RESENHA DE NOTÍCIAS CULTURAIS
Edição Nº 91
[ 7/6/2012 a 13/6/2012 ]
Sumário
CINEMA E TV...............................................................................................................3
Folha de S. Paulo - Documentário flagra a ascensão da nova classe média no Brasil...................3
Correio Braziliense – A brasileira que ganhou Cannes...................................................................3
Estado de Minas - Fronteiras em expansão ...................................................................................4
Folha de S. Paulo - "De Pernas pro Ar" ganha continuação em Nova York....................................6
Estado de S. Paulo – A poética no olhar do menino .....................................................................7
Folha de S. Paulo - Quebrando a banca.........................................................................................9
TEATRO E DANÇA....................................................................................................10
Jornal de Brasília – A arte de comunicar com gestos....................................................................10
O Globo - Belo Horizonte reabre palcos e fronteiras.....................................................................11
Correio Braziliense – Anarriê, véi!.................................................................................................12
Correio Braziliense – Construtora de sonhos / Entrevista.............................................................13
Correio Braziliense - A cara do pai ...............................................................................................16
ARTES PLÁSTICAS...................................................................................................17
Brasil Econômico - As cores do Cerrado de Siron.........................................................................17
O Estado de S. Paulo - Tempestade de areia em Kassel.............................................................18
Folha de S. Paulo - Brasileiro Kobra leva suas tintas para muro de Nova York............................20
O Globo - Exposição coletiva revela o surrealismo nosso de cada dia.........................................20
Correio Braziliense - Língua da arte .............................................................................................21
O Globo - Arte e política nas mãos das mulheres em Kassel.......................................................23
MÚSICA......................................................................................................................25
O Estado de S. Paulo - Foles dinâmicos no meio do jazz. O suingue de Maceo Parker em dois
palcos............................................................................................................................................26
Jornal de Brasília - Surpresa de Recife.........................................................................................27
O Globo - Batidão sertanejo..........................................................................................................29
O Globo - O homem que faz Belém tremer...................................................................................31
Jornal de Brasília - A caneta e o saxofone ...................................................................................32
Jornal de Brasília - Um tributo a Nara Leão .................................................................................34
Folha de S. Paulo - Campeão em indicações no Prêmio da Música rejeita rótulo "regional"........35
Estado de Minas - Choros de Waldir Silva....................................................................................36
O Estado de S. Paulo - Desafio contemporâneo...........................................................................37
LIVROS E LITERATURA...........................................................................................38
Folha de S. Paulo - Livro estuda as inovações de compositor nos anos 30..................................38
Jornal de Brasília - Jornalista e escritor Ivan Lessa morre aos 77 anos .......................................39
Correio Braziliense - Memórias de uma exposição ......................................................................40
Estado de Minas - Amor jovem é um sucesso...............................................................................42
Zero Hora - Amor e morte em Neptuno.........................................................................................43
Zero Hora - Histórias entrelaçadas................................................................................................44
O Globo - Arte e política nas mãos das mulheres em Kassel.......................................................45
ARQUITETURA E DESIGN........................................................................................47
Revista Veja – A arte da geometria...............................................................................................47
OUTROS.....................................................................................................................48
O Estado de S.Paulo – A tripla vitória do 'homem de ferro'...........................................................48
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CINEMA E TV
FOLHA DE S. PAULO -
Documentário flagra a ascensão da nova classe média no Brasil
"Família Braz - Dois Tempos" venceu o É Tudo Verdade de 2011
RODRIGO LEVINO
(08/006/2012) "Família Braz - Dois Tempos", documentário vencedor do festival É Tudo Verdade de
2011, é um daqueles exemplos que provam o dito popular de que "uma imagem vale por mil
palavras".
No caso do filme, dirigido por Dorrit Harazim e Arthur Fontes, a narrativa se debruça sobre a tão
falada ascensão da nova classe média, nos últimos dez anos no Brasil, a partir do recorte de uma
família da periferia paulistana.
E a mostra com imagens tão eficazes, capazes de sobrepor teses e escritos.
Chefiada por seu Toninho e dona Maria, trabalhadores informais e pais de quatro filhos, a família tem
o dia a dia acompanhado pela câmera, em dias recentes, tendo como contraponto a situação
financeira uma década antes.
Filhos formados, capacitados para o mercado, empenhados na melhora de vida dos pais e cultivando
novos hábitos são a evolução do que era crise e incerteza.
Delicado sem ser piegas, "Dois Tempos" flagra um momento marcante da sociedade brasileira sem
recorrer a firulas economicistas nem tomar partido ideológico.
CORREIO BRAZILIENSE – A brasileira
que ganhou Cannes
Depois de quatro passagens pelo festival francês, Juliana Rojas comemora a menção honrosa pelo
curta Duplo
» YALE GONTIJO
O curta-metragem Duplo, com a atriz Sabrina Greve, é inspirado em lenda germânica na qual uma
réplica imita a forma humana física
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O Festival de Cannes 2012 registrou a participação de muitos brasileiros fora e dentro das mostras
competitivas. O cineasta Walter Salles concorreu a Palma de Ouro, com Na estrada (que não levou
nenhum prêmio) e Cacá Diegues (Deus é brasileiro e Bye bye Brasil) presidiu o júri do Camera D’ Or
um dos mais importantes de Cannes. Porém, foi mesmo a diretora paulistana Juliana Rojas a
conquistar o melhor desempenho da edição. O curta-metragem O duplo foi exibido na Semana da
Crítica e levou a menção especial Nikon. Juliana, 30 anos, não é nenhuma marinheira de primeira
viagem a pisar na Croisette. Foram quatro passagens por Cannes. A primeira foi com o projeto de
graduação da ECA-USP, o drama O lençol branco, em 2005. Depois, tiveram o curta O ramo (2007) e
o longa-metragem Trabalhar cansa, em 2011. Todos dirigidos em parceria com Marco Dutra, com
quem dividiu os bancos da faculdade de cinema.
Agora, Juliana tocou a direção sem a ajuda do amigo Dutra. No entanto, O duplo segue algumas
características do trabalho em conjunto como a filiação ao cinema do fantástico. “O duplo foi inspirado
na lenda do Doppelgänger. Um ser fantástico com habilidade de tomar a forma humana de uma
pessoa e expor o seu lado negativo. Durante a pesquisa descobri o relato verídico de uma professora
perseguida por seu duplo. Os professores têm um papel importante na sociedade e a função moral de
ensinar crianças, achei interessante incluir um personagem como esse envolvido numa história
sobrenatural”, explicou no dia da exibição na França.
O próximo filme, uma volta ao trabalho com Dutra receberá o título As boas maneiras e foi
selecionado para a Residência da Cinéfondation, um programa do Festival de Cannes, na qual
cineastas do mundo todo são convidados a morar juntos, em Paris, durante seis meses para escrever
um roteiro de longa. Juliana está na França desde março desenvolvendo o projeto que deverá ser
rodado no segundo semestre de 2013. “É uma fábula de horror na São Paulo atual e pretende
dialogar ainda mais com diferentes gêneros cinematográficos. Fala sobre maternidade e impulsos de
paixão e violência”, adianta. O projeto do longa está em fase de captação de verba pelas leis de
incentivo. O curta O duplo foi inscrito em vários festivais do Brasil, mas não foi confirmada nenhuma
participação ainda.
Avesso
Em alemão, o termo Doppelgänger é formado pela soma de doppel (duplo) e gänger (ambulante).
Reza a lenda germânica que a réplica imita a forma humana física, mas também os aspectos mais
profundos da personalidade de uma pessoa. No entanto, o duplo opera apenas com os aspectos
negativos.
Três perguntas// Juliana Rojas
Vencida a ansiedade de estreante, como você aproveitou o Festival de Cannes?
A ansiedade pode diminuir ao longo dos anos, mas sempre existe uma expectativa em relação à
exibição do filme. Como ele vai ser recebido? Se vai correr tudo bem na projeção... A emoção de
passar um filme pela primeira vez é sempre viva e autêntica. O que muda é que, conhecendo a
dinâmica do festival, dá para organizar melhor o tempo para divulgar novos projetos e assistir aos
filmes.
Cannes é conhecido por ser um festival que possibilita uma janela de negócios internacional. Como
os brasileiros têm tomado partido dessa vantagem?
Não sou produtora, então não tenho como avaliar quais são os resultados da participação brasileira
no mercado de Cannes. Cada vez é maior o número de profissionais brasileiros presentes no festival,
por meio do programa Cinema do Brasil e do Producers’ Network. Dentro do mercado, é possível
organizar projeções de filmes para compradores, distribuidores e curadores de festival. Também vejo
que há um interesse maior dos produtores em procurar parceiros para coprodução internacional.
Qual é a diferença entre dirigir um filme com seu “duplo”, Marco Dutra e sozinha?
Tenho que tomar as decisões só, sem um interlocutor durante o processo para decidir em conjunto.
Isso não é melhor nem pior do que dirigir em parceria, só é diferente. Eu gosto das duas experiências,
por isso, alterno trabalhos solo e em parceria com o Marco.
ESTADO DE MINAS
- Fronteiras em expansão
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O cineasta Silvio Da-Rin lança hoje em Belo Horizonte o documentário Paralelo 10, que trata da
relação dos sertanistas da Funai com índios isolados na Amazônia brasileira
Ana Clara Brant
José Carlos Meirelles com índios ashaninkas, em cena do documentário Paralelo 10: em busca do
diálogo
(11/06/2012) Mais do que descobrir que o Brasil é o país com o maior número de índios isolados no
mundo, com 72 ocorrências já mapeadas pela Fundação Nacional do Índio (Funai) na Amazônia
brasileira, o diretor Silvio Da-Rin ficou surpreso com a existência de uma profissão dedicada
exclusivamente a desenvolver uma política de contato e integração com os indígenas, tentando
demarcar suas terras e protegê-los. Foi assim que surgiu a ideia de realizar um documentário sobre o
assunto.
Depois de entrar em contato com um dos sertanistas mais importantes do país, José Carlos Meirelles,
Da-Rin e sua equipe se embrenharam na floresta amazônica durante três semanas, no fim de 2010.
O resultado é Paralelo 10, em que Da-Rin, Meirelles e o antropólogo Terri de Aquino sobem o Rio
Envira, no Acre, enfrentando vários tipos de obstáculos e se aproximando de índios isolados. Nessa
jornada, o indigenista rememora experiências, expõe contradições de seu ofício e discute com os
madijás e ashaninkas a melhor forma de se relacionar com os índios “brabos”, sem tentar amansá-los
ou exterminá-los.
A produção será exibida e debatida hoje à noite, durante o projeto Sempre um Papo, na Sala Prof.
José Tavares de Barros, no Sesc Palladium, com a presença do documentarista. “Percorremos 500
quilômetros subindo o Rio Envira em direção ao pararelo 10, na fronteira com o Peru. Não deixa de
ser uma expedição. No entanto, o que mais me impressionou foi o próprio Meirelles. Seu
voluntarismo, sua capacidade de realização, já que é um homem multitarefa. Ao mesmo tempo em
que desenvolve um importante trabalho de conscientização com os índios, ele conserta motor de
barco, fabrica algumas coisas, planta, colhe. É uma figura de muitos atributos e com uma grande
capacidade de adaptação, já que era extremamente urbano. Além disso, é um excelente narrador e
sua capacidade de transformar em palavras suas vivências impressiona”, observa Da-Rin.
José Carlos Meirelles é a figura central do documentário e é difícil não se fixar em seus depoimentos
sobre sua relação com os índios e acerca da árdua missão de mediar conflitos. Dois episódios que
marcaram sua vida são momentos fortes do documentário: a experiência de ser flechado e a de ter
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matado um índio. “Quem está aqui sabe da possibilidade de isso acontecer. Acabei levando uma
flechada que quase me tirou a vida. E o caso da morte do índio é notório. Se aquilo não foi legítima
defesa, não sei o que é. Eu matei um índio. Se não tivesse feito isso, teria morrido. O lema ‘morrer se
preciso for, matar jamais’, do marechal Cândido Rondon, funciona na literatura, mas na realidade,
quando você se vê cercado por 100 índios e sua vida corre perigo, é diferente”, relembra o sertanista
no documentário.
Oficinas Para Da-Rin, as oficinas de conscientização ministradas por Meirelles e o antropólogo Terri
Aquino com os índio aldeados que vivem à beira do Envira, com o objetivo de minimizar conflitos e
preconceitos, deram relevo ao filme. O diretor relembra que foi bastante interessante constatar o
modo como os nativos vivem, o processo de aculturação e as diferenças entre os isolados e os
aldeados. “O Meirelles já tinha realizado essas oficinas com outros índios, mas faltava a cabeceira do
Envira. Ele, junto com o Terri, percebeu que era muito relevante promover um trabalho preventivo de
pacificação da área e foi gratificante e proveitoso acompanhar tudo aquilo”, destaca. Paralelo 10 será
lançado em DVD no fim de julho e vai ser exibido de hoje a domingo, em três sessões, na Sala Prof.
José Tavares de Barros, no Sesc Palladium.
Paralelo 10
Lançamento do documentário de Silvio Da-Rin, hoje, às 19h30, na Sala Prof. José Tavares de Barros,
no Sesc Palladium (Av. Augusto de Lima, 420), dentro do Sempre um Papo. Informações: (31) 32611501 e www.sempreumpapo.com.br. O documentário será exibido de hoje a domingo, às 16h, 18h e
20h, no mesmo local. Classificação livre, com entrada franca
Três perguntas para Silvio Da-Rin, cineasta
1) Xingu, de Cao Hamburger, e o documentário Hotxuá, de Letícia Sabatella e Gringo Cardia, têm os
índios como tema. Você acha que está havendo um maior interesse pelo assunto?
Foi uma coincidência. Não acredito que o interesse por estudos antropológicos indigenistas esteja em
alta. Pelo contrário. Nos anos 1980, a preocupação era muito maior e o apogeu foi a Constituinte, que
deu garantias constitucionais aos índios. O curioso é que as populações indígenas que já foram muito
menores, com 200 mil, agora estão na faixa de 750 mil pessoas. Por outro lado, os interesses antiindígenas se fortaleceram muito.
2) Como você vê a relação do público brasileiro com o documentário?
O Brasil tem produzido muitos documentários. Entre 2001 e 2010 foram cerca de 100 filmes, sendo
40% de documentários. E isso se deve principalmente às políticas públicas de fomento à produção,
que possibilitam realizar filmes que são importantes para o mapeamento cultural do Brasil. O volume
de documentários nacionais nas premiações estrangeiras é grande. Mas a nossa vida não é fácil. Não
temos uma televisão interessada em difundir os documentários brasileiros.
3) E como fica a exibição nos cinemas?
O mercado mudou radicalmente. Não existem mais salas de ruas, e o cinema é uma âncora para
atrair consumidores aos shoppings. Quem vai ao cinema hoje está em busca de entretenimento.
Essas pessoas não estão em busca de informação. Com exceção dos documentários sobre música e
esportes, os demais não atraem público significativo. Graças às políticas públicas, essas produções
estão sendo feitas e permanecerão eternamente disponíveis. Isso é importante, porque elas cumprem
papel relevante.
FOLHA DE S. PAULO -
"De Pernas pro Ar" ganha continuação em Nova York
Maior bilheteria nacional em 2011, longa com atriz Ingrid Guimarães vai mostrar "conquista da
América"
Verena Fornetti, de Nova York
(11/06/2012) Com foco suavizado na sexualidade e aposta na construção de franquias nacionais de
sucesso, o diretor Roberto Santucci filma em Nova York a sequência de "De Pernas pro Ar", longa
estrelado pela atriz Ingrid Guimarães que foi a maior bilheteria nacional de 2011.
"De Pernas pro Ar 2" tem orçamento de R$ 6 milhões, 20% mais do que o anterior.
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O segundo filme começa quando Alice (Ingrid Guimarães) inaugura seu centésimo sex shop e
procura investidores para lançar seu negócio em Nova York.
Depois de uma crise de estresse e uma passada por um spa no Rio, onde conhece um workaholic
interpretado por Eriberto Leão, viaja para a metrópole americana com marido, babá e o filho.
Ali flerta com o galã viciado em trabalho e foge dos passeios turísticos em família para acertar os
detalhes da construção de um sex shop brasileiro na Grande Maçã.
Se no longa anterior o mote era a procura pelo prazer sexual, neste o foco é a dificuldade em
harmonizar carreira com casamento e filhos.
Para a protagonista, a expressiva bilheteria do primeiro filme só aconteceu porque o prazer foi
discutido no âmbito da família. "O brasileiro é conservador", diz a atriz.
"De Pernas pro Ar" teve 3,6 milhões de espectadores. Ingrid afirma que a discussão casamento
versus carreira atinge todas as classes sociais, inclusive o público da classe C, que impulsionou o
sucesso do primeiro longa-metragem.
EMERGENTE
A produtora Mariza Leão diz que a decisão de filmar em Nova York se relaciona com o sonho da
classe média emergente de conhecer a cidade, mas também com a simbologia de que Alice atingiu o
topo na carreira e está "conquistando a América".
"Já filmei em Veneza e em Barcelona [em "Meu Nome Não é Johnny"] e vi como esses lugares
simbólicos, que estão no imaginário do espectador, levantam as cenas."
A produtora destaca que o filme segue a tradição de comédias americanas, que constroem uma
marca (como "American Pie") e apostam em continuações.
Ela sonha com o terceiro "De Pernas pro Ar" e diz que, embora não esteja pensando na adaptação
para a TV, vê a convergência de mídias como algo natural.
O diretor Roberto Santucci argumenta que, apesar de ser uma continuação, há frescor no segundo
filme.
"A vilã é um pouco a própria Alice. No filme, ela aprende que tem que balancear a vida. Ela vai
cometer o mesmo erro de novo, de tentar dar conta de tudo."
ESTADO DE S. PAULO – A poética
no olhar do menino
Curta raro de Sérgio Ricardo inaugura o 19.º CineSul
Evento será realizado no Rio de Janeiro até o dia 1.º de julho com a participação de 12 países
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'Menino da Calça Branca'
(12/6/2012) Chico Buarque e Maria Bethânia são seus fãs. Carlos Drummond de Andrade respeitava
tanto Sérgio Ricardo que lhe deu seu único cordel, A Estória de João Joana - que Sérgio musicou e
apresentou há cerca de um mês em Brasília. Um mês? "Sou ruim de datas, mas foi por aí", ele
explica, numa entrevista por telefone. Sérgio Ricardo, nascido João Lutfi, minimiza o fato, diz-se
avesso às homenagens, mas hoje, no Rio, na abertura do 19.º CineSul, ele sobe ao palco do CCBB
para o aplauso do público do Festival Ibero-Americano de Cinema e Vídeo.
O CineSul, que começa hoje, vai até 1.º de julho com uma programação que promete. Participam 12
países - Espanha, Argentina, México, Cuba, Venezuela, Portugal, Chile, Colômbia, Equador, El
Salvador, Porto Rico e Alemanha. As mostras competitivas exibem 68 médias e longas-metragens,
sendo 33 brasileiros e 35 estrangeiros. A proposta é oferecer não apenas uma programação
diferenciada de filmes - a maioria nem chega ao circuito exibidor do País -, como promover o
intercâmbio, a discussão, a reflexão. As mostras temáticas Palcos e Telas, CineSul Ambiental, Arte
CineSul, Romance Latino, Foco Espanha, Bossas Musicais e CineSul apresentam títulos garimpados
entre os mais de 900 inscritos. O cinema da ibero-americano reluz no Rio e, no centro de toda essa
programação, se destaca a homenagem a Sérgio Ricardo.
Hoje será exibido o curta Menino da Calça Branca, de 22 minutos. Foi a estreia do diretor, em 1961. A
cópia é nova e passou por um trabalho de limpeza pela Cinemateca Brasileira - "Meus filmes estão
bem conservados e não necessitam de grandes restaurações", informa. Para muita gente - toda uma
geração de espectadores que desconhece o curta de Sérgio Ricardo -, será uma revelação. Ele
admite que fez Menino sob o impacto que lhe provocou a descoberta de um filme que virou clássico O Balão Vermelho, de Albert Lamorisse, de 1956.
Havia uma revolução em curso no cinema francês e mundial, na segunda metade dos anos 1950.
Lamorisse não era caracteristicamente um autor da nouvelle vague, embora adotasse alguns
conceitos da nova onda. Sua câmera era livre, como seriam as de François Truffaut e Jean-Luc
Godard, mas a proposta era outra. A combinação de imagem e som, a estrutura audiovisual de Crins
Blancs e O Balão Vermelho traduzia-se como poesia pura na tela. Sérgio Ricardo ficou siderado.
Ele já era músico. Amava o cinema. E usou o que ganhava na música para financiar o próprio
experimento cinematográfico. O Menino da Calça Branca é poético, com as belas imagens
fotografadas pelo irmão do diretor - o lendário Dib Lutfi, cuja mão firme foi fundamental na eclosão do
Cinema Novo e da máxima glauberiana, 'uma câmera na mão e uma ideia na cabeça'. Belo, poético,
mas enraizado no social. Já era assim na música de Sérgio Ricardo e, em plena bossa nova, quando
O Pato, na voz de João Gilberto, virava emblema de uma nova expressão musical, ele introduziu o
protesto no movimento, com Zelão.
"Todo morro entendeu quando Zelão chorou..." - Sérgio Ricardo reivindica a criação da canção de
protesto com Zelão. Há algo desse protesto, dessa indignação social, em O Menino da Calça Branca,
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que também se aparenta ao curta Couro de Gato, de Joaquim Pedro de Andrade. O menino ganha a
calça branca. Tenta mantê-la limpa. Busca o asfalto, mas as circunstâncias o devolvem à favela. "Os
dois filmes têm alguma coisa, sim, mas não havia visto o curta do Joaquim. Era um sentimento
comum, coisa da época." Na sequência do Menino, vieram Esse Mundo É Meu, Juliana do Amor
Perdido e A Noite do Espantalho.
Sérgio queria fazer um cinema que não fosse só diversão, mas expressão de um pensamento.
Glauber Rocha chamou-o para a trilha de Deus e o Diabo na Terra do Sol. E, agora, é chegada a
hora da homenagem. Sérgio Ricardo está completando 80 anos. São Paulo não fica fora do circuito
da comemoração. Na sexta, 22, o Sesc Belenzinho abriga o show de aniversário. São 80 anos de
vida e 60 de carreira. Sérgio, com mais duas cantoras e um cantor, vai repassar sucessos como
Zelão, Nosso Olhar e Poema Azul, além das canções compostas para a trilha sonora de Deus e o
Diabo e para a peça Flicts, de Ziraldo.
"Te entrega, Corisco/ Eu não me entrego não..." - Sérgio Ricardo atravessou os anos da ditadura
exilado no próprio Brasil, fazendo shows de resistência para estudantes. Em 1967, quebrou o violão e
o atirou no público que vaiava Beto Bom de Bola, no Festival da Record. O fato marcou. "Não me
arrependo de nada." Como ator - começou na TV -, cantor, compositor, diretor, "trilheiro", sua
contribuição à cultura do País é valiosa.
FOLHA DE S. PAULO -
Quebrando a banca
Tribunal de Contas do Estado mostra que polo de cinema de Paulínia saiu pelo dobro do preço
Matheus Magenta e Lúcia Valentim Rodrigues, de São Paulo
(12/06/2012) Uma auditoria do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP) constatou que a
Prefeitura de Paulínia (a 119 km da capital) gastou o dobro do que poderia ter desembolsado para
construir seu polo de cinema.
O modelo adotado, de uma parceria público-privada (PPP) com os Estúdios Quanta, prevê a
construção e a manutenção de uma estrutura formada por cinco estúdios, escritórios e um museu.
Ao todo, ao longo de dez anos, seriam pagos pela prefeitura R$ 332 milhões. Ao fim do contrato, o
patrimônio será revertido ao governo.
Se o poder público tivesse decidido construir e administrar esse projeto, o valor chegaria a R$ 142
milhões, segundo cálculos do próprio TCE.
De acordo com o documento, que ainda está em análise e deve ir a votação em três semanas, fica
"improvada a economicidade do contrato".
A prefeitura disse que o tribunal ainda não decidiu sobre o assunto, que há "apenas indicativos da
auditoria" e que há um "erro técnico" na avaliação (leia nesta pág.).
Em abril, a Folha publicou reportagem que apontava para o sucateamento do polo de Paulínia, a
suspensão do festival de cinema e o abandono da política de financiamento de filmes.
EDITAL AUSENTE
Não há editais de fomento a produções desde 2010 -o prefeito José Pavan Jr. (PSB) promete um
novo para este mês, ainda sem revelar valores nem datas.
Por contrato, só a prefeitura pode definir quem utiliza os estúdios. Na prática, só os contemplados
pelos editais podem usar a estrutura, já que esses espaços não podem ser alugados.
Dos dez selecionados no último edital, há dois anos, faltavam três produções a serem filmadas na
cidade. Duas delas desistiram.
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"Trinta", sobre o carnavalesco Joãosinho Trinta (1933-2011), nega que a decisão tenha a ver com a
crise no polo. O produtor Matias Mariani, da Primo Filmes, diz que "foi coincidência".
"Conseguimos o dinheiro de um outro investidor no Rio de Janeiro. Não valeria a pena transferir toda
a estrutura do filme para Paulínia."
Para a equipe de "O Tempo e o Vento", que adapta a obra homônima de Erico Veríssimo, foi uma
precaução.
"Teríamos de investir na construção dos cenários sem ter retorno garantido sobre as datas em que a
verba da prefeitura estaria liberada", diz a produtora Rita Buzzar.
O filme será rodado integralmente no Rio Grande do Sul, onde é gravado desde março. "Foi uma
questão logística com as locações que tínhamos disponíveis."
Somente a Gullane mantém o cronograma para "Acorda Brasil", sobre uma orquestra jovem na favela
de Heliópolis (SP). Vão levar à cidade cem pessoas, entre técnicos e atores.
"Atrasou um pouco para recebermos, mas está totalmente garantido [fazer o filme na cidade]. Acho
que a tempestade que estão fazendo é muito maior do que a realidade", diz Caio Gullane. "Acorda
Brasil" vai receber R$ 1,1 milhão.
O prefeito anterior de Paulínia, Edson Moura (PMDB), criou o projeto do polo cinematográfico e
elegeu Pavan Jr. como seu sucessor.
Mas os dois romperam, e Pavan deixou o cinema em segundo plano para investir em programas
sociais.
A suspensão do festival e a substituição de cursos de longa duração por workshops são
consequência da nova política.
TEATRO E DANÇA
JORNAL DE BRASÍLIA – A arte
de comunicar com gestos
Camilla Sanches [email protected]
(07/06/2012) Mímica é uma forma de comunicação humana, conhecida como a arte de exprimir
pensamentos e sentimentos por meio de gestos. Nas artes cênicas, o termo significa o estudo da
ação física do homem em seu meio. A imagem do mímico que geralmente nos vem à cabeça é a de
alguém com o rosto pintado de branco, camisa listrada e macacão preto. Com a Mostra Internacional
de Mímica, que começa esta noite, no Teatro Plínio Marcos da Funarte (Eixo Monumental), o mímico
Miquéias Paz procura quebrar este mito.
“É um gênero que vai muito além disso e nosso objetivo, com esta primeira edição, é mostrar a
diversidade do fazer mímica. Ela não é um apêndice do teatro, é uma arte por si só”, esclarece ele,
que é o idealizador do evento. “Queremos, também, agregar todos os convidados e pessoas que
fazem mímica na cidade, para que se vejam, se conheçam e troquem experiências ao longo desses
quatro dias de programação”, acrescenta.
Assim como outras manifestações artísticas, existem várias formas e estilos de praticar esta arte. A
mais conhecida é chamada de pantomina, onde os artistas usam cara branca e se inspiram na figura
do pierrot (um palhaço triste). Na Mostra Internacional, nomes de vários estados brasileiros e da
América Latina e apresentam seus diferentes processos de criação, num total de sete espetáculos.
A abertura será com Retalhos do Meu Brasil Brasileiro, trabalho apresentado pelo organizador
Miquéias Paz. Em cena, uma peça montada a partir de vários recortes de personagens que
representam o cotidiano do brasileiro, divididos em três esquetes.
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ATRAÇÕES
A primeira, Minha Cor, trata da escravidão no Brasil, com o auxílio de gestos e imagens. Em Mulher,
ele homenageia a tripla jornada feminina da mulher moderna que se divide em multitarefas ao longo
do dia. Tudo com muito humor e sensibilidade. O último quadro é Brasil Brasileiro que fala sobre a
rotina diária de um trabalhador, fazendo uso da percussão vocal. Em seguida, é a vez de Jader
Clown, da Colômbia, apresentar Variette , um espetáculo que, como o nome do artista sugere, usa
técnicas de mímica e de clown para envolver o público. Nos demais dias, o palco da Plínio Marcos
recebe artistas de Cuba, Rio de Janeiro, Goiás e São Paulo.
Um deles é o paulista Luis Louis, que traz o seu Falas de um Mímico, com temática ligada à mímica
contemporânea. “Preciso manter uma relação muito aberta e afinada com o público para a peça dar
certo, tanto que a cena final é construída com a ajuda dele. Por isso, já fiz diversas apresentações e
ensaios abertos antes de estrear”, conta Louis. A montagem é inédita e deve ser encenada na capital
paulista só em setembro. Após todas as sessões, haverá bate-papos entre os artistas e a plateia.
Mais uma oportunidade para a troca de experiências.
O GLOBO -
Belo Horizonte reabre palcos e fronteiras
De hoje ao dia 24, o 11o- FIT exibe 19 espetáculos estrangeiros e 22 nacionais
Luiz Felipe Reis
(09/06/2012) Iniciando hoje sua 11ª edição, o Festival Internacional de Teatro de Belo Horizonte (FITBH) faz jus ao nome e escancara as fronteiras de Minas para uma invasão de línguas e linguagens
teatrais. Até o dia 24 de junho, serão apresentados 41 espetáculos, sendo 19 montagens
internacionais, vindas de 12 diferentes países, além de 12 peças nacionais e dez criações de grupos
que representam a nova cena mineira.
— O FIT se diferencia dos outros festivais internacionais do país por ser bienal, o que nos dá mais
tempo para tocar produção, garimpar espetáculos e definir curadoria e linhas conceituais — diz o
coordenador geral do evento, Rodrigo Barroso.
Teatro de rua marca primeiro dia Para além das considerações numéricas, chama a atenção a
qualidade dos grupos e espectáculos selecionados pelos curadores Marcelo Bones, Grace Passô e
Yara de Novaes. O festival já começa a mostrar seus trunfos hoje, com três grandes espetáculos de
rua, os brasileiros “Sua incelença Ricardo III”, do Grupo Clowns de Shakespeare, e “Romeu e Julieta”,
do Grupo Galpão, além de “Time out”, concebido pela companhia alemã Antagon TheaterAKTion.
Com direção de Bernhard Bub, a peça alemã contrapõe os sentimentos de opressão e liberdade
numa sociedade tecnocrata.
Também hoje, o diretor e autor argentino Daniel Veronese estreia “Los hijos se han dormido”,
inspirada em “A gaivota”, de Anton Tchékhov, e o grupo colombiano La Maldita Vanidad encena “Los
autores materiales”, inspirada em “Festim diabólico”, de Alfred Hitchcock.
Ao longo da semana vale conferir as inquietantes performances do francês Olivier de Sagazan —
“Transfiguration 1” (dia 12), “Transfiguration 2” (13), “Hybridation” (14), “Transept” (15) e “Matéria
prima” (16) —, assim como as duas montagens que a consagrada Fondazione Pontedera Teatro, da
Itália, apresenta: “Abito”, baseada no “Livro do Desassossego”, de Fernando Pessoa, e “Lisboa”,
também uma homenagem ao poeta.
Ambas serão dirigidas por Roberto Bacci, que também encena a única estreia nacional do FIT, a peça
“umnenhumcemmil”, que traz, no dia 15, o ator Cacá Carvalho mergulhado no universo de Luigi
Pirandello.
Do ponto de vista conceitual, a curadoria buscou investigar fronteiras. Há espetáculos que lidam com
os limites entre teatro e cinema ou artes plásticas, por exemplo. Muitas peças saíram do palco
tradicional e acontecem em espaços públicos diversos.
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E há espaço, ainda, para montagens bem experimentais. — Também queremos intensificar as
relações artísticas entre criadores de vários países — diz o coordenador do FIT.
CORREIO BRAZILIENSE – Anarriê,
véi!
Inspiradas na tradição nordestina, quadrilhas do DF e Entorno destacam-se pela exuberância das
coreografias e por projetos comunitários
Milene Sodré
Especial para o Correio
São-joão de verdade é no Nordeste. Não há dúvida sobre a máxima, mas, o Distrito Federal, erguido
e ocupado por gente de todo o país, tem feito um arrasta-pé arretado de bom. Organizadas, as
quadrilhas juninas não só animam o terreiro como se profissionalizam, chegando a viajar pelo CentroOeste e animar festas vizinhas. Funcionam como coletivos reunidos para participar não só dos
festejos de época, mas também competir positivamente entre si, num processo de aprendizagem
constante. Só, no Circuito das Ligas de Quadrilhas Juninas do Distrito Federal, na ativa desde 2001,
são 48 grupos divididos em módulos A, B e C.
De Ceilândia, natural território de ocupação de nordestinos no DF, Robson Eiras, coordenador-geral
do grupo Sanfona Lascada, orgulha-se em recriar uma tradição que, para ele, já tem um traço
tipicamente brasiliense. “Quando viajamos pelo Brasil, sempre nos reconhecem como do CentroOeste, porque o jeito de dançar é diferente”, conta. No DF e Entorno, a dança para saudar São João
ganhou movimento mais alto, passos bem marcados, quase um salto.
Do módulo C, Sanfona Lascada canta e dança para São João há 30 anos e faz parte da liga há uma
década. Neste ano, eles exaltam o tema Em todo lugar tem um sanfoneiro para contar histórias de
músicos de forró, saídos do Nordeste em busca de oportunidades, levando no matulão apenas o som
e os sonhos. Para levantar essa espécie de “forró-enredo”, a comunidade se une para bancar e
confeccionar roupas, cenário, transporte e alimentação. Para levantar o dinheiro, organiza galinhadas,
feijoadas e rifas. O lucro dessas atividades e as inevitáveis doações de integrantes do grupo,
familiares e amigos ajudam nas despesas da quadrilha.
O clima comunitário ultrapassa a ideia de fazer apresentações localizadas. No coletivo Sanfona
Lascada, o sentimento vai além de ensaiar para brilhar como dançarinos. “Nosso intuito é se firmar
como instituição cultural, social e filantrópica, representando nossa cidade e ajudando a comunidade
a crescer com mais respeito”, indica Robson. O grupo tem o time de futebol Botafoguinho, que
incentiva o esporte, e o grupo teatral Sanfona Lascada, que trabalha com temas de saúde (contra
drogas) e sociais (valorizando a identidade local).
Grupo coeso
Lá de Luziânia, a Vai Mas Não Vai (módulo B), também aposta no envolvimento e na garra dos
participantes para formar um grupo coeso. Neste ano, eles levantam a poeira para saudar os 100
anos de Luiz Gonzaga. O grupo, que existe há uma década, está no Circuito das Ligas há três anos.
Os integrantes sonham em passar para o cobiçado Módulo A e, para isso, envolvem-se diariamente.
São 32 dançarinos (16 casais), um puxador (locutor do espetáculo) e 13 pessoas na equipe de apoio.
Gente de 12 a 40 anos, que deposita na Vai Mas Não Vai uma dedicação pessoal.
Porém, ninguém se doa mais que dona Antônia, fundadora e costureira do grupo desde 2003. A
cearense de 66 anos, que mora por aqui há 15, trouxe da terra natal o amor pela festa junina. “Desde
menina festejo o são-joão, e, quando cheguei aqui, tratei logo de montar um grupo, já que havia tão
poucos naquela época”, lembra.
Antônia pega pesado. Cria os 32 figurinos e costura sozinha os 16 vestidos (trabalhosos e ricos em
detalhes). São 40 dias costurando. A fundadora ainda tira do próprio bolso o dinheiro para bancar as
roupas, aproximadamente R$ 10 mil.
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A quadrilha Sanfona Lascada acredita que o DF e o Entorno criaram uma dança própria: passos
marcados e saltos largos
Como uma escola de samba
Comemorando 20 anos de arraial, a quadrilha Chamegos do Ó pisa na quadra, neste ano, com o
tema A chegada da literatura de cordel no Brasil. Com mais de 60 integrantes, sendo 46 dançarinos,
o grupo é formado por pessoas com idade entre 14 e 32 anos, que representam o bairro do Setor Ó,
em Ceilândia, no modulo A. Como nas equipes carnavalescas, Chamegos trabalha durante 10 meses
do ano para que tudo dê certo, tendo somente dois meses de descanso. “As apresentações terminam
no início de setembro, e já em novembro começamos as pesquisas do próximo tema. É um trabalho
minucioso, no qual fazemos viagens e utilizamos todo tipo de literatura para compor a história que
será contada em quadra”, conta Márcio Nunes, presidente do grupo.
Também é a partir de novembro que a equipe dará início às ações para arrecadar a verba que
possibilitará a confecção dos trajes e as despesas com transporte e alimentação, já que não contam
com nenhum tipo patrocínio. “Nós vendemos lanches na porta da paróquia, fazemos rifas, entre
outras coisas. Essas ações são vitais para a sobrevivência do grupo”, revela Márcio. Em janeiro,
começam os ensaios da coreografia. Ali, eles abusam da teatralização para enriquecer o espetáculo.
A preparação física também é importante, já que durante o período junino, eles chegam a fazer até
três apresentações diárias. Além da manutenção da tradição, muitas vezes desconhecida, o maior
ganho é o trabalho a jovens e adultos, que, muitas vezes, possuíam algum tipo de dependência
química antes de entrar no grupo.
Competição ferrenha
O Circuito das Ligas de Quadrilhas Juninas do Distrito Federal tem o objetivo de promover
apresentações de quadrilhas de são-joão pelos quatro cantos do DF. Apesar de não distribuir troféus
nem dinheiro, a competição é ferrenha pela melhor colocação e posição no ranking. A programação
das quadrilhas está no www.confebraq.com.br
CORREIO BRAZILIENSE –
Construtora de sonhos / Entrevista
PAULA SAYÃO Quando está fervilhando de ideias, a bailarina, coreógrafa, economista e atual
gerente do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) de Brasília, Paula Sayão, costuma virar um trator.
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É um pega daqui, muda de lá, constrói acolá. Nessa hora, quem está ao lado comenta: xi, baixou o
Bernardo Sayão. Neta do engenheiro, um dos ícones da construção de Brasília, ela herdou essa
inquietação construtivista, levada como marca para a nova gestão à frente da instituição, que vive
uma nova fase: a de se espalhar por Brasília por meio de parcerias.
Irlam Rocha Lima
Ricardo Daehn
Sérgio Maggio
O CCBB entrou em processo de parcerias com outras instituições da cidade. Qual o objetivo dessa
estratégia?
O CCBB completou 12 anos e passou por várias fases, com gestões importantes que o fizeram
crescer e se consolidar com referência cultural. Agora que ocupamos esse lugar de respeito na
cidade e entre os frequentadores, passamos para uma outra fase. A de democratizar ainda mais e
ampliar o acesso. Isso porque os teatros e o cinema, por exemplo, têm uma capacidade física
limitada. Então, por que não fazer uma parceria com um cinema maior, como é o caso do Cine
Brasília? A gente permite que um número maior de pessoas participe da programação a partir desses
parceiros, como o Cine Brasília e o Clube do Choro.
Como é a parceria com o Clube do Choro?
O Clube do Choro já era patrocinado pelo Banco do Brasil, então resolvemos estender ao CCBB,
criando um intercâmbio de artistas, com o objetivo de ampliar plateias. O Clube do Choro é um
espaço muito importante para Brasília e nós vamos somar, fazendo com que o artista, que já vem à
cidade com as despesas todas pagas pelo CCBB, fique mais um dia e toque em mais uma
oportunidade. Por exemplo, vamos abrir a homenagem a Gonzagão com Moraes Moreira, na área
externa, no domingo. Na segunda, dia em que o CCBB não funciona, ele abre um projeto no Clube do
Choro, que vai girar em torno dos 100 discos mais importantes da MPB. No caso do Moraes, Acabou
chorare, de Os Novos Baianos.
Surge aí um CCCB virtual?
Sim, ele começa a caminhar para outros espaços. É uma fase mais madura, que sucede à fase em
que tivemos que trabalhar forte para inserir Brasília no circuito de estreias nacionais.
A preocupação com as estreias nacionais é uma grande vitória, como é o caso da abertura da
exposição sobre Pixinguinha.
Sim, porque as estreias projetam Brasília num cenário nacional. Antes, havia uma briga para manter
essa proposta porque as produções não queriam. Tinha um clima de “deus me livre”, de ser um
ensaio geral. Agora, muitas fazem questão de colocar na proposta Brasília como um começo, até
porque os artistas perceberam o quanto o público brasiliense é criterioso. Cada centro cultural tem
sua especificidade, a nossa é de renovar e ampliar o público. Nesse sentido, as estreias nacionais
são imprescindíveis e temos a nossa cota.
A situação do Cine Brasília a incomoda? Futuramente, o CCBB pretende entrar nessa nova
estruturação?
Estamos conversando com a Secretaria de Cultura e com a expectativa de um acordo de cooperação
para que possamos ir com a programação do CCBB para lá. Nossa sala de cinema é pequena. A
mostra de Almodóvar, por exemplo, lotou e não cabia as pessoas, numa época em que o circuito de
arte na cidade estava fechado. Com um pouco mais de recursos, posso levar essa programação para
600 pessoas. Sou apaixonada pelo Cine Brasília e poder contribuir com uma programação regular de
cinema está no nosso plano.
Em relação às cidades do DF, há planos do CCBB estender as atividades para esses locais?
No ano passado, tínhamos o projeto Escritores Brasileiros, que acontecia aqui e lá, em parceria com
o Sesc. Sozinho, o CCBB não consegue caminhar. Temos planos para as cidades, como o de escoar
a boa produção para o CCBB, proporcionando que esses cidadãos venham. Para quem não tem
carro, hoje há o sistema de ônibus que funciona bem. Então, ter o CCBB como vitrine para a cidade é
uma grande possibilidade, como aconteceu no projeto Radiografia Cultural, que mapeou a produção
da periferia do DF. O CCBB quer dar tela para os sem-tela, palco aos sem-palco, tentar dar um
espaço maior para que a programação local seja inclusa, lembrando que o nosso edital é nacional,
para todos os CCBBs criarem uma programação conjunta.
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Existe uma cota para incluir essa programação local?
A cota está misturada. Numa mostra de cinema nacional, posso inserir um cineasta de Brasília num
debate; na área externa de um show, amplio a proposta de nomes da cidade; numa peça local, posso
projetá-la para os outros CCBBs.
O que de mais ousado aconteceu no CCBB até hoje?
A maior surpresa dos últimos tempos foi há duas semanas, com o projeto Todos os Sons, que junta
um artista nacional com outros locais, numa ideia de levar atrair as famílias no domingo à tarde.
Nosso público variava entre 2 e 3 mil. Agora, com Criolo, Sistema Criolina e Paula Zimbrus, bateu 12
mil pessoas na hora do show, sendo que, durante o dia, nosso contador registrou 14,5 mil. Isso sem
nenhuma ocorrência. O que aconteceu é que investimos pesado nos eventos ao ar livre, porque o
CCBB tem uma área externa que permite essa atividade durante seis meses de seca. Exigimos um
pouquinho mais nas escolhas dos nomes nacionais e incrementamos a conversa com as atrações
locais.
O CCBB imaginou esse público?
Tomamos um susto quando vimos que próximo ao show havia 7 mil pessoas confirmadas no
Facebook. Então, trabalhamos antecipadamente para ampliar o sistema de segurança, o serviço de
bar e o estacionamento. Mesmo assim, foi surpreendente aquela plateia para ver Criolo em seu
primeiro grande show em Brasília. Ele ficou feliz. Agradeceu no Twitter aos pais que levaram seus
filhos e aos netos que trouxeram os seus avós.
Os shows ao ar livre vão se estender a outros projetos?
Esse investimento na área externa segue com a homenagem a Gonzagão, com Moraes Moreira, e
show de Gaby Amarantos, Felipe Cordeiro e a Gangue do Eletro, em projeto que vai mapear a
música do Pará, do carimbó ao tecnomelody. Assim, a gente democratiza ainda mais. As pessoas
encontram um CCBB aberto e sem pagar ingresso. Nosso espaço maior é no fim de semana, quando
temos 10 mil visitantes. É diferente do Rio e de São Paulo, que estão no Centro e ganham muita
visitação durante a semana. Com a exposição de Escher, por exemplo, o CCBB Rio teve a exposição
mais visitada do mundo. Pela primeira vez, o Brasil entrou nesse ranking mundial
A dança não é muito privilegiada na programação. Isso tem a ver com o fato de você ser bailarina de
origem? É um policiamento?
Nosso eixo curatorial para a dança é o contemporâneo, os novos criadores. Não temos espaço físico
para realizar espetáculos de dança clássica. Quem sabe numa dessas parcerias eu consiga? No ano
passado, fizemos uma parte do Panorama, que acontece no Rio. Neste ano, colocamos a Marcia
Milhazes na área externa, num aquário montado. Tenho um problema grave: possuo uma sala para
ideias, shows, teatro e dança.
No Rio, há as famosas senhorinhas das vans que frequentam os teatros. Aqui, há um perfil de
público?
São professores universitários e senhoras da terceira idade que adoram o cinema. Há também um
público de meia-idade que é majoritário. Os adolescentes não estão ainda muito presente. Mas
estamos trazendo eles com projetos como Game On. Hoje, com as redes sociais, podemos ver as
carinhas de cada um . É um público exigente, que reclama quando não gosta. Queremos renovar
essa plateia sempre, porque não somos um museu, somos um centro de convívio.
Esse perfil de público está menos elitista?
Ainda é elitista, mas a proposta é trabalhar para que não seja. O CCBB não é só para o Lago Sul, é
para todos do DF.
Você teme a concorrência com outros centros culturais na cidade?
Não existe esse sentimento. Se entrar um outro centro cultural, a cidade só ganhará. A nossa
programação enriquece. Essa coisa de concorrência não existe. Precisamos ganhar mais em
qualidade, em intercâmbio.
Há projetos de ampliar a estrutura física do CCBB?
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No segundo semestre, eu fecho a Caixa de Vidro para reforma, com subsolo, controle de umidade,
antessala, área de convivência ao redor, e inauguro um pavilhão provisório no jardim, desenhado por
Antonio Gomide.
Qual foi o seu momento mais feliz como artista?
Quando resolvi coreografar despretensiosamente, em duas oportunidades. A primeira, quando fui
convidada para um projeto de graduação da UnB, chamado Rita, com música do Casa de Farinha,
que abriu um seminário internacional de dança. A outra, quando fiz o espetáculo Fuxico, em que
misturei dança popular com música paraibana executada ao vivo.
A música é o novo carro-chefe do CCBB Brasília?
A briga vai ser feia com as artes visuais, do jeito que planejamos fazer shows para 20 ou 30 mil
pessoas em nossa área externa. Claro que, para os CCBBs, as artes plásticas fazem muito sentido,
pois podemos trabalhar os programas educativos.
Como está a memória do seu avó, Bernardo Sayão, para essa nova geração de Brasília?
A família tem um trabalho sério a fazer, porque essa memória está se perdendo. Agora, com a
reinauguração do Catetinho, há um ânimo porque a história está lá. Precisamos partir para a criação
de algo mais institucional, temos muito material.
CORREIO BRAZILIENSE - A cara
do pai
Maíra de Deus Brito
Pela primeira vez, a Cia. de Comédia Os Melhores do Mundo assiste a um texto encenado por um
outro elenco e sob sua supervisão
O encontro entre Adriana, Siri, Victor e Welder (ao centro) com Kael e Carol (primeiro plano);
Robson, Alexandre e Similião (ao fundo): espelho mágico.
(11/06/2012) Era abril de 1995 e a Cia. de Comédia Os Melhores do Mundo ainda se chamava A
Culpa é da Mãe quando estreou o infantil Nada é de brinquedo quando alienígenas ameaçam nossas
jujubas, que contava as peripécias do garoto Pedro Henrique (Ricardo Pipo) e do herói Capitão
Cataplam (Adriano Siri). Para salvar o mundo, a dupla precisava lutar contra as maldades do vilão
Doutor Azedox (Jovane Nunes). Após 17 anos, a trupe brasiliense decidiu dar outros ares para o
trabalho: entregou o texto para um novo elenco. No sábado, pela primeira vez, o grupo ficou diante do
resultado dessa guinada.
“É emocionante ver eles fazendo uma coisa que a gente construiu. Gostei e acho que eles podem
melhorar cada vez mais. Sabia como iam ser as falas, mas me surpreendi porque eles trouxeram
novas piadas. Me diverti”, disse, comovido, Adriano Siri. “Assistir à peça com o público é outra coisa.
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A gente ensaia durante meses, mas não sabe como será a resposta. Foi fantástico”, completou
Adriana Nunes.
A ideia de passar para outras mãos o espetáculo da companhia existia há cinco anos. O grupo tinha
vontade de montá-lo novamente, contudo, a proposta não cabia na agenda lotada. “Jujubas é algo
muito precioso pra gente, mas estamos viajando muito e não teríamos como levá-lo para todos os
lugares. Aí, no ano passado, Robson Nunes perguntou se tínhamos um infantil para ele fazer”, conta
Adriana.
Desde que saiu do Disney Channel, Robson tinha o desejo de montar um infantil, mas queria fugir do
convencional. Foi quando conversou com Victor Leal e assistiu ao DVD da peça. “Eu me apaixonei
pela história: um herói superbrasileiro, gordinho, e agora na versão afro. Está sendo maravilhoso”,
elogia o ator e comediante que, no fim de junho, trará para Brasília o show solo de humor, Afrobege.
Teatro, cinema e internet
“Durante as cinco semanas em que Nada é de brinquedo quando alienígenas ameaçam nossas
jujubas ficará em cartaz, vamos observar o que pode ser melhorado, pensar em cenários. Queremos
transformá-lo em um musical bacana”, revela Adriana. A peça tem cinco músicas gravadas pela
companhia e uma delas foi transformada em clipe, disponível na web. O vídeo é um embrião do
projeto que pretende transformar Jujubas num longa-metragem animado.
A lista de resoluções 2012/2013 dos Melhores do Mundo não para de crescer e ainda inclui a
gravação do DVD Sexo, em Brasília; a produção de Tira: Codinome Perigo para uma novela de
internet e o lançamento de Hermanoteu na terra de Godah nas telonas. Previsto para o segundo
semestre de 2013, o filme está em fase de pré-produção e sob os cuidados da produtora Casé
Filmes, de Bruno Mazzeo.
Além-mar
Se existe um “culpado” pelo sucesso nacional dos Melhores do Mundo, ele é Joseph Klimber. Graças
ao personagem da peça Notícias populares — marcado pelo bordão “a vida é uma caixinha de
surpresas”—, o grupo quebrou recordes de apresentações e de público. “Fomos dar uma entrevista
para o Jô Soares e depois o site Jacaré Banguela colocou na internet o esquete. Estávamos em
cartaz em São Paulo com Misticismo e, no fim de cada sessão, todo mundo pedia o Joseph e não
entendíamos nada. Aí descobrimos o estouro na web e isso possibilitou a excursão que fizemos pelo
Brasil”, lembra Adriana.
O êxito do sexteto formado por Adriana Nunes, Adriano Siri, Jovane Nunes, Ricardo Pipo, Victor Leal
e Welder Rodrigues foi além-mar, chegou em Portugal e, em breve, deve desembarcar na Argentina.
A produtora Tickets For Fun, que trabalha com o grupo na capital paulista, abriu um teatro em Buenos
Aires e espera os brasileiros por lá. “Será uma experiência para, no futuro, criar a montagem de
Hermanoteu em espanhol. Ainda não conseguimos viabilizar a produção de espetáculos nossos com
outros atores no exterior porque é uma coisa muito grande. Porém, Miami, Nova York, Paris e Japão
são lugares com uma comunidade brasileira muito grande e que estão em negociação para receber
peças nossas. Por isso Jujubas é muito importante. Essa peça é o primeiro passo para ver como os
nossos textos ficam com outras pessoas, como eles funcionam”, comenta.
Dobradinha no palco
Jujubas surgiu a partir de outro trabalho dos Melhores do Mundo: Rumo ao planeta Boing. A peça
narrava a história dos primeiros brasileiros que iam para o espaço e tinha no cenário uma nave
espacial. “Daí pensamos que as crianças adorariam aquilo e que podíamos fazer um infantil usando o
mesmo espaço, assim nasceu Jujubas, que era apresentado à tarde, e o adulto à noite”, diz Adriana
Nunes.
ARTES PLÁSTICAS
BRASIL ECONÔMICO - As
cores do Cerrado de Siron
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(08/06/2012) Quem for no Rio + 20 vai conferir a mostra do artista plástico Siron Franco, que será
exposta de 12 a 23 de junho, no salão principal do Museu de Arte Moderna (MAM- RJ). A convite da
ministra doMeio Ambiente Izabella Teixeira, Franco criou a videoinstalação sensorial “Brasil Cerrado”,
que será montada em mais de 600 m² de área distribuídas em quatro salas e em dois painéis.
Para a beleza do cerrado brasileiro, o artista mostrará de forma criativa a necessidade de preservar a
região. Insetos, flores, pássaros, animais, texturas, cores e odores do cerrado serão apresentados em
grandes projeções com alta definição, esculturas, fotos e textos. A mudança de ambiente será
caracterizada e percebida pelo público através da sonorização dos espaços e da presença de
elementos sensoriais como água, calor e outros.
A destruição do cerrado, que acolhe o segundo maior bioma do país, será o foco da obra. “A
intenção é provocar conforto e desconforto. Apresento o acolhimento que a natureza nos proporciona
e também a destruição que o homem vem causando”, declarou Franco.
Ainda segundo o autor, o público verá a necessidade de adotar ações de proteção ambiental.
Mapas da degradação serão disponibilizados em tempo real, via satélite, tirados do site do Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).
Siron Franco criou mais de 3 mil obras, além de instalações e interferências, representadas nos mais
importantes salões e bienais internacionais. Além disso, em 1992, com apoio da Prefeitura Municipal
do Rio de Janeiro e do Fórum Global da Conferência da ONU Eco'92, Siron Franco criou o
Monumento à Paz, que está instalado desde então no Centro do Rio.
O MAM abrirá ao público de segunda a sexta-feira, das 11h às 18h e aos sábados, domingos e
feriados, das 11h às 19h. O evento é gratuito. C.M.
O ESTADO DE S. PAULO -
Tempestade de areia em Kassel
A brasileira Renata Lucas cria instalação crítica e poética para a Documenta 13
(8/6/2012) CAMILA MOLINA, ENVIADA ESPECIAL / KASSEL - Um simulacro em que Kassel é
tomada por tempestades de areia. Mais ainda, uma obra formada por partes de pirâmides encravadas
em porões e sótãos de edifícios: Ontem, Areias Movediças, que a artista brasileira Renata Lucas
criou especialmente para a Documenta 13, a ser aberta amanhã para o público, é mais um de seus
trabalhos conceituais que envolvem o espaço urbano e expositivo. Suas intervenções, à primeira vista
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estranhas, requerem a percepção de quem está desatento e desafiam o espectador. No caso desse
projeto, ele se faz como que em simbiose com o tecido da cidade e sua história, guardando em
camadas a potência da materialização poética e crítica de uma ação artística.
Ontem, Areias Movediças . De RenataLucas: partes de pirâmides ocupamo subsolo de quatroedifícios da cidadealemã
Sempre há algo de crítico nas obras de Renata. Numa descrição de seu trabalho para a Documenta
13, seis pontos com sinal gratuito de internet, delimitados por um quadrilátero no centro de Kassel
abrangendo o porão do museu Fridericianum, o subsolo do prédio onde se hospedou a curadora da
exposição, Carolyn Christov-Bakargiev - local era a antiga casa dos irmãos Grimm -, o piso inferior da
loja de departamentos Kaufhof; e mais uma outra localidade da Friedrichsplatz, possibilitam aos
visitantes capturar com telefones, tablets e computadores vídeos que a artista produziu usando
imagens artificiais de locais da cidade alemã sendo invadida por tempestades de areia como as dos
desertos. Renata usou o Photoshop e se apropriou de cenas da internet. Mais ainda, esculpiu em
madeira e concreto o que seriam os fragmentos de uma pirâmide nos quatro pontos que formam o
quadrilátero de sua ação.
"Escolhi a pirâmide por ser um elemento comum, mas ainda assim um sólido geométrico calculado
matematicamente e comum a diversas culturas", diz a artista. Mas há outros sentidos complexos por
trás dessa escolha. "Além de qualquer aspecto místico intrínseco, a pirâmide faz referência à
monumentalidade da Documenta, à mística da própria mostra, ao modo como as pessoas chegam
em massa a Kassel atrás de um sinal", conta ela. "Preferi buscar um símbolo para falar de uma
história materializada no subsolo, do número de mortos e escondidos que caracteriza o subsolo da
cidade como uma urbanização em paralelo."
A artista faz menção, nesse sentido, à "indústria armamentista que sustenta a cidade ao mesmo
tempo que alimenta os conflitos no Oriente Médio; à fantasia de uma cultura superior anciã; à própria
fantasia delicada da curadoria ao ir buscar parceria com o Afeganistão e Egito; à fantasia comum em
relação ao Oriente, ao exótico; às imagens facilmente recolhidas da internet e que você pode pegar e
colar para construir ficções como provas da realidade nas telas de vigilância; aos processos
migratórios e migrações de paisagem".
A obra, assim, é um escopo de disparos contundentes de Renata Lucas. Quando passamos pelo
porão do Fridericianum, por exemplo, não temos ideia de que aquele pedaço de uma base de
pirâmide poderia abrigar tantas questões. Curiosamente, ainda, o título do projeto foi baseado em
texto surrealista do escultor e pintor Alberto Giacometti.
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Renata Lucas foi convidada em 2009 pela escritora e curadora Carolyn Christov-Bakargiev a
participar da Documenta 13. Volta e meia, está escalada para as principais mostras de arte
contemporânea, como a última Bienal de Istambul, a 53.ª Bienal de Veneza e a 27.ª Bienal de São
Paulo, entre outras, além de ter recebido prêmios e residências no exterior. "Não há hierarquia, toda
exposição é perturbadora e todo lugar tem assunto", diz a artista.
"A Documenta é muito importante porque permite um tempo de pesquisa e reflexão maior, tem um
time curatorial afiado e o artista também tem oportunidade de acompanhar o processo de outros
artistas. Mas está longe de ser ideal com seus problemas de comunicação, autorização (restrições de
segurança inviabilizaram vários trabalhos) e orçamento. Entretanto, a Documenta permite um certo
afastamento que o circuito frenético de bienais e feiras já consumiu. Ela ocorre num lugar
absolutamente inexpressivo, que literalmente 'incorpora' uma entidade que está fora do movimento
local, e você precisa cavar fundo nesse falso contexto de mesmice e banalidade que é a cidade de
Kassel para entender sobre o que esta urbanidade plácida está construída."
FOLHA DE S. PAULO -
Brasileiro Kobra leva suas tintas para muro de Nova York
(09/06/2012) DE SÃO PAULO - Eduardo Kobra, artista urbano conhecido por pintar murais nas ruas
de São Paulo, levou suas tintas para uma esquina de Chelsea, em Nova York.
Na parede de um loja de som de carros, ele apresenta uma releitura da famosa fotografia do beijo em
Times Square, tirada em 1945, por Alfred Eisenstaedt.
Ao redor do casal se beijando, em vez do movimento registrado na clássica foto, com pedestres a
observar a cena, lojas e a linha de bonde, Kobra pintou um arco-íris com cores fortes.
O maior de todos os murais do artista foi pintado na avenida 23 de Maio, com 1.000 m².
O GLOBO -
Exposição coletiva revela o surrealismo nosso de cada dia
Tema une 57 artistas contemporâneos a partir de hoje no Centro Hélio Oiticica
Catharina Wrede
(09/06/2012) Nada de relógios derretendo ou peixes voadores. O surrealismo que a nova exposição
do curador Marcus Lontra quer mostrar vai muito além do clichê. Na coletiva “Espelho refletido — O
surrealismo na arte contemporânea brasileira”, que ele inaugura hoje, às 17h, no Centro Municipal de
Arte Hélio Oiticica, o foco está na produção atual de artistas que, de alguma forma, dialogam e
atualizam o movimento imortalizado por Salvador Dalí e Buñuel.
A mostra reúne cerca de 200 obras de 57 artistas diferentes, entre nomes já consagrados, como
Ernesto Neto, Roberto Magalhães, Adriana Varejão, Luiz Zerbini e Vicente de Mello e outros mais
novos, entre eles Nino Cais, Flávia Metzler, Gabriela Mureb e Pedro Varela.
Narrativa estranha
Os tipos de obras e suportes escolhidos por Lontra são diversos. Pinturas e esculturas dividem o
espaço com objetos estáticos e em movimento, vídeos e performances. Em comum, todos
apresentam uma narrativa estranha, fantástica, ora perturbadora, ora absurda.
— Analisando os trabalhos feitos hoje, percebi um novo surrealismo contemporâneo muito forte — diz
Lontra. — Vi, através dos novos curadores e artistas com quem convivo, como o compromisso da
criação através da arte não era mais com aquela utopia do mundo ideal, do homem ideal. Isso não
existe. O que precisamos mostrar é esse mundo fragmentado de hoje, como o surrealismo permeia
nossa realidade.
Os 57 artistas escolhidos, no início, eram apenas 20. O número foi aumentando à medida que o
curador observou o quanto a produção atual está conectada:
20
— A comunicação é a principal questão da arte hoje. O que é periferia no mundo atual? É a arte a
responsável pela ligação entre o inconsciente e o consciente, o “eu” e o “como eu me vejo”. E o
surrealismo sempre tratou disso.
Daí o nome da mostra. Lontra montou a grande coletiva como uma espécie de prelúdio do que
planeja no futuro: junto com outros quatros curadores cariocas (Daniela Name, Felipe Scovino,
Bernardo Mosqueira e Marcelo Campos), ele articula um megaprojeto — já apresentado à secretaria
municipal de Cultura — para 2013: quer inaugurar, em um grande galpão, cinco mostras de arte
contemporânea brasileira paralelas, cada uma com cerca de 30 artistas, sob diferentes óticas
curatoriais.
— O Rio precisa de eventos grandes. Essas exposições acontecendo ao mesmo tempo, aliadas à Ar
tRio, por exemplo, podem fazer com que a cidade volte a ser o centro cultural do país. Sempre
tivemos vocação para isso. Está na hora de aproveitarmos esse bom momento.
“Optical empire”, de Luiz Zerbini
CORREIO BRAZILIENSE -
Língua da arte
Um artista brasileiro e outro italiano, sem falarem o mesmo idioma, produzem três painéis em prédios
de Brasília
YALE GONTIJO
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Mural de Mr. Klevra e Guga Baygon no Conic: santas enormes fixadas com jatos de sptray
(11/06/2012) Dois tipos de arte distantes. Um dos artistas é da Itália e se chama Mr. Klevra. Outro
nasceu em Recife, mas vive em Brasília há sete anos e usa o nome artístico de Guga Baygon. Os
estilos dos dois se cruzaram recentemente para preencher três espaços vazios na paisagem urbana
de Brasília. O projeto Mural Itália-Brasil percorrerá também as cidades do Rio de Janeiro e Salvador.
Em todas as capitais, os locais escolhidos têm características semelhantes. “Escolhemos um lugar de
grande circulação de pessoas, um na instituição apoiadora (Caixa Cultural) e um na periferia, onde a
penetração da arte ainda é difícil", explica o curador do projeto Marco Antônio Teobaldo. “A força da
arte urbana reside no fato de que ela pode percorrer diversos territórios, com vários tipos de perfis. É
uma arte facilmente compreendida pelas pessoas, em acessos públicos. Feita a céu aberto, pode
promover a cultura com mais facilidade do que nos museus e galerias”, acrescenta o curador.
Uma das paredes externas da Caixa Cultural de Brasília foi decorada com uma composição na
mesma linha. Na parte educativa do projeto, um dos muros da Escola Classe Estrutural 1 recebeu o
colorido do grafite e uma oficina para cerca de 350 crianças. Enorme mural ocupa um dos muros do
Setor de Diversões Sul (Conic). No painel grafitado ao lado do Quiosque Cultural, duas enormes
santas fixadas por jatos de spray emolduram um pôster central em formato de anjo, com jeito de
super-herói de autoria de outro italiano, Omino 71 (que não pôde vir ao Brasil).
Linguagem sacra
A santa localizada à esquerda, com traços de pintura bizantina, é de autoria de Mr. Klevra. A da
direita, uma santa alienígena feita pelo brasileiro. “O estilo que o Klevra trouxe para o projeto é o que
ele e o Omino estão trabalhando no Eikonprojekt. São ícones de linguagem sacra, sem ser religiosa.
A ideia dos italianos é trabalhar com múltiplos suportes, por isso a mistura do pôster com grafite. A
minha ideia foi criar uma santa que não fugisse do meu estilo e se encaixasse no trabalho”, explica
Baygon.
Mr. Klevra não fala português. Baygon não fala inglês ou italiano. Foi preciso encontrar uma maneira
de fazer os dois se entenderem. “A gente conseguiu uma nova comunicação telepática. Eu só falo
pernambuquês. O Klevra ouvia todo mundo falando em um estilo e eu falava com o meu sotaque. Ele
percebeu a diferença. A gente se comunica por e-mail até hoje. Chamamos isso de a magia do
Google Tradutor”, brinca Baygon.
Em meio a tantas diferenças, algumas semelhanças foram encontradas: “Nós não nos encaixamos
muito no estilo do hip-hop. Nossa pegada lembra a galera da pop arte, bem figurativa. Somos
roqueiros e, enquanto a gente trabalhava, ouvíamos metal e reggae”, diferencia Baygon, que também
é tatuador. O mural faz parte das parcerias promovidas pelo Momento Itália Brasil, realizado em
nosso país desde o ano passado, e cumpre uma das ambições do projeto cultural, que pretende
estreitar os laços entre os dois países.
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Segundo o embaixador da Itália no Brasil, Gherardo La Francesca, a intenção é levar as artes para o
meio da rua. “A cultura não tem de ser um fenômeno elitista, fechado nos museus. Tem de ser algo
ligado ao povo e às expressões populares. O que não quer dizer que seja uma cultura menor. A
intenção é desfazer essa visão”, resume La Francesca.
Três perguntas // Mr. Klevra
Para algumas pessoas, a street art é a forma mais importante de arte atualmente. Por quê?
A arte de rua é uma das coisas mais inovadoras e originais do nosso tempo. Do meu ponto de vista,
esse poder ainda não foi plenamente reconhecido pela maioria das pessoas porque a arte de rua e o
grafite são invariavelmente confundidos com vandalismo e os artistas que a praticam não são levados
a sério. O que existe de novo e fresco nesse tipo de arte são as galerias que o artista escolhe. Nas
ruas, cada trabalho é planejado para ser realizado especialmente naquele lugar, com aquela luz, com
aquela arquitetura. Os observadores podem se deparar com algo inesperado. A arte de rua deixa o
artista livre para se expressar da maneira que quiser, pode usar esquemas da arte clássica misturada
ao uso de qualquer técnica, como estêncil e spray. Para mim, a arte de rua é liberdade de criar para
pessoas comuns.
O que você leva da experiência no Brasil?
A experiência no Brasil foi maravilhosa. Fiquei impressionado com a técnica e alegria do Guga
Baygon. Apesar de não falarmos o mesmo idioma, nós nos entendemos perfeitamente e trabalhamos
em perfeita harmonia. Foram 10 dias de muito trabalho e perfeita simbiose. A experiência no Brasil
me enriqueceu muito, profissional e pessoalmente. No entanto, o mais importante, me fez entender
que não existem limites para a criatividade.
Quais são as diferenças entre o estilo brasileiro e o italiano?
São escolas diferentes, especialmente no uso das cores. Eu amei a técnica do Guga. Não consigo
encontrar uma diferença verdadeira entre os dois estilos, mas sim a fusão. Um completa o outro.
O GLOBO - Arte
e política nas mãos das mulheres em Kassel
Maria Thereza Alves, Anna Maria Maiolino e Renata Lucas expõem na Documenta ao lado de obras
de Maria Martins
Graça Magalhães-Ruether
Enviada especial • KASSEL
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“O IMPOSSÍVEL”, de Maria Martins: uma das maiores obras expostas na Documenta, marcada pelo
silêncio e pelo vazio
“HERE AND THERE”, de Anna Maria Maiolino: Irmãos Grimm
“THE HEROES of the lake”, de Maria Thereza Alves: protesto
(13/6/2012) A escultura em bronze da artista brasileira Maria Martins (1894-1973) “O impossível”
parece monumental em comparação com a maior parte das obras mostradas na Documenta 13, a
maior exposição de arte do mundo, aberta na cidade alemã de Kassel no último sábado.
Diferentemente das edições anteriores da mostra, realizada a cada cinco anos, que tem a polêmica, a
grandiosidade e a provocação como sua marca registrada, a Documenta da curadora americana
Carolyn Christov-Bakargiev é marcada pelo silêncio e pelos espaços quase vazios, mas também pela
arte como declaração política.
Para a impressão de sobriedade, contribui também a ampliação do espaço de exposição. Além dos
palcos tradicionais, como o Museu Fridericianum, onde a brasileira Renata Lucas usa o espaço já
ocupado pelo alemão Anselm Kiefer com seu trabalho “Ontem, areias movediças”, a exposição foi
ampliada também até o Parque da Karlsaue e a estação ferroviária. Além disso, são realizados
eventos e mostras paralelas em Cabul, no Cairo e em Alberta, no Canadá.
Protesto contra a colonização
Em uma casinha de madeira, já no final do parque, a brasileira Anna Maria Maiolino fez a sua
instalação “Here and there”, onde usou 2.500 quilos de argila para formar miniesculturas. No Museu
de Ciências Naturais Ottoneum, que fica ao lado do Fridericianum, a também brasileira Maria Thereza
Alves mostra o seu trabalho sobre o drama do Lago de Chalko, ao sul da Cidade do México, onde a
colonização espanhola, iniciada em 1519, deixou marcas que ainda hoje afetam a vida da população
local.
Maria Thereza mostra o caso do lago aterrado pelos colonizadores espanhóis, ao qual as águas
voltaram, naturalmente, séculos depois. Nas paredes de uma sala do Ottoneum, as fotos de 27
homens e mulheres com aparência indígena, que hoje vivem na região do lago, parecem
testemunhas da acusação contra “o ciclo vicioso das colonizações”, como lembra a artista. Para ela,
que nasceu no Brasil mas emigrou com a família para os EUA quando tinha apenas 7 anos, a arte é
também uma forma de testemunho da realidade que toma partido. No caso do seu trabalho, a favor
das vítimas da colonização.
— Eu abordo o problema no México, mas não se trata de uma situação local e específica. É algo
global, que ainda hoje continua acontecendo em muitos lugares — diz.
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Ela cita exemplos no Brasil: — Em Minas, há uma tribo que teve sua cultura destruída e hoje precisa
criar gado, atividade com a qual não se identifica — aponta a artista como outro caso de erro da
colonização. Além das fotos nas paredes, Maria Thereza mostra na Documenta o livro que escreveu
sobre o Lago de Chalko e uma reconstrução em papelão da paisagem da região.
‘Depoimento poético’
Para Anna Maria Maiolino, que nasceu na Itália mas foi morar no Brasil em 1960, a obra de arte é um
testemunho, mas é sobretudo um depoimento poético.
— Toda obra de arte é poética, porque trabalhamos com metáforas — diz a artista ao explicar a sua
obra “Here and there”, que instalou numa casinha de madeira antigamente ocupada pelos
trabalhadores do parque Karlsaue.
Anna Maria recebeu o convite para participar da Documenta em 2010. Depois de percorrer todos os
lugares onde poderia expor, ela se deparou com a casinha.
— Quando eu vi essa casa, escondida no meio das plantas, pensei nos Irmãos Grimm, que viveram
na cidade, e resolvi que este seria o lugar onde instalaria o meu trabalho — disse.
Segundo ela, a intenção da sua instalação era mostrar a mão como a ação primordial, a ferramenta
inicial que tornou tudo possível. Em seguida vem o material, a argila, que simboliza o ciclo da vida, o
que volta a ser pó para se integrar de novo à natureza. Na sala da casinha, que tem subsolo, térreo e
primeiro andar, ela mostra um video que fez em 1976 e fotos nas paredes. Renata Lucas, que em
2010 recebeu o Prêmio da Fundação Schering, de Berlim, criou, no subsolo do Fridericianum, onde
ficava a casa dos irmãos Grimm, pirâmides encravadas e uma parede de madeira. Ela escolheu a
pirâmide por ser “um elemento comum a diversas culturas”.
No mesmo espaço, Anselm Kiefer havia mostrado o lugar dos Nibelungos — uma abordagem mítica
da cultura alemã —, mitos que culminaram com a catástrofe da ditadura nazista e a destruição de
Kassel no final da Segunda Guerra Mundial. O tema destruição toca também a obra de Renata, que
chamou o seu trabalho de “Ontem, areias movediças”, baseado em texto do escultor Alberto
Giacometti. Segundo ela, a pirâmide é também uma alusão ao Oriente Médio e à indústria
armamentista, que sustenta o conflito na região.
Artistas e cientistas mortos
Maria Martins, uma das pioneiras da emancipação da mulher brasileira, conhecida também por ter
sido amante do artista surrealista francês Marcel Duchamp, não é a única artista já morta na atual
Documenta. Salvador Dalí tem seus trabalhos confrontados com os do geneticista Alexander
Tarakhovsky, que tentou visualizar em imagens o genoma de pessoas traumatizadas.
Partindo da sua visão da arte como algo essencial, a curadora americana Carolyn Christov-Bakargiev
(conhecida pelo apelidosigla CCV) incluiu também cientistas já falecidos, como Konrad Zuse, o
inventor do computador, que também foi pintor, como parte da análise de “momentos capazes de
mudar o mundo”. Um lugar carregado de História é o antigo mosteiro de Breitenau, nos arredores de
Kassel, onde a artista croata Sanja Ivecovic fez uma instação com jumentos de pano, que chamou
com nomes, entre outros, de Walter Benjamin ou de Martin Luther King, simbolizando pessoas que
morreram pelas suas convicções.
Ivecovic teve a ideia de fazer o trabalho ao encontrar no arquivo de Kassel uma foto de um jumento
de 1933, que os nazistas haviam feito para humilhar os judeus como tão inferiores quanto o animal.
Ela usa como declaração política os objetos pessoais de Hitler e de sua amante, Eva Braun,
coletados em 1945 pela repórter americana Lee Miller, que chegou a Munique em 1945, com as
tropas aliadas, e posou para uma foto na banheira do ditador.
MÚSICA
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O ESTADO DE S. PAULO -
Foles dinâmicos no meio do jazz. O suingue de Maceo Parker
em dois palcos
Bebê Kramer e Toninho Ferragutti juntam seus acordeons em festival
(8/6/2012) LAURO LISBOA GARCIA, ESPECIAL PARA O ESTADO - Há quase dois anos rodando o
Brasil com um dinâmico duo de acordeons, o paulista Toninho Ferragutti e o gaúcho Bebê Kramer
levam seu concerto popular em versão ampliada para o BMW Jazz Festival. Eles representam o
Brasil como a segunda atração da noite de estreia do festival hoje, na Via Funchal.
Bebê e Toninho. Sofisticação clássica comsenso de humor
Entre outras afinidades musicais, a dupla tem a sofisticação clássica e o senso de humor na forma de
tocar e de apresentar seu repertório. No show de amanhã, terão como convidados outros dois
refinados acordeonistas: o cearense Adelson Viana e o paulista Gabriel Levy. "Viana vem da escola
nordestina e Levy tem se interessado muito pela música cigana, do Leste Europeu. Bebê traz a
cultura do Sul e eu, a do interior de São Paulo", observa Ferragutti, que tem vasta experiência em
tocar com várias formações e com artistas de diversos estilos.
Desta vez também terão um grupo de apoio com Alexandre Ribeiro (clarinete), Zé Alexandre
Carvalho (baixo acústico), Henrique Araújo (cavaquinho) e dois percussionistas, Amoy Ribas e
Roberto Angerosa, este especialista em flamenco. "Minha intenção é realçar que no forró elegante de
Adelson também tem um pouco da cultura árabe, que fez o caminho pela Península Ibérica. E a
sanfona é um instrumento bastante representativo da cultura popular não só do Brasil, mas desses
outros países", diz Ferragutti.
Para Kramer, o diálogo musical com Ferragutti se dá de forma espontânea. "Isso resulta de a gente
ficar tocando horas juntos, cada um sabe o lado certo pra onde vai. Muitas coisas a gente nem
combina. Em cada show da turnê a gente ficava duas horas antes tocando juntos, então é por isso
que é tudo bem entrosando, um completando o outro", diz o músico gaúcho.
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Com o trabalho em parceria registrado no ótimo CD Como Manda o Figurino (Borandá), eles têm
contribuído para dar outra dimensão ao instrumento, levando-o para as salas de concerto, sem
contudo tirar o brilho da alegria, que o associa ao contexto de festa, seja de vanerão ou de forró.
Entre essas duas representantes das pontas do País, no CD eles tocam valsa, choro, toada, ao
mesmo tempo uma música elaborada e divertida. No palco, entre um número e outro, costumam
narrar episódios engraçados, alguns vivenciados na própria turnê da dupla. Atitudes como a deles além de músicos e compositores como Arismar do Espírito Santo, Alessandro Penezzi e Alexandre
Ribeiro, mais ligados ao choro - têm colaborado para provar a certa parcela do público que a música
instrumental não é um bicho de sete cabeças, nem entediante. Um dos bons exemplos é o tema O
Sorriso da Manu, que Ferragutti fez para a filha de 12 anos.
"Essa vontade de se expressar de maneira engraçada é de trazer para o palco o que a gente é nos
bastidores", diz Ferragutti. "Como não temos os truques dos atores, podemos oscilar muito. Então, a
música nos dá a segurança. A gente procura deixar o show mais leve e tocar um tipo de público que
às vezes não está acostumado a ouvir música instrumental. Embora a música seja sofisticada, a
gente toca de maneira a não passar dificuldade."
A dupla segue adiante com mais 54 shows até o fim do ano. Ainda este mês, Ferragutti e Kramer
tocam nas embaixadas brasileiras de Berlim e Madri, em julho se apresentam na Flip (Festa Literária
Internacional de Paraty) e entre agosto e outubro rodam o Norte e o Nordeste brasileiro. "A gente
ainda tem muita história pra contar", diz Ferragutti.
"Viajando pelo País dentro do projeto Sonora Brasil, que fazemos pelo Sesc, uma das nossas
funções é mostrar um acordeom diferente. Conheço poucos trabalhos que vão por essa linha no
Brasil. Isso se deve à falta de material de estudo, há bem pouca gente escrevendo música para
acordeom", diz Kramer.
Apesar disso, tanto ele como seu parceiro vêm o instrumento em franca expansão pelo País. "Cada
vez mais os acordeonistas estão tendo maior formação musical. Com isso, estão percebendo cada
vez mais a riqueza, as possibilidades do instrumento, que vai muito bem com instrumentos de sopro,
de corda e de palheta. Ele tem grande poder de dinâmica e sustentação de som, então vai muito bem
com a voz também", diz Ferragutti.
O bem-sucedido encontro de Toninho Ferragutti e Bebê Kramer terá lugar entre os shows do
Ambrose Akinmusire Quintet e a reunião de Chick Corea, Stanley Clarke e Lenny White, hoje, na Via
Funchal. O BMW Jazz Festival segue amanhã com apresentações do Clayton Brothers Quintet,
Trombone Shorty, forte nome da nova geração do jazz, com Orleans Avenue, além de Maceo Parker
com Fred Wesley e Pee Wee Ellis, naipe de metais da lendária JB's, banda de James Brown. Darcy
James Argue's Secret Society, Ninety Miles e Charles Lloyd Quartet encerram o evento no domingo,
quando haverá também uma apresentação grátis, no Parque do Ibirapuera, de Parker e The Clayton
Brothers, às 17 horas. / L.L.G.
JORNAL DE BRASÍLIA -
Surpresa de Recife
Herbert Lucena é recordista de indicações na 23ª edição do Prêmio de Música Brasileira
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(09/06/2012) “Cantador pra cantar coco não pode tremer a língua", diz uma das faixas do novo CD de
Herbert Lucena, todo dedicado ao gênero. O papo é reto com o artista pernambucano, cujo nome,
desconhecido longe de Recife e de Caruaru, despontou como recordista em indicações no Prêmio de
Música Brasileira: ele concorre como revelação, melhor cantor e CD na categoria regional e ainda
pelo projeto visual do disco.
A festa, que em sua 23ª edição homenageia João Bosco, por seus 40 anos de carreira, será na
quarta-feira, no Teatro Municipal. Herbert, que está no Rio para a divulgação do trabalho, finalmente
vai conhecer o prédio histórico que até hoje só viu em fotografias. Como revelação, ele disputa com
Criolo, cujo discurso em 2011 ganhou dimensão nacional. Herbert sabe que não será fácil, mas é
assim mesmo que tem sido em duas décadas de dedicação à música.
"Sei que a possibilidade de ganhar é remota. O coco ficou muito restrito ao Nordeste e o foco é mais
o período junino. Levar para o resto do Brasil é difícil", diz. "Nem as rádios de Pernambuco tocam
os artistas de lá. A gente vê neguinho com a camisa do Estado, mas na hora de ouvir música, só
ouve ‘fuleiragem music’, esse forró de plástico de grupos como Calcinha Preta."
O CD se chama Não me Peçam Jamais Que Eu Dê de Graça Tudo Aquilo Que Eu Tenho pra
Vender. Mas isso não quer dizer que Herbert seja contra liberar sua música na internet. O que lhe
desagrada mesmo é a ideia de seu trabalho, fruto da colaboração de músicos amigos, do apoio de
empresas para a parte gráfica, e, principalmente, de alto investimento (financeiro e emocional)
próprio, de dois intensos anos, ir parar numa banquinha.
LANÇAMENTO
O lançamento foi no Recife, em dezembro, onde Herbert mora há oito anos, depois de deixar
Caruaru. Foi o próprio quem mandou o CD para o prêmio, sabendo que ele tem como característica
antiga o intuito de revelar para um público maior artistas de qualidade, "independente de vendagem,
modismo ou execução em rádios", como assinala seu criador, José Maurício Machline, há três
edições com patrocínio da Vale para o evento.
"Fiquei muito bem impressionado com a capacidade que ele tem de fazer cocos sem nenhum ranço
passadista", aponta João Cavalcanti, do grupo Casuarina, um dos 20 jurados.
Ex-roqueiro – chegou a ter banda, influenciado pelos ingleses dos Smiths e Depeche Mode –,
apaixonado pelo legado de Gonzagão, Jacinto Silva e Jackson do Pandeiro e pelo som das bandas
de pífano, gravado como compositor por Dominguinhos e Silvério Pessoa, Herbert já havia lançado
um CD em 2004, Na Pisada do Coco.
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PRESENÇA BRASILIENSE
Outro trabalho que concorre ao prêmio é o CD brasiliense Urubupeba, de Antônio Carlos Bigonha. O
disco concorre na categoria arranjador, pelo trabalho realizado por Dori Caymmi para o álbum –
lançado em 2011.
Pianista e compositor, Bigonha trabalha como procurador da República. Ele se dedica à música
desde os anos 90 e comemora por ser um dos finalistas. “Essa indicação é um reconhecimento não
só ao nosso trabalho, mas à MPB instrumental”, diz.
O casal Kleuton & Karen, também de Brasília, concorre ao prêmio na categoria Melhor Dupla
Regional. Eles lançaram o CD Genuinamente Caipira, com músicas de viola e violão.
SAIBA Mais
Este ano é o segundo Prêmio da versão itinerante, com shows em sete cidades, a última parada é
São Paulo.
Os artistas escalados são Leila Pinheiro, Mariana Aydar, Arlindo Cruz e Péricles, além do próprio
João Bosco. São 35 categorias.
Disputam 104 artistas, selecionados entre 735 CDs e 93 DVDs inscritos. Chico Buarque, Caetano
Veloso, Criolo, Beth Carvalho, Dori Caymmi e Cauby Peixoto estão entre os indicados mais de uma
vez.
O GLOBO -
Batidão sertanejo
Unindo MCs e acordeom, o funknejo faz sucesso ao juntar gêneros a princípio inconciliáveis
Leonardo Lichote
(09/06/2012) Ela veio do interior do Brasil, com um passado repleto de romantismo e contemplação
da beleza da vida simples do campo. Ele cresceu nos subúrbios e favelas cariocas — chapa quente,
papo reto. Mas, jovens, caíram nas mesmas festas, e se deu o encontro, à primeira vista improvável.
Unidos pelo desejo da diversão, regada a uísque, energético, sexo e irreverência, a música sertaneja
e o funk se aproximaram de forma tão intensa que geraram até um subgênero — o funknejo.
Os exemplos são muitos: a referência ao batidão em “Eu quero tchu, eu quero tcha”, de João Lucas &
Marcelo; duplas sertanejas dando suas versões para sucessos dos bailes cariocas (como “Adultério”,
de Mr. Catra, por Pedro Paulo & Alex, ou “Sou foda”, dos Avassaladores, por Carlos & Jader); o
surgimento de bandas como a catarinense Sertanejo. Com, que se define como de “batidão
sertanejo”; duplas e MCs gravando juntos (“Sou foda 2”, com Cacio & Marcos e Avassaladores, ou
“Vem cá”, com Sandro & Guilherme e Mr. Catra). Diversas formas de comunhão entre gêneros que
eram considerados inconciliáveis.
Mas um olhar mais cuidadoso na história de ambos mostra que a união não é tão surpreendente. O
funk tem de forma mais evidente o espírito mestiço desde sua formação, quando bebia de miami bass
e Kraftwerk. Depois, o caldo só fez engrossar com outras informações, sobretudo da própria cultura
popular brasileira, como nota MC Leonardo:
— O moleque do funk hoje dança frevo sobre batidas de tambores africanos e pandeiro de samba.
Aproximação simbólica e física Já o sertanejo, comumente associado à pureza, traz um caminho em
muitos pontos similar ao do primo carioca, com abertura para outros gêneros daqui e de fora. Autor
da dissertação “Dos braços de uma viola à dissonância de uma guitarra — Tradição e modernidade
na música caipira-sertaneja”, o pesquisador Paulo Luna traça esse histórico.
— A música caipira é gravada pela primeira vez em 1929, pelo pesquisador Cornélio Pires. Já na
década de 1930 ela começa a sofrer transformações, ao fazer contatos com outros gêneros.
Alvarenga e Ranchinho, por exemplo, tocaram no Cassino da Urca. Temas da cidade começam a ser
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incorporados, como em “O divórcio vem aí”, dos próprios Alvarenga e Ranchinho. Na década de
1940, um grupo de músicos faz uma viagem ao Paraguai e começa a incorporar a guarânia, o
rasqueado. A moda de viola passa a ser mais um elemento entre outros. A década de 1960, aponta
Luna, é um marco no sentido da apropriação de outros ritmos:
— A dupla Palmeira e Biá grava um bolero, “Boneca cobiçada”, marcando a mudança do nome, de
caipira para sertaneja. No fim da década, começa a fusão com a Jovem Guarda, principalmente com
Leo Canhoto e Robertinho, uma das primeiras duplas a usar a guitarra. Para você ver como o cenário
é complexo, hoje eles são vistos como tradicionais. Depois vieram as gerações de Chitãozinho &
Xororó, aí Leandro e Leonardo, Zezé Di Camargo & Luciano, cada vez mais voltados para a canção
romântica, afastando-se do universo do interior. A atual geração, chamada de sertanejo universitário,
radicalizou essas transformações — acredita Luna. — Como os limites da cidade avançam cada vez
mais para o interior, há uma aproximação simbólica e física cada vez maior entre funk e sertanejo.
MC Leonardo vê raízes ainda mais fundas na ligação entre ambos:
— A música sertaneja, em sua origem, tem muito de lamento negro — diz, citando a gravação de
1930 da “Moda do peão”, de Mariano e Caçula, na qual Cornélio Pires lista “a melancolia profunda do
africano no cativeiro” entre os elementos do canto caipira. — Pensamos sempre nos tambores do
candomblé, mas o negro em Minas não fez igual ao da Bahia. E o funk cresceu na favela, entre
pessoas de origem negra e nordestina. Querer impedir essa ligação é uma ignorância histórica e da
própria natureza viva da cultura.
Nas letras, o novo sertanejo carrega o mesmo hedonismo-classe-C — algo ostentatório, do camarote,
da área VIP, de bebidas caras como uísque e champanhe — do funk. Se Chitãozinho & Xororó
choravam ao lembrar do cabelo da amada e Leandro & Leonardo imploravam “pensa em mim”, hoje
sertanejo e funk se unem em versos como “Quer fidelidade? Arruma um cachorro/ Quer romance?
Compra um livro/ Quer amor?/ Volta a morar com seus pais, mulher” — de “Pentada violenta”,
gravada por artistas dos dois lados.
— O novo sertanejo, pós-universitário, é um culto à “balada” — diz o antropólogo Hermano Vianna,
que identifica cruzamentos que incluem outros gêneros. — Na base há uma mistura furiosa de ritmos,
dos baianos aos gaúchos, passando pelo tamborzão. Tudo está próximo. As duplas confirmam a
avaliação de Hermano, do encontro entre os gêneros nas baladas:
— Não éramos ouvintes de funk, mas sempre curtíamos nas baladas — diz Carlos, da dupla Carlos &
Jader. — Foi nessas festas que percebemos que o público vibrava com esse estilo musical. Hoje nos
tornamos fãs.
Pedro Paulo & Alex (que assinam junto sua declaração, enviada por email) dão testemunho similar:
— Conhecemos o funk nas festas da faculdade. Ouvimos “Adultério” (versão libidinosa de “Tédio”, do
Biquini Cavadão) com o Mr. Catra, notamos que todos estavam gravando funknejo, então resolvemos
fazer nossa mistura.
No culto à balada, a mulher deixa de ser a musa, por quem se sofria, e passa a ser um troféu, na
mesma lógica de ostentação e hedonismo. Por outro lado, ela ganha voz nas canções- resposta,
prática comum do funk (e que remete em sua origem aos desafios de violeiros) abraçada pelos
sertanejos. Nessas músicas, elas esvaziam a marra deles e afirmam seu olhar, como em “Coitado”,
resposta que Naiara Azevedo dá a “Sou foda”: “Se acha o bicho/ Nem era tudo aquilo que contava
pros amigos/ Eu sempre te defino/ Desanimador, prepotente, arrogante.”
— Gostaria de ver mais letras voltadas para a nossa realidade, os problemas do sistema. Mas a
cultura não está obrigada a nada. Acho ótimo o que os sertanejos estão fazendo — diz MC Leonardo,
que vê impactos também no funk. — Acabo de ouvir “Vai ou racha”, do MC Henrico, que vai nessa
linha, que ele chama de funk universitário.
Apoiando as letras do novo gênero, há um ritmo dançante que cruza, com originalidade, o acordeom
(quase onipresente), tocado de forma frenética, com o tamborzão (transposição do maculelê, tradição
interiorana, para uma batida eletrônica). Ou seja, um encontro rico de várias vertentes da cultura
popular.
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— Há uma rede que linka todas as novas músicas populares brasileiras. Sucessos ganham versões
em todos os ritmos. Nasce como forró, vira tecnobrega, arrocha, vanerão, sertanejo, funk... —
defende Hermano, dizendo que vê ali a lógica do folclore.
— No “Música do Brasil” (projeto de mapeamento de manifestações musicais pelo país), já era uma
brincadeira da equipe adivinhar o momento em que apareceria “Calix bento” na festa que estávamos
documentando. Ela apareceu até como samba de parelha no interior de Sergipe e na ladainha dos
índios do Alto Rio Negro. Pedaços de melodias, de letras, de coreografias circulavam por todas as
festas. Cada uma fazia seu remix, reprocessando as mesmas informações em contextos diferentes.
Hoje é igual.
O GLOBO -
O homem que faz Belém tremer
Parceiro de Gaby Amarantos e líder da Gang do Eletro, o DJ e produtor paraense Waldo Squash
sacode o universo tecnobrega
Carlos Albuquerque
(09/06/2012) Josivaldo de Souza Pinto está sendo procurado por toda a parte. Mais conhecido nas
ruas pela alcunha de DJ Waldo Squash, ele é o cabeça da Gang do Eletro, uma das bandas mais
inovadoras da sempre surpreendente cena musical de Belém do Pará. Recém contratada pela
gravadora DeckDisc, após uma explosiva apresentação no festival Sónar São Paulo, em maio, com
todos os seus integrantes vestindo roupas fluorescentes e exibindo sua colorida mistura de cumbia,
drum and bass, house e carimbó, a Gang prepara o seu primeiro disco, que deve ser lançado até o
fim do ano.
Preconceito como no funk Os vocais vão ficar a cargo dos MCs Maderito, William Love e Keila Gentil,
mas todas as bases serão produzidas por Waldo Squash, como foram também as demos e mixtapes
da Gang, que há cerca de quatro anos, desde o seu surgimento, circulam livremente pela internet.
Responsável pela avançada sonoridade do grupo — batizada de eletromelody, um passinho à frente
do tecnobrega —, ele também assina a maior parte das batidas de “Treme”, o disco de estreia de
Gaby Amarantos. Como a cantora, diversos artistas que tocam nas aparelhagens de Belém — as
enormes equipes de som locais — também tiveram suas faixas produzidas por Waldo, esse exmecânico industrial e ex-radialista de 33 anos que, de tão requisitado, se transformou no principal
motor do som que está se espalhando por todo o Brasil, levando a uma inevitável comparação com o
DJ Marlboro, o homem que deu os contornos finais ao funk carioca.
— Já perdi as contas de quanta gente produzi nos últimos anos — conta Waldo. — A cena
tecnobrega de Belém é muito fértil, quase todo dia tem música nova sendo lançada e gente me
procurando para ajudar. Por causa da Gang do Eletro, eu diminuí o ritmo, mas acho que já trabalhei
com mais de cem artistas. Hoje Waldo tem o seu próprio tempo e seu próprio estúdio, em Barcarena,
cidade industrial próxima a Belém, onde mora. Ali ele grava suas músicas e também, quando arruma
tempo na agenda, spots e vinhetas para rádios locais. Quando precisa resolver algum negócio
relacionado à Gang, dar uma entrevista ou produzir algum artista, ele pega a balsa que liga
Barcarena a Belém, pelo Rio Moju Cidade, e em uma hora está na capital.
— Barcarena é bem mais tranquila que Belém. Moro numa casa com quintal e me sinto muito bem ali
— garante. Foi numa rádio, a Sorriso FM, que Waldo começou a se aproximar das engrenagens que
movem o fenômeno tecnobrega e suas raves populares, em bailes que reúnem, a cada semana,
cerca de dez mil pessoas, e agitam um mercado informal que une músicos, DJs, produtores, camelôs
e aparelhagens, movimentando aproximadamente R$10 milhões mensalmente. Autodidata, ele já
mexia em programas de edição musical quando, há seis anos, resolveu fazer uma música para a
aparelhagem Superpop, uma das maiores de Belém.
— Nos intervalos, eu brincava com instrumentos virtuais e um dia cismei de fazer essa música. Criei
uma base, fiz uns vocais e botei no ar. O pessoal da equipe ouviu, gostou e adotou a música como
tema, que passou a ser chamada de “Superpop é curtição” — lembra ele. — Daí em diante não parei
mais.
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A porção DJ estava esperando esse clique para desabrochar também. Afinal, Waldo é filho de peixe
(de água doce). — Meu pai era DJ nas horas vagas e tinha uma aparelhagem, bem pequena, que
alugava para bailes no fim de semana.
Eu ia junto com ele e fui aprendendo a mixar e depois a mexer nos equipamentos. Mas só tocava em
casa mesmo. Com as primeiras músicas saindo do forno e as apresentações nas festas, Waldo
conheceu Maderito, que passou a ser seu cantor, letrista e parceiro musical. Juntos eles formarama
dupla DJ Waldo Squash e Maderito Alucinado, que seria o embrião da Gang do Eletro. Como as
produções soavam diferente das demais músicas do tecnobrega, elas levaram a dupla a um lugar de
destaque — e de isolamento — na cena de Belém.
— Eu ouvia as músicas que tocavam nas aparelhagens e achava que poderia fazer diferente ou
melhor — conta Waldo. — Aí fui misturando coisas de drum and bass, de electro, de techno, coisas
mais pesadas, inspiradas em artistas como (o produtor italiano) Benny Benassi, com o que eu ouvia
de carimbó e até axé. Logo chamado de eletromelody, esse som caiu nas graças das torcidas
organizadas das aparelhagens, semelhantes às galeras do mundo funk. Com isso, veio o sucesso e
também o preconceito, como aconteceu com o batidão carioca.
— As letras do Maderito falavam de curtição e de algumas sacanagens, mas sem palavrões. As
turmas se divertiam e, como o som era mais pesado, ficavam agitadas nos bailes, às vezes chegando
a brigar. Por isso, a polícia chegou a proibir o eletromelody de tocar nas festas. Fiquei tão chateado
que abandonei tudo, me mudei para Rondônia e voltei a trabalhar como mecânico industrial.
Foi justamente nesse período que o tecnobrega começou a ganhar destaque nacional, principalmente
pela voz e pela figura de Gaby Amarantos, com quem Waldo tinha trabalhando quando estava à
frente da banda Tecnoshow.
— Fiquei maluca quando eu soube que o Waldo tinha ido embora — lembra Gaby. — Ligava para ele
toda hora, dizendo para voltar, que o lugar dele era na música. Felizmente isso aconteceu. O Waldo é
um inovador nato, é o cara do tecnobrega e do eletromelody. Sem ele, o meu disco não soaria da
mesma forma. Ele é uma inspiração para todo mundo em Belém.
Elogios do criador do Sónar A parada parece ter dado um novo impulso para Waldo, que retomou os
trabalhos à frente da Gang do Eletro (trazendo William Love e Keila Gentil para a formação) e viu a
banda se destacar recentemente em festivais como Terruá Pará, Rec Beat (em Recife) e o próprio
Sónar São Paulo, onde foi considerada um dos destaques pelo espanhol Enric Palau, criador do
evento.
— Acho que qualquer festival de música nova no país tem que ter o Waldo e a Gang do Eletro. É um
som eletrônico completamente original e brasileiro — afirma Chico Dub, que fez a curadoria do Sónar
São Paulo e é um dos DJs da festa Dancing Cheetah, uma das primeiras do Rio a tocar as produções
de Waldo. — Ele é um dos produtores mais talentosos e originais da nova safra da música brasileira.
Depois de criar as batidas do disco de Gaby, Waldo se desligou das produções alheias e dos frilas
radiofônicos Até o fim do ano, vai se concentrar apenas no disco da Gang do Eletro (“Quero
aproveitar e estudar o som do dubstep”, afirma), só abrindo exceções para tocar como DJ, usando o
sobrenome artístico que nasceu fora do ar.
— Uns amigos de uma rádio estavam me zoando, num intervalo, dizendo que eu não podia ser
apenas o DJ Waldo — conta ele. — Aí começou um papo sobre esportes e eu disse que jogava
squash. O nome acabou pegando, mas era brincadeira. Eu nunca joguei squash, nem sei pegar numa
raquete.
JORNAL DE BRASÍLIA - A caneta
e o saxofone
Com bom humor, autora Lygia Fagundes Telles faz mudanças na sua própria obra
(10/06/2012) O saxofone ocupa um lugar privilegiado na obra da célebre escritora Lygia Fagundes
Telles. Um de seus contos preferidos (e também um dos melhores) intitula-se justamente O Moço do
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Saxofone revela vestígios melancólicos ao narrar o destino do rapaz que compensa a traição da
mulher tocando maravilhosamente bem aquele instrumento.
Pois, nem mesmo esse texto, considerado primoroso por críticos diversos, escapou do crivo de sua
autora – desde que a Companhia das Letras começou a reeditar seus livros, em 2009, Lygia decidiu
reler todos e promover alterações que os tornassem ainda mais perfeitos. Recentemente, por
exemplo, ela pôs um ponto final na reescrita de Um Coração Ardente, conto que vai abrir seu próximo
lançamento. E o trabalho teve cuidado cirúrgico.
"Eu me sinto muito à vontade para mexer, não acredito que os textos devam continuar como no
original", conta ela, em seu apartamento. Ali, cercada pelas boas lembranças – fotos que ocupam a
sala comprovam momentos de felicidade –, ela trabalha à mão, corrigindo frases, alternando orações,
eliminando vírgulas. Uma prosa limpa mas poética é seu grande objetivo.
Grande dama da literatura brasileira, Lygia é, como bem observa o jornalista José Castello no
posfácio de Seminário dos Ratos, uma escritora que se dedica aos temas universais: a loucura, o
amor, a paixão, o medo, a morte.
E a vida cotidiana é sua grande fonte de inspiração. Ainda que renomada, Lygia não se cansa de
aprender. E, se isso vem acompanhado de boas gargalhadas, melhor ainda. Ela se recorda de uma
curiosa alteração que promoveu em O Moço do Saxofone, que figura no livro Antes do Baile Verde:
quando acompanhava, comovida, uma leitura do texto realizada pelo ator Guilherme Lemos, ela, que
conhece todas as esquinas do conto, percebeu uma frase alterada.
"Ao invés de dizer 'fiquei broxa na hora', como está no original, Guilherme falou 'broxei na hora'",
conta Lygia, sem conter uma gargalhada. "Chateada, comentei com um colega da Academia Paulista
de Letras, que me alertou na hora: 'homens não ficam broxa – apenas broxam'. Eu nunca tinha
notado esse detalhe, afinal, sou mulher! Agora já atualizei o texto."
DIVERTIDA
O bom humor é uma das marcas da personalidade da escritora, que conhece o poder da ironia.
Embora não goste de revelar a idade (o que será respeitado aqui), ela diverte-se dizendo ser do
"tempo da pedra lascada".
Nas reuniões semanais que faz questão de frequentar na Academia Paulista, Lygia não se furta de
prazeres proibidos como um cálice de vinho e um cigarrinho. Mas habitualmente prefere manter a
imagem. "Certa noite, em uma festa da Companhia das Letras, escondi o cigarro quando o doutor
Drauzio Varella se aproximou. Ficaria envergonhada se ele me flagrasse."
Ela também frequenta as reuniões do Conselho da Fundação Padre Anchieta, entidade mantenedora
da TV Cultura. Membro vitalício, Lygia preocupa-se com a emissora. "Tenho medo que fique
comercial demais", conta.
Enfrentando os desafios
Mesmo com os movimentos limitados depois de sofrer uma queda no banheiro há alguns meses,
quando fraturou a bacia, Lygia não gosta de viver como uma ermitã. Ainda que agora selecione mais
os convites, ela se vale do apoio de uma bengala para os passeios.
Quando isso acontece, utiliza táxis, nos quais prefere viajar no banco da frente. "São mais duros e me
incomodam menos", justifica ela, que adora puxar conversa com os motoristas. "Com um, aprendi
que não devo contar que torço para o São Paulo, pois ele soube de dois passageiros que acabaram
no rio Tietê tão logo confessaram isso. Que exagero."
CASAMENTOS
Enfrentar desafios, na verdade, tornou-se sua marca. Lygia lembra- se com ternura do temor da mãe,
Maria do Rosário, ao descobrir, nos anos 1940, que a filha também se dedicaria às letras. "Ela
balançava a cabeça e dizia: 'você já estuda em uma faculdade apenas de homens (a de Direito do
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Largo São Francisco) e agora quer uma profissão masculina: assim nunca vai se casar.'", diverte- se.
"Mal sabia ela que eu me casaria duas vezes."
Com o segundo marido, o crítico e pesquisador Paulo Emílio Sales Gomes, ela viveu bons momentos
naquele apartamento no bairro Jardins. Ela gosta de relembrar, ao som de um saxofone – seu
aparelho de CD não se cansa de reproduzir a música de Roberto Sion. Ali, a identificação é plena,
pois, se no saxofone é o sopro do músico que determina volume, intensidade, cor e qualidade do
timbre, é com a caneta que Lygia reconstrói e engrandece sua obra.
SAIBA +
Lygia acredita que a TV Brasil não pode ficar sem programas com música clássica, que ela considera
educativos.
A autora confessa ainda ser fiel espectadora do Inglês com Música, atração que ensina o idioma de
Shakespeare por meio de canções conhecidas.
JORNAL DE BRASÍLIA -
Um tributo a Nara Leão
Rafael Cortez, músico e humorista do CQC, é quem organiza a homenagem à cantora
(10/06/2012) Na última quinta-feira, completou- se 23 anos da morte da capixaba Nara Leão. Mas,
desde janeiro, quando a cantora completaria 70 anos de vida, quase nada foi feito para revisitar seu
legado à cultura do País. O Brasil, parece, esqueceu-se dela.
Apaixonado por Nara desde a adolescência, o humorista (e violonista – lançou um CD instrumental no
ano passado) Rafael Cortez, 35, do programa CQC – Custe o Que Custar (Band), se encarregou de
pôr fim ao silêncio em torno dela.
Ele encabeça uma equipe que, em 30 de outubro, pretende levar ao Auditório Ibirapuera (SP) 15
vozes femininas para interpretar justamente o repertório de Nara.
O time de cantoras é eclético. Vai de nomes populares como Ivete Sangalo e Sandy a figuras da cena
emergente como Mallu Magalhães, Mariana Aydar, Fabiana Cozza, Thais Gulin e Roberta Sá.
A lista tem ainda Badi Assad, Bárbara Eugênia, Luiza Possi, Luciana Mello, Laura Lavieri, Graça
Cunha e Bruna Caram. Precursora em interpretar o repertório de Nara – lançou o tributo Onde
Brilhem os Olhos Seus, em 2007–, Fernanda Takai completa a seleção.
"Buscamos cantoras que tivessem mais ou menos a mesma idade que Nara tinha na década de
1960, quando estava realmente popular no Brasil", diz Cortez.
A seleção acabou contemplando também mulheres com mais de 30 anos. "Não dava pra deixar Badi
Assad de fora, por exemplo", afirma, referindo-se à cantora e instrumentista, professora de violão de
Cortez.
Depoimentos de Maria Bethânia – que, nos anos 1960, ganhou projeção graças à indicação de Nara
para substituí-la no show Opinião –devem ser captados em vídeo e usados na apresentação.
O espetáculo vai ser registrado por Oscar Rodrigues Alves – que, há dois anos, fez projeto parecido
com Wilson Simonal – e deve ser lançado comercialmente em 2013.
"No DVD, vamos intercalar a música captada no show com depoimentos de pessoas que conviveram
com a Nara", diz. Além de Bethânia, a equipe planeja falar com os músicos Chico Buarque, Carlinhos
Lyra, Roberto Menescal e com o cineasta Cacá Diegues (que foi casado com ela).
DATADA
Cortez lembra que, até agora, o único projeto relevante feito para marcar o que seria o 70º aniversário
de Nara foi tocado justamente pela filha da cantora, Isa bel Diegues. Trata-se do site oficial www.
naraleao. com. br.
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"Uma das grandes injustiças com a Nara é que ela é, hoje, uma cantora "datada', por ignorância. A
molecada – os fãs do CQC, por exemplo – acha que a Nara é uma cantora do passado como foi
Elizeth Cardoso, Aracy de Almeida. Acha que ela é velha e ultrapassada. Desconhecendo que Nara
foi vanguardista de um monte de coisas", afirma o humorista e instrumentista.
Saiba+
No site oficial de Nara Leão é possível conhecer a carreira da artista de acordo com as décadas.
Além da cronologia da vida da cantora, a página da internet disponibiliza fotos e vídeos de
apresentações.
Os álbuns, como Com Açúcar Com Afeto e Manhã de Liberdade também podem ser ouvidos pelo
computador, na íntegra.
FOLHA
- Campeão em indicações no Prêmio da Música rejeita rótulo
"regional"
DE
S. PAULO
Desconhecido no Sudeste, Herbert Lucena concorre a mais troféus do que Gal, Chico e Caetano
(10/06/2012) Músico pernambucano disputa nas categorias disco regional, cantor regional, revelação
e melhor projeto gráfico
MARCUS PRETO DE SÃO PAULO
Quando foram divulgados, em maio, os artistas indicados aos troféus da 23ª edição do Prêmio da
Música Brasileira, a grande surpresa foi ver, encabeçando a lista, um nome nada familiar aos ouvidos
do eixo Rio-São Paulo.
Mas quem raios é esse Herbert Lucena que, indicado em quatro categorias, ultrapassou gente como
Chico Buarque, Caetano Veloso, Marisa Monte, Gal Costa e Criolo?
"Sou de Caruaru, mas moro em Recife. E nunca fiz um show no Sudeste. Tenho 46 anos e vivo só de
música. Não tenho outra fonte de renda. Além de fazer meus shows, sou produtor de discos de
artistas da minha região."
Lucena é dono do selo Coreto Records e já fez CDs do repentista Zé Vicente da Paraíba, dos
cantores Azulão e Walmir Silva e dos grupos Mazuca de Agrestina e Fim de Feira, entre outros. Os
dois últimos concorreram ao Prêmio da Música em 2008. Fim de Feira ganhou como melhor grupo
regional daquele ano.
Nesta edição, Lucena inscreveu seu segundo álbum, "Não me Peçam Jamais que Eu Dê de Graça
Tudo Aquilo que Eu Tenho pra Vender". E foi classificado nas categorias revelação, projeto gráfico,
disco e cantor regional.
"Quando me inscrevi, sabia que iam me colocar em categorias regionais. Mas não me considero
artista regional. O que faço é frevo, ciranda, maxixe, coco, forró e baião -tudo música popular
brasileira", diz. "Até Alceu Valença, quando lança um disco, entra [em premiações] como artista
regional, não como MPB. E ele é conhecido de Norte a Sul do país -e até lá fora."
CACILDA
O título do disco é variação de frase da atriz Cacilda Becker (1921-1969), que foi levemente
modificada por Lucena para, quando musicada, encaixar-se "na metrificação de quadra, em
decassílabo de violeiro", como ele define.
"A frase cai muito bem a qualquer pessoa que trabalhe com arte -ator, escritor, músico. As pessoas
acham que, como o produto artístico é meio impalpável, ele pode ser oferecido de graça. Já levei
muito cano de contratante com esse argumento."
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O trabalho foi bancado pelo próprio autor, com contribuição de alguns patrocinadores apenas para
ajudar na confecção do projeto gráfico (indicado ao prêmio), de capa dura e vasto material fotográfico.
Também foi produzida edição em vinil (duplo).
A entrega do Prêmio da Música Brasileira acontece na quarta-feira, em cerimônia no Theatro
Municipal do Rio. O músico deve estar na plateia.
Mesmo que não leve nenhum dos quatro troféus, alguma coisa já está um pouco diferente na vida de
Herbert Lucena desde as indicações.
"Fui procurado pela imprensa de São Paulo e do Rio, e as reportagens repercutiram. Mas queria ser
divulgado aqui em Pernambuco -só um jornal local me procurou até agora. O pernambucano não
veste a própria camisa."
ESTADO DE MINAS
- Choros de Waldir Silva
Ailton Magioli
(11/06/2012) “Agora chegou a sua vez”, alertaram os amigos de Waldir Silva, que, ao 80 anos, 60 dos
quais dedicados à música, vai finalmente realizar um show de repertório autoral. Atração do Projeto
Pizindin, do Conservatório UFMG, o compositor-cavaquinista que faz fama graças ao cavaquinho diz
ter preterido a própria obra em função da preferência das gravadoras pela música comercial. “Gravei
minhas músicas esporadicamente, porque nunca tive esta pretensão”, desconversa, admitindo que
agora a turma de amigos “pegou de jeito”.
Para ter uma ideia do peso do instrumento na carreira do músico, Waldir recorda ter gravado seis
CDs de boleros e tangos que vendem no mundo inteiro. “Um deles me rendeu há cinco anos um
Disco de Ouro, pelas 150 mil cópias vendidas”, revela o instrumentista, que, ao pesquisar por seu
nome na internet, descobriu sua interpretação brilhando na programação de rádio e na exibição de
filme de países como República Tcheca e Estados Unidos.
Com média de 15 shows por mês, Waldir, que possui conjunto de baile há mais de 30 anos, tornou-se
responsável pela apresentação do projeto Minas ao Luar, do Sesc-MG, que leva a música de seresta
para todo o estado, em praça pública. “O primeiro show foi em Diamantina”, recorda da terra do
presidente JK, que acabou se tornando um símbolo do gênero. No dia 29, Waldir Silva & Conjunto
Musical estarão comemorando na Pampulha, em Belo Horizonte, ao lado do grupo paulistano
Demônios da Garoa, 500 apresentações do projeto, que já rendeu a eles cerca de 20 anos de
viagens.
Com 33 discos gravados – 18 LPs e 15 CDs –, lançados no Brasil e no exterior, Waldir Silva é
contratado da gravadora MoviePlay, de São Paulo, depois de passar por empresas como RCA e
Eldorado. Autor de pelo menos 100 composições, a maioria delas instrumentais, o cavaquinista já
gravou a metade do repertório autoral, também registrado em disco por artistas como Milton
Carvalho, Flávio de Alencar, Otavilho da Mata Machado, Lourival Costa, Trio Itacolomi, Caxangá e
Delmário, a maioria com letras. Já Zé Ramalho – o célebre Zé Ramalho da Paraíba – divide com o
cavaquinista mineiro a autoria do choro instrumental Paraibeiro.
Código Especializado em tocar música para dançar – tangos e boleros, principalmente –, na hora de
compor Waldir vai de choro, valsa, seresta, samba-canção e até marchinha. A primeira composição
foi Telegrama musical, que ele gravou em um 78 rotações, que trazia do outro lado o dobrado Belo
Horizonte. Homenagem aos telegrafistas, a primeira composição de Waldir Silva emite, por meio das
notas musicais soladas, mensagem expressa em Código Morse. Na época, o compositor teria sido
parabenizado inclusive pelo então presidente JK, que foi telegrafista. Compôs ainda Aos heróis do
fogo, com letra em homenagem aos bombeiros.
Artista pronto para atender a variadas demandas, além de eventos como aniversários, bailes e
casamentos, Waldir participa de comemorações religiosas. Na semana passada, durante celebração
de Corpus Christi no Mineirinho, tocou a Ave Maria, de Franz Schubert, e Amigos para sempre, de A.
Lloyd e Webber. “Dificilmente digo não”, confessa o cavaquinista.
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O ESTADO DE S. PAULO -
Desafio contemporâneo
Brasil Guitar Duo estreia concerto de Paulo Bellinati com a Osesp
LAURO LISBOA GARCIA, ESPECIAL PARA O ESTADO - Um marco na música de concerto
brasileira. É com essa expressão de entusiasmo que Brasil Guitar Duo, formado pelos violonistas
João Luiz e Douglas Lora, executa uma peça inédita de Paulo Bellinati, com estreia mundial amanhã,
na Sala São Paulo com a Osesp (Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo), sob regência do
maestro italiano Giancarlo Guerrero. "Ter uma obra desse porte no repertório brasileiro é uma
aquisição sem par", diz João Luiz. "Existem poucos grandes concertos para dois violões e este, sem
dúvida, vai deixar uma grande marca."
Pelo mundo. Aos 16 anos de carreira, João Luiz e
Douglas Lora levam o concerto para os EUA e para
a Ásia.
O caráter inovador desse Concerto Para
Dois Violões e Orquestra, composto e
arranjado por Bellinati, está "na
distribuição da forma", ou seja, na
adequação da orquestra à delicadeza
sonora dos violões: eles vêm em
primeiro plano e a orquestra entra em
intensidade reduzida. "O violão é um
instrumento
que
sofre
certa
desvantagem na questão de projeção
sonora. Isso fica muito evidente quando
acompanhado por uma orquestra ou
dentro de um conjunto de câmara maior",
lembra Douglas.
"No caso de um concerto, em que o
instrumento solista deve ter mais
destaque em muitos momentos, é
fundamental o conhecimento pleno de
seus recursos e limitações. Bellinati
dispensa apresentações e comentários
sobre o seu domínio e inteligência na
escrita para violão, e soube melhor do
que ninguém equilibrar os instrumentos
em relação com a orquestra", diz.
No início de 2011, a partir do convite de Arthur Nestrovski, diretor da Osesp, para João Luiz e
Douglas Lora tocarem com a orquestra, eles sugeriram um concerto inédito em vez do repertório
tradicional para violões e indicaram Bellinati. Dividido em três movimentos - Toada, Moda de Viola e
Ponteado -, o concerto é uma homenagem do compositor paulistano à música caipira de São Paulo,
sem, no entanto, ter nada da tradição regionalista.
"Toco bastante viola caipira nos meus discos, queria fazer uma coisa de São Paulo e o que achei
mais representativo foi pegar esses violeiros do interior e os ponteados como inspiração. Não que o
concerto tenha esse som tradicional. É um concerto com harmonias contemporâneas do jazz
brasileiro para ser tocado no mundo inteiro. Fiz pensando nisso, não queria uma coisa engessada",
diz Bellinati. Há apenas uma referência "muito de leve" à viola caipira. "O que achei legal é o conceito
dos violeiros se desafiarem. Isso me deu a textura do concerto, essa pergunta e resposta intensa que
tem na música regional", diz o compositor.
Para ele, trata-se de uma peça rara. "Além de ter poucos concertos para dois violões e orquestra,
nesse estilo acho que é quase nenhum. Mesmo o do Radamés Gnattali é muito nos moldes eruditos.
O meu não é erudito nem pretende ser. É uma coisa nova para dois violões e orquestra. É uma peça
fácil de tocar, bem melódica. E você ouve o Brasil o tempo inteiro", observa.
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Embora tenha analisado muitos concertos nesse formato nos cursos que fez e tenha ouvido outros
para ter ideia de como encerrar sua criação, Bellinati diz que não seguiu nenhuma receita. "Fiz
questão de quebrar todas elas. Não tinha nenhuma referência, o que fez o trabalho ser um pouco
mais difícil. Tive muito conflito comigo mesmo, joguei movimentos inteiros fora, mas estou feliz com o
resultado. Inventei muitas coisas e elas funcionaram: pingue-pongues no violão, desafios rápidos, um
violão acompanha e outro sola a melodia, depois invertem os papéis, há momentos só com os
violões, outros só com a orquestra - tem muita dinâmica nesse sentido."
Embaixador do violão. Multi-instrumentista, mestre e compositor dos mais refinados, Bellinati é, como
diz João Luiz, "o embaixador do violão brasileiro", com bem-sucedida carreira no exterior. Ao longo de
mais de 30 anos de carreira, além de discos autorais mantidos em catálogo nos EUA, outros em
dupla com a cantora Mônica Salmaso e o violonista Weber Lopes (com quem continua a tocar e vai
gravar um segundo CD), um de seus trabalhos mais marcantes é o de reinterpretação da obra de
Garoto.
Integrante do Pau Brasil, gravou recentemente mais um trabalho com o grupo e outro com a também
violonista Cristina Azuma. Suas peças integram constantemente o repertório do Brasil Guitar Duo. "As
obras de Bellinati são justamente a nossa transição do até então repertório clássico (Bach, Sor,
Scarlatti, Tedesco, Granados) que a gente tocava para o repertório brasileiro", aponta João Luiz.
O Duo, que também já tem carreira sólida nos Estados Unidos e Europa desde 2006, deve levar o
concerto para mundo. Uma apresentação já está programada para este ano na Carolina do Norte. Em
breve eles também o executam como solistas da Orquestra Sinfônica de Taiwan. "Esse vai ser nosso
concerto-assinatura, pois une a sofisticação orquestral com a espontaneidade do violão brasileiro,
que tanto atrai o público de todo o mundo", diz Douglas.
O programa de amanhã, sexta e sábado da Osesp inclui peças de Gioacchino Rossini e Ottorino
Respighi, que a sinfônica também apresenta no domingo às 11 horas, com entrada franca. Amanhã,
às 10 horas, haverá ensaio aberto do Concerto Para Dois Violões e Orquestra, de Bellinati, que não
será apresentado no domingo.
LIVROS E LITERATURA
FOLHA DE S. PAULO -
Livro estuda as inovações de compositor nos anos 30
Obra de Mayra Pinto fala das contribuições de Noel para a canção popular
Publicação pode ser proibida pela família do sambista, como ocorreu com biografia
LUCAS NOBILE COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
(09/06/2012) Mais de 75 anos depois da morte de Noel Rosa, o nome do compositor de Vila Isabel
segue envolto em polêmicas.
Acaba de ser lançado o livro "Noel Rosa: O Humor na Canção" (Ateliê Editorial), resultado da tese de
doutorado de Mayra Pinto pela Universidade de São Paulo (USP).
A obra analisa os aspectos artísticos de Noel -ele atuou somente seis anos como compositor e
morreu aos 26, vítima de tuberculose.
São esmiuçados no livro o uso do humor e da ironia, a quebra do estereótipo do malandro, a
profissão de sambista e a linguagem coloquial de Noel. Sua entoação (seguindo a escola de Mario
Reis, ao cantar de modo mais falado) também é explorada, assim como o fato de não ser um
sambista do morro, como as figuras do Estácio, e a célebre rusga poética entre o Poeta da Vila e
Wilson Batista.
"Ele usava um humor sofisticado, e o samba não tinha prestígio nos anos 1930. Além da
originalidade, Noel sempre teve uma postura de confronto em relação às forças dominantes", diz
Mayra.
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"Hoje, a pesquisa de música popular brasileira está mais substanciosa. Não posso deixar de citar o
acervo do Instituto Moreira Salles e a caixa do Omar Jubran ["Noel Pela Primeira Vez"], que me
ajudaram demais."
BIOGRAFIA PROIBIDA
Mesmo sem levantar passagens biográficas, dedicando-se apenas a uma investigação artística da
obra de Noel, o livro de Mayra deve enfrentar problemas judiciais com a família do sambista.
"Tecnicamente, este livro está ilegal. Tudo que envolva o uso do nome ou da imagem -da marca Noel
Rosa- está sujeito à autorização das herdeiras", diz Élio Joseph, 74, representante legal das
sobrinhas de Noel, as irmãs Maria Alice Joseph, 70, com quem ele é casado, e Irami Medeiros Rosa
de Melo, 72.
"Nós vamos analisar este livro, estamos abertos a negociações. Caso contrário, vamos ver as
medidas cabíveis, como aconteceu com o livro de Máximo e Didier".
Amparada na Constituição e no Código Civil, a família segue com processo, em Brasília, contra a
editora da UnB (Universidade de Brasília), João Máximo e Carlos Didier, autores de "Noel Rosa Uma Biografia".
Lançado em 1990, o livro ficou em circulação até 1994, com 15 mil cópias vendidas. Desde então,
virou raridade e teve seu preço inflacionado em sebos. A livraria Luzes da Cidade, em Botafogo,
cobra R$ 1.000 por um exemplar.
"A família nos cobra R$ 50 mil. Se existisse uma editora mais ousada, ela daria esse valor, e o livro
até poderia sair novamente. O negócio das herdeiras é dinheiro. Não estão preocupadas com a moral
da família", diz Máximo.
"Esse valor, de R$ 50 mil, não procede. Nenhum dos autores entrou em contato conosco. Se existir
um acordo, vamos estudar e ver o que é mais favorável para nós e para eles", responde Joseph.
MODIFICAÇÕES NA LEI
Além do livro de Máximo e Didier, o embate entre autores e biografados ou seus herdeiros é comum.
Foi assim com Roberto Carlos e Paulo Cesar de Araújo); herdeiros de Garrincha e Ruy Castro ou
com o espólio de Guimarães Rosa e Alaor Barbosa.
O projeto de lei 395/2011, representado pela deputada Manuela D'Ávila (PC do B-RS), que permitiria
a divulgação de informações biográficas e de imagens de figuras públicas, continua parado na
Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) desde fevereiro do ano passado, sem previsão
de avanços.
"Biografia não é livro de fofoca, fala da história de um país", diz a deputada.
"O Brasil está muito atrasado. Steve Jobs morreu e ganhou cinco biografias. Imagina se os filhos do
Napoleão tivessem impedido as biografias dele? É a história da França, não de uma pessoa."
NOEL ROSA: O HUMOR NA CANÇÃO
AUTOR Mayra Pinto
EDITORA Ateliê Editorial
QUANTO R$ 35 (205 págs.)
JORNAL DE BRASÍLIA -
Jornalista e escritor Ivan Lessa morre aos 77 anos
(10/06/2012) O jornalista, cronista e escritor Ivan Lessa, de 77 anos, foi encontrado morto na tarde da
última sexta- feira, em Londres. Sua mulher, Elizabeth, 73, afirmou que o escritor estava se tratando
havia um ano e que já não saia mais de casa.
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Uma estrutura foi montada na residência para que ele não fosse hospitalizado. Mesmo muito
debilitado, Lessa continuava mandando os textos para a BBC.
Segundo Elizabeth, o corpo do escritor será cremado, como desejava Lessa. A cerimônia será
privada, pois o escritor sempre fez questão de manter privacidade.
Ivan era filho do também escritor Orígenes Lessa. Tinha três livros publicados: Garotos da Fuzarca
(1986), Ivan Vê o Mundo – Crônicas de Londres (1999) e O Luar e a Rainha (2005).
Foi fundador e um dos principais colaboradores do jornal O Pasquim, durante a resistência à ditadura
militar brasileira, junto de Sérgio Cabral, Paulo Francis, Tarso de Castro e Millôr Fernandes.
Criou, junto com o cartunista e amigo Jaguar, o ratinho Sig – ins - pirado no psicanalista Sigmund
Freud –, baseada na anedota "Deus criou o Sexo, Freud criou a sacanagem". O ratinho se tornou
símbolo de O Pasquim.
Ele também trabalhou na TV Globo e foi colaborador de diversas publicações brasileiras, entre elas
as revistas Senhor, Veja e Playboy, e os jornais Folha de S.Paulo, O Estado de S.Paulo e o Jornal do
Brasil. Ivan era colaborador da BBC Brasil desde janeiro de 1978, quando deixou o Brasil, com a
mulher e a filha, para morar na capital britânica.
CORREIO BRAZILIENSE -
Memórias de uma exposição
Livro conta os bastidores do primeiro evento voltado para as HQs realizado no Brasil (e no mundo),
em junho de 1951
Pedro Brandt
(11/06/2012) O retumbante sucesso de bilheteria do filme Os Vingadores é apenas um indicativo da
assimilação pela cultura pop das histórias em quadrinhos. Não é de hoje que super-heróis e outros
personagens surgidos nas páginas das HQs são levados de forma bem-sucedida para outras mídias.
Também não é novidade que os gibis, além de entretenimento, podem ser usados como material de
alfabetização. Os quadrinhos se tornaram também, cada vez mais, objeto de estudo acadêmico, tal
qual o cinema, a literatura, as artes plásticas ou qualquer forma de expressão.
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Mas nem sempre foi assim, como relembra Álvaro de Moya no livro A reinvenção dos quadrinhos.
Com o subtítulo Quando o gibi passou de réu a herói, a publicação tem como ponto de partida a 1ª
Exposição Mundial de Quadrinhos, realizada em São Paulo em junho de 1951. Evento inédito e
pioneiro, a exposição apresentou ao público as histórias em quadrinhos como arte. Naquela época,
muitos pais e educadores viam na leitura de gibis uma ameaça à juventude — reflexo da “caça às
bruxas” que os quadrinhos sofriam também em outros países, em especial nos Estados Unidos.
Um dos maiores especialistas do assunto no Brasil, Álvaro de Moya, 82 anos, trabalhou como
desenhista de HQs e ilustrador de livros. Também foi jornalista, produtor de programas de televisão,
autor de livros (entre eles, Shazam, pioneiro no estudo dos quadrinhos) e realizador de mostras,
exposições e outras atividades culturais.
Idealizadores do evento de 1951, Moya, o desenhista Jayme Cortez, os editores Miguel Penteado e
Reinaldo de Oliveira, e o roteirista Syllas Roberg conseguiram com editoras americanas uma série de
páginas originais de autores como Milton Caniff (Terry e os Piratas, Steve Canion), Hal Foster
(Príncipe Valente), Al Capp (Ferdinando), Alex Raymond (Flash Gordon), George Harriman (Krazy
Kat) e Burne Hogart (Tarzan), além de material de autores brasileiros.
Inaugurada em 18 de junho, no Centro Cultura e Progresso, um clube da juventude judaica localizado
no bairro do Bom Retiro, em São Paulo, a exposição tinha, além de muitas páginas de quadrinhos,
painéis que apresentavam a trajetória e a evolução dessa linguagem (desde seus primeiros passos),
amostras de trabalhos de autores de outras nacionalidades (Argentina, Japão e países europeus).
Um painel apontava casos de plágio feitos por artistas brasileiros (mais do que inspirados em tiras
americanas). Outros, incitavam a reflexão a respeito da necessidade da produção nacional de HQs e
a revisão do papel dos quadrinhos na educação dos jovens.
O livro também reproduz algumas das matérias publicadas em periódicos da época comentando a
exposição. Algumas, elogiando a iniciativa, outras, mantendo a equivocada crítica aos quadrinhos
como um perigo para a juventude. Dividido em 10 capítulos, o livro ainda aborda o grande, ainda que
tardio, reconhecimento que a exposição recebeu duas décadas depois.
A reinvenção dos quadrinhos foi publicado pela primeira vez há 10 anos. A nova edição do livro foi
revisada e ampliada, resultando num trabalho mais bem acabado. Seu grande mérito, além de
relembrar o episódio, é apresentar, de forma bastante espontânea, as memórias de Moya, um dos
grandes homens da comunicação no Brasil, que as conta como quem conversa descontraidamente
com um amigo.
As enciclopédias dos Estados Unidos, França e Itália falam que o Brasil foi o primeiro país a fazer
uma exposição de histórias em quadrinhos".
Álvaro de Moya, autor do livro A reinvenção dos quadrinhos
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Três perguntas // Álvaro de Moyá
O pioneirismo da exposição de 1951 é reconhecido internacionalmente?
As enciclopédias dos Estados Unidos, França e Itália falam que o Brasil foi o primeiro país a fazer
uma exposição de histórias em quadrinhos. Há pouco tempo, no Wikipedia, apareceu uma informação
de que teriam sido realizadas duas exposições antes da nossa. Uma foi nos Estados Unidos, pelo
King Features Syndicate (empresa distribuidora de conteúdo jornalístico) mas, além de quadrinhos,
eles colocaram em exposição também o restante do material que eles produziam. Ou seja, era uma
exposição comercial, oferecendo os serviços deles. A outra, na França, criticava os quadrinhos como
uma ferramenta do imperialismo americano. A nossa foi a primeira exposição didática sobre
quadrinhos, fazendo, inclusive, relações entre os quadrinhos, a literatura e o cinema.
Quais quadrinhos clássicos você gostaria de ver relançados?
Ferdinando (Li’l Abner), do Al Capp, autor que foi como um François Rabelais daquele período, um
grande satirista. Ele arrasava com tudo. O Spirit, do Will Eisner, é outro clássico — o herói aqui é
apenas um chavão para contar as histórias de pano de fundo, como faziam os escritores Anton
Tchecov e Guy de Maupassant. Em terceiro lugar, o Flash Gordon, do Alex Raymond, com suas
críticas aos ditadores fascistas. Essas três HQs precisam de uma revisão.
E dos autores mais contemporâneos, de quem você gosta?
Dos modernos, gosto de Art Spiegelman, Robert Crumb, Joe Sacco, Frank Miller, Alan Moore e Neil
Gaiman. Os três primeiros, fazendo um trabalho mais marginal, voltado para o novo mercado de
quadrinhos, o das graphic novels. Os outros, fazendo um trabalho de massa — eles conseguem fazer
quadrinhos populares com qualidade, como as HQs clássicas do passado.
ESTADO DE MINAS
- Amor jovem é um sucesso
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A escritora Paula Pimenta chegou à marca de 100 mil livros vendidos
(13/06/2012) Como boa mineira, a escritora Paula Pimenta vem construindo sua carreira sem alarde e
longe dos holofotes, e já acumula números impressionantes: em três anos e meio, lançou cinco
títulos, divididos em duas séries, que venderam, juntos, quase 100 mil exemplares. A fórmula do
sucesso não é complicada, mas nem por isso é replicada facilmente. Paula, hoje com 35 anos,
escreve para adolescentes, sobre o universo dessas meninas e meninos e com um sotaque
brasileiríssimo.
O segredo todo está no processo de identificação do leitor com a personagem, que ocorreu na
primeira série da autora: Fazendo meu filme, cujo quarto e último volume – Fani em busca do final
feliz – foi lançado agora e está se repetindo em sua segunda empreitada, Minha vida fora de série,
para a qual também estão previstos quatro livros. “É gostoso ler um livro em que a mãe da
personagem a leva no shopping, em que ela come pão de queijo, coisas assim, mais próximas”, conta
Paula, leitora voraz de chick lit, aquela literatura feita para meninas e mulheres, gênero em que ela
mesmo vem tentando deixar a sua marca.
A protagonista de Fazendo meu filme é Fani. Aos 16 anos, ela se vê tendo de escolher entre fazer um
intercâmbio cultural ou viver um novo amor. É com esse impasse que Paula Pimenta começa a série.
Nos três volumes seguintes o leitor acompanha sua vida durante o intercâmbio e a batalha por fazer
vingar um amor à distância.
A publicação do primeiro livro não foi fácil. Paula bateu à porta de duas editoras mineiras, que nem
leram o livro e já disseram não. Chegou então à Autêntica, de livros acadêmicos e sem nenhum
juvenil em catálogo. Dois anos depois do início da batalha pela publicação, Fazendo meu filme 1
chegava às livrarias com uma mirrada tiragem de mil exemplares.
O esforço da autora de visitar colégios, a divulgação nas redes sociais – na época, o Orkut –, e o
boca a boca foram essenciais nesse começo. As tiragens seguintes saltaram para 3 mil; depois, 7 mil;
e hoje já saem com 10 mil. Um dos desafios da escritora é dar conta de continuar falando com seu
público original, que foi crescendo e amadurecendo enquanto ela escrevia a série, ao mesmo tempo
em que novas leitoras se juntam ao fã-clube. Sonho de todo escritor, Paula Pimenta já ganha dinheiro
com os livros que publica e, em meados de 2011, teve de largar tudo para se dedicar apenas à
escrita e à divulgação.
ZERO HORA - Amor
e morte em Neptuno
Leticia Wierzchowski autografa hoje o romance “Neptuno”, 19º livro de sua carreira
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(13/06/2012) É a história de um amor intenso. É também a história de um crime. Neptuno, 19º livro de
Leticia Wierzchowski, um romance que dá a essa paixão um desfecho trágico, tem lançamento e
sessão de autógrafos hoje, às 19h, na Livraria Cultura do Bourbon Shopping Country, em Porto
Alegre.
Há pouco mais de um ano, em abril de 2011, a chacina que deixou 12 mortos na Escola Municipal
Tasso da Silveira, em Realengo, no Rio, ajudou a autora a esboçar alguns contornos do romance.
Uma entrevista com familiares do atirador a fez pensar sobre as diversas vítimas indiretas nascidas
de um episódio como esse – são vidas irremediavelmente alteradas. O livro Precisamos Falar sobre o
Kevin, da americana Lionel Shriver, lançado no Brasil em 2007 e adaptado para o cinema pela
diretora escocesa Lynne Ramsay no ano passado, também foi bastante marcante.
– Fiquei muito impressionada com a situação. Quando uma pessoa comete um ato de loucura
qualquer, quantas pessoas mais isso prejudica? Quantas outras mortes subjetivas acontecem ao
redor? – comenta Leticia.
Neptuno apresenta M. e June. O leitor logo descobre que M. cometeu um assassinato – nas primeiras
páginas, o jovem vai em busca de um advogado, amigo de seu pai com quem não tem contato há
anos, e faz a confissão. Ao telefone, diz precisar de seus serviços, ainda que a especialidade do
interlocutor seja o direito de família. Dali em diante, a narrativa apresenta os protagonistas e a cidade
que empresta seu nome ao título – uma praia pequena, familiar, pouco turística.
– A ideia que eu tinha guardada há anos era a da história contada pelo próprio M. Depois mudou.
Circundar a história principal é o que a torna mais interessante. É uma história de amor contada por
um narrador completamente oposto à história de amor. Os opostos se iluminam – afirma a escritora
porto-alegrense, 40 anos completados na última semana.
Repleto de referências literárias e revelador de alguns dos escritores mais admirados por Leticia, o
romance inspira-se principalmente em Somerset Maugham – a pequena Blackstable, cenário de O
Destino de um Homem, guarda semelhanças com Neptuno – e Vladimir Nabokov, do clássico Lolita.
Diz um trecho: “E June tinha sardas, minúsculas sardas douradas que pareciam pó de ouro. A boca
era carnuda, cor de romã (...). June era uma menina crescida demais. Tinha um corpo delgado, de
onde brotavam promessas. Ela andava suave e cadenciadamente. E tinha aquelas pernas longas,
perfeitamente lisas...”.
– Essa menina é a minha Lolita – compara Leticia.
ZERO HORA -
Histórias entrelaçadas
Carlos André Moreira
Pode a infelicidade ser uma herança? É essa a pergunta que norteia a escritora Susana Vernieri ao
longo das páginas de Desvãos, novela que a autora autografa amanhã, às 19h.
(13/06/2012) O livro narra duas histórias que se alternam ao longo das páginas. Na primeira delas,
ambientada nos anos 1960, pouco antes do golpe militar, um casal de adolescentes se apaixona
imediatamente após um encontro em uma festa de Réveillon em Punta del Este. François, filho de um
joalheiro em Pelotas, e Ana Maria, filha de um estancieiro e empresário de modos caudilhescos,
fogem da vigilância dos pais por uma noite e se amam à beira-mar. Quando a paixão produz seus
efeitos, como uma gravidez, as famílias de ambas serão responsáveis pelo afastamento entre os dois
enamorados. Nascida a criança, a família de Ana Maria a envia para ser criada com a de François e
ameaça o moço de morte – bravata que o jovem leva a sério, dadas as estreitas relações entre o pai
de sua amada e os militares recém-chegados ao poder.
Na segunda história, uma mulher chamada Renata recorda, em episódios aparentemente desconexos
um do outro, suas frustrações em relacionamentos amorosos anteriores.
A evolução das linhas narrativas, em breves 80 páginas, estabelece as relações entre ambas, no que
poderia ser uma releitura contemporânea de Romeu e Julieta.
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– Eu não pensei deliberadamente em colocar uma alusão a Romeu e Julieta, mas casou com a
história e foi acontecendo. Não planejei nada na narrativa, apenas fui escrevendo – conta Susana.
A primeira redação do romance foi escrita há cinco anos. No final do ano passado, o texto foi
retrabalhado, personagens foram eliminados e situações foram modificadas até a forma que está
ganhando edição agora. Susana já transitou por gêneros literários, como o ensaio, o conto (venceu o
Açorianos com As Grades do Céu, em 2009), a poesia e a narrativa longa.
– Cada livro me leva para um gênero de cada vez. Já tenho um livro de contos e um de poesia
prontos também – comenta a autora.
O GLOBO - Arte
e política nas mãos das mulheres em Kassel
Maria Thereza Alves, Anna Maria Maiolino e Renata Lucas expõem na Documenta ao lado de obras
de Maria Martins
Graça Magalhães-Ruether
Enviada especial • KASSEL
“O IMPOSSÍVEL”, de Maria Martins: uma das maiores obras expostas na Documenta, marcada pelo
silêncio e pelo vazio
“HERE AND THERE”, de Anna Maria Maiolino: Irmãos Grimm
(13/6/2012) A escultura em bronze da artista brasileira Maria Martins (1894-1973) “O impossível”
parece monumental em comparação com a maior parte das obras mostradas na Documenta 13, a
maior exposição de arte do mundo, aberta na cidade alemã de Kassel no último sábado.
Diferentemente das edições anteriores da mostra, realizada a cada cinco anos, que tem a polêmica, a
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grandiosidade e a provocação como sua marca registrada, a Documenta da curadora americana
Carolyn Christov-Bakargiev é marcada pelo silêncio e pelos espaços quase vazios, mas também pela
arte como declaração política.
Para a impressão de sobriedade, contribui também a ampliação do espaço de exposição. Além dos
palcos tradicionais, como o Museu Fridericianum, onde a brasileira Renata Lucas usa o espaço já
ocupado pelo alemão Anselm Kiefer com seu trabalho “Ontem, areias movediças”, a exposição foi
ampliada também até o Parque da Karlsaue e a estação ferroviária. Além disso, são realizados
eventos e mostras paralelas em Cabul, no Cairo e em Alberta, no Canadá.
Protesto contra a colonização
Em uma casinha de madeira, já no final do parque, a brasileira Anna Maria Maiolino fez a sua
instalação “Here and there”, onde usou 2.500 quilos de argila para formar miniesculturas. No Museu
de Ciências Naturais Ottoneum, que fica ao lado do Fridericianum, a também brasileira Maria Thereza
Alves mostra o seu trabalho sobre o drama do Lago de Chalko, ao sul da Cidade do México, onde a
colonização espanhola, iniciada em 1519, deixou marcas que ainda hoje afetam a vida da população
local.
Maria Thereza mostra o caso do lago aterrado pelos colonizadores espanhóis, ao qual as águas
voltaram, naturalmente, séculos depois. Nas paredes de uma sala do Ottoneum, as fotos de 27
homens e mulheres com aparência indígena, que hoje vivem na região do lago, parecem
testemunhas da acusação contra “o ciclo vicioso das colonizações”, como lembra a artista. Para ela,
que nasceu no Brasil mas emigrou com a família para os EUA quando tinha apenas 7 anos, a arte é
também uma forma de testemunho da realidade que toma partido. No caso do seu trabalho, a favor
das vítimas da colonização.
— Eu abordo o problema no México, mas não se trata de uma situação local e específica. É algo
global, que ainda hoje continua acontecendo em muitos lugares — diz.
Ela cita exemplos no Brasil: — Em Minas, há uma tribo que teve sua cultura destruída e hoje precisa
criar gado, atividade com a qual não se identifica — aponta a artista como outro caso de erro da
colonização. Além das fotos nas paredes, Maria Thereza mostra na Documenta o livro que escreveu
sobre o Lago de Chalko e uma reconstrução em papelão da paisagem da região.
‘Depoimento poético’
Para Anna Maria Maiolino, que nasceu na Itália mas foi morar no Brasil em 1960, a obra de arte é um
testemunho, mas é sobretudo um depoimento poético.
— Toda obra de arte é poética, porque trabalhamos com metáforas — diz a artista ao explicar a sua
obra “Here and there”, que instalou numa casinha de madeira antigamente ocupada pelos
trabalhadores do parque Karlsaue.
Anna Maria recebeu o convite para participar da Documenta em 2010. Depois de percorrer todos os
lugares onde poderia expor, ela se deparou com a casinha.
— Quando eu vi essa casa, escondida no meio das plantas, pensei nos Irmãos Grimm, que viveram
na cidade, e resolvi que este seria o lugar onde instalaria o meu trabalho — disse.
Segundo ela, a intenção da sua instalação era mostrar a mão como a ação primordial, a ferramenta
inicial que tornou tudo possível. Em seguida vem o material, a argila, que simboliza o ciclo da vida, o
que volta a ser pó para se integrar de novo à natureza. Na sala da casinha, que tem subsolo, térreo e
primeiro andar, ela mostra um video que fez em 1976 e fotos nas paredes. Renata Lucas, que em
2010 recebeu o Prêmio da Fundação Schering, de Berlim, criou, no subsolo do Fridericianum, onde
ficava a casa dos irmãos Grimm, pirâmides encravadas e uma parede de madeira. Ela escolheu a
pirâmide por ser “um elemento comum a diversas culturas”.
No mesmo espaço, Anselm Kiefer havia mostrado o lugar dos Nibelungos — uma abordagem mítica
da cultura alemã —, mitos que culminaram com a catástrofe da ditadura nazista e a destruição de
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Kassel no final da Segunda Guerra Mundial. O tema destruição toca também a obra de Renata, que
chamou o seu trabalho de “Ontem, areias movediças”, baseado em texto do escultor Alberto
Giacometti. Segundo ela, a pirâmide é também uma alusão ao Oriente Médio e à indústria
armamentista, que sustenta o conflito na região.
Artistas e cientistas mortos
Maria Martins, uma das pioneiras da emancipação da mulher brasileira, conhecida também por ter
sido amante do artista surrealista francês Marcel Duchamp, não é a única artista já morta na atual
Documenta. Salvador Dalí tem seus trabalhos confrontados com os do geneticista Alexander
Tarakhovsky, que tentou visualizar em imagens o genoma de pessoas traumatizadas.
Partindo da sua visão da arte como algo essencial, a curadora americana Carolyn Christov-Bakargiev
(conhecida pelo apelidosigla CCV) incluiu também cientistas já falecidos, como Konrad Zuse, o
inventor do computador, que também foi pintor, como parte da análise de “momentos capazes de
mudar o mundo”. Um lugar carregado de História é o antigo mosteiro de Breitenau, nos arredores de
Kassel, onde a artista croata Sanja Ivecovic fez uma instação com jumentos de pano, que chamou
com nomes, entre outros, de Walter Benjamin ou de Martin Luther King, simbolizando pessoas que
morreram pelas suas convicções.
Ivecovic teve a ideia de fazer o trabalho ao encontrar no arquivo de Kassel uma foto de um jumento
de 1933, que os nazistas haviam feito para humilhar os judeus como tão inferiores quanto o animal.
Ela usa como declaração política os objetos pessoais de Hitler e de sua amante, Eva Braun,
coletados em 1945 pela repórter americana Lee Miller, que chegou a Munique em 1945, com as
tropas aliadas, e posou para uma foto na banheira do ditador.
ARQUITETURA E DESIGN
REVISTA VEJA – A arte
da geometria
Mario Mendes
Trinta anos após sua morte, a carioca Bea Feitler enfim tem seu talento revolucionário para o design
gráfico reconhecido em uma biografia à altura
(13/06/2012) Os amigos, e os vários colaboradores com quem trabalhou, lembram-se dela
principalmente como a mulher que "entrava nos lugares em passo de marcha, cheia de si e de
grandeur, com suas pulseiras e balangandãs, e dizia: 'É assim que tem de ser'". A carioca Beatriz
Feitler, ou Bea, como ficou conhecida, é uma das principais referências do design gráfico mundial,
responsável por momentos históricos de publicações como Harper's Bazaar, Ms., Rolling Stone e
Vanity Fair — foi dela o projeto gráfico original da revista. Também trabalhou em estreita colaboração
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com mestres da fotografia como o francês Jacques Henri Lartigue, o japonês Hiro e o americano
Richard Avedon, além de ter alavancado a carreira dos hoje clássicos Bruce Weber e Annie Leibovitz.
Sobre ela, o fotógrafo brasileiro Otto Stupakoff costumava dizer "Bea é a maior de todos os diretores
de arte". Curiosamente, Bea Feitler é pouco conhecida no Brasil, e somente agora, trinta anos após
sua morte, sua trajetória ganha um registro à altura no país — a biografia O Design de Bea Feitler
(CosacNaify; 216 páginas; 119 reais) é um daqueles elegantes e bem cuidados coffee table books
(do tipo que ela era especialista em fazer). Reúne um texto biográfico assinado pelo sobrinho da
designer, Bruno Feitler, a uma análise gráfica de sua obra, feita pelo designer André Stolarski e
amparada em 480 ilustrações.
"Bea possuía três grandes talentos", disse Stolarski a VEJA. "Um talento sem igual para a tipografia,
estabelecendo verdadeiras narrativas visuais paralelas com as letras; pleno domínio da fotografia,
tanto na produção quanto na edição de imagens: e fortes ligações com profissionais de diversas
áreas criativas" Bruno Feitler, por sua vez, enxerga sobretudo a ousadia no trabalho da tia, apesar de
ela muitas vezes utilizar tipologias que já haviam caído em desuso: "Ela era ousada e moderna na
diagramação e na edição de imagens, ao mesmo tempo que trabalhava com bases clássicas”,
observa.
Nascida em uma Ipanema ainda repleta de casas e de ruas de areia, em 1938. Bea Feitler era filha
de judeus alemães que haviam se radicado no Rio de Janeiro fugindo da perseguição nazista na
Europa. Cresceu numa atmosfera cultivada por arte, livros e música clássica — ópera e balé sempre
foram suas paixões. Em 1957, ao contrário do que faziam as moças da época — que aos 19 anos se
preparavam para casar —. Bea foi estudar design na prestigiosa Parsons School, em Nova York.
Passou os três anos seguintes envolvida com o que ela explicou em carta para uma amiga como:
"Propaganda, desenhos de pacotes para supermarkets, capas para livros, discos etc. É bastante
interessante". Quando voltou ao Rio, pediu emprego a Carlos Scliar, diretor de arte da então recémlançada revista Senhor. Passaria apenas um ano trabalhando no Brasil, mas foi o suficiente para
deixar sua marca no mercado. Além da Senhor, desenhou capas de livros e cartazes para teatro e
galerias de arte. Mas sua aventura profissional começou realmente quando voltou a Nova York ("com
a cara e a coragem", dizia) em 1960 e acabou sendo contratada pela Harper's Bazaar — conhecida
tanto pelo apuro como pela ousadia visual, uma herança do celebrado diretor de arte Alexei
Brodovich, um dos ídolos de Bea.
Dividindo a direção de arte da revista com outra jovem, a americana Ruth Ansel, Bea literalmente fez
história ao traduzir a energia pulsante da década em linguagem gráfica para reportagens e editoriais
de moda. No início dos anos 70, pouco antes de sua saída da Bazaar — a direção decidiu que suas
experimentações eram pouco comerciais —, Bea elaborou o projeto gráfico de uma revista feminina
para a Editora Abril (que publica VEJA), a Setenta, de curta duração porém grande impacto. "Bea,
antes de tudo, era uma artista", diz o vice-presidente do conselho editorial da Editora Abril, Thomaz
Souto Corrêa, que trabalhou com a designer na época. "Basta ver seu trabalho na Rolling Stone.
Nunca mais se fez nada igual porque não há outra Bea Feitler", resume Souto Corrêa. Prova disso é
a célebre capa da edição de janeiro de 1981, que mostra John Lennon nu enroscado em sua mulher,
Yoko Ono. Bea eliminou as chamadas de capa e manteve apenas o logotipo sobre a foto de Annie
Leibovitz: "Seu tirocínio foi perceber que um minuto de silêncio poderia ser de ouro", escreve Stolarski
no livro.
Bea Feitler morreria apenas um ano depois, de câncer de pulmão, no Rio de Janeiro, aos 44 anos.
Havia acabado de realizar o design da Vanity Fair e deixava um legado de inúmeras páginas de
revista, livros de arte, capas de discos, cartazes de espetáculos e uma personalidade esfuziante.
Uma de suas marcas, aliás, era o humor despachado com que avaliava o próprio trabalho: "Não
importa o que faça, quão comercial ou estático, tudo sai de minhas tripas", dizia. É isso que O Design
de Bea Feitler revela — um talento imenso e intensamente pessoal.
OUTROS
O ESTADO DE S.PAULO – A tripla
vitória do 'homem de ferro'
Jovem vence três cânceres e se torna atleta de Ironman para superar seus limites
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Gabriela Cupani
(10/06/2012)Há duas semanas, o engenheiro curitibano Paulo Henrique Velloso, de 30 anos, entrou
para o seletíssimo grupo de atletas que conseguem completar o Ironman - competição que envolve
3,8 mil metros de natação, 180 quilômetros de ciclismo e mais uma maratona, tudo na mesma prova.
Com um tempo de 11 horas e 25 minutos, ele ainda não se acha autor de uma grande façanha.
Talvez porque, de certa forma, outra marca já havia feito dele um verdadeiro homem de ferro: faz sete
anos que ele venceu o câncer pela terceira vez - e, com o fim do período de exames de
acompanhamento, já pode ser considerado oficialmente curado da doença.
Para Paulo, nada se compara ao desafio que enfrentou quando "o raio caiu três vezes no mesmo
lugar", como ele mesmo diz - o primeiro deles quando tinha apenas 17 anos. Era 1998 e ele assistia à
derrota do Brasil para a Noruega na Copa do Mundo da França quando sentiu dores terríveis no
testículo. No hospital, logo foi diagnosticado com um seminoma, tipo de tumor que ataca as células
germinativas. "Foi bem assustador, eu estava na fase de festas, estudando para o vestibular."
Naquele verão, Paulo trocou a praia da cidade onde mora, Florianópolis (SC), por sessões de
radioterapia, tratamento que afeta as células reprodutoras. "O pior foi ter ficado estéril. Como já
esperávamos por isso, meus filhos foram ‘guardados’ em um banco de sêmen em Porto Alegre",
conta o atleta.
Caroços no pescoço. Três anos depois, já cursando Engenharia Civil, quando todos os exames
apontavam que ele estava livre do tumor, notou um caroço no pescoço. A princípio achou que fosse
apenas uma reação alérgica a mariscos. Mas seu médico insistiu em fazer uma biópsia - e o
resultado foi um linfoma não Hodgkin. Dessa vez, Paulo encarou oito sessões de quimioterapia.
"Estava numa sala com gente mais jovem e com quadros mais delicados. Percebi que não tinha o
direito de ficar triste ou pessimista", lembra.
Uma história parecida se repetiu três anos depois, quando surgiu outro caroço no pescoço. "Logo
desconfiei", diz. "Mas esse foi o maior baque". Para sua surpresa, não era uma recidiva do mesmo
tumor - era outra doença, desta vez um linfoma de Hodgkin.
O fato de ser um tipo diferente de tumor foi uma boa e uma má notícia. "Era um alívio saber que eu
havia vencido a batalha anterior. Por outro lado, era assustador saber que outra doença apareceu.
Quando isso ia acabar?" O médico comentou que não era comum, que nunca tinha visto algo assim e
ia levar o caso para discutir com alguns colegas.
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Olhares de pena. "Quando você recebe um diagnóstico desses, o importante é fazer planos",
acredita. "Por isso, perguntei ao médico só três coisas: se tinha cura, qual era o tratamento e quanto
tempo levaria." E aí Paulo encarou as sessões de químio e de radio como uma contagem regressiva.
"Sempre tive a certeza da cura", afirma.
Por incrível que pareça, enfrentar o tratamento era mais fácil do que lidar com a reação das pessoas.
"Elas tentam se mostrar fortes, para nos encorajar, e acabam mostrando uma fragilidade, que por sua
vez nos desperta dúvidas: ‘Será que é verdade que você tem 99% de chances de cura?’. Eu nunca
tive vergonha de ter a doença, mas não me faziam bem aqueles olhares de pena das pessoas."
Logo que o tratamento acabou, com o sinal verde para praticar esportes, Paulo começou a correr na
praia. Antes de ficar doente, ele jogava futebol e às vezes andava de mountain bike. "Corria para me
sentir vivo. Era meu momento de conversar comigo mesmo, de meditação." Naquela época, ele
achava incrível quem conseguia correr cinco, dez quilômetros. Foi também após a alta que conheceu
Thaís, com quem se casou há três anos e com quem pretende ter os filhos que estão ‘guardados’ na
clínica gaúcha.
Aos poucos, quase sem querer, foi aumentando as distâncias. Depois, começou a nadar e a pedalar
também, às vezes percorrendo até 40 quilômetros no domingo. A essas alturas, e depois de ganhar
algumas lesões, sentiu a necessidade de um acompanhamento profissional.
Ironman. Há dois anos, assistiu a uma prova de Ironman e resolveu que queria participar. Com a
ajuda da treinadora, seguiu uma planilha à risca. Contou também com a orientação de um
nutricionista. Nos últimos seis meses, intensificou os treinos, praticando duas modalidades por dia,
somando até quatro horas diárias de exercícios - de manhã, de noite, com sol, com frio, com chuva.
"O Ironman é só a cereja do bolo, é uma superação no dia a dia." E, de certa maneira, foi justamente
o câncer que lhe deu combustível para chegar lá.
"Hoje dou mais valor ao tempo, gosto de acordar cedo. A doença também me deixou mais forte e me
deu preparo mental, já que você tem que saber que vai sofrer muito durante a prova." E também
depois, já que os dias seguintes costumam ser bem doloridos por conta do esforço.
A paciência está entre as maiores lições que a doença lhe deixou. "Tem coisas que a gente não tem
como apressar." Durante a prova, exatamente como nas sessões de químio, ficava fazendo uma
contagem regressiva dos quilômetros. "E pensava na minha mãe e na minha mulher me esperando
na linha de chegada. Tinha certeza que ia chorar, mas só consegui sorrir."
Mesmo com toda a distância percorrida até aqui, ele ainda considera seu tempo de prova modesto
para ser um verdadeiro ‘ironman’. Hoje ele acha incrível quem consegue terminar a prova em oito ou
nove horas. E já começou a contagem regressiva para a próxima edição, no ano que vem. O câncer?
"Só me deixou coisas boas, mas nem penso mais nele." Ficou para trás.
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