Ridigez e Flexibilidade na Administração Portuguesa do Brasil Colonial – Análise
Multi-Facetada de um Exemplo Pré-Científico de Gestão por Resultados
Autoria: José Carlos Ferreira Fernandes
Resumo
A atuação da administração portuguesa em sua colônia sul-americana durante todo o
longo período que se estende dos inícios do séc. XVI aos inícios do XIX, por baixo de uma
espessa capa de rigidez normativa e de inflexibilidade operacional, ocultava, não obstante,
uma impressionante maleabilidade e adaptabilidade, ligadas ao objetivo precípuo perseguido
desde o início por parte do aparato estatal metropolitano, qual seja, a maximização dos
rendimentos da Coroa. Para atingir tal fim, foram utilizadas, de maneira cambiante, e de
acordo com as circunstâncias, políticas ora mais restritivas e estatizantes, ora mais liberais e
privatizantes, não se furtando a administração metropolitana de superposições de funções e de
mudanças de estratégias de curto prazo, em prol de seu objetivo final. A análise da
participação do Brasil nos rendimentos da Coroa Portuguesa ao longo do referido período,
tanto em termos absolutos quanto relativos, mostra que tal atuação foi, sob o ponto-de-vista
especificamente metropolitano, coroada de êxito, mostrando-se como um soberbo exemplo,
ainda que pré-científico, de gestão por resultados.
Introdução
Este trabalho procura mostrar que as práticas levadas a cabo pela administração
portuguesa no Brasil Colonial pautaram-se por uma mescla de rigidez e de flexibilidade que
tinha por objetivo precípuo maximizar o retorno da metrópole, ou melhor, do aparato estatal
metropolitano (como distinto da própria “nação” portuguesa), tudo sendo subordinando a esse
fim, inclusive a alternância entre práticas ora mais estatizantes ora mais privatizantes, ora
mais abertas ou ora mais fechadas; e que tal prática, sob o ponto-de-vista do Estado
metropolitano, foi plenamente coroada de êxito. Tal tipo de atuação da superestrutura
administrativa sobre a massa de “súditos” (quer sejam eles assim denominados, quer ganhem
o epíteto de “cidadãos”) configura-se, ainda hoje, como a mais poderosa herança do passado
colonial presente no Brasil contemporâneo – a prioridade do aparato administrativo sobre o
povo, sobre a nação, numa estrutura nitidamente imperial.
De fato, mesmo após a Independência, o Brasil continuou sendo, em larga medida, um
Estado antes de ser uma genuinamente uma nação, e tal característica muito pouco possuía de
novidade – era apenas a continuação de uma situação anterior, ligada a práticas
administrativas já entranhadas nas estruturas da colônia.
Tais práticas serão apreciadas sob quatro pontos de vista distintos mas
complementares: político-administrativo, eclesiástico, judicial e, enfim, econômico. O
aspecto econômico servirá para, mercê de algumas considerações de índole quantitativa,
ilustrar e confirmar a eficácia das referidas práticas, as quais, em seu espírito, vêm se
mantendo, ao menos em larga medida, até aos dias atuais.
Administração Colonial – Aspecto Político-Administrativo:
Trinta anos após o achamento oficial do Brasil (22 de abril de 1500), o Estado
português procurou resolver o problema do que fazer com suas posses sul-americanas,
juridicamente estabelecidas diante da rival monarquia espanhola a partir do tratado assinado
na cidade de Tordesilhas, em Castela-a-Velha, aos 7 de junho de 1494, pela sua repartição em
1
imensos territórios (“capitanias”), concedidos a particulares. Entre os anos de 1534 e 1536,
foram instituídas pelo Rei de Portugal quatorze capitanias, compreendendo quinze lotes,
atribuídos a doze donatários1. As capitanias eram como que senhorios dotados de
considerável autonomia (embora não de soberania), independentes umas das outras e
diretamente ligadas ao governo central em Lisboa. Os principais direitos dos capitães
donatários eram: a) distribuir justiça; b) conceder asilo (com algumas exceções, como nos
casos de heresia, traição e fabricação de moeda falsa); c) escravizar silvícolas e vendê-los em
Portugal, em número variável; d) doar sesmarias (terrenos não colonizados) a cristãos; e) coparticipar dos privilégios fiscais da Coroa (vintena do pau-brasil, redízimo, meia dízima do
pescado, etc.); f) transmitir a capitania por herança; g) conservar sesmarias para si2.
Desse modo, a colonização brasileira começou como uma atividade privada, gozando
os concessionários de amplos privilégios e constituindo-se o espaço colonizado por núcleos
independentes entre si, supervisionados à distância pelo Estado. O sistema, ao contrário do
que usualmente se apregoa, não malogrou (tanto que novas donatarias foram distribuídas
posteriormente), conseguindo polvilhar a extensa costa com vários pequenos núcleos
populacionais, os quais exibiram fortunas e vitalidades diversas, é verdade3, mas garantindo
ao Estado metropolitano a efetiva posse da colônia sul-americana.
Para coordenar os esforços da colonização e fazer frente às pretensões corsárias e
coloniais estrangeiras (especialmente francesas), já vencida a primeira etapa da implantação
na nova terra (não para extinguir o sistema das donatarias, mas sim para aprimorá-lo), foi
implantado em 1549 um Governo-Geral, com sede na capitania da Bahia (comprada de seu
antigo donatário e, assim, constituída em Capitania Real, em oposição às demais Capitanias,
ditas “Hereditárias”), para o qual construiu-se a primeira cidade do Brasil, São Salvador da
Baía de Todos os Santos (a atual Salvador). As lutas contra as tentativas de estabelecimento
dos franceses na Guanabara levaram ao estabelecimento de mais uma Capitania Real, a do
Rio de Janeiro, e à fundação da segunda cidade do Brasil (São Sebastião do Rio de Janeiro,
em 1565).
Embora não cessasse a concessão de novas donatarias após o estabelecimento dos
Governadores-Gerais, prova aliás cabal de que o sistema em si estava longe de ser
considerado ineficaz (ilha da Trindade, 1539, sem conseqüências práticas4; ilha de Itaparica,
1556; Paraguaçu ou Recôncavo da Bahia, 1566), o poder dos donatários foi cerceado em
alguns aspectos importantes: o direito de asilo (homizio) sofreu severa restrição, e suas
atribuições judiciárias foram reduzidas, tendo surgido entre eles e o rei duas instâncias
judiciais, a do Ouvidor Geral e a do Governador Geral.
Serviu também o governo-geral para melhor coordenar a expansão territorial no norte
da colônia, região mais próxima à sede de Salvador e à próspera capitania de Pernambuco,
surgindo novas capitanias reais em terras negligenciadas pelos antigos donatários: Paraíba
(1584-85, com a fundação da terceira cidade do Brasil, e última a ser fundada no séc. XVI,
Filipéia de Nossa Senhora das Neves, depois chamada Paraíba – a atual João Pessoa), Sergipe
d’el-Rey (1590), Rio Grande do Norte (1603) e, após a expulsão dos franceses, Maranhão
(1615) e Grão-Pará (1617), e enfim Ceará (1619).
O tamanho do território, contudo, fez com que, em repetidas ocasiões, cogitasse a
metrópole a partição da colônia em diversos governos-gerais autônomos. Uma primeira
partição ocorreu entre 1573-77, com a parte norte (até Ilhéus, inclusive) sob um governo
sediado em Salvador e a parte sul sob um sediado no Rio de Janeiro. Após a reunificação em
1578, em favor de Salvador, seguiu-se uma nova repartição de curta duração (1608-12), nos
mesmos termos. Embora efêmeras, a primeira repartição deixou como herança a constituição
(1575) de uma segunda diocese, ou melhor, prelazia (do Espírito Santo para o Sul),
subordinada a um administrador apostólico residente no Rio, independente do bispo de
Salvador, e a segunda legou uma partição judiciária permanente, com a criação (1608) da
2
Ouvidoria-Geral do Rio de Janeiro, com a mesma área de abrangência, independente da
Ouvidoria-Geral de Salvador.
De efeitos mais permanentes foi a criação do Estado do Maranhão, em 1621 (efetivado
em 1626)5, independente do Estado do Brasil. Sua capital foi fixada em São Luís do
Maranhão, e abrangia originariamente as capitanias do Maranhão, do Grão-Pará e do Ceará.
No novo Estado, foram sendo sucessivamente criadas novas donatarias: Cametá ou Camutá
(1620), Cumá, Cumã, Tapuitapera ou Alcântara (1633), Caité, Caeté ou Gurupi (1634), Cabo
do Norte (1637), Marajó ou Ilha Grande de Joanes (1655) e Xingu (1685, sem efeitos
práticos). O centro de gravidade do Estado deslocou-se paulatinamente para a região
amazônica, à proporção em que, através dos rios, ocupava-se a vasta bacia6. Portanto, deve-se
ter em mente um fato muitas vezes ignorado, ou negligenciado: ao contrário do que é dito
muitas vezes, a colonização portuguesa em suas terras do Novo Mundo não se pautou pela
constituição de uma administração unitária e centralizada – houve, durante longo tempo
(1626-1772), dois Estados distintos e independentes entre si (Maranhão e Brasil), e a sua
união (aliás, de cunho meramente administrativo) ocorreria apenas em finais da era colonial.
A expansão territorial dos dois Estados para além dos limites estipulados por
Tordesilhas iniciou-se sob a União Ibérica (1580-1640), quando Portugal e Espanha
encontravam-se sob um mesmo governo, e acelerou-se depois. Seguindo os pioneiros,
bandeirantes, pecuaristas, mineradores ou missionários (notando-se maior participação e
incentivo oficial no Estado do Maranhão e no norte do Estado do Brasil), foram sendo
estabelecidas as respectivas unidades administrativas locais (vilas com a suas câmaras), bem
antes de serem constituídas novas capitanias – desbravaram-se os sertões nordestinos e o
interior paulista, até aos confins paranaenses e mato-grossenses, e abriu-se a bacia amazônica,
principalmente por intermédio das ordens religiosas7. A partir dos meados do séc. XVII, não
mais se concederam donatarias; e mesmo três capitanias, no Estado do Brasil (Fernando de
Noronha, Pernambuco e Itamaracá), passaram à Coroa8.
Nas hereditárias, merecem menção os destinos das três capitanias do extremo sul: o
segundo quinhão de São Vicente, ou São Vicente propriamente dita, Santo Amaro e Santana.
Ligadas judicialmente à Ouvidoria-Geral do Rio de Janeiro até 1699, pertenciam à mesma
família, os Sousas dos dois irmãos que foram seus primeiros donatários (Martim Afonso e
Pêro Lopes); por questões de herança, em 1624 Santo Amaro e Santana incorporaram-se à
capitania de São Vicente, que passou a incluir assim todos os territórios portugueses ao sul da
Capitania Real do Rio de Janeiro. Seu centro vital encontrava-se não na capital, a litorânea
São Vicente, mas sim na vila de São Paulo, no interior, terra de fronteira, para efeitos práticos
independente do governo senhorial, e ponta-de-lança de extensa expansão territorial, tendo
por motivação a preagem de índios, a procura de metais preciosos e a expansão pecuarista.
Os esforços mineradores foram enfim coroados de êxito nos últimos anos do século XVII e ao
longo das duas primeiras décadas do XVIII, o que trouxe um aumento desmesurado da área
de influência da referida capitania, a qual passou a se estender às regiões das minas, aos
confins de Goiás e Mato Grosso e, no sul, até ao que hoje são os estados do Paraná, Santa
Catarina e Rio Grande do Sul.
Tal situação ensejaria, cedo ou tarde, a intervenção da Coroa: o extremo sucesso dos
paulistas acabou se lhes transformando numa damnosa hereditas. Em 1709, os direitos do
último donatário, o segundo marquês de Cascais, foram comprados pelo soberano; a capitania
de São Vicente foi então extinta, criando-se em seu lugar a Capitania Real de São Paulo e das
Minas do Ouro, com capital na vila (desde 1711 enfim cidade) de São Paulo.
Sucessivamente, desse enorme corpo administrativo foram sendo criadas novas capitanias
reais: Minas Gerais (1720, ainda sem o Triângulo), Santa Catarina (1737, efetivada em 1738,
da qual separou-se em 1760 a capitania do Rio Grande de São Pedro9), Mato Grosso (1748,
mas somente efetivada em 1751) e Goiás (1748, incluindo o Triângulo Mineiro); no mesmo
3
ano de 1748, o remanescente da capitania foi incorporado à do Rio de Janeiro, assim
permanecendo até 1765, quando enfim restaurou-se a Capitania Real de São Paulo10. A
supervisão das regiões do extremo sul, contudo (Santa Catarina e Rio Grande de São Pedro),
tradicionalmente ligada a São Vicente/São Paulo, passou a ficar sob a égide da Capitania Real
do Rio de Janeiro11.
Refletindo o fortalecimento da monarquia absolutista portuguesa, e num programa
voltado à uniformização administrativa e à tentativa de centralização de procedimentos, as
capitanias hereditárias remanescentes foram sendo encampadas pela Coroa sob os reinados de
d. João V (1706-1750) e de d. José (1750-1777). Assim ocorreu com o Espírito Santo
(adquirido em 1718 do último donatário), com Paraguaçu (comprada pela Coroa em 1733 e
incorporada à Bahia), com Porto Seguro (confiscado ao duque de Aveiro em 1758 e também
incorporado à Bahia), com Ilhéus (adquirida em 1761 e igualmente incorporada à Bahia) e
com Itaparica (adquirida em 1763 e, do mesmo modo, incorporada à Bahia).
A capitania de São Tomé (região de Campos, atualmente no norte fluminense), desde
1615 conhecida como Paraíba do Sul, passou em 1648 aos domínios dos viscondes de Asseca,
até ser incorporada pela Coroa em 1748. Em 1753, foi absorvida pela Capitania Real do
Espírito Santo12.
A história administrativa do Estado do Maranhão seguiu caminhos próprios. Extinto
em 1652, foi logo restaurado em 1654, com o nome de “Estado do Maranhão e Grão-Pará”
(testemunhando a crescente importância da região amazônica no referido Estado), mas sem a
capitania do Ceará, passada ao Estado do Brasil, juntamente com a região do atual Piauí. O
Piauí, aliás, teve história bem sinuosa. Permaneceu no Estado do Brasil, como parte da
capitania de Pernambuco, até 1715, quando, por disposição régia, voltou a ser incorporado ao
Estado do Maranhão e Grão-Pará (passando a fazer parte da capitania do Maranhão); em
1718, criou-se uma capitania do Piauí, subordinada à do Maranhão, que foi contudo extinta
em 1722. Somente em 1753 recriou-se a referida capitania, desmembrando-se-a do
Maranhão, concomitantemente à criação da capitania de São José do Rio Negro (o atual
Amazonas), desmembrada do Grão-Pará.
Em 1751 a capital do Estado havia sido transferida de São Luís para Belém, mudandose o nome da entidade de “Estado do Maranhão e Grão-Pará” para “Estado do Grão-Pará e
Maranhão”; entre 1752 e 1753, enfim, as donatarias remanescentes (Cabo do Norte, Caeté,
Cametá, Alcântara e Marajó) foram absorvidas, passando o Estado a se constituir das quatro
citadas capitanias reais (Piauí, Maranhão, Grão-Pará e São José do Rio Negro) até que, em
1772, foi enfim extinto como unidade política. A partir de então (e somente a partir de então),
a América Portuguesa passou a se constituir num único Vice-Reinado, com sede no Rio de
Janeiro, sub-dividido, para fins administrativos, em capitanias reais (sem mais nenhuma
donataria).
Junto a esse extenso processo macro-administrativo (que durou, grosso modo, de 1534
a 1772), o qual caminhou na tendência de uma maior centralização e uniformização, seguiu
um não menos rico processo micro-administrativo, a constituição de ativos núcleos de
governo local – o surgimento de vilas e de cidades, com as suas câmaras municipais. Se as
capitanias eram, muitas vezes, a expressão de forças e de desejos distanciados da vida
quotidiana da colônia, tal não se podia dizer das câmaras, que representavam, tanto quanto era
possível para a época e as circunstâncias, os interesses locais – ao menos, o das forças sociais
mais influentes das elites locais. As câmaras municipais, sempre ciosas de sua autonomia,
muitas vezes punham-se em oposição aos capitães-gerais, governadores ou mesmo vice-reis,
e, especialmente nas regiões mais distantes dos centros mais tocados pelo governo central (os
grandes núcleos populacionais litorâneos, especialmente Pernambuco, o Recôncavo, a região
em torno do Rio de Janeiro, e Vila Rica e Mariana, nas Minas Gerais), constituía-se no
4
governo de fato, tanto nos aspectos executivos quanto em vários quesitos legislativos e,
mesmo, judiciários.
Administração Colonial – Aspecto Eclesiástico
A análise dos aspectos eclesiásticos da administração colonial não é desprezível, pois,
ao contrário do que ocorre atualmente, não havia separação, para fins operacionais, entre
Igreja e Estado13.
A criação do governo-geral teve também como conseqüência a constituição de uma
hierarquia eclesiástica formal, com o bispado de Salvador (1551). Em 1575, conforme
comentado mais acima, constituiu-se no sul (a partir da capitania do Espírito Santo, inclusive)
uma nova diocese, ou melhor, prelazia, com sede no Rio de Janeiro e sob os cuidados de um
administrador apostólico, independente do bispo de Salvador. Fora isso, a autoridade do
prelado soteropolitano cobria todo o restante do Estado do Brasil, e todo o Estado do
Maranhão, e isso até 1677-78, quando mais três bispados foram criados: o do Rio de Janeiro
(governando toda a antiga prelazia do sul), o de Olinda (com jurisdição sobre Pernambuco e
Paraíba) e, enfim, o de São Luís (com jurisdição sobre o Estado do Maranhão e mais as
capitanias do Ceará e do Rio Grande do Norte), todos sufragâneos de Salvador, cujo bispo
ascendeu à posição de arcebispo. A expansão na região da bacia amazônica enfim ensejou a
criação do bispado de Belém do Pará (1719, com jurisdição sobre o Grão-Pará), e o
desbravamento das regiões mineiras e do Centro-Oeste levou, em 1745, a uma sub-divisão do
bispado do Rio de Janeiro, tornado demasiado extenso: criaram-se os bispados de São Paulo
(com jurisdição sobre São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande de São Pedro) e de Mariana
(com jurisdição sobre as Minas Gerais), bem como as prelazias de Goiás (com jurisdição
sobre Goiás) e de Cuiabá (com jurisdição sobre o Mato Grosso). Ambas as prelazias,
contudo, somente foram efetivadas em 1782.
Além da crônica falta de sacerdotes, a vida religiosa da colônia caracterizou-se por
uma alta dose de formalismo e ritualismo, a par de muito pouca espiritualidade autêntica;
havia muito mais sentimento (ou melhor, sentimentalismo) do que efetiva compreensão e
vivência das doutrinas religiosas. Não era incomum que os padres se imiscuíssem na vida
econômica, comportando-se como qualquer pessoa, que tivessem bens, terras e escravos, e até
que constituíssem famílias. Sob esse aspecto, estavam totalmente integrados na sociedade
que os cercava e, salvo exceções, eram vistos muito mais como funcionários do Rei e
dispensadores de sacramentos “mágicos” do que como guias espirituais. Ao menos,
encontravam-se bem próximos (talvez próximos demais) da realidade circundante.
Muito mais importante do que o clero secular era, no Brasil colonial, o clero regular,
tanto pela sua ação junto aos colonos quanto, principalmente, pelo seu papel desbravador e
civilizador junto aos silvícolas, estando seus estabelecimentos, especialmente nas zonas
pioneiras de missões, virtualmente independentes da supervisão das autoridades eclesiásticas
e, mesmo, civis14. No Grão-Pará, o papel das diferentes ordens foi predominante, e, na
melhor tradição do Padroado, foram utilizadas como instrumentos para a ocupação portuguesa
da bacia amazônica15. Na região sul, a atividade missionária coube aos jesuítas espanhóis,
que, em território atualmente brasileiro, estabeleceram duas áreas de missões, Guairá (16101639) no que hoje é, grosso modo, o interior do Paraná, e Guaranis (1610-1767), no que são
hoje o Rio Grande do Sul e o Paraguai. Os devastadores raids dos bandeirantes paulistas
puseram fim às missões do Guairá; na área guarani, a autorização dada enfim pela Coroa
espanhola para que fossem utilizadas armas de fogo (1631) garantiu-lhes a sobrevivência
(vitória de M’bororé, 1641, sobre os bandeirantes). Os guaranis foram mesmo utilizados pela
administração espanhola para combater os portugueses, na disputa pela fronteira do sul.
Contudo, o tratado de Madri (1750), ao entregar sete das missões jesuíticas (os “Sete Povos”,
5
no que é hoje o noroeste do Rio Grande do Sul) a Portugal, em troca da colônia do
Sacramento, gerou uma revolta entre os índios (1750-1756), enfrentada por tropas lusoespanholas, que devastaram a região e desorganizaram-lhe a economia. A derrogação, por
parte da Coroa, do poder secular das ordens nas suas missões (1755) e a expulsão dos jesuítas
dos domínios portugueses (1759), medidas levadas a efeito pelo primeiro-ministro do rei, o
Marquês de Pombal, terminaram por se revelar economicamente contra-producentes: os novos
administradores leigos mostraram-se muito menos competentes, e muito mais susceptíveis à
crueldade e a práticas inadequadas ou corruptas, do que os antigos missionários – e os
estabelecimentos, quando não desapareceram, vegetaram no letargo de uma sufocante e
inalterada estagnação econômica.
Administração Colonial – Aspecto Jurídico, ou da Dispensação da Justiça
Tal como em outras esferas administrativas, o processo de dispensação de justiça no
Brasil colonial (ou seja, o que se convencionou chamar depois de “poder judiciário”)
constituiu-se a partir da implantação na nova terra das estruturas existentes no Reino. Assim,
na época colonial, as capitanias eram divididas, para fins administrativos, em cidades ou vilas,
cada uma com a sua câmara16. Tais câmaras (também chamadas, algumas vezes, “senados”)
possuíam feições bem distintas das atuais câmaras municipais, exercendo funções legislativas
e judiciais, além das eminentemente executivas. Seguindo as Ordenações Manuelinas (151421) e suas sucessoras, as Ordenações Filipinas (1603), as câmaras no Brasil eram usualmente
compostas por três (às vezes quatro) vereadores, um tesoureiro, um escrivão, um procurador,
um síndico, um advogado e dois juízes almotacés (estes últimos encarregados da aferição de
pesos e medidas, bem como de cuidar do abastecimento e da higiene públicas) – todos
funcionários eleitos pelos membros mais representativos e influentes (ou seja, ricos) da
sociedade local, e para cujo ofício não se exigia nenhum estudo ou especialização além
daqueles adquiridos pela prática, pela fortuna, pela perspicácia e pela ambição.
O poder das câmaras, especialmente na esfera judicial, foi bastante reduzido pela
criação, por parte do rei d. Afonso IV, em 1352, dos “juízes de fora”, ou “de fora à parte”,
também chamados “de vara branca”, formalmente possuidores de grau em Direito e nomeados
e pagos pela Coroa. Isso, contudo, ocorreu no Reino, porque no Brasil somente em 1692
foram pela primeira vez os juízes de fora instituídos, sendo que os primeiros tomaram posse
em 1696, em Salvador, no Rio de Janeiro e em Olinda; a pouco e pouco, foram alcançando as
diversas câmaras, embora, evidentemente, devido às vastas distâncias e péssimas estradas, à
rede rarefeita de vilas e cidades (principalmente longe do litoral), e ao inevitável
desconhecimento das condições e redes de influência locais, sua atuação, na prática, sempre
sofresse algum tipo de entrave, ainda que de boicote passivo. De qualquer forma, passaram
os juízes de fora, como representantes do Rei, a presidir as câmaras municipais, deixando aos
funcionários locais, sob o ponto-de-vista da administração da justiça, apenas funções judiciais
menores (ações por injúrias verbais e pequenos furtos, além das causas de almotaceria, já
mencionadas).
Assim, em todos os lugares alcançados pela administração colonial, régia ou senhorial,
a justiça de primeira instância focava-se nas câmaras municipais das vilas e cidades, com seus
juízes-de-fora e seus funcionários locais, representantes dos poderosos e influentes do lugar.
Para além dessa esfera, nas donatarias a justiça de apelação concentrava-se na pessoa do
capitão donatário; o estabelecimento do governo-geral, porém, fez com que se criasse uma
instância judiciária de apelação paralela, na pessoa do Ouvidor-Mor, com autoridade tanto
sobre as capitanias reais quanto sobre as próprias donatarias e sua justiça senhorial. A área de
atuação desse Ouvidor (também chamado “Corregedor”) era denominada “comarca”, sendo
que a primeira comarca (com sede em Salvador) englobava todo o território do governo geral.
6
O progressivo desenvolvimento e a crescente complexidade da sociedade colonial levaram à
criação, ao longo do tempo, de mais comarcas, com seus ouvidores-corregedores. A
tendência seguida, ainda que sinuosamente, e com os inevitáveis altos e baixos, era a de
aproximar os territórios das comarcas do das capitanias, de modo que uma comarca não
englobasse áreas em várias capitanias, mas esse processo nunca se pôde completar na época
colonial – especificidades locais, regionais e mesmo pessoais freqüentemente passavam ao
primeiro plano.
A primeira comarca a ser desmembrada da jurisdição da Ouvidoria de Salvador foi a
do Rio de Janeiro (1608), por ocasião da segunda partição do governo-geral. Passava o
Ouvidor do Rio de Janeiro a ter jurisdição sobre todas as capitanias ao sul da do Rio de
Janeiro, inclusive; mas a autoridade suprema de Salvador no aspecto judiciário foi mantida
pela criação, logo a seguir (1609) de um tribunal superior de recursos, o Tribunal da Relação,
ou simplesmente a “Relação de Salvador”, por sua vez sob a égide da Casa da Suplicação de
Lisboa (que funcionava como última instância judicial). À Relação de Salvador estavam
subordinados os Ouvidores-Corregedores de Salvador e do Rio de Janeiro, e também o de
Pernambuco (Olinda), criado naquele ano. A constituição do Estado do Maranhão levou à
criação (1619) de mais uma ouvidoria e corregedoria, a de São Luís, que não estava, contudo,
subordinada à Relação da Bahia, mas diretamente ligada à Casa da Suplicação de Lisboa.
A Relação de Salvador (extinta em 1626, mas restaurada em 1652) assistiu à
progressiva criação, no Estado do Brasil, de novas ouvidorias-corregedorias, ou seja, de novas
comarcas: a da Paraíba (1687, para a Paraíba e o Rio Grande do Norte), a de São Cristóvão
(1696, para Sergipe d’el-Rey) e enfim a de São Paulo (1699, englobando todas as regiões ao
sul do Rio de Janeiro, exclusive, com limites aliás bastante indefinidos nessa área de
fronteiras ainda abertas). No Estado do Maranhão, criou-se em 1700 a comarca de Belém,
com jurisdição sobre o Grão-Pará (atuais Amazonas e Pará).
O processo de reorganização administrativa da primeira metade do séc. XVIII, quando
as regiões auríferas (Minas, Goiás, Mato Grosso) e as oriundas do contínuo avanço no sul
(Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul) foram enfim administrativamente enquadradas,
teve por conseqüência o progressivo desmembramento da comarca de São Paulo. Em 1714
criaram-se as quatro comarcas que constituiriam, em 1720, a nova Capitania das Minas
Gerais: Vila Rica (englobando Vila Rica do Ouro Preto e Mariana), Rio das Mortes (São João
d’el-Rey), Serro Frio (Serro) e Rio das Velhas (Sabará)17. Em 1722 foi criada a comarca de
Paranaguá (com jurisdição sobre todos os territórios ao sul do atual Paraná, inclusive; dela
separou-se em 1749 a comarca de Santa Catarina, com sede na vila do Desterro, atual
Florianópolis, e jurisdição sobre Santa Catarina e o Rio Grande de São Pedro18); em 1734 foi
criada a de Goiás, e em 1751 a de Vila Bela (Mato Grosso).
No Nordeste, criaram-se comarcas nas Alagoas (1711)19, em Oeiras, no Piauí (1722),
no Ceará (1723), em Jacobina, no interior da Bahia (1734), em Vitória (1741), em Porto
Seguro (1759) e em Ilhéus (1762). No Estado do Maranhão, criou-se, juntamente com a
respectiva capitania, a comarca de São José do Rio Negro (1758-1760). A partir do
estabelecimento da Família Real no Brasil, em 1808, inúmeras novas comarcas foram criadas,
mas o estudo dessa nova situação, quando a própria superestrutura estatal transmigrou-se para
o território do antigo vice-reino, já foge ao escopo do presente trabalho.
Para melhor coordenar as várias novas comarcas criadas no sul do Estado do Brasil foi
criado mais um Tribunal da Relação, o do Rio de Janeiro, com jurisdição do Espírito Santo e
das Minas Gerais, inclusive, para o sul. Com a extinção do Estado do Grão-Pará e Maranhão,
a Relação de Salvador passou a ter também jurisdição sobre as comarcas do antigo Estado
(englobando as capitanias do Piauí, Maranhão, Grão-Pará e São José do Rio Negro)20.
Nota-se assim, sob o ponto-de-vista da dispensação da justiça, que o Estado
colonizador atuou nos dois extremos do processo, procurando, por assim dizer, mantê-lo sob
7
controle num movimento de pinça: localmente a partir dos juízes-de-fora, centralmente a
partir dos Ouvidores-Corregedores e das Relações. Essa “justiça régia” era constituída de
pessoas em geral de bom nível e com formação na área do Direito, mas em sua atuação
efetiva comportava-se como um corpo estranho, padecendo de excessivo formalismo e
morosidade; sua visão de mundo, com efeito, era a do aparelho estatal em que transitavam,
faltando a seus membros, muitas vezes, a necessária percepção das condições e necessidades
efetivas dos administrados. Para a resolução dos problemas do dia-a-dia, quando não se
recorriam aos conselhos ou opiniões dos párocos, dos missionários ou de algum poderoso
local que tivesse influência econômica e moral, ou aos préstimos dos funcionários locais das
câmaras, os colonos, se quisessem decisões rápidas e compatíveis com o seu universo social,
tinham que resolver suas pendências por si mesmos. Constituía-se assim uma espécie de
justiça em duas vias paralelas, nem sempre opostas entre si, mas de qualquer modo
potencialmente geradora de conflitos, de complicações e de demoras e procrastinações, vias
essas que, ainda hoje, condicionam o imaginário do brasileiro médio diante do conceito de
“dispensação de justiça”.
Administração Colonial – Aspecto Econômico
O objetivo precípuo da administração portuguesa em sua colônia sul-americana era
arrecadar rendimentos para a Coroa, ou seja, para o Estado português; todas as suas ações
pautaram-se por esta meta. Vista sob olhos modernos, a política econômica da Coroa parece,
muitas vezes, desconexa e sem sentido, mas deve-se ter em mente que ela era pragmática
(voltada aos resultados), não ideológica (embora encobrisse seus objetivos, talvez mesmo
inconscientemente, sob uma grossa capa ideológica). Nesse caso, os fins justificavam os
meios. Por isso eram usados os expedientes os mais diversos – e, na área econômica, épocas
de grande intervenção estatal direta alternavam-se com períodos mais frouxos; procurava-se
utilizar, para se atingir a mesma finalidade, a liberdade de comércio, o monopólio estatal ou o
monopólio privado.
No geral, os produtos da colônia pagavam dois tipos de impostos: o dízimo (10%) à
Ordem de Cristo, e os direitos aduaneiros sobre o comércio marítimo (de exportação ou de
importação). O trato do açúcar, assim como o do algodão, o do tabaco e o dos gêneros de
primeira necessidade era livre. Monopólios estatais eram, especificamente, o sal, as drogas,
as especiarias e o pau-brasil; nesses casos, usualmente a exploração e exportação podiam ser
arrendadas a particulares, em troca do pagamento de uma soma anual pré-fixada21. Sobre os
metais preciosos cobrava-se um imposto de 20%, o “quinto”. Apenas com a restrição de ter
de ser efetuado via Portugal, livre era também o comércio, apenas com o pagamento das taxas
aduaneiras (as quais podiam ser bastante altas).
Tal esquema, contudo, podia ser modificado, quando a Coroa julgasse vantajoso. Foi
assim que se criou a Companhia Geral do Comércio do Brasil (1649), com subscrição inicial
de 1.250.000 cruzados (sendo a maior parte oriunda de ricos comerciantes cristãos-novos, os
quais, como encorajamento, passavam a estar sujeitos diretamente apenas à pessoa do Rei,
ficando livres inclusive das investigações da Inquisição). A ela era assegurado o monopólio
do pau-brasil e do fornecimento de farinha de trigo, bacalhau, vinho e azeite, com preços préestabelecidos, podendo exportar para Portugal, recebendo frete e seguro marítimo, açúcar,
fumo, couros, algodão e outras mercadorias. Não foi bem sucedida, porque os monopólios
lhe foram cassados em 1659, por pressão de interessados em recuperar o sistema de contratos,
tendo sido encampada pela Coroa em 1664 e extinta em 1720.
Criou-se também a Companhia de Comércio do Estado do Maranhão (1682), que
recebeu, por 20 anos, o monopólio de todo o comércio entre o Estado do Maranhão e o Reino.
8
A má qualidade dos produtos que introduziu levou a uma revolta em 1684, que teve por
conseqüência, no ano seguinte, a extinção do monopólio e, portanto, da Companhia22.
Uma similar flexibilidade foi observada também na legislação tributária das novas
minas de ouro e de diamantes. De 1700 a 1713, vigorou o regime usual do quinto, com a
expectativa de uma produção anual de 100 arrobas (1 arroba = 14,7456 kg) e, portanto, o
ingresso de 20 arrobas no Erário; mas, em 13 anos, arrecadaram-se apenas 14 arrobas, mais
11½ oriundas de apreensão de contrabando. Então, de 1714 a 1724 vigorou o regime dito
“das avenças”, no qual uma quantia anual firme, avençada de antemão (30 arrobas, depois 25,
por fim 37) era repartida entre as câmaras, que se encarregavam de cobrar dos mineradores.
Rendeu para a Coroa, no período, 312½ arrobas, o que encorajou a Coroa a tentar um novo
sistema, o do quinto com derrama (1725-1735): estipulava-se o pagamento firme de 100
arrobas anuais, de uma produção suposta de 500, sendo que, se não se atingisse tal meta, a
diferença era distribuída por derrama entre os moradores dos distritos; em 11 anos, rendeu
1.068 arrobas. Entre 1736 e 1751 instituiu-se a capitação (incidência de imposto per capita
sobre todos os habitantes, mineiros ou não, livres ou escravos, acima de 14 anos de idade); tal
sistema rendeu à Coroa 2.066 arrobas no período. A partir de 1751, voltou-se ao sistema do
quinto de 100 arrobas, que era distribuído per capita do modo do sistema anterior. O
progressivo esgotamento das minas começou a se fazer sentir: até 1764 ainda se conseguiam,
em média, as 100 arrobas, quantidade que baixou para cerca de 70 em 1777, 57 em 1785 e 30
em 1808. Na prática, as derramas não puderam ser efetuadas, e o imposto per capita teve de
ser paulatinamente abaixado.
Enfim, qual teria sido o impacto de todas essas medidas administrativas, ao longo de
gerações, na economia colonial e, mais especificamente, nas receitas do Reino? Quanto à
influência sobre os rendimentos auferidos pela Coroa, que servirá para ilustrar e confirmar a
eficácia (do ponto de vista especificamente metropolitano) das atuações administrativas
aparentemente erráticas encetadas pela metrópole, dar-se-á uma panorâmica em seis instantes
distintos, espaçados entre si de cinqüenta anos, ao longo de toda a história colonial: os anos de
1550, 1600, 1650, 1700, 1750 e 1800. Os números (obtidos a partir de Oliveira Marques e de
Simonsen, citados na Bibliografia) devem ser considerados, obviamente, aproximados, mas
baseiam-se nas fontes primárias coligidas pelos referidos autores, ou por eles citadas23.
Situação em 1550: as receitas da Coroa, à época, andavam à roda de 600.000
cruzados24. A nova colônia poderia contribuir diretamente, nesses rendimentos, com os
impostos sobre o pau-brasil e sobre o açúcar. As exportações de pau-brasil25 renderiam, nessa
época, 50.000 cruzados, sendo (pelo sistema de contratos então vigente) 4.000 pagos à Coroa.
As exportações anuais de açúcar montavam a cerca de 180.000 arrobas (1 arroba = 14,75 kg);
ao preço de 1.400 réis a arroba, averiguado para a época, valeriam 252 milhões de réis, ou 252
mil contos de réis, ou (com 400 réis perfazendo um cruzado) 630.000 cruzados. Assim, as
exportações do Brasil andariam à ordem de 680.000 cruzados, e os rendimentos diretos pagos
à Coroa (contrato do pau-brasil e dízimo do açúcar) iriam (4.000 + 63.000) a 67.000 cruzados
(11,1% dos rendimentos totais da Coroa na época). Nessa época, o apogeu do “fascínio
asiático”, os lucros com as especiarias da Ásia e com o ouro africano (escoado a partir do
forte de São Jorge da Mina, no golfo da Guiné) respondiam por cerca de 40% de todos os
rendimentos da Coroa; os direitos alfandegários representavam outros 15% a 20%, e quase
todos referiam-se ao rico comércio asiático26.
Situação em 1600: as receitas da Coroa andavam à roda de 3.300.000 cruzados. As
exportações de pau-brasil (10.000 quintais anuais) renderiam 100.000 cruzados, com o
pagamento de 52.500 cruzados à Coroa. Quanto ao açúcar, a situação já se modificara
bastante, com a maturação da grande propriedade monocultora e voltada ao mercado externo
(plantation): a exportação atingiria o volume aproximado de 1.200.000 arrobas, ao preço
verificado de 2.000 réis a arroba. Assim, as exportações do Brasil andariam à ordem de
9
6.100.000 cruzados (100.000 do pau-brasil e 6.000.000 do açúcar), e os rendimentos diretos
auferidos pela Coroa (pau-brasil e dízimo do açúcar) estariam (52.500 + 600.000) em 652.500
cruzados (19,8% dos rendimentos totais). A proporção poderia ser ainda um pouco maior, já
que não estão computados nesse total os direitos alfandegários, que, à época, andavam por
volta de 14% dos rendimentos totais (embora a maior parte pudesse ainda se referir ao
comércio asiático)27.
Situação em 1650: as receitas da Coroa à época alcançariam o montante aproximado
de 3.000.000 cruzados. Os 10.000 quintais de pau-brasil valeriam ainda 100.000 cruzados,
com o pagamento de 60.000 à Coroa; o açúcar alcançava o volume exportado de 2.100.000
arrobas, a 2.000 réis a arroba, com o valor exportado de 10.500.000 cruzados (2.100.000
arrobas x 2.000 réis por arroba / 400 réis por cruzado). As exportações totais estariam à
ordem de 10.600.000 cruzados (com os 100.000 do pau-brasil), e o rendimento respectivo
para a Coroa (dízimo do açúcar e contrato do pau-brasil) era da ordem de 1.110.000 cruzados
(37,0% dos rendimentos totais); tal proporção era seguramente maior, se fossem incluídos os
direitos alfandegários, que deviam andar à ordem de 20% do rendimento total da Coroa28.
Situação em 1700: as receitas da Coroa andariam à volta dos 5.000.000 cruzados. O
pau-brasil renderia uns 120.000 cruzados na exportação, com aproximadamente 60.000 pagos
à Coroa; a produção de açúcar (agora já enfrentando a concorrência do Caribe) atingiria o
volume de 1.600.000 arrobas, a um preço de 2.000 réis a arroba (valor total de 8.000.000
cruzados); novos produtos, no entanto, agregavam-se à pauta das exportações: o tabaco, cujo
valor exportado (posto em Lisboa) situava-se à volta de 750.000 cruzados29 e, principalmente,
o ouro, cuja produção estaria à ordem de 2.300 kg (ou cerca de 2.460.000 cruzados)30; assim,
as exportações brasileiras seriam de 11.210.000 cruzados. Os rendimentos diretos da Coroa
eram: dízimo do açúcar, 800.000 cruzados; mais duas arrobas de ouro, ou 32.000 cruzados;
mais 2.300.000 cruzados das taxas e contratos de arrendamento sobre o tabaco, num total de
seriam de 3.132.000 cruzados (62,6% dos rendimentos totais). Tal proporção era
seguramente maior se fossem incluídos os direitos alfandegários da reexportação do açúcar e
do ouro. O Brasil agora respondia, direta ou indiretamente, pela maior parte dos rendimentos
da Coroa portuguesa, com o tabaco exibindo uma importância inusitada.
Situação em 1750: as receitas da Coroa montariam a cerca de 15.000.000 cruzados.
A produção de açúcar oscilava em torno de 1.600.000 arrobas, a 2.400 réis a arroba
(9.600.000 cruzados); as exportações de tabaco valeriam 900.000 cruzados; a produção de
ouro estaria à ordem de 14.600 kg (c. 16.200.000 cruzados)31. Assim, as exportações
brasileiras alcançariam uns 26.700.000 cruzados, e os rendimentos diretos da Coroa auferidos
do Brasil (dízimo do açúcar, 960.000 cruzados; taxa de capitação sobre o ouro, 130 arrobas,
ou c. 2.130.000 cruzados; mais 2.300.000 cruzados das taxas e contratos de arrendamento
sobre o tabaco) seriam de 5.390.000 cruzados (35,9% dos rendimentos totais). O valor
mostra-se bem menor do que o pico de 1700, tendo em vista a estagnação do açúcar e o
crescimento da própria economia metropolitana, a partir do fluxo do ouro brasileiro, mas a
proporção é bem maior se se incluírem os direitos alfandegários, que, à época, estariam em
torno de 40% do total dos rendimentos, boa parte referente a produtos brasileiros.
Situação em 1800: as receitas da Coroa andariam à volta de 28.000.000 de cruzados.
A produção de açúcar era de cerca de 1.500.000 arrobas, a 1.600 réis a arroba (total de
6.000.000 cruzados – note-se o declínio absoluto da lavoura açucareira nas pautas de
exportação); as exportações de tabaco valeriam 900.000 cruzados; a produção de ouro, já
decadente, estaria à ordem de 4.850 kg32 (c. 5.390.000 cruzados). Despontava, contudo, a
exportação de algodão33, no valor da ordem de 5.500.000 cruzados. Então, as exportações
brasileiras seriam de 17.790.000 cruzados, e os rendimentos diretos da Coroa (dízimo do
açúcar, 600.000 cruzados; quinto do ouro, c. 40 arrobas, ou aproximadamente 655.000
cruzados; mais 2.300.000 cruzados referentes às taxas e contratos de arrendamento sobre o
10
tabaco, mais 550.000 cruzados de dízimo sobre o algodão) seriam de 4.105.000 cruzados
(14,7% dos rendimentos totais), mas essa proporção era bem maior se se incluírem os direitos
alfandegários, que, à época, estariam em torno de 40% do total, boa parte referente a produtos
brasileiros.
Administração Colonial – Conclusão
A extrema flexibilidade demonstrada pela administração colonial portuguesa,
mesclando práticas de diversas orientações nos aspectos político-administrativo (ora exibindo
maior centralismo, ora delegando funções administrativas a senhorios, a magnatas e mesmo a
câmaras municipais), eclesiástico (utilizando-se ao máximo das potencialidades e das
influências tanto do clero secular quanto regular, dentro do regime do Padroado), judiciais
(combinando uma justiça centralizada voltada exclusivamente para os interesses da Coroa
com as atribuições judiciais assumidas pelas câmaras municipais e mais ligadas aos interesses
locais) e econômicas (atuando de variadas maneiras, ora com o comércio livre, ora com
monopólios estatais diretamente explorados, ora com companhias privilegiadas, e sempre com
o pagamento de altos direitos aduaneiros sobre o comércio marítimo, o qual somente poderia
dar-se via Metrópole) garantiu-lhe sucesso em seu verdadeiro e principal objetivo, qual seja,
transformar suas possessões sul-americanas numa rentável fonte de recursos, o que
efetivamente ocorreu: o Brasil era o responsável (quando se analisam os impostos diretos e os
direitos aduaneiros), desde os meados do séc. XVII, por metade, ou mais, dos rendimentos da
Coroa.
Tal sucesso não se resume, contudo, nos rendimentos auferidos pelos produtos ligados
mais diretamente ao grande comércio de exportação (açúcar, algodão, tabaco) e ao ouro; a
economia colonial passou a exibir uma variedade e uma complexidade cada vez maior ao
longo do séc. XVIII: o comércio interno passou a se intensificar, e os produtos brasileiros
passaram a abastecer muitas das necessidades portuguesas (assim, p.ex., por volta de 1781
todo o arroz consumido em Portugal originava-se do Brasil; e, além do uso extenso na
colônia, tanto no Nordeste quanto no Sul, exportavam-se para Portugal grandes quantidades
de couros e peles). Por outro lado, cada vez mais, menos podia a metrópole oferecer
efetivamente, em termos de sua própria produção, em troca34, e isso apesar do fato de (como
também a importação tinha que se dar via Portugal) de a América Portuguesa mostrar-se
como um autêntico mercado cativo para os produtos da metrópole. O fracasso de Portugal no
sentido de desenvolver uma manufatura dinâmica e intensiva levou-o, cada vez mais, a um
papel de mero intermediário, vivendo dos impostos diretos, das taxas alfandegárias e das
rendas auferidas pelos contratos de monopólio. Isso explica, em grande parte, a relativa
suavidade do processo de independência da colônia, a partir do instante em que, por
circunstâncias fortuitas da política européia, toda a estrutura administrativa do “intermediário”
teve que se transplantar fisicamente para o Novo Mundo (1808).
Bibliografia
ABREU, Capistrano de, Capítulos de História Colonial, Fundação Biblioteca
Nacional-Departamento Nacional do Livro, s/d.
ANGELO-MENEZES, Maria de Nazaré, Histoire des Systèmes Agraires dans la
vallée du Tocantins, Etat du Pará, Brésil: colonisation européenne dans la deuxième moitié du
XVIIIè siècle et la première moitié du XIXè siècle, These présentée em vue de l’obtention du
doctorat de 3º cycle de l’Ecole des Hautes Etudes em Sciences Sociales – EHESS, Paris,
1998.
11
ANTONIL, André João (pseudônimo do jesuíta italiano João Antônio Andreoni),
Cultura e Opulência do Brasil por suas Drogas e Minas, com Várias Notícias Curiosas do
Modo de Fazer o Açúcar, Plantar e Beneficiar o Tabaco, Tirar Ouro das Minas, e Descobrir as
da Prata; e dos Grandes Emolumentos que esta Conquista da América Meridional dá ao Reino
de Portugal com estes e outros Gêneros e Contratos Reais, impresso originariamente em
Lisboa em 1711, edição comentada por Afonso d’Escragnolle Taunay, São Paulo, 1922, texto
proveniente da Biblioteca Virtual do Estudante de Língua Portuguesa,
http://www.bibvirt.futuro.usp.br.
AVELLAR, Hélio de Alcântara, História Administrativa e Econômica do Brasil,
MEC-Fename, Rio de Janeiro, 1970.
OLIVEIRA MARQUES, A. H. de, História de Portugal, vol I, Palas Editora, Lisboa,
1975.
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Periferias no Mundo Luso-Brasileiro, 1500-1808, in Revista Brasileira de História, vol. 18, nº
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SIMONSEN, Roberto C., História Econômica do Brasil, 1500-1820, Companhia
Editora Nacional, São Paulo, 1969.
NOTAS
1
Deve-se excetuar o caso isolado da capitania da ilha de São João, doada a 24 de janeiro de 1504 a Fernão de
Noronha (e confirmada pelo Rei d. João III em 3 de março de 1522), com a qual, contudo, não foi instituído um
sistema. A capitania de São Vicente (atribuída a Martim Afonso de Sousa) abrangia dois lotes distintos,
separados pela de Santo Amaro, o que explica a discrepância entre o número de lotes e o de capitanias. Por outro
lado, o donatário Pêro Lopes de Sousa, irmão de Martim Afonso, recebeu três capitanias (Itamaracá, Santo
Amaro e Santana), o que esclarece serem doze os donatários e quatorze as donatarias.
2
Eram privilégios mantidos pela Coroa: a cunhagem das moedas; os monopólios das drogas, especiarias e paubrasil; a arrecadação do quinto (20%) dos minerais preciosos e do dízimo (10%) dos demais produtos.
3
Pernambuco e a parte norte do segundo quinhão de São Vicente prosperaram; Itamaracá, Bahia, Porto Seguro,
Ilhéus e Espírito Santo, embora povoadas, não demonstraram o mesmo sucesso; nas extremidades norte (as duas
capitanias do Maranhão, a do Rio Grande do Norte e a do Ceará) e sul (as de Santo Amaro e de Santana), a
ocupação foi desprezível ou nula, o que ocorreu também em São Tomé (atual região de Campos, no norte
fluminense) e no primeiro quinhão (mais ao norte) de São Vicente (a posterior Capitania Real do Rio de Janeiro).
4
O donatário, Belquior de Carvalho, fidalgo da Casa Real, jamais tomou posse. Assim abandonada, acabou por
ser ocupada em 1781 pelos ingleses, que também abandonaram a ilha em 1783, seguindo-se no mesmo ano
ocupação portuguesa efêmera até 1795; abandonada novamente por cem anos, os mesmos ingleses a ocuparam
em 1895, devolvendo-a contudo ao Brasil, por meios diplomáticos, em 1896.
5
O regime de ventos imperantes na costa, do Ceará para o norte, tornava mais fáceis as comunicações dessa
região com a Europa do que com a Bahia; tal foi a motivação imediata mais importante para a criação do
referido Estado.
6
Fato momentoso nesse processo foi a grande expedição do capitão Pedro Teixeira, de 1637 a 1639, mandado
por ordem do Governador Jácome Raimundo de Noronha, que, partindo de Cametá, no Pará, atingiu Quito, no
Equador, subindo o rio Amazonas e permitindo fixar no rio Napo o limite ocidental do Estado do Maranhão.
7
As questões referentes à definição dos limites com as possessões espanholas nem sempre foram fáceis,
principalmente na região sul. O objetivo de Portugal foi sempre, lá, levar a fronteira ao rio da Prata (o que afinal
não conseguiu), para tal tendo fundado a Nova Colônia do Santíssimo Sacramento (1680), no atual Uruguai,
diante de Buenos Aires. Tomada pelos espanhóis em 1681, foi devolvida em 1683; retomada em 1705, foi
devolvida a Portugal em 1715, e enfim dada à Espanha em troca dos Sete Povos das Missões em 1750. Além
dos tratados de Utrecht (1713-15), os de Madri (1750) e de Santo Ildefonso (1777) regularam as fronteiras entre
as duas potências coloniais, reconhecendo a posse portuguesa na Amazônia, no Centro-Oeste e no Sul, muito
12
mais a ocidente do que o estipulado pelo antigo meridiano de Tordesilhas, num delineamento bastante próximo
da atual fronteira brasileira.
8
Tanto Pernambuco quanto Itamaracá passaram à Coroa (1652 e 1654) após a expulsão dos holandeses, tendo
sido as famílias dos donatários indenizadas após morosos processos; Itamaracá (cuja porção norte, praticamente
abandonada, já havia sido incorporada à Paraíba, em 1585) foi incorporada à capitania de Pernambuco. A
capitania da ilha de São João (Fernando de Noronha) reverteu à Coroa em 1700, sendo incorporada também à
capitania de Pernambuco.
9
O território do Rio Grande de São Pedro (atual Rio Grande do Sul), como apêndice da capitania de Santa
Catarina, foi governado por comandantes militares entre 1737 e 1761 (ano da efetiva instalação da nova
capitania, que ficou formalmente subordinada à do Rio de Janeiro até 1796).
10
A restaurada capitania incluía os territórios dos atuais estados de São Paulo e Paraná. O Paraná (comarca de
Curitiba) somente tornar-se-ia independente de São Paulo, como província do Império, em 1853.
11
Pesou nisso o fato de se tratarem de regiões onde se entrechocavam as esferas de influência espanhola e
portuguesa, o que encorajava uma supervisão mais atenta por parte do governo central, localizado no Rio de
Janeiro desde 1763. O vice-rei do Brasil passou, então, além de suas atribuições normais, a acumular as de
capitão-geral da Capitania Real do Rio de Janeiro e a administração civil indireta, e militar direta, das duas
capitanias do extremo sul (Santa Catarina e Rio Grande de São Pedro).
12
Somente em 1832 a região, denominada São Salvador dos Campos dos Goitacases, seria integrada à então
província do Rio de Janeiro, criando-se no ano seguinte a respectiva comarca judicial.
13
Tal aspecto era bem mais acentuado nas monarquias ibéricas, onde vigorava o regime do “padroado”, ou seja,
o Estado (o “gládio temporal” da medieval Teoria dos Dois Gládios), em troca de ser o “protetor” da Igreja (o
“gládio espiritual”) nos assuntos seculares, fazendo cumprir coercitivamente sua doutrina e as disposições do
Direito Canônico e providenciando os pagamentos (“côngruas”) do clero secular, interferia na administração dos
assuntos eclesiásticos (inclusive nomeações para os cargos, especialmente os bispados) e no recolhimento dos
impostos (“dízimos”) devidos à Igreja e às suas várias ordens monásticas. O Brasil, tendo sido descoberto por
uma expedição financiada pela Ordem de Cristo (sucessora em Portugal dos Templários, e cujo Grão-Mestre era
o próprio rei), estava sujeito ao pagamento do dízimo (10%) à referida Ordem, incidente sobre uma série de
produtos. Na prática, o dízimo à Ordem de Cristo fazia parte do orçamento real.
14
Tanto de fato (dadas as grandes distâncias e a crônica escassez de pessoal no clero secular e na administração
civil) quanto, mesmo, de direito: desde 1655 a Coroa concedeu poder secular ao clero regular em suas missões;
os frades gozaram, assim, de considerável autonomia para estender seus esforços de conversão, embora o
empreendimento fosse também de cunho econômico – as missões eram unidades produtoras organizadas e
coerentes, não só auto-suficientes como geradoras de valioso excedente econômico: no sul, a partir da criação e
do cultivo, gado, couros, tabaco e erva-mate; na região amazônica, a partir do extrativismo cuidadoso e
selecionado, “drogas do sertão” (canela, cacau, baunilha, guaraná, anil, urucum, certos tipos de pimenta), ervas
medicinais e algumas madeiras. Tal excedente era comercializado pelos missionários.
15
Entre 1687 e 1714, uma série de cartas régias dividiram a área entre as várias ordens: Amapá e Marajó aos
Franciscanos de Santo Antônio; os afluentes do norte do Amazonas aos Franciscanos da Piedade; as bacias do
Tocantins, Xingu, Tapajós e Madeira aos Jesuítas; as bacias do Negro, Branco e Solimões aos Carmelitas; o
médio Amazonas aos Mercedários; enfim, a baixa Amazônia a partir de Gurupá aos Capuchinhos.
16
Tanto cidades quanto vilas eram aglomerados urbanos dotados de câmaras; as cidades, contudo, possuíam um
status legal maior, por exibirem maior importância em termos de população, atividade econômica, etc., ao menos
em teoria – porque vários núcleos foram fundados, desde o início, como “cidades”, sem passarem pela fase de
vila, e houve cidades que o eram quase que só honorificamente, tendo em vista, p.ex., a sua dignidade episcopal
(assim, nas Minas Gerais, Mariana era a única cidade, ao passo que Vila Rica, a capital da capitania, e muito
mais importante em termos econômicos, era uma simples vila). Em 1775, havia no vice-reinado do Brasil 126
vilas e 10 cidades; estas últimas eram: Salvador (fundada como cidade em 1549), Rio de Janeiro (idem, 1565),
Filipéia de Nossa Senhora das Neves ou Paraíba (idem, 1584), São Cristóvão (vila fundada em 1590,
praticamente no local da atual Aracaju, realocada em 1595-96 para um sítio mais defensável, enfim movida
definitivamente para uma elevação às margens do rio Paramopama em 1607, tornando-se então a quarta cidade
do Brasil colonial), Cabo Frio (fundada como cidade em 1615, após o desbaratamento de mais uma tentativa de
estabelecimento dos franceses), Belém (povoado em 1616, vila em c. 1625, cidade em 1655), Olinda (povoado
em 1535, vila em 1537, cidade em 1675), São Luís (povoação fundada pelos franceses em 1612, vila em 1621,
cidade em 1677, por ocasião de sua elevação à dignidade de sé episcopal), São Paulo (vila em 1554, cidade em
1711) e enfim Mariana (vila em 1711, cidade em 1745, por ocasião de sua elevação à dignidade de sé episcopal).
17
Desde 1730, foram incluídas na comarca de Serro Frio, e na capitania das Minas Gerais, a região de Minas
Novas e as variantes do Jequitinhonha, anteriormente pertencentes à Bahia. A região então conhecida como
“Sertão da Farinha Podre”, o atual Triângulo Mineiro, pertencia ainda a Goiás. Em 1815 foi desmembrada, da
13
comarca do Rio das Velhas, a nova comarca de Paracatu, que no ano seguinte passou a incorporar o Triângulo
Mineiro e o alto Parnaíba, incluídos enfim nas Minas Gerais, que adquiriram então as suas atuais fronteiras.
18
Entre 1777 e 1778, devido à ocupação (temporária) da ilha de Santa Catarina pelos espanhóis, a sede da
comarca de Santa Catarina foi transferida para Porto Alegre. Em 1812, a sede da comarca foi transferida
definitivamente para Porto Alegre, até que em 1821 recriou-se a comarca de Santa Catarina, coincidente com a
respectiva província.
19
A comarca das Alagoas foi retirada da jurisdição da comarca de Pernambuco, embora continuasse a fazer parte
da respectiva capitania. Da comarca de Pernambuco (Olinda) foi separada a do Sertão do São Francisco (1810) e
enfim a do Recife (1815); a capitania (depois província) passava a se constituir, assim, por quatro comarcas
(Olinda, Recife, Alagoas e Sertão do São Francisco). A província de Pernambuco teve suas fronteiras
diminuídas por causa de suas revoltas contra o poder central, inicialmente o metropolitano, instalado no Rio de
Janeiro desde 1808, e, depois de 1822, o imperial: a comarca das Alagoas foi-lhe separada, transformando-se em
província própria, em 1817, e a comarca do Sertão do São Francisco, por sua vez, foi-lhe subtraída em 1824 e
incorporada inicialmente às Minas Gerais, e depois (1827) à Bahia (que, a partir de então, passou a exibir as
fronteiras que ainda hoje ostenta).
20
Em 1809 foi criada uma terceira Relação, a de São Luís, com jurisdição sobre São José do Rio Negro, GrãoPará, Maranhão, Piauí e Ceará. Em 1821 criou-se mais uma Relação, no Recife, compreendendo as províncias
do Ceará (até então sob a jurisdição de São Luís), Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco (exceto a
comarca do Sertão do São Francisco, que permaneceu sob a jurisdição de Salvador). Nessa época, contudo,
como conseqüência do transplante de toda a estrutura da Coroa Portuguesa para o Brasil, a Relação do Rio de
Janeiro havia sido alçada a tribunal de último recurso, como uma nova Casa da Suplicação.
21
Por exemplo, no que tange ao pau-brasil, houve contratos até 1612; depois, operação direta (1612-1625 e
1640-45) e contratos (1625-1640 e 1645-1649), até o monopólio ser concedido (1649-1659) à Companhia para o
Comércio do Brasil, voltando-se a depois, via de regra, aos contratos.
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Sob o marquês de Pombal, tentou-se de novo o estabelecimento de companhias privilegiadas: a Companhia
Geral de Comércio do Grão-Pará e Maranhão, que durou de 1755 a 1778 e que efetivamente ajudou no
desenvolvimento do cultivo e comércio do algodão e do arroz na região do Pará, e a Companhia Geral de
Comércio de Pernambuco e Paraíba, que durou de 1759 a 1779 e, ao ser extinta, devia ao Erário duzentos contos
de réis.
23
Os dados referentes aos rendimentos (e despesas) da Coroa foram retirados, em geral, de Oliveira Marques; os
dados referentes à produção de pau-brasil, açúcar e algodão, de Simonsen. Para o tabaco, foram utilizados dados
de Simonsen e a própria análise de Antonil. Enfim, no que concerne ao ouro, foram utilizados dados presentes
em Oliveira Marques e em Simonsen.
24
O cruzado, no caso, era uma moeda de conta que valia 400 reais, ou “réis”. A conversão para um equivalenteouro pode ser feita a partir do preço oficial do marco de ouro (230,40 g) amoedado: em 1550 valia 25.000 réis,
em 1600 30.000 réis, em 1650 56.250 réis, em 1700 98.700 réis, em 1750 e 1800 102.400 réis. Não se tentará
qualquer tipo de equivalência para moedas modernas (como a libra esterlina, como fez Simonsen, ou o dólar
norte-americano, como fazem outros) a partir dessa equivalência-ouro, já que, para tanto dever-se-ia levar em
consideração o efetivo poder de compra do ouro, algo, no mínimo, extremamente problemático (dadas as
enormes lacunas existentes nos dados para que se possam estabelecer níveis de preços). Contudo, para os fins
deste trabalho – uma comparação sobre a importância relativa do Brasil nos rendimentos da Coroa – não há a
necessidade de se tentar tal equivalência.
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Ao longo da primeira metade do séc. XVI, é razoável supor-se a exportação média anual de 5.000 quintais
(valendo um quintal 58,982 kg) de pau-brasil, que era vendida em Lisboa a um preço médio de quatro mil réis o
quintal. Desse modo, o valor das exportações andava à roda de vinte contos de réis, ou 50.000 cruzados.
Anualmente, pagava-se à Coroa, pelo contrato do pau-brasil, 4.000 cruzados. Posteriormente, ao longo do séc.
XVII, a quota de extração aumentou para 10.000 quintais anuais, correspondendo, ao preço de 4 mil réis o
quintal, a um valor exportado de 100.000 cruzados (valores considerados para 1600 e 1650). Antonil, por outro
lado, informa, para o início do séc. XVIII, que o valor da exportação de pau-brasil ia a 48 contos de réis
(120.000 cruzados). Sabe-se que em 1602 o monopólio real estava arrendado a 21 contos de réis anuais, e, pelos
meados do século, a 24 contos (52.500 cruzados e 60.000 cruzados, respectivamente, valores utilizados para os
rendimentos respectivos da Coroa em 1600 e 1650). Para 1700, utilizou-se, como rendimento, a mesma
proporção de 1650 (60.000 cruzados); a partir daí, tendo em vista o esgotamento da madeira, explorada quase à
extinção, desconsiderou-se o pau-brasil na pauta de exportações.
26
O peso do Oriente (Índia, Indochina, Indonésia) e do seu comércio, eixo das grandes navegações portuguesas,
mostra-se assim esmagador diante da nova colônia sul-americana (55% a 60% dos rendimentos totais da Coroa,
face a c.10% do Brasil). Contudo, se grandes eram os rendimentos auferidos do Império asiático, também
enormes eram as despesas correspondentes: entre 1522 e 1543, p.ex., 800.000 cruzados foram gastos como
reforços às armadas regulares enviadas à Índia; e entre 1522 e 1551 foram perdidos, em média, 100.000 cruzados
14
anuais em naufrágios ou em ataques de piratas aos navios durante a viagem entre Lisboa e a Índia, ou entre
Lisboa e a Flandres. A única grande despesa registrada para o Brasil no período refere-se aos 160.000 cruzados
gastos, ao longo do segundo quartel do séc. XVI, com as expedições de patrulhamento, mas elas também
serviam à Guiné, e não apenas à colônia americana; e as despesas ordinárias anuais com o Brasil (salários de
funcionários, equipagem de navios, construção e manutenção de fortalezas, etc.) não ultrapassavam os 20.000
cruzados (e nem os 40.000 nos inícios do séc. XVII).
27
Na época, o Império português na Índia e no Extremo Oriente (ou seja, o anel de fortalezas e feitorias que se
estendiam da costa oriental da África até à Índia, ao Ceilão, à Indonésia e a Macau, na China) ainda encontravase, apesar dos grandes gastos, numa situação econômica (do ponto de vista da geração de receitas para a Coroa)
relativamente saudável; era a calmaria antes da tempestade, pois, logo a seguir, os gastos com a defesa das
possessões asiáticas em face dos ataques holandeses, e o posterior colapso do próprio Império, com a perda da
maior parte das feitorias e o conseqüente desfazimento das redes comerciais, alteraria totalmente a situação.
28
Por essa época, a presença de produtos brasileiros nas receitas aduaneiras já devia estar longe de
insignificante, dado o desabamento do Império asiático, obra dos ingleses e dos holandeses, principalmente
destes últimos. Os primeiros navios holandeses atingiram o Oriente, via Cabo da Boa Esperança, em 1597; em
1601 fundava-se a Companhia das Índias Orientais, e os ataques aos navios portugueses iniciaram-se em 1603.
Seguiu-se uma série de enfrentamentos até que uma trégua de doze anos foi assinada pelo governo de Madri
(1609); uma de suas cláusulas previa o franqueamento dos portos do Império Português aos navios holandeses –
o que, na prática, arruinou o monopólio luso e preparou os holandeses para futuras incursões. Como quer que
fosse, tal trégua forneceu uma pausa, mas os ataques recomeçaram a partir de 1621, quando ela expirou e não
houve interesse em renová-la por nenhuma das duas partes. Enquanto o governo espanhol lutava na Europa,
atacando a Holanda a partir das suas possessões belgas, os holandeses metodicamente iniciaram, por mar, os
ataques às posições portuguesas: Ormuz caiu em 1622, Salvador, sede do governo-geral do Brasil, foi tomada em
1624 (embora fosse recuperada no ano seguinte), e vários baluartes no Ceilão tombaram em 1630, assim como
Mombaça (recuperada porém em 1634). Nesse mesmo ano Recife e Olinda foram atacados, iniciando-se o
período de ocupação das regiões açucareiras nordestinas pela Holanda (1630-1654). Em 1637 os holandeses
conquistaram São Jorge da Mina, o grande empório de escoamento de ouro e escravos, no golfo da Guiné; em
1638, Arguim caiu. Um tratado de paz foi assinado com a Inglaterra em 1635, o que reduziu o inimigo a um só.
Logo após a Restauração da independência portuguesa (1640), aproveitando-se da fragilidade do novo governo,
um grande ataque foi lançado contra a importante feitoria e fortaleza de Malaca, que sucumbiu (1641),
virtualmente desorganizando todo o comércio com a Indonésia; por volta de 1650, com auxílio dos ingleses,
Portugal havia sido expulso de todas as suas posições na Arábia e no Golfo Pérsico. Um armistício foi assinado
com a Holanda, para um período de dez anos (1641-1651), findo o qual a luta recomeçou; no Brasil, as armas
portuguesas (com valioso auxílio local) conseguiram expulsar os holandeses, mas isso selou de vez o destino do
Império asiático: um grande número de feitorias na Índia caiu em 1653, Colombo, no Ceilão, rendeu-se em 1656,
o restante das feitorias da ilha sucumbiu em 1659, Cranganor e Cochim, na Índia, cederam em 1662; os ingleses
foram neutralizados com mais um tratado de aliança, mas Bombaim foi-lhes cedida em 1665, como parte do dote
da infanta Maria, que esposava o rei Carlos. Por volta de 1665, do outrora orgulhoso Império asiático restavam
na Índia Goa, Damão e Diu, mais Baçaim e algumas insignificantes fortalezas ao norte (que vegetariam até
serem ocupadas pelos maratas em 1739), Macau na China e metade da ilha de Timor, na Indonésia.
29
Quanto à produção, Antonil informa que da Bahia saíam anualmente 25.000 rolos ou mais, e de Pernambuco
2.500 rolos. Cada rolo pesava 8 arrobas, e seu preço, posto em Lisboa, era de 12$124 réis para cada rolo de
fumo da Bahia e 16$620 para os de Pernambuco. Pode-se considerar, assim, para 1700, com folga, uma
produção de 25.000 rolos de 8 arrobas, valendo (25.000 x 12$124) 303,1 contos de réis, ou, em números
redondos, 750.000 cruzados. Há dados precisos no Arquivo da Marinha e Ultramar, de Lisboa, citados por
Simonsen, que informam ter sido a exportação de tabaco em 1757 de 248.702 arrobas (c.31.000 rolos); o
relatório do administrador da Alfândega de Salvador informa, para 1797, a quantidade exportada de cerca de
30.000 rolos. Desse modo, considerou-se o valor de 30.000 rolos como o volume exportado em 1750 e em 1800,
ao preço de 12 mil réis a arroba, relativamente estável (apesar de algumas oscilações), ou seja, um montante
exportado de 900.000 cruzados. Isso quanto à exportação. Quanto aos rendimentos da Coroa, tirava el-Rei em
dízimos e outras taxas cerca de dois mil réis por cada rolo posto em Lisboa (assim, 125.000 cruzados em 1700 e
150.000 cruzados em 1750 e 1800), mas, mais importante, também o arrendamento sobre o fumo já
desembarcado, agora processado e posto à venda. O preço da libra (460,80 g, correspondendo a dois marcos) de
fumo picado variava de 20 a 24 tostões em Lisboa (pelo baixo, então, a arroba, equivalente a 32 libras, valeria 64
mil réis). O contrato de arrendamento rendia à Coroa 2.200.000 cruzados na época de Antonil, 1.400.000
cruzados em 1716, 1.800.000 cruzados em 1722, 2.200.000 cruzados entre 1753 e 1781 e 2.160.000 cruzados em
1807. Dessarte, os valores considerados para os rendimentos foram de 2.300.000 cruzados para todo o período
(125.000+2.200.000=2.325.000 cruzados em 1700, 150.000+2.200.000=2.350.000 cruzados em 1750 e
150.000+2.160.000=2.310.000 cruzados em 1800). Não é exagero dizer que o tabaco era um produto muito
15
mais rentável para a Coroa, proporcionalmente, do que o próprio ouro, um vício sobre o qual se podia aplicar
uma implacável taxação; aliás, a situação ainda é basicamente a mesma nos dias atuais...
30
Conforme citado por Simonsen, Calógeras avalia a produção de ouro brasileiro em 65.500 arrobas entre 1700
e 1801, ou 966 toneladas (47.500 arrobas tendo vindo das Minas Gerais, 13.000 do Mato Grosso e 5.000 de
outros lugares). Soetbeer, por sua vez, citado pelo mesmo autor, avalia a produção, entre 1691 e 1850, em 980,1
toneladas. Para o período 1691-1720 (30 anos), estima esse mesmo Soetbeer a produção de 70.000 kg, ou, em
média, algo como 2.300 kg/ano. Como o marco de ouro (230,40 g) amoedado valia 98.700 réis em 1700, 2.300
kg, correspondendo a 9.983 marcos, valeriam 2.463.216 cruzados, ou, em números redondos, os 2.460.000
cruzados considerados. Por outro lado, conforme visto, entre 1700 e 1713, um total de 25½ arrobas foram
arrecadadas, ou 1,96 arrobas/ano – utilizando-se o valor de 2 arrobas/ano para os rendimentos da Coroa.
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Soetbeer (ver nota anterior) avalia a produção de ouro, nos vinte anos compreendidos entre 1741 e 1760, em
292.000 kg, ou 14.600 kg/ano, na média. Com o marco ouro amoedado (230,40 g) valendo 102.400 réis em
1750, e 400 réis perfazendo um cruzado, 14.600 kg de ouro equivaliam a 16.222.000 cruzados, ou, em números
redondos, os 16.200.000 considerados. Por outro lado, conforme visto, entre 1736 e 1751, sob o regime da
capitação, a Coroa recebeu 2.066 arrobas, ou 2.066 / 15 = 137 arrobas anuais; em números redondos, foram
consideradas 130 arrobas.
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Soetbeer avalia a produção de ouro, nos trinta anos compreendidos entre 1781 e 1810, em 146.500 kg, ou
4.883 kg/ano, em média – ou 4.850 kg, em números redondos. Com o marco de ouro amoedado ainda valendo
102.400 réis, esses 4.850 kg anuais equivaleriam a 5.388.900 cruzados, ou, em números redondos, aos 5.390.000
cruzados adotados. Por outro lado, conforme visto, a extração do quinto, na época, não poderia render mais do
que 40 arrobas anuais, em média (havia rendido 57 em 1785, e renderia 30 em 1808).
33
O crescimento da cultura algodoeira ocorreu no último quartel do séc. XVIII, especialmente no Maranhão, em
Pernambuco e no Pará. Contudo, a partir dos começos do séc. XIX, a concorrência do algodão do sul dos EUA
se fez sentir. Em 1800, a Inglaterra importou cerca de 30.000 sacas de algodão do Brasil, e 40.000 dos EUA; em
1804, os números eram 46.000 e 102.000, respectivamente; em 1807, 19.000 e 171.000. Em 1800 o algodão
representava 12% da exportação total norte-americana; em 1820, 35%; em 1830, 52%; em 1850, 60%.
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Os grandes produtos de exportação de Portugal (azeite, vinhos, pescados, principalmente os bacalhaus da
Terra Nova) possuíam substitutos fáceis na América: a banha de porco e o azeite de dendê; toda uma variada
aquarela de aguardentes e licores; e os vários peixes tropicais, tanto os de água doce quanto os de água salgada.
No que concerne aos manufaturados, houve, ao longo do séc. XVIII, algum progresso na exportação de artigos
industriais portugueses para o Brasil, mas a metrópole não era uma nação industrial (especialmente após o
tratado de Methuen, de 1703, com a Inglaterra), de modo que os produtos manufaturados ingleses, franceses,
holandeses e italianos, por mais baratos e de boa qualidade, acabavam se impondo; mesmo aqui, Portugal atuava,
mais e mais, como um mero intermediário.
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1 Ridigez e Flexibilidade na Administração Portuguesa do