Tema:
Juventude
DE
LHO NA IMAGEM
S. Martinelli/Stock Photos.
Português: Linguagens — William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães
As banhistas (1877), de Renoir.
1. Compare as moças da pintura de Renoir com a moça da fotografia.
a) O que elas apresentam em comum? Elas são jovens e estão nuas.
b) Qual é a principal diferença física entre elas? As moças do quadro são mais ou menos gordas, e a modelo da foto é magra.
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c) O olhar das moças do quadro se dirige para o rio ou para elas mesmas; já o olhar da moça
da foto se dirige para o fotógrafo.
2. Observe o espaço em que se encontram as
moças e a direção do olhar delas.
Salve a gordurinha!
a) Em que cenário se encontram as moças
Gordurinhas localizadas, flacidez, celulite,
tudo isso que o atual padrão de beleza condena já
do quadro de Renoir? O que elas
foi sinônimo de elegância e refinamento social.
estão fazendo? Elas estão integradas no
Elas se encontram à beira de um rio, se banhando e se
No passado, as mulheres “cheinhas” represencenário? refrescando e estão integradas no cenário.
tavam o ideal feminino de beleza, que estava relab) Em que lugar está a moça da foto? O que
cionado a uma posição social privilegiada, de quem
ela está fazendo? Ela está integrada no
levava uma vida de pouco trabalho. Já as mulheres
moça se encontra em um cenário indefinido, vazio, frio. Ela
cenário? Aapenas
está posando para a foto.
magras eram associadas ao trabalho e à pobreza,
c) Para onde elas dirigem o olhar?
sendo, por isso, consideradas feias ou “inferiores”
socialmente.
d) Quem aparenta estar assumidamente
posando para o artista (pintor ou fotógrafo)? Por quê? A moça da foto, pois, além de ela estar olhando fixamente para a câmera, não há mais nenhum elemento na foto.
Professor: Comente com os alunos que o objetivo da foto é retratar o corpo nu ou a beleza da moça.
3. O quadro foi pintado em 1877 pelo pintor francês Renoir. A fotografia foi tirada por S. Martinelli,
um fotógrafo da atualidade.
a) Troque ideias com os colegas: Tanto em uma cena quanto em outra existe graça e sensualidade nessas jovens? Espera-se que os alunos percebam que, apesar de serem um pouco gordas para os padrões atuais, as moças são graciosas, bonitas e sensuais.
b) As características físicas das moças do quadro coincidem com o ideal de beleza que os meios
Pelos padrões atuais, elas seriam consideradas um pouco gordas e, portanto, em desacordo com o ideal de
de comunicação atuais veiculam? Não.
beleza de agora.
c) Leia o boxe Salve a gordurinha! acima e responda: No século XIX, as modelos do quadro
eram consideradas um exemplo de graça e de sensualidade feminina? Sim.
abrir a discussão com a classe. Seria importante que os alunos reconhecessem a
força dos meios de comunicação na criação de padrões, preconceitos, etc.
5. Comparando a beleza das moças retratadas
por Renoir no século XIX com a da modelo
fotografada em nosso tempo ou a da musa
virtual Lara Croft, responda: São relativos, pois variam de
acordo com a época, com a cultura, com as relações que existem na sociedade, etc.
a) Os padrões de beleza são universais e
atemporais (isto é, independem da época),
ou são relativos e variam de acordo com
cada época? Justifique sua resposta.
b) No mundo de hoje, os conceitos de beleza nascem espontaneamente na sociedade ou são influenciados pelos meios de
comunicação? Justifique sua resposta.
Musas e aventuras digitais
Os jovens internautas e aficionados por videogames também criaram suas musas virtuais, sinônimos da perfeição feminina, como Lara Croft,
Tmmy e Yuky Terai e a brasileira Kaya. Algumas
delas, inclusive, são resultado de uma montagem
de várias mulheres
famosas: a boca de
uma, os olhos de
outra, e assim por
diante.
A mais famosa
delas é Lara Croft,
criada em 1996, que
saiu dos games para o
cinema. Para fazer o
papel da musa digital, no filme Tomb
Raider, foi convidada
a atriz Angelina Jolie.
São fortemente influenciados pela televisão, que não só veicula exemplos de pessoas bonitas e bem-sucedidas, mas também cria necessidades de consumo relacionadas
com determinado ideal de beleza: alimentos diet, aparelhos de ginástica, cosméticos, etc.
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Português: Linguagens — William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães
a) Ela se assemelha fisicamente a alguma
das moças retratadas pelo pintor ou pelo
fotógrafo? Justifique. Não, ela é forte, musculosa.
b) Que grupos sociais valorizam mulheres
Geralmente os grupos envolvidos
com esse tipo de corpo? com esportes, ginástica e academia.
c) Você acha que essa mulher representa
um novo padrão de beleza? Se sim, quem
criou essa mudança? Resposta pessoal. Professor: Sugerimos
© Keystock
4. Leia o boxe Musas e aventuras digitais e
observe o corpo de Lara Croft, musa virtual:
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Tema:
Juventude
ESTUDO DO TEXTO
Uma vez uma mulher me disse: vocês jovens não sabem a força que têm.
Ela falava isto como se colocasse uma coroa de louros num herói. Ela falava isto como se não
apenas eu, mas todos os jovens fôssemos um grego olímpico ou um daqueles índios parrudões nos
rituais da reserva do Xingu.
De certa maneira ela dizia: vocês têm o cetro na mão. E eu, jovem, tendo o cetro, não o via.
Aquela frase me fez olhá-la de onde ela falava: do lugar da não juventude. Ela expressava seu
encantamento a partir de uma lacuna. Se colocava propositadamente no crepúsculo e com suas palavras me iluminava.
Essa frase lançada generosamente sobre minha juventude poderia ter se perdido como tantas
outras de que necessito hoje, mas não me lembro. Contudo, ela ficou invisível em alguma dobra da
lembrança. Ficou bela e adormecida muitos séculos, encastelada, até que, de repente, despertou e me
veio surpreender noutro ponto de minha trajetória.
Possivelmente a frase ficou oculta esperando-me amadurecer para ela. Só uma pessoa não mais
jovem pode repronunciá-la com a tensão que ela exige.
Vocês jovens não sabem a força que têm.
Pois essa frase deu para martelar em minha cabeça a toda hora que uma adolescente passa com
sua floresta de cabelos em minha tarde, toda vez que um rapaz de ombros largos e trezentos dentes
na boca sorri com estardalhaço gesticulando nas vitrinas das esquinas.
Possivelmente é uma frase ainda mais luminosa no verão.
[...]
Outro dia a frase irrompeu silenciosamente em mim como coroamento de uma cena. Uma cena,
no entanto, trivial.
Estávamos ali na sala de um apartamento e conversávamos. Um grupo, digamos, de pessoas
maduras. Cada um com seu copinho de uísque na mão, conversando negócios e banalidades. De
repente entra pela sala uma adolescente preparando-se para sair. Entra como faz toda adolescente:
pedindo à mãe que veja qualquer coisa em seu vestido ou lhe empreste uma joia. E quando ela entrou
tão naturalmente linda, não de uma beleza excepcional, mas de uma beleza que se espera que
uma jovem tenha, quando ela entrou, um a um, todos foram murchando suas frases para
ficarem em pura contemplação.
Ali, era disfarçar e contemplar. Parar e haurir.
Poderia-se argumentar que vestida assim ela parecia uma Grace Kelly, um cisne
solicitando adoração. Mas se assim é, por que a mesma cena se repetiu quando
entrou outra irmã, impromptamente, de jeans, vinda da rua, espalhando brilho nos
dentes e vida nos cabelos?
Olhava-se para uma, olhava-se para outra. Olhava-se para os pais que orgulhosos
colhiam a mensagem no ar. E surge a terceira filha, também adolescente com aquela
roupa displicente que, em vez de ocultar, revela mais ainda juventude.
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Quando se é jovem e forte
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Esta experiência se repete quando numa família são apresentados os filhos jovens.
Igualmente quando se entra numa universidade e se vê aquele enxame de camisetas,
jeans e tênis gesticulando e rindo entre uma sala e outra, entre um sanduíche e um
livro, sentados, displicentes, namorando sob árvores e na grama, como se dissessem:
eu tenho a juventude, o saber vem por acréscimo.
Infelizmente não vem. E a juventude se gasta. Como as pedras se gastam, como
as roupas se gastam, se gasta a pele, embora a alma se torne mais densa ou encorpada.
Algo semelhante ocorre diante de qualquer criança. Para um bebê convergem
todas as atenções na sala. Sorrisos se desenham nos rostos adultos e o ambiente é de terna devoção.
É a presença da vida, que no jovem parece ter atingido seu auge.
Por isto, ver um (ou uma) jovem no esplendor da idade é como ver o artista no instante de seu
salto mais brilhante e perigoso ou ver a flor na hora em que potencializa toda a sua vida e imediatamente nunca mais será a mesma.
Claro, há jovens que são foscos e velhos e velhos que são radiosos adolescentes. Não é disto que falo.
Estou falando de outra coisa desde o princípio. Daquela frase que aquela mulher depositou na
minha juventude e agora renasceu.
Gostaria de doá-la a alguém. Penso nisto e a porta se abre. Irrompem, lindas, minhas duas filhas.
Extasiado lhes dou um beijo e digo:
— Filhas, vocês não sabem que força têm.
(Affonso Romano de Sant’Anna. Porta de colégio. São Paulo: Ática, 1995. p. 39-42.)
Português: Linguagens — William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães
cetro: bastão de apoio usado no passado por reis e
generais, sinal de poder e comando.
coroa de louros: coroa feita com folhas de louro com
a qual se homenageava alguém por seus feitos.
crepúsculo: luminosidade solar crescente (ao amanhecer) ou decrescente (ao anoitecer).
displicente: descuidado, relaxado.
fosco: sem brilho.
Grace Kelly: atriz que abandonou a carreira para se
casar com o príncipe Rainier, de Mônaco. Morreu
em 1983, em acidente automobilístico.
haurir: beber, sorver.
impromptamente: de forma improvisada, despreocupada.
irromper: entrar com ímpeto, aparecer de repente.
parrudo: forte e musculoso.
radioso: alegre, contente.
trivial: comum, corriqueiro.
viço: vigor, exuberância de vida.
Procure no dicionário outras palavras que você desconheça.
COMPREENSÃO E INTERPRETAÇÃO
1. Todo o texto se estrutura a partir de uma frase que o narrador ouviu, segundo conta, de certa
mulher quando ele era jovem. Qual é essa frase? Vocês jovens não sabem a força que têm.
2. No 4º parágrafo, o narrador comenta: “Aquela frase me fez olhá-la de onde ela falava: do lugar
da não juventude”. De acordo com o texto:
Não necessariamente; ela seguramente não é jovem; assim, pode tratar-se tanto de uma pessoa de meia-idade quanto de uma pessoa idosa.
a) A mulher é caracterizada como uma pessoa idosa? Justifique sua resposta.
b) Considerando-se que o texto reflete sobre a passagem do tempo e sobre as fases da vida, o que
a partir de um ponto de vista próprio de quem já passou pela maturidasignifica colocar-se propositadamente “no crepúsculo”? Falar
de, isto é, pelo auge da vida, e caminha lentamente para o fim.
c) Na comparação das fases da vida com a trajetória do sol durante o dia, a que etapa do sol
corresponderia a fase da juventude do ser humano?
Espera-se que o aluno associe a juventude, isto é, o momento máximo de vida, ao momento de plenitude do sol, ou seja, ao meio-dia.
3. As palavras da mulher produzem no narrador a impressão de que ele, como os demais jovens,
tinha o cetro na mão, embora não tivesse consciência disso.
a) Por que a fase da juventude é associada à situação de realeza? Porque os jovens têm nas mãos o poder da juventude.
b) Considerando a história pessoal do narrador, você acha que a afirmação de que ele não tinha
consciência de sua força era verdadeira? Por quê? Sim, porque foi preciso que ele também chegasse à maturidade para que as palavras
da mulher fizessem sentido para ele.
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Carpe diem: aproveite o dia
A consciência de que a vida é breve e de que o tempo é irreversível gera, naturalmente, o desejo de aproveitar a vida, de viver
intensamente cada momento que ela oferece. Esse tema foi muito
explorado na poesia de várias épocas e recebeu o nome de carpe
diem (expressão latina que significa “aproveite o dia”). No filme
Sociedade dos poetas mortos, o professor de literatura (representado
pelo ator Robin Williams) dá uma bela aula sobre o assunto, mostrando aos seus alunos a fotografia de antigos alunos do colégio,
então todos mortos, e dizendo a eles “carpe diem, carpe diem...”.
4. Embora a frase dita pela mulher tenha iluminado o narrador, ela ficou adormecida por vários
anos, até que fosse despertada pela presença das filhas do amigo. Diz o narrador que a frase “ficou
bela e adormecida muitos séculos, encastelada”.
A Bela Adormecida
a) As expressões bela, adormecida e encastelada remetem a um conto de fadas. Qual é ele?
b) Em que a condição da personagem principal desse conto de fadas e a condição dessa frase na
memória do narrador se assemelham? Tanto a personagem quanto a frase permaneceram adormecidas até que algo as despertasse.
5. O narrador exemplifica o que é, para ele, ser jovem: é ter a beleza jovial das três filhas do amigo
e a descontração dos estudantes da universidade. E compara o deslumbramento provocado pela
juventude ao deslumbramento que se tem diante de um bebê, ou diante da perfeição de um
artista no auge de sua técnica, ou diante da beleza máxima de uma flor na sua curta existência.
6. No 16º parágrafo, o narrador afirma que os jovens universitários agem como se
dissessem: “eu tenho a juventude, o saber vem por acréscimo”. Em seguida afirma: “Infelizmente não vem”. De acordo com o texto:
a) Qual seria, então, o preço que se paga para obter o saber? O amadurecimento, o envelhecimento.
b) Você acha que esse saber envolve apenas o saber universitário? Justifique sua resposta.
Não, refere-se ao saber como um todo, ao saber que se adquire com o passar dos anos.
c) Apesar de seus aspectos negativos, que consequências positivas a perda da juventude traz?
A alma se torna mais “densa e encorpada”, ou seja, o ser se torna mais pleno, mais rico de experiências e emoções.
7. O narrador distingue “jovens que são foscos e velhos” de “velhos que são radiosos adolescentes”.
velho é aquele que não tem alegria de viver, que não sente prazer em descobrir a vida,
Em seguida acrescenta: “Não é disto que falo”. Oemjovem
experimentar, em conhecer coisas novas, etc. O velho adolescente é aquele que, apesar da
idade, não perdeu o encanto da vida e a alegria de viver.
a) Qual é a diferença entre um jovem velho e um velho adolescente?
b) De que juventude, então, fala o narrador? Resposta pessoal. Espera-se que o aluno perceba que o narrador não está discutindo a juventude
pela perspectiva individual, isto é, pelo valor que ela teria para cada um de nós, mas do ponto de vista filosófico, isto é, como uma fase que representa o apogeu da vida de todo ser humano.
8. Traçando um movimento circular, o texto termina como se inicia. Estando agora no lugar da não
juventude, é o narrador quem diz às filhas a mesma frase que há tempos ouvira de uma mulher.
Não; antes ele não conseguia alcançar a dimensão do
a) Essa frase tem, para ele, o mesmo significado de antes? Por quê? significado da frase. Agora, maduro, ele compreende
seu verdadeiro significado.
b) O texto retrata uma contradição inevitável da vida, existente na relação entre juventude e
maturidade. Por que essa relação é contraditória?
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a) Na sua opinião, as filhas do amigo ou os jovens universitários retratados pelo texto demonsNão, eles simplesmente são jovens à sua maneira. Mesmo os universitários, que agem
tram consciência da “força que têm”? Por quê? como se dissessem “eu tenho a juventude”, parecem não valorizar a juventude em si, mas
a sensação de liberdade que ela proporciona.
b) Ao comparar a juventude com a flor, o narrador afirma que a flor, depois do momento máximo em que “potencializa toda a sua vida”, nunca mais será a mesma. E com as pessoas, isso
também acontece? Por quê? Sim, pois a vida, como o tempo, é irreversível. A cada novo segundo, somos diferentes do que éramos.
Porque, quando se é jovem, não se tem consciência do valor da juventude; quando se é maduro, chega-se a essa consciência, mas, então, não se tem a juventude.
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9. A frase dita pela mulher, depois de ficar adormecida muitos anos na memória do narrador, renasce com outra importância e significado. “Gostaria de doá-la a alguém”, pensa ele. É possível dizer
que o narrador conseguiu realizar esse desejo? Por quê? Sim. Ao redigir a crônica, ele a transmite a seus leitores, que podem transmiti-la
a outras pessoas, e assim por diante.
A LINGUAGEM DO TEXTO
1. Releia o 8º parágrafo do texto.
a) Nesse parágrafo, o narrador faz uso da hipérbole, uma figura de linguagem que consiste em
de cabelos” e “treum exagero intencional. Identifique nesse trecho dois exemplos de hipérbole. “floresta
zentos dentes na boca”
b) Na sua opinião, considerando o assunto tratado nesse parágrafo, com que finalidade o narrador empregou as hipérboles? Para realçar a abundância de vida que há nos jovens.
2. Releia este parágrafo do texto:
“Por isto, ver um (ou uma) jovem no esplendor da idade é como ver o artista no instante
de seu salto mais brilhante e perigoso ou ver a flor na hora em que potencializa toda a sua vida
e imediatamente nunca mais será a mesma.”
Agora veja alguns dos significados da palavra efêmero, segundo o dicionário:
efêmero 1 que dura um dia 2 que é passageiro, temporário, transitório [...] 5
o que dura pouco, o que é transitório [...]
(Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.)
No texto, para dar uma ideia do que é o esplendor da juventude, o narrador compara-o com dois
elementos: o salto do artista e o apogeu da flor. Para o narrador, a juventude é efêmera? Justifique
sua resposta. Sim, pois tanto o salto do artista quanto o apogeu da flor — elementos com que é comparada a juventude — duram muito pouco.
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LEITURA EXPRESSIVA DO TEXTO
Quatro alunos leem a frase dita pela mulher ao narrador, cada um com uma entonação diferente,
procurando transmitir as seguintes impressões:
• tom profético (fala lenta e impostada, alongando a última palavra da frase);
• tom simples e coloquial (com simplicidade, como se fala a um amigo);
• tom de superioridade (reforçando, com expressões do rosto e da boca, a ideia de inferioridade dos
ouvintes);
• tom ansioso (fala rápida, nervosa, como se a pessoa tivesse pressa de transmitir o que pensa).
Se desejar, descubra outras entonações para a frase.
Trocando
ideias
O texto desenvolve-se a partir da frase “vocês jovens não sabem a força que têm”.
1. Se alguém lhe fizesse essa afirmação, como você a interpretaria? Que tipo de força é essa?
2. O que você acha que é possível fazer com essa força jovem?
3. O texto menciona “jovens velhos” e “velhos adolescentes”. Você acha que é possível envelhecer
em plena adolescência ou ter uma velhice parecida com a adolescência?
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Tema:
Juventude
ESTUDO DO TEXTO
A adolescência é uma fase extremamente difícil da vida. Talvez a mais difícil. Temos que nos
comportar como adultos sem dispor de cacife para isso. Temos que ser fortes e independentes quando ainda nos sentimos inseguros e sem autonomia de voo. Temos que mostrar autoconfiança sexual,
mesmo sendo totalmente inexperientes. Temos que formar um juízo a nosso respeito — se possível
positivo —, mas nos falta a vivência para aprofundar o autoconhecimento. Enfim, temos que ser
ousados e corajosos, embora a cada passo surja o medo para nos inibir.
O que fazer? Frente a tantas incertezas, acabamos seguindo os modelos sugeridos pela própria
cultura. Passamos a imitar nossos heróis, “travestindo-nos” de super-homens e de mulheres maravilha. Assim, encobrimos nossas dúvidas e inseguranças. Elas que sejam reprimidas e enviadas para o
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Juventude: a utopia da onipotência
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porão do inconsciente. Nós seremos fortes e destemidos, para nós
nada de errado ou ruim irá acontecer. Construímos uma imagem
de perfeição, de criaturas especiais, particularmente abençoadas
pelos deuses. Resultado: nos sentimos onipotentes e, a partir daí,
não há coisa no mundo que possa nos aterrorizar, uma vez que
estamos revestidos de proteções extraordinárias.
Este “estado de graça” irá perdurar por um tempo variável.
É um período bastante complicado para as pessoas que convivem
com o jovem, pois ele sabe tudo, faz tudo melhor, acha todo o
mundo “alienado” e “burro”. Só ele é competente e sábio. No
entanto, para o próprio jovem, a fase parece muito positiva. Ele,
finalmente, se sente bem, forte, seguro e não tem medo de experimentar situações novas. Pode montar o cavalo mais selvagem com
a certeza absoluta de que não cairá em hipótese alguma. Mais tarde, quando não for mais tão ousado
e confiante, se lembrará dessa época da vida como a mais feliz. Afinal de contas, a sensação de euforia
é sempre inesquecível.
Na verdade, ninguém teria nada contra a onipotência, se ela correspondesse à realidade. Porém,
não é isso que os fatos nos ensinam. Sabemos que, entre os jovens, são exatamente os mais confiantes
aqueles que se envolvem em todo tipo de acidentes graves, quando não fatais. São estes jovens que
dirigem seus carros na estrada, durante a madrugada, com o “pé na tábua”. Não sentem medo porque
“é óbvio que os pneus não irão estourar” e “é lógico que não irão adormecer ao volante”. São estes
jovens que saem de uma festa e, alcoolizados, vão a toda a velocidade para a praia. Sua “imortalidade” só é desmentida por um acidente fatal. Aliás, para ser sincero, parece incrível que não ocorra um
maior número de acidentes.
Alguns jovens, onipotentes e filhos diletos dos deuses, andam de motocicleta sem capacete.
Desafiam a chuva e o asfalto molhado, depois de usar tóxicos ou ingerir álcool. Fazem curvas superperigosas. Não se intimidam porque “para eles nada de mau irá acontecer”. E morrem ou ficam
paralíticos, interrompendo vidas que poderiam ser ricas e fascinantes. Estes mesmos jovens utilizam
drogas em doses elevadas, porque se julgam imunes aos riscos da overdose e suas graves consequências. Chegam a compartilhar seringas, ao injetar tóxicos na veia, pois “é claro que não terão AIDS”. E,
pela mesma razão, continuam a ter relações sexuais com parceiros desconhecidos, sem sequer tomar
o cuidado de usar camisinha.
Aqueles que não morrem ou não ficam gravemente doentes, um dia acordam desse sonho em
que flutuavam em “estado de graça”. Acordam porque lhes aconteceu algo: aquele acidente considerado impossível. Caíram do cavalo. Eles também são mortais! Então, tomam consciência de toda a
insegurança e de toda a fragilidade que os levaram a construir a falsa armadura da onipotência. Ao
se tornar criaturas normais, sentem-se fracos. Antes era muito melhor. Sim, mas era tudo mentira.
Agora, o mundo perdeu as cores vibrantes da fantasia. Vestiu os meios-tons da realidade. Eles não
conseguiram domar o cavalo selvagem e foram
derrubados no chão. Terão que aprender a cair e
cacife: a quantia em dinheiro com que cada
se levantar. Terão que aprender a respeitar mais
jogador entra no jogo.
os cavalos! Terão que saber que todas as doenças,
meio-tom: na escala de cores, aquela correstodos os acidentes, todas as faltas de sorte poderão
pondente à metade de um tom.
persegui-los. E — o que é mais importante — terão
onipotência: poder absoluto.
que enfrentar com serenidade a plena consciência
utopia: plano ou sonho irrealizável, fantasia.
vulnerável: fácil de ser atingido, frágil.
de que são vulneráveis. Este é um dos ingredientes
da maturidade: ter serenidade na viagem da vida,
Procure no dicionário outras palavras que você
mesmo sabendo que tudo pode nos acontecer.
desconheça.
(Flávio Gikovate. Claudia, fev. 1992.)
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COMPREENSÃO E INTERPRETAÇÃO
1. Flávio Gikovate, médico psiquiatra, discute nesse texto um problema relacionado ao jovem adolescente. No 1º parágrafo, várias vezes é empregada a 1ª pessoa do plural, como em “Temos que
nos comportar como adultos [...]”. A quem o autor se refere, ao empregar a 1ª pessoa?
Refere-se a todos nós; o emprego da 1ª pessoa do plural generaliza, dando a entender que todos, de alguma forma, vivem ou já viveram o problema.
2. Com o emprego repetido do verbo ter, o 1º parágrafo passa a impressão de que cada um de nós
tem de apresentar uma série de comportamentos exigidos pela sociedade. Observe alguns deles,
enumerados pelo autor:
• Comportar-se como adulto. • Mostrar autoconfiança sexual.
• Ser forte e independente.
• Formar um juízo de si mesmo.
Por que esses comportamentos são exigidos socialmente?
• Ter ousadia e coragem.
Porque são a condição para as pessoas serem aceitas socialmente como adultas.
3. Releia este trecho:
“Frente a tantas incertezas, acabamos seguindo os modelos sugeridos pela própria cultura.
Passamos a imitar nossos heróis, ‘travestindo-nos’ de super-homens e de mulheres maravilha.”
Com base no 2º e no 3º parágrafos, responda:
a) Que relação o autor estabelece entre o sentimento de onipotência do jovem e os modelos
culturais? Para o autor, o sentimento de onipotência advém da identificação do jovem com os modelos culturais, ou seja, o jovem passa a imitar seus ídolos da TV e do cinema.
b) Como é, para os familiares, conviver com um jovem que vive em “estado de graça”? Por quê?
É difícil, pois o jovem nessa fase é intolerante, acha que tem razão em tudo e se acha o melhor.
James Dean, ator que fez o papel principal de Juventude
transviada e que, na vida real, imitou o filme: ainda
jovem, morreu em acidente de automóvel.
Português: Linguagens — William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães
A imagem da juventude como rebelde, contestadora e inconsequente é mais ou menos recente na
cultura ocidental: data dos anos 50 do século XX para
cá. Antes disso, os jovens não eram vistos como um
grupo de importância social, com necessidades, valores e interesses próprios.
O filme Juventude transviada (1955) foi o primeiro a registrar a insatisfação dos jovens americanos
em relação aos valores da família e da sociedade. Os
anseios do movimento hippie e dos jovens dos anos 60
ficaram documentados no musical Woodstock — Onde
tudo começou (1970). Nos anos 70, a contestação jovem
ficou registrada no filme Laranja mecânica, de Kubrick.
Nos anos 90, o filme Kids causou impacto com seus
adolescentes decadentes e sem perspectiva. E hoje?
Você acha que o filme As melhores coisas do mundo traduz os anseios da sua geração?
Bettmann/Corbis
A juventude no cinema
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4. No 4º parágrafo, o autor afirma que “ninguém teria nada contra a onipotência, se ela correspondesse à realidade”. Com esse comentário, Gikovate quer dizer que a sensação de onipotência é
positiva ou negativa? Explique por quê. Quer dizer que ela é negativa, pois tem base no mundo da fantasia, e isso cria problemas no mundo real.
5. No 5º parágrafo, no trecho “Alguns jovens, onipotentes e filhos diletos dos deuses [...]”, o autor
faz uso da ironia — uma figura de linguagem que leva à inversão do sentido comum das palavras
— ao empregar a expressão filhos diletos dos deuses. Que efeito de sentido essa ironia causa
no texto? Produz uma inversão no sentido da frase, ou seja, o autor sugere que os jovens, embora
não sejam onipotentes e filhos diletos dos deuses, agem como se fossem.
6. Observe e compare estes dois trechos:
“Pode montar o cavalo mais selvagem com
a certeza absoluta de que não cairá em hipótese
alguma.” (3º parágrafo)
“Caíram do cavalo. Eles também são mortais! [...] Eles não conseguiram domar o cavalo
selvagem e foram derrubados no chão. Terão que
aprender a cair e se levantar. Terão que aprender
a respeitar mais os cavalos!” (último parágrafo)
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Em ambos os trechos, o autor usa a mesma imagem: a do cavalo e do cavaleiro. No 1º trecho tem sentido denotativo; no 2º trecho tem sentido conotativo.
a) Em qual deles a imagem tem sentido denotativo e em qual tem sentido conotativo?
b) No trecho conotativo, além do sentido comum, que outros sentidos ganham:
• o cavalo selvagem? O de problemas, dificuldades que a vida oferece.
• a queda do cavalo? Nosso fracasso diante desses problemas.
• o respeito ao cavalo? O reconhecimento de nossas limitações diante das dificuldades.
7. No último parágrafo, o autor compara a vida a uma viagem, na qual um dia todos nós acordamos
de um sonho e saímos do “estado de graça” em que nos achávamos.
Não, pois é difícil admitir que temos limitações, que
a) É fácil para o viajante abandonar o “estado de graça”? Por quê? somos vulneráveis.
b) De acordo com o texto, qual é o requisito fundamental para fazer a “viagem da vida” de modo
tranquilo? Ter serenidade e consciência de que a viagem não será fácil.
8. O texto foi publicado em Claudia, uma revista dirigida principalmente ao público formado por
mulheres adultas.
Considerando o público a que se destina a revista, indique qual dos itens a seguir expressa a
finalidade principal do texto:
X
a) Orientar os pais sobre como envelhecer e como lidar com os filhos que chegam à maturidade.
b) Explicar psicologicamente o que ocorre com o jovem adolescente na transição para a maturidade e orientar os pais sobre como lidar com os filhos nessa fase.
c) Informar cientificamente o que ocorre com os jovens durante a transição para a maturidade e
orientá-los sobre como aproveitar melhor os aspectos positivos dessa fase.
d) Instruir pais e filhos sobre como devem agir durante esse período em que os jovens se sentem
onipotentes.
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A LINGUAGEM DO TEXTO
1. No 1º parágrafo, o autor repete várias vezes a construção temos que. Que efeito de sentido essa
repetição produz no texto? A repetição dessa expressão soa como um código de leis que devesse
ser cumprido. A repetição dessa expressão soa como um código de leis que devesse ser cumprido.
2. Na frase “Temos que nos comportar como adultos sem dispor de cacife para isso”, o autor emprega a palavra cacife, que se liga ao campo semântico de jogo.
a) Qual o sentido dessa palavra no contexto? Não temos ainda uma bagagem de experiências, de vivências, para sermos adultos.
b) Ao empregar essa palavra, o autor implicitamente faz uma comparação. A que a vida é comparada? A um jogo, para o qual estamos despreparados.
3. Releia este trecho: “Agora, o mundo perdeu as cores vibrantes da fantasia. Vestiu os meios-tons
da realidade”. Também aqui o autor empregou palavras ligadas a um campo semântico diferente
do campo semântico do assunto central do texto.
a) Qual é esse campo semântico? O da pintura.
b) Explique o sentido que as palavras destacadas têm no contexto em que foram empregadas.
cores vibrantes: a graça, a motivação; meios-tons: o lado menos atraente da realidade ou os problemas que ela apresenta.
Trocando
ideias
a) Você concorda com o psiquiatra? Ser adolescente é difícil? Por quê?
b) Na sua opinião, é possível fugir à pressão da sociedade quanto aos padrões de comportamento
desejados? Em caso afirmativo, explique como.
2. A onipotência do jovem foi tratada no texto como meio de superar a insegurança.
a) Você se sente onipotente? Em caso afirmativo, descreva essa sensação. Em caso negativo,
conhece alguém que se sinta assim? Como é essa pessoa?
b) Você conhece alguém que tenha sido vítima de sua própria onipotência? Conte como foi e as
consequências desse fato.
c) Na sua opinião, de que forma o jovem pode combater a sedução da onipotência?
3. Flávio Gikovate dá dois exemplos de consequências desastrosas, para o jovem, da sensação de
onipotência: acidentes com veículos e doenças como a Aids. A que outras consequências negativas você acha que o “jovem onipotente” está exposto?
Português: Linguagens — William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães
1. Flávio Gikovate considera difícil a fase de iniciação à vida adulta. E afirma que a dificuldade
maior reside no fato de não sermos ainda aquilo que socialmente esperam que venhamos a ser.
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Tema: Juventude