da história para elas.
(COELHO, 2002, p. 9)
A escolha da história a ser contada é a chave mágica e será decisiva para o agrado
dos ouvintes, por isso devemos considerar suas características, pois há publicações direcionadas
sobre assuntos diversos e como a história é algo que mexe com o imaginário infantil, quando
chegado o momento de contar a história, nossa preocupação principal estará voltada ao que lhe
interessa, ao que ela possa entender, ao tempo que ela consegue estar atenta ao narrador, ao seu
repertório lingüístico e outras características que o contador vai poder levantar em ação.
Segundo Aguiar (2001), para que possamos conhecer o leitor que temos à nossa
frente, podemos propor a eles um desenho a partir do tema: Eu sou assim ... Nos desenhos,
podemos conhecer as características dos nossos alunos, pois teremos um quadro revelador, em
que eles mostram como percebem o mundo e como nele se inserem.
Para Coelho (2002), o enredo da história infantil tem três momentos cruciais: a
introdução, clímax e o desfecho. A introdução é parte fundamental para a compreensão da história,
pois é o momento em que se apresentam as características dos personagens e se estabelece um
primeiro contato entre o narrador, a história e os ouvintes, quando e onde ocorre o fato narrado.
À apresentação da história – introdução que possibilitou aos ouvintes entendê-la
sucede-se o clímax, ou seja, o ponto crucial, fruto do encaminhamento anterior das mazelas da
vida dos personagens, e que poderá ter vários momentos culminantes, como no caso dos três
porquinhos e as investidas do lobo, despertando o ouvinte para os embates entre os perigos
vividos e as estratégias do lobo.
Após os perigos vividos e superados pelos personagens, os ouvintes esperam pelo
desfecho da história, no qual se restabelece a vida dos personagens que podem ser, diferentes de
nós, felizes para sempre...
No que se refere aos recursos que podemos utilizar para contar histórias, muitos
deles são dos dotes do narrador. Outros são livros com figuras maravilhosas, os fantoches,
dedoches, os cd’s, dvd’s e tantos outros que vão depender da imaginação de quem conta.
Ao narrador é importante: conhecer bem a história, planejá-la antes de contá-la,
evitar ênfase em detalhes simples, contar com naturalidade, mostrar entusiasmo ao contá-la,
evitar o uso de muitos “e” “ou” “então”, encarar seus ouvintes, olhando-os e procurando sua
receptividade. Outros itens que podem aumentar essas sugestões virão das experiências nos
contadores no decorrer das suas vivências.
Não podemos esquecer que aos detalhes anteriores, somam-se o local e a situação
mais adequada ao contar uma história. Ponto a ser sublinhado é o preparo a ser feito quando as
crianças são muito novas – sanar a curiosidade delas. Se vou falar dos três porquinhos, contar
como são esses animais. Caso sejam conhecidos, perguntar quem já os viu, o que sabem...
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Projetos e práticas de formação de professores
Esse cuidado evita que a toda hora sejamos interrompidos pelas crianças que contam que viram
no sítio do tio... .
Faria (2004, p. 35) aponta que:
[...] um bom criador (ou contador) de histórias sabe estabelecer
com competências os cortes da narrativa, ou seja, deixar bem claro,
no desenrolar da história, o início o fim das seqüências e suas cenas.
Esses cortes têm função importante para compreensão dos fatos
narrados.
Contar história pode ser muito mais envolvente ao se colocar uma toalha no chão
sob uma árvore, ou um fundo musical, ou ainda usar o perfume que anuncia a chegada de uma
linda menina, coisas que aguçam os sentidos e mexem com as emoções de adultos e crianças.
A escolha da história, os recursos necessários, as técnicas empregadas não teriam
razão senão em função de quem vai ouvir as histórias. Conhecer as suas características é condição
para o sucesso do “contar histórias”, para tanto, devemos recorrer à psicologia e aos trabalhos de
Piaget, que mostram as fases do desenvolvimento infantil e as características da criança em cada
fase.
Além de contar histórias como uma forma de conhecer o passado, aproximar
gerações e recreação, é contando histórias que podemos enriquecer as experiências infantis,
propiciando situações nas quais as crianças falem sobre seus desejos, medos e fantasias e
principalmente desenvolver diversas formas de linguagem, ampliando o vocabulário, desenvolvendo
a confiança na força do bem, proporcionando a ela viver o imaginário.
O PROJETO FORMANDO CONTADORES DE HISTÓRIA UNINDO GERAÇÕES
O projeto teve início no primeiro semestre de 2004, pela solicitação da diretora da
Escola Municipal de Educação Infantil, que participa do GEIEI – Grupo de Estudos da Infância e
Educação Infantil, o qual coordenamos. A partir dessa solicitação, passamos a levantar junto aos
professores a viabilidade e interesse em um projeto que estivesse ligado a contar histórias e
literatura infantil. A receptividade foi grande quando sugerimos a possível participação das famílias
no projeto para o resgate da cultura local e da aproximação entre avós e netos.
As características da EMEI “Stélio Machado Loureiro”, na cidade de Bauru – SP
são: atende a crianças de 3 a 6 anos, totalizando 14 professores, 320 alunos distribuídos em 11
turmas, nos períodos manhã e tarde. totalizando 320 alunos, em 11 turmas, nos períodos manhã
e tarde. Os alunos são advindos de diversos bairros da cidade, pois a escola está localizada no
centro comercial, e assim muitos deles permanecem na escola durante o horário em que os pais
se encontram no trabalho. A escola, uma das primeiras EMEI s da cidade, conta com pais e avós
que participam ativamente, pois muitos dos alunos são filhos e netos de ex-alunos, o que facilitou
a implantação do projeto.
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Projetos e práticas de formação de professores
A partir do encontro inicial, levantamos junto aos professores os conteúdos a serem
estudados para a viabilidade do projeto pelo grupo:
·
·
As características dos alunos de educação infantil;
Literatura infantil: origens;
·
·
Classificação da literatura infantil: faixa etária, espécies e gêneros literários;
Estudo das diversas modalidades dos textos infantis;
·
·
A importância do maravilhoso na literatura infantil;
Autores nacionais da literatura infantil;
·
·
Monteiro Lobato e as suas contribuições para a literatura infantil brasileira;
Elaboração de projetos para o trabalho com a literatura infantil;
·
A literatura infantil hoje.
Os conteúdos pedidos podem ser expressos em um objetivo:
·
Estudar os conteúdos necessários para o trabalho da literatura infantil com
crianças de 3 a 6 anos.
Contar história, à primeira vista, pode parecer uma atividade na qual o contador
precisa somente saber o teor do que se vai contar, mas como expusemos anteriormente, essa
simplificação é errônea. Com tal preocupação, numa primeira (1o e 2o semestres de 2004) etapa,
em que realizamos um estudo com os professores sobre o que seria necessário para um grupo
formado de professores e pessoas da comunidade em geral que quisessem contar histórias,
apontaram:
·
Identificar os tipos de história: contos de fadas, fábulas, gibis, livros infantis, etc;
·
·
Identificar as características necessárias ao contador de história;
Selecionar adequadamente os recursos para os diferentes tipos de história;
·
Descrever técnicas de expressão corporal e vocal, relação com o espaço,
expressão do olhar, vocabulário etc;
·
Conhecer as características cognitivas e afetivas das crianças, segundo as
teorias piagetiana e psicanalítica dos ouvintes.
O contato com os professores era uma oportunidade sem precedentes para investigar
junto ao público participante, se gostavam de história na infância, quem lhes contava, qual eram
as histórias, como contava (recursos e técnicas), com que freqüência e sua preferência atual de
leitura. Assim, os professores passaram a relatar as suas preferências e quais as alterações
começaram a ocorrer após os estudos que eles realizavam sob nossa orientação, ao que passamos
a pedir que eles relatassem por escrito as contribuições que os estudos traziam à sua prática
cotidiana, o que os fez refletir sobre o seu trabalho, bem como nas formas de aprimorá-lo, que se
encontra em fase de categorização.
O trabalho dos professores com as “histórias” apontou que a “biblioteca escolar”,
nos moldes em que estavam, não atendiam mais aos interesses de alunos e professores.Assim,
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Projetos e práticas de formação de professores
pedimos a colaboração de uma bibliotecária que está montando as orientações para a organização
da biblioteca pelos professores, momento crucial do desenvolvimento do projeto, pois serão eles
que irão organizá-la, bem como mantê-la, o que aponta o quanto os professores já avançaram em
relação ao período anterior dos seus estudos.
Nesse momento (2o semestre de 2005), estamos iniciamos o trabalho junto às
famílias (pais e avós). Para tanto foi enviado um questionário, que tem por objetivo esclarecer
sobre o projeto “Contar histórias e aproximar gerações” e obter algumas informações sobre:
·
Se ouviu histórias quando criança;
·
·
Se gostava de ouvir histórias;
Quais eram as de sua preferência;
·
·
Quem as contava;
Se conta histórias para os parentes mais jovens;
·
E se gostaria de participar do projeto.
A partir desses dados, vamos conhecer as experiências e preferências das famílias
no que se refere às histórias infantis, o que nos permitirá resgatar características de gerações,
bem como que parentes (pais e avós) gostariam de transmitir suas histórias, sua visão sobre o
mundo e a vida a partir delas.
Fato merecedor de nossa atenção é que a maior parte das crianças brasileiras tem
na escola o contato inicial com os livros, sendo a literatura infantil o convite para o gosto da leitura.
Para muitas crianças, essa a oportunidade é única. Assim, promover ações para que o professor
usufrua o encanto mágico das histórias e contos é fundamental, mas para tanto é preciso que ele
goste de ler, conheça a importância da leitura, saiba como trabalhar, e não fazer como temos visto
– a literatura infanto-juvenil tem se tornado um recurso artificial e desprazeroso de leitura, que se
torna uma “obrigação”.
Com o projeto que apresentamos, possibilitamos: o estudo dos professores sobre o
valor da literatura infantil e de se conhecer a criança, bem como a aproximação a partir das
histórias das gerações, sensibilizando a criança para a valorização das diferentes fases do
desenvolvimento da vida, para as diferenças culturais, sociais e étnicas.
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Formato, 2001.
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COELHO, B. Contar histórias - uma arte sem idade. São Paulo: Ática, 2002.
COELHO, N, N. Literatura infantil. Teoria, análise e didática. SP: Moderna, 2000.
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Projetos e práticas de formação de professores
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PIAGET, J. A formação do símbolo na criança: imitação, jogo e sonho, imagem e representação.
Rio de janeiro, 1975.
PIAGET, J. INHELDER, B. A psicologia da criança. São Paulo: Bertrand Brasil, 1994.
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Projetos e práticas de formação de professores
“DANÇANDO NA ESCOLA”: UM PROJETO
DESENVOLVIDO PELO NÚCLEO DE ENSINO DO
INSTITUTO DE ARTES DA UNESP
GODOY, Kathya Maria Ayres de
(Universidade Estadual Paulista, Instituto de Artes, Departamento de Artes
Cênicas, Educação e Fundamentos da Comunicação)
APRESENTAÇÃO
Apresentar o Projeto “Dançando na Escola” (2004) significa em primeiro lugar
resgatar a história do projeto piloto “Desenvolvendo a Dança no Magistério” (2003), pois foi por
meio da implantação do piloto que conseguimos a estruturação deste último. Ambos foram
desenvolvidos pelo Núcleo de Ensino do Instituto de Artes da Unesp em parceria com a Escola
Estadual Alexandre de Gusmão.
O projeto piloto “Desenvolvendo a Dança no Magistério” foi gestado a partir da
constatação de que a linguagem da dança faz parte do cotidiano das pessoas como uma
manifestação sociocultural, mas não é trabalhada no universo escolar como uma possibilidade de
reflexão sobre aspectos relacionados ao corpo e ao movimento expressivo. Por outro lado oportunizar
a descoberta da motricidade e de novas aprendizagens de maneira criativa poderia instrumentalizar
futuros educadores da rede pública.
Por isso o projeto piloto preocupou-se em desenvolver um curso específico para os
alunos do magistério. Portanto para que o projeto piloto fosse implantado foi estabelecida uma
parceria entre o Instituto de Artes da Unesp e a Escola Estadual Alexandre de Gusmão.
Essa escola localiza-se em uma região carente da cidade de São Paulo, a caminho
da favela Heliópolis, caracterizando-se como uma escola de passagem que atende moradores
estudantes dessa região.
Para que o projeto piloto fosse implantado, inicialmente pesquisamos a região,
conversamos com os alunos da escola e com o corpo escolar a fim de que essa parceria acontecesse
de fato. Posteriormente conversamos com a professora responsável pela disciplina de Prática de
Ensino do Instituto de Artes para que pudéssemos aliar o projeto a essa disciplina, possibilitando
aos alunos do Instituto de Artes o cumprimento do estágio obrigatório.
Assim implantamos o projeto piloto em 2003, com a participação de várias pessoas:
a coordenadora do projeto, a professora de Prática de Ensino, duas alunas do curso de licenciatura
em Educação Artística com habilitação em Artes Cênicas do Instituto de Artes, doze alunas do
curso de magistério da Escola Estadual Alexandre de Gusmão, vinte professores da escola, direção
e vice-direção que mostraram um imenso compromisso com essa parceria.
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Projetos e práticas de formação de professores
Os resultados foram positivos, pois as alunas estagiárias relataram que houve um
desenvolvimento pessoal e profissional, que revelou que o projeto aliado à prática de ensino pode
ser uma alternativa interessante de cumprimento de estágio. As alunas do magistério em seus
depoimentos relataram que o curso forneceu a elas o instrumental necessário para o trabalho na
escola. O corpo escolar se integrou ao projeto e trouxe a comunidade para participar dos eventos
que foram feitos na escola como as apresentações das alunas do magistério e dos grupos
convidados.
O PROJETO “DANÇANDO NA ESCOLA”
A partir dessa primeira experiência e após a avaliação feita entre os participantes
do projeto piloto “Desenvolvendo a Dança no Magistério”, resolvemos ampliar o projeto incorporando
algumas sugestões e assim iniciamos o projeto “Dançando na Escola”.
Fez parte desta ampliação o realinhamento dos objetivos do projeto. Dessa maneira,
o objetivo principal: levar a cultura da dança para a escola se desdobrou na reflexão sobre essa
manifestação sociocultural, na possibilidade de aquisição de repertório motriz, no exercício e na
descoberta do potencial criativo por meio de novas aprendizagens e na apreciação estética dessa
linguagem artística.
Para que esses objetivos fossem contemplados também foi preciso selecionar um
número maior de alunos estagiários. Portanto participaram desse projeto quatro alunas estagiárias
do curso de licenciatura em Educação Artística com Habilitação em Artes Cênicas do Instituto de
Artes da Unesp.
A parceria entre as instituições públicas se manteve, mas por sugestão da direção
e vice-direção da escola, definimos quatro ações distintas e integradas que foram desenvolvidas
no decorrer do ano de 2004.
Procuramos oferecer essas ações a todos os alunos do Ensino Médio, não somente
aos alunos do magistério, aos professores, coordenadores, direção, à comunidade, para que
todos pudessem participar em diferentes esferas de atuação. Dessa forma trabalhamos com trinta
professores, dois coordenadores, o vice-diretor, o diretor, vinte e cinco alunos participantes das
oficinas e cerca de quatrocentos presentes na apresentação e o registro de quarenta e cinco
pessoas da comunidade que viram a exposição.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
As ações
Definimos como ações artístico-pedagógicas um processo de capacitação docente
para os professores da escola; o oferecimento de duas oficinas de dança para os alunos da escola,
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Projetos e práticas de formação de professores
uma exposição de fotos sobre dança aberta à comunidade e a apresentação de um espetáculo de
dança na quadra da escola para todo corpo escolar.
A capacitação dos professores ocorreu no horário das reuniões de HTPC (horário
de trabalho pedagógico coletivo) da escola. Nesses momentos a coordenadora do projeto dirigiu
as reuniões junto com as alunas estagiárias apresentando textos e propondo dinâmicas a fim de
proporcionar discussões sobre a importância da introdução da linguagem da dança no espaço
escolar. Dessa forma foi possível estabelecer uma articulação entre a proposta do projeto e o
corpo escolar, o que facilitou o trânsito das alunas estagiárias na escola e o acontecimento das
outras ações.
Como segunda ação oferecemos duas oficinas de dança. A primeira foi uma oficina
de dança-teatro: “Você tem fome do que?” que ocorreu no início do ano. Essa oficina foi idealizada
pelas quatro alunas estagiárias e objetivou apresentar aos alunos da escola a dança como uma
linguagem expressiva e comunicativa, por isso a junção da dança ao teatro e a provocação “Você
tem fome do que?”. A outra oficina “Dance senão estamos perdidos” ocorreu no segundo semestre
e procuramos trabalhar com aquisição de repertório motriz por meio de improvisações criativas e
exercícios sistematizados. Como ambas foram oferecidas a todos alunos do Ensino Médio, o
desafio esteve presente na preparação dessas oficinas levando em consideração não só os objetivos
definidos para a aprendizagem, mas também a motivação e o interesse dos adolescentes.
A apreciação estética foi o foco das duas ações que se seguiram.
A exposição de fotos de dança foi aberta à comunidade. Essas fotos foram
selecionadas pelos alunos da escola e pelas alunas estagiárias. Adicionamos depoimentos, poesias
e imagens de manifestações da cultura popular brasileira à exposição que foi montada no saguão
principal da escola, por onde todos passam diariamente. Deixamos também um livro de registros
para que as pessoas pudessem escrever sobre o que estavam visualizando. A exposição se manteve
por três semanas e os depoimentos registrados revelaram diferentes olhares sobre a dança. Isso
foi discutido posteriormente com os alunos da escola e com as pessoas da comunidade.
A quarta ação envolveu toda a escola no período matutino. Cerca de quatrocentas
pessoas assistiram a apresentação de dança “Das flores, não mais falam os jardineiros” exibida
pelo do Núcleo de Pesquisa do Centro de Dança de Santo André. A apresentação ocorreu na
quadra da escola e apesar da quantidade de alunos presentes nas arquibancadas, o silêncio foi
geral. Todos estiveram atentos em uma manifestação de respeito e apreciação à obra artística.
CONCLUSÃO
Vivemos em uma sociedade que contribui para a formação de pessoas fragmentadas,
as quais se especializam em determinadas atividades, em um tipo de raciocínio, hipertrofiam
algumas funções cerebrais e partes do corpo em detrimento de outras. Pessoas condicionadas
pelo bombardeio diário de informações provenientes dos meios de comunicação e da cultura de
massa, as quais impõem modelos prontos e influenciam diretamente na capacidade de percepção
e atuação na sociedade (Godoy, 2004).
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Projetos e práticas de formação de professores
Neste sentido, a prática da dança é uma forma de resgatar e ampliar a percepção
das pessoas, a partir da ampliação da consciência corporal, buscando favorecer a integração do
corpo, mente e emoções por meio do contato com essa manifestação artística. Por isso, achamos
de capital importância que a linguagem da dança entre nas escolas públicas. O que nos parece a
melhor alternativa para democratizar uma linguagem tão elitizada dentro da realidade sócioeconômica brasileira.
Com o intuito de ampliar o repertório cultural e potencialidades criativas e expressivas
dos participantes, o projeto esforçou-se não só por favorecer a prática da dança, mas também,
por promover debates, com todos que pertencem à escola, nos âmbitos da arte, estética, cultura,
filosofia, realidades históricas e sociais dos participantes por meio da apreciação estética das
manifestações artísticas presentes na sociedade. Nessa medida, procuramos o envolvimento da
comunidade nas atividades propostas pelo projeto que também se manifestou por meio dos registros
deixados na exposição de fotos e pelas conversas dentro e na porta da escola.
Mas o que nos pareceu relevante foi o amadurecimento profissional das alunas
estagiárias, pois relataram ao passar pelas quatro ações propostas pelo projeto que este
proporcionou um olhar diferenciado para a realidade da escola pública e da docência. Elas disseram
que não imaginavam como seria a resposta do corpo docente da escola em relação à capacitação
e que tinham uma idéia pré-concebida de que esses professores talvez não se interessassem por
projetos artísticos: “ainda bem que nos enganamos”.
Um outro aspecto foi o fato de ter que elaborar e ministrar aulas para alunos do
Ensino Médio: “puxa, eles são exigentes, temos que alterar a estratégia a todo o momento, pois a
concentração é pequena”; “eles perguntam sobre o objetivo de cada atividade, temos que ter uma
super clareza do que vamos propor”; “dependendo do que falamos ou propomos, eles travam”.
Outro aprendizado para as estagiárias se deu em função da percepção das
implicações de se trabalhar em grupo e estabelecer relações interpessoais que são importantes
no exercício da docência: “precisamos tomar cuidado na condução das aulas, acho que por
estarmos em quatro é necessário que a gente estabeleça quem conduz a aula e em que momento
isso deve acontecer”.
Talvez o que tenha sido mais significativo para todos os envolvidos com o projeto
foi a manifestação dos alunos no dia da apresentação do grupo convidado. Eram mais de
quatrocentas pessoas em absoluto silêncio, dentre as quais algumas estavam visivelmente
emocionadas. O depoimento do diretor do grupo, professor Ferron traduz o que aconteceu: “eu
percebi enquanto estava dançando o olhar desses meninos, eles me pegaram, foi sutil, o ar se
tornou denso e ao mesmo tempo leve”; “eu vi, eu senti que eles compreenderam a proposta do
trabalho, temos que ocupar esse espaço porque ele existe...”
BIBLIOGRAFIA
ALMEIDA, Laurinda Ramalho de & PLACCO, Vera Maria Nigro de Souza (orgs.). As relações
interpessoais na formação de professores. São Paulo. Edições Loyola, 2002.
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BARBOSA, Ana Mae (org.). Inquietações e mudanças no ensino da arte. São Paulo. Cortez
Editora, 2002.
BRASIL. Secretaria da Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: Arte. Brasília:
MEC/SEF, 2000.
DE CAMILLIS, Maria de Lourdes. Criação e docência em arte. São Paulo. PUC-SP. Tese de
doutorado, 1997.
FERRAZ, Maria Heloísa Corrêa de Toledo e FUSARI, Maria F. de Rezende e. Metodologia do
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GODOY, Kathya Maria Ayres. “Dançando na Escola”: o movimento da formação do professor de
arte. São Paulo. PUC-SP. Tese de Doutorado, 2003.
HERNANDEZ, Fernando. Cultura visual, mudança educativa e projeto de trabalho. Porto Alegre.
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MARQUES, Isabel A. Ensino de dança hoje, textos e contextos. São Paulo. Cortez, 1999.
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SCHÖN, Donald A. Educando o profissional reflexivo: um novo design para o ensino e aprendizagem.
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Projetos e práticas de formação de professores
DOCÊNCIA, ESTÁGIO E PRÁTICA:
O DIÁLOGO POSSÍVEL
ROSA, Ana Cristina Silva da; SILVEIRA ,Sérgio Roberto da (Universidade Ibirapuera)
INTRODUÇÃO
O propósito deste artigo é discutir como tem se constituído a relação entre os
seguintes aspectos: formação inicial do professor/pedagogo, a prática pedagógica e o estágio
supervisionado no curso de Pedagogia da Universidade Ibirapuera; procurando mostrar que é
possível um diálogo harmônico entre estes três elementos indissociáveis para o exercício da
docência.
No exercício das respectivas funções da docência no ensino superior e da assistência
na Coordenação do curso de Pedagogia da UNIb, foi possível a experiência no campo da formação
de professores, observando-se o ingresso no ensino superior, a formação inicial do pedagogo e a
instrumentalização do mesmo, pautada nas vivências de prática pedagógica e estágio
supervisionado. Para tanto, essa experiência foi implementada a partir do redimensionamento
curricular pelo o qual o curso de Pedagogia da UNIb atravessou no decorrer dos últimos dois anos.
A preocupação com o redimensionamento, a organização e a implementação do
currículo passou por fortes mudanças desde o ano de 2003, a partir da Resolução n° 2/2002 que
institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de professores da Educação Básica.
Com base nas orientações previstas nessa Resolução foi possível estruturar um currículo que
apresentasse a possibilidade de proporcionar uma formação do educador voltada para os elementos
constitutivos da aprendizagem escolar propriamente dita, bem como, voltada para elementos
constitutivos do papel do professor na instituição escolar enquanto agente propulsor de mudanças
e transformações sociais.
A intencionalidade do currículo foi evidenciada em situações de estudo, observação
e atuação do aluno do curso de Pedagogia durante as propostas de projetos e realizações das
quatrocentas horas destinadas a Prática Pedagógica e ao Estágio Supervisionado. Na verdade, a
linha mestra que alinhavou esse trabalho fundamentou-se na interlocução entre a docência e o
estágio, promovendo uma experiência com inferências qualitativas na formação dos futuros
educadores.
O grande desafio foi verificar a existência de um diálogo possível entre docência,
estágio e prática pedagógica em três eixos temáticos de pesquisa, com o objetivo de formar o
professor pesquisador. Ou seja, o propósito final da observação do trabalho foi verificar se no
decorrer do percurso realizado pelo aluno do curso de Pedagogia durante a sua formação inicial, o
mesmo encontraria condições de potencializar sua prática profissional, o entendimento dos
elementos constituintes da profissão professor e das implicações sociais, culturais e políticas em
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Projetos e práticas de formação de professores
que estaria envolvido.
O CURSO DE PEDAGOGIA
O curso de Pedagogia da Universidade Ibirapuera foi o primeiro curso a ser oferecido
nessa Instituição. Historicamente, configurou-se como características de atendimento as
necessidades de administração escolar. Paulatinamente, foi ganhando novas características,
atreladas ao exercício da docência e gestão. Hoje, o foco central está voltado, principalmente, para
a formação de professores e posterior formação para as gestões educacionais.
O curso tem como missão formar profissionais em Pedagogia capacitados para
atuar nas atividades de ensino formal e não formal, relacionadas as áreas de docência, técnicoadministrativa-pedagógica e de pesquisa, caracterizando–se como estudiosos da educação que
investem na formação continuada como condição para se instrumentalizarem para agir num mundo
em mudanças.
A meta do referido curso releva-se a capacitar os profissionais específicos para
serem capazes de entender como o objeto de estudo da área, as implicações e as relações da
tarefa educativa, inseridas numa formação voltada para a autonomia, a participação e a consciência
crítica
O Curso é estruturado com a firme intenção de contribuir, meritoriamente, para a
formação acadêmica e a potencialização de instrumentos, habilidades e competências que
possibilitem o exercício dos novos profissionais.
Ressalta-se que o foco do Curso de Pedagogia é propiciar a formação de profissionais
competentes para atuarem com o ato educativo nas instâncias do ensino formal, como atividades
docentes, administrativas pedagógicas e pesquisa em educação, bem como nas instâncias do
ensino não formal, e atividades de consultoria, orientação, pesquisa, recursos humanos e outras
que não as especificamente escolares.
O DIÁLOGO ENTRE A DOCÊNCIA, A PRÁTICA E O ESTÁGIO
As relações entre pesquisa e ensino tem sido muito discutidas nos últimos anos,
principalmente, pela consolidação dos cursos de pós-graduação das Universidades. Esta
preocupação também tem se estendido aos cursos de graduação, pois ao se propor a formação
docente na perspectiva do “professor pesquisador” esta relação não pode ser esquecida.
Mesmo tendo controvérsias quanto a necessidade ou não de se formar o professor como um investigador como traz Santos (2001) em que mostra que há grupos que afirmam
que a trajetória profissional de ambos (professor/pesquisador) são distintas, o curso de Pedagogia
da Universidade Ibirapuera tem investido nestes últimos anos na formação do docente com tal
competência. Não vamos aqui discutir o papel do professor como um profissional da pesquisa
enquanto construtor de conhecimentos, mas procurar articular o que André (2001, p.59) explica:
“É extremamente importante que ele (professor) aprenda a observar,
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Projetos e práticas de formação de professores
a formular questões e hipóteses e a selecionar instrumentos e dados
que o ajudem a elucidar seus problemas e a encontrar caminhos
alternativos na sua prática docente.”
O curso tem por objetivo formar o futuro professor/pedagogo com competência
para proposição de ações transformadoras no meio em que está inserido a partir da análise de seu
campo de atuação e das necessidades nele encontradas. Para isto o curso está organizado em
três bases de formação teórico-prático: a formação do educador social; do professor/pedagogo; e
do gestor educacional.
O currículo do curso de formação inicial do professor foi estruturado pensando-se
na possibilidade de otimização do mesmo para o pleno exercício profissional. Ou seja, não adianta
se falar em mudanças organizacionais no ensino das instituições escolares da Educação Básica
sem se pensar em mudanças organizacionais nos cursos de ensino superior. Segundo Barroso
(2003, p.140)
...”Não há ‘mudança curricular’ no ensino básico e secundário se
não houver mudança curricular na formação de professores, no
ensino superior. A formação de professores tem de ser isomórfica
das mudanças que os professores devem introduzir nas suas práticas
profissionais, na gestão do currículo, nos métodos pedagógicos e
na relação com os alunos”.
Há a necessidade de se rever a formação de professores pensando na proposição
de situações de estudo, pesquisa e atuação que favoreçam ao futuro professor/pedagogo a
intervenção nos processos de ensino aprendizagem, nas situações de gestões e nos momentos
de interlocução com a comunidade escolar enquanto agente social, cultural e político de mudanças
e transformações. Ainda para Barroso (2003, p.140)
...”A solução está em adotar práticas de formação inicial de
professores que sejam em si mesmas a expressão de modos de
organização pedagógica que se espera que os futuros professores
venham a aplicar com os alunos na sala de aula”.
Assim sendo, ao longo do curso tem-se oferecido aos alunos oportunidades de
articulação teórico-prática a partir da disciplina Prática Pedagógica e Estágio (PPE/ESU) e a
interdisciplinaridade entre as demais disciplinas. Especificamente esta disciplina – PPE/ESU também tem atendido as exigência da Resolução nº 2/2002 que institui as Diretrizes Curriculares
para a formação de professores da educação básica que diz em seu artigo 1º inciso I e II que é
necessário oferecer 400 (quatrocentas) horas de prática como componente curricular, vivenciada
ao longo do curso e 400 (quatrocentas) horas de estágio curricular supervisionado a partir do início
da segunda metade do curso.
A organização curricular tem oferecido não só a articulação teoria e prática entre as
diversas disciplinas, mas tem extrapolado o espaço físico universitário como possibilidade de
aprendizado, pois o futuro professor/pedagogo tem a oportunidade de realizar seus estudos e
desenvolver ações práticas a partir do 3º semestre do curso por meio de estudos, pesquisa de
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Projetos e práticas de formação de professores
campo e prática, possibilitando um diálogo entre estas três vertentes.
A disciplina PPE/ESU, a cada semestre, proporciona aos alunos um eixo temático
de investigação e prática. No PPE/ESU I o objetivo é conhecer e compreender as diferentes
instituições de educação formal e não formal e suas interfaces, possibilitando ao futuro professor/
pedagogo o desenvolvimento de um plano de ação junto a estas instituições frente aos desafios
educacionais encontrados. Os estudos sobre estes desafios, nos últimos semestres, se centraram
nos temas: educação sexual, rotulação de “alunos problemas”, a indisciplina e a violência na sala
de aula, a relação família e escola entre outros. No PPE/ESU II, o objetivo é compreender o
cotidiano da escola formal e suas ações em seu entorno, possibilitando aos universitários práticas
relacionadas à inter-relação família e escola, além de compreender os aspectos éticos e estéticos
da educação. No PPE/ESU III e IV, proporciona ao futuro professor/pedagogo a articulação teóricoprática com as disciplinas metodológicas, oportunizando momentos de atuação prática em sala
de aula, atuando nas diversas áreas do conhecimento.
Nesta perspectiva o estágio não é apenas uma exigência para a formação profissional
e nem mais um componente ou “apêndice” curricular. O estágio faz parte do corpus do curso e
envolve estudos, análise, problematização, reflexão e proposição de solução à situações de ensino
e aprendizagem. Com este caráter formador, o estágio e a prática pedagógica inter-relacionam-se
com as demais disciplinas, fazendo com que os futuros professores/pedagogos ampliem seu universo
de conhecimentos através das práticas sociais e coletivas, possibilitando-o a desenvolver as
competências e habilidades de: capacidade de formular e encaminhar soluções de problemas
educacionais, tendo como parâmetro a Educação como direito universal do homem; capacidade
de estabelecer diálogo entre a área educacional e as demais áreas do conhecimento; capacidade
para identificar, selecionar e desenvolver metodologias adequadas ao atendimento das necessidades
dos educandos; entre outras competências e habilidades que são essenciais segundo Perrenoud
(2001).
A atuação do professor orientador da PPE/ESU se dá por meio de encontros na
Universidade, com o grupo de alunos, que orienta os estudos e discussões teóricas (seminários
temáticos) e na supervisão da elaboração dos projetos de prática e estágios desenvolvidos pelos
alunos. A supervisão se dá desde a concepção do projeto até a realização do mesmo, pois o
professor orientador acompanha as atividades práticas dos alunos/grupo nas escolas parceiras.
Estas escolas, em sua maioria, estão entorno da universidade o que facilita a
supervisão, além de garantir a atuação da universidade em sua comunidade. Mas sabendo-se dos
limites de atuação do professor orientador da PPE/ESU, as reflexões críticas no desenvolvimento
da disciplina tem se centrado nos elementos:
a)
Qual a concepção de homem se pretende contribuir para formar?
b)
Qual a concepção epistemológica de conhecimento e de saber escolar
estamos assumindo ao desenvolvermos nossa prática?
c)
Que postura política estamos exercendo e assumindo ao realizarmos nossa
prática educacional?
Por conseqüência, tais questionamentos, remete aos futuros professores/pedagogos
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Projetos e práticas de formação de professores
a análise crítica sobre sua ação “in lócus” educacional.
Colocar em prática a idéia do professor pesquisador e reflexivo tem sido um grande
desafio. Em primeiro momento, porque confronta-se com a concepção pré-concebida do aluno
que o professor universitário lhe dará as respostas prontas e acabadas, que basta ler, decorar e
registrar aquilo que está nos livros acadêmicos. No segundo momento, porque o aluno não se vê,
em primeira instância, como ser autônomo e capaz de investigar, refletir e atuar. E terceiro, porque
exige do professor orientador uma prática flexível, acolhedora, mas problematizadora. Este último
desafio exige que o professor compreenda que o “o papel da teoria é oferecer aos professores
perspectivas de análise para compreender os contextos históricos, sociais, culturais, organizacionais
e de si mesmos como profissionais, nos quais se dá sua atividade docente, para eles intervir,
transformando-os”(Pimenta, 2004, p. 49).
No decorrer do semestre o professor orientador discute com os alunos as práticas
desenvolvidas, os desafios encontrados e as conquistas, além de assuntos pertinentes ao eixo
investigativo para cada semestre. Ao longo da disciplina, os alunos devem ir a campo para
desenvolverem seu projeto de pesquisa e prática, retornando constantemente à Universidade. A
socialização do trabalho de pesquisa e prática tornar-se essencial na formação do professor/
pedagogo, pois é na troca de vivências e de conhecimentos entre os envolvidos na PPE/ESU que
a aprendizagem se consolida. As discussões são norteadas pelos estudos teóricos desenvolvidos
também em sala de aula, com leitura de textos já solicitadas pelo professor.
No último estágio do PPE/ESU, é garantido ao futuro professor/pedagogo a
construção de sua autobiografia (Nóvoa, 1988) como instrumento auto-formador. A autobiografia
também
“exerce uma função retroactiva – ela ordena o passado. Por outro
lado, aquele texto, de índole primeiramente íntima, na sua vigilância
a curto prazo, permite uma influência prospectiva, no sentido de
resolução, de decisão, para enfrentar o acontecimento em função
de impulsos do passado recente.” (Ramos e Gonçalves, 1996, p.129)
Neste contexto, na elaboração da autobiografia, o futuro professor/pedagogo traz
duas características fundamentais: a retrospectiva e a prospectiva. É possibilitado a ele compreender
o seu percurso formativo e tomar decisões baseadas em fundamentações teóricas de maneira a
compreender o cotidiano escolar e romper com algumas práticas consolidadas.
Por isso as idéias de Nóvoa (1988), Alarcão (1996), Josso (1988), Tardif (1991) e
Ramos e Gonçalves(1996) orientam este trabalho.
“Temos vindo a abordar mais ou menos explicitamente, aspectos
sem os quais o conceito/realidade de professor reflexivo não
poderia existir. Assim, ao triplo estatuto de professor/narrador/
personagem empenhada subjazem conceitos como Aprender e
Ensinar, Contar, Refletir, Agir, Criar, Existir (numa dialética sócioindividual). Consciencializar, julgar, transformar, enfim, toda uma
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Projetos e práticas de formação de professores
imensidão de conceitos que fazem do professor actual um ser cada
vez mais ávido de, em primeira instância, se autoconhecer para se
auto-desenvolver.” (Ramos e Gonçalves, 1996, p.130)
O conteúdo do texto da história de vida dos alunos é pessoal e muitas vezes,
esbarra-se na seleção de lembranças que muitas vezes não querem que sejam trazidas a tona.
Os sentimentos e lembranças desagradáveis muitas vezes são esquecidos, mas não inteiramente,
principalmente os de infância, sendo assim devem ser respeitados e aceitos pelo professor
orientador.
A produção da história de vida pelos futuros professores/pedagogos segue as
orientação de Josso (1988) que sugere o desenvolvimento da “atenção interior” para a leitura do
próprio itinerário formativo, procurando responder as questões fundamentais: “Como me tornei no
que sou?” e “Como tenho as idéias que tenho?”, para então, a partir de tais questionamentos
organizar sua produção reflexiva. Durante esta produção o professor orientador pode intervir
solicitando maior aprofundamento sobre determinadas passagens do percurso formativo, permitindo
que o autor reflita ainda mais sobre os intervenientes participantes deste processo e suas influências;
as práticas pedagógicas vividas enquanto aluno; os meios sociais e culturais e outros fatos
significativos.
Com a construção deste tipo texto, vários futuros professores/pedagogos
questionaram qual seria o percurso formativo de alguns professores formados que já estão
atuando nas redes públicas ou particulares, principalmente quando não conseguem romper com
os moldes arraigados de professor autoritário e bancário (Freire, 1997). Eles passam a compreender
que muito dos moldes educativos são construídos pelo professor enquanto aluno, e que a ruptura
com tais modelos nem sempre é fácil, pois significa muitas vezes “abrir mão” de conhecimentos
que até então eram considerados absolutos e inquestionáveis.
Durante a realização da PPE/ESU, nestes dois últimos anos, pudemos constatar
que os futuros professores/pedagogos tem conseguido compreender e realizar atividades práticas
com maior inter-relação teórico-prática, o que facilita aos futuros professores perspectivas de análise
para compreender os contextos histórico-sociais, culturais, organizacionais e de si mesmo como
agentes atuantes e transformadores, não esquecendo-se do princípio reflexivo que segundo Dewey
(1938) é
“Uma forma especializada de pensar, implica uma prescrutação
activa, voluntária, persistente e rigoroso daquilo em que se julga
acreditar ou daquilo que habitualmente se pratica, evidencia os
motivos que justificam as nossas acções ou convicções e ilumina as
conseqüências a que elas conduzem. Eu diria que ser reflexivo é ter
a capacidade de utilizar o pensamento como atribuidor de sentido.”
(apud, Alarcão, 1996, p. 175)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Projetos e práticas de formação de professores
É claro, que no presente momento, ainda há possibilidade de reorganização na
proposta de articulação entre docência, prática pedagógica e estágio supervisionado, uma vez
que estamos num percurso formativo com a preocupação de respeito a interioridade humana dos
alunos, sem se desvincular dos aspectos políticos da ação educativa, que é inerente a prática
docente e os aspectos profissionais da própria docência. No entanto, esta experiência tem trazido
ganhos significativos na formação do futuro professor/pedagogo.
Com as análises feitas até aqui, podemos constatar e afirmar que o caminho para a
formação inicial do professor sempre deve apresentar a preocupação sobre o diálogo possível
entre: docência, estágio e prática. Não é fácil, mas é um desafio possível de se realizar.
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Projetos e práticas de formação de professores
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Projetos e práticas de formação de professores
EDUCAÇÃO AMBIENTAL: FORMAÇÃO DOCENTE
E PRÁTICAS EDUCATIVAS VOLTADAS PARA A
CONQUISTA DE UM AMBIENTE SAUDÁVEL E A
JUSTIÇA SOCIAL
MARIN, Fátima Aparecida Dias Gomes (Faculdade de Ciências e Tecnologia – FCT/UNESP)
INTRODUÇÃO
O Núcleo de Ensino da UNESP - Presidente Prudente (SP) tem por objetivo
promover a educação ambiental, no âmbito da formação de professores (inicial e em serviço), a
partir da compreensão de problemas de degradação e de ações de preservação, conservação e
recuperação ambiental, especificamente relacionadas à questão da água e do resíduo/lixo.
Atualmente, participam do projeto alunos dos cursos de Geografia e Pedagogia e
docentes de diferentes áreas do conhecimento. O enfoque globalizador é o referencial teóricometodológico adotado no trabalho pedagógico interdisciplinar que envolve pesquisa, ensino e
extensão.
Com o objetivo de somar esforços para reverter o quadro de degradação ambiental,
promover melhoria na qualidade de vida e a justiça social, o projeto busca alcançar parceiros do
ensino fundamental.
Para tanto, este texto é endereçado aos profissionais com interesses neste âmbito
e apresenta proposta teórico-metodológica embasada no enfoque globalizador sobre a educação
ambiental em resíduos, a ser desenvolvida com alunos do primeiro ciclo.
O papel da educação no enfrentamento da crise ambiental
A crise ambiental da atualidade é caracterizada pelos impactos de toda ordem:
poluição, aquecimento global, destruição da camada de ozônio, esgotamento de recursos naturais
e extinção das espécies. Somam-se a estes problemas a desigualdade social, a pobreza e a
violência, sintomas de uma sociedade que clama pela revisão dos seus valores éticos e morais e
por ações para enfrentar estes problemas.
Os impactos ambientais anunciam a fragilidade do planeta em suportar as
interferências humanas. A natureza tem sido apropriada como fonte de recursos para a satisfação
das necessidades, considerando-a como uma mercadoria. Este processo não tem respeitado os
ciclos naturais, a restauração dos ecossistemas e o desenvolvimento humano. Os pilares deste
empreendimento se baseiam na competição, na dominação e no lucro. O crescimento econômico
nem sempre está atrelado ao desenvolvimento humano, à melhoria da qualidade de vida e a
justiça social. Maturana (1998, p.35) ressalta que:
O progresso não está na contínua complicação ou mudança
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Projetos e práticas de formação de professores
tecnológica, mas na compreensão do mundo natural (...) com base
no seu conhecimento e no respeito por ele. Mas para ver o mundo
natural e aceitá-lo sem pretender dominá-lo ou negá-lo devemos
aprender a aceitar-nos e a respeitar-nos como indivíduos [...].
A degradação ambiental traz conseqüências para toda sociedade ao interferir, por
exemplo, na redução da qualidade de vida, mas afeta principalmente as pessoas de baixo poder
aquisitivo que são excluídas do acesso digno a moradia e a serviços de saúde e de educação. Em
virtude da especulação imobiliária, a população de baixa renda constrói as suas moradias em
áreas de risco estando sujeitas ao deslizamento das encostas, aos prejuízos materiais, ao convívio
com o lixo, o esgoto, as doenças.
A visão antropocêntrica atribui ao homem o poder de dominação e exploração da
natureza sem precedentes, contrariando a concepção de que como ser vivo integra a teia da vida
e, portanto, não está apartado da natureza. Neste sentido, são oportunas as considerações de
Capra (1996, p.231):
Todos os membros de uma comunidade ecológica estão interligados numa vasta e
intrincada rede de relações, a teia da vida [...] A interdependência – a dependência mútua de
todos os processos vitais dos organismos – é a natureza de todas as relações ecológicas. O
comportamento de cada membro vivo do ecossistema depende do comportamento de muitos
outros [...]
À revelia desta premissa a relação homem-natureza vem se dando de maneira
arbitrária e predatória provocando a crise ambiental que anuncia a possibilidade de um colapso
dos ecossistemas.
As discussões sobre a crise ambiental ganharam relevância nos últimos anos
tornando uma preocupação para diversos setores da sociedade. O aumento populacional, os
hábitos consumistas e os desperdícios agravam a degradação ambiental. Os avanços científicos
e tecnológicos não são suficientes para conter a degradação e restaurar o equilíbrio natural
colocando em risco a sobrevivência.
As conseqüências de desastres ambientais localizados se fazem sentir do outro
lado do planeta. Há um consenso sobre a gravidade da degradação ambiental. Entretanto, o
gerenciamento adequado do meio ambiente, a adoção de medidas de conservação e preservação,
a efetivação de políticas e leis ambientais esbarram em interesses contraditórios.
Embora sejam efetivos os ganhos promovidos por segmentos da sociedade que
têm se organizado e promovido ações com relação à gestão eficiente dos recursos naturais, nem
todos estão comprometidos com a instauração de uma aliança global para estes fins.
Proporcionar situações para que os alunos possam identificar os conflitos, os
interesses privados e coletivos, os agentes sociais, os valores, os poderes em jogo e as diferentes
responsabilidades diante da crise ambiental é o primeiro passo para compreender a complexidade
que envolve as questões ambientais. São relevantes as considerações de Guimarães (2004,
p.75) quanto à educação ambiental crítica:
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Projetos e práticas de formação de professores
A educação ambiental crítica das desigualdades sociais e dos desequilíbrios nas
relações entre sociedade e natureza percebe os problemas ambientais como decorrentes do conflito
entre interesses privados e coletivos, mediados por relações desiguais de poder que estruturam a
sociedade contemporânea em suas múltiplas determinações e seu modo de produção.
A concepção de sustentabilidade fundamenta-se no equilíbrio entre o
desenvolvimento do sistema socioeconômico e os ecossistemas. A ciência e a tecnologia
contribuem para promover a manutenção do capital natural com a finalidade de não comprometer
as gerações futuras. Sinaliza-se para medidas de preservação da diversidade das espécies para
manter a complexidade das relações de vida. Um dos princípios da sustentabilidade é a substituição
do uso de recursos naturais não renováveis pelos renováveis. São oportunas políticas de reciclagem
e reuso dos materiais. Estas medidas poupam matéria-prima, energia e amenizam o impacto
ambiental causado pela disposição irregular dos resíduos.
Neste contexto, é importante destacar a exploração desenfreada dos recursos
naturais, o aumento da geração e o descarte dos resíduos/lixos, bem como os impactos negativos
causados ao ambiente. Cabe ao docente problematizar o modo de produção, as relações homemnatureza e homem-homem, o consumismo, os diferentes interesses em jogo, bem como valorizar
ações quanto à redução do consumo, o descarte seletivo, o reuso de materiais e produtos que
estão sendo descartados como lixo e a reciclagem. Segundo Logarezzi (2004, p.236):
[...] educação ambiental implica em discutir integralmente conhecimentos, valores
e participação política, a abordagem da questão dos resíduos deve incluir com destaque a atividade
de consumo de produtos e serviços, em análises que busquem distinguir necessidades básicas
do ser humano, voltadas para objetivos essenciais, de necessidades criadas pelo ser humano,
voltadas para objetivos artificiais, tendo sempre como parâmetros as referências socioambientais
que condicionam a realidade contemporânea e suas implicações para com as gerações futuras.
A qualidade de vida e ambiental pressupõe transformações profundas na sociedade
de caráter cultural e político-ideológico coadunadas com princípios éticos e morais, a fim de
assegurar a democracia, a cidadania, o respeito às diferenças, amenizar as desigualdades sociais
e garantir para todos o acesso à alimentação, à saúde, à escola, à habitação e a um ambiente
saudável.
De acordo com a Lei Nacional de Educação Ambiental n° 9.795/99, no seu capítulo
I - artigo primeiro, a Educação Ambiental refere-se aos: [...] processos por meio dos quais o
indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e
competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo,
essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade. (BRASIL, 1999).
Nesta lei estabelece-se que a dimensão ambiental deve fazer parte dos currículos
de formação de professores. A primeira vista esta normatização não oferece obstáculos, uma vez
que é comum o professor reconhecer a sua importância, sentir-se capaz de compartilhar vivências
do seu cotidiano, ser tocado por sentimentos nobres e engajar-se na luta pela melhoria do ambiente.
Todavia, embora estas intenções sejam legítimas, requerem a construção de saberes e
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Projetos e práticas de formação de professores
competências para que a atuação deste professor não se caracterize por um pragmatismo
exacerbado, um vale tudo, sob o risco de banalizar a prática e inviabilizar o sonho da cidadania
ambiental.
Entre os princípios básicos estabelecidos pela Política Nacional de Educação
Ambiental estão a sua continuidade e a permanência no processo educativo. Para tanto, faz-se
necessário o empenho do professor para identificar diferentes perspectivas que estão diluídas sob
o rótulo ambiental, dominar conhecimentos específicos no trato do ambiente, identificar conteúdos
relevantes, proceder à transposição didática em adequação às características da criança e ao
caráter formativo, na intenção de estabelecer as contribuições específicas da educação no
enfrentamento da crise ambiental.
O empenho em sensibilizar e instrumentalizar as crianças para este enfrentamento
não se reduz à realização de atividades pontuais como, por exemplo, o plantio de árvores em dias
comemorativos. Estas atividades possuem uma função socializadora, mas pouco contribuem
para a cidadania ambiental. Geralmente, caracterizam-se pela superficialidade, não ultrapassam
as concepções ingênuas e não possibilitam a construção de conhecimentos para uma leitura
crítica da realidade.
Não é raro encontrar em materiais didáticos a menção de atitudes corretas e
incorretas no trato do ambiente apenas de caráter informativo. A razão de agir de maneira adequada
não é compreendida e sequer interiorizada pela sua importância intrínseca. A criança pode respeitar
estas indicações para não ser advertida pelo professor ou para ser “politicamente correta” perante
os colegas. Estas menções, talvez tenham uma razão nobre na sua proposição, mas carecem de
contextualização, de problematização sobre o porquê agir de determinada maneira e estão longe
de alcançar a conscientização e a cidadania ambiental.
O processo de conscientização crítica é mais complexo e baseia-se numa percepção
ecológica profunda. Capra (1996, p.25) defende este percepção ao admitir que:
Uma visão holística [...] de uma bicicleta significa ver a bicicleta como um todo
funcional e compreender, em conformidade com isso, as interdependências das suas partes.
Uma visão ecológica da bicicleta inclui isso, mas acrescenta-lhe a percepção de como a bicicleta
está encaixada no seu ambiente natural e social – de onde vêm as matérias-primas que entram
nela, como foi fabricada, como seu uso afeta o meio ambiente natural e a comunidade pela qual
ela é usada, e assim por diante.
O pensamento sistêmico tem como pressuposto esta complexidade e aponta para
a necessidade de articular diferentes campos do conhecimento numa tentativa de compreender a
questão ambiental. A profundidade no tratamento dos temas ambientais condiz com o processo
paulatino de (re)construção de conhecimentos, sem perder de vista a globalidade.
O termo meio ambiente engloba aspectos naturais e sociais. A conquista de uma
comunidade ecologicamente equilibrada envolve aspectos econômicos, políticos, sociais, éticos,
culturais. O trabalho pedagógico que tenha como foco a educação para a cidadania ambiental
tem por princípio resgatar as discussões sobre meio ambiente e adotar uma proposta teóricometodológica em adequação ao público infantil.
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Projetos e práticas de formação de professores
Proposta teórico-metodológica de educação ambiental em resíduos para o ensino
fundamental
Para que o saber possa ser inteligível, além de adaptações dos conteúdos à
linguagem apropriada são necessários investimentos em metodologias de ensino que respeitem
a estrutura lógica do material de aprendizagem e a estrutura psicológica dos alunos e ofereça
oportunidades para facilitar a aprendizagem significativa. A transposição didática exige cuidado
para que a simplificação e a maneira de apresentar os conteúdos não comprometam a compreensão
da realidade.
Especialmente com relação a discussões sobre o meio ambiente, a mídia (televisão,
filme, jornal, revista) tem sido uma fonte de pesquisa paralela do professor assumindo o papel de
socializar conhecimentos. Entretanto, nem sempre há um compromisso com o rigor teórico e
conceitual o que requer a vigilância crítica das informações veiculadas.
Por outro lado, os saberes escolares são organizados de forma a obedecer as
lógicas internas das disciplinas, cuja prioridade se justifica como um fim em si mesmo. Justificase o estudo de um assunto, por exemplo, porque faz parte do currículo proposto para série e não
pela sua relevância social.
Este fato se agrava ao se considerar a fragilidade da fragmentação do conhecimento
em disciplinas escolares. Esta compartimentação contraria a maneira global com que nos
deparamos e atribuímos significados aos problemas da realidade (ao observarmos um fenômeno
buscamos compreendê-lo na sua totalidade sem o atrelamento a Geografia, a Matemática,... ),
ainda que se justifique a importância da especialização para assegurar o aprofundamento necessário
dos estudos.
Como amenizar esta problemática e oferecer um outro parâmetro para a definição
do que e como ensinar em consonância com a função social da escola?
Na perspectiva do enfoque globalizador (ZABALA, 2002) são identificados problemas
da realidade e os conteúdos escolares tornam-se relevantes ao se constituírem em conhecimentos
que possibilitem a resolução dos mesmos. De acordo com o enfoque globalizador a escolha dos
conteúdos se dá em função da necessidade de compreender e intervir na realidade complexa,
valendo-se das ciências como instrumento para a melhoria das condições de vida. Neste contexto,
a interdisciplinaridade se sustenta ao promover a intercomunicação dos saberes, através de um
amplo processo de negociação entre os professores que culmine na colaboração de diferentes
profissionais no estudo de um tema ou problema.
É importante que a escolha do tema possibilite a ampliação do repertório de
conhecimentos a respeito do mundo social e natural, a partir de uma problemática vivenciada no
meio onde a criança se insere. Contextualizar o objeto de estudo, em consideração às relações
estabelecidas no cotidiano da criança pode torná-lo mais significativo, porém é necessário não
perder de vista as possibilidades de generalização para outros contextos.
O estudo do tema resíduo/lixo, por exemplo, pode ser reconhecido pela comunidade
da instituição como instigador e de relevante significado social. Discutir o resíduo/lixo (da escola,
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Projetos e práticas de formação de professores
da casa) estimula a construção de valores, hábitos e atitudes de cidadania ambiental, em favor de
medidas de diminuição do consumismo e de conservação e preservação ambiental.
Cabe ressaltar que, nesse processo educativo, a construção de conhecimentos
deve incluir a discussão de conceitos, incorporando novas propostas conceituais, a exemplo de
Logarezzi (2004, p.222), cujos conceitos para resíduo e lixo são mostrados neste trabalho:
resíduo – Aquilo que sobra de uma atividade qualquer, natural ou cultural. Nas
atividades humanas em geral, geramos resíduo (e não lixo); (...) ao ser descartado um resíduo
pode ter seu “status” de resíduo (que contém valores sociais, econômicos e ambientais) preservado,
ao longo do que pode ser chamada de rota dos resíduos, a qual geralmente envolve descarte e
coleta seletivos – terceiro R- reciclagem; caso contrário, um resíduo pode, por meio do descarte
comum, virar lixo – nenhum dos 3R. [...]. lixo – Aquilo que sobrou de uma atividade qualquer e é
descartado sem que seus valores (sociais, econômicos e ambientais) potenciais sejam preservados,
incluindo não somente resíduos inservíveis, mas também, incorretamente do ponto de vista
ambiental, resíduos reutilizáveis e recicláveis. Resíduos assim descartados geralmente adquirem
aspectos de inutilidade, sujidade, imundície, estorvo, risco etc.,
Ao professor cabe proporcionar situações que mobilizem as crianças para
construírem conhecimentos sobre a temática, diagnosticarem problemas no seu contexto e
sugerirem soluções para os problemas que envolvam ações individuais e coletivas.
É preciso querer aprender, estar motivado positivamente para aprender. Esta é
uma das condições fundamentais para a ocorrência da aprendizagem significativa. Em educação
ambiental destaca-se a importância da sensibilização como uma primeira aproximação para atingir
os objetivos da cidadania ambiental.
A criança tem uma dimensão diferente quanto à relevância social da aprendizagem
dos conteúdos. Para suscitar este interesse é preciso observar as vivências das crianças, a fim de
instigá-las na busca do significado para o estudo de um determinado tema. Com relação ao tema
resíduo/lixo é possível aproveitar as vivências e/ou criar oportunidades que mereçam atenção.
Um forte odor, um bueiro entupido, fotos de lixão, catadores ou de uma pessoa alimentando-se de
restos coletados no lixo, o acúmulo de resíduo/lixo na sala ao ponto de incomodar podem ser
objetos de atenção e ativar o interesse em aprender.
A valorização das conquistas, das experiências idiossincráticas, da auto-estima, a
administração adequada dos conflitos e das diferentes expectativas, a proposta de novos desafios,
através de um acompanhamento constante do docente, colaboram para a manutenção do interesse
e criam um clima favorável à aprendizagem.
De acordo com o enfoque globalizador, em um primeiro momento, a apresentação
da realidade caracteriza-se por uma perspectiva metadisciplinar evitando-se o atrelamento aos
conteúdos das diferentes disciplinas. Um dos problemas da educação é centrar a atenção nas
disciplinas o que empobrece a leitura de mundo. Romper com esta estrutura significa ampliar as
possibilidades de entendimento.
Mesmo ciente da complexidade da realidade e de todas as limitações das crianças
em compreendê-la, é fundamental instigar a sua leitura. Neste sentido, são oportunas situações
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Projetos e práticas de formação de professores
em que as crianças verbalizem os porquês (do forte odor, do bueiro entupido, do acúmulo de
resíduo/lixo na sala, de pessoas sobreviverem catando resíduos ou alimentando-se de restos) e
proponham hipóteses. Ao explicitar as suas indagações as crianças evidenciam os seus
conhecimentos prévios a respeito do assunto a ser estudado. Este é o momento adequado para
avaliar o que sabem, as limitações deste saber, os obstáculos diante da compreensão e intervenção
na realidade.
A criança pode expressar os seus conhecimentos, através da fala, da escrita, de
desenhos, de dramatizações. Os critérios estabelecidos para estas tarefas precisam ser claros
para que a criança sinta-se encorajada para representar o que sabe. A troca dos materiais produzidos,
a apresentação dos desenhos para o coletivo, a argumentação sobre o porquê dos desenhos têm
o potencial de desencadear a ampliação dos saberes, a negociação dos diferentes pontos de
vista.
Em relação ao tema resíduo/lixo o levantamento inicial pode ser realizado, através
de desenhos e de uma roda de conversa a respeito dos conceitos de resíduo e lixo, da identificação
de problemas causados pelo lixo, das sensações, etc. O levantamento dos conhecimentos prévios,
a formulação de hipóteses pelas crianças e o questionamento intencional do professor (ex. Quais
os resíduos/lixos da sala de aula? Quem utilizou os produtos? Para que usou? Eles ainda servem
para algo? Para onde vão parar? Eles causam problemas para o meio ambiente? Por quê algumas
pessoas sobrevivem catando resíduos? Como resolver estes problemas?) auxiliam na mobilização
de esquemas de pensamento para interpretar a realidade e têm por princípio focalizar e potencializar
as observações da criança sobre acontecimentos relevantes do seu entorno.
Ativar os conhecimentos prévios, evidenciar as suas limitações causam
desequilíbrios que fazem parte do processo de aprender e merecem a intervenção do professor
para providenciar materiais e os recursos necessários para que a criança possa relacionar os seus
conhecimentos prévios ao novo material de aprendizagem e reorganizar e ampliar os seus saberes,
o que caracteriza a aprendizagem significativa.
Diante das hipóteses levantadas pelas crianças cabe ao professor delimitar o objeto
de estudos. Não é possível responder a todas as questões em função da disponibilidade de tempo
e das condições efetivas de aprendizagem. Adequações quanto à profundidade e amplitude do
trabalho a ser desenvolvido de acordo com as possibilidades remetem a diferentes fontes de
informação, a seleção de materiais de aprendizagem, ao julgamento dos conteúdos relevantes, a
organização e a apresentação lógica destes saberes em atendimento aos objetivos pretendidos.
Por outro lado, não há uma seqüência rígida dos conteúdos. O que ensinar vai sendo reavaliado
a cada momento diante das necessidades de compreensão do grupo.
Num segundo momento, busca-se assegurar a interdisciplinaridade. A delimitação
dos conteúdos requer esclarecer qual a função de cada disciplina específica para a compreensão
e intervenção na realidade. A delimitação de situações problemas, a consideração das experiências
e a definição de áreas curriculares que lançam mão da interdisciplinaridade e a intercomunicação
dos saberes são atitudes que favorecem o pensamento complexo. Este procedimento respeita os
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Projetos e práticas de formação de professores
instrumentos conceituais e metodológicos específicos das disciplinas e é enriquecido pela
multiplicidade de abordagens e contribuições de diferentes áreas do conhecimento o que
potencializa os resultados da aprendizagem.
O estudo do tema resíduo/lixo pode suscitar conexões com uma infinidade de
assuntos de acordo com o caminho do grupo caracterizado por experiências, expectativas,
subjetividades e contextos sociais e culturais singulares. O grupo é quem decide quais serão os
temas que serão abordados, as fontes de informação e as estratégias utilizadas, a fim de favorecer
a interpretação crítica da realidade. Oportunamente, o agendamento de visitas, palestras ou
atividades desenvolvidas por outros profissionais se faz necessário, assim como a participação
dos pais.
Em educação ambiental é imprescindível acompanhar, refletir e valorizar as
manifestações cotidianas em prol da transformação social, da conquista de um ambiente saudável.
Com este objetivo é indicado reservar um espaço para arquivar os registros da caminhada e
resgatar a memória coletiva.
A título de sugestão seguem algumas atividades que podem fazer parte do estudo
sobre o tema resíduo/lixo para crianças do primeiro ciclo com a contribuição de diferentes áreas
do conhecimento. Ressalta-se a importância da valorização das várias linguagens (musical,
corporal, plástica, pictórica, oral...) e dos aspetos lúdicos no processo de construção de
conhecimentos.
1) Resíduo/Lixo
•
Objetivos: Abordar o tema resíduo/lixo em consideração às características
de construção do conhecimento pela criança; Identificar e confrontar hipóteses dos alunos, no
sentido de aproximá-las das explicações científicas.
•
Procedimentos: Observação e descrição da sala com resíduo/lixo; Registro
e discussão sobre as percepções e as sensações de ocupar uma sala com muito lixo; Fotografia
(ou desenhos) da sala para documentação; Investigação coletiva dos materiais que compõem o
resíduo/lixo da sala e agrupamento destes materiais por categorias; Observações e registros de
pesquisa (Ex. formulários simples para levantamento de dados sobre tipos e quantidades de
resíduo/lixo produzido durante um período na sala); Elaboração de gráficos, apresentação oral
dos resultados e debate sobre os resultados.
2) Você sabe o que é resíduo/lixo?
•
Objetivo: Conceituar resíduo/lixo, identificar os resíduos/lixos produzidos
no local e os seus diferentes tipos: domiciliar, comercial, público, saúde, industrial, portos,
aeroportos, terminais rodoviários, agrícola e entulhos.
•
Procedimento: Montagem de painel coletivo com imagens ou objetos de
diferentes tipos de resíduo/lixo.
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Projetos e práticas de formação de professores
3) Do que e como são feitos os produtos? Processo de produção (recursos naturais,
matéria-prima, energia, técnica/tecnologia, trabalhadores).
•
Objetivos: Compreender o processo de produção de objetos utilizados pelas
crianças (Ex.papel); Avaliar a necessidade de reposição do recurso natural utilizado como matéria
prima (Ex. árvores e reflorestamento) e discutir sobre a importância da manutenção da
biodiversidade.
•
Procedimentos: Montagem de cartazes de produtos e suas respectivas
matérias-primas; Escolha de alguns produtos utilizados (Ex. papel, lápis) para o estudo do seu
processo de produção; Painéis com fotografias de desmatamento/ reflorestamento – plantas nativas
- monocultura/ biodiversidade.
4) O lixo de antigamente e de hoje
•
Objetivos: Reconhecer o valor de resíduos e materiais que são jogados
fora; Contribuir para construção de noções espaciais, temporais (transformações e permanências
no espaço); Problematizar sobre o avanço tecnológico e o aumento da geração de lixo não
degradável.
•
Procedimentos: Contador de estórias; Desenhos coletivos sobre os resíduos/
lixos de antigamente e de hoje; Montagem de painel com desenhos e imagens de resíduos/lixos
gerados no decorrer do tempo (cronologia); Montagem da casa de antigamente (remédios naturais,
horta, transformação do lixo orgânico em adubo, reuso de produtos, pouca geração de lixo) e da
casa de hoje (excesso de produtos industrializados, de embalagens descartáveis, geração de
muito resíduo/lixo); Entrevistas com familiares ou pessoas da comunidade sobre a coleta do
resíduo/lixo e papel dos catadores no decorrer do tempo (construir o instrumento de entrevista
junto com as crianças).
5) O ciclo da natureza
•
Objetivo: Evidenciar o ciclo da natureza.
•
Procedimentos: Experiência de decomposição do lixo orgânico - relatório
semanal das alterações percebidas e convite para um especialista para tratar da decomposição
do lixo na natureza/ Horta comunitária na escola cuidada pelos alunos.
6) Para onde vai o lixo? A rota do lixo (lixão, aterro controlado, aterro sanitário,
incineração)
•
Objetivos: Estabelecer as diferenças entre as rotas do lixo e do resíduo e
identificar os problemas causados pelo lixo ao meio ambiente.
•
Procedimentos: Questionamento sobre qual a forma de descarte (comum
ou seletivo) da casa de cada um; Apresentação de história em quadrinhos sobre o descarte
comum realizado por uma família e o caminho do lixo produzido com ênfase nos impactos
ambientais; Apresentação e leitura de imagens e maquetes de lixão, aterro controlado, aterro
sanitário, incinerador (favorecer a manipulação das maquetes e a dedução dos processos dinâmicos
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Projetos e práticas de formação de professores
envolvidos em cada etapa) - levantamento das observações e hipóteses dos alunos - identificação
de semelhanças e diferenças entre os diferentes destinos do lixo; Apresentação e análise de
imagens de impactos ambientais.
7) Quais os problemas causados pela disposição irregular do lixo? (poluição da
água, do solo, do ar, proliferação de insetos e risco da disseminação de doenças)
•
Objetivo: Identificar os problemas causados pelo lixo ao meio natural e as
pessoas; Procedimentos: Leitura de história em quadrinhos sobre os problemas causados pelo
lixo e convite para profissional da área de saúde para falar sobre os riscos da disseminação de
doenças no lixão.
8) Lixão: poluição, qualidade de vida dos catadores, exclusão social, desemprego,
trabalho infantil, doenças
•
Objetivo: Perceber as desigualdades sociais, sensibilizar-se com a situação
de vida dos catadores e empenhar-se para o bem estar do semelhante.
•
Procedimentos: Interpretação de fotografia de lixão e roda de conversa:
compartilhar opiniões.
9) Para onde vai o resíduo? A rota do resíduo (descarte seletivo, coleta seletiva,
triagem, pré-processamento, reciclagem/ usina de triagem e compostagem)
•
Objetivo: Estabelecer as diferenças entre as rotas do lixo e do resíduo.
•
Procedimentos: Apresentação de história em quadrinhos sobre o descarte
seletivo realizado por uma família e o caminho do resíduo; Apresentação e leitura de imagens e
maquetes de descarte seletivo, coleta seletiva, triagem, pré-processamento, reciclagem, usina de
triagem e compostagem (favorecer a manipulação das maquetes e a dedução dos processos
dinâmicos) - levantamento das observações e hipóteses dos alunos; Identificação de semelhanças
e diferenças entre as rotas do lixo e do resíduo com destaque para os impactos socioambientais
positivos e negativos; Apresentação e problematização da realidade local quanto ao destino do
resíduo/lixo (existência de lixão, aterro controlado, aterro sanitário, incinerador, cooperativa de –
coleta seletiva, pré-processamento, reciclagem - usina de compostagem).
10) Produtos que entram na nossa casa e Preciso de tudo isto? (Hábitos de consumo
x desperdício)
•
Objetivos: Identificar os diferentes modos de vida e de consumo;
Problematizar os desperdícios e os hábitos de consumo priorizando a redução do consumo;
Potencializar as capacidades analíticas, críticas e interpretativas frente às mensagens recebidas
pelos meios de comunicação de incentivo ao consumismo.
•
Procedimentos: Debate sobre o resíduo/lixo produzido nas casas dos alunos;
Apresentação de dados de pesquisas sobre as diferenças de consumo das classes sociais com
destaque para a exclusão social e identificação das diferenças entre os padrões culturais de
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Projetos e práticas de formação de professores
consumo; Investigação sobre a quantidade de produtos consumidos pelas crianças e o que é
desperdício; Excesso de embalagens.
11) Os resíduos servem para alguma coisa?
•
•
Objetivo: Reconhecer o valor de materiais que são jogados fora.
Procedimentos: Solicitação para que as crianças tragam resíduos que podem
ser reutilizados ou recicláveis de casa para que sejam separados (plásticos, metais, papel, vidro);
Construção com caixas de papelão encapadas (vermelho, azul, amarelo, verde) de coletores
seletivos; Visita à cooperativa/associação de resíduos e doação do material recolhido. (Elaboração
em conjunto com os alunos de um roteiro de entrevista sobre as condições de trabalho, renda,
resíduos e materiais recicláveis, história de vida -reconstrução da trajetória de um catador); Registro,
sistematização e divulgação da experiência para a comunidade escolar.
12) Redução , reuso e reciclagem
•
Objetivo: Compreender, promover e valorizar práticas de redução do
consumo e reuso de materiais e produtos (papel, brinquedos, roupas) para poupar os recursos
naturais envolvidos no processo de produção e diminuir a poluição./ Compreender processos de
reciclagem.
•
Procedimentos: Sugestões (alunos e professor) de como diminuir o consumo
e reaproveitar os materiais antes jogados na lixeira (Ex. aproveitamento dos dois lados do papel);
Substituição de copos descartáveis por canecas duráveis trazidas de casa; Um dia na cozinha:
receita com o aproveitamento de alimentos que, geralmente, são desprezados (ex. talos de agrião,
folhas de beterrabas); Organização de palestra – nutricionista; Estabelecimento coletivo de regras
e cuidados com a conservação das mesas, carteiras e outros objetos para que tenham um maior
tempo de vida útil; Promoção de campanha de doação de brinquedos usados para crianças carentes
/ Reciclagem: Exposição de produtos reciclados e dos materiais recicláveis que lhes deram origem;
Técnica artesanal de reciclagem do papel; Transformação de materiais usados em matéria-prima
para brinquedos.
13) Poder Público (federal, estadual, municipal), indústria, comércio e comunidade
Objetivo: Compreender as responsabilidades com relação ao descarte, coleta,
acondicionamento, triagem, processamento, reciclagem, transporte, disposição e tratamento do
resíduo/lixo
Procedimentos: Palestras, visitas.
14) Cidadania Ambiental
•
Objetivo: Avaliar a experiência de aprender sobre o tema resíduo/lixo e o
significado da cidadania ambiental; Problematizar o co
mpromisso para com a preservação
e conservação do meio ambiente; Promover a generalização da experiência com destaque para
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Projetos e práticas de formação de professores
outras realidades; Mobilizar ações políticas locais envolvendo a escola e a comunidade no
enfrentamento dos impactos sociambientais relacionados a questão do resíduo/lixo.
•
Procedimentos: Debate sobre os resultados do trabalho e do conceito de
cidadania ambiental; Instalação de coletores seletivos na escola e doação dos resíduos recolhidos;
Dramatização: o papel individual e coletivo diante das ações que podem ser realizadas em diferentes
espaços para a conservação e preservação do meio ambiente.
CONCLUSÕES
As atividades propostas são condizentes com a cidadania ambiental na medida em
que privilegiam a aquisição de conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais voltados para
a conservação do meio ambiente. A instituição escolar tem um papel “limitado” diante do contexto
global da tomada de decisões pertinentes à transformação da política econômica vigente. Não
obstante, contribui para efetivar a construção de um outro paradigma para nortear os
relacionamentos do homem com a natureza e homem-homem em que valores éticos e morais
fundamentem projetos de vida sensíveis à problemática ambiental e solidários com o bem estar e
a justiça social.
A cidadania ambiental é um processo moroso fundamentado na mudança de
paradigma. Não basta apenas informar as atitudes corretas e incorretas com relação ao meio
ambiente. Este compromisso envolve a todos que pertencem à instituição e necessita da conquista
de parceiros além dos muros da escola. Neste sentido, é primordial conquistar parceiros da
sociedade civil (ONGs, Associação de moradores, igrejas...) e representantes do poder público
com o objetivo de efetivar ações coletivas de preservação, conservação e recuperação ambiental.
Na universidade são realizadas pesquisas interdisciplinares sobre a realidade de
Presidente Prudente (SP) com relação ao resíduo/lixo. A extensão tem por propósito socializar os
conhecimentos com a comunidade. São confeccionados materiais didáticos, acervo fotográfico,
realizadas exposições, estágios de regência na rede de ensino e oficinas voltadas à formação
docente em serviço. O objetivo do Projeto é realizar pesquisas, investir na formação docente
inicial e em serviço e realizar parcerias com o poder público e a comunidade na busca do
enfrentamento da crise ambiental.
Promover a educação ambiental requer estudo, o rompimento com algumas crenças
para reconstruir o caminho, viver o coletivo, negociar as diferenças. Para avançar é inevitável
abalar a segurança, acreditar na utopia, abrir-se para o novo e refletir sobre a própria prática na
busca constante de realizar o sonho da cidadania ambiental.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 9.795, de 27 de abril de 1999. Diário Oficial [da] República do Brasil, DF, Poder
Legislativo, Brasília, DF, 28 abr. 1999.
CAPRA, Fritjof. A teia da vida.Tradução de Newton Roberval Eichemberg. São Paulo: Cultrix,
1996.
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Projetos e práticas de formação de professores
GUIMARÃES, Mauro. A formação de educadores ambientais. Campinas: Papirus, 2004.
LOGAREZZI, Amadeu J. M. Contribuições conceituais para o gerenciamento de resíduos sólidos
e ações de educação ambiental. In: LEAL, Antonio Cezar et al. Resíduos sólidos no Pontal do
Paranapanema. Presidente Prudente: Antonio Thomaz Junior, 2004. p.221-244.
MATURANA, Humberto. Emoções e linguagem na educação e na política. Tradução de José
Fernando Campos Fortes. Belo Horizonte: UFMG, 1998.
SÃO PAULO (Estado). Secretaria do Meio Ambiente. Coordenadoria de Educação Ambiental.
Guia pedagógico do lixo. São Paulo: SMA, 2002.
ZABALA, Antoni. Enfoque globalizador e pensamento complexo: uma proposta para o currículo
escolar. Tradução de Ernani Rosa. Porto Alegre: Artmed, 2002.
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Projetos e práticas de formação de professores
EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO CONTEXTO DA
EDUCAÇÃO INFANTIL E A UTILIZAÇÃO
DO BRINCAR: RELATO DE EXPERIÊNCIA
ALVES, Heliana Castro (UFSCar)
Constitucionalmente vêem-se hoje garantidos muitos direitos às pessoas portadoras
de necessidades especiais no sentido da inclusão social. No campo da educação, o paradigma da
inclusão social veio para garantir às crianças com necessidades educacionais especiais sua inserção
na rede regular de ensino, invertendo a lógica da exclusão de grupos minoritários historicamente
construída a partir de um modelo de referência segregacionista. Encontra-se esta nova forma de
conceber a educação em documentos como a LDB n. 9.394/96 no Plano Nacional de Educação
(Minto, 2000), na Declaração de Salamanca e o Referencial Curricular Nacional para a Educação
Infantil, este que propõe diretrizes para a educação desta população, contemplando as áreas de
Educação Infantil e Especial.
A escola inclusiva se baseia no princípio de igualdade social, que preza o
reconhecimento e a legitimação da diferença; que a diversidade deve ser incorporada e não
marginalizada e segregada da convivência social. A inclusão incorpora uma filosofia que aceita a
diversidade, na vida em sociedade; reconhece que todas as pessoas são diferentes, têm
necessidades diversas e que deve ser contemplada, constitucionalmente a garantia das mesmas
condições de desenvolvimento e oportunidades na vida social para todos seus membros.
Segundo Abramowicz, Rocha e Cunha (2002) constatam-se entre os fatores que
dificultam a inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais a formação do professor
de ensino regular: “Poucos têm conhecimento nessa área e sentem-se inseguros ao saber que
em sua turma haverá um aluno com estas características” (p.245). Aranha (2000) concorda ao
pontuar a necessidade de prover os professores de ensino regular de suporte técnico, didático e
pedagógico, possibilitando o ajuste refinado entre fazer e saber, na construção do conhecimento
e na prática pedagógica.
Mendes (2004), ao analisar pesquisas sobre escola inclusiva realizadas no Brasil,
conclui que a função da pesquisa na área seria a de produzir conhecimento para a construção de
sistemas educacionais inclusivos, e destaca três vertentes que considera relevantes para a produção
científica: a primeira delas é relacionada à formação de professores; a segunda à implantação e
avaliação de políticas de inclusão em sistemas públicos de ensino; a terceira trata de estudos
relacionados à família e educandos com necessidades educacionais especiais. Destaca-se nas
suas considerações finais, o seguinte: “uma política de formação de professores é um dos pilares
para a construção da inclusão escolar, pois a mudança requer um potencial instalado, em termos
de recursos humanos, em condições de trabalho para que ela possa ser posta em prática” (p.228).
Com base em estudos, que revelaram haver demanda, por parte do sistema de
ensino, na formação dos professores na compreensão do paradigma da inclusão social (ARANHA,
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Projetos e práticas de formação de professores
2000, PEREIRA, 2002; MENDES, 2004), e na capacitação para lidarem com a criança portadora
de necessidades especiais, a experiência aqui relatada utiliza o “brincar” da criança para convidar
o professor a um olhar reflexivo sobre a sua prática. A escolha do brincar parte do fato de este ser
o comportamento típico da fase da infância, presente nas crianças com necessidades especiais e
crianças com desenvolvimento típico, fazendo parte do cotidiano escolar e do conjunto de recursos
de que o professor se utiliza na sua prática.
Existem várias linhas desenvolvimentistas e pensadores que enfatizam a importância
do brincar no desenvolvimento infantil. Abramowicz, Rocha e Cunha (2002) apontam a atividade
lúdica enquanto um importante instrumento na ação educativa, e Mrech (2003) percebe os
brinquedos e jogos assumindo um papel nuclear no estabelecimento de intervenções que visam a
atender às necessidades especiais das crianças que apresentam alguma disfunção no
desenvolvimento.
Kishimoto (2003) discorre sobre como se dão as relações entre o jogo infantil e a
educação ao longo da história, discernindo diferentes concepções para cada época, desde a
antiguidade, o renascimento, até aos dias atuais. O brinquedo assume um papel importante para
o desenvolvimento infantil e para a aprendizagem. De forma intuitiva a criança pode adquirir
noções espontâneas, envolvendo aspectos da cognição, afetividade, físico e social. O jogo,
permitindo a ação intencional, a construção de representações mentais, a manipulação de objetos
e o desempenho de ações sensório-motoras, contribui para seu desenvolvimento. A dimensão
educativa surge a partir do momento que existe a intenção do adulto no estímulo de certos aspectos
da aprendizagem.
Desta forma, a autora chama a atenção para o significado do jogo na educação,
diferenciando duas funções: a lúdica, envolvendo o prazer e a escolha voluntária e a educativa,
envolvendo a apreensão do mundo, a complementação do saber. Estas funções parecem entrar
em contradição, já que a natureza livre do jogo incompatibiliza-se com a busca de resultados,
típica de processos educativos. Pontua em seus estudos que duas das características do jogo
infantil é a livre escolha e o controle interno sendo que em ambas percebe-se a criança
protagonizando a situação da brincadeira, quanto à sua escolha e quanto ao desenvolvimento dos
acontecimentos. Desta forma a autora levanta o questionamento em relação à forma de reunir na
mesma situação de brincar, a função lúdica e educativa. Quanto a isso, exemplifica:
“Se a criança está diferenciando cores, ao manipular livre e prazerosamente um
quebra-cabeça disponível na sala de aula, a função educativa e lúdica estão presentes. No entanto
se a criança prefere empilhar peças do quebra-cabeça, fazendo de conta que está construindo um
castelo, certamente estão contemplados o lúdico, a situação imaginária, a habilidade para a
construção do castelo, a criatividade na disposição das cartas, mas não se garante a diferenciação
das cores” (p. 37)
Kishimoto (2003) acrescenta que a despeito da diversidade de situações de
aprendizagem propiciadas na situação lúdica, não existe a garantia de que a intenção pedagógica
do professor tenha sido contemplada na construção do conhecimento efetuado pela criança. Essa
é a especificidade do brinquedo educativo.
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Projetos e práticas de formação de professores
Estas características e funções dos jogos infantis são importantes já que a concepção
e percepção do professor sobre o brincar da criança com necessidades educacionais especiais
passa, antes de tudo pela sua forma de conceber o jogo na educação e na sua prática educativa.
Kishimoto (2003) destaca a liberdade como atributo principal do jogo devendo ser respeitada
conciliando-se com a orientação própria dos processos educativos. “Desde que não entre em
conflito com a ação voluntária da criança, a ação pedagógica intencional do professor deve se
refletir na organização do espaço, na seleção de brinquedos e na interação com as crianças (...)
Qualquer jogo empregado pela escola aparece sempre como um recurso para a realização das
finalidades educativas e, ao mesmo tempo, um elemento indispensável ao desenvolvimento infantil”
(KISHIMOTO, 2003 p.19 e 22).
Victor (2004) aponta que muitas vezes o jogo, quando presente enquanto um recurso
pedagógico para crianças com necessidades especiais, especialmente a deficiência mental, serve
geralmente como suporte às atividades didáticas, perdendo-se sua especificidade. Apresenta,
neste sentido, a noção trazida por Kishimoto (2003) em relação à necessidade de se integrar as
duas funções do jogo, o lúdico e o educativo, ao dizer que “o brincar, além de proporcionar alegria
e divertimento, desenvolve a criatividade, a competência intelectual (...) atuando como fator
significativo para a aprendizagem”(p. 92). As pesquisas descritas pela autora visam contribuir na
discussão sobre o papel do brincar no currículo da Educação infantil e na educação de crianças
com necessidades educacionais especiais.
Em uma das pesquisas a autora se propunha a analisar o jogo, a mediação
pedagógica e a interação entre a criança com deficiência mental e a criança com desenvolvimento
típico. Sua meta neste trabalho foi contribuir para a formação do professor promovendo a reflexão
sobre a mediação pedagógica, tendo por referência a brincadeira de faz-de-conta de crianças
com deficiência mental e crianças com desenvolvimento típico. Assim, além do interesse nas
interações entre as crianças com necessidade educacionais especiais, a autora também escolheu
como objeto de estudo na sua pesquisa a mediação pedagógica de alunos de iniciação científica,
ou seja, futuros profissionais da área da educação em formação inicial. A pesquisa se deu em
uma brinquedoteca.
No resultado de sua pesquisa sobre as contribuições do brincar na inclusão da
criança com necessidades educacionais especiais, a autora também chama a atenção para a
ineficiente mediação do professor na condução do aluno ao conhecimento através da brincadeira
e na promoção de situações de inter-relacionamento entre as crianças com necessidades especiais
e as que apresentam desenvolvimento típico. Para a autora, esta “lacuna” na formação do professor
quanto às possibilidades do brincar na ação educativa e nas trocas sociais, permite sentimentos
e atitudes de exclusão na escola, portanto, contrários à perspectiva de inclusão.
Emmel (2004) discorre sobre o papel do adulto para o brincar da criança, uma vez
que, através da interação entre adulto e criança, pode ser criado um ambiente propício ao
desenvolvimento global do indivíduo. Esta interação possibilita, além do contato afetivo, um apoio
para a atividade cognitiva fornecendo bases novas para a aprendizagem. Segundo esta mesma
autora o papel do adulto também está no estabelecimento de uma interação entre as crianças, ao
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Projetos e práticas de formação de professores
organizar o espaço e as experiências da criança, estabelecendo regras, condições para o
desenvolvimento das atividades e estimulando modalidades específicas de comportamento social
entre elas. Destaca, porém, que em alguns momentos a presença do adulto na brincadeira também
pode restringir iniciativas de interação dentro do grupo, resultando na redução do número de
contatos entre as crianças e seus pares. Por outro lado, Emmel (2000) diz que a presença do
adulto possibilita à criança a oportunidade de representar e simbolizar, além de atribui relevância
social a suas ações e aos objetos. Victor (2004) também realça a função do educador no
acompanhamento do movimento lúdico da criança e na realização de mediações pedagógicas
que favoreçam o seu desenvolvimento, estimulando a criatividade, a operatividade, o equilíbrio
emocional, a sociabilidade, entre outros fatores.
Mrech (2003) ao falar sobre o uso de brinquedos, jogos e materiais pedagógicos na
prática do professor junto à criança com necessidades especiais, adiciona o conceito de modalidade
de aprendizagem que revela a forma e o conteúdo de estruturação da aprendizagem do sujeito.
Diferentemente do modelo de aprendizagem geral e universalista, a modalidade de aprendizagem
é sempre singular e específica (FERNANDÉZ, 1991). É através da modalidade de aprendizagem
do sujeito que realmente poderemos conhecer como o material introduzido pelo professor foi
captado e quais são as necessidades específicas do aluno.
Neste sentido se o olhar for direcionado para o fato de que a inclusão de crianças
com necessidades especiais inseridas na rede regular de ensino desestrutura de certa forma o
sistema de ensino tal como ele é concebido, admite-se a necessidade de uma mudança significativa
nas configurações físicas e pedagógicas da escola, investindo-se na formação do professor no
sentido de colaborar para que este possa perceber quê tipo de recurso de instrumentos o aluno
precisa receber (Victor, 2004). Isso significa que não há uma metodologia única para a multiplicidade
das diferenças (Abramowicz, Cunha e Rocha, 2002) e que devemos aderir a um sistema de
ensino que habilite o professor para olhar a singularidade de cada aluno, adaptando assim suas
estratégias pedagógicas.
Abramowics, Cunha e Rocha (2002) discutem que o educador, preocupado em
avaliar a capacidade intelectual da criança, acaba não priorizando a criação de um ambiente que
favoreça o aprendizado daquela criança, conforme sua necessidade. Para as autoras, a falta de
compreensão acerca dos problemas dos portadores de deficiência leva à adoção de
comportamentos que provocam impacto negativo no desenvolvimento da criança. Por exemplo, a
atitude de superproteção do educador, ou cuidador, ao se depararem com a criança com
necessidades especiais realizando alguma atividade. Geralmente, acabam por realizar a tarefa
por ela, já que não aceitam a velocidade com que ela realiza a sua ação, não dando condições
para o exercício da autonomia. Neste sentido, Miura, Profeta e Toledo (2000) alertam que o professor
e os familiares podem desempenhar um papel importante no processo de estigmatização da
criança com necessidades educacionais especiais dependendo da forma com este se relaciona
com ela, e que, havendo uma mudança de atitudes destes atores em relação à deficiência,
possibilitando ao aluno “uma melhor interação dele com meio, é possível que ele seja visto como
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Projetos e práticas de formação de professores
uma pessoa que participa afetivamente, socialmente, economicamente, etc, de uma vida comum
a todos.” (p.174).
Partindo destes pressupostos, acredita-se que é preciso criar na escola espaços de
reflexão que poderão levar a modificações importantes no pensar e no fazer pedagógico, conforme
aponta Oliveira (2002).
Assim, adaptar os recursos pedagógicos e ampliar a área de conhecimento do
professor, passa, antes de tudo, pela concepção do professor acerca da deficiência em si. Acreditase que este pensar interfere na prática do professor e também na forma como ele interage com a
criança ao brincar, na forma como ele a observa ao brincar, na forma como ele estabelece seu
papel de mediador pedagógico e no favorecimento da relação com as crianças que apresentam
desenvolvimento típico.
Projeto Criando Asas:estrutura de funcionamento e reflexão sobre a prática
Através de um espaço de “brinquedos e brincadeiras” a experiência desenvolvida
no Projeto Criando Asas se propõe a oferecer suporte para estes educadores, favorecendo o
processo de inclusão, além de prestar atendimento às crianças com necessidades educacionais.
O projeto Criando Asas era um programa do estado, passando a ser municipalizado
a partir de 2003/ 2004 foi realizado através da secretaria de educação e cultura em parceria com
a secretaria da cidadania.
Funcionava dentro das brinquedotecas nas creches de São Carlos e Centros
Comunitários.
O Criando Asas apesar de ter nascido com a proposta de funcionar dentro das
brinquedotecas que era um espaço diferenciado do cotidiano educacional, teve desde o início um
caráter formativo. Os educadores que atuavam neste projeto passaram a criar um espaço de
reflexão e atuação com estas crianças com necessidades especiais. A partir do brincar estabeleceuse uma nova interação e uma nova compreensão a respeito da deficiência sendo que muitas
vezes estas novas formas de contato favoreciam o processo de inclusão destas crianças. Além
disso, estes educadores começavam a cumprir a função de multiplicadores no momento em que
dividiam suas experiências com outros profissionais.
Os professores recebiam as crianças com necessidades educacionais especiais
nestas brinquedotecas, desenvolvendo um trabalho de estimulação e estabelecimento de contato
educador-criança através do brincar, do lúdico. Para tanto recebiam orientações de uma terapeuta
ocupacional e de uma fonoaudióloga. A terapeuta ocupacional orientava as educadoras em relação
aos brinquedos, brincadeiras e atividades apropriadas para cada criança inclusa no projeto, tendo
em vista seu desenvolvimento e o favorecimento do processo de inclusão. No entanto, as orientações
eram realizadas a partir, principalmente das reflexões das educadoras e o relato de sua rotina com
a criança, favorecendo o processo de mudança na sua mediação pedagógica e possibilitando um
importante diálogo entre profissionais em relação ao atendimento das necessidades daquelas
crianças.
Dentro das creches, a princípio, as crianças eram retiradas da sua sala para serem
atendidas separadamente na brinquedoteca. Ao perceber que isso poderia favorecer atitudes
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Projetos e práticas de formação de professores
discriminatórias dentro da creche, começou-se a incluir no projeto crianças com desenvolvimento
típico, criando um espaço propício não só para o desenvolvimento de habilidades mas um espaço
de integração e configuração de novas formas de relação entre professor e aluno, entre as crianças
com necessidades educacionais e crianças com desenvolvimento típico, favorecendo atitudes e
situações mais coerentes com a concepção e os princípios da educação inclusiva.
A brinquedoteca é um espaço diferenciado e diferenciado no sentido de propiciar
um maior leque de possibilidades de contato desta criança com o lúdico. O papel do educador
também se modifica, pautando sua ação mais no brincar do que no desenvolvimento de ações
com finalidades puramente pedagógicas.
Foi possível observar uma mudança na forma dos professores perceberem as
crianças que estavam sendo acompanhadas, levando em consideração as potencialidades e não
apenas o déficit. A concepção de deficiência foi criando novos contornos a partir da atmosfera
lúdica, permitindo que se ressaltasse os aspectos positivos de cada criança atendida.
A partir de um novo olhar sobre estas crianças, foi possível uma melhor qualidade
na relação educador-criança, favorecendo o processo de inclusão destas crianças na rede regular
de ensino.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABRAMOWICZ, A.; ROCHA, M.J.S; CUNHA, I,A,M. O desenvolvimento das Crianças de três a
Seis anos. In: PALHARES, M.S; MARINS, S. (Org.). Escola inclusiva. São Carlos: Edufscar,
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UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO
81
Projetos e práticas de formação de professores
PEREIRA, E. G. Avaliação de uma experiência de formadores de professores de magistérios
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Projetos e práticas de formação de professores
EXPERIÊNCIA DO CECEMCA – UNESP NO PROJETO
PILOTO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM
CARTOGRAFIA E MEIO AMBIENTE
FREITAS, Maria Isabel Castreglhini de (DEPLAN-IGCE/UNESP);
ALMEIDA, Rosangela Doin de (IGCE/UNESP); RAMOS, Eugênio Maria de França
(IB/UNESP); CABRAL, Márcia Pereira (IGCE/UNESP)
INTRODUÇÃO
A Rede Nacional de Formação Continuada, um programa vinculado ao MEC/SEB,
tem por objetivo a constituição de centros de pesquisa e desenvolvimento, visando promover a
formação permanente de professores e a implantação de novas tecnologias de ensino, onde os
materiais didáticos estarão acessíveis para Estados e Municípios interessados, abarcando atividades
presenciais, semi-presenciais ou a distância.
O Centro de Educação Continuada em Educação Matemática, Científica e Ambiental
(CECEMCA) – Unesp iniciou suas atividades no ano de 2004 e resulta de um Convênio entre a
Unesp e o MEC.
Faz parte da Rede Nacional de Formação Continuada de Professores da Secretaria
de Educação Básica do MEC e tem como objetivo produzir material didático e oferecer cursos de
educação continuada para professores das escolas públicas municipais e estaduais de todo o
Brasil.
A experiência aqui apresentada faz parte do projeto piloto do CECEMCA/Unesp –
Núcleo Rio Claro, realizada na escola estadual Marcello Schmidt, na cidade de Rio Claro/SP, no
período de Abril e Maio de 2005. O Curso teve como objetivo a apresentação de conceitos relativos
às ciências cartográficas e educação matemática aplicados aos estudos ambientais e foi ministrado
para 20 professoras, num total de 40 horas. Objetivou também aprimorar o conteúdo dos cadernos
didáticos elaborados para a formação continuada de professores do ensino fundamental, no formato
semi-presencial. O curso se desenvolveu através de encontros presenciais, atividades monitoradas
usando ferramentas de educação a distância e atividades desenvolvidas em classe pelos professores
com seus alunos do ensino fundamental.
CARTOGRAFIA E MEIO AMBIENTE NO ENSINO FUNDAMENTAL
O CECEMCA – Núcleo Rio Claro, adotou como estratégia centralizar na Educação
Ambiental e nos estudos voltados para os aspectos ambientais a realização de seus cursos, que
podem ser presenciais, semi-presenciais e à distância, bem como do material didático a eles
relacionados, como livros, vídeos e diferentes mídias eletrônicas.
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83
Projetos e práticas de formação de professores
O Meio Ambiente, considerado nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) como
tema transversal, é abordado aqui de forma a integrar as disciplinas e temáticas referentes à
Cartografia sendo que, para tal, é alimentado de exemplos, divulgando o conhecimento científico
gerado pelas diferentes áreas. Pela sua complexidade, a questão ambiental não é exclusividade
de uma ou outra área de conhecimento ou disciplina, mas resulta da combinação de inúmeras
variáveis, envolvendo a natureza física da Terra e a ação do homem como principal ator de sua
transformação e humanização.
O curso Cartografia, Matemática e Meio Ambiente foi preparado para professores
do Ensino Fundamental que atuam nas séries iniciais e tem o objetivo de apresentar conceitos
elementares de cartografia, assim como possibilitar um aprofundamento em temas das ciências
cartográficas que normalmente não se encontram acessíveis no cotidiano do professor. Objetivando
tornar menos árdua a tarefa de transitar por definições e conceitos técnicos, inserções são feitas
em Cartografia Ambiental bem como em Educação Ambiental, trazendo situações do dia-a-dia
visando estimular a sua reflexão sobre a vida, a sociedade e o ambiente nos quais o professor se
insere. Desta forma, pretende-se contribuir para uma visão mais abrangente da Cartografia, que
geralmente é associada exclusivamente aos estudos Geográficos, sendo assim pouco explorada
por professores de Matemática e Ciências, dentre outros, nas suas atividades didáticas.
A Cartografia aqui é encarada para além de ciência que se ocupa de conceitos e
classificações dos produtos cartográficos, bem como de aplicações metodológicas incluindo coleta
de dados, processamento de informações e representação sob a forma de mapas, gráficos e
modelos, dos aspectos humanos e dos relativos à superfície física da Terra. A cartografia também
ordena e representa o ambiente, aprimorando aquilo que sempre foi intuitivo no homem, e o
acompanha desde os primórdios de sua vida no planeta, que é representar a paisagem a sua
volta, desenhar e descrever suas rotas, seus caminhos e os aspectos que refletem sua organização
em sociedades.
A cartografia ambiental parte do princípio de que os problemas ambientais atuais
são, em sua maioria, desencadeados prioritariamente por problemas sociais e não por ações
naturais, sendo que essas últimas também têm sua importância. Eles emergem principalmente
da sociedade e não da natureza (MARTINELI, 2001).
E é na paisagem que esses problemas se materializam. Assim, valendo-se de
estudos em escala temporal e espacial, a cartografia ambiental, busca detectar e representar tais
problemas de caráter sócio-ambiental, dando suporte à tomada de decisão dos administradores
em nível local e regional.
Abordar os conteúdos da cartografia para o ensino, considerando o meio ambiente
como elemento de ligação entre as diversas áreas do conhecimento, permite ao professor
flexibilidade no estudo e na representação cartográfica de temas que vão desde a percepção
ambiental do caminho percorrido para chegar à sua escola até, por exemplo, as mais complexas
interações que envolvem representação espacial e o estudo dos impactos ambientais.
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Projetos e práticas de formação de professores
Torna-se importante incluir nas atividades didáticas no ensino fundamental atividades
que explorem as relações espaciais topológicas elementares e de orientação, que permitem aos
alunos o domínio do seu espaço cotidiano e dos aspectos relativos a sua posição em relação aos
objetos que o cercam. Aspectos relativos à classificação de mapas, às normas cartográficas e ao
exercício de observação da paisagem e de sua representação através de mapas são algumas das
ferramentas tratadas no curso que permitem o aprofundamento do conhecimento de diferentes
conteúdos como os relativos a história, geografia, matemática, dentre outros. A questão de escala
e generalização cartográfica, representação dos elementos que compõem objetos do cotidiano na
paisagem urbana e rural, através de croquis e de maquetes são temas cartográficos que podem
ser explorados em diferentes disciplinas, fortalecendo os conceitos e dinamizando as aulas.
O CURSO PILOTO
A EE Marcello Schmidt, escolhida para a aplicação do curso piloto, está localizada
no centro da cidade de Rio Claro, a maioria dos seus professores atua como efetivo na escola,
mantendo assim sua participação ativa nos projetos da escola, que são vários. Os alunos que
freqüentam a escola pertencem predominantemente à classe média. Observa-se o empenho e a
liderança da direção e coordenação da escola para abrigar novos projetos que dêem melhores
condições de atualização para os professores e formação para os alunos. A escola estadual em
questão foi contemplada com um laboratório com computadores e internet rápida, que deveria ter
sido instalado no início de 2005. Atrasos nessa instalação, que até o final do curso piloto não havia
ocorrido, levaram ao uso de computadores particulares dos professores cursistas e os da
administração da escola (3 computadores) para o desenvolvimento das aulas à distância.
O Curso teve como objetivo a apresentação de conceitos relativos às ciências
cartográficas e educação matemática aplicados aos estudos ambientais, para 20 professoras do
Ensino Fundamental da Escola Marcello Schmidt, dentro do piloto do Projeto Unesp - MEC relativo
a Rede de Formação Continuada do MEC. A experiência de aplicação do curso para o grupo de
professores de uma escola visou aprimorar o material didático gerado em termos de conteúdo,
profundidade e viabilização de sua aplicação na formação de professores das séries iniciais. e as
metodologias didáticas adotadas pelo CECEMCA.
Adotou-se para a aplicação do Curso a metodologia de Ensino Semi-Presencial,
tendo sido realizadas aulas presenciais e à distância fazendo uso da plataforma gerenciadora de
conteúdo – o TelEduc. Na etapa presencial do curso foram ministradas aulas teóricas e práticas
na própria escola, num total de 20 horas.
As 20h restantes do curso foram utilizadas para as atividades à distância, através
da internet, nas quais o acesso ao curso pôde se dar de acordo com sua disponibilidade de
horário.
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Projetos e práticas de formação de professores
O acompanhamento do trabalho das professoras cursistas foi feito através do agente
Tutor, que acompanhou as atividades ao longo do curso, e do agente Instrutor, que as acompanhou
conduzindo discussões, fomentando a pesquisa e novas fontes de informação.
A avaliação dos cursistas na etapa à distância foi realizada através de tarefas
relacionadas com os conteúdos trabalhados, bem como pela sua participação no mural de
discussões, expondo dúvidas e sugestões, além das salas de bate-papo.
Além dessas atividades os participantes tiveram o compromisso de aplicar em
classe, com seus alunos regulares, um dos temas abordados no curso. Esta atividade foi
acompanhada pelos estagiários tutores que assistiam às aulas e elaboravam relatos das mesmas.
Os registros das aulas, realizados por observadores de campo (bolsistas do
CECEMCA) em diários de campo, foram transformados em relatos ampliados (com o auxílio de
gravação em cassete) e apresentados aos professores como notas para escrita da narrativa, suprindo
a impossibilidade do professor, ao mesmo tempo, realizar e registrar a sua aula.
Ao final do curso os professores participantes tiveram como tarefa final a redação
de uma narrativa na qual descreviam a sua percepção dos aspectos abordados no curso relativos
aos conteúdos e a reflexão sobre os mesmos, assim como a experiência realizada com seus
alunos em sala de aula.
RESULTADOS OBTIDOS
Algumas dificuldades foram encontradas no transcorrer do curso, principalmente
com relação aos professores que trabalhavam por três períodos (exerciam função tanto na rede
municipal, quanto estadual e particular), visto que possuíam pouco tempo para acessar o curso,
resultando assim na desistência dos mesmos.
O curso transcorreu conforme as expectativas destacando-se o empenho e dedicação
por parte das participantes. Algumas dificuldades foram observadas no que se refere ao volume
de conteúdo trabalhado no curso, que foi super dimensionado para o período previsto. Em função
do ritmo das professoras cursistas, observou-se que uma redução no conteúdo era fundamental
para o sucesso das atividades práticas previstas. A equipe redimensionou o curso, visando atender
a demanda das participantes.
Os resultados positivos da experiência estão relatados nas atividades da ação
colaborativa que foi desenvolvida pelas participantes. As narrativas elaboradas indicam o
comprometimento coletivo das professoras com o curso proposto, e sua dedicação para que a
conclusão dos trabalhos fosse feita com êxito. Observou-se ainda que foi possível para a maioria
do grupo integrar cartografia e matemática com os aspectos ambientais em suas práticas
pedagógicas.
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Projetos e práticas de formação de professores
AÇÃO COLABORATIVA E AVALIAÇÃO POR MEIO DE NARRATIVAS
Como ação colaborativa, os cursos realizados pelo CECEMCA foram avaliados
pela inserção de saberes trazidos pelos professores participantes a partir de conexões que
estabeleceram com suas práticas. A escrita, sob a forma de registros em diários de campo e
também sob a forma de narrativa, consistiu no meio fundamental para tanto, o que deu maior
abrangência à avaliação a respeito dos desdobramentos dos cursos nas práticas dos professores.
Há uma bibliografia já bem conhecida dos pesquisadores da área da educação que dá fundamento
teórico-metodológico para esta abordagem, designada por alguns como pesquisa colaborativa, a
qual associamos à proposta da pesquisa narrativa apresentada por D. Jean Clandinin e F. Michael
Connelly1. Por se tratar de uma ação formativa, as produções escritas podem ser tomadas como
testemunhos indicativos do que se busca observar (a transformação das práticas docentes como
resultados de conexões, entre o que era usual e o que se colocou como inovação, realizadas
durante os cursos), além disso, o que foi narrado torna-se um enunciado para interlocução futura
entre os professores narradores e outros (participantes ou não do curso).
As narrativas apresentam a experiência de uma unidade de ensino, que pode ter
tomado diversas aulas, sobre um tema relacionado com um dos itens do programa apresentado
no curso. Consistiram, portanto, na forma sob a qual cada um dos participantes apresentou-se
aos demais, narrando a experiência de suas práticas a partir dos registros.
Nesse sentido, a avaliação por meio de narrativas, nesta fase inicial, estabeleceu
elos de ligação entre o cotidiano das salas de aula e o lugar onde se encontram os organizadores
dos cursos - alguns deles bem remotos, pois vários autores dos módulos não precisaram chegar
até as escolas. O conhecimento de repercussões dos cursos à distância, por meio de narrativas
dos professores, servirá como referência para as adequações a serem feitas nos próximos cursos.
Notamos que 70 % dos participantes realizaram a narrativa, o que é um resultado muito bom, se
considerarmos as condições objetivas de trabalho dos participantes.
Destacamos, a seguir, aspectos que iluminam a qualidade das narrativas. Primeiro,
a narrativa como relato de uma aula, colada na seqüência do que foi realizado, de modo impessoal.
Esse tipo de texto não permite saber como as pessoas experienciaram a aula, suas dúvidas,
dilemas etc, apresenta ocorrências que poderão ser objeto de reflexão por parte do leitor, embora
não o convide a estabelecer conexões com suas próprias experiências. Este é um exemplo:
“A atividade aplicada está relacionada ao conteúdo de Geografia e Ciências da 4a
série. Portanto, procurei dar seqüência, trabalhando a planta da parte superior e pátio da escola.
De imediato, os alunos deslocaram-se da sala de aula, acompanhados por mim e Rafaela, onde
iniciaram a pesquisa, que surgiu a partir do conteúdo que foi desenvolvido na 1a aula de alfabetização
cartográfica. Circularam por toda parte superior, alguns entrevistaram os professores, outros
visitaram cada repartição (salas), anotaram o nome do profissional que ali ocupa, número de
alunos que estuda em cada série etc. (...)” (Professora J.M.J.S.)
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Projetos e práticas de formação de professores
As narrativas, geralmente, deixam entradas para que o leitor possa, se for o caso,
fazer ligações com suas próprias experiências. Destacamos este trecho de narrativa como exemplo:
“Desde que ingressei no magistério, dar aulas de Geografia nunca me agradou,
talvez seja pelo trauma que sofri quando estava no ginásio, pois não me sentia segura, nunca foi
me passado como uma matéria prazerosa, portanto nunca gostei. Toda vez que tinha que dar
essa aula aos meus alunos sentia medo de passar essa insegurança. Então, dava aquelas aulas
maçantes, seguindo apenas o livro didático. Fazendo o PEC, aprendi que Geografia não é decorar,
decorar e decorar, mas sim observar, comparar, refletir, etc, sobre os fatos reais. (...) Senti que os
alunos ficaram motivados, porque me pediram que nossas aulas de Geografia sempre seguissem
essa dinâmica.” (Professora C.S.G.B.).
A prática de produção de narrativas permitirá ainda que se crie nos cursos um
ambiente colaborativo de fato, pois elas convertem-se em uma construção e re-construção
compartilhadas, “uma mesma pessoa está ocupada, ao mesmo tempo, em viver, em explicar, em
re-explicar e em re-viver histórias” (Connely e Clandinin, 1995, p. 22).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A aplicação do curso piloto de formação continuada abordando o tema Cartografia
e Meio Ambiente foi uma oportunidade ímpar de realizarmos, na prática, a ação de formação
proposta pelo CECEMCA – Núcleo Rio Claro, envolvendo professores de 1º a 4º anos do Ensino
Fundamental. Embora a maioria dos professores possuísse computador em casa, com acesso à
internet, muitos deles não os utilizam no seu dia a dia. Alguns professores deram depoimento de
que o curso piloto oferecido permitiu pela primeira vez seu acesso a correio eletrônico e navegação
na internet.
A experiência adquirida no curso piloto permitiu a readequação dos assuntos
trabalhados em classe, ou através das aulas à distância, para que o rendimento dos professores
seja adequado. Desta forma, através da interação com as professoras participantes dos cursos,
foi possível a construção do conhecimento do grupo todo, professores da universidade, estagiários
e professores cursistas, o que leva a uma formação contínua e integrada de todos os participantes
do processo.
Os cursos ministrados tiveram a vantagem de aprofundar alguns dos conteúdos já
de domínio dos professores, levando-os a refletir sobre suas práticas e ampliando as possibilidades
de exploração dos recursos da internet. Conteúdos como Sensoriamento Remoto e Cartografia
Tátil, no curso de Cartografia e MeioAmbiente, foram inovadores e atraentes, faltando aos cursos
maior tempo para que os professores pudessem se dedicar ao aprofundamento dos mesmos.
Deve-se destacar que a maioria dos professores justifica o seu maior domínio de um conteúdo,
em detrimento de outro, devido à sua formação inicial, inclusive no que se refere ao uso de
materiais didáticos.
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Projetos e práticas de formação de professores
Os resultados obtidos apontam para a importância e a necessidade de atividades
de formação continuada que permitam aos professores em exercício terem acesso ao conhecimento
para se manterem atualizados frente ao desenvolvimento da cultura e das ciências.
Observou-se ainda que o trabalho pautado na ação-reflexão-ação é um determinante
na mudança de conduta do professor em sala de aula. O exercício de pensar as suas práticas e
redigir narrativas sobre suas atividades cotidianas permitirá ainda que se crie nos cursos um
ambiente colaborativo de fato, pois elas se convertem em uma construção e re-construção
compartilhadas.
BIBLIOGRAFIA
BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL. Parâmetros Curriculares Nacionais:
Meio Ambiente. Brasília: MEC/SEF, 1998.
CLANDININ, D.J. & CONNELY, E.M. Relatos de experiência e investigación narrativa. In: Déjame
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MARTINELI, M., PEDROTTI, F. A Cartografia das Unidades de Paisagem: Questões Metodológicas.
Revista do Departamento de Geografia, 14 (2001): 39-46.
NOTAS
1 CLANDININ, D.J. & CONNELY, E.M. Relatos de experiência e investigación narrativa. In: Déjame que te cuente: ensayos sobre
narrativa y educación. Barcelona: Editorial Laertes. Pp. 11-59. 1995.
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Projetos e práticas de formação de professores
FORMAÇÃO DOCENTE A DISTÂNCIA: DISTANTE DE
QUEM? A TUTORIA COMO DIFERENCIAL EM EAD NO
CURSO NORMAL SUPERIOR DO CENTRO
UNIVERSITÁRIO HERMÍNIO OMETTO – UNIARARAS –
UMA PROPOSTA PRESENCIAL
MUSSI, Amali de Angelis; GUILHERME, Claudia Cristina Fiorio; MONTEIRO, Aneridis
Aparecida; PACHECO, Márcia Maria Reis Dias; CARVALHO, Lúcia Helena de Carvalho;
SANO, Midori (Centro Universitário Hermínio Ometto- UNIARARAS)
Os assuntos ligados a formação de professores em cursos a distância sempre
causam polêmicas, especialmente porque as propostas deste tipo de educação surgiram há
décadas atrás, com bases behavioristas, elaboradas em modelos de instrução programada, e
também organizadas para cursos, em sua grande maioria, essencialmente técnicos. Os alunos
de tais cursos recebiam um material para estudo individual (auto-estudo) e depois comprovavam,
por meio de testes, enviados aos “formadores distanciados”, a aquisição satisfatória (ou não) de
conhecimentos.
Atualmente, um grande número de pesquisadores da área educacional condena
as propostas de formação docente nos moldes de EAD (Educação a distância), pois entendem a
sustentação das mesmas nesses moldes iniciais (décadas de 40 e 50) - condutivistas/objetivistasque implicam em conceitos inapropriados sobre a educação como a transmissão, instrução,
mecanização e mera transferência de informação. Temos adotado para a formação docente do
século XXI, de forma oposta, um paradigma onde a interação humana é que garante a educação,
e isto, de certa forma, justifica o elevado número de profissionais contrários a EAD:
Em algumas instituições, os docentes questionavam a legitimidade de tais propostas
por considera-las, acima de tudo, uma manifestação dos enfoques tecnocráticos do ensino de da
aprendizagem. Os projetos de educação a distância eram caracterizados como uma metodologia
do tipo processo-produto, a qual respondia aos critérios de uma eficácia instrumental. Argumentavase, além disso, que todas as propostas consideradas nessa modalidade apoiavam-se em técnicas
condutivas de estímulo-resposta, desconhecendo a interação das dimensões psicológicas, sociais
e políticas que perpassam todo processo educacional. Não obstante essas generalizações, também
é certo que muitos projetos com os quais se deu origem a essa forma de estudo em diferentes
lugares do mundo tinham uma forte marca tecnicista, tanto em sua concepção pedagógica global
como no desenho de seus materiais. (Coiçaud, 2001, p.55)
A justificativa da negação desta forma de educação aos olhares julgadores, parte
do entendimento dos termos, pois educação e ensino para alguns são coisas distintas, com
intenções e resultados diferentes. Sob a ótica das críticas, não podemos chamar de educação a
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Projetos e práticas de formação de professores
distância o que se propõe atualmente, mas de ensino a distância (Cascino, 2001). Contraargumentando estes estudiosos que condenam por completo a formação de professores a distância,
nossa proposta é indicar a EAD para a formação docente em nossos moldes, como um amplo
processo de mudança de paradigmas, ou seja, para além de modismos, a formação docente fora
da sede, ou a distância, é entendida por nosso grupo de pesquisadoras como uma crescente
democratização de saberes em nível superior e também como a crença na formação de professores
para a autonomia, para o constante aprender a aprender, sendo assim, sob a nossa ótica, uma
excelente oportunidade de construir o conhecimento, desenvolver competências e habilidades,
além de dominar a tecnologia atual pelo contato direto com os mídias.
Esta problematização com relação a nomenclatura e crítica aos formatos e materiais
dos cursos de EAD (tecnofilia) enfocam a necessidade da presencialidade como condição sine
qua non na promoção do conhecimento humano, subentendendo o conceito de educação que
exprime a idéia de que é na interação que ocorre a construção de conceitos e que o compromisso
ético exige a fisicidade dos sujeitos:
Em complemento, a educação não é apenas um somatório de experiências
presenciadas, vividas, mas um sem-número de informações refletidas, acumuladas, articuladas.
É tentativa e erro, carinho e raiva, conquistas e derrotas. Não está afeita a um lugar ou um
momento específico...A educação é multiforme, polifônica, inacabável.
Daí decorre a afirmação de que o componente importante ao ato educativo é sua
fisicidade, sua presencialidade. Contudo, se a distância que possibilita a realização da diferença
torna-se afastamento, separação entre os indivíduos, passa a ser solo fértil onde o poder pode
plantar sua lógica: o “indivíduo só e nu”. (Cascino, 2001, p.55)
Ao empregar no meio acadêmico o termo educação a distância para a formação
docente tem-se a impressão de que estamos lesando a Pedagogia. É como se estivéssemos
cometendo um grande pecado educacional por algumas razões apontadas anteriormente.
Pretendemos neste estudo, construir um outro discurso em EAD com uma figura que altera sua
condição de vilã e a transforma em possibilidade real de ampliação da formação docente pela
ausência da separação física e formação de um grupo de alunos: o tutor.
No Brasil a Educação a Distância foi normatizada pela LDB 9394/96, pelos Decretos
nº 2.494, de 10 de fevereiro de 1998 e nº 2.561, de 27 de abril de 1998. A nova LDB desencadeou
um processo de oferta desta forma de educação, especialmente para atender o que estava
socialmente visível: a alta demanda pelo ensino superior.
A partir da legalização (LDB 9394/96) houve uma preocupação com o cadastramento
(MEC) de instituições públicas e privadas que ofereceriam educação superior aos brasileiros, no
caso das licenciaturas, através dos Institutos Superiores de Educação (ISEs). Nesse direção é
que surge o Normal Superior visando atender esta alta demanda e também a indicação legal que
enfatizava a necessidade da formação dos professores da Educação Infantil e do Ensino
Fundamental (primeiras séries) em nível superior.
As preocupações legais com os profissionais da educação estão em completa
consonância com a sociedade atual, ansiosa pela democratização do ensino e pela qualidade da
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Projetos e práticas de formação de professores
educação, assim como pela caracterização de um mundo pleno de mudanças instantâneas que
exigem um novo professor: dotado de competências, autonomia e criatividade.
Assim, a educação a distância para a formação de professores objetiva levar o
ensino superior aos brasileiros que não dispõem de meios para buscarem o ensino superior, ou
mesmo, terem acesso a este nível de ensino, o que, de certa forma, estaria centrado na concepção
ampla de escola e educação inclusivas.
Modelos e experiências surgiram nesses últimos anos voltados para a formação de
professores e dentre eles destacamos: PEC-Formação Universitária (SEE/SP), Pedagogia Cidadã
(UNESP), Curso Normal Superior Fora de Sede (UNIARARAS), PCN em ação (Formação
Continuada- MEC/SEE/SME), PROFA – programa de formação do professor alfabetizador
(Formação Continuada (MEC/SEE/SME). Cada um destes dotado de identidade singular, com
múltiplas combinações de linguagens e recursos.
Enfocaremos um destes, o Curso Normal Superior Fora de Sede, do Centro
Universitário Hermínio Ometto – Uniararas. Este curso foi estudado por nossa equipe de pesquisa
durante dois anos (2003 e 2004), e, toda a equipe de pesquisadoras (teve) tem contato com
alunos, tutores e supervisores do Curso, além de também compor a equipe pedagógica desde
2003.
O Curso Normal Superior Fora de Sede da Uniararas nasceu com uma proposta
especial de dois anos com um modelo diferenciado de EAD, pois além de oferecer os mídia,
comuns aos programas de EAD, tem a presença de um tutor para encurtar distâncias e tornar
possível o caráter de grupo de alunos, com a presencialidade e fisicidade diárias necessárias à
educação problematizadora e interativa:
O modelo didático do Curso Normal Superior é um modelo que usa multimídias e
a presença de um professor-facilitador (tutor) para encurtar distâncias e alcançar um grande
contingente de alunos. Traz, um novo conceito de ensinar a distância, valorizando a comunidade
de aprendizagem. Por isso, é considerado presencial, pois os alunos devem freqüentar, diariamente,
as aulas sob orientação de um facilitador (tutor) utilizando-se dos recursos tecnológicos de educação
a distância.
(...)A metodologia de ensino a distância revoluciona a própria aula presencial, porque
a torna replicável tanto em seu conteúdo quanto no que se refere às estratégias e etapas de
ensino-aprendizagem adotadas. Isso ocorre sem que o docente e os alunos deixem de ser
protagonistas nesse processo, pois ambos, a partir do estabelecimento de novas conexões e
relações entre os conteúdos abordados e fatos mais próximos no tempo e no espaço, ressignificam
e atribuem novos sentidos às propostas e atividades. Esta possibilidade deve-se, prioritariamente,
ao processo de interação entre alunos e tutor, em tempo real e ao vivo na sala de aula local onde,
inclusive os demais componentes didáticos estarão presentes, à disposição dos alunos. Tem
como objetivos:
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Projetos e práticas de formação de professores
· Construir, compartilhar, sistematizar conhecimentos significativos, ou seja,
conhecimentos que façam sentido para a vida dos alunos nas dimensões pessoal e profissional;
· Compreender e aplicar conceitos em situações de prática de aula, seja em
estágios supervisionados ou no exercício docente dos alunos que já trabalham, seja em simulações
ou casos construídos com base em situações educativas reais;
· Sistematizar e socializar a reflexão sobre a prática docente;
·
Avaliar a própria aprendizagem. (Proposta Pedagógica CNSFS, 2003)
Este curso estruturou-se a partir das demandas de melhoria da educação escolar
de crianças e das discussões recentes sobre as especificidades do trabalho profissional do professor.
O objetivo geral é promover transformações efetivas nas práticas curriculares da formação de
professores, procurando superar a insatisfação generalizada com os modelos vigentes. O seu
maior desafio é preparar professores para a escola básica contemporânea que, como diz a
Resolução CNE nº 1, de 18 de fevereiro de 2002, é uma novidade social e cultural. Portanto, a
meta prioritária do Instituto Superior de Educação – UNIARARAS é o desenvolvimento do professor,
de modo a favorecer o exercício autônomo e responsável das funções profissionais.
Prevê, nesse sentido, a construção de uma escola comprometida com o aprendizado
do aluno, exigindo uma formação profissional de alto nível para seus professores, de modo a
atender todas as demandas pertinentes à docência.
Caracteriza-se como EAD na questão de dar-se fora de sua sede, por usar recursos
tecnológicos, mas o Curso Normal Superior Fora da Sede não se encaixa nas concepções
tradicionais de EAD (conceitos de estudiosos das décadas de 60 e 70), pois estavam pautadas
em métodos de instrução que secundarizavam o papel do aluno e estavam voltadas à transmissão
eficiente de informações na tentativa de superar a relação face a face presencial determinadas em
um tempo e espaço.
Por outro lado, nosso modelo não se dá na Sede e nem há contato presencial com
os professores do curso, mas apresenta-se como “semi-presencial”, especialmente pela mediação
ocorrer através de um tutor, mas ainda sem um termo específico para a singularidade da proposta.
Este nosso tipo de modelo de EAD, relativizado pelo diferencial do tutor e do grupo presencial fora
da sede, estaria voltado a uma concepção interacionista de ensino e o “facilitador” pedagógico, no
nosso caso, o tutor, seria a figura responsável pela relação dialógica imprescindível ao aprendizado
dos alunos.
ANALISANDO O PERFIL E O PAPEL DO TUTOR NO CURSO NORMAL
SUPERIOR FORA DE SEDE DA UNIARARAS: A PRESENÇA QUE ENCURTA DISTÂNCIAS
Baseados nos pressupostos de Educação a Distância do Centro Universitário
Hermínio Ometto – autonomia, aprendizagem contínua, espaços colaborativos de aprendizagem
- o Curso Normal Superior surge integrado ao Programa Especial de Formação Pedagógica
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Projetos e práticas de formação de professores
Superior, inicialmente, destinado a oferecer a graduação para professores em exercício nas redes
públicas, conforme Deliberação CEE nº 12/2001.
O CNSFS (Curso Normal Superior Fora de Sede) é descentralizado, oferecido na
sede de municípios e exige a presença diária dos alunos. Foi credenciado pelo MEC através da
Portaria nº 1500 de 26/05/2004 e atualmente tem duas modalidades:
Ï% CNSFS 02 anos - destinado a professores da rede pública e privada que já
possuem o curso Normal ou Magistério em nível Médio;
Ï% CNSFS 03 anos – destinado a alunos provenientes do ensino Médio.
A Uniararas, neste ano de 2005, conta com 180 pólos no Estado de São Paulo,
perfazendo um total de 9.562 alunos e 2.435 concluintes.
O CNSFS conta também com recursos e materiais que são disponibilizados em
cada um dos pólos, há uma preocupação com relação ao espaço físico das aulas e para isso há
uma equipe na Uniararas que se encarrega de visitar e autorizar os locais e ainda uma seleção de
Tutor para acompanhamento do grupo.
Além de criteriosa seleção (o que inclui a preocupação da formação superior na
área da Educação), o grande requisito, e que reconhecemos a sólida base do trabalho do tutor, é
a sua experiência na educação básica, mediante os seus conhecimentos práticos e seus
conhecimentos científicos, assim ele personifica os requisitos para conduzir o Curso Normal Superior
Fora da Sede, com sua proposta pedagógica a qual comentamos objetivamente acima. A tutoria
presencial visa atender às necessidades socioculturais dos alunos e garantir a interação,
humanizando o processo de aprendizagem fora da Sede.
Há também capacitações na sede para esclarecimento e discussões de questões
conceituais, metodológicas e estruturais (desde a discussão teórica do material, função do tutor,
funcionamento dos equipamentos, etc.). O dia-a-dia da tutoria e de segunda a sexta-feira, cumprindo
uma carga horária de quatro horas e meia por dia. Ele tem capacitações mensais realizadas pela
equipe pedagógica ou pelo supervisor de sua área, um roteiro de aula, onde são sugeridas atividades
e leitura de textos que ele pode enriquecer a aula do dia, que tem como base o material escrito e
a aula televisiva e que preparada e gravada pelo professor especialista da sede. Este trabalho
conjunto gera uma harmonia, porque o tutor sente amparado pela equipe e pelo professor.
Com as capacitações e a liberdade para o tutor sanar qualquer dúvida por telefone
ou via e-mail a sua atuação pedagógica é eficiente, gerando nos alunos uma tranqüilidade e uma
aprendizagem dinâmica e reflexiva do aprender a aprender.
Outra face que não poderíamos deixar de evidenciar são os elos afetivos que essa
proposta nos tem revelado, temos relatos que demonstram que alem da formação profissional a
formação pessoal destaca em nossos alunos e tutores, onde o regaste da auto-estima, da
convivência social e os valores aprimorados, estão na convivência do cotidiano em nossas salas
de aulas. Entendemos que a educação tendo este aporte complementar o humano fica sustentado
e o profissional alicerçado nas bases do conhecimento necessário para gerar profissionais autênticos
e capacitados para formar cidadãos competentes para atuarem no mundo globalizado.
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Projetos e práticas de formação de professores
Alguns dados obtidos através de pesquisas realizadas pelos tutores em exercício e
formação contínua (Monografias apresentadas ao Curso de Pós Graduação Stricto Sensu Formação
de Formadores – Centro Universitário Hermínio Ometto – 2004/2005) nos acenam positivamente
a este tipo de proposta, principalmente pela figura do tutor presencial. Traçamos, pelos dados dos
tutores, um cenário de nossos alunos do CNSFS: 99% da clientela são do sexo feminino; a
grande maioria procurou o curso (2 anos) para não “perder” o emprego ou para nova oportunidade
de trabalho (3 anos); as idades variam de 25 a 40 anos. Nas monografias são apontados os
depoimentos de alunos que evidenciam o CNSFS como a realização do sonho de “cursar uma
Faculdade”, a oportunidade de reconhecer e utilizar os novos recursos tecnológicos para uma
educação do futuro (uso das TIC’s) e essencialmente a importância da presença do Tutor, que
toma o lugar de um “aprendente”, o que os aproxima mais (alunos e tutor) e possibilita um processo
de comunicação que ultrapassa o entendimento do tutor como alguém que controla os alunos e o
torna o CNSFS um novo espaço de construção e reconstrução de saberes, dentro de uma dimensão
colaborativa na sala de aula possibilitada pela presença e atuação do tutor.
.
Assim, o tutor, um profissional que ainda não é reconhecido no meio acadêmico,
que tem seu papel questionado, ganha uma nova dimensão: um misto de mediador “interacionista”,
pois tutores e alunos, em suas cidades, vão descobrindo aos poucos as novas dimensões do
ensinar e aprender. O tutor para nós tem se configurado como um profissional que passa a ser um
gestor de ensino e de aprendizados em espaços e tempos diferenciados.
Dizemos, assim, que encurtar distâncias é a possibilidade de recriar uma sala de
aula com as dimensões de uma instituição que desempenha o seu papel de oferecer cursos e
desenvolver a sua missão de gerar profissionais competentes, e, na percepção dos alunos do
CNSFS é:
- tornar o aprendiz sujeito de seu aprendizado;
- redimensionar possibilidades metodológicas;
- aprender com o trabalho coletivo e com as relações interpessoais;
- ter a presença do tutor na sala de aula.
Em síntese, a nossa proposta com esta análise do CNSFS é discutir como tornar
possível novos processos de ensinar e aprender na formação docente e continuar pesquisando
sobre esses novos tempos e espaços no ensino superior. Sem esgotar o assunto, apresentamos
aqui parte dos dados que temos em mãos e que, num segundo momento pretendemos cruzar
com outros dados de avaliação do CNSFS da Uniararas que foram coletados pela Fundação
Carlos Chagas.
BIBLIOGRAFIA
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2005. Monografia (Pós Graduação- Formação de formadores para educação infantil e ensino
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Projetos e práticas de formação de professores
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Decreto2.494, de 10 de fevereiro de 1998, que regulamenta o disposto no artigo. 80 da LDB
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Projetos e práticas de formação de professores
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Projetos e práticas de formação de professores
NÚCLEO DE ENSINO NA FORMAÇÃO DE
PROFESSORES DE SOCIOLOGIA: TEORIA E
PRÁTICA NO FAZER PEDAGÓGICO
MENDONÇA, Sueli Guadelupe de Lima - UNESP
O Núcleo de Ensino (NE) da FFC/UNESP tem desenvolvido, entre outras pesquisas,
desde o início de seus trabalhos, pesquisas sobre a formação inicial e continuada de professores
em Sociologia, bem como sobre a presença da disciplina Sociologia nas escolas, na região de
Marília. Além desses temas, também tem investigado o cotidiano escolar das escolas parceiras,
visando a apreender elementos da realidade escolar que possibilitassem a elaboração de diagnóstico
e propostas de soluções para os principais problemas existentes nessas instituições.
A pesquisa pioneira de CHAMMÉ e MOTT “A realidade do ensino da sociologia no
2º grau: inovações e continuidades”, desenvolvida junto ao Núcleo de Ensino, na região de Marília,
buscou identificar a realidade do ensino da Sociologia nas escolas de 2º grau. Analisando o período
de 1984 a 1993, os pesquisadores, embora constatando a quase duplicação de escolas com a
referida disciplina, encontraram, também, condições desfavoráveis à consolidação da Sociologia
na grade curricular. As razões que explicam tal fato são diversas e perpassam desde a falta de
condições estruturais até a resistência ideológica de parte significativa da comunidade escolar
frente à Sociologia.
A realidade do ensino de Sociologia para o 2º grau revela-se, pois,
delicada e preocupante se considerarmos que a pulverização da
carga horária, em várias disciplinas distintas, representa a
possibilidade que os professores das disciplinas da área de
Humanas têm de complementar suas cargas horárias e, então,
poderem perceber os parcos rendimentos que o Governo do Estado
oferece aos professores da Rede. Com salários aviltados, que mal
lhes permite a assinatura de um único jornal que seja, o que dizer
sobre a compra de livros? Além disso, estando eles responsáveis
por diferentes disciplinas, múltiplos programas específicos e iguais
Propostas Curriculares, mal lhes sobra tempo para correção de
trabalhos e provas de seus alunos... (CHAMMÉ, MOTT, 1996, p.
127).
As dificuldades detectadas para a disciplina de Sociologia, como também para os
seus professores, são muito próximas, pois ambos, além dos problemas característicos da educação
brasileira, encontram um elemento adicional a sua situação específica na Rede Pública de Ensino,
qual seja, a desvalorização dessa disciplina e também do seu profissional, conseqüência direta de
décadas da sua inconstante presença no currículo da escola. Esse processo de ”entra e sai” do
currículo, ao longo da história da educação brasileira, não permitiu a consolidação da disciplina
Sociologia e, conseqüentemente, o reconhecimento e o “status” das outras disciplinas já
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Projetos e práticas de formação de professores
consolidadas na grade curricular como Português e Matemática. As razões que justificam tal
processo ainda precisam ser melhor investigadas pelos pesquisadores da área.
Além disso, a concepção de sociedade e de educação dominante no Brasil contribuiu
significativamente para a maior marginalização da Sociologia na escola.
Diante do quadro já desolador de marginalidade em que se encontra
a população brasileira em relação ao processo educativo excludente
e expulsivo, no qual apenas pequena parcela que se manteve no
processo de escolaridade ou que a ele retornou chega a freqüentar
o 2º grau, pudemos observar – no tocante ao desinteresse ou à
desinformação sobre os reais objetivos da Sociologia no 2º grau – a
presença de uma situação de tal sorte reprodutivista e não
interpretativa, capaz de contribuir para a geração do desinteresse e
o conseqüente distanciamento do papel que o Ensino e 2º grau,
por meio das inter-relações estabelecidas a partir da discussão crítica
por disciplinas como a sociologia, poderia desempenhar na formação
do indivíduo. (idem, p.123-124).
O diagnóstico elaborado pela primeira pesquisa do NE sobre a realidade da disciplina
Sociologia na Rede Pública de Ensino só veio a se agravar, como também toda a problemática da
escola. Tivemos, objetivamente, um decréscimo das aulas de Sociologia nas escolas e o surgimento
e consolidação de um novo fenômeno: indisciplina e violência na escola.
Sabemos que a escola expressa, em muito, em seu micro espaço social, os
problemas maiores da sociedade. Se há o aprofundamento do nível de exclusão social manifesto
pelo desemprego, fome, falta de perspectiva de futuro, etc., também encontraremos na escola
não só reflexos dessa exclusão social maior. A própria instituição desencadeia o seu processo de
exclusão interno ao discriminar seus agentes sociais frente à ausência de respostas aos problemas
que enfrenta no seu dia a dia.
Neste sentido, as políticas educacionais dos últimos Governos Federal e Estadual
corroboram para o acirramento da crise estrutural da educação. A política de avaliação “Progressão
Continuada”, desvirtuando a proposta original de ciclos, ao não dar as condições necessárias à
escola a sua implementação (diminuição de número de aluno por sala, qualificação profissional,
infra-estrutura, etc.) criou o fenômeno da exclusão dentro do processo de inclusão. Hoje, há
alunos formalmente aprovados, que não dominam os conhecimentos mais elementares do ler e
escrever, que conseguem chegar ao ensino médio. Assim, temos na escola, cada vez mais, um
grande número de alunos discriminados por não ter conseguido se apropriar dos conteúdos
curriculares, mas aos olhos da estatística oficial do Governo estão aptos na sua escolaridade. A
indisciplina é uma das conseqüências desse processo, que se não enfrentada adequadamente
pode chegar a níveis de violência não desejados na escola.
Nos últimos anos, o NE tem sido muito procurado pelas escolas públicas de Marília
e região exatamente para assessorá-las na busca de soluções para dois problemas centrais: as
dificuldades de aprendizagem dos alunos e a indisciplina. Esses problemas estão presentes desde
as escolas das séries iniciais do ensino fundamental até ao ensino médio, transformando-se em
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Projetos e práticas de formação de professores
sério desafio para aqueles que atuam na educação. Neste sentido, alunos e docentes do curso de
Ciências Sociais assumiram esse desafio e se envolveram, via NE, nessa nova frente de atuação:
as séries iniciais do ensino fundamental.
O NE tem atuado em uma escola, em especial, de 1ª a 4ª séries com trabalho
interdisciplinar (Português, Matemática, Filosofia e Ciências Sociais). O trabalho foi realizado
com três turmas, com cerca de 60 alunos no total, com cada turma tendo duas horas e meia de
aula de Reforço por semana, em horário diferente das aulas regulares. A primeira etapa do trabalho
do NE foi conhecer as professoras responsáveis, bem como delinear o perfil e as dificuldades dos
alunos do reforço, tendo chegado nas seguintes questões:
a)Sérias dificuldades de aprendizagem: os alunos não dominam o ler e o escrever,
comprometendo profundamente os conteúdos das áreas específicas, especialmente os das Ciências
Humanas (História/Geografia), ficando a parte conceitual extremamente prejudicada, gerando
graves distorções na 5ª série, quando, na verdade, o aluno se defrontará, de fato pela primeira
vez, com os conteúdos dessa área do conhecimento.
b) Frágil formação dos professores na área de Ciências Humanas: os docentes da
escola, nas reuniões periódicas dos projetos anteriores de Ciências Humanas, declararam, por
diversas vezes, não dominar os conteúdos de História e Geografia, pois simplesmente não tiveram
esses conteúdos na sua formação específica. Logo, optavam por não ensiná-los, para não ensinálos errados. Esse fato já explicitava a forte resistência ao conteúdo desconhecido, principalmente
pela sua ausência na formação desses professores. O trabalho de sensibilização junto aos
professores foi um dos investimentos de destaque do NE.
c) Difíceis relações entre os agentes sociais da escola: o motivo que levou a
escola procurar a UNESP foi exatamente a dificuldade que enfrentava frente aos problemas de
indisciplina e de violência. Por sua presença constante na escola, os vários projetos do NE puderam
constatar que a indisciplina tinha pelo menos duas matrizes centrais: uma se centrava na própria
dificuldade do aluno em aprender, derivada muitas vezes pela limitação do professor em ensinar;
outra gerada nas relações extremamente desequilibradas entre os agentes sociais da escola,
como, por exemplo, professor/aluno, aluno/aluno, professor/direção/coordenação, escola/
comunidade. Esta escola é do distrito de Marília, sendo seus alunos, em sua maioria, de baixa
renda, de famílias desestruturadas, com graves problemas de sociabilidade (alcoolismo,
desemprego, fome, etc.). Essa combinação de fatores se transforma numa “bomba social”, quando
os agentes sociais não se conscientizam da necessidade de mudança dessa situação. Apesar de
ser um processo extremamente lento e difícil, a escola já deu um primeiro passo ao reconhecer a
existência de problema e ao buscar auxílio.
Diante do quadro, o NE atuou interdisciplinarmente através de basicamente dois
projetos pedagógicos: “Identidade”, que buscava resgatar as raízes e a cultura dos alunos; e
“Igualdade e Diferenças”, que trabalhava a discriminação econômica e racial, explicitando muitos
conflitos e preconceitos dos agentes sociais da escola. Concomitantemente, foram realizadas
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Projetos e práticas de formação de professores
entrevistas com os próprios alunos, seus professores e pais, visando traçar o perfil sócio-econômicocultural desse aluno. Esse trabalho articulado do NE foi, lentamente, resgatando a auto-estima
dos alunos e professores, favorecendo o desenvolvimento de atividades pedagógicas, organizadas
a partir da realidade adversa desses alunos.
Gradativamente, os alunos foram apresentando avanços significativos, em termos
conceituais nas diversas áreas, bem como melhor domínios no ler, escrever e contar. Esses
resultados parciais só foram possíveis porque houve, na prática, um trabalho interdisciplinar dos
diversos projetos através de atividades criativas que passavam desde jogos lúdicos de matemática
à recriação de historinhas infantis, em especial do Patinho Feio, com conteúdos voltados à temática
da cidadania e discriminação social.
Assim, os alunos foram recuperando, aos poucos, o interesse pelos estudos, bem
como hábitos de estudar, que não existiam anteriormente, dispondo-se à realização das atividades
com uma vontade de “conhecer o desconhecido e desvendar o conhecido” reconquistada nesse
processo. Os alunos do reforço, aptos para participar da avaliação do SARESP de 2002, tiveram
um desempenho muito bom, chamando a atenção da escola. Mesmo com os importantes avanços
destacados acima, se faz necessário ainda um acompanhamento mais de perto e diferenciado
junto a esses alunos.
Assim, para os alunos do curso de Ciências Sociais a experiência concreta com
educação, através do NE, tem permitido uma formação diferenciada para a docência, mudando
sua perspectiva como futuro profissional. O trabalho apresentado dá pistas concretas de como a
área de Ciências Humanas pode estar contribuindo efetivamente para mudar esse quadro caótico
da educação pública. A estratégia de atividades que privilegiem o processo de resgate de identidade
dos alunos como sujeito histórico, como aluno, como cidadão dentro do mundo contemporâneo,
se mostrou extremamente eficaz. Em decorrência, se apresentou uma demanda efetiva de
elaboração de material didático-pedagógico voltado a situação específica. Esses desafios devem
se constituir em eixos permanentes na formação de professores na área de Ciências Humanas,
em especial, de Sociologia.
Vale lembrar que a licenciatura de Ciências Sociais, desde 2002, vem trabalhando
nas disciplinas de Prática de Ensino e Didática a produção de material didático-pedagógico para
o ensino fundamental e médio, abordando temáticas como: a questão racial na escola; cidadania;
história do Brasil contada a partir da participação da juventude nos movimentos sociais; questão
indígena, questão ambiental; questão do trabalho, do tempo e participação política; história do
Brasil a partir de charges de época; etc. Toda a produção foi incorporada ao acervo do NE, que
busca constituir um Laboratório de Ciências Humanas, construído a partir de experiências
significativas na formação dos alunos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As Ciências Sociais têm um papel fundamental no resgate da identidade da
instituição escolar, passando por um amplo processo de reflexão e transformação de seus agentes,
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Projetos e práticas de formação de professores
isto é, alunos, professores, funcionários e a comunidade local. Isso implica uma nova perspectiva
de atuação da universidade, trazendo para si a necessidade de redefinir o seu trabalho acadêmico,
principalmente no que se refere à formação de professores e pesquisa educacional. Neste sentido,
a Sociologia tem uma contribuição valiosa a fazer nesse processo de busca de novas relações
sociais no âmbito da escola, bem como no estabelecimento das diretrizes e conteúdo dos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) na área de Ciências Humanas, que venham a colaborar
na construção de alternativas pedagógicas, que possam estar subsidiando, de modo mais efetivo,
os desafios do fazer pedagógico no cotidiano escolar.
Para darmos conta de tal tarefa, ou seja, do fazer pedagógico, temos como fio
condutor a indissociabilidade entre a teoria e a prática. Para tanto se faz uma ferramenta vital
desse processo a formação dos agentes sociais envolvidos. O planejamento de várias atividades
que articulam a relação teoria/prática busca criar novos caminhos que consigam construir processos
educativos mais consistentes, aliando a necessária reflexão sobre ação, com os indispensáveis
fundamentos teóricos para começar a compreendê-la, numa relação dialética onde os pólos
interagem. Por isso, a necessidade de seminários de estudos sobre os problemas encontrados no
cotidiano escolar, visando a elaboração de subsídios para avançar na superação desses problemas.
Na perspectiva da formação docente, defendemos a concepção que a práxis
pedagógica só é possível com pesquisa, com uma permanente reflexão do professor sobre a sua
ação, o que o leva a produção de conhecimentos, de sabres pedagógicos. Sem dúvida, isso
requer uma articulação cada vez mais complexa no interior da escola e nos projetos que se
disponham a contribuir nessa direção. Neste sentido, as Ciências Sociais têm um grande desafio
à frente no trabalho da (re) significação das relações sociais no interior da escola e dos seus
conteúdos curriculares, buscando recuperar o distanciamento histórico e teórico das últimas
décadas, em especial a Sociologia, que pouco se dedicou à educação, trazendo sérios prejuízos
à escola e à pesquisa científica.
Os PCN e a própria Lei de Diretrizes da Educação Nacional (LDB) ressaltam a
importância dos conteúdos das Ciências Humanas na formação do aluno desde a escolarização
inicial, apesar da quase inexistência das disciplinas de Sociologia e Filosofia na educação básica.
Porém, contraditoriamente, verificamos a desvalorização das Ciências Humanas na vida da escola,
que ultrapassa a questão curricular, explicitando-se como um problema maior de crise de valores
éticos e morais da própria sociedade.
O acúmulo de pesquisa e atuação do NE junto à Rede Pública de Ensino possibilitou
o delineamento de novas diretrizes à licenciatura de Ciências Sociais, que vem, aos poucos,
repensando o seu processo de formação de professores. A articulação entre a licenciatura e o
trabalho do NE vem se constituindo no novo caminho a ser trilhado no processo de formação de
professores de Sociologia. Atualmente, com a Resolução CNE/CP 2, de 19/02/2002, juntamente
com o Parecer CNE/CP 28/2001 - que define as novas diretrizes para os cursos de formação de
professores, instituindo 400h de prática vivenciada ao longo do curso, 400h de estágio curricular
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Projetos e práticas de formação de professores
supervisionado - iniciativas como dos projetos do NE precisarão ser incentivadas e ampliadas, se
a universidade pública quiser garantir a qualidade da formação docente.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Projetos e práticas de formação de professores
O ESTÁGIO NA FORMAÇÃO DOCENTE:
UM OLHAR PARA A INCLUSÃO ATRAVÉS DA ARTE
SARTORI, Janete de Andrade (Faculdade Mozarteum de São Paulo)
A FAMOSP – Faculdade Mozarteum de São Paulo, tendo como missão a formação
de professores, estende sua responsabilidade social para além da dimensão da educação escolar.
Fundamentada em sua história e experiência, as ações que desenvolve têm como eixo a arte e a
educação.
A arte sempre esteve presente, desde o início da história da humanidade, em todas
as formações culturais: o homem sempre comunicou suas idéias, pensamentos e sentimentos
através da arte. A arte de cada cultura revela o modo de perceber, sentir e articular valores e
significados às relações entre os indivíduos numa sociedade.
Hoje, arte constitui-se numa forma de comunicação rápida e eficiente, estimulando
a visão, a escuta e os demais sentidos, tornando-se uma porta de entrada para uma compreensão
mais significativa das questões sociais.
Usualmente, a formação inicial do professor, fica restrita às questões da escola e
da regência de classe não tratando das demais dimensões do processo social.
Uma formação voltada à construção da cidadania deve incorporar o tratamento de
questões sociais urgentes, o que requer, dos educadores, uma sólida e ampla formação cultural,
razão pela qual privilegiamos o trato da dimensão social.
A reflexão sobre o universo cultural e as questões sociais é, uma necessidade no
currículo de formação de professores.
Na reorganização dos cursos de licenciatura a FAMOSP privilegia a formação
pedagógica com disciplinas voltadas para a sensibilização referente às questões sociais incluindose um projeto de Prática de Ensino visando a inclusão social.
A proposta desta ação está relacionada ao estágio, mas não se restringe a ele.
Tem como finalidade promover a articulação dos diferentes conteúdos da formação geral, artística
e pedagógica numa abordagem interdisciplinar, pautada nos referenciais teóricos e em experiências
que conduzam a uma educação inclusiva.
O exercício da reflexão sobre a prática é sistemático permitindo compreender a
realidade e atuar em situações contextualizadas.
Fundamentado em Delors, o trabalho com arte, neste projeto, apoia-se nas quatro
aprendizagens fundamentais: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e
aprender a ser.
aprender a conhecer – oferece os instrumentos para explorar, atualizar,
aprofundar e enriquecer os conhecimentos possibilitando se adaptar às constantes mudanças e
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Projetos e práticas de formação de professores
inovações que o progresso oferece, significa uma oportunidade de continuar aprendendo ao
longo de toda a vida.
aprender a fazer – adquirindo competências que, possibilitem o
enfrentamento de situações diversas, preparando, para o mundo do trabalho, colocando em prática
os conhecimentos e exercitando as capacidades de inovação e criação para atuar no contexto
local.
aprender a viver juntos – constitui-se no grande desafio para os educadores,
exercitar a convivência, conhecer o outro, lidar com os conflitos.
aprender a ser – a síntese das aprendizagens anteriores, desenvolvendo a
capacidade de autonomia, de discernimento e de responsabilidade social.
São saberes que vão além da mera aquisição de informações para uma formação
humana e social do indivíduo. Adquirindo os instrumentos de compreensão, propiciam agir sobre
o meio, participando e cooperando com os outros na convivência humana.
Um projeto de Educação através da Arte contempla os princípios éticos da
autonomia, estéticos da sensibilidade e políticas dos direitos e deveres, portanto, o aprender a
ser, aprender a fazer, aprender a conhecer e aprender a conviver.
As práticas artísticas favorecem a interação entre os participantes através das
estratégias de classe, da organização da sala, da aprendizagem cooperativa, dos círculos
comunitários e trabalhos compartilhados.
As oportunidades de fazer arte contribuem de maneira significativa para a auto
estima, os processos estéticos e artísticos constituem-se em desafios para o aprender a aprender.
Os registros das observações realizadas, os conhecimentos prévios e a resolução
de situações-problemas embasam as atividades significativas, presentes na teoria de Ausubell.
É na ação/reflexão/ação que a prática é construída permitindo conhecer melhor a
realidade e as contradições nela presentes.
Pensar a inclusão é compreender a diversidade, buscando diferentes formas de
agir favorecendo a construção da cidadania.
Hoje, uma educação voltada aos grupos minoritários é uma necessidade e tem
como finalidade levar esses grupos a tomar na mão o seu próprio destino.
Nesse sentido segundo Delors (2001), para haver reconhecimento social, é bom,
sempre que possível, diversificar os sistemas de ensino e envolver nas parcerias (...) os diversos
atores sociais.
O projeto constitui-se dos momentos de planejamento, execução e avaliação.
Tendo como ponto de partida a formação dos formadores, em relação às linguagens
que estão sendo estudadas, pensar como podem contribuir para que as comunidades menos
favorecidas experimentem as emoções de fazer arte e construam saberes e competências que
possam propiciar sua inserção na sociedade. Nesse sentido foram estabelecidos os objetivos e as
ações.
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Projetos e práticas de formação de professores
I - Objetivos na formação:
- Refletir a realidade social e as oportunidades reais ao acesso aos bens culturais.
- Limitar um campo para atuação e observação, escolhendo o local de atuação.
- Conhecer a realidade e estabelecer prioridades.
- Propor e desenvolver um plano de atividades que tem a Arte, como eixo dessa
intervenção.
- Observar, acompanhar e registrar o processo, as expressões espontâneas com
vistas à avaliação qualitativa.
- Colher elementos de avaliação externa, das comunidades que indiretamente
acompanham e observam o projeto.
- Ao final, estabelecer pistas para a inclusão social e construção de uma cidadania
efetiva.
Para os participantes:
Vivenciar momentos e emoções com os prazeres da arte.
-
Desenvolver habilidades e competências nas diferentes linguagens.
Melhorar a comunicação e a expressão individual.
-
Favorecer a convivência.
Propiciar, gradativamente, a inclusão escolar e social.
II - Escolha dos espaços, para atuação:
- Restringem-se às instituições que abrigam parcela da população mais
desfavorecida.
-São de caráter assistencial e constituem-se de igrejas, creches, asilos, lares de
crianças, idosos, portadores de deficiências, etc. localizados nos bairros periféricos da cidade.
A maioria não dispõe de recursos próprios, contando com a colaboração da
comunidade. Algumas são conveniadas com a prefeitura, mas os recursos nunca são suficientes,
contando com a participação de voluntários.
III - Conhecimento do local, contato com as pessoas que atuam nas diferentes
funções, diagnóstico das necessidades e possibilidades de atuação, levantamento de materiais
disponíveis.
IV - Propostas de ações:
- Estabelecimento de cronograma com o desenvolvimento das atividades, que devem
ocorrer regularmente e sistematicamente, com escolha do dia da semana e horário definido.
- Definição de prazo. Um encontro semanal de duas horas durante dois semestres.
- Levantamento, com fundamento no diagnóstico, do tema transversal que servirá
de eixo para as atividades artísticas.
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Projetos e práticas de formação de professores
- Indicação dos conteúdos das linguagens artísticas com o estabelecimento das
atividades.
- Previsão de recursos humanos e materiais que darão suporte às atividades, com
aproveitamento de materiais recicláveis, cujas experiências têm demonstrado bons resultados.
V - O acompanhamento e o desenvolvimento das atividades, com olhar reflexivo,
propiciam elementos que redirecionam as ações dos projetos.
VI - Da avaliação:
-A avaliação quantitativa fornece os dados que apontam a constância, o interesse e
a dimensão do projeto.
-A avaliação qualitativa, através das expressões espontâneas e relatos sinalizam o
desenvolvimento e o grau de satisfação das atividades.
- A avaliação do projeto, envolve também a dimensão da instituição, à medida em
que os coordenadores/direção manifestam-se, através de documento à IES, avaliando o projeto.
VII - O envolvimento da comunidade através dos momentos de apreciação estética
como: apresentações musicais, exposições e encenações de pequenas peças, constitui-se também
em instrumento de avaliação.
Apresentamos alguns projetos realizados em 2003 e 2004 com registro fotográfico
e especificação do tema, local, participantes, faixa etária e depoimentos, nas diferentes áreas:
-
Área de Artes Cênicas
Área de Artes Plásticas
-
Área de Música
Área de Desenho
1 - ÁREA DE ARTES CÊNICAS:
Propostas desenvolvidas:
· Projeto: O Artista Vai à Escola.
Local: Escola pública da periferia da zona norte da cidade.
Participantes : alunos do Ensino Médio (período noturno)
Faixa etária: 15 a 20 anos.
Considerando-se que no corpo discente da IES encontramos artistas que atuam
profissionalmente na área, estes levaram sua contribuição aos jovens, que viveram a experiência
de conhecer e sentir o artista. Através de atividades com os jogos dramáticos e improvisações, os
alunos experimentaram uma vivência cênica.
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Projetos e práticas de formação de professores
São expressões dos alunos:
Quero fazer teatro...
-
Gostaria de conversar com o meu professor...
- Projeto: Encenação: Aí, vai encarar?
Local: Espetáculo desenvolvido em Escola Municipal de Ensino Fundamental.
Participantes: 200 crianças .
Faixa etária: 11 a 15 anos.
Depoimento da escola: Agradecemos o belíssimo espetáculo de teatro e que vocês
continuem fazendo este trabalho nas escolas.
· Projeto: Arte e Inclusão Social: textos teatrais
Local: Instituto de Arte e Saúde
Participantes: 11 crianças excepcionais do tipo síndrome de down, lesão cerebral e
adolescentes autistas.
Faixa etária: de 14 a 35 anos.
Depoimentos:...esta atuação propiciou um apoio no desenvolvimento dos alunos
nas oficinas profissionalizantes, auxiliando diretamente para suas desenvolturas sociais e culturais,
apoiando suas inserções naturais na sociedade.
- Projeto: A Descoberta da Linguagem Teatral.
Local: Espaço Gente Jovem.
Participantes: 40 alunos.
Faixa etária: de 8 a 14 anos.
Depoimento da dirigente da Instituição: .... Nossas crianças precisam muito de
iniciativas como estas, de alunos que vêm, e se dispõe a trabalhar as habilidades artísticas...
sempre traz surpresas e novas emoções. Os alunos aguardam ansiosos a chegada das
“bonequinhas”, como carinhosamente foram apelidadas...
2 - ÁREA DE ARTES PLÁSTICAS:
Propostas desenvolvidas:
· Projeto: Dobradura e Modelagem.
Local: Instituição de obras sociais.
Participantes: 15 alunos.
Faixa etária: de 3 a 5 anos.
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Depoimentos: A instituição agradece a Faculdade por nos favorecer com alunas
competentes e com uma excelente formação.
· Projeto: Tecelagem e Cestaria
Local: Comunidade Assistencial
Participantes: 20 alunos
Faixa etária: de 10 a 15 anos.
-Projeto: uma cestaria de jornal.
Local: Escola Municipal – EJA – Educação de Jovens e Adultos.
Participantes: 28 alunos.
Faixa etária: de 17 a 33 anos.
Depoimentos:...a proposta muito colaborou para o conhecimento artístico dos alunos,
levando-os a um aperfeiçoamento de suas habilidades, e também, a um processo de criação.
Sendo assim, os resultados foram gratificantes para todos nós.
-Projeto: Técnicas utilizando papel cartão e vegetal.
Local: Escola Municipal de Educação Especial – Município de Cajamar.
Participantes: 19 alunos
Faixa etária: de 13 a 21 anos.
· Projeto: Criações em Papel Vegetal.
Local: Comunidade Assistencial de Bairro.
Participantes:12
Faixa etária: de 35 a 58 anos.
- Projeto: Integração Escola- Comunidade
Local: Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais- Município de Cajamar.
Participantes: 24 crianças.
Faixa etária: de 5 a 14 anos.
-Projeto: Desenhando Uma Nova Criança.
Local: Lar de Crianças.
Participantes: 27 crianças.
Faixa etária: de 5 a 6 anos.
Depoimentos: ... o projeto cumpriu com um papel muito importante no processo de
desenvolvimento das capacidades de criação, imaginação, coordenação motora e expressiva da
faixa etária pré escolar.
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2 - ÁREA DE MÚSICA:
Propostas desenvolvidas:
- Projeto: Quem canta, encanta.
Local: Igreja Batista.
Participantes: 20.
Faixa etária: de 19 a 35 anos (sem conhecimento musical).
- Projeto: Canto Coral.
Local: Igreja Basílica Nossa Senhora da Conceição de Santa Ifigênia.
Participantes: 40.
Faixa etária: adultos, envolvendo a 3ª idade – aposentados, donas de casa e
comunidade.
- Projeto: Musicalização Infantil.
Local: Centro de Convivência Comunitária.
Participantes: 22.
Faixa etária: de 09 a 14 anos.
· Projeto: Brinquedos Cantados.
Local: Lar de crianças.
Participantes: 68.
Faixa etária: 07 anos.
4 - ÁREA DE DESENHO:
Propostas desenvolvidas:
- Projeto: Cartões Arquitetônicos.
Local: Colméia.
Participantes: 30.
Faixa etária: 14 e 15 anos.
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Comentários:
Das crianças:
Dos professores
-
-
A professora chegou!
Oba! Que bom!
-
Tia, que dia você volta?
Eles nunca tiveram esta oportunidade...
Que danadinho, nunca imaginei que ele fosse tocar tão bem...
Dos estagiários
Valeu, foi uma experiência rica em todos os
sentidos, pois pudemos contribuir para o desenvolvimento de crianças maravilhosas,
porém carentes.... até de carinho!
Avaliação qualitativa
As expressões espontâneas dos participantes e os depoimentos dos funcionários e
estagiários indicam o grau de satisfação e interesse dos envolvidos constituindo-se em indicadores
para avaliar os objetivos propostos.
Assim se expressaram:
Os participantes ...
T (06 anos)
“ Gosto de mexer na argila. Nunca ninguém falou sobre artistas de pintura. Na
minha escola a professora não fala dessas coisas que vocês falam. Dá pra vocês ficarem mais
tempo aqui? Posso ir com vocês na escola de vocês? Não vão embora está gostoso”.
E (07 anos)
“ Gosto de pintar. O que vamos fazer hoje? Posso usar a cor que eu quiser? Fazer
sucata é fácil. Que legal vamos pintar. Papel machê, que que é isso? Vocês vão voltar outra vez?
Não vão embora”.
K (08 anos)
“Posso ser o ajudante? Papel reciclado é esquisito mas fica legal! Argila é mole
demais mas é legal. Por que Picasso pintava assim? Todo mundo pode pintar que nem ele? Não
vão embora. Vocês vão voltar algum dia novamente?
J (09 anos)
“ A professora da escola falou que eu melhorei bastante nos meus desenhos. Ela
quer que eu pinte do jeito dela e eu falei que não pode ser assim. Gosto quando vocês falam do
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pintor Picasso, ele é muito interessante. Olha a minha pintura! Que pena que vocês vão embora.
Será que vocês voltam um dia?”
E (10 anos)
“ Acho que não vou conseguir fazer é nada. Não tenho coordenação, é o que todo
mundo fala de mim. Nem acredito que consegui fazer tudo isso sozinho. Agora sei que sou capaz,
mas não muito direito, mas consigo...”
P (12 anos)
“ Arte é difícil. Minha professroa só dá desenho pronto pra pintar. Tenho que pintar
do jeito que a professora quer. Posso usar a cor que eu quiser? É difícil fazer tela? Que legal, vou
usar tinta de verdade. Não quero parar essa atividade. Não gosto muito de desenho pronto. Gosto
de desenhar árvores.
T (13 anos)
“Sabe que eu estava fazendo quando vocês estavam para chegar? Desenhando
uma figura de animal. Ficou legal? Que bom vamos trabalhar com argila, é geladinha e mole”.
D (14 anos)
“ Na minha escola a professora fala que eu não sei fazer e não tenho habilidade.
Hoje vocês mostraram que sou capaz! Como é bonita a obra de Picasso. Será que um dia posso
ser parecido com Picasso?”
E (16 anos)
“ Que utilidade tem tudo isso que vocês fazem? Hoje gostei de fazer essa atividade
de sucata e papel machê. É mais legal ! Espero que vocês voltem mais vezes”.
O Coordenador administrativo da Instituição PROHACC
... o projeto possibilitou às crianças envolvidas, a vivência da Arte em sua
especialidade e como meio de formação e valorização da auto estima.
Enfatizando o trabalho de pintura, a importância de materiais recicláveis, como
forma de expressão e comunicação, o projeto cumpriu com um papel muito importante no processo
de desenvolvimento das capacidades de criação, imaginação, expressiva e motora da faixa etária
– 6 à 13 anos.
BIBLIOGRAFIA
BRASIL, Parâmetros Curriculares Nacionais : Arte, vol. 06, Brasília: MEC, 1998.
BRASIL, Parecer CNE/CP 09/2001e 27/2001. Diretrizes para a formação inicial de professores
da educação básica, Brasília, 2001.
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Projetos e práticas de formação de professores
BRASIL, Resolução CNE/CP nº 1 de 2002. Diretrizes Curriculares nacionais para a formação de
professores da educação básica, Brasília, 2002.
DELORS, Jaques. Educação: Um tesouro a descobrir. São Paulo: Cortez, 2001.
IAVELBERG, Rosa. Para gostar de aprender arte: sala de aula e formação de professores, Porto
Alegre, Artmed, 2003.
IMBERNÓN, Francisco. Formação docente e profissional, São Paulo, Cortez, 2000.
MACEDO, Lino de. Ensaios pedagógicos: como construir uma escola para todos? Porto Alegre,
Artmed, 2005.
NOVOA, Antonio. Os professores e sua formação. Lisboa: Publicações Dom Quixote
1992.
Ltda,
PATTO, Maria Helena Souza. Introdução à psicologia escolar, São Paulo, T. A. Queiroz, 1981.
PERRENOUD, Phillipe. Dez novas competências para ensinar, Porto Alegre, Artmed, 2000.
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Projetos e práticas de formação de professores
PRÁTICA DE ENSINO E PROJETOS DE
TRABALHO NA FORMAÇÃO INICIAL DO
PROFESSOR DE EDUCAÇÃO INFANTIL
GUIMARAES, Célia Maria - FCT/UNESP
Esta pesquisa-ação em desenvolvimento desde o ano 2000 originou-se da
preocupação em investigar e implementar práticas de formação inicial articuladas às necessidades
e ao contexto das IEI – Instituições de Educação Infantil e às exigências da legislação brasileira.
O problema da pesquisa se constitui da crise de identidade das IEI brasileiras e de seus profissionais,
da necessidade de definir a função educativa dos profissionais perante a necessidade de articular
a educação da criança aos seus cuidados, de rever a inadequação da metodologia dos estágios
curriculares praticados na disciplina de Pratica de Ensino, de superação da histórica dificuldade
de conferir intencionalidade às ações desenvolvidas com crianças pequenas, e da expectativa de
elaboração dos saberes e conhecimentos específicos para educação infantil e qualificação
profissional daqueles que trabalham na IEI.
É objeto desta pesquisa a formação inicial do profissional de educação infantil
capaz de considerar a singularidade deste nível da educação básica.
Desde o ano 2000, participam do estudo as alunas da Habilitação para o Magistério
em Educação Infantil do curso de Pedagogia da FCT/UNESP - Campus de Pres. Prudente-sp,
matriculadas na disciplina: “Prática de Ensino da Educação Infantil”. Com base no art. 65 da LDB
(Lei 9394/96), o parecer CES/CNE no. 744/97, orienta o cumprimento das 300 horas de Pratica
de Ensino desdobradas em no máximo 75 horas em sala de aula para contemplar a parte teórica
e o mínimo de 225 horas para estágio supervisionado para desenvolver a parte prática. O curso
de Pedagogia acima segue esta orientação e as 300 horas mencionadas são utilizadas para
desenvolver o estudo em questão.
Os objetivos que têm orientado a pesquisa são:
·
Pesquisar práticas de formação teórico-prática no âmbito do estágio
curricular capazes de superar os erros metodológicos cometidos nos estágios durante a formação
inicial em nível superior de ensino – graduação e,
·
avaliar quais práticas de formação teórico-prática melhor se adequam a
elaboração dos saberes e conhecimentos específicos durante a formação inicial em nível superior.
A Metodologia é qualitativa. A partir da pesquisa-ação, há um movimento constante
entre ação-reflexão-ação que dá sentido a relação teoria e prática e vice-versa. O aluno tem como
núcleo da sua formação a intervenção pedagógica adotando metodologias globalizadoras (ZABALA,
2002, 1998) em ÍEIS durante o ano letivo onde planeja, executa e avalia suas ações sob a forma
de projetos de trabalho (FERNANDO HERNÁNDEZ ,1998).
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Projetos e práticas de formação de professores
A teoria das representações sociais segundo Moscovici, por sua vez, baliza
procedimentos escolhidos para a pesquisa: oferece os elementos teóricos para o conhecimento e
a compreensão dos sistemas de referências e o que move as opções e as práticas dos grupos
estudados. São utilizadas para este fim as técnicas: verbais, não-verbais, projetivas de associações
livres de palavras e observações. Para analise dos dados é usada a técnica de análise de conteúdo
·
o pesquisador e os alunos são levados a avaliar suas representações
preexistentes e se tornarem sujeitos do processo de mudança de representações e ações
inadequados aos objetivos de articular os cuidados da criança a sua educação.
·
As representações sociais são investigadas antes de iniciar as ações com
os participantes e estas norteiam as intervenções junto a eles, assim como a escolha de conteúdos
e estratégias para os encontros onde utilizo o grupo focal.
·
Os alunos são levados a avaliar e comunicar resultados das ações e
intervenções desenvolvidas na IEI.
·
É constante a prática de apreciar (avaliar o antes/durante e depois) resultados
obtidos com as ações e intervenções com intenção de reconduzir, melhorar, mudar e/ou introduzir
novos elementos na pratica pedagógica com a intenção de estabelecer a relação teoria e prática
e vice-versa.
O professor de infantil precisa compreender que atua numa sociedade de classes
distintas, que existe uma diversidade de culturas, entender o sujeito-criança e compreender como
constrói conhecimento, como organiza sua afetividade etc. É necessário construir instrumentos
que lhe permitam enfrentar o imprevisível, o novo trazido pelo cotidiano. Por isso, a formação
inicial do aluno num contexto de formação em contexto (OLIVEIRA-FORMOSINHO E KISHIMOTO,
2002) poderá proporcionar a vivencia de uma sala de pré-escola, aprendendo visceralmente como
é ser professor, junto com as crianças e voltando ao que é teórico para repensar, refletir e, voltar
ao cotidiano com novas idéias, com novas dimensões (SÁ, 1993). Segundo Sousa (1996), para
formar o professor de educação infantil competente do ponto de vista do conhecimento (competência
técnica), da atitude e do compromisso (competências humana e político-social) os formadores de
educadores precisam capacitá-lo a desempenhar sua função competentemente e a refletir sobre
os pressupostos que subjazem à sua prática educativa.
“Porque os ”tempos estão mudando” (HERNÀNDEZ, 1998, p.65) a instituição
educacional deve responder à mudança em relação à informação que hoje se produz. De acordo
com Hernàndez (1998), vivenciamos algumas diferenças de contexto: interdependência entre
países e culturas; um desenvolvimento tecnológico que permite trabalhar com múltiplas fontes e
sistemas de informação; as concepções psicopedagógicas sobre a aprendizagem e o ensino; a
relação entre o saber das disciplinas e o conhecimento escolar; a função social da Escola.
A propósito deste contexto diferenciado, Hernández (1998, p.12-13) apresenta uma
proposta transgressora, cujo objetivo é transgredir:
1) “...a visão da educação escolar baseada nos “conteúdos, apresentados como
‘objetos” estáveis e universais e não como realidades socialmente construídas que, por sua vez,
reconstroem-se nos intercâmbios de culturas e biografias que têm lugar na sala de aula...
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Projetos e práticas de formação de professores
2) a visão de aprendizagem vinculada ao desenvolvimento (conhecido como
construtivismo). Enfoque que, sozinho, não dá conta de explicitar alguns aspectos da aprendizagem
na escola: intercâmbios simbólicos que se representam na sala de aula, construções sociais que
o ensino intermedia, valores que o professor promove ou exclui, construção de identidades que
favorece, relações de poder que a organização escolar veicula e o papel dos afetos na (des)
aprender.
3) a visão de currículo escolar centrada nas disciplinas, entendidas como fragmentos
empacotados em como compartimentos fechados, que oferecem ao aluno algumas formas de
conhecimentos sem vínculo com os problemas dos saberes fora da Escola e estão afastados das
demandas que diferentes setores sociais propõem a instituição escolar.
4) A visão da Escola que impede que alunos se construam como sujeitos em cada
época de sua vida, deslocando as necessidades do aluno à etapa seguinte da escolaridade.
5) a perda da autonomia dos docentes: “...as inovações ou são realizadas pelos
professores ou acabam não acontecendo.
6) a incapacidade da Escola para repensar-se permanentemente, dialogar com as
transformações sociais, dos alunos e da educação.
7) as amarras que impedem de pensar por si mesmo, de construir uma nova relação
educativa baseada na colaboração na sala de aula, na Escola e com a comunidade, na valorização
do saber dos excluídos, na construção da cidadania que favoreça a solidariedade, o valor da
diversidade, o sincretismo cultural e a discrepância.”
As mudanças desejadas nas práticas dos adultos que se responsabilizam pelo
cotidiano das crianças de 0 a 6 anos no âmbito daquelas instituições impõem a necessidade de
que as instituições norteiem seu trabalho por meio de uma proposta pedagógica fundamentada
em uma concepção de criança e de educação infantil claramente definida e nos conhecimentos
acumulados sobre os processos de desenvolvimento e aprendizagem na primeira etapa da vida
humana. A relevância do papel social da Educação Infantil está em prestar serviços às crianças e
às mulheres trabalhadoras, em dar atendimento assistencial ou médico, porém, não se limita a
essas questões, precisando ser organizada para o trabalho pedagógico, ‘’...Valorizar os
conhecimentos que as crianças possuem e garantir a aquisição de novos conhecimentos, exercendo
(...) função pedagógica...” (Kramer, l989, p. 22-3). A função educativa, por sua vez, seria
concretizada pela concepção de criança como sujeito de sua ação, percebida em sua diversidade
e pelo espaço físico propiciador de interações entre iguais, com os adultos e com os objetos,
considerando a particularidade desta etapa da vida. A concepção de aprendizagem se caracterizaria
pela certeza de que a criança constrói e apropria-se do conhecimento desde o momento em que
interage pela primeira vez com o mundo, as coisas e as pessoas, num longo processo de construção
do saber. Sendo assim, sobretudo o brincar e os jogos lúdicos seriam as formas privilegiadas de
interação, capazes de promover a capacidade de representar, de simbolizar, fator este de essencial
importância para que a criança se aproprie da realidade externa assimilando-a à sua realidade
interna. A capacidade de criar representações e símbolos, nesta fase, é fundamental para a criança
registrar, pensar e ler o mundo. O jogo, a brincadeira, o faz-de-conta têm papel preponderante na
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Projetos e práticas de formação de professores
vida cognitiva, afetiva e social da criança pequena. O papel do profissional de Educação Infantil
caracterizar-se-ia como o de mediador, de dinamizador do processo de desenvolvimento e de
aquisição de conhecimentos e das oportunidades da vivência de experiências enriquecedoras,
iniciando ou propondo atividades, lançando desafios, etc.. A ele caberia o papel de planejar e
executar atividades caracterizadas pela intenção educativa, além de cooperar no planejamento da
rotina geral, dos eventos, do trabalho com as famílias, de avaliar sua ação e prática, de diagnosticar
e avaliar o desenvolvimento do seu grupo de crianças, de organizar o espaço-físico e materiais
para as atividades, de incentivar a criança a colaborar em sua reorganização, de buscar
aperfeiçoamento e atualização constante. A formação e a qualificação deste profissional é essencial
para o sucesso da intenção de que a Educação Infantil (0 a 6 anos) possa articular as funções de
cuidar e educar no contexto das exigências sociais e educacionais do terceiro milênio. Toda
expectativa posta no profissional de educação infantil exige práticas de formação inicial que criem
contextos significativos para aprender a pensar criticamente. Esta capacidade requer ações que
permitam ao profissional em processo de formação dar significado à informação, analisá-la, sintetizála, planejar ações, resolver problemas, criar novos materiais ou idéias, e envolver -se mais na
tarefa de aprendizagem escolar. (Hernández, 1998).
Por outro lado, para que estes profissionais possam dedicar-se ao trabalho com as
crianças, precisam ter garantidas condições adequadas de suas funções aos direitos trabalhistas
(contrato, horário, férias, licenças); salário, instalações; incentivos e estímulos para aperfeiçoamento
de seus conhecimentos; clareza quanto às funções que exercerão no espaço educativo da Instituição
de Educação Infantil, etc.
A escolha dos projetos de trabalho para realização de estágio curricular no processo
de formação inicial se justifica porque
“... Pretende desenvolver no estudante um senso, uma atitude, uma forma de
relacionar-se com a nova informação a partir da aquisição de estratégias procedimentais, que
faça com que sua aprendizagem vá adquirindo um valor relacional e compreensível. Tal intenção
parece a mais adequada se o que se pretende é aproximar-se à complexidade do conhecimento e
da realidade e adaptar-se com um certo grau de flexibilidade às mudanças sociais e
cultuais.”(Hernández e Ventura, 1998, p. 59)
Segundo Moss (2002), nos últimos anos tem se delineado uma idéia de criança
que supera concepções equivocadas sobre a criança pequena. Outra visão seria a criança
concebida como membro de um grupo social, agentes de suas vidas, embora ainda não o sejam
totalmente agentes livres, co-construtores do conhecimento, de identidade e cultura. Se Aceita
hoje que a infância se relaciona com a fase adulta, mas não hierarquicamente. É uma etapa
importante da vida em si mesma que deixa traços nas fases posteriores, e a preocupação é com
o adulto que a criança vai se tornar e com a infância que está vivendo. Essa idéia de infância
corresponde a uma série de imagens de criança: forte; competente; inteligente; pedagogo, capaz
de teorias interessantes e desafiadoras, capaz de compreensões e perguntas desde o nascimento;
criança com voz para ser ouvida (nas suas muitas formas). Esta concepção de criança e suas
imagens correspondentes desafiam a ficarmos atentos as escolhas que faremos, pois ta construção
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Projetos e práticas de formação de professores
de criança “rica” produz um tipo de Instituição de Educação Infantil (IEI) e gera programas para
as IEI que enfatizam (MOSS, 2002):
- Serviços para primeira infância como espaços para o enriquecimento da criança
aqui e agora e que reconhecem o valor da infância:
Programas que promovem uma cultura da própria criança, especialmente
brincadeiras, e políticas democráticas;
-
À criança é permitido participar de um mundo de relações e atividades;
Não há um programa que serve a um propósito - produzir um produto
especifico;
As IEI- Instituições de Educação Infantil são locais para provocação,
confrontação, discordâncias, complexidade e diversidade, incerteza, ambivalência, manutenção
do pensamento crítico, deslumbramento, assombro, curiosidade, diversão, de aprender com adultos
e outras crianças respostas para as quais não há tarefas pré-estabelecidas.
Moss (2002), afirma que essa conceitualização de criança e de IEI requer
outra conceitualização dos profissionais para a Educação Infantil: nem substituo da mãe
e nem “professor” escolar. A imagem de criança “rica” exige novo entendimento sobre
programas e escolas e é preciso construir o profissional que:
Reflete sobre sua prática
-
aja como um pesquisador
aja como co-construtor do conhecimento - das crianças e dele próprio
seja criador de ambientes e situações desafiadoras
seja questionador de suas imagens de criança e de seu entendimento de
aprendizagem infantil e outras atividades
-
seja capaz de apoiar a aprendizagem da criança e de aprender com ela
seja capaz de sustentar as relações com a criança
seja capaz de lidar com a cultura própria da infância.
A construção do profissional com esta identidade exige métodos de trabalho que
enfatizem e possibilitem análise crítica constante da prática – o que acontece, como concebem e
entendem a criança. Os aspectos propostos antes delineiam escolhas políticas e éticas e uma
função para as IEI, uma função para o profissional, opções por princípios e pressupostos teóricos
que fundamentarão as propostas pedagógicas e programas curriculares das IEI.
Por estas razões a metodologia que temos adotado no estudo (2000-2005) tem
sido interessante porque a transformação das práticas da Educação Infantil consideradas
inadequadas as necessidades da criança dos tempos atuais carece iniciar pela transformação da
forma de proceder a formação inicial dos profissionais responsáveis pelo cotidiano das Instituições
de Educação Infantil. A tarefa de articular as funções de cuidar e educar precisa ser consubstanciada
numa concepção de Educação Infantil suficientemente explicitada, fundamentada num corpo
teórico/prático capaz de subsidiar práticas propiciadoras do desenvolvimento infantil, da
emancipação dos conhecimentos prévios da criança, da construção de novos conhecimentos, da
cidadania e da construção de uma educação e de uma sociedade mais democrática.
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Projetos e práticas de formação de professores
Trabalhar por projetos hoje guarda diferenças dos projetos de outras épocas. O que
se pretende com os projetos de trabalho é a mudança na educação e na função da escola:
“Os projetos de trabalho supõem, do meu ponto de vista, um enfoque do ensino
que trata de ressituar a concepção e práticas educativas na escola, para dar resposta (não “A”
resposta’) às mudanças sociais, que se produzem nos meninos, meninas e adolescentes e na
função da educação, e não simplesmente readaptar uma proposta passada e atualizá-la.”
(Hernández, 1998, p. 64)
Os resultados obtidos entre 200 e 2005 vem demonstrando que os futuros
professores de educação infantil precisam construir a intenção educativa desde suas ações durante
do processo de formação inicial, por meio de práticas que relacionem a função de educar e a de
cuidar. Em geral, os estágios obrigatórios durante a formação inicial em ÍEI e as poucas práticas
pedagógicas que desenvolvem raramente têm favorecido a formação didática e metodológica de
futuros profissionais de educação infantil, tampouco favorecem a sua competência técnica, humana
e político-social e a constituição da articulação da educação da criança aos seus cuidados. Esta
proposta tem pretendido gerar informações e conhecimentos capazes de fomentar a construção
da mudança das práticas de formação e a metodologia de ensino adotada na disciplina “Prática
de Ensino” dos cursos responsáveis pela formação inicial de professores para as Instituições de
Educação Infantil.
Um aspecto importante foi descobrir que no momento em que alunos em formação
inicial são colocados a realizar intervenções com crianças nas ÍEIS é preciso oferecer ao menos
uma alternativa de organização de suas práticas. Por isso, em coerência com o enfoque globalizador
adotado na disciplina, a organização dos conhecimentos e atividades que alunos desenvolvem
nas ÍEIS têm sido feitos sob a forma de projetos de trabalho segundo a concepção de Fernando
Hernández (1998, 1998a). As ações e conhecimentos são definidos após avaliação diagnóstica
(inicial) , seguida da elaboração das propostas de intervenção pedagógica baseada no diagnóstico.
Este procedimento tem permitido conhecer a realidade das ÍEIS e provoca a compreensão da
razão de estudar para propor situações e intervenções para crianças, desarticula práticas
pedagógicas escolarizantes em salas de pré-escolares, gera conflitos acerca da metodologia que
vem sendo adotada com crianças pequenas, provoca professores em exercício e alunas a voltarem
o foco de sua ação para a criança concreta com a qual trabalham, oferece norte e sistematicidade
frente a constante dúvida sobre o que, como e quando ensinar / avaliar na educação infantil. Esta
forma de promover a organização do conhecimento escolar favoreceu o acompanhamento do
grupo a respeito de sua dinâmica de funcionamento ao se defrontar com a contradição entre o
velho e o novo, a ruptura e a continuidade entre o conhecimento baseado no senso comum e o
conhecimento científico e a relação que as alunas foram podendo estabelecer entre a teoria e a
prática profissional. A articulação entre educação e avaliação ficou mais significativa. A atitude de
investigar as representações sociais sobre a função da educação, papel do professor pré-escolar
e visão da criança em idade pré-escolar e concepções individuais das alunas antes de iniciar o
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Projetos e práticas de formação de professores
ano letivo orientou a seleção dos conteúdos de ensino, as técnicas de ensino adotadas, os aspectos
a serem destacados durante os grupos focais e as discussões, orientações e reflexões. As mudanças
ocorridas na prática pedagógica foram verificadas por meio do acompanhamento das ações na
escola no decorrer do ano. Os avanços e aspectos positivos se devem a metodologia escolhida
que intencionalmente provoca gradativamente no aluno a interação com a escola, com a sala de
aula e as crianças e suas individualidades, as famílias, a comunidade, o profissional em exercício.
Todas estas facetas da interação fazem emergir as exigências, sucessos, limitações, decepções
e vicissitudes que esta relação provoca. O aluno se vê crescentemente sendo exigido num grau
de envolvimento e compromisso pessoal necessário para qualquer processo de mudança e
qualificação em se tratando de educação. Até o momento alguns aspectos foram detectados
como fundamentais nas ações propostas: definição prévia do número de horas/aula de estágio
em cada semestre; agendamento e regularidade das orientações individuais presenciais; supervisão
das ações realizadas com crianças e posterior discussão individual ou coletiva; alguns dos conteúdos
que darão os fundamentos necessários às ações na escola deverão ser estudados no inicio do
ano letivo; a organização do programa de ensino: fazê-lo em blocos mais definidos de conteúdos;
a forma de registro e controle das horas /aula de estágio não podem ter caráter de mero cumprimento
das mesmas. O relato parcial das ações desenvolvidas tem sido realizado no final de junho com
objetivo de avaliar o desenvolvimento da proposta de intervenção pedagógica, trocar experiências,
acatar sugestões e propor as revisões necessárias. O relato oral com base na apresentação do
processo desenvolvido na sala onde estagiou, com demonstração dos resultados obtidos, o uso
de fotos, produções infantis etc. se revelou momento de síntese e avaliação. À medida que o ano
letivo se desenrola, os alunos vão revisitando suas representações sociais iniciais e podem reformular
suas visões, crenças, conhecimentos. Ao avaliar suas representações sociais ao término do ano
letivo constata-se processos de mudança em andamento, especialmente em relação a alteração
dos conhecimentos baseados apenas na experiência prática e senso-comum.
À maioria dos cursos formadores e, em especial, à disciplina de “Prática de Ensino”
falta a necessária fundamentação teórica às suas práticas de ensino, falta reflexão crítica acerca
do que o aluno observa nos estágios e há ausência de situações reais, contextuais, através das
quais o aluno experiencie a necessidade de relacionar teoria e prática para dar respostas e/ou
alternativas a problemas concretos gerados na/pela Instituição de Educação infantil e salas de
aula de educação pré-escolar. Os estágios obrigatórios em salas de aula, pouco têm favorecido a
formação didática e metodológica dos futuros profissionais e sua competência técnica, humana e
político-social, devido à descaracterização de sua finalidade na formação inicial de educadores.
O estudo, ao fazer opção pelas práticas adotadas, pretende que a formação do
educador ocorra com base na formação das competências técnica, político-social e humana,
visto que são fundamentais para a constituição de uma prática pedagógica contextualizada,
democrática, formadora do homem e do cidadão e capaz de promover situações de ensino
possibilitadoras da aquisição dos conhecimentos acumulados pela humanidade e produtoras de
novos conhecimentos e do desenvolvimento infantil, segundo suas peculiaridades e singularidade.
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Projetos e práticas de formação de professores
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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projetos de trabalho – o conhecimento é um caleidoscópio. 5ª. Ed. Porto Alegre: Art Med, 1998a.
Trad. Jussara H. Rodrigues
KRAMER, SONIA. Melhoria da qualidade do ensino: o desafio da formação de professores em
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MOSS, PETER. Para além do problema com qualidade. Maria Lucia de A. Machado (org.).
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OLIVEIRA-FORMOSINHO, JÙLIA e KISHIMOTO, Morchida Tizuko. Formação em contexto:
uma estratégia de integração. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2002.
SÁ, MÁRCIA S. M. MOURÃO. A formação do educador para a pré escola - a chave do tamanho.
Revista Criança. Brasília, n.25, p.15-27, 1993.
SOUSA, ANA M. C. Educação Infantil: uma proposta de gestão municipal. São Paulo:
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ZABALA, ANTONI. Enfoque globalizador e pensamento complexo –uma proposta para o currículo
escolar. Porto Alegre: ARTMED Editora, 2002.
ZABALA, ANTONI. A prática educativa: como ensinar. Porto Alegre: ARTMED Editora, 1998.
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Projetos e práticas de formação de professores
O ESTÁGIO SUPERVISIONADO NUMA PERSPECTIVA
INTERDISCIPLINAR – PROPOSTA PARA UMA
FORMAÇÃO REFLEXIVA
GEBRAN, Raimunda Abou; LEPRE, Rita Melissa; BASÍLIO, Valéria Cristina (IEDA/Assis).
INTRODUÇÃO
O presente trabalho é síntese de um projeto que vem sendo realizado no Instituto
Educacional de Assis (IEDA), especificamente junto ao curso de Pedagogia. Preocupados com a
formação do professor, futuro profissional das séries iniciais do ensino fundamental, os docentes
e a coordenação pedagógica do curso, envolveram-se num processo de estudos, reflexões e
discussões que encaminharam para o estabelecimento de novas proposições para a formação
dos professores. Esse processo propiciou a reestruturação curricular do curso e, por conseqüência,
a reestruturação da Prática de Ensino e Estágio Supervisionado.
Assim, procuramos centrar nesse trabalho, como vem sendo concebida essa
formação docente e como tem sido deflagrada a Prática de Ensino e o Estágio Supervisionado.
Apresentamos as concepções teóricas e legais que respaldam o projeto de estágio, bem como a
sua caracterização geral, as ações docentes e discentes, a sua operacionalização, apontando ao
final, alguns indicativos iniciais de avaliação do mesmo.
REFLETINDO SOBRE A FORMAÇÃO DO PROFESSOR
A formação do educador tem sido pauta obrigatória nas discussões que visam a
busca de melhorias para o processo ensino-aprendizagem. É certo que o professor surge como
peça chave nesse processo e o seu papel assume proporções importantes quando pensamos na
sua atuação em sala de aula e na escola como um todo. Além do importante papel de auxiliar as
crianças no seu desenvolvimento cognitivo, afetivo e social, o professor deve ter ainda formação
política para entender, criticar e buscar soluções para os diferentes problemas vivenciados no
sistema educacional.
Nesse sentido, o preparo do professor nos cursos de formação, deve contemplar
elementos que orientem e façam a mediação entre o ensino e a aprendizagem dos alunos e que
favoreçam uma ação pedagógica significativa, propiciando compromisso com o sucesso da
aprendizagem, desenvolvimento de práticas investigativas, elaboração e execução de projetos
para trabalhar com os diferentes conteúdos curriculares, utilização de novas metodologias de
ensino e de avaliação e desenvolvimento de trabalhos em equipe.
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Projetos e práticas de formação de professores
Em uma palavra, o professor deve ter autonomia intelectual, ter o direito e a
responsabilidade para tomada de decisões profissionais, ou seja, além de saber e saber fazer,
deve compreender o que faz e por que faz. Para tanto, é necessário que ele tenha uma formação
integral, onde possa conhecer as várias faces da educação e da sua gestão, pois a escola é mais
do que salas de aula, é mais do que regras de linguagem e matemática, é mais do que muros e
grades. Escola é vida em processo e, como tal, precisa ser conhecida na sua integridade para que
possa ser entendida.
É sabido que a Universidade, e em especial os cursos de formação docente, tem
papel importante na formação dos professores, e é dentro dela que o mapa para o conhecimento
da realidade educacional pode e deve ser traçado. Este mapa precisa, necessariamente, inscreverse no binômio teoria-prática. Educadores necessitam de formação teórica e da concretização da
teoria na prática, a partir de situações didáticas que permitam que os conhecimentos apreendidos,
de diferentes naturezas e experiências, possam ser vivenciados em tempos e espaços diferenciados,
de maneira crítica e reflexiva, pois como aponta Freire (1998)
...na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão
crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode
melhorar a próxima prática. O próprio discurso teórico, necessário à reflexão crítica, tem de ser
de tal modo concreto que quase se confunda com a prática. (p. 44)
O professor, enquanto sujeito que não reproduz apenas, por ser também sujeito do
conhecimento, pode, por meio de uma reflexão crítica, fazer do seu trabalho em sala de aula um
espaço de transformação. É na ação refletida e no redimensionamento de sua prática que o
professor pode ser agente de mudanças, na escola e na sociedade. Nessa perspectiva, a formação
do docente se faz pelo repensar sobre a prática, sobre a realidade, bem como pela construção da
identidade pessoal, ética e política.
Considerando que a teoria e a prática constituem o núcleo articulador do currículo,
permeando todas as disciplinas e tendo por base uma concepção sócio-histórica da educação,
alguns princípios devem nortear o projeto de estágio supervisionado:
a)
a docência é a base da identidade dos cursos de formação
b)
c)
o estágio é um momento da integração entre teoria e prática;
o estágio não se resume à aplicação imediata, mecânica e instrumental de
técnicas, rituais, princípios e normas aprendidas na teoria;
Assim, o estágio supervisionado é o lugar por excelência para que o futuro professor
faça a reflexão sobre sua formação e ação, possa aprofundar conhecimentos e compreender o
seu verdadeiro papel e o papel da escola na sociedade.
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Projetos e práticas de formação de professores
A PRÁTICA DE ENSINO E O ESTÁGIO SUPERVISIONADO NA LEGISLAÇÃO
ATUAL
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) nº 9394, aprovada em
dezembro de 1996, ao introduzir novos indicadores para a formação de profissionais para a
Educação Básica, suscitou novas discussões e encaminhamentos.
Ressalte-se que as proposições estabelecidas pela LDB, para a formação de
profissionais da educação (artigos 61 a 65), implicaram em uma série de regulamentações que se
seguiram, a saber: a Resolução CP/CNE 1 de 30 de setembro de 1999, que dispõe sobre os
Institutos Superiores de Educação, o Decreto nº 3276/99, que dispõe sobre a formação de
professores em nível superior para atuar na Educação Básica, alterado pelo Decreto 3554/2000,
o Parecer CES 970/99 que trata sobre a formação de professores nos Cursos Normais Superiores
e o Parecer CNE/CP 9/2001 que trata das Diretrizes Curriculares para a Formação de Professores
da Educação Básica, em nível superior, dentre outras.
O Parecer 9/2001 ao apresentar as diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação
de Professores da Educação Básica, em nível superior, destaca a importância da articulação da
teoria com a prática e indica que a prática na matriz curricular não pode ficar reduzida a um
espaço isolado, que a reduza ao estágio como algo fechado em si mesmo e desarticulado do
restante do curso. Propõe que ela deve permear todo o curso, desde o seu início, inserida em
todas as áreas ou disciplinas, mobilizando e articulando diferentes conhecimentos e experiências.
O Parecer reforça ainda a idéia da prática como componente curricular e define:
Uma concepção de prática mais como componente curricular implica vê-la como
uma dimensão do conhecimento, que tanto está presente nos cursos de formação nos momentos
em que se trabalha na reflexão sobre a atividade profissional, como durante o estágio nos momentos
em que se exercita a atividade profissional. (p.22)
Com relação aos estágios, a proposição inicial do Parecer 9/2001, foi alterada pelo
Parecer 27/2001, estabelecendo os seguintes termos:
No estágio curricular supervisionado a ser feito nas escolas de educação básica. O
estágio obrigatório definido por lei deve ser vivenciado durante o curso de formação e com tempo
suficiente para abordar as diferentes dimensões da atuação profissional. Deve, de acordo com o
projeto próprio, se desenvolver a partir do início da Segunda metade do curso, reservando-se um
período final para a docência compartilhada, sob a supervisão da escola de formação,
preferencialmente na condição de assistente de professores experientes. Para tanto, é preciso
que exista um projeto de estágio planejado e avaliado conjuntamente pela escola de formação
inicial e as escolas campos de estágio, com objetivos e tarefas claras e que as duas instituições
assumam responsabilidades e se auxiliem mutuamente, o que pressupõe relações formais entre
instituições de ensino e unidades dos sistemas de ensino. Esses “tempos na escola” devem ser
diferentes segundo os objetivos de cada momento da formação. Sendo assim, o estágio não pode
ficar sob a responsabilidade de um único professor da escola de formação, mas envolve
necessariamente uma atuação coletiva dos formadores.
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Projetos e práticas de formação de professores
O Parecer 28/2001 enfatiza o estágio curricular supervisionado de ensino, como
outro componente curricular obrigatório integrado à proposta pedagógica do curso, efetivando-se
a partir da segunda metade do curso, como coroamento formativo da relação teoria-prática. Deverá,
portanto, ser uma atividade intrinsecamente articulada com a prática e com as atividades de
trabalho acadêmico. Deve ainda ser considerado “o momento de efetivar, sob a supervisão de um
profissional experiente, um processo de ensino-aprendizagem que tornar-se-á concreto e autônomo
quando da profissionalização deste estagiário”. (p.10).
A Resolução CNE/CP 1 de 18 de fevereiro de 2002, com base nos Pareceres 9/
2002 e 27/2001, estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores
da Educação Básica, em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, definindo
os princípios, fundamentos e procedimentos a serem observados na organização institucional e
curricular de cada estabelecimento de ensino e a Resolução CNP/CP 2, de 19 de fevereiro de
2002, respaldada no Parecer CNE/CP 28/2001, institui a duração e a carga horária dos cursos de
licenciatura, a saber estabelecendo 400 (quatrocentas) horas de prática como componente
curricular, vivenciadas ao longo do curso e 400 (quatrocentas) horas de estágio curricular
supervisionado a partir do início da segunda metade do curso.
Essas regulamentações definiram novas concepções, organização e estruturação
dos cursos de formação de professores tendo exigido reformulações significativas nos projetos
pedagógicos dos cursos, em especial, nas licenciaturas.
DESENVOLVIMENTO DO PROJETO
A preocupação em estar acompanhando e atendendo as orientações propostas
pelas diretrizes para a formação dos professores e tendo como suporte a concepção de uma
formação crítica e reflexiva, instigou os docentes do curso de Pedagogia, do Instituto Educacional
de Assis (IEDA) a elaborarem um projeto interdisciplinar para atender ao estágio supervisionado
de prática de ensino. A proposta de um projeto interdisciplinar constituiu-se a tônica desse processo,
ou seja, um trabalho que propiciasse a articulação e o envolvimento das diferentes áreas do
conhecimento. Um real trabalho de cooperação e troca, aberto ao diálogo e ao planejamento,
onde estivessem envolvidas diversas disciplinas do curso de Pedagogia.
O Projeto de Estágio Supervisionado numa perspectiva redimensionada tem como
objetivo central efetivar a articulação do curso de Licenciatura em Pedagogia com a Educação
Básica da rede pública e privada, aprimorando a formação do profissional da educação de forma
a garantir uma ação mais comprometida com o processo educativo. O Projeto de Estágio
redimensionado ganha contornos diferenciados porque pressupõe que a aquisição dos saberes
pedagógicos (científicos e docentes) não ocorre de forma estanque, mas ao contrário, se dá pela
interação entre as várias áreas de conhecimento.
Entendendo que a missão do Curso Superior de Pedagogia seja a de formar um
profissional adequado ao seu tempo, propõe-se uma forma de Estágio que contemple a formação
de um pedagogo capaz de atender às demandas de uma realidade, que se faz nova e diferente a
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Projetos e práticas de formação de professores
cada dia. Buscou-se então um trabalho interdisciplinar, em que a maioria dos docentes do curso
pudesse trazer a sua contribuição para o projeto, oferecendo subsídios e participando efetivamente
da sua orientação, acompanhamento, execução e avaliação. A Prática de Ensino e o Estágio
Supervisionado passaram a se configurar como eixo articulador da formação dos professores,
envolvendo diferentes disciplinas. A partir de observações, relatórios, investigações e análise do
espaço escolar e da sala de aula, esse processo ultrapassa a situação do processo ensinoaprendizagem favorecendo espaços de reflexão e o desenvolvimento de ações coletivas e
integradoras,
Apesar de entender que a formação de um pedagogo está ligada a situações mais
amplas, tanto na área da educação formal quanto informal, neste primeiro momento o grupo de
docentes orientadores, optou por centralizar o seu olhar no Ensino Fundamental. Esta opção
deveu-se à necessidade de uma organização operacional, que se mostrasse viável. Desta forma,
as escolas municipais, estaduais e privadas, de Assis e região, que mantêm o Ensino Fundamental,
são alvos desse projeto de trabalho.
Como estagiários atuam os alunos do 3º, 4º, 5º e 6º termos do Curso de Pedagogia
do Instituto Educacional de Assis – IEDA. No 3º termo os alunos iniciam o estágio com a observação
da escola como um todo. Essa observação tem como objetivo analisar e compreender as
características do espaço escolar, na sua singularidade, inteirando-se de seu funcionamento,
suas deficiências, suas possibilidades e a forma como a escola se organiza para resolver seus
conflitos, dificuldades e enfrentamentos. O contato com todos os sujeitos inseridos no contexto
escolar permite que, a partir de suas falas e de suas ações, o aluno estagiário visualize as
possibilidades de sua inserção na busca de resolução de determinadas situações-problema.
No 4º termo o estagiário elabora e inicia o desenvolvimento de um projeto de
atuação, em qualquer setor da escola que exista uma necessidade real de intervenção – biblioteca,
secretaria, eventos esportivos, culturais e de lazer, produção de materiais didáticos, entre outros.
Essa intervenção tem propiciado intensa participação dos alunos estagiários na escola como nas
reuniões do horário de trabalho pedagógico, nas atividades e eventos programados pela escola,
nas atividades relacionadas à biblioteca e, principalmente, o desenvolvimento de projetos de ação
que envolvem: atividades lúdicas na escola, recreação no espaço escolar, projetos de leitura junto
à biblioteca, mini-cursos sobre sexualidade, ética, meio-ambiente, produção e organização de
material didático-pedagógico, produção e organização de jornal escolar, dentre outros.
Nos 5º e 6º termos o aluno estagiário desenvolve um trabalho, também voltado
para suprir necessidades da escola, mas agora diretamente ligado à sala de aula, analisando os
aspectos estruturais da sala de aula (disposição física), as relações em sala de aula, aspectos
organizacionais da sala de aula e os aspectos didáticos pedagógicos. Essa análise dá suporte aos
alunos para projetarem suas propostas junto às salas, envolvendo, dentre outras, atividades
regulares de docência, aulas de reforço e recuperação de alunos com dificuldades de aprendizagem,
orientação sexual, seminários sobre os temas transversais (ética, pluralidade cultural, trabalho e
consumo, ecologia,).
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Projetos e práticas de formação de professores
Em geral, os projetos de intervenção dos alunos estagiários são propostos e
desenvolvidos em grupos de até três elementos, levando em consideração a experiência anterior
dos alunos, seu repertório cultural e suas habilidades. Esta opção foi feita pelo entendimento de
que a interação entre os alunos é tão importante quanto a integração dos diferentes componentes
curriculares do Curso de Pedagogia, na elaboração deste Projeto de Estágio Supervisionado.
Em todos os momentos do estágio, os alunos têm a supervisão direta de seu
orientador, escolhido pelo próprio aluno estagiário, no início do 3º e 5º termos, levando em
consideração a afinidade existente entre a sua proposta de intervenção e a área de atuação do
docente orientador, com acompanhamento e orientação dos professores de Didática, Estrutura e
Funcionamento do Ensino, Filosofia da Educação, Psicologia da Educação, História da Educação
e Sociologia da Educação. É importante ressaltar que os encontros entre o supervisor de estágio
e seus alunos, constituem-se essenciais para a reflexão sobre as observações e/ou investigações
realizadas e os encaminhamentos possíveis e necessários em cada unidade educativa.
A avaliação do Projeto de Estágio acontece de forma processual, com ênfase nos
aspectos qualitativos sobre os quantitativos, mas sempre levando em consideração os resultados
alcançados. Os estabelecimentos de ensino que recebem os alunos estagiários são envolvidos
nesse processo de avaliação, por meio da socialização dos relatórios elaborados pelos estagiários,
enquanto desenvolvem as suas propostas de trabalho.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao término de um semestre letivo, julgamos necessário uma avaliação do projeto
acima apresentado. Em atividade conjunta, chegou-se às seguintes conclusões:
1)
Houve um real envolvimento no trabalho, tanto por parte do corpo docente
como dos estagiários;
2)
Foi possível notar mudanças nas relações internas, entre os professores,
que passaram a conversar mais e a “trocar idéias” continuamente. Dessa maneira, o Curso de
Pedagogia, como um todo, pôde sentir os benefícios da ação interdisciplinar;
3)
Os alunos puderam observar a escola participando dela e assim reconhecer
os seus vários aspectos. Normalmente, os olhares sobre a escola procuram captar o que ela “não
tem”, ou seja, têm a tendência de descrevê-la em termos negativos, de comunicar o que nela não
existe para elencar suas carências e deficiências. Pode-se verificar que “olhares” puderam ir além
e ver, também, aquilo que a escola “tem” e que a faz singular, como sua cultura, sua história, seus
medos, suas dúvidas, suas vitórias, ou seja, a sua vida cotidiana;
4)
A supervisão se mostrou, antes de tudo, um espaço de socialização, onde
os alunos estagiários puderam falar de suas experiências e escutar a dos outros, promovendo
discussões e buscando possíveis soluções para os problemas, quando encontrados. Constituiuse num espaço singular de reflexão sobre a ação pedagógica
Enfim, na sua totalidade, julgamos o trabalho realizado de forma positiva.
Entendemos, também, que houveram aspectos que passaram desapercebidos e que,
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Projetos e práticas de formação de professores
provavelmente, ressurgirão em outros momentos. Como toda prática que se inicia, não possuímos
respostas para todas as questões que surgiram e que hão de surgir, mas possuímos, sem dúvida,
a vontade e a disposição para continuar pesquisando e buscando caminhos que possam auxiliar
a formação de docentes críticos e atuantes. Buscar melhorias para os aspectos injustos de nossa
realidade educacional será, sempre, o objetivo último de nosso trabalho e, para tanto, precisamos
de profissionais que tenham condições para possibilitar a transformação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ASSOCIAÇÃO NACIONAL PELA FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO ANFOPE. XII Encontro Nacional: Documento Final. Brasília: ANFOPE, 2004.
BRZEZINSKI. I. Pedagogia, Pedagogos e Formação de Professores: a busca e movimento.
Campinas, São Paulo: Papirus, 1996. (Coleção Magistério: Formação e trabalho Pedagógico)
FAZENDA, I. Metodologia da pesquisa educacional. São Paulo: Cortez, 1997.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e
Terra, 1998.
LIBÂNEO. J. C. Pedagogia e Pedagogos, para quê? .São Paulo: Cortez, 1998.
LIBÂNEO, J. C. Adeus Professor, adeus professora? : novas exigências educacionais e profissão
docente. São Paulo: Cortez, 1998 (Coleção Questões da nossa época: vol. 67)
LIMA. M. S. L. A hora da prática: reflexões sobre o estágio supervisionado e a ação docente. 3ª
ed. Fortaleza: Edições Demócrito rocha, 2003
OLIVEIRA, A. C. B. de Qual a sua formação, professor? Campinas, São Paulo: Papirus, 1994.
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SILVA, C. S. B. da. O curso de Pedagogia no Brasil: história e identidade. 2ª ed. revisada e
atualizada. Campinas, SP: Autores Associados, 2003. (Coleção Polêmicas do nosso tempo; 66).
Documentos Legais
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________. Conselho Nacional de Educação. Parecer CP 09 de 08 de maio de 2001. Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da educação básica, em nível superior,
curso de licenciatura, de graduação plena. Mimeografado.
________. Conselho Nacional de Educação. Parecer CP 28 de 02 de outubro de 2001. Dá nova
redação ao Parecer CNE/CP 21/2001, que estabelece a duração e a carga horária dos cursos de
licenciatura, de graduação plena, de formação de professores da educação básica em nível superior.
________. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CP 1 de 18 de fevereiro de 2002.
Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da educação básica,
em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena. Mimeografado.
________. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CP 1 de 19 de fevereiro de 2002.
Institui a duração e a carga horária dos cursos de licenciatura, de graduação plena, de formação
de professores da educação básica em nível superior.
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Projetos e práticas de formação de professores
O PAPEL DO PROFESSOR NA FORMAÇÃO DO
JOVEM: A VOZ DO ALUNO DO ENSINO MÉDIO
MENDES, Maria Celeste de Jesus (Universidade Católica de Santos)
Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver o Universo...
Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer.
Porque sou do tamanho do que vejo
E não do tamanho da minha altura...
Fernando Pessoa
Este trabalho se propõe a tratar de aspectos que consideramos fundamentais para
ampliarmos nosso olhar para o aluno do Ensino Médio. Os dados abordados foram coletados
através de textos produzidos por 98 alunos ingressantes nesta etapa escolar de uma escola pública
de periferia em 2004. A produção destes textos fez parte de um projeto1 maior desenvolvido na
escola desde 2003, que consistia em valorizar o aluno enquanto sujeito de sua aprendizagem.
Faremos, inicialmente, algumas considerações sobre a função social da escola, o Ensino Médio e
a adolescência, para, então, adentrarmos às considerações e análise dos dados coletados.
Várias instituições são responsáveis pela formação do jovem, a família, as
comunidades, os meios de comunicação e a escola, e esta é, sem dúvida, o principal espaço para
organizar, sistematizar, transmitir e proporcionar a construção do conhecimento. É através do
conhecimento, do domínio das ciências e das tecnologias que o homem adquire meios de
transformar o meio natural e a sociedade em que vive. Esse caráter transformador da escola é
determinado pelo grau com que instrumentaliza seus alunos no campo da ciência, da técnica, da
crítica e da criatividade. Ao estimular e desenvolver nos educandos as capacidades intelectuais,
as atitudes e o comportamento crítico em relação à sociedade, na qual estão inseridos, a escola
colabora de forma determinante com a transformação social. Mas o que qualquer pessoa ligada à
escola, seja professor, aluno ou comunidade percebe com clareza é o que toda a sociedade já se
habituou a chamar de “crise da educação”. Todos a reconhecemos, embora não se saiba exatamente
qual sua extensão e nem quando começou, mas ela se torna evidente quando concretamente
uma enorme parcela de crianças ingressantes na escola não consegue concluir satisfatoriamente
os oito anos mínimos e obrigatórios. Esse é, certamente, um dos maiores problemas enfrentados
pela escola brasileira na atualidade.
Por conta disso, vários esforços foram e estão sendo articulados numa tentativa de
redirecionar a educação brasileira. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB, Lei
nº 9.394/97, ao estabelecer como sendo dever do Estado a progressiva extensão da obrigatoriedade
do Ensino Médio, pretende corrigir uma das razões que provocam a distorção idade/série e a
elevada exclusão dos jovens e adolescentes desta etapa escolar.
O Plano Nacional de Educação estabeleceu metas para a educação no Brasil com
duração de dez anos que garantam, entre muitos outros avanços, a elevação global do nível de
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Projetos e práticas de formação de professores
escolaridade da população, a melhoria da qualidade do ensino em todos os níveis, a redução das
desigualdades sociais. E uma das mais importantes metas do Plano Nacional de Educação, no
que tange o Ensino Médio, é a garantia do acesso a todos aqueles que concluam o Ensino
Fundamental.
Com o aumento da demanda, o Ensino Médio vem gradativamente passando por
algumas mudanças, engendradas, em grande parte pelas políticas públicas. É cada vez mais
forte a idéia de que esta etapa escolar deva ter uma estreita relação entre o Ensino Fundamental
e o Superior e não se reduzir a uma série de conteúdos que visem à aprovação em provas
vestibulares. Ou seja, o aluno deve, neste período, ser levado a perceber as articulações entre
ciência, diversidade cultural e trabalho, como também desenvolver atitudes e valores éticos, ter o
convívio social estimulado e ser conscientizado a rejeitar qualquer tipo de preconceito. E, ainda,
desenvolver o educando, assegurando-lhe a preparação para o trabalho e a cidadania.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais/PCNs do Ensino Médio (Brasil, 1999),
propõem que, no nível do Ensino Médio, a formação geral, em oposição à formação específica,
deve orientar “o desenvolvimento de capacidades de pesquisar, buscar informações, analisá-las e
selecioná-las; a capacidade de aprender, criar, formular, ao invés do simples exercício de
memorização”.
Aqueles que de alguma forma estão ligados a escolas de Ensino Médio verificam
que a realidade apresentada está muito distante do que propõem os Parâmetros. Essa etapa
escolar encontra-se, atualmente, sem identidade e os professores carentes de formação mais
adequada a essa etapa. Preparar os educandos, para o mundo do trabalho, para o acesso ao
ensino superior, para o exercício da cidadania, tudo isso é um discurso do qual, em teoria, não
podemos discordar, mas o que percebemos na prática é a impossibilidade de concretizar esses
propósitos, principalmente, porque a escola e o professor não estavam preparados para o aumento
da demanda desse público específico do Ensino Médio: adolescentes e jovens.
Percebe-se um descompasso entre o que a escola oferece ao adolescente do Ensino
Médio, aquilo que se pretende que ela deva oferecer e ao que o aluno espera que ela ofereça.
Percebe-se inclusive um “mal-estar” com relação ao trabalho dos professores. A crise da escola
evidencia-se de tal maneira que os profissionais da educação são acometidos de uma série de
conflitos que perpassam pela falta de credibilidade profissional que, por sua vez, é produto da falta
de credibilidade da escola. Se a imagem da escola como instituição está ameaçada, a idéia de
cidadania também está, pois a escola ainda é o meio de o cidadão ter de fato acesso aos seus
direitos com vistas não somente ao direito de voto, mas também a uma vida com dignidade.
Quando se investiga o insucesso escolar, principalmente no Ensino Médio, as razões
que constantemente surgem é a falta de interesse do aluno, não têm perspectivas, não querem
estudar etc., ou seja, esse insucesso é produto de outras fontes que não a escola, o professor ou
a ação pedagógica.
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Projetos e práticas de formação de professores
Para Aquino (1998:182):
(...) ao eleger o aluno-problema como um empecilho ou obstáculo
para o trabalho pedagógico, a categoria docente corre abertamente
o risco de cometer um sério equívoco ético, que é o seguinte: não
se pode atribuir à clientela escolar a responsabilidade pelas
dificuldades e contratempos de nosso trabalho, nossos ‘acidentes
de percurso’. Seria o mesmo que o médico supor que o grande
obstáculo da medicina atual são as novas doenças, ou o advogado
admitir que as pessoas que a ele recorrem apresentam-se como
um empecilho para o exercício ‘puro’ de sua profissão.
Quem é esse aluno que chega ao ensino médio? O que quer? Quais são seus
projetos? Que vivências ele já possui? Quais são seus anseios e dúvidas? A escola e o professor
esperam um aluno ideal e desconsideram ou rotulam o aluno real com o qual se deparam. Ignoramse as suas múltiplas experiências de vida fora do espaço escolar. A expectativa pelo aluno ideal
torna-se mais problemática se desconsiderarmos a diversidade do público atual do ensino médio.
O que nos parece claro é que a escola, os professores e a sociedade em geral olham para a
conduta do adolescente sempre de forma reducionista, simplista e como problemática. O aluno
adolescente, ou o “aborrecente” é apontado sempre como um problema, criam-se estereótipos e,
ao mesmo tempo, em que lhe são impostas novas regras do mundo adulto lhe é negada participação
efetiva nesse espaço, principalmente, no que diz respeito ao direito à expressão. Esse espaço de
tempo, em que as características infantis são abandonadas, mas ainda não se assumiram as
obrigações e responsabilidades da vida adulta, torna-se cheio de contradições.
Sobre essas contradições, Melman (1999) afirma que a forma pela qual a
adolescência é tratada revela uma discordância que nossa cultura mantém entre os estatutos
biológico, subjetivo e social. O adolescente, por um lado, é tomado por uma exigência interna e,
de outro, por uma norma social que o subestima e o declara ainda incapaz.
Com o alongamento da permanência na escola, propiciado pelo aumento progressivo
do acesso à escola de ensino médio, há a necessidade de novas propostas de trabalho para esse
público específico, prioritariamente, adolescentes e jovens.
Para Calligaris (2000: 8-9), os adolescentes:
(...) amam, estudam, brigam, trabalham. Batalham com seus
corpos, que se esticam e se transformam. Lidam com as dificuldades
de crescer no quadro complicado das famílias modernas (...) eles
precisam lutar com a adolescência, que é uma criatura um pouco
monstruosa, sustentada pela imaginação de todos, adolescentes e
pais. (...) A adolescência é o prisma pelo qual os adolescentes se
contemplam. Ela é uma das formações culturais mais poderosas
de nossa época.
A adolescência não é um fenômeno universal. A antropologia já constatou que os
povos primitivos não passam por esse estágio, pois o mundo adulto encontra-se nitidamente
dividido pelo “ritos de passagem”. Esses rituais introduzem o indivíduo no mundo adulto com
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Projetos e práticas de formação de professores
valores e regras bem definidas, não havendo ambigüidades a respeito dos direitos e deveres que
estado de “adulto” lhe acarreta.
Já, nas sociedades modernas, há a segregação do jovem através de uma espécie
de segmentação no período de transição de uma faixa etária para outra. A escola, na modernidade,
passou a ter papel fundamental nesse período de espera enquanto espaço separado, apropriado e
de grande importância para a preparação para a vida adulta. Mas como já observamos
anteriormente, a escola vê esse adolescente de modo reducionista e estereotipado, não
proporcionando momentos de vivências adequadas para que os educandos se desenvolvam
enquanto sujeitos dessa preparação para adentrar na vida adulta.
Faz-se necessário, então, que a escola perceba, como nos diz Dayrell (1996: 140), que:
(...) os alunos chegam à escola marcados pela diversidade, reflexos
dos desenvolvimentos cognitivo, afetivo e social, evidentemente
desiguais, em virtude da qualidade de suas experiências e relações
sociais prévias e paralelas à escola. O tratamento uniforme dado
pela escola só vem consagrar a desigualdade e as injustiças das
origens sócias dos alunos.
É preciso, assim, que a escola propicie espaços para que seus alunos tenham voz,
para que se expressem, opinem, sugiram, analisem, critiquem, enfim, participem, desenvolvendo
assim competências fundamentais para o mundo do trabalho, característica primeira do mundo
adulto. Compreender esse aluno que chega à escola é apreendê-lo como sujeito sócio-cultural.
Para isso, é preciso superar a visão homogeneizante e estereotipada da noção de aluno. Ou seja:
Trata-se de compreendê-lo na sua diferença, enquanto indivíduo que possui uma
historicidade, com visões de mundo, escala de valores, sentimentos, emoções, desejos, projetos,
com lógicas de comportamentos e hábitos que lhe são próprios. (Dayrell, 1996:140)
Ao participarmos por alguns minutos de qualquer reunião de conselho de classe e
série, veremos que essa necessária mudança de visão está bem distante da realidade, pois nos
deparamos com vários rótulos e estereótipos dados aos alunos: o desinteressado, o indisciplinado,
o desrespeitoso, o que não tem pré-requisitos, o que não tem limites, o agressivo, o tímido, o
bagunceiro, ou ainda, uma expressão que de tão ampla é vazia de significado: “esse aluno tem
problemas”. Esses esteriótipos acabam por cristalizar modelos de comportamento com os quais
os alunos passam a se identificar.
De acordo com Spósito (2001), o estereótipo atribui a priori características ao sujeito,
neste caso, o adolescente, e nega o direito à fala. Ou seja, nos negamos a escutar o que ele teria
a dizer sobre si mesmo e lhe são impostas definições externas que toma como suas, que, ainda
segundo a mesma autora, essas definições tornam-se representações incorporadas pelo jovem,
podendo gerar estigmas que deformam a identidade. Desta forma, torna-se claro que o olhar que
lançamos ao adolescente tem grande importância na constituição de sua identidade.
A responsabilidade de escola com relação à formação do jovem é enorme e deve
não reproduzir o olhar que a sociedade em geral tem do adolescente e, sim, caminhar no sentido
de reconhecer esse adolescente como um ser único, respeitando democraticamente seu direito a
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Projetos e práticas de formação de professores
ser ouvido e estimulado à livre expressão responsável, crítica e consciente, que precisa, conforme
Aquino (2003: 61), ser incessantemente cultivado.
Tendo por base que a escola é um espaço polissêmico, é necessário articular a
experiência que a escola oferece de acordo com o seu projeto político-pedagógico, com o projeto
dos alunos. Não seria a escola o espaço privilegiado para desenvolver a formação humana de
forma ampla, ampliando o universo dos alunos?
E, como nos diz Velho (1987, apud Dayrell, 1996: 145):
(...) quanto mais exposto estiver o ator a experiências diversificadas,
quanto mais tiver de dar conta de ethos e visões de mundo
contrastantes, quanto menos fechada for a sua rede de relações ao
nível do seu cotidiano, mais marcada será a sua percepção de
individualidade singular. Por sua vez, a essa consciência da
individualidade, fabricada dentro de uma experiência cultural
específica, corresponderá uma maior elaboração de um projeto.
Pensando dessa forma, iniciamos, em 2003, um projeto que tinha como objetivo
desenvolver a livre expressão, a análise, a crítica, e a solidariedade através da empatia e do
respeito ao outro. Um dos momentos desse projeto caracterizou-se pela proposta de uma produção
textual que tinha como tema o papel do professor na formação do jovem. A princípio, o que se
percebeu foi a enorme dificuldade de elaborar, selecionar e organizar a idéias, ou seja, a maioria
não sabia exatamente qual era o papel do professor na sua própria formação. O que pode parecer
estranho, afinal, a maioria está na escola pelo menos há nove anos e não conseguia definir qual é
o papel do professor. Questionados sobre isso, os alunos se surpreenderam por nunca terem
pensado que os professores têm um papel em sua formação e passaram a refletir sobre ele.
Nos textos produzidos, que passaram a ser tratados, na análise de dados como
questionários abertos, o que se percebe é que apesar de a maioria nunca ter refletido sobre o
tema, quando o fez, conseguiu levantar aspectos sobre o papel do professor extremamente
pertinentes. Ou seja, os alunos quando estimulados a participar, a refletir e a expressar-se mostramse competentes e demonstram ser muito diferentes dos esteriótipos e rótulos que normalmente
lhe são impostos.
Segundo Rios (2003:93): “Em toda a ação docente, encontram-se uma dimensão
técnica, uma dimensão política, uma dimensão estética e uma dimensão ética”. Em seus textos,
os educandos abordaram pontos que englobam justamente essas quatro dimensões. Sendo assim,
os dados coletados foram organizados no que tange à dimensão da competência técnica, dimensão
ético-política e dimensão estética. Além desses dados elencados com relação ao papel do professor
enquanto formador, pode-se constatar, também, que muitos alunos conseguiram perceber as
dificuldades e deficiências que alguns professores têm em desempenhar esse papel e, ainda,
indicaram o que seria necessário para que a sua formação, enquanto alunos, fosse mais eficaz.
Na dimensão da competência técnica, o que se espera de um professor é o domínio
dos conteúdos de sua disciplina e que consiga transmiti-los, ou seja, domínio do conteúdo
específico e de métodos pedagógicos.
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Projetos e práticas de formação de professores
De acordo com Cunha (1982, apud Rios, 2003:94), o termo “técnica” é usado para
indicar o “conjunto dos processos de uma arte” ou a “maneira ou habilidade especial de executar
ou fazer algo”. Temos, então, a competência técnica ligada à capacidade de lidar com os conteúdos
e conceitos e das atitudes. Essa dimensão foi claramente citada na maioria dos textos:
O docente tem o dever de conhecer a matéria que ele leciona e
deve expressar esse conhecimento com clareza...
O papel do professor é transmitir conhecimento, é tirar qualquer
tipo de dúvida que apareça sobre sua matéria...
Ensinar de forma que o aluno entenda faz parte do papel do
professor; deve também tentar compreender a dificuldade do aluno
e tentar tirar suas dúvidas...
(...) os professores devem se empenhar em ensinar de uma forma
interativa e dinâmica, fazendo com que os alunos aprendam de
uma forma divertida e interessante...
(...) deve ensinar seu conteúdo com clareza, preparar para o
vestibular e nos sentirmos seguros para entrar no mercado de
trabalho...
A competência ético-política está presente naquele professor que, além de ensinar,
sente a responsabilidade de formar integralmente o seu aluno, parafraseando Freire (1997), ter
compromisso ético político é aquele que ensina a ler o mundo e não apenas se restringe a ensinar
a leitura das palavras.
Rios (2003:106) reivindica, para a profissão docente, a dimensão da competência
ética, esclarecendo que competência guarda o conceito de algo de boa qualidade – algo que se
exercita como deve ser, na direção não apenas do bem (...), mas do bem comum.
Inseparável da ética está a competência política que tem como finalidade a vida
justa e feliz, ou seja, a vida propriamente humana digna de seres livres (Chauí 1994:384). Iniciar
os alunos no que diz respeito a sua participação na sociedade, cientes de seus direitos e deveres,
é parte desta competência. Nos textos analisados, essa competência é a citada como mais
importante na formação do jovem. Vejamos alguns trechos:
O papel do professor é um marco na vida de qualquer pessoa. É
ele quem ensina, auxilia nas dificuldades e prepara-nos para o
mundo.
(...) é necessário que exista respeito para que o docente exerça sua
função de ensinar, mas não apenas uma simples lição de
determinada matéria, mas sim um aprendizado de vida que o jovem
irá levar com ele pela vida toda.
O professor tem uma grande importância na educação dos jovens,
pois ele passa um terço de nossa vida conosco...é necessário que
ele seja o guia do jovem... um amigo e não só um simples professor...
e também deve servir de inspiração para o jovem...
(...) além disso, é ele que te ajuda a ter respeito ao próximo, a ser
solidário... o docente sempre tem algo novo e surpreendente para
te ensinar, é ele que vai te mostrar que o mundo pode ter mais
brilho e te transformar numa pessoa preparada para o futuro...
O professor não é só importante para o ensino de Português,
Matemática, mas também para orientá-lo no dia-a-dia, é ele um
dos responsáveis junto com a família, pelo desenvolvimento do
intelecto e do futuro do jovem.
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Projetos e práticas de formação de professores
(...) em suas aulas deve exigir de nós sempre o melhor, fazendonos ter responsabilidade com datas de entregas de trabalho, e
mostrando sempre que isso é para o nosso bem...
(...) outro fator importantíssimo na educação de um jovem é o
professor servir de espelho para seus alunos, ou seja, se o educador
se mostra uma pessoa bem educada, com princípios, o jovem
receberá isso como uma lição que será exercida diariamente...
(...) deve valorizar o aluno na sua capacidade... levantar sua autoestima para que ele se sinta forte para lutar por seus interesses...
ensinar que para ser um cidadão não precisa passar por cima dos
outros e, sim, ter respeito por todos que o cercam sendo uma pessoa
digna de caráter...
A origem etimológica da palavra estética vem do grego aisthesis com o significado
de “faculdade de sentir”, “compreensão pelos sentidos”, “percepção totalizante”, portanto, tomando
esses significados não aprofundaremos, aqui, uma reflexão sobre a arte ou o belo, mas, sim,
relacionar os significados originais da palavra à necessidade de sensibilidade no ato educativo.
Rios (2003), citando Ostrower (1986:12-13), refere-se à sensibilidade como algo
que vai além do sensorial e que diz respeito a uma ordenação das sensações, uma apreensão
consciente da realidade, ligada estreitamente à intelectualidade. Segundo ela (id.: 96): “(...) a
sensibilidade guia o indivíduo nas considerações do que para ele seria importante ou necessário
para alcançar certas metas de vida.(...)”. A sensibilidade se converte em criatividade ao ligar-se
estreitamente a uma atividade social significativa para o indivíduo. Sendo assim, a estética é uma
dimensão da existência, do agir humano. É o que podemos perceber das falas de alguns dos
nossos alunos:
(...) o professor deve agir com carinho, demonstrando interesse em
que todos alcancem o objetivo final que é ser aprovado, ele
conseguirá a confiança e o respeito de todos (...), propor trabalhos
e atividades que exijam a aproximação do aluno e do professor...
(...) deve haver entre o professor e o aluno um vínculo de amizade,
confiança e respeito, para que haja um melhor rendimento e para
que todos os objetivos sejam alcançados...
(...) deve ser um conselheiro sincero, é o nosso amigo que muitas
vezes nos dá um conselho, um apoio quando precisamos...
O professor deve demonstrar interesse pelo aluno e ter paciência
quando explicar.
(...) o professor não é só um amigo ele é muito mais que isso, ele
vai estar com o aluno boa parte da vida, mostrando coisas que ele
nem sonhava que existiam...
Outro item muito importante na relação entre o professor e o aluno
é o companheirismo, pois a partir do momento que os dois sejam
companheiros, facilitarão os dois lados, o ensino do professor e o
aprendizado do aluno...
Percebe-se, na análise dos textos produzidos pelos alunos, que suas percepções
sobre o papel do professor são aprofundadas no sentido de demonstrarem claramente que uma
dimensão apenas não é suficiente, mas que uma complementa a outra.
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Projetos e práticas de formação de professores
Para Rios (2003:108):
a dimensão ética é a dimensão fundante da competência porque a
técnica, a estética e a política ganharão seu significado pleno
quando, além de apoiarem em fundamentos próprios de sua
natureza, se guiarem por princípios éticos. Assim vale reafirmar que,
para um professor competente, não basta dominar bem os conceitos
de sua área – é preciso pensar criticamente no valor efetivo desses
conceitos para a inserção criativa dos sujeitos na sociedade. Não
basta ser criativo – é preciso exercer sua criatividade na construção
do bem-estar coletivo. Não basta ser comprometido politicamente –
é preciso verificar o alcance desse compromisso, verificar se ele
efetivamente dirige a ação no sentido de uma vida digna e solidária.
E, neste sentido, afirma um de nossos alunos:
(...) existem professores que só se preocupam em ensinar sua
matéria deixando de lado coisas muito importantes: a virtude, que é
ensinar como conviver bem com seus colegas e na sua comunidade,
a ser um cidadão de verdade.
Além de terem elencado, em seus textos, as quatro dimensões da competência,
alguns fizeram referências às dificuldades e deficiências apresentadas no ambiente da sala de
aula, abordando aspectos como a falta de conhecimento teórico sobre matéria lecionada, o clima
de desordem, a falta de didática, a falta de comprometimento. Alguns conseguiram identificar o
comportamento de professores que, provavelmente, se mostram na fase de desinvestimento da
carreira. Vejamos alguns trechos para melhor ilustrar:
A desordem dentro da sala de aula atrapalha o desenvolvimento
dos alunos, pois se a bagunça não é contida, logo ela se torna
gradual e, mais tarde, foge do controle do professor, que, muitas
vezes, não dá importância, mostra um certo desinteresse em
melhorar, em inverter a situação e, com isso, acaba permitindo os
excessos de indisciplina, pois sua autoridade não é mais respeitada.
Alguns professores tentam dar aula. Quando eles percebem que
não vão conseguir, alguns deles desistem, deixando apenas um
conteúdo incompreendido na lousa e quem ficam prejudicados são
os alunos que estão interessados em aprender.
Existem professores que conseguiram ter conhecimento suficiente
para exercer sua profissão que é de muita responsabilidade, mas
não conseguem ensinar os alunos.
Há professores que não conseguem preparar suas aulas e chegam
na escola com algumas coisas improvisadas e não conseguem
passar o conhecimento suficiente para os alunos.
O professor tem um papel fundamental na vida do jovem, mas alguns
entram nessa profissão não sei por que, pois não sabem explicar
direito, só sabem gritar e brigar com os alunos.
Já é da natureza do aluno não gostar da escola e quando percebem
que o professor está com falta de interesse, não estudam, não fazem
nada, se tornando alunos rebeldes...
O professor precisa compreender que os alunos não têm o mesmo
grau de conhecimento que ele e, por isso, não deve se irritar, mas
ensinar quantas vezes for necessário para que o aluno aprenda o
máximo.
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Projetos e práticas de formação de professores
Como toda a profissão, existem os que fazem seu dever por amor e
vocação e os que fazem só pelo dinheiro e a diferença se vêem em
sala de aula, há professores que só se preocupam em “passar” a
matéria e acham que fazendo isso sua missão está cumprida”.
Parece-nos claro que o aluno está muito além daquilo que normalmente o rotulam.
A ampliação do olhar sobre ele, percebendo-o de maneira mais complexa, no sentido de conhecer
seus saberes, vivências, suas idéias, suas críticas, suas propostas, poderia ser um caminho no
sentido de dar contornos possíveis para uma formação integral desse jovem. Ao ouvir o aluno, o
que se recebe de volta é uma profusão de opiniões, observações, propostas etc., que são
surpreendentes e que em nada sugerem a imagem de superficialidade que normalmente lhe é
impingida. A escola precisa abrir-se para o novo, e o adolescente precisa de um espaço em que
possa ser ouvido, reconhecido. Ao propor que o aluno precisa ser ouvido, não estamos sugerindo
que ele passe a ditar suas regras e sugerir propostas que devam ser aceitas prontamente pela
escola, obviamente que não, o que se propõe é oportunizar o diálogo, construir uma relação de
respeito mútuo. Nos dados coletados, os alunos sinalizam claramente que precisam de um adulto,
no caso, o professor como portador de valores, de regras e que lhe sirva de exemplo:
(...) outro fator importantíssimo na educação de um jovem é o
professor servir de espelho para seus alunos, ou seja, se o educador
se mostra uma pessoa bem educada, com princípios, o jovem
receberá isso como uma lição que será exercida diariamente...
A vontade dos alunos é ter voz, é ter oportunidade de propor, de criticar, de participar
de um processo no qual são os principais interessados, assim, como transformar nosso aluno em
sujeito de seu próprio conhecimento sem dar oportunidade para que se expresse? Nosso objetivo,
no presente trabalho, foi o de discutir a importância de se ouvir o aluno para podermos ampliar
nosso olhar sobre ele e mostrar que durante o desenvolvimento do projeto, no qual os textos foram
produzidos, isso foi possível. Ou seja, os alunos foram ouvidos, reconhecidos como sujeitos capazes
de observar, avaliar, propor mudanças, questionar, enfim, participar de um processo dialético.
Estamos cientes de que não exploramos a totalidade dos dados recolhidos, muito
mais poderíamos aprofundar tanto no que diz respeito às informações presentes nos textos, como
em relação a uma mais completa fundamentação teórica.
Acreditamos que a relevância dos aspectos abordados pelos alunos e a dimensão
com que participaram das atividades nos dão indícios sobre a necessidade e a importância de se
ouvir o aluno e olhá-lo com um olhar ativo, sem pressa, percebendo as mudanças, as semelhanças
e as diferenças, enfim, olhá-lo com “olhos de ver”.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AQUINO, Julio Groppa de. Indisciplina: o contraponto das escolas democráticas. São Paulo:
Editora Moderna, 2003.
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Projetos e práticas de formação de professores
__________. A indisciplina e a escola atual. Revista da Faculdade de Educação da USP. São
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CALLIGARIS, Contardo. A adolescência. São Paulo: Publifolha, 2000.
CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Editora Ática, 1994.
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educação e cultura. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2001, p.96-104.
NOTAS
1 O projeto Vivências Comunicativas integrava as aulas de Língua Portuguesa da E.E. Profª Gracinda Maria
Ferreira.
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Projetos e práticas de formação de professores
PROGRAMA DE FORMAÇÃO CONTINUADA –
TEIA DO SABER – UMA ANÁLISE CRÍTICA.
CUSINATO, Ricardo; CUSINATO, Maria Nazareth Cardoso (FCL-UNESP/CAR)
O Governo do Estado de São Paulo, através da Secretaria da Educação e da
Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas ,elabora um programa de Formação Continuada
de Professores denominado ‘TEIA DO SABER’. É um projeto de Capacitação Descentralizada
Mediante Contratação de Instituições de Ensino Superior.
A Secretaria da Educação parte, portanto, de alguns princípios básicos: primeiro ,o
de que há a necessidade da atualização do conhecimento e da capacidade profissional do professor
de ensino fundamental e médio; segundo, de que esta Formação Continuada deve ser dada pelas
Instituições de Ensino Superior, especificamente daquelas habilitadas nos cursos de Licenciatura.
Esse projeto tem como objeto a “Contratação de Instituições de Ensino Superior,
públicas ou privadas, devidamente autorizadas/reconhecidas para implementar as ações
descentralizadas do Programa de Formação Continuada de Professores – Teia do Saber – da
Secretaria de Estado da Educação do Estado de São Paulo, visando a capacitação de professores
do ciclo II do ensino fundamental e do ensino médio, que estejam atuando em sala de aula nas
escolas estaduais jurisdicionadas à Diretoria de Ensino.”
Como terceiro princípio, destaca-se o direito e a habilitação das Instituições de
Ensino Superior , públicas ou privadas, a desenvolverem estes cursos.
Pergunta-se : Por que o Estado de São Paulo mantém três Universidades Públicas
e para qualificar o corpo docente do ensino fundamental e médio recorre às instituições de
Ensino Superior Privadas?
A justificativa do programa é de que “ A Secretaria da Educação está concentrando
seus esforços para oferecer à população uma escola pública de qualidade, que receba e mantenha
sob seus cuidados todas as crianças e jovens, que favoreça o acesso à cultura, à arte, à ciência,
ao mundo do trabalho, que eduque para o convívio social e solidário, para o comportamento
ético, para o desenvolvimento do sentido da justiça, o aprimoramento pessoal e a valorização da
vida. O êxito desse empreendimento requer o preparo intelectual, emocional e afetivo dos
profissionais nele envolvidos. Por essa razão, está priorizando, entre suas ações, a formação dos
educadores que atuam nas escolas. Para tanto, o presente projeto prevê a participação de
instituições de ensino superior, contratadas para realização de cursos de capacitação e
aprimoramento dos professores da rede pública estadual.”
Como quarto princípio destacamos o papel essencial da escola, sem desmerecer
as outras funções que ela assume ,socialmente , na atualidade, que é o de favorecer e permitir o
acesso do aluno à ciência, à arte, à cultura e sua relação com o mundo do trabalho e com o
mundo social e solidário. Ao papel histórico da escola como espaço para fazer a iniciação científica
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Projetos e práticas de formação de professores
da criança ,a escola do século XXI acrescenta a preocupação da sua relação com a vida na
sociedade. Quando menciona a sua preocupação com o mundo do trabalho, entendo que se
opõe a uma educação alienada que prepara o jovem para o nada. Se hoje a Secretaria da Educação
manifesta sua preocupação com o projeto pedagógico da escola e insere nele questões relativas
ao mundo social, a sobrevivência da classe trabalhadora, que é o mundo do trabalho, significa
que ela busca superar o projeto da escola alienada que só prepara para o vestibular, para um ritual
macabro onde centenas de jovens concorrem a uma vaga nas universidades públicas. Fica assim
a maioria dos jovens sem a formação acadêmica e científica de uma universidade pública por
falta de vagas e por outro lado ficou também sem a formação acadêmica que poderia ter sido
desenvolvido no ensino médio e não foi.
Este empreendimento, argumenta a Secretaria da Educação, requer o preparp
intelectual, emocional e afetivo dos profissionais nele envolvidos. Profissionais, esta é uma palavra
que expressa uma concepção realista sobre a atividade educar: mais ainda, revela a existência de
pessoas preparadas e habilitadas e comprometidas com a ação de ensino e que são e serão
tratadas pela Secretaria como “profissionais”. Mas tem uma recaída no parágrafo seguinte quando
argumenta que em suas ações está priorizando a formação de “educadores”, que atuem nas
escolas. Não há contrato, nem concursos , nem leis para educadores e sim para professores. O
termo que expressa respeito, dignidade, respeito pelo profissional é o de ‘PROFESSOR’. Educador
é o avô quando conta histórias para o seu neto; o pai quando ensina ao filho como conviver com
os outros e nesses atos está de certo modo imbricado uma dose de história, de moral, de afetividade,
de controle, de família. Mas se perde com certeza, neste ato o princípio da ciência. Não há
naquele momento, na relação do avô com o neto, do pai com o filho, nenhum objetivo com os
procedimentos acadêmicos e científicos, e sim uma visão de transferência de experiências de
vida , no sentido mais largo do termo. São dois momentos distintos, dois momentos
imprescindíveis, mas distintos. Educador, é um momento, uma expressão que revela mais do
que tudo afetividade, romantismo. Professor é um termo, e porque não dizer um conceito, que
enuncia procedimentos, atitudes, comportamentos , que passa por avaliações, por exames de
laboratório. Ser professor significa um compromisso com o PROCESSO DE ENSINO, um
compromisso com a ciência.
O quinto princípio ocorre ao tratar dos objetivos do projeto: o uso de novas
metodologias voltadas para as práticas inovadoras e para o uso de materiais didáticos. Parte do
pressuposto de que o objeto de ação de formação continuada dos professores devem ser os
procedimentos, as novas metodologias, o uso de novos equipamentos, de novas linguagens que
atendam às necessidades de aprendizagem das crianças e jovens. No segundo objetivo acrescenta:
o desenvolvimento de competências para a utilização de novas tecnologias a serviço da
aprendizagem. Em nenhum momento ,o Projeto TEIA DO SABER põe em questão a formação
de conteúdos do professor. Para a Secretaria da Educação, a questão da educação, a ação das
Faculdades e dos cursos de formação continuada para os professores devem incidir nos
procedimentos, no método e nas novas tecnologias. Parte do pressuposto de que o PROFESSOR
SABE e que só precisa SABER ENSINAR. Já ouvimos diversas vezes, em nossas experiências
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Projetos e práticas de formação de professores
de vida, alunos que não entendem a aula de um professor e dizem, “ ele sabe para ele, mas não
sabe ensinar.”. Pergunto, será que um aluno sabe avaliar se um professor sabe? O fato de ficar na
lousa, enchendo de números ou de conceitos e palavras pode significar o contrário, de que ele
não tem claro os conceitos básicos de sua matéria, de sua especialidade científica. Não há
nenhum indício deste dado: o de que o professor sabe o CONTEÚDO de sua disciplina. O fato de
ter feito um curso de licenciatura é um indício da formação do professor. No entanto, a diversificação
das instituições de ensino que oferecem cursos de formação de professores é bastante significativa,
o que torna difícil poder afirmar que existe um grau de aprendizado conceitual , acadêmico e
científico assegurado. Por um lado, temos as Universidades Públicas com uma tradição de
ensino e pesquisa de alto nível, de centros de excelência, mas que podem ter o resultado dos
cursos de formação de professores, dos seus cursos de licenciatura, comprometido com o maior
ou menor envolvimento de seu quadro docente com a temática da formação dos professor e com
as questões relativas ao ensino fundamental e médio. Mesmo como centros de excelência, os
professores que forma para o magistério do ensino fundamental e médio podem ter uma margem
relativa de conhecimento de conteúdos. O próprio rol de disciplinas oferecidas, assim como as
disciplinas optativas realizadas pelos alunos demonstram um maior ou menor comprometimento
com o ensino fundamental e médio.
A análise do processo de contratação das Instituições de ensino
Superior para ministrar os cursos para o Programa Teia do Saber demonstra que ,entre outros, o
critério determinante na realização do pregão, cumpridas as formalidades legais, é o custo financeiro
do curso, é o preço. O preço do curso surge de forma independente da qualificação dos professores
que prestarão os serviços. Este procedimento de remuneração é incompatível com a forma de
remuneração do profissional ,do professor no ensino superior: tanto no ensino superior público
quanto no particular, o valor do trabalho, da hora -aula do professor é variável e compatível de
acordo com sua titulação: graduação, mestre, doutor e livre docente.
No PREGÃO, edital de concorrência para os cursos de qualificação
profissional no Programa Teia do Saber, a Secretaria da Educação desconsidera a titulação dos
professores, o curriculum lates dos professores que representarão a Instituição que ministrará os
cursos de formação de professores, ou seja, na contratação de instituições de ensino superior,
públicas ou privadas, a Secretaria da Educação desconsidera a titulação, o curriculum e a
experiência profissional dos professores que trabalham nos projetos de Formação de Professores.
Esta omissão da Secretaria da Educação tem como conseqüência a própria desvalorização do
professor, provocada por ela mesma. Como ela elabora um projeto de Formação de Professores
quando a própria Secretaria da Educação nega a qualificação profissional.
Este critério da Secretaria da Educação acaba por privilegiar as Instituições
de Ensino Superior Privadas em detrimento das Universidades Públicas, na medida em que a
titulação e a experiência docente dos professores das instituições de ensino são ignoradas. O
peso de um curso oferecido por um professor Doutor, que trabalha a dez anos nos cursos de
licenciatura, que ministra cursos e orienta trabalhos de pesquisa no curso de pós graduação em
Educação, tem exatamente o mesmo valor de um curso de um professor, pós-graduando com o
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Projetos e práticas de formação de professores
título de mestre, com pouca ou nenhuma experiência profissional, com pouca ou nenhuma
experiência de ensino. Para efeito do pregão dos cursos do Programa Teia do Saber da Secretaria
da Educação, ambos têm o mesmo peso, o mesmo valor. Pode haver maior desvalorização da
qualificação profissional do Professor ?
O critério de contratação é única e exclusivamente o preço.
O critério para a contratação do corpo docente ou mais precisamente, a
falta de critério , não exigindo qualificação do corpo docente responsável por estes cursos , não
exigindo qualificação do corpo docente compatível com a formação dos professores do ensino
básico da rede pública no Ensino Fundamental e Médio. Os professores do Ensino Fundamental
e do Ensino Médio são docentes graduados em licenciatura plena, com diversos anos de experiência
profissional em ensino e muitos deles efetivos,o que significa dizer que foram aprovados em um
concurso público de títulos e provas promovidos pelo Estado, em um prova que lhes exigiu
conhecimentos de sua matéria específica e conhecimentos sobre a Educação Brasileira. Cumpre
acrescentar que conhecimentos semelhantes não são exigidos dos professores que vão ministrar
os cursos na Teia do Saber.
As Universidades Públicas têm grande experiência em ensino e pesquisa
e contam hoje com um corpo docente com uma qualificação profissional e uma titulação, na sua
imensa maioria de doutores, com experiência em formação de professores, lecionando nos cursos
de licenciatura. Mas como a qualificação profissional é ignorada pelo projeto Teia do Saber, as
Universidades Públicas têm sido prejudicadas na concorrência pública de prestação de serviços
para a Secretaria da Educação – nos pregões.
No entanto,como o critério para a contratação dos cursos é única e
exclusivamente o preço, ignorando a qualificação profissional dos professores, as Faculdades
Privadas têm levado vantagem de maneira expressiva nestes pregões. É sabido que graduandos
e mestres fazem parte do corpo docente destas Faculdades e receio que esteja havendo uma
inversão de valores neste processo. Sabemos as condições em que são feitos os cursos de pós
-graduação e, sem ter experiência expressiva de sala de aula no ensino fundamental e médio são
contratados para dar os cursos para um professor, concursado e com experiência profissional no
magistério. Argumenta-se nos bastidores que em muitos casos, os professores do ensino
fundamental e médio têm uma qualificação profissional superior aos professores envolvidos no
projeto.
A presença dos professores do Ensino Fundamental e Médio se torna
obrigatória nestes cursos pela pontuação e premiação imposta pela Secretaria da Educação, o
que não significa necessariamente tradução em ganho científico e educacional.
As Universidades Públicas e a própria Secretaria da Educação têm
profissionais qualificados e capacitados atuando nos seus quadros, nas Oficinas Pedagógicas e
na Supervisão de Ensino, com formação acadêmica de graduação, de pós- graduação e com
experiência profissional de Ensino Fundamental e Ensino Médio que lhes dão um estatuto
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Projetos e práticas de formação de professores
profissional que, com certeza, poderiam estar desenvolvendo esse trabalho de formação docente
e de qualificação profissional com competência e comprometimento.
Estes cursos, da maneira como estão sendo desenvolvidos, representam
para o professor do magistério público mais um elemento de sobrecarga de trabalho. As aulas
destes cursos são desenvolvidas aos sábados, ao longo de todo o ano, sobrecarregando ainda
mais de trabalho a jornada do professor. Para fazer estes cursos, muitas vezes os professores
precisam viajar, uma vez que cada Diretoria de Ensino organiza um curso na cidade em que está
instalada a Faculdade, fazendo com que todos os professores se desloquem para determinada
cidade.
Estes cursos representam um grande custo para a Secretaria da Educação
Estadual que vai argumentar que investiu milhões de reais na formação do professor e no ensino
fundamental e médio. No entanto, a forma de organização e de realização dos cursos representam
mais uma medida de desqualificação e de perda da identidade do professor. O texto abaixo
citado, reforça esta idéia:
“As ações descentralizadas do Programa de Formação Continuada – Teia do Saber
– visam proporcionar ao professor ambientes de aprendizagem que assegurem: desenvolvimento
de competências que qualifiquem para o enfrentamento das contradições do cotidiano, favorecendo
o processo de socialização dos alunos, a edificação de valores éticos, solidários e de respeito ao
outro, que auxiliam o aluno na construção de seu projeto de vida.”
BIBLIOGRAFIA:
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Projetos e práticas de formação de professores
RELATO DE EXPERIÊNCIA: PROFESSORES E ALUNOS
APRENDENDO JUNTO AO LABORATÓRIO DE
INFORMÁTICA E O PROCESSO DE ABSTRAÇÃO
REAL, Luciane Magalhães Corte – FACED/UFRGS;
PICETTI, Jaqueline Santos – UNIRRITER/UFRGS
Este relato de experiência propõe-se a analisar teoricamente, um projeto construído
na interação de professores e alunos, junto ao Laboratório de Informática - LI - de uma escola da
Rede Municipal de Educação - RME - de Porto Alegre. Para tal fim, utilizaremos a teoria da
abstração reflexionante de Piaget.
Vale pontuar, que a experiência utilizou-se da metodologia de Projetos de
Aprendizagem como descrita por Fagundes et all (1999). Nessa proposta, professores e alunos
aprendem em conjunto, pois em alguns momentos o professor ensina o aluno e em outro, o aluno
é professor de seu professor. A aprendizagem também se deu entre professores e pesquisadoras,
pois, a análise utilizando a teoria piagetiana foi discutida conjuntamente com os professores.
A experiência concretizou-se a partir da proposta dos professores e pesquisadoras
aos alunos, na elaboração de projetos de estudos em parceria com o LI da escola em que
frequentam. Os adolescentes interagiram no Laboratório de Informática durante dois meses, com
freqüência de duas vezes por semana. A proposta de trabalho, a eles sugerida, foi que a partir de
um projeto de estudos na internet, construíssem páginas sobre algum local de seu interesse ou
curiosidade (país, cidades, etc). Alguns locais escolhidos: China, Alemanha, Estados Unidos,
Veneza, Gramado (RS - Brasil) e Porto Alegre. Em cada computador trabalharam dois ou três
alunos com seus projetos de estudo em comum. Era desafio ao grupo a construção de uma
página na internet, contendo informações necessárias para que se algum colega fosse visitar o
local, soubesse o que iria encontrar (alimentação, moeda, vestimenta, língua, comidas, pontos
turísticos, etc.)
Nesse princípio de reflexão, é relevante destacar a idéia de que entre os vários
processos envolvidos na trajetória da construção do conhecimento no ser humano temos o de
abstração, o qual Piaget, pesquisador desses processos, chamava a atenção desde 1950. Para
esse autor há necessidade de distinguirmos uma abstração que seria reflexionante de outra,
apoiada sobre os observáveis dos objetos e das ações nas suas características materiais. Buscando
preencher essa lacuna, Piaget realizou vários experimentos que deram subsídios para explorar
teoricamente essa questão e produzir a obra “Abstração Reflexionante: relações lógico-aritméticas
e ordem das relações espaciais” (a primeira publicação dessa obra foi em 1977, mas para esse
trabalho estamos utilizando um livro com edição de 1995).
A reflexão teórica sobre esse relato de experiência abordará o conceito de abstração
estudado por Piaget, seus diferentes tipos, o processo de reflexionamento com seus dez patamares
e a criação de novidades, relacionando com as construções dos adolescentes no LI.
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Projetos e práticas de formação de professores
Conceito de Abstração: empírica, reflexionante, pseudo-empírica e refletida
e a interação dos adolescentes no LI
Para iniciarmos a discussão sobre o conceito de abstração recorremos a um
dicionário de filosofia que nos possibilitou a construção da seguinte definição: abstração é a
operação que isola um elemento de uma representação para considerá-lo à parte, não se
encontrando separado da realidade, bem como é o processo pelo qual o espírito se desvincula
das significações familiares do vivido e do mundo das percepções para constituir conceitos
(JAPIASSÚ, 2001). O termo abstração (abs + trahere) significa retirar alguma coisa de alguma
coisa.
Piaget trabalhou com a abstração construtiva diferentemente da metodologia usual
que utilizava a abstração indutiva. Para ele, a teoria da abstração tenta trazer para o mundo das
trocas simbólicas a teoria da equilibração. “Entendemos por isso (...) um processo (de onde o
termo equilibração) que conduz de certos estados de equilíbrio aproximado a outros qualitativamente
diferentes, passando por múltiplos desequilíbrios e reequilibrações” (PIAGET, 1975, p. 9, apud
MONTANGERO, 1998, p. 151).
Para Piaget (1995), há dois tipos de abstração: a empírica e a reflexionante, sendo
que esta envolve a abstração pseudo-empírica e a refletida.
A abstração empírica apoia-se sobre as informações dos objetos ou das ações
em suas características materiais. É a retirada das qualidades que os objetos ou as ações em
suas características materiais têm antes do sujeito agir sobre ele, isto é, os observáveis (PIAGET,
1995).
A abstração reflexionante funda-se na coordenação das ações do sujeito que são
interiores. É o processo que se apoia nos não-observáveis. Ela pode permanecer inconsciente ou
dar lugar a tomadas de consciência - “... significa apropriar-se dos mecanismos da própria ação,
ou seja, o avanço do sujeito na direção do objeto, a possibilidade de o sujeito avançar no sentido
de apreender o mundo, de construir o mundo, de transformar o mundo que está aí, se dá na
precisa medida que ele apreende a si mesmo como sujeito, que ele apreende a sua prática, a sua
ação” (BECKER, 2001, p. 42). Se dá primeiro pelo resultado e posteriormente pelo procedimento,
isto, é, parte dos resultados para ir ao processo. A compreensão, que envolve a tomada de
consciência, se dá tardiamente em relação à ação. A ação tem êxito precoce em relação à
compreensão. A teoria da meta-cognição é a tomada de consciência, sendo a operação sobre a
operação. Cada abstração reflexionante é meta-cognição. - e conceituações variadas. Permite
construir estruturas novas a partir da reorganização de elementos tirados das estruturas anteriores,
criar e recriar novas coordenações e acarreta mais construções de formas - “...consiste em reunir
objetos em um todo, apoiando-se sobre relações de equivalência, em função de suas qualidades
comuns, supõe a intervenção de uma abstração reflexionante...” (PIAGET, 1995, p. 276). O
sujeito se apropria da forma, transformando-a em conteúdo. É a coordenação das ações com
vistas a descobrir as leis dessa coordenação. - em relação aos conteúdos - consiste inicialmente
nos observáveis, destacando a abstração empírica. Posteriormente, é constituído pelas formas
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Projetos e práticas de formação de professores
tematizadas, sendo a coordenação das ações com vista a descobrir as propriedades dos objetos.
“... a abstração reflexionante consiste em introduzir, em novos objetos, propriedades que eles não
possuíam, seja porque sua reorganização consegue construir novas formas que engendram, então,
novos conteúdos” (p. 286). No processo de construção das páginas para a internet, no momento
em que os adolescentes procuravam o local pesquisado na rede, liam os textos referentes a ele,
capturavam as imagens e elaboravam o seu projeto, construindo novidades. Um exemplo é o
grupo que pesquisou Porto Alegre: mesmo os alunos morando nessa cidade, descobriram que
havia alguns locais históricos desconhecidos, como a Estátua do Laçador, símbolo da cidade.
Durante a experiência observamos que no momento em que os adolescentes
conseguiam imaginar as conseqüências de suas ações na máquina (computador) melhores
resultados e menos equívocos obtinham na construção de suas páginas. Quanto mais a abstração
reflexionante conseguir prever a empiria, maior será a segurança e o sucesso do sujeito.
Foram observadas as coordenações e diferenciações (que são partes importantes
da abstração reflexionante, são processos complementares e simultâneos) ao longo do trabalho,
sendo possível constatar as diferenciações que os adolescentes fizeram entre continentes, países,
estados e cidades. No início do processo não havia uma relação de inclusão.
A abstração reflexionante conduz a generalizações construtivas - apoia-se sobre
as operações do sujeito ou seus produtos. É de natureza compreensiva e extensiva e produz
novas formas e por vezes novos conteúdos, ou seja, novas organizações estruturais. Pode conduzir
à elaboração de estruturas mais ricas, mas de extensão restrita, podendo-se falar em “generalização
especializante”. O ponte de partida é a dificuldade de uma assimilação particular e o ponto de
chegada é o que era obstáculo à assimilação se torna uma transformação interna do esquema
ampliado, mas com diferenciação do esquema inicial em sub-sistemas e com integração destes
num sistema total que os coordena. Elabora uma enorme riqueza de sistemas, manifestando-se
em compreensão, pois as estruturas de ordem superior apresentarão propriedades novas (PIAGET,
1978). Já, a abstração empírica, apresenta generalizações indutivas - parte dos observáveis dos
objetos e se detém nesses para verificar a validade de relações observadas, para estabelecer seu
grau de generalidade e tirar daí previsões ulteriores. É de natureza extensiva e generaliza de
“alguns” para “todos” os fatos ou relações constatados, ou melhor, os observáveis a títulos de
conteúdos destas constatações. Limita-se a assimilação dos conteúdos sem engendrá-los (PIAGET,
1978). Essas duas abstrações existem em todos os níveis de desenvolvimento. A abstração
reflexionante participa da coordenação das ações, por isso, da assimilação recíproca dos esquemas
“Assimilação não reduz (...) a uma simples identificação, mas é construção de estruturas ao
mesmo tempo que incorporação de coisas a essas estruturas” (PIAGET, 1936, p. 364, apud
MONTANGERO, 1998, p. 115). “Um esquema é a estrutura ou a organização das ações, tais
como elas se transferem ou se generalizam por ocasião da repetição dessa ação e das
circunstâncias semelhantes ou análogas” (PIAGET, 1966, p. 11, apud MONTANGERO, 1998, p.
166). Ao incorporarmos elementos novos nos esquemas anteriores, há uma modificação desses
últimos para ajustá-los aos novos dados.
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A abstração pseudo-empírica é a que ocorre quando o objeto é modificado pelas
ações do sujeito e enriquecido por propriedades tiradas de suas coordenações.
Podemos dizer que: “...ao agir sobre o objeto e sobre seus observáveis atuais,
como na abstração empírica, as constatações atingem, de fato os produtos da coordenação das
ações do sujeito: trata-se, pois, de um caso particular de abstração reflexionante e, de nenhum
modo, de uma decorrência da abstração empírica” (PIAGET, 1995, p. 274).
Esse falso empírico é reflexionante, pois retira do objeto o que não está lá. Essa
abstração “...serve (...) de suporte e de auxiliar essenciais às abstrações reflexionante” (PIAGET,
1995, p. 277).
A abstração refletida é uma forma superior de abstração que procede de um
processo de abstração reflexionante a partir da reflexão sobre as reflexões particulares. É o processo
de tornar consciente o resultado de uma abstração reflexionante. No decorrer do trabalho, inúmeras
vezes os alunos foram questionados sobre a construção dos projetos de estudo, bem como de
suas páginas e no final foram indagados sobre o sentido de tudo o que foi realizado para o seu
processo de desenvolvimento. De alguma forma, os desafiamos na direção da abstração refletida,
pois eram maneiras de tornar consciente a coordenação das ações que eles haviam realizado.
Alguns exemplos nas falas dos alunos “Tive que organizar tudo e pensar o que ia fazer. Aprendi
sobre tudo, tanto da liberdade de escolha quanto sobre meu país (Rússia)”. “Foi bom para
aprendermos a ter nossas próprias idéias...”.
Prosseguindo o estudo sobre o tema, podemos dizer que a abstração refletida
permanece em retardo em relação à abstração reflexionante, mas há um momento em que ela se
torna o instrumento necessário das reflexões. É um ato mental de reconstrução e reorganização
sobre o patamar superior daquilo que foi assim transferido do inferior, permite a formação de uma
meta-reflexão - reflexão da reflexão - e torna possível a constituição de sistemas lógico-matemáticos
de cunho científico. Assim, essa abstração localiza-se nos diferentes patamares de reflexionamento
- projeção para um patamar superior do que foi tirado do inferior - e esses dão lugar a possibilidade
de novas reflexões (PIAGET, 1995).
PROCESSO DE REFLEXIONAMENTO
Cada reflexão supõe a formação de um patamar superior de reflexionamento no
sujeito. O que estava no patamar inferior torna-se objeto de pensamento e é tematizado. Novos
patamares de “reflexionamento” constroem-se para permitir novas “reflexões”. A reflexão conduz o
jogo em relação aos reflexionamentos e se reduz as tematizações (operações que se tornam
objetos de pensamento), sendo que nos níveis inferiores, são os reflexionamentos que constituem
o motor essencial. A união da reflexão e do reflexionamento é formadora de patamares sucessivos
e cada patamar novo comporta uma diferença de grau e qualitativa (PIAGET, 1995). Podemos
realcionar essas questões com as falas dos adolescentes na avaliação da proposta: “As coisas
que eu não conhecia sobre o Rio Grande do Sul eu conheci.” “Fazendo alguma coisa que se tem
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Projetos e práticas de formação de professores
curiosidade a gente acaba aprendendo e também vendo que há coisas que pensamos saber
tudo e acabamos mudando nosso jeito de pensar.”
O processo de reflexionamento consiste em tirar algo de um patamar e mandar
para um patamar superior. Esse processo apresenta cinco patamares, os quais presenciamos
alguns nessa experiência com adolescentes: o primeiro deles é o mais elementar e conduz das
ações sucessivas à sua representação atual. O segundo é o da reconstituição, com ou sem
narrativa, da seqüência das ações, do início até o término. É o processo de reunir as representações
num todo coordenado. O terceiro é o das comparações, em que a ação, reconstituída, é comparada
a outras que são análogas ou diferentes. Esse patamar foi observado na construção das páginas
para serem linkadas, pois a cada nova construção, comparações eram estabelecidas com a anterior.
As comparações, na vida comum, podem ser espontâneas, e muitas pessoas as fazem por si
próprias. A partir do momento que essas comparações passam a ser destacadas, começa o
próximo patamar. No quarto, surgem novos patamares de reflexionamento, caracterizados por
reflexões sobre as reflexões precedentes e chegando a vários graus de meta-reflexão, permitindo
à pessoa encontrar as razões da conexão. Acreditamos que os adolescentes, no decorrer do
trabalho, chegaram a esse patamar, pois podemos observar um aprimoramento das suas
comparações e reflexões, assim como trabalharam mais de uma variável. Por último encontramos
o patamar em que as reflexões são elevadas à Segunda e à enésima potência, tornando essencial
a própria reflexão por oposição ao reflexionamento (PIAGET, 1995).
Quanto à narrativa, mencionada no segundo patamar, é importante destacarmos
que ela constitui o fazer em pensamento e implica a abstração reflexionante, supondo uma ordem
reconstituída.
A Criação e a Fonte de Novidades: os dez patamares do reflexionamento
O processo de abstração reflexionante gera um movimento de criação de novidades
que é próprio da reflexão: “...todo novo reflexionamento exige uma reconstrução sobre o patamar
superior daquilo que fora dado no precedente” (PIAGET, 1995, p. 278). Este enriquecimento
progressivo e a criação de novidades podem ser organizados a partir de dez patamares de
reflexionamento que também foram constatados no trabalho com os adolescentes em questão:
1.
O primeiro resultado da abstração reflexionante ocorre por diferenciação de
um esquema de coordenação e sua aplicação de maneira nova.
2.
O reflexionamento pode produzir um novo morfismo ou uma correspondência
entre a coordenação conceptualizada e as situações práticas (PIAGET, 1995). A ordem da narração
não corresponde automaticamente à das ações descritas. A reconstituição que a narração exige
acarreta um esforço, uma construção, em parte nova. Observamos essa reconstituição no momento
em que cada grupo apresentava, ao final de cada aula, aos demais o seu trabalho realizado. Tal
fato possibilitou, algumas vezes, que os alunos tomassem consciência de suas construções: Nossa eu não tinha percebido como o meu grupo evoluiu no trabalho hoje! (fala de um aluno).
3.
As estruturas desse nível, assim como dos outros, são retiradas de um
patamar superior aos anteriores. Há o estabelecimento de implicações significantes entre dois
esquemas.
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148
Projetos e práticas de formação de professores
4.
“...a conceitualização consciente das coordenações em jogo provoca
comparações com outras coordenações análogas...” (PIAGET, 1995, p. 280). As narrações,
primeiramente, ocorrem em relação às diferenças de conteúdo, depois, estabelece correspondência
entre as ações e, mais tardiamente, centra-se nas analogias de estrutura. A multiplicidade e a
lentidão de sucessão dessas etapas nos mostra a realidade operativa e a construtividade da
abstração reflexionante o que ocasiona a chegada tardia às abstrações refletidas, necessárias a
tais comparações (PIAGET, 1995).
5.
As comparações conduzem, em certos casos, à abstração de estruturas
qualitativas comuns, bastante gerais, servindo à solução de uma variedade de problemas.
6.
É a etapa que assinala a generalização da negações ou inversões. A negação
requer uma construção nova, extraída por abstração reflexionante das relações qualitativas das
diferenças.
7.
A construção, por abstração, da negação, conduz a uma nova etapa de
construtividade que é a quantificação das extensões e a reversibilidade.
8.
Nesse momento, a abstração refletida que encontrava-se em atraso em
relação à ação dos processos reflexionantes, passa a se juntar a eles e a servir de ponto de partida
ou de trampolim para novas construções (PIAGET, 1995).
9.
Uma vez formadas as estruturas operatórias, tornam possíveis reflexões
sobre as reflexões anteriores, começando uma meta-reflexão.
10.
Nesse momento, há a capacidade de depreender as “razões” das
coordenações e da criação de teorias.
A fonte de novidades encontra-se na necessidade de um equilíbrio entre os processos
de assimilação e acomodação, exigindo, assim, o conhecimento, uma alimentação renovada dos
esquemas. Consiste num estado de constantes trocas, preservando a conservação do sistema,
enquanto ciclo de ações ou de operações interdependentes (PIAGET, 1995).
São necessárias três condições para que a equilibração aconteça:
“1) Uma capacidade durável de acomodação dos esquemas aos objetos (...) que
conduz a uma diferenciação progressiva desses esquemas, diferenciação que enriquece, e,
simultaneamente, conserva, seu estado anterior, sem perdas, nem produção de esquemas
radicalmente novos. 2) Uma assimilação recíproca dos esquemas em subsistemas, e destes
entre si, que atinge coordenações tais, que se conservam, enriquecendo-se mutuamente. 3) Uma
integração de subsistemas em totalidades caracterizadas por suas leis de composição, com
conservação destes subsistemas, à medida que suas propriedades diferenciadas podem ser
reconstruídas, a partir do sistema total” (PIAGET, 1995, p. 283).
As estruturas, equilibradas, comportam uma compensação entre afirmações e
negações. A transposição de uma estrutura de um patamar inferior a um superior de reflexionamento
é fonte de múltiplos desequilíbrios, decorrendo daí necessidade de novas acomodações e
assimilações (PIAGET, 1995).
Percebemos a partir dessa experiência que a própria tecnologia provoca inúmeros
desequilíbrios nos alunos e professores, um exemplo foi com a utilização do Open Office Writter
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149
Projetos e práticas de formação de professores
(LINUX) e sua relação na construção da escrita. Para os alunos, ao escreverem nesse programa
para guardarem algumas informações que seriam futuramente colocadas em suas páginas, tinham
sua escrita questionada através da marcação das palavras escritas com erros ortográficos,
desafiando-os a corrigí-las. Aos professores, este novo recurso da informática juntamente com os
Projetos de Aprendizagem, abriu possibilidades para pensar um outro tipo de aula, mais dinâmica
e que venha ao encontro das necessidades e desejos dos alunos.
Os processos de desequilíbrio envolvem três principais características: “1) conflitos
entre o sujeito e os objetos (...); 2) conflitos entre subsistemas (...); 3) desequilíbrio entre a
diferenciação e a integração...” (PIAGET, 1995, p. 283).
As novidades, provindas da abstração reflexionante, possuem sua origem no
processo de desequilíbrio. As novidades consistem na realização de possibilidades abertas pelas
construções do nível precedente (PIAGET, 1995).
Ao finalizarmos esse trabalho, percebemos o quanto são importantes os estudos
de Piaget relativos ao processo de abstração para refletirmos teoricamente sobre a interação dos
alunos com tecnologias da informação e comunicação e quanto a metodologia de Projetos de
Aprendizagem possibilita uma melhor relação entre professores e alunos (propondo aprendizagem
entre ambos). Essa teoria nos possibilita sairmos de um paradigma de repetição (copia e cola),
para um de construção e criação de novidades. Consideramos essa experiência como formação
de professores em serviço, uma formação que incluiu uma nova relação professor-aluno, uma
metodologia diferente de trabalho (Projetos de Aprendizagem) e novos recursos a serem utilizados
(informática e internet).
BIBLIOGRAFIA
BECKER, Fernando. Educação e Construção do Conhecimento. Porto Alegre: Artmed, 2001.
FAGUNDES, Lea et all. Aprendizes do futuro: as inovações começaram. MEC, 1999.
JAPIASSÚ, Hilton & MARCONDES, Danilo. Dicionário Básico de Filosofia. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 2001.
MONTANGERO, Jacques & NAVILLE, Danielle. Piaget ou a Inteligência em Evolução. Porto
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PIAGET, Jean. Abstração Reflexionante: relações lógico-aritméticas e ordem das relações espaciais.
Porto Alegre: Artmed, 1995.
______. Recherches sur la Généralisation. Paris: Presses Universitaries de France, 1978. (Tradução
de Fernando Becker e revisão de Rosângela de Almeida: Porto Alegre, maio de 1991).
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150
Projetos e práticas de formação de professores
TEMAS TRANSVERSAIS X CONCEITOS
MATEMÁTICOS: RESULTADOS DE UM
EXPERIMENTO EM SALA DE AULA
BRIGHENTI, Maria José Lourenção; ROMANINI, Greici Elem B. Rodrigues (USC - Bauru)
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE A PESQUISA
A atual Lei de Diretrizes e Bases Nacionais – LDB 9394/96 (Brasil, 1996), traz
mudanças significativas quanto à educação básica. Integra a Educação Infantil, o Ensino
Fundamental e o Ensino Médio e apresenta um conjunto de definições políticas que orienta o
atual sistema educacional brasileiro, buscando relacionar a educação com as necessidades
profissionais e sociais do homem no mundo moderno.
A referida LDB trata a educação de forma abrangente tanto no que se refere às
concepções, quanto às alternativas organizacionais. O foco educacional está centrado em
competências a serem construídas durante a escolaridade básica, modificando o paradigma
curricular existente que se funda numa educação descontextualizada e compartimentada valorizando
o acúmulo de informações.
Esta LDB demonstra preocupações no sentido de que a educação não seja somente
um processo de ensino e nem uma justa posição de etapas fragmentadas, mas dirigida à formação
humana numa perspectiva de continuidade articulada entre os diferentes níveis de educação,
possibilitando um conjunto de aprendizagens e desenvolvimento de capacidades que todo cidadão
tem direito de ter ao longo da sua vida, com intervenção escolar (BRASIL, 2001).
Um dos seus principais objetivos é a vinculação da educação ao trabalho e à prática
social, pois ambos fazem parte da vida de qualquer indivíduo. Este novo cenário exige o
desenvolvimento de um novo perfil de conhecimento e de modelo profissional. Neste sentido, dos
noventa e dois artigos da LDB, seis deles destinam-se à formação profissional dos professores e
dentre eles, o artigo 61 trata da formação dos professores baseada nos fundamentos da “associação
entre a teoria e a prática”, pois só se aprende realmente quando os conceitos aprendidos na
escola estão relacionados com os da sua vida real.
Atendendo os pressupostos básicos desta LDB, o Ministério da Educação
juntamente com os importantes membros da área educacional do país, elaboram propostas
curriculares educacionais e novas diretrizes curriculares para a formação dos profissionais da
educação.
Os princípios orientadores das propostas educacionais para a escolarização básica
encontram-se nos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN’s – para o Ensino Fundamental
(1997) e para o Ensino Médio (1999). Tais propostas têm como meta oferecer aos nossos jovens
um ensino de qualidade, buscando desenvolvimento cognitivo, afetivo e social.
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151
Projetos e práticas de formação de professores
O termo “parâmetro” indica a possibilidade de se construir referências comuns na
educação, respeitando as diferenças regionais, culturais, políticas existentes no país. Este termo,
segundo Aurélio (1995, p. 482), representa “todo elemento cuja variação de valor modifica a
solução de um problema sem lhe modificar a natureza”.
O termo “curriculares” vem de currículo que, pedagogicamente, possui diferentes
significados, mas a concepção aqui adotada, será a de análise curricular como uma expressão de
princípios e metas do projeto educativo que necessita ser flexível, promovendo discussões e reelaborações dos procedimentos realizados em sala de aula.
Quanto à abrangência “nacional”, a intenção é a de criar condições na escola para
que se discutam formas de garantir, a toda criança ou jovem brasileiro, o acesso ao conjunto de
conhecimentos socialmente elaborados e necessários para o exercício da cidadania.
As áreas contempladas pelos PCN’s são: Português, Matemática, Ciências Naturais,
História, Geografia, Língua Estrangeira, Educação Física e Arte. Especificamente no que se refere
à Matemática, na primeira parte dos PCN’s (1997), além de trazer seus princípios norteadores; a
trajetória e a análise das características da Matemática e do papel que ela desempenha no currículo
escolar discutem a necessidade de refletir sobre o papel desta área de conhecimento na formação
do cidadão brasileiro e a sua relação com os temas transversais.
A inclusão dos chamados Temas Transversais, na escola poderá orientar seus
alunos para viver melhor em sociedade, discutindo e resgatando a dignidade da pessoa humana,
a igualdade de direitos, a participação ativa do indivíduo na sociedade e a sua co-responsabilidade
pela vida social.
Os temas transversais podem ser trabalhados de forma interdisciplinar, não como
assunto específico, mas permeando o tema que está sendo o desenvolvimento. Devem ser
incluídos no processo de aprendizagem com o objetivo de construir a cidadania a partir de conteúdos
e ações vinculadas com o cotidiano do aluno e aos interesses da maioria da população.
Para o Ensino Fundamental, os PCN’s (1997) almejam que o aprendiz saiba exercitar
a cidadania, preservando e transformando o meio ambiente; valorizar o patrimônio sócio-cultural
brasileiro; desenvolver capacidades cognitivas, físicas e afetivas; cuidar do próprio corpo valorizando
e adotando hábitos saudáveis para ter qualidade de vida, agindo com responsabilidade com sua
saúde e com a saúde da comunidade onde vive.
Essa almejada formação geral dos indivíduos, somente será alcançada se as
instituições formadoras de professores estiverem proporcionando aos licenciandos reflexões sobre
os anseios educacionais; proporcionarem comparações com as práticas que vêm sendo realizadas
em nossas salas de aula; inserirem os futuros professores em reais situações do cotidiano escolar
e proporcionarem conhecimento tecnológico e científico atual.
O quadro educacional atual, esboçado acima, tem trazido angústias aos professores
em exercício e, também, tem provocado alterações nas aulas de Prática de Ensino nos cursos de
formação de professores. Os professores sentem-se despreparados para desenvolver ações,
segundo as propostas apresentadas nos PCN’s, e até dificuldades de realizarem atividades
interdisciplinares utilizando os Temas Transversais. Surgem dúvidas como:
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152
Projetos e práticas de formação de professores
Qual a importância dos temas transversais para a formação do aluno do
Ensino Fundamental e do futuro professor?
-
Quais os verdadeiros objetivos dos PCN’s?
Como integrar conteúdos matemáticos com os temas transversais?
Como a Matemática poderá interferir para o desenvolvimento da cidadania?
Pensando nessas situações, desenvolveu-se a pesquisa aqui descrita que além de
incentivar o licenciando a pesquisar sobre a literatura pertinente às mudanças do paradigma
educacional vigente, planejando e vivenciando ações pedagógicas diferenciadas, teve como meta
desenvolver atividades que propiciasse ao aluno de 5ª série do Ensino Fundamental de uma
escola pública de Itápolis, o aprendizado de conceitos matemáticos, enquanto trabalhava com os
Temas Transversais.
2. Temas transversais e o uso da transversalidade
Os educadores não podem mais ver a escola como um ambiente isolado da
sociedade. É preciso adaptar à realidade, trabalhando com questões que interferem na vida dos
educandos e da própria sociedade onde a escola está inserida.
... a escola não é uma ilha de ensino e está inserida em determinada comunidade,
com seus conflitos, aflições e alegrias, o professor deve criar espaços para que as crianças e
adolescentes discutam e opinem sobre tais fatos. É essa, justamente, a proposta dos temas
transversais (Revista Nova Escola, p. 4).
Pensando nessa questão, foram integrados às propostas dos PCN’s os temas como:
ética, saúde, meio ambiente, pluralidade cultural, orientação sexual e trabalho e consumo, que
não constituem uma nova área de conhecimento, mas um conjunto de temas atuais que envolvem
problemáticas sociais e que podem permear a concepção de diferentes áreas, seus objetivos,
conteúdos e orientações didáticas.
Os Temas Transversais não são novos conteúdos para serem desenvolvidos em
sala de aula aumentando ainda mais os conceitos já existentes, sobrecarregando os programas e
dificultando a tarefa do corpo docente. Devem ser trabalhados perpassando, transversalmente,
outros conceitos mais específicos, girando em torno da temática das áreas curriculares, atingindo
as finalidades educacionais.
A inclusão dos Temas Transversais no processo educativo tem provocado diferentes
concepções por parte dos educadores. Monteiro e Pompeu (2003) vêem as disciplinas tradicionais
como o eixo vertebral do sistema educacional e os temas transversais devem ser articulados às
disciplinas.
Antagonicamente, para a pedagoga Montserrat Moreno (2000) o eixo vertebral do
processo educativo deve ser a temática social, enquanto que as disciplinas tradicionais devem
perpassar as questões mais abrangentes, transversalmente. Acredita que ao trabalhar com os
aspectos sociais, cria-se um ambiente pedagógico muito mais rico para capacitar os estudantes a
entender e a participar criticamente do mundo onde vive e da sociedade à qual pertence, afirma:
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Projetos e práticas de formação de professores
...”as matérias curriculares são instrumentos através dos quais pretende-se
desenvolver a capacidade de pensar e de compreender e manejar adequadamente o mundo que
nos rodeia [...] Sem um contexto para situá-los, para grande parte dos estudantes, os conteúdos
curriculares transformam-se em algo absolutamente carente de interesse ou totalmente
incompreensível.” (IN: BUSQUETS, 2000, p. 36).
Para Busquets (2000), introduzir no ensino preocupações direcionadas aos
problemas da sociedade atual não significa manejar matérias curriculares para antes ou depois de
alguns tópicos estipulados, mas possibilitar ao aluno o contato com os temas transversais enquanto
se aprende ou discute outros conteúdos mais específicos.
A sociedade contemporânea enquanto valoriza a ciência clássica, também necessita
formar pessoas autônomas e críticas, capazes de respeitar a opinião dos demais e de defender os
seus direitos.
Dessa forma, os Temas Transversais destinam-se a superar alguns conceitos
tradicionais da nossa educação, facilitando ao aluno os primeiros contatos com questões atuais
que aproximam os conteúdos curriculares da realidade do aluno.
Saber utilizar tais temas enquanto desenvolve conteúdos programáticos na escola,
não tem sido fácil para os educadores. Pensando nisso, as atividades aqui descritas tiveram por
objetivo sugerir ações que possibilitassem trabalhar com esses temas, enfatizando o Meio Ambiente,
com a finalidade de possibilitar aos alunos, não apenas no aprendizado de operações matemáticas,
mas de utilizá-las em situações cotidianas, estimulando e facilitando a sua criatividade e reflexão,
desenvolvendo a consciência individual e coletiva. Falar do Meio Ambiente resulta,
conseqüentemente, no resgate de outros valores, como: ética e a tomada da consciência social
lidando com o consumo desenfreado e com o desrespeito à natureza e ao próprio ser humano.
3. METODOLOGIA E MÉTODOS
Atentando os objetivos relacionados aos conceitos matemáticos para o Ensino
Fundamental, procuramos relacionar as ações realizadas nesta pesquisa com as questões
ambientais, promovendo discussões e despertando o senso crítico e criativo dos alunos.
Este estudo foi de caráter qualitativo, pois teve o pesquisador como seu principal
instrumento; seus dados foram descritivos; preocupou-se com o processo e não com o produto. A
análise dos dados realizou-se por um processo indutivo, fundamentado em dados obtidos nas
observações realizadas pelo pesquisador no seu trabalho de campo (LUDKE & ANDRÉ, 1986).
Segundo D’Ambrosio (1997), trabalhando com a pesquisa qualitativa, o professor
se atualiza, aprimora seus métodos de pesquisas, pois se preocupa com a coleta de dados em
diferentes situações utilizando-se de entrevistas, de observações ou de questionários e com a
descrição do processo e com a reconstrução de cenários culturais.
As ações em sala de aula iniciaram pela leitura e reflexão do texto “Consumo
doméstico no Brasil”, que tratava do consumo/ desperdício, seguidas da exibição do filme “Ilha
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154
Projetos e práticas de formação de professores
das Flores”, que expressa a realidade brasileira (a miséria gerada pela desigualdade social, pela
má distribuição de renda e pelo descaso dos governantes).
As discussões levaram aos alunos refletirem sobre as possíveis intervenções da
escola para modificar situações parecidas do nosso cotidiano.São elas: ações para a preservar a
natureza; reflexões sobre o consumo e o desperdício, controle de gastos.
Numa das etapas, os alunos realizaram uma pesquisa sobre a história da cidade
de Itápolis, com a intenção comparar as condições do local com as condições do filme Ilha das
Flores. Durante leituras de textos, as discussões e as ações realizadas, os alunos trabalhavam, ao
mesmo tempo, com algum dos Temas Transversais, também utilizavam com conceitos
matemáticos: números decimais, transformações de unidades, leituras e construções de tabelas
e gráficos de barras.
Após todo esse trabalho metodológico em sala de aula, a pesquisa foi finalizada
com uma visita ao Aterro Sanitário da cidade de Itápolis, atividade esta que permitiu que a
pesquisadora colher depoimentos significativos dos alunos sobre as impressões do local e sobre
as suas expectativas quanto à futura preservação do meio ambiente. Esta visita possibilitou ainda,
um rico material confeccionado pelos alunos em forma de cartazes, sobre problemas do lixo
doméstico e sobre os cuidados necessários para o meio ambiente.
1.1
ATIVIDADES DESENVOLVIDAS
1ª Trabalhar com o texto “Consumo doméstico no Brasil”, retirado do jornal Folha
de São Paulo, iniciando a discussão entre consumo/ desperdício e o conceito de números decimais
(leitura, escrita, comparações).
2ª Exibição do filme “Ilha das Flores”: discussões e reflexões sobre o tema.
3ª Dividir a classe em 5 grupos e programar um debate, para que cada grupo
relacione o filme com o tema proposto na primeira atividade. Incentivar os alunos a organizar uma
campanha contra o lixo, alertando e informando os outros alunos da escola.
4ª Promover uma campanha de coleta de lixo na escola. Para isso cada grupo se
encarregará de:Divulgação: divulgar e incentivar a campanha, utilizando-se de cartazes, panfletos,
etc.Organização: organizar os cestos para coletar o lixo na escola. Fiscalização: fiscalizar a adesão
e o empenho de todos os alunos em relação à campanha.
5ª Propor aos grupos fazer um levantamento dos alunos que freqüentam a cantina
da escola, organizando uma tabela e construindo um gráfico de colunas com os dados. Em
seguida, construir um segundo gráfico de colunas envolvendo o número de alunos e o valor gasto.
6ª Cada grupo pesquisará quantos alunos consomem a merenda diariamente;
qual é o dia em que o consumo é maior; a existência de desperdício de comida; que fim tem a
comida desperdiçada.
7ª Visita ao aterro sanitário da cidade registrando as ações vivenciadas (fazendo
redações, fotografando a experiência), para realizar uma exposição em murais.
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Projetos e práticas de formação de professores
8ª Para cada texto trabalhado em sala de aula envolvendo a questão do lixo no
meio ambiente, propor atividades matemáticas que desenvolvam o conceito de números decimais.
No final de cada atividade, a pesquisadora realizou um relatório detalhado contendo
as ações desenvolvidas, o registro das reações, as dificuldades, as facilidades dos alunos durante
todo o processo. O relato foi fiscalizado com uma análise qualitativa dos resultados dessa
intervenção.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
A investigação histórica do município de Itápolis, realizada pelos alunos, possibilitoulhes o contato com conceitos de diferentes áreas, além dos aspectos relacionados com o meio
ambiente que pretendiam investigar. Conheceram dados sobre a fundação da cidade; sua área
territorial; sua população; produção agrícola; suas indústrias e, ainda, as preocupações dos
governantes quanto à preservação do meio ambiente.
Os alunos constataram que, o lixo, é um problema crônico e já acarretou problemas
à população e ao meio ambiente como: a poluição do Rio São Lourenço e a pelo fato do aterro
sanitário estar próximo à cidade, o aumentando a presença de insetos e animais roedores, que a
administração municipal vem tomando algumas precauções como: dedetizar o local onde o lixo é
depositado e, posteriormente, enterrado; a pretensão de ampliar a usina de compostagem do lixo;
a existência de estudos e entendimentos com lideranças políticas dos municípios vizinhos e
também com a iniciativa privada, para se estabelecer um consórcio que viabilize o projeto.
Esta pesquisa realizada pelos alunos, acrescida das discussões sobre o filme “Ilha
das flores”, possibilitou conclusões importantes sobre as condições sociais e de aprendizagem,
pois apontaram dois conceitos que interferem na melhoria da vida em sociedade: a desigualdade
social e a poluição. Paralelamente, os conceitos matemáticos estiveram sempre presentes, com
alguns cálculos e comparações, ao estimar: populações futuras; o aumento do lixo na cidade.
Surpresos com os cálculos, os alunos chegaram a conclusão de que enquanto não
forem tomadas decisões políticas, cabe a cada um de nós, a preservação do meio ambiente.
Neste sentido, chegaram a discutir o quanto a população poderia poupar com o re-aproveitamento
de materiais como: papel, plásticos, metais e vidros.
A discussão sobre esses materiais levaram à conceitos como: fabricação,
industrialização, matéria prima, reciclagem, produção de embalagens, poluição, matérias-primas
ameaçadas de esgotamento, economia de energia elétrica, extração mineral, além de trabalharem
com conceitos matemáticos como: transformação de unidades (quilogramas em tonelada ou com
outras unidades), porcentagem escritas em fração ou em número decimal, etc.
Para reforçar ainda mais os conceitos relacionados ao meio ambiente, sempre
utilizando conceitos matemáticos, os alunos ainda realizaram:
·
Campanha do Lixo – intitulada “Mandamentos do consumidor ecológico”,
que serviu como modelo informativo para ser entregue aos outros estudantes e professores;
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156
Projetos e práticas de formação de professores
·
Estudo da freqüência dos seus alunos à cantina da escola e em relação ao
consumo de merenda, organizando os dados em tabelas e gráficos de colunas;
·
Visita ao aterro sanitário, com o acompanhamento de todo o processo
realizado com o lixo;
·
Confecção de cartazes sobre o meio ambiente, realizando uma exposição
no pátio da escola com a intenção de chamar a tenção dos seus colegas para o problema.
Após a visita realizada ao aterro sanitário, os alunos bastante preocupados com
quantidade de lixo e com a falta de conscientização e responsabilidade da sociedade, resolveram
trabalhar com a conscientização das pessoas sobre o problema e sobre a importância da
preservação da natureza. Sugeriram conversas familiares ou com amigos, pedindo a separação
do lixo doméstico.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No desenvolvimento desta pesquisa, a pesquisadora sempre teve o objetivo a
conhecer, na teoria e na prática, os novos anseios educacionais relacionados à Matemática e aos
Temas Transversais, e vivenciar ações metodológicas diferenciadas, com o intuito de colaborar
com a sua formação, enquanto pesquisadora, e com os alunos da escola pública, como cidadãos.
Com este objetivo, conseguiu-se realizar atividades envolvendo vários conceitos
matemáticos como: números decimais, porcentagens, transformações de unidades, bem como
construção de tabelas e gráficos de barras, contextualizados em diferentes questões referentes ao
meio ambiente.
As ações realizadas possibilitaram aos alunos expressar suas idéias de várias
maneiras: nos debates e reflexões; nas confecções de cartazes; nas realizações de exercícios;
fatos estes que colaboraram para aumentar a auto-estima.
Foi possível perceber que trabalhar com conceitos matemáticos relacionados aos
Temas Transversais contribui para que os conteúdos matemáticos deixem de ser limitados a uma
exploração simplesmente acadêmica, de forma isolada, sem qualquer conexão entre seus próprios
campos ou com outras áreas do conhecimento.
Acompanhar as novas propostas e mudanças educacionais requer que o professor
seja um pesquisador. Não é tarefa fácil, porém, necessária para que a escola possa preparar a
sua clientela para a cidadania.
Sem dúvida, esta pesquisa permitiu o amadurecimento da pesquisadora e dos
alunos da 5ª série. Da pesquisadora, por conseguir desenvolver ações que relacionassem conceitos
matemáticos, temas transversais e o cotidiano do aluno, atendendo um dos princípios dos PCN’s
para a área da Matemática: a atividade matemática escolar não é “olhar para coisas prontas e
definitivas”, mas a construção e a apropriação de um conhecimento pelo aluno, que o ajudará
compreender e transformar sua realidade.
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157
Projetos e práticas de formação de professores
Dos alunos, pois as ações realizadas permitiram a construção de conceitos,
desenvolver a auto-estima e a perseverança na busca de soluções, interagir de forma coletiva na
discussão de um assunto, respeitando o modo de pensar dos colegas e aprendendo com eles.
Como educadores não podemos parar no tempo. É preciso buscar conhecimentos
adequados aos procedimentos de sala de aula ao mundo real. Esta é uma tarefa árdua, porém,
necessária para que a educação não fique estagnada e nem ultrapassada. Neste sentido, Monteiro
e Pompeu (2003, p.15), destacando as palavras de D’Ambrósio reforçam essa idéia: “Os professores
atuais têm pela frente um grande desafio: educados num processo fragmentado, terão de superar
os limites que essa formação lhes impõe e extrapolar as fronteiras de conteúdos vistos de forma
parcial e a-histórica”.
6. REFERÊNCIAS
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Projetos e práticas de formação de professores
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Projetos e práticas de formação de professores
TRABALHANDO COM A FORMAÇÃO
CONTINUADA DE PROFESSORES:
PROJETO CONSUMO SUSTENTÁVEL
ORTIGOZA, Silvia Ap Guarnieri (Departamento de Geografia); MOTA, Renata; Cristina da
(Pós-Graduação); NATIVIO, Priscila Maria (Graduação); MIGUEL, Yaisa D. Carvalho
(Graduação); BRESIGHELLO, Maria Luísa M. (UNAMOS) - UNESP
INTRODUÇÃO
A Rede Nacional de Formação Continuada, um programa vinculado ao MEC/SEB,
tem por objetivo a constituição de centros de pesquisa e desenvolvimento, visando promover a
formação permanente de professores e a implantação de novas tecnologias de ensino, onde os
materiais didáticos estarão acessíveis para Estados e Municípios interessados, abarcando atividades
presenciais, semi-presenciais ou a distância.
Essa Rede é formada por Universidades de todo o país (14 Estados ao todo,
totalizando 20 centros), distribuídas em cinco áreas: Alfabetização e Linguagem; Educação
Matemática e Científica; Ensino de Ciências Humanas e Sociais; Arte e Educação Física e,
Gestão e Avaliação da Educação.
A UNESP vê-se inserida na área de educação matemática e científica, onde se
formou então, o CECEMCA – Centro de Educação Continuada em Educação Matemática, Científica
e Ambiental, que conta com a atuação de vários campus, entre docentes, alunos de graduação e
pós-graduação.
Em Rio Claro, existem 7 módulos que contemplam a temática científica e ambiental
- A Entomologia e a Óptica aplicada à Educação Ambiental; A terra em que vivemos; Áreas
Verdes; Cartografia Aplicada aos Estudos do Meio Ambiente; Fauna; O Conhecimento Indígena e
o Respeito à Natureza: Bases para a Educação Ambiental.
Além, há o Módulo Consumo Sustentável/ Consumo Responsável: desenvolvimento,
cidadania e meio ambiente, coordenado pela Profª Drª Silvia Aparecida Guarnieri Ortigoza, que
teve a tarefa de transformar o material já editado para o formato não presencial, ou seja, para a
educação à distância, numa forma de aplicação inicial – um projeto piloto, solicitado pelo MEC.
Dessa forma, todo o material anteriormente preparado foi devidamente transformado
para atuar aos moldes da rede mundial de computadores – a Internet. Assim, atuamos junto a
plataforma TelEduc, um ambiente de ensino-aprendizagem à distância, desenvolvido e monitorado
pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).
A transformação do material para o formato EaD, nesse projeto piloto proposto pelo
MEC, buscou consolidar essa nova forma de ensino-aprendizagem e quais suas vantagens e
desvantagens de efetivação
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Projetos e práticas de formação de professores
Nosso trabalho inicial consistiu em unir comunidade e universidade, isto é, para a
aplicação desse projeto piloto, contamos com a parceria de professores da rede municipal de
ensino, sendo estes atuantes nas séries iniciais do ensino fundamental, da escola “Armando
Grizzi”, localizada na periferia do município de Rio Claro – SP.
Aos professores cabia o papel de participar do curso como alunos, tendo sempre
aulas às quintas-feiras e aos sábados e algumas tarefas para serem solucionadas entre uma aula
e outra. Além disso, os professores também teriam que receber em sua aula alguma tutora do
curso para a observação de alguma atividade referente ao conteúdo do mesmo. E a nós, do
módulo, coube o papel de tutoria, isto é, além de termos transformado o material para o formato
EaD, também auxiliaríamos os professores em toda e qualquer dificuldade encontrada no transcorrer
do curso, desde o auxílio através de e-mail, telefone, contato presencial, até a solução de problemas
vinculados á própria Internet.
Com certeza, encontramos muitos percalços pelo caminho: desistências, professores
insatisfeitos, confusos ou até mesmo irritados com o curso. E talvez fossem essas as reações
esperadas pela equipe. Afinal, por ser um projeto piloto nada poderia sair tão perfeito assim.
Os objetivos do curso que propomos foi refletir sobre as dinâmicas próprias da
realidade sócio-ambiental brasileira procurando conhecer os impactos do consumo na atualidade
tendo como propósito principal levar o professor a repensar sua prática e construir junto com a
Universidade e com seus alunos novas estratégias de ensino-aprendizagem; criar condições para
que o professor reconheça seu papel social como agente de mudança na problemática do consumo;
e, estimular a produção de conhecimentos por parte do professor articulando ensino e pesquisa
em sua prática docente.
Durante o desenvolvimento deste curso esperava-se alcançar: a incorporação dos
temas transversais (Consumo e Meio Ambiente) na formação continuada de professores e
conseqüentemente nas salas de aulas; elaboração de novas formas e novas abordagens no ensino
de Ciências e Matemática; mudanças nas práticas educativas por meio da adoção da pesquisaação e da pesquisa colaborativa; criação de um canal permanente de integração entre a
Universidade e os Professores do Ensino Fundamental; e, conscientização por parte do professor
de seu papel como um agente fundamental nas mudanças de comportamento no que tange as
problemáticas sócio-ambientais na atualidade.
REFERENCIAIS TEÓRICOS
O desenvolvimento do capitalismo, no estágio atual, tende a estruturar e normatizar,
cada vez mais o consumo invadindo o cotidiano da população e, assim subjugando a vida em
todos os seus momentos. Nesta dinâmica, o cidadão é reduzido a consumidor, e o sujeito perde
a sua identidade. Nesse complexo e contraditório processo ocorre uma metamorfose dos valores,
e fica cada vez mais difícil entendermos o que é, ou não, necessidade.
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Projetos e práticas de formação de professores
No Brasil as relações de consumo são ainda mais complexas devido a uma enorme
desigualdade de renda, existindo, de um lado, uma elite com alto poder de consumo e, de outro,
um enorme contingente populacional na linha de pobreza, os conflitos aumentam quando contamos
com aqueles totalmente marginalizados do mundo do consumo e também com a grande massa
da classe média brasileira. Com todas estas diferenças de renda e, portanto de poder de compra,
nossas reflexões sobre o consumo devem contemplar uma análise mais global dos problemas
brasileiros. Neste sentido, é necessária uma reflexão do consumo que contemple não só a sua
complexidade social, mas também a sua complexidade ambiental, ou seja, um enfoque das relações
sócio-ambientais.
A educação é um processo que propicia o desenvolvimento pessoal podendo
contribuir para a construção de um mundo melhor ao oferecer condições para que seus sujeitos
se tornem conscientes de sua responsabilidade social e global, habilitando-os para que exerçam
o protagonismo de seus papéis sociais.
A educação ambiental pretende renovar a maneira de se encarar o papel exercido
pelo homem no mundo, entendendo como qualidade de vida a convivência harmoniosa entre o
ser humano e meio ambiente, a esperança é que essa relação de forma integrada e sustentável
pode dar condições para que os indivíduos criem mecanismos de avanços na qualidade de seus
conhecimentos. O grande desafio é despertar uma consciência crítica quanto à problemática
ambiental atingindo todos os cidadãos num processo pedagógico que seja participativo e
permanente. Esta forma abrangente de educação deve relacionar as alterações sociais, políticas
e econômicas e ambientais, buscando a compreensão da complexidade do meio ambiente, tanto
natural quanto artificial, suscitando sentimentos de responsabilidade, numa consciência sócioambiental.
Neste contexto, o consumo e suas formas produzidas na história do capitalismo
têm conseqüências para o meio ambiente e, portanto, é um tema transversal de grande importância
na atualidade para toda a sociedade.
O IMPACTO SÓCIO-AMBIENTAL DO CONSUMO
O impacto sócio-ambiental do consumo está intimamente ligado ao modo e ao
ritmo com que o consumismo veio contagiando cada vez mais as populações do mundo. Neste
sentido, há necessidade de se abordar juntamente com a histórica da concretização da sociedade
de consumo os danos ambientais decorrentes desta.
Acredita-se que um melhor entendimento do assunto “impacto sócio-ambiental do
consumo” pode despertar uma consciência geral a este respeito; e levar a identificação de possíveis
soluções para o tratamento dos problemas advindos do consumismo e, ainda gerar mudanças
comportamentais de todos os setores, em escala mundial.
Ao entrar em contato com estas idéias que este tema abarca, a população perceberá
que o meio ambiente não é uma fonte inesgotável de recursos e já apresenta sinais de esgotamento.
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Projetos e práticas de formação de professores
O maior impacto sócio-ambiental do consumo se deve ao atendimento sistemático das demandas
crescentes por novos-novos produtos o que faz com que ocorra um intenso uso do patrimônio
natural.
Muitas vezes a degradação do meio ambiente pode não ser percebida pelas pessoas,
pois ocorre em diferentes escalas. Há problemas globais, como as mudanças climáticas e o
crescimento populacional; há também problemas regionais, como a poluição do ar, a chuva ácida
e a destruição de ecossistemas; e há problemas locais, como o lixo municipal. É preciso que se
encontre um equilíbrio na distribuição dos frutos do progresso material, científico e tecnológico
entre os povos do mundo. Estudos revelam que alguns recursos sofrem mais este impacto do
consumo, entre eles destacamos a água, alimentos, florestas.
Um grande problema atual é o volume crescente de resíduos e sua destinação
final. Com a industrialização e a concentração da população nas grandes cidades, o lixo foi se
tornando um grande problema, tornando-se uma fonte de doenças e contaminação para o meio
ambiente. É preciso conter a geração de resíduos e dar-lhe um tratamento adequado, para isso é
preciso brecar o consumo desenfreado e investir em conscientização e em tecnologias que permitam
reaproveitar e reciclar os materiais em desuso. Muito lixo que poderia ser reaproveitado é depositado
em aterros ou lixões espalhados pelo país, como podemos ver na fotografia abaixo, devemos
buscar soluções para o destino final dos resíduos baseadas na política dos 3Rs – Reduzir, Reutilizar
e Reciclar.
São diversas as questões que se colocam para que se possa refletir sobre o tema
do consumo sustentável e assim promover ações no seu cotidiano.
TRAÇANDO NOVOS RUMOS EM DIREÇÃO AO CONSUMO SUSTENTÁVEL
Todos nós sabemos que a maior causa da degradação contínua da qualidade de
vida da população e do meio ambiente global é o padrão de insustentabilidade e consumo
apresentado em todo o mundo, principalmente nos países industrializados.
Faz-se necessário a conscientização dos indivíduos a respeito da importância de
tornarem-se consumidores responsáveis. Deve-se estabelecer um trabalho de formação de um
consumidor - cidadão, que implique a tomada de consciência do consumidor como importante
ator de transformação do modelo econômico em vigor, já que tem em suas mãos o poder de exigir
um padrão de desenvolvimento socialmente justo e ambientalmente equilibrado. Essa não é uma
tarefa simples, pois requer uma mudança de posturas e atitudes individuais e coletivas no cotidiano.
O desafio que se coloca é o abandono da sociedade do descarte e do consumo excessivos, além
da recusa do sonho americano (american dream) como sinônimo de bem-estar e de felicidade.
Por Consumo Responsável entende-se a capacidade de cada pessoa ou instituição,
pública ou privada, escolher e/ou produzir serviços e produtos que contribuam, de forma ética e
de fato, para a melhoria de vida de cada um, da sociedade e do ambiente.
O Consumo Responsável nos possibilitaria a chegada ao Consumo Sustentável e,
conseqüentemente, Desenvolvimento Sustentável, onde as necessidades e aspirações da geração
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Projetos e práticas de formação de professores
atual seriam satisfeitas sem o comprometimento da capacidade das gerações futuras satisfazerem
as suas. Por isso, podemos afirmar que o conceito de Consumo Sustentável está relacionado ao
fornecimento de serviços e de produtos, que preencham as necessidades básicas e dêem uma
melhor qualidade de vida, paralelamente pensando na minimização do uso de recursos naturais e
de substâncias tóxicas, assim como nas emissões de resíduos e de poluentes, com a idéia de
proteger as necessidades das gerações futuras.
Uma sociedade mundial sustentável só será possível se atendida uma distribuição
eqüitativa, entre as nações, das matérias-primas, de energia e dos bens e serviços; além de
mantido o respeito a Terra e a seus ecossistemas, manifestado na adoção de métodos de produção
que preservam a oportunidade das gerações futuras usufruírem dos mesmos padrões de vida das
atuais. Para que isso seja realmente possível temos que transformar nossos hábitos e fazê-los
sustentáveis, transformando o ato de consumir em algo mais que uma satisfação de necessidades,
visando incorporar um elemento reflexivo com relação às suas conseqüências.
Assim, torna-se clara a importância do nosso papel como cidadãos. Um dos
primeiros passos é a informação, devemos nos informar sobre as várias características dos produtos
que consumimos, sobre sua composição e efeitos à nossa saúde, segurança e ao ambiente.
Outro passo é desperdiçar menos, comprando menos descartáveis e embalagens bonitas, e,
conseqüentemente, evitando a geração de resíduos e o problema de seu descarte final. Exigir
durabilidade de um produto e comprar produtos reciclados de boa qualidade, estes são também
passos importantes.
Relacionados com estas questões aparecem dois termos, que também possuem
ligação direta com o desenvolvimento humano: a qualidade ambiental e a qualidade de vida. Nas
últimas décadas, estes termos vêm sendo fortemente discutidos, tanto no meio intelectual quanto
na mídia em geral.
Definir o que vem a ser qualidade não é fácil, pois depende de posições filosóficas,
políticas e ideológicas assumidas pelos indivíduos, sempre carregadas de interesses e
necessidades. Mas tanto a qualidade ambiental quanto à de vida podem ser determinadas por
indicadores básicos, como emprego, moradia, renda, educação, saúde, entre outros. Nesse
contexto, é importante o IDH – Índice de Desenvolvimento Humano, proposto pelo Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD (órgão vinculado à Organização das Nações
Unidas – ONU), para se avaliar a qualidade de vida dos países, segundo saúde, conhecimento e
acesso aos bens materiais – qualidade essa que terá íntima relação com a qualidade ambiental.
Além disso, hoje também existe o IDH – M (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal) que,
embora visando os mesmos fenômenos, os indicadores considerados nesse são mais adequados
para avaliar as condições de núcleos sociais menores.
Apesar desses indicadores, a qualidade ambiental e de vida também podem ser
avaliadas subjetivamente, ou seja, dependerá da percepção de cada indivíduo quanto ao meio
ambiente e ao que considera essencial para sua existência – para uns pode ser ter comida na
geladeira; para outros, ter o carro do ano. E nisso, temos uma relação com o papel exercido pelos
impactos ambientais, como poluição e o desmatamento; e o das desigualdades sociais, que no
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Projetos e práticas de formação de professores
Brasil, cabe lembrarmos da desigual distribuição de renda, onde muitos têm tão pouco e uma
minoria tem demais – são esses papéis que farão com que os indivíduos vejam e sintam o que
ocorre no meio em que estão inseridos e, mudar, então, torna-se um ato coletivo envolvendo a
administração pública e, concomitantemente, um ato individual – o de cada indivíduo determinar
o que é qualidade em sua vida.
O CURSO PILOTO CONSUMO SUSTENTÁVEL
O curso piloto teve como número inicial de beneficiários 14 professores da Escola
Municipal de Ensino Fundamental Armando Grizzi, aguardando conclusão de atividades de
avaliação por parte dos professores:
Para realização do curso foi feito uso da metodologia de Ensino a Distância (EaD)
da UNESP em convênio com o MEC, e da plataforma gerenciadora de conteúdo – o TelEduc.
O acesso ao curso pelo aluno pode se dar de acordo com sua disponibilidade não
só de tempo, mas também quanto ao uso de um computador ligado a rede mundial de
computadores – a Internet.
Quanto às mídias, essas foram: o site do CECEMCA para o conhecimento do
projeto < http://ns.rc.unesp.br/ib/cecemca >; e a Plataforma – TelEduc - onde está disponível a
sala de aula junto ao material didático de cada aula.
Além disso, contou com a comunicação de forma síncrona – no mesmo horário –
como a sala de bate-papo, ou de forma assíncrona – em horários diferenciados segundo a
disponibilidade do(s) aluno(s) – através de um mural de discussões, uma agenda e e-mail.
O acompanhamento do trabalho dos alunos foi feito através do agente Tutor, que
acompanhou as atividades dos mesmos ao longo do curso. O aluno foi avaliado durante todo o
curso - através da realização de tarefas que terão total relação com os conteúdos trabalhados e
pela participação no mural de discussões, expondo suas dúvidas e sugestões, além das salas de
bate-papo.
O conteúdo programático do curso desenvolveu-se em torno dos temas transversais
e da relação entre Educação Ambiental e Educação Matemática. Foram os seguintes itens
relacionados à temática ambiental: A sociedade de consumo; O prejuízo ambiental do consumo;
Consumo responsável – Consumo Sustentável; Qualidade ambiental e de vida: a ilusão da
necessidade; IDH, questões ambientais e sociais; Geração, Deposição e Impacto dos Resíduos
nas Cidades; A política dos 3Rs em questão: Reduzir, Reutilizar e Reciclar; e, Resíduos e Saúde.
Já em relação ao conteúdo matemático, os itens abordados foram: Medidas e Comparações;
Parte, todo e comparações; Classificações, Relações e Conclusões; e aulas de criação de novas
atividades matemáticas.
Por tratar-se de um curso em formato EaD buscou-se ter o menor contato presencial
com os professores, mas foram realizadas reuniões, visando esclarecer a dinâmica do curso.
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Projetos e práticas de formação de professores
O curso teve um total de 10 aulas, que eram liberadas via internet através da
plataforma TelEduc, às quintas-feiras e aos sábados. Dessa forma, o aluno contava com o material
de apoio, que englobava o conteúdo proposto; leituras complementares, que visavam subsidiar o
conteúdo e suas práticas pedagógicas; e atividades relacionadas às temáticas ambiental e
matemática.
Em relação às tarefas, os professores participantes tinham o prazo de 5 dias para
enviar as mesmas. Os professores enviam-nas para seu devido tutor pela ferramenta “Correio” da
plataforma TelEduc. Depois de corrigidas pelo tutor, estas tarefas eram reenviadas aos professores,
que tinham a liberdade de reformulá-las quando julgasse necessário.
Os professores eram avaliados por sua freqüência ao curso, assim como pela
realização das tarefas e interação com os demais participantes do curso e tutores.
Foi feito o acompanhamento das atividades aplicadas em sala de aula por uma
professora que leciona na 2ª série da Escola “Armando Grizzi”. Tal atividade estava relacionada
com o conteúdo “reciclagem”, que foi tratado durante o curso EaD. Esse acompanhamento visava,
além da observação da aula, oferecer à professora uma descrição de sua aula, que subsidiaria a
sua narrativa como atividade final do curso.
Essa descrição e narrativa é parte da metodologia de pesquisa colaborativa, que
tem por objetivo fazer com que o professor repense suas atividades em sala e suas práticas
pedagógicas.
RESULTADOS OBTIDOS
Algumas dificuldades foram encontradas no transcorrer do curso, principalmente
com relação aos professores que trabalhavam por três períodos (exerciam função tanto na rede
municipal, quanto estadual e particular), visto que possuíam pouco tempo para acessar o curso,
resultando assim na desistência dos mesmos.
Como ponto positivo do curso, destacamos a participação da professora Rosemeire
Colin, que se mostrou bastante participativa durante a ocorrência do mesmo, realizando todas as
atividades propostas e mantendo contato constante com a tutora.
Todo o empenho demonstrado durante o curso e todo o conteúdo assimilado pela
professora foi muito bem trabalhado durante a atividade sobre reciclagem que desenvolveu com
seus alunos. Isto demonstra que a professora soube integrar a temática ambiental e matemática
em suas práticas pedagógicas.
Além disso, a própria professora argumentou que, através da realização deste curso,
incorporou em duas práticas pedagógicas cotidianas o “hábito” de planejar suas aulas. E isto tem
íntima relação com as atividades que eram solicitadas no curso: a elaboração de planos de aula.
Dessa forma, a professora Rosemeire, devido seu desempenho, poderia ser uma
das futuras tutoras quanto ao curso para o município de Rio Claro, pois conscientizou-se de seu
papel como agente nas mudanças de comportamento em relação à temática sócio-ambiental.
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166
Projetos e práticas de formação de professores
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Projetos e práticas de formação de professores
UMA ENTRE AS AÇÕES: O SUPERVISOR FORMADOR
PERINA, Sandra Helena (Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP)
“Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Fala-se hoje, com insistência,
no professor pesquisador. No meu entender o que há de pesquisador no professor não é uma
qualidade ou uma forma de ser ou de atuar que se acrescente à de ensinar. Faz parte da natureza
da prática docente a indagação, a busca, a pesquisa. O de que se precisa é que, em sua formação
permanente, o professor se perceba e se assuma, porque professor, como pesquisador”.
Paulo Freire
A SUPERVISÃO NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO: UM POUCO DA HISTÓRIA
Estar supervisora é a condição em que me encontro, apesar de não ter almejado
essa posição. Na rede municipal não existe o cargo de supervisora de ensino, porém a função que
desempenho dentro da Secretaria Municipal de Educação (SME), mais especificamente no
Departamento de Ensino Fundamental, assume essa nomenclatura para fins administrativos e
burocráticos.
Como não há plano de carreira do magistério, somos todos professores, apenas
diferenciados pelo concurso público que possibilitou o acesso. Dependendo do edital de concurso,
o professor pode ser regido pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) ou pelo regime
Estatutário, com diferentes jornadas de trabalho, podendo ser de vinte, vinte e cinco, trinta ou
quarenta horas semanais.
Para preencher as vagas criadas para as funções de diretor de escola ou professorcoordenador ocorre concurso interno, com a apresentação de um projeto contendo a proposta de
trabalho, que é defendida pelos candidatos em uma banca composta por membros internos (da
SME) e externos (com representantes de classes convidados e nomeados pelo prefeito). Quanto
ao preenchimento das vagas de supervisão, historicamente na rede este tem acontecido por
indicação de alguém que já ocupa ou ocupou a função ou pela indicação da própria chefia do
departamento.
No mês de agosto de 1997, eu e mais duas amigas, professoras, fomos convidadas
pela administração municipal a compor uma equipe com a finalidade de implantar o Ensino
Fundamental na Rede Municipal. Era a municipalização. Três professoras da rede, que então se
reduzia ao ensino infantil, e que também atuavam em escolas particulares no ensino fundamental.
O convite foi justificado pelo fato de que tínhamos um fazer pedagógico diferenciado, assim como
deveria ser a proposta para o nascimento do ensino de 1a a 4a série no município. Foi assim que
se deu a minha inserção no Departamento de Ensino Fundamental, sem pretensão de ocupar um
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Projetos e práticas de formação de professores
lugar de destaque ou posição. O desafio que tínhamos era de trilhar o caminho das pedras, algo
novo, tanto para nós quanto para própria SME.
Nesta ocasião, para tudo era necessário produzir uma legislação, um decreto, um
ato de criação. Foi fazendo, refazendo tais decretos, atos, regimentos que o departamento começa
a se estruturar e, diferentemente do ensino infantil, a ter tudo legalizado, uma vez que o ensino
fundamental tem uma exigência burocrática maior, devida à própria organização institucional de
quem assume a “zeladoria” da vida escolar de cada um dos seus alunos, em sua dimensão legal,
tal como emissão de conceitos e pareceres para aprovação ou não. Enfim, era necessária uma
estrutura legislativo-burocrática.
Mesmo neste contexto, o que mais nos movia - e me movia, no entanto, era poder
transformar o sonho, que um dia esteve tão distante, em realidade: criar o ensino público de
“qualidade”. Para isso era necessário investir na formação dos profissionais da educação, nos
professores e essa era a nossa bandeira – a formação continuada.
Cada uma de nós trazia as experiências das escolas públicas e privadas. Da rede
particular trazíamos uma carga enorme de horas em formação (congressos, seminários, workshop,
palestras e até mesmo o modelo das reuniões pedagógicas, as quais são assumidas como Hora
de Trabalho Coletivo –HTPC).
No início, como eram poucas escolas e, portanto, poucos professores, acabamos
assumindo a coordenação dos HTPCs. Cada uma dava conta de uma determinada área do
conhecimento, eu com a Matemática e as Ciências, as outras com Língua Portuguesa, História e
Geografia.
Porém a rede cresce, cresce muito em dois anos e, apesar de ainda insistirmos em
continuar atuando como formadoras, propondo cursos para os professores fora do horário de
serviço, já não era mais possível continuar daquela forma e se fazia necessário um número maior
de funcionários no próprio departamento.
Houve a necessidade da criação de um concurso próprio para o ensino fundamental
e a partir desse concurso que dá acesso aos professores, por concurso interno, são escolhidos os
diretores e professores-coordenadores. Com a indicação de alguns nomes, foram escolhidos
também supervisores. Até então nós três éramos e não éramos supervisoras. Embora tivéssemos
até “um carimbo” para os documentos, como supervisoras, a nossa preocupação estava voltada
para “o fazer pedagógico”, longe de modelos já estabelecidos para a supervisão escolar.
Com a ampliação da rede e a entrada de novos profissionais no quadro de
supervisores, surge o primeiro embate entre ser supervisor formador e ser supervisor fiscalizador.
A supervisão escolar, nomenclatura dada para designar a Função Gratificada (FG) de Supervisor
nasce talvez sem que haja uma reflexão. Aos supervisores de escola, nos serviços administrativos,
de funcionamento geral, como também nos pedagógicos vão sendo dadas atribuições que não os
diferenciam dos gestores das escolas (diretores) e sua função se distancia do ensino, assim como
a sua própria identidade fica abalada.
O modelo de supervisão fiscalizador foi ganhando espaço na SME e, apesar da luta
pela formação continuada dos professores e da garantia de um número maior de horas para
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Projetos e práticas de formação de professores
estudos e planejamento, já não tínhamos a maioria preocupada com o processo de ensinoaprendizagem.
Para tratar da formação em serviço são contratados profissionais, de fora da rede,
com referência na prática educativa. Foram muitas as tentativas em busca de se obter melhores
propostas quanto ao investimento na formação continuada. Nesta situação, a minha indagação se
dava no sentido de que ninguém melhor do que aqueles que já atuam e conhecem a rede para
trabalhar junto aos seus profissionais. Para tanto se fazia necessário tratar também da formação
dos supervisores e dos demais especialistas que se dedicam ao processo ensino-aprendizagem.
O NÚCLEO DE ESTUDO E PESQUISA NA ÁREA DE MATEMÁTICA
Desde o final de 2002, no entanto, na Secretaria Municipal de Educação de
Piracicaba (S.M.E.), mais especificamente no Departamento de Ensino Fundamental, as funções
do supervisor passam a ser objeto de estudos, com a finalidade de revê-las. Nesses estudos,
chega-se ao perfil do supervisor como formador, e este é gradativamente levado a assumir a
condição de formador e, desta forma a dedicar-se mais aos estudos e à sua própria formação para
que possa assumir a coordenação de um “Núcleo”1
Atuando como supervisora apresentei ao Departamento de Ensino Fundamental,
no final de 2003, uma proposta para coordenar um “Núcleo na área de Matemática”, na qualidade
de professora polivalente e com experiência na área de matemática nas séries iniciais do ensino
fundamental.
Justifiquei a proposição deste grupo, considerando que, na condição de supervisora
escolar, no Ensino Fundamental municipal, desde a sua implantação, no ano de 1998, tenho me
deparado com a seguinte situação:
Uma grande preocupação com a alfabetização em Língua Portuguesa e pouca
preocupação com a alfabetização em Matemática, com a numeralização como é também chamada
nas séries iniciais, assim como o raciocínio lógico, resolução de problemas, etc.
Dizer que as crianças não estão alfabetizadas, para a maioria dos professores, é o
mesmo que dizer que não sabem ler e escrever e está implícita aí uma área específica do
conhecimento – Língua Portuguesa. Ler e escrever também é importante nas demais áreas do
conhecimento; em matemática também se lê e se escreve, para organizar o pensamento,
representar, interpretar, buscar soluções, etc.
O ensino de matemática, a alfabetização matemática ou numeralização nos ciclos
iniciais (1a e 2a etapas do I Ciclo) ou séries iniciais é tão importante quanto a alfabetização em
Língua Portuguesa. Ambas vão trabalhar com a linguagem com o objetivo de levar o aluno a
conseguir fazer leitura, interpretação e explicação do mundo. Na linguagem matemática, esse
caminhar para conseguir conquistar tais objetivos terá que atingir uma dupla abstração do signo,
uma em sua essência enquanto palavra e a outra enquanto signos matemáticos.
Tanto na condição de professora de ensino infantil e fundamental, quanto atuando
como coordenadora de um Núcleo de Estudos e Pesquisas, na formação continuada, na área de
matemática, tenho sido confrontada com um enorme número de professores que dizem não
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Projetos e práticas de formação de professores
gostar dessa área do conhecimento e que, portanto, dispensam um número menor de horas e
dedicação para o ensino, apesar de haver um quadro curricular que normatiza o número de horas
de estudo por área do conhecimento.
Relacionado a isto, tenho observado um número crescente de alunos que também
não gostam da “matemática”, ou melhor, do ensino que vem sendo oferecido, e que, quando
muito, conseguem mecanicamente operar, através do algoritmo, as quatro operações.
É importante também considerar, para melhor compreensão de meu interesse de
pesquisa, que outros momentos de formação, anteriores aos Núcleos e com outra formatação, já
se fizeram presentes na rede municipal, também na área de matemática, com objetivo de melhorar
a qualidade de ensino. Compreendo que pensar na qualidade de ensino, é pensar no
desenvolvimento profissional/pessoal e coletivo que se dá nos grupos de estudos e formação em
que o professor está inserido. É no coletivo, é no social que nos constituímos enquanto profissionais
e também enquanto grupo. Posso dizer então que nesta Rede há uma história de formação de
professores, bem como de discussões (acerca do) e de alterações no papel do supervisor em
relação a esta formação.
O OBJETIVO DA PESQUISA
Estamos assumindo o grupo de professores do “núcleo” como um lugar de discussão
do ensino de matemática. No entanto, quem propõe essa coordenação não é um especialista na
área, mas uma educadora. Assumindo, ainda, que não há nem primeira nem última palavra, e
que também não existe a primeira e nem última verdade, mas verdades que se constituem na
linguagem e por meio dela, no seio de práticas sociais determinadas continuamente ao longo da
história, o objetivo da minha pesquisa é de entender o papel do supervisor formador, as
possibilidades e os limites de sua atuação na formação em serviço, a partir de uma experiência de
formação em ensino de matemática.
Considerando a situação em que se encontra o ensino de matemática nos ciclos
iniciais / séries iniciais, esta pesquisa pretende conhecer, explicar e verificar as possibilidades e
os limites do supervisor atuando em um processo de formação. Da elaboração do plano de ensino
à elaboração do plano de aula até a produção da própria aula, há momentos no planejamento
onde as escolhas que o professor faz são da maior importância e fazem a diferença no ato de
ensinar e aprender.
Qual a contribuição do supervisor na formação de professores? Como se articula
esse lugar ocupado pela supervisora com a formação de professores e com a sua própria formação?
Analisar as possibilidades de um processo de formação continuada de professores,
os saberes produzidos por esses professores, assim como as suas influências na qualidade de
ensino são os objetivos desta pesquisa. Pretende-se, assim, relatar uma experiência de formação
em serviço e analisar essa experiência, contextualizando-a também em relação ao histórico dos
diferentes momentos de formação vividos na rede municipal. Ao considerar esses movimentos,
também estaremos buscando entendimento de como acontecem as buscas pelos espaços de
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Projetos e práticas de formação de professores
formação, e dessa forma contemplando a atuação do supervisor nas questões que vão se produzindo
bem como nas possíveis lacunas deixadas nesse cenário de formação.
A ABORDAGEM TEÓRICO-METODOLÓGICA
Atualmente, pensar em formação continuada é pensar, principalmente, nos saberes
da experiência que se desenvolvem em um contexto de múltiplas interações. Diante dessa visão,
temos que analisar o que se vive, o que se pratica e para isso se faz necessário compreender que
a gênese de nossa constituição profissional está nas relações sociais e eu, indivíduo, me faço nas
relações sociais e nas práticas sociais.
Ao analisar as práticas desse grupo de formação e o contexto em que eu, supervisora,
também vou me constituindo enquanto formadora, estarei elucidando o papel do supervisor, as
suas possibilidades e os seus limites em serviço. Esses estudos nos remetem a uma abordagem
histórica cultural e, portanto, nos apontam o movimento da história e os processos de
transformações ocorridos.
Ao olhar para a experiência em foco, as questões da matemática, como área
específica do conhecimento, estarão presentes, como do mesmo modo que a análise dos encontros
envolverá a literatura sobre os modelos de formação em serviço. Já ao tratar das questões da
prática e do perfil do supervisor teremos que recorrer à literatura específica, pensando-a e discutindoa em uma perspectiva histórico-cultural.
A constituição do material de análise se dá a partir de observações e registros
quinzenais em áudio-gravação, seguida de transcrição literal dos encontros, bem como de
anotações contendo detalhes que a áudio-gravação não possa revelar e relatos escritos pelas
professoras. Um total de oito encontros, durante o segundo semestre de 2004, com
aproximadamente vinte e quatro horas de áudio-gravação, constitui o material básico para o
processo de investigação sobre o movimento discursivo e as instâncias de enunciação nas
condições reais de trabalho e formação, com vistas a compreender o papel do supervisor, suas
possibilidades e limites nos processos de formação de professores em serviço.
FASE ATUAL DA PESQUISA
A pesquisa encontra-se na fase final das transcrições das áudio-gravações e das
primeiras aproximações ao material empírico, num processo de pré-análise com vistas à construção
dos dados. Nesta aproximação inicial do material empírico, temos encontrado durante todo o
percurso do grupo, no tempo mencionado, discussões sobre o ensino da matemática, sobre
questões metodológicas e de aprendizagem dos alunos e sobre o currículo, bem como discussões
acerca das condições de trabalho dos professores. Tal aproximação também nos dá indícios de
que seja necessária a realização de uma entrevista com os professores que fizeram parte desse
grupo de estudo sobre o que pensam a respeito do “supervisor”, do “supervisor formador”.
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Projetos e práticas de formação de professores
Esperamos, com esta pesquisa, poder contribuir com e para a prática do supervisor
que está inserido no processo ensino-aprendizagem, com atuação direta junto aos professores
das unidades em que atuam.
BIBLIOGRAFIA
CONTRERAS, J.La investigación en la acción. Cuadernos de Pedagogia, 224,7-19, 1994.
BAKHTIN, M. Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo, Hucitec, 1999.
FERREIRA, N. S. (org) Supervisão Educacional Para Uma Escola de Qualidade. São Paulo,
Cortez Editora, 2002.
FONTANA,R. Como nos tornamos professoras ? Belo Horizonte: Autêntica, 2003.
FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 4a ed., São Paulo:
Paz e Terá, 1997.
MOYSÉS, Lúcia. Aplicações de Vygotsky à educação matemática. Campinas, Papirus, 2003.
PIMENTA, S.G. E GHEDIN, E. (orgs) Professor Reflexivo no Brasil: gênese e crítica de um
conceito. São Paulo, Cortez, 2002.
SILVA, C.A. (orgs) Nove olhares sobre a supervisão. Campinas, Papirus, 1997.
VYGOTSKY, L.S. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1987.
ZEICHNER, M K. M. A Formação Reflexiva de Professores: idéias e práticas. Lisboa, Educa,
1993.
Nota
1 “Núcleo” é o nome dado aos grupos de estudos e pesquisas em que o supervisor da rede municipal está vinculado na condição de
coordenador/formador.
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Projetos e práticas de formação de professores
UMA PRÁTICA DE FORMAÇÃO
CONTINUADA MEDIADA PELA ESCRITA
GARCIA, Roseli Gonçalves Ribeiro Martins; BRITTO, Luiz Percival Leme (Uniso)
A preocupação com a intervenção pedagógica junto à equipe de educadores sempre
esteve presente em minha prática, tentando de alguma forma melhorar a atuação frente à
comunidade escolar, às famílias e, especialmente, no relacionamento com as crianças.
Após refletir sobre a necessidade de investir na formação do educador infantil e
como poderia enriquecer a formação continuada em serviço, numa história que se constrói dia-adia, na ação e na reflexão sobre a ação, bem como acreditando na hipótese que a postura
pedagógica do especialista tem efeito sobre o perfil profissional do Educador e sobre a consciência
da comunidade escolar a respeito das relações sociais das quais os processos pedagógicos fazem
parte, tratei de, numa perspectiva em que o especialista esteja mais próximo da prática escolar,
intervir diretamente na formação continuada em serviço, de modo que ela consista na construção
de um pensamento reflexivo e produtivo de um discurso comprometido.
A linguagem escrita da Educadora Infantil que expressa seus anseios junto ao
aluno e comunidade escolar, pergunta e busca respostas, intermedeia o processo de sua formação
continuada? Esta primeira questão produz outras, tanto pelo tema como pela ação educativa:
Como a construção da autoria dessa Educadora Infantil pode influenciar na construção da autoria
da produção escrita de seus alunos, nessa interação que se dá na Escola de Educação Infantil
com profissionais letrados? Como é proporcionada e valorizada esta posição crítica e criativa da
produção escrita da Educadora Infantil? Que fins terão a leitura posterior desses escritos? Apenas
relatos de um segmento de tempo numa instituição, material de estudos e reflexões para outros
educadores em sua formação, registro histórico de uma escola, memórias, releitura de material,
para reavaliação e planejamento, publicações, divulgação da Educação Infantil? Como se
estabelece uma relação, pessoal ou profissional, entre Educadoras Infantis e Direção ou
Coordenação, mediada pela oralidade e pela escrita? Qual a importância da formação inicial na
produção escrita da Educadora Infantil?
A prática que apresento se dá na direção de uma creche municipal – CEI-59
“Eugênio Leite”, Centro de Educação Infantil que atende em período integral crianças de zero a 6
anos, filhos de trabalhadoras num bairro periférico –Brigadeiro Tobias, da cidade de Sorocaba/SP.
A instituição conta com uma equipe de educadoras infantis formada por Professoras de Educação
infantil, Regentes Maternais, Agente Infantil, Auxiliares de Educação, Serventes e Merendeiras.
Focalizar como objeto de estudo esta produção diária ou semanal chamada
Relatórios ou Registros diz respeito sobre a própria atuação como Educadora Infantil nas atividades
propostas e suas realizações, suas reflexões e intermediações com a realidade, sobre alguma
situação ou aluno em especial, como vê o mundo e a si mesma ao estudar, refletir, agir, refletir
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Projetos e práticas de formação de professores
sobre a ação, transformar-se e transformar o mundo, ou seja, as idas e vindas dos profissionais da
Educação Infantil entre o cuidar e o educar na importante construção da sociedade e dos indivíduos.
Propor à escola que delineie um Projeto Político Pedagógico, que a equipe toda se
mobilize como caracterizam vários autores, enfatizando a pesquisa-ação, entre eles Elliott (in
Geraldi, Florentini e Pereira, 1998) num
processo que se modifica continuamente em espirais de reflexão e ação, onde
cada espiral inclui:
- aclarar e diagnosticar uma situação prática ou um problema prático que se
quer melhorar ou resolver;
- formular estratégias de ação;
-
desenvolver essas estratégias e avaliar sua eficiência;
ampliar a compreensão da nova situação (situação resultante);
- proceder os mesmos passos para a nova situação prática.”
As atividades não se repetem, porque as situações são distintas e os indivíduos
também ao longo do processo e do tempo vivido social e histórico. Diante desta constante mutação,
a reflexão é imprescindível. A reflexão intrínseca do ser humano, a reflexão que leve a ação de
modificar situações e não de ser conduzidos pelas situações. Trata-se de, a partir de leituras e de
estudos, buscar a identidade do educador e demonstrar na prática, construir novos conhecimentos;
de ver, interpretar, sensibilizar-se pela realidade e intervir nela como sujeito inserido na relação
social onde desempenha seu papel de educador.
A proposta é de atuação da Diretora para formar o educador autônomo, atuante,
reflexivo, crítico, que veja seu aluno e a si mesmo possíveis de transformação e emancipação,
como produtos da sociedade, membros da comunidade, pessoas que têm uma história dentro da
instituição escolar e da vida. Não estamos isentos nessa interação social que acontece na escola,
podemos modificar e sair modificados desse processo.
Com o objetivo de que o diálogo evolua, com foco na formação continuada em
serviço e na intervenção e transformação da atuação, através da constante reflexão sobre a ação
e o mundo que os cerca, a produção escrita é um dos instrumentos de que dispõe o especialista
para contribuir com o Educador Infantil em sua formação continuada, de modo que pergunte e
busque respostas e produza textos reflexivos, bem elaborados, que expressem seus anseios na
atuação junto ao aluno e comunidade escolar.
Num primeiro momento, com o objetivo de localizar o CEI-59 no contexto sócioeconômico brasileiro foi proposta a leitura de dois textos, levando em consideração as questões,
enquanto educadoras do CEI-59: Quem somos? O que fazemos aqui, agora, em 2005? O que
pretendemos? Quais são nossas intenções?
Cada um dos dois textos tem enfoques bem diferentes, mas o que interessou em
sua seleção para esta leitura foi trazerem estatísticas sócio-econômicas mundial e brasileira que
levam a olhar para as dimensões numéricas de nossos problemas sociais e apontam soluções,
sejam governamentais “caberá à nação decidir o futuro de seus novos filhos (...) 2,7 milhões de
brasileiros que virão à luz em 2005.” (Skaf), sejam de participação cidadã “transformação do
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Projetos e práticas de formação de professores
indivíduo em sujeito, e não objeto, da política” (Dutra).
As leituras se deram em dois grupos heterogêneos. Foi percebida a desenvoltura
dos que tem mais familiaridade com este tipo de texto e a preocupação de tornar a leitura
compreensível a todos. Na discussão, a impressão sobre as estatísticas levou a olhar para a
dimensão dos problemas, principalmente brasileiros, e indignar-se, refletir sobre o papel dessa
equipe de educadores no contexto em que atua. Um sentimento de conexão com uma sociedade
viva, da qual faz parte.
Nesse dia, foi construído coletivamente o texto renovado da Missão da Escola:
Somos um Centro de Educação Infantil que através do cuidar, educar e brincar
atende crianças de famílias trabalhadoras em período integral. Visamos a inclusão, a transformação
social e o pleno desenvolvimento do educando, das famílias e dos educadores, proporcionando
acesso aos bens culturais.
Foi proposto e aceito pelo grupo o projeto “8 jeitos de mudar o mundo” (ONU) –
sem patrocínio. Cada tema, escolhido conforme afinidade por duplas de educadores, será tratado
dentro da possibilidade de abrangência do tema com as crianças, com os pais e a comunidade:
1.
2.
Acabar com a fome e a miséria
Educação básica de qualidade para todos
3.
4.
Igualdade entre sexos e valorização da mulher
Reduzir a mortalidade infantil
5.
6.
Melhorar a saúde das gestantes
Combater a AIDS, a malária e outras doenças
7.
8.
Qualidade de vida e respeito ao meio ambiente
Todo mundo trabalhando pelo desenvolvimento
Num segundo momento, com a justificativa de um processo diagnóstico, tendo
como objetivo ampliar o olhar, partindo da visão que os participantes já tem sobre o contexto foi
proposto um percurso pelo bairro e adjacências. Cada grupo pesquisa no arquivo da escola os
endereços de seus alunos; leva papel e caneta para desenhar o percurso e se possível localiza o
endereço dos alunos; fotografa os pontos estratégicos. Ao retornar, cada educador do CEI-59
produzirá um texto com o título proposto: “Olhar, sentir, pensar. Agir?” Em seguida a socialização
dos textos.
Foi solicitada uma van, porém veio um ônibus enorme. O percurso previsto teve
que ser modificado, pois o ônibus parecia um transatlântico dentro do bairro. Houve paradas e
descidas em pontos estratégicos. Houve mobilização diferenciada entre os educadores que moram
no bairro e os que não moram. Uma rememoração dos que moram no bairro, mas não circulam
constantemente por todos os pontos, também se preocuparam em contar o contexto histórico e
geográfico dos locais visitados e ouvir as impressões dos colegas educadores não moradores.
Todos sentiram na pele, cabelos, músculos, no olhos, nos ouvidos, no nariz e até na boca, os
lugares onde vivem os alunos.
Na parada em uma das vilas, foi muito interessante o encontro de uma professora
com sua aluninha acompanhada de sua mãe, pai e vizinhança, que estavam surpresos com a
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Projetos e práticas de formação de professores
presença do grupo de educadores, e pediram para registrar com foto. Um ônibus de viagem no
bairro “Só pra enterro” (funeral) disse uma vizinha. “É bom saberem onde a gente mora, se
precisar de alguma coisa” disseram os pais.
Olhar o bairro de vários ângulos trás novas perspectivas ao sentir ao mesmo tempo
as proximidades e as distâncias, as subidas, as descidas, as estreitezas das vielas, a largueza da
estrada, o urbano, o rural, o progresso, a pobreza, as riquezas, as misérias. Se a cidade é escrita,
hoje ela foi lida de outras maneiras por educadores do CEI-59.
Pela Rodovia Raposo Tavares, visitando o Jardim Novo Eldorado, se enxerga ao
fundo a cúpula da Biblioteca da UNISO. Não estava no percurso previsto, pois seriam visitados
endereços dos alunos, mas por insistência dos educadores, foi acrescentada no percurso uma
volta dentro da cidade universitária.
Desceram do ônibus e pediram para conhecer pelo menos a biblioteca. Pareciam
crianças em excursão diante da suntuosidade do prédio e do suposto saber que abriga. A. Auxiliar
de Educação, se expressou naquele momento como a “realização de um sonho, poder visitar a
UNISO”. K., Auxiliar de Educação, sendo aluno de direito da UNISO, tinha familiaridade com a
biblioteca e levou os colegas visitar todas dependências.
Pôde-se perceber a proximidade geográfica entre a cidade universitária e o bairro
Brigadeiro Tobias, porém outra distância precisa ser superada, a distância entre a academia e a
realidade cotidiana, a distância entre o ensino superior privado, mesmo que comunitário, e o
poder aquisitivo do profissional da educação infantil, entre quem pode pagar para estudar e quem
não pode nem colocar em pauta tal investimento. O conhecimento produzido na Universidade
pode emanar do cotidiano, mas deve voltar pra ele.
Voltando ao CEI-59, no fervor do retorno, agitados, pernas cansadas, cabelos duros
de poeira, mas muito animadas, foram à produção do texto cujo título proposto foi o já citado
“Olhar, sentir, pensar. Agir?” Transparece a distância geográfica, mas um sentimento de ser todos
parte deste mesmo lugar – o bairro, mas também o “nós” separado “dessa gente”, o lugar sóciogeográfico do CEI-59 e sua importância como Centro onde se busca educação e cultura, qualidade
de vida. Trechos selecionados:
“Através desse passeio visualizamos e constatamos a imensidão da área de
abrangência desta unidade de ensino (Cei-59), onde tivemos uma pequena idéia das dificuldades
e dos obstáculos que algumas famílias encontram para se deslocar até a escola, enfrentando
terra, pó, falta de transporte gratuito, barro, lama em dias de chuva, enfim, uma série de dificuldades
que as crianças enfrentam para chegar e retornar para casa no final do dia. (...) verificando os
pontos positivos e negativos, podemos fazer um plano de ação e trabalharmos mais dentro da
realidade que esta comunidade vivencia no seu dia-a-dia.” (K. - Auxiliar de Educação da 2ª fase)
“Sair para vivenciar um pouco a moradia de nossos alunos foi uma experiência
muito rica... no dia-a-dia, tiramos conclusões das pessoas sem realmente conhecer suas raízes.
Eu senti alegria em ver algumas crianças, até onde moram, mas também senti admiração pela
força de necessidade de caminharem tanto em busca da tão almejada “Educação”, deu para
perceber que realmente somos um Centro, pelo qual é responsável por um dia melhor dessa
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Projetos e práticas de formação de professores
gente, apesar do conforto do ônibus, pude sentir as minhas pernas cansadas, imagine a perninha
delas (crianças) que é tão curtinha! (...) além de abrir as portas da creche precisamos abrir o
coração e os olhos principalmente para essa gente que quer viver tão bem quanto nós.” (R. Professora da 3ª fase)
“Através do nosso “passeio” pelo bairro pude observar a realidade em que nossos
alunos vivem, sua vida cotidiana, suas dificuldades, o nível sócio-econômico de suas famílias e
as condições nas quais eles vivem.
Partindo dessa “visão” ficou mais claro perceber seus anseios quanto ao nosso
trabalho e da nossa instituição, e acima de tudo, da importância que este espaço representa.
Acredito que para muitos, este espaço é o único ao qual eles podem ter acesso aos
bens culturais, à diversões, à socialização; e cabe a nós “educadores” valorizarmos este acesso e
fazer com que cada vez mais encurtem as distâncias, não só geográficas, mas também de
oportunidades de vislumbrar um futuro melhor, com igualdade de condições. (...) Para participarem
dessa sociedade e [que] sejam capazes de modificá-la e assim construírem um mundo mais
justo, digno e igualitário.” (R. - Professora da 1ª fase)
“Olhar – As belas paisagens e as reais condições do bairro (dificuldades e desafios)
Sentir – saudades da minha infância.
Pensar – como era o bairro quando era criança, as mudanças que ocorreram, o
que melhorou, o que precisa mudar, as dificuldades que as crianças enfrentam para chegar a
escola.
Agir – O que nós podemos fazer para melhorar as condições de vida de nossos
alunos, como transformar essa realidade.”
(A. - Auxiliar de Educação do Maternal 2)
“É complicado andar, às vezes debaixo de chuva, ou mesmo sol escaldante,
quilômetros e quilômetros para ter a segurança de deixar os filhos em um local onde serão cuidados,
alimentados e principalmente “educado”, para uma vida que ainda não conhecem. Para eles (as
crianças) tudo não passa de uma brincadeira, mas o que esperam do futuro? O que seus pais
podem fazer? Como mudar às vezes uma vida dura, quase miserável tanto de bens materiais
como de amor? (M. - Auxiliar de Educação da 3ª fase)
“A distância de muitos percorrida, as dificuldades do trajeto. Muitos deles devem
chegar cansados, acordam cedo e depois a maioria permanecer doze horas na creche. Então eu
acho que seja necessário ter um ambiente acolhedor, aconchegante, fazendo com que as crianças
se sintam bem recebidas. ” (E. - Auxiliar de Educação do Maternal 1)
“Sinto que vivem com dificuldades, como qualquer um sem recursos de que quem
vive com baixa renda. Pensar de fazer as crianças felizes, ouvindo-os dando amor oferecer
oportunidades de participar de eventos dentro de nossas condições.” (J. - Regente Maternal do
Berçário)
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Projetos e práticas de formação de professores
“Durante o passeio senti o cheiro da natureza, vi algumas crianças que são alunos
do CEI e consegui entender as dificuldades que tem para chegar a escola devido a distância de
suas casas. (...) Percebi quanto o nosso bairro está esquecido pelos órgãos públicos e que isso só
iria melhorar se a população se unir em torno de um objetivo. (P. – Auxiliar de Educação do
Maternal 1)
“Podemos fazer alguma coisa para mudar isso. Temos que nos sensibilizar e também
a comunidade em geral começando dos nossos alunos e pais. Realizando algum projeto que
envolva a todos.
Esse passeio deu oportunidade de sentirmos a necessidade que “todos”, não só as
crianças, temos em procurar a melhoria de nosso bairro. (R. – Auxiliar de Educação do Berçário)
“Senti o quanto eu gosto desse bairro, também senti o quanto é difícil para algumas
crianças chegarem até a unidade, senti um prazer enorme de mostrar o nosso bairro para os
outros.
(...) Temos que fazer projetos para conhecer melhor o nosso bairro e mostrar para
crianças o quanto é importante e bonito o lugar onde moramos.” (V. – Professora do Maternal 2)
O primeiro leitor é o próprio autor e o segundo é este interlocutor, intermediando ou
personificando a instituição escolar. No compartilhamento destas produções escritas há grande
possibilidade de enriquecimento também entre pares.
Diante da problemática foi escolhido um foco de trabalho: cidadania e meio ambiente,
conscientização de que Brigadeiro Tobias é (pertence) a Sorocaba e não se justifica o abandono
dos bens públicos e históricos.
Aquele que educa, ensina a escrever, ou que trabalha sobre um conhecimento
escrito, muitas vezes não exercita a escrita como participação social autônoma, além de formulários
e outros produtos que não exigem reflexão, talvez influenciados pelos condicionamentos históricos
de sua formação e atuação profissional. Participando desse processo através da escrita, organiza
seu pensamento; no distanciamento do seu cotidiano proporcionado por essa reflexão, pode verse, ver a realidade, indagar-se e agir sobre ela.
A Educadora Infantil é muito ligada à ação e a oralidade, no sentido de a palavra
dita ter muito valor e facilidade em relatar oralmente sua atuação: a transformação dessa reflexão
em autoria escrita construída para outro leitor – comunidade escolar, público em geral, acadêmico
talvez –, num registro mais elaborado, contribui para o desenvolvimento de uma ação educativa
reflexiva e comprometida com a realidade dos educandos.
Uma avaliação subjetiva em que o profissional se revela enfrenta muitas resistências
nos estilos de vínculos estabelecidos entre estas condições hierárquicas ou de confiança através
dos suportes e o formato do texto, respeito às normas convencionais, organização, organograma
ou relatórios em prosa, que revele uma visão geral ou detalhada, numa narrativa e reflexão.
Buscar a conquista de espaço físico no tempo para parar e escrever, ou melhor, para parar a ação
e refletir escrevendo: há que se buscar um espaço psicológico desse ato, de modo que seja
percebido como algo valorizado pelo grupo e que tenha sentido para a Educadora Infantil para se
manter numa “atitude reflexiva constante” (Scarpa,1998).
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Projetos e práticas de formação de professores
Os textos escritos são carregados de muita afetividade, revelam o que vai dentro
do autor, e o vínculo estabelecido com o interlocutor traz uma marca transferencial, em que
repetem relações significativas anteriores.Pode-se inferir em Olson (1997) que a produção escrita
não é só uma transcrição da fala, mas que serve de modelo à fala mais consciente. Quando a
Educadora Infantil escreve, ela destaca, separa a palavra do ato em si, refletindo sobre o significado
da palavra, tornando consciente o que motivou a ação, a decisão, a dúvida, o receio, a crença que
lhe é mais valorizada, originados esses processos na mente como a idéia em si, o pensamento
expresso e peculiar de cada sujeito – o que constitui sua subjetividade.
A Diretora, ao ler a produção escrita semanal, reconhece a autora, e sua perspectiva
de mundo, por trás do texto. Reconhece também o que imagina (esta autora) do interlocutor e o
que espera dele. Essa leitora com sua mente e perspectiva de mundo coordenará essas perspectivas
– da autora, do interlocutor imaginado, e a sua própria – no estabelecimento de um diálogo, que
no caso de haver intencionalidade, evoluirá com um sentido, um foco gerador de transformações
nos sujeitos, nas relações, nas ações propriamente, ou seja, na intervenção e transformação da
atuação, através da constante reflexão sobre a ação e o mundo que os cerca.
Por haver indícios de revelações da mente, apesar de a educadora Infantil-autora
decidir sobre o que coloca ou oculta no texto, esta prática se estabelece num clima de confiança
entre as parceiras, ainda que hierárquicas, em que o interlocutor intermedeia ou personifica a
instituição escolar.
Na Educação Infantil, especificamente em creches onde se atende crianças de
zero a 6 anos, a distinção de Aristóteles (in Geraldi, Florentini e Pereira, 1998) entre poesis e
praxis cria uma tensão. Poesis se refere a um conjunto de procedimentos operativos para produzir
conseqüências quantificadas e especificadas previamente enquanto “práxis”, sendo uma forma
de atualizar nossos ideais e valores em uma forma adequada de ação e constituindo-se, por isso
mesmo, uma forma sempre inacabada que requer uma contínua reflexão. Nossa práxis alimenta
nossa poesis, que não é assim tão fechada, nem tão aberta, visto os riscos e comprometimentos
a que as crianças pequenas estão expostas. Há uma demanda de mobilidade, mas ela precisa
estar assegurada pelo senso comum, as transformações imediatas se dão pela intuição, e as
reflexões sobre elas levam à cristalização dos procedimentos e segurança na postura.
Aqui estou falando de cuidar e educar. “O caráter pedagógico da Educação Infantil
não está na atividade em si, mas na postura do adulto frente ao trabalho que realiza” (Machado,
2004). É preciso que a equipe esteja envolvida, integrada, disposta a melhorar sua atuação.
Durante o processo, a auto-avaliação também se faz necessária, o educador se transforma também,
apesar de ser um processo secundário, depende toda a espiral: “não há desenvolvimento curricular sem desenvolvimento de professores” (Stenhouse,1975 in Geraldi, Florentini e Pereira, 1998).
REFERÊNCIAS
CASTELLO-PEREIRA, L.T. Leitura de Estudo. Campinas,SP:Editora Alínea, 2003.
VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005
UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO
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Projetos e práticas de formação de professores
GERALDI, C.M.G.; FIORENTINI, D.; PEREIRA, E.M. de A. Cartografias do Trabalho Docente.
Campinas,SP: Mercado de Letras: Associação de Leitura do Brasil – ALB, 1998. (Coleção Leituras
no Brasil)
OLSON, D. R. O Mundo no Papel – as implicações conceituais e cognitivas da leitura e da
escrita. São Paulo: Ática, 1997.
SCARPA, Regina. Era assim, agora não...uma proposta de formação de professores leigos. São
Paulo: casa do Psicólogo, 1998.
MACHADO M.L.de A. Por uma Pedagogia da Educação Infantil. Pátio Educação Infantil, Porto
Alegre, RS: Artes Médicas, Ano II, Nº 5, p.6-8, Ago/Nov, 2004.
VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005
UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO
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