Leia o texto a seguir: “À Cidade da Bahia”
Triste Bahia! Oh quão dessemelhante
Estás, e estou do nosso antigo estado!
Pobre te vejo a ti, tu a mi empenhado,
Rica te vi eu já, tu a mi abundante.
A ti trocou-te a máquina mercante,
Que em tua larga barra tem entrado,
A mim foi-me trocando, e tem trocado
Tanto negócio, e tanto negociante.
Deste em dar tanto açúcar excelente
Pelas drogas inúteis, que abelhuda
Simples aceitas do sagaz Brichote.
mercador, comerciante
Oh se quisera Deus, que de repente
Um dia amanheceras tão sisuda
Que fora de algodão o teu capote!
(MATOS, Gregório de. Poesias selecionadas. 3.ed. SP: FTD, 1998. p. 141.)
A repeito das figuras de linguagem presentes no poema, considere as
assertivas abaixo transcritas:
I. A descrição satírica que o eu-poético faz da Cidade da Bahia (Salvador)
configura uma antítese entre o estado antigo e o atual.
II. A hipérbole é verificada na oposição entre as expressões “máquina
mercante” e “drogas inúteis”, ambas como referência crítica ao pacto colonial.
III. Os versos 3 e 4 do soneto são exemplos do papel relevante da gradação no
conjunto do poema, porque enumeram estados de espírito do eu-lírico.
IV. Os versos “Um dia amanheceras tão sisuda / Que fora de algodão o teu
capote!” configuram exemplos de prosopopeia e de metáfora, respectivamente.
01. Assinale a alternativa correta.
a) Somente as afirmativas I e IV são corretas.
b) Somente as afirmativas II e III são corretas.
c) Somente as afirmativas III e IV são corretas.
d) Somente as afirmativas I, II e III são corretas.
e) Somente as afirmativas I, II e IV são corretas.
01. RESP: A – As assertivas I e IV estão corretas. O eu-poético contrasta a
submissão da colônia ao poderio interesseiro da metrópole portuguesa
através do jogo antitético entre presente (“vejo”) e passado (“vi”), entre
“pobre” e “rica”, respectivamente. “Sisusa” significa séria, austera,
ajuizada, aquela que tem siso (lembre-se do dente-do-siso, o dente do
juízo) e se refere à Cidade da Bahia, constituindo-se em prosopopeia.
Capote de algodão é sinônimo de pureza – algodão é branco e capote
(capuz) serve para esconder a vergonha, metaforicamente.
Atente:
De tanta inspiração e tanta vida
Que os nervos convulsivos inflamava
E ardia sem conforto...
O que resta? uma sombra esvaecida,
Um triste que sem mãe agonizava...
Resta um poeta morto!
sem ânimo, sem alma
Morrer! e resvalar na sepultura.
Frias na fronte as ilusões no peito
Quebrado o coração!
Nem saudades levar da vida impura
Onde arquejou de fome... sem um leito!
Em treva e solidão!
Tu foste como o sol; tu parecias
Ter na aurora da vida a eternidade
Na larga fronte escrita...
Porém não voltarás como surgias!
Apagou-se teu sol da mocidade
Numa treva maldita!
(Álvares de Azevedo – “Um Cadáver de Poeta” – Lira dos vint’anos, 1853)
02. Assinale a alternativa incorreta pertinente ao poema acima transcrito:
a) a pontuação revela o estado de espírito do eu-poético;
b) os versos apresentam a temática da morte de maneira piedosa;
c) a postura ultrarromântica disfarça o humour impregnado de spleen;
d) ocorre o predomínio da função emotiva da linguagem;
e) O eu-poético está dividido entre a alegria do passado e a tristeza do
presente.
02. RESP: C - Até pelo título, o poema ultrarromântico de Álvares de
Azevedo é irônico e evidencia o satanismo cheio de spleen e de mal-doséculo presente nas liras.
Observe o quadro e leia o texto:
Era esse dia domingo do Espírito Santo. Como todos sabem, a festa
do Espírito Santo é uma das festas prediletas do povo fluminense. Hoje
mesmo que se vão perdendo certos hábitos, uns bons, outros maus,
ainda essa festa é motivo de grande agitação; longe porém está o que
agora se passa daquilo que se passava nos tempos a que temos feito
remontar os leitores. A festa não começava no domingo marcado pela
folhinha, começava muito antes, nove dias cremos, para que tivesse lugar
as novenas.
(Memórias de um sargento de milícias, 1854, de Manuel Antonio de Almeida –
capítulo XIX)
03. O trecho do livro apresenta estreita relação com o motivo pintado pelo
francês Jean Baptiste Debret (1768/1848). Sendo assim, pode-se dizer que o
livro de Manuel Antônio de Almeida (1831/1861) é um romance romântico:
a) psicológico;
b) social de costumes;
c) regionalista;
d) pictórico;
e) urbano.
03. RESP: B - O romance registra os usos e costumes populares e
folclóricos do Rio de Janeiro no tempo do rei D. João VI.
Desde que a febre de possuir se apoderou dele totalmente, todos
os seus atos, todos, fosse o mais simples, visavam um interesse
pecuniário. (...) Aquilo já não era ambição, era uma moléstia nervosa, uma
loucura, um desespero de acumular, de reduzir tudo a moeda. E seu tipo
baixote, socado, de cabelos à escovinha, a barba sempre por fazer, ia e
vinha da pedreira para a venda, da venda às hortas e ao capinzal, sempre
em mangas de camisa, de tamancos, sem meias; olhando para todos os
lados, com o seu eterno ar de cobiça; apoderando-se, com os olhos, de
tudo aquilo de que ele não podia apoderar-se logo com as unhas.
(Aluísio Azevedo, O cortiço, 1890)
04. No excerto acima, a percepção do narrador traz marcas do estilo
naturalista, pelo fato de
a) caracterizar o modo de ser da personagem como uma patologia.
b) trazer ao leitor, com objetividade e parcimônia, o lado cômico do
comportamento humano.
c) criar analogia entre homem e animal, imagem resultante da projeção
subjetiva do observador sobre o observado.
d) criticar explicitamente a ambição desmesurada da alta burguesia.
e) apresentar sintaxe e léxico inovadores e temática cientificista.
04. RESP: A - A classificação dos comportamentos humanos como
patologias é um traço típico do Naturalismo – o psicofisiologismo. A
compulsão da personagem João Romão, dono da estalagem “Carapicus”,
demonstra ganância e privação pessoais e é transmitida como doença “febre”, “moléstia nervosa”, “loucura”.
Textos para as questões 05 e 06:
Texto I: “Profissão de fé”
Torce, aprimora, alteia, lima
A frase; enfim,
No verso de ouro engasta a rima,
Como um rubim.
(Olavo Bilac, Poesias – 1888)
Texto II: “O Haicai”
Lava, escorre, agita
a areia. E enfim, na bateia,
Fica uma pepita.
(Guilherme de Almeida, Poesias – 1932)
Nota: Haicai é uma estrutura poética oriental, especialmente do Japão, surgida
no século XVI e ainda hoje em voga. É composta de maneira formal, com três
versos bem definidos: o primeiro e o terceiro com cinco sílabas (redondilha
menor) e o segundo com sete (redondilha maior). Entre os grandes poetas,
destaca-se Matsuô Bashô (1644 / 1694).
05. É correto dizer que os textos
a) destacam o trabalho poético como resultado do esforço artesanal, de
ourivesaria, envolvendo o garimpo de vocábulos preciosos da língua.
b) exemplificam a tendência barroca da poesia brasileira, dado o rebuscamento
e a lapidação da linguagem.
c) trazem índices da estética simbolista, na medida em que não respeitam a
regularidade métrica, adotando rimas pobres e versos populares.
d) ironizam a delicadeza do poeta, concebido como mero escultor de joias, que
trabalha incansavelmente até encontrar a rima preciosa.
e) recupera aspectos formais e temáticos defendidos pelos poetas românticos,
como o brilho egocêntrico.
05. RESP: A – Em ambos os textos, o poeta é apresentado como aquele
que encontra o ouro (metáfora de Guilherme de Almeida) ou o que produz
a joia (metáfora de Olavo Bilac).
06. Considere as seguintes afirmações:
I. O Texto II corresponde a uma paródia do Texto I, na medida em que valoriza
a concepção de arte como produto da inspiração, do acaso e da sorte.
II. O diálogo entre os textos exemplifica o repúdio dos modernistas da fase
Heroica (1922/1930) às estéticas do século XIX, representativas do passado.
III. Os dois textos explicam o próprio fazer poético através do jogo metafórico e,
portanto, configuram discursos metalinguísticos.
Assinale:
a) se apenas I estiver correta.
b) se apenas II estiver correta.
c) se apenas III estiver correta.
d) se apenas II e III estiverem corretas.
e) se todas estiverem corretas.
06. RESP: C - É evidente que ambos os textos se referem à poesia e são,
portanto, metalinguísticos. Erros: em I, a paródia se constitui em imitação
irônica do consagrado, assumindo gênero satírico e rebaixando o tema;
em II, ambos apresentam a mesma concepção do fazer poético – apesar
de moderno, Guilherme de Almeida ainda está atrelado ao formalismo e
às propostas parnasianas de Olavo Bilac (tanto que seu poema é um
haicai).
07. A música e a dança folclóricas do Brasil têm por base o amálgama dos
elementos melódicos e coreográficos procedentes de Portugal, a rítmica e
rituais próprios de diversas regiões da África e ainda a enorme contribuição
ameríndia. Nas alternativas abaixo, marque a incorreta:
a) “Bumba-meu-boi” é uma festa regional do norte/nordeste, feita
exclusivamente por mulheres, na qual os instrumentos musicais (rabecas, viola,
flauta e zabumba) executam ritmos e melodias que acompanham letras da
tradição oral.
b) A contribuição dos negros para a música brasileira consistiu na rítmica
heterogênea, diversificada e chamativa, com cadências melódicas e notável
variedade instrumental, desde apitos e assovios até cordas.
c) O som anasalado de alguns cantos, o timbre de alguns instrumentos de
sopro, como a inúbia, e de percussão, como o chocalho, e algumas danças ou
coreografias rituais são reflexos marcantes da cultura indígena na música
brasileira.
d) O elemento básico que forneceu orientação e estruturação à música do
Brasil foi o português, com seu sistema harmônico tonal e a incorporação de
diversos instrumentos europeus, entre eles, o piano, o violino e o fagote.
e) “Catira” é uma dança em que o ritmo musical é marcado pela batida dos pés
e das mão e que apresenta origem híbrida - indígena, africana e europeia com coreografia normalmente executada dez por homens e dois violeiros,
sendo muito comum nos estados de Minas Gerais e São Paulo.
07. RESP: A – O “Bumba-meu-Boi” é uma dança folclórica do
norte/nordeste, em especial do Maranhão, que apresenta personagens
humanos e animais fantásticos e que gira em torno da morte e
ressurreição de um boi. Tradicionalmente, os papéis femininos são
representados por homens. Estudiosos apontam a origem da peça
folclórica em Pernambuco, quando a invasão holandesa e do episódio do
famoso “Boi Voador” promovido por Maurício de Nassau na inauguração
de uma ponte sobre o rio Capiberibe.
Atente:
Para esclarecer o que seja a imitação, na relação entre a Arte e o
Mundo, no Livro X da República, Platão parte da hipótese das Ideias, as quais
designam a unidade na pluralidade, operada pelo pensamento ou intelecto. Ele
toma como exemplo o carpinteiro que, por sua arte, cria uma mesa, tendo
presente a ideia de mesa, como modelo. Entretanto, o que ele produz é a mesa
e não a sua ideia absoluta e verdadeira. O artista pertence à mesma categoria:
cria um mundo de mera aparência.
The Dark Side of the Moon (1973),
Pink Floyd
Escola de Atenas (1511), de Raphael
Sanzio (1483-1520). Detalhe: Platão e
Aristóteles.
08. Com base no texto apresentado e observando atentamente as figuras, é
correto afirmar a respeito da teoria das Ideias de Platão que:
a) Deus é o criador último da Ideia, e o artista, enquanto coparticipante da
criação divina, alcança a verdadeira causa das coisas a partir do reflexo da
ideia ou do simulacro que produz.
b) A participação do artista no mundo das Ideias permite admitir realidades
sensíveis como causas verdadeiras e acessíveis à razão – é um processo de
sublimação ou transcendência.
c) O artista é imitador de simulacros e por intermédio da imitação não alcança o
conhecimento das Ideias como causa verdadeira e una de todas as coisas.
d) As coisas belas produzidas pelo artista se explicam por seus elementos
físicos e concretos, como a cor e a forma, expressando multiplicidade de
ideias: a beleza em si e por si.
e) A alma humana possui a mesma natureza das coisas sensíveis, razão pela
qual o artista é capaz de reconhecê-la como tal na percepção aparente.
08. RESP: C - O mundo das ideias é absoluto, verdadeiro e uno. O mundo
real é aparente, distorcido, múltiplo e cheio de simulacros. Para Platão, o
artista – que vive no mundo real - imita uma imagem não verdadeira, já
aparente e distorcida, como se fosse a cópia da cópia ( o simulado é uma
prova que imita o exame vestibular – simula o exame, com todos os
detalhes).
Os trabalhos do artista Vik Muniz (1961/?) ficaram famosos no Brasil ao
figurarem na abertura de uma telenovela de uma das maiores emissoras do
país. “Waste Land”, traduzido como “Lixo Extraordinário” é um documentário
brasileiro a respeito do artista plástico e do seu projeto de reciclagem de lixo
entre os catadores de lixo. O tema é antigo e já sensibilizou e indignou muitos
artistas e personalidades, entre eles, o poeta moderno Manuel Bandeira
(1886/1968), como no poema abaixo transcrito:
“O BICHO”
Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.
(Manuel Bandeira - Rio, 27 de dezembro de
1947.)
Medusa Marinara (after Caravaggio) –
macarrão com molho, em prato de
porcelana - 1997, de Vik Muniz
09. Com base nas imagens e na leitura do poema, considere as afirmativas a
seguir.
I. Os trabalhos podem ser classificados como arte engajada e participativa, já
que as propostas de fundo, tanto do artista plástico como do poeta, procuram
denunciar os problemas sociais e econômicas.
II. O artista plástico faz parte de um grupo internacional que defende a
retomada dos temas mitológicos para a arte; sem assunto poético, o poeta
aborda qualquer situação banal.
III. A ressignificação de obras de arte consagradas pelo tempo é frequente na
arte promovida pelo artista plástico; por sua vez, o poeta procura transfigurar
em reflexão socioexistencial o seu tema prosaico.
IV. A incorporação de materiais e suportes não convencionais é um dos
pressupostos de Vik Muniz; o poema elaborado com regras formas e
convencionais (rima, métrica e ritmo) é um dos traços de Manuel Bandeira.
Assinale a alternativa correta.
a) Somente as afirmativas I e II são corretas.
b) Somente as afirmativas I e IV são corretas.
c) Somente as afirmativas III e IV são corretas.
d) Somente as afirmativas I e III são corretas.
e) Somente as afirmativas II, III e IV são corretas.
09. RESP: D - As propostas de fundo destacam a fome como fonte de
problemas sociais e econômicos; nesse sentido, são obras engajadas e
participativas. As releituras de obras consagradas feitas por Vik Muniz
utilizam materiais de consumo não convencionais, demonstrando
efemeridade (tanto que as obras são fotografadas). A
sensível
mundividência de Manuel Bandeira transforma um fato banal em reflexão
socioexistencial .
Observe a imagem a seguir:
Intriga, de James Ensor- 1890. 0,90 x 1,50 cm. Museu Real de Artes, Antuérpia.
10. Com base no quadro, do pintor James Ensor (1860/1949), assinale a
alternativa correta.
a) A pintura expressionista trabalha com partes de uma mesma imagem,
recompondo-as e utilizando-as ao mesmo tempo, com o intuito de criar várias
perspectivas e dar a impressão de que um objeto pode ser visto ao mesmo
tempo sob todos os ângulos.
b) Pintando diretamente sobre a tela branca, utilizando somente cores puras
justapostas em vez de misturá-las previamente na paleta, os pintores
expressionistas buscavam obter a vibração da luz e também pesquisavam os
cambiantes efeitos da luz na atmosfera e nos objetos cotidianos para fixá-los
na tela.
c) A proposta do Expressionismo é de que a arte flua livremente a partir do
inconsciente, da livre associação, com a incorporação de elementos ilógicos do
sonho, da fantasia, sem se submeter a qualquer teoria vigente e a nenhuma
lógica, o chamado nonsense.
d) O artista expressionista é inclinado a deformar a realidade de modo cruel,
caricatural, muitas vezes grotesco, fazendo com que o exagero, a distorção e
a dramaticidade das formas, linhas e cores revelem sua atitude emocional.
e) O movimento expressionista propõe a destruição dos valores burgueses,
utilizando-se do antilirismo para reforçar conceitos da sociedade moderna,
veloz e técnica, expressando manifestações intencionalmente ordenadas e
objetivas.
10. RESP: D - A marca indelével da estética expressionista é a brusca
deformação dos motivos abordados – ironias, caricaturas, situações
grotescas e apelativas. A alternativa A está para o Cubismo; a B pra o
Impressionismo; a C pra o Surrealismo; a E para o Futurismo.
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