LITORAL/INTERIOR: CLIVAGEM COM SENTIDO?
VARIAÇÕES POPULACIONAIS INTER-CENSITÁRIAS NAS ÚLTIMAS DUAS
DÉCADAS
Estela Alegria, CCDRN1
Resumo
Testámos econometricamente, a nível concelhio, para o Continente, o modo
como as variações populacionais na década de 1981/91 e na de 1991/2001 se
tinham relacionado com: (1) a densidade demográfica de partida; (2) a
concentração urbana de partida (medida pelo indicador “população residente
em lugares de mais de 2000 habitantes); e (3) a variação do emprego no
mesmo período.
No período 1981/1991, as duas primeiras variáveis apareciam como
explicativas (a mais de 80%) das variações populacionais, segundo regressões
quadráticas (em parábola). A variação do emprego aparecia com uma
correlação ainda maior (superior a 90%). Fizemos então o exercício de dividir o
País em Litoral e Interior, repetindo as regressões para cada um destes subespaços e os resultados foram surpreendentes: no sub-conjunto dos concelhos
do Litoral, o poder explicativo das variáveis testadas era ainda maior; para todo
o Interior, pelo contrário, obtivemos uma nuvem de pontos desformatada, tendo
subjacente uma correlação quase nula, mesmo para o factor emprego.
Para o período 1991/2001, os resultados foram substancialmente diferentes:
mesmo tomando todo o Continente, a densidade demográfica e a concentração
urbana de partida perderam o poder explicativo relativamente às variações
demográficas; as variações no emprego, pelo contrario, surgem ainda mais
correlacionadas com as variações populacionais do Interior que as do Litoral.
Como factores explicativos das ocorrências observadas podemos citar a
procura de melhores condições de vida, a melhoria das acessibilidades e o
emprego, este último assumindo uma relevância cada vez mais acrescida.
1
Comissão de Coordenação e Desenvolvimento da Região do Norte
Abstract
We tested econometrically, for the municipalities of inland Portugal, the way
populational changes in the decades of 1981/91 and 1991/2001 were related
with: (1) initial demographic density; (2) initial urban concentration and (3)
employment.
In the period 1981/91, the two first variables explained (at more than 80%) the
subsequent populational changes, following quadratic regressions. The
statistical changes of employment in the same period presented an even
stronger correlation (more than 90%). Then we made the exercise of dividing
the country in Littoral and Interior, we repeated the regressions for each of
these spatial divisions and we reached surprising results: in the group of
municipalities of the Littoral, the explanational power of the tested variables was
even greater; for the Interior, on the contrary, we obtained an unformatted cloud
of points, corresponding to an almost null correlation, even for the factor
employment.
For the period 1991/2001, the results were substantially different: even for the
whole mainland, the initial density and urban concentration lost a lot of their
explanational power in relation to demographical changes; the changes in
employment, on the contrary appear now more thoroughly correlated with the
populational changes in the Interior than in the Littoral.
As explanational factors of the observed facts we may mention the search of
better living conditions, the progresses in accesses and employment, the latter
assuming more and more emphasis.
2
1 - Introdução
O ponto de partida para o presente trabalho foi a questão de tentar saber das
implicações da densidade populacional e concentração urbana de início do
período, bem como das variações do emprego, sobre as variações
demográficas nas décadas de 80 e 90, a nível concelhio, para o Continente. A
esta questão juntou-se uma outra, que consistiu na tentativa de averiguação da
situação, face aos mesmos indicadores, no Litoral e no Interior do País,
participando assim na discussão sobre as clivagens existentes ou o seu
esbatimento.
A não existência de “acidentes” a nível demográfico nestas duas décadas
permitem-nos um mínimo de segurança no tratamento econométrico das
variáveis em presença2.
Quanto à divisão adoptada entre “Litoral” e “Interior”, esta foi delimitada
segundo um padrão “clássico” referido à acessibilidade em relação à costa. De
outro modo, i.e., se utilizássemos factores de caracterização demográficos e
económicos, cairíamos em sobreposições indesejáveis com as variáveis que
queremos analisar. A delimitação foi feita por NUTS III, classificando como do
Litoral as que confinam com o mar e aquelas cujo concelho “principal” (o de
maior população em 1991) dista menos de 60 kms de Lisboa ou do Porto
(cerca de meia hora em estrada rápida), e como do “Interior” as restantes. A
discriminação da metodologia utilizada e consequente divisão geográfica é
apresentada no Anexo I.
Nos capítulos seguintes, procede-se à apresentação dos resultados obtidos
para as diferentes variáveis, períodos temporais e subdivisões espaciais,
relegando para anexo a expressão matemática desses resultados.
Conclui-se com um capítulo de análise global, aventando os principais factores
de influência nas movimentações demográficas detectadas.
2
Por exemplo, na década de 70, com o enorme fluxo de “retornados” do Ultramar, uma análise deste tipo
seria mais problemática.
3
2 - Análise da influência da densidade populacional de partida nas
variações demográficas
2.1 – 1981/91
Na década de 80, as variações demográficas concelhias relacionaram-se
(R2=72,9%) com a densidade populacional de partida mediante uma parábola,
com decréscimos acentuados para os dois concelhos de maior densidade –
Lisboa e Porto. Ou seja, as pessoas optaram por concelhos de maior
densidade populacional, mas só até certo ponto. Densidades demasiado
elevadas acabaram por “afugentar” população. Assim, Lisboa apresenta a
máxima densidade e a máxima variação negativa, reflectindo as grandes
perdas demográficas da cidade consolidada.
Continente
0
2000
4000
6000
8000
10000
Loures
50000
Sintra
Seixal
Variação da População 1981-1991
Amadora
Almada
Oeiras
0
Barreiro
Porto
-50000
-100000
R Sq Quadratic =0,729
Lisboa
-150000
0
2000
4000
6000
8000
10000
Densidade 1981
Os concelhos que mais se afastam da curva traçada para o Continente
pertencem às zonas de influência Metropolitana de Lisboa e do Porto3. Assim
temos acima da curva, i.e., com ganhos de população mais acentuados, os
concelhos de Loures, Sintra, Seixal e Amadora. Abaixo da curva encontramos
3
Sobre as “delimitações” das Conurbações Metropolitanas de Lisboa e Porto, ver PORTAS et allii, 2004,
pp. 24 a 55.
4
o Barreiro (decréscimo populacional), Almada, Oeiras, Espinho e S. João da
Madeira4 (crescimento pouco significativo).
Obtemos uma parábola parecida se tomarmos apenas os concelhos do Litoral,
sendo a correlação ainda mais forte que no gráfico anterior.
Aproveitamos para assinalar mais alguns concelhos, todos pertencentes às
conurbações metropolitanas de Lisboa e Porto.
Litoral
Loures
50000
Sintra
Seixal
Vila Nova de Gaia
Amadora
Variação da População 1981-1991
Matosinhos
São João da Madeira
0
Espinho
Porto
-50000
-100000
R Sq Quadratic =0,735
Lisboa
-150000
0
2000
4000
6000
8000
10000
Densidade 1981
Pelo contrário, se nos restringirmos aos concelhos do Interior, a densidade de
partida perde todo o seu poder explicativo (R2=0,05%) – com densidades
semelhantes em 1981, verificam-se comportamentos completamente díspares
quanto às variações populacionais na década.
Compare-se, por exemplo,
Évora e Chaves, com densidades de partida semelhantes, o primeiro com um
marcado crescimento populacional e o segundo com acentuado decréscimo.
4
Estes dois últimos concelhos não foi possível assinalar na figura, por sobreposição de imagens.
5
Interior
Évora
Variação da População 1981-1991
2000
Entroncamento
Benavente
0
Peso da Régua
Mesão Frio
-2000
-4000
Chaves
-6000
R Sq Quadratic =0,051
Covilhã
-8000
0
200
400
600
800
1000
Densidade 1981
2.2 – 1991/2001
Se desenharmos para a década seguinte, para as mesmas variáveis, uma nova
parábola, esta não apresenta qualquer poder explicativo: R2=42,2%, se
considerarmos a totalidade dos concelhos do Continente, R2=41,4% para os
do Litoral e R2=0,11% para os do Interior).
Continente
150000
Variação da População 1991/2001
Sintra
100000
50000
Vila Nova de Gaia
0
Amadora
Barreiro
Porto
-50000
R Sq Quadratic =0,422
Lisboa
-100000
0
2000
4000
Densidade 1991
6
6000
8000
Litoral
150000
Variação da População 1991- 2001
Sintra
100000
50000
Vila Nova de Gaia
0
Amadora
Barreiro
Porto
-50000
R Sq Quadratic =0,414
Lisboa
-100000
0
2000
4000
6000
8000
Densidade 1991
Interior
Viseu
10000,00
Variação da População 1991-2001
8000,00
Ourém
6000,00
Guarda
Benavente
4000,00
Entroncamento
Vila Real
2000,00
0,00
Mesão Frio
Lamego
-2000,00
R Sq Quadratic =0,114
Peso da Régua
Abrantes
-4000,00
0,00
200,00
400,00
600,00
800,00
Densidade 1991
7
1000,00
1200,00
3 - Análise da influência da concentração urbana de partida nas variações
demográficas
O indicador de que dispomos para a concentração urbana é o da População
Residente em Lugares de mais de 2000 habitantes.
3.1 - 1981/91
Estamos de novo perante um comportamento em parábola, e com um poder
explicativo reforçado: R2=83,7% para todos os concelhos e R2=85,5% para os
concelhos do Litoral.
Continente
Loures
50000
Sintra
Variação da População 1981-1991
Seixal
0
Porto
-50000
-100000
R Sq Quadratic =0,838
Lisboa
-150000
0
200000
400000
600000
800000
1000000
População em Lugares de >2000 habitantes - 1981
8
Litoral
Loures
50000
Sintra
Variação da População 1981-1991
Seixal
0
Porto
-50000
-100000
R Sq Quadratic =0,856
-150000
0
200000
400000
600000
800000
1000000
População em Lugares de >2000 habitantes - 1981
Quanto aos concelhos do Interior, por si sós, não encontramos nenhuma
relação entre a densidade urbana de partida e as variações demográficas
“subsequentes”. Por outras palavras: nesta matéria, o Interior só aparece
explicado quando tomado conjuntamente com o Litoral. Isto significa que
pequenas diferenças de densidade, no interior, não são suficientes para
desencadear processos diferenciais de comportamento demográfico (variação
de população). Dito de outro modo, e tendo em atenção as observações
Interior
Entroncamento
Variação da População 1981-1991
2000
Évora
Benavente
Viseu
Santarém
0
Castelo Branco
Vila Real
Portalegre
Guarda
-2000
Bragança
Beja
Abrantes
Mirandela
-4000
Chaves
-6000
R Sq Quadratic =0,004
Covilhã
-8000
0
10000
20000
30000
40000
População em Lugares de >2000 habitantes - 1981
9
anteriores, as variações tanto na densidade como na concentração urbana de
partida só foram determinantes a partir de determinado nível de concentração
populacional.
Observe-se que estamos a falar da unidade geográfica “Concelho”, ou seja,
estamos a tomar cada município como um todo. Sabemos que se verificaram
nesta década, dentro de cada concelho, em grande parte dos municípios do
Interior, movimentos importantes de esvaziamento das aldeias em direcção às
sedes concelhias. Para detectar tais movimentos necessitaríamos, obviamente,
de trabalhar a nível de Freguesia.
Olhemos, todavia, para o quadrante duplamente positivo do gráfico: vamos
encontrar aí cidades médias que se realçam por disporem de uma estrutura de
serviços superior, para o que não basta serem sedes de Distrito, sendo que
Évora e Viseu se encontram neste quadrante, mas outras sedes de Distrito
apresentam decréscimos populacionais (Santarém, Castelo Branco, Portalegre,
Vila Real, Guarda, Bragança, Beja).
3.2 - 1991/2001
É importante realçar que na década de 90 a concentração urbana de partida
perde muito do seu poder explicativo em relação às alterações demográficas
Continente
150000,00
Variação da População 1991 - 2001
Sintra
100000,00
50000,00
Vila Nova de Gaia
Seixal
Maia
0,00
Amadora
Porto
-50000,00
R Sq Quadratic =0,524
Lisboa
-100000,00
0
100000
200000
300000
400000
500000
600000
700000
População em Lugares de >2000 habitantes - 1991
10
verificadas (R2= 52,4%), embora se apresente ainda como um factor positivo.
Isto significa que o ciclo do êxodo rural, a nível concelhio, está a diminuir de
intensidade, talvez mesmo a caminho de se fechar.
No Litoral, os concelhos que mais se distanciam da curva de tendência fazem
parte das grandes Áreas Metropolitanas, espaços em que as deslocações
casa-trabalho inter-concelhias são manifestamente importantes, quer as que se
situam acima da curva – Sintra, Vila Nova de Gaia, que foram os concelhos
Metropolitanos que a nível nacional mais população atraíram5 - como abaixo
da curva – Porto, Amadora.
Litoral
150000,00
Variação da População 1991 - 2001
Sintra
100000,00
50000,00
Vila Nova de Gaia
Seixal
Maia
0,00
Barreiro
Amadora
Porto
-50000,00
R Sq Quadratic =0,523
Lisboa
-100000,00
0
100000
200000
300000
400000
500000
600000
700000
População em Lugares de >2000 habitantes - 1991
Desta vez já aparecem no quadrante duplamente positivo mais algumas sedes
de Distrito do Interior: Guarda, Castelo Branco, Santarém, Bragança, Vila Real.
Lamego e Peso da Régua, que eram vistas como potenciadoras do
crescimento de um “cidade média tripartida” ou eixo Vila Real – Régua –
Lamego, aparecem aqui com decréscimos populacionais.
5
Hipoteticamente isto poderá estar relacionado com políticas de ordenamento municipal mais atractivas.
11
Interior
Viseu
10000,00
Variação da População 1991 - 2001
8000,00
Ourém
6000,00
Guarda
Benavente
Entroncamento
4000,00
Vila Real
Évora
Chaves
Lousã
Bragança
2000,00
Castelo Branco
Santarém
0,00
Lamego
-2000,00
R Sq Quadratic =0,253
Peso da Régua
Valpaços
Abrantes
-4000,00
0
10000
20000
30000
40000
População em Lugares de >2000 Habitantes - 1991
4 - Análise da relação entre as variações no emprego e as variações
demográficas
Não estamos perante variações no emprego propriamente dito, mas o indicador
de que dispomos é o da População Residente Empregada e sua evolução.
Quer isto dizer que se trata de população cujo emprego se pode localizar fora
do concelho de residência mas, evidentemente, a distância casa – trabalho é
necessariamente exequível (passível de movimentos pendulares diários). Mas
se, de facto, não é importante para a nossa análise que o emprego seja no
mesmo concelho. O que conta é que a pessoa, residente ali, tem um emprego
ao qual pode ser assídua.
O discurso político e económico aponta frequentemente para a criação de
emprego não agrícola. Optamos, no entanto, para a análise das variações no
emprego total, que comporta, medindo, a capacidade da geração de empregos
não agrícolas superarem a descida no emprego agrícola.
Lembremo-nos que, em econometria, não podemos indicar o sentido da
relação, ou seja, não estamos autorizados a concluir matematicamente que é o
emprego ou a falta dele que atrai população (ou a afasta), uma vez que
estamos perante variáveis não desfasadas no tempo, relativamente uma à
12
outra. A direcção da causalidade é-nos apenas ditada pelo bom-senso. A este
respeito citemos, por exemplo, Jorge Gaspar et allii6, que referem verificar-se
“dois tipos de variação da população: a natural, consequência da capacidade
reprodutiva local, e a migratória, dependente das características económicas...”
(nomeadamente da) “... resposta simples às diferentes oportunidades regionais
de emprego”. Com efeito, sabemos que “O emprego é por excelência o espaço
da integração social. Um grande problema das áreas em perda está
relacionado com a fraca oferta de oportunidades em termos de emprego”7.
4.1- 1981/91
Continente
Loures
50000
Variação da População 1981- 1991
Seixal
Sintra
Leiria
0
Porto
-50000
-100000
R Sq Quadratic =0,931
Lisboa
-150000
-75000
-50000
-25000
0
25000
50000
Variação da População Residente Empregada 1981 - 1991
A variação do emprego e a variação demográfica aparecem correlacionados,
em parábola, a 93%. A forma da curva indica o crescimento menos que
proporcional do crescimento da população relativamente ao crescimento do
emprego. Como seria de esperar, a curva passa próximo do cruzamento dos
eixos (ponto de crescimento nulo de ambas as variáveis) e, à escala que
compreende a visualização de todos os concelhos, há uma concentração à
6
7
In “Portugal – os próximos 20 anos”, Vol. VI, pág. 8.
DGOTDU, 2003, b), pág. 9.
13
volta desse cruzamento, sendo que a esmagadora maioria dos municípios se
encontra nos quadrantes de sinal homogéneo (++, --).
Repita-se que a variável “emprego” aqui representada se refere a “população
com emprego residente em tal concelho” e não necessariamente à localização
do emprego em si mesmo, o que vem “encapotar” alguns (muitos?) fluxos de
migração pendular. Assim, mais uma vez, os concelhos do quadrante
duplamente positivo que mais se afastam da curva de tendência traçada são da
Grande Lisboa (Loures, Sintra, Seixal) ou das suas imediações (Leiria).
Litoral
Loures
50000
Variação da População 1981 - 1991
Seixal
Sintra
Leiria
0
Porto
-50000
-100000
R Sq Quadratic =0,935
Lisboa
-150000
-75000
-50000
-25000
0
25000
50000
Variação da População residente Empregada 1981 - 1991
Mais uma vez, a parábola desenhada para os concelhos do Litoral é bastante
semelhante à primeira.
E, mais uma vez, as variáveis aparecem não correlacionadas quando tomamos
apenas os concelhos do Interior. Note-se que, à escala de maior pormenor a
que nos reportamos agora, são numerosos os concelhos do Interior que
perdem população apesar de ganharem população residente empregada. A
esta escala, aparecem claramente neste quadrante alguns concelhos do
Interior Norte (Bragança, Lamego, Sernancelhe) e Centro (Castelo Branco).
14
Interior
Benavente
Variação da População 1981- 1991
2000
Entroncamento
Évora
Mangualde
0
Oliveira de Frades
Castelo Branco
Sernancelhe
-2000
Tomar
Bragança
Abrantes
Tondela
Mirandela
Montalegre
-4000
Chaves
-6000
R Sq Quadratic =0,328
Covilhã
-8000
-4000
-2000
0
2000
4000
Variação da População Residente Empregada 1981 - 1991
Pelo contrário, Mangualde e Oliveira de Frades apresentam ganhos de
população apesar de perdas de população empregada, o que pode estar ligado
à retenção do crescimento natural. Note-se a proximidade com Viseu, área
potenciadora de emprego
4.2 - 1991/2001
Desta vez, a curva de tendência apresenta uma mais que proporcionalidade da
crescimento demográfico relativamente ao crescimento do emprego. A posição
dos concelhos de Loures e Santo Tirso deverá ser olhada com reservas, pois
derivam de estimativas que a foi necessário recorrer devido à introdução dos
novos concelhos da Trofa e Odivelas.
Mais uma vez, a curva para os concelhos do Litoral é semelhante à do conjunto
total de concelhos.
15
Continente
Variação da População 1991 - 2001
150000,00
Sintra
100000,00
50000,00
Vila Nova de Gaia
Maia
Seixal
Loures
0,00
Porto
-50000,00
R Sq Quadratic =0,708
Lisboa
-100000,00
-60000,00
-20000,00
20000,00
-40000,00
0,00
60000,00
40000,00
80000,00
Variação da População residente Empregada 1991 2001
Litoral
150000
Variação da População 1991 - 2001
Sintra
100000
50000
Vila Nova de Gaia
Maia
Seixal
Guimarães
Loures
0
Porto
-50000
R Sq Quadratic =0,694
Lisboa
-100000
-60000
-40000
-20000
0
20000
40000
60000
80000
Variação da População Residente Empregada 1991 - 2001
Pelo contrário, para o Interior, estamos agora perante uma correlação ainda
maior que a da curva total (R2=80,9%). No quadrante duplamente positivo
surge Viseu destacadíssimo, seguindo-se-lhe Ourém, Guarda, Benavente,
Entroncamento e Vila Real. São agora menos os concelhos com crescimento
da população residente empregada mas perda de população residente total,
sendo de realçar que a zona do Douro apresenta concelhos nesta situação
paradoxal (Lamego, Santa Marta de Penaguião), o que merecerá ser estudado.
16
Interior
Viseu
10000
Variação da População 1991 - 2001
8000
Ourém
6000
Guarda
Entroncamento
4000
Chaves
Évora
Vila Real
2000
0
Tondela
Torres Novas
Santa Marta de Penaguião
Lamego
-2000
R Sq Quadratic =0,809
Seia
Abrantes
-4000
-4000
-2000
0
2000
4000
6000
8000
Variação da População Residente Empregada 1991 - 2001
5 – Melhoria generalizada das condições de vida, acessibilidades,
emprego
A diferença de comportamentos verificada nas duas décadas em observação
poderá parecer, à partida, paradoxal. Devemos, porém, atentar em que vinte
anos na evolução de uma população é tempo suficiente para que mudanças
estruturais se verifiquem e, consequentemente, para que comportamentos se
alterem.
Uma hipótese de trabalho que ponho, perante os resultados obtidos, é a de que
na década de 80 ainda estavam por resolver muitos problemas infraestruturais, pelo que a concentração urbana, à qual está ligado o fornecimento
de mais serviços à população, seria factor de peso na decisão de escolher um
sítio para viver. Na década de 90 esses problemas estavam mais fortemente
atenuados - maior convergência dos índices respectivos, no território do
Continente - pelo que o factor “emprego” adquiriu paulatinamente maior
relevância, a nível de todo o território. Não podemos descurar a “análise
territorial da qualidade de vida e do bem-estar dos indivíduos e dos grupos que
constituem, afinal, o grande objectivo do desenvolvimento”8.
8
Marques, 2002, pág. 6.
17
A fim de averiguar da convergência de indicadores de bem estar a nível
concelhio e dada a escassez de informação para 1981, conseguimos trabalhar
apenas três indicadores:
-
abastecimento de água nos alojamentos
-
saneamento básico nos alojamentos
-
mortalidade infantil (este último como indicador do nível de
atendimento dos serviços de saúde)
1981
%
1991
%
2001
%
Abastecimento de água
Média do Continente
Desvio Padrão concelhio
71,4
18,6
88,7
11,1
98,6
3,3
Saneamento
Média do Continente
Desvio Padrão concelhio
77,8
20,6
90,7
10,8
95,0
5,0
Mortalidade Infantil
Média do Continente
Desvio Padrão concelhio
%0
21,4
15,7
%0
10,6
11,1
%0
4,8
6,8
Fonte: dados INE trabalhados na CCDRN
Como se vê no quadro apresentado, a convergência de cada um dos
indicadores considerados é manifesta, com melhoria das médias de
atendimento ao longo do período de observação e desvios padrão concelhios
apresentando visível diminuição ao longo do mesmo período. Estamos,
portanto, não só perante uma melhoria generalizada das condições de vida no
País, como também perante uma uniformização tendencial dos níveis de oferta
e atendimento dos serviços prestados à população, com esbatimento dos
desequilíbrios concelhios e regionais. Assim, as clivagens Litoral/Interior
também se têm esbatido quanto à qualidade de vida dos seus habitantes9.
9
Sobre a uniformização tendencial de alguns indicadores de qualidade de vida nos últimos anos, ver
FERRÃO, 2003.
18
Uma outra mudança estrutural manifesta no período em análise consistiu no
reforço e melhoria das acessibilidades, aumentando a mobilidade das
populações com a diminuição de tempos de percurso e possibilitando percorrer
distâncias cada vez mais longínquas nas deslocações diárias de casa-trabalho.
Este factor aumenta o espectro de possibilidades de localização de residência
face à localização do posto de trabalho, com maior reflexo sobretudo nas áreas
metropolitanas que, como vimos nos capítulos anteriores, apresentam maior
especificidade face aos comportamentos globais expressos nas curvas de
regressão estudadas. Citemos, a propósito, MARQUES, 2002 quando refere
que “nas áreas mais urbanizadas... as metrópoles, as cidades e mesmo os
pequenos centros urbanos...(integram-se)... em sistemas aparentemente
policêntricos, nas quais a vida quotidiana se interliga, podendo residir,
trabalhar, educar os filhos e passar os tempos de lazer em ambientes urbanos
muito diversificados”10. Com efeito, e falando de um modo mais genérico, “a
criação de externalidades positivas de base (acessibilidade e infra-estruturas
logísticas, solos, etc.)” contribuem para condicionar a competitividade dos
territórios11.
Por outro lado, o desenho das grandes vias de comunicação proporciona novas
possibilidades interessantes para a localização das actividades económicas.
Veja-se a este respeito o caso de Viseu que se destaca, dentre as cidades do
Interior, por indicadores muito positivos de emprego e atracção de população.
Uma vez esbatidas as discrepâncias territoriais quanto à qualidade de vida, e
posto que a melhoria das acessibilidades alarga o espectro das possibilidades
de localização da habitação face à localização do posto de trabalho, é o factor
emprego que ganha uma cada vez maior relevância nos movimentos da
população.
Estando a variável emprego ligada às questões da localização empresarial, em
relação à qual o factor da concentração urbana não é despiciendo, por
proporcionar economias de aglomeração e proximidade de serviços, este é
mais um factor que leva a que a concentração urbana continue a ter relevância,
10
11
MARQUES, 2002, pág. 49.
PORTAS et allii, 2003, p.83.
19
ainda que em segunda instância, nas estratégias de escolha do lugar para
habitar das populações. Citemos PORTAS et allii, em como “as actividades,
mais ou menos fixadoras de emprego e produtoras de relações e polarizações,
funcionam como agentes principais na conformação da nova territorialidade
urbana”12.
Repare-se ainda que da conjugação da uniformização dos indicadores de
qualidade de vida com a melhoria das acessibilidades e com o alargamento do
espectro de localização das actividades económicas resultou um maior número
de cidades capital de Distrito capazes de atrair população na última década,
por comparação da década anterior. Ou seja, verificou-se na década de 90 um
reforço e alargamento da rede de cidades pequenas e médias capazes de
apresentar um dinamismo demográfico positivo. Esta é uma referência
importante, uma vez que “as cidades médias são elementos cruciais na
construção de uma estrutura de sustentação dos territórios em perda e na sua
afirmação de um sistema urbano policêntrico”13. Estamos, portanto, perante o
reforço da chamada Rede Complementar do Sistema Urbano Português14
12
15
.
PORTAS et allii, 2003, p. 83.
MARQUES, 2002, p. 87.
14
Tema desenvolvido em DGOTDU, 2002, b).
15
Agradeço à Drª Paula Santos e ao Engº Júlio Pereira os incentivos à prossecução deste estudo, à Prof.
Drª Teresa Sá Marques a sua contribuição na definição desta abordagem, em momentos diversos ao longo
de todo o trabalho, à Drª Marília Silva a sua contribuição para o último capítulo e à Josefina Gomes o
trabalho na base de dados e no arranjo gráfico.
13
20
Bibliografia
DGOTDU, 2003,a) “Sistema Urbano Nacional – Síntese”, por FERRÃO, João,
MARQUES, Teresa Sá, MCOTA, SEOT, Lisboa.
DGOTDU, 2003,b) “Sistema Urbano Nacional – Rede Complementar”, MCOTA,
SEOT, Lisboa.
FERRÃO,
João,
2003
“Dinâmicas
Territoriais
e
Trajectórias
de
desenvolvimento: Portugal 1991 – 2001” in Seminário “Dinâmicas Sociais na
Região do Norte – Tendências e perspectivas”, Porto, 30 de Setembro de 2003,
8 pp.
FERRÃO,
João,
1996
“Três
Décadas
de
Consolidação
do
Portugal
Demográfico “Moderno””, in A Situação Social em Portugal, 1960 – 1995,
organização de António Barreto, Instituto de Ciências Sociais – Universidade
de Lisboa , pp. 165-190.
GASPAR, Jorge et alii, 1989, “Portugal – os Próximos 20 anos – Vol. VI –
Ocupação e Organização do Espaço – Uma Prospectiva” – Fundação Calouste
Gulbenkian, Temas Actuais, 338 pp.
INE, 2003, “Movimentos Pendulares e Organização do Território Metropolitano:
Área Metropolitana de Lisboa e Área Metropolitana do Porto: 1991 – 2001”,
Instituto Nacional de Estatística e Gabinete de Estudos e Planeamento do
ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, Lisboa, 209 pp.
MARQUES, Teresa Maria Vieira de Sá, 2002 “Dinâmicas Territoriais: Portugal
na Transição do Século (XX/XXI)” – Vol. 1 – Faculdade de Letras da
Universidade do Porto, 261 pp.
MARQUES, Teresa et allii, 1996, “Estudo Estratégico das Cidades do Eixo
Atlântico: Vol.I: As formas do Sector Terciário Superior” – Porto, C.M. do Porto,
204 pp.
21
MEPAT / SEDR, 1999, “Política de Cidades e Reabilitação Urbana: Ciclo de
Encontros Portugal 2000 – 2006: Debates e Documentação”, PNDES, Lisboa,
186 pp.
PORTAS, Nuno, DOMINGUES, Álvaro, CABRAL, João et allii, 2003, “Políticas
Urbanas – Tendências, estratégias e oportunidades”, Lisboa, Fundação
Calouste Gulbenkian, 295 pp.
22
ANEXO I – Delimitação adoptada entre “Litoral” e Interior”
Separação das NUTS III entre "Litoral" e "Interior"
NUTS III
Minho-Lima
Cávado
Ave
Grande Porto
Tâmega
Entre Douro e Vouga
Douro
Alto Trás-os-Montes
Baixo Vouga
Baixo Mondego
Pinhal Litoral
Pinhal Interior Norte
Dão Lafões
Pinhal Interior Sul
Serra da Estrela
Beira Interior Norte
Beira Interior Sul
Cova da Beira
Oeste
Médio Tejo
NUTS III que não toca o litoral
NUTS III que toca o
Distância a Classificação
litoral
Concelho de maior Lisboa / Porto
população 1991
(km)
x
Braga
Guimarães
<60
<60
Paredes
<60
Vila Real
Chaves
>60
>60
x
x
x
x
x
Oliveira do Hospital
Viseu
Sertã
Seia
Guarda
Castelo Branco
Covilhã
>60
>60
>60
>60
>60
>60
>60
Abrantes
>60
x
Grande Lisboa
Península de Setúbal
x
x
Alentejo Litoral
Alto Alentejo
Alentejo Central
Baixo Alentejo
Lezíria do Tejo
x
Algarve
x
Litoral
Litoral
Litoral
Litoral
Litoral
Litoral
Interior
Interior
Litoral
Litoral
Litoral
Interior
Interior
Interior
Interior
Interior
Interior
Interior
Litoral
Interior
Litoral
Litoral
Portalegre
Évora
Beja
Santarém
>60
>60
>60
>60
Litoral
Interior
Interior
Interior
Interior
Litoral
23
NUTS III do Continente
24
Tabela utilizada na função pública para as distâncias kilométricas a
Lisboa e Porto
25
26
ANEXO II - Regressões
Análise da influência da densidade populacional de partida nas variações
demográficas - 1981/ 1991Todos os concelhos do Continente
Independent: Dens.81
Dependent Mth Rsq d.f.
F Sigf
b0
b1
b2
VarPop.8 QUA ,729 272 366,59 ,000 -1803,0 16,7771 -,0030
Abbreviated Extended
Name
VarPop.8
Name
VarPop.8191
Litoral
Independent: Dens.81
Dependent Mth Rsq d.f.
F Sigf
b0
b1
b2
VarPop.8 QUA ,735 123 170,72 ,000 -1556,9 16,8466 -,0030
Abbreviated Extended
Name
Name
VarPop.8
VarPop.8191
Interior
Independent: Dens.81
Dependent Mth Rsq d.f.
VarPop.8 QUA ,051 146
F Sigf
b0
b2
3,93 ,022 -1135,5 ,3839 ,0041
Abbreviated Extended
Name
Name
VarPop.8
b1
VarPop.8191
27
Análise da influência da densidade populacional de partida nas variações
demográficas - 1991/2001
Todos os concelhos do Continente
Independent: dens91
Dependent Mth Rsq d.f.
F Sigf
b0
b1
b2
varp9101 QUA ,422 275 100,59 ,000 -121,24 15,3863 -,0029
Litoral
Independent: dens91
Dependent Mth Rsq d.f.
F Sigf
b0
b1
b2
varp9101 QUA ,414 126 44,54 ,000 1528,45 13,9760 -,0027
Interior
Independent: dens91
Dependent Mth Rsq d.f.
varp9101 QUA ,114 146
F Sigf
b0
b1
b2
9,42 ,000 -862,62 11,4623 -,0067
Análise da concentração urbana de partida nas variações demográficas
Todos os concelhos do Continente
Independent: Pop.L.200081
Dependent Mth Rsq d.f.
F Sigf
b0
b1
b2
VarPop.8 QUA ,838 272 701,45 ,000 -848,11 ,1695 -4,E-07
Abbreviated Extended
Name
Name
VarPop.8
VarPop.8191
28
Litoral
Independent: Pop.L.200081
Dependent Mth Rsq d.f.
F Sigf
b0
b1
b2
VarPop.8 QUA ,856 123 365,29 ,000 315,736 ,1632 -4,E-07
Abbreviated Extended
Name
Name
VarPop.8
VarPop.8191
Interior
Independent: Pop.L.200081
Dependent Mth Rsq d.f.
F Sigf
b0
b1
b2
VarPop.8 QUA ,004 146
,30 ,739 -1018,0 -,0311 1,2E-06
Abbreviated Extended
Name
Name
VarPop.8
VarPop.8191
Análise da concentração urbana de partida nas variações demográficas
Todos os concelhos do Continente
Independent: poplu91
Dependent Mth Rsq d.f.
F Sigf
b0
b1
b2
varp9101 QUA ,524 272 149,74 ,000 -53,836 ,2134 -6,E-07
Litoral
Independent: poplu91
Dependent Mth Rsq d.f.
F Sigf
b0
b1
b2
varp9101 QUA ,523 123 67,41 ,000 1633,52 ,1988 -5,E-07
29
Interior
Independent: poplu91
Dependent Mth Rsq d.f.
F Sigf
b0
b1
b2
varp9101 QUA ,253 146 24,72 ,000 -892,71 ,1585 -2,E-06
Análise da relação entre a variação no emprego e a variação demográfica
- 1981/1991
Todos os concelhos do Continente
Independent: Varemp8191
Dependent Mth Rsq d.f.
F Sigf
b0
b1
b2
VarPop.8 QUA ,931 272 1828,64 ,000 -781,90 1,2474 -1,E-05
Abbreviated Extended
Name
Name
VarPop.8
VarPop.8191
Litoral
Independent: Varemp8191
Dependent Mth Rsq d.f.
F Sigf
b0
b1
b2
VarPop.8 QUA ,935 123 881,09 ,000 -796,32 1,2511 -1,E-05
Abbreviated Extended
Name
Name
VarPop.8
VarPop.8191
Interior
Independent: Varemp8191
Dependent Mth Rsq d.f.
F Sigf
b0
b1
b2
VarPop.8 QUA ,328 146 35,71 ,000 -847,09 ,8709 -4,E-05
30
Abbreviated Extended
Name
Name
VarPop.8
VarPop.8191
Análise da relação entre as variações no emprego e as variações
demográficas - 1991/2001
Todos os concelhos do Continente
Independent: vare9101
Dependent Mth Rsq d.f.
F Sigf
b0
b1
b2
varp9101 QUA ,708 272 329,18 ,000 -371,01 1,1240 9,8E-06
Litoral
Independent: vare9101
Dependent Mth Rsq d.f.
F Sigf
b0
b1
b2
varp9101 QUA ,694 123 139,19 ,000 39,3104 1,1147 9,7E-06
Interior
Independent: vare9101
Dependent Mth Rsq d.f.
F Sigf
b0
b1
b2
varp9101 QUA ,809 146 309,32 ,000 -706,10 1,0178 4,8E-05
31
32
Download

LITORAL/INTERIOR: CLIVAGEM COM SENTIDO? VARIAÇÕES