Em Sevilha existe a rara habilidade de fazer com que o efémero tome corpo de aparente permanência. Os nossos ritos, os nossos momentos de glória, as cores, a luz, tudo o que podemos qualificar acertadamente como efémero, produto de uma estação do ano, de uma data do calendário ou de um conjunto de circunstâncias, forma parte desse universo de valores que definem, e distinguem, a cidade. O irrepetível causa sempre sensação em Sevilha. Por isso talvez seja esta uma das poucas cidades europeias que continua a oferecer exemplos vivos e actualizados de arquitectura efémera, como são as portadas do ‘Corpus’ e, sobretudo, a Portada da ‘Feria’. Acreditem que, aquando da noite de segunda-feira de ‘Feria’, eu, ao pé desse molhe de tubos e madeira, pressiono o botão que ilumina a portada e às vezes penso o bonito que ficava se alguém repetisse os versos que Cervantes dedicou ao túmulo de Felipe II: “Voto a Dios que me espanta esta grandeza y que diera un doblón por describilla; porque ¿a quién no sorprende y maravilla esta máquina insigne, esta riqueza?...” Exposição: RITO Y FIESTA. Una aproximación a la arquitectura efímera sevillana Comissários José María Gentil Baldrich Ana Yanguas Álvarez de Toledo Colaboradores TEP 214 US Andrés Martín Pastor Montagem Una Aproximación A La Arquitectura Efímera Sevillana Esta exposição “Rito y Fiesta: una aproximación a la arquitectura efímera sevillana” devolve-nos à Roma triunfante em ânimo e nobreza que era a Sevilha da época, mas que por vezes nos descobre signos que ainda hoje são identificáveis como componentes da forma de ser e estar desta cidade. Estudio ADD Sevilla, S. L. Catálogo. Desenho e Maquetacion Alfredo Sánchez Monteseirín Alcalde de Sevilla Víctor M. Montero Fernández Exposição patente no Reservatório da Patriarcal, Museu da Água da EPAL de 5 a 30 de Junho de 2008 Rito y Fiesta A Alma das Coisas A percepção do tempo simboliza um limite de duração em contraponto com o eterno. Por definição o tempo humano é finito e o tempo divino é infinito ou seja a negação do tempo, o ilimitado. O tempo é simbolizado pela roda com o seu movimento giratório. O centro do círculo é o aspecto imóvel do ser, o ponto que torna possível o movimento dos seres, opondo-se a ele como a eternidade ao tempo. Para Santo Agostinho o tempo é a imagem móvel da imóvel eternidade. Todo o movimento assume a forma do círculo, desde o momento em que se inscreve numa curva evolutiva entre um começo e um fim e cai sob a possibilidade de uma medida que não é mais que a do tempo. Para tentar exorcizar a angústia e o efémero a relojoaria contemporânea desenhou relógios e despertadores de forma quadrada simbolizando assim a ilusão humana de fugir à roda inexorável e de dominar a terra impondo-lhe a sua medida. O quadrado simboliza o espaço, a terra, a matéria. Esta passagem simbólica do temporal ao espacial não chega contudo a suprimir toda a rotação mas esconde o efémero, para indicar apenas o instante presente no espaço. A exposição “Rito y Fiesta: una aproximación a la arquitectura efímera sevillana” é a consagração do efémero como beleza eterna. A festa sevilhana expressa a cultura de gentes intensas que amam o belo e o divinizam em rituais prodigiosos. Ao observarmos estas obras da arquitectura efémera sentimos um misto de desconsolo e fruição primordial. A obra não existe fisicamente, não podemos vê-la ou tocá-la pelo que a fruição não é imediata mas sim primordial ao sentirmos a negação física, a ausência, e ao mesmo tempo a elevação pura da sua beleza intangível. Celebramos com esta exposição a arte maior dos arquitectos que desenham o mundo, construtores do passado, do presente e do futuro, dimensões inalienáveis. Arquitectos do tangível e do intangível também e estando o tempo indissoluvelmente ligado ao espaço não escondem o efémero mas exaltam-no como a beleza ultima. O Reservatório da Patriarcal transforma-se numa festa sevilhana ao acolher esta magnífica exposição e para sempre ficará guardião da alma de todos estes monumentos efémeros que o intangível torna eterno. Porque o melhor de nós é a alma que se inscreve em tudo o que criamos e só a alma se eterniza. Ao lembrar a arquitectura efémera, a FIDAS e o Colégio Oficial de Arquitectos de Sevilha estão a criar novas memórias, a imagem móvel da imóvel eternidade. Curiosamente esta exposição realiza-nos o impossível: torna o efémero eterno e o eterno um simples ponto de referência. Margarida Ruas Gil Costa Directora do Museu da Água A presente exposição, que agora se apresenta em Lisboa, foi realizada dentro das celebrações da Semana da Arquitectura organizada pelo Colégio de Arquitectos de Sevilha em 2004. Seguindo com a serie de exposições anteriores dos arquitectos sevilhanos, ofereceu nesse ano “Rito y Fiesta: una aproximación a la arquitectura efímera sevillana”, com o mesmo fim de colocar à disposição do público da nossa cidade outra parcela da sua própria história arquitectónica, e que agora se expõe aqui. Expor uma arquitectura efémera do passado podese interpretar como uma pretensiosa intenção de recuperar o tempo. Mas essa intenção não era só nossa na selecção que se expõe, era também a dos desenhadores, gravadores, fotógrafos e cronistas que recolheram aqueles acontecimentos, hoje muitas vezes adormecidos nos nossos arquivos e, não poucas vezes, perdidos ou esquecidos na nossa memória. Não se quer fazer com isto um canto nostálgico a estas arquitecturas desaparecidas que, além disso, nunca pretenderam outra coisa, senão fazer notar o quanto pesa a destruição do passado, mas muitos edifícios salvaram-se mesmo contra as intenções de demolição. Inclusivé, os edifícios demolidos ainda possuem o benefício da arqueología, mas com os desenhos e ilustrações perdidas só nos resta a hipótese gráfica. A selecção de imagens que se exibe dividiuse tematicamente em diversas partes, para que se compreenda a sua visão. Sucedem-se assim cortejos reais, cenografías urbanas, arcos triunfais, túmulos e monumentos, festas primaveris... com uma sucinta explicação dos conteúdos. Mas, para além dos exemplos concretos deve assinalar-se a sua separação, que recolhe num conjunto parte da arquitectura presente nas comemorações e nas festas sevilhanas, segundo a visão de que delas tiveram os ilustradores e fotógrafos do passado. O catálogo editado recolhe, junto com as imagens expostas, uma selecção de textos introdutórios sobre o tema. Alguns deles correspondem a destacados autores que iniciaram a investigação destas arquitecturas há alguns anos e que publicaram os seus estudos monográficos em diversos meios e momentos. A sua leitura confirma a condição de pioneiros no estudo das construções efémeras sevilhanas. O presente trabalho realizou-se com o patrocínio não só do Colégio de Arquitectos e da Fundação FIDAS, mas também com o apoio da Delegação de Festas Maiores da Câmara Municipal de Sevilha. Nada mais indicado para este ensaio que esta colaboração do organismo municipal, herdeiro dos que conceberam, projectaram e pagaram a maioria das celebrações históricas que aqui se expõem: desde os arcos que receberam Fernando, o Católico, até aos que o fizeram com Alfonso XIII; desde o polémico túmulo de Felipe II, até ao mais modesto da rainha Mercedes; desde a festa de toiros e “cañas” na Praça de São Francisco, até às portadas da ‘Feria de Abril’. Por isso, merecem um reconhecimento especial, tanto por manterem o interesse através dos séculos, como pela promoção e o apoio prestado a esta efémera exposição. Ángel Díaz del Río Hernando Decano-Presidente del Colegio Oficial de Arquitectos de Sevilla