BORBOLETA ERIC HUANG JULIA MAYUMI YOFUKUJI NISHIYAMA LUIS FERNANDO HASHIMOTO JORGE PAULA AKEMI MIYAKAVA VANESSA EMI FURUKAWA LUCAS O que você faria se um dia acordasse em um lugar totalmente oposto de onde você vive? O“Era uma vez” nunca fez parte da vida de João. Residente da tranqüila são Luis do Paraitinga, ele morava com sua avó, levando uma vida sossegada – até que um dia, após um tropeço, sua vida virou do avesso... literalmente. BORBOLETA Borboleta/ Eric Huang, Julia Mayumi Yofukuji Nishiyama, Luis Fernando Hashimoto Jorge, Paula Akemi Miyakava, Vanessa Emi Furukawa Lucas. Direção editorial: Paula Akemi Miyakava Direção de arte: Vanessa Emi Furukawa Lucas Criação de design: Eric Huang Ilustrações: Vanessa Emi Furukawa Lucas Capa: Eric Huang, Julia Mayumi Yofukuji Nishiyama, Luis Fernando Hashimoto Jorge, Paula Akemi Miyakava, Vanessa Emi Furukawa Lucas. Editora: Julia Mayumi Yofukuji Nishiyama Diagramação: Maria Virginia Scopacasa Revisão / Colaboradores: Maria Virgíni , Oscar Itiro Kudo, Jorge Barbour, Victor Jo , Débora Sebriam, Simone Maria Valencio. Centro Educacional Pioneiro - São Paulo SP – Brasil http://www.pioneiro.com.br/ Impressão: ????????? Impresso no Brasil. 2011 Este trabalho foi licenciado com uma Licença Creative Commons Atribuição - NãoComercial - CompartilhaIgual 3.0 Brasil. Índice: 1. A Queda........................................................................................... página 7 2. Nunca Duvide de um Velho e de Um Biscoito................ página 9 3. Hipnose........................................................................................... página 13 4. Eu, ele e o nosso problema..................................................... página 16 5.Antígena.......................................................................................... página 19 Para Butch Hartman 1. A Queda Quem nunca dormiu ouvindo uma história de ninar, não sabe do que estou falando. Ainda me lembro das doces palavras de minha querida avó Gena “Lá embaixo, meu bem, existe um mundo onde tudo é diferente... É o chamado Anti-Mundo...”. A dor de cabeça já estava bicando o meu cérebro e eu não tinha nem aberto os olhos ainda... O estranho é que eu não conseguia me lembrar do meu sonho, coisa que geralmente acontece comigo eu escrevo todos eles no meu diário. Tá bom, eu já sei. Não posso ficar na cama dormindo pra sempre, já vou me levantar. Foi só eu abrir meus olhos que uma onda de poeira se arrastou e me fez fechar os olhos outra vez. Não podia acreditar no que via. Não! Não! Eu tinha dormido na rua? O que... mas... eu... E o que tinha acontecido com essa cidade? São Luis do Paraitinga não era cinza. Meu Deus, que pessoas mal humoradas são essas? Por um momento achei que ainda estava dormindo. Ou tendo um pesadelo, pelo menos. Mas foi só eu fechar os olhos por um segundo que um flashback apareceu. E estava indo comprar pão e lendo o jornal ao mesmo tempo, como sempre faço. Daí em diante só me lembro de ter acordado na rua. Uma gota de sangue escorria da minha cabeça. É isso! Eu caí! No... buraco da Igreja. —João, o que você está fazendo aqui? Some, moleque! E nunca mais apareça na frente dessa padaria! Foi a partir daí que eu me lembrei da minha avó. Não, não pode... Pode? Quer dizer, não existe esse tal de... —Aaaaaaaaah! 7 8 2. Nunca Duvide de um Velho e de um Biscoito Um velho de barba branca vestindo várias roupas velhas e rasgadas, colocadas umas sobre as outras me puxou pelo braço para um tipo de galpão. Ele fazia movimentos incertos e mexia a cabeça a cada cinco segundos. Não demorei para perceber que ele era louco. Ele falava rápido demais e suas palavras eram confusas, mas acho que ele falava que eu estava ao contrario. Não, você está no mundo ao contrário, dizia ele com a sua voz rouca. O velho se embaralhava com as palavras, mas ainda assim continuava. —Vinte anos! Vinte anos! O buraco! Algum ataque de pânico o atormentava, suas palavras rápidas explodiam como bombas e ele olhava a cada segundo para os lados. Por algum motivo. Ele olhou para mim pela primeira vez desde que me puxara para lá. Seus olhos brilharam, ele se acalmara: —Você se parece com o meu filho. Ha vinte anos atrás, claro. – seus olhos brilharam e ele se perdeu em seus pensamentos por alguns minutos. Ele suspirou – Estou neste lugar faz um bom tempo. A minha única companhia era meu cachorro, ele caiu neste fim de mundo comigo. Não durou nem cinco minutos para ele encontrar seu Anti e sumir. Meu coração começava a palpitar e as falas mal saíam da minha boca. —O que o senhor quer dizer com isso? 9 —Não saia daqui, ou saia, encontre seu Anti e desapareça para sempre. O velho cambaleou até o canto isolado e escuro do galpão, onde se agachou e começou a falar com o rato. Aquela história estava cada vez mais esquisita. Não aguentava mais aqueles prédios, os ratos, e aquela trilha sonora de buzinas. Eu estava em algum tipo de filme de terror? 10 A minha cabeça estava fervendo. Sumir?! Pfff, como se fosse possível! Ah, espera! Acho que já vi isso em física, o professor... Nossa, quem é aquela? Minhas pernas começaram a tremer e um frio na barriga me incomodava. Uma mulher de um sorriso magnífico passou na frente do galpão. Um colar com um pingente de pedra verde esmeralda destacava sua cor alva. Tudo indicava que era a minha Anti-avó que acabara de passar em frente aquele galpão. Ela carregava uma bolsa com frutas e cantarolava. —Senhor? Aquela mulher costuma ser alegre assim? —Borboletas! Elas não costumam aparecer por aqui... Peguei um pedaço de carvão e no chão desenhei o rosto de minha avó. Ele parecia ter entendido desta vez. —Sua avó vai morrer, menino Meu rosto estava molhado, eu estava chorando. Além do velho louco, o meu diário era minha única companhia aquela noite. No momento em que fui pegá-lo, encontrei alguma coisa. Do fundo do bolso peguei uma pequena embalagem e abri. Era um biscoito da sorte, acho que foi vovó Gena que colocou no casaco. A fome me consumia e eu ansiava cada segundo comer aquele biscoito. Foi quando me deparei com aquela mensagem “Se a memória lhe faltar, ao mundo retornará”. O que isso quer dizer? Uma vez minha avó me disse que a chave para os problemas eram os esquecimentos “Esqueça isso, querido. Siga em frente.” Não deve ser assim tão simples, e mesmo que seja, como eu faço pra esquecer de tudo? Não posso simplesmente bater a cabeça, desse jeito é bem mais provável eu morrer do que eu esquecer das coisas. Acabei adormecendo com aquele papel na mão. 11 12 3. Hipnose “Se a memória lhe faltar, ao mundo retornará” Os segundos voavam. O tic-tac do relógio incomodava a ponto de abrir os olhos, eu estava suando frio. Quanto mais tempo eu passava naquele lugar com ar carregado e pútrido, mais tempo a minha avó estaria sozinha naquela cama, morrendo. Então não pude mais. Teria que arriscar sair daquele galpão e achar algum jeito de voltar ao meu mundo. Mas o que o velho estava resmungando? Seus 13 olhos enormes balançavam, combinando com algumas únicas palavras que da sua boca saíam. Não digo que eram frases. Não, eram apenas palavras. E que palavras! “O menino”, “esquecer, esquecer, esq-“. O velho estava tentando me dizer alguma coisa muito importante; podia perceber pelo evidente nervosismo em sua voz. Mas o que eu deveria esquecer? Não consegui encaixar essas informações. Não havia uma sequencia lógica. Parei para pensar. Depois de muito tempo com aquele papel na mão, consegui entender o que ele me dizia. Agora poderia tentar sair daquele lugar! O velho me dizia para fazer com que o Anti-João soubesse que eu estava no mundo dele! Tudo fazia sentido... Se ele soubesse que eu estou no mundo dele, instantaneamente eu me esqueceria de tudo isso, completando a profecia. Sempre que alguma coisa anda muito bem, acontece uma desgraça. Bom, pelo menos era o que eu pensava – até eu ouvir aquele som. Era tão confortante, suave... E que sons eram aqueles? Pela primeira vez senti alguma coisa dentro de mim ao ouvir uma música. Ela dançava aos meus ouvidos, era como um grande ímã que atraía cada partícula do meu corpo. Que maravilhosos instrumentos podiam fazer tão angelicais melodias? Os violinos não eram violinos, os trompetes não eram trompetes e aquela harpa – não eram normais. Nenhum deles. Compridos, cheios de botões e com buracos nos lugares errados; por mais diferentes que fossem, todos provocavam o mesmo efeito de hipnose. Uma força me empurrava cada vez mais forte para perto daquela música, e pelo visto eu não era o único. Toda a população do Anti-Mundo se concentrava no coreto. Oh meu Deus, eu estava no coreto! De alguma forma meus músculos se mexeram e me trouxeram para cá. Congelei. Eu não podia ficar perto dele. 14 4. Eu, ele e o nosso problema Anti-João —Ei João! Acho que o seu anti está aqui. Olhe, ele é tão parecido com você! – um misto de espanto e horror estampavam seu rosto. O que? O que é um anti? Acho que o Pedro está ficando louco. —Do que está falando? — Como assim, João? Não se lembra? Debaixo dos nossos pés existe um mundo que é totalmente ao contrário de onde vivemos, inclusive as pessoas. Para cada um de nós existe um anti, uma pessoa fisicamente igual a nós, porém com a personalidade oposta. E nem pense em encontrar o seu anti, que um dos dois desaparecerá. Nossa! Como poderia ter me esquecido o Anti-Mundo daquele jeito? Todos temem o seu anti e o meu estava a poucos metros de mim! E eu tinha esquecido sua existência! Como isso aconteceu, meu Deus! Um fato que me atormentava desde que nasci desaparecer da minha cabeça assim?! 15 16 João Algo tocava meu ombro. Virei-me para conferir o que era e dei de cara com o velho louco, que parecia ter sido hipnotizado também. O barulho dos instrumentos era tão alto, mas acho que ele gritava: —Menino! Menino! – seus olhos giravam e ele tremia - Se esconda! A borbo... ? Ele está aqui! Aqui! Ele, ele esta! Que borboleta linda... Mal deixei o velho terminar de falar e comecei a andar sem rumo pela praça lotada. Costurava a multidão em busca de um esconderijo. A música estava tão alta! As vozes daquelas pessoas pareciam ecoar na minha cabeça, uma sensação de enjôo tomava meu corpo, tudo parecia estar girando. Não consegui mais ficar de pé. Então eu vi uma borboleta... e tudo se escureceu... 17 18 5. Antígena —Oi vovó, eu estava no coreto, tinha uma banda tocando lá... - Um brilho verde chamou minha atenção... – Que colar bonito! “Blém blém blém blém” A dor de cabeça já estava bicando o meu cérebro e eu não tinha nem aberto os olhos ainda... O estranho é que eu não conseguia me lembrar do meu sonho, coisa que geralmente acontece comigo - eu escrevo todos eles no meu diário. Tá bom, eu já sei. Não posso ficar na cama dormindo pra sempre, já vou me levantar. Foi só eu abrir meus olhos que percebi que estava caído na rua. O Totó cheirava minha blusa e, ah meu Deus! Já eram seis da tarde! E a vovó esta sozinha em casa! Por mais que a chuva me fizesse apressar os passos em direção a minha casa, eu apreciava cada árvore pela qual eu passava e cada respiração funda que dava, sentindo uma mistura de cheiros: chuva, mata, cachorro molhado... E por algum motivo o portão estava aberto. A casa estava escura e a chuva molhava a mesa que fica embaixo da janela. Meu coração disparou e a cada passo barulhento que eu dava um pensamento agonizante cutucava minha cabeça. E se alguma coisa aconteceu com a vovó Gena enquanto eu estive fora? Abri a porta do quarto devagar, nunca senti tanto medo na vida. Ao ouvir uma respiração ofegante – talvez fosse a minha, não sei – percebi que alguma coisa se mexia na cama. Ufa, uma onda de alivio tomou meu corpo, a minha avó ainda estava ali. E viva. Ao caminhar lentamente à sua cama, ela se virou. —Olá João. Demorou... – sua voz era animada, e pela primeira vez em anos consegui enxergar um brilho em seus olhos. 19 20