ARTIGO DE PROFESSOR DIAGNÓSTICO E REABILITAÇÃO DA DISLEXIA: Uma visão neuropsicológica THE DIAGNOSIS AND REHABILITATION OF DYSLEXIA: a neuropsychological approach Ana Maria Maaz Acosta Alvarez* Aparecida Liberato Caetano** Rute Roman*** Sobre a apropriação da escrita: “E foi nesta época que a palavra veio em minha procura: lá estava eu, sem rosto, sem nome, e ela me tocou, transformando-me para sempre.” Pablo Neruda n RESUMO Este trabalho tem a finalidade de introduzir o conceito de dislexia, rever importantes dados do histórico, relatar o estado da arte das pesquisas, bem como enfocar uma nova abordagem para avaliação e tratamento. UNITERMOS: dislexia, tratamento neuropsicológico, leitura e escrita, distúrbios de aprendizagem. n SUMMARY The purpose of this paper is to introduce dyslexia concept, to review important historical data, to relate the state-of-art of research, as well as to focus a neuropsychological approach to assessment and treatment. KEY WORDS: dyslexia, neuropsychological treatment, reading and writing learning disabilities. * Fonoaudióloga Clínica, Especialista em Linguagem pelo CFFa; Pós-Graduanda em Ciências – Fisiopatologia Experimental – Universidade de São Paulo – USP; Professora do Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica – CEFAC ** Fonoaudióloga Clínica; Ex-Professora do Curso Superior de Especialização em Deficiência Auditiva das Faculdades Metropolitanas Unidas – FMU-USP; Fonoaudióloga Membro do Conselho Executivo da OMEP-SP *** Psicóloga Clínica e Educacional com Cursos de Extensão em Alfabetização e Aquisição da Linguagem; Orientadora e Capacitadora de Professores de Educação Infantil Colaboração das Fonoaudiólogas: Elena Zaidan e Isabel Albuquerque Maranhão de Carvalho 96 DIAGNÓSTICO E REABILITAÇÃO DA DISLEXIA: UMA VISÃO NEUROPSICOLÓGICA n INTRODUÇÃO destas duas modalidades e sua consciência, tanto por parte do adulto como da criança, possibilita a construção de estratégias para o ensino da língua escrita. Escrever requer intensa reflexão sobre as características dos diferentes sons da língua e sua possível correlação com os elementos gráficos a serem utilizados (ALVAREZ, 1998a). Uma vez que a leitura e a escrita resultam de processamentos sensoriais de experiências de hipóteses e de aprendizagem formal, seus processos de aquisição são individuais e culturalmente regulados. Segundo TALLAL (1997), 20% da população apresenta problemas de leitura suficientemente severos para destruir o entretenimento e o prazer que a leitura pode proporcionar. Estas alterações não diminuem com o tempo sem intervenção terapêutica adequada. Assim sendo, pode-se dizer que os distúrbios de leitura e escrita dizem respeito a dificuldades singulares apresentadas pelo indivíduo à apropriação e uso estável e generalizado de linguagem escrita. GALABURDA (1991) considera que tais distúrbios representam um conjunto de sintomas conceituados, diagnosticados e tratados meramente com base em critérios educacionais. Indo mais além, mesmo que este tipo de diagnóstico diferencial leve em conta dados de baixos quocientes intelectuais generalizados, déficits sensoriais e/ou neurológicos evidentes, doenças mentais ou alterações afetivo-emocionais e motivacionais, este tem sido foco de intensa revisão, uma vez que negligencia fatores neuropsicobiológicos envolvidos no processo. Desta forma, torna-se importante salientar que a abordagem contemporânea necessária para o estudo e compreensão deste conjunto de condições abrange, além de dados educacionais e socioculturais, estudos de neuroanatomia, neuroimagem, desenvolvimento cognitivo e organização funcional do cérebro, disciplinas que compõem as Neurociências do comportamento. A forma mais bem estudada de distúrbios de leitura e escrita é a DISLEXIA ou, segundo o DSM-IV, Transtorno de Leitura, onde a comunicação escrita aparece primariamente afetada, embora possa coexistir com problemas de linguagem oral, cálculo, atenção, memória e integração perceptivo-motora. Ainda conforme o DSM-IV, 60% a 80% dos indivíduos que apresentam dislexia são do sexo masculino. Sua prevalência mundial em escolares é de 10%. No Brasil, segundo a Associação Brasileira de Dislexia, a estimativa é similar (NICO, A; BIANCHINI, M; BARREIRA, M., 1998). A linguagem é uma forma de comunicação distintivamente humana, um instrumento interpessoal de transmissão de informações. Os princípios a ela subjacentes regem uma classe ampla, variada e particular do comportamento humano. A linguagem permeia intensamente as relações e individualiza pensamentos e hipóteses que vão se ajustando, de maneira lenta e gradual, a contextos semântico-pragmáticos previamente estabelecidos. “Organiza nossa experiência sensorial e expressa nossa auto-identidade, pensamentos, sentimentos e expectativas” (KANDEL, SCHWARTZ & JESSEL, 1997 p. 506). CHOMSKY (1968) relatou que o ser humano possui um mecanismo inato para a aquisição da linguagem oral, um programa neural específico que o prepara para o aprendizado da língua; um sistema de regras geneticamente determinado, a gramática universal. Sendo assim, acredita-se que aspectos universais da aquisição da linguagem são estabelecidos por esta estruturação inata do cérebro humano que já está preparado para a aprendizagem e utilização da fala como forma eficiente de comunicação. O processamento da linguagem ocorre em estruturas específicas com localizações determinadas e suas evidências têm nos dado os mais apurados indícios sobre a arquitetura funcional do cérebro. Aceita-se, contemporaneamente, que os aspectos cognitivo-verbais seriam mediados pelo hemisfério esquerdo, enquanto que os componentes prosódicos e afetivo-emocionais seriam mediados pelo hemisfério direito. Logo, uma forma eficiente de comunicação exigiria integridade funcional dos dois hemisférios. Historicamente, os seres humanos iniciaram seu processo de comunicação oral há aproximadamente 100 mil anos, muito antes do uso da linguagem escrita, que teve seu início estimado há cerca de 6 mil anos. Embora a utilização sistemática da linguagem escrita ocorra na escola através de um processo formal de aprendizagem (a alfabetização), desde muito cedo a criança constrói uma série de hipóteses sobre a leitura e a escrita e traz este conhecimento dentro de si, reformulando-o progressivamente em função de novos avanços. O progresso do pensamento e da capacidade de raciocinar sobre o fazer, o escutar e o dizer os sons de uma língua interferem e determinam as etapas de aquisição da escrita. Escrever é diferente de falar porque o uso ou a circunstância de uso típica do falar é a conversação, a produção dialógica, enquanto a circunstância de uso típica do escrever é a produção monológica (TOLCHINSKY, 1995). Ao falar, a criança busca uma série de pistas fonológicas, semânticas, cinestésicas e motoras internalizadas para chegar a produzir linguagem autonomamente. Ao escrever, a permanência do escrito possibilita voltar sobre o feito e corrigir a ação. O equilíbrio n DEFINIÇÃO, HISTÓRICO E ESTADO DA ARTE DAS PESQUISAS O distúrbio específico de desenvolvimento — dislexia — constitui um conjunto de sintomas específicos que 97 REVISTA CEFAC: ATUALIZAÇÃO CIENTÍFICA EM FONOAUDIOLOGIA lecer sistemas adequados e eficientes de mapeamento fonológico-gráfico. Então, assim como em outras formas de distúrbios de aprendizagem, a dislexia é um quadro heterogêneo, com manifestações diversas, o que significa que um grande número de estudos neurológicos, lingüísticos e neuropsicológicos ainda deve ser desenvolvido antes que se possa formar uma idéia exata das possíveis correlações existentes entre as evidências anatomofuncionais de cérebros de disléxicos e seus respectivos comportamentos. implicam em disfunções subcorticais e corticais, freqüentemente de origem constitucional, que afetam o aprendizado da linguagem escrita (CAMARGO, 1996). Tais disfunções parecem ser herdadas via mutações nos cromossomos 6 e 15 (ABDULLA, 1998) e podem resultar em distúrbios no processamento auditivo-visual de leitura. LURIA (1966) escreveu que embora determinadas lesões no córtex temporal esquerdo não perturbem a audição, diminuem a habilidade para discriminar estímulos sonoros verbais. Esta alteração leva, inevitavelmente, à desintegração da capacidade de escrever e, dentro de certos limites, a distúrbios de leitura. Demonstrou, ainda, que diferentes tipos de déficit de análise e síntese fonêmica ocorrem em presença de disfunções em regiões parietoocciptotemporais esquerdas e que muitas vezes são acompanhados por distúrbios na base cinética do ato da fala. Alguns estudos mostram disfunções desta natureza mesmo quando as lesões não são aparentes. TALLAL (1997), em seus estudos com crianças disléxicas e não-disléxicas, descobriu que o primeiro grupo era inferior em aprendizagem via modalidade auditiva. Mostrou, então, que os disléxicos sofrem de uma incapacitação primária no processamento auditivo-temporal e que são incapazes de organizar e integrar estímulos apresentados em velocidade aumentada, embora consigam processar os mesmos dados em velocidade mais baixa. BAKKER (1977) estudou a dominância cerebral e a inaptidão para leitura e descreveu correlações entre dominância de orelha e mão e observou, também, que sob audição dicótica há vantagem de orelha esquerda para os leitores inaptos. n ESPECIALIZAÇÃO HEMISFÉRICA Para melhor entender a dislexia e suas diferentes manifestações, faz-se necessário conhecer a maneira pela qual o cérebro humano funciona. Podemos dizer que o nosso cérebro, sede de todos os nossos comportamentos, é composto por duas semi-esferas: o hemisfério direito e o hemisfério esquerdo, os quais mantêm conexões recíprocas. O maior feixe de conexões se constitui no corpo caloso que liga regiões de um hemisfério às suas contralaterais homólogas. A camada exterior de revestimento é chamada de córtex e é extremamente enrugada e plena de circunvoluções, o que lhe confere uma área bastante extensa. Cada tipo de habilidade ou de comportamento vivenciado pode ser melhor relacionado a uma área do cérebro em particular. De uma certa forma, o cérebro pode ser visto como um conjunto de especialistas cooperantes. As regiões posteriores do córtex — os lobos occipitais, são especializados na VISÃO; as regiões laterais — os lobos temporais — na AUDIÇÃO e LINGUAGEM; as partes superiores — os lobos parietais — são responsáveis pelo TATO e INFORMAÇÕES PROPRIOCEPTIVO-CINESTÉSICAS e as áreas situadas na parte anterior, isto é, os lobos frontais, estão mais bem relacionados a FUNÇÕES MOTORAS E PLANEJAMENTO E EXECUÇÃO DE COMPORTAMENTOS COMPLEXOS (Fig. 1). Em termos de funções especializadas, há uma importante diferença entre os dois hemisférios: para a maior parte das pessoas, o hemisfério esquerdo é dominante para o processamento verbal e aspectos cognitivos da linguagem, e o hemisfério direito, para a prosódia e percepção de formas e direção. A dominância cerebral é cruzada para a visão, audição, funções motoras e percepção somática (Fig. 2). Apresentamos, a seguir, o Quadro 1, que é o resumo das principais funções hemisféricas e suas relações com os processamentos sensoriais e funções motoras. É importante frisar, no que diz respeito à audição, que a orelha direita projeta maior quantidade de fibras (2/3) ao hemisfério esquerdo, embora também envie informações GALABURDA (1991) relatou achados de circunvoluções anormais bilateralmente em córtex parietal e corpo caloso mais fino em áreas relacionadas a áreas parietais mencionadas, juntamente com ectopia de neurônios na substância branca subcortical e malformação arteriovenosa envolvendo o vermis do cerebelo. Encontrou, também, distúrbios focais da arquitetura do lobo temporal. GALABURDA, MENARD e ROSEN (1994) descrevem a existência de maior número de neurônios nas áreas posteriores de linguagem do hemisfério direito, de tendência a desenvolvimento anormalmente simétrico dos planos temporais e a presença de vias auditivas atípicas. Relatam, ainda, uma tendência familiar em desenvolver dislexia e maior incidência em canhotos e ambidestros. CHERMAK e MUSIEK (1997) constataram que tanto o esplênio, parte posterior do corpo caloso, quanto a ínsula são menores em disléxicos e em portadores de distúrbios de aprendizagem. ABDULLA (1998) menciona dados de hipoatividade da ínsula esquerda de indivíduos disléxicos. Segundo ela, esta estrutura poderia ser a matriz das representações fonológicas: a diferença entre indivíduos normais e disléxicos resultaria, então, de deficiências no processamento perceptivo-lingüístico que impediriam os disléxicos de estabe- 98 DIAGNÓSTICO E REABILITAÇÃO DA DISLEXIA: UMA VISÃO NEUROPSICOLÓGICA Planejamento e execução de funções complexas Lobo frontal Lobo frontal Lobo pariental tato Lobo pariental tato Lobo occiptal visão Lobo temporal audição Lobo temporal audição Lobo occiptal visão Figura 1. homolaterais (1/3). O mesmo é válido para a orelha esquerda com relação ao hemisfério direito. Com relação à VISÃO, há uma distinção importante na delimitação dos campos visuais direito e esquerdo, uma vez que as fibras ópticas se cruzam no quiasma. Quadro 1. Controle do corpo Corpo caloso H.E. H.D. Figura 2. 99 Controle do lado esquerdo do corpo Controle do lado direito do corpo · Hemisfério, em geral, dominante para a prosódia e aspectos afetivo-emocionais da fala · Hemisfério, em geral, dominante para os aspectos verbais e cognitivos da Linguagem · Análise meticulosa de formas, espaço e direções · Processamento temporal · Representação e planejamento viso-espacial · Pensamento lógico · Criatividade, imaginação · Conceitos matemáticos · Emoções · Programação e execução seqüencial · Início de tarefas · Automatização de tarefas REVISTA CEFAC: ATUALIZAÇÃO CIENTÍFICA EM FONOAUDIOLOGIA Campo visual esquerdo Retina Retina Hemisfério direito Hemisfério esquerdo Corpo caloso Quiasma óptico Esquerdo Direito Figura 3. Podemos definir os campos visuais direito e esquerdo como as áreas que ficam à direita e à esquerda do ponto de fixação para o qual o sujeito está olhando. É necessária a integração direita e esquerda para a focalização de pontos de fixação (Fig. 3). Examinando a habilidade de ler, podemos afirmar que a leitura é uma tarefa bi-hemisférica, uma vez que solicita estratégias de hemisfério esquerdo, PROCESSAMENTO COGNITIVO-VERBAL, e de hemisfério direito, PROSÓDIA e PERCEPÇÃO DE FORMAS E DIREÇÃO. Em outras palavras, a prontidão para a leitura e escrita exige a organização de diferentes sistemas sensoriais, incluindo a integração de dados auditivos e relações semântico-contextuais com informações visuais experimentadas através da convergência ocular, direção e orientação espacial, bem como de mecanismos perceptivos de velocidade, contraste, cor e forma. n ORGANIZAÇÃO FUNCIONAL DO CÉREBRO E LEITURA Ler implica em focalizar pontos no espaço gráfico, movimentar coordenada e harmonicamente a musculatura 100 ocular à medida que se esquadrinha a página, e em buscar, paulatinamente, relações estáveis de compreensão. Durante a leitura, o movimento dos olhos se efetua aos saltos, de um ponto de fixação para outro, seguidamente. O leitor experiente dá poucos saltos e se utiliza de menos pontos de fixação. Logo, é o que tem maior campo visual periférico. Quando se lê um texto, as palavras são apresentadas aos campos visuais simultaneamente e são então projetadas, ao mesmo tempo, para os dois hemisférios. Após a ativação do córtex visual esquerdo e direito, torna-se claro que o cérebro é recrutado como um todo para perceber, discriminar, compreender e articular. Mesmo assim, certas áreas mostrarão maior atividade que outras. No leitor adulto, o hemisfério esquerdo está mais envolvido com a leitura comum, cotidiana, de conteúdo conhecido; o hemisfério direito participa, mas em menor grau. Com material de leitura não usual, perceptualmente complexo, há recrutamento de maior atividade do hemisfério direito. Para crianças em processo de alfabetização, letras, palavras e sentenças constituem material perceptualmente complexo e, portanto, neste momento, o hemisfério direito desempenha papel mais ativo. Na medida em que as letras DIAGNÓSTICO E REABILITAÇÃO DA DISLEXIA: UMA VISÃO NEUROPSICOLÓGICA e palavras tornam-se familiares, a leitura fica mais rápida e é baseada na experiência de linguagem que a criança adquiriu, isto é, leitura significativa. Neste momento, o hemisfério esquerdo é o mais ativo. Com base em resultados obtidos em estudos com potencial evocado em crianças e adultos, BAKKER (1990) concluiu que em adultos as palavras apresentadas no hemicampo visual DIREITO são lidas com maior precisão e velocidade, isto é, o campo visual direito é superior para esta tarefa. Assim, o hemisfério ESQUERDO mostra maior atividade. Em crianças, a ativação cerebral para a leitura só muda após os 7 anos de idade. Logo, durante o período de instrução formal da alfabetização, a estimulação visual deve ser feita no campo visual esquerdo para estimular o hemisfério direito. Na audição, assim como na visão, os componentes verbais e não-verbais parecem ser funcionalmente distintos (KIMURA,1961b). O processamento e a integração das informações auditivas são básicos para a leitura. Ler em voz alta envolve tanto áreas cerebrais de leitura como de fala. A leitura silenciosa exige subvocalização e resgate de informação auditiva estocada em memória de curto prazo. n DIAGNÓSTICO Em vista do acima exposto, parece-nos adequado afirmar que a dislexia exibe múltiplas manifestações e distintos níveis de acometimento e, assim sendo, uma abordagem multidisciplinar, que enfoque o disléxico, com seus déficits e potencialidades, será a mais produtiva e conveniente. Ao fonoaudiólogo, membro integrante desta equipe, cabe a tarefa de avaliar as atividades acadêmicas, as habilidades fonológicas, o processamento auditivo-lingüístico e o estilo de leitura. Este último pode ser obtido através da análise de critérios de velocidade e ritmo, e da verificação dos tipos de erros apresentados (substituições, omissões, inserções ou contaminações de palavras, sílabas ou letras). O protocolo de exame da função auditiva deve incluir tanto os testes monoaurais de baixa redundância, que fornecem dados sobre as habilidades auditivas, quanto os dicóticos de palavras, que dão indícios seguros sobre a maturidade das áreas corticais auditivas e suas conexões intra-hemisféricas. Incluem-se, também, os testes não-verbais de padrões temporais seqüenciais que avaliam a função hemisférica direita, a integridade de corpo caloso e a conceituação auditivo-lingüística. Sempre que necessário, recorre-se a medidas eletrofisiológicas como avaliação complementar ou alternativa à avaliação comportamental. Os testes de audição dicótica de palavras têm se mostrado críticos para a análise e diagnóstico diferencial de subperfis de dislexia (ALVAREZ, 1998b). 101 Os resultados dos exames de processamento auditivo central de disléxicos revelam déficit de decodificação fonêmica, associação auditivo-lingüística, integração inter-hemisférica (disfunção ou imaturidade de corpo caloso), organização da saída (eferência) (Bellis, 1996;) e função não-verbal (Quadro 2) (TOMPKINS, 1995; ALVAREZ et al. 1999). A reunião de dados comportamentais, de histórico clinicodesenvolvimentista, de processamento auditivo-lingüístico, de habilidades fonológicas e de exame de leitura possibilitam a descrição de três tipos ou subperfis de disfunção: de compreensão ou lingüística; viso-construtiva ou não-verbal; e mista, com características dos dois tipos anteriores. n CLASSIFICAÇÃO E REABILITAÇÃO Já se sabe que podemos separar criteriosamente os disléxicos em, pelo menos, três subperfis. Durante a leitura, os disléxicos de compreensão e os viso-construtivos usam, predominantemente, estratégias de hemisfério direito e esquerdo, respectivamente. Em outras palavras, quando os disléxicos de compreensão lêem, o equilíbrio da atividade cerebral se dirige ao hemisfério direito, enquanto que nos disléxicos viso-construtivos, a atividade cerebral desloca-se para o hemisfério esquerdo (BAKKER,1990). n DISFUNÇÃO VISO-CONSTRUTIVA OU NÃO-VERBAL A disfunção viso-construtiva ou não-verbal é o tipo de dislexia onde a ativação hemisférica é muito maior no HEMISFÉRIO ESQUERDO. Este fato decorre de extrema superioridade de funções de hemisfério esquerdo ou de disfunção de hemisfério direito. Desta forma, a leitura apresenta-se rápida e imprecisa, uma vez que a criança utiliza-se, principalmente, de estratégias de hemisfério esquerdo, prevalecendo, assim, o significado e o contexto como pistas de atuação. Diante do material escrito, o sujeito muitas vezes não termina a leitura, tentando sempre adivinhar o final, inserindo palavras e sílabas, desenvolvendo uma leitura impulsiva. Esta ação favorece erros reais, como omissões, adições e substituições de letras, sílabas e palavras. Observa-se que, sob audição dicótica, há vantagem auditiva de orelha direita, (acima do esperado) mostrando maior ativação de hemisfério esquerdo, onde, nestes indivíduos, a linguagem verbal é processada. Este tipo de disléxico faz uso predominantemente de estratégias lingüísticas durante a leitura, muitas vezes devido à ativação precoce destas técnicas durante o processo de aprendizagem da leitura, ou por disfunção nãoverbal (disfunção de hemisfério direito). Não são necessariamente habilidosos em linguagem: os aspectos cogniti- REVISTA CEFAC: ATUALIZAÇÃO CIENTÍFICA EM FONOAUDIOLOGIA Quadro 2. Distúrbios de P.A.C. e suas correlações com dislexia (Bellis, 1996; Ferre, 1997, expandido por Alvarez, 1998b, 1998c e 1999) Déficit Funções Alteradas Achados Clínicos Direções Gerais para a Reeducação Decodificação Auditiva Reconhecimento de sons isolados, sílabas e/ou palavras ouvidas. Fechamento auditivo e figura-fundo. Atenção seletiva Performance rebaixada em testes monoaurais de baixa redundância. Tempo de latência aumentado para a apresentação de respostas Otimização do sinal acústico. Desenvolvimento de atenção seletiva, treinamento auditivo-fonêmico com pistas complementares de diferentes modalidades sensoriais. Estimulação específica para funções de hemisfério esquerdo Integração Auditiva Reconhecimento de padrões gestálticos da palavra e frase. Leitura lenta, silabada, com substituição de palavras semelhantes no contorno visual. Tarefas que incluam duas ou mais modalidades sensoriais: uso de linguagem simbólica e habilidades musicais Grande número de erros em orelha esquerda competitiva (ou não-dominante) sob escuta dicótica e baixa eficiência bilateral em testes que envolvem repetição de padrões temporais não-verbais com respostas verbais Estimulação de transferências inter-hemisféricas, motora e lingüisticamente. Exercícios corporais de dissociação de movimentos no tempo e espaço. Funções de linguagem receptivo-pragmática. Reconhecimento de palavras homônimas e metáforas. Baixos resultados bilaterais em escuta dicótica com sons verbais; evocação rebaixada a partir de pistas semânticas; categorização reduzida Desenvolvimento de Linguagem combinando estratégias compensatórias de diferentes modalidades. Utilização conjunta de pistas fonológicas e semânticas para ativação da compreensão Inabilidade em seqüenciar, planejar e organizar respostas com mais de dois elementos importantes. Similar ao déficit de Associação, incluindo treino de habilidades de organização, seqüencialização e imagem articulatória. Ensaios verbais anteriores à escrita Associação Auditiva Baixa compreensão de instruções orais e leitura (repete o que ouve ou lê, mas não compreende) Uso de uma modalidade sensorial concomitante à verbalização com controle de estimulação. Técnicas para estimulação de hemisfério direito e esquerdo Memória de curto prazo Organização da Saída Seqüencialização, planejamento e organização de resposta (sistema eferente). Padrões motores, em geral, aparecem afetados Escrita geralmente mais comprometida que leitura. Atenção sustentada e memória Função Não-Verbal Identificação e utilização dos aspectos prosódicos de enunciados relacionados ou não a pistas não-verbais, expressões faciais, corporais e gestos. Habilidades musicais e/ou habilidades auditivas nãoverbais. Reflexos estapedianos contralaterais alterados, baixíssima resistência a estímulos interferentes. Inabilidades para nomeação rápida Dificuldade de reconhecimento de padrões não-verbais (DPS, PPS) tanto em mímica como em nomeação. Como no déficit de integração, há inabilidade de reconhecimento de padrões gestálticos. Como no déficit de associação, há dificuldade em entender sarcasmos, frases ambíguas e homônimos. Presente em dislexias viso-construtivas ou não-verbais 102 Desenvolvimento de habilidades de linguagem pragmática e de comportamento social, bem como treino prosódico da fala, de percepção de tonicidade e duração; estratégias para estimulação de hemisfério direito e vivência de aspectos afetivo-emocionais DIAGNÓSTICO E REABILITAÇÃO DA DISLEXIA: UMA VISÃO NEUROPSICOLÓGICA vo-lingüísticos dominam, mas domínio e eficácia são atributos bastante diferentes. Processo Terapêutico Nestes casos, o processo terapêutico deve enfocar a estimulação específica de hemisfério direito via campo visual esquerdo e mão esquerda, além de estimulação hemisférica alusiva de hemisfério direito, de treino de prosódia e de reconhecimento de padrões afetivo-emocionais da fala. A estimulação táctil-cinestésica específica pode ser realizada através do uso de “caixas tácteis” e quadros de encaixe de formas e letras, com formas geométricas e letras de diferentes materiais para palpação. Serão manuseadas formas, letras, palavras e sentenças com a mão esquerda, que deverão ser, primeiramente, identificadas pelo tato, executadas gestualmente no espaço e, depois, nomeadas em voz alta. Quando em sentenças, oferece-se as palavras uma a uma, tentando-se, assim, minimizar o efeito adivinhatório. Devem ser usadas palavras pouco comuns e formas geométricas não convencionais. Uma vez lido o texto, a criança faz exercícios escolhidos e modificados para garantir que o desafio perceptual prevaleça. Exemplo: Veremos, a seguir, um grupo de letras maiúsculas e minúsculas. Descubra a palavra que está escrita só com as letras maiúsculas. Faça o mesmo com as minúsculas: ANplMatALo ApNlaMAtLo LIsMOuNAcoDA Ache as palavras ordenando as letras da menor para a maior: O i P q 1. Comparar uma forma, letra ou palavra palpada com quatro diferentes figuras ou palavras apresentadas visualmente. Colocam-se as seguintes questões: a. Qual palavra ou figura é equivalente à palavra que você acabou de sentir? (as palavras devem apresentar diferenças nas letras finais, obrigando o sujeito a analisar cuidadosamente sem adivinhar.) b. Qual das palavras que você sentiu é igual à palavra ou figura que você pode ver aqui? (são usadas palavras com letras perceptualmente complexas, que só se diferem na posição final). 2. Identificar formas geométricas ou desenhos feitos na mão esquerda. Na estimulação alusiva, deve-se utilizar textos e tarefas que solicitem trabalho preferencial de hemisfério direito. As atividades devem ser coerentes com o nível de habilidade do indivíduo e o material a ser usado deve ser planejado especial e cuidadosamente de acordo com o tipo de dislexia. Neste caso, uma vez que o objetivo é evitar uma leitura imprecisa, os textos devem acentuar ao máximo os aspectos perceptuais. Para tanto, pode-se modificar a tipografia do texto, escrevendo-se, por exemplo, uma palavra com vários tipos e tamanhos de letras, tendo as ilustrações como opcionais. O critério fundamental é que o texto seja perceptualmente complexo, porém legível. 103 F U Esta caixa contém cinco letras maiúsculas. Pinte cada letra com uma cor diferente e descubra a palavra que pode ser escrita com elas: T Sugestões de Atividades Adicionais R o i i s h a b A f n R u O j g l e e o p n DISFUNÇÃO DE COMPREENSÃO OU VERBAL Conforme foi explicado anteriormente, a criança deve iniciar a aquisição da leitura utilizando-se de estratégias mediadas pelo hemisfério direito. Porém, a leitura inicial vai se tornando necessariamente mais fluente e avançada. Nesta fase, o hemisfério esquerdo passa a dominar a ação. Se este progresso não ocorre, o leitor pode desenvolver a DISFUNÇÃO DE COMPREENSÃO. Observa-se neste tipo de dislexia, ao contrário da dislexia de decodificação, que o hemisfério direito é o mais ativado e/ou há uma disfunção de hemisfério esquerdo. A leitura apresenta-se lenta, mas contínua, do tipo vagarosa, repetitiva, onde prevalece a percepção da forma como pista de atuação. Este comportamento proporciona erros do tipo: leitura fragmentada, silabada, lenta com ritmo ou boa entoação, mas repetitiva, com repetição de unidades como apoio para a continuação. Observa-se que a linguagem falada é processada bilateralmente, ou no hemisfério direito. Os disléxicos de compreensão fazem uso predominantemente de técnicas perceptuais durante a leitura devido à REVISTA CEFAC: ATUALIZAÇÃO CIENTÍFICA EM FONOAUDIOLOGIA maior ativação contínua de HEMISFÉRIO DIREITO, com prejuízos na compreensão do material lido. Podemos suspeitar de HEMISFÉRIO DIREITO superdesenvolvido, imaturidade de HEMISFÉRIO ESQUERDO e má função de corpo caloso. Processo Terapêutico A estimulação eficiente deve ser alusiva de hemisfério esquerdo e, específica para hemisfério esquerdo via mão direita. Esta estimulação deve ser táctil-cinestésica, sempre trabalhando com a mão DIREITA. Um exemplo de atividade é o uso de prancha ou caixa de encaixe com letras simples para palpação. São usadas letras do mesmo material para a palpação. Tais letras devem ser identificadas pelo tato e lidas em voz alta. No trabalho com sentenças, este tipo de disléxico deve sentir as palavras e nomeá-las somente com a leitura completa da frase (pista semântica). São usadas palavras familiares, com um só tipo de letra. Outras Atividades 1.1. Comparação e pareamento de quatro elementos seguindo as seguintes questões: a. Qual palavra ou figura vista quer dizer a mesma coisa do que você acabou de sentir? b. Qual das palavras que você acabou de sentir significa o mesmo que você está vendo ou ouvindo? c. Qual das palavras que você sentiu serve para? d. Qual das palavras que você sentiu completaria esta frase? 1.2. Identificação de palavras sentidas pelos dedos com uma ou mais letras ausentes. Coloca-se, assim, um desafio, onde o sujeito deve arriscar a resposta, utilizando-se de técnicas adivinhatórias complementadas pelo pensamento operatório. 1.3. Identificar letras simples ou palavras abstratas escritas na palma da mão direita em letra de forma maiúscula. 1.4. Usar palavras que contenham seriação diferente das mesmas letras: VAI-VIA; LAMA-ALMA 1.5. Identificar a posição serial de letras numa palavra palpada. 1.6. Treino de percepção temporal na mão direita. Análise e síntese de palavras e sentenças curtas. 1.7. Determinação de significado de palavras familiares que contenham letras inteiramente, ou em parte, apagadas. 104 A estimulação alusiva é trabalhada com textos de leitura a serem oferecidos aos disléxicos de compreensão, impressos com tinta preta sobre papel branco, com um tipo de letra bastante familiar à criança, de forma a evitar qualquer desafio perceptual. É preferível evitar ilustrações. Com o objetivo de desenvolver habilidades semânticas, podemos oferecer diferentes exercícios que solicitem a compreensão do material lido. Por exemplo, um texto é preparado com ausência proposital de algumas palavras, e a criança deve preencher as lacunas. Da mesma forma, durante a leitura, pode-se perguntar à criança o significado de algumas palavras, ou, após a leitura do texto, pergunta-se sobre o conteúdo da história lida. (É preferível perguntar o significado de palavras que a criança leu hesitando ou silabando.) Os estímulos devem ser tais que a leitura fluente seja encorajada através do uso de características simbólicas e semânticas do texto. O objetivo dos exercícios é aumentar a habilidade fonética, semântica e sintática da criança. Exercícios de rima são bastante ricos para este propósito, assim como completar textos inacabados, iniciar textos com finais e personagens definidos, ordenar palavras para a formação de sentenças, incluir ou excluir palavras de conjuntos com critérios semânticos. Exemplos: ❑ Escreva as palavras que não pertencem a estes conjuntos: 1. PAI TIA VIZINHO 2. LÁPIS PENTE CANETA ❑ Ordene as palavras e forme uma sentença com sentido: AO BUSCAR FOMOS ONTEM AEROPORTO VOVÓ. ❑ Fale (ou escreva) palavras que rimem com estas: MÃO, SABÃO ______________ BOLA, COLA _______________ ❑ Complete com uma palavra que rime: NÃO GOSTO DE ARROZ COM FEIJÃO. PREFIRO COMER ____________ PEDRINHO É FORTE E VALENTE. ELE EMPRESTOU O SEU _______ ❑ Complete os espaços em branco: a. João era um________ muito esperto que jogava ________. Um belo dia, ele foi buscar a bola e viu, na árvore, um___________ muito grande. Não sabendo o que fazer,__________ e, então, muitas pessoas apareceram correndo. Ele quase não conseguia ____________ mas _______________________________________________ _______. DIAGNÓSTICO E REABILITAÇÃO DA DISLEXIA: UMA VISÃO NEUROPSICOLÓGICA b. Mabel e Mara eram ___________muito bondosas que brincavam de ____________todos os dias. Sábado de manhã ___________buscar pão para __________. Chegando à __________________ sentiram um __________ muito gostoso de _________ recém-saído do forno. Resolveram, então, __________________. É importante ressaltar que alguns critérios podem nortear a programação do material a ser utilizado no processo de reabilitação tanto da dislexia de decodificação como no da dislexia de compreensão: ❑ se a sessão for semanal, é preferível usar textos que possam ser concluídos em, no máximo, duas sessões; ❑ os referidos textos devem conter sentenças curtas e, em média, palavras pequenas; ❑ é conveniente que as palavras difíceis se repitam através dos textos; ❑ além de textos, podem ser usados jogos e exercícios lingüísticos de tal forma que a sessão fique estruturada com, aproximadamente, 20 minutos de leitura e 10 minutos de exercícios lingüísticos com o restante do tempo disponível para um jogo. Concluindo, um disléxico de decodificação deve palpar palavras e sentenças com os dedos da mão esquerda (indicador e médio), usando palavras referentes a substantivos pouco freqüentes, sendo obrigados a usar critérios de comparação, procurando figuras ou palavras que digam respeito à palavra sentida (letras perceptualmente difíceis). A terapeuta deve se assegurar de que o sujeito não adivinhe antes de sentir a última letra. Um disléxico de compreensão recebe a informação via dedos da mão direita. É apropriada a nomeação de letras, assim como o são questões que dizem respeito à posição de letras na palavra ou de palavras nas sentenças. Pode-se deixar o sujeito sentir a palavra PAI e depois perguntar se ele sentiu VAI, CAI ou PAI. (Apresentação oral ou escrita.) Atividades de seriação e posição são consideradas apelos extras ao HEMISFÉRIO ESQUERDO. Este conceito é baseado no fato de que para a maioria das pessoas a percepção temporal do material verbal é controlada primariamente pelo HEMISFÉRIO ESQUERDO. Parece-nos óbvio que se exercitarmos outras funções típicas de HEMISFÉRIO ESQUERDO, estaremos ativando-o, embora isto não tenha sido demonstrado conclusivamente (BAKKER,1990). n DISLEXIA MISTA São observados neste tipo de dislexia características tanto da dislexia não-verbal quanto da de compreensão. 105 Cabe ao fonoaudiólogo identificar tais características e desenvolver, para elas, estratégias de ativação de hemisfério direito e/ou esquerdo. n CONCLUSÃO “A urgência em tomar decisões colaborativas sobre o meioambiente mundial, a tecnologia e os recursos naturais irão nos compelir a novas maneiras de trabalhar conjuntamente. A organização tribal deve dar lugar à global... Pessoas de todos os lugares vão ter que se exigir muito mais. Para o futuro, quem quiser ser brilhante deve ser guiado pela luz do aprendizado, a verdadeira Tocha” (W.A. Henry III in “The Century Ahead: Ready or Not here it comes” Revista Time, Edição Especial, p. 29 “Adiante do ano 2000: o que esperar no novo milênio”,1992). E, a caminho do novo milênio, impõem-se mudanças. Autores como VYGOTSKY e FEUERSTEIN trabalharam com comunidades que sofreram deprivação cultural; tais comunidades representavam o espelho da população. Perceberam, cada um no seu caminho de pesquisa que, em alguns anos, essa população poderia assumir a posição de culturalmente atuante (APUD — SHARRON, 1994). Como? Com Educação apropriada. Então como educar/habilitar indivíduos disléxicos, pessoas com dificuldades de aprendizagem, alunos diferentes? A resposta é a mesma: educação apropriada, pensada, planejada e elaborada, levando-se em conta as necessidades do indivíduo e da comunidade na qual está inserido. O uso de tecnologias avançadas como o computador, tanto auxiliam na identificação de preditores cognitivos de dificuldades, como na intervenção, possibilitando o uso de softwares adequados para atividades de instrumentalização. Enfim, temos a oportunidade de desenvolver sistemas mediadores da atividade do indivíduo: para VYGOTSKY, a linguagem, e para FEUERSTEIN, o potencial “escondido” (APUD — SHARRON, 1994). Ambos ressaltaram as habilidades do indivíduo muito mais do que suas limitações. Educar a criança segundo a natureza do seu distúrbio, valorizando suas qualidades e ressaltando seu bom desempenho em diferentes áreas, é um meio sábio de torná-la ativa, interessada e responsável em melhorar o seu desempenho. A ênfase deve ser dada, também, na importância de uma prática educacional conhecedora dos processos que envolvem o aprendiz e na consciência que os agentes de educação devam ter, consciência esta que lhe permita atuar em sala de aula/reeducação de maneira autônoma, independentemente da metodologia utilizada e da abordagem teórica adotada. E, uma vez assumido que todos nós, dentro de nossas potencialidades, podemos aprender a partir do que vemos, ouvimos, sentimos, tocamos e fazemos, é de vital impor- REVISTA CEFAC: ATUALIZAÇÃO CIENTÍFICA EM FONOAUDIOLOGIA tância o estabelecimento do setting escolar/terapêutico, a determinação da natureza da tarefa, a instrumentalização do indivíduo a partir de estratégias compensatórias e a adequação, primeiramente, do meio ao indivíduo e, então, do indivíduo ao meio. Esse conjunto de medidas, somado à “anima” do professor/terapeuta, constitui o elemento chave da aprendizagem/reabilitação bem sucedida. n BIBLIOGRAFIA ABDULLA, S. — Left Hemisphere of the brain is underactive in dyslexic people; BMJ, 316:1185, 1998. ALVAREZ, A.M.M.A. — Processamento auditivo central: intervenção e reeducação em dislexia; Conferência - III Simpósio Internacional de Dislexia. São Paulo - SP, 1998a. ALVAREZ, A.M.M.A. — Reabilitação neuropsicológica dos distúrbios de leitura e escrita; Conferência - I Jornada Paulista de Reabilitação Cognitiva. São Paulo - SP, 1998b. ALVAREZ, A. M. M. A. & CAETANO, A.L. — Central auditory processing: early intervention and management“ — Proc. XXIV IALP Congress; Amsterdam, 1998. ALVAREZ, A M.M. A.; BALEN, S. A.; MISORELLI, M.; SANCHEZ, M. — Processamento auditivo central: proposta de avaliação e dignóstico diferencial; Atheneu- São Paulo-SP, 1999, (no prelo). BAKKER, D.J. — Neuropsychological treatment of dyslexia. Oxford Univ. 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