REVISTA DE INICIAÇÃO
CIENTÍFICA DA ULBRA 2007
Reitor
Ruben Eugen Becker
Vice-Reitor
Leandro Eugênio Becker
Pró-Reitor de Administração
Pedro Menegat
Pró-Reitor de Graduação da Unidade Canoas
Nestor Luiz João Beck
Pró-Reitor de Graduação das Unidades Externas
Osmar Rufatto
Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação
Edmundo Kanan Marques
DIRETORIA DE PESQUISA
Nádia T. Schröder (Dir.)
Ana Maria Pujol Vieira dos Santos
Marilena França Sarmento Barata
Márcia Viana das Dores
Juliana da Silva Lemos
COMISSÃO EDITORIAL
Ana Maria Pujol Vieira dos Santos
Marilena França Sarmento Barata
Nádia T. Schröder
INDEXADOR
LATINDEX
EDITORA DA ULBRA
Diretor
Valter Kuchenbecker
Capa
Juliano Dall’Agnol
Projeto Gráfico
Isabel Kubaski
Editoração
Humberto Gustavo Schwert
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação – CIP
Av. Farroupilha, 8001 - Prédio 29 - Sala 202 - Bairro São José
CEP: 92425-900 - Canoas/RS
Fone: (51) 3477.9118 - Fax: (51) 3477.9115
www.editoradaulbra.com.br
E-mail: [email protected]
Imagem da capa: Representação esquemática da proteína anticoagulante
nitroforina - 2, presente na saliva do inseto Barbeiro (Rhodinus prolixus).
Autoria: Laboratório de Bioinformática Estrutural
R454
Revista de Iniciação Científica /
Universidade Luterana do Brasil. Vol. 1, n. 1 (2002)- . - Canoas:
Ed. ULBRA, 2002.
v. ; 23 cm.
Anual.
ISSN 1806-8642
Setor de Processamento Técnico da Biblioteca Martinho Lutero – ULBRA/Canoas
REVISTA DE INICIAÇÃO
CIENTÍFICA DA ULBRA 2007
Índice
APRESENTAÇÃO .................................................................................................................................. 7
CIÊNCIAS AGRÁRIAS
Análise dos polimorfismos da proteína priônica (PRNP) em ovinos crioulos do Rio Grande do Sul
Éverton Eilert Rodrigues, Diego Hepp, Luís Alberto Oliveira Ribeiro, Norma Centeno Rodrigues, Daniel Thompsen Passos,
Tania de Azevedo Weimer ...................................................................................................................................................... 11
Avaliação do desempenho em confinamento de novilhos abatidos aos 15 ou 27 meses de idade
Leonardo Canali Canellas, Pedro Rocha Marques, Carlos Santos Gottschall, Hélio Radke Bittencourt ...................................... 19
Identificação da microbiota da orofaringe e cloaca em filhotes de arara-azul-grande
(Anodorhynchus hyacinthinus) de vida livre do Pantanal-MS
Márcia Regina Loiko, Fernanda de Souza Abilheira, Neiva Robaldo Guedes, Daniel Thompsen Passos, Tania de Azevedo Weimer,
Sérgio José de Oliveira, Mariangela da Costa Allgayer ............................................................................................................ 29
CIÊNCIAS BIOLÓGICAS
Avaliação da atividade genotóxica/antigenotóxica de Arrabidaea chica
Shandale Emanuele Cappelari, Cândida Lüdtke, Juliane Garcia Semedo, Vivian Francília Silva Kahl, Thais Basso Longo,
Marc François Richter, Patrícia Pereira, Alexandre de Barros Falcão Ferraz, Jaqueline Nascimento Picada ............................... 39
Avaliação da eficiência do tratamento de esgoto na remoção de ovos de helmintos
Samanta Anunciato Zynich, Ana Marisa de Oliveira Alves, Márcia Regina Thewes ............................................................... 51
Caracterização de fatores de virulência presentes em isolados de Escherichia coli provenientes da região Sul do Brasil
Fernanda Kieling Moreira, Yara Silva Casanova, Fabrício Alves Cerveira, Priscilla Karina Vitor Koerich, André Salvador
Kazantzi Fonseca, Vagner Ricardo Lunge, Ana Paula Wobeto e Nilo Ikuta .............................................................................. 63
Genotoxicidade associada a adesivos dentários de uso odontológico
Stela Maris da Silva Cariati, Guilherme Anziliero Arossi, Heloisa Helena Rodrigues de Andrade ............................................ 75
CIÊNCIAS DA SAÚDE
Análise comparativa entre o endo ptc original e leve como substâncias auxiliares no preparo de canais
radiculares pelo método manual e mecanizado
Ketherine P. Polidoro, Elias P. Motcy de Oliveira , Tiago André Fontoura de Melo, Graziele Borin ........................................... 85
Audição de idosos do bairro São Luís, Canoas, RS: presença de deficiência auditiva
Aline Ferreira Vieira, Cristiane Martins, Eduardo Farias, Adriane Ribeiro Teixeira, Cíntia de La Rocha Freitas,
Benno Becker Júnior, Luzia Fernandes Millão ........................................................................................................................ 97
Avaliação do nível de satisfação dos usuários na atenção básica de saúde em um municìpio da região
metropolitana de Porto Alegre: programa de saúde da família x tradicionais
Roberto Carvalho Silva, Luzia Fernandes Millão, Maria Renita Burg Figueiredo, Mitiyo Shoji Araújo,
Rosa Maria Freitas Groenwald ............................................................................................................................................. 105
Detecção de DNA de papilomavírus humano (HPV) em mulheres grávidas utilizando a urina
Suelen Angeli, Tiago Dalpiaz, Laura Gerber, Regina Bones Barcellos, Márcia Susana Nunes Silva, Maria Lucia Rosa Rossetti ... 115
Papel do fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF) como biomarcador de desfecho primário noTCE grave em adultos
Greizy Modesto Gomes, Fabiana da Silva Carvalho, Fábio Alves dos Santos Kespers, Alan Knolsseisen Cambrussi , Édison
Oliveira, Andrea Pereira Regner ......................................................................................................................................... 121
CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA
Extração de voláteis de broto e casca de fruto do pessegueiro e avaliação das respostas eletroantenográficas
sobre Grapholita molesta (LEP.: TORTRICIDAE)
Fabrício Fredo Naciuk, Josué Sant’Ana, Luiz Antonio Mazzini Fontoura .............................................................................. 133
CIÊNCIAS HUMANAS
A educação para a saúde e o ensino de ciências: estudando as zoonoses – estudo preliminar
Joana Kliemann da Cruz, Mariana Proença, Rosana Maria Paris, Ricardo Luiz Ramos, Rossano André Dal-Farra, Edson Roberto Oaigen .... 147
Cultura e processos de socialização na produção das infâncias de classes populares
Fernanda Nogueira, João Paulo Pooli, Márcia Rosa da Costa ................................................................................................. 157
O professor como objeto de poder e de saber: problematizações sobre a formação docente
Larisse Katiele Vargas da Costa, Luís Henrique Sommer ....................................................................................................... 167
Pesquisa arqueológica na casa Gomes Jardim, município de Guaíba/RS
Priscila Pedroso Dias, Gislene Monticelli ............................................................................................................................. 173
Universidade e permanência – promovendo gestão acolhedora
Maristela Rissi Ferla, Bianca Daniete Chimello Goulart, Dorilda Grolli, Lauraci Dondé da Silva, Tania Maria Scuro Mendes ..... 181
CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
Disciplinando os corpos: como a mídia nos ensina sobre o prolongamento da vida na sociedade atual
Fernanda Izidro Balestro, Sue Ellen Tatsch da Silva, Cristianne Maria Famer Rocha .............................................................. 193
Energia de ondas: uma proposta de inserção tecnológica e econômica no Brasil
Willian Mattes Gonçalves, Flávio Tosi Feijó, Patrízia Raggi Abdallah .................................................................................... 207
O dever do estado de fornecimento do interferon peguilado a pacientes portadores de hepatite c1
Eliziani Vedoy da Silva, Paula Pellizzer Dal’Pizzol, Germano Schwartz ................................................................................. 217
ENGENHARIAS
Desenvolvimento de um sistema de controle de movimento baseado em atuadores de ligas flexíveis
com memória
Fábio Bairros, André L. Bianchi, João C. Vernetti dos Santos, Valner, J. Brusamarello ............................................................ 229
O efeito da corrosão do aço no concreto aparente com cimento portland branco: um problema que se apresenta
quando da concepção do projeto arquitetônico
Amilton Sangoi Antunes, Carlos Fernando Guimarãoes Seffrin, Luciano Milesi Maciel, Ronaldo Tomazi, Marcos Alberto Oss Vaghetti .. 237
Polímeros biodegradáveis: relação entre cristalinidade e propriedades biológicas
Daniele Faccin Hubner, Ana Paula de Freitas, Martha Fogliato Santos Lima ......................................................................... 251
NORMAS PARA PUBLICAÇÃO DE TRABALHOS .......................................................................... 261
ÍNDICE DE AUTORES ..................................................................................................................... 265
Apresentação
A Revista de Iniciação Científica da ULBRA que apresentamos, revela o crescimento qualitativo dos trabalhos de iniciação científica selecionados no XIII Salão de Iniciação Científica da
ULBRA de 2007 que se constitui num espaço de convergência e irradiação do saber.
A iniciação científica é um instrumento básico de formação de recursos humanos qualificados
que possibilita introduzir os alunos de graduação em contato direto com a atividade científica e
tecnológica e engajá-los na pesquisa. Nesta perspectiva, esta atividade caracteriza-se como instrumento de apoio teórico e metodológico à execução de uma pesquisa. Também garante, aos
estudantes, uma maior visão do mundo permitindo com que imprevistos possam ser solucionados.
Nesta atividade de pesquisa há estímulo para o desenvolvimento do espírito crítico e da criatividade.
O Programa de Iniciação Científica e Tecnológica (PROICT/ULBRA) foi aprovado com o
objetivo de efetivar este processo consistente de capacitação de recursos humanos visando estabelecer mecanismos adequados de auxílio para a formação de uma nova mentalidade no aluno,
desenvolvendo nele a atitude científica, tornando-o um indivíduo preparado para ser o profissional diferenciado no mercado de trabalho. Além do programa institucional próprio contamos com o
auxílio do CNPq por meio do PIBIC que tem por finalidade o despertar da vocação científica e
incentivar talentos potenciais entre estudantes de graduação universitária, mediante participação
em projeto de pesquisa, orientados por pesquisador qualificado.
O Salão de Iniciação Científica da ULBRA, mais do que a difusão de conhecimentos é a ampliação
das relações da Universidade com a comunidade em que está inserida e aberta a outras Instituições de
Ensino Superior, constituindo-se numa oportunidade única para que o estudante possa perceber o
sentido do fazer científico dentro da Universidade. Além disso, é uma oportunidade para estudantes
participarem de eventos onde há trocas de experiências, de informações entre os participantes e avanço
do conhecimento com a exposição dos resultados das pesquisas desenvolvidas por estes alunos.
Ciências Agrárias
10
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Análise dos polimorfismos da proteína priônica
(PRNP) em ovinos crioulos do Rio Grande do Sul
ÉVERTON EILERT RODRIGUES1
DIEGO HEPP1
LUÍS ALBERTO OLIVEIRA RIBEIRO2
NORMA CENTENO RODRIGUES3
DANIEL THOMPSEN PASSOS4
TANIA DE AZEVEDO WEIMER5
RESUMO
Scrapie é uma encefalopatia espongiforme transmissível, de ovinos e caprinos. Polimorfismos no gene da
proteina priônica (PRNP) estão associados com a suscetibilidade à scrapie. Este trabalho determinou o
polimorfismo do codon 171 do PRNP em duas variedades [Serrana (n=58) e Fronteira (n=51)] de ovinos
da raça nativa Crioula. O DNA foi amplificado por PCR; os produtos foram clivados com Bsl I e analisados
em gel em poliacrilamida não-desnaturante a 10,5%. A freqüência do alelo de resistência (R) foi de 0,30 na
população Serrana e 0,39 na Fronteira. Apesar da alto ocorrência do alelo de suscetibilidade (Q), a população Fronteira apresentou a mais alta freqüência, já descrita, do alelo R, em ovinos brasileiros.
Palavras-chave: Ovinos crioulo, scrapie, encefalopatia espongiforme transmissível, polimorfismos no
gene PRNP.
1
Curso de Medicina Veterinária, Laboratório de Biotecnologia
Veterinária, ULBRA, Canoas.
4
Professor do Curso de Medicina Veterinária/ULBRA e do
PPG em Genética e Toxicologia Aplicada/ULBRA.
2
Departamento de Medicina Animal, Faculdade de Veterinária, UFRGS, Porto Alegre.
5
3
Professora do Curso de Medicina Veterinária/ULBRA.
Professora/orientadora do Curso de Medicina Veterinária/
ULBRA e PPG em Genética e Toxicologia Aplicada e PPG
Diagnóstico Genético Molecular. ([email protected])
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
11
ABSTRACT
Scrapie is a sheep and goat transmissible spongiform encephalopathy. Polymorphisms at the prionic
protein gene (PRNP) are associated to scrapie susceptibility. This paper analyzed the codon 171 PRNP
polymorphism at in two morphological varieties [Serrana (n=58) and Fronteira (n=51)] of Crioula
indigenous sheep. Genomic DNA was PCR amplified; PCR products were submitted to Bsl I cleavage
and analyzed in 10.5% non-denaturing polyacrylamide gel electrophoresis. The frequency of the resistant
allele (R) was of 0.30 in Serrana breed and 0.39 in Fronteira. Although susceptibility allele (Q) had high
frequency, Fronteira breed presents the highest frequency of R allele so far described, in Brazilian sheep.
Keywords: Ovinos crioulo, scrapie, encefalopatia espongiforme transmissível, polimorfismos no gene PRNP.
INTRODUÇÃO
Scrapie é uma enfermidade pertencente ao
grupo das encefalopatias espongiformes
transmissíveis (EET) que acomete ovinos e
caprinos. É uma doença neurodegenerativa fatal causada por uma proteína infecciosa (prion,
PrPSc), resultante de mudanças conformacionais
da proteína priônica (PrPC). A proteína anormal (PrPSc) acumula-se no tecido cerebral e sistema linforeticular, causando distúrbios
comportamentais, de locomoção, perda de peso,
intenso prurido. As EETs também afetam humanos (Kuru e Doença de Creutzfeld-Jakob, CJD,
por exemplo), bovinos (BSE: encefalopatia
espongiforme bovina, conhecida como “doença
da Vaca Louca”) além de outras espécies de
mamíferos (COSTA e BORGES, 2000), podendo ocorrer transmissão entre espécies.
Na Europa e no Reino Unido, casos vêm sendo relatados há mais de 200 anos (HUNTER,
2003; CHESEBRO, 2003). Na década de 80 a
importância da scrapie aumentou depois que
surgiram, no Reino Unido, casos da doença da
vaca louca (RIBEIRO e RODRIGUES, 2001).
Os sintomas da BSE são semelhantes aos da
scrapie, sendo sugerido, por alguns autores, que
12
a origem da doença, nos bovinos, seria a ingestão,
por estes, de ração para ruminantes (farinha de
carne e osso) produzida a partir de proteína de
ovinos infectados com scrapie (BRUCE et al.,
2002; NONO et al., 2003; THURING et al.,
2004). Neste mesmo período no Reino Unido, a
BSE foi associada a uma nova variante da CJD,
em humanos, de manifestação precoce, (vCJD)
gerando medo nos consumidores britânicos e
enormes prejuízos financeiros.
Desde 1996, o Ministério da Agricultura proibiu, no Brasil, o uso de farinha de carne e osso
na alimentação de bovinos (RIBEIRO e
RODRIGUES, 2001).
No Brasil, o primeiro caso de scrapie ocorreu
em 1978, em uma fêmea Hampshire Down, proveniente do Reino Unido (FERNANDES et al.,
1978). Até 2001 mais quatro surtos foram
registrados no país, nas regiões do Rio Grande do
Sul e Paraná, sendo que a origem dos animais
infectados era sempre de ovinos importados e de
raças produtoras de carne (RIBEIRO e
RODRIGUES, 2001). De 2003 até 2006 ocorreram mais cinco surtos no Brasil no Paraná, Minas
Gerais, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul.
A origem desses animais também era importada
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
ou com ascendentes importados do Canadá ou
Estados Unidos (GUIMARÃES, 2006).
A transmissão da doença depende da predisposição genética dos hospedeiros e da exposição ao prion infeccioso. No momento da parição
ou aborto, as ovelhas portadoras do agente podem contaminar o ambiente com o prion infeccioso que está presente nos restos placentários.
(PATTISON et al., 1974). Com isso, existe o
risco de infecção da prole durante o período
compreendido entre o nascimento e o desmame
e de outros ovinos e caprinos que consomem alimentos que entraram em contato com as membranas fetais eliminadas pelas fêmeas portadoras. Adicionalmente, ocorre um longo período
de sobrevivência da prion no ambiente. Os
machos que se contaminam podem adquirir os
sintomas, mas não transmitem a doença (GUIMARÃES, 2006).
A forma infecciosa da proteína decorre de
modificações conformacionais na estrutura da
PrPC cuja forma normal rica em α-hélice alterase em maior proporção para β-pregueada, tornando-se insolúvel e resistente à digestão de
proteases (HUNTER, 1999) acarretando o
acúmulo de PrP Sc, no cérebro e no sistema
linforeticular dos animais infectados (HARRIS,
1999; BUJDOSO et al., 2005; PONZ et al., 2005).
Em ovinos o gene que codifica a PrPC apresenta três importantes polimorfismos, nos códons
136, 154 e 171, que influenciam a alteração
conformacional da PrPC para PrPSc e estão associados com maior ou menor suscetibilidade à
scrapie (GOLDMANN et al., 1990; BOSSERS
et al., 1996; BILLINIS et al., 2004).
O códon 171 codifica os aminoácidos
Glutamina (Q), Arginina (R), Lisina (K) ou
Histidina (H). Os alelos Q e R estão associados
com a suscetibilidade à scrapie. Os animais portadores do alelo 171Q possuem maior
suscetibilidade enquanto que os portadores do
alelo 171R são mais resistentes à manifestação
clínica da doença. Os alelos K e H para o códon
171 apresentam uma freqüência muito baixa e
têm sido considerados equivalentes ao alelo Q
quanto à suscetibilidade (ACUTIS et al., 2004;
BILLINIS et al., 2004). Segundo Dawnson et al.
(1998), o controle da scrapie nos ovinos das raças Down (Hampshire e Suffolk) vem sendo feito, em vários países, com base na análise molecular,
através de programas de erradicação dos portadores do alelo Q do códon 171, que é considerado o principal determinante para a
suscetibilidade à doença. Já o códon 136 codifica os aminoácidos Valina (V) ou Alanina (A),
sendo considerado importante em alguns tipos de
scrapie e em determinadas raças de ovinos, como
Texel, Shetland, Poll Dorset. O códon 154 codifica os aminoácidos Histidina (H) ou Arginina
(R) e não é considerado em programas de
erradicação, nos EUA, por ser o códon de menor
expressão na determinação da suscetibilidade
genética à scrapie (HUNTER et al., 2002).
De acordo com Dawnson et al. (1998),
genotipando os animais é possível classificá-los
quanto ao risco de suscetibilidade. Animais com
genótipo QQ são considerados altamente suscetíveis, se expostos ao agente prion alterado,
animais QR possuem risco médio de
suscetibilidade e animais RR possuem risco mínimo de desenvolver os sintomas da doença.
No Brasil as freqüências dos alelos de
suscetibilidade à scrapie foram descritas apenas
em rebanhos Down, do Rio Grande do Sul (PASSOS et al., 2008).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
13
OBJETIVOS
Geral: Verificar as freqüências dos alelos de
resistencia à scrapie em ovinos do Rio Grande
do Sul, visando reduzir a probabilidade de disseminação da Scrapie nos rebanhos do Brasil.
Específico: Verificar as freqüências dos alelos
R e Q do códon 171 do gene PRNP na raça
ovina Crioula e compará-las com os resultados
já obtidos nas raças Down (Hampshire e
Suffolk), do Rio Grande do Sul.
MATERIAL E MÉTODOS
População e amostra
Os ovinos Crioulos são animais rústicos, que
sobrevivem bem em campos pobres, de pequeno
porte e têm na lã, naturalmente colorida, um de
seus grandes diferenciais, característica que começa a chamar a atenção do mercado artesanal.
Possuem maior resistência a parasitas e maior habilidade materna, resultando em melhor sobrevivência de cordeiro. Apresentam velos ralos, mostrando fibras longas e lisas, em mechas longas e
pontiagudas, de cor variando entre branca, marrom e preta, alguns apresentando manchas coloridas sobre fundo branco. A carne é bem aceita
por ser magra, macia e com sabor diferenciado.
Seu melhoramento por seleção é demorado e difícil, e cruzamento com outra raça é perigoso, pois
sua rusticidade pode desaparecer se a raça
cruzante for mal escolhida. A ovelha crioula
lanada tem desempenhado um importante papel
na manutenção do homem no campo, pois se
adapta a diferentes condições de clima, solo e
vegetação, inclusive em ambientes adversos para
a criação de outros ovinos.
14
Acredita-se que a ovelha Crioula teve origem na Churra, trazida para a América do Sul
pelos colonizadores ibéricos. Todavia, é difícil
caracterizar os diversos tipos de ovinos “crioulos” existentes em diferentes regiões da América, embora apresentem semelhanças em seus
traços gerais. No Brasil, parece ter surgido no
século XVII, do cruzamento entre os rebanhos
trazidos pelos padres jesuítas e outras raças também importadas. De acordo com a classificação
internacional, o rebanho de Ovelha Crioula é
considerado como população rara, pois conserva traços dos ovinos primitivos que lhe deram
origem. Existem duas variedades morfológicas,
Serrana e Fronteira, desconhecendo-se o grau
de diferenciação genética entre as mesmas.
Foram obtidas 109 amostras de sangue ( 59
Serrana e 51 Fronteira), por punção da veia
jugular, com anti-coagulante. O material foi
mantido sob refrigeração e enviado ao laboratório de Biotecnologia do hospital veterinário
ULBRA, para a extração do DNA.
Métodos laboratoriais
O DNA genômico foi isolado a partir de sangue
total de acordo com o método de Miller et al. (1988)
e o gene PRNP foi amplificado utilizando a técnica
da Reação em Cadeia da Polimerase (PCR). Os
produtos das amplificações foram clivados com a
enzima de restrição Bsl I para possibilitar a diferenciação dos alelos, e conseqüente identificação dos
genótipos. As análises dos produtos de clivagem foram feitas por eletroforese vertical em gel de
poliacrilamida não-desnaturante a 10,5% e corado
com nitrato de prata (SAMBROOK & RUSSEL,
2001). Os primers, as condições da PCR e de
clivagem são as mesmas descritas por YuzbasiyanGurkan et al. (1999).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
RESULTADOS
As freqüências genotípicas e alélicas obtidas
para o códon 171 do gene do gene PRNP, em
ovinos Crioulos estão apresentadas nas Tabelas
1 e 2, respectivamente. As tabelas apresentam
também os dados previamente descritos por Passos et al., 2008, para ovinos Down, para efeitos
de comparação. Pode-se observar que foram observados 60% de indivíduos QQ na população
serrana e 41%, na fronteira, correspondendo a
frequencias alélicas de 0,7(Q) e 0,3(R), na população serrana e 0,61(Q) e 0,39 (R), na fronteira.
A frequencia do alelo R na amostra Serrana
foi similar à descrita para Hampshire Down (Tabela 2), enquanto a da Fronteira foi a mais alta
já verificada em ovinos do Rio Grande do Sul e
mais alta que a de outras populações mundiais.
Tabela 1 - Freqüências genotípicas do códon 171 do gene da PrP
Tabela 2: Freqüências alélicas do códon 171 do gene da PrP
Essa é a primeira descrição das freqüências
do genótipo de PRNP em ovinos da raça Crioula.
DISCUSSÃO
A avaliação dos polimorfismos no gene PRNP
tem sido utilizada em diferentes países como forma de controle das encefalopatias espongiformes
transmissíveis, visando a diminuição do risco de
contaminação de animais e humanos.
Nas duas populações analisadas foi observada uma alta freqüência do alelo Q, relacionado à maior suscetibilidade. Estes dados são
compatíveis com estudos anteriores
(YUZBASIYAN-GURKAN et al., 1999) em
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
15
rebanhos que não sofreram seleção para o alelo
de resistência à scrapie. É importante salientar que não há relatos da ocorrência de scrapie
em ovinos Crioulos; no entanto a alta
frequencia do alelo de susceptibilidade sugere o risco de contaminação desses rebanhos
caso os mesmos venham a ter contato com
animais infectados.
Comparando com as outras populações ovinas do Rio Grande do Sul, já investigadas (Tabelas 1 e 2), observa-se que os animais da raça
Crioula, da população Fronteira, apresentaram
a mais alta freqüência do alelo de resistência
(R), sugerindo a importância deste rebanho
como fonte de resistência à EET.
Considerando que os machos não transmitem o prion infeccioso e sim os alelos de
suscetibilidade ou de resistência é importante
genotipar e identificar os machos portadores de
pelo menos um alelo R. Com isso, é possível utilizar estes animais em cruzamentos dirigidos para
aumentar a freqüência dos alelos de resistência
nos rebanhos ovinos brasileiros, sem que haja o
risco de contaminação das fêmeas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Através dos resultados obtidos, pretendese informar aos criadores a importância da
genotipagem e identificação de machos portadores de pelo menos um alelo R, pois as
análises deste polimorfismo poderão servir aos
criadores brasileiros como ferramenta útil na
seleção de rebanhos ovinos através da realização de cruzamentos dirigidos. Adotando
esta metodologia é possível estabelecer um
programa de seleção eficiente e assim, redu-
16
zir o risco de disseminação da doença, obtendo um rebanho resistente e de maior valor comercial.
REFERÊNCIAS
ACUTIS, P.L. et al. Low frequency of the
scrapie resistance associated allele and
presence of lysine-171 allele of the prion
protein gene in Italian Biellese ovine breed.
Journal of General Virology, v. 85, p. 31653172, 2004.
BILLINIS, C. et al. Prion protein gene
polymorphisms in healthy and scrapieaffected sheep in Greece. Journal of General Virology, v. 85, p. 547-554, 2004.
BOSSERS, A. et al. PrP genotype contributes
to determining survival times of sheep with
natural scrapie. Journal of General
Virology, v. 77, p. 2669-2673, 1996.
BRUCE, M.E. et al. Strain characterization
of natural sheep scrapie and comparison with
BSE. Journal of General Virology, v. 83, p.
695-704, 2002.
BUJDOSO, R.; BURKE, D.F.; THACKRAY,
A.M. Structural differences between allelic
variants of the ovine prion protein revealed
by molecular dynamics simulations. Proteins:
Structure, Function, and Bioinformatics, v.
61, p. 840-849, 2005.
CHESEBRO, B. Introduction to the
transmissible spongiform encephalopathies or
prion diseases. British Medical Bulletin, v.
66, p. 1-20, 2003.
COSTA, L.M.C.; BORGES, J.R.J. Encefalopatia
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Espongiforme Bovina (“Doença da Vaca Louca”). Revista CFMV, v. 21, p. 8-15, 2000.
DAWNSON, M. et al. Guidance on the use
of PrP genotyping as an aid to the control of
clinical scrapie. Scrapie Information Group.
Veterinary Record, v. 142, p. 623-625, 1998.
FERNANDES, R.E.; REAL, C.M.;
FERNANDES, J.C.T. Scrapie em ovinos no Rio
Grande do Sul. Arquivos da Faculdade de
Veterinária - UFRGS, v. 6, p. 139-146, 1978.
GOLDMANN, W. et al. Two alleles of a
neural protein gene linked to scrapie in
sheep. Proceedings of the National
Academy of Sciences, v. 87, p. 2476-2480,
1990.
GUIMARÃES, E.B. Scrapie. In: ENCONTRO NACIONAL DO PROGRAMA NACIONAL DE CONTROLE DA RAIVA
DOS HERBÍVOROS E OUTRAS
ENCEFALOPATIAS – PNCRH, 3., 2006,
Cuiabá. Anais... Cuiabá, 2006.
HARRIS, D.A. Cellular biology of prion
diseases. Clinical Microbiology Reviews, v.
2, p. 429-444, 1999.
HUNTER, N. Molecular biology and
genetics
of
bovine
spongiform
encephalopathy. In: FRIES, R.; RUVINSKY,
A. The genetics of Cattle. New York: CABI
Publishing, 1999.
HUNTER, N. et al. Transmission of prion
diseases by blood transfusion. Journal of
General Virology, v. 83, p. 2897-2905, 2002.
HUNTER, N. Scrapie and experimental BSE
in sheep. British Medical Bulletin, v. 66, 171183, 2003.
MILLER, S.A.; DYKES, D.D.; POLESKY,
H.F. A simple salting out procedure for
extracting DNA from human nucleated cells.
Nucleic Acid Research, v. 16, p. 1215, 1988.
NONO, R. et al. Molecular analysis of cases
of Italian sheep scrapie and comparison with
cases of bovine spongiform encephalopathy
(BSE) and experimental BSE in sheep.
Journal of Clinical Microbiology, v. 41, p.
4127-4133, 2003.
PATTISON, I.H. et al. Further observations
on the production of scrapie in sheep by oral
dosing with fetal membranes from scrapieaffected sheep. British Veterinary Journal,
v. 130, p. 65-67, 1974.
PASSOS, D.T. et al. PrP polymorphisms in
Brazilian sheep. Small Ruminant Research,
v. 74, p. 130–133, 2008.
PONZ, R. et al. Scrapie resistance alleles are
not associated with lower prolificity in Rasa
Aragonesa sheep. Research in Veterinary
Science, v. 81, p. 37-39, 2005.
RIBEIRO, L.A.O.; RODRIGUES, N.C.
Scrapie. A Hora Veterinária, v. 120, p.1922, 2001.
SAMBROOK, J.; RUSSELL, D.W.
Molecular Cloning: A Laboratory Manual. 3. ed. Cold Spring Harbor, NY: Cold Spring
Harbor Laboratory, 2001.
THURING, C.M.A. et al. Discrimination
between scrapie and bovine spongiform
encephalopathy in sheep by molecular size,
immunoreactivity and glycoprofile of prion
protein. Journal of Clinical Microbiology,
v. 42, p. 972-980, 2004.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
17
YUZBASIYAN-GURKAN, V. et al.
Development and usefulness of new polymerase
chain reaction-based tests for detection of
18
different alleles at codons 136 and 171 of the
ovine prion protein gene. American Journal
of Veterinary Research, v. 60, p. 884-887, 1999.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Avaliação do desempenho em confinamento de
novilhos abatidos aos 15 ou 27 meses de idade
LEONARDO CANALI CANELLAS1
PEDRO ROCHA MARQUES2
CARLOS SANTOS GOTTSCHALL3
HÉLIO RADKE BITTENCOURT4
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo avaliar o desempenho bio-econômico de novilhos de corte
submetidos a um modelo de produção baseado na utilização de pastagem cultivada e confinamento,
visando à produção de novilhos superprecoces e precoces. Foram utilizados 432 novilhos com base racial
britânica, sendo 267 novilhos superprecoces, abatidos em média aos 15 meses (grupo NSP), e 165 novilhos precoces, abatidos em média aos 27 meses (grupo NP). Os NSP e os NP foram alocados em
pastagem de azevém (Lolium multiflorum) aos 7 e 22 meses, com peso médio inicial (PIPAST) de 185,06
e 314,36 kg, permanecendo em pastejo por 145 e 55 dias respectivamente. Posteriormente os animais
foram colocados em regime de confinamento, iniciando com peso médio (PICONF) de 296,98 e 352,04 kg,
respectivamente para NSP e NP (p<0,01) e foram terminados até que atingissem o grau de terminação
adequado, sendo vendidos de forma escalonada. Novilhos superprecoces apresentaram melhor retorno
econômico no modelo de produção proposto, sendo a diferença de preço compra/venda o principal fator
responsável por esse resultado.
Palavras-chave: Novilhos precoces, confinamento, pastagem, desempenho econômico.
1
Acadêmico de Medicina Veterinária/ULBRA. Bolsista de
Iniciação Científica PROICT/ULBRA.
3
2
Acadêmico de Medicina Veterinária/ULBRA. Aluno de Iniciação Científica voluntário PROICT/ULBRA.
4
Professor/orientador do Curso de Medicina Veterinária/
ULBRA. ([email protected])
Estatístico, Faculdade de Matemática, PUCRS.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
19
ABSTRACT
The main objective of this research was to evaluate the bio-economic performance of young and
younger beef steers from a production system based on the utilization of pasture and feedlot. Four
hundred and thirty two steers were divided in two groups: 267 younger steers (YY), slaughtered at 15
months old; and 165 young steers (YS), slaughtered at 27 months of age. YY and YS were allocated
on Lolium multiflorum pasture at 7 and 22 months age, with 185.06 and 314.36 kg (beginning
weight, BWPAST) for 145 and 55 days, respectively. After that, YY and YS were confined with 296.98
and 352.04 kg (BWCONF) (p<0.01) and sold as long as it reached a minimum visible fat rate. YY
reached better economic performance. The difference between purchase/sale was the main variable
affecting the results.
Keywords: Young steers, days on feed, weight gain, feedlot
INTRODUÇÃO
A terminação intensiva de bovinos de corte
tem se destacado nos últimos anos como alternativa para o aumento dos índices produtivos e econômicos dos sistemas de produção de gado de
corte. Esse quadro pode ser explicado, em parte,
devido à necessidade de melhoria dos índices
produtivos apresentados atualmente, que se encontram abaixo do potencial de produção do setor (PACHECO et al., 2006), gerando um baixo
retorno econômico. Nesse contexto, alguns sistemas de produção têm utilizado recursos como
as pastagens cultivadas e o confinamento, tendo
como objetivo um melhor desempenho biológico
e um maior retorno econômico.
No Rio Grande do Sul, a utilização de pastagens cultivadas de crescimento hibernal permite
um desenvolvimento adequado dos animais durante o inverno, período no qual o campo nativo
apresenta baixa disponibilidade e qualidade de
forragem (ROCHA et al., 2003). O confinamento,
por sua vez, proporciona segurança ao sistema
quando se deseja atingir determinados índices
20
produtivos, pois permite o controle da dieta e o
monitoramento do desempenho dos animais
(COSTA et al., 2002). A utilização desses recursos, de maneira isolada ou integrada permite a
produção de novilhos precoces (abatidos aos 2430 meses) e superprecoces (abatidos aos 14-17
meses), antecipando receitas e proporcionando
giro rápido do capital investido (GOTTSCHALL
et al. 2007a; EUCLIDES FILHO et al. 2003).
O desempenho biológico do animal durante a
fase de terminação, representado principalmente
pela taxa de ganho de peso, afeta diretamente a
eficiência econômica do sistema de produção
(ALBRIGHT et al., 1994). Além disso, outros fatores também afetam o desempenho econômico da
atividade, tais como custo de compra dos animais,
qualidade nutricional, custo de alimentação e
categoria animal utilizada (GOTTSCHALL,
CANELLAS e FERREIRA, 2006). O objetivo do
presente trabalho foi avaliar o desempenho bioeconômico de novilhos de corte submetidos a um
modelo de produção baseado na utilização de pastagem cultivada e confinamento, visando à produção de novilhos superprecoces e precoces.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
MATERIAL E MÉTODOS
O trabalho foi realizado em uma propriedade
particular situada no município de Carazinho, Rio
Grande do Sul, entre maio de 2006 e fevereiro de
2007. Foram utilizados 432 novilhos de corte, sendo
267 novilhos manejados para abate em média aos
15 meses de idade, denominados superprecoces (grupo NSP) e 165 novilhos manejados para abate em
média aos 27 meses, denominados precoces (grupo
NP). Os NSP foram comprados em 01/05/2006 aos 7
meses de idade, com peso médio de 185,06 kg
(PIPAST), ao valor de R$ 1,71/kg. Após a compra os
animais foram alocados em pastagem de azevém
(Lolium multiflorum) durante 145 dias até serem confinados em 25/9/2006, aos 12 meses, com peso médio de 296,98 kg (PICONF). Os NP foram comprados
em 01/08/2006, aos 22 meses de idade, com peso
médio de 314,36 kg (PIPAST), ao valor de R$ 2,03/kg.
Após a compra os animais também foram alocados
em pastagem de azevém durante 55 dias até serem
confinados em 25/9/2006, aos 24 meses, pesando
352,04 kg. A carga animal utilizada na pastagem foi
de 330 kg de peso vivo/ha para os NSP e de 690 kg
de peso vivo/ha para os NP, sob pastejo contínuo.
Os animais foram mantidos em confinamento
até que atingissem o grau de terminação adequado, expresso por visualização de gordura subcutânea, não tendo peso nem data pré-determinados para o abate. Durante os 12 primeiros
dias de confinamento, os animais foram submetidos a uma adaptação à dieta, ajustada conforme NRC (1996), para GMD de 1,1 kg/dia. O
volumoso utilizado era composto de quantidades variáveis de silagens de milho, girassol, laranja e aveia, e o concentrado continha farelos
de soja e girassol, resíduos de soja e trigo, grãos
de milho e sorgo, calcário calcítico e monensina
sódica (1,5 gramas por animal/dia), na relação
volumoso:concentrado de 54:46. A dieta era
fornecida na base de 3,0 % do peso vivo e continha valores médios de 70% de nutrientes
digestíveis totais (NDT) e 12,5% de proteína
bruta (PB). O controle sanitário seguiu o calendário normal da propriedade, visando o controle de endoparasitas e ectoparasitas.
A análise estatística consistiu da utilização do
Modelo Linear para comparação do ganho médio diário de peso em confinamento (GMDCONF)
entre NSP e NP, utilizando o PICONF e o tempo
médio de permanência (TPCONF) como co-variáveis. Segundo o Modelo linear para comparação
do GMDCONF entre NSP e NP, verificou-se que o
tempo de permanência e a categoria exercem
influência significativa sobre o GMDCONF.
Na análise econômica do modelo de produção
foram considerados apenas os custos variáveis de
produção (custo de compra dos animais e custo de
alimentação). Os custos fixos não foram considerados por estarem diluídos em outros setores da
propriedade, dificultando um cálculo preciso. O
custo da pastagem foi calculado conforme a lotação e o período de ocupação da mesma. Como base,
foi considerado um custo/ha de R$ 75,00 e um
período de ocupação de 150 dias. Os indicadores
utilizados para a análise econômica das fases de
pastagem e confinamento foram: custo da alimentação/animal/dia; tempo médio de permanência em
pastagem/confinamento (TPPAST /TPCONF); custo da
alimentação/animal; ganho de peso/animal na pastagem/confinamento (GPPAST /GPCONF); e custo/kg
produzido. Para análise econômica do modelo de
produção (pastagem e confinamento) foram considerados: custo de compra/kg; custo de compra/
animal; custo total/animal; receita bruta/kg; recita bruta/animal; margem bruta/animal;
lucratividade no período; e diferença de preço
compra/venda.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
21
RESULTADOS E
DISCUSSÃO
Na Figura 1 pode-se visualizar um fluxograma do modelo de produção adotado, desde a
compra dos animais até o abate dos mesmos. Na
Tabela 1 estão dispostos os dados referentes ao
desempenho biológico médio dos NSP e NP durante a fase de pastagem.
O PIPAST observado nos diferentes grupos é
facilmente explicado pela idade com a qual os
animais foram comprados. Os NSP foram comprados no mês de maio, em média com 7 meses, ou seja, se tratavam de animais recém desmamados e com um peso compatível com sua
idade. Já os NP foram comprados no mês de
agosto, época do ano em que os preços tendem
se elevar, principalmente devido à escassez de
oferta por conta dos meses de inverno. Os NP
foram comprados em média aos 22 meses, o que
explica o maior peso vivo em relação aos NSP.
Dentro do planejamento da propriedade visando à produção de novilhos superprecoces e precoces e considerando a necessidade de liberação das áreas de pastagem para o preparo e
plantio de lavoura de verão, foram organizadas
as datas de compra e ajustado o tempo de permanência de cada categoria no pasto. Quanto
maior o ganho de peso na fase de pastagem,
que apresenta baixo custo na propriedade em
questão (tabela 3), menor é o tempo de permanência e o ganho de peso necessário no
confinamento para atingir o grau de terminação adequado, sistema que apresenta custos mais
elevados e maior risco em relação às pastagens.
Conforme RESTLE et al. (2007), na busca por
maior lucratividade nos sistemas intensivos de
terminação de bovinos de corte, o enfoque deve
basear-se na redução do custo com a alimentação. Além disso, segundo GOTTSCHALL
(2005) através da manipulação da dieta, é possível atingir uma maior deposição de gordura
nos novilhos mais jovens, permitindo a antecipação do abate desses animais, o que não seria
possível até o término do ciclo da pastagem. O
TMPPAST foi maior para os NSP, atingindo um
elevado GPPAST em relação aos NP, o que permitiu com que os dois grupos obtivessem pesos
satisfatórios ao início do confinamento.
Os dados referentes ao desempenho biológico dos NSP e NP no confinamento são apresentados na Tabela 2.
Tabela 1 - Peso médio inicial (PIPAST) em kg, peso médio final (PICONF) em kg, tempo médio de permanência
(TPPAST) em dias, ganho médio diário de peso (GMDPAST) em kg/dia e ganho de peso vivo (GPPAST) em
kg, de novilhos superprecoces (NSP) e precoces (NP) na fase de pastagem.
22
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Figura 1 - Fluxograma do modelo de produção de novilhos superprecoces (NSP) e precoces (NP) em pastagem
e confinamento.
Tabela 2 - Peso médio inicial (PICONF) em kg, peso médio ao abate (PA) em kg, tempo médio de permanência
(TPCONF) em dias, ganho médio diário de peso (GMDCONF) em kg/dia e ganho de peso vivo (GPCONF)
em kg, de novilhos superprecoces (NSP) e precoces (NP) na fase de confinamento.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
23
Novilhos precoces apresentaram maior
(p<0,01) PICONF do que os superprecoces, o que
era esperado em virtude da diferença de idade
entre os animais dos diferentes grupos. O PA foi
superior para os NP (p<0,01) em relação aos
NSP. O TPCONF foi maior para os NSP, enquanto
o GMDCONF foi superior para os NP (p<0,01). O
GPCONF foi semelhante (p>0,05) para os dois
grupos, em função da relação existente entre o
TPCONF e GMDCONF, pois o resultado é conseqüência da combinação de maior TP e menor
GMDCONF para os NSP e a combinação de menor TP e maior GMDCONF para os NP. Esses resultados (tabela 2) ressaltam que o PICONF obtido com auxílio da pastagem, foi coerente com a
necessidade de ganho de peso de cada categoria na fase de confinamento.
Diversos autores afirmam que o peso de terminação diminui com o aumento do plano nutricional
(COLEMAN, EVANS e GUENTHER, 1993; DI
MARCO, BARCELLOS e COSTA, 2006). Esse
maior aporte de nutrientes, por sua vez, deve ocorrer sempre que o objetivo for o abate de novilhos
com até 14 meses de idade, visto que, em um curto período, a necessidade de ganho de peso dessa
categoria animal é elevada, aumentando também
sua exigência nutricional. Desse modo, terneiros
submetidos a dietas que proporcionem altas taxas
de ganho de peso tendem a atingir o ponto de terminação precocemente e com menores pesos em
relação a novilhos mais velhos. Gottschall et al.
(2007) relatam resultado semelhante, onde novilhos superprecoces com maior peso inicial obtiveram maior peso ao abate, obtendo também ganhos
de peso vivo semelhantes.
Observa-se, que o GMDPAST foi superior para
os NSP, o que pode ser explicado pela lotação
utilizada na pastagem, que foi duas vezes maior
24
para os NP em relação aos NSP, o que proporcionou maior oferta de forragem para os novilhos
mais jovens. O GMDCONF se comportou de maneira oposta, sendo maior (p<0,01) para os NP,
o que possivelmente ocorreu devido ao menor
ganho de peso na pastagem e à maior estrutura
corporal desses animais em relação aos
superprecoces por ocasião do início do
confinamento, resultando em um maior ganho
compensatório para esses animais. Conforme
HERSOM et al. (2004) animais que sofreram
algum tipo de restrição alimentar prévia tendem
a fazer um ganho ou crescimento compensatório quando passam a receber dietas de melhor
qualidade. A maior manifestação de ganho compensatório em novilhos mais velhos é explicada
por Gottschall (2005), que ressalta que para a
produção de novilhos precoces existe uma grande flexibilidade quanto ao momento e à intensidade do ganho de peso. Esse autor afirma que
novilhos abatidos entre 24-30 meses exigem
GMD moderado (em torno de 0,500 kg/dia),
devendo este ser mais intenso na fase final de
terminação, que muitas vezes coincide com o
confinamento. Desse modo, esses novilhos acabam sendo submetidos a períodos de restrição
alimentar de curta a média duração, geralmente seguidos pelo período final de terminação,
onde recebem um aporte nutricional elevado,
resultando na manifestação de um ganho compensatório para esses animais.
O TPCONF foi de 94,20 e 68,87 dias para NSP
e NP, respectivamente (p<0,01). Esses períodos
de confinamento estão de acordo com os relatados por Lanna e Almeida (2005) para condições
brasileiras (70 a 80 dias). Períodos de
confinamento superiores tendem a apresentar
queda na eficiência e conseqüentemente maiores custos. Novilhos precoces permaneceram con-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
finados por um menor (p<0,01) período de tempo em relação aos superprecoces (tabela 2). Apesar de ambos os grupos terem apresentado GPCONF
semelhantes, o GMDCONF foi superior para os NP,
o que contribuiu para que esses novilhos atingissem mais rapidamente seu peso de terminação
(PA), acarretando na antecipação do abate desses animais. Esses resultados estão de acordo com
Di Marco (1998) e Hersom et al. (2004), que
afirmam que o ganho diário de peso apresenta
uma correlação negativa com o tempo de permanência dos animais em confinamento, ou seja, o
aumento na taxa de ganho de peso gera redução
no número de dias de confinamento.
Os custos variáveis de produção, obtidos
durante as fases de pastagem e confinamento
podem ser visualizados nas tabelas 3 e 4. Durante a fase de pastagem (Tabela 3) o custo de alimentação/animal/dia foi um pouco superior para
os NSP, o que pode ser explicado pela menor
lotação utilizada, havendo, portanto, uma me-
nor diluição do custo da pastagem por unidade
animal. O custo de alimentação/animal também
foi superior para os NSP, pelo fato de que o tempo de permanência em pastagem foi bem superior aos NP. Além disso, a carga animal utilizada
por hectare de pastagem foi menor para os NSP,
o que colaborou para aumentar o custo com a
alimentação. Contudo, o custo/kg produzido foi
praticamente o mesmo, visto que o GMDPAST e
o GPPAST foram maiores para os NSP. Apesar de
terem apresentado um menor custo/animal/dia
durante o confinamento (Tabela 4), resultado
de um menor consumo absoluto de alimento, os
NSP apresentaram maior custo de alimentação/
animal e maior custo/kg produzido. Para cada
kg produzido no confinamento, foram necessários R$ 1,46 para os NSP contra R$ 1,23 para os
NP. Isso ocorreu pelo maior ganho de peso apresentado pelos NP nessa fase, o que levou a uma
maior diluição do custo de alimentação, ressaltando a influência exercida pelo desempenho
biológico sobre o custo de produção.
Tabela 3 - Custos variáveis de produção, em Reais (R$), obtidos durante a fase de pastagem por novilhos
superprecoces (NSP) e precoces (NP).
Tabela 4 - Custos variáveis de produção, em Reais (R$), obtidos durante a fase de confinamento por novilhos
superprecoces (NSP) e precoces (NP).
Na Tabela 5 podem ser visualizados dados referentes aos custos variáveis de produção, receitas e análise econômica do modelo de produção
de novilhos superprecoces e precoces em pasta-
gem cultivada e confinamento. Observa-se que
o custo de compra/kg foi superior para os NP em
relação aos NSP, contrariando uma característica de mercado, que normalmente valoriza mais o
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
25
kg do terneiro (NSP) em relação ao kg do novilho magro (NP). Essa diferença de preço representa uma flutuação de mercado que ocorreu
dentro daquele ano, havendo uma diminuição
na oferta de animais no mercado no mês de agosto em relação à oferta que havia no mês de maio.
Gottschall, Canellas e Ferreira (2006) afirmam
que o comportamento do mercado deve sempre
ser analisado com atenção, caso contrário, eventuais flutuações podem prejudicar o resultado econômico do processo.
O custo de compra/animal também foi superior para os NP, que além de terem custado R$
0,32/kg a mais na compra, foram adquiridos com
cerca de 130 kg a mais em relação aos terneiros,
o que gerou um maior desembolso. O custo de
alimentação/animal foi superior para os NSP,
principalmente devido ao maior tempo de permanência em pastagem e no confinamento e à
necessidade de um maior número de kg até o
abate. Em trabalho realizado com novilhos precoces e superprecoces, Pacheco et al. (2006) afirmaram que a redução do tempo de permanência em confinamento promoveu aumento na
lucratividade do sistema de terminação. Apesar do maior custo com alimentação, o custo
total/animal foi inferior para os NSP, visto que o
desembolso para a compra desses animais havia
sido menor.
Tabela 5 - Custos de produção, receitas e análise econômica do modelo de produção de novilhos superprecoces
(NSP) e precoces (NP) em pastagem e confinamento.
A receita bruta/kg foi praticamente a mesma
para os dois grupos, o que mostra que não houve
uma remuneração superior para os NSP, o que
normalmente ocorre por se tratarem de animais
mais jovens e com maior qualidade de carne.
Segundo Gottschall, Canellas e Ferreira (2006),
o valor de venda/kg é um fator determinado pelo
mercado, estando sujeito a variações. A receita
bruta/animal foi superior para os NP, devido ao
maior peso ao abate alcançado por esses animais.
Entretanto, essa maior receita não foi suficiente
26
para compensar o maior custo total/animal apresentado pelos NP, visto que a margem bruta/animal foi maior para os NSP, gerando uma
lucratividade no período e ao mês também superior para esses animais. Observa-se que mesmo o
custo de alimentação/animal sendo R$ 53,00 superior para os NSP, esses animais apresentaram
maior margem bruta/animal, o que está diretamente associado ao menor valor de compra/animal, apresentado pelos NSP. Em sistemas de
confinamento o custo de compra bem como o cus-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
to de alimentação variam conforme a idade, o
sexo e o peso corporal dos animais. O custo de
alimentação tende a ser maior para novilhos mais
jovens, devido ao maior tempo de permanência
desses animais no cocho. Por outro lado, o custo
de compra/animal é mais alto quando se trata de
novilhos de 2 anos (NP), comparados a terneiros
(NSP), devido ao maior peso corporal desses animais (GOTTSCHALL, CANELLAS e
FERREIRA, 2006).
O principal fator responsável pelo melhor desempenho econômico dos NSP nesse modelo de
produção é representado pela diferença entre o
preço de compra e o de venda, que foi de 12,76%
e - 4,10%, respectivamente para NSP e NP. Nesse
caso, o preço de venda foi praticamente o mesmo
para os dois grupos, não servindo como parâmetro
de comparação. Entretanto, o preço de compra foi
determinante. Para cada kg de peso vendido em
relação ao comprado, foram R$ 0,08 a menos para
os NP, o que em 314,36 kg (peso de compra), representam R$ 25,15. Nessa mesma linha de raciocínio, os NSP obtiveram, para cada kg de peso,
um acréscimo de R$ 0,25, o que representa R$
46,27 a mais em 185,06 kg comprados.
Supondo que a diferença de R$ 0,25/kg fosse
aplicada aos NP, o retorno econômico seria ainda
maior, devido ao maior peso de compra (314 kg),
o que proporcionaria um acréscimo de R$ 78,50,
superior ao retorno obtido a partir do peso de compra dos NSP. Gottschall, Canellas e Ferreira
(2006), afirmam que, para um maior retorno econômico, animais mais jovens devem ser biologicamente eficientes (elevado ganho de peso e
menor conversão alimentar), enquanto em animais mais velhos o ponto central deve ser a exploração da diferença de preço compra/venda,
devido ao seu maior peso corporal.
Os resultados apresentados e discutidos acima demonstram que um retorno econômico superior depende de uma relação compra/venda
favorável, caso contrário, a margem obtida será
proveniente exclusivamente do ganho na engorda, o que aumenta o risco do processo, principalmente na fase de confinamento.
CONCLUSÕES
Novilhos superprecoces apresentaram melhor
retorno econômico no modelo de produção proposto, obtendo maior margem bruta,
lucratividade no período e ao mês. A diferença
de preço compra/venda foi determinante para
esse resultado, sendo o custo de compra/kg o
principal fator responsável por esse quadro. O
uso de pastagem cultivada apresentou menor
custo/kg produzido e permitiu uma redução no
tempo de permanência dos animais em
confinamento. O melhor desempenho biológico
dos NP resultou em um menor custo/kg produzido para esse grupo na fase de confinamento.
REFERÊNCIAS
ALBRIGHT, M.L. et al. Factors affecting
cattle feeding profitability and cost of gain.
Beef cattle handbook, 8050, 4p, 1994.
COLEMAN, S. W.; EVANS, B. C.;
GUENTHER, J. J. Body and carcass
composition of Angus and Charolais steers
as affected by age and nutrition. Journal of
Animal Science, v.71, n.86, 1993.
COSTA, E. C. et al. Desempenho de novilhos Red Angus superprecoces, confinados e
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
27
abatidos com diferentes pesos. Revista Brasileira de Zootecnia, Viçosa, v.31, n.1, 2002.
DI MARCO, O. N. Crecimiento de vacunos
para carne. Mar Del Plata, Uruguay, 1998. 246p.
DI MARCO, O.; BARCELLOS, J.O.J.; COSTA, E. N. Crescimento de bovinos de corte. Porto Alegre: Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, 2006. 248 p.
HERSOM, M. J. et al. Effect of live weight
gain of steers during winter grazing: I. Feedlot
performance, carcass characteristics, and
body composition of beef steers. Journal of
Animal Science, v. 82, p.262-272, 2004.
EUCLIDES FILHO, K. et al. Desempenho
de diferentes grupos genéticos de bovinos de
corte em confinamento. Revista Brasileira
de Zootecnia, Viçosa, v. 32 , n. 5, 2003.
LANNA, D.P.D.; ALMEIDA, R. A terminação de bovinos em confinamento. Visão Agrícola, n.3, p. 55-58, 2005.
GOTTSCHALL, C.S. Produção de novilhos
precoces: nutrição, manejo e custos de produção. 2.ed. rev. e ampl. Guaíba: Agrolivros,
2005. 213p.
GOTTSCHALL, C.S.; CANELLAS, L.C.;
FERREIRA, E.T. Confinamento de bovinos
de corte: alternativas para o aumento da eficiência econômica. In: GOTTSCHALL,
C.S.; SILVA, J.L. (Orgs.). Anais do XI Ciclo de Palestras em Produção e Manejo de
Bovinos. Canoas: Editora da ULBRA, 2006.
p.57-66.
GOTTSCHALL, C.S. et al. Desempenho de
novilhos Angus, Devon e cruzas Angus x
Devon x Nelore em confinamento. Revista
Semina, v.28, n.1, p. 135-142, 2007.
GOTTSCHALL, C.S. et al. Avaliação de três
28
diferentes categorias de bovinos de corte terminados em regime de confinamento. Revista Brasileira de Saúde e Produção Animal.
v.8, n.2, p.61-70, 2007.
NATIONAL RESEARCH COUNCIL.
(NRC). Nutrient requeriments of beff
cattle. 7.ed. Washington: National Academy
Press, 1996.
PACHECO, P.S. et al. Desempenho de novilhos jovens e superjovens de diferentes grupos genéticos terminados em confinamento.
Revista Brasileira de Zootecnia, v. 34, n.3,
p.963-975, 2006.
RESTLE, J. et al Apreciação econômica da
terminação em confinamento de novilhos Red
Angus superjovens abatidos com diferentes
pesos. Revista Brasileira de Zootecnia, v.36,
n.4, p.978-986, 2007.
ROCHA, M.G. et al. Produção animal e retorno econômico da suplementação em pastagem de aveia e azevém. Ciência Rural,
v.33, n.3, 2003.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Identificação da microbiota da orofaringe e cloaca
em filhotes de arara-azul-grande (Anodorhynchus
hyacinthinus) de vida livre do Pantanal-MS
MÁRCIA REGINA LOIKO1
FERNANDA DE SOUZA ABILHEIRA2
NEIVA ROBALDO GUEDES3
DANIEL THOMPSEN PASSOS4
TANIA DE AZEVEDO WEIMER5
SÉRGIO JOSÉ DE OLIVEIRA6
MARIÂNGELA DA COSTA ALLGAYER7
RESUMO
Estudos relacionados com sanidade estão sendo realizados para a conservação da arara-azul-grande
(Anodorhynchus hyacinthinus) em vida livre. Amostras de cloaca e orofaringe de 14 filhotes foram analisadas através de métodos microbiológicos padronizados. Bactérias Gram negativas e leveduras estão presentes na microbiota dos filhotes sadios desta espécie, sendo os microrganismos Staphylococcus sp., Escherichia
coli , Enterococcus sp., Klebsiella sp., Enterobacter sp., Pseudomonas sp. e leveduras presentes na
cloaca e orofaringe, enquanto Proteus sp. ocorreu apenas em orofaringe e Salmonella sp. em cloaca.
Palavras-chave: arara-azul-grande, Anodorhynchus hyacinthinus, microbiota, cloaca, orofaringe.
1
Acadêmico do Curso de Medicina Veterinária/ULBRA – Aluna de Iniciação Científica voluntária PROICT/ULBRA
5
Professora do Curso de Medicina Veterinária/ULBRA, do
PPG em Genética e Toxicologia Aplicada/ULBRA
2
Aluna da Residência Médico Veterinária/ULBRA
6
Professor do Curso de Medicina Veterinária/ULBRA
3
Professora do Curso de Biologia/UNIDERP, Presidente do
Instituto Arara Azul
7
4
Professor do Curso de Medicina Veterinária/ULBRA e do
PPG em Genética e Toxicologia Aplicada/ULBRA
Professora - Orientadora do Curso de Medicina Veterinária/ULBRA e Doutoranda em Genética e Toxicologia Aplicada/ULBRA ([email protected])
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
29
ABSTRACT
Investigations about the health status of wildlife Hyacinth Macaw (Anodorhynchus hyacinthinus)
have being performed in order to contribute to conservation program of this species. Cloaca and oropharynx
samples were obtained from 14 nestlings and analyzed with standard microbiological methods. Gram
negative bacteria and yeasts occurred in normal nestling of this species, the isolated microorganisms being
Staphylococcus sp., Escherichia coli, Enterococcus sp., Klebsiella sp., Enterobacter sp., Pseudomonas
sp., and yeasts from cloaca and oropharynx, while Proteus sp. occurred only in oropharynx and Salmonella
sp. only in cloaca.
Keywords: Hyacinth Macaw, Anodorhynchus hyacinthinus, microbiota, cloaca, oropharynx.
INTRODUÇÃO
Uma das questões mais relevantes no contexto atual é a conservação do meio ambiente,
em especial a biodiversidade e o patrimônio natural. Uma das ferramentas crescentes em importância para a conservação desta
biodiversidade é a “Medicina da Conservação”,
em outras palavras, o trabalho médico-veterinário aplicado aos conceitos e necessidades
conservacionistas. Neste contexto, o estudo das
enfermidades infecciosas afetando animais selvagens ganha especial destaque, devido às doenças exercerem importante e crescente impacto sobre as populações nativas e mantidas
em cativeiro.
A determinação da prevalência e da distribuição de patógenos, especialmente os
transmissíveis nas populações selvagens é tarefa
urgente e prioritária (OTTO, 1998). Ballou et
al. (2000) ressaltaram que a qualificação e
quantificação do risco da ocorrência de uma
determinada enfermidade, e conseqüentemente de seu impacto sobre a biodiversidade, estão
subordinadas ao conhecimento das informações
epidemiológicas dos agentes mórbidos e de suas
relações com os hospedeiros potenciais.
30
Segundo Catão-Dias (2003) no Brasil, em
virtude de sua magnífica biodiversidade e do
estado delicado em que muitas espécies animais
se encontram, é urgente o desenvolvimento de
pesquisas, além do apoio às já existentes, que
investiguem a ocorrência natural de patógenos
e suas correspondentes enfermidades. Atualmente, com a constante ação antrópica sobre o meio
ambiente e a conseqüente degradação da natureza, a compreensão dos processos naturais das
doenças nos animais, suas dinâmicas e impactos
nas populações selvagens, é uma ferramenta
valiosa em prol da conservação de nossa
riquíssima biodiversidade.
No Brasil, cerca de 20 % dos psitacídeos encontram-se na lista dos animais ameaçados de
extinção. A arara-azul-grande (Anodorhynchus
hyacinthinus) é o maior exemplar da família
Psittacidae (SICK, 1997) e encontra-se nesta lista, mas sua situação começou a mudar com as
atividades do Projeto Arara Azul no PantanalMS. Vários estudos foram e estão sendo realizados com esta arara e uma série de conhecimentos sendo adquiridos sobre a espécie em vida livre. Dentro destes estudos vale a pena ressaltar a
necessidade de aquisição de dados relacionados
à sanidade desta espécie, pois durante os 17 anos
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
do projeto poucas pesquisas foram direcionadas
ao monitoramento sanitário. Dentre elas podemos citar os relatos associados à infestação por
larvas de Philornis sp. (GUEDES et al., 2000), pesquisa de endoparasitos (ARAÚJO et al., 2000;
ALLGAYER et al., 2004a), detecção de Salmonella
Bredney em vísceras (VILELA et al., 2001),
epidemiologia da Chlamydophila psittaci (RASO
et al., 2006) e pesquisa de hemoparasitos
(ALLGAYER et al., 2004b).
Dados microbiológicos de populações naturais
ainda são escassos na literatura científica, mas
podem vir a contribuir para a conservação in situ
e ex situ das espécies ameaçadas de extinção uma
vez que permitirá o monitoramento da saúde dos
animais e ajustes no manejo em cativeiro ou em
ambiente natural alterado. Os neonatos de aves,
teoricamente, deverão ser estéreis no momento
da eclosão, sendo colonizados a partir das bactérias presentes na alimentação e no seu ambiente
(CLUBB, 1997; RUPLEY, 1999). Dessa forma, as
culturas bacterianas e fúngicas são de extrema
importância, pois propiciam o monitoramento do
filhote e do ambiente. A determinação e avaliação da microbiota gastrintestinal e do trato respiratório superior dos filhotes saudáveis e a detecção
de infecções podem ser realizadas através de colorações de Gram e culturas de cloaca e orofaringe
(FLAMMER & CLUBB, 1994; OGLESBEE &
BISHOP, 1998).
Dentro desse contexto ecológico de saúde, este
trabalho realizou o monitoramento sanitário dos
filhotes de vida livre da arara-azul-grande do Pantanal (Anodorhynchus hyacinthinus), através da
determinação da microbiota associada à orofaringe
e cloaca, visando à conservação da espécie.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram avaliados 14 filhotes de arara-azulgrande do Pantanal (Anodorhynchus
hyacinthinus), nascidos durante a estação
reprodutiva 2006 no Pantanal de Miranda - Mato
Grosso do Sul. As coletas foram realizadas no
momento em que os filhotes foram retirados do
ninho, para os procedimentos de biometria e
identificação, realizados rotineiramente pelo
Projeto Arara Azul. Foram coletados 1 “swab”
de cloaca e 1 “swab” de orofaringe de cada
ninhego, estas amostras foram mantidas em meios
de transporte StuartMR, sob refrigeração e enviados ao Laboratório de Microbiologia do Hospital Veterinário da ULBRA-RS.
Os “swabs” foram semeados em placas de
Ágar sangue e Ágar Mac Conkey, incubadas em
aerobiose por 24hs a 37°C e em placas com meio
Dermasel incubadas a 25°C em aerobiose por 4
dias segundo a técnica citada por Hirsch & Zee
(2003) e Barrow & Felthan (1993). Placas do
material inoculado em Ágar sangue foram incubadas em anaerobiose por 48hs à 37ºC, visando à identificação de bactérias anaeróbias (OLIVEIRA, 2000).
As colônias bacterianas foram classificadas
pelo crescimento nos meios sólidos, ocorrência
de hemólise, coloração por Gram, testes
bioquímicos de Indol, vermelho metila (VM),
Voges Proskauer (VP), utilização de citrato,
utilização de uréia, formação de H2S, utilização
de glicose, prova de catalase e prova de oxidase
(OLIVEIRA, 2000). Algumas bactérias isoladas
foram enviadas à Fundação Instituto Oswaldo
Cruz (FIOCRUZ) para certificação.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
31
RESULTADOS E
DISCUSSÃO
Os resultados obtidos através das culturas das
14 amostras coletadas da cloaca e orofaringe dos
filhotes estão apresentados na Tabela 1. Podese verificar que, em geral, os microrganismos
foram mais freqüentes em orofaringe que em
cloaca, sendo os mais comuns, E. coli (86% na
orofaringe e 43% na cloaca), Enterobacter sp.
(64% em orofaringe, 21% em cloaca) e levedura (93% em cloaca e 86 % em orofaringe).
A microbiota aeróbica cloacal nos filhotes
saudáveis de psitacídeos mantidos em cativeiro está constituída quase que exclusivamente
por bactérias Gram positivas dos gêneros
Lactobacillus spp., Bacillus spp., Corynebacterium
spp.,
Streptococcus
não -hemolítico,
Staphylococcus spp., Micrococcus spp. (CLUBB,
1997; FLAMMER & CLUBB, 1994; RUPLEY,
1999), Streptomyces spp. (OGLESBEE &
BISHOP, 1998), Corynebacterium spp. e Gaffkya
spp. (FLAMMER & DREWES, 1988; HOEFER,
1997). Nesta pesquisa foram isoladas um maior
percentual de bactérias Gram negativas em filhotes de vida livre da arara-azul-grande do Pantanal clinicamente sadias. Este resultado está
de acordo com Clubb (1997) e Oglesbee &
Bishop (1998) que relataram que as bactérias E.
coli, Klebsiella spp. e Enterobacter spp. podem estar presentes na microbiota de filhotes clinicamente sadios, e seu isolamento não requer necessariamente tratamento. No entanto vale ressaltar que as bactérias Escherichia coli, Klebsiella
spp., Enterobacter spp., Pseudomonas spp., Proteus
spp., Salmonella spp., Campylobacter spp.,. e leveduras em brotamento são consideradas
patógenos primários ou potencialmente oportunistas (CLUBB, 1997; FLAMMER & CLUBB,
1994; OGLESBEE & BISHOP, 1998). As leveduras e fungos fazem parte da microbiota natural das aves, sendo consideradas comensais no
trato gastrintestinal e na pele (GODOY, 2006).
Tabela 1 - Bactérias isoladas da cloaca e orofaringe de 14 filhotes de vida livre de arara-azul-grande do
Pantanal-MS na estação reprodutiva de 2006.
32
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Na avaliação da microbiota cloacal normal de
19 filhotes de vida livre de papagaios-de-cara-roxa
(Amazona brasiliensis) Serafini et al. (2005) isolaram Escherichia coli, Pseudomonas spp., Proteus vulgaris,
Enterobacter spp., Enterobacter aglomerans,
Enterobacter aerogenes Enterobacter cloacae, Providencia spp., Citrobacter diversus, Citrobacter amalonaticus,
Staphylococcus spp., Streptomyces spp. e Candida spp.
Os resultados estão de acordo com os obtidos no
presente trabalho, evidenciando a presença de bactérias Gram negativas além das Gram positivas.
As bactérias detectadas na orofaringe dos filhotes não diferiram das bactérias isoladas da cloaca
com exceção da presença de Proteus sp. e ausência de Salmonella sp. Esta constatação se deve ao
fato do ambiente do ninho estar contaminado com
fezes e dessa forma promover a ocorrência de contaminação da orofaringe por estas enterobactérias.
Pesquisas realizadas em vida livre têm demonstrado que a presença de bactérias Gram
negativas parece ser normal na microbiota de
aves saudáveis. Estes achados discordam dos
autores Flammer & Drewes (1988) e Hoefer
(1997) que consideraram a colonização do trato
gastrintestinal com bactérias Gram negativas
como um sinal de doença e recomendam a terapia com drogas antimicrobianas. No entanto,
Clubb (1997) ressalta que a decisão da necessidade de instituir uma terapia deve ser realizada
através de uma análise criteriosa entre avaliação clínica, outros testes diagnósticos,
parâmetros ambientais e experiência clínica.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os filhotes avaliados neste estudo tiveram
seus parâmetros de desenvolvimento dentro do
normal e abandonaram o ninho na idade esperada (100-110 dias) não ocorrendo morbidade e
mortalidade de nenhuma arara até esta data.
Estes resultados evidenciam que a presença de
bactérias Gram negativas é normal na microbiota
de filhotes de vida livre de arara-azul-grande
do Pantanal.
O estudo da ecologia desta espécie associada às pesquisas direcionadas ao monitoramento
sanitário é vital para sua conservação, pois possibilita um conhecimento do estado sanitário da
população de vida livre da arara-azul-grande do
Pantanal. Permitindo verificar quais microrganismos estão naturalmente presentes na sua
microbiota e estabelecer seu potencial
patogênico que possa vir a afetar a saúde de indivíduos e populações mediante alterações
ambientais.
REFERÊNCIAS
ALLGAYER, M.C. et al. Parasitológico de
fezes em filhotes de arara-azul-grande
(Anodorhynchus hyacinthinus) no Pantanal. In:
CONGRESSO DA SOCIEDADE DE ZOOLÓGICOS DO BRASIL, 28., 2004, Rio de
Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Sociedade
de Zoológicos do Brasil, 2004.
ALLGAYER, M.C. et al. Pesquisa de
hemoparasitos em filhotes de arara-azul-grande (Anodorhynchus hyacinthinus) no Pantanal.
In: CONGRESSO DA SOCIEDADE DE ZOOLÓGICOS DO BRASIL, 28., 2004, Rio de
Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Sociedade
de Zoológicos do Brasil, 2004.
ARAÚJO, C.P. et al. Pesquisa de parasitos
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
33
em fezes de filhotes de arara-azul
(Anodorhynchus hyacinthinus). In: ENCONTRO DE BIÓLOGOS DO CRB-1 (SP, MT,
MS), 11., 2000, São Pedro-SP. Anais... São
Paulo: CRB-1 (SP, MT, MS), 2000.
BALLOU, J.D. Infectious disease risk
assessment in captive propagation,
reintroduction and wildlife conservation.
Proceedings of the 7th World Conference on
Breeding Endangered Species, p.63-76, 1999.
BARROW, G.I.; FELTHAM, R.K.A. Manual for the identification of Medical Bacteria.
Cambridge: Cambridge University Press,
1993. p.90-137.
CATÃO-DIAS, J.L. Doenças e seus impactos sobre a biodiversidade. Ciência e Cultura, v.55, n.3, p. 32-34, 2003.
CLUBB, S.L. Psittacine pediatric husbandry
and medicine. In: ALTMAN, R.B. et al.
Avian medicine and surgery. Philadelphia:
W. B. Saunders Company, 1997.
FLAMMER, K.; CLUBB, S.L. Neonatology.
In: RITCHIE, B.W.; HARRISON,
G.J..; HARRISON, L.R. Avian medicine:
principles and application. Florida: Wingers
Publisching, Inc, 1994.
FLAMMER, K.; DREWES, L.A. Speciesrelated differences in the incidence of Gramnegative bacteria isolated from the cloaca of
clinically normal psittacine birds. Avian
Diseases, v.32, p.79-83, 1988.
GUEDES, N.M.R. et al. Filhotes de arara-azul
(Anodorhynchus hyacinthinus) com infestação
por larvas de Philornis no Pantanal Sul, Brasil.
In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ORNI-
34
TOLOGIA, 9., 2001, Curitiba. Ornitologia
Brasileira do Século XX. Curitiba: Museu
de História Natural, p.331-332, 2001.
GODOY, S.N. Doenças bacterianas. In:
CUBAS, Z.S.; SILVA, J.C.R.; CATÃODIAS, J.L. Tratado de Animais Selvagens –
Medicina Veterinária. São Paulo: Roca, 2006.
HIRSCH, D.C.; ZEE, Y.C. Microbiologia
Veterinária. Rio de Janeiro: Editora
Guanabara Koogan S.A., 2003.
HOEFER, H.L. Disease of the
gastrointestinal tract. In: ALTMAN, R.B. et
al. Avian medicine and surgery.
Philadelphia: W. B. Saunders Company, 1997.
OGLESBEE, B.L.; BISHOP, C.L. Doenças
infecciosas aviárias. In: BICHARD, S.J.;
SHERDING, R.G. Manual Saunders: Clínica de Pequenos Animais. São Paulo: Roca,
1998.
OLIVEIRA, S.J. Microbiologia Veterinária
– Guia Bacteriológico prático. 2.ed. Canoas:
Editora da ULBRA, 2000.
OTTO, A.A. Psittacosis outbreak in Costa
Rica associated with pet birds imported from
the United States. Proceedings of the Joint
Meeting of the American Association of
Zoo Veterinarians and American
Association of Wildlife Veterinarians, 1998.
p.258-260.
RASO, T.F. et al. Chlamydophila psittaci in
free-living blue-fronted amazon parrot (Amazona aestiva) and Hyacinth macaws
(Anodorhynchus hyacinthinus) in the Pantanal of Mato Grosso do Sul, Brazil. Veterinary
Microbiology, v. 117, p.235-241, 2006.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
RUPLEY, A.E. Manual de Clínica Aviária.
São Paulo: Roca, 1999.
SICK, H. Ornitologia Brasileira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997.
SERAFINI, P.P. et al. In: CONGRESSO DA
SOCIEDADE DE ZOOLÓGICOS DO BRASIL19., 2005, Camboriú. Anais... Camboriú:
Sociedade de Zoológicos do Brasil, 2005.
VILELA, V.O. et al. Salmonella Bredney em
Arara-Azul Anodorhynchus hyacinthinus, In:
ORNITOLOGIA sem Fronteiras. Curitiba:
Ed. Straub, 2001.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
35
Ciências Biológicas
38
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Avaliação da atividade genotóxica/antigenotóxica
de Arrabidaea chica
SHANDALE EMANUELE CAPPELARI1
CÂNDIDA LÜDTKE1
JULIANE GARCIA SEMEDO2
VIVIAN FRANCÍLIA SILVA KAHL3
THAIS BASSO LONGO4
MARC FRANÇOIS RICHTER5
PATRÍCIA PEREIRA5
ALEXANDRE DE BARROS FALCÃO FERRAZ5
JAQUELINE NASCIMENTO PICADA6
RESUMO
A planta Arrabidaea chica é utilizada na medicina popular como analgésica, antiinflamatória, agente
adstringente e para o combate de enfermidades da pele. Neste trabalho foram avaliadas as atividades
genotóxicas e antigenotóxicas do extrato bruto (500, 1000 e 2000 mg/Kg/dia) e frações aquosa, butanólica
e clorofórmica (1000 mg/kg/dia), obtidos das partes aéreas de A. chica, através do teste cometa em
camundongos CF-1. Não houve indução de danos ao DNA pelo extrato bruto ou frações de A chica,
tanto no sangue periférico quanto no fígado dos animais tratados. O extrato bruto e a fração clorofórmica
Acadêmica do Curso de Biomedicina/ULBRA – Bolsista
FAPERGS
4
Aluna de Pós Graduação em Genética e Toxicologia Aplicada/ULBRA.
Acadêmica do Curso de Biomedicina/ULBRA – Bolsista PIBIC/
CNPq
5
Professor(a) do Curso de Farmácia e Biomedicina/ULBRA
e do PPG em Genética e Toxicologia Aplicada/ULBRA.
Acadêmica do Curso de Biologia/ULBRA – Bolsista
PROICT/ULBRA
6
Professora-Orientadora do Curso de Farmácia e
Biomedicina e do PPG em Genética e Toxicologia Aplicada
([email protected])
1
2
3
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
39
protegeram o DNA contra danos oxidativos induzidos pelo peróxido de hidrogênio, sugerindo efeito
antigenotóxico por mecanismos antioxidantes.
Palavras-chave: Arrabidaea chica, genotoxicidade, antigenotoxicidade.
ABSTRACT
The plant Arrabidaea chica is used in popular medicine as analgesic, anti-inflamatory, astringent
agent and to treat skin diseases. In this study, genotoxic and antigenotoxic activities of crude extract (500,
1000 and 2000 mg/kg/day) and water, butanolic and chloroformic fractions (1000mg/kg/day), obtained
from the aerial parts of A.chica, were evaluated by comet assay in CF-1 mice. There was not DNA
damage induction by crude extract or A. chica fractions in the peripheral blood and in the liver of the
treated animals. The crude extract and the chloroformic fraction protected DNA against oxidative damages
induced by hydrogen peroxide, suggesting antigenotoxic effect by antioxidant mechanisms.
Keywords: Arrabidaea chica, genotoxicity, antigenotoxicity.
INTRODUÇÃO
Arrabidaea chica pertence à família
Bignoniaceae (sin: Bignonia chica (Bonpl.)) que
consiste em aproximadamente 120 gêneros e
800 espécies de plantas arbustivas, arbóreas e
trepadeiras. A família Bignoniaceae é conhecida por conter uma grande variedade de plantas com ocorrência no cerrado brasileiro. A
espécie Arrabidaea chica ocorre no Brasil desde a Amazônia até o Rio Grande do Sul
(TAKEMURA et al., 1995). Alguns representantes deste gênero como a Arrabidaea
samydoides, A. brachypoda e A. triplinervia demonstraram efeito antioxidante (PAULETTI et
al., 2003b), atividade antifúngica (ALCERITO
et al., 2002) e atividade contra doença de Chagas (LEITE et al., 2006), respectivamente.
Arrabidaea chica é popularmente chamada de
carajuru, chica, pariri ou cajiru, sendo amplamente utilizada na medicina popular, principal-
40
mente na região Amazônica (REITZ, 1974;
TAKEMURA et al., 1995; ZORN et al., 2001).
Suas folhas apresentam atividades analgésica,
antiinflamatória e adstringente (SILVA et al.,
2007) e são utilizadas em cólicas intestinais, diarréia sanguinolenta, leucorréia, anemia e
leucemia. Também é utilizada topicamente para
combater as enfermidades da pele
(TAKEMURA et al., 1995; ZORN et al., 2001).
Com base na literatura científica, verificase que existem poucos relatos de estudos químicos do gênero Arrabidaea, sendo A. chica a espécie mais estudada. A partir desta espécie foram isolados fitoesteróis (TAKEMURA, 1993),
taninos e principalmente flavonóides
(TAKEMURA et al., 1995; ALCERITO et al.,
2002; PAULETTI et al., 2003a). CHAPMAN
et al. (1927) identificaram o primeiro composto
de A. chica, denominado carajurina. Posteriormente, os trabalhos de Harbone (1967) e Scogin
(1980) relataram que a presença de um raro pig-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
mento vegetal em Bignoniaceae era restrito à
espécie A. chica. Em estudo realizado por Zorn
et al. (2001), a partir do extrato éter etílico das
folhas de A. chica, foram isoladas e identificadas
quatro antocianidinas, entre elas a carajurina e
carajurona. Outro composto chamado
carajuflavona foi obtido a partir da fração acetato
de etila do extrato metanólico das folhas de A.
chica (TAKEMURA et al., 1995).
As folhas de A. chica fornecem um corante
vermelho-escuro ou vermelho tijolo (vermelho
carajuru), insolúvel na água e solúvel no álcool e
no óleo (REITZ, 1974). Uma das substâncias presentes neste corante avermelhado foi identificada
como sendo carajurina (6,7-dihidroxi-5,4´dimetoxi-flavilium) (ZORN et al., 2001;
PAULETTI et al., 2003a). No norte do Brasil, o
corante das folhas é utilizado em tatuagens pelos
índios (PAULETTI et al., 2003b). Alguns estudos como de Magalhães (UNICAMP), avaliam a
possibilidade do desenvolvimento do batom de
A. chica. O pigmento vermelho produzido por esta
planta é estável, possuindo vantagens sobre
corantes como o urucum, pelo fato de resistir à
degradação, sendo potencialmente interessante
para compor formulações de cosméticos em geral
(www.inova.unicamp.br). Outro estudo da planta A. chica realizado por Barata e colaboradores
(UNICAMP, 2006) avalia a possibilidade do emprego de A. chica na forma de extrato fitoterápico
para uso como antifúngico e antibacteriano
(www.inova.unicamp.br).
Tendo em vista que A. chica é utilizada popularmente e não há relatos de estudos avaliando as propriedades biológicas ou a toxicidade
desta planta, este trabalho se propôs a avaliar a
atividade genotóxica/antigenotóxica do extrato bruto e frações das partes aéreas de A. chica.
MATERIAL E MÉTODOS
Material vegetal
As partes aéreas de A. chica (Bignoniaceae)
foram coletadas no município de Taquari no
Estado do Rio Grande do Sul. O material, imediatamente após a coleta, foi selecionado, e seco
em ambiente arejado e ao abrigo de luz direta e
triturado em moinhos de facas.
Extração e fracionamento
As partes aéreas (100 gramas) de A. chica
foram submetidas à decocção em água destilada (1000ml), obtendo-se o extrato bruto, onde
parte deste extrato foi submetido à secura no
aparelho de rotavapor e denominado extrato
bruto (EB). A seguir, utilizando o restante da
solução do EB, foi realizado o fracionamento
utilizando solventes em polaridade crescente
(clorofórmio, butanol e água). Os extratos obtidos foram concentrados à secura em aparelho de rotavapor e denominados, fração
clorofórmica (FC), fração butanólica (FB) e fração aquosa (FA). Para administração nos animais os extratos secos foram diluídos posteriormente em solução salina (NaCl 0,9%).
Animais Experimentais
Foram utilizados 70 camundongos CF-1 machos e fêmeas oriundos do Biotério da Universidade Luterana do Brasil, ULBRA, Canoas,
RS. Os animais foram mantidos a 22ºC, com
ciclo claro 12h/escuro 12h, durante todo o período experimental, com alimentação e água a
vontade.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
41
Tratamento dos animais
Os animais foram divididos em 7 grupos de
10 animais, sendo 5 machos e 5 fêmeas por grupo, tratados por 3 dias consecutivos e sacrificados no 4º. Dia. Os grupos foram: controle negativo: solução salina (NaCl 0,9%); extrato bruto
a 500, 1000 e 2000 mg/Kg/dia; fração butanólica
a 1000 mg/Kg/dia; fração clorofórmica a 1000
mg/Kg/dia e fração aquosa a 1000 mg/Kg/dia.
As administrações foram feitas pela via oral
(gavagem) e ajustadas ao peso de cada animal
sendo de 0,1ml/ 10g de peso do camundongo.
Amostras
Foram coletadas amostras de sangue total da
cauda dos animais após 3h e 24h da primeira
administração (1º.dia), através da veia caudal.
O sangue foi colocado em tubos tipo Eppendorf
contendo heparina (12 μL para cada 50 μL de
sangue total). No 4ºdia, os animais foram sacrificados por decapitação para coleta de amostras
de sangue e fígado.
Teste cometa
Utilizou-se a versão alcalina (pH>13) do
teste cometa conforme descrito em Tice et al.
(2000). Uma alíquota de 5 microlitros de sangue ou de suspensão de fígado (em PBS) foi
misturada com 95 microlitros de agarose “low
melting” 0,75% e a mistura foi colocada sobre
lâminas pré-cobertas com agarose normal a
1,5%. Para avaliação da atividade
antigenotóxica, as lâminas foram tratadas com
solução de peróxido de hidrogênio (H 2 O 2 )
0,20 mM em PBS, por 5 minutos a 4°C, e após
lavadas três vezes com solução salina (NaCl
0,9%), conforme o procedimento ex vivo des-
42
crito em Pereira et al. (2005). Em seguida, todas as lâminas foram mergulhadas em uma solução de lise (2,5 M NaCl, 100 mM EDTA e
10 mM Tris, pH 10 com adição de 1% Triton
X-100 e 10% DMSO na hora do uso), por no
mínimo 1 hora até no máximo 72 horas a 4oC,
para o rompimento das membranas celulares.
Posteriormente, as lâminas foram incubadas
em tampão alcalino (300 mM NaOH e 1 mM
EDTA, pH > 13) por 20 minutos para permitir a desnaturação do DNA. E após este período foi realizada a eletroforese com aplicação
de corrente elétrica de 300 mA e 25 V (0,90
V/cm) por 15 minutos. As lâminas foram neutralizadas com tampão Tris 0,4 M, pH 7,5, coradas com nitrato de prata, conforme descrito
em Nadin et al. (2001) e analisadas ao microscópio ótico.
Os resultados foram expressos em índice de
danos (ID) e freqüência de danos (FD). O ID
foi obtido pela avaliação visual das classes de
dano (de 0, sem dano aparente a 4, com máximo dano), em 100 células analisadas por tratamento. Foram classificados como sendo de classe
zero os núcleos intactos, que apareceram redondos. Já nas células lesadas, o DNA livre que
migrou do núcleo em direção ao ânodo, durante a eletroforese, foi visualizado como uma
“cauda” de fragmentos sedimentados, semelhante a um cometa e foram classificadas em
classes 1 (dano mínimo) a 4 (dano máximo).
Assim o ID pode variar de 0 (todas as células
da classe zero: 0 X 100) a 400 (todas as células
com classe quatro: 4 X 100). FD foi calculada
baseada no número de células com dano versus
aquelas sem dano (TICE et al., 2000; NADIN
et al., 2001; HARTMANN et al.,2003).
Os dados da avaliação do potencial
antigenotóxico foram também expressos como
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
percentuais de inibição do índice de dano (ID)
de acordo com a expressão: (I%): porcentagem
de inibição do ID = [ ID do H2O2 – ID do
extrato com H2O2 ] / [ ID do H2O2 – ID do
controle negativo] x 100 (KAPISZEWSKA et
al. 2005).
Análise Estatística
A análise estatística foi conduzida utilizando
análise de variância (ANOVA) com o teste Post
Hoc de Dunnett. Foram considerados genotóxicos
os tratamentos que aumentaram significativamente ID ou FD em relação ao tratamento com o controle negativo, com valores de P ≤ 0,05 e
antigenotóxicos os tratamentos que diminuíram significativamente os danos induzidos pelo peróxido
de hidrogênio, com valores de P ≤ 0,05 e de forma
dose-dependente.
RESULTADOS E
DISCUSSÃO
A versão alcalina do teste cometa, utilizada
neste trabalho, detecta quebras de fita simples e
dupla no DNA, sítios alcali-lábeis e crosslinks (TICE
et al., 2000). Como mostra a Tabela 1, o extrato
bruto e frações de A. chica não induziram danos ao
DNA em sangue periférico após 3 h e 24 h da aplicação da primeira dose dos extratos e frações de A
chica, em nenhum dos grupos experimentais. Mesmo com o tratamento por três dias consecutivos (3
x 2000 mg/Kg), o extrato bruto não induziu danos
ao DNA em sangue e fígado (Tabela 2). As frações (3 x 1000 mg/Kg) também não induziram danos (Tabela 2). Apenas foi observada uma redução significativa da FD no tecido hepático, em comparação com o controle negativo, pelo extrato bruto na dose de 500 mg/Kg/dia e 2000 mg/Kg/dia,
somente em camundongos machos (Tabela 2).
Tabela 1 - Avaliação da atividade genotóxica em camundongos tratados com dose única de extratos de Arrabidaea chica.
Controle EB : controle extrato bruto – solução salina 0,9% (solvente dos extratos).
Controle FR: controle frações – solução salina 0,9% (solvente dos extratos).
a
a
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
43
b
EB 500 (extrato bruto na dose de 500 mg/Kg);cEB 1000 (extrato bruto na dose de 1000 mg/Kg); dEB 2000 (extrato bruto na dose de
2000 mg/Kg); eFB 1000 (fração butanólica na dose de 1000 mg/Kg); fFC 1000 (fração clorofórmica na dose de 1000 mg/Kg); gFA 1000
(fração aquosa na dose de 1000 mg/Kg) (Resultados – média ± desvio padrão).
Amostras de sangue periférico 3 horas, 24 horas após aplicação da dose em camundongos machos e fêmeas.
Índice de dano – de zero (sem dano, 100 células X 0) a 400 (com máximo de dano, 100 X 4).
Freqüência de dano – calculada baseada no número de células com dano versos aquelas sem dano.
*p≤0,05 ; **p≤0,01
Tabela 2 - Avaliação da atividade genotóxica em camundongos tratados por 3 dias consecutivos com os
extratos de Arrabidaea chica.
Controle EB : controle extrato bruto – solução salina 0,9% administrada por 3 dias consecutivos(solvente dos extratos).
Controle FR: controle frações – solução salina 0,9% administrada por 3 dias consecutivos (solvente dos extratos).
b
EB 3x 500 (extrato bruto na dose de 500 mg/Kg/dia por 3 dias);cEB 3x 1000 (extrato bruto na dose de 1000 mg/Kg/dia por 3 dias); dEB
3x 2000 (extrato bruto na dose de 2000 mg/Kg/dia por 3 dias); eFB 3x 1000 (fração butanólica na dose de 1000 mg/Kg/dia por 3 dias);
f
FC 3x 1000 (fração clorofórmica na dose de 1000 mg/Kg/dia por 3 dias); gFA 3x 1000 (fração aquosa na dose de 1000 mg/Kg/dia por 3
dias) (Resultados – média ± desvio padrão).
Amostras de sangue e de fígado no sacrifício (24 horas após aplicação da última dose dos extratos) em camundongos machos e fêmeas.
Índice de dano – de zero (sem dano, 100 células X 0) a 400 (com máximo de dano, 100 X 4).
Freqüência de dano – calculada baseada no número de células com dano versos aquelas sem dano.
*p≤0,05 ; **p≤0,01
a
a
No procedimento para avaliação do efeito
antigenotóxico, após o tratamento dos animais
com o extrato bruto ou frações de A chica, as
amostras de tecidos foram tratadas com
peróxido de hidrogênio. Este método, chamado de ex vivo, é utilizado na determinação da
antigenotoxicidade de substâncias com poten-
44
cial antioxidante, que podem proteger as células dos efeitos genotóxicos induzidos por lesões oxidativas ao DNA (PEREIRA et al.,
2005). O DNA é especialmente sensível à ação
do peróxido de hidrogênio, que induz danos mediados por íons metálicos como ferro e cobre
através da reação de Fenton para formação do
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
radical HO· (KARIHTALA e SOINI, 2007).
Após geração do radical HO·, que é extremamente reativo, ocorrem lesões ao DNA que
incluem modificações de bases nitrogenadas,
quebras simples e duplas de fita (BARBOUTI
et al., 2001).
Como mostra a tabela 3, as frações não apresentaram atividade antigenotóxica após 3 horas
da administração de 1000 mg/Kg. Entretanto,
com o tratamento de 2000 mg/Kg de extrato
bruto houve aumento do ID e FD em sangue
periférico de fêmeas. Porém, após três dias consecutivos de tratamento com extrato bruto,
houve redução significativa do ID e FD de
forma dose-dependente, em sangue de camundongos machos, sugerindo proteção contra danos oxidativos induzidos pelo peróxido
de hidrogênio (Tabela 4). Este efeito não foi
tão pronunciado em camundongos fêmeas, pois
somente a dose máxima de EB foi estatisticamente significante, alcançando I% de 66,6%.
A ação antigenotóxica do EB pode estar ligada à presença de flavonóides, já relatada por
Takemura et al., (1995), no extrato metanólico
das folhas de A. chica. Tendo em vista que os
flavonóides possuem a habilidade de seqüestrar radicais livres como o ânion superóxido,
o radical hidroxil e peroxil (RICE-EVANS et
al., 1996), pode-se sugerir que a presença
desta classe de compostos no extrato bruto
esteja relacionada com a atividade
antigenotóxica deste extrato.
Em adição aos resultados de EB, a FC, no
tratamento por 3 dias consecutivos, conferiu
proteção contra danos oxidativos em amostras
de sangue dos camundongos machos, com I%
de 79,2%, porém esta fração não apresentou
efeito nas fêmeas. As frações aquosa (FA) e
butanólica (FB) não reduziram ID e FD, em
relação ao controle positivo. No tecido hepático, tanto o extrato bruto quanto as frações
não apresentaram atividades antigenotóxicas
(Tabela 4).
É possível que o efeito antigenotóxico da
fração clorofórmica seja devido à presença
de antocianidinas, anteriormente isoladas do
extrato éter etílico das folhas de A. chica
(ZORN et al., 2001). Pool-Zobel et al. (1999)
demonstraram que algumas antocianidinas
apresentam potencial antioxidante. Outros
estudos indicaram que as antocianidinas podem ser responsáveis pela proteção contra
radicais peroxil (WANG et al., 1999; AZEVEDO et al., 2007).
A proteção conferida pelos EB e FC ao DNA,
verificada pela ação antigenotóxica ex vivo (Tabela 4), pode ter ocorrido devido ao seqüestro de
radicais livres por compostos antioxidantes presentes nesses extratos, ativação de enzimas
antioxidantes durante o tratamento dos animais
e/ou ligação de componentes dos extratos com o
íon ferro, dificultando a reação de Fenton
(SZETO et al., 2002).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
45
Tabela 3 - Avaliação da atividade antigenotóxica em camundongos tratados com dose única de extratos de Arrabidaea chica.
Controle EB:controle extrato bruto–solução salina 0,9% (solvente dos extratos) + H2O2 (0,20 mM).
Controle FR: controle frações – solução salina 0,9% (solvente dos extratos) + H2O2 (0,20 mM).
b
EB 500 (extrato bruto na dose de 500 mg/Kg);cEB 1000 (extrato bruto na dose de 1000 mg/Kg); dEB 2000 (extrato bruto na dose de
2000 mg/Kg); eFB 1000 (fração butanólica na dose de 1000 mg/Kg); fFC 1000 (fração clorofórmica na dose de 1000 mg/Kg); gFA 1000
(fração aquosa na dose de 1000 mg/Kg) (Resultados – média ± desvio padrão).
Amostras de sangue periférico 3 horas, 24 horas após aplicação da dose em camundongos machos e fêmeas.
Índice de dano – de zero (sem dano, 100 células X 0) a 400 (com máximo de dano, 100 X 4).
Freqüência de dano – calculada baseada no número de células com cauda versos aquelas sem cauda.
*Valor significante = p<0,05; **Valor significante= p<0,01
a
a
CONCLUSÕES
AGRADECIMENTOS
O conjunto dos resultados indica que o extrato
bruto e frações butanólica, clorofórmica e aquosa
de partes aéreas de A. chica não apresentam atividade genotóxica em camundongos pelo teste cometa. O extrato bruto e a fração clorofórmica protegeram o DNA contra danos oxidativos induzidos
pelo peróxido de hidrogênio, sugerindo efeito
antigenotóxico por mecanismos antioxidantes.
46
Este trabalho teve o apoio financeiro da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico
e Tecnológico – CNPq e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul
– FAPERGS -, Brasil.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Tabela 4 - Avaliação da atividade antigenotóxica em camundongos tratados por 3 dias consecutivos com os
extratos de Arrabidaea chica.
Controle EB:controle extrato bruto–solução salina 0,9% (solvente dos extratos) + H2O2 (0,20 mM).
Controle FR: controle frações – solução salina 0,9% (solvente dos extratos) + H2O2 (0,20 mM).
b
EB 3x 500 (extrato bruto na dose de 500 mg/Kg/dia por 3 dias);cEB 3x 1000 (extrato bruto na dose de 1000 mg/Kg/dia por 3 dias); dEB
3x 2000 (extrato bruto na dose de 2000 mg/Kg/dia por 3 dias); eFB 3x 1000 (fração butanólica na dose de 1000 mg/Kg/dia por 3 dias);
f
FC 3x 1000 (fração clorofórmica na dose de 1000 mg/Kg/dia por 3 dias); gFA 3x 1000 (fração aquosa na dose de 1000 mg/Kg/dia por 3
dias) (Resultados – média ± desvio padrão).
h
I%: porcentagem de inibição do ID = [ ID do H2O2 – ID do extrato com H2O2 ] / [ ID do H2O2 – ID do controle negativo] x 100.
Amostras de sangue e de fígado no sacrifício (24 horas após aplicação da última dose dos extratos) em camundongos machos e fêmeas.
ID:Índice de dano – de zero (sem dano, 100 células X 0) a 400 (com máximo de dano, 100 X 4).
FD: Freqüência de dano – calculada baseada no número de células com dano versos aquelas sem dano.
*p≤0,05 ; **p≤0,01
a
a
REFERÊNCIAS
Toxicology, v.45, p. 852-858, 2007.
ALCERITO, T. et al. Foliar epicuticular wax
of Arrabidaea brachypoda: flavonoids and
antifungal activity. Biochemical Systematics
and Ecology, v.30, p. 677-683, 2002.
BARBOUTI, A. et al. Intracellular iron, but
not copper, plays a critical role in hydrogeninduced DNA damage. Free Radical
Biology & Medicine, v.31, p. 490-498, 2001.
AZEVEDO, L. et al. Differential response
related to genotoxicity between eggplant
(Solanum melanogena) skin aqueous extract
and its main purified anthocyanin
(delphinidin) in vivo. Food and Chemical
CHAPMAN, E.; PERKIN, A.G.;
ROBINSON, R. Journal of Chemical
Society, p. 3015, 1927.
HARBORNE,
J.B.
Comparative
Biochemistry of the Flavonoids. London:
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
47
Academic Press, 1967.
Journal of Nutrition, v.38, p. 227-234, 1999.
HARTMANN, A, et al. Recommendations
for conducting the in vivo alkaline Comet
assay. Mutagenesis, v.18, p. 45-51, 2003.
RICE-EVANS,
C.A.;
MILLER,
N.J.;PAGANGA, G. Structure–antioxidant
activity relantionship of flavonoids and
phenolic acids. Free Radical Biology &
Medicine, v. 20, p. 933-956, 1996.
KAPISZEWSKA, M. et al. The protective
ability of the mediterranean plant extracts
against the oxidative DNA damage. The role
of the radical oxygen species and the
polyphenol content. Journal of Physiology
and Pharmacology, v.56, p.183-197, 2005.
KARIHTALA, P.; SOINI, Y. Reactive oxygen
species and antioxidant mechanisms in
human tissues and their relation to
malignancies. APMIS, v. 115, p. 81-103, 2007.
LEITE, J.P.V. et al. Trypanocidal activity of
Triterpenes from Arrabidaea triplinervia and
derivates. Biological & Pharmaceutical
Bulletin, v.29, p.2307-2309, 2006.
NADIN, S.B.; VARGAS-ROIG, M.L.;
CIOCCA, D.R. A silver staining for singlecell gel assay. The Journal of Histochemistry
and Cytochemistry, v.49, p.1183-1186, 2001.
48
SANDWITH, N.Y.; HUNT, D.R.
Bignoniáceas. In: REITZ, P.R. Flora Ilustrada Catarinense. Itajaí, 1974.
SCOGIN, R. Anthocyanins of the
bignoniaceae. Biochemical Systematics and
Ecology, v. 8, p. 273-276, 1980.
SILVA, E.M. et al. Antioxidant activities and
polyphenolic contents of fifteen selected
plant species from Amazonian region. Food
Chemistry, v.101, p.1012-1018, 2007.
SZETO, Y.T.; COLLINS, A.R.; BENZIE,
I.F.F. Effects of dietary antioxidants on DNA
damage in lysed cells using a modified comet
assay procedure. Mutation Research, v. 500,
p.31-38, 2002.
PAULETTI, P.M.; BOLZANI, V.S.; YOUNG,
M. C.M. Constituintes Químicos de
Arrabidaea samydoides (Bignoniaceae). Química Nova, v.26, p.641-643, 2003.
TAKEMURA, O.S. Flavonóides em folhas
de Arrabidaea chica H&B Verlot. –
Bignoniaciae. 1993. Dissertação (Mestrado
em Botânica) - Departamento de Botânica, Universidade Federal do Paraná,
Curitiba, 1993.
PAULETTI, P.M. et al. New antioxidant Cglucosylxanthones from the stems of
Arrabidaea samydoides. Journal of Natural
Products, v.66, p. 1384-1387, 2003.
TAKEMURA, O.S. et al. Flavone from leaves
of
Arrabideaea
chica
f.
cuprea.
Phitochemistry, v.38, p.1299-1300, 1995.
POOL-ZOBEL, B.L. et al. Anthocyanins are
potent antioxidants in model systems but do
not reduce endogenous oxidative DNA
damage in human colon cells. European
TICE, R.R. et al. Single cell gel/comet
assay:guidelines for in vitro and in vivo
genetic toxicology testing. Environmental
and Molecular Mutagenesis, v.35, p.206221, 2000.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
UNICAMP. Disponível em <http://
www.inova.unicamp.br>. Acesso em 26 dez.
2006.
aglycon, cyaniding from tart cherries.
Journal of Natural Products, v.62, p. 294296, 1999.
WANG, H.;NAIR, M.G.;STRASBURG,
G.M. Antioxidant and antiinflamatory
activities of anthocyanins and their
ZORN, B. et al. 3-Desoxyanthocyanidins from
Arrabidaea chica. Phytochemistry, v.56,
p.831-835, 2001.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
49
50
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Avaliação da eficiência do tratamento de esgoto
na remoção de ovos de helmintos
SAMANTA ANUNCIATO ZYNICH1
ANA MARISA DE OLIVEIRA ALVES2
MÁRCIA REGINA THEWES3
RESUMO
O conhecimento dos helmintos presentes nos esgotos permite analisar as condições sanitárias da população.
O objetivo deste trabalho foi caracterizar parasitologicamente e avaliar a eficiência do tratamento de esgoto por
lagoas de estabilização na remoção dos ovos de helmintos. Amostras de esgoto oriundas de monitoramento
sistemático foram processadas conforme método adaptado de Coelho, Carvalho e Araújo (2002). Identificaram-se os seguintes helmintos: Ascaris lumbricoides (maior freqüência), Trichuris trichiura, Ancilostomídeos,
Toxocara spp, Enterobius vermicularis, Taenia sp. e Hymenolepis sp.. O processo apresentou 100% de
remoção dos ovos de helmintos, garantindo a qualidade sanitária dos esgotos tratados (efluentes).
Palavras-chave: Helmintos, esgoto, tratamento, lagoas, estabilização.
ABSTRACT
Information on the presence of helminth in sewage allows the analysis of population sanitary conditions.
This study aimed to provide the parasitologic characterization and evaluation of the efficiency in removing
1
2
Acadêmica do Curso de Biologia/ULBRA.
Chefe do setor de Microbiologia/Departamento Municipal
de Água e Esgoto-Divisão de Pesquisa
3
Bióloga, Chefe da Seção Biológica/Departamento Municipal de Água e Esgoto-Divisão de Pesquisa.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
51
helminth eggs in sewage treatment by stabilization lagoons in Porto Alegre. Samples from the systematic
monitoring were analyzed according to adapted method of Coelho, Carvalho e Araújo. (2002). The
following helminths were identified: Ascaris lumbricoides (most frequent), Trichuris trichiura,
Ancilostomídeos, Toxocara spp, Enterobius vermicularis, Taenia sp. and Hymenolepis sp. The process
removed 100% of helminth eggs, assuring sanitary quality of treated sewages (effluents).
Keywords: Helminths, sewage, treatment, lagoons, stabilization.
INTRODUÇÃO
O elevado crescimento demográfico dos centros urbanos implica na redistribuição da população menos favorecida economicamente para
áreas desprovidas de infra-estrutura de saneamento, onde os recursos d’água são utilizados
como fonte de abastecimento e de lançamento
de dejetos. Esta situação resulta no comprometimento da qualidade de saúde populacional e
causa um impacto ambiental aos mananciais.
A preocupação com as ações de saneamento
básico tem resultado no aumento do número de
estações de tratamento de esgoto em diversos
países. O tratamento dos esgotos consiste em
separar a parte líquida da parte sólida do esgoto
e tratar cada uma delas separadamente, reduzindo ao máximo a carga poluidora, de forma
que elas possam ser dispostas adequadamente,
sem prejuízos ao meio ambiente.
Em Porto Alegre, os dados da Prefeitura
Municipal (2007), indicam que a cidade conta
atualmente com uma capacidade para coleta de
87% de esgoto produzido, sendo 55% através de
rede cloacal (separadora absoluta) e 32% através de rede de esgoto misto. Até o ano de 1989,
Porto Alegre contava com uma capacidade de
tratamento de apenas 2%. Nos últimos anos houve uma evolução desse panorama. Entre 1990 e
2000 houve a construção das Estações de Trata-
52
mento de Esgoto (ETE): Esmeralda, Lami,
Ipanema e São João Navegantes, que aumentou a capacidade de tratamento de esgoto para
25%. Em 2002, com a conclusão da ETE Belém
Novo, a capacidade de tratamento passou para
27%. A partir do Programa Integrado SócioAmbiental (PISA), que prevê o tratamento dos
sistemas Ponta da Cadeia/Cavalhada/Restinga,
o tratamento de esgoto atingirá a capacidade
de 77% (PREFEITURA DE PORTO ALEGRE,
2007). A previsão é de que, também, ainda em
2008 com recursos do Programa de Aceleração
do crescimento (PAC), sejam iniciadas as obras
para a implantação da primeira etapa do Sistema de Esgotamento Sanitário Sarandi, na zona
norte do município, aumentando este índice em
mais 3 %, totalizando assim em 80% a capacidade de tratamento de esgotos gerados pela população porto-alegrense.
A Organização Mundial da Saúde (OMS),
dentro de suas propostas e regulamentações relativas a temas internacionais de saúde pública
para efluentes líquidos, estabeleceu recomendações de padrões microbiológicos a serem atendidos quanto ao tratamento de águas residuárias
(AYRES e MARA, 1996). No Brasil, o Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA)
na Resolução nº 357, de 17 de Março de 2005,
estabelece a classificação das águas com base
nos usos preponderantes e prioritários (sistema
de classes de qualidade) estabelecendo níveis
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
de qualidade a serem alcançados e/ou mantidos em um trecho do corpo hídrico ao longo do
tempo. Portanto, os efluentes residuários somente podem ser descartados em corpos hídricos se
os seus parâmetros característicos se situarem
dentro do balizamento dado pela Resolução.
a principal via de transmissão de patógenos é
pela rota fecal-oral, e sendo a ingesta de água
contaminada apenas um dos mais diversos tipos
possíveis de infecção, devem-se adotar medidas
para assegurar a qualidade da água que a população recebe.
Os parâmetros propostos são: substâncias
químicas orgânicas e inorgânicas, coliformes
fecais e organismos patogênicos. Dentre os organismos patogênicos encontrados nos esgotos
domésticos, destacam-se os helmintos, sendo o
parâmetro estabelecido pelas legislações = 1
ovo de helmintos /L no esgoto tratado (efluente).
O tratamento de esgoto é exigência da própria reurbanização e garantia de qualidade de
vida para a população. De acordo com o Departamento Municipal de Água e Esgoto de Porto
Alegre (DMAE, 2007), os sistemas de tratamento
de esgoto na cidade utilizam basicamente um
ou mais dos seguintes processos: lodos ativados,
digestor anaeróbio e lagoas de estabilização.
Helmintos é a denominação dada a diversas
espécies de vermes endoparasitários, especialmente
Platelmintos (vermes achatados) e Nematelmintos
(vermes cilíndricos) (NEVES, 2005).
Os danos que estes parasitas podem causar a
seus portadores incluem a obstrução intestinal, a
desnutrição, a anemia por deficiência de ferro e diarréia, sendo que as manifestações clínicas são habitualmente proporcionais à quantidade parasitária
abrigada pelo indivíduo (STEPHENSON, 1987).
A OMS estimou, em 2003, que existiam em
todo o mundo, cerca de um bilhão de indivíduos infectados por Ascaris lumbricoides, entre 700
milhões e um bilhão de pessoas contaminadas
por Trichuris trichiura e Ancilostomídeos e ainda
500 milhões infectados por Entamoeba hystolitica.
Diversos fatores implicam no alto índice de indivíduos infectados por parasitoses, tais como:
práticas de higiene inadequadas, condições precárias de moradia e saúde, saneamento
ambiental
ausente
ou
deficiente
(STEPHENSON, 1987). Contudo, sabendo que
Dentre os processos de tratamento de esgoto
utilizados em países de desenvolvimento, as lagoas de estabilização são os métodos mais empregados, tanto por seu baixo custo, como por
sua alta eficiência na redução de organismos
patogênicos.
No processo de lagoas de estabilização, a
matéria orgânica presente no esgoto é decomposta pelas bactérias na presença ou não de oxigênio (PREFEITURA DE PORTO ALEGRE,
2007). Na superfície da lagoa que contém oxigênio dissolvido, a matéria orgânica é degradada pelas bactérias aeróbias e no fundo onde a
quantidade de oxigênio dissolvido é pequena
ou nula, a matéria orgânica é decomposta pelas
bactérias anaeróbias. Usualmente são empregadas seqüências de lagoas anaeróbias, facultativas e de maturação, para se obter melhor qualidade do efluente (Figura 1).
No município de Porto Alegre este processo foi
empregado nas ETEs Lami, Ipanema e Belém Novo.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
53
(Fonte: Adaptado de Von Sperling, 1995)
Figura 1 - Processo de Lagoas de Estabilização.
Os sistemas que empregam o processo de lagoas de estabilização têm o objetivo principal
de transformar os materiais orgânicos, presentes
em águas residuárias, em produtos mineralizados.
Para atingir este objetivo, utilizam-se mecanismos de tratamento que se baseiam na atividade
metabólica dos microrganismos, particularmente bactérias e algas. As algas produzem oxigênio
através da fotossíntese e este oxigênio pode ser
usado por bactérias para oxidar o material
biodegradável (CAVALCANTI et al., 2001).
Todavia, as condições climatológicas (temperatura, incidência de radiação solar), o tempo de
detenção hidráulica (TDH) e as características geométricas e operacionais da lagoa, influenciam diretamente no tratamento.
As lagoas anaeróbias (ou digestores anaeróbios)
são responsáveis pelo tratamento primário e são
dimensionadas para receber cargas orgânicas elevadas, que inviabilizam a ocorrência de oxigênio
dissolvido, sendo a matéria orgânica presente nesta lagoa é digerida anaerobicamente.
Nas lagoas facultativas, ocorre a degradação
anaeróbia no fundo da lagoa e aeróbia na zona fótica,
estas lagoas apresentam grande espelho d’água para
o desenvolvimento de algas nas camadas mais superficiais e maior área de transferência de oxigênio
com a atmosfera. Geralmente são utilizadas no tratamento secundário dos esgotos, oxidando a matéria carbonácea remanescente.
54
As lagoas de maturação caracterizam-se por
receber um efluente com baixa carga orgânica
e o oxigênio dissolvido se faz presente em toda a
massa líquida, sendo responsável pelo pós-tratamento dos esgotos, seu principal objetivo é
promover a remoção de microrganismos
patogênicos.
Segundo Von Sperling et al. (2003), os ovos
de helmintos e cistos de protozoários são removidos nas lagoas de estabilização por sedimentação. A remoção de helmintos tem sido aceita
como indicador dos demais “organismos
sedimentáveis”, incluindo cistos de protozoários
como Entamoeba sp, Giardia sp e Cryptosporidium
sp (OMS, 1989).
As lagoas de estabilização são consideradas
como uma das técnicas mais simples de tratamento de esgotos. Esse tipo de sistema vem sendo utilizado no mundo todo para o tratamento
de esgotos domésticos e também industriais, sendo o processo significativamente favorecido em
regiões de clima tropical e subtropical, como é o
caso do Brasil (GOTARDO, 2005).
Portanto, o presente estudo objetiva a caracterização parasitológica do esgoto e investiga a
respectiva eficiência na remoção dos ovos de
helmintos em ETEs operadas pelo Departamento
Municipal de Água e Esgotos de Porto Alegre
através do processo de Lagoas de Estabilização.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
METODOLOGIA
As ETEs avaliadas correspondem a sistemas
de tratamento licenciados, cujos parâmetros
monitorados são encaminhados ao órgão
ambiental responsável (Fundação Estadual de
Proteção Ambiental - FEPAM), em conformidade às licenças operacionais vigentes. São elas:
a ETE Ipanema, por sua capacidade nominal de
tratamento, atendendo 142 mil habitantes, a
ETE Belém Novo e a ETE Lami por estarem vinculadas a balneabilidade, representando entre
8 e 7 mil habitantes, respectivamente. Todas
utilizam o sistema de tratamento de esgoto pelo
processo lagoas de estabilização.
Foram analisados os esgotos brutos (afluente) e
tratados (efluente) destas estações, pertinentes ao
processo de lagoas de estabilização. A amostragem
foi efetuada mensalmente, no período de junho
de 2005 a dezembro de 2006, num total de 90 amostras, sendo 45 de esgoto bruto e 45 de esgoto tratado, com posterior análise no Laboratório de
Microbiologia da Divisão de Pesquisa – DMAE.
As amostras foram processadas, com algumas
modificações, segundo o trabalho de Coelho, Carvalho e Araújo (2002), o qual é uma adaptação
dos métodos de Yanco (1987) e Bailenger (AYRES
e MARA, 1996).
Esta técnica, segundo Alves (2005), foi escolhida por associar estes métodos consagrados,
proporcionando uma maior eficiência na
quantificação de ovos de helmintos. Esta
metodologia é simples e de fácil implementação
dos procedimentos laboratoriais de rotina.
A identificação dos ovos de helmintos teve
como base as suas características morfológicas e
o seu tamanho. Para este fim foi utilizado um microscópio com retículo de ocular calibrado, indispensável para a medição exata e identificação
de características específicas dos ovos, tais como:
forma, conteúdo do ovo, espessura da membrana
externa (casca), dentre outras características.
A técnica de avaliação de viabilidade dos ovos
de helmintos foi feita pelos critérios morfológicos,
para se distinguir entre ovos viáveis e não-viáveis.
Esta técnica é fundamentada nas mudanças
morfológicas que aparecem nos ovos mortos ou nãoviáveis (KAGEI, 1982). Os ovos de helmintos contados foram os morfologicamente viáveis e os critérios básicos para a determinação da viabilidade
destes são apresentados na Tabela 1.
Tabela 1 - Principais critérios morfológicos para determinação de ovos viáveis e não viáveis de helmintos.
(Fonte: CEMAT, 1987 apud CHERNICHARO et al., 2002).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
55
As amostras foram coletadas e preservadas
segundo Guia de Coleta Preservação de Amostras de Água – CETESB, 1987, e a NBR 9898/
1987. Os volumes coletados foram 5L para o esgoto bruto e 10L para o esgoto tratado.
RESULTADOS
As Figuras 2, 3 e 4 demonstram as variações
no tempo da concentração total de ovos de
helmintos no período de jul/05 a dez/06.
Observa-se que a ETE Belém Novo (Figura
2) apresentou maior concentração de ovos de
helmintos (121ovos/L) e maior freqüência na distribuição temporal destes, em comparação com
as outras duas ETEs: Lami (Figura 3) e Ipanema
(Figura 4), que no mesmo período apresentaram
até nove meses de leitura “0” * para ovos de
helmintos. Não foi observada uma relação sazonal, tanto na freqüência como na densidade de
ovos de helmintos nas estações em avaliação.
Figura 2 - Concentração mensal do número total de ovos de helmintos por litro do esgoto bruto da ETE Belém
Novo de Porto Alegre, jul/05 a dez/06* .
*
56
O resultado “0” indica a não visualização de ovos de helmintos e não necessariamente a ausência dos mesmos. O
resultado é expresso como < 1 ovo / L.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Figura 3 - Concentração mensal do número total de ovos de helmintos por litro do esgoto bruto da ETE Lami de Porto
Alegre, jul/05 a dez/06*.
Figura 4 - Concentração mensal do número total de ovos de helmintos por litro do esgoto bruto da ETE
Ipanema de Porto Alegre, jul/05 a dez/06* .
O estudo dos esgotos brutos (afluentes) no período de jul/05 a dez/06 identificou os seguintes
helmintos: Ascaris lumbricoides; Trichuris trichiura;
Ancilostomídeos; Toxocara spp; Enterobius
vermicularis; Taenia sp. e Hymenolepis sp..
Com relação ao parasita prevalente, o Ascaris
lumbricoides foi o mais freqüente em todas as
amostras de esgoto bruto das ETEs estudadas,
como mostram as Figuras 5 e 6.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
57
Figura 5 - Principais helmintos, em porcentagem, encontrados no esgoto bruto das ETEs Belém Novo, Lami e
Ipanema de Porto Alegre, jul/05 a dez/06.
Figura 6 - Total de helmintos, em porcentagem, encontrados no esgoto bruto das ETEs de Porto Alegre, no
período de jul/05 a dez/06.
58
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Para o mesmo período de estudo foram analisados os esgotos tratados destes sistemas, aplicando-se a mesma metodologia já citada.
(com registro no SisLab/Siga: Banco de dados
da DVP) dentre os quais Demanda Bioquímica
de Oxigênio (DBO) e Escherichia coli.
A partir dos resultados obtidos, as ETEs:
Belém Novo, Lami, Ipanema, que empregam o
processo de lagoas de estabilização, apresentaram 100% de eficiência na remoção da concentração de ovos de helmintos.
Na Tabela 2 estão apresentadas as médias de
DBO e densidade de Escherichia coli das ETEs estudadas, as quais caracterizam os esgotos brutos
para o período equivalente. Comparando os esgotos brutos das ETEs, pode-se inferir uma relação
direta entre as médias de DBO e a densidade de
Escherichia coli (que caracterizam carga orgânica),
com a média do número de ovos de helmintos.
O monitoramentos realizado pela Divisão de
Pesquisa (DVP) oferece uma série de parâmetros
Tabela 2 - Médias de DBO, Escherichia coli e número de ovos de helmintos nos esgotos bruto e tratado das
ETEs Belém Novo, Lami, Ipanema, no período de jul/05 a dez/06.
(Fonte: DMAE-DVP, 2005/2006)
Observa-se que o processo de tratamento foi
capaz de produzir efluentes tratados com densidades de Escherichia coli iguais ou inferiores a
103 NMP/100 ml e concentração de ovos de
helmintos = 1 ovo/L.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
59
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
Os helmintos identificados neste estudo foram: Trichuris trichiura; Ascaris lumbricoides;
Ancilostomídeos; Toxocara spp., Enterobius
vermicularis, Hymenolepis sp. e Taenia sp.
O Ascaris lumbricoides foi o parasita de maior
concentração e freqüência em todas as amostras de esgoto bruto das ETEs estudadas. Isto
ocorre devido à longa sobrevivência de seus ovos
no meio ambiente, caracterizando-o como indicador mais adequado da presença de ovos de
helmintos.
A identificação e a quantificação destes
patógenos presente no esgoto, permitem avaliar
as condições sanitárias da população local, as
quais foram comprovadas neste estudo, uma vez
que foram identificados ovos de helmintos na grande parte das amostras de esgoto bruto analisadas.
O processo lagoas de estabilização apresentou 100% de eficiência para remoção de ovos
de helmintos.
Sugerimos a continuidade do monitoramento
de ovos de helmintos nas ETEs estudadas, bem
como, estender o mesmo às outras estações de
Porto Alegre para avaliar a eficiência destes em
relação a estes parasitas.
O monitoramento das estações de tratamento
de esgotos no Brasil ainda não usa a análise de
helmintos como rotina, porém a perspectiva do
reuso dos efluentes domésticos tratados justifica a
implantação do controle da presença de helmintos
no efluente final das ETEs. Assim, os resultados
obtidos neste estudo reforçam a importância do
controle das helmintíases como um instrumento
relevante para garantir a avaliação da qualidade
sanitária dos efluentes tratados na ETEs.
60
ALVES, A. M. Quantificação e identificação de ovos de helmintos em esgoto bruto
e tratado. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2004. 56p.
Monografia submetida ao Programa de PósGraduação em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental UFRGS como requisito
parcial para a conclusão do Curso de Especialização em Sistemas e Tratamento de Esgotos Sanitários.
AYRES, R.; MARA, D. Analysis of
wastewater for use in agriculture - A
laboratory manual of parasitological and
bacteriological techniques. Geneva: World
Health Organization, 1996. 35 p.
BAILENGER,
J.
Mechanisms
of
parasitological concentration in coprology
and their practical consequences. Journal of
American Medical Technology, 41, apud
AYRES, R.; MARA, D. Analysis of
wastewater for use in agriculture. A
laboratory manual of parasitological and
bacteriological techniques. Geneva: WHO,
p.65-71, 1989.
CAVALCANTI, P. F. F. et al. Lagoas de polimento para o pós-tratamento de esgoto digerido parte 2: remoção de patógenos. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA
SANITÁRIA E AMBIENTAL, 21., 2001, João
Pessoa. Anais... João Pessoa, 2001. 10 p.
CETESB. Guia de coleta e preservação de
amostras de água. São Paulo: CETESB,
1987. 150p.
CHERNICHARO, C. A. L.; ZERBINI, A. M.
Metodologias para quantificação, identifi-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
cação e análise de viabilidade de ovos de
helmintos em esgotos brutos e tratados. In:
CHERNICHARO, C. A. L. (Org.). Pós-tratamento de efluentes de reatores
anaeróbicos. Belo Horizonte: Projeto
PROSAB, 2002. p. 70-107.
COELHO W. M. et al. Avaliação de
metodologias para detecção de ovos de
helmintos no lodo e determinação do
percentual de recuperação. In: CONGRESSO INTERAMERICANO DE ENGENHARIA SANITÁRIA E AMBIENTAL, 27.;
2002, Cancun. Anais... Cancun, 2002.
CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE – CONAMA. Resolução n. 20, de
18 de junho de 1986. Estabelece a classificação das Águas Doces, Salobras e Salinas do
Território Nacional. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF. , 30 jul. 1986.
GOTARDO, J. T. Perfil longitudinal de uma
lagoa facultativa de tratamento de esgoto
doméstico aplicada nas condições
ambientais do sul do Brasil. 2005. 122f. Dissertação (Mestrado em Engenharia
Ambiental) - Programa de Pós-Graduação em
Engenharia Ambiental, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2005.
KAGEI, N. Techniques for the measurement
of environmental pollution by infective stage
of soiltransmitted helminths. Collected
Papers on the Control of Soil-Transmitted
Helminthiasis. Asian Parasite Control
Organisation, Tokyo, v. 2, p. 227 – 246, 1982.
NEVES, D. P. Parasitologia humana. 11. ed.
São Paulo: Atheneu, 2005. 494 p.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. Preservação e Técnicas
de Amostragem de efluentes líquidos e corpos receptores: NBR 9898: 1987. Rio de
Janeiro, jun. 1987. 34p
PORTO ALEGRE (RS). Prefeitura. Coordenação de Comunicação Social. Cobertura
dos Serviços de Esgoto em Porto Alegre
22/10/2007. Disponível em <http://
www.portoalegre.rs.gov.br> Acesso em outubro de 2007.
SPERLING, M. V. Introdução à qualidade
das águas e ao tratamento de esgotos. Belo
Horizonte: DESA/UFMG, 1995. v.1, 240 p.
SPERLING, M. V. et al. Lagoas de estabilização. In: GONÇALVES, R.F. (Coord.). Desinfecção de efluentes sanitários. Rio de
Janeiro: PROSAB/FINEP, 2003. p. 277-336.
STEPHENSON, L. S. The impact of
helminth infections on human nutricion.
London: Taylor & Francis, 1987. 5p.
THEWES, M. R. Comparação entre as técnicas de tubos múltiplos e substrato
enzimático para determinação dos
coliformes termotolerantes e Escherichia
coli. Porto Alegre: Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, 2005. 69p. Monografia
submetida ao Programa de Pós-Graduação
em Recursos Hídricos e Saneamento
Ambiental como requisito parcial para a conclusão do Curso de Especialização em Sistemas e Tratamento de Esgotos Sanitários.
WORLD HEALTH ORGANIZATION.
Health guidelines for use of wastewater in
agriculture and acquaculture. Geneve:
WHO, 1989.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
61
WORLD HEALTH ORGANIZATION.
The world health report – 2003. Geneve:
WHO, 2003.
YANKO, W. A. Occurrence of pathogen
in
distribution
and
marketing
62
municIpanemal sludges. County Sanitation
Districts of Los Angeles County, Whittier,
CA. In: EPA/625/R–92/013. Environmental
Regulations and Techonology. Control of
pathogens and vector attraction in sewage
sludge, 1992, p.166-172.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Caracterização de fatores de virulência presentes
em isolados de Escherichia coli provenientes da
região Sul do Brasil
FERNANDA KIELING MOREIRA1
YARA SILVA CASANOVA2
FABRICIA ALVES CERVEIRA3,4
PRISCILLA KARINA VITOR KOERICH5
ANDRÉ SALVADOR KAZANTZI FONSECA4
VAGNER RICARDO LUNGE4,6
ANA PAULA WOBETO4
NILO IKUTA4,7
RESUMO
Foram analisados neste trabalho 42 isolados de Escherichia coli originários de 15 granjas de suínos da região
Sul do Brasil. Os isolados foram obtidos a partir de fezes de suínos com suspeita de colibacilose. As amostras foram
caracterizadas quanto a presença de fatores de virulência (FVs) pela reação em cadeia da polimerase (PCR), que
consistiu na detecção das fímbrias F4, F5, F6, F18 e F41 e das toxinas Stb, StaP, Stx2e e LT. Dos 42 isolados,
somente 15 foram confirmados como portadores dos FVs estudados, sendo que as toxinas mais freqüentemente
encontradas foram Stb seguida da StaP. Nos isolados portadores de toxinas foram encontradas as fímbrias F18, F4
1
Acadêmica de mestrado do PPG Diagnóstico Genético e
Molecular/ULBRA.
2
Acadêmica do Curso de Biomedicina/ULBRA, Bolsista de
Iniciação Científica PROICT/ULBRA.
3
Acadêmica do Curso de Biologia/ULBRA, Bolsista de Iniciação Científica PROICT/ULBRA.
4
5
SIMBIOS Biotecnologia .
Perdigão Agroindustrial S/A - Videira SC.
6
Professor do Curso de Medicina Veterinária/ULBRA e PPG
em Diagnóstico Genético e Molecular/ULBRA.
7
Professor/Orientador do Curso de Biologia/ULBRA e PPG em
Diagnóstico Genético e Molecular/ULBRA. ([email protected])
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
63
e F5, e 4 isolados toxigênicos não apresentaram as fímbrias analisadas. A utilização da PCR para detecção de
toxinas e fímbrias demonstrou ser um teste prático no diagnóstico da colibacilose.
Palavras-chave: Escherichia coli, ETEC, PCR, colibacilose, fatores de virulência.
ABSTRACT
Forty two Escherichia coli isolates from 15 swine farms localized in Southern Brazil were analyzed in
this study. The bacterias were isolated from stool of pigs with suspicion of colibacillosis. The samples were
characterized by Polymerase Chain Reaction (PCR) for the presence of virulence factors consisted by
fimbrial adhesin F4, F5, F6, F18, F41 and enterotoxins Stb, StaP, Stx2e, LT. Only 15 of 42 isolates were
confirmed as carriers of studied virulence factors. The most frequent toxin found in these samples were Stb
followed by StaP. The fimbrial adhesins F18, F4 e F5 were found in isolates that carry toxin, but studied
fimbrial genes were not detected in 4 toxigenic isolates. The use of PCR to detect toxins and fimbrial
adhesins showed to be a practical test on the diagnostic of colibacillosis.
Keywords: Escherichia coli, ETEC, PCR, colibacillosis, virulence factors.
INTRODUÇÃO
A Escherichia coli é uma bactéria anaeróbia
facultativa predominante na microbiota normal
de animais homeotérmicos. Algumas cepas produzem fatores de virulência (fímbrias e toxinas)
capazes de causar doenças entéricas em seus hospedeiros (NATARO e KAPER, 1998). Segundo
Saldarriaga et al. (2000) as fímbrias permitem
que as bactérias se liguem às vilosidades intestinais e as toxinas estimulam o enterócito a bombear líquido no lúmen, aumentando a
motilidade intestinal e induzindo a diarréia
secretora com perda excessiva de fluídos e
eletrólitos.
Na suinocultura industrial é muito utilizado
o sistema de produção que separa os animais nas
etapas de maternidade, creche e crescimentoterminação. As cepas de E. coli produtoras de
toxinas (ETEC – Enterotoxigenic E. coli) estão
64
diretamente relacionadas ao desenvolvimento
da colibacilose em suínos nas fases pré-desmame (maternidade) e pós-desmame (creche,
crescimento-terminação), sendo economicamente uma das mais importantes doenças na
indústria de suínos (SMITH e LINGOOD,
1971; MOON, 1978; ALEXANDER, 1994;
BERBEROV et al., 2004; ZHANG et al., 2006).
Na colibacilose neonatal (pré-desmame), os
leitões podem adquirir os agentes patogênicos
pelo contato direto com o meio ambiente e mais
comumente da própria mãe através do contato
de suas fezes. Reconhece-se que a maioria das
porcas é portadora assintomática de cepas
patogênicas de E. coli em seu intestino.
A colibacilose pós-desmame pode se manifestar sob a forma da colibacilose da terceira semana e a doença do edema. A primeira ocorre
em leitões com 5 - 25 dias de idade, que é um
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
período crítico e de grande susceptibilidade, pois
além de deixarem a companhia materna, ocorre
a substituição do leite para alimentação exclusiva de ração. A doença do edema por sua vez,
caracteriza-se pela ocorrência de sinais de
disfunção neurológica, mortes súbitas e desenvolvimento de edemas, afetando principalmente leitões entre 4 a 15 dias após o desmame, podendo ocorrer em alguns casos em animais de
mais de 60 dias (HOLLAND, 1990; LUDKE e
LUDKE, 2003).
As fímbrias de adesão encontradas com maior
freqüência em ETEC de origem suína são F4 (K88),
F5 (K99), F6 (987P), F18 (F107) e F41 (WILSON
e FRANCIS, 1986; OJENIYI et al., 1994;
BERTSCHINGER e FAIRBROTHER, 1999;
NAGY e FEKETE, 1999) e podem possuir genes
codificadores para toxinas denominadas termo-lábeis
(LT), termo-estáveis (Sta, Stb) e toxina do tipo Shiga
(Stx2e) (MOON et al., 1986; POLLARD et al.,
1990; DEAN-NYSTROM et al., 1997; NATARO
e KAPER, 1998; BERTSCHINGER e
FAIRBROTHER, 1999; NAGY e FEKETE, 1999;
CHOI et al., 2001). A partir da aderência, essas
bactérias colonizam a superfície celular e secretam
as toxinas envolvidas no processo de diarréia.
Atualmente, o diagnóstico de colibacilose é baseado em sinais clínicos e no isolamento bacteriano
a partir de amostras de fezes com diarréia
(BARCELLOS et al., 1980; MACÊDO et al.,
2007). Nestes casos, o isolamento da E. coli em
altas concentrações é utilizado como um forte
indicativo de que estes estejam relacionados com
ETEC, permitindo um diagnóstico diferencial das
cepas comensais encontradas na microbiota intestinal. Além deste parâmetro, diversos estudos utilizam a atividade hemolítica em ágar sangue como
método de triagem de E. coli patogênicas
(LUDWIG e GOEBEL, 1997; BRITO et al., 1999;
KUHNERT et al., 2000).
A detecção dos FVs é o teste definitivo para
diferenciar os isolados E. coli patogênicas das comensais, e tem contado com métodos de diagnóstico fenotípicos ou moleculares. Apesar disto, a utilização destas técnicas não é uma prática rotineira
nas agroindústrias do país. O uso de tecnologias
baseadas na técnica da Reação em Cadeia da
Polimerase (PCR) para identificar genes de fatores
virulência já é bem descrito e tem sido recomendado por vários autores para confirmação de isolados
relacionados com ETEC (FRANKLIN et al., 1996;
BOSWORTH e CASEY, 1997; KWON et al., 1999;
OSEK, 2002; VIDAL et al., 2004; OLASZ et al.,
2005; WEST et al., 2007; MACÊDO et al., 2007).
Com base na coleta de 42 amostras provenientes de 15 propriedades localizadas nos Estados do
Paraná (PR), Santa Catarina (SC) e Rio Grande
do Sul (RS), este trabalho procurou caracterizar
cepas de E. coli com fatores de virulência, isoladas
de suínos com diarréia previamente diagnosticados com colibacilose. A técnica de PCR multiplex
foi aplicada como teste confirmatório para
detecção de ETEC, utilizando primers específicos
para os genes de fímbrias e toxinas (OJENIYI et
al., 1994; STACY-PHIPPS et al., 1995; BLANCO
et al., 1997; OSEK et al.,1999). Também foram
comparadas as relações entre a idade dos animais
e presença dos genes de toxina, e a idade dos animais infectados e presença dos genes de fímbrias.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram obtidos 42 isolados de campo a partir
de amostras de fezes de suínos, no período de
março a agosto de 2006, coletadas em granjas com
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
65
suspeitas de colibacilose de 15 propriedades localizadas na região Sul do Brasil (RS, SC e PR)
incluindo 7 casos na fase de maternidade, 28 casos de creche e 7 casos na fase de terminação.
Cepas de referência: As quatro amostras de
referência, 2568 (Stb, StaP, F18 e Stx2e), 2569
(Stb, LT e F4), 2570 (987P e StaP) e 2571 (StaP,
F5 e F41), foram gentilmente cedidas pelo laboratório de Patologia da empresa Perdigão
Agroindustrial (Videira - SC) e utilizados como
controles positivos para a técnica de PCR.
Procedimentos
Microbilógicos
Isolamento bacteriano: Para a obtenção de colônias isoladas, cada amostra foi semeada em meio
de cultura contendo Ágar Sangue ou MacConckey
incubada a 37°C durante 24h. Colônias com características sugestivas de E. coli foram repicadas
por esgotamento, e posteriormente identificadas
por provas bioquímicas (OLIVEIRA, 2000).
Atividade hemolítica: amostras de E. coli foram inicialmente semeadas em meio ágar sangue (enriquecida com 5% de sangue carneiro
desfibrinado) a 37°C por 18h e a atividade
hemolítica foi determinada visualmente. Foram
consideradas positivas as amostras capazes de
induzir halo de hemólise.
Procedimentos
Moleculares
Os procedimentos moleculares foram realizados conforme as instruções do fabricante. A
66
extração do DNA foi realizado utilizando os kits
para NewGene Prep e NewGene Preamp, e a
amplificação de DNA utilizando o kits NewGene
Amp fornecidos pela Simbios Biotecnologia,
descritos resumidamente abaixo:
Extração de DNA: Uma suspensão
bacteriana de 100 μL foi adicionado em 400
μL da solução NewGeneprep e incubado a 60°C
por 10 min. Após centrifugação (10.000 x g, 1
min.), o sobrenadante foi transferido num tubo
contendo 20 μL de uma suspensão de sílica (fornecido no kit NewGene Preamp). Após agitação e centrifugação (10 000 x g, 1 min.), o pellet
foi lavado 2 vezes com 150 μL solução de lavagem A (5 M tiocianato de guanidina, 0.1 M
Tris-HCl [pH 6.4]), 2 vezes com solução de
lavagem B (etanol 80%) e 1 vez com solução
de lavagem C (etanol 96%). Após a secagem
da sílica o DNA foi separado com 50 μL solução de eluição (10 mM Tris-HCl [pH 8.0], 1
mM EDTA).
Detecção dos fatores de virulência: O kit
NewGene Amp consiste de um PCR multiplex,
onde 2 μL do DNA extraído é adicionado em
28 μL de uma mistura pronta dos reagentes de
amplificação. Os genes dos 9 fatores de virulência foram amplificados em 3 reações multiplex
distintas (Multiplex1, Multiplex2 e Multiplex3)
no termociclador Applied Biosystems 9700, e o
programa de amplificação consistiu de uma etapa de desnaturação de 3 minutos a 95°C, e 45
ciclos de 15 segundos a 95°C e 1 minuto a 60°C.
Os produtos de detecção foram avaliados em gel
de poliacrilamida (10%) corados com nitrato de
prata (SANGUINETTI et al., 1994). A Tabela
1 apresenta os primers utilizados neste estudo
para detecção dos genes que codificam as toxinas StaP, Stb, STx2e, LT e das fímbrias de adesão F4, F5, F6, F18 e F41.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Tabela 1 - Descrição do Multiplex 1, 2 e 3 quanto a composição dos fatores de virulência (FV), seqüência dos
primers e tamanho dos fragmentos amplificados (amplicon).
Análise Estatística
A análise estatística foi feita através das relações entre (i) idade dos animais e presença dos
genes de toxina, (ii) idade dos animais infectados
e presença dos genes de fímbrias, e posteriormente
comparadas pelo teste t de Student.
RESULTADOS E
DISCUSSÃO
A suinocultura da região Sul do Brasil, composta pelos Estados do Paraná, Rio Grande do Sul
e Santa Catarina, pode ser considerada como a
mais tecnificada da América do Sul, atingindo bons
índices de produtividade (ABIPECS, 2006). Uma
das principais causas de perdas econômicas na produção comercial de suínos, consiste na ocorrência
de diarréia em leitões na fase de creche, causando
redução no desempenho de crescimento e mortalidade (CUNHA et al., 2007). Geralmente, a infecção apresenta evolução aguda e sintomas caracterizados por diarréia severa, desidratação e algumas vezes morte (SOJKA, 1971).
No presente trabalho, o procedimento
molecular adotado para detecção dos FVs, mostrou ser de fácil execução e interpretação. A
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
67
Figura 1 apresenta um exemplo dos resultados
laboratoriais obtidos com a amplificação do
multiplex PCR-1. No gel de poliacrilamida podemos avaliar amostras como a cepa de referên-
cia 2568, que apresenta as toxinas StaP, Stb e a
fímbria F18, e os isolados (canaletas 3-8) com os
diferentes padrões encontrados. Resultados semelhantes foram obtidos com os multiplex 2 e 3.
Figura 1 - Multiplex PCR-1 avaliado em gel de eletroforese em poliacrilamida. Os produtos de amplificação
referem-se aos alvos Stb (113 bp), StaP (158 bp) e F18 (313 bp). As amostras estão distribuídas
da seguinte forma: canaleta 1 com marcador de peso molecular 50 bp, canaleta 2 com o controle
positivo 2568, canaletas 3 – 8 isolados de campo e canaleta 9, controle negativo.
São poucos os estudos brasileiros sobre a
prevalência e importância de diferentes cepas
patogênicas de E. coli. Freqüentemente o diagnóstico de colibacilose é realizado somente pelo
isolamento bacteriano, sem nenhuma caracterização dos fatores de virulência (Baccaro et al.,
1999; Baccaro et al., 2000; Calderaro et al., 2001).
A análise dos 42 isolados de E. coli deste trabalho demonstrou a presença de toxinas em 15
amostras (Tabela 2), confirmando que estes estavam relacionados com ETEC. Foram encontrados isolados com 1 a 3 toxinas. Respectivamente, 3 isolados com apenas 1 toxina, 8 isolados com 2 e os 4 restantes com 3 (Tabela 3). As
toxinas mais freqüentemente encontradas foram
Stb (14/15) e StaP (10/15), e em menor freqüência Stx2e (4/15) e LT (3/15).
68
Na análise do perfil dos suínos deste estudo
não se observou diferenças significativas entre
a idade média dos animais infectados por isolados com (47,5 ± 40,1 dias) e sem toxinas
(44,7 ± 38,1 dias). Na análise por etapa de
produção, não foram encontradas toxinas nos
7 isolados da maternidade. Entre os isolados
dos animais de terminação (7), detectou-se 2
isolados com toxinas, ambas com a toxina StaP
e uma destas com Stb. A maioria dos isolados
relacionados com ETEC foram encontrados na
fase de creche (13/28). Calderaro et al. (2001)
observaram nos dados coletados de sistemas de
produção em São Paulo uma freqüência de
animais positivos para ETEC semelhante a deste estudo, através da ocorrência das toxinas
Sta, Stb, e LT, respectivamente em 25,7% (18/
70), 21,5% (15/70) e 7,1% (5/70) dos isolados.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Apesar da casuística de Calderaro (2001) ser
maior que a deste trabalho, ele não detectou a
verotoxina Stx2e, encontrada em 4 casos aqui
descritos. Recentemente Macêdo et al. (2007)
também obtiveram uma freqüência semelhante em relação à produção de verotoxinas, onde
21,4% dos isolados foram positivos para Stx2e.
Costa et al. (2006) e Macêdo et al. (2007) também observaram com maior prevalência os genes
das toxinas Stb, presentes em 50% e 40,5% dos
isolados, seguidos de Sta (35%) e StaP (33,3%)
respectivamente. Resultados semelhantes para
a prevalência das toxinas foram obtidos por
Moon et al. (2004).
Tabela 2 - Caracterização dos fatores de virulência (toxinas e fímbrias) de Escherichia coli em 42 isolados a
partir de amostras de fezes com diarréia em diferentes etapas de produção de suínos.
Na análise das fímbrias, não foram detectadas F6 e F41 em nenhum dos isolados deste estudo (Tabela 3). Considerando as amostras positivas para as fímbrias foram encontradas F18,
F4 e F5 em 11 isolados (todos na creche), respectivamente nas proporções de 7/15 , 3/15 e 1/
15. Em todos estes casos, foram detectados apenas uma fímbria por isolado. Costa et al. (2006)
obtiveram resultados semelhantes aos deste estudo, onde os genes de fímbrias com maior
prevalência foram F18, com 27,5%, seguido por
F4 e F5 com 22,5%. Moon et al. (2004) também
encontraram a fímbria F4 em maior freqüência,
seguida pela F18. Entretanto, Macêdo et al.
(2007), em estudo realizado no Estado de Minas Gerais encontraram resultados que diferem
de nossos achados, onde as fímbrias F5, F18, F6,
F4 e F41 apresentaram respectivamente as freqüências de 33,3%, 19,0%, 14,3%, 14,3% e 9,5%
dos isolados.
Nos isolados com toxinas na idade de creche
(13), dois não apresentaram as fímbrias
investigadas, como também os 2 isolados
toxigênicos de terminação. Quando as médias
das idades dos animais infectados isolados
toxigênicos com fímbrias (31,2 ± 3,4 dias) foram comparadas com isolados sem fímbrias (50,8
± 43,6 dias), estas apresentaram diferença estatisticamente significativa (P<0.018). Nestes
casos as fímbrias de adesão estavam presentes
em 84,6% dos isolados toxigênicos presentes nos
animais da fase de creche, onde concentram-se
a maior parte de nossas amotras. Esta é uma fase
extremamente delicada para a suinocultura devido aos vários fatores estressantes que ocorrem
simultaneamente por ocasião do desmame, principalmente relacionados com a separação dos
leitões da matriz, mudança de ambiente e mudança brusca na alimentação. Conseqüentemente, alguns problemas sanitários como diarréia pósdesmame e doença do edema podem surgir, ocasionando perdas econômicas pela elevação da
taxa de mortalidade e pela redução no ganho
de peso dos leitões (McALLISTER et al., 1979;
SANTOS et al., 2003).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
69
Tabela 3 - Caracterização do número de isolados quanto à presença de fímbrias e toxinas de E. coli.
Apesar de a literatura sugerir que a presença de atividade hemolítica em cepas de E. coli
é um indicativo da presença de fatores de virulência (LUDWIG & GOEBEL, 1997; BRITO
et al., 1999; KUHNERT et al., 2000), os dados
deste trabalho demonstram que este parâmetro
não é um teste confirmatório eficiente. Todas
as amostras deste estudo (42) apresentaram atividade hemolítica e foram confirmados somente 15 casos como portadoras dos FVs mais importantes. Este estudo corrobora os dados de
Macêdo et al. (2007) que sugere que utilização da característica hemolítica não é
satisfatória para se identificar amostras
diarreicogênicas de E. coli.
No presente trabalho, foi realizada uma análise retrospectiva a partir de isolados de fezes de
suínos com diarréia obtidas em granjas comerciais localizadas no Sul do Brasil. Todas as amostras apresentaram um forte indicativo de estarem relacionadas com colibacilose (presença de
altas concentrações de E. coli hemolíticas em fezes com diarréia), e em todos estes casos, os animais foram tratados com antibióticos. Porém, os
testes moleculares realizados confirmaram somente um pequeno número de casos (15/42), indicando que parte dos lotes tratados pode não estar relacionada com ETEC. Apesar do presente
70
trabalho ter pesquisado as toxinas e fímbrias mais
importantes descritas na literatura, já existem
descrições de novos fatores de virulência que
poderiam estar relacionados com alguns casos
deste estudo (NATARO et al., 1998; OSEK et
al., 1999; BRITO et al., 2003; WEST et al., 2007;
WU et al., 2007; ZHANG et al., 2007).
A freqüência de cepas patogênicas varia
muito, dependendo da fase de produção dos
animais estudados, das técnicas utilizadas, da
região geográfica e da presença ou não de diarréia. Este fato demonstra a importância da execução de estudos de detecção rápida e fidedigna de fatores virulência em cepas de E. coli isoladas de suínos com diarréia, para determinar
regionalmente as mais freqüentes e também poder caracterizar a sensibilidade a diferentes
agentes antimicrobianos (MACÊDO et al.,
2007). Este estudo demonstrou que o diagnóstico laboratorial de colibacilose, baseado exclusivamente no isolamento de E. coli a partir de
amostras de fezes com diarréia, é um método
pouco fidedigno, com alta incidência de resultados falso-positivos. A utilização da PCR para
detecção de fatores de virulência (toxinas e fímbrias) demonstrou sua eficiência como teste
complementar ao isolamento bacteriano no diagnóstico da colibacilose.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
REFERÊNCIAS
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA PRODUTORA E EXPORTADORA
DA CARNE SUÍNA. Relatório 2006. Disponível em: <http://www.abipecs.org.br/
relatorios ABIPECS_relatorio_2006_pt.pdf>.
Acesso em 16 fevereiro de 2008.
ALEXANDER, T.J.L. Neonatal diarrhoea in
pigs. In: GYLES, C. L. Escherichia coli in
domestic animals and humans. Oxon: CAB
International, 1994. p.151-170.
BACCARO, M.R.; MORENO, A.M.;
BRONZONI, P.V.M. Detecção de genes
codificadores de enterotoxinas e verotoxinas
através da PCR em amostras de E. coli isoladas
de leitões lactentes. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE VETERINÁRIOS ESPECIALISTAS EM SUINOS, 9., 1999, Belo Horizonte.
Anais... Belo Horizonte: Associação Brasileira
de Veterinários Especialistas em Suinos, 1999.
BACCARO, M.R.; MORENO, A.M.;
FERREIRA, A.J.P. Occurrence of some
virulence genes among Escherichia coli isolates
piglets in Brazil. In: INTERNATIONAL PIG
VETERINARY SOCIETY CONGRESS, 16.,
2000, Melbourne. Proceedings... Melbourne,
2000. p.52.
BARCELLOS, D.E.S.N.; GUIZZARDI, I.I. ;
FALLAVENA, L.C.B. Frequência e causa de
diarréias bacterianas em suínos nas zonas
criatórias do Vale do Taquari e Missões, Rio
Grande do Sul, Brasil. Boletim do Instituto
de Pesquisas Veterinárias “Desidério
Finamor”, v.7, n.1, p.27-37, 1980.
BERBEROV, E.M. Relative importance of heatlabile enterotoxin in the causation of severer
diarrheal disease in the gnotobiotic piglet model
by a strain of enterotoxigenic E. coli that
produces multiple enterotoxins. Infection and
Immunity, v.72, p.3914-3924, 2004.
BERTSCHINGER, H.U.; FAIRBROTHER,
J.M. Escherichia coli infections. In: STRAW
B.E. et al. (Eds.) Diseases of swine. Ames:
Iowa State University Press, 1999. p.431-468.
BLANCO, M. et al. Genes coding for
enterotoxins and verotoxins in porcine
Escherichia coli strains belonging to different
O:K O:H serotypes: relationship with
toxigenic phenotypes. Journal of Clinical
Microbiology, v.35, p.2958-2963, 1997.
BOSWORTH, B.T.; CASEY, T.A.
Identification of toxin and pilus genes in
porcine Escherichia coli using polymerase
chain reaction (PCR) with multiple primer
pairs. In: GENERAL MEETING OF THE
AMERICAN
SOCIETY
FOR
MICROBIOLOGY, 97., 1997, Miami.
Abstracts... Washigton: ASM Press, 1997.
Abstract B 509.
BRITO, B.G. et al. Virulence-associated
factors of uropathogenic Escherichia coli
strains isolated from pigs. Veterinary
Microbiology, v.65, p.123-132, 1999.
BRITO, B.G. et al. Produção de enterotoxina
termoestável, hemolisinas, colicina e fatores
de colonização de Escherichia coli isoladas de
leitões com diarréia no sudoeste do Paraná.
Scientia Agraria, v.4, n1/2, p.15-20, 2003.
CALDERARO, F.F. et al. Freqüência de
agentes causadores de enterites em leitões
lactentes provenientes de sistemas de produção de suínos do Estado de São Paulo.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
71
Arquivos do Instituto de Biologia, São Paulo, v.68, n.1, p.29-34, 2001.
CHOI, C. et al. Prevalence of the
enteroaggregative Escherichia coli heatstableenterotoxin 1 (EAST1) gene in isolates in
weaned pigs with diarrhea and/or edema disease.
Veterinary Microbiology, v.81, p.65-71, 2001.
COSTA, M.M. et al. Caracterização
epidemiológica e perfil de resistência aos
antimicrobianos de Escherichia coli isoladas
de criatórios suínos do sul do Brasil. Pesquisa Veterinária Brasileira, v.26, p.5-8, 2006.
CUNHA, M.L. et al. Diarréia em leitões da
maternidade e creche em uma Unidade
Produtora de Leitões (UPL) no Rio Grande
do Sul, Brasil. Veterinária em Foco, v.4, n.2,
p.177-184, 2007.
DEAN-NYSTROM, E.A. et al. Presence of
F18ac (2134 P) fimbriae on 4 P-E.coli isolates
from weaned pigs with diarrhea. Veterinary
Clinics of North America: Food Animal
Practice, v.9, p.77-79, 1997.
FRANKLIN, M.A. et al. A PCR-based
method of detection and differentiation of
K88+ adhesive Escherichia coli. Journal of
Veterinary Diagnostic Investigation, v.8,
p.460-463, 1996.
HOLLAND, R.E. Some infections causes of
diarrhoea in young farm animals. Clinical
Microbiology Reviews, v.3, p.345-375, 1990.
KUHNERT, P.; BOERLIN, P.; FREY, J. Target
genes for virulence assessment of Escherichia
coli isolates from water, food and the
environment. FEMS Microbiology
Reviews, v.24, p.107-117, 2000.
72
KWON, D.; KIM, O.; CHAE, C. Prevalence of
genotypes for fimbriae and enterotoxins and of
O serogroups in Escherichia coli isolated from
diarrheic piglets in Korea. Journal of Veterinary
Diagnostic Investigation, v.11, p.146-151, 1999.
LUDKE, J.V.; LUDKE, M.C.M. Produção de
suínos com ênfase na preservação do ambiente. 2003. Disponível em: www.cnpsa.embrapa.br/
?/artigos/2003/artigo-2003-n21.html. Acesso em
12 fevereiro de 2008.
LUDWIG, A. ; GOEBEL, W. Haemolysins
of Escherichia coli. In: SUSSMAN, M.
Escherichia coli mechanisms of virulence.
Cambridge: Cambridge University, 1997,
p.281-329.
MACÊDO, N.R. et al. Detecção de cepas
patogênicas pela PCR multiplex e avaliação
da sensibilidade a antimicrobianos de
Escherichia coli isoladas de leitões diarréicos.
Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.59, p.1117-1123, 2007.
MCALLISTER, J.S.; KURTZ, H.J.; SHORT
JR., E.C. Changes in the intestinal flora of
young pigs with postweaning diarrhea or
edema disease. Journal of Animal Science,
v.49, n.3, p.868-887, 1979.
MOON, H.W. Mechanisms in the
pathogenesis of diarrhea: a review. Journal
of the American Veterinary Medical
Association, v.172, p.443-448, 1978.
MOON, H.W. et al. Prevalence of virulence
factors among Escherichia coli. Ames: Iowa
State University Press, 2004. Disponível em:
http://www.extension.iastate.edu/Pages/
ansci/swinereports/ asl-1601.pdf. Acesso em
14 de fevereiro 2008.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
MOON, H.W.; SCHNEIDER, R.A.;
MOSELEY, S.L. Comparative prevalence of
four enterotoxin genes among Escherichia coli
isolated from swine. American Journal of
Veterinary Research, v.47, p.210-212,1986.
reaction for determination of virulence
factors of Escherichia coli strains from pigs in
Poland. Comparative Immunology,
Microbiology & Infectious Diseases, v.22,
p.163-174, 1999.
NAGY, B.; FEKETE, P.Z. Enterotoxigenic
Escherichia coli (ETEC) in farm animals.
Veterinary Research, v.30, p.259-284, 1999.
POLLARD, D.R. et al. Rapid and specific
detection of verotoxin genes in Escherichia coli
by the polymerase chain reaction. Journal of
Clinical Microbiology, v.28, p.540-545, 1990.
NATARO, J.P.; KAPER, J.B. Diarrheagenic
Escherichia coli. Clinical Microbiology
Reviews, v.11, p.142–201, 1998.
NATARO, J.P.; STEINER, T.; GUERRANT,
R.L. Enteroaggregative Escherichia coli.
Emerging Infectious Diseases, v.4, p.251261, 1998.
OJENIYI, B.; AHRENS, P.; MEYLING, A.
Detection of fimbrial and toxin genes in
Escherichia coli and their prevalence in piglets
with diarrhoea. The application of colony
hybridization assays, polymerase chain
reaction and phenotypic assays. Zentralblatt
für Veterinarmedizin B, v.41, p.49–59, 1994.
OLASZ, F. et al. Characterization of an F18+
enterotoxigenic Escherichia coli strain from post
weaning diarrhoea of swine, and of it’s
conjugative virulence plasmid pTC. FEMS
Microbiology Letters, v.244, p.281-289, 2005.
OLIVEIRA, S.J. Microbiologia Veterinária
- Guia Bacteriológico Prático. 2.ed. Canoas,
Ed. ULBRA, 2000. 235p.
OSEK, J. Rapid and specific identification
of Shiga toxin-producing Escherichia coli in
faeces by multiplex PCR. Letters in Applied
Microbiology, v.34, p.304-310, 2002.
OSEK, J. et al. The use of polymerase chain
SALDARRIAGA, F.T.; CALLE, S.E.;
CAMACHO,
C.S.
Resistência
antimicrobiana de cepas de Escherichia coli
provenientes de lechones lactantes criados
en una granja tecnificada de Lima. Revista
de Investigaciones Veterinárias del Perú,
Lima, v.11, n.2, p.195-200, 2000.
SANGUINETTI, C.J.; NETO, E.D,;
SIMPSON, A.J.G. Rapid silver staining and
recovery of PCR products separated on
polyacrylamide gels. Biotechniques, v.17,
p.915-919, 1994.
SANTOS, W.G. et al. Manose na alimentação de leitões na fase de creche (Desempenho, pH do trato gastrintestinal e peso dos
órgãos). Ciência e Agrotecnologia, v.27, n.3,
p.696-702, 2003.
SMITH,. H.W.; LINGOOD, M.A.
Observations of the pathogenic properties of
the K88, Hly and Ent plasmids of Escherichia
coli with particular reference to porcine
diarrhea. Journal of Medical Microbiology,
v.4, p.467-685, 1971.
SOJKA, W.J. Enteric diseases in newborn
piglets, calves and lambs due to Escherichia
coli infection. Veterinary Bulletin, v. 41,
p.509-522, 1971.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
73
STACY-PHIPPS, S.; MECCA, J.J.; WEISS,
J.B. Multiplex PCR assay and simple
preparation method for stool specimens detect
enterotoxigenic Escherichia coli DNA during
the course of infection. Journal of Clinical
Microbiology, v.33, p.1054-1059, 1995.
VIDAL, R. et al. Multiplex PCR for diagnosis
of enteric infections associated with
diarrheagenic Escherichia coli. Journal of
Clinical Microbiology, v.42, p.1787-1789,
2004.
ZHANG, W. et al. Significance of heat stable
and heat-labile enterotoxinas in porcine
colibacillosis in an additive model for
pathogenicity study. Infection and Immunity,
v.76, p.3107-3114, 2006.
ZHANG, W. et al. Prevalence of virulence
genes in Escherichia coli strains recently
74
isolated from young pigs with diarrhea in the
US. Veterinary Microbiology, v.123, p.145152, 2007.
WEST, D.M. et al. Rapid detection of Escherichia
coli virulence factor genes using multiplex realtime TaqMan PCR assays. Veterinary
Microbiology, v.122, p.323-331, 2007.
WILSON, R.A.; FRANCIS, D.H. Fimbriae
and enterotoxins associated with Escherichia
coli serogroups isolated from clinical cases of
porcine colibacillosis. American Journal of
Veterinary Research, v.47, p.213-217, 1986.
WU, X. et al. Comparative analysis of
virulence genes, genetic diversity, and
phylogeny of commensal and enterotoxigenic
Escherichia coli isolates from weaned pigs.
Applied and Environmental Microbiology,
v.73, n.1, p.83-91, 2007.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Genotoxicidade associada a adesivos dentários
de uso odontológico
STELA MARIS DA SILVA CARIATI1
GUILHERME ANZILIERO AROSSI2
HELOISA HELENA RODRIGUES DE ANDRADE3
RESUMO
Monômeros livres resultantes da polimerização incompleta de materiais dentários tendem a liberação e a
interação com tecidos vivos, podendo gerar danos genéticos. O teste para Detecção de Mutação e
Recombinação Somática (SMART) em Drosophila melanogaster foi aplicado para testar a ação de dois
adesivos dentários como indutores de mutações gênicas e/ou cromossômicas, assim como recombinação
mitótica. Ambos os Adesivos A e B induziram incrementos estatisticamente significantes na freqüência total
de clones mutantes, principalmente no genótipo trans-heterozigoto – indicando que a toxicidade genética
atribuída a ambas resinas deve-se basicamente à indução de recombinação entre cromossomos homólogos –
um evento que está relacionado com a perda da heterozigose e associado à indução de câncer.
Palavras-chave: Monômeros livres, SMART, genotoxicidade.
1
Acadêmica do Curso de Biologia da ULBRA. Bolsista PIBIC/
CNPq.
2
Aluno Doutorando do Programa de Pós-Graduação em
Genética e Toxicologia Aplicada da ULBRA.
3
Professora-Orientadora do Curso de Biologia/ULBRA e
Coordenadora do PPG em Genética e Toxicologia Aplicada/ULBRA ([email protected] ).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
75
ABSTRACT
Free monomers from incomplete polymerization of dental materials tend to release and interact with
living tissue, and can generate genetic damage. The SMART test was applied to investigate their action as
genotoxins. Adhesive A and Adhesive B induced statistically significant increases in the frequency of total
spots. These findings indicate that both adhesives are inducers of toxic-genetic events, being the mitotic
recombination the main mechanism of action, which is related to the loss of heterozygosity and associated
with cancer induction.
Keywords: Free monomers, SMART, genotoxicity.
INTRODUÇÃO
Os materiais resinosos comercialmente disponíveis são encontrados na forma de resinas
compostas, cimentos resinosos, adesivos dentais,
e uma variedade de outros produtos, utilizados
na clínica diária para a terapêutica de reabilitação oral em Odontologia. Suas matérias-primas são monômeros resinosos tais como BisGMA
(Bisfenol A glicidilmetacrilato), TEGDMA
(trietilenoglicoldimetacrilato),UDMA
(uretanodimetacrilato)eHEMA
(hidroxietilmetacrilato). Estes materiais sofrem
um processo de ativação que determina o início
da polimerização, podendo demorar até um mês
para se esgotar completamente (WATTS,
McNAUGHTON e GRANTS, 1986). Contudo, nem todo monômero originalmente presente é consumido, propiciando a formação de radicais livres de cadeias carbônicas dentro do
material (AROSSI, 2004).
Diversos estudos têm fornecido evidência da
permanência de cerca de 5% de monômeros livres, que são capazes de reagir com outros grupos de radicais carbônicos ou até mesmo com
átomos de oxigênio e hidrogênio, por afinidade
eletrônica ou polaridade (FERRACANE, 1985;
76
KILDAL e RUYTER, 1993; PARK e LEE, 1996;
BAGIS e RUEGGEBERG, 1997). A
biocompatibilidade é outra desvantagem atribuída aos monômeros (GEURTSEN, 2000). Uma
vez difundidos nos tecidos vivos, eles podem provocar diferentes tipos de interações com os mais
diversos receptores e estruturas celulares.
Em função das características destes materiais, o estudo do seu potencial tóxico-genético
vem sendo investigado através de diferentes
bioensaios, que privilegiam a detecção de eventos específicos como perda de cromossomos inteiros (aneugênese) e/ou perda de segmentos
cromossômicos (clastogênese). Os monômeros
BisGMA; UDMA; TEGDMA; GMA
(glicidilmetacrilato); Bisfenol A; MMA
(metilmetacrilato) e HEMA não aumentam as
taxas de revertentes no teste de Ames, indicando que tais produtos não induzem mutações pontuais em procariotos. No entanto, TEGDMA tem
efeito comprovadamente clastogênico, sendo
mutagênico segundo o ensaio HPRT, enquanto
que BisGMA e UDMA não apresentaram atividade significativa como indutores de mutações
- ainda que seus subprodutos GMA e Bisfenol
A tenham causado aumento na indução de
micronúcleos em cultura de células V79
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
(SCHWEIKL, SCHMALZ e RACKEBRANDT,
1998; SCHWEIKLL, SCHMALZ e SPRUSS,
2001). Por outro lado, BisGMA, TEGDMA,
UDMA, HEMA não provocaram quebras
cromossômicas em linfócitos humanos saudáveis
no teste do cometa - quando avaliados em doses compatíveis com valores menores do que 25%
de mortalidade (KLEINSASSER et al., 2004).
são primordialmente induzidas nas estruturas que
darão origem às asas dos adultos com seus
tricomas, que se organizam em manchas, com
fenótipos característicos - que indicam a ocorrência de eventos genéticos relacionados com
mutações pontuais, aberrações cromossômicas e
rearranjos estruturais devidos à recombinação
mitótica.
Dentro deste contexto, o presente trabalho
tem como objetivo geral avaliar, através do Teste para Detecção de Mutação e Recombinação
Somática (SMART) em Drosophila melanogaster,
os Adesivos A e B. Tem como objetivos específicos qualificar a ação mutagênica, clastogênica
e/ou recombinogênica dos produtos em estudo
e quantificar a contribuição da recombinação
mitótica e da mutação gênica e/ou cromossômica
para a genotoxicidade total dos materiais em
estudo.
Foram utilizadas linhagens de Drosophila
melanogaster designadas como flr 3 (flr 3 /
In(3LR)TM3,ri pp sep l(3)89Aa bx34e e BdS), e mwh
(mwh/mwh). Para maiores esclarecimentos a respeito dos marcadores genéticos acima apresentados, ver Lindsley e Zimm (1992). Nesta abordagem experimental foi empregado o cruzamento padrão, no qual fêmeas virgens flr3 foram cruzadas com machos mwh, originando larvas portadoras de nível basal de atividade metabólica
dependente de citocromo P-450. Este cruzamento
originou larvas com duas constituições
genotípicas, no que se refere aos genes
marcadores localizados no cromossomo 3:
MATERIAL E MÉTODOS
Os materiais utilizados na pesquisa foram dois
adesivos dentários nomeados como: (i) Adesivo A, composto por uma associação de diferentes monômeros, tais como o BisGMA, HEMA,
UDMA, além de ativadores e solvente a base
de álcool e água e (ii) Adesivo B, agente de
união que apresenta UDMA e HEMA como
monômeros constituintes e solvente a base de
acetona. Os adesivos foram diluídos em água
até que a quantidade do solvente, água ou álcool, atingisse uma concentração de 5%.
O Teste SMART de asa baseia-se na identificação de pêlos com fenótipos mutantes que
representam a expressão fenotípica da ocorrência de lesões em nível de DNA. Tais alterações
·
Larvas mwh +/ + flr3 - que são transheterozigotas para os marcadores
recessivos mwh e flr3.
·
Larvas mwh +/TM3,BdS - heterozigotas
para o cromossomo TM3, necessário para
balancear o marcador flr3, já que este é
letal em homozigose (GARCIA-BELLIDO
e DAPENA, 1974).
Os cruzamentos foram realizados em massa
(80 fêmeas: 40 machos), durante três dias, em
vidros contendo meio de cultura padrão. Após
este período, os casais foram transferidos para
tubos de ¼ de litro contendo meio de ovoposição,
onde permaneceram por oito horas. Passado este
tempo, os adultos foram descartados. Depois de
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
77
72 horas do início do período de ovoposição, foram coletadas larvas de terceiro estágio, por
flotação em água corrente. Estas larvas foram,
então, submetidas a tratamento crônico com
diferentes diluições dos compostos.
Todos os adultos que nasceram 10-12 dias após
a postura dos ovos foram conservados em etanol
70%. Posteriormente, as asas dos indivíduos transheterozigotos e heterozigotos TM3 foram submetidas à montagem em lâminas de vidro, contendo 10 asas de fêmeas e 10 asas de machos, e analisadas em microscópio óptico com aumento de
400 X. Foram analisadas as asas de 30 indivíduos
de cada sexo, por concentração do composto,
observando-se os fenótipos dos tricomas existentes nas superfícies dorsal e ventral das asas. Os
diferentes tipos de manchas são designados como
simples mwh ou flr 3, quando apenas um dos
marcadores se expressa, ou como manchas gêmeas, quando tanto pêlos múltiplos (mwh), como
pêlos com a base alargada (flr3) estão presentes
dentro de uma mesma mancha.
Analisando o genótipo heterozigoto TM3, que
expressa somente manchas originadas por mutações pontuais e cromossômicas, pode-se
quantificar o papel da recombinação mitótica
78
enquanto mecanismo de ação genotóxica da droga. Para se fazer a avaliação genotóxica dos adesivos, as diferentes diluições foram comparadas
com seus respectivos controles-negativos. A análise estatística foi realizada através do teste
Binominal Condicional (Kastenbaum e Bowman)
e os diagnósticos positivos foram confirmados através do teste não-paramétrico de Wilcoxon, Mann
e Whitney (teste U) (FREI e WÜRGLER, 1995).
RESULTADOS E
DISCUSSÃO
Na Tabela 1 é apresentado o somatório de
resultados obtidos através do teste SMART de
asa de Drosophila melanogaster, considerando a
resposta de imagos do cruzamento padrão, portadores dos genótipos trans-heterozigotos (mwh/
flr3) e heterozigoto TM3 (mwh/TM3), após a
exposição crônica aos Adesivos A e B. Foram
testadas três concentrações e um controle negativo para cada droga. As soluções de solventes,
utilizadas como controles negativos, foram comparadas aos grupos testes para a identificação
de aumento estatisticamente significativo na
freqüência de indução de manchas mutantes.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Tabela 1 - Dados referentes à indução de manchas mutantes após tratamento crônico com adesivos dentais
comercialmente disponíveis — Adesivo A e Adesivo B — obtidos através do cruzamento padrão do
teste SMART.
a
Diagnóstico estatístico segundo Frei e Würgler (1998): +, positivo; -, negativo; i, inconclusivo; m, fator de multiplicação para
estabelecimento de resultado negativo significante. Nível de significância a=b=0,05. b Incluindo manchas flr 3 raras. c Apenas
manchas simples mwh podem ser observadas no heterozigoto mwh/TM3 já que o cromossomo balanceador TM3 não carrega a mutação
flr3. CN = controle negativo.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
79
O Adesivo A promoveu um aumento na freqüência de indução de manchas mutantes nas asas
de moscas trans-heterozigotas, o que o caracteriza
como genotoxina de ação direta – com diagnóstico
positivo na maior concentração. Assim, para identificação do tipo de dano que o xenobiótico induz,
foram analisadas moscas do genótipo heterozigoto
TM3, que expressam exclusivamente mutação
gênica e/ou cromossômica – não tendo sido observado aumento significativo na indução de manchas
mutantes. Isso classifica o fármaco como indutor da
recombinação mitótica. Já o Adesivo B apresentou
resultado positivo confirmado nas três concentrações testadas quando foram avaliadas as moscas
trans-heterozigotas. Na análise do genótipo
heterozigoto TM3 se obteve resposta estatisticamente
significante somente na maior concentração, indicando que a droga atua via aumento da
recombinação mitótica e da mutação.
Os produtos comerciais (adesivos dentais) foram diluídos até que seu diluente – álcool para o
Adesivo A e acetona para o Adesivo B – fosse
reduzido a 5% e não atuasse como genotoxina
para não servir de viés na obtenção de resultados
(RODRIGUES et al., 2007). Como esses produtos foram bastante diluídos, as concentrações testadas podem ser encontradas em situações clínicas, onde o adesivo mal-polimerizado pode liberar grande quantidade de monômeros livres que
irão interagir com os tecidos locais, isto é, o
complexo dentino-pulpar, mucosa jugal e
gengival. Na Tabela 2, se evidencia a potência
genotóxica dos dois adesivos por unidade de tratamento. O Adesivo B foi cerca de seis vezes
(92,60) mais genotóxico que o A (16,40). Tais
achados podem estar relacionados ao fato de que
o Adesivo B apresenta maiores concentrações de
monômeros, representados por HEMA e UDMA.
Tabela 2 - Quantificação da Recombinação Mitótica e da Potência Genotóxica a.
Todos os valores são corrigidos pelo controle. Freqüências no marcador heterozigoto mwh/flr3 são calculadas com e sem correção por
tamanho do clone, uma vez que diferentes estimativas são obtidas para a contribuição relativa da recombinação para a indução de
clones totais; b A freqüência de clones por indivíduos, dividido pelo número de celulas analisadas por indivíduo (48 800) fornece uma
freqüência estimada por célula e por divisão celular em experimentos de exposição crônica; c Média geométrica calculada de acordo
com Frei et al. (1992).
a
80
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Independente da dose e da potência
genotóxica, ambos adesivos se classificam como
genotoxinas de ação direta, predominantemente
indutoras de recombinação mitótica. A importância clínica dessa afirmação encontra respaldo na
utilização desses materiais, que entram em contato direto com tecidos vivos. Os adesivos, que
são responsáveis pela adesão da resina composta
à estrutura dental durante o protocolo restaurador, são amplamente empregados diariamente por
grande parte dos cirurgiões-dentistas, sendo objeto de investigação científica e desenvolvimento tecnológico dentro da Odontologia. Além da
ação sobre o dente propriamente dito, monômeros
provenientes dos adesivos e das resinas compostas podem exercer sua ação genotóxica sobre as
mucosas orais, agindo como um auxiliar na promoção da carcinogênese. Como o câncer bucal é
um problema de saúde pública e a população já
está exposta a um grande número de substâncias
mutagênicas (álcool, fumo, radiação solar, traumas térmicos e mecânicos, além de processos inflamatórios e proliferativos), subprodutos de restaurações estéticas encontram um campo propício ao dano biológico.
Relatos na literatura mostram que os
monômeros resinosos possuem diversificada ação
citotóxica e genotóxica, entre elas a alteração
da secreção de citocinas, do metabolismo
lipídico; possuem efeito estrogênico, produzem
danos à membrana celular, inibição de atividade enzimática, alteração do equilíbrio REDOX
na célula, adutos em DNA e proteínas (reação
de adição de Michael), necrose e apoptose celular, formação de micronúcleos, mutação gênica
e mutação cromossômica (SCHWEIKL,
SPAGNUOLO, SCHMALZ, 2006). Os resultados desta pesquisa apontam para a recombinação
mitótica como mais um mecanismo de ação
genotóxica dos monômeros resinosos de uso
odontológico, evidenciado nos adesivos. Como
a recombinação mitótica é uma importante via
de reação genética, envolvida na promoção e
evolução do câncer, conhecer substâncias que
estimulam esse fenômeno é importante para a
utilização segura de materiais em Odontologia.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ambos adesivos estão relacionados com
indução de eventos tóxico-genéticos no genótipo
trans-heterozigoto. O Adesivo A induz lesões
no DNA celular associadas exclusivamente à
recombinação entre cromossomos homólogos,
enquanto que o Adesivo B provoca aproximadamente 14% de danos relacionados à mutação
(gênica e cromossômica) e 86% devido à
recombinação mitótica.
REFERÊNCIAS
AROSSI, G. A. Avaliação de microdureza
superficial de resinas compostas submetidas a diferentes métodos de polimerização
complementar. 2005. 95 f. Dissertação
(Mestrado em Odontologia) – Faculdade de
Odontologia, Universidade Luterana do Brasil, Canoas, 2005
BAGIS, Y.H.; RUEGGEBERG, F.A. Mass loss
in urethane/TEGDMA and BisGMA/
TEGDMA based resin composites during post
cure heating. Dental Materials, v.13, p.377380, nov. 1997.
FERRACANE, J.L. Correlation between
hardness and degree of conversion during the
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
81
setting reaction of unfilled dental restorative
resins. Dental Material Journal, v.1, p.1114, 1985.
FREI, H.; WÜRGLER, F.E. Statiscal methods
to decide whether mutagenicity test data
from Drosophila assays indicate positive,
negative or inconclusive result. Mutation
Research, v.203, p.297-308, 1998.
GARCIA-BELLIDO, A.; DAPENA, J.
Induction, detection and characterization of
cell differentiation mutations in Drosophila.
Molecular and General Genetics, v.128,
p.1117-1130, 1974.
GEUTSEN, W. Biocompatibility of nonamalgam dental filling materials. Critical
Reviews in Oral Biology and Medicine,
v.11, p.333-355, 2000.
KILDAL, K.K.; RUYTER, I.E. How different
curing methods affect the degree of
conversion of resin-based inlay/onlay
materials. Acta Odontológica Scandinavia,
v.52, p.315-322, 1993.
KLEINSASSER, N. H. et al. Genotoxicity and
cytotoxicity of dental materials in human
lymphocytes as assessed by the single cell
microgel electrophoresis (comet) assay. Journal
of Dentistry, v.32, p.229–234, 2004.
LINDSLEY, D.L.; ZIMM, G.G. The genoma
of Drosophila melanogaster. New York:
Academic Press, 1998. 1133p.
82
PARK, S.H.; LEE, C.S. The difference in
degree of conversion between light-cured and
additional heat-cured composites. Operative
Dentistry, v.21, n.5, p.213-217, 1996.
RODRIGUES, F. et al. Genotoxicity of three
mouthwashes products, cepacol, periogard
and plax, in the Drosophila wing-spot test.
Environmental
and
Molecular
Mutagenesis, v.48, n.8, p.644-649, oct. 2007.
SCHWEIKL, H.; SCHMALZ, G.;
RACKEBRANDT, K. The mutagenic
activity of unpolymerized resin monomers in
Salmonella typhimurium and V79 cells.
Mutation Research, v.415, p. 119–130, 1998.
SCHWEIKLL, H.; SCHMALZ, G.; SPRUSS,
T. The Induction of micronuclei in vitro by
unpolymerized resin monomers. Journal of
Dental Research, v.80, n.7, p. 1615-1620, 2001.
SCHWEIKL, H.; SPAGNUOLO, G.;
SCHMALZ, G. Genetic and cellular
toxicology of dental resin monomers. Journal
of Dental Research, v.85, n.10, p. 870-877,
oct. 2006.
WATTS, D.C.; MCNAUGHTON, V.;
GRANT, A. A. The development of surface
hardness in visible light-cured posterior
composites. Journal of Dentistry, v. 14, p.
169-174, 1986.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Ciências da Saúde
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
83
84
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Análise comparativa entre o ENDO PTC original e
leve como substâncias auxiliares no preparo de canais radiculares pelo método manual e mecanizado
KETHERINE PICININ POLIDORO1
ELIAS PANDONOR MOTCY DE OLIVEIRA2
TIAGO ANDRÉ FONTOURA DE MELO3
GRAZIELE BORIN3
RESUMO
Este trabalho avaliou, em Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV), as condições de limpeza das
paredes dentinárias de canais radiculares de sessenta pré-molares inferiores humanos preparados pelas
técnicas manual e mecanizada empregando-se como substâncias químicas auxiliares o Endo PTC original e o leve, a solução de hipoclorito de sódio e o EDTA. As eletromicrografias foram analisadas por três
examinadores sendo atribuídos escores conforme o grau de desobstrução dos túbulos dentinários. Através
dos resultados obtidos e das análises estatísticas de Kruskal-Wallis e de Wilcoxon realizadas, constatouse que não houve diferença estatística quanto à desobstrução dos túbulos em relação ao método de
instrumentação empregado e as substâncias químicas auxiliares utilizadas. Porem houve diferença quanto
aos terços radiculares analisados.
Palavras-chave: Preparo de canal radicular; irrigantes do canal radicular; microscopia eletrônica de
varredura.
1
2
Acadêmica do Curso de Odontologia/ULBRA, Bolsista de
Iniciação Científica PROICT/ULBRA.
Professor/Orientador do Curso de Odontologia da ULBRA
e do PPG Odontologia/ULBRA ([email protected])
3
Mestre em Endodontia pela Universidade Luterana do
Brasil
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
85
ABSTRACT
This work evaluated, through Microscopy Electron Scanning (MEV), the conditions of cleanness of
the dentinal walls of root canals of sixty inferiors premolars human prepared by the techniques manual and
mechanized. It was using, as auxiliary chemical substances, the original and the light Endo PTC, the
sodium hypochlorite solution and the EDTA. The eletromicrografias had been analyzed by three examiners,
attributed marks in agreement the degree of removel of hindrance of the dentinal tubules. Through the
gotten results and the Kruskal-Wallis and Wilcoxon statistical analysed, of the analysis carried through
statistics, it was evidenced that it did not have difference statistics about the removel of the tubules. But, it
had difference about the third root analysed.
Keywords: Root canal preparation; root canal irrigants; microscopy electron scanning.
INTRODUÇÃO
A utilização dos instrumentos endodônticos
durante a realização do preparo do canal
radicular, buscando a limpeza e a modelagem
do mesmo, apresenta como fator adverso à formação de uma camada residual, denominada
de magma dentinário (McCOMB e SMITH,
1975; HOLANDA PINTO, BRAMANTE e
BERBERT, 1991). Essa camada quando aderida
à parede dentinária serve como subsídio para a
colonização de microorganismos e como depósito de seus produtos, interferindo assim na ação
da medicação intracanal e do material
endodôntico obturador (MALLMANN,
FELIPPE e SOARES, 1996).
O uso de substâncias químicas auxiliares, durante a realização do preparo químicomecânico, tem a função de facilitar a remoção
do magma dentinário além de lubrificar e
desinfectar o sistema de canais radiculares.
Várias substâncias estão sendo usadas e descobertas buscando no afã reunir todas as propriedades desejáveis em uma única solução, como é
o caso do creme de Endo PTC.
86
O creme de Endo PTC surgiu em 1973, quando Paiva e Antoniazzi propuseram uma modificação na fórmula proposta por Stewart,
Kapsimalis e Rappaport (1969) na qual houve a
substituição do EDTA da formula original do
RC-Prep por um detergente sintético, o Tween
80 (Polissorbato 80), com o objetivo de
potencializar o aumento da permeabilidade
dentinária. Esses autores também sugeriram que
no lugar da solução de hipoclorito de sódio a
5,25% houvesse a neutralização do peróxido de
uréia com o uso da solução de hipoclorito de
sódio a 0,5% tendo como veículo o carbowax
surgindo assim o creme de Endo PTC.
Cada componente do creme de Endo PTC
possui uma função: o veículo, carbowax, serve
como transporte das substâncias e torna viável
a associação delas; o Tween 80 é um detergente
que atua diminuindo a tensão superficial facilitando assim a penetração das substâncias nos
túbulos dentinários e também funciona como
umectante e emulsionante, absorvendo a gordura e mantendo-a em suspensão, fazendo com
que sua retirada seja facilitada; já o peróxido
de uréia é um agente antimicrobiano, e que
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
quando reage com a solução de hipoclorito de
sódio, libera oxigênio livre e cloro ativo, que são
altamente
eficazes
no
combate
a
microorganismos (AMORIN e LAGE-MARQUES, 2001; PAIVA e ANTONIAZZI, 1988).
A partir da idealização do creme de Endo
PTC, vários autores iniciaram diversos estudos
analisando as suas propriedades.
Em 1989, Prokopowitsch, Moura e Muench
realizaram um estudo que avaliou, in vitro, a
permeabilidade dentinária radicular no terço
apical através da utilização de inúmeras substâncias químicas auxiliares. Como resultado, os
autores verificaram que o creme de Endo PTC
associado à solução de hipoclorito de sódio a
1% e ao Tergentol/Furacin, frente às outras substâncias químicas auxiliares utilizadas, foi o que
melhor promoveu um aumento da
permeabilidade dentinária no terço apical.
Ferreira, Carvalho e Lage-Marques (2005)
compararam a utilização do Endo PTC na forma
gel, tendo como veículo o carbopol, com o Endo
PTC creme no preparo químico-mecânico de
canais radiculares. Concluíram que mesmo não
tendo ocorrido diferença estatística significativa entre o Endo PTC gel e na forma de creme, o
gel proporcionou alto índice de infiltração do
corante indicador.
Também em 2005, Carvalho, Habitante e
Lage-Marques analisaram a alteração da
permeabilidade dentinária promovida pelo uso
da substância química auxiliar Endo PTC empregando diferentes veículos na sua composição.
Verificaram que não houve diferença estatística significativa quanto ao veículo do Endo PTC
e que o mesmo é uma substância química auxiliar que pode ser empregada na limpeza do sis-
tema de canais radiculares, pois promoveu um
grande aumento na permeabilidade dentinária
representado pela infiltração do corante indicador.
O Endo PTC existe no mercado na forma de
creme e mais recentemente na forma de gel.
Atualmente foi lançado o Endo PTC leve que
apresenta a mesma composição do Endo PTC já
existente (Peróxido de Uréia, Polissorbato 80 e
carbowax). A única diferença entre o Endo PTC
original e o leve está no peso molecular do carbowax
utilizado como veículo. O carbowax utilizado no
Endo PTC leve tem um peso molecular bem menor que o usado no Endo PTC original, o que torna a sua consistência mais fluída.
Este estudo teve como objetivo avaliar em
microscopia eletrônica de varredura (MEV), a
eficiência da limpeza das paredes dentinárias de
canais radiculares preparados por meio dos métodos de instrumentação manual e mecanizada
de rotação alternada, tendo como substâncias
químicas auxiliares o creme de Endo PTC original e o leve, ambos neutralizados pela solução de
hipoclorito de sódio a 1% e toalete final com
EDTA trissódico a 17%.
MATERIAL E MÉTODOS
Para o presente estudo foram utilizados 60 dentes pré-molares inferiores. Os mesmos foram distribuídos de forma randomizada em 06 grupos de acordo com a técnica de instrumentação e com as substâncias químicas auxiliares utilizadas durante o
preparo químico-mecânico (Quadro 1).
Os grupos 01 e 04 foram considerados como
grupos controle.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
87
Quadro 1 - Quadro demonstrativo dos grupos experimentais.
A coroa dos dentes foi removida na altura
do limite amelocementário e o comprimento das
raízes foi padronizado entre 15 mm a 16 mm.
Após determinado o comprimento de trabalho, as raízes foram fixadas em uma morsa envoltas por uma gaze a fim de facilitar a realização da instrumentação. O preparo dos canais
radiculares foi realizado por um único operador.
Inicialmente, realizou-se o preparo do terço
cervical em todos os canais radiculares com uma
broca Gates-Glidden no. 01 (Dentsply/Maillefer) a
uma profundidade de 3 mm e com a broca GatesGlidden no. 02 a uma profundidade de 2 mm.
Para o preparo dos canais radiculares utilizaram-se os instrumentos endodônticos Flexo-File
da 1ª série (Dentsply/Maillefer) e a técnica de
preparo utilizada para todos os grupos foi a
88
escalonada de recuo progressivo programado
(WALTON, 1976).
O número limite de usos de cada instrumento endodôntico foi padronizado em cinco
canais radiculares (PESCE, 1984). Sendo empregado como memória o instrumento
endodôntico nº. 30, recuando-se 1 mm do comprimento de trabalho para o instrumento nº.
35 e 2 mm para o nº. 40.
Para a técnica oscilatória, utilizou-se o contra ângulo NSK (TEP 10R) com redução da
velocidade de 16:1, sendo empregado os instrumentos Flexo-File com a mesma seqüência de
instrumentação realizada nos seis grupos.
Foi utilizado o creme de Endo PTC, original e
leve, de um mesmo fabricante (Fórmula & Ação,
São Paulo – Brasil) (Quadro 2).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Quadro 2 - Quadro comparativo entre o Endo PTC original e leve.
Tanto o Endo PTC original como o leve foi
levado para o interior do canal radicular por
meio dos instrumentos endodônticos durante
todo o preparo químico-mecânico, sendo neutralizado por 1 ml de solução de hipoclorito de
sódio a 1% (Iodontec) a cada troca de instrumento. Após a finalização do preparo, foi levado ao interior do canal radicular o EDTA
trissódico a 17% (Iodontec), o qual permaneceu no seu interior por um período de 3 minutos. A seguir, foi realizada a irrigação final com
2 ml de solução de hipoclorito de sódio a 1%.
O canal radicular foi seco com pontas de papel
absorvente (Tanari) e em seguida a raiz foi
clivada, sendo utilizada a melhor hemissecção
(Figura 1) para análise em MEV.
Figura 1 – Hemissecção radicular após a clivagem.
As imagens eletromicrográficas foram obtidas
em duas zonas, sendo uma no terço apical e a
outra no terço médio, com um aumento de 1000
vezes. Posteriormente, todas as imagens foram
avaliadas por três examinadores com experiência
em MEV que foram treinados e calibrados de
acordo com o seguinte critério analisado:
desobstrução dos túbulos dentinários (Tabela 1).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
89
Tabela 1 - Escores relativos ao critério de desobstrução dos túbulos dentinários.
Figura 2 – Imagem de eletromicrografia referente ao escore 1.
Figura 3 – Imagem de eletromicrografia referente ao escore 2.
90
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Figura 4 – Imagem de eletromicrografia referente ao escore 3.
Com relação à calibragem dos examinadores foi utilizado o cálculo do Kappa em
que se observou, de acordo resultados obtidos, uma concordância significativa entre
os mesmos.
Logo após os resultados obtidos foram submetidos à análise estatística utilizando-se o teste
não-paramétrico de Kruskal-Wallis e de Wilcoxon.
RESULTADOS
Os resultados da desobstrução dos túbulos
dentinários no terço médio do canal radicular
estão mostrados na Figura 5.
Figura 5 – Grau de desobstrução dos túbulos dentinários no terço médio do canal radicular.
Por meio dos resultados obtidos no teste nãoparamétrico de Kruskal-Wallis verifica-se que
não existe diferença significativa entre os grupos. (Estatística do teste = 6,41; p = 0,27).
Já os resultados da desobstrução dos túbulos
dentinários no terço apical do canal radicular
estão mostrados na Figura 6.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
91
Figura 6 - Grau de desobstrução dos túbulos dentinários no terço apical do canal radicular.
Também nos resultados do teste não paramétrico de Kruskal-Wallis verifica-se que
não existe diferença significativa entre os grupos. (Estatística do teste = 6,17; p = 0,29).
Com relação à análise comparativa entre os ter-
ços analisados, terço médio e apical, de acordo com
o teste não-paramétrico de Wilcoxon, se verificou
que existe diferença significativa entre os mesmos
(Figura 7). Observa-se escores superiores no terço
Apical. (Z = -4,09; p < 0,01).
Figura 7 – Comparativo do grau de desobstrução dos túbulos dentinários entre o terço médio e apical do canal
radicular.
Já com relação à análise comparativa entre os
dois métodos de instrumentação, manual e alternada, por meio do teste não-paramétrico de Wilcoxon,
92
se verificou que não houve diferença significativa
entre os mesmos tanto ao nível de terço médio (Figura 8) como de terço apical (Figura 9).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Figura 8 – Comparativo do grau de desobstrução dos túbulos dentinários entre os dois métodos de
instrumentação correspondente ao terço médio.
Figura 9 – Comparativo do grau de desobstrução dos túbulos dentinários entre os dois métodos de
instrumentação correspondente ao terço apical.
DISCUSSÃO
A limpeza dos canais radiculares é um aspecto altamente significante no tratamento
endodôntico e a sua importância tem sido
enfatizada por diversos pesquisadores
(GOLDMAN et al., 1982; GROSSMAN e
NEYMAN, 1941; McCOMB et al., 1976;
BERBERT, BRAMANTE e BERNARDINELI,
1980). Por isso atualmente, têm-se buscado um
conjunto de métodos associando diferentes instrumentos endodônticos, técnicas de
instrumentação com diferentes substâncias
químicas auxiliares que possam proporcionar canais radiculares adequadamente limpos, independente da sua morfologia.
Em nosso estudo tivemos como intuito avaliar
a efetividade do creme de Endo PTC leve recentemente lançado no mercado, comparado com o
creme de Endo PTC original, que vem sendo utilizado há muito tempo como substância química
auxiliar no preparo de canais radiculares.
Com relação aos resultados obtidos no presente estudo, no qual não se verificou diferença
estatística significativa entre as substâncias quí-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
93
micas auxiliares utilizadas nos diferentes grupos
quanto ao critério de desobstrução dos túbulos
dentinários, pode-se justificar isso devido à utilização como irrigante final, em todos os grupos,
da solução de EDTA trissódico a 17%.
Segundo alguns autores (McCOMB e
SMITH, 1975; MERYON e BROOK, 1990), o
EDTA trissódico a 17% é um quelante que promove a remoção do magma dentinário, o que
resulta em paredes dentinárias mais limpas e os
túbulos dentinários evidentes.
Embora o creme de Endo PTC não tenha
apresentado diferença significativa em relação
à substância química auxiliar utilizada nos grupos controles, alguns autores respaldam a sua
utilização na terapêutica endodôntica
(AMORIN e LAGE-MARQUES, 2001;
PROKOPOWITSCH, MOURA e MUENCH,
1989; HOLLAND et al., 1990), pois segundo eles
o Endo PTC é a substância que promove maior
aumento na permeabilidade dentinária.
Em relação ao tipo de creme de Endo PTC,
original e leve, que também não apresentaram diferença estatística entre si, pode-se verificar que
o creme de Endo PTC leve apresenta uma maior
facilidade e uma melhor condição de trabalho
provavelmente devido a sua maior fluidez e um
melhor escoamento no interior do canal radicular.
Já com relação à diferença estatística significativa que houve entre os terços analisados,
terço médio e terço apical, quanto a
desobstrução dos túbulos dentinários, acreditase que seja devido a diferença de permeabilidade
dentinária e a dificuldade de se promover uma
correta limpeza em regiões mais apicais.
Alguns trabalhos (MARSHALL, MASSLER
e DUTE, 1960; HAMPSON e ATKINSON,
94
1964; COHEN et al., 1970; MOURA,
ROBAZZA e PAIVA, 1978; ROBAZZA, PAIVA
e ANTONIAZZI, 1981; MOURA, 1985) exibem
resultados praticamente idênticos, no que tange à permeabilidade dentinária do terço apical
em relação ao terço médio, enfatizando que a
região apical é a menos permeável quando comparada aos terços cervical e médio.
Com relação aos dois métodos de
instrumentação utilizados, não houve diferença
estatística significativa quanto à influência na limpeza das paredes dos canais radiculares preparados. Resultado esse semelhante ao obtido por
Favieri, Gahyva e Siqueira Junior (2000) que
embora não tenha ocorrido diferença entre os métodos, a técnica rotatória apresentou uma limpeza significantemente menor do que as outras técnicas testadas no seu estudo.
CONCLUSÕES
Analisando os resultados obtidos e relacionando-os à desobstrução dos túbulos dentinários,
pode-se verificar que não houve diferença significativa entre as substâncias químicas auxiliares utilizadas e quanto ao método de instrumentação
utilizado no preparo dos canais radiculares. Houve somente alterações com relação aos terços, o
terço médio apresentou resultados superiores em
relação ao terço apical do canal radicular.
REFERÊNCIAS
AMORIN, C.V.G.; LAGE-MARQUES, J.L.S.
Avaliação comparativa da permeabilidade
dentinária após o preparo do canal variando
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
as substâncias químicas. In: REUNIÃO ANUAL DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE PESQUISA ODONTOLÓGICA, 18., 2001,
Águas de Lindóia. Anais... São Paulo: SBPqO,
2001. p. 75. Resumo A039.
BERBERT, A.; BRAMANTE, C.M.;
BERNARDINELI, N. Irrigações em
endodontia. In: BERBERT, A. et al.
Endodontia prática. 1.ed. São Paulo: Sarvier,
1980. p. 47-69.
CARVALHO, G.L.; HABITANTE, S.M.;
LAGE-MARQUES, J.L.S. Análise da alteração da permeabilidade dentinária promovida pela substância Endo PTC empregando
diferentes veículos. Ciência Odontológica
Brasileira, v. 8, n. 4, p. 23-28, out./dez. 2005.
COHEN, S. et al. The effects of acids. Alkalies,
and chelating agents on dentine permeability.
Oral Surgery, Oral Medicine, Oral Pathology,
v. 29, n. 4, p. 631-634, apr. 1970.
FAVIERI, A.; GAHYVA, S.M.; SIQUEIRA
JR, J.F. Extrusão de detritos durante
instrumentação com instrumentos manuais
e acionados a motor. Jornal Brasileiro de
Endo/Perio, v. 2, p. 60-64, jul./ago. 2000.
FERREIRA, M.B.; CARVALHO, E.M.O.F;
LAGE-MARQUES, J.L.S. Avaliação da
permeabilidade dentinária dos canais
radiculares utilizando gel e creme Endo PTC
como substâncias químicas auxiliares. Revista de Odontologia da Universidade de São
Paulo, v. 12, n. 1, p. 32-37, 2005.
GOLDMAN, M. et al. The efficacy of several
endodontic irrigating solutions: a scanning
electron microscopic study. Part 2. Journal of
Endodontics, v. 8, n. 11, p. 487-492, nov. 1982.
GROSSMAN, L.I.; NEYMAN, B.W. Solution
of pulp tissue by chemical agents. Journal of
the American Dental Association, v. 28, n.
2, p.223-225, feb. 1941.
HAMPSON, E.L.; ATKINSON, A.M. The
relation between drugs used in root canal
therapy and permeability of the dentine.
British Dental Journal, v. 116, n. 12, p. 546550, jun. 1964.
HOLLAND, R. et al. Presença de detritos
na região apical de dentes de cães após o
preparo biomecânico com ou sem o emprego
de substância auxiliar cremosa. Revista de
Odontologia da UNESP, v. 19, n. 1, p. 105112, jan./fev. 1990.
HOLANDA PINTO, S.A.; BRAMANTE,
C.M.; BERBERT, A. Avaliação da limpeza de
canais radiculares obtidas pelas técnicas de
instrumentação manual, ultra-sônica e combinação de ambas. Revista Brasileira de Odontologia, v. 48, n. 3, p. 2-12, maio/jun. 1991.
MALLMANN, J.; FELIPPE, W.T.; SOARES,
I.J. Smear layer – é necessário removê-lo?
Revista Brasileira de Odontologia, v. 53, n.
5, p. 35-38, set./out. 1996.
MARSHALL, F.J.; MASSLER, M.; DUTE,
H.L. Effects of endodontic treatments on
permeability of root dentine. Oral Surgery,
Oral Medicine, Oral Pathology, v. 13, n. 2,
p. 208-223, feb. 1960.
McCOMB, D.; SMITH, D.C. A preliminary
scanning electron microscopic study of root
canals after endodontic procedures. Journal of
Endodontics, v. 1, n. 7, p. 238-242, jul. 1975.
McCOMB, D. et al. The results of in vivo
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
95
endodontic chemomechanical instrumentation:
a scannig electron microscopic study. Journal
of the British Endodontic Society, v. 9, n. 1,
p. 11-18, jan. 1976.
MERYON, S.; BROOK, A. Penetration of
dentine by three oral bacteria in vitro and
their associated cytotoxicity. International
Endodontic Journal, v. 23, n. 4, p. 196-202,
jun. 1990.
MOURA, A.A.; ROBAZZA, C.R.; PAIVA,
J.G. A relação entre permeabilidade
dentinária e o uso do Endo PTC no preparo
do canal. Estudo “in vitro” e “in vivo”. Revista da Associação Paulista de Cirurgiões
Dentistas, v. 32, n. 1, p. 37-46, jan./fev. 1978.
MOURA, A.A.M. Análise “in vitro” da
permeabilidade dentinária radicular quando do emprego de instrumentos
endodônticos, tendo como fonte de variação o instrumento e o número de uso. 1985.
75f. Tese (Doutorado em Odontologia) - Faculdade de Odontologia, Universidade de
São Paulo, São Paulo, 1985.
PAIVA, J.G.; ANTONIAZZI, J.H. O uso de
uma associação de peróxido de uréia e detergente (Tween 80) no preparo químicomecânico dos canais radiculares. Revista da
Associação Paulista de Cirurgiões Dentistas, v.27, n.7, p.416-423, 1973.
PAIVA, J.G.; ANTONIAZZI, J.H. Substâncias químicas. In: PAIVA, J.G.;
ANTONIAZZI, J.H. Endodontia: bases para
96
a prática clínica. 2.ed. São Paulo: Artes Médicas, 1988. p. 588-629.
PESCE, H.F. Análise comparativa in vitro
da eficiência do corte de alguns instrumentos de uso endodôntico em função do seu
tipo e procedência, número de usos e operador. 1984. 44f. Tese (Doutorado em Odontologia) - Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1984.
PROKOPOWITSCH, I.; MOURA, A.A.M.;
MUENCH, A. Análise “in vitro” da
permeabilidade dentinária radicular do terço
apical, tendo como fonte de variação a substância química auxiliar da instrumentação.
Revista de Odontologia da Universidade de
São Paulo, v. 3, n. 2, p. 345-353, abr./jun. 1989.
ROBAZZA, C.R.C.; PAIVA, J.G.;
ANTONIAZZI, J.H. Variações na
permeabilidade da dentina radicular quando do emprego de alguns fármacos auxiliares
no preparo endodôntico. Revista da Associação Paulista de Cirurgiões Dentistas, v. 35,
n. 6, p. 528-533, nov./dez. 1981.
STEWART, G.G.; KAPSIMALIS, P.;
RAPPAPORT, H. EDTA and urea peroxide
for root canal preparation. Journal of the
American Dental Association, v. 78, n. 2,
p. 335-338, feb. 1969.
WALTON, R.E. Histologic evaluation of
different methods of enlarging the pulp canal space. Journal of Endodontics, v. 2, n.
10, p. 304-311, oct. 1976.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Audição de idosos do bairro São Luís, Canoas,
RS: presença de deficiência auditiva
ALINE FERREIRA VIEIRA1
CRISTIANE RODRIGUES MARTINS2
EDUARDO MACHADO FARIAS3
ADRIANE RIBEIRO TEIXEIRA4
CÍNTIA DE LA ROCHA FREITAS5
BENNO BECKER JÚNIOR5
LUZIA FERNANDES MILLÃO6
RESUMO
Este estudo teve como objetivo avaliar a audição de idosos residentes no bairro São Luís, em Canoas
(RS). Inicialmente foram visitadas as casas do bairro, visando identificar em quais residiam idosos, entrevistando-os. A seguir foi realizada a meatoscopia, a medida do nível de ruído ambiente e a audiometria.
Dos 72 idosos encontrados, 51 (70,83%) realizaram a avaliação, sendo 36 (70,59%) mulheres (69,41±7,06
anos) e 15 (29,41%) homens (70,47±7,05 anos). Constatou-se que a maior parte (64,7%) apresentou
deficiência auditiva de grau leve (29,41%), moderado (19,61%), severo (7,84%) ou profundo (7,84%).
Palavras-chave: presbiacusia, deficiência auditiva, idosos, gerontologia, envelhecimento.
1
Acadêmica do Curso de Fonoaudiologia/ULBRA – Bolsista
PROICT/ULBRA
4
Professora-Orientadora do Curso de Fonoaudiologia/
ULBRA ([email protected])
2
Acadêmica do Curso de Educação Física da ULBRA –
Bolsista PROICT/ULBRA
5
Professores do Curso de Educação Física/ULBRA
6
Professora do Curso de Enfermagem/ULBRA
3
Acadêmico do Curso de Educação Física/ULBRA
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
97
ABSTRACT
This study aimed at assessing the hearing capacity of elders living in São Luís neighborhood, in Canoas,
Rio Grande do Sul. Firstly, houses in that neighborhood were visited in order to identify the ones with older
people; then an interview was conducted with the identified elders. Next, a meatoscopy was performed to
measure the level of environmental noise, together with audiometry. Out of the 72 elders identified, 51
(70.83%) were assessed, with 36 (70.59%) women (69.41±7.06 years), and 15 (29.41%) men
(70.47±7.05 years). It was noticed that most of them (64.7%) showed a slight hearing impairment
(29.41%), a moderate hearing impairment (19.61%), a severe hearing impairment (7.84%) or a deep
hearing impairment (7.84%).
Keywords: presbycusis, hearing impairment, elder, gerontology, aging.
INTRODUÇÃO
O aumento no número de idosos é um fenômeno que ocorre mundialmente, sendo que no
Brasil isto ocorre de forma rápida e radical. Projeções indicam que em 2020 o país ocupará o
sexto lugar em número de pessoas com mais de
60 anos (VERAS, 2007). Este fato pode ser explicado pelo declínio acentuado nas taxas de
fecundidade, principalmente a partir da metade da década de 60, e do declínio da mortalidade (WONG e CARVALHO, 2006).
Sabe-se que o envelhecimento pode provocar
uma série de transformações nos diferentes sistemas do corpo humano. No que se refere ao sentido
da audição, a deficiência auditiva decorrente do
aumento da idade é chamada de presbiacusia.
(KASSE e CRUZ, 2006). Caracteriza-se por ser de
tipo neurossensorial e bilateral, com piora dos limiares audiométricos nas freqüências agudas
(GARDNER e SLENKOVICH, 2006). Apesar de
manifestar-se clinicamente a partir dos 50 anos,
sabe-se que o início da presbiacusia ocorre por volta
dos 30 anos, atingindo mais precocemente e de
forma mais intensa os indivíduos do sexo masculino (HAYFLICK, 1997).
98
Baraldi, Almeida e Borges (2005) citam o
Comitee on Hearing, Bioacoustics and
Biomechanics para destacar que, além da idade,
a presbiacusia é resultante da “soma de prejuízos auditivos causados por exposição a ruído,
agentes ototóxicos e prejuízos causados por desordens e tratamentos médicos”. Para Bilton,
Viude e Sanchez (2006), além dos fatores citados, ainda devem ser incluídas as alterações
metabólicas e circulatórias, as infecções, os
traumatismos e a hereditariedade.
Por ser uma alteração com alta prevalência,
a deficiência auditiva em idosos pode ser considerada um problema de saúde pública, apesar
de não estar na lista dos problemas investigados
por médicos neste grupo etário (VALETEROSALINO e ROZENFELD, 2005).
Vários estudos nacionais e internacionais
foram realizados para tentar estabelecer o número de idosos afetados, sendo que os valores
encontrados foram muito variáveis.
Pesquisas nacionais destacam prevalências de
39,4% (MATTOS e VERAS, 2007), 32,2%
(BARALDI, ALMEIDA e BORGES, 2007), 63%
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
(BILTON et al, 1997), 81,2% (BÉRIA et al, 2007)
e 89,23% (AMARAL e SENA, 2004). Nos estudos
internacionais foram encontrados valores de 16,9%
a 83% (BESS, 2000; FERRÉ REY, MORELLÓCASTRO e BARBERÁ CURTO, 2002; HEINE e
BROWNING, 2002; GORDON-SALANT, 2005).
Apesar dos autores citados concordarem que
os idosos apresentam deficiência auditiva
neurossensorial, e que os indivíduos do gênero
masculino são mais afetados, também foram encontradas discordâncias no que se refere ao grau
de deficiência auditiva, que pode ser leve, leve
a moderado ou moderado (AMARAL e SENA,
2004; MATTOS e VERAS, 2007; BARALDI,
ALMEIDA e BORGES, 2007,).
Estas divergências podem ser explicadas pela
variabilidade de indivíduos avaliados, que, além
de diferentes geneticamente, provavelmente
foram expostos a uma série de fatores que afetaram em maior ou menor grau a sua capacidade
auditiva. Além disso, são várias as classificações
de deficiência auditiva, no que se refere ao grau,
sendo que, nos estudos citados, não foi utilizada a mesma forma de cálculo.
Considerando-se que a deficiência auditiva
afeta um número significante de idosos e a carência de estudos de base populacional sobre o
tema, optou-se por realizar esta pesquisa que tem
como objetivo verificar a prevalência de deficiência auditiva em um grupo de idosos residentes no bairro São Luís, em Canoas, RS.
MATERIAL E MÉTODOS
Esta pesquisa é transversal e interdisciplinar,
com profissionais e alunos dos cursos de
Fonoaudiologia, Educação Física e Enfermagem.
O grupo foi formado a partir do interesse na área
do envelhecimento humano. Inicialmente foram
realizadas reuniões para a organização do projeto
de pesquisa, sendo estabelecidos os objetivos do
mesmo. A partir desta etapa, cada um dos professores foi responsável pela seleção de instrumentos de avaliação em sua área específica, tendo o
cuidado de eleger aqueles que pudessem ser aplicados nas residências dos idosos. Após várias reuniões, foi criado um instrumento final, que incluía avaliações auditivas, de sono, dor, qualidade de vida, equilíbrio e força. A seguir foi feito o
treinamento do grupo, para a possibilidade de
aplicação do instrumento pelos alunos e profissionais das diversas áreas, com exceção da
audiometria, que foi realizada somente pelos envolvidos no curso de Fonoaudiologia. O projeto
foi aprovado no comitê de ética em pesquisa da
ULBRA (protocolo 2006/035h).
Este estudo foi realizado no bairro São Luís,
na cidade de Canoas, RS. A escolha do mesmo
foi feita por conveniência, em função da proximidade com a Universidade e a possibilidade
de deslocamento dos idosos até à mesma, caso
fossem encaminhados para outras avaliações.
O bairro São Luís situa-se em Canoas (RS),
às margens da BR 116 e tem uma população
aproximada de 4500 habitantes. No início do
estudo, foi realizada a definição dos limites geográficos do bairro e número de ruas existentes.
A seguir, foram realizadas visitas aos domicílios,
buscando identificar em quais residiam idosos e
convidando os mesmos para participação voluntária na pesquisa. Os que aceitaram assinaram
o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
e foram submetidos às avaliações.
Devido ao número de avaliações a serem realizadas, em muitos casos foi necessária uma se-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
99
gunda visita ao domicílio, para finalização da
aplicação dos protocolos.
0-25 decibel nível de audição (dBNA) - limiares auditivos normais;
A amostra foi constituída, inicialmente, por
72 idosos. Foi considerado idoso o indivíduo com
idade igual ou superior a 60 anos (NETTO, 2006).
26 – 40 dBNA – deficiência auditiva leve
Do número inicial de idosos participantes,
21 foram excluídos por não concordarem em realizar o procedimento ou não serem encontrados em suas residências no momento em que a
avaliação auditiva foi realizada, mesmo após a
tentativa de agendamento de horário e data por
telefone. Assim, a amostra foi composta por 51
indivíduos de ambos os sexos.
A primeira fase da pesquisa de limiares auditivos consistiu na medida do ruído ambiental
dos vários cômodos do domicílio (decibelímetro
MSL-1351C – MINIPA), identificando o que
tivesse o menor nível de ruído, que foi selecionado para a realização da pesquisa. Após, os idosos passavam por meatoscopia (otoscópio Welch
Allyn) e eram orientados sobre o procedimento.
A pesquisa de limiares auditivos para tom
puro foi realizadas utilizando-se um audiômetro
portátil modelo AS-208 (Marca Interacoustics),
utilizando-se o método descendente e tom puro
modulado (warble). Os idosos foram posicionados
de costas para o examinador e orientados a levantar a mão do lado correspondente ao que
estivessem escutando o som. O exame iniciou
sempre pela orelha em que o indivíduo referia
escutar melhor. Caso não percebesse diferença,
o exame foi iniciado pelo lado direito. Para o
cálculo do grau de deficiência auditiva, foi utilizada a classificação da Organização Mundial
da Saúde (OMS, 1997), ou seja, considerou-se
a média das freqüências de 500Hz, 1000Hz,
2000Hz e 4000Hz:
100
41 – 60 dBNA – deficiência auditiva moderada
61 – 80 dBNA – deficiência auditiva severa
+ 80 dBNA – deficiência auditiva profunda
Destaca-se que para a análise dos dados foram
considerados somente os resultados da melhor orelha (OMS, 1997) e que o nível de ruído ambiental
das residências não ultrapassou os 50dB(A).
RESULTADOS E
DISCUSSÃO
Foram avaliados 51 sujeitos, sendo 36
(70,59%) do gênero feminino (média de idade
de 69,41 ± 7,06 anos) e 15 (29,41%) do gênero
masculino (média de idade 70,47 ± 7,05 anos).
A presença de um número maior de idosas
reflete um fenômeno nacional, a feminização do
envelhecimento. Isto ocorre porque as mulheres têm uma expectativa de vida e uma
longevidade maior do que os homens
(CAMARANO, 2006). Este dado é extremamente importante, pois uma maior longevidade
significa que as mulheres estão mais propensas
ao desenvolvimento de doenças crônicodegenerativas. No estágio de desenvolvimento
atual do país, não a maior longevidade não significa envelhecer com qualidade, especialmente no que se refere à saúde. Sabe-se que as iniciativas de prevenção e promoção de saúde são
relativamente novas no Brasil e dificilmente
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
atingem ou atingiram os idosos. Com isto, têmse uma população maior de idosas, que provavelmente sofrem com uma série de patologias.
A avaliação auditiva dos idosos revelou que
a maior parte apresentava deficiência auditiva
(Tabela 1).
Tabela 1 – Prevalência de deficiência auditiva em idosos residentes no bairro São Luís, Canoas, RS
Os valores obtidos são semelhantes aos encontrados por Bilton et al (1997), que observou
a presença de deficiência auditiva em 63% dos
idosos por eles avaliados.
O valor obtido neste estudo, porém, foi superior ao observado por Baraldi, Almeida e
Borges (2007) e Ferre Rey, Morelló-Castro e
Barberá Curto (2002) e inferior aos constatados
por Amaral e Sena (2004) e Béria et al (2007).
Tal como foi destacado anteriormente, nos estudos pesquisados, a metodologia de análise de
dados foi variada, sendo que somente nos estudos de Béria et al (2007) e Mattos e Veras (2007)
foi utilizada a classificação da OMS para a
constatação da presença de deficiência auditiva. Este fato certamente influenciou nos valores obtidos por todos os autores pesquisados.
Um dado a ser salientado é a defasagem de
valores de indivíduos afetados pela deficiência
auditiva descrita na Política Nacional de Saúde
do Portador de Deficiência (30%), inferior ao
obtido em todos os estudos nacionais sobre o tema.
Tabela 2 – Graus de perda auditiva dos idosos
No que se refere ao grau de deficiência auditiva nos idosos avaliados, constatou-se que a maior
parte apresentou deficiência auditiva de grau leve
(29,4%), seguido pela deficiência auditiva de grau
moderado (19,6%)(Tabela 2). Este dado é concordante com o observado por Mattos e Veras
(2007) e Baraldi, Almeida e Borges (2007).
A presença de deficiência leve faz com que o
idoso muitas vezes não procure ou não seja encaminhado para atendimento especializado, por não
ter uma queixa específica sobre os distúrbios auditivos. Sabe-se, porém, que este grau de deficiência auditiva, associado à uma perda auditiva
maior nas freqüências altas (agudas) faz com que
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
101
a compreensão de fala seja prejudicada, interferindo negativamente nos relacionamentos dos
idosos, fazendo com que os mesmos afastem-se
do convívio familiar e social, iniciando um processo de isolamento que pode agravar ou originar quadros depressivos (Teixeira et al, 2007).
Tabela 3 – Presença e grau de deficiência auditiva nos idosos do gênero feminino
Tabela 4 – Presença e grau de deficiência auditiva nos idosos do gênero masculino
No que se refere à influência da variável gênero (Tabelas 3 e 4), observou-se que, conforme descrito na literatura nacional e internacional, os indivíduos do gênero masculino são mais afetados
pela alteração e têm um grau maior de deficiência
auditiva. Este achado confirma os resultados obtidos por Baraldi, Almeida e Borges (2007) e são
diferentes dos observados por Mattos e Veras
(2007), que observaram, nos dois grupos, a maior
prevalência de deficiência auditiva de grau leve.
Tal como foi descrito anteriormente, a
presbiacusia é causada pelo envelhecimento do
sistema auditivo, mas este sistema também sofre
as conseqüências das mais diversas agressões que
ocorrem ao longo da vida (ruído, doenças, medicamentos, álcool, fumo, entre outros). Considerando-se o estilo de vida da maior parte dos
idosos, em que as mulheres exerciam funções
102
mais ligadas à vida doméstica e que os homens
muitas vezes eram expostos a uma série de outros fatores agressores (MATTOS e VERAS,
2007), acredita-se que este fator seja
determinante para a maior prevalência e maior
grau de deficiência auditiva nos indivíduos do
sexo masculino.
CONCLUSÃO
A realização do estudo permitiu verificar que
a maior parte dos idosos avaliados apresentaram
deficiência auditiva, de grau leve ou moderado. Constatou-se, ainda, que os homens foram
mais afetados do que as mulheres, tanto no que
se refere à presença de deficiência auditiva
quanto no grau da alteração pesquisada.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem a Pró-reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da Universidade
Luterana do Brasil e a todos os idosos que participaram do estudo.
REFERÊNCIAS
AMARAL, L.C.G. ; SENA, A.P.R.C. Perfil
audiológico dos pacientes de terceira idade
atendidos no Núcleo de Atenção Médica
Integrada da Universidade de Fortaleza.
Fono Atual, v.27, n.7, p.58-64, 2004.
BARALDI, G.S.; ALMEIDA, L.C.;
BORGES, A.C.C. Evolução da perda auditiva no decorrer do envelhecimento. Revista Brasileira de Otorrinolaringologia, v.73,
n.1, p.64-70, 2007.
BARALDI, G.S.; ALMEIDA, L.C.;
BORGES, A.C.C. Perda auditiva e hipertensão: achados em um grupo de idosos. Revista Brasileira de Otorrinolaringologia, v.70,
n.5, p.640-644, 2005.
BÉRIA, J.U. et al. Hearing impairment and
socioeconomic factors: a population-based
survey of na urban locality in southern Brazil.
Pan American Journal of Public Health,
v.21, n.6, p.381-387, 2007.
BESS, F.H. Hearing impairment. Clinical
Geriatrics, v.8, n.4, 2000. Disponível em:
<http://www.clinicalgeriatrics.com/article/
193>. Acesso em 01 de dezembro de 2007.
BILTON, T. et al. Prevalência de deficiência auditiva em uma população idosa. O
Mundo da Saúde, v.21, n.4, p. 218-225, 1997.
BILTON, T.; VIUDE, A.; SANCHEZ, E.P.
Fonoaudiologia. In: FREITAS, E.V. et al.
(Orgs). Tratado de Geriatria e
Gerontologia. Rio de Janeiro: GuanabaraKoogan, 2006.
CAMARANO, A.A. Envelhecimento da
população brasileira: uma contribuição
demográfica. In: FREITAS, E.V. et al.
(Orgs.). Tratado de Geriatria e
Gerontologia. Rio de Janeiro: GuanabaraKoogan, 2006.
FERRÉ REY, J.; MORELLÓ-CASTRO, G.;
BARBERÁ CURTO, J.L. Factores de riesgo
involucrados en la presbiacusia. Acta
Otorrinolaringológica Española, v.53,
p.572-577, 2002.
GARDNER, M.; SLENKOVICH, N.G.
Disacusia neurossensorial. In: JAFEK, B.W.;
MURROW,
B.W.
Segredos
em
Otorrinolaringologia. Porto Alegre: Artmed,
2006.
GORDON-SALANT, S. Hearing loss and
aging: new research findings and clinical
impairment. JRRD – Journal of
Rehabilitation Research and Development,
v.42, n.4, p.9-24, 2005.
HAYFLICK, L. Como e por que envelhecemos. Rio de Janeiro: Campus, 1997.
HEINE, C. ; BROWNING, C. Communication
and psychosocial consequences of a sensory loss
in older adults: overview and rehabilitation
directions. Disability and Rehabilitation, v.24,
n.15, p.763-773, 2002.
KASSE, C.A. ; CRUZ, O.L.M. Presbiacusia.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
103
In: COSTA, S.S.; CRUZ, O.L.M.; OLIVEIRA, J.A.A. Otorrinolaringologia – Princípios e prática. 2.ed. Porto Alegre: Artmed,
2006. p. 430-433.
idosos: importância do uso de prótese auditiva. Arquivos
Internacionais
de
Otorrinolaringologia, v.11, n.4, p.453-458,
2007.
MATTOS, L.C. ; VERAS, R.P. A prevalência
de deficiência auditiva em uma população de
idosos da cidade do Rio de Janeiro: um estudo
seccional.
Revista
Brasileira
de
Otorrinolaringologia, v.73, n.5, p.654-659, 2007.
VALETE-ROSALINO, C.M. ; ROZENFELD,
S. Triagem auditiva em idosos: comparação
entre auto-relato e audiometria. Revista
Brasileira de Otorrinolaringologia, v.71,
n.2, p.193-200, 2005.
NETTO, M.P. O estudo da velhice no século XX: histórico, definição do campo e termos básicos. In: FREITAS, E.V. et al. (Orgs.).
Tratado de Geriatria e Gerontologia. Rio
de Janeiro: Guanabara-Koogan, 2006.
VERAS, R. Envelhecimento populacional e
as informações de saúde do PNAD: demandas e desafios contemporâneos. Introdução.
Cadernos de Saúde Pública, v.23, n.10,
p.2463-2466, 2007.
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE.
WHO/PDH/97.3. Geneva: WHO, 1997.
WONG, L.L.R. ; CARVALHO, J.A. O rápido processo de envelhecimento populacional
do Brasil: sérios desafios para as políticas públicas. Rerista Brasileira de Estudos de
População, v.23, n.1, p.5-26, 2006.
TEIXEIRA, A.R. et al. Sintomatologia
depressiva em deficientes auditivos adultos e
104
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Avaliação do nível de satisfação dos usuários na
atenção básica de saúde em um município da região metropolitana de Porto Alegre: programa de
saúde da família x tradicionais
ROBERTO CARVALHO SILVA1
LUZIA FERNANDES MILLÃO2
MARIA RENITA BURG FIGUEIREDO3
MITIYO SHOJI ARAÚJO3
ROSA MARIA FREITAS GROENWALD3
RESUMO
Este artigo tem como objetivo conhecer a opinião dos usuários da Atenção Básica sobre o Programa de
Saúde da Família (PSF) e comparar as opiniões dos usuários atendidos pelas equipes de PSF com os
atendimentos pelo sistema tradicional (Unidades Básicas de Saúde - UBS). Trata-se de um estudo
exploratório-descritivo com abordagem quantitativa realizado com setenta (70) usuários atendidos na
rede básica de saúde após receberem atendimento por um profissional de saúde. Utilizou-se um instrumento com perguntas abertas e fechadas, obedecendo aos aspectos éticos. Foi possível conhecer como o
usuário define o Programa de Saúde da Família (PSF) e qual o impacto do mesmo na sua saúde ou de sua
família.
Palavras-chave: Atenção Básica, usuários, avaliação, PSF.
Acadêmico do Curso de Enfermagem/ULBRA – Bolsista
PROICT/ULBRA.
1
2
ULBRA ([email protected])
3
Professora do Curso de Enfermagem/ULBRA.
Professora/Orientadora do Curso de Enfermagem/
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
105
ABSTRACT
This article aims to hear the views of users of the Basic Care on the Family Health Program (PSF) and
compare the views of users served by teams of PSF with attendances by traditional system (Basic Health
Units - UBS) . This is an exploratory study-with descriptive quantitative approach conducted with seventy
(70) users attended the network after receiving basic health care by a health professional. It was used an
instrument with questions open and closed, according to the ethical aspects. It was possible to know how the
user defines the Family Health Program (PSF) and what the impact of that on their health or their family.
Keywords: Basic Care, users, evaluation, PSF.
INTRODUÇÃO
A avaliação da qualidade de atenção à saúde
sob a perspectiva da satisfação dos usuários vem
ganhando destaque nos últimos anos no Brasil
por meio do fortalecimento da participação da
comunidade nos processos de planejamento e
avaliação (ESPIRIDIÃO e TRAD, 2005).
Avaliação dos serviços de saúde pode produzir informações pertinentes para a melhoria dos
serviços prestados bem como acerca da cobertura, acesso, equidade, qualidade técnica,
efetividade, eficiência e percepção dos usuários
a seu respeito (HARTZ e SILVA, 2005).
Usuários, representantes da população, profissionais de saúde e gestores dos serviços têm
uma percepção diferente em relação aos serviços de saúde, dão prioridade a aspectos diferentes quando avaliam a qualidade das ações em
saúde, como nos traz Serapioni (1999). A qualidade do serviço de saúde deve ser analisada
por todos os atores sociais envolvidos, pois de
nada adianta ter um serviço organizado que
agrade a equipe de saúde e os gestores, se não
leva em consideração as características da população onde está inserida, por isso a participação de todos se faz necessário.
106
Com a descentralização das ações e serviços de
saúde o usuário passa a ser co-responsável, isto é,
ganhou poder de decisão no Conselho de Saúde.
Nesse espaço pode participar na decisão dos investimentos no setor saúde bem como colaborar
na transformação das práticas sanitárias, tornando
os serviços mais eficientes e eficazes, pois leva em
consideração a realidade da população do território abrangido, ou seja, se conhece quem nele reside e aquilo que necessitam. A descentralização é
uma estratégia de democratização para incorporar
princípios como da equidade e controle social, pois
nenhum serviço será de qualidade se não reduzir
os agravos de saúde e capacitar à população atendida pelo mesmo.
O conhecimento da satisfação do usuário vem
contribuir para a retroalimentação dos programas desenvolvidos e apontar a qualidade dos
serviços prestados a partir da avaliação de serviços e programas bem como seus resultados ou
ainda auxiliar no desenvolvimento de modelos
de atenção à saúde da comunidade
(PEDROSA, PESSANA e LOUREIRO, 2006).
Sob o rótulo de avaliação reúnem-se diversas atividades, cujo aspecto varia desde um julgamento subjetivo do tipo “como os usuários
avaliam os serviços de saúde”? Até a chamada
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
pesquisa avaliativa que responde a pergunta
semelhante utilizando métodos e técnicas quantitativas (SILVA e FORMIGLI 1994,
ESPIRIDIÃO e TRAD 2006).
Apesar das dificuldades em definir satisfação, muitas pesquisas buscam estudar os
determinantes de satisfação. O trabalho de
WEISS é bastante citado pelos autores: Silva e
Formigli 1994, Espiridião e Trad, 2006, apresenta quatro grupos principais de determinantes de
satisfação:
- características dos pacientes
- características dos profissionais
- aspectos da relação médico-paciente
- fatores estruturais e ambientais.
Viacava e colaboradores (2004) propõem as
seguintes categorias para avaliar o desempenho
do sistema de saúde:
- acesso
- aceitabilidade
- respeito ao direito das pessoas
- continuidade
- adequação
- segurança
- efetividade
- eficiência
Percebe-se ao analisar as diferentes categorias propostas por diferentes autores, a importância da incorporação do usuário na avaliação
como um indicador sensível da qualidade do
serviço prestado e também por estar relacionando à maior adequação no uso do serviço
(ESPIRIDIÃO e TRAD, 2005).
O papel fundamental do setor de controle e
avaliação em uma estrutura de gestão é acompanhar as ações desenvolvidas para orientar o
desenvolvimento de políticas e programas de
saúde. Estas atividades devem ser centradas na
avaliação quantitativa e ou qualitativa fornecendo informações aos setores responsáveis pelo
planejamento e programação de ações de saúde
(PEDROSA, PESSANA e LOUREIRO, 2006).
A atenção á saúde tem registrado marcantes
mudanças nas últimas décadas no Brasil. Todo
este processo gerado pela Reforma Sanitária tem
como um dos pilares fundamentais a
descentralização das ações e recursos ao nível
municipal.
Logicamente, a avaliação de serviços no nível municipal não pode prescindir de dados e
informações detalhadas, um pré-requisito indispensável para reformulação de políticas públicas de saúde (MARINHO, 2003).
Os serviços de saúde podem ser avaliados a partir de diferentes perspectivas. A prática da avaliação dos serviços por meio de perguntas aos usuários
é uma delas, difundiu-se a partir dos anos 60 na
Europa e EUA inicialmente em estudos sobre adesão ao tratamento tomando relevância nas décadas
seguintes com o movimento da qualidade dos serviços de saúde (ESPERIDIÃO e TRAD, 2005).
No Brasil, esses estudos ganharam destaque a
partir da década de 90, amparado na Constituição Federal de 1988, no seu artigo 196 - saúde
direito de todos e dever do Estado, tornando o
usuário não somente um indicador sensível da
qualidade do serviço prestado, mas também como
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
107
adequador no uso do serviço (ESPERIDIÃO e
TRAD, 2006).
Em relação aos fatores relacionados com a
satisfação, podem ser destacados dois grandes
grupos. Um relativo ao serviço e aos seus provedores, e outro inerente aos próprios usuários.
A mensuração da operacionalização do conceito de satisfação inclui aspectos como: acessibilidade/conveniência, qualidade técnica do
cuidado, estrutura física e organizacional, comportamento interpessoal e continuidade do cuidado (ESPERIDIÃO e TRAD, 2006).
Baseado nisso, esta pesquisa se propôs a investigar: Conhecer a opinião dos usuários da Atenção Básica sobre o PSF e comparar as opiniões de
usuários atendidos pelas equipes de PSF com os
atendidos pelo sistema tradicional de saúde.
MATERIAL E MÉTODOS
Trata-se de uma pesquisa transversal do tipo
exploratório-descritiva, desenvolvida em um
município da região metropolitana de Porto Alegre/RS, município urbano, com uma população
de aproximadamente 350.000 habitantes. O referido município implantou a Estratégia de Saúde da Família em 2003, realizando ainda os devidos ajustes.
Os dados foram coletados em três unidades
integradas ao Programa de Saúde da Família
(PFS) e três unidades com sistema tradicional
(UBS). A amostra foi intencional. Os usuários
108
foram convidados a responder as entrevistas após
o atendimento na Unidade Básica de Saúde.
Foram entrevistados 70 (setenta) usuários da
rede básica de saúde, sendo 30 atendidos por
PSF e 40 pela UBS. O tratamento dos dados
recebeu uma abordagem quantitativa nas questões abertas e as questões fechadas foram
digitadas em um banco de dados especialmente
criado utilizando o programa Epi-info, e analisados a luz da estatística descritiva.
Os usuários já contemplados no novo modelo responderam sobre o que é o Programa de
Saúde da Família (PSF) e qual o impacto do
mesmo na sua saúde e ou de sua família. Nos
locais com o sistema tradicional perguntou-se
se os mesmos gostariam de ser atendidos pelo
PSF e se mudaria a sua saúde e de sua família.
Os dados foram coletados em agosto a novembro de 2007.
RESULTADOS
Os usuários participantes do estudo, após o
atendimento na rede básica de saúde, foram 70%
do sexo feminino e 30% do sexo masculino, a
faixa de idade predominante dos respondentes
foi de 16 a 35 anos (60%), 58% são casados e
68% possuíam o ensino fundamental incompleto. A ocupação de maior freqüência foi a de dona
de casa com 38%. Quanto à renda, 82% recebiam de 1 a 3 salários mínimos de referência Nacional. Nas Figuras 1 e 2, os entrevistados referiram os motivos para procurar o serviço de saúde por ocasião da entrevista.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Figura 1 - Distribuição sobre o motivo da procura pelo serviço de saúde nas unidades com o PSF.
Percebe-se que os usuários do PSF procuraram o serviço de saúde por diversos motivos. Os
mais freqüentes foram para tratamento curativo
devido a distúrbios respiratórios (25%), seguido
de dor (14,3%).
Os resultados apontam que a população assistida pelo PSF permanece com a cultura do
modelo tradicional de saúde, voltada para o tratamento de doenças. A demanda espontânea
continua prevalecendo na população, permanecendo a filosofia de tratar apenas a doença, predominando o tratamento curativo imediato e
não a vigilância em saúde proposto pelo PSF. A
utilização da referência e contra-referência, por
sua vez é adequada.
Figura 2 - Distribuição sobre o motivo da procura pelo serviço de saúde nas unidades com o sistema tradicional (UBS).
A Atenção Básica deve ser a porta de entrada do sistema, quando a mesma não consegue
“resolver” os problemas utilizam-se serviços da
Atenção Secundária para posteriormente
retornar a Atenção Básica.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
109
Os principais motivos para as consultas tanto no sistema tradicional como no PSF são devido a complicações de doenças crônicas. O tipo
de atendimento recebido pelo usuário no serviço de saúde por ocasião da entrevista está apresentado no Quadro 1.
Quadro 1 - Tipo de atendimento recebido pelo usuário
Observa-se que a procura por tratamento foi
maior (71,4%) no PSF do que nas UBS (47,5%).
Os outros motivos referidos pelos usuários são
vacinas, coleta de citopatológico, troca de receitas, controle da pressão arterial, marcação de
consultas e teste do pezinho.
O principal fator para a escolha do local onde
o usuário procurou a assistência, tanto na assistência tradicional como na Estratégia da Saúde
da Família é a localização, com 87%. Neste contexto, Mendes (1993) nos traz que a criação e
desenvolvimento dos Distritos Sanitários têm
como objetivo reorganizar as ações e os serviços
de saúde prestados à população, de modo que
atenda as necessidades desta no local onde se
encontra inserida. A territorialização deve levar em consideração às características da população, os agravos à saúde aos quais está exposta,
fazendo deste mais do que somente um processo
110
de descentralização político-administrativa do
sistema de saúde, contribuindo, assim, para sanar os problemas de saúde destes atores sociais.
Tem como objetivo promover mudanças das práticas sanitárias, tornando os serviços mais eficientes e eficazes de acordo com a realidade da
população do território abrangido, ou seja, se
conhece quem nele reside e o que necessitam.
Ocorre uma mudança no foco de atenção, sai o
Modelo Privatista e entra a Promoção em Saúde, não tem apenas uma idéia imediatista, curativa, tem consigo a idéia de prolongar a vida
com qualidade tem como ações vigiar, intervir e
controlar fatores áreas, grupos, situações quem
possam apresentar riscos para a população.
Ao perguntarmos aos usuários sobre o seu
conhecimento em relação ao PSF no qual estão
inseridos no município, apresentamos as respostas na Figura 3.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Figura 3 - Distribuição sobre o conhecimento do Programa de Saúde da Família por usuários atendidos pelo PSF.
Observa-se nas respostas dos usuários que
28,6% da população pesquisa refere ser tratamento
da família e em 21,4% ser médico da família.
Em relação ao entendimento sobre o PSF pelo
usuário, identificamos que entre os usuários não
contemplados com essa estratégia do Ministério
da Saúde a maioria desconhece completamente este modelo de atenção. Os usuários de PSF
também entendem pelo Programa de Saúde da
Família que os profissionais visitam a casa para
saber das condições de saúde dos moradores.
Figura 4 - Distribuição sobre o conhecimento do Programa de Saúde da Família por usuários atendidos pelas
UBS (sistema tradicional).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
111
Percebe-se na Figura 4 que os usuários atendidos no modelo tradicional de saúde demonstraram pouco conhecimento em relação ao PSF.
Em 55% referiram não conhecer este programa,
17,5% visitam a casa e 12,5% médico da família.
O PSF ainda é recente, pois seu início ocorrera em 1994, um curto espaço de tempo para
que a população transforme seus valores, privilegiando a saúde ao invés da doença, deixando
de ser apenas objetos da ação e se tornando coresponsável pela sua saúde. Também os profissionais de saúde, que se formaram anteriormente
à implantação da estratégia de saúde, devem se
inserir nesta nova visão tornando-os profissionais promotores, capacitadores e reabilitadores
com o olhar da promoção da saúde. Há apenas
cerca de 26.729 equipes de PSF implantadas no
Brasil, num total de 5.106 municípios, com uma
cobertura populacional de 46,2%, ou seja,
85,7milhões de pessoas e os principais indicadores de saúde desta população assistida já apresentam um impacto positivo (MINISTÉRIO DA
SAÚDE, 2006).
Com a implementação do PSF os recursos de
saúde são utilizados de maneira mais racional
pela população, bem como pelos profissionais,
uma vez que os agravos à saúde mais comuns
são tratados na Atenção Básica, entre eles as
doenças crônicas e não transmissíveis que tanto
são onerosas por recursos materiais
disponibilizados quando estes não são “vigiados”
na Atenção Básica e acabam por gerar inúmeras internações em nível de Atenção Terciária.
Também foi investigado, junto aos usuários,
se a sua saúde e a da sua família melhorou após
a implementação do PSF. Responderam em 46,5%
que sim e 21,4% não soube responder. Mas,
32,5% afirmaram não terem observado melhora.
112
Já com os usuários da UBS, foi perguntado
se acreditavam que a sua saúde e de sua família
mudaria se fosse contemplado pelo PSF. Responderam em 75% que mudaria e 7,5% talvez. Outros 17,5% referiram não acreditar na mudança
que o PSF traria na melhoria da sua saúde.
Os usuários atribuíram uma nota numérica
ao atendimento recebido pelos profissionais nos
serviços de saúde. Os entrevistados, indiferentemente do tipo de assistência prestada, não
registraram discrepância entre as suas opiniões,
ou seja, tanto no modelo assistencial tradicional como os que já se encontravam inseridos no
PSF, a nota para a assistência prestada permanecem semelhantes, visto que a média da assistência tradicional ficou com 7,9 e a do PSF 8,2.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A participação popular tem papel fundamental para a “aceitação’’ de um modelo assistencial
bem como as mudanças e ações no cenário da
saúde que o mesmo propõe. Não existem modelos em estado puro nas sociedades, não estão isentos dos interesses e das vontades dos diversos grupos sociais. Desse modo, três modelos convivem
no Brasil de forma contraditória ou complementar: o modelo campanhista, o médico-assistencial
privatista e o modelo de Vigilância em Saúde.
Para que os objetivos do PSF sejam alcançados
faz-se necessário gerir os serviços segundo as estratégias do PSF com qualidade e resolutividade.
Os profissionais de saúde precisam incorporar
novos saberes bem como socializar e conscientizar
a população sobre este novo modelo assistencial,
sua filosofia para que, a mesma tenha um impacto positivo em sua qualidade de vida (CARVALHO, 1998 e PAIM, 2003).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Cabe aos profissionais de saúde capacitar à
população acerca dessa nova visão da promoção
da saúde, salientando sua co-responsabilidade
individual e coletiva no meio onde está inserido, sendo um sujeito participativo no ato de vigilância em saúde. A demanda espontânea ainda impera em nosso cotidiano, pois os usuários
ainda enxergam a saúde como ausência de doença e não com um conceito ampliado, considerando como um estado positivo e dinâmico
de busca de bem estar, que integra os aspectos
físico e mental (ausência de doença), ambiental
(ajustamento ao ambiente), pessoal/emocional
(auto realização pessoal e afetiva) e sócio-ecológico (comprometimento com a igualdade social e com a preservação da natureza).
Assim, é possível concluir que ambas as populações estudadas ainda conhecem pouco sobre o
PSF. A população que permanece com o modelo
tradicional tem a expectativa de melhorar a qualidade de sua saúde com a implementação do PSF.
REFERÊNCIAS
CAPRARA, A; RODRIGUES, J. A relação
assimétrica médico-paciente: repensando o
vínculo terapêutico. Revista Ciência & Saúde, v.9, n.1, p.139-146, 2004.
CARVALHO, A. I.; RIBEIRO, J. M . Modelos de atenção à Saúde. In: GESTÃO em
saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz/UnB/1998.
ESPIRIDIÃO, M.A. Avaliação de satisfação
de usuários: considerações teóricoconceituais. Cadernos de Saúde Pública, Rio
de Janeiro, v.22, n.6, p.1267-1276, jun, 2006.
ESPIRIDIÃO, M.A. Avaliação de satisfação
de usuários. Revista Ciência & Saúde Coletiva, v.10 (supl.), p.330-312, 2005.
HARTZ, Z. M. A.; SILVA, L.V. Avaliação em
saúde: dos modelos teóricos à prática de
programas e sistemas de saúde. Salvador:
EDUFA; Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2005.
MARINHO A Avaliação da eficiência técnica nos serviços de saúde nos municípios do
estado do Rio de Janeiro. Revista Brasileira
de Economia, Rio de Janeiro, v. 57, n.2,
p.515-534, jul/set, 2003.
MENDES, E. V. Distrito Sanitário: O processo social de mudança das práticas sanitárias do Sistema Único de Saúde. São Paulo Rio de Janeiro: Hucitec- Abrasco, 1993.
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de
Atenção Básica. Manual para a organização da atenção básica. Brasília, 1998.
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Departamento
de Atenção Básica [online] jan. 2008. Disponível em < http://dtr2004.saude.gov.br/
dab/abnumeros.php#numeros> Acesso em
21 de jan. 2008.
PEDROSA, M.L; PESSANHA, G.H.;
LOUREIRI, M.M. Proposta metodológica
para o monitoramento e avaliação sistemática das ações de saúde no Estado do Rio de
Janeiro. CONGRESSO BRASILEIRO DE
SAÚDE COLETIVA, 8., 2006, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro, CDROON, 2006.
PAIM, J. S. Modelos de atenção e vigilância
da saúde. In: EPIDEMIOLOGIA & Saúde.
6 ed. São Paulo: Medsi, 2003.
POLIT, D.B.; HUNGLER, B.P. Fundamentos de Pesquisa em Enfermagem. 5.ed. Porto
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
113
Alegre: Artmed, 2004.
91, jan/mar, 1994.
RAMOS, D.D.; LIMA, M.A.D.S. Acesso e
acolhimento aos usuários em unidade de saúde de Porto Alegre, RS, Brasil. Cadernos de
Saúde Pública, v.19, n.1, jan/fev, 2003.
STARFIELD, Bárbara. Atenção Primária Equilíbrio entre necessidades de saúde, serviços e tecnologias. 2.ed. Brasília: UNESCO,
Ministério da Saúde, 2004.
SERAPIONE, M. Avaliação da qualidade em
saúde: a contribuição da sociologia da saúde
para a superação da polarização entre visão
dos usuários e a perspectiva dos profissionais
da saúde. Saúde em Debate, Rio de Janeiro,
v.23, n.53, p.81-92, 1999.
STENZEL, A.C.B.; MISOCZKY, M.C.; OLIVEIRA, A.I. Satisfação dos usuários dos serviços públicos de saúde. In: MISOCZKY, M.C. ;
BORDIN, R. (Orgs). Gestão local em saúde:
práticas e reflexões. Porto Alegre: Dacasa, 2004.
SILVA, L.M.V.; FORMIGLI, V.L.A. Avaliação em saúde: limites e perspectivas. Cadernos de Saúde Pública, v.10, n.1, p.80-
114
VIACAVA, F. et al. Uma metodologia de
avaliação do desempenho do sistema de saúde brasileiro. Revista Ciência & Saúde, v.9,
n.3, p.711-724, 2004.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Detecção de DNA de Papilomavírus Humano
(HPV) em mulheres grávidas utilizando a urina
SUELEN ANGELI1
TIAGO DALPIAZ2
LAURA GERBER3
REGINA BONES BARCELLOS4
MÁRCIA SUSANA NUNES SILVA5
MARIA LÚCIA ROSA ROSSETTI6
RESUMO
Este trabalho foi realizado com o objetivo de investigar a incidência de DNA de Papilomavírus Humano (HPV) em urina de gestantes atendidas no Hospital Divina Providencia, do município de Frederico
Westphalen da Região do Médio Uruguai. As amostras coletadas foram encaminhadas ao Laboratório de
Biologia Molecular da ULBRA onde foram submetidas aos processos de extração de DNA e amplificação por PCR (Polimerase Chain Reaction) utilizando primers específicos do genoma viral. Os fragmentos de DNA foram visualizados em eletroforese em gel de agarose (1,5%). Das 70 gestantes que participaram do estudo, 9 apresentaram contaminação viral, sendo 12,9% da população estudada positiva para
HPV.
Palavras-chave: Papilomavírus humano (HPV), gestantes, urina.
1
Acadêmico do curso de Biomedicina - Bolsista PROICT/
ULBRA
2
Acadêmico do curso de Biomedicina/ULBRA - Bolsista
FAPERGS
3
Aluno do PPG de Genética e Toxicologia Aplicada da Ulbra
4
Aluno do PPG de Biologia Celular e Molecular da UFRGS
5
Professora – Curso de Biomedicina/ULBRA
Professora-Orientadora do Curso de Biomedicina e PPG de
Genética
e
Toxicologia
Aplicada
/ULBRA
([email protected])
6
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
115
ABSTRACT
The purpose of this study was to investigate the incidence of human papillomavirus (HPV) in pregnants
at the Hospital Divina Providencia, in Frederico Westphalen, at Middle Uruguay region. Samples of urine
were collected and sent to molecular biology laboratory of Ulbra, and were submitted to DNA extraction
and amplification by PCR (Polimerase Chain Reaction) using specific primers to detect the viral genome.
DNA fragments were visualized in agarose gel (1.5%) after electrophoresis. From the 70 women who
participate of this study, 9 of them presented the viral contamination, corresponding to 12.9% of positivity
for HPV in the studied population.
Keywords: Human papillomavirus (HPV), pregnant, urine.
INTRODUÇÃO
A infecção pelo Papilomavírus Humano
(HPV) no trato genital é a doença sexualmente
transmissível (DST) mais encontrada na população, representando um grave problema de saúde
pública, especialmente nos países em desenvolvimento (CAMPOS et al., 2004). A presença de
HPV é detectada em aproximadamente 10 a 40%
da população feminina sexualmente ativa entre
15 e 49 anos de idade (TÁBORA et al., 2005).
A infecção pelo HPV é considerada a causa principal dos casos de câncer cervical e de uma pequena fração dos casos de câncer vaginal, vulvar,
peniano e anal (TAMIM et al., 2002).
Durante a gravidez o risco de infecção pelo
HPV é mais elevado, devido a associação entre
a elevação dos níveis hormonais e a
imunossupressão (BANDYOPADHYAY e
CHATTERJEE, 2006) . A presença do vírus também pode levar a contaminação do recém nascido durante o parto, atingindo principalmente
a árvore respiratória (MEDEIROS et al., 2005).
Medidas preventivas poderiam ser realizadas, se
o diagnóstico de infecção pelo HPV fosse co-
116
nhecido. Além disso, a detecção de HPV é usualmente feita em amostra cervical e a coleta
desse material clínico não é recomendada para
gestantes, dificultando a sua realização durante o período gestacional (COSTA et al., 2001).
Este trabalho foi realizado com o objetivo de
verificar a utilização de urina como amostra para
o diagnóstico de HPV em mulheres grávidas.
MATERIAL E MÉTODOS
Local do estudo e população
estudada
Fez parte deste estudo transversal um grupo
de 70 gestantes que buscaram atendimento no
Hospital Divina Providência da cidade de
Frederico Westphalen da Região do Médio Alto
Uruguai. Os critérios de inclusão foram gestantes internadas no hospital que, mediante consentimento informado, aceitaram participar do
estudo. Foram excluídas do estudo gestantes em
trabalho de parto.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Amostras e a detecção de DNA
de HPV
As amostras de urina coletadas foram refrigeradas e encaminhadas ao Laboratório de Biologia Molecular da Ulbra, onde foram
aliquotadas e armazenadas a –20°C até o momento da preparação. Para a extração do DNA,
as amostras foram centrifugadas a 5.200rpm por
5 min e tratadas com solução de lise a 100°C
para romper a membrana celular. O material
resultante desse processo foi centrifugado junto
a uma resina de sílica. Foram feitas lavagens para
a purificação da amostra. O DNA foi precipitado utilizando etanol 70° e ressuspendido em TE
1X (1 mM Tris-HCl; 1mM EDTA, pH 8,0)
(adaptado de BOOM et al, 1990).
Após a extração, as amostras foram submetidas à amplificação por PCR. Os primers utiliza-
dos foram GP5+ (5’ TTT GTT ACT GTG GTA
GAT ACT AC 3’) e GP6+ (5’ GAA AAA TAA
ACT GTA AAT CAT ATT C 3’) (DE RODA
HUSMAN et al.,1995) gerando um fragmento
de 150pb correspondente a parte do gene L1,
que codifica a principal proteína do capsídeo
viral. O produto final da PCR foi 50μl, sendo
10μl submetidos à eletroforese em gel de agarose
(1,5%) visualizado sob luz ultravioleta.
RESULTADOS
Após o processamento das amostras e a reação
de PCR, foi possível a detecção em gel de agarose
de um fragmento de DNA de tamanho esperado
em 9 das 70 amostras de urina de gestantes estudadas, ou seja, 12,9% das amostras foram positivas
para DNA de HPV (Figura 1).
Figura 1 – Percentual de gestantes atendidas no Hospital Divina Providência da cidade de Frederico
Westphalen com diagnóstico positivo e negativo para HPV.
Uma análise do questionário aplicado foi feita
para correlacionar os resultados com a idade da
gestante. Foi possível observar que a maior
prevalência de DNA de HPV ocorreu no intervalo entre 15 e 20 anos de idade, que corresponde
ao período de início da atividade sexual.
DISCUSSÃO
Diferentes estudos têm mostrado a alta
prevalência de infecção por HPV em mulheres
e em gestantes (NONNENMACHER et al,
2002; DENG et al., 2005; CARESTIATO et
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
117
al., 2006). Tendo em vista a dificuldade, as limitações e a importância da identificação da
infecção pelo HPV em gestantes, o estudo da
possibilidade de formas de detecção viral, bem
como de alternativas de amostras clínicas são
importantes e podem colaborar na diminuição
dos casos de câncer cervical e na transmissão
de HPV. Esse estudo mostrou a viabilidade da
utilização de amostras de urina para o diagnóstico específico de HPV através da detecção
de DNA. Estudos anteriores já demonstraram
a possibilidade do uso de urina como material
clínico para a detecção viral. Jacobson et al.
(2000) relataram uma concordância entre os
resultados de urina e amostras cervicais. No
entanto, eles enfatizaram a necessidade de outros estudos. Porém, Howard et al. (2004) concluiu em seu estudo que o uso de urina era
uma alternativa de obtenção de amostra mais
fácil e menos invasiva. Até o momento, a investigação do uso de urina para detecção de
HPV em grávidas não tem sido relatada. Um
estudo com a urina de mulheres grávidas foi
realizado para detecção de Chlamydia
trachomatis (ROURS et al., 2005). No nosso
estudo, foi possível detectar 12,9% de DNA
de HPV nas urinas das gestantes analisadas e
que a maior prevalência estava em mulheres
de 15 a 20 anos. Murta et al. (2001) também
encontraram que a prevalência maior da infecção estava em mulheres gestantes com idade superior a 20 anos.
Além disso, os testes moleculares como a
captura híbrida e o PCR têm mostrado que são
estratégias importantes para o diagnóstico
(CARESTIATO et al., 2006; PAYAN et al.,
2007). Neste trabalho, os resultados obtidos confirmam a possibilidade de utilizar o PCR para
detectar especificamente o DNA de HPV.
118
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem a Diretoria de Pesquisa da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da ULBRA, pela oportunidade de divulgação desse estudo que é parte de um dos projetos
realizados no Laboratório de Biologia Molecular
da mesma Universidade.
REFERÊNCIAS
BANDYOPADHYAY, S.; CHATTERJEE, R.
HPV viral load determination during
pregnancy as a possible cervical cancer risk.
Journal of Experimental & Clinical Cancer
Research, v.25, n.1, p.29-38, mar. 2006.
BOOM, R. et al. Rapid and simple method
for purification of nucleic acids. Journal of
Clinical Microbiology, v.28, n.3, p.495-503,
mar. 1990.
CAMPOS, S.F. et al.Papiloma vírus humano. Revista Brasileira de Analíses Clínicas,
v. 36, n.3, p. 137-142, 2004.
CARESTIATO, F.N. et al. Prevalence of
human papillomavirus infection in the genital
tract determined by hybrid capture assay.
Brazilian Journal of Infectious Diseases,
v.10, n.5, p.331-336, oct. 2006.
COSTA, M.S.H. et al. Rotinas em obstetrícia. 4.ed. Porto Alegre: Artmed Editora,2001.
DE RODA HUSMAN, A.M. et al. The use
of general primers GP5 and GP6 elongated at
their 3' ends with adjacent highly conserved
sequences improves human papillomavirus
detection by PCR. Journal of General
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Virology, v.76, part 4, p.1057-1062, apr. 1995.
DENG, D. et al. Asymptomatic genital
infection of human papillomavirus in
pregnant women and the vertical
transmission route. Journal of Huazhong
University of Science and Technology Medical Science, v.25, n.3, p.343-345, 2005.
HOWARD, M. et al. Optimal cutoff of the
hybrid capture II human papillomavirus test
for self-collected vaginal, vulvar, and urine
specimens in a colposcopy referral population.
Journal of Lower Genital Tract Disease, v.8,
n.1, p.33-37, jan. 2004.
JACOBSON, D.L. et al. Concordance of
human papillomavirus in the cervix and urine among inner city adolescents. The
Pediatric Infectious Disease Journal, v.19,
n.8, p.722-728, aug. 2000.
MEDEIROS, L.R. et al.Vertical transmission
of the human papillomavirus: a systematic
quantitative review. Cadernos de Saúde Publica, v.21, n.4, p.1006-1015, jul./ago. 2005.
MURTA, E.F.C. et al. Human papillomavirus
infection in pregnancy: relationship with
cytological findings. Revista Brasileira de
Ginecologia e Obstetrícia, v.23, n.6, p.377381, 2001.
NONNENMACHER, B. et al. Genital human
papillomavirus infection identification by
molecular biology among asymptomatic
women. Revista de Saúde Pública, v.36, n.1,
p.95-100, fev. 2002.
PAYAN, C. et al. Human papillomavirus
quantification in urine and cervical samples
by using the Mx4000 and LightCycler general real-time PCR systems. Journal of Clinical
Microbiology, v.45, n.3, p.897-901, mar. 2007.
ROURS, G.I. et al. Use of pooled urine
samples and automated DNA isolation to
achieve improved sensitivity and costeffectiveness of large-scale testing for
Chlamydia trachomatis in pregnant women.
Journal of Clinical Microbiology, v.43, n.9,
p.4684-4690, sept. 2005.
TÁBORA, N. et al. Chlamydia trachomatis
and genital human papillomavirus infections
in female university students in Honduras.
American Journal of Tropical Medicine and
Hygiene, v.73, n.1, p.50, july 2005.
TAMIM, H. et al. Cervicovaginal
coinfections with human papillomavirus and
Chlamydia
trachomatis.
Diagnostic
Microbiology and Infectious Diseases, v.43,
n.4, p.277-281, aug. 2002.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
119
120
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Papel do Fator Neurotrófico Derivado do Cérebro
(BDNF) como biomarcador de desfecho primário
noTCE grave em adultos
GREIZY MODESTO GOMES1
FABIANA DA SILVA CARVALHO2
FÁBIO ALVES DOS SANTOS KESPERS2
ALAN KNOLSSEISEN CAMBRUSSI2
ÉDISON OLIVEIRA3
ANDREA PEREIRA REGNER4
RESUMO
Crescentes esforços em pesquisas buscam investigar biomarcadores com possíveis valores prognósticos
em TCE grave, dentre estes está o BDNF. Buscamos investigar se o BDNF correlaciona-se com o desfecho
primário (morte/sobrevida) em TCE grave. O presente estudo é uma coorte com n=45 homens, com TCE
grave. Dezenove sofreram TCE isolado. Os pacientes entraram no CTI dentro de 24h pós-trauma. O
sangue foi coletado até 24h após admissão no CTI. Análise estatística utilizou teste T e correlação de
Spearman para dados não paramétricos. A concentração de BDNF foi significativamente maior no grupo
que sofreu TCE isolado grave. No TCE isolado grave houve significativa correlação entre o aumento de
BDNF e morte.Concluiu-se que o aumento de BDNF prediz desfecho fatal em TCE grave isolado.
Palavras-chave: BDNF, trauma cranioencefálico, biomarcadores.
1
Acadêmica do Curso de Medicina/ULBRA – Bolsista
PROICT/ULBRA
Acadêmico(a) do Curso de Medicina/ULBRA
2
Médico Intensivista do Hospital Cristo Redentor – Aluno de Dou-
3
torado do PPG em Genética e Toxicologia Aplicada da ULBRA
6
Professora/Orientadora do Curso de Medicina/ULBRA e
do PPG em Diagnóstico Genético e Molecular/ULBRA
([email protected])
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
121
ABSTRACT
Efforts have focused on the investigation of biomarkers with prognostic value following severe TBI.
BDNF has been implied in some researches. Our objectives was determine whether BDNF serum correlate
with primary outcome following severe TBI. A prospective study enrolled 45 male with severe TBI, either
isolated severe TBI (n=19) or associated with extracranial lesions. The patients transferred to the ICU
within 24 h of the head injury. Peripheral blood was collected at admission in the ICU. Statistical analysis:
T-test and Spearman’s Correlation. BDNF were significantly increased in the isolated severe TBI. In the
isolated severe TBI, a significant correlation between higher BDNF and fatal outcome. Increased BDNF
predicted fatal outcome in isolated severe TBI.
Keywords: Serum brain derived neurotrofic factor, brain injury, biomarkers.
INTRODUÇÃO
O trauma é a principal causa de morte na faixa de 1-45 anos, e a segunda causa de mortalidade geral. No Brasil, aproximadamente 350 pessoas morrem diariamente em decorrência do trauma. Em pacientes portadores de traumas múltiplos graves, a cabeça é a parte do corpo mais
freqüentemente traumatizada. O traumatismo
crânio-encefálico (TCE) contribui significativamente em metade de todas as mortes por trauma.
(KRAUS et al., 1996; GHAJAR, 2000; BRUNS
JR e HAUSER, 2003; KIRKNESS et al, 2004).
O TCE é estratificado pela Escala de Coma
de Glasgow (Glasgow Coma Scale - GCS) a qual
fornece uma medida quantitativa do nível de
consciência, e resulta da soma de escores de
avaliação de três parâmetros a serem considerados: abertura ocular, resposta verbal e melhor resposta motora. Atribuídos os valores para
a GCS, classifica-se em leve (GCS 14-15), moderado (GCS 9-13) e grave(GCS 3-8).
(KRAUS et al., 1996; WILSON et al, 1998;
GHAJAR, 2000; BRUNS JR e HAUSER,
2003). A determinação do escore da GCS é a
medida clínica mais estudada e utilizada no
122
estabelecimento da gravidade e desfecho (predição de mortalidade) no TCE.
Apesar do reconhecido valor prognóstico das
medidas da GCS nas primeiras horas, alguns pacientes, com lesões aparentemente leves, podem deteriorar clinicamente, ressaltando-se a importância
da observação dos pacientes vítimas de TCE. A
tríade composta pela deterioração do nível de consciência, dilatação pupilar e hemiparesia é sugestiva
de lesão com efeito de massa, causando herniação
transtentorial. Outras causas para deterioração do
nível de consciência no TCE são hipóxia/hipotensão;
convulsões; hipoglicemia; e, intoxicação exógena
(KRAUS et al., 1996; DUFF, 2003). Tendo em vista que o exame neurológico inicial, freqüentemente,
é pouco confiável no TCE, utiliza-se a tomografia
computadorizada de crânio (TCC), como exame
de escolha, para auxilio diagnóstico (GHAJAR,
2000; BRUNS Jr e HAUSER, 2003).
A mortalidade do TCE grave varia entre 3080%, conforme os centros e populações pesquisados.
Em relação à morbidade associada ao TCE grave,
sabe-se que 100% dos sobreviventes terão algum
grau de seqüela. Alguns fatores prognósticos tem
sido estabelecidos: o grau de coma inicial (estabelecido pela GCS) e a idade são os mais estudados.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
A idade segue-se em importância à GCS: crianças menores de cinco anos apresentam mortalidade superior às de 5 a 19 anos. Jovens recuperam-se
muito melhor que idosos. Pupilas fixas, ausência
ou alteração grave dos movimentos oculares, padrões anormais de resposta motora também estão
relacionados com piores prognósticos (KRAUS et
al., 1996; GHAJAR, 2000; DUFF, 2003).
voso e outras funções dos neurônios e células gliais,
assim como de alguns tecidos não nervosos. As
neurotrofinas ligam-se ao receptor p75, mas suas
ações no p75, ao menos no cérebro adulto, não são
bem compreendidas, assim como suas ações nos receptores trk, (que inclui subtipos de receptores trkA,
trkB e trkC) (MORIS e VEGA, 2003 ;
SCHARFMAN, 2005).
Desta forma, biomarcadores têm sido investigados como potenciais marcadores prognósticos no
cenário de TCE grave. Entre estes marcadores estão: creatina-quinase-BB, proteína glial fibrilar ácida, enolase neuronal específica, proteína S100b e
Hsp70 (RAABE et al, 2003; da ROCHA et al,
2005 e 2006; CAMPELO et al, 2007; CRESPO et
al, 2007; de OLIVEIRA et al, 2007). Porém, há
muitas controvérsias quanto ao poder preditivo
destes marcadores na rotina médica. Atualmente,
entre os biomarcadores mais promissores estão a
proteína S100b e a enolase neuronal (RAABE et
al, 2003). Aumento na concentração sérica de
biomarcadores foram descritos em diferentes doenças neurológicas, na fase ativa de dano celular
no SNC. Elevações no soro sugerem comprometimento da integridade da barreira hematoencefálica
(BHE), razão pela qual, medidas de biomarcadores
no soro podem ter utilidade clínica na avaliação
de danos ao SNC (RAABE et al, 1998;
INGEBRIGTSEN et al, 1999; ANDERSON et al,
2001; REGNER et al, 2001a; REGNER et al, 2001b;
MUSSAK et al, 2002; PETZHOLD et al, 2002;
JONSSON, 2003; da ROCHA et al, 2005).
O BDNF é sintetizado predominantemente no
SNC, por células gliais (ZAFRA et al., 1992;
CATTANEO e ZUCCATO, 2007). Embora largamente expresso no SNC do mamífero adulto, é
particularmente abundante no hipocampo e
córtex cerebral (CATTANEO e ZUCCATO,
2007). Nota-se que sua expressão aumenta após
injúrias e eventos isquêmicos. Entretanto, manipulações benignas, tais como exercícios físicos ou
tratamentos a base de estrógenos também podem
elevar seus níveis (SCHARFMAN, 2005).
O BDNF é uma neurotrofina descoberta em
1982, sendo esta, a segunda da família dos agentes
neurotróficos (a primeira foi o Fator Neurotrófico
do Nervo (NGF) (UNIVERSITE PARIS DESCARTES, 2006; CATTANEO e ZUCCATO, 2007). As
neurotrotrofinas são moléculas que regulam a sobrevivência natural, a plasticidade do sistema ner-
Evidências mostram que o sistema nervoso central (SNC) adulto possui regeneração neuronal restrita, porém, tem sido sugerido que os fatores
neurotróficos possam proteger os neurônios diante de
determinadas situações patológicas como a morte por
apoptose e o dano celular provocado por diversas
agressões (MORIS e VEGA, 2003). Ainda, fatores
neurotróficos têm sido implicados na etiopatogenia
de algumas doenças neurodegenerativas, tais como:
Alzheimer, Parkinson, neuropatias periféricas e
esclerose lateral amiotrófica (MORIS e VEGA, 2003).
Estudos específicos investigando o BDNF, sugerem
que seus baixos níveis séricos estão relacionados como
fator de risco para depressão e que variantes do gene
do BDNF, aumentam o risco de esquizofrenia
(AYDEMIR el al., 2006; QIAN et al., 2007). Em relação a doença de Huntington, acredita-se no
envolvimento do BDNF na gênese da doença, e como
sendo também, um potencial agente terapêutico
(CATTANEO e ZUCCATO, 2007). Contudo, o
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
123
papel do BDNF ainda não foi investigado na lesão
cerebral traumática no adulto.
Apesar da importância do TCE na saúde
pública, pouco progresso tem sido alcançado em
termos de manejo clínico/terapêutico nas últimas décadas. Até o momento, não existem
marcadores prognósticos precisos ou alternativas farmacológicas efetivas para as vítimas de
TCE grave. Assim, é de suma importância a pesquisa de marcadores de dano neural, que possam ter aplicação como marcadores prognósticos no TCE, estratificando-se os pacientes de
maior risco e guiando o emprego de estratégias
terapêuticas mais invasivas. Dessa forma, o presente estudo investigará o papel do BDNF como
biomarcador no TCE grave.
MATERIAL E MÉTODOS
O presente estudo foi delineado como uma
coorte prospectiva, teve aprovação do Comitê de
Ética e Pesquisa do Hospital Municipal de Pronto
Socorro de Porto Alegre, Hospital Cristo Redentor
e Universidade Luterana do Brasil. Os pacientes
incluídos na pesquisa estavam clinicamente inconscientes e por isso a assinatura do consentimento informado foi obtido através de parentes desses pacientes, após devido esclarecimento a respeito dos
propósitos da coleta de amostras de sangue.
O estudo analisou 45 homens, com idade entre 16 e 77 anos, vítimas de TCE grave (GSC 3-8
na admissão na sala de emergência, sem história
prévia de doenças neurológicas e psiquiátricas) e
o grupo controle era composto por 5 pacientes do
sexo masculino e hígidos. Dezenove pacientes
apresentaram TCE isolado e vinte e seis pacientes
tiveram TCE com trauma extracraniano adicional. Somente os pacientes transferidos para UTI
124
dentro de 24h após o TCE grave foram incluídos
no estudo. As variáveis relacionadas ao desfecho
dos pacientes com TCE grave consistiam em:
sobrevida, tempo transcorrido até a alta da UTI e
avaliação neurológica através do emprego do GOS
escore no momento da alta da UTI. Na entrada
do paciente no CTI, a condição circulatória e o
GCS escore eram monitorados e o Acute Physiology
and Chronic Health Evaluation II (APACHE II)
escore foram determinados também.
O escore de APACHE II tem sido estudado como
um preditor de gravidade funcional e de mortalidade em TCE. Todos os pacientes foram sedados e
ventilados mecanicamente. Corticoesteróides não
foram administrados.
Estudos prévios estabeleceram diferenças
entre gêneros na patofisiologia e desfecho precoce após TCE ou trauma extracraniano. Menos susceptibilidade a isquemia pós-traumática
após dano cerebral tem sido observado em mulheres. Assim, para evitar uma possível diferença gênero-dependente no desfecho pós-trauma,
somente homens participaram do estudo.
Sangue periférico foi coletado após entrada do
paciente na CTI (entrada no estudo). As amostras
de sangue foram centrifugadas por 10 minutos, o
plasma coletado e estocado em freezer a -20º C. Foi
realizado acompanhamento clínico dos pacientes até
o desfecho (alta da CTI ou óbito). O soro foi descongelado e posteriormente submetido à análise para
dosagem de BDNF. A concentração sérica de BDNF
foi medida pelo método de ELISA (Quantikine, #
DBD00, R&D Systems, MN, USA). Os procedimentos experimentais foram realizados no laboratório do Centro de Pesquisa em Ciências Médicas da
Universidade Luterana do Brasil.
A análise estatística empregou teste T para
dados não paramétricos e correlação de Spearman.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
RESULTADOS
A Tabela 1 caracteriza a população de TCE
grave estudada, e estratifica a mesma pelo desfecho primário (sobreviventes/não sobreviventes). A mediana de idade no grupo de pacientes com TCE grave foi de 39 (16-77) anos. Não
houve diferença significativa entre as médias de
idade dos grupos de vítimas de TCE quando
estratificados por desfecho ou tipo de TCE (isolado ou associado ao politrauma). O TCE grave
foi associado a uma taxa de mortalidade de 55%.
No grupo dos sobreviventes o tempo mediano
entre o trauma e a alta do CTI foi de 13 dias
(escala de 2-54). O tempo mediano entre o
evento traumático e morte foi de 3 dias (escala
de 0-85). Sessenta por cento dos pacientes sofreram politrauma. Houve diferença significativa quanto ao mecanismo de lesão entre os grupos de TCE isolado e TCE associado ao
politrauma, havendo maior incidência de queda e agressão no grupo de vítimas de TCE isola-
do (p < 0,05, teste-t não pareado). A concentração sérica de BDNF foi avaliada em todos os
pacientes que entraram no estudo (Figuras 1 e
2). Os indivíduos com TCE foram agrupados em
TCE isolado (n=19) e TCE associado ao
politrauma (n=26). Após admissão na CTI (em
média 10,5h após o trauma) a concentração
sérica de BDNF foi significativamente maior nos
pacientes vítimas de TCE isolado (13,05±1,4 þg/
ml) quando comparados aos pacientes vítimas
de TCE associado à politrauma (9,48±0,8 þg/
ml; média±D.P), (p=0,028, teste T para dados
não pareados) (Figura 1). Ainda, considerando
o grupo com TCE grave isolado, o grupo com
desfecho fatal apresentou aumento significativo de BDNF (16,06±1,8 þg/ml, média±DP)
quando comparado ao grupo sobrevivente
(9.67±0.9 þg/ml; média±DP), (p=0,020, teste
T não pareado). No grupo com TCE grave isolado houve significativa correlação entre o aumento do BNDF e o desfecho fatal (rho=0.5292,
p=0.028) (Figura 2).
Tabela 1 - Características da população estudada com traumatismo crânio-encefálico (TCE) e estratificação
da medida dos resultados primários (sobreviventes / não sobreviventes).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
125
* Diferença significativa do grupo TCE grave associado à politrauma (p<0,050).
Figura 1 - Concentração sérica de BDNF em indivíduos com TCE grave. Os indivíduos com TCE foram agrupados
em TCE isolado (n=19) e TCE associado à politrauma (n=26). Após admissão na CTI (em média 10,5h
após o trauma) a concentração sérica de BDNF foi significativamente maior nos pacientes vítimas de
TCE isolado (13,05±1,4 þg/ml) quando comparados aos pacientes vítimas de TCE associado à
politrauma (9,48±0,8 þg/ml; média±D.P), (p=0,028, teste T para dados não pareados).
* Diferença significativa do grupo que teve desfecho fatal (p = 0.020, teste T não pareado).
Figura 2 - Níveis séricos médios de BDNF no TCE grave isolado, estratificados pelo desfecho primário (alta da
CTI ou óbito). O grupo com TCE grave isolado fatal apresentou aumento significativo de BDNF
(16,06±1,8 þg/ml, média±DP) quando comparado ao grupo sobrevivente (9,67±0,9 þg/ml;
média±DP), (p=0,020, teste T não pareado), no grupo TCE grave isolado houve significativa
correlação entre o aumento do BNDF e o desfecho fatal (rho = 0,5292, p=0,028).
126
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
DISCUSSÃO
Neste estudo avaliamos o BDNF como
marcador prognóstico de desfecho fatal em vítimas de TCE grave. Foram investigados 45 homens com idade entre 16 e 77 anos (mediana
de 39 anos). Foi dosada a concentração sérica
de BDNF em todos os pacientes com TCE grave. Foi demonstrado um aumento significativo
dos níveis de BDNF nos pacientes que sofreram
TCE grave isolado quando comparados às vítimas que sofreram TCE grave associado ao
politrauma, sugerindo maior especificidade do
BDNF sérico em lesões de caráter exclusivo do
SNC. Ainda, neste grupo de vítimas de TCE
isolado, foi verificada correlação entre níveis
mais altos de BDNF e mortalidade.
Na literatura, o BDNF tem sido envolvido
na patofisiologia de diversas doenças. No entanto, não encontramos estudos relacionando
BDNF e TCE no adulto. Scharfman (2005) descreve que eventos isquêmicos e outras injúrias
cerebrais podem elevar a expressão de BDNF,
entretanto, o BDNF também pode elevar-se em
situações benignas, como os exercícios físicos e
tratamentos a base de estrógenos. Sua implicação na gênese de doenças neurodegenerativas
e psiquiátricas , reforçam a importância de sua
investigação nos mais diversos tipos de patologias, inclusive no TCE (MORIS e VEGA, 2003;
AYDEMIR et al., 2006 ; QIAN et al., 2007).
Encontramos, neste estudo, uma taxa de
mortalidade de 55% com o desfecho fatal ocorrendo majoritariamente no terceiro dia após o
trauma. Cinqüenta e sete por cento dos pacientes investigados com TCE apresentaram trauma
associado, principalmente de extremidades e de
tórax. Não pudemos deixar de observar em nossos resultados, que a mortalidade dos pacientes
que sofreram TCE vítimas de agressão foi de
100%, independente de ser TCE isolado ou associado ao politrauma, demonstrando assim, a
gravidade das agressões, como mecanismo de
lesão, em nosso meio.
Nossos resultados, demonstraram significativo aumento do BDNF sérico nas vítimas de TCE
isolado que se correlacionaram com desfecho
fatal. Desta maneira, o BDNF sérico é eficiente
como marcador de desfecho primário no TCE
grave isolado em adultos. Contudo, a dosagem
sérica do BDNF apresenta especificidade para
lesão neural, porém, com baixa sensibilidade, o
que dificultaria seu uso como um marcador precoce na triagem de pacientes vítimas de
traumatismo crânio-encefálico. Talvez, os níveis
liquóricos de BDNF apresentassem resultados
mais expressivos como marcador prognóstico.
CONCLUSÃO
Em suma, o BDNF sérico está elevado no
TCE isolado, sugerindo sua participação nos
mecanismos patofisiológicos da lesão neural traumática. Ainda, as concentrações séricas desta
neurotrofina apresentaram correlação significativa com o desfecho fatal no TCE grave isolado.
REFERÊNCIAS
AYDEMIR, C. et al. Brain-derived
neurotrophic factor (BDNF) changes in the
serum of depressed women. Progress in
Neuro-Psychopharmacology & Biological
Psychiatry, v.30, p.1256–1260, 2006.
BRUNS JR, J.; HAUSER, W.A. The
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
127
epidemiology of traumatic brain injury: a
review. Epilepsia, v. 44, p. 2-10, 2003.
CAMPELLO, Y.V. et al. Role of plasma DNA
as a predictive marker of fatal outcome
following severe head injury in males. Journal
of Neurotrauma, v. 24, n.7, p.1172-1181,
2007.
CATTANEO, E.; ZUCCATO, C. Role of
brain-derived neurotrophic factor in
Huntington’s disease. Progress in
Neurobiology, v. 81, p.294–330, 2007.
CRESPO, A.R. et al. A. Increased serum sFas
and TNFalpha following isolated severe head
injury in males. Brain Injury. v.21, n.4, p.441447, 2007.
DUFF, D. Review Article: altered states of
consciousness, theories of recovery and
assessment following a severe traumatic brain
injury. Axone, v. 23, n.1, p.18-23, 2003.
GHAJAR, J. Traumatic brain injury. The
Lancet, v. 356, p.923-929, 2000.
INGEBRIGTSEN, T. et al. Traumatic Brain
Damage in Minor Head Injury: Relation of
Serum S-100 Protein Measurements to
Magnetic Resonance Imaging and
Neurobehavioral Outcome. Neurosurgery,
v. 45, n.3, p.468-476, 1999.
JÖNSSON, H. et al. Elimination of S100B
and renal function after cardiac surgery.
Journal of Cardiothoracic and Vascular
Anesthesia, v.14. n.6, p.698-701, 2003.
KIRKNESS, C.J. et al. Is there a sex
difference in the course following traumatic
brain injury? Biological Research for
Nursing, v. 5, n.4, p.299-310, 2004.
128
KRAUS, J.F. et al. Epidemiology of brain
injury. In: NARAYAN, R.K.; WILBERGER
Jr., J.E. ; POVLISHOCK, J.T. (Eds).
Neurotrauma. New York: McGraw Hill,
cap.2, p.13-30, 1996.
MORIS,G.;
VEGA
J.A.
Factores
neurotróficos: fundamentos para su
aplicación clínica. Neurologia, v.18, n.1,
p.18-28, 2003.
MUSSACK, T. et al. Serum S-100B and
interleukin-8 as predictive markers for
comparative neurologic outcome analysis of
patients after cardiac arrest and severe
traumatic brain injury. Critical Care
Medicine, v.30, n.12, p.2669-2674, 2002.
OLIVEIRA, C.O. de. et al. Plasma von
Willebrand factor levels correlate with clinical
outcome of severe traumatic brain injury. Journal
of Neurotrauma. v. 24, n. 8, 1331-1338, 2007.
PETZOLD, A. et. al. Role of serum S100B as
an early predictor of high intracranial pressure
and mortality in brain injury: A pilot study.
Crititical Care Medicine, v.30, n.12, p.27052710, 2002.
QIAN, L. et al. Brain-derived neurotrophic
factor and risk of schizophrenia: An
association study and meta-analysis.
Biochemical and Biophysical Research
Communications, v.353, p.738–743, 2007.
RAABE, A. et al. Correlation of computed
tomography findings and serum brain
damagem markers following severe head
injury. Acta Neurochirurgica, Wien, v.140,
p.787-792, 1998.
RAABE, A. et al. Serum S100B protein as a
molecular marker in severe traumatic brain
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
injury. Restorative Neurology and
Neuroscience, v. 21, p.159-169, 2003.
REGNER, A. et al. Increased serum S100ß
protein concentrations following severe head
injury in humans: a biochemical marker of brain
death? NeuroReport, v.12, n.4, p.691-694, 2001.
following isolated severe head injury or
multitrauma. Clinical Chemistry Laboratory
Medicine, v. 44, n.10, p.1234-1242, 2006.
SCHARFMAN,
H.E.
Brain-derived
neurotrophic factor and epilepsy – a missing link?
Epilepsy Currents, v 5, n. 3, p. 83-89, 2005.
REGNER, A.R.et al. Neurochemical
characterization of traumatic brain injury in
humans. Journal of Neurotrauma, v.18, n.8,
p.783-792, 2001.
UNIVERSITÉ PARIS DESCARTES.
Genatlas: gene database, 2006. Disponível em
http://www.dsi.univparis5.fr/genatlas/
fiche1.php?symbol=BDNF. Acesso em 08/2007.
ROCHA, A.B. da. et al. Serum Hsp70 as an
early predictor of fatal outcome after severe
traumatic brain injury in males. Journal of
Neurotrauma, v.22, n.9, p.966-977, 2005.
WILSON,
J.T.L.;
PETTIGREW,
L.E.L.;TEASDALE, G.M. Structured
Interviews for the Glasgow Outcome Scale
and the Extended Glasgow Outcome Scale:
guidelines for their use. Journal of
Neurotrauma, v.15, n.8, p.573-585, 1998.
ROCHA, A.B. da. et al. Role of serum S100â
as predictive marker of fatal outcome
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
129
130
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Ciências Exatas e da Terra
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
131
132
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Extração de voláteis de broto e casca de fruto do
pessegueiro e avaliação das respostas
eletroantenográficas sobre Grapholita molesta
(Lep.: Tortricidae)
FABRÍCIO FREDO NACIUK1
JOSUÉ SANT’ANA2
LUIZ ANTONIO MAZZINI FONTOURA3
RESUMO
O presente trabalho teve como objetivo extrair os voláteis de broto e de casca do fruto verde do
pessegueiro (Chiripá cv.) com diferentes solventes e avaliar a resposta da antena de machos e fêmeas de
Grapholita molesta a esses extratos. O método de extração foi o sólido-líquido utilizando hexano e etanol
como solventes. Os bioensaios foram realizados em um eletroantenógrafo. Tanto machos como fêmeas
apresentaram respostas eletrofisiológicas significativamente maiores aos extratos obtidos a partir do broto
de pessegueiro, independente do solvente usado. O extrato ativo foi analisado por GC/MS e é constituído
majoritariamente por benzaldeído.
Palavras-chave: Grapholita molesta, pessegueiro, eletroantenografia, benzaldeído.
1
Acadêmico do Curso de Química/ULBRA, Bolsista CNPqIC – Fundação de Ciência e Tecnologia (CIENTEC)
2
Professor Adjunto – Departamento de Fitossanidade Faculdade de Agronomia, UFRGS
3
Professor/Orientador do Curso de Quimica/ULBRA e Pesquisador da Fundação de Ciências e Tecnologia (CIENTEC)
([email protected])
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
133
ABSTRACT
The present work aimed to extract volatiles of shoots and unripe skin fruits of peach trees (Chiripá cv.)
with different solvents, and evaluate the electroantennographic responses of male and female Grapholita
molesta to this extracts. Solid–liquid extraction was used with hexane and methanol as solvents. The
bioassays were carried out by electroantennography. Both, males and females, showed higher
electrophysiological responses to extracts of shoots peach trees, independent of the solvent. The active
extract was analyzed by GC/MS and is mainly constituted by benzaldehyde.
Keywords: Grapholita molesta, peach, electroantennography, benzaldehyde.
INTRODUÇÃO
O estudo de estratégias visando o controle
de pragas agrícolas é uma área que aproxima a
química da produção de alimentos. É nesta área
que entram, por exemplo, os defensivos agrícolas. O uso de tal estratégia pode eliminar a
praga agrícola, mas também pode causar um
desequilíbrio ao ecossistema, além de danos à
saúde humana e poluição do meio ambiente
(NUNES et al., 2003). Recentemente, o mercado tem exigido um maior controle na produção dos frutos, assegurando ao consumidor a
qualidade do produto adquirido. Apenas a boa
aparência do fruto não é o suficiente para garantir sua qualidade. Análises químicas para
identificar possíveis resíduos de agrotóxicos no
fruto são necessárias. Importante, também, é o
consumidor ter conhecimento do impacto
ambiental que a estratégia de controle da praga pode causar. Desta maneira, pode ficar ciente dos processos produtivos do alimento que
irá consumir, e assim, adquirir maior confiança
no produto (FACHINELO et al., 2005). Uma
alternativa ecologicamente correta para evitar
os danos indesejáveis do uso de agrotóxicos é a
Produção Integrada de Frutas (PIF). Na PIF
utilizam-se estratégias biológicas, físicas e cul-
134
turais visando apenas o manejo da praga, não
correndo o risco de dizimar a espécie e muito
menos de agredir a saúde humana e o
ecossistema (FARIAS et al., 2003; NUNES et
al., 2003). A utilização da PIF leva a resultados econômicos e sociais bastante satisfatórios,
tais como geração de empregos e melhoria na
renda. Mais importante ainda é a menor incidência no uso de defensivos agrícolas, o que
leva à produção de frutas com melhor qualidade e com menor quantidade de contaminantes,
diminuindo os riscos, portanto, à saúde do trabalhador rural e do consumidor (FACHINELO
et al., 2005).
Dentro das culturas agrícolas de alimentos,
os frutos desempenham papel econômico importante, entre os quais, destaca-se o pêssego
(Prunus persica). Atualmente os principais produtores de pêssego são a Ásia (40%), Europa
(30%) e América do Norte (10%) sendo a China responsável por 30% da produção mundial
(AUBERT e MILHET, 2007). No cenário nacional, os estados do Rio Grande do Sul, São
Paulo, Santa Catarina, Paraná e Minas Gerais
são os maiores produtores. O Rio Grande do
Sul é o principal contribuinte, sendo responsável por mais de 40% da produção no país (FA-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
RIAS et al., 2003; ARIOLI et al., 2005;
FACHINELO et al., 2005). Os pólos de Pelotas,
Porto Alegre e a região da serra encontram-se
entre os maiores produtores gaúchos (ARIOLI
et al., 2005).
As pragas que mais danificam este tipo de
cultura são a Grapholita molesta (Lep.:
Tortricidae) e a Anastrepha fraterculus (Dip.:
Tephritidae). A grafolita, também conhecida por
mariposa-oriental, pode reduzir a produção do
pêssego na ordem de 3% a 5%, sendo que plantas com estágio de maturação mais avançado
são as mais prejudicadas (NUNES et al., 2003).
Além do pêssego, a grafolita também pode danificar outras frutas de clima temperado
(ARIOLI et al., 2004). O uso de defensivos agrícolas contendo fosforados e piretróides tem sido
o meio mais comum de controlar esta praga
(ARIOLI et al., 2004). O problema gerado pelo
uso de inseticidas de amplo espectro é o seu ataque a inimigos naturais, os quais auxiliam no
controle de pragas. Essa falta de seletividade
pode causar um desequilíbrio no ecossistema,
fazendo com que haja uma explosão populacional
de pragas secundárias, uma vez que seus predadores e parasitóides foram eliminados
(GONRING et al., 1999).
Entre os métodos de manejo utilizados na
PIF está o monitoramento da população da praga através do uso de feromônios. Feromônios
são substâncias químicas sintetizadas por um
indivíduo que, quando liberadas, desencadeiam alguma resposta fisiológica ou
comportamental em outro indivíduo da mesma
espécie, ou seja, tem caráter intra-específico
(FERRERIA e ZARBIN, 1998; SANT´ANA e
CORRÊA, 2007). Para uso do monitoramento
e controle de pragas pelo método
comportamental, é importante estudar os meios de comunicação da planta com o inseto, pois
pode haver efeitos aditivos ou sinérgicos com
os voláteis liberados pela primeira. Desta maneira, pode se obter uma melhor compreensão
pela preferência do ataque das pragas ao pêssego em determinada fase de maturação. Este
tipo de atração da grafolita pelo pessegueiro é
causado por voláteis da planta classificados
como cairomônios, isto é, substâncias que atuam na comunicação química de ação inter-específica, as quais beneficiam apenas o receptor do sinal químico. A ação deste sinalizador
irá depender, principalmente, dos aspectos fisiológicos do inseto, tais como capacidade de
percepção da antena e da idade do indivíduo,
entre outros fatores e dos estágios e partes
fenológicas da planta (SANT’ANA e
CORRÊA, 2007).
Provavelmente, as partes da planta que liberam os cairomônios atrativos à grafolita sejam o
broto, pois é o sítio de cópula, e a casca do fruto
verde, que é o estágio de maturação em que as
fêmeas ovipositam seus ovos (LEOPAGE e FADIGAS, 1944; SALLES, 2000).
Este trabalho tem como objetivo avaliar a
percepção eletroantenográfica da G. molesta a
extratos obtidos do broto e da casca do fruto
verde do pessegueiro. Os voláteis foram obtidos
por extração sólido–líquido utilizando etanol e
hexano como solventes. As soluções foram analisadas por cromatografia gasosa com detector
seletivo de massas (GC/MS) e utilizadas em
ensaios eletroantenográficos com machos e fêmeas de grafolita. Além disso, foram medidas
também as respostas de fêmeas a diferentes doses de benzaldeído, componente majoritário do
extrato ativo.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
135
A composição Química dos
Voláteis do Pêssego
O aroma exalado pelas plantas decorre da
emissão de substâncias voláteis por elas sintetizadas. Normalmente, as funções orgânicas que
estão presentes nesses voláteis são aldeídos,
alcoóis, cetonas, ésteres, lactonas e terpenos. A
ocorrência dessas substâncias químicas se dá em
baixas concentrações, as quais são influenciadas por fatores tais como variedade, condições
climatológicas e estágio de maturação do tecido (AUMATEL et al., 2004; AUBERT e
MILHET, 2007).
Aliado ao fato do pêssego apresentar uma boa
aparência, o seu aroma é item fundamental para
sua boa aceitação no mercado. Assim, tornamse de grande importância investigações sobre as
substâncias responsáveis pelo aroma da fruta
(HORVAT e CHAPMAN, 1990; HORVAT et
al., 1990). Em 1964, Lim e Romani já relatavam
a mudança de concentração dos voláteis durante
o estágio de maturação do pêssego (HORVAT
e CHAPMAN, 1990, HORVAT et al., 1990;
AUBERT e MILHET, 2007). Foi apenas em 1990,
entretanto, que foi relatado o primeiro trabalho, por Horvat et al. (1990), o qual visava identificar e quantificar os principais voláteis presentes em cada estágio de maturação da fruta.
Para isso, frutos em diferentes estágios de
maturação foram submetidos à destilação por
arraste de vapor utilizando como solvente
hexano. Após os voláteis terem sido isolados, as
análises foram realizadas por CG/MS. Foram
identificados como os principais voláteis presentes no destilado o benzaldeído, linalol, γdecalactona, δ-decalactona, hexanal e (E)-2hexenal. Voláteis obtidos das folhas foram também identificados. Neste caso, as folhas foram
136
submetidas ao nitrogênio líquido, pulverizadas
e suspensas em água e a suspensão levada à destilação. A maioria dos voláteis presentes no destilado era constituída de compostos aromáticos,
sendo que o benzaldeído correspondeu a mais
de 95% deles (HORVAT e CHAPMAN, 1990).
No mesmo ano, os autores apresentaram um segundo trabalho (HORVAT et al., 1990) cujo
objetivo era comparar os compostos voláteis em
diferentes culturas de pêssegos: Belle of Geórgia,
Cresthaven, June Gold, Monroe e Bailey. Os voláteis foram isolados por destilação por arraste de
vapor em hexano, realizada em aparelho de
Likens-Nickerson modificado. Através da análise por GC/MS foi possível identificar trinta e
dois compostos, havendo quantidades mais expressivas de benzaldeído, linalol, hexanal, (E)2-hexenal, 6-pentil-α-pirona, γ-decalactona e
δ-decalactona, γ-dodecalactona, ácido
palmítico e três hidrocarbonetos lineares (C21,
C23, C25). Os compostos foram quantificados
por cromatografia gasosa com detector por
ionização em chama (GC/FID). Em trabalho
posterior, Aumatel et al. (2004) desenvolveram
um método rápido por microextração em fase
sólida em head space (HS/SPME) e GC/MS para
caracterizar os compostos voláteis de néctares e
suco de frutas. Os voláteis foram obtidos por HSSPME a partir do pêssego, pêra e damasco. Os
compostos foram quantificados por GC/FID.
Entre os compostos que foram encontrados em
maior concentração estão o limoneno, acetato
de hexila, γ-terpeno, acetato de 3-hexenila,
octanoato de etila, ácido acético, linalol,1,2,3,4tetraidro-1,6,8-trimetilnaftaleno, α-terpineol,
α-(E,E)-farneseno e γ-decalactona. Em trabalho recente, Aubert e Milhet (2007) estudaram
a distribuição de compostos voláteis em diferentes partes do pêssego white-fleshed. Estes voláteis foram isolados por micro-extração líquido-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
líquido (LLME). Os extratos obtidos foram
quantificados por GC/FID e identificados por
GC/MS. Na casca, a totalidade dos voláteis presentes, acima de 33% eram compostos C6,
lactonas (30%) e alcanos (25%). Porém, na polpa, lactonas (acima de 50%), compostos C6
(26%) e C13-norisoprenoides (17%). Em uma
linha de trabalho diferente, Natale et al. (2004)
avaliaram a atratividade da grafolita a voláteis
do pêssego e da maçã. Os voláteis foram isolados a partir de amostras do broto das frutas através da técnica de headspace dinâmico e analisados por GC/MS. De todos os voláteis identificados, as classes que apresentaram maior relevância foram os terpenóides e ésteres (> 27%),
hidrocarbonetos (> 18%) e álcoois (9%). A atividade biológica dos compostos foi avaliada através de um olfatômetro. Foram selecionados insetos fêmeas copuladas de três a cinco dias.
Quando os insetos foram submetidos aos ensaios biológicos, ambos os voláteis, de pêssego e
maçã foram atrativos. Quando os insetos foram
submetidos no olfatômetro às duas alternativas,
não mostraram preferência por uma delas. Em
outro trabalho, os mesmos autores estudaram os
voláteis do broto. Os voláteis emitidos apresentaram atratividade significativa tanto para as
fêmeas virgens quanto para as copuladas
(NATALE al., 2003).
A Grapholita molesta
A Grapholita molesta é originária do Japão
ou do norte da China. Apresenta coloração
acinzentada com manchas escuras nas asas. Possui envergadura entre 12 e 15 mm e asas de 6 a
7 mm de largura. Geralmente as fêmeas possuem tamanho superior aos machos (SALLES,
2000). A fêmea copulada tem preferência em
ovipositar seus ovos em folhas novas de brotos
e frutos verdes. As lagartas, ao eclodirem, medem aproximadamente 4 mm de comprimento
com coloração branco-creme a levemente amarelada. No seu estágio final podem atingir de
10 a 12 mm de comprimento e adquirem cor
branco-rosada. A cabeça é facilmente diferenciada e de cor preta (SALLES, 2000). O estágio larval da grafolita tem uma duração máxima de 11 a 21 dias. Logo após eclodir, a larva
sai em busca de alimento. Para isso perfura os
brotos até atingir a parte mais suculenta. Quando ataca o fruto, a perfuração é feita no sentido do caroço. Ao atingir o caroço, alimenta-se
da polpa que se encontra ao redor. Após atingir total desenvolvimento, a larva procura as
axilas dos ramos ou dos frutos, no ponto de inserção do pedúnculo para tecer seu casulo. A
duração deste estágio vai de 2 a 9 dias. Após
isso, atinge o período de pupa que dura de 5 a
12 dias (LEOPAGE e FADIGAS, 1944;
SALLES, 2000) . Ao atingir a fase adulta, a
mariposa tem um tempo de vida que vai de 10
a 14 dias para as fêmeas e de 7 a 10 dias para os
machos. Em relação aos horários preferidos para
voar, a mariposa apresenta hábitos crepusculares. Em algumas culturas, observa-se que a lagarta da grafolita ataca os brotos e ponteiros,
em outros casos, apenas o fruto verde e ainda
pode acontecer o ataque nos três estágios
fenológicos do pessegueiro (SALLES, 2000).
Com a finalidade de atrair o macho para a
cópula, as fêmeas liberam feromônios sexuais.
Os componentes feromonais liberados pelo inseto são o acetato de (Z)-8-dodecenila, acetato
de (E)-8-dodecenila e álcool (Z)-8-dodecenílico
(CARDÉ, BAKER e CARDÉ, 1979). Quando
esses feromônios chegam até a antena do macho, provocam uma resposta comportamental
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
137
fazendo com que este vá ao encontro da fêmea.
O feromônio entra no organismo do inseto através dos poros existentes nas sensilas
quimiorreceptoras da antena. Para realizar o
controle populacional da G. molesta, feromônios
sintéticos têm sido usados como estratégia de
confundimento para impedir a cópula dos insetos (SALLES & MARINI, 1989).
O Eletroantenógrafo
A resposta de uma antena ao estímulo provocado por um odor pode ser medida
quantitativamente em um equipamento chamado de eletroantenógrafo (EAG). O aparelho
consiste basicamente de um tubo cilíndrico por
onde constantemente passa ar umidificado, de
um redirecionador de fluxo, que faz com que a
corrente de ar carregue os voláteis, um eletrodo
de prata, ouro ou platina, onde é colocada a
antena do inseto, e um osciloscópio que registra
o estímulo gerado pelos voláteis (ROZAS e
PEREZ, 1987; SANT’ANA e CORRÊA, 2007).
Para analisar a resposta eletroantenográfica, a
antena do inseto é colocada entre eletrodos fixando-se as suas extremidades com um gel condutor. Dependendo do tipo de aparelho usado,
utiliza-se o inseto inteiro ainda vivo, ou apenas
sua antena. No último caso, a análise deve ser
conduzida o mais breve possível, para que se
possa utilizar a antena ainda com sua máxima
capacidade de resposta (SANT’ANA e
CORRÊA, 2007).
A intensidade do estímulo gerado irá depender do número de sensilas quimiorreceptoras que
a antena do inseto possui. Outro fator importante é a concentração dos voláteis analisados.
Quanto mais concentrada é a solução, maior a
138
resposta. Contudo, vale ressaltar que existem limites máximo e mínimo de detecção da antena.
Se a solução for muito concentrada, as proteínas
responsáveis pela degradação das moléculas dos
voláteis não terão tempo de desempenharem seu
papel, fazendo com que a antena fique saturada
e assim não gere mais resposta (SANT’ANA e
CORRÊA, 2007). A resposta é medida em mV,
sendo que o valor negativo refere-se à
despolarização da membrana celular gerada pelo
extrato analisado sobre a antena do inseto. Este
sinal é gerado pela soma das despolarizações de
todas as sensilas quimiorreceptoras (ROZAS e
PEREZ, 1987; SANT’ANA e CORRÊA, 2007).
MATERIAL E MÉTODOS
A obtenção dos Extratos
Frutos verdes e brotos isentos de tratamento
com defensivos agrícolas foram coletados e fornecidos pelo Laboratório de Biologia, Ecologia
e Controle Biológico de Insetos da Faculdade
de Agronomia da UFRGS. O modo de preparação das amostras foi o mesmo para o broto e casca do fruto verde. Os materiais foram submetidos à extração sólido-líquido com etanol (Vetec)
e hexano (Merck). As amostras foram picadas
em um liquidificador e 50 g de amostra foram
pesadas e transferidas para um balão de 100 mL.
Sobre a amostra, foram adicionados 20 mL de
solvente. A seguir, foram submetidas a refluxo
por um período de 4 h. Após o término deste
tempo, os extratos obtidos repousaram por 1 h e,
então, foram filtrados em papel pregueado. As
extrações foram realizadas no período de 24 a
48 h após a coleta do material. Os extratos foram armazenados sob refrigeração.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
A análise Cromatográfica
O GC/MS utilizado foi um Shimadzu QP2010
equipado com uma coluna capilar RTX-5MS (30
m x 0,25 mm x 0,1 μm) utilizando He como gás
de arraste com uma vazão de 1 mL min-1. A temperatura inicial de forno foi de 40 oC, a qual,
após 3 min, foi elevada a uma taxa de 5 oC min
até 240 oC. O injetor foi selecionado para o modo
splitless a 240 oC. A interface e a câmara de
ionização foram mantidas na mesma temperatura. Os espectros de massas foram obtidos por
impacto eletrônico (IE) a 70 eV. O analisador
foi ajustado no modo scan operando no intervalo m/z 40 a 460. A análise qualitativa foi realizada pela comparação dos espectros obtidos com
espectros autênticos da Biblioteca Nist 5.0.
O ensaio Eletroantenográfico
Foram utilizados insetos fêmeas e machos com
idade de 4 dias. Com o auxílio de uma lupa e
utilizando uma pinça histológica a antena do
inseto foi retirada o mais próximo possível da
base. As extremidades basal e apical da antena
ficaram aderidas ao eletrodo registrador e ao
neutro, respectivamente, e ambas foram imersas
em gel condutor, para possibilitar a
condutividade elétrica da amostra. Um papel
filtro de ca 1 x 1,5 cm foi impregnado com 5 μL
do extrato a ser ensaiado. Após a evaporação do
solvente, o papel foi introduzido em uma pipeta
Pasteur. Para cada extrato e para seus respectivos solventes (hexano e etanol) foi preparada
uma pipeta. Os papéis com os extratos foram
utilizados até 2 h após terem sido impregnados.
Uma mangueira foi conectada na extremidade
da pipeta e então o aparelho foi acionado para
que o fluxo de ar fosse redirecionado para passar pela pipeta e arrastar os voláteis até a ante-
na. O fluxo de ar com os voláteis persiste por 0,5
s. Cada antena foi exposta aos quatro extratos e
aos dois solventes, respeitando-se um intervalo
de 60 s entre tratamentos. Foram utilizadas 12
antenas de doze insetos diferentes para cada
sexos. Além dos extratos, testes de sensibilidade ao benzaldeído foram realizados com antenas de fêmeas virgens e fêmeas copuladas. Soluções de benzaldeído em hexano com concentrações de 1.10-7 a 10 mg mL-1 foram testadas.
Os ensaios foram realizados seguindo o mesmo
procedimento utilizado para os extratos. A resposta analógica do sinal, em milivolts, foi capturada e processada com um controlador de
aquisição de dados (IDAC-4, Syntech® ,the
Netherlands) e, posteriormente, analisados com
o software (EAG2000, Syntech® , The
Netherlands). Em todos os ensaios, foram calculadas as médias das doze medidas, os erros
padrões e as variâncias, sendo os resultados comparados por ANOVA, com 95% de
confiabilidade (α < 0,05).
RESULTADOS E
DISCUSSÃO
Os extratos obtidos com etanol apresentaram
coloração verde com aroma adocicado característico do pêssego. Quando o solvente utilizado
foi hexano, uma coloração amarelada foi obtida. Neste caso, nenhum cheiro característico
do pêssego foi percebido. Nos dois casos, o extrato da casca verde apresentou cor mais intensa que o do broto.
A partir dos dados obtidos na análise
eletroantenográfica foi possível observar que para
o conjunto de antenas dos insetos de ambos os
sexos, o extrato do broto do pessegueiro foi o
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
139
que apresentou maior resposta independente do
solvente (Figuras 1 e 2). Do total das antenas
testadas de insetos machos, 75% responderam
mais intensamente ao extrato do broto obtido
com hexano. Porém, no caso das antenas de fê-
meas, 83% responderam mais significativamente ao extrato obtido com etanol. Entretanto, a
análise estatística fornece resultados indicando
que o tipo de solvente utilizado não interfere na
resposta do inseto.
Figura 1 - Média das respostas eletrofisiológicas (± desvio padrão), mV, de machos de Grapholita molesta (n=
12) a voláteis de diferentes porções de plantas hospedeiras.
Figura 2 - Média das respostas eletrofisiológicas (± desvio padrão), mV, de fêmeas de Grapholita molesta (n=
12) a voláteis de diferentes porções de plantas hospedeiras.
As fêmeas, além de ovipositarem seus ovos
nos brotos, também o fazem em frutos verdes.
Portanto, era esperado que o extrato obtido da
casca verde também pudesse gerar resposta nas
antenas de fêmeas. Contudo, não foram obser-
140
vadas respostas significativas das antenas submetidas aos extratos da casca do fruto verde.
Os extratos ativos, isto é, do broto, foram analisados por GC/MS. Uma vez que o benzaldeído
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
foi identificado como componente majoritário,
optou-se por avaliar a resposta de antenas a diferentes doses deste composto (5.101 a 5. 10-7 μg).
A sensibilidade das sensilas antenais de fêmeas
virgens e copuladas de G. molesta todas as doses
de benzaldeído, foram similares (P>0,05). No
entanto, a dose de 50 μg foi a única que diferiu
significativamente do controle, sendo esta, considerada a dose-limite para que o inseto perceba
o odor, independentemente do status de cópula.
A Figura 3 apresenta o gráfico da média das repostas lançadas em função da dose de benzaldeído.
Figura 3 - Média das respostas eletroantenográficas (EAG) de fêmeas de Grapholita molesta ao hexano
(controle) e a cinco diferentes doses de benzaldeído. 1 (hexano); 2 (5.10-7 μg), 3 (5.10-5 μg), 4 (5.103
μg), 5 (5.10-1 μg), 6 (5.101 μg). Médias seguidas de letras distintas diferem entre si (P < 0,05).
CONCLUSÃO
O extrato de broto de pessegueiro é o mais
bioativo em antenas de Grapholita molesta de
ambos os sexos. Benzaldeído é o composto majoritário no extrato de broto de pessegueiro e 50 μg
é a dose-limite desta substância, em antenas de
fêmeas de G. molesta, virgens e copuladas.
REFERÊNCIAS
ARIOLI, C. J.; BOTTON, M.; CARVALHO, G. A. Controle químico da Grapholita
molesta (Busck) (Lepidoptera: Tortricidae)
na cultura do pessegueiro. Ciência Rural,
Santa Maria, v.34, n.6, p.1695-1700, 2004.
ARIOLI, C. J.; CARVALHO, G. A.;
BOTTON, M. Flutuação populacional de
Grapholita molesta (Busck) com armadilhas
de feromônio sexual na cultura do pessegueiro em Bento Gonçalves, RS, Brasil. Ciência
Rural, Santa Maria, v.35, n.1, p.1-5, 2005.
AUBERT, C.; MILHET, C.; Distribution of the
volatile compounds in the different parts of a
white-fleshed peach (Prunus persica L. Batsch).
Food Chemistry, v.102, p.375-384, 2007.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
141
AUMATELL, M. R. et al. Characterization
of volatile compounds of fruit juices and
nectars by HS/SPME and GC/MS. Food
Chemistry, v.87, p.627-637, 2004.
CARDÉ, A. M.; BAKER, T. C.; CARDÉ, R.
T. Identification of a four-component sex
heromone of the female oriental fruit moth,
Grapholita molesta (Lepidoptera: Tortricidae).
Journal of Chemical Ecology, v.5, n.3, p.423427, 1979.
FACHINELO, J. C. et al. Produtividade e
qualidade de pêssegos obtidos nos sistemas
de produção integrada. Revista Brasileira
de Fruticultura, Jaboticabal, v.27, n.1, p. 6467, 2005.
FARIAS, R. M. et al. Produção convencional x integrada em pessegueiro cv. Marli na
depressão central do Rio Grande do Sul.
Revista Brasileira de Fruticultura,
Jaboticabal, v.25, n.2, p.253-255, 2003.
FERREIRA, J. T. B.; ZARBIN, P. H. G. Amor
ao primeiro odor: A comunicação química
entre os insetos. Química Nova na Escola,
n.7, 1998.
GONRING, A. H. R. et al. Seletividade de
inseticidas, utilizados no controle de
Grapholita molesta (Busck) (Lepidoptera:
Olethreutidae) em pêssego, a Vespidae
predarores. Anais da Sociedade de
Entomologia do Brasil, v.28, n.2, p.301-306,
1999.
HORVAT, R. J.; CHAPMAN, G. W.
Comparison of volatile compounds from
peach fruit and leaves (cv. Monroe) during
maturation. Journal of Agricultural and
142
Food Chemistry, v.38, p.1442-1444, 1990.
HORVAT, R. J. et al. Comparison of the
volatile compounds from several commercial
peaches cultivars. Journal of Agricultural
and Food Chemistry, v.38, p.234-237, 1990.
LEOPAGE, H. S.; FADIGAS Jr, M. A mariposa oriental das frutas. O Biológico, v.10,
p.135-140. 1944.
NATALE, D. et al. Response of female Cydia
molesta (Lepidoptera: Tortricidae) to plant
derived volatiles. Bulletin of Entomological
Research, v.93, p.335-342, 2003.
NATALE, D. et al. Apple and peach fruit
volatiles and apple constituent butyl
hexanoate attract female oriental fruit moth,
Cydia molesta, in the laboratory. Journal of
Applied Entomologhy, v.128, p.22-27, 2004.
NUNES, J. L. S. et al. Flutuação populacional
e controle da mariposa oriental (Grapholita
molesta Busk, 1916) em produção convencional e integrada de pessegueiro. Revista
Brasileira de Fruticultura, Jaboticabal, v.25,
n.2, p. 227-228, 2003
ROZAS, R.; PEREZ, D. A selective
electroantennography cell for testing the
activity of pheromones. Journal of Chemical
Education, v.64, n.4, p.356-358, 1987.
SALLES, L.A.B. Mariposa–oriental,
Grapholita molesta (Lepidoptera: Tortricidae).
In: VILELA, E. F. et al. (Orgs.) Histórico e
impacto das pragas introduzidas no Brasil.
Ribeirão Preto: Holos, 2000. p. 42-45.
SALLES, L.A.B. ; MARINI, L.H. Avaliação
de uma formulação de feromônio de
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
confundimento no controle de Grapholita
molesta (Busck, 1916) (Lepidoptera,
Tortricidae). Anais da Sociedade
Entomológica do Brasil, v.18, n.2, p.329-336,
1989.
SANT’ANA, J.; CORRÊA, A.G. Ecologia
química de insetos. In: VIEIRA, P. C.;
CORRÊA, A. G. (Orgs.). Produtos naturais no controle de insetos. 2 ed. São Carlos:
EDUFSCAR, 2007. p.9-18.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
143
Ciências Humanas
146
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
A educação para a saúde e o ensino de ciências:
estudando as zoonoses – estudo preliminar
JOANA KLIEMANN DA CRUZ1
MARIANA PROENÇA2
ROSANA MARIA PARIS2
RICARDO LUIZ RAMOS2
ROSSANO ANDRÉ DAL-FARRA3
EDSON ROBERTO OAIGEN4
RESUMO
A Organização Mundial da Saúde define zoonoses como sendo doenças naturalmente transmissíveis
entre animais vertebrados e seres humanos. Alguns autores incluem ainda patologias como a dengue, febre
amarela, malária e doença de chagas no âmbito das zoonoses. Diante da relevância epidemiológica destas
doenças, especialmente no Brasil, as zoonoses se constituem em tema relevante no âmbito do Ensino de
Ciências e da sua interface com a Educação para a Saúde, devendo ser objeto de estudo tanto no Ensino
Fundamental, quanto no Ensino Médio. Com base nestas premissas, o objetivo deste estudo consiste em
realizar uma prospecção a respeito do conhecimento de estudantes de nível médio, de graduação e pósgraduação em relação às zoonoses, visando lançar as bases para abordar o tema em atividades didáticas
no Ensino de Ciências. Entende-se que através de programas educativos e de saúde dentro das escolas
será possível contribuir para os programas de controle destas doenças na população.
Palavras-chave: Educação para a saúde, Ensino de Ciências, zoonoses.
1
Acadêmica do Curso de Medicina Veterinária /ULBRA
Acadêmico(a) do Curso de Biologia/ULBRA
2
3
Professor/Orientador do Curso de Medicina Veterinária/
ULBRA e do PPG em Ensino de Ciências e Matemática/ULBRA
([email protected])
4
Professor do Curso de Biologia/ULBRA e do PPG em Ensino de Ciências e Matemática/ULBRA
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
147
ABSTRACT
The World-wide Health Organization defines zoonosis as a natural transmissible illness between vertebrate
animals and human beings. Some authors still include pathologies such as, dengue, yellow fever, malaria
and the chagas illness in the scope of zoonosis. Do to the epidemiological relevance of these illnesses,
especially in Brazil, zoonosis constitutes a excellent subject in the ambit of Teaching Science and its interface
with Health Education, and it should be objective of study in Elementary Schools as well as in High
Schools. On the basis of these premises, the objective of this study consists of, carrying through a prospective,
regarding the knowledge of students of undergraduate level, graduate and master degree in relation to
zoonosis, aiming at, launching the bases to approach the subjects in didactic activities on Science Study’s .It
is understood that through educative and health programs inside of the schools, it will be possible to
contribute for control programs of these illnesses in the population.
Keywords: Health education, Science Education, zoonosis.
INTRODUÇÃO
O termo zoonoses é originário do grego. O
prefixo “zoon” significa animal, e o sufixo “nosos”
doenças. A origem dos agentes causadores destas patologias se perde no tempo, e a sua transmissão remonta aos primeiros contatos do ser
humano com os animais. Entretanto, a partir da
Revolução Neolítica no período de 8.000 a. C.,
com o desenvolvimento da agricultura em grande escala, e a intensificação da domesticação
de animais, ocorreu o abandono da vida nômade para uma vida sedentária próximo aos rios,
havendo condições propícias para o alastramento das zoonoses.
Existem relatos de zoonoses desde a época
de Moisés, os quais já conheciam a raiva e, além
disso, tinham um ditado popular: “Ninguém acreditará no homem que disser ter sido mordido por
um cão raivoso e ainda esteja vivo”. Na Grécia
antiga, Hipócrates e Aristóteles fizeram referências nos seus escritos ao mormo e sua transmissão ao ser humano. Entretanto, somente no século XIX, o médico alemão Rudolf Wirchow,
148
após a descoberta das características de algumas bactérias e de outros organismos conseguiu
estabeleceu analogias entre diversas doenças
contagiosas do ser humano e dos animais. Em
1966, durante a realização do “3° Encontro de
Peritos em Zoonoses” da Organização Mundial
da Saúde, ficou definido que zoonoses seriam as
doenças e infecções naturalmente transmissíveis
entre os hospedeiros vertebrados e o homem
(VASCONCELOS, 2007), embora alguns autores incluam ainda doenças como a dengue, a
malária e a doença de Chagas como zoonoses
(GOMES et al., 1998). Muitas vezes, como ocorre com o morcego hematófago e a raiva silvestre, os animais podem transmitir as doenças sem
necessariamente estar evidenciando manifestações clínicas que permitissem o diagnóstico das
mesmas, sendo apenas um reservatório para o
agente da doença.
O incremento do crescimento populacional
ocorrido em várias regiões do mundo nas últimas
décadas tem gerado crescentes aglomerações urbanas, principalmente em países em desenvolvimento. Considerando as precárias condições de
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
vida nestes locais, somadas às deficiências em
relação à educação, há uma maior probabilidade
de ocorrência de doenças transmissíveis, entre
as quais se encontram as zoonoses.
A falta de investimento na profilaxia das
doenças, no saneamento básico e especialmente o desconhecimento por parte da população,
são aspectos que contribuem para o aumento do
número de casos, agravados pelas deficiências
no manejo sanitário das criações de animais.
Estes problemas prejudicam decisivamente a
saúde das pessoas e a economia do país, pelos
prejuízos em relação à exportação de produtos
de origem animal.
Outro aspecto relevante se refere a globalização
por favorecer sobremaneira a disseminação das
zoonoses, devido aos meios modernos de transporte rodoviário, ferroviário, marítimo e
aeroviário, possibilitando a condução acidental
de vertebrados (reservatórios) e/ou invertebrados
(vetores) para outros locais do globo.
Na América Latina, países como o Brasil, a
Argentina e o Uruguai possuem condições climáticas e topográficas altamente favoráveis para
a atividade pecuária e para a produção de alimentos de origem animal como um todo. Suínos,
bovinos, caprinos, ovinos e aves em número elevado constituem setores de elevada importância
econômica para estes países, em meio a políticas
sanitárias ainda em desenvolvimento, criando
condições para que as zoonoses ocorram em níveis elevados e atingindo diretamente a população destes países, em especial no Brasil, em que
podemos citar a brucelose e a tuberculose como
zoonoses de extrema importância. Inclusive, no
ano de 2001 o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) instituiu um Programa Nacional de Controle e Erradicação da
Brucelose e Tuberculose Animal (PNCEBT) a fim
de diminuir os impactos negativos destas zoonoses,
implantando a vacinação obrigatória contra
brucelose bovina e medidas de combate a tuberculose (NETTO, 2003).
Segundo Almeida et al. (1999), um considerável número de zoonoses tem emergido, tanto
em países industrializados, quanto em países em
desenvolvimento. Fato este que ocorre em virtude do conhecimento de novos agentes patológicos ou de agentes já identificados, os quais têm
reaparecido após anos sem serem identificados.
Entretanto, o principal problema que enfrentamos se refere ao desconhecimento por parte da
população sobre as zoonoses, favorecendo o aumento do número de casos nas unidades de atendimento básico de saúde. Portanto, há uma necessidade de elaborarmos Programas de Educação para Saúde que possam ser integrados às atividades de Ensino de Ciências ou que sejam trabalhados de foram transversal, pois as zoonoses
não se constituem em tema freqüente nos currículos do Ensino Fundamental e Médio do Brasil.
Mohr e Schall (1992), afirmam em seu trabalho, que o artigo 7 da lei 5.692/71, tornou obrigatória a educação em saúde nas escolas brasileiras de 1º e 2º graus, visando despertar nos
estudantes o interesse pelo conhecimento e pela
prática da saúde básica e da higiene.
Segundo os autores...
“...a própria operacionalização da lei, através do parecer 2.264/74 do Conselho Federal de Educação, estabelece que a
aprendizagem deve se processar,
prioritariamente, através de ações e não
de explanações, o que não se efetivou de
fato (MOHR e SCHALL, 1992).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
149
Ainda segundo Mohr e Schall (1992), de
maneira geral, tanto os professores provenientes
das escolas de formação de professores em nível
de 2º grau, quanto os licenciados com formação
em nível de graduação, deveriam estar capacitados para trabalhar em sala de aula com a educação em saúde com base na transposição dos
aspectos teóricos às realidades práticas concretas que o tema sugere.
Conforme os Parâmetros Curriculares Nacionais, ou PCN (BRASIL, 1998), os nomes das
doenças, os respectivos agentes e os sintomas
característicos das mesmas devem ser trabalhados de forma significativa, relacionando com o
contexto no qual as pessoas vivem. A propósito,
mesmo abordando a temática Educação para a
Saúde, os PCN não abordam especificamente a
questão das zoonoses, citando, entretanto, a
necessidade do desenvolvimento de atitudes do
ser humano em relação a sua saúde.
150
Portanto, precisamos fazer com que este conhecimento chegue até a escola e se difunda
pela sociedade como um todo, integrando as
ações relativas a alfabetização científica que têm
sido realizadas no Brasil, sendo o objetivo deste
trabalho realizar uma prospecção em relação ao
conhecimento de estudantes e docentes a respeito das zoonoses, assim como discutir a relevância de tratar este tema no Ensino de Ciências e na educação formal como um todo.
MATERIAL E MÉTODOS
Portanto, a inclusão deste tema nos debates
escolares seria de grande valia para a educação
contemporânea, considerando a proximidade
cada vez maior que o ser humano tem tido com
animais, especialmente os de companhia como
cães e gatos.
A iniciativa de realizar este estudo decorreu
de uma análise inicial exploratória com
graduandos em Biologia, a respeito do conhecimento dos mesmos sobre zoonoses. Diante da
constatação de que havia lacunas em relação a
determinados aspectos técnicos relacionados ao
assunto, foram elaborados instrumentos de coleta de dados (ICD) para serem aplicados em
alunos que cursavam o Ensino Médio (total de
16 alunos), alunos de Graduação em Biologia
(total de 18 alunos) e alunos de Pós-Graduação
em Ensino de Ciências e Matemática (total de
12 alunos).
Embora timidamente, algumas ações têm sido
realizadas ao longo das últimas décadas visando
informar a população a respeito das zoonoses.
No ano de 2005, o Ministério da Saúde lançou
o Guia de Vigilância Epidemiológica, um instrumento de consulta dos profissionais da área
da saúde que circula em todo Brasil, com informações a respeito de diversas zoonoses endêmicas
no país. Paralelo a este processo, muitas pesquisas têm sido realizadas no Brasil a respeito das
zoonoses e do tratamento das mesmas.
O ICD aplicado aos alunos do Ensino Médio
solicitava que assinalassem, em uma questão
fechada, quais as doenças que eles consideravam ser zoonoses dentre quinze opções apresentadas envolvendo patologias que efetivamente
eram zoonoses e outras não. Para os alunos de
graduação, além da questão anterior, foi acrescida uma questão aberta na qual perguntava:
Dentre as alternativas escolhidas na questão anterior, qual delas você daria maior importância em termos de saúde publica? Justifique sua resposta. Para
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
os mestrandos, além das duas questões anteriores foram incluídas as seguintes: O que você entende por Zoonose? além de: Você acha que as
Zoonoses são abordadas corretamente em nosso
modelo de ensino? Ou há uma necessidade de Programas de Educação para Saúde? Justifique sua
resposta.
Posteriormente, os resultados foram analisados com base na quantificação das respostas dos
diferentes grupos às questões fechadas, e na
análise das respostas às questões abertas, realizada por meio da denominada Análise de Conteúdo proposta por Bardin (2006), composta por
uma pré-análise caracterizada pelo que o autor
chama de “leitura flutuante”, na qual foi processada a codificação dos resultados do ICD e
realizada a numeração progressiva dos
respondentes, para então, num segundo momento, serem destacados os temas, definidos pelo
autor francês como sendo unidades de registro
para estudar as respostas que são obtidas a questões abertas.
Segundo Bardin (2006), a análise de conteúdo analisa propriamente as condições da produção dos textos, ou seja, o objeto dos mesmos.
Desta forma, são obtidos os temas, definidos
como unidades de significação que se obtém da
análise de um texto segundo critérios relativos
à teoria que serve de guia para a leitura destes.
Para o autor, a investigação dos temas permite
que se analise os discursos dos sujeitos
respondentes de forma simples.
Metodologicamente, os resultados obtidos
foram analisados considerando o amplo conceito de zoonoses que inclui outras doenças que
são transmitidas para o ser humano por animais
não vertebrados.
RESULTADOS E
DISCUSSÃO
Ensino Médio
Entre os entrevistados que estavam cursando o Ensino Médio, 56,3% deles classificaram
corretamente as zoonoses, incluindo a raiva
(56,3%), a toxoplasmose (56,3%), a pediculose
(56,3%), a leptospirose (50%) e a sarna (50%),
sendo a dengue citada por 43,8%. Em relação
às respostas erradas, três indivíduos assinalaram
a leucemia, e apenas um respondente assinalou
Hemofilia, HIV, hepatite, diabete, gripe, pneumonia, sarampo e gastrite como zoonoses.
Verifica- se, que embora a maioria dos
respondentes tenha assinalado corretamente as
zoonoses, o tema não representa um aspecto corriqueiro para a totalidade dos entrevistados.
Acadêmicos de Biologia
Nos acadêmicos de Biologia, a leptospirose foi
assinalada por 100% dos entrevistados, e as demais zoonoses foram assinaladas corretamente pela
maioria dos entrevistados sendo 94,4% para
toxoplasmose, 88,9% para pediculose, 83,3% para
dengue, 66,7% para raiva e 61,1% para sarna.
Provavelmente, as freqüentes matérias na
mídia a respeito da leptospirose, em decorrência
de enchentes, tenham contribuído para o fato de
todos os respondentes terem assinalado a mesma
como zoonose, estando fortemente associada com
a presença de ratos no meio urbano e rural.
Segundo Blood et al. (1991) a leptospirose é
uma zoonose bacteriana transmissível entre animais e o ser humano, estando presente no mun-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
151
do todo, sendo, porém, de prevalência elevada
em países de clima subtropical, em especial nos
períodos de elevados níveis pluviométricos.
Hepatite, hemofilia, pneumonia, sarampo,
gastrite e leucemia não foram assinaladas pelos
respondentes, entretanto, um dos entrevistados
assinalou erroneamente doenças como HIV e
diabetes como sendo zoonoses.
Ao responderem a questão solicitando qual era
a zoonose de maior importância na saúde pública,
88,9% assinalaram a leptospirose, justificando pelo
fato da mesma ser transmitida pela urina do rato e
pelas precárias condições no que diz respeito ao
saneamento básico, o acúmulo de lixo e a expansão das grandes cidades, bem como a falta de higiene por parte das pessoas e pelo fato de sua incidência ser maior em populações carentes.
A segunda doença mais mencionada na questão supracitada foi a dengue, sendo que 66,7% a
consideram como importante na inclusão em programas de saúde pública, com as justificativas relativas à questão do mosquito e às condições precárias de vida das pessoas. Um dos entrevistados
afirmou: “Só o apelo dos meios não é o suficiente,
falta informação” aludindo para a necessidade da
educação formal se envolver no problema.
Em terceiro lugar foi mencionada a
toxoplasmose por 44,4% do total de entrevistados, destacando-a pelo fato da vinculação ao
felino doméstico, e também pelo desconhecimento da população. Segue-se a menção à
pediculose com 33,3%, associada às questões da
transmissão nas escolas.
Apenas 22,2% dos entrevistados citaram a
raiva como importante em programas de saúde
pública, associando-a com o cão e com alertas
152
para a necessidade de realizar uma correta vacinação destes animais. A sarna foi mencionada por dois respondentes, com justificativas em
relação a condições de higiene como relevantes
para controlar a doença.
Erroneamente, um dos respondentes assinalou a pneumonia e o HIV como zoonoses, e dois
deles a diabete, demonstrando desconhecerem
o significado do termo.
Portanto, os dados corroboram a constatação
dos autores deste estudo em relação a necessidade da elaboração de campanhas para esclarecimento da população, com trabalhos voltados a
sensibilização das pessoas no sentido de amplificar a divulgação das principais zoonoses que ocorrem em nosso meio, principalmente nas escolas.
Ao serem questionados a respeito do que
entendiam por zoonoses, 75% mencionaram o
fato das zoonoses serem doenças transmitidas
pelos animais, com dois respondentes aludindo
a insetos e parasitas. Um dos estudantes afirmou que zoonoses seria o “...órgão responsável
pelo controle de parasitas, bactérias, vírus que
são transmitidos por animais”, provavelmente por
conhecer apenas o setor responsável por este
âmbito em sua cidade.
Mestrandos
Todos os indivíduos assinalaram que a raiva
e sarna se constituem em zoonoses, provavelmente pelo fato de muitas pessoas relacionar as
zoonoses principalmente com os animais de estimação, em especial, o cão.
Torna-se importante neste caso lembrar que,
embora tradicionalmente associada aos cães, a
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
raiva também pode ser transmitida por morcegos hematófagos a outros animais e ao ser humano. Segundo dados do Ministério da Saúde
em 2004/2005, estes animais causaram 41 óbitos
humanos por raiva no Pará e Maranhão. No Rio
Grande do Sul, em 2006, foram identificados 12
focos de raiva bovina e eqüina transmitida por
estes morcegos (BRASIL, 2007).
Além do morcego hematófago ser transmissor
do vírus da raiva, o morcego insetívoro pode disseminar outra variante do vírus, tornando-se então
de extrema importância em termos de saúde publica, principalmente por viverem próximos às cidades. Entre 1990 a 2001, foram registrados, no
Brasil, cerca de 458 casos de raiva humana. No
entanto, no RS, o vírus da Variante Canina em
cães e gatos não ocorre desde 1990, sendo considerada uma doença sob controle. Entretanto, foi
detectado um caso de raiva canina em Tapes, cidade localizada a 103 Km de Porto Alegre no dia
23 de janeiro de 2007, cuja origem foi um morcego
infectado (RIO GRANDE DO SUL, 2007).
A leptospirose, a pediculose e a toxoplasmose
foram classificadas como zoonoses por respectivamente, 83,3%, 75%, 58,3% dos entrevistados.
Ao passo que a dengue foi assinalada somente
por 33,3% dos respondentes.
Em relação às respostas erradas, 33,3% assinalaram HIV, 33,3% gripe, 8,3% hemofilia e
8,3% pneumonia, indicando que os respondentes
não conheciam o significado do termo zoonoses,
aspecto que dificultaria a implantação de programas de controle destas doenças na população. Hepatite, diabete, sarampo, gastrite e
leucemia não foram assinalados.
Do total dos entrevistados 83,3% mencionaram leptospirose como de importância em ter-
mos de saúde pública, justificando pela relação
da mesma com o rato e com o acúmulo de lixo e
enchentes. Um dos respondentes justificou sua
resposta dizendo: “população desinformada, necessidade de ações para o controle”.
A leptospirose é uma doença bacteriana
comumente associada ao rato, no entanto, outros mamíferos, inclusive silvestres e domésticos
podem transmiti-la ao ser humano, incluindo os
animais de companhia. Conforme o Ministério
da Saúde, os agentes causadores da leptospirose,
as bactérias do gênero Leptospira, estão presentes na urina dos bovinos, suínos e cães, que podem adoecer e transmitir a doença ao ser humano, se tornando de grande valor em termos
de Saúde Pública (BRASIL, 2007).
A raiva, por sua vez, foi assinalada por 66,7%
do total dos entrevistados, sendo que a maioria
justificou pelo fato de ser transmitida pelo “melhor amigo do homem”, relacionando mais uma
vez com animais domésticos.
Em terceiro lugar ficou a pediculose e a sarna, mencionada por 41,7% do total dos entrevistados, com a justificativa de afetar crianças e
poder acarretar outras doenças, com os entrevistados alertando para as questões de higiene
básica familiar.
A toxoplasmose foi mencionada por dois entrevistados, relacionando-a corretamente aos “problemas em mulheres grávidas” ocorridos pela “precária
informação [da população]...”, e pelo fato “das pessoas poderem estar infectadas e não saberem”.
Ao serem questionados a respeito do que
entendiam por zoonoses, 41,7% do total afirmaram ser uma doença transmitida por animais, e
16,7% relacionaram a questão aos parasitas.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
153
Confrontando as respostas às questões abertas com as respostas às questões fechadas, verifica-se nitidamente que os mestrandos conheciam as doenças e também os seus meios de controle, conseguindo identificar as suas causas e
detalhando as suas conseqüências fundamentais, apresentando apenas dificuldades em conhecer o termo zoonoses e não das questões
importantes em relação ao tema.
Na questão relativa às abordagens das
zoonoses em nosso modelo de ensino, houve uma
maciça concordância de que há desconhecimento da questão pela comunidade, e que isto se
deve ao fato da escola não enfatizar este conteúdo em suas aulas e nos programas direcionados
à população.
Um indivíduo chegou a afirmar: “Sou professor há 15 anos e nunca ouvi tratar do tema
no ambiente escolar”. O problema estaria, segundo os mestrandos, principalmente na falta
de atitude dos professores em abordar o tema, já
que os mesmos estão em contato direto com seus
respectivos alunos. Também foi mencionada a
importância da mídia na divulgação da importância das zoonoses, por meio da produção de
programas que possam atingir grande parte da
população.
Depreende-se das respostas, que a atuação
da comunicação de massa deveria ser mais efetiva, com informações mais claras, tal como realizado com relação a dengue que, sem as inserções diárias na programação televisiva seria quase que desconhecida da população.
Um dos entrevistados argumentou que o tema...
“...deveria ser tratado com maior importância, desde as séries primárias até a formação do 3° grau”,
“...falta uma reformulação do currículo...”.
154
Análise Comparativa
Com base nos resultados encontrados, verifica-se que alguns entrevistados conheciam o
tema em relação ao fato de haver doenças que
podem ser transmitidas pelos animais, embora
muitos desconhecessem o termo zoonoses.
Houve concordância em relação a necessidade de tratar da questão na sociedade contemporânea, especialmente em programas de
Educação para a Saúde na escola.
Verifica-se que os temas mais freqüentemente
abordados pela mídia eram conhecidos pela maioria dos sujeitos pesquisados, destacando-se a
leptospirose, além das tradicionalmente conhecidas
raiva e sarna, sendo a primeira pelas histórias a respeito da captura de cães nas nossas cidades e pelas
campanhas de vacinação, e a segunda em virtude
das considerações sobre os cães de rua “sarnentos”
como popularmente são chamados os animais que
apresentam qualquer problema dermatológico.
As respostas dos entrevistados de diferentes
níveis de ensino também podem ser associadas
às narrativas históricas em relação ao perigo dos
cães à saúde humana, por conhecerem o papel
das “carrocinhas” cujas cenas dramáticas pertencem ao cenário urbano das últimas décadas.
O cão pode estar associado a diferentes zoonoses,
entretanto, a cena do cão babando de raiva está
marcada nas histórias que ouvimos a respeito
dos mesmos, o que leva tantos proprietários a
vacinarem seus cães contra a raiva, inclusive
proprietários que pouco interagem com eles, mas
que, no entanto, deixam de vacina-los contra
outras doenças (DAL-FARRA, 2003).
De forma ampla, os respondentes graduandos
e principalmente os mestrandos, entendem que
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
quando falamos de higiene e saúde, surge um
grande desafio para nossa educação, necessitando de uma efetiva transformação nos hábitos das
pessoas. Somente informar não é o suficiente, é
necessário conscientizar e educar, demonstrando através de atividades concretas como este
processo ocorre, para que a população desenvolva hábitos e conceitos relevantes para a sua
saúde. Há uma necessidade de implantação de
Programas de Educação voltados para saúde,
uma vez que os próprios entrevistados afirmam
ser um assunto de elevada importância a ser tratado nas escolas devido ao desconhecimento a
respeito das zoonoses na população.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Entende-se que todo conhecimento adquirido se ancora no conhecimento prévio das pessoas, e que para isto, é necessário trabalharmos
a população dentro do seu contexto, buscando
na educação o ponto chave para disseminação
e conscientização dos problemas relacionados à
cada região.
Ao melhorarmos as condições de vida das
pessoas, no que tange ao saneamento básico e
as condições de higiene de produção, distribuição e preparo de alimentos, acompanhados de
uma maior acesso a informações por parte das
pessoas, estaremos contribuindo decisivamente
para a minimização dos problemas relativos à
saúde, e este processo não pode prescindir das
abordagens a respeitos das doenças como as
zoonoses dentro do Ensino de Ciências, por ser
um lugar de destaque para abordar questões
desta natureza, ampliando o debate a respeito
da saúde pública na comunidade.
Por meio de Programas de Educação para a
Saúde, e da implementação de atividades que
abordem o tema zoonozes nas escolas, tanto no
Ensino Fundamental como no Ensino Médio, tornar-se-á factível a implantação de programas de
erradicação destas doenças no país, pois, como
todo processo coletivo, a realização de ações na
comunidade deve ocorrer pela inclusão e participação de todos para que tenham êxito.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, P. L.; MARTINS, S. L.; BROD,
S. C. Fatores de risco associados à presença
de anti-corpos antileptospira em trabalhadores do Serviço de Saneamento Ambiental.
Ciência Rural, Santa Maria, v.29, n. 3, p.511
–516, 1999
BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa:
Edições 70, 2006.
BLOOD, D. C.; RADOSTITS, O. M.;
ARUNDEL, J. H. Clínica Veterinária. 6. ed.
São Paulo: Roca, 1991.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais : Ciências Naturais / Ensino de Quinta a Oitava Série..Brasília: MEC/SEF, 1998. 138p.
BRASIL. Ministério da Saúde. Tópicos de
Saúde – Leptospirose. Disponível em
<http://portal.saude.gov.br/portal/svs/
visualizar_texto.cfm?idtxt=21734> Acesso
em 05/06/2007.
DAL-FARRA, R. A. Representações de
animal na contemporaneidade: uma análise na mídia impressa. 2003. 320f. Tese (Dou-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
155
torado em Educação) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2003.
GOMES, A . et al. O que são zoonoses e
quais as mais comuns? Disponível em: http:/
/ w w w. c n p g c . e m b r a p a . b r / t e c n o l o g i a s /
quersabermais/500p/autores4.html. 1998.
Acesso em: 20/07/2007.
MOHR, Adriana; SCHALL, Virginia T.
Rumos da educação em saúde no Brasil em
sua relação com a educação ambiental. Cadernos de Saúde Publica v.8, n.2, 1992.
NETTO, F. F. Programa Nacional de Controle e Erradicação da Brucelose e Tuber-
156
culose Animal (PNCEBT). 2003. Disponível em: http://www.paginarural.com.br/
artigos_detalhes.asp?subcategoriaid=19&id=730.
Acesso em: 25/07/2007.
RIO GRANDE DO SUL. Secretaria da Saúde. Notícias. Disponível em <http://
w w w. s a u d e . r s . g o v. b r / w s a / p o r t a l /
index.jsp?menu=noticias&cod=1708>.
Acesso em 14/07/2007.
VASCONCELLOS, Silvio Arruda. Zoonoses
- Conceito. Disponível em: <http://
w w w. c e v i s a . i b i u n a . s p . g o v. b r /
Arquivos%20para%20baixar/
zoonosesconceito.pdf>. Acesso em: 11/07/2007.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Cultura e processos de socialização na produção
das infâncias de classes populares
FERNANDA NOGUEIRA1
JOÃO PAULO POOLI2
MÁRCIA ROSA DA COSTA3
RESUMO
Este artigo apresenta resultados parciais de uma investigação sobre a infância a partir de referenciais teóricos
da Sociologia, considerando a criança como produtora de sistemas de significações próprios em suas representações do mundo, estando esses sistemas intimamente relacionados a suas vivências culturais. O objetivo da
pesquisa é analisar os processos configuracionais em que estão envolvidas as crianças e suas infâncias nas classes
populares. Os dados empíricos são de atividades de pesquisa realizada em um centro infantil localizado na
periferia urbana da cidade de Porto Alegre/RS. Através deste estudo pretende-se contribuir, de forma qualitativa, na formação dos docentes que trabalham na educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental.
Palavras-chave: infância, socialização, cultura, formação docente.
ABSTRACT
This article presents partials results of an investigation, based in sociological theories, about childhood
that consider child an own significations systems producer in his world’s representations, been there strongly
Acadêmica do Curso de Pedagogia/ULBRA, Bolsista
PROICT/ULBRA
1
2
do PPG em Educação/ULBRA ([email protected])
3
Professora do Curso de Pedagogia/ULBRA
Professor - Orientador do Curso de Pedagogia/ ULBRA e
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
157
connected at his culture’s experiences. The investigation’s objective is analyses the configurationally process
that the children and their childhoods are involved in popular classes. The empiric dados come from
investigations’ actives realized in a childish center of urban periphery of Porto Alegre/RS city. This study
pretends to contribute qualitatively in the teaching formation of childhood and basic school firsts levels
educational professionals.
Keywords: childhood, socialization, culture, teaching formation.
INTRODUÇÃO
A investigação no campo dos estudos culturais sobre a infância vem sendo desenvolvida
pelo grupo de pesquisa “Escola, Docência e Identidade” desde o ano de 2005, estando agora em
sua terceira etapa. O foco central das investigações anteriores foi o estudo das concepções
de infância e crianças nos meios escolares (professores, pais e crianças). A partir de seus resultados, verificou-se a importância de ampliação
da temática e a necessidade de aprofundamento
e produção de conhecimentos no campo da Sociologia da Infância no nosso país.
O principal objetivo da pesquisa foi analisar
os processos configuracionais em que estão envolvidas as crianças e suas infâncias nas classes
populares, investigando as culturas que se expressam no fluxo das vidas dessa população. Pretendeu-se, ademais, analisar as configurações
da infância através da produção de significados
nos seus mais diversos contextos e o processo de
socialização das crianças.
A infância e suas concepções foram historicamente construídas dentro do marco das configurações sociais, que estão vinculadas às suas
circunstâncias históricas e, portanto, profundamente marcadas pelas culturas que engendram
visões de mundo específicas. É a partir dessa
perspectiva, e inseridos nos contextos históricos,
158
que podemos circunscrever a infância como objeto de pesquisa, tornando-a visível, observável,
categorizável e possível de ser compreendida em
todas as suas dimensões.
Se passamos a investigar sociologicamente
a infância agregando novos conhecimentos aos
já empreendidos por outras áreas de pesquisa
como, por exemplo, os estudos históricos de
Philippe Áries, não podemos analisar essa categoria como produto puro da descrição de
uma dada realidade empírica. A construção
desta categoria social deve levar em conta
principalmente os elementos culturais que se
impõem e atravessam a sua constituição. A
infância é ao mesmo tempo construída pela
polifonia das determinações sociais (representações, códigos, regramentos, rituais, religiosidade, gênero, classe social etc.) assim como
pela autonomia da produção cultural específica que continuamente vai sendo desenhada
pela vida cotidiana (as brincadeiras e os brinquedos, os jogos, a utilização do espaço e do
tempo, a interpretação própria do mundo, as
relações de poder etc).
A partir disto, podemos supor que as configurações das infâncias são também estabelecidas
neste mundo de possibilidades pelas suas formas
de inserção social. Dentro desta perspectiva
adotamos os seguintes posicionamentos
conceituais:
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
·
·
a criança como um sujeito social, produtora de culturas e com participação no
jogo de construção dos fatos sociais, sendo importante respeitá-la e considerar seu
universo de representações, com reconhecimento de seus direitos e possibilidade
de participação social.
a infância como uma categoria social,
construída a partir da interação da criança com os diferentes contextos de socialização e desenvolvimento (família, escola, meios de comunicação, grupos de
iguais...), não se restringindo a um conceito único e fechado. A infância deve
ser considerada uma condição do ser criança, sendo importante respeitá-la, pois
é um sujeito participante das relações sociais, fazendo parte de um processo histórico, social, e cultural.
nição durkheiniana, considerando a infância e
a própria criança “um simples objeto passivo de
uma socialização regida por instituições”. O rompimento desta perspectiva faz surgir os primeiros elementos de uma sociologia da infância.
É a utilização destes elementos de análise da
infância, considerando-a como uma categoria
dentro do campo sociológico, que levou vários
pesquisadores a instituírem no Congresso Mundial de Sociologia, ocorrido em 1990, a corrente
da Sociologia da Infância. Neste encontro foram
debatidos vários aspectos concernentes ao processo de socialização da criança e à influência
exercida sobre ela pelas instituições e agentes
sociais. Encontramos vários pesquisadores de
diferentes países envolvidos nestes estudos, com
uma bibliografia já mais desenvolvida, principalmente nas línguas inglesa e francesa4 .
Na história da sociologia se encontram poucos registros de preocupações com estudos específicos relacionados à infância, principalmente
no que se refere a formulações teóricas ou
metodológicas que dêem conta deste campo
conceitual. A partir da década de 80, alguns
estudiosos começaram a apresentar esforços, no
sentido de configurar os estudos sobre as crianças e a infância como um campo da sociologia.
De acordo com Sirota (2001, p.9), a sociologia
durante longo tempo esteve circunscrita a defi-
Interessa destacar neste trabalho principalmente algumas das contribuições dadas por este
campo no que se refere aos estudos sobre a cultura e sobre a infância. Um dos princípios básicos assumidos pelos autores da sociologia da infância têm sido o de realizar um aprofundamento
das análises a partir de estudos investigativos,
principalmente de base etnográfica, tendo como
elemento as falas das crianças para verificar o
que estas apontam sobre sua cultura e mundo
social. Segundo M. J. Sarmento e M. Pinto, pesquisadores do Instituto de Estudos da Criança,
Vários pesquisadores reconhecidos internacionalmente têm
contribuído através de suas obras neste campo de estudos,
dentre eles pode-se destacar: Willian A. Corsaro (Indiana
University, Bloomington), Jens Qvortup (Norwegian Centre
for Child Research, Norway), Cléopâtre Montandon (Faculté
de psychologie et des sciences de l’éducation Université de
Genève), Régine Sirota (Université Paris V – France), Manuel
Jacinto Sarmento (Instituto de Estudos da Criança - Universi-
dade do Minho – Portugal), Allison James (School of
Comparative and Applied Social Sciences, University of Hull),
Alan Prout (Stirling University, GB), Pia Christensen (School of
Comparative and Applied Social Sciences, University of Hull),
Chris Jenks (Goldsmiths College, London). Maiores informações sobre estes estudos podem ser encontradas nos artigos de Sirota e Montandon, publicados na língua portuguesa pelos Cadernos de Pesquisa, n. 112.
4
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
159
da Universidade do Minho, Portugal, as falas
das crianças são elementos fundamentais para a
compreensão das culturas infantis. Para estes
sociólogos a infância é uma categoria social e,
ao constituir-se como objeto de pesquisa, deve
ser merecedora de todo cuidado e atenção no
que diz respeito às metodologias a serem
adotadas, assim como com qualquer outra categoria de pesquisa sociológica. De acordo com
Sarmento (2004):
O conceito de “culturas da infância” tem
vindo a ser estabelecido consistentemente pela Sociologia da Infância como um
elemento distintivo da categoria
geracional. Por esse conceito entende-se
a capacidade das crianças em construírem de forma sistematizada modos de significação do mundo e de ação intencional, que são distintos dos modos adultos
de significação e ação.
Este conceito e perspectiva podem ser relacionados às importantes contribuições de S. Hall
(1997) no que se refere à compreensão da
centralidade da cultura em tempos de pósmodernidade, assegurando que toda ação social é “cultural” e que todas as práticas sociais
expressam ou comunicam um significado e, neste sentido, são práticas de significação, o que
guardar relação direta ao pensarmos o estudo
dos processos de ressignificação da infância a
partir dos significados conferidos pelas próprias
crianças às suas práticas culturais.
Como indivíduos convivendo em uma sociedade, as crianças têm seu papel, estando inseridas
em uma diversidade cultural, sendo constituídas
e constituintes da cultura. Sarmento (2003) ainda afirma que “Estudos sociológicos da infância
têm sustentado a autonomia das formas culturais
160
da infância (Denzin, 1977; CORSARO,1997;
JAMES, JENKS e PROUT, 1998; PROUT,
2000).” Essas formas culturais radicam e desenvolvem-se em modos específicos de comunicação intrageracional e intergeracional.
Para Sarmento (2004) as culturas da infância
expressam a cultura societal em que se inserem,
porém de forma diferente das culturas encontradas nas relações adultas, pois trazem ao mesmo tempo formas especificamente infantis de
compreensão, representação e simbolização do
mundo. Para o autor existe uma universalidade
das culturas infantis que ultrapassa consideravelmente os limites da inserção cultural local de
cada criança, já que estas constroem, nas suas
relações, ordens sociais instituintes que regem as
relações de conflito e de cooperação, traduzindo questões relacionadas à classe social, etnia,
gênero e cultura que cada uma integra.
Assim, se pode concluir que a escuta das
vivências e das experiências das crianças possibilita a compreensão dos significados dados às
hierarquizações constituídas nas diferentes instituições e papéis sociais. De acordo com Elias (1994)
as mudanças de conduta que vão se operando através dos tempos, não têm um planejamento racionalmente organizado em etapas previamente elaboradas a serem aplicadas a longo prazo; assim a
família, a escola e todos os espaços por onde a criança circula são formadores do sujeito em relação
à configuração social, constituindo-se agências
civilizadoras. Segundo o mesmo autor, a sociabilidade inerente aos seres humanos só se evidencia
quando se tem presente o que significam as relações com outras pessoas para a criança pequena.
Neste sentido, a busca dos significados dados pelas crianças às diferentes ações sociais possibilita
que possamos compreender e trazer para análise
as nossas próprias culturas.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Para Florestan Fernandes (1994), as diferentes formas de socialização e as relações
estabelecidas nos espaços urbanos determinam as
culturas infantis. Este sociólogo brasileiro traz uma
contribuição importante ao estudo da temática
cultura e infância, por ter sido pioneiro, no Brasil,
ao tratar esta questão através da pesquisa realizada sobre o folclore na cidade de São Paulo, onde
observou as crianças brincando e a constituição
e importância da cultura infantil. Segundo Mazza
(2000), Fernandes reconheceu que o folclore infantil era um dentre outros processos de
integração do indivíduo aos padrões grupais, mas
retomou conceitos importantes da sociologia, ao
dar maior atenção para o aspecto da socialização
elaborado no interior dos grupos infantis.
No entanto, as mudanças de conduta que vão
se operando através dos tempos, não têm um planejamento racionalmente organizado em etapas
previamente elaboradas a serem aplicadas a longo prazo; assim a família, a escola e todos os espaços por onde a criança circula são formadores do
sujeito em relação à configuração social, constituindo-se agências civilizadoras (ELIAS, 1994,
p.30). Dessa forma, a escola passa a ser um local
de destaque. Se a escola é na atualidade o local
onde as crianças passam a maior parte do tempo,
existem culturas infantis sendo produzidas? Quais
os processos de socialização, de padrões grupais
que se têm gestado dentro do espaço urbano? A
referência da pesquisa de Fernandes (1994) é
porque descreve os estudos sobre folclore com
crianças na cidade de São Paulo, quando desenvolveu minuciosa análise dos dados empíricos
registrados, dizendo da importância de “interrogálos” e ter um indispensável domínio teórico da
situação investigada.
A relação que a criança estabelece com o
mundo urbano e os significados que confere às
diferentes práticas sociais constitui-se elemento de análise sociológica e cultural. Com base
no pensamento de Elias (1993, p.195) podemos
afirmar que o mundo urbano instaurou e continua instaurando redes de relacionamento que
exigem determinados comportamentos de todos
e de cada um como formas de inserção em sua
lógica civilizadora, pois, segundo ele, quando
as redes de relações se estabelecem, os papéis a
serem desempenhados pelos indivíduos tornamse mais definidos, intensificando-se as cadeias
de interdependência social e ocorrendo mudanças dos comportamentos.
Na configuração das cadeias de
interdependência social e nos comportamentos
assumidos pelos diferentes atores sociais, podemos afirmar que as identidades sociais destes
atores se constituem através da cultura. De acordo com Hall (1997), a cultura tem assumido uma
crescente centralidade nos processos globais de
formação e mudança, assim como de penetração na vida cotidiana, tendo um papel
constitutivo na formação das identidades e subjetividades. Dessa forma é que se torna pertinente questionarmos que culturas infantis se
apresentam na atual sociedade urbana.
O processo de socialização dos indivíduos tem
sido estudado, analisado e utilizado no meio
educacional a partir de diversos autores, mas
todos provenientes da área da psicologia. Por isso
a presente investigação considera como principal referencial teórico a obra de Norbert Elias.
Em seu principal livro, O Processo civilizador,
publicado em 1939, mostra através de um estudo e análise sociológica, do século XVI ao XX,
como o homem chegou a ser o que é, assim como
as modificações no comportamento e sensibilidade, os modos de relacionamento entre os homens e a constituição do Estado. A obra de Elias
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
161
é merecedora de estudos aprofundados, pois
aponta para uma série de análises e conexões
necessárias ao campo da educação e do processo de socialização. Segundo o autor (1980, p.13)
não é possível falarmos do indivíduo, da criança
e da família, do indivíduo e da sociedade ou do
sujeito e do objeto, sem termos claramente presente que o indivíduo faz parte de seu ambiente
e de todas essas instâncias socializadoras, sendo
indissociáveis relacionalmente, “a sociedade
muitas vezes colocada em oposição ao indivíduo, é inteiramente formada por indivíduos, sendo nós próprios um ser entre os outros”.
A família é uma instituição social, assim como
a escola, ambas se constituindo agências
civilizadoras. Para Elias não existem atitudes
naturais do homem; elas são assimiladas através
da educação social. As mudanças de conduta
que vão se operando através dos tempos, não
têm um planejamento racional, organizado em
etapas previamente elaboradas a serem aplicadas a longo prazo; a educação e a escola são as
formadoras do sujeito em relação à configuração social. Para Elias (1994, p.30) somente com
base no diálogo instintivo contínuo com outras
pessoas é que os impulsos elementares e informes da criança pequena tomam uma direção
mais definida, assumem uma estrutura mais clara. A criança precisa ser adaptada pelo outro, precisa da sociedade para se tornar fisicamente adulta.
Dessa forma é possível afirmar que as mudanças e características da sociedade interferem diretamente no desenvolvimento das crianças. Tudo e todos com os quais a criança convive, cada membro da família, cada adulto e
criança com a qual interage, favorecem o processo socializador. No entanto, conforme Pooli
(2001, p. 102) a escola já concebe o aluno como
162
“um sujeito “civilizado” pelo menos nos comportamentos mínimos, e põe em marcha todo um
processo de transmissão e produção do conhecimento organizado e catalogado como um conjunto de verdades a serem processadas no decurso de pelo menos 17 anos”.
Para Elias (1993), os homens somente conseguem experienciar-se a si próprios enquanto indivíduos que se distinguem uns dos outros porque vivem em associações. Portanto, quanto mais
vivenciarem essas interações, melhor compreenderão suas vidas como uma unidade complexa.
A escola, como instituição que surge basicamente para desenvolver esse processo socializador,
adota práticas curriculares caracterizadas pelos
conteúdos e formas de organização e relações
estabelecidas no seu interior, leva as crianças progressivamente, às idéias, concepções, disposições e
modos de conduta que a sociedade adulta requer.
De acordo com Gómez (1998, p. 15):
A segunda função do processo de socialização na escola é a formação do cidadão/
ã para sua intervenção na vida pública.
A escola deve prepará-los para que se incorporem à vida adulta e pública, de modo
que se possa manter a dinâmica e o equilíbrio nas instituições.
Esta afirmação poderia ser questionada no
aspecto relacionado à preparação das crianças
para a vida adulta futura. Pensamos que a escola
deve atender às condições, necessidades, direitos e situações vivenciadas pela criança a cada
momento de sua vida. Lefebvre (1997, p.72) ainda dirá que o ser humano possui necessidades
diversas, muitas das quais de convivência e
interação e que ”a casa, a morada, a residência e
o apartamento, a vizinhança, o bairro, a cidade,
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
a aglomeração, satisfizeram, ainda satisfazem, ou
não satisfazem mais a alguns desses apelos”.
Uma educação que possibilita a participação
e o diálogo com as crianças em todo o processo
já se constitui por si só em um exercício para a
cidadania. A partir destes pressupostos, a forma
como a escola participa do processo de socialização e inserção da criança no mundo social, se
constitui em uma questão-chave a ser analisada para uma melhor compreensão deste tema.
METODOLOGIA
A Etapa 2007 da pesquisa foi realizada em
uma escola de educação infantil de periferia
urbana da cidade de Porto Alegre. Os dados
foram levantados através de trabalho de observação participante em uma turma composta de
30 crianças, na faixa etária de 5 anos. As observações foram registradas através de gravações e
fotografias e as análises buscaram verificar como
as crianças estabelecem as relações entre si e
configuram os processos de socialização.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As observações empíricas realizadas junto ao
grupo de crianças, ocorrida na etapa 2007 da
pesquisa, evidenciaram conclusões parciais relevantes, as quais se referem principalmente às
configurações que se apresentaram nas atividades cotidianas da escola infantil. Esses resultados são indícios significativos da
“permeabilidade” cultural que atravessa o espaço educativo e a vida das crianças. Nesse contexto destacamos que:
A sala de aula é um abrangente espaço de
interações culturais e, por essa razão, a proposição de momentos livres de interação entre as
crianças é muito significativa. Entretanto, muitas vezes esses espaços são reduzidos a rotinas
de atividades pré-estabelecidas e padronizadas
propostas pelas educadoras (atividades
dirigidas). No transcorrer dessas atividades é
evidente o esforço investido pelas crianças na
tentativa de conquistar espaços livres de
interação (mudam as regras ou não se envolvem nas brincadeiras dirigidas, preferindo ficar
conversando). Na perspectiva de Elias (1993)
os homens somente conseguem experienciar-se
a si próprios como indivíduos que se distinguem
uns dos outros porque vivem em associações.
Quanto mais vivenciam essas interações melhor
compreenderão suas vidas. Além disso, os diálogos e brincadeiras livres expressaram a riqueza de representações próprias de mundo que as
crianças trazem para escola.
As crianças de classes populares
investigadas, neste campo de pesquisa, levam
para dentro da instituição que freqüentam, aquilo que comumente denominamos de cultura
popular. A produção de significados que configuram visões de mundo específicas e dizem respeito ao modo de representar, imaginar e “ler” o
mundo, são processadas por um pluralismo cultural que conjuga a cultura local (entendida
como uma cultura estética, alimentar, de moda,
de estilo, de relações de vizinhança, de sexualidade, de intimidade, de arquitetura), a cultura
de massa (cultura musical, das novelas, dos
vídeos) e a cultura midiática, em especial a televisão. Notou-se que a influência dos programas televisivos no cotidiano das crianças é muito representativa. No entanto, entendemos ser
temeroso fazer qualquer vinculação direta en-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
163
tre as mensagens que os programas pretendem
emitir e sua recepção pelos sujeitos da pesquisa.
As crianças chegam à instituição escolar com
um conjunto de saberes sobre a vida. Porém, ainda
é muito presente um posicionamento moralista por
parte das educadoras em face às interpretações que
elas, ao longo do dia, vão realizando sobre as suas
circunstâncias. Não que se realize aí um conflito
entre visões de mundo mas, na realidade, há uma
tentativa de impor às crianças novos significados,
principalmente morais. Neste sentido, pode-se afirmar que a concepção de cultura popular assumida
pelas educadoras no espaço escolar é a que Chartier
(1995, p. 179) define como um modelo específico
de descrição e interpretação: “preocupado em lembrar a existência das relações de dominação que
organizam o mundo social, percebe a cultura popular em suas dependências e carências em relação à
cultura dos dominantes”. Desta forma, a prática de
escuta das crianças pelos educadores é, muitas vezes, meramente uma formalidade pedagogizada do
que uma prática educativa de produção de significados. Em termos gerais, as educadoras levam muito mais em conta a sua interpretação de mundo, o
seu modo de vida, como referência básica da constituição de todos os modos de vida, ensejando juízos
de valor unilaterais.
Embora se possa, em termos amplos, falar de
uma cultura infantil própria, produzida pela criança, fica evidente que essas culturas estão, de
alguma forma, constituídas junto com os adultos. As crianças reconhecem explicitamente
uma diferença entre o mundo adulto e o mundo
da criança, entre coisas que adultos fazem e
coisas que crianças fazem.
Os processos de socialização em que as crianças estão envolvidas reproduzem, em parte, a
cultura vivenciada com sua família, seus cole-
164
gas e seus amigos. Portanto, deve-se ter todo
um cuidado ao definir esse processo como sendo um processo de inclusão. As crianças e suas
infâncias, inegavelmente, já estão incluídas no
mundo social, não sendo a instituição escolar a
responsável direta ou única por este fato.
REFERÊNCIAS
ARIÈS, Philippe. História social da criança e
da família. Rio de Janeiro: Editora LCT, 1981.
ARIÈS, Philippe. Por uma história da vida
privada. IN: CHARTIER, Roger (Org.). História da vida privada: da Renascença ao
Século das Luzes. São Paulo: Companhia das
Letras, 1991.
CADERNOS DE PESQUISA. Sociologia da
Infância: novos enfoques. São Paulo: Fundação Carlos Chagas, n.112, março 2001.
CHARTIER, Roger. “Cultura Popular”.
Revisitando um conceito historiográfico.
Revista Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v.8, n.16, p.179-192, 1995. Disponível em:
< http://www.cpdoc.fgv.br/revista/arq/
172.pdf> Acesso em 29 fev.2008.
COSTA, Márcia Rosa da. Eu também quero falar: um estudo sobre infância, violência
e educação. 2000. Dissertação (Mestrado em
Educação) - Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
Porto Alegre, 2000.
ELIAS. Norbert. A sociedade de corte. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.
ELIAS. Norbert. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1994.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
ELIAS. Norbert. O processo civilizador: formação do estado e civilização. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1993.
ELIAS. Norbert. Introdução à sociologia.
Braga: Edições 70, 1980.
ELIAS. Norbert; SCOTSON, John L. Os estabelecidos e os outsiders. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Editor, 2000.
FERNANDES, Florestan. Ciências Sociais: na
óptica do intelectual militante. Revista Estudos Avançados, Edição comemorativa dos 70
anos da USP, São Paulo, n.22, set/dez 1994. Disponível em: <http://www.usp.br/iea/revista/revista22/fernandes.html> Acesso em 12 out.2002.
GÓMEZ, A. I. Pérez. Compreender e transformar o ensino. Porto Alegre: Artmed, 1998.
GÓMEZ-GRANELL, Carmen; VILA,
Ignácio (Orgs.). A cidade como projeto
educativo. Porto Alegre: Artmed, 2003.
HALL, Stuart. A centralidade da cultura:
notas sobre as revoluções culturais do nosso
tempo. Educação & Realidade, v.22, n.2 jul/
dez 1997. Disponível em: <http://
www.ufrgs.br/neccso/downloadtextos.html>
Acesso em 30 de março de 2004.
T1481427895533> Acesso em: 28 set. 2002.
MONTANDON, Cléopatre. Sociologia da
Infância: balanço dos trabalhos em língua
inglesa. Cadernos de Pesquisa, São Paulo,
n.112, p.33-70,.mar. 2001.
QVORTRUP, Jens. A infância na Europa:
novo campo de pesquisa social. Textos de
Trabalho. N. 1.CEDIC. IEC. Universidade do
Minho, 1999.
SARMENTO, Manuel Jacinto. Imaginário e
culturas da infância. Disponível em: <http:/
/ w w w. i e c . u m i n h o . p t / p r o m a t o / t ex t o s /
ImaCultInfancia.pdf> Acesso em 30 de janeiro de 2004.
SARMENTO, Manuel Jacinto. As culturas da
infância nas encruzilhadas da 2ª Modernidade.
Disponível em: <http://www.iec.uminho.pt/
cedic/TEXTOSdetrabalho/
ENCRUZILHADAS.doc> Acesso em 04 de
abril de 2003.
SIROTA, Régine. Emergência de uma sociologia da infância: evolução do objeto e do
olhar. Cadernos de Pesquisa, São Paulo,
n.112, p.7-31, mar. 2001.
LEFEBVRE, Henri. A revolução urbana.
Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1999.
POOLI, João Paulo. Decifra-me ou te devoro: a excelência do objeto pela construção
do argumento. Educação e Realidade, Porto Alegre, v. 23, n.2, p.95-108, jul/dez.1998.
MAZZA, Débora. A leitura sociológica do
folclore: a contribuição de Florestan
Fernandes. In: REUNIÃO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISA EM
EDUCAÇÃO, 23., 2000, Caxambu. Disponível em: <http://www.anped.org.br/24/
POOLI, João Paulo. Quando “um outro” se
torna “muitos outros”: da família à escola, a
complexidade da descoberta do mundo social.
In: ROMAN, Eurilda Dias; STEYER, Vivian
Edite. A criança de 0 a 7 anos: um retrato
multifacetado. Canoas: Ed. ULBRA, 2001.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
165
166
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
O professor como objeto de poder e de saber:
problematizações sobre a formação docente*
LARISSE KATIELE VARGAS DA COSTA1
LUÍS HENRIQUE SOMMER2
RESUMO
Este artigo discute o modelo de professor produzido pelo discurso da obra Construção do conhecimento em sala de aula, de Celso Vasconcelos, literatura fartamente utilizada em cursos de formação de
professores. A perspectiva teórica alicerça-se no pensamento de Michel Foucault. O método de análise
destaca as regularidades discursivas presentes no texto, demonstrando o modelo de professor construído
pela trama discursiva e sua associação a um determinado modelo de escola, com funções sociais específicas. Na obra em foco, percebe-se uma tentativa da síntese entre discursos político-pedagógicos e discursos psicopedagógicos, ou seja, um trabalho de harmonização entre o sujeito crítico-transformador das
pedagogias críticas e o sujeito psicológico das pedagogias cognitivistas.
Palavras-chave: Formação de professores, análise de discurso, Michel Foucault.
ABSTRACT
This paper discuss the model of teacher produced by the discourse on Celso Vasconcelos’ book, Construção do conhecimento em sala de aula, widely used in teacher’s education. The theoretical perspective
* Este estudo é resultado do Projeto de Pesquisa Processos de Fabricação da Docência e da Escola na
Contemporaneidade, em realização no PPGEDU/ULBRA
Acadêmica do Curso de Pedagogia – Bolsista PROICT/ULBRA
1
Professor-orientador do Curso de Pedagogia e do PPG
em Educação/ULBRA ([email protected])
2
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
167
is based on Michel Foucault’s works. The method of analysis highlights discoursive regularities in the text,
showing the model of teacher produced by an array of discourses and its association with a specific model
of school, with specific social functions. In the book focused, there is an attempt of synthesis between
political-pedagogy discourse and psychopedagogics discourse, that is, an effort to harmonize the criticaltransformation subject of critical pedagogies and the psichologycal subject of the cognitivism pedagogies.
Keywords: teacher’s education, discourse analysis, Michel Foucault.
INTRODUÇÃO
O campo de pesquisa sobre formação de professores no Brasil tem se caracterizado por uma
grande e sistemática produção, estruturada a
partir de diferentes enfoques teóricos e eixos
temáticos. Sob o rótulo formação de professores
encontram-se trabalhos que tematizam formação inicial, formação continuada, identidade e
profissionalização docente, prática pedagógica.
Em cada um desses eixos emergem discussões
que vão desde condições de trabalho e remuneração, passando por políticas educacionais e
relações de gênero, até a descrição e análise do
professor da educação fundamental. Um inventário mais preciso das pesquisas desenvolvidas
neste campo pode ser encontrado no artigo Estado da arte da formação de professores no Brasil
(ANDRÉ et al., 1999). Nesse artigo, as autoras
destacam que nos periódicos científicos brasileiros os textos têm sido marcados por uma extrema ideologização e politização “abrangendo
aspectos amplos e variados da formação docente, definindo concepções, práticas e políticas de
formação” (ANDRÉ et al., 1999, p. 306-307).
Por outro lado, nas teses e dissertações examinadas a preocupação é “com temas e conteúdos
bem específicos, de natureza técnico-pedagógica, deixando em aberto questões mais
abrangentes sobre ações e sobre políticas de formação” (ANDRÉ et al., 1999, p. 307). Em co-
168
mum, essa ampla e diferenciada produção busca sustentação teórica na perspectiva dialética,
o que nos permite afirmar que são investigações
feitas desde o interior do dispositivo das utopias
educativas (NARODOWSKI, 1999), que historicamente tem sido talvez o principal mecanismo regulatório do discurso pedagógico e, por
extensão, das práticas pedagógicas postas em ato
na educação escolarizada.
A pesquisa que originou este artigo se centra
no exame de um conjunto de livros que vem
sendo tomado como referência na formação de
professores a partir dos anos 1990. Especificamente neste texto, temos como objetivo demonstrar e analisar o modelo de professor produzido
pelo discurso da obra Construção do conhecimento
em sala de aula, de Celso Vasconcelos. Esse livro, cuja primeira edição data de 1993, se encontra na 16ª edição e é fartamente utilizado
em cursos de formação de professores. A referida pesquisa se ancora em uma perspectiva pósestruturalista de análise, o que pressupõe não
tomar o sujeito como um a priori transcendental,
a exemplo das chamadas filosofias da consciência que estão na base do pensamento pedagógico da modernidade. Nesse sentido, a um só tempo, abre mão de assertivas sobre quem é o professor e de prescrições acerca de como o professor deve se portar no cotidiano da docência contemporânea. A lógica da investigação, e deste
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
texto em particular, parte da tentativa de se
colocar em relevo alguns dos complexos processos e estratégias que confluem na produção do
docente em nossa época. Assim, se trata de
empreender uma discussão ancorada na análise
de práticas discursivas que estariam implicadas
na fabricação das subjetividades docentes em
nosso presente. A perspectiva assumida na investigação tem sido compartilhada mais recentemente por diversos pesquisadores brasileiros e
estrangeiros (NARODOWSKI, 1994 e 1999;
LARROSA, 1995; PALAMIDESSI, 1996;
POPKEWITZ, 1998; GVIRTZ, 1999; GARCIA,
2000; Ó, 2006).
De forma especial, nos servimos da teorização
de Michel Foucault, sobretudo da produção tardia desenvolvida no eixo da ética da genealogia
histórica do sujeito moderno empreendida pelo
filósofo francês. Mais precisamente, interessa-nos
pôr em relevo diferentes estratégias/mecanismos
de fabricação da docência na contemporaneidade.
Os estudos de Michel Foucault (1990; 1993; 1995;
1996; 1998a; 1998b, 1999) nos oferecem preciosos
insights acerca da produção de sujeitos
autogovernados, seja ao nível das instituições disciplinares, nas quais são postas em ato tecnologias
de dominação de uns sobre outros, até o nível
das relações consigo, das tecnologias do eu, que
consistem em procedimentos através dos quais o
indivíduo, agindo sobre si mesmo, se autoconstitui
como sujeito de um certo tipo. Nessa última direção, a démarche foucaultiana, aqui assumida,
permite inquirir acerca dos complexos processos
de fabricação do professor e da escola contemporâneos, colocando em relevo certos textos que,
nesse registro, medeiam a relação de cada um
consigo mesmo. Ao mesmo tempo, a pesquisa
desenvolvida nesse registro teórico pretende es-
tar atenta às estratégias de resistência a formas
estandardizadas que a docência assume em nosso presente, aos modos de individualização que
nos têm sido impostos na contemporaneidade.
MATERIAL E MÉTODOS
Como já referimos, neste estudo está em análise o livro de Celso Vasconcelos Construção do conhecimento em sala de aula. O método utilizado,
que entendemos estar em perfeita harmonia com
as investigações foucaultianas, consistiu em destacar as regularidades discursivas da obra, de modo
a extrair o modelo de docência tecido na trama
do texto. Nesse sentido, a preocupação foi com
uma leitura atenta da obra, de modo a levar adiante uma análise discursiva que tomasse os enunciados sobre o professor na sua qualidade de ditos,
sem perguntarmos por quaisquer possíveis sentidos ocultos, ou por uma suposta ideologia
subjacente ao discurso. Noutros termos, operamos
sobre a superfície do texto, sem buscar um suposto
significado subjacente à sua materialidade. Os
enunciados do texto ganham sentidos a partir de
sua exterioridade e não a partir de sua lógica interna. Assim, se trata de “estabelecer as relações
entre esses enunciados e aquilo que eles descrevem” (VEIGA-NETO, 1996, p. 185).
Para facilitar a extração dos enunciados sobre a docência e, ao mesmo tempo, garantir uma
maior fidedignidade dos dados, criamos uma ficha onde dispusemos os excertos da obra que se
referiam explicitamente ao professor. Tal modo
de organização facilitou sobremaneira a identificação das regularidades discursivas e a
detecção dos campos discursivos dos quais tais
enunciados provinham.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
169
DISCUSSÃO
É importante destacar que, via de regra, a
literatura identificada como própria do campo
formação de professores, se alicerça em uma crítica radical ao chamado modelo de educação
tradicional. Invariavelmente ela enuncia os aspectos considerados negativos e, em tese, responsáveis pela crise da escola. Na obra analisada o autor, seguindo essa lógica, reduz a aula
expositiva à transmissão, aponta seus pressupostos epistemológicos (empirismo), justifica sua
presença pelo fato de esse modelo estar na base
da formação dos professores atuais, procura demonstrar sua falta de significado para os alunos
e seus postulados perversos efeitos sociais.
Além disso, Vasconcelos passa em revista,
muito rapidamente, a tradição escolanovista, de
modo a demonstrar as diferenças e similitudes
com o modelo anterior. Nesse último aspecto, é
interessante destacar que o ponto de contato
entre escola tradicional e escola nova é, para o
autor, a incapacidade de uma e de outra
oportunizarem a transformação da realidade.
Noutros termos a classificação dos dois modelos
como pedagogias liberais, tem o poder de
enfraquecê-los na medida em que estariam comprometidos com a manutenção do caráter seletivo e excludente de nossas escolas. Assim, utilizando-se de uma retórica bastante contundente, o autor lança mão da lógica dialética, o que
justifica a necessidade de superação dos modelos anteriores e, desta forma, abre condições para
apresentar um novo modelo de educação, por
ele chamado de Metodologia Dialética de Construção do Conhecimento em Sala de Aula.
Olhando de forma mais atenta, na obra em
foco percebe-se, em primeiro lugar, uma tenta-
170
tiva da síntese entre o que vamos chamar aqui
de discurso político-pedagógico e discurso
psicopedagógico (Ó, 2006). Em outras palavras,
o autor busca permanentemente harmonizar o
sujeito crítico-transformador das pedagogias críticas e o sujeito psicológico das pedagogias
cognitivistas. São evidências desta tentativa de
harmonização, afirmações categóricas sobre
como o professor deve ser; sobre sua função social; sobre seu papel em ajudar os alunos a entenderem a realidade, aliadas a enunciados acerca da necessidade de o professor provocar a abertura para a aprendizagem, de entender o ponto
de vista do educando para ajudá-lo na construção do conhecimento, de garantir a interação
entre sujeito e objeto. Nota-se, pois, que o professor produzido pelo discurso da obra de Vasconcelos é um sujeito híbrido de dois campos
discursivos: a política e a psicologia.
No modelo de docência instaurado pelo discurso da chamada Metodologia Dialética de Construção do Conhecimento em Sala de Aula, grosso
modo, o professor deve conhecer a realidade social dos alunos, o estágio de desenvolvimento
em que eles se encontram (psicogênese); ter
clareza dos objetivos e ser capaz de estabelecer
a contradição entre as representações mentais
dos alunos e a realidade. O teor prescritivo do
texto, e sua ampla circulação em cursos de formação de professores, permite-nos entendê-lo
como um manual, como um texto prático, que
oferece um conjunto de regras de conduta a
serem seguidas para se atingir o modelo de
docência apregoado. Tal conjunto de regras,
operaria sobre a dimensão ética dos professores,
tem a ver com a relação que cada um deve estabelecer consigo mesmo, com a forma de cada
docente se constituir como sujeito moral de seus
atos (FOUCAULT, 1995). O livro de Vascon-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
celos é farto em argumentos comprobatórios da
realidade que ele mesmo produz. Todo um conjunto de justificativas sociais, filosóficas, psicológicas é colocado à disposição dos professores.
Desta forma, é como se estivessem sendo oferecidos a esses, ao mesmo tempo, um conjunto de
regras e um modo de sujeição. Ou seja, as diferentes formas como os professores estabeleceriam uma relação com essas regras e se reconheceriam como obrigados a exercê-las na prática
(FOUCAULT, 1998b). É nesse sentido que se
pode afirmar que a obra põe em funcionamento
certas técnicas de si, o governo de si mesmo, de
forma a transformar cada sujeito no tipo de professor apregoado pela Metodologia Dialética de
Construção do Conhecimento em Sala de Aula.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Vasconcelos, ao examinar os modelos pedagógicos vigentes e propor sua superação
dialética, incita os professores a se reconhecerem, a se auto-examinarem constinuamente. À
medida que cada um examina a si mesmo, cada
um se toma como objeto de saber. Ao tomar a si
mesmo como objeto de saber, cada docente extrai saber de si mesmo. Tal operação
instrumentaliza os docentes a agirem sobre si
mesmos, a exercer poder. De fato, o que nos parece é que nos defrontamos com um processo de
sujeição aos axiomas da Metodologia Dialética de
Construção do Conhecimento em Sala de Aula,
cujos efeitos estariam na produção de um sujeito-moral-docente típico desse modelo de escola e de educação. Assim, o campo possível da
ação docente é estruturado; a subjetividade
docente é administrada, regulada, controlada.
Pelo governo da subjetividade docente, uma
identidade profissional é produzida, definida pela
obediência a um código moral fundado numa
concepção romântica de sujeito, num sujeito
original (sujeito cognitivo) e numa série de práticas que se deve exercer sobre eles com o fim
de provocar a transformação social pela educação. Estas regras de conduta docente, prescrições acerca de como controlar o espaço da sala
de aula, acabam controlando o próprio professor
através de uma experiência singular caracterizada pela interrelação de um determinado campo de saber psicológico, um tipo particular de
normatividade (conjunto de regras e normas) e
os modos pelos quais os/as professores significam
a sua própria conduta (formas de subjetividade). Finalmente, para tornar-se o tipo de professor apregoado pelo discurso da obra analisada, resta ao professor agir sobre si mesmo, tomando-se como objeto de poder e de saber.
REFERÊNCIAS
ANDRÉ, Marli et al. Estado da arte da formação de professores no Brasil. Educação &
Sociedade, Campinas, v.20, n. 68, p. 301-309,
dez.1999.
FOUCAULT, Michel. Verdade e subjetividade (Howison Lectures). Revista de Comunicação e Linguagens, Lisboa, n.19, p.203-223,
dez.1993. (Conferências proferidas em
Berkeley, em 20 e 21 de outubro de 1980).
FOUCAULT, Michel. O sujeito e o poder. In:
DREYFUS, Hubert L.; RABINOW, Paul.
Michel Foucault - Uma trajetória filosófica:
para além do estruturalismo e da hermenêutica.
Tradução Vera Porto Carrero. Rio de Janeiro:
Forense Universitária, 1995. p. 231-249.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
171
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Tradução Raquel Ramalhete. 14. ed. Petrópolis: Vozes, 1996. 277 p.
cação. In: SILVA, Tomaz Tadeu da. O sujeito da educação: estudos foucautianos.
Petrópolis: Vozes, 1994. p. 35-86.
FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso: aula inaugural no Collège de France, pronunciada em 2 de dezembro de 1970. Tradução Laura F. A. Sampaio. Campinas: Loyola,
1998.79 p.
NARODOWSKI, Mariano. Infancia y poder: la conformación de la pedagogia moderna. Buenos Aires: AIQUE, 1994.
FOUCAULT, Michel. Verdade e poder. In:
FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder.
Organização e tradução Roberto Machado.
Rio de Janeiro: Graal, 1998. p. 1-14.
FOUCAULT, Michel. Tecnologías del yo. In:
FOUCAULT, Michel. Tecnologías del yo y
otros textos afines. Tradução Mercedes
Allendesalazar. Barcelona: Paidós, 1990. p.
45-94.
FOUCAULT, Michel. História da sexualidade 2: o uso dos prazeres. Tradução Maria
Thereza da Costa Albuquerque. Rio de Janeiro: Graal, 1998. 232 p.
FOUCAULT, Michel. História da sexualidade
1: a vontade de saber. Tradução Maria T. C.
Albuquerque e J. A. Guilhon Albuquerque. 13.
ed. Rio de Janeiro: Graal, 1999. 152 p.
GARCIA, Maria M. A. A função pastoraldisciplinar das pedagogias críticas. 2000.
Tese (Doutorado em Educação) - Programa
de Pós-Graduação em Educação, Faculdade
de Educação, Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, Porto Alegre, 2000.
GVIRTZ, Silvina. El discurso escolar a través de los cuadernos de clase: Argentina
1930-1970. Buenos Aires: Eudeba, 1999.
LARROSA, Jorge. Tecnologias do Eu e Edu-
172
NARODOWSKI, Mariano. Después de la
clase: desencantos y desafíos de la escuela actual.
Buenos Aires: Novedades Educativas, 1999.
Ó, Jorge Ramos do. A criança transformada
em aluno: a emergência da psicopedagogia
moderna e os cenários de subjectivação dos
escolares a partir do último quartel do século XIX. In: SOMMER, Luís H.; BUJES, Maria I. E. Educação e cultura contemporânea: articulações, provocações e trangressões
em novas paisagens. Canoas: Ed. Ulbra, 2006.
p. 281-304.
PALAMIDESSI, Mariano I. La producción
Del “maestro constructivista” en el discurso
curricular. Educação & Realidade. Porto
Alegre, v. 21, n. 2, p. 191-213, jul./dez. 1996.
POPKEWITZ, Thomas S. Reforma educacional e construtivismo. In: SILVA, Tomaz T.
(Org.). Liberdades reguladas: a pedagogia
construtivista e outras formas de governo do
eu. Petrópolis: Vozes, 1998. p. 95-142.
VASCONCELOS, Celso dos S. Construção
do conhecimento em sala de aula. São Paulo: Libertad, 1999.
VEIGA-NETO, Alfredo. A Ordem das disciplinas. 1996. Tese (Doutorado em Educação)
- Programa de Pós-Graduação em Educação,
Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre,1996.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Pesquisa arqueológica na casa Gomes Jardim,
município de Guaíba/RS
PRISCILA PEDROSO DIAS1
GISLENE MONTICELLI2
RESUMO
O presente trabalho busca ressaltar a importância da pesquisa arqueológica realizada no monitoramento
do restauro arquitetônico da casa que pertenceu a Gomes Jardim, um personagem de destaque da Revolução Farroupilha (1835-1845). Esta propriedade, localizada na região central do município de Guaíba,
está profundamente ligada à formação da cidade, como também a história do Rio Grande do Sul. As
atividades de restauro, assim como a pesquisa arqueológica, iniciaram em abril de 2006 e foram concluídas em setembro de 2007. O imóvel é uma das mais antigas construções de Guaíba, sendo o único bem
tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (IPHAE) no município.
Palavras-chave: Casa Gomes Jardim, Guaíba, pesquisa arqueológica.
ABSTRACT
This paper shows the importance of the archaeological research developed during the architectonic
restoration of the house which belonged to Gomes Jardim, a prominent character from the Farroupilha
Revolution (1835-1845). This property, located in the central area of department of Guaiba, is profoundly
connected to the formation of the city of Guaiba, as well as to the history of the State of Rio Grande do Sul.
1
Acadêmica do Curso de História/ULBRA - Bolsista PROICT/
ULBRA
2
Professora/Orientadora do Curso de História/ULBRA
([email protected])
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
173
The restoration of the building started simultaneously with the archaeological activities in April 2006 and
was concluded in September 2007. This house is one of the most antique constructions in Guaiba and the
only one protected by the Historical and Artistical Heritage Institute of the State (IPHAE).
Keywords: Gomes Jardim House, Guaíba, archaeological research.
INTRODUÇÃO
A pesquisa arqueológica foi realizada no
monitoramento do restauro arquitetônico da
casa que pertenceu a Gomes Jardim, um importante líder farroupilha. A casa, situada na região central do município de Guaíba, está atrelada a formação da cidade. A história do Rio
Grande do Sul também se encontra profundamente ligada a Casa Gomes Jardim.
Na área onde hoje é o centro da cidade
de Guaíba foi tramado o movimento para
criação da República do Pampa. Das margens da praia da Alegria, centenas de
Rebeldes entraram em pequenos barcos e
tomaram Porto Alegre. Nascia a Revolução Farroupilha (GUAÍBA, 2006).
Existem registros de sítios arqueológicos de
grupos caçadores-coletores e ocupações de índios ceramistas Guarani encontrados no município de Guaíba. Soma-se a isto, o fato de que o
local onde se encontra a casa está no alto do
morro e próximo ao Lago Guaíba, ou seja, em
posição privilegiada. Então, se imagina que o
lugar tenha servido como habitação, passagem
ou acampamento para populações indígenas em
tempos pré-históricos (MONTICELLI, 2006).
No que se refere a sua raiz histórica, conforme consta em Monticelli (2006) “o local foi sede
da estância Pedras Brancas, de propriedade de Antônio Ferreira Leitão, cujas terras deram origem de-
174
pois ao 9º distrito de Porto Alegre, Pedras Brancas,
e, em 1926, ao município emancipado de Guaíba”,
que recebeu este nome devido ao Lago que o
margeia, Guaíba.
A partir de 1800, a casa foi residência de
Isabel Leonor Ferreira, filha do antigo proprietário, e de seu esposo, José Gomes de
Vasconcellos Jardim. Tempos depois, a área serviu como escola e armazém de secos e molhados. Desde a década de 1930 até os dias de hoje,
o imóvel pertence à família Leão (idem).
Quanto a Gomes Jardim, viveu entre 1783 a 1854,
sendo um personagem de destaque da Revolução
Farroupilha (1835-1845) e o primeiro presidente da
República Rio-Grandense. Ele assumiu o lugar de
Bento Gonçalves, quando o líder esteve preso na
Bahia, e organizou a primeira tropa de soldados para
invadir Porto Alegre (COMEÇA, 2006). Era considerado médico prático, isto é, sem formação acadêmica, mas que usava de seus conhecimentos para o
tratamento de doentes. Inclusive, acredita-se que
Bento Gonçalves tenha morrido em um dos cômodos da casa, pois era primo de Gomes Jardim, que
cuidou dele em seus últimos momentos de vida.
Segue o mistério sobre a existência do registro de óbito do chefe farroupilha, pois
nem a Cúria Metropolitana nem as igrejas mais antigas, de Rio Grande, Viamão
e Triunfo, possuem tal documento. A
Cúria também não possui registro de óbito de Gomes Jardim (CULTURA, 2007).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Cabe destacar que a Revolução Farroupilha, que
eclodiu na madrugada de 20 de setembro de 1835,
teve seu início no período Regencial e acabou no
Segundo Império. Foi a mais longa das rebeliões
regenciais, pois manteve por dez anos uma luta armada contra as forças imperiais. Por conta de grandes ressentimentos no Rio Grande do Sul, assim
como em outras regiões de economia subsidiária,
ocorreu uma série de rebeliões provinciais marcadas
por idéias federativas e republicanas. A questão do
separatismo surgiu apenas no decorrer do tempo,
mediante a dificuldade de negociação com a Coroa (PESAVENTO, 1990).
O imóvel, hoje, é um bem tombado pelo Estado, desde 1994, através do Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico do Estado (IPHAE), pois é
considerado sítio arqueológico. O processo de
tombamento é resultado dos esforços da família
Leão, atual proprietária. É importante destacar
que a casa não foi tombada por estar bem conservada, mas porque é importante para comunidade
(Figura 1). Neste sentido, através da pesquisa
arqueológica “cria-se a oportunidade de identificar
evidências materiais de antigas ocupações humanas
pré-históricas ou já do período histórico”
(MONTICELLI, 2005).
Figura 1 - Fachada da Casa Gomes Jardim antes das obras do restauro arquitetônico.
A preservação do entorno da propriedade,
assim como o cipreste, árvore centenária localizada na praça em frente, estão incluídos no projeto, que tem como proponente a Associação de
Amigos do Meio Ambiente (AMA Guaíba). Os
recursos para o restauro arquitetônico e para
pesquisa arqueológica foram obtidos junto a Lei
de Incentivo a Cultura (LIC), mediante renúncia fiscal do governo do Rio Grande do Sul, para
a empresa Medex, patrocinadora. A pesquisa
arqueológica obteve autorização junto ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) mediante a portaria número 186
(MONTICELLI, 2006).
O objetivo deste trabalho consiste, de modo
geral, no resgate das evidências materiais de
antigas ocupações humanas que ocorreram no
local: indígenas Guarani, escravos, imigrantes
açorianos, estancieiros farroupilhas, entre outros.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
175
Desta forma, pretende-se avaliar a ocupação
humana pré-colonial e histórica do local, comparando com padrão de assentamento conhecido em outras regiões.
MATERIAL E MÉTODOS
A Casa Gomes Jardim passou por um processo de restauro arquitetônico entre abril de 2006
a setembro de 2007, já que se trata de uma das
mais antigas construções do município de
Guaíba e, em seu entorno, desenvolveram-se
relações políticas, econômicas, sociais e culturais. A pesquisa arqueológica ocorreu no mesmo período do restauro arquitetônico e teve
como coordenadora a arqueóloga Gislene
Monticelli. O trabalho arqueológico se divide,
de modo geral, em três partes: campo, laboratório e gabinete. Deste modo, as metodologias utili-
zadas em cada uma destas atividades serão tratadas, aqui, separadamente.
No que se refere ao trabalho de campo (Figura 2), foram abertas quadrículas no quintal da
casa e realizadas intervenções relacionadas às próprias obras de restauro, como por exemplo, na instalação hidráulica, na remoção de pisos, na implantação de alicerces, entre outros. O arqueólogo responsável pelo trabalho de campo foi o especialista Junior Marques Domiks. Junto com ele
trabalharam estagiários voluntários do Curso de
História da Universidade Luterana do Brasil
(ULBRA/Canoas). O material extraído das escavações, depois de devidamente acondicionado, foi cuidadosamente transportado para o
Laboratório de Arqueologia e Etnologia (LAE),
localizado no Museu de Ciências Naturais (MCN)
da ULBRA/Canoas, que possui a guarda e
curadoria permanente do acervo.
Figura 2- Início da pesquisa arqueológica - decapagem do 1º Nível Artificial das quadrículas QSWF8, QSWF9,
QSWG8 e QSWG9.
Quanto às atividades de laboratório, num primeiro momento, o material passou por cinco etapas. A primeira delas foi a lavagem, cuidadosa,
176
pois os fragmentos vinham sujos do campo. Cabe
destacar que neste procedimento, além de água,
nenhum tipo de produto químico é utilizado. De-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
pois de lavadas e secas, as peças foram separadas
de acordo com o tipo de evidência: ossos, vidros,
louças, metais, entre outros. Em seguida, todo
material passou pelo processo de catalogação. Os
dados contidos nas etiquetas, que acompanham o
acervo desde o campo, foram transcritos para uma
ficha de catálogo. O próximo passo foi a numeração. Principalmente louças, vidros e cerâmicas foram numerados. Este trabalho é realizado com bico
de pena e nanquim. No final desta etapa, está a
quantificação, ou seja, contagem de todos os fragmentos recolhidos durante as escavações. Cabe
destacar que, na realização destas atividades também trabalharam estagiários voluntários do Curso
de História da ULBRA/Canoas.
Em relação ao trabalho de gabinete, foram desenvolvidas atividades voltadas, principalmente,
para a análise e tratamento de imagens. Inúmeras
fotos foram realizadas durante os trabalhos para
registrar todas as fases do andamento das obras e
das escavações. Também os documentos referentes ao restauro arquitetônico, a pesquisa arqueológica e as reportagens jornalísticas publicadas no
período da restauração foram escaneadas. Um banco de dados está sendo montado, incluindo todo
este material, pois a intenção é manter um
memorial, já que nos últimos anos as portas da casa
sempre estiveram abertas ao público, especialmente
durante a Semana Farroupilha, oportunidade em
que recebe centenas de visitantes. A responsável
por este trabalho foi a acadêmica do Curso de História e bolsista do PROICT/ULBRA, Patrícia Zilles
do Nascimento.
RESULTADOS E
DISCUSSÃO
Com o final das obras de restauro
arquitetônico a fachada da casa ficou totalmente
modificada. As estruturas do telhado e do forro
foram removidas, assim como a platimbanda e o
frontão. As esquadrias de madeira e as aberturas externas foram substituídas. As telhas voltaram a ser aquelas do tipo “capa e canal”. O
forro também foi substituído. Um canal de drenagem no solo, junto às paredes externas, foi
construído. Ainda, a fachada, as paredes e as
aberturas externas receberam nova pintura
(Figura 3).
Figura 3 - Fachada da Casa Gomes Jardim após o restauro arquitetônico.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
177
No que tange a pesquisa arqueológica, grande número de evidências materiais foi resgatado,
como fragmentos de louça nacional e importada,
objetos de metal, couro e madeira, restos de alimentação (ossos e dentes), fragmentos de cerâmica torneada e indígena, material construtivo,
como por exemplo, telhas, tijolos e azulejos, fragmentos de vidro, muitos inclusive em processo
de decomposição, entre outros. Soma-se a isto
um tipo diferente de cerâmica, possivelmente
associado a ocupação do local por escravos negros. Mas ainda são necessários mais estudos a
respeito deste tipo de evidência para que tal hipótese seja confirmada. Um outro tipo de fragmento, bastante curioso, que apareceu durante
as escavações foi a lousa. Na época em que a
propriedade sediou uma escola, não existiam cadernos com folhas brancas como nos dias de hoje,
então a lousa desempenhava esta função.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As escavações encerraram no mesmo período
em que foram concluídas as obras do restauro
arquitetônico, ou seja, em setembro de 2007,
quando a casa foi inaugurada. As primeiras etapas do trabalho de laboratório já estão praticamente finalizadas. Mas, as análises e interpretações serão realizadas na continuidade das pesquisas. Está prevista uma análise comparativa do
acervo da casa Gomes Jardim com as evidências
materiais obtidas no monitoramento arqueológico das obras do Conduto Forçado Álvaro Chaves-Goethe, em Porto Alegre (MONTICELLI e
CAPPELLETTI, 2007), uma vez que as duas pesquisas se referem a ocupações humanas, especialmente ao longo do século XIX, quando ambas
as margens do Lago Guaíba pertenciam ao município de Porto Alegre.
178
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao PROICT/ULBRA pela bolsa de
Iniciação Científica; a professora Gislene
Monticelli, que orientou este trabalho, pela oportunidade de iniciação na pesquisa, pelo incentivo
constante para seguir nesta área e pela liberdade
de trabalho; a arqueóloga Ângela Maria
Cappelletti, sempre disposta a dividir seus conhecimentos, por todo apoio, principalmente em relação ao desenvolvimento das atividades de laboratório; ao amigo João Henrique da Silva Neto, pelo
auxílio com a tradução e, finalmente, a todos os
colegas do Curso de História que passaram pelo
LAE durante o ano de 2007, pelas discussões fomentadas durante as horas em que passamos juntos, nos dedicando a conhecer detalhadamente
parte do cotidiano do trabalho arqueológico.
REFERÊNCIAS
COMEÇA restauração da casa de Gomes Jardim. Jornal do Comércio, Porto Alegre, 10
abril 2006. Disponível em: jc.plugin.com.br.
Acesso em: 17 nov. 2006.
CULTURA: casa do revolucionário Gomes Jardim é reaberta. Diário Popular, Pelotas, 16 set.
2007. Disponível em www.diariopopular.com.br.
Acesso em: 25 jan. 2008.
GUAÍBA. Página do Gaúcho, Porto Alegre,
20 nov. 2003. Disponível em: http://
w w w. p a g i n a d o g a u c h o . c o m . b r / h i s t /
guaiba.htm. Acesso em: 17 nov. 2006.
MONTICELLI, Gislene. Um sítio arqueológico inédito em Lavras do Sul/RS. Textura,
Revista de Letras e História, Canoas, n.11,
jan./jun. 2005.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
MONTICELLI, Gislene. Projeto de Pesquisa. Arqueologia nas obras de restauro da Casa
de Gomes Jardim, Município de Guaíba/RS.
Guaíba: LAE/MCN/ULBRA, 2006
dências materiais de dois sítios arqueológicos históricos urbanos: Casa Gomes Jardim
(Guaíba) e Conduto Forçado Álvaro ChavesGoethe (Porto Alegre). Canoas: ULBRA, 2007.
MONTICELLI, Gislene; CAPPELLETTI,
Ângela Maria. Análise comparativa das evi-
PESAVENTO, Sandra. A Revolução
Farroupilha. São Paulo: Brasiliense, 1990.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
179
180
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Universidade e permanência – promovendo
gestão acolhedora
MARISTELA RISSI FERLA1
BIANCA DANIETE CHIMELLO GOULART2
DORILDA GROLLI3
TANIA MARIA SCURO MENDES3
LAURACI DONDÉ DA SILVA4
RESUMO
Esta pesquisa foi desenvolvida com vistas à construção de um projeto educativo, objetivando a Gestão
Acolhedora e a permanência dos alunos da Ulbra. O caminho investigativo percorrido nesta foi de caráter
qualitativo e quantitativo, segundo Bogdan (2000), com a elaboração de ações conjuntas envolvendo
pesquisa-ação, consoante Demo (1994) e Brandão (2003). A partir da análise de dados, os indicadores
para a construção dos significados sobre permanência e gestão acolhedora contribui com programa que
promove a formação continuada de diversos segmentos da Universidade, onde se faz preponderante o
desenvolvimento de competências educadoras.
Palavras-chave: gestão acolhedora, permanência, formação continuada.
1
Acadêmica do Curso de Pedagogia Empresarial/ULBRA –
Bolsista de Iniciação Científica PROICT/ULBRA
Acadêmica do Curso de Pedagogia Orientação Educacional/ULBRA. Aluna de Iniciação Científica voluntária
2
PROICT/ULBRA
3
Professora do Curso de Pedagogia/ULBRA
Professora-Orientadora do Curso de Pedagogia/ULBRA
([email protected])
4
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
181
ABSTRACT
The present research is based upon the necessity of developing an educational project, facing the issue
of the Welcoming Management and the permanence of the students at ULBRA. The investigative path for
this research has both a qualitative and a quantitative approach, according to Bogdan (2000), with the
elaboration of joint actions involving action-research as shown in Demo (1994) and Brandão (2003).
Through the analysis of information, from indicators for the construction of the meanings about Welcoming
Management and performance, this work constitutes a program that promotes continuous education for
different sectors of the University, where the main objective in the development of educational competencies.
Keywords: welcoming management, permanence, continuous education.
INTRODUÇÃO
A democratização do ensino, nas ultimas
três décadas no Brasil, especialmente na educação básica, tem oportunizado que uma maior quantidade de alunos egressos do Ensino
Médio e de cursos de Educação de Jovens e
Adultos, possam ingressar em Instituições de
Ensino Superior. Constata-se, em função do
aumento da demanda de alunos, que várias
faculdades, centros universitários, universidades, vêm oferecendo diferentes cursos, alguns
novos, o que tem aumentado a concorrência
entre elas. Embora haja grande oferta de cursos, o ingresso do aluno, via vestibular ou programa de incentivo, não garante a sua permanência na instituição. Tal fato repercute numa
problemática que precisa ser investigada e enfrentada por essa Instituição.
Não se pode abordar a questão da permanência do aluno no ensino superior apenas
do ponto de vista econômico. Há uma gama
de fatores implicados nessa permanência que
diz respeito, antes de tudo, ao projeto pessoal do aluno e as conseqüências disso no plano social.
182
Por isso o conceito de permanência volta-se
para o investimento na formação integral do
sujeito. Essa formação deve ocorrer ao longo
de toda sua existência e equivale à continuidade nos processos educativos. Permanência
abrange o aprimoramento de conhecimentos
que leva ao desenvolvimento do sujeito enquanto pessoa com caráter profissional e social. Os seus significados conduzem, desse modo,
a uma compreensão sobre a incompletude humana. Assim, entende-se permanência do aluno, neste caso no ensino superior, na sua relação com os indicadores educacionais assumidos por esta coletividade.
O investimento nestas premissas precisa ser
compromisso fundamental das universidade e,
por isso, constitui uma das prioridades para as
mesmas; o que pode desencadear investigações
instuticionais.
Trazendo esta análise para o contexto da
Universidade, foi desenvolvida uma investigação tendo como foco as questões da evasão e a
permanência do aluno. Cabe então indagar: por
que o aluno da Universidade Luterana do Brasil (ULBRA) permanece nesta Instituição?
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Visando encontrar respostas possíveis a esta
interrogação, teve-se, como horizonte, a finalidade de desenvolver um Programa de Gestão Acolhedora com os diversos segmentos da ULBRA, a
partir dos dados analisados e categorizados na pesquisa, realizada em 2007/1, qual seja: UNIVERSIDADE E PERMANÊNCIA – PROMOVENDO
GESTÃO ACOLHEDORA.
CONSTRUINDO
RELAÇÕES TEÓRICAS
A pesquisa intitulada Universidade e Permanência: promovendo gestão acolhedora, desenvolvida em 2007, pode proporcionar maior compreensão sobre componentes da identidade do aluno, traduzidos em sua cultura, sua linguagem e
seus determinantes histórico-sociais.
As novas demandas sócio-cullturais, especialmente com a assimilação das tecnologias digitais, têm engendrado uma ecologia cognitiva que
altera e amplia as necessidades de inserção social. Assim, o papel da universidade é o de dar
vez e voz aos sujeitos sociais e, para tanto, essa
Instituição precisa romper com paradigmas
condicionantes. Necessita construir novas formas de fazer educação, que visem à formação
integral em processos humanizadores, sustentados pela ética e pela visão de imprevisibilidade.
Essa abertura à sociedade e ao outro, que
deve ser finalidade da educação desenvolvida
na universidade, é respaldada por Prigogine
(1996). Ele que enfatiza que a ciência não se
limita mais a situações simplificadas e idealizadas, mas, ao contrário, põe-nos diante da perplexidade de um mundo complexo e constantemente mutável.
A Universidade deve atuar na continuidade
da formação do sujeito, tendo como finalidade
última a construção de projetos de vida. Para tanto, este precisa definir claramente as suas metas
e avaliar as suas condições pessoais necessárias
para a tradução desse projeto em uma realidade
concreta (ZORZO, SILVA e POLENZ, 2004).
O papel da Universidade frente à formação
do sujeito social, para além do profissional, exige
essa perspectiva construtora e cooperadora do
conhecimento. É neste contexto que pode-se dizer que a formação acadêmica está intimamente
ligada à dialética do saber, através da qual configura-se “um caminho que parte de uma visão
abstrata de um objeto de estudo até a sua assimilação na concretude” (KOSIK,1998, p.11).
O caminho a que Kosik se refere indica construção para a atitude de reflexividade, de percepção e de apropriação da realidade, que possibilitam a ruptura dos estereótipos e das conclusões prontas, favorecendo a criação de novas
possibilidades de ação e relação no mundo concreto. O desenvolvimento da autonomia é prérequisito para capacitar alguém a fazer estas escolhas. O sujeito é autônomo na medida em que
suas opções se configuram como expressão da
sua vida interior, auto-percebidas nas conexões
que ele tem com a sociedade e com o universo,
ou, como diria Paulo Freire (2002, p.138), “enquanto forem uma expressão da leitura que cada
um consegue fazer no mundo”.
Ao desenvolver uma prática curricular democrática, aberta aos saberes que emergem
numa perspectiva dialógica, a universidade dará
oportunidade ao aluno para promover o desenvolvimento da sua autonomia. Segundo Freire
(2002, p.22), “a busca da autonomia é, pois, uma
das grandes metas da educação, para cuja exe-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
183
cução se exige dos homens que consigam se libertar de sua auto-inculpável menoridade”.
tões acolhedoras, considerando-se todas as instâncias em que ocorrem as relações na Universidade.
A permanência do aluno na Universidade, de
acordo com os estudos realizados até o momento6 ,
vincula-se ao conceito de acolhimento. Este conceito deve estar implícito numa ação pedagógica
nos espaços educativos formais e informais que
envolvem atitudes voltadas ao esforço em estabelecer vínculos significativos com os sujeitos nas
relações que se impõem no contexto educacional
universitário. Nesse sentido, representa a inclusão
das diferenças, numa dimensão multicultural, e
no aproveitamento dos conhecimentos prévios,
para um trabalho intersubjetivo e intercultural, bem
como para a construção participativa do conhecimento, voltando-se para a formação de sujeitos
reflexivos, participantes, autônomos e transformadores da sociedade. Tal perspectiva implica as concepções de construção do conhecimento e da inserção social do sujeito que inclui a percepção da
realidade, a formação da consciência, a atitude
participativa e o desenvolvimento da autonomia.
Para tanto, propõe-se a construção continuada de um programa de ações decorrentes da compreensão da realidade no contexto pedagógico e
administrativo. A concretização de um trabalho
desse teor envolve, necessariamente, toda a comunidade acadêmica. Urge construir parcerias
com setores que abrangem a Universidade nas
diversas gestões que a representam, promovendo, interdisciplinarmente, a gestão acolhedora, que
compreende a humanização e a valorização dos
sujeitos envolvidos neste processo.
Neste sentido, acolhimento significa a possibilidade de abrir espaço para a relação, numa
atitude de disponibilização, de aceitação do
outro, sem pré-julgamento ou preconceito, de
entendimento sobre as subjetividades, de negociação e de encaminhamentos que podem oferecer alternativas ou redirecionamentos das
questões, problemas, dúvidas e/ou conflitos.
Assim, o desenvolvimento da competência
dialógica faz-se preponderante para criação de ges-
6
184
Evasão Diagnóstico e Prevenção (2001) - Evasão no Ensino Superior (2002) - O despreparo para fazer escolhas e
suas implicações na Evasão (2003) - A Formação Continuada do professor e o Desenvolvimento da Autonomia do
Aluno: Fatores Implícitos na Evasão do Ensino Superior
Como não poderia deixar de ser, esse estudo
constitui uma pesquisa–ação, que decorre da
especificidade de cada área de conhecimento e
de cada serviço oferecido pela Universidade,
para a elaboração de um programa de ações
interdisciplinares a partir da análise de diferentes realidades, envolvendo o eixo articulador,
gestão acolhedora, tornando imprescindível a
participação dos responsáveis de cada segmento no processo de avaliação permanente.
Com base no aporte teórico anunciado, o programa de ações direcionou-se a segmentos da
universidade diretamente envolvidos com o
atendimento aos alunos.
Nas primeiras etapas deste programa, as ações
envolveram os funcionários de: Limpeza, Estacionamento, Seguranças e Gerentes de Setores
de Alimentação.
(2004) - Evasão e Permanência: reesignificando a vida
acadêmica (2005) - Ação Educadora na Universidade –
promovendo a permanência (2006) - Universidade e Permanência – promovendo a gestão acolhedora (2007).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Num segundo momento foram envolvidos
Pró-reitor de Graduação, Diretores de Área,
Coordenadores de Cursos, Assessores Pedagógicos e Professores.
As perguntas fechadas tiveram como objetivo coleta de dados dos alunos ingressantes em
2007/1. Em especial, seu nível-socio-economicocultural.
Em um terceiro momento, o programa abrangeu: Secretárias de cursos, Central de Atendimento, DOEP, Biblioteca, Apoio Financeiro e
Secretaria Geral.
Com a questão aberta, os alunos podiam expressar suas expectativas ao ingressar no ensino
superior.
Em todos os trabalhos, desenvolvidos de modo
cooperativo com a Central de Recursos Humanos da Ulbra, privilegiou-se a gestão acolhedora com a premissa fundamental da permanência
dos alunos na Instituição. O que implica a qualidade no que diz respeito às relações administrativo-pedagógicas e ensino e aprendizagem.
METODOLOGIA
O estudo realizado encaminhou um trabalho
de caráter interdisciplinar que tem compreendido
a articulação de ações com setores envolvidos no
contexto educativo da Universidade e que implicam, como eixo articulador, a conceituação foco
desta pesquisa: “gestão acolhedora”. Este processo
vem (re) desencadeando avaliações de ações conferindo-se um sentido de avaliação permanente
ao processo, a fim de compreender o fenômeno e
construir alternativas para a permanência dos alunos na Universidade. Desta forma, empreende-se
neste estudo, uma pesquisa-ação.
Para tanto, foi utilizado como instrumento de
pesquisa um questionário com perguntas fechadas, de caráter objetivo, e uma aberta.
Os sujeitos da pesquisa foram os ingressantes
em todos os cursos oferecidos pela Ulbra em 2007/
1, perfazendo um total de 1269 alunos.
A análise dos dados foi de caráter quantitativo, em relação as questões fechadas, e qualitativo, na questão aberta, segundo os pressupostos de
Bogdan (2000), Demo (1994) e Brandão (2003).
RESULTADOS
A partir dos resultados obtidos nas questões
objetivas, verificamos que 62,5% dos alunos ingressaram no curso superior na sua 1º opção. Podemos inferir que os demais alunos ingressantes
em na 2º opção, podem necessitar de orientação
profissional sob pena de desistirem do curso ou
de o abandonarem. Deve-se também levar em
consideração que 77% desses alunos são muito
jovens. Em relação à escolha do curso, 72,13%
dos alunos responderam que a realizaram por opção pessoal, 17,99% devido a possibilidades de
trabalho e 9,99% não responderam.
O interesse, o gosto, as aptidões são
determinantes na escolha do curso. Por isso, é
necessário intensificar o trabalho junto aos alunos do ensino médio,visando à orientação profissional à orientação profissional, ao conhecimento das profissões no mundo do trabalho.
De acordo com os dados da pesquisa, os alunos ingressantes concluíram o ensino médio recentemente, sendo que 52% no turno da manhã e 31,89% no turno da tarde. Quanto aos
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
185
demais, concluíram-no há bastante tempo (mais
de 13 anos).
A maioria (51%) dos alunos provém de escolas públicas. Portanto, com possíveis defasagens de conhecimentos, o que exige transformação no processo de trabalho educativo do
professor universitário, tendo em vista dificuldades de interpretação, de escrita, de argumentação, de cultura geral e humanística que podem apresentar. Há uma nova demanda de trabalho para que os professores atendam às características desses perfis de alunos.
A maior parte dos alunos (57,8%) reside com
os pais e provém de famílias de classe média,
42% desses têm renda familiar destinada à manutenção de 3 a 5 pessoas.
Quanto ao grau de instrução do pai, a maior
porcentagem verificada é de 39,25% que concluíram o ensino fundamental, sendo que o da
mãe é de 36,22%, também no ensino fundamental. Podemos perguntar: Qual a cultura familiar
em relação à leitura, conhecimentos gerais, dedicação ao estudo?
Constatou-se ainda um número considerável de alunos (34,37%) é mantido exclusivamente pelos pais; enquanto a maioria dos alunos
(42,72%) trabalha mais de oito horas diárias; os
demais trabalham até seis horas diárias, o que
significa dizer que são trabalhadores estudantes. Apenas 38,8% tem recursos próprios para
manter-se no curso, o restante necessita de algum tipo de auxilio, como bolsa de estudos, financiamentos etc. Mais de 10.000 alunos realizam estágios remunerados e, por isso, estudam à
noite. A porcentagem de quase 40% de alunos
que trabalham, ainda que em parte, em atividade relacionada à sua formação acadêmica,
186
justifica os indicadores encontrados na questão
subjetiva: qualificação, conhecimento e mercado de trabalho, como veremos adiante.
A maioria (84%) dos alunos reside na região
metropolitana de Porto Alegre, onde se localizam as Instituições de Ensino Superior concorrentes à Ulbra, o que solicita desta universidade um diferencial de qualidade. O transporte
coletivo é o mais utilizado pelos estudantes, o
que implica verbas financeiras que precisam
destinar para tal fim. Se houvesse um convênio
com as empresas para diminuição dos gastos com
o transporte, os alunos poderiam cursar, pelo
menos, mais uma disciplina no semestre.
A maioria dos alunos (79,98%) tem na mídia
suas fontes de lazer, de comunicação e de cultura. Uma quantidade razoável (70,8%) dos alunos tem computador com acesso à Internet em
sua residência ou em seu ambiente de trabalho.
Indagados sobre como conheceram a Ulbra,
49,24% disseram que o fizeram através de publicidade , 37,63% através de amigos , 10% mediante
a Feira das Profissões; testes vocacionais e visitas,
promovida pela Diretoria de Orientação Educacional e Profissional da Universidade Luterana do
Brasil; 3,42%, através de esportes e 9,71% por outros meios. Podemos deduzir que a mídia constitui-se um bom meio de divulgação da Ulbra, acompanhada do significativo percentual de divulgação através de contatos interpessoais, o que significa que é necessário intensificar o endo-marketing,
envolvendo alunos e professores, para a satisfação
da clientela interna, o que, mais uma vez, remete
aos indicadores da questão subjetiva.
No que se refere à questão aberta, que
objetivava coletar dados sobre a perspectiva do
aluno ao ingressar na Ulbra, é necessário expli-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
car que nem todos os alunos que responderam
a questão fechada, a responderam.
Para uma visualização mais detalhada das re-
postas descritas pelos alunos, apresenta-se na Figura 1 o conjunto de dados obtidos na Área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas.
Figura 1 - Resultado da questão aberta – Área de Ciências Sociais e Aplicadas
Seguindo uma análise qualitativa, implicando análise de conteúdos, segundo Bardin
(1979), agruparam-se os conteúdos advindos
das respostas em categorias que, pela similaridade, foram sendo reagrupadas sucessivamente, o que conduziu às categorias mais genéricas e relevantes. Pode - se
verificar,
correlacionando a análise qualitativa com a
quantitativa, que, entre os maiores índices
percentuais alcançados, as categorias que
mais se destacaram são: 39% Qualificação
(qualidade, infra-estrutura, feira das profissões/visitas, serviços/atendimento ao aluno e
palestras/testes vocacionais); 34% Conhecimento (me formar) e 27% Mercado de Trabalho (bolsa/crédito, estágio/emprego).
Trazendo estas categorias: Qualificação, Conhecimento e Mercado de Trabalho, pode-se
compreender a necessidade de se intensificar as
atividades e propor metas que alcancem tais indicadores junto ao programa de ações continuadas, engendradas pela Gestão Acolhedora voltadas à permanência do aluno na Universidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considera-se, assim, a relevância deste
trabalho, uma vez que a traduz preocupação
por parte de todos os segmentos que implicam as gestões administrativas e pedagógicas da Universidade. Sua repercussão atinge não só a comunidade acadêmica, bem
como a comunidade externa em que a Instituição está inserida.
Nesta pesquisa, busca-se apoio em análise de
perspectiva histórica e sócio-cultural, numa abor-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
187
dagem intercultural e intersubjetiva para o desenvolvimento do pensamento crítico e da capacidade de fazer a leitura do contexto educativo.
Nesta, tem-se por finalidade conhecer a identidade do aluno ingressante em 2007 em suas múltiplas características, para pensar coletivamente,
os espaços em que estas identidades possam se
desenvolver no universo acadêmico.
No tocante ao processo de ensino e aprendizagem, a pesquisa, a partir dos indicadores para
a construção dos significados sobre gestão acolhedora e permanência, desencadeia realização
de ações que promovem a formação continuada
de professores e funcionários.
O acadêmico, em sua formação pessoal e profissional, beneficia-se deste estudo, uma vez que
as relações no espaço universitário, dentro e fora
da sala de aula, passam a favorecer a convivência e o desenvolvimento dos sujeitos implicados, desencadeando, maior índice de permanência e fidelização.
Um dos grandes desafios para a continuidade
desta investigação é de construir uma nova cultura em relação a permanência e fidelização do
estudante na Universidade. Deseja-se, com isso,
maximizar o potencial transformador dos jovens,
possibilitando a realização de seus projetos de
vida, e aproveitando toda infra-estrutura material e humana que a Instituição oferece.
Considera-se assim, atender da melhor forma possível, as expectativas apresentadas pelos
alunos ingressantes. Entre elas:
- receber um atendimento qualificado de
todos os setores da Universidade;
- obter uma excelente qualificação para o
competitivo mercado de trabalho;
188
- tornar-se um profissional ético, competente,
responsável e transformador da sociedade;
- ingressar no mercado de trabalho, iniciando pelos estágios, aliando desta forma
teoria e prática.
Espera-se que os dados apresentados contribuam no desenvolvimento de novas metas e políticas de permanência e fidelização dos acadêmicos que ingressam nesta Universidade.
REFERÊNCIAS
BARDIM, Laurence. Análise de Conteúdo.
Lisboa: Edições 70,1979.
BECKER, F. Educação e construção do conhecimento. Porto Alegre: Artmed, 2001.
BOGDAN, R. Investigação qualitativa em
Educação. Uma Introdução à teoria e aos
métodos. Porto: Ed. Porto, 2000.
BRANDÃO, C.R. A pergunta a várias mãos:
a experiência da pesquisa no trabalho do educador. São Paulo: Cortez, 2003.
CHALITA, G. Pedagogia do Amor. 3.ed.
São Paulo: Ed. Gente, 2003.
CONTRERAS, José. A autonomia de professores. São Paulo: Cortez, 2002.
DEMO, Pedro. Pesquisa e construção do
conhecimento – metodologia científica no
caminho de Habermas. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1994.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia:
saberes necessários à prática educativa. São
Paulo: Paz e Terra, 2002.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
FREIRE, Paulo. Pedagogia da esperança. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
GROLLI, Dorilda. Alternidade e feminino.
São Leopoldo: Nova Harmonia, 2004.
HABERMAS, Jürgen. Teoria de la acción
comunicativa I e II.
KOSIK, KARL. A dialética do concreto. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 1998.
KULLOK, M.G. Brandão. As exigências na
formação do professor na atualidade.
Maceió: Edufal, 2000.
Canoas, n. 17, p. 33-42, jul.-dez, 2000,
PRIGOGINE, I. O fim das certezas. São
Paulo: UNESP, 1996.
SILVA, Lauraci Dondé da. Orientação educacional - uma necessidade para o ensino
superior? Canoas: ULBRA, 2005.
SILVA, L.D.; ZORZO, C.M.; SERAFIN, M.
D. Evasão: diagnóstico e prevenção. Educação Brasileira, Brasília, v. 23, n.47, p.155173, jul./dez. 2001.
LUCHESI, Cipriano C. Avaliação da aprendizagem. São Paulo: Cortez, 2000.
VASCONCELLOS, Celso dos S. Para onde
vai o professor? Resgate do professor como
sujeito de transformação. São Paulo:
Libertad, 2001.
MORIN, Edgar. A Cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. 8 ed.
Rio de Janeiro: Bertrand, 2003.
VASCONCELLOS, Celso dos S. Construção do conhecimento em sala de aula. São
Paulo: Libertad, 2000.
NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. In. NÓVOA, A . (Org.). Os
professores e a profissão. Lisboa: Dom
Quixote,1992.
ZABALA, M. A. O ensino universitário seu cenário e seus protagonistas. Porto Alegre: Artmed, 2004.
PIAGET, Jean. Psicologia e epistemologia.
Lisboa: Dom Quixote, 1991.
ZORZO, C.M.; SILVA,L.D.; POLENZ,T. Papel da Universidade frente ao fenômeno da
evasão. In: SILVA, L.D.; POLENZ,T. Educação e contemporaneidade: mudanças de
paradigmas na ação formadora da universidade. Canoas: ULBRA, 2002.
POLENZ, Tamara. Interdisciplinaridade e
construção do conhecimento. Caesura,
ZORZO, C. M.; SILVA, L. D.; POLENZ, T. Pedagogia em conexão. Canoas: Ed. Ulbra, 2004.
PIAGET, Jean. A epistemologia genética.
Petrópolis: Vozes, 1973.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
189
Ciências Sociais Aplicadas
192
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Disciplinando os corpos: como a mídia nos ensina
sobre o prolongamento da vida na sociedade atual
FERNANDA IZIDRO BALESTRO1
SUE ELLEN TATSCH DA SILVA2
CRISTIANNE MARIA FAMER ROCHA3
RESUMO
Este texto, decorrente de um projeto de pesquisa4 , objetiva analisar a produtividade dos discursos
veiculados na Revista Veja, em 2005, sobre os diferentes dispositivos utilizados para o prolongamento ad
infinitun da vida na atual sociedade. A intenção é descrever e buscar compreender os processos pelos
quais nos tornamos sujeitos de um determinado processo de objetivação que nos informa o quanto as
novas tecnologias revolucionam nossos modos de vida e nossos corpos para que, a partir disto, possamos
viver com maior qualidade e de forma mais duradoura nossas vidas. As promessas são muitas e analisar
a (des)continuidade temporal destes discursos nos permite, talvez, reconhecer, no todo e na repetição, a
multiplicidade e a instabilidade dos mesmos, as ênfases e os recursos utilizados, além das possíveis relações
com outros discursos que circulam e fortalecem a necessidade de vivermos um uma sociedade de controle.
Palavras-chave: mídia impressa, corpo, discursos, revista Veja, novas tecnologias.
1
Ex-aluna do Curso de Comunicação Social/Ulbra, Bolsista
PROICT/ULBRA
2
Acadêmica de Comunicação Social/Ulbra. Acadêmica voluntária PROICT/ULBRA
Professora/Orientadora do Curso de Comunicação Social/ULBRA
e PPG em Educação/ULBRA.([email protected])
3
4
Trata-se do Projeto de Pesquisa intitulado: “Disciplinando
os Corpos: Como a mídia nos ensina sobre o prolongamento da vida na sociedade de controle”, desenvolvido junto
ao Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGEDU/
ULBRA), sob orientação da Profa. Dra. Cristianne Maria
Famer Rocha, desde agosto de 2006
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
193
ABSTRACT
This text, part of a research project, aims to analyze the productivity in discourses published in Veja (a
weekly magazine of national circulation), in 2005, about different devices used to prolong life ad infinitum
in the current society. The intention is to describe and try to comprehend the processes in which we become
subjects of a determined process of objectivation that inform us how new technologies revolutionize our
lives and our bodies, so we can live with more quality and in a more durable way. There are many promises
and analyze the time (dis)continuity of these discourses perhaps will allow us to recognize, in the whole and
in the repetition, our multiplicity and instability, the emphasis and the used resources, plus the possible
relations with other discourses that circulate and corroborate the necessity of living in a society of control.
Keywords: press media, body, discourses, Veja Magazine, new technologies.
INTRODUÇÃO
Entre as tecnologias que transformarão a vida
na próxima década, estão algumas que prometem diagnósticos mais precisos, remédios
mais baratos e próteses que respondem ao
comando do cérebro. (Veja, jul.2005, p.46)
Na sociedade atual, são inúmeros os recursos e
mecanismos (predominantemente de ordem
tecnológica) constantemente oferecidos e
disponibilizados no “mercado” para, segundo aqueles que os produzem, deixarem nossas vidas mais
duradouras. A mídia, por sua vez, tem sido pródiga em veicular mensagens que informam sobre as
inúmeras vantagens relacionadas à introdução das
“novas” tecnologias em nossas vidas. Além disto,
ela nos abastece de discursos (textos e imagens),
os mais variados possíveis, sobre as vantagens relacionadas ao prolongamento da existência de nossos corpos e, por conseqüência, de nossas vidas.
Sant’anna (2001, p.69) nos alerta sobre as
sujeições a que estamos sendo continuamente
expostos, sem maiores questionamentos:
(...) a publicidade não cessou de prometer um poder inédito de transfiguração:
pode-se passar o inverno bronzeado, che-
194
gar aos cinqüenta anos com o rosto de
quarenta e adquirir a aparência ideal para
cada circunstância.
Na área da saúde, as buscas por soluções que
prolonguem a vida estão em constante
publicização. Em geral, são inovações que “revolucionarão” os mais diferentes campos do conhecimento e nos darão a possibilidade de viver, em
menor tempo e independente do espaço físico
existente, as maravilhas que nos dizem existir em
função da presença de computadores, vídeos, telefones digitais ou chips. São tantas as facilidades
oferecidas, nos mais diferentes campos de saberes e práticas, que a hiper-necessidade e a hiperfacilidade que representam, enfatizadas pelos discursos circulantes, podem ser apenas uma plausível justificativa para a introdução contínua (e
sem maiores resistências) de uma outra lógica
discursiva. Afinal, como afirma Le Breton (2003),
O corpo é visto por alguns entusiastas das
novas tecnologias como um vestígio indigno fadado a desaparecer em breve. (...)
Conectados ao ciberespaço, os corpos se
dissolvem (...) [e] o cibernauta abandona a prisão do corpo e entra num mundo
de sensações digitais (...). O corpo ele-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
trônico atinge a perfeição, imune à doença, à morte, à deficiência física. Ele representa o paraíso na terra, um mundo sem
a espessura da carne. (p.123-124)
Lemos (2002), por sua vez, relata que o corpo,
na atualidade, funde-se gradualmente com as
novas tecnologias, tornando-se um híbrido, um
campo de intervenções artificiais como a cirurgia
plástica, a engenharia genética, as
nanotecnologias. Da mesma forma, Sant’ana
(2001) diz que há tecnologias que permitem ao
cirurgião repetir sua operação sobre o modelo numérico do paciente “exatamente como se ele estivesse num simulador de vôo” (p.40). Além disso, a
humanidade parece caminhar para uma cibervida,
ou seja, uma vida virtual em que nossas experiências e vivências parecem ser cada vez mais significativas - apenas e tão somente - no mundo virtual.
São considerações como as acima proferidas
que nos incitaram a analisar a produtividade
discursiva das reportagens veiculadas em uma revista de notícias de circulação nacional (a Revista Veja), ao longo do ano de 2005, no que diz respeito aos diversos dispositivos e mecanismos utilizados para o prolongamento da vida na sociedade
atual. A intenção é descrever e buscar compreender os processos pelos quais nos tornamos sujeitos
de um determinado processo de objetivação.
Afinal, é preciso compreender até que ponto a
mídia (neste caso, a impressa) está subjetivando
os seus leitores no que diz respeito aos dispositivos
que postergam a vida. Está ela apenas informando
sobre as novas tecnologias? Formando opiniões com
seus discursos sobre o assunto? Ou determinando
5
A chamada de capa é uma manchete de uma reportagem
na capa, mas não se constitui matéria de capa da revista.
Portanto, uma capa tem, em geral, uma matéria de capa
nossos modos de agir, ao sugerir a condução de
nossas vidas com vistas a uma longa velhice?
MATERIAL E MÉTODOS
A fim de analisar a produtividade discursiva
das reportagens veiculadas na Revista Veja, em
relação aos diversos dispositivos utilizados para
o prolongamento da vida na sociedade atual,
buscamos em Fischer (1997) inspiração para
descrever como se constrói a comunicação didática com sujeito-receptor, através de uma certa sintaxe - estruturação
de texto, seleção e encadeamento de imagens, sons, pausas, palavras, trilha sonora
e assim por diante. (p. 63)
Partindo-se do pressuposto que os meios de informação e comunicação constroem significados e
atuam decisivamente na formação dos sujeitos
(FISCHER, 1997), buscamos analisar as reportagens
previamente selecionadas (aquelas que traziam, em
seus textos ou imagens, temáticas relacionadas às
novas tecnologias e ao prolongamento da vida), fazendo uso dos Operadores discursivos da mídia impressa, que são colocados em funcionamento, segundo Rocha (2005), a partir de quatro regras:
Regra das localizações:
As reportagens ocupam lugares estratégicos nas revistas (ser matéria ou chamada
de capa5 ; estar em uma ou outra seção;
estar no início ou no final da revista; ocupar uma página inteira ou mais páginas
e, eventualmente, uma ou mais chamadas sobre outros
temas de importância que se encontram publicadas na
revista (Rocha, 2005).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
195
etc) e tal localização, em geral, indica a
importância e o destaque que a matéria
recebe ou não. Além disto, as reportagens
ocupam também lugares específicos nas
páginas (página inteira, meia página, parte superior, parte inferior, entre outras).
Regra das repetições:
Os temas apresentados, por vezes, se repetem, em freqüências variadas e nas mais
diferentes condições (desde a repetição
praticamente “literal” de uma reportagem
até as repetições em que o tema é apresentado com a utilização de argumentos
contrários ao que já foi publicado).
Regra das ênfases:
É uma parte do “como” dos textos veiculados,
ou seja, quais aspectos (no campo das idéias)
as reportagens ressaltam, evidenciam, consideram. Apesar da pretensa “neutralidade informativa”, os textos publicados indicam as tomadas de posição das revistas, às vezes através
do uso de palavras ou expressões (de cunho
positivo/negativo, depreciativo/entusiasmado),
outras vezes são os próprios argumentos – dados e fatos – que indicam as posições assumidas (favoráveis ou contrárias). E também na
utilização constante de números, dados, gráficos, tabelas, percentagens nas reportagens –
e que procuram fortalecer os argumentos utilizados na defesa de algumas “verdades”. Além
disso, um outro fator a ser considerado na análise é o “autor” das informações publicadas (em
geral especialistas em determinada área do conhecimento).
Regra dos recursos:
É a outra parte do “como”, isto é, quais re-
196
cursos gráficos são utilizados nas matérias
publicadas (uso de imagens, cores, fotografias, tipos e tamanhos e letras etc). No entanto, não foram analisadas em específico as particularidades destes recursos, em especial as
relativas a ângulos, planos e enquadramentos.
As mesmas foram observadas como parte dos
discursos enunciados pela mídia. Para esta
análise, o “texto escrito” é visto como o elemento articulador de verdades e é a partir
dele que os outros elementos - incluindo o
“texto visual” – foram analisados. (p.150-152)
Ao organizar, definir, selecionar e mostrar uma
linha discursiva, a mídia (neste caso, a impressa) utiliza tais regras com a finalidade de produzir verdades que, de algum modo, regulam e
regem nossos comportamentos e modos de agir
e ser no mundo. Como afirmou Rocha (2005):
As revistas são artefatos culturais e pedagógicos (...) que englobam a produção e a circulação de saberes, onde jogos de poder estabelecem determinados modos de ser que,
graças às operações estratégicas que utilizam, passam a ser vistos como os únicos (e
verdadeiros) possíveis. (p.148-149)
A produtividade discursiva da mídia impressa também pode ser discutida a partir da análise
de uma estratégia frequentemente utilizada:
falar de uma realidade particular totalizando-a.
E, neste procedimento, ao retratar ou descrever
situações particulares como se fossem gerais
(iguais para todos), faz com que (ou permite
que) seus leitores, de alguma maneira, se reconheçam em tais histórias. É este “processo de
reconhecimento” que permite com que os leitores se sintam identificados, compreendidos e,
por assim dizer, sujeitos das histórias relatadas.
O discurso circulante, portanto, em sua “objetiva” descrição dos fatos, seduz e sujeita.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
As revistas semanais utilizam esse recurso de
forma incisiva e contínua. De acordo com Rocha
(2005), “a periodicidade semanal, o formato, os
recursos utilizados e o público a quem se destinam contribuem para que elas alcancem este
duplo objetivo: totalizar para convencer” (p.179).
Um recurso muito utilizado pelas revistas é a
freqüente utilização das imagens que, tão fortes
quanto o texto escrito, sujeitam aqueles que,
com ela, se relacionam, na medida em que:
[os] discursos que “fazem sentido” servem de
uma estratégia pedagógica, de sedução e ao
mesmo tempo de controle, adquirindo visibilidade em cada imagem capturada pelas
câmeras, a cada seqüência editada, sonorizada,
veiculada e recebida. (FISCHER, 1997, p.73)
Ao divulgar, espetacularizar ou até banalizar
o uso de novas tecnologias para o prolongamento
da vida, a mídia atribui valores e sentidos que,
ao serem lidos, informam sobre, mas também induzem a adoção de determinadas práticas e criam conceitos persuasivos que nos fazem acreditar em algumas verdades e ignorar outras.
Analisar, portanto, a quantidade e a “qualidade” dos discursos veiculados na Veja, em
relação às temáticas escolhidas, certamente
nos permitirá compreender alguns dos mecanismos de sujeição a que estamos sendo continuamente submetidos. Afinal, neste processo de produção de verdades e de sujeitos, os
discursos proferidos são extremamente úteis
para informar, formar ou “deformar” os leitores em relação às vantagens das novas
tecnologias em nossas vidas. Pois, se não podemos viver sem elas, talvez seja importante
buscar compreender como elas são descritas e
apresentadas, a fim de que possamos viver com
maior qualidade (e não somente com maior
quantidade) nossas vidas.
RESULTADOS
Foram pesquisados, ao longo de 2005, 52
exemplares da Revista Veja. Nestes, foram
selecionadas para análise 98 reportagens que
abordaram temáticas relacionadas às novas
tecnologias, ao corpo e ao prolongamento da
vida, como mostra a Figura 1.
Figura 1 - Temas em destaque nas reportagens
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
197
De acordo com as quatro regras antes citadas, apresentamos a seguir os resultados mais
significativos encontrados:
Regra dos recursos
A utilização de imagens (em geral, fo-
tografias, infográficos ou quadros demonstrativos com dados estatísticos) foi bastante freqüente nas reportagens selecionadas (95% das
reportagens tiveram ao menos uma imagem em
destaque), conforme a Figura 2.
Figura 2 - Presença de fotos, imagens, gráficos, ilustrações nas reportagens.
Regra das localizações
A Figura 3 mostra que as reportagens
selecionadas se apresentaram em maior número nas
Seções Guia, Medicina, Tecnologia/Internet e Saúde.
Foi analisada, ainda, a extensão das reportagens selecionadas dentro das temáticas propostas. A maior parte delas (64%) ocupou uma ou
duas páginas, conforme o Gráfico 4.
Figura 3 - Regra das localizações/seções das matérias.
198
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Figura 4 - Números de páginas das matérias.
Regra das repetições
Embora as reportagens se apresentem, em geral, nas seções relacionadas à temática da saúde
e das novas tecnologias (Medicina, Saúde,
Tecnologia etc), a própria diversidade dos assuntos tratados é um forte indício da constante repetição destas temáticas na revista analisada.
Como exemplo, citamos a reportagem com a entrevista de James Watson, cientista genético, nas
páginas amarelas (primeira seção da Revista Veja).
A matéria traz como título O radical da genética.
Um dos cientistas que descobriram a estrutura do
DNA diz que não deve haver restrição nenhuma à
pesquisa com genes (Veja, 24 ago. 2005, p.11) e
uma das afirmações do entrevistado (a seguir),
relevante para as discussões aqui pretendidas,
ganhou destaque em um “olho”6 da matéria:
6
Outro exemplo de reportagem fora das seções “típicas”, por assim dizer, para as temáticas
analisadas é aquela intitulada Um terrível mundo novo, na seção Cinema, que trata de assuntos
referentes a filmes de novas tecnologias e
ciberespaço, mas fazendo um constante paralelo ao mundo real, tal como pode-se ver no fragmento de texto abaixo:
Se um dia pudermos mudar os genes para
que as crianças fiquem mais bonitas ou
inteligentes, não vejo por que não fazêlo. (Veja, 24 ago. 2005, p.11)
A Ilha tem muitos defeitos e uma idéia sólida: a de que o homem já virou uma mercadoria genética (...) uma história passada no
futuro próximo de 2019, na qual se lida com
uma idéia que vem migrando com urgência da ficção científica para a esfera do diaa-dia – a idéia do pós-humano (...). Em A.I.
– Inteligência Artificial, (...) o menino-robô
David é indistinguível, na aparência e na
alma, de uma criança verdadeira, mas nunca será amado como tal (...). A ciência está
muito longe de criar uma inteligência artificial tão verossímil quanto David, mas muito
Olho, na linguagem jornalística impressa, quer dizer uma
espécie de “box” ou quadro, com uma citação dita pelo
entrevistado e que merece destaque. Geralmente alguma
frase polêmica ou contestadora. Esse recurso é muito utilizado para atrair leitores, particularmente nas revistas semanais e nos jornais diários.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
199
perto de fazer com que a questão levantada
por A.I. se aplique aos próprios homens (...).
Os avanços em áreas como clonagem e a
manipulação genética estão prestes a desencadear uma revolução no conceito de
natureza humana (...) o supermercado genético não é mais uma miragem. Ele está
aberto, e as filas já estão se formando. (Veja,
3 ago, 2005, p.122-123)
As diferentes abordagens em que aparece, nas
reportagens, a temática das novas tecnologias nos
leva a crer que elas foram - e continuam sendo criadas a partir de determinadas necessidades, de
determinadas demandas sociais. No entanto, estando inseridas no mercado (e o seu uso insistentemente incentivado pela mídia), os caminhos tomados por elas passam a ser os mais imprevisíveis. Conforme lembra Rocha (2005), um exemplo disto foi
“a própria criação da Internet, que foi concebida
como uma ferramenta restrita para a segurança de
dados militares nos anos sessenta e acabou se expandindo de forma impressionante” (p.193).
Regra das ênfases
No que diz respeito a esta regra, as reportagens, como mostramos a seguir, foram subdivididas em quatro grandes grupos:
1) Incentivo à utilização de próteses ou de
mutações genéticas:
Uma das reportagens, Rumo ao homem
biônico (Veja, jul.2005, p.46), apresenta as
tecnologias que irão influenciar profundamente
200
a Medicina nos próximos anos: diagnósticos
precoces e precisos, medicamentos mais baratos e próteses movimentadas pelo cérebro de
seus portadores. Nesta matéria, é citado o caso
de Cameron Clapp que, mais tarde, no segundo semestre do ano de 2005, renderia reportagem exclusiva, em uma outra edição da revista (neste caso, faz-se uso da regra da repetição). A segunda matéria apresenta a história
de Cameron Clapp (Figura 5), que foi atropelado por um trem aos 15 anos e perdeu os membros inferiores e um membro superior. Mas, quatro anos após o acidente, graças ao implante
de próteses, voltou a ter uma vida ativa:
Em quatro anos ele reaprendeu a andar,
correr e manipular objetos com a ajuda
de prótese de alta tecnologia (...). Durante um ano o adolescente mutilado viveu em cadeira de rodas (...). No início
usou próteses pequenas para fortalecer
os músculos inativos. Depois trocou por
aparelhos com chips que calculam o movimento da perna e ajustam hidraulicamente os joelhos para combinarem com
seu passo e piso. Para correr tem uma
versão levíssima. Com extremidades de
fibra de carbono: para nadar, pernas e
braços mecânicos mais curtos, ambos
acoplados a nadadeiras (...). “Estou limitado a atividades robóticas e gasto três
vezes mais energia que um corpo normal
para me movimentar. Mas a tecnologia
está evoluindo e minha vida só vai melhorar”. (Veja, 9 nov. 2005, p.86-87)
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Figura 5 - Vida sobre próteses (Veja, 9 nov. 2005, p.86-87)
2) Incentivo ao uso das inovações
tecnológicas para prevenção ou tratamento:
portagem anterior, mas utiliza argumentos mais
convincentes:
A reportagem Tratamento de choque contra a depressão apresenta um novo tratamento para esta patologia, com a utilização de aparelhos de
eletrochoque: um é implantado no tórax, o outro é
aplicado nas têmporas e o terceiro é aplicado no
crânio.
Depressão é um mal cada vez mais comum
no mundo moderno (...) até 2020 a depressão se tornará o segundo maior problema de
saúde pública, perdendo apenas para as doenças do coração. A boa notícia é que uma
nova e promissora técnica de tratamento
contra a depressão se encontra em fase de
testes inclusive no Brasil: a estimulação magnética transcraniana (EMT). A técnica
consiste na aplicação de pulsações magnéticas repetitivas, produzidas por uma máquina, em uma região específica do cérebro relacionada à ocorrência da depressão (...).
Na Universidade Wayne de Detroit, nos Estados Unidos, já foram obtidos resultados
promissores no tratamento de vítimas de
derrame com perda parcial da capacidade
de fala (...). Se os estudos continuarem nesse ritmo, os pacientes depressivos podem ser
os primeiros a usufruir em larga escala a nova
técnica. (Veja, 21 dez. 2005, p.88-89)
Um aparelhinho parecido com um
marcapasso é implantado no tórax do paciente. Seus impulsos elétricos estimulam o
nervo que influencia a região cerebral responsável pelas emoções e na qual ocorrem os
processos depressivos. (Veja, 6 jul. 2005, p.98)
Outra reportagem, sobre a mesma temática
(regra das repetições), intitulada Eletricidade
contra a depressão. Médicos começam a obter bons
resultados no tratamento da doença com o uso da
estimulação magnética, também apresenta uma
“promissora” tecnologia para o tratamento da
depressão (Figura 6). A tal “nova tecnologia”
parece não diferir muito da apresentada na re-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
201
Figura 7 - Eletricidade contra a depressão (Veja, 21 dez. 2005, p.88).
3) Incentivo à beleza e à saúde:
Neste grupo de reportagens selecionadas, são
apresentadas aquelas que incentivam a utiliza-
ção das novas tecnologias para tornar-se mais
bela ou para modificar o corpo, como no caso da
reportagem de capa (Figura 8).
Figura 8 - Adeus ao pneuzinho (Veja, capa, 14 dez. 2005).
Nas páginas internas, a reportagem traz
mais de cinco páginas, mostrando as novas estratégias - dietas, exercícios físicos e medica-
202
mentos - para acabar com esse “mal”, que aflige e traz tantos problemas à saúde das mulheres: a barriga.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Está em curso uma revolução nos estudos
sobre a obesidade. Mais importante do que
a quantidade de gordura é o modo como
ela se distribui pelo corpo. O objetivo agora
é eliminar aquela “barriguinha”, nociva à
estética e à saúde. (Veja, 14 dez. 2005, p.174)
Outro exemplo de reportagem que utiliza o
argumento da “beleza e saúde a qualquer preço
(ou recurso teconológico)” é aquela cujo título
é: Injeta, amassa, estufa...e torce para dar certo.
Nela, o argumento é que:
a bioplastia, nova mania entre os tratamentos estéticos, muda para sempre. Injetar no
corpo uma substância sintética pouco conhecida, sem ter certeza das evoluções futura, e nunca mais poder retirá-la, quem
faria uma loucura dessas? Muita gente. A
contrapartida é o que a bioplastia, um tratamento que vem causando furor, oferece
em termos de reengenharia estética a jato:
nariz reto, queixo proeminente, boca carnuda, bumbum empinadinho e outras saliências devidamente ressaltadas, sem cirurgia nem internação, só com anestesia local,
algumas agulhadas e uma rápida massagem
modeladora. (Veja, 17 ago. 2005, p.106)
4) Incentivo à longevidade:
Neste quarto e último grupo de reportagens, foi
possível constatar, a partir de dos incisivos discursos
publicados na Veja, o incentivo à quantidade dos
anos de vida. Um dos exemplares apresenta, como
matéria de capa, a reportagem intitulada Serenidade até o fim. A busca por maneiras mais humanas de
enfrentar os momentos finais da vida: (Figura 9)
Figura 9 - Serenidade até o fim (Veja, capa, 9 nov. 2005).
A reportagem, no total, apresentou cerca de
dez páginas sobre as possibilidades para se viver
um “final sereno”, com a utilização de tratamentos paliativos, em casa, que tornam a fase final
da vida menos traumática e mais duradoura.
Outra reportagem desta série é aquela que
apresenta as vantagens de nosso cérebro viver
eternamente, independente de nossa
corporeidade física:
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
203
(...) até 2050 será possível passar as informações do cérebro de qualquer pessoa para um computador, teoricamente
permitindo que uma cópia dele continue
funcionando depois da morte. (Veja,
jul.2005, p.84)
Esta reportagem, intitulada Nosso cérebro viverá para sempre, apresenta a entrevista com o
futurólogo da British Telecom, Ian Pearson, que
desde a década de 1990, investiga novas
tecnologias e tenta prever suas possíveis implicações para o mercado e a sociedade:
O futurólogo garantiu à Veja que não se
trata de um delírio de cientista maluco, e
sim de uma conseqüência natural do progresso de tecnologias hoje em estado inicial (...). “Será como um backup de seu
cérebro em um computador (...). Dentro
de cinqüenta anos, pelo menos os mais
ricos terão acesso a uma espécie de ‘imortalidade eletrônica’. Mais tarde, pode ser
possível instalar esse cérebro em um
andróide parecido com você e viver como
se nada tivesse acontecido”. (Veja,
jul.2005, p.84)
Pelo acima exposto, talvez apenas os mais
ricos possam viver mais e melhor, por enquanto. Mas, a produtividade dos discursos proferidos por Veja (ao falar das novas
tecnologias e de seu uso para o prolongamento da vida) certamente ultrapassa as mais
triviais barreiras de acesso e busca, através
da utilização de variados recursos, construir
“verdades” e alternativas que sejam por todos nós tidas como as únicas possíveis ou as
melhores existentes.
204
CONCLUSÕES
Ao longo da pesquisa realizada, muitos foram os questionamentos e as reflexões possíveis,
desde o nosso papel de simples consumidoras até
aquele de produtoras de informações, enquanto profissionais da área da comunicação. Afinal, quem trabalha com os meios de produção e
circulação de notícias jamais deve esquecer que
tem em mãos o “poder” de ser lido, escutado,
visto por muita gente e de, assim, poder persuadir beneficamente ou não os demais sobre as
coisas do mundo, sobre os possíveis acontecimentos, sobre como está/é a sociedade, ou como
deveria estar/ser a mesma.
É nosso dever, portanto, permitir-se produzir
outras e diferentes verdades sobre o mundo. Para
tanto, temos que nos abastecer de informações,
das mais variadas possíveis, mas não apenas
absorvê-las. Pois, nessa era digital, onde estamos
cada vez mais inseridos em uma lógica de facilidades e acessos infinitos, é preciso prestar maior
atenção às várias armadilhas postas pelo mercado, já que muitas das informações hoje produzidas e proferidas não são apenas benéficas, como
nos fazem crer.
A partir da pesquisa realizada, pôde-se perceber o quanto a mídia impressa e, aqui, particularmente, a Revista Veja, não apenas informa
seus leitores, mas utiliza-se de estratégias ou
recursos (textuais e imagéticos) convincentes
para fazê-los acreditar que necessitam sempre
mais das novidades tecnológicas para viverem
mais e com maior qualidade suas vidas.
Ao informar, a Veja forma opiniões e transforma seus leitores em sujeitos de outras verdades,
objetivados, informados ou seduzidos pelos discursos proferidos. No caso da pesquisa realiza-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
da, as reportagens publicadas invariavelmente
mostraram uma variedade de motivos e argumentos positivos relativos às inúmeras vantagens
decorrentes da introdução das novas tecnologias
em nossas vidas. Resta, portanto, diante disto,
primeiro, buscar compreender as condições de
produção das informações publicadas na revista
e, segundo, discernir sua aplicação ou não no
dia-a-dia, de acordo com as crenças e necessidades de cada um de nós.
REFERÊNCIAS
FISCHER, Rosa Maria Bueno. O estatuto
pedagógico da mídia: questões de análise.
Educação & Realidade, Porto Alegre, v.22,
n. 2, p.59-80, jul./dez. 1997.
LE BRETON, David. Adeus ao corpo. Tradução Paulo Neves. In: NOVAES, Adauto
(Org.). O Homem-máquina: a ciência manipula o corpo. São Paulo: Companhia das
Letras, 2003, p.123-137.
LEMOS, André. Corpo e Tecnologia. In:
LEMOS, André. Cibercultura: tecnologia e
vida social na cultura contemporânea. Porto
Alegre: Sulina, 2002. p.174-199.
ROCHA, Cristianne Maria Famer. A escola
na mídia: nada fora do controle. 2005. Tese
(Doutorado em Educação) - Programa de
Pós-Graduação em Educação, Faculdade de
Educação, Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, Porto Alegre, 2005.
SANT’ANNA, Denise Bernuzzi. Corpos de
Passagem: ensaios sobre a subjetividade contemporânea. São Paulo: Estação Liberdade, 2001.
VEJA. São Paulo: Abril, 2005. (todos os exemplares).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
205
206
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Energia de ondas: uma proposta de inserção
tecnológica e econômica no Brasil
WILLIAN MATTES GONÇALVES1
FLÁVIO TOSI FEIJÓ2
PATRÍZIA RAGGI ABDALLAH3
RESUMO
O presente artigo explora a possibilidade de inserção de tecnologias de geração de energia elétrica a
partir da energia de ondas marinhas na costa brasileira. Para tanto, foram revisadas as principais tecnologias
implementadas no mundo para a extração de energia advinda das ondas, incluindo os custos associados à
instalação de uma unidade-piloto. De acordo com os dados mais recentes, um aproveitamento intensivo
desse recurso na costa brasileira seria capaz de fornecer 50 TWh.
Palavras-chave: Economia da energia, fontes renováveis de energia, energia de ondas.
ABSTRACT
This paper explores the possibility of electricity generation based on wave energy at the brazilian coast.
Therefore, we present a review of the main technologies available around the world to this sort of energy
production, including the principal range of costs related to them. In according to the most recent available data,
an intensive utilization of this resource at the brazilian coast would be able to generate around 50 TW-h.
Keywords: Energy economics, renewable energy sources, wave energy.
nômicas, Administrativas e Contábeis (DCEAC)/FURG
([email protected])
Acadêmico do curso de Economia/FURG. Bolsista PROBIC/
FURG
1
Professor/Orientador do Departamento de Ciências Eco-
2
3
Professor/Orientador do DCEAC/FURG
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
207
INTRODUÇÃO
As preocupações relacionadas com as questões ambientais têm figurado com forte proeminência nos debates científicos e acadêmicos. Ao
longo das últimas décadas, as dimensões atingidas pela sociedade contemporânea, no que diz
respeito à intensificação da demanda por recursos naturais, renováveis ou não, motivam um
crescente número de pesquisas que pretendem
apontar vias possíveis para a sustentabilidade
intertemporal desses recursos.
Os processos de geração de energia desempenham um papel fundamental na consecução
dos objetivos econômicos, sociais e ambientais
das nações modernas, e são capazes de representar um ponto de estragulamento quando mal
planejados e gerenciados. No mesmo tocante,
grande parte desses processos demanda uma alta
quantidade de combustíveis altamente
poluentes, dependendo do tipo de matriz em que
estão baseados, e exigem uma reformulação
setorial adequada de modo que contemplem as
exigências do desenvolvimento econômico e
social em conjunção com a redução das agressões ambientais.
É notável que a mudança de paradigmas a
respeito do desenvolvimento, sobretudo com a
incorporação da noção de sustentabilidade4 ,
permitirá uma participação crescente dos processos de geração de energia baseados em fontes renováveis. No entanto, a performance dessa inserção está sujeita a uma vasta gama de
4
208
Uma definição suscinta de desenvolvimento sustentável é
apresentada por World Comission on Environment and
Development 1987 Report (apud UNDP World Assessment
Energy, 2000, p. 31), sendo aquele “that meets the needs
fatores que inclui investimentos em pesquisa e
desenvolvimento de novas tecnologias,
mapeamentos do aproveitamento potencial das
novas fontes de energia, verificação de viabilidades técnica e econômica, e a formação de um
arcabouço institucional que contemple políticas direcionadas a objetivos desejados.
Embora seja um tipo de recurso ainda
incipiente em sua utilização no mundo, o potencial energético contido nos oceanos apresenta-se como uma alternativa promissora para a
geração de energia elétrica, o que justifica a
necessidade de estudos sobre o aproveitamento
desse recurso, especialmente na costa brasileira. De acordo com Cruz e Sarmento (2004), o
potencial energético global atribuído à energia
das ondas é da ordem de 2 TW5 , sendo equivalente à potência elétrica média anual consumida
mundialmente.
Neste artigo, tem-se como objetivo uma caracterização das principais tecnologias utilizadas para a extração da energia das ondas
no mundo, e a detecção dos principais componentes de custos associados à sua instalação, através de revisão bibliográfica. A classe
de dispositivos de conversão da energia das
ondas analisada neste trabalho é a mais recente e aquela que permite beneficiar-se dos
regimes de ondas mais poderosos, característicos de zonas de elevada profundidade
(offshore). Para tanto, o artigo encontra-se
dividido em quatro seções seguintes que abordam, respectivamente, uma introdução téc-
of the present without compromising the ability of future
generations to meet their own needs.”
TW, unidade de medida de potência equivalente a 1.000
Gigawatts.
5
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
nica sobre o aproveitamento da energia das
ondas; uma caracterização dos principais tipos de equipamentos utilizados na extração
desse tipo de energia; uma descrição dos principais componentes de custos relacionados com
a instalação de uma usina de geração de energia elétrica a partir da energia das ondas; e
uma breve contextualização da energia das
ondas ao caso brasileiro, com os potenciais impactos de sua implantação na costa litorânea.
Aspectos técnicos do
aproveitamento da energia das
ondas
As ondas resultam do efeito do vento sobre a
superfície dos oceanos, caracterizadas pela movimentação vertical de partículas fluidas, cuja
direção de propagação energética se dá perpendicularmente à linha de crista da onda. Os mecanismos precisos de transferência da energia
dos ventos para as ondas são bastante complexos. No entanto, Estefen et al. (2003) identificam os seguintes aspectos: i) o fluxo de ar sobre
a superfície do mar transfere energia através de
tensões cisalhantes, resultando na formação e
no crescimento das ondas; ii) alterações dos campos de pressão e das tensões cisalhantes, em
decorrência de fluxos turbulentos de ar, levam
a uma intensificação do processo de formação
das ondas; e iii) a partir de certo tamanho, as
ondas podem sofrer uma ação mais intensa do
fluxo de ar, o que se reflete também no crescimento das ondas.
O fluxo de energia, P, de uma onda senoidal,
por unidade de frente, segundo a teoria linear
da onda, pode ser expressa teoricamente pela
seguinte equação:
P = ρg2 H2 T
32π
Onde r é a massa específica da água, g é a
aceleração da gravidade, H é a altura da onda
e T é o período da onda.
No entanto, a definição acima comporta uma
modelagem simplificada quando comparada às condições reais do mar, onde existe predominância da
superposição aleatória de inúmeros desses processos
simplificados. Outras modelagens procuram definir
a distribuição da energia das ondas, em condições
reais, em função da freqüência das ondas. Ainda
nesse sentido, modelagens mais sofisticadas incluem a distribuição da energia das ondas com base na
direção das ondas, capturando a parcela de energia
capaz de ser interceptada por um dispositivo
unidirecional de extração de energia.
As tecnologias de extração da
energia das ondas
Nas últimas décadas, a extração da energia
das ondas tem motivado os pesquisadores a encontrar diferentes soluções para equacionar o
desafio tecnológico. Segundo Estefen et al.,
‘“A flutuação dos níveis de potência das
ondas ao longo do ano é uma das maiores dificuldades encontradas pelos projetistas de aparatos para a extração de
energia das ondas, pois enquanto uma
usina de ondas deve operar de forma eficiente em níveis de potência da ordem
de 20 kW/m, deve ser também capaz de
suportar a ação de ondas extremas com
potências da ordem de 1.000 kW/m.”
(2003, p. 490)
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
209
As tecnologias de conversão da energia das
ondas são classificadas usualmente com base no
princípio de operação do equipamento ou com base
na distância entre o equipamento e a linha de
costa (CRUZ e SARMENTO, 2004). De acordo
com esta última classificação, podem ser classificadas em dispositivos costeiros (shoreline), dispositivos próximos da costa (near-shore), e dispositivos
afastados da costa (offshore). O motivo pelo qual é
feita essa classificação deve-se às profundidades
resultantes das distâncias dos dispositivos à costa,
uma vez que o regime de ondas é mais energético
em maiores profundidades, sendo assim vantajoso
colocar tais dispositivos em profundidades superiores. No caso dos dispositivos shoreline as profundidades serão normalmente inferiores a 20 m e os
dispositivos são assentados no fundo do mar. No
segundo caso, nearshore, a profundidade fica em
torno dos 50 m e os dispositivos são flutuantes.
A primeira classificação está associada ao modo
de conversão da energia das ondas em energia elétrica, isto é, ao tipo de dispositivo. Temos assim
três classes principais de dispositivos de conversão
da energia das ondas, que podem ser de Coluna
de Água Oscilante, CAO (Oscillating Water
Column,), Corpos Flutuantes, podendo ser de absorção pontual (Point Absorbers) ou progressiva
(Surging devices), e Galgamento (Overtopping
devices). É importante ressaltar que esses dispositivos podem eventualmente ser usados em conjunto
em um parque de geração de energia. A seguir,
são apresentados os dispositivos pertencentes à classe de equipamentos capazes de operar em maiores
profundidades e, dessa forma, beneficiarem-se de
regimes mais poderosos e energéticos de ondas.
6
210
Desenvolvido pela Teamwork Technology (Países Baixos).
http://www.waveswing.com
Archimedes Wave Swing (AWS)6
O Archimedes Wave Swing é um dispositivo
de conversão de energia das ondas da classe dos
corpos flutuantes. Com um diâmetro de 10 a 15
m, bastante inferior ao comprimento de onda
(cerca de 150 m), o AWS pode ser considerado
um dispositivo de absorção pontual. O AWS é
formado por dois cilindros ocos submersos, no
interior dos quais o ar pressurizado equilibra o
cilindro superior (flutuador) e a coluna de água
exterior acima dele. A passagem das ondas altera a pressão sobre o cilindro flutuador, provocando um movimento oscilatório. Esse movimento é utilizado para acionar um gerador elétrico
linear, responsável pela produção da energia elétrica. Os dispositivos finais prevêem uma potência instalada de aproximadamente 5 MW.
Pelamis7
O Pelamis é um dispositivo de conversão de
energia das ondas do tipo progressivo. Os dispositivos progressivos são sistemas alongados com uma
dimensão longitudinal da ordem de grandeza do
comprimento de onda e estão dispostos no sentido
de propagação da onda, de modo a gerarem um
efeito de bombeamento progressivo, associado à
passagem da onda. Cada dispositivo é composto
de quatro tubos circulares e três módulos de conversão de energia, perfazendo uma capacidade
unitária de aproximadamente 750 kW, sendo o seu
comprimento de 120 m e o diâmetro externo igual
a 3.5 m. O movimento de propagação das ondas
provoca a oscilação dos cilindros em relação às
Desenvolvido pela Ocean Power Delivery Ltd. (Escócia).
http://www.oceanpd.com
7
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
juntas que os unem e, dessa forma, a pressurização
de óleo interno que passa por motores hidráulicos,
responsáveis pela geração da energia elétrica. Uma
das componentes importantes do Pelamis é o seu
sistema de fixação ao fundo do mar, que, dadas as
características do dispositivo, assume uma relevância fundamental.
Wave Dragon8
O Wave Dragon é um dispositivo de conversão
de energia das ondas que pode ser considerado
como um dispositivo de galgamento afastado da
costa (offshore). O sistema consiste basicamente
em dois refletores e de um reservatório que armazena a água e ainda de um determinado número
de turbinas de baixa queda, através das quais a
energia elétrica é produzida. Um dispositivo Wave
Dragon é projetado para, em escala real, atingir
uma potência nominal de 7 MW, em um intervalo
que pode variar entre 4 e 11 MW, de acordo com o
clima médio de ondas do Atlântico (36 a 40 kW/
m). Este sistema foi o primeiro a introduzir eletricidade em uma rede elétrica, em Nissung, Dinamarca (CRUZ e SARMENTO, 2004).
Componentes de custos
A determinação dos custos totais compreende o levantamento e a soma de todos os custos
de investimento. Estes podem variar de acordo
com o projeto, mas, basicamente, incluem equipamentos (novos e usados); licenças; patentes;
despesas de instalação, etc. (EPRI, 2004)
8
Equipamentos
No caso dos equipamentos (EPRI, 2004),
podem ser mencionados: turbinas (componentes que são diretamente responsáveis pela extração de energia do fluxo tidal, tais como o
rotor, e seus controladores, e cabo principal);
estruturas de extração (componentes estruturais de extração, tais como dutos de alojamento, ou qualquer outro componente estrutural
requerido); geradores; fundações, aportagem e
ancoragem (componentes requeridos para a
fixação, em determinado local, do dispositivo
de conversão de força do fluxo tidal);
interconexões elétricas (cabos requeridos para
a conexão das plantas individuais a um ponto
de interconexão comum); interconexões paralelas (todos os sistemas de cabos, engrenagens,
linhas de transmissão e infra- estrutura
requeridas para a conexão do ponto de
interconexão comum ao ponto de conexão baseado em terra); comunicação, comandos e controle (equipamentos e infra-estrutura requeridos para estabelecer uma ligação de duas
vias entre solo e sistemas de geração, com fins
de comunicação, controle e comandos); custos de instalação (custos requeridos para o
transporte do sistema até o local de operação,
para completar todas as conexões, e verificação do local); instalações gerais e engenharia
(custos de engenharia associados ao planejamento do parque de geração e de instalações
gerais requeridas para a operação da planta.
Neste item poderiam ser incluídas modificações em docas, compras de manutenção etc.
para a operação e manutenção do parque).
Desenvolvido pela Wave Dragon ApS, um consórcio internacional europeu. http://www.wavedragon.com
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
211
Encargos Financeiros e
Provisões Econômicas
No caso de custos relacionados com encargos e provisões econômicas, destacam-se: custo
de desenvolvimento do proprietário (estimado em
aproximadamente 5% dos custos de instalação
acima); provisões econômicas (estimadas em aproximadamente 2% dos custos de equipamentos);
taxas financeiras (estimadas em aproximadamente
2% do primeiro ano de dívida); e demais encargos.
Demais Custos
Entre os demais custos, podem ser mencionados os custos subestação-subestação que consistem
no custo de capital inicial requerido para qualquer custo de transmissão/distribuição entre
subestações que seja incluído no custo estimado,
entretanto, desde que seja creditado de volta com
juros dentro dos primeiros 5 (cinco) anos de operação. Por simplificação, esse custo não é fatorado junto ao custo de eletricidade (CDE) ou nos
cálculos da taxa interna de retorno.
Custos de Operação e
Manutenção
Por sua vez, os Custos Anuais Programados
de Operação e Manutenção (O&M) compreendem os componentes de O&M que constituem de seguro, mão-de-obra e “partes”. Em
mão-de-obra, além de pessoal capacitado, incluem-se despesas com equipamentos como
lanchas, barcos de mergulho, etc. para a execução das atividades de O&M. “Partes” são simplesmente itens de reposição. Os custos de
O&M não incluem custos infreqüentemente
incorridos na revisão dos dispositivos e outros
212
componentes. Estes custos estão incluídos no
Custo de Reposição Atualizado (CRA). As despesas referem-se aos pagamentos anuais associados à operação e à manutenção da planta, e
incluem O&M recorrentes e não-recorrentes
(que são estimados, para efeitos de análise econômica, baseados em projetos relacionados da
indústria offshore). A maior parte dos custos
de O&M associados com os dispositivos de conversão de energia tidal pode ser agrupada em
três categorias: i) Manutenção Não-programada: execução de reparos, tipicamente ocorrendo após violentas tempestades; ii) Manutenção Preventiva Programada; iii) Revisões e
Reposições Programadas de Dispositivos.
Quanto ao Custo Anual Não-programado de
O&M, tem-se a provisão para manutenção nãoprogramada estimada em uma porcentagem do
custo anual programado de O&M. O Custo Atualizado de Reposições e Revisões Periódicas
(CARP), uma vez que, dependendo do tipo específico de equipamento, requerem-se maiores
revisões do dispositivo e do sistema de fixação,
e são programadas para ocorrer a cada 5, 10 ou
15 anos. Essas maiores revisões podem se dirigir
às engrenagens, sustentações, lacres e outras
partes móveis, bem como ao cabo de fixação e
componentes. Uma vez que são custos incorridos em intervalos de vários anos, e não rotineiramente a cada ano, a sua contabilização correta requer um aporte anual de fundos. O objetivo desse aporte é disponibilizar recursos para
quando surgir a necessidade de reposições ou
revisões. O aporte envolve cálculo de Valor Presente Líquido, em nível dos custos de revisão e
reposição, a uma base anualizada, consistente
com os outros elementos de custos. Por se tratarem de investimentos, são elegíveis a taxas de
crédito de investimentos.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Assim, o Custo Total da Planta (CTP), isto
é, custo total instalado e incumbido, consistirá
nos elementos de custo supramencionados. O
Investimento Total na Planta (ITP) é o montante de capital total para a construção da planta, considerando-se os juros durante o período
de construção. ITP = CTP + Juro durante a
Construção.
A energia das ondas
e o caso brasileiro
Os estudos sobre aproveitamento da energia
das ondas ainda se encontram em fase bastante
incipiente no Brasil, agravados por obstáculos
significativos ao seu desenvolvimento como a
ausência de dados sobre o potencial energético
do mar brasileiro, dificuldade de atração de investidores e a ausência de mecanismos
institucionais que incluam projetos de investimentos nesse tipo de geração de energia em programas de incentivos ao desenvolvimento de
energias alternativas.
Estefen et al. (2003) reportam os dados obtidos do potencial energético da costa brasileira, com base na medição realizada pelo satélite Topex/Poseidon, referentes a um período de
6 anos e meio (setembro de 1992 a março de
1996, e fevereiro de 1999 a setembro de 2000).
A Tabela 1 reproduz aqui esses resultados.
Tabela 1 - Valores médios de H9 , Te10 e P11 ao largo da costa brasileira obtidos a partir das medidas dos
altímetros do satélite Topex/Poseidon entre setembro de 1992 a março de 1996 e fevereiro de 1999
a setembro de 2000.
9
Altura da onda.
11
Compreende um período médio, denominado período
de energia ou de potência, sendo expresso em kW/m.
10
Potência disponibilizada pela onda, expressa em kW/h.
Traços das pistas do satélite. Cf. TOLMASQUIM, M. T.
2003. p. 493. Figura 2.
12
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
213
É possível observar que a potência
disponibilizada pelas ondas aumenta de acordo
com a latitude até atingir 32,5 kW/h no extremo Sul do país (Pista 163), compreendendo um
recurso total de aproximadamente 40 GW.
Estefen et al. (2003) admitem um máximo de
capacidade de aproveitamento do recurso das
ondas entre 10 e 15% do total disponível. Em
outras palavras, um aproveitamento intensivo do
recurso seria capaz de produzir anualmente o
equivalente a 50 TWh.
Em virtude das limitadas experiências com
energia de ondas no mundo ainda, é difícil estimar o quão viável economicamente será a sua
operação em um estágio maduro de desenvolvimento, ou em larga escala. No entanto, algumas tecnologias de extração offshore de energia
das ondas já são competitivas em certos nichos
de mercado, como em pequenas comunidades
ou ilhas que fazem uso de geração de energia
em pequena escala a partir de diesel combustível (UNDP, 2000). De acordo com os custos
apresentados por Fraenkel (1999), uma geração
a partir de óleo diesel custa tipicamente entre
US$ 0,10 a US$ 0,50 por quilowatt-hora (kW/
h), enquanto algumas tecnologias offshore produzem a mesma quantidade de energia a custos
entre US$ 0,06 e US$ 0,15.
A mensuração detalhada dos benefícios econômicos e sociais advindos de fontes renováveis
é bastante difícil e, normalmente, está vinculada ao tipo de projeto a ser empreendido, incluindo os diferentes equipamentos utilizados. A
partir da revisão de uma experiência com energia de ondas na Escócia, Wec (2003) ressalta
ainda como os principais benefícios a criação de
empregos diretos e indiretos; externalidades
tecnológicas, principalmente quando o país dis-
214
põe de know-how na indústria offshore; e
dinamização econômica de áreas rurais.
Além disso, representaria um incremento na
capacidade instalada de geração de energia elétrica baseado em uma fonte renovável e nãopoluente. Ademais, um projeto de energia de
ondas estaria apto à elegibilidade ao Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, sendo possível
a oferta de créditos de carbono no mercado internacional.
CONCLUSÃO
O equacionamento dos desafios ambientais
que se põem diante da humanidade requer uma
especial atenção aos processos de geração de
energia, dada a sua indispensabilidade para o
continuado desenvolvimento humano e para o
crescimento econômico. O Brasil apresenta uma
relativa eficiência energética do ponto de vista
ambiental com sua matriz preponderantemente
baseada em geração hidrelétrica. Estimações das
emissões de dióxido de carbono (CO2) per capita
para a geração de energia elétrica apontam para
1,76 tonelada no Brasil, consideravelmente abaixo da média da América Latina, estimada em
4,18 toneladas, e de países como Estados Unidos e Japão, que emitem em média 20 e 9,5 toneladas per capita, respectivamente. O desenvolvimento da extração de energia das ondas
na costa brasileira reafirmaria a posição brasileira na eficiência energética ambiental.
Por outro lado, em vista do nível de potência
disponível na costa brasileira, com destaque para a
Região Sul do país, é razoável admitir-se que os
empreendimentos de energia das ondas mais viáveis economicamente serão aqueles mais afastados
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
da costa, onde o potencial energético das ondas é
maior e, portanto, beneficiar-se-ão de uma maior
capacidade de geração de energia elétrica. Apresentaram-se, neste trabalho, as principais classes de
tecnologias disponíveis para tais empreendimentos
e a estrutura de custos relacionados com a sua instalação e operação. A estimação desses custos é parte
essencial dos estudos de viabilidade econômica da
operação de usinas de energia elétrica com base em
ondas marinhas, bem como para a seleção dos tipos
de dispositivos a serem utilizados.
A escassez de informações e de pesquisas sobre a inserção de tecnologias de geração de energia elétrica a partir das ondas no Brasil ainda representa uma das maiores deficiências para a
prospecção e o desenvolvimento de aplicações
efetivas no país. Entretanto, os esforços conjuntos de laboratórios de pesquisa, da iniciativa privada e do setor governamental apontam para boas
perspectivas sobre o aproveitamento econômico
da energia das ondas na costa brasileira.
AGRADECIMENTOS
Agradecemos ao apoio do Programa
Institucional de Bolsas de Iniciação Científica
da Fundação Universidade Federal do Rio Grande (PROBIC/FURG), e ao Centro Nacional de
Pesquisas
da
Petrobras
(CENPES/
PETROBRAS) pela motivação despertada ao
estudo de energia das ondas na costa brasileira.
REFERÊNCIAS
CRUZ, J. M.; SARMENTO, A. J. Energia
das ondas: introdução aos aspectos
tecnológicos, económicos e ambientais. Portugal: Instituto do Ambiente Alfragide, 2004.
ENERGY
POWER
RESEARCH
INSTITUTE – EPRI. Economic assessment
methodology for offshore wave power
plants. [s.l.], 2004.
ESTEFEN, S. F.et al. Energia das ondas. In:
TOLMASQUIM, M. T. (Org.). Fontes
renováveis de energia no Brasil. Rio de Janeiro: Interciência, 2003.
FRAENKEL, P. L. New developments in tidal
and wavepower technologies. In: SILVER
JUBILEE CONFERENCE: TOWARD A
RENEWABLE FUTURE. CONFERENCE
C73 OF THE SOLAR ENERGY SOCIETY.
Proceedings... Brighton, UK. 1999.
TOLMASQUIM, M. T. (Org.) Fontes
renováveis de energia no Brasil. Rio de Janeiro: Interciência, 2003.
UNITED NATIONS DEVELOPMENT
PROGRAMME – UNDP. World energy
assessment: energy and the challenge of
sustainability. New York, 2000.
WAVE ENERGY CENTER – WEC. Wavenet
full report. Lisbon, 2003.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
215
216
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
O dever do estado de fornecimento do interferon
peguilado a pacientes portadores de hepatite C1
ELIZIANI VEDOY DA SILVA2
PAULA PELLIZZER DAL’PIZZOL3
GERMANO ANDRÉ DOERDELEIN SCHWARTZ4
RESUMO
O presente artigo procura conceituar o que é hepatite C e as formas de seu tratamento pelo Interferon
Peguilado, o medicamento mais avançado e oneroso indicado para o tratamento. Busca, também, analisar o direito do cidadão em receber do Estado o fármaco tendo em vista a escassez de recursos econômicos e a rotineira alegação da reserva do possível por parte do Estado.
Palavras-chave: Dever do Estado, direito à saúde, hepatite C, Interferon Peguilado, reserva do possível.
ABSTRACT
The present article explain what is hepatite C and its healing through the Interferon Peguilado, the most
advanced and expensive medicine specified for the treatment. By the end, it explains the rights of the
citizens for the medication and the scarce of resouces (the reserve of the possible).
O artigo é resultado de pesquisa realizada junto ao programa de Pós-Graduação em Direito da ULBRA/Canoas.
Foi financiado por essa instituição e faz parte do projeto de
pesquisa “Direito à saúde e teorias Jurídico-Contemporâneas”, conectado ao grupo de pesquisa CNPq
“Constitucionalismo e Direitos Fundamentais.”
1
Acadêmica do curso de Direito/ULBRA. Bolsista PROICT/ULBRA
2
Acadêmica do curso de Direito/ULBRA. Bolsista Voluntária
de Iniciação Científica da ULBRA
3
Professor/Orientador do Curso de Direito/ULBRA e UPF e
do PPG em Direito/ULBRA ([email protected])
4
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
217
Keywords: Hepatite C, Pegylated Interferon, right to the health, reserve of the possible.
INTRODUÇÃO
O artigo tem como objetivo principal a análise
do fornecimento gratuito do medicamento
Interferon Peguilado a partir da temática da Reserva do Possível. Essa questão assumiu grande relevância nas discussões jurisprudenciais no Brasil. Um
dos pilares dessas discussões é, segundo os entes federativos, a economia brasileira, que não possui condições de assegurar esse direito aos cidadãos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país5 .
O assunto é de extrema relevância tanto para
as pessoas que solicitam esse direito quanto para o
Poder Judiciário que tenta, assim, preservar o Direito à Vida – Direito Absoluto – diante da disposição orçamentária do país. O Estado não pode
deixar de fornecer o medicamento, não só porque
tal negativa é insubsistente, mas também porque
a Carta Magna assegura esse direito a todos os cidadãos6 , qualificando-o como dever do Estado.
Diante de tantas discussões, o Poder Judiciário do nosso País vê-se obrigado a decidir entre a consecução da saúde ou a preservação da economia. Esse dilema social gera a
problemática sobre o que é mais importante:
o direito à vida ou o direito do Estado de pre-
5
Artigo 5º, “caput”, CF/88: ‘Todos são iguais perante a lei,
sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade,
à segurança e à propriedade...’
Conforme o artigo 196 da Constituição Federal Brasileira
de 1988: ‘A saúde é direito de todos e dever do Estado,
garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e
6
218
servar o orçamento previsto. Eis, portanto, o
assunto do presente artigo, observado mediante pesquisa bibliográfica e analisado pelo
método analítico reflexivo.
O conceito e as conseqüências
da Hepatite C
A Hepatite é uma doença caracterizada pela
inflamação do fígado7 , gerando desde pequeno
até um grande grau de destruição das células
hepáticas. Existem vários tipos de Hepatites. As
mais comuns são a Hepatite A, B e C. De uma
forma geral, a Hepatite pode ser transmitida por
via viral, auto-imune8 , por reação ao álcool, por
drogas e por medicamentos.
A Hepatite C pode manifestar-se, inicialmente, de duas formas: aguda e crônica. A
forma aguda acentua-se nos seis primeiros
meses, aproximadamente, a partir da data de
contagio. A grande maioria é assintomática
(não causa sintomas) e anictérica (causa sintomas). Essa fase é demasiadamente complicada, pois pode ocorrer uma evolução do caso
sem saber que se tem a doença, resultando
assim, na cirrose.
ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para
sua promoção, proteção e recuperação.’
PACIONIR, Rodolfo. Dicionário Médico. 3ª edição/Rio de
Janeiro: Guanabara Koorgan, 1985, p.. 321.
7
Segundo Coutinho, auto-imunidade é o processo em que
se formam anticorpos contra um componente dos tecidos
do próprio individuo, ou em que o mesmo antigénio produz
uma sensibilização específica. Esta tolerância pode levar a
quadros de doença. Pg. 250-251.
8
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Por outro lado, a segunda fase, chamada de
crônica, pode, também, não apresentar sintomas
(assintomática) ou apresentar sintomas
inespecíficos até que apareçam as lesões no fígado
(cirrose) e câncer hepático. Estima-se que atualmente, o VHC9 seja responsável por 60% das doenças crônicas de fígado. È a principal indicação
de transplantes hepáticos nos países desenvolvidos10 . É importante detectar a Hepatite na fase
aguda, pois a doença pode tornar-se crônica. Cerca de um terço dos pacientes “evoluem” de forma
rápida para a cirrose. Tal fato pode ocorrer em um
período de aproximadamente 20 anos após a infecção.11 No entanto, a maioria dos pacientes só
percebe o diagnóstico positivo da doença na fase
crônica, muitas vezes anos após a infecção.
O VHC é transmitido pelo contato com sangue contaminado, tendo como fatores de risco específicos a transfusão de hemoderivados, usuários
de drogas endovenosas, hemodiálise, relações sexuais, uso de cocaína intranasal, tatuagem,
“piercing”, acupuntura, contatos domiciliares (extremamente baixo), transmissão vertical (de mãe
para filho), transmissão profissional, entre outros.
De outra banda, essa doença pode ser
diagnosticada através de dois testes: os exames
sorológicos que detectam a presença de anticorpos
9
VHC - Vírus da Hepatite C
contra o VHC pela famosa técnica de ELISA12
ou pelos testes moleculares que detecta as partículas virais. Na década de 70, com o desenvolvimento dos testes sorológicos para diagnóstico das
Hepatites A e B, notou-se uma grande tendência de ser crônica13 , não possibilitando chamá-la
de Hepatite A e nem de Hepatite B.
Por volta de 1989 foi constatada a existência
de um anticorpo nos seres humanos contra uma
Hepatite não identificada, recebendo, inicialmente, o nome de Hepatite não A e não B. Em
1990, foi descoberto o RNA do vírus da Hepatite não A e não B, que, posteriormente, recebeu
o nome de Hepatite C (VHC). Essa doença tornou-se um problema de saúde pública, pois, atualmente, existe no mundo um número crescente maior de pessoas infectadas por esse vírus,
Hepatite C, do que pelo vírus HIV.14
No entanto, frise-se que com o desenvolvimento tecnológico, as hepatites por vírus, conhecidas
desde os tempos remotos, puderam ser mais bem
estudadas e compreendidas nas últimas décadas15 .
Contudo, há estimativas de que mais de cem milhões de pessoas16 , no mundo todo, já estejam
infectados com o VHC. Todavia, a maior frustração
dos cientistas e pesquisadores é que a prevalência
dos seis diferentes genótipos e 30 sorotipos atual-
PACIONIR, Rodolfo. Dicionário Médico. 3ª edição/Rio de
Janeiro, Guanabara Koorgan, 1985. P. 186.
AYUB, Munir Akar – Hepatite C – RBM – Revista Brasileira de
Medicina – Volume 57 – Número 5 – Julho de 2000. p. 680.
14
MINCIS, Moysés – Hepatite C - RBM – Revista Brasileira
de Medicina. – Volume 64 – Número 5 – Maio de 2007. p.
204.
15
10
11
Enzyme Linked Immuno Sorbent Assay, um teste
imunoenzimático que permite a detecção de anticorpos.
FIGUEIREDO, Mendes T.; PITELLA, Ana Maria – Recentes
avanços em Hepatites – 1993 – Editora BYK – São Paulo. P. 80
12
13
Crônico: de longa duração, o oposto de agudo.
MINCIS, Moysés – Hepatite C - RBM – Revista Brasileira
de Medicina. – Volume 64 – Número 5 – Maio de 2007. p.
202.
Figueiredo, Mendes T.; PITELLA, Ana Maria – Recentes
avanços em Hepatites – 1993 – Editora BYK – São Paulo. P.
79.
Estimativa da Organização Mundial de Saúde. AYUB,
Munir Akar – Hepatite C – RBM – Revista Brasileira de
Medicina – Volume 57 – Número 5 – Julho de 2000. p. 680
16
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
219
mente descritos é variável para cada região do globo terrestre. Essa possibilidade de mutação genotípica
gera dificuldades e/ou pode diminuir a sensibilidade dos testes antigênicos17 .
Tal implicação na patogênese, e sua variabilidade genotípica, dificultam a adequação do VHC ao
tratamento correto. Atualmente, o medicamento
mais utilizado é o Interferon Peguilado. Porém, existem alguns genótipos que não respondem bem a
ele, como, por exemplo, o VHC 1b. Isso se dá porque, nos indivíduos portadores da infecção, quando de longa duração, o Interferon Peguilado pode
acarretar lenta modificação na seqüência dos
nucleotídeos, ocasionando a produção de vírus diferente do originalmente infetado, o que impossibilita a obtenção de vacinas para prevenção deste.
O Interferon Peguilado
De acordo com Mike Edelhart18 , o Interferon
é uma proteína que o organismo produz regularmente. Sua função consiste em proteger as células das devastadoras invasões. Ao sentir-se
ameaçado, o organismo transforma as células em
fábricas de Interferon bastante eficientes, com
o intuito de salvar as células restantes, sempre
que possível.
Mike Edelhart descreve, ainda, que o
Interferon é a primeira linha de defesa do organismo contra um ataque concentrado. Segundo
AYUB, Munir Akar – Hepatite C – RBM – Revista Brasileira de
Medicina – Volume 57 – Número 5 – Julho de 2000. p. 681.
17
EDELHART, Mike. INTERFERON: A NOVA ESPERANÇA
CONTRA O CANCER. Tradução Dr. Jean Lindermann e Dr.
Sérgio Augusto Teixeira. Coleção Ciência. Livraria Francisco
Alves Editora S/A. Rio de Janeiro. F. Alves, 1983. p. 27
18
19
220
EDELHART, Mike. INTERFERON: A NOVA ESPERANÇA
ele, o entendimento de todas as propriedades do
Interferon, inclusive as que se referem às células
cancerosas, baseia-se na compreensão da maneira como a proteína entra em ação quando os vírus atacam. Nesse sentido, as células do organismo humano não são somente atacadas pelo vírus.
São forçadas a trabalhar por si mesmas, até a
morte, na produção de novos materiais para o vírus.19 Diante disso, pode-se imaginar que haveria uma grande expansão do vírus, que tomaria
todo o organismo humano. Porem, os vírus são
limitados e somente um vírus de cada vez pode
tentar a conquista do organismo.
O Interferon é um sistema de alarme doméstico. Durante as operações habituais da
célula as duas ordens se neutralizam e a célula
não produz Interferon. Sob certas
circunstancias, todavia, o “sinal vermelho” se
apaga, o “sinal verde” se acende, e a célula
entra em ação. Eis o Interferon. Sua função no
organismo humano é a de alertar as células
contra o invasor genético. Avisa, também, o
organismo contra atividades processadas no
interior e que poderão prejudicar-lhe.
De acordo com Edelhart, o Interferon não
ataca nem mata nada. Não possui muito efeito
sobre a célula que o produz. Os poderes dessa
proteína beneficiam as células circundantes.
Trata-se de uma sentinela cujos avisos tornam a
comunidade capaz de defender-se de si própria.20
CONTRA O CANCER. Tradução Dr. Jean Lindermann e Dr.
Sérgio Augusto Teixeira. Coleção Ciência. Livraria Francisco
Alves Editora S/A. Rio de Janeiro. F. Alves, 1983. p. 28
EDELHART, Mike. INTERFERON: A NOVA ESPERANÇA
CONTRA O CANCER. Tradução Dr. Jean Lindermann e Dr.
Sérgio Augusto Teixeira. Coleção Ciência. Livraria Francisco
Alves Editora S/A. Rio de Janeiro. F. Alves, 1983. p. 34
20
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Com o surgimento da Hepatite C, na década de 80, e com as evoluções nos estudos sobre
o Interferon, observou-se a droga como o primeiro agente eficaz contra tal infecção. Seus
mecanismos de ação são a inibição da replicação
viral, indução da defesa e a amplificação da resposta imune do organismo hospedeiro ao vírus.21
O tratamento com o Interferon tem demonstrado efeitos cada vez mais positivos. No início
foi utilizado como monoterapia. Logo após,
mixou-se em combinação com a ribavarina; e,
finalmente, com uma combinação de interferon
peguilado e ribavarina.
Os resultados dos estudos conduzidos utilizando uma terapia com interferon peguilado
alfa-2a e alfa-2b em pacientes com infecção crônica pelo VHC estabeleceram a superioridade
desse novo tratamento sobre as formas convencionais do interferon alfa.22 Nessa linha de raciocínio, segundo Ruy Neto, ambas as formas de
apresentação do interferon peguilado representam uma melhoria na qualidade de vida do paciente, não só no que diz respeito à utilização
do medicamento, mas também por implicar na
redução dos índices de efeitos colaterais.23
RUIZ, Fernando J. G. Neto; SYLBERGELD, David. Revista
Brasileira de Medicina. Volume 61, número 11. Ed. Moreira
Jr. LTDA, novembro, 2004. p. 720
21
RUIZ, Fernando J. G. Neto; SYLBERGELD, David. Revista
Brasileira de Medicina. Volume 61, número 11. Ed. Moreira
Jr. LTDA, novembro, 2004. p. 721
22
RUIZ, Fernando J. G. Neto; SYLBERGELD, David. Revista
Brasileira de Medicina. Volume 61, número 11. Ed. Moreira
Jr. LTDA, novembro, 2004 p. 721
23
Mesmo com grandes avanços e pesquisas que
revelam, cada vez mais, que o interferon
peguilado seria o único medicamento que possibilitaria a qualidade de vida dos portadores
do VHC, seu custo é oneroso demais para a
maioria da população.
O medicamento encontra-se disponibilizado
na lista de medicamentos fornecidos gratuitamente pelo Estado24 . Contudo, tal fornecimento não é rotineiro. Assim sendo, importante registrar que a demora para seu acesso pode acarretar diversos agravantes na saúde do paciente.
A razão para a negativa de seu fornecimento é
repetida, como um mantra, pelo Estado: não
existem recursos financeiros em quantidade suficiente.
Dessa forma, a única alternativa ao cidadão
é o ingresso de demanda judicial, requerendo a
efetivação de seu direito à vida e de seu direito
à saúde. Trata-se, portanto, de questão travada
diante de uma lógica perversa (saúde ou economia). Deve-se, assim, a partir da ótica do sistema jurídico, perceber sua resolução por intermédio das premissas decisórias legais existente
a respeito do tema.
Rio Grande do Sul. LEI Nº 9.908, DE 16 DE JUNHO DE
1993. Art. lº - O Estado deve fornecer, de forma gratuita,
medicamentos excepcionais para pessoas que não puderem prover as despesas com os referidos medicamentos,
sem privarem-se dos recursos indispensáveis ao próprio
sustento e de sua família.
24
Parágrafo único - Consideram-se medicamentos excepcionais
aqueles que devem ser usados com freqüência e de forma
permanente, sendo indispensáveis à vida do paciente.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
221
A Saúde : direito de todos os
cidadãos brasileiros?
A busca pela saúde existe desde o inicio da
humanidade. No início da civilização a saúde
era vista como uma forma de “cura” 25 dos males
que afligiam a sociedade. Hoje (a saúde) é vista pela perspectiva da “prevenção”. É nesse sentido que o preâmbulo da Constituição da Organização Mundial de Saúde (OMS), órgão da
ONU, refere que “a saúde é o completo bemestar físico, mental e social e não apenas a ausência de doenças”. 26
Por outro lado, o direito à saúde é um direito
social27 . Os direitos sociais, por seu turno, são
direitos de caráter prestacional. Têm por objetivos assegurar a todas as pessoas direitos materiais necessários para sua sobrevivência. Por isso,
exigem a interferência do Estado para diminuir
as desigualdades sociais28 . Logo, é função do Estado transferir as condições mínimas existenciais (saúde) à sociedade civil.
Lembrando: os direitos sociais estão garantidos por meio de normas constitucionais (artigo
6º da Constituição Federal de 1988). Têm como
característica principal serem direito direitos a
ações positivas, no sentido de garantia/
efetividade da saúde. Carregam, portanto uma
carga de mudança na realidade social.
Como exemplo tem-se a “Peste Negra” que assolou a
Europa durante o século XIV.
25
Marco teórico-referencial do conceito de saúde publicado em 26 de julho de 1946.
26
Artigo 6o da Constituição Federal de 1988: “São direitos
sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer,
a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma
desta Constituição.”
27
222
Dito resumidamente: o direito à saúde, e,
assim, ao fornecimento do Interferon Peguilado
para os portadores de Hepatite C, requer do
Estado uma ação, uma posição de garantidor.
Por isso é incabível, desde o ponto de vista da
Constituição Federal de 1988, ações positivas
fáticas pelo Estado, com é exemplo a omissão no
fornecimento de medicamentos e/ou de tratamentos médicos para pessoas que possuem condições financeiras de adquirirem o que necessitam por vias particulares sem prejudicarem a sua
subsistência e de sua família. 29
Registre-se que o requisito supra faz parte
de um intricado jogo entre a existência de recursos e a necessidade da preservação da vida
dos jurisdicionados. A lei, “Todavia, quando
assim disciplina, o faz para toda a sociedade gaúcha, não fazendo diferenciação entre os que
possuem x ou y tipo de enfermidade – o que
inclusive seria vedado pelo Princípio Constitucional da Igualdade e Impessoalidade vigentes.”30 O Brasil possui latente desigualdade social. Dessa maneira, tal requisito, não previsto
na Constituição Federal, foi implantado pela jurisprudência pátria para não sobrecarregar a Economia Brasileira, e, em conseqüência o Estado.
De fato, tal posicionamento é fruto de evolução do trato da saúde pelo Poder Judiciário.
Discorda-se, entretanto, da preponderância do
requisito econômico. Pugna-se, aqui, pela mai-
28
Artigo 3º da Constituição Federal de 1988.
LEIVAS, Paulo Gilberto Cogo. Teoria dos direitos fundamentais sociais. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2006. p. 87
e 88.
29
LEAL, Rogério Gesta. A efetivação do direito à saúde por
uma jurisdição-serafim: limites e possibilidades. p. 1532. In
: REIS, Jorge Renato do; ____ (Org.) Direitos Sociais e
Políticas Públicas : desafios contemporâneos. Tomo 7.
Santa Cruz do Sul : Edunisc, 2007.
30
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
or valoração do perigo de morte. Com isso, preserva-se a vida, não sendo importante a realidade financeira do cidadão – e, no caso, a do
Estado, pois ele é erigido em função de um contrato social que o proíbe de condenar à morte
qualquer um de seus cidadãos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A posição de que não se pode fornecer
Interferon Peguilado a quem possua condições
financeiras não encontra respaldo na sistemática constitucional brasileira. Veja-se. O artigo 196 da Carta Maior afirma que a saúde é
um direito absoluto ao mencionar que ela é
direito de todos e dever do Estado, cujo acesso deve ser universal e igualitário. A Constituição diz mais: a saúde é o completo bem estar do indivíduo, e deve ser assegurada pela
forma de promoção, de proteção e de recuperação. Portanto, a saúde não é apenas ausência de doenças, mas sim o bem-estar físico,
mental e social, integrando o conceito de
qualidade de vida:
“O direito à saúde integra o conceito de
qualidade de vida, porque as pessoas em
bom estado de saúde não são as que recebem bons cuidados médicos, mas sim
aquelas que moram em casas salubres,
comem uma comida sadia, em um meio
SCHWARTZ, Germano André Doederlein. Direito à saúde: efetivação em uma perspectiva sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 40.
31
LEAL, Rogério Gesta. A efetivação do direito à saúde por
uma jurisdição-serafim: limites e possibilidades. p. 1532. In
: REIS, Jorge Renato do; ____ (Org.) Direitos Sociais e
Políticas Públicas : desafios contemporâneos. Tomo 7.
32
que lhes permite dar à luz, crescer, trabalhar e morrer.”31
A saúde é, assim, uma junção de vários fatores. No entanto, para tê-la, como requisito primordial, é necessário estar vivo. Logo, o fornecimento de tratamentos médicos é de extrema relevância. Nenhuma regra hermenêutica pode
sobrepor-se ao principio maior estabelecido, em
1988, pela Constituição Federal, de que a saúde
é um direito de todos e dever do Estado
(art.196).”32 . Nem mesmo a questão econômica.
É, mais, uma questão de direitos humanos,
pois “os direitos fundamentais, de certa forma,
são também sempre direitos humanos, no sentido de que seu titular sempre será o ser humano,
ainda que representado por entes coletivos (grupos, povos, nações, Estados). ”33 Eles (os direitos fundamentais) nascem e se desenvolvem junto com a Constituição na qual foi assegurado,
direito interno, e é sob essa ótica que devem ser
analisados.
É verdade que o direito à saúde teve um
enorme avanço no ordenamento jurídico contemporâneo quando foi positivada a Constituição Federal Brasileira em 1988. A Carta Magna
vigente “foi a primeira na história do
constitucionalismo pátrio a prever um título próprio destinado aos princípios fundamentais.” 34
Consolidou o Estado Democrático de Direito35 ,
com os fundamentos que enuncia em seu artigo
Santa Cruz do Sul : Edunisc, 2007. p. 1528.
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998. p. 31.
34
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana
e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 61.
35
Preâmbulo da Carta Magna de 1988.
33
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
223
1º, incisos I ao V: um compromisso assumido pela
sociedade, exercido através de seus representantes, buscando a efetivação da justiça social
com resultado na qualidade de vida.36 A adoção do critério econômico para o fornecimento
do Interferon Peguilado configurar-se-ia, assim,
em perfeito retrocesso social.
No mais, gize-se que a positivação do princípio da dignidade da pessoa humana é relativamente recente em nosso ordenamento jurídico. Todavia, ela realça a importância da
efetivação do direito à saúde. Esse princípio
fundamental37 vem previsto no artigo 1º, inciso
III, da Lei Fundamental: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel
dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de
Direito e tem como fundamentos: III - a dignidade da pessoa humana.”
AYUB, Munir Akar. Hepatite C. Revista
Brasileira de Medicina, v. 57, n.5, p. 680692, jul. 2000.
CÉU COUTINHO, A. Dicionário Enciclopédico de Medicina. 3. ed. Lisboa: Argo Editora, 1997. 592p.
EDELHART, Mike. Interferon: a nova esperança contra o cancer. Tradução Jean
Lindermann; Sérgio Augusto Teixeira. Rio de
Janeiro: Livraria Francisco Alves Editora S/
A. , 1983. (Coleção Ciência).
FIGUEIREDO, Mendes T.; PITELLA, Ana
Maria. Recentes avanços em Hepatites. São
Paulo: Editora BYK, 1993. 191 p.
LEAL, Rogério Gesta. A efetivação do direito à
saúde por uma jurisdição-serafim: limites e possibilidades. p. In : REIS, Jorge Renato do; LEAL,
Rogério Gesta (Orgs.). Direitos Sociais e Políticas Públicas : desafios contemporâneos. Tomo
7. Santa Cruz do Sul : Edunisc, 2007.
A dignidade da pessoa humana tem uma
vasta amplitude no contexto de um Estado Democrático de Direito – caso do Brasil- . Ela repudia todo e qualquer modo de
instrumentalização do ser humano. 38 Dessa
maneira, a saúde deve ser assegurada ao indivíduo, independente de qualquer condição financeira, visando sua condição humana. Reconhece-se, assim, que é o Estado que existe em função do cidadão e não o cidadão em função do
Estado, deixando clara a obrigação prestacional
do Estado em relação à sociedade civil no que
tange ao fornecimento do Interferon Peguilado
para pacientes portadores do vírus HIV.
PACIORNIK, Rodolfo. Dicionário Médico.
3.ed.. Rio de Janeiro: Guanabara Koorgan,
1985. 903 p.
Qualidade de vida está diretamente relacionado com a
saúde.
direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 68.
36
37
224
REFERÊNCIAS
LEIVAS, Paulo Gilberto Cogo. Teoria dos
direitos fundamentais sociais. Porto Alegre:
Livraria do Advogado Ed., 2006.
MINCIS, Moysés. Hepatite C. Revista Brasileira de Medicina, v.64, n.5, p.202-207. Maio 2007.
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
RUIZ NETO, Fernando J. G.; SYLBERGELD,
David. Revista Brasileira de Medicina, v.61,
n.11, nov., 2004
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 1998.
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na
Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.
SCHWARTZ, Germano André Doederlein.
Direito à saúde: efetivação em uma perspectiva sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
225
Engenharias
228
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Desenvolvimento de um sistema de controle de
movimento baseado em atuadores de ligas flexíveis
com memória
FÁBIO BAIRROS1
ANDRÉ LUIS BIANCHI2
VALNER JOÃO BRUSAMARELLO3
JOÃO CARLOS VERNETTI DOS SANTOS4
RESUMO
O presente projeto apresenta o desenvolvimento de um sistema de controle de movimento para atuadores
baseados em arranjos de elementos de liga de memória de forma (SMA) eletricamente aquecidos. Esses
atuadores, quando aquecidos eletricamente, produzem um movimento mecânico. Neste trabalho é
construído e testado um sistema microprocessado que incorpora uma estratégia de aquecimento rápido da
liga através de um PWM, para fazer o controle de movimento e velocidade de resposta deste dispositivo.
Palavras-chave: Atuadores de lida de memória, sistema de controle, controle elétrico de movimento.
ABSTRACT
This work presents the development of a system aimed to an actuator based on an electrically heated Shape
Memory Alloy (SMA). After being deformed from its original crystallographic configuration, the SMAs have a
1
Acadêmico de Engenharia Elétrica/ULBRA, bolsista
PROICT/ULBRA
2
Professor da Escola São Lucas/ULBRA
3
Professor do Curso de Engenharia Elétrica/ULBRA
4
Professor/Orientador do Curso de Engenharia Elétrica/
ULBRA e do PPG em Engenharia: Engenharia, Ambiente e
Materiais/ULBRA ([email protected])
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
229
temperature-dependent property, which allow regaining its original geometry. Thus, under heating, the SMA
specimen produces a mechanical movement. In this paper, a microcontroller is employed to develop a PWM for
controlling the SMA’s temperature and so, controlling the displacement and velocity of the device.
Keywords: Shape memory alloys bared actuators, motion control system, control system.
INTRODUÇÃO
Ligas especiais são usadas como atuadores de
estado sólido que se movem por reestruturação
molecular, conhecidos como atuadores de memória de forma (SMA). Trata-se de um fio de
pequeno diâmetro que contrai como músculos
quando é alimentado com corrente elétrica, por
isto o elemento também é conhecido vulgarmente por músculo eletrônico. Esta habilidade de
flexionar é característica de ligas que mudam
suas estruturas internas dinamicamente sob determinadas temperaturas. Este atuador pode
aquecer e esfriar rapidamente.
Ligas de Memória de forma (cuja siga em inglês
é SMA, de Shape Memory Alloy) têm uma variedade de usos tanto em robótica como em aplicações
não robóticas. Aplicações incluem atuadores em
endoscópios ativos (IKUTA et al., 1988), atuadores
de robóticos (HIROSE et al., 1985; REYNAERTS
e VAN BRUSSEL, 1998; MOSLEY e
MAVROIDIS, 2001) e micro-atuadores (TROIS
FONTAINE et al., 1998; YAO et al., 2004). Estes
atuadores apresentam inúmeras vantagens entre as
quais se cita a sua simplicidade mecânica, a alta
relação de potência/peso, tamanho reduzido, operação silenciosa e livre de faíscas. Entre as suas
desvantagens estão à baixa eficiência, histerese e
são considerados de resposta lenta.
Em aplicações de robótica, fatores como velocidade, precisão, controlabilidade e a habilidade
para ter movimento contínuo são muito importan-
230
tes. Por isto, atuadores baseados em dispositivos
de SMA são arranjados tipicamente como pares
antagônicos. Eles são aquecidos por efeito joule,
ou seja, passando uma corrente elétrica pelo elemento, e são resfriados por meio de transferência
de calor para o ambiente. Portanto, são os regimes
de aquecimento e resfriamento que determinam a
velocidade de resposta de atuadores de SMA.
Várias pesquisas têm sido conduzidas para investigar atuadores baseados em ligas SMA em aplicações de controle de movimento rápido e preciso
(WELLMAN et al., 1988; GRANT, 1999;
REDINIOTIS et al,. 2002; ELAHINIA at al., 2004).
O aumento da velocidade de atuadores pode
ser obtido aumentando a taxa de resfriamento, através de resfriamento forçado com ar ou água, ou ainda, usando elementos de SMA mais delgados. Por
outro lado, para aumentar a taxa de aquecimento,
o único método é fazer circular uma corrente maior
através do elemento. Porém, o elemento de SMA
corre o risco de aquecer demais, sendo então danificado, se uma corrente maior que um certo valor
seguro for aplicada durante um período de tempo
de longa duração. Este valor seguro pode ser encontrado freqüentemente nos catálogos com características técnicas destes elementos.
Para melhorar a velocidade de resposta,
Kuribayashi (1991) propôs o monitoramento da
temperatura do SMA, usando esta informação
para determinar o nível de corrente através do
atuador. Ele mediu diretamente a temperatura
do elemento de SMA usando um termopar de
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
tamanho miniatura. Se a temperatura ultrapassar um limite prefixado, a corrente de aquecimento é reduzida. Caso contrário, uma corrente grande de aquecimento é aplicada. O resultado de incorporar este mecanismo de avaliação de temperatura proporciona uma grande
melhoria nos tempos de resposta do atuador.
Alternativamente, a resistência de elementos de
SMA varia durante a transformação de fase, e estas
informações podem ser usadas para substituir o mecanismo de avaliação de temperatura proposto por
Kuribayashi (1991). A vantagem desta estratégia é
que elimina a necessidade de instalação especial
de sensor de temperatura miniatura para determinar o estado do SMA. Featherstone e Teh (2004)
usam a avaliação da medida de resistência incorporada como mecanismo de limitação de corrente
em um sistema de controle de movimento.
Neste trabalho é feita uma avaliação do desempenho de um elemento SMA através da aplicação de uma corrente, e indiretamente da temperatura, controlada por um microcontrolador.
MATERIAL E MÉTODOS
A Tabela 1 mostra as características técnicas de ligas SMA comerciais. Neste trabalho,
utilizou-se um fio de 0,015 mm de diâmetro
(0,006 polegadas).
Tabela 1 - Características técnicas de ligas SMA de diferentes diâmetros.
Para a realização dos testes na liga metálica foi
implementado um circuito de atuação que consis-
te basicamente em um dispositivo
microcontrolador, que comanda o movimento da
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
231
liga (Figura 1). Esse comando é realizado por um
modulador de largura de pulso, o qual possui a
função de controlar a corrente média que circula
pelo SMA de acordo com a contração desejada.
Figura 1 – Diagrama de blocos simplificado do hardware desenvolvido.
Para implementar o controle, foi empregado o
microcontrolador PIC167872. As medições da corrente e tensão são executadas com o auxílio de dois
multímetros. E com estes dados pode-se, através de
cálculo, obter a resistência e potência elétrica.
basicamente consiste em manter um sinal pulsante –
PWM para o acionamento do SMA mantendo controlada a corrente e a tensão, evitando, desta forma,
que a liga seja danificada através do rompimento do
fio e/ou a perda da característica de flexibilidade.
O software de controle foi desenvolvido em linguagem C e o procedimento utilizado no software
A Figura 2 mostra o fluxograma simplificado
utilizado na implementação.
Figura 2 – Fluxograma simplificado do software implementado.
232
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
A liga foi acomodada em uma estrutura de
madeira, de modo a permanecer tensionada,
sendo sustentada por um dinamômetro que foi
utilizado pára medir a força exercida quando
a liga fosse percorrida por corrente elétrica.
Para determinar o deslocamento ou a contração sofrida pelo material, uma escala
milimétrica foi anexada ao suporte. A Figura
3 mostra o protótipo montado para a realização dos testes.
Figura 3 – Protótipo desenvolvido para a realização dos testes.
RESULTADOS
Os testes mostraram que com a aplicação de
uma excitação do tipo pulso quadrado, a liga
SMA começa a responder mecanicamente após
0,5 s, esta resposta é verificada com a contração
da mesma. Sem sofrer influência da corrente
elétrica, observa-se que o elemento retorna ao
ponto de partida, sem que se verifiquem alterações no comprimento.
Como procedimento de teste, foi aplicada
uma corrente inferior a recomendada pelo fabricante que era de 400mA para ligas de 0,006
mm², no tempo de 2 segundos, para que o material entre em regime permanente de aquecimen-
to, contraindo-se. O valor estabelecido para cada
pulso foi em torno de 380mA.
Com isto observou-se que a liga manteve sempre o mesmo movimento de contração com a
corrente, e após 4s de inatividade a liga voltou
ao tamanho normal, não se observando alterações no comprimento inicial da liga. No período
em que ela estava sob ação da corrente elétrica
a contração verificada foi de 1,5mm, constante.
Este procedimento foi realizado 30 vezes.
Os dados obtidos nos testes estão apresentados de forma resumida, apenas 15 ensaios,
pois não se observou alteração nos demais, na
Tabela 2.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
233
Tabela 2 – Ensaios com a liga SMA.
CONCLUSÃO
Neste trabalho, foram avaliados amostras, tipo
fio, de ligas SMA como atuadores. Foi desenvolvido um sistema baseado em um
microcontrolador, o qual teve a função de fazer
o controle da temperatura nas amostras. Este
sistema de controle de temperatura foi
implementado, injetando corrente elétrica, com
um PWM, o qual, através de efeito joule do próprio fio provocava um movimento mecânico.
Dessa forma, foi possível desenvolver um
algoritmo para o controle do deslocamento e
velocidade do dispositivo.
Na avaliação das ligas SMA através da aplicação de uma corrente controlada por um
microcontrolador, o elemento correspondeu ao
resultado esperado sem que fosse verificado dano
ou alteração na estrutura física da liga. Dessa
forma, este estudo mostrou que é possível utili-
234
zar o elemento SMA sem a necessidade de um
sensor de temperatura. Os resultados observados também mostraram que é possível fazer o
controle destes dispositivos, utilizando a estratégia adotada, no entanto, é preciso aprimorar
o trabalho visando aumentar a velocidade de
resposta.
As ligas SMA ainda não são aplicadas na indústria, mas já é uma realidade nos estudos da
medicina e robótica, e em trabalhos futuros, espera-se desenvolver uma aplicação nesse sentido.
REFERÊNCIAS
ELAHINIA, M. H. et al. Nonlinear stressbased control of a rotary SMA-actuated
manipulator. Journal of Intelligent
Materials Systems & Structures, v.15, n.6,
p. 495-508, 2004.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
FEATHERSTONE, R.; TEH, Y. H.
Improving the speed of shape memory alloy
actuators by faster electrical heating . In:
International Symposium Experimental on
Robotics, 9., 2004, Singapore. Proceedings...
Singapore, 2004. Paper ID 128.
MOSLEY, M. J.; MAVROIDIS, C. Experimental nonlinear dynamics of a shape memory
alloy wire bundle actuator Transactions
ASME, Journal of Dynamic Systems,
Measurement & Control, v.123, n.1, p 103112, 2001.
GRANT, D. Accurate and rapid control of
shape memory alloy actuators. 1999. Thesis
(PhD) - Centre for Intelligent Machines,
McGill University ,1999.
REDINIOTIS, O. K. et al. Development of
a shape-memory-alloy actuated biomimetic
hydrofoil. Journal of Intelligent Material
Systems & Structures, v.13. p 35-49, 2002.
HIROSE, S.; IKUTA, K.; UMETANI, Y. A new
design method of servo-actuators based on the
shape memory efect. In: MORECKI, A.;
BIANCHI, G.; KEDZIOR, K. (Eds.). Theory
and practice of robots and manipulators.
Cambridge: MIT Press, 1985. p 339-349.
REYNAERTS, D.; VAN BRUSSEL, H.
Design aspects of shape memory actuators.
Mechatronics, v.8, p 635-656, 1998.
IKUTA, K.; TSUKAMOTO, M.; HIROSE,
S. Shape memory alloy servo actuator system
with electric resistance feedback and
application for active endoscope In: IEEE
INTERNATIONAL CONFERENCE ON
ROBOTS AND AUTOMATION, 1988,
Philadelphia. Proceedings... Philadelphia:
IEEE,1988. p 427-430.
KURIBAYASHI, K. Improvement of the
response of an SMA actuator using a
temperature sensor. The International
Journal of Robotics Research, v.10, n.1, p
13-20, 1991.
TROISFONTAINE, N.; BIDAUD, P.;
DARIO, P. Control experiments on two SMA
based micro – actuators. In: CASALS, A.;
ALMEIDA, A. T. (Eds.). Experimental
Robotics V. London: Springer, 1998. p 490499.
WELLMAN, P. S. et al. Mechanical design
and control of a high-bandwidth shape
memory alloy tactile display. In: CASALS,
A.; ALMEIDA, A. T. (Eds.). London:
Springer, 1998. p 56-66.
YAO, Q.; JIN S.; MA, P. The micro trolley
based on SMA and its control system. Journal
of Intelligent and Robotic Systems, v.39, p
199-208, 2004.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
235
236
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
O efeito da corrosão do aço no concreto aparente com cimento portland branco: um problema que
se apresenta quando da concepção do projeto
arquitetônico
AMILTON SANGOI ANTUNES1
CARLOS FERNANDO GUIMARÃES SEFFRIN2
LUCIANO MILESI MACIEL3
RONALDO TOMAZI3
MARCOS ALBERTO OSS VAGHETTI4
RESUMO
O concreto estrutural branco traz desafios para tecnologistas e pesquisadores no sentido de compreender melhor seu desempenho frente às agressividades do meio. Procura-se, através desse trabalho, contribuir para um problema que está se tornando importante para as obras em Concreto Branco, que é a
corrosão do aço no interior desses concretos. A pesquisa que originou este trabalho está sendo desenvolvida na ULBRA/Santa Maria/RS, em parceria com a UFSM e tem por objetivo verificar, experimentalmente, os efeitos causados pela corrosão das armaduras no concreto aparente, com cimento Portland branco,
dando ênfase para essa importante manifestação patológica que, cada vez mais, preocupa os projetistas e
empreendedores dessas obras especiais.
Palavras-chave: Corrosão, concreto branco, carbonatação, cimento portland branco.
1
Acadêmico do Curso de Arquitetura e Urbanismo/ULBRA,
Santa Maria, RS - Bolsista PROICT/ULBRA/SM
3
Acadêmico do Curso de Arquitetura e Urbanismo/ULBRA,
Santa Maria, RS - Bolsista BIC/FAPERGS
4
2
Acadêmicos do Curso de Arquitetura e Urbanismo/ULBRA,
Santa Maria, RS
Professor-Orientador do Curso de Arquitetura e Urbanismo/
ULBRA, Santa Maria, RS ([email protected])
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
237
ABSTRACT
The concrete structural white brings challenges for technologists and researchers in the sense of
understanding his acting front better to the aggressiveness of the middle. It is sought through of that work,
to contribute for a problem that is becoming important for the works in White Concrete, that it is the
corrosion of the steel in the inside of those concretes. The research that originated this work is being
developed in ULBRA/Santa Maria/RS in partnership with UFSM and she has for objective to verify the
effects experimentally caused by the corrosion of the rebars in the apparent concrete with cement Portland
white, giving emphasis for that important pathological manifestation that more and more worries the
planners and enterprising of those special works.
Keywords: Corrosion, concrete white, carbonation, cement Portland white.
INTRODUÇÃO
Entre os materiais empregados na construção civil atualmente, o concreto é, sem dúvida, o mais largamente utilizado. Apresenta vantagens como a facilidade de obtenção dos seus
materiais componentes na natureza; sua preparação não é demorada e não exige treinamento especializado; pode ser executado numa variedade
de formas e tamanhos; bem como as suas características e propriedades, quando utilizadas em
conjunto com o aço (concreto armado ou
protendido), são praticamente imbatíveis no que
diz respeito ao aspecto econômico e estrutural.
Estima-se que o consumo mundial de concreto é
da ordem de 5,5 bilhões de toneladas por ano
(MEHTA e MONTEIRO, 1994). Este elevado consumo, aliado ao fato de a produção do concreto requerer menor consumo de energia, qualifica-o como
um material que exige uma atenção especial de
pesquisadores no sentido de conhecer amplamente
seu desempenho e, eventualmente, adequá-lo frente às necessidades do mercado consumidor.
Nos últimos anos, a demanda por construções
que utilizam o concreto é muito significativa.
238
Segundo o Sindicato Nacional da Indústria de
Cimento (SNIC:<http://www.snic.org.br>), no
ano de 2003, a produção dos dez maiores grupos
industriais de cimento no Brasil ultrapassou a marca de 34 milhões de toneladas, chegando ao nível mais alto da história entre os maiores produtores mundiais de cimento. Produziu-se, também,
segundo a Associação Nacional de Entidades de
Produtores de Agregados para a Construção Civil (ANEPAC:<http://www.anepac.org.br>), no
ano de 2000, 141 milhões de m3 de areia e 97
milhões de m3 de pedra britada. Com relação ao
aço, segundo dados preliminares do Instituto Brasileiro de Siderurgia (IBS:http://www.ibs.org.br),
a produção brasileira de aço bruto, no ano de 2004,
foi de aproximadamente 30 milhões de toneladas
(VAGHETTI, 2005).
Esses números dão uma idéia do consumo de
concreto (cimento e agregados) e aço no país nos
últimos anos. Este crescimento, porém, não foi
acompanhado de uma legislação, norma técnica ou pesquisa científica que relacionasse a
interdependência entre a agressividade do meio
e a durabilidade do concreto e da armadura.
Deste modo, tem-se notado, nos últimos anos,
um número crescente de estruturas de concre-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
to armado e protendido com sinais visíveis de
deterioração pela corrosão da armadura.
Problemas com a corrosão do aço no concreto
trazem ao Brasil um prejuízo anual de 3,5 a 4,0%
do Produto Interno Bruto (PNB), segundo a Comissão de Estudos de Corrosão de Elementos
Metálicos em Concreto da ABNT (CONSTRUÇÃO, 1991). Para um PNB de cerca de 467 milhões de reais, temos um gasto de 18,7 milhões
de reais por ano em recuperação de estruturas de
concreto armado e protendido, deterioradas pela
corrosão da armadura. Ainda, segundo Gemelli
(2001, p.xiii), “...estima-se que a corrosão destrua 25% da produção mundial de aço por ano, o
que corresponde a várias (5 a 7) toneladas por
segundo... O custo total da corrosão está avaliado em 4% do produto nacional bruto”.
Além do aspecto econômico, acidentes envolvendo estruturas deterioradas pela corrosão
da armadura constituem-se em fatos lamentáveis, pois causam perdas humanas e materiais,
transtornos aos que utilizam a obra pela sua interdição e implicam em onerosa reparação.
Exemplo disso foi o risco de colapso da Ponte
dos Remédios em São Paulo, que em 1997 colocou em perigo a segurança dos usuários, revelando o estado grave das obras de arte no Brasil. O
problema foi resolvido com soluções criativas e
eficientes, mas ficou a questão sobre as possíveis
causas do processo de corrosão dos cabos
protendidos desta obra de arte (TÉCHNE, 1997).
Aliando a utilização de um dos materiais mais
consumidos, que é o concreto armado, e sua deterioração mais importante, que é a corrosão das
armaduras, busca-se inserir, nesse contexto, os
problemas enfrentados pelos arquitetos quando
da concepção de suas obras em concreto aparente, em especial empregando, na fabricação desse concreto, o cimento Portland branco.
O concreto aparente, apesar da robustez proporcionada pelo material, tem muita leveza no
seu aspecto estético, principalmente quando os
arquitetos concebem peças estruturais com significativa esbeltez. Atualmente, vêm crescendo
muito as obras que empregam concreto aparente
com cimento Portland branco. Pode-se citar, a nível mundial, várias obras que empregaram o concreto branco estrutural em seus projetos, tais
como: a Igreja Dives in Misericórdia (Figura 1a)
em Roma; Pavilhão da Expo’98 e Torre do Tombo
em Lisboa; Catedral da Arquidiocese em Los
Angeles. No Brasil, a utilização desse concreto
iniciou no ano de 2000, com a construção do
Edifício Flexotronics em Sorocaba/SP. A partir daí,
várias obras foram e estão sendo executadas com
concreto estrutural branco, como, por exemplo:
Panamerica Park em São Paulo, Ponte Irineu
Bornhausen em Brusque/SC, Museu Iberê Camargo
(Figura 1b), em Porto Alegre/RS, iniciada em
2003, a obra mais importante em Concreto Branco atualmente em execução no Brasil.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
239
(a)
(b)
Figura 1 – (a) Igreja Dives in Misericórdia, projeto do arquiteto Richard Méier, (b) Museu Iberê Camargo,
projeto arquiteto português Álvaro Siza
240
Ao mesmo tempo que o apelo estético fica
muito evidente na concepção de edificações em
concreto aparente com cimento Portland branco,
surge um problema de durabilidade desse material em longo prazo, que muito incomoda o
meio técnico-científico, que é a corrosão das
armaduras, bem como também incomoda em especial, os arquitetos que projetam essa obras,
pois os efeitos que advém desse problema, como
as manchas superficiais (ferrugem) nos elementos
estruturais (vigas, pilares e lajes), causam verdadeiro desconforto aos proprietários, que precisam conviver com essa patologia e também
dispender de recursos financeiros para tentar
solucioná-la ou amenizá-la.
Neste sentido, coloca-se a importância de se
implementar uma pesquisa que venha a contribuir para o conhecimento mais aprofundado sobre a corrosão do aço no concreto aparente com
cimento Portland branco, principalmente devido
ao aumento do número de construções com esse
material que se projeta para o futuro, tendo em
vista especialmente a beleza que elas proporcionam, como também aos aspectos técnicos envolvidos com a patologia da corrosão, que instiga
os pesquisadores em descobrir novas soluções
para tentar diminuir ou evitar esse problema.
Sendo assim, o objetivo principal deste
trabalho de iniciação científica é de verificar,
experimentalmente, os efeitos causados pela
corrosão das armaduras no concreto aparente
com cimento Portland branco, com a corrosão
sendo induzida por carbonatação e acelerada por
ciclos de molhagem/secagem. A pesquisa está
sendo desenvolvida no campus da ULBRA/Santa
Maria/RS e conta com a parceria, para seu delineamento experimental, do Laboratório de Materiais e Construção Civil (LMCC) da UFSM.
Os materiais escolhidos para a pesquisa experimental foram os seguintes: cimento branco (CPB40) e cimento cinza CPV-ARI; agregados: areia
média (natural e calcária) e brita 01 (rochas
diabásicas e calcárias); bem como o aço utilizado
nos corpos-de-prova foi de bitola 8mm (CA-50).
MATERIAL E MÉTODOS
A investigação contou com os seguintes ensaios: ensaios de trabalhabilidade, ensaios físicos, moldagem dos concretos; ensaios de cura e
de resistência à compressão axial, carbonatação
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
acelerada e de potencial de corrosão. No ano
de 2008 estarão sendo realizados os ensaios de
aceleração da corrosão por ciclos de molhagem/
secagem para o objetivo final de avaliar o grau
de corrosão do aço nos concretos através do
ensaio não-eletroquímico da perda de massa
gravimétrica.
Na fase de proporcionamento dos traços de
concreto (Tabela 1), tanto para o “concreto cin-
za” quanto para o “concreto branco”, foram realizados ensaios de trabalhabilidade (consistência pelo abatimento do tronco de cone NBR 7223), conforme Figura 2, com o objetivo de determinar as dosagens adequadas de
cimento, areia, pedra, água para cada traço,
desejando sempre um teor ótimo de argamassa para um determinado nível de consistência
da mesma.
Tabela 1 – Tipos de concretos
Para cada um dos traços de concreto foram
estudados três níveis de resistências, representados pelas relações água/cimento 0,50 ; 0,60 e
0,70. Portanto, foram moldados 6 traços diferentes, três para cada um dos concretos.
Figura 2 – Ensaio de trabalhabilidade
Para os ensaios voltados à corrosão das armaduras, os corpos-de-prova (c.p.) tiveram as seguintes dimensões: 10,0 cm x 10,0 cm x 6,0 cm.
A Figura 3 mostram o c.p. prismático utilizado
no experimento, evidenciando a região da barra exposta à corrosão, bem como os afastamentos laterais da mesma no interior do concreto
(todas as medidas estão em ‘cm’).
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
241
Figura 3 – Vistas superior e frontal, corte AA e perspectiva do c. p.
A preparação do aço (Ø8mm-CA50) para ser
colocado dentro dos c.p. 10x10x6cm foi realizada da seguinte maneira: primeiramente, procedeu-se uma limpeza com decapagem mecânica,
através de escova de aço em equipamento giratório sob alta rotação, eliminando a ferrugem
superficial até alcançar a condição de “metal
branco”. Após, as barras foram limpas em uma
solução contendo ácido clorídrico e água desti-
lada, na proporção 1:1 mais 2 g/l de um inibidor
de corrosão (hexametilinotetramina). Para essa
limpeza, as barras foram imersas na solução e
vibradas com um gerador de ultra-som, sendo,
depois, lavadas em água corrente, escovadas com
escova de cerdas plásticas, mergulhadas em acetona e secas com ar quente, segundo procedimento ASTM G1/1990. Estes trabalhos estão
ilustrados nas Figuras 4 e 5 a seguir .
Figura 4 – (a) Aço após limpeza com decapagem mecânica, (b) limpeza das barras de aço por imersão em
solução ácida e vibração com um gerador de ultrasom
242
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Figura 5 – (a) lavagem em água corrente das barras, escovadas com escova de cerdas plásticas e (b) secas
com ar quente
Após a moldagem dos corpos-de-prova (Figura 6), os mesmos foram colocados em câmara
úmida por 35 dias. Ao término desse período, os
corpos-de-prova foram acondicionados por 21
dias (3 semanas) numa sala climatizada (Figura
7) com umidade e temperatura controladas (UR
entre 65%-75% e T~23°C) para equilíbrio da
umidade interna, período de pré-condicionamento. O objetivo do pré-condicionamento foi
de dotar os corpos-de-prova de um ambiente
aéreo e com uma distribuição uniforme da água
evaporável.
Figura 6 – (a) Concretos adensados em mesa vibratória e (b) concretos após moldagem
Figura 7 – (a) Corpos-de-prova desmoldados (b) c.p. na sala climatizada
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
243
Para avaliar a resistência dos concretos, foi
realizado o ensaio de resistência à compressão
axial (NBR 5738) nas idades de 7, 28 e 91dias
(Figura 8). O ensaio de potencial de eletrodo
ou de corrosão (Figura 9), que avalia o estado
superficial do aço mediante leituras
eletroquímicas, segundo método descrito na
ASTM C 876 (1991), foi realizado inicialmente
aos 35 dias e após semanalmente. O equipamento
utilizado foi um pH-metro/milivoltímetro de alta
impedância de entrada, da marca ANALION,
e um eletrodo de calomelano saturado (ECS).
Figura 8 – Ensaio de resistência à compressão axial
Figura 9 – Ensaio de potencial de corrosão
O ensaio de indução da corrosão por
carbonatação acelerada foi realizado em uma caixa
de cimento amianto adaptada para uma câmara com
umidade e temperatura controladas (Figura 10).
Para isso, foi retirado aproximadamente 10% de ar
244
em relação ao volume total da câmara (1000 litros),
através de uma bomba de vácuo e posteriormente
injetado 10% de CO2. Com isso, a atmosfera da câmara ficou propícia para a carbonatação dos corposde-prova em regime acelerado.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Figura 10 – Câmara de carbonatação (a) interior e (b) exterior
RESULTADOS E
DISCUSSÃO
Como a pesquisa a partir de 2008 entra numa
fase final, com a obtenção dos dados quantitativos da perda de massa gravimétrica (densidade
de corrente de corrosão), os resultados obtidos
até o momento que efetivamente servem para a
análise dos aspectos que envolvem a corrosão do
aço no concreto foram os de resistência à compressão axial aos 7, 28 e 91 dias (Figura 11), bem
como as leituras eletroquímicas do potencial de
corrosão do período de indução da corrosão por
carbonatação acelerada (Figuras 12 e 13).
Figura 11 - Resultados da resistência à compressão axial (MPa) aos 7, 28 e 91 dias de idade, dos concretos
branco e cinza.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
245
Os resultados de resistência à compressão axial
e potencial de corrosão estão colaborando para
elucidar e diagnosticar o desempenho do concreto branco frente à corrosão quando comparado com o concreto cinza (de referência), especificamente quando se faz uma análise diante de
outras pesquisas envolvendo esse tema, podendo-se citar a pesquisa de Kirchheim et al., 2005,
que também obteve resultados semelhantes no
tocante à resistência à compressão axial.
Especificamente quanto aos resultados qualitativos do potencial de corrosão (Figuras 12 e
13), pode-se verificar que todos os aços analisados, para os dois tipos de concreto nas quatro
primeiras semanas do período de pré-condicionamento, apresentaram muita variação nos resultados, ficando entre + 50 mV e -200 mV.
Nesse período de 4 semanas, o aço ainda está
no estado passivo e com o concreto (pH elevado) protegendo a armadura.
Figura 12 – Potencial de corrosão (mV) no período de indução por carbonatação acelerada para o concreto cinza.
246
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Figura 13 – Potencial de corrosão (mV) no período de indução por carbonatação acelerada para o concreto branco
Figura 13 – Potencial de corrosão (mV) no período de indução por carbonatação acelerada para o concreto branco.
Com o início do período de indução por
carbonatação acelerada (aos 63 dias), o avanço da
frente de carbonatação na primeira semana (entre
63 e 70 dias) dos corpos-de-prova dentro da câmara já se fez sentir nos resultados de potencial, havendo uma tendência a valores mais negativos para
os aços nos dois tipos de concreto, especialmente
àqueles com maior porosidade (relação a/c = 0,70).
Nas semanas seguintes, pode-se verificar até
uma elevação nos valores dos potenciais para os
dois tipos de concreto (CC e CB). Esse
enobrecimento dos potenciais, segundo alguns
autores, entre eles Andrade et al (1988), pode
ser devido à redução da umidade em função da
evaporação d’água através das reações de
carbonatação, ficando esse processo facilitado
em concretos mais porosos, com relações a/c mais
elevadas. Ainda assim, com os concretos mais
resistivos (relação a/c = 0,50) nota-se que praticamente os potenciais não se alteraram.
Verifica-se também que nas 20 semanas de
carbonatação acelerada (dos 63 aos 203 dias),
os potenciais dos aços tiveram oscilações para
valores positivos e negativos, mas a tendência
mostrou que o concreto branco, por ser mais
resistivo, impediu que os potenciais dos aços ficassem na faixa negativa quando comparado
com os aços do concreto cinza.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
247
Na análise das Figuras 12 e 13 para o período
de aceleração da corrosão através dos ciclos de
molhagem/secagem, verifica-se já logo no início dos ciclos (entre 203 e 210 dias) uma queda
significativa nos potenciais, passando de valores +20 mV para valores até -600 mV.
Fica evidente que somente a carbonatação
dos concretos não é suficiente para provocar a
corrosão do aço propriamente dita, necessitando muito que a umidade preencha os poros do
material e contribua para aumentar a mobilidade iônica e mais precisamente o transporte dos
íons das regiões anódicas para as regiões
catódicas através do eletrólito.
Espera-se que durante esse período de ciclos
de molhagem/secagem, os potenciais permaneçam na faixa entre -200 mV e -600 mV, acelerando o processo corrosivo dos aços.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O desenvolvimento desta pesquisa de iniciação científica de cunho experimental reveste-se
de uma importância significativa, não só pelo
engrandecimento do curso e sua inserção em pesquisa, mas sobretudo pelo envolvimento dos recursos humanos de forma contundente na criação de um espírito de grupo, favorecendo as relações interpessoais tão necessárias à formação do
caráter do acadêmico e posteriormente do profissional, além de reverter em benefício da instituição ULBRA, que participa deste processo de formação científica e intelectual, merecendo destaque no cenário regional e nacional.
Provavelmente, em meados de abril de 2008,
teremos uma gama de resultados de corrosão
248
(tanto qualitativos como quantitativos) que irá
nos possibilitar a tomada de conclusões mais efetivas sobre o foco principal do trabalho, contribuindo para elucidar mais o comportamento da
corrosão do aço no concreto branco.
REFERÊNCIAS
AMERICAN SOCIETY FOR TESTING
AND MATERIALS. Standard practice for
preparing, cleaning and evaluating test
specimens. ASTM G1-90. Annual Book of
ASTM Standards. Philadelphia, 1990
(Reapproved 1994).
AMERICAN SOCIETY FOR TESTING
AND MATERIALS. Standard test method
for half- cell potentials of uncoated
reinforcing steel in concrete. ASTM C 876.
American Society for Testing and Materials.
Philadelphia, 1991.
ANDRADE, C.; GONZÁLES, J.A.
Tendencias actuales en la investigación sobre corrosión de armaduras. Informes de la
Construcción, v.40, n.398, p. 7-14, 1988.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. Moldagem e cura de
corpos-de-prova de concreto, cilíndricos ou
prismáticos. NBR 5738. Rio de Janeiro,1984.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. Determinação da consistência do concreto pelo abatimento do
tronco de cone - ensaio de abatimento: NBR
7223. Rio de Janeiro, 1982.
CONSTRUÇÃO - Região Sul. Corrosão sob
controle. PINI, n.269, mar.1991, p.15.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
GEMELLI, E. Corrosão de materiais metálicos e sua caracterização. Rio de Janeiro:
LTC, 2001.
KIRCHHEIM,A.P et al. Análise comparativa
da utilização de diferentes sistemas de proteção
de corrosão de armaduras na aderência entre
concreto branco e barras de aço. In: CONGRESSO BRASILEIRO DO INSTITUTO BRASILEIRO DO CONCRETO, 47., 2005, São Paulo. Anais... São Paulo: IBC, 2005. p.vii.1-vii.10.
MEHTA,P.K.; MONTEIRO,P.J.M. Concre-
to: estrutura, propriedades e materiais. São
Paulo: Pini,1994.
TÉCHNE. “Nó reatado”. PINI, ano 5, n.30,
p.31-36, set/out 1997.
VAGHETTI, M.A.O. Estudo da corrosão
do aço, induzida por carbonatação, em concretos com adições minerais. 2005. Tese
(Doutorado) - Programa de Pós-Graduação
em Engenharia de Minas, Metalúrgica e de
Materiais, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2005.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
249
250
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Polímeros biodegradáveis: relação entre
cristalinidade e propriedades biológicas
DANIELE FACCIN HUBNER1
ANA PAULA DE FREITAS1
MARTHA FOGLIATO SANTOS LIMA2
RESUMO
O objetivo deste trabalho foi o de determinar a relação entre a cristalinidade de polímeros biodegradáveis
utilizados comercialmente e suas propriedades biológicas. A metodologia utilizada consistiu inicialmente
na caracterização de propriedades térmicas de polímeros biodegradáveis comerciais e posterior preparação de placas finas através de prensagem em prensa dotada de aquecimento. Foi selecionado o poli
(sucinato-co-tereftalato) de butila ou PBST (DuPont) para a realização do estudo, onde as placas obtidas deste polímero foram posteriormente fundidas e submetidas a diferentes condições de cristalização,
visando modificar a cristalinidade das amostras. As técnicas de caracterização empregadas foram Análise
Termogravimétrica (TGA), Calorimetria Exploratória Diferencial (DSC) e Difração de Raios-X em
Ângulo Largo (WAXS). Foram obtidas amostras de PBST amorfo e com graus de cristalinidade na faixa
de 18 a 40%. Estas amostras serão posteriormente avaliadas quanto a sua capacidade de biodegradação
através de técnicas respirométricas.
Palavras-chave: polímeros biodegradáveis, cristalinidade, biodegradação.
1
Acadêmica do Curso de Engenharia de Plásticos/ULBRA Bolsistas PROICT/ULBRA
Professora/Orientadora do Curso de Química/ULBRA e do PPG
Engenharia: Energia Ambiente e Materiais ([email protected])
2
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
251
ABSTRACT
The aim of this work was to study the relationship between the crystallinity of biodegradable polymers
used commercially and their biological properties. The methodology used was the characterization of
thermal properties of the polymer samples and subsequent preparation of thin plates by pressing into press
equipped with heating. It was selected the poly(butylene succinate-co-terephthalate) or PBST (DuPont)
for the conduct of the study, where the plates obtained from this polymer were melted and submitted to
different crystallization conditions, in order to modify the crystallinity of the samples. The employed
characterization techniques were Thermogravimetric Analysis (TGA), Differential Scanning Calorimetry
(DSC) and Wide-Angle X-ray Scattering (WAXS). It was obtained samples of amorphous PBST and
with crystallinity degrees in the range of 18 to 40%. These samples will be subsequently evaluated on their
ability to biodegradation through respirometric techniques.
Keywords: biodegradable polymers, crystallinity, biodegradation.
INTRODUÇÃO
Os chamados polímeros biodegradáveis são
materiais poliméricos que, sob a ação de organismos vivos, são metabolizados a moléculas mais
simples, tais como dióxido de carbono, água, e
biomassa (CHIELLINI e SOLARO, 2003).
Vários polímeros na natureza são conhecidos por serem biodegradáveis, como a celulose,
encontrada sob várias formas, o amido, presente
nos alimentos, e a caseína, presente no leite
(MIKULÁSOVÁ et al., 2001). Os chamados
“plásticos verdes” devem realizar sua função e
desaparecer em um período de tempo razoável,
na forma de produtos de degradação
ambientalmente aceitáveis. Atualmente, há
polímeros capazes de atender a inúmeras aplicações, variando-se sua estrutura química, sua
formulação (mistura com aditivos, pigmentos,
etc.) e seu método de processamento. A
biodegradabilidade está relacionada mais à estrutura química final do que à origem do
polímero (STEVENS, 2002). Materiais plásticos
continuam sendo aperfeiçoados e as estratégias
252
combinam propriedades físicas superiores com
baixos custos.
Atualmente,
materiais
poliméricos
biodegradáveis são utilizados para aplicações em
diversos segmentos, tais como sacolas plásticas de
supermercados e para mercadorias em geral, filmes de utilização agrícola, materiais de uso médico-hospitalar, embalagens para alimentos, dentre
outras utilizações. Esses produtos ainda se destinam a nichos de mercado, ocupando cerca de 1%
do total do mercado de produtos plásticos. Esses
produtos estão todos, praticamente, ainda em fase
de desenvolvimento e estudo de suas características estruturais-morfológicas e suas relações com
propriedades físicas e mecânicas. A literatura disponível ainda é bastante restrita. Um dos
parâmetros importantes no controle de propriedades, tanto físico-mecânicas, como de
biodegradabilidade, é a cristalinidade desses
polímeros, uma vez que são, em sua grande maioria, semicristalinos. Os polímeros semicristalinos são
constituídos por dois componentes com diferentes
graus de ordenação: um componente cristalino,
com ordem de longo alcance na distribuição espa-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
cial das cadeias poliméricas, e um componente
amorfo, possuindo ordem somente de curto alcance (BILLMEYER, 1984; SPERLING, 1986;
BODOR, 1991; CALLISTER, 2002). De uma forma genérica, o grau de cristalinidade, índice de
cristalinidade, ou simplesmente cristalinidade, de
um polímero semicristalino pode ser definido como
a razão entre a quantidade do componente cristalino e a quantidade total da amostra, constituída
por porções cristalinas e amorfas (SPERLING,
1986). A cristalinidade constitui um importante
parâmetro associado aos aspectos morfológicos em
polímeros semicristalinos, seu valor é dependente
da história térmica e mecânica do material e influencia sua processabilidade e suas propriedades
físicas e mecânicas (LIMA, VASCONCELOS e
SAMIOS, 2002; LIMA e SAMIOS, 2005).
A modificação das fases cristalina e amorfa,
bem como a morfologia associada a estas fases é
uma questão complexa e de grande importância, uma vez que as características estruturais e
morfológicas determinam o comportamento térmico e mecânico do polímero que se reflete em
suas propriedades de uso final. Particularmente, o aspecto da cristalinidade tem sido
pouquíssimo explorado pelos estudos internacionais (SCOTT, 2002). Um aspecto muito importante e que precisa ser esclarecido é a relação entre a cristalinidade dos polímeros
biodegradáveis e a sua biodegradabilidade. A
parte cristalina dos polímeros é a responsável por
sua resistência mecânica e química. Os cristais
constituem-se em estruturas densamente empacotadas, possivelmente mais recalcitrantes, isto
é, mais resistentes à biodegradação.
Com base nestas considerações, este trabalho tem como objetivo a obtenção de amostras
de polímeros biodegradáveis utilizados comer-
cialmente com diferentes graus de cristalinidade
para, numa segunda etapa, avaliar a capacidade de biodegradação apresentada pelas amostras através da técnica conhecida como
respirometria.
MATERIAL E MÉTODOS
Os materiais utilizados foram os seguintes
polímeros biodegradáveis comerciais:
·
Poli(epsilon- caprolactona) ou PCL
(Solvay)
·
Poli(butileno adipato tereftalato) ou
PBAT (Basf)
·
Poli(butileno succinato tereftalato) ou
PBST (DuPont)
Preparação das amostras
A metodologia utilizada consistiu inicialmente na caracterização preliminar de propriedades
térmicas de polímeros biodegradáveis comerciais, visando estabelecer as melhores condições
para preparação de filmes ou placas finas através de prensagem em prensa dotada de aquecimento e controle de pressão.
Foi selecionado o poli (sucinato- cotereftalato) de butila ou PBST (Dupont) para a
preparação de amostras com diferentes graus de
cristalinidade, onde as placas obtidas deste
polímero foram posteriormente fundidas e submetidas a diferentes condições de cristalização,
desde lento resfriamento até “quenching”, através da sua imersão em nitrogênio líquido.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
253
Análise Termogravimétrica
(TGA)
Esta técnica foi utilizada com o objetivo de
avaliar o perfil de degradação térmica dos materiais estudados e também a estabilidade térmica dos polímeros. Foi utilizado para análise o
equipamento de TGA da TA Instruments, modelo 2050, disponibilizado no Laboratório de
Polímeros da ULBRA. As análises foram realizadas em atmosfera de nitrogênio gasoso, em uma
faixa de temperatura de 30 a 700ºC, a taxa de
aquecimento de 20º C/min. As massas utilizadas foram de 6,0 a 10,0 mg.
Calorimetria Exploratória
Diferencial (DSC)
A técnica de DSC foi empregada para caracterizar o comportamento térmico das amostras (fusão e cristalização). Foi utilizado o equipamento de DSC da TA Instruments, modelo
2010, do Laboratório de Polímeros da ULBRA.
Amostras com massas na faixa de 5,0 a 7,0 mg
foram analisadas com taxa de aquecimento de
10° C/mim, no intervalo de temperatura de 20 a
250° C, utilizando-se atmosfera de nitrogênio
gasoso.
Difração de raios-X em ângulo
largo (WAXS)
Esta técnica foi empregada para analisar a estrutura e permitir a avaliação da cristalinidade das
amostras. O equipamento utililizado foi um
difratômetro da marca Rigaku , existente no
254
CEPPED/ULBRA, equipado com fonte de raios-X
e operando na faixa de 20-40 kV e 20-40 mA com
filtro monocromador de grafite. Foi utilizado passo
de 0,05 e varredura em ângulo 2è de 3 a 60°.
A avaliação da cristalinidade foi realizada
pelo método de difração de raios-X, que baseiase na hipótese de que é possível separar a contribuição da intensidade da radiação difratada
das regiões cristalinas e amorfas (ZEVIN e
KIMMEL, 1995). O grau de cristalinidade das
amostras foi obtido pela razão entre as áreas dos
picos, descontando o halo amorfo, e a área total
do difratograma, através de método matemático adequado.
Avaliação da
biodegradabilidade
A capacidade de biodegradação apresentada pelas amostras com diferentes graus de
cristalinidade será avaliada através da técnica
conhecida como respirometria. Esta técnica baseia-se na avaliação da atividade metabólica dos
organismos presentes em frascos fechados (células respirométricas) por meio da quantificação
do dióxido de carbono produzido em função do
tempo (ASTM D 5338-98, 2003). Serão empregadas células herméticas contendo composto ou
solos típicos da região, sendo o dióxido de carbono liberado capturado por soluções de
hidróxido de sódio. Os resultados referentes a
esta etapa encontram-se em andamento e não
encontram-se contemplados neste trabalho.
As Figuras de número 1 a 4 ilustram as técnicas experimentais utilizadas.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Figura 1- Equipamento de DSC, Lab. de
Polímeros – ULBRA
Figura 3 - Difratômetro de Raios–X,
CEPPED-ULBRA
Figura 2 - Equipamento de TGA, Lab. de
Polímeros – ULBRA
Figura 4 - Respirômetro
respirométrica.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
e
célula
255
RESULTADOS E
DISCUSSÃO
Nas Figuras 5 e 6 são apresentados os resultados
experimentais de TGA e DSC obtidos para o PBST.
As curvas de TGA demonstram que o PBST
é estável termicamente até a temperatura de
300 oC, iniciando sua decomposição após esta
temperatura. O perfil de degradação mostra que
a decomposição ocorreu em duas etapas, a 442,79
o
C e 527,17 oC, finalizando ao redor de 600 oC.
Figura 5 – Curvas de TGA e termogravimetria derivativa, obtidas para o poli (sucinato-co-tereftalato) de butila (PBST).
256
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Figura 6 – Curva de DSC obtida para o poli (sucinato-co-tereftalato) de butila (PBST).
A curva de DSC obtida mostra que a temperatura de transição vítrea (Tg) do PBST ocorre
na faixa de (50-60) oC. A fusão do polímero iniciou em torno de 130 oC e foi finalizada ao redor
de 220 oC, ocorrendo em duas etapas que estão
representadas por dois picos endotérmicos, com
temperaturas de pico máximo de fusão de 146,37
o
C e 204,19 oC, respectivamente. O valor total de
entalpia de fusão foi de 23,24 J/g, referente à soma
das áreas dos dois picos endotérmicos de fusão.
A caracterização térmica foi realizada também para os polímeros PBAT e PCL. Os resultados da caracterização térmica foram resumidos
no Quadro 1, que mostra um comparativo entre
as propriedades de estabilidade térmica, temperatura de transição vítrea (Tg), temperatura
de fusão (Tf), temperatura de cristalização (Tc)
e entalpia de fusão (ÄHf) dos polímeros PBST,
PBAT e PCL.
Quadro 1 – Resultados experimentais de TGA e DSC, obtidos para os polímeros PBST, PBAT e PCL.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
257
No caso do PBAT e PCL, não foi possível a
determinação da T g , pois para ambos os
polímeros esta encontrava-se fora do limite de
detecção do aparelho (abaixo de -50 oC). Os
resultados de TGA demonstraram que o poli
(sucinato-co-tereftalato) de butila (PBST) foi
o polímero que apresentou maior estabilidade
térmica, até 300 oC.
A Figura 7 apresenta os difratogramas comparativos para as amostras de PBST modificadas
através de diferentes condições de cristalização
empregadas. O ajuste destes difratogramas, através de método matemático adequado, demonstrou que foram obtidas amostras de PBST amorfo
e com graus de cristalinidade na faixa de 18 a
40%, conforme assinalado nas curvas.
Figura 7 - Difratogramas comparativos de amostras de PBST amorfo e com graus de cristalinidade de 18%, 30% e 40%.
CONCLUSÕES
Neste trabalho, foram caracterizadas as propriedades térmicas dos seguintes polímeros
biodegradáveis: poli (sucinato-co-tereftalato) de
butila (PBST), poli (adipato-co-tereftalato) de
butila (PBAT) e poli å-caprolactona (PCL). A
caracterização térmica, juntamente com a
metodologia empregada na preparação das placas, demonstrou que o polímero mais adequado
ao prosseguimento do estudo foi o PBST. A partir
das placas obtidas deste polímero, foi possível
modificar a cristalinidade através da variação das
condições de cristalização, obtendo-se amostras
258
de PBST amorfo e com graus de cristalinidade
na faixa de 18 a 40%. A avaliação da capacidade
de biodegradação destas amostras encontra-se em
andamento e ainda não foram obtidos resultados
conclusivos relativos a esta etapa da pesquisa.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem ao Prof. João Pocos
(Laboratório de Polímeros/ULBRA) e ao técnico Demian Fogaça (CEPPED/ULBRA), respectivamente pelo apoio na caracterização térmica
e nas análises de difração de raios-X, bem como
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
à Universidade Luterana do Brasil pela concessão das Bolsas de Iniciação Científica.
REFERÊNCIAS
ASTM D 5338-98. Standard test method for
determining aerobic biodegradation of
plastic materials under controlled
composting conditions, 2003.
BILLMEYER, F. W. Textbook of Polymer
Science. 3.ed. Wiley-Interscience, 1984.
BODOR, G. Structural Investigations of
Polymers. Ellis Horwood Series in Polymer
Science and Technology, 1991.
Z.; SAMIOS, D. Journal of Polymer Science.
Part B: Polymer Physics, v.40, n.9, p.896.
2002
LIMA, M. F. S.; SAMIOS, D. Brazilian
Journal of Materials Science and
Engineering, n. 7, p. 71-79, 2005..
MIKULÁSOVÁ, M. et al. World Journal of
Microbiology & Biotechnology, n. 17, p.
601-607, 2001.
SCOTT, G. Degradable polymers principles and applications. Kluwer
Academic Publishers, 2002.
SPERLING, L. H. Introduction to Physical
Polymer Science. John Wiley & Sons, 1986.
CALLISTER Jr., W. D. Materials Science
and Engineering - An Introduction 3. ed.
New York: John Wiley & Sons, Inc., 1994.
STEVENS, E. S. An introduction to the new
science of biodegradable plastics. Princeton
University Press, 2002.
CHIELLINI,
E.;
SOLARO,
R.
Biodegradable polymers and plastics.
Kluwer/Plenum, 2003.
ZEVIN, L. S.; KIMMEL, G. Quantitative XRay Diffractometry. New York: SpringerVerlag, 1995.
LIMA, M. F. S.; VASCONCELOS, M. A.
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
259
260
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
NORMAS PARA PUBLICAÇÃO DE TRABALHOS
A Revista de Iniciação Científica editada
pela Universidade Luterana do Brasil publica
artigos de Iniciação Científica selecionados durante o Salão de Iniciação Científica da ULBRA
que ocorre anualmente e neste ano de 2007 efetivou sua 13ª edição. Segue abaixo as normas
para publicação desses artigos:
1) O artigo de iniciação científica deve ser encaminhado à Diretoria de Pesquisa via e-mail
([email protected] ou [email protected])
ou em CD-ROM em Word for Windows.
2) O trabalho completo deverá ser digitado
em espaço 1,5, fonte arial 12, em um número máximo de 15 laudas A4 incluindo
tabelas, quadros e figuras.
3) O artigo deverá conter os seguinte tópicos: Título (em caixa alta, negrito e alinhado à direita); Nomes dos Autores
(iniciando pelos alunos de iniciação científica); Resumo (no máximo 10 linhas);
Palavras- chave (no máximo cinco);
Abstract; Key-words; Introdução (com
revisão bibliográfica e objetivos); Material e Métodos (descrição da metodologia
utilizada para a execução da pesquisa);
Resultados e/ou Discussão; Conclusões
e/ou Considerações Finais; Agradecimentos (quando houver) e Referências
(conforme indicado nos itens 7 e 8).
4) Para artigos de revisão bibliográfica, não é
necessário as subdivisões citadas no item
anterior, mas no artigo, obrigatoriamente, deverá conter: Título, Nomes dos
Autores, Resumo, Palavras- chave,
Abstract e Keywords.
5) Os nomes dos autores deverão ser colocados por extenso, alinhados à direita, um
embaixo do outro, iniciando-se pelo(s)
aluno(s) de iniciação científica, seguidos
de índice numérico, que será repetido no
rodapé, onde deve constar:
5.1) se o autor for aluno (Ex: 1Acadêmico
do curso de Medicina Veterinária/ULBRA
– Bolsista PROICT/ULBRA;
5.2) se o autor for professor participante
da pesquisa (Ex: 2Professor do curso de
Medicina Veterinária/ULBRA;
5.3) se o autor for de outra instituição deverá constar a profissão e a Instituição
( 3 Aluno
de
Pós-Graduação
e
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
261
Anestesiologista da Irmandade Santa Casa
de Misericórdia de Porto Alegre)
5.4) se o autor for professor –
orientador(Ex: 3Professor – Orientador do
Curso de Engenharia Ambiental/ULBRA
(inserir o e-mail do orientador para correspondência)
6) O significado das siglas e abreviações deverá estar explicito na primeira vez que
aparecerem no texto.
7) Quanto às citações bibliográficas no texto, a ordem vai depender se o(s) autor(es)
está(ão) sendo citado(s) como parte integrante da frase, nesse caso, somente o ano
da publicação deve vir entre parênteses,
por exemplo: COELHO (2005). Se no final da frase ou parágrafo, o(s) autor(es)
será(ão) citado(s) juntamente com o ano
da publicação, somente entre parêntese,
por exemplo: (COELHO, 2005):
a) quando a citação for de um autor: SANTOS (2001) ou (SANTOS, 2001);
b) quando for com dois autores: KEEP e
CORRIGAN (2000) ou (KEEP e
CORRIGAN, 2000);
c) quando for com três autores: SANCHES,
PULL e REEVE (2003) ou (SANCHES,
PULL e REEVE, 2003);
d) quando for com mais de três autores:
RENAME et al. (1997) ou (RENAME et
al., 1997).
e) quando houver, no mesmo ano, mais de
um artigo de mesma autoria, acrescentar
letras minúsculas, após o ano (BACK et
al., 1996a, 1996b).
262
f) quando, dentro de um mesmo parêntese,
houver mais de uma citação, estas devem
ser colocadas em ordem cronológica de
publicação (KLEIN, 1983; CARVALHO,
1994; MARTINELLO et al., 1999)
8) A citação das referências no final do artigo deverá ser por ordem alfabética de
autores e seqüência cronológica crescente, seguindo a ABNT 6023.
9) Os gráficos, fotos e desenhos, com enunciado na porção inferior, devem ser citados como figuras numeradas com algarismos arábicos em ordem crescente e corrida, conforme indicadas no texto. As tabelas e quadros, com enunciados na parte superior, devem ter seqüência numérica corrida indicada com algarismos arábicos e de acordo com a sua indicação
no texto.
10) O trabalho será analisado pelos consultores da Comissão Editoral da Revista.
11) Quando os referis sugerirem alterações
no artigo, o(s) autor(es) deve(m), após
fazer(em) as correções, encaminhar a versão definitiva em CD-ROM, em Word for
Windows.
12) Os textos apresentados são de inteira
responsabilidade de seu(s) autor(es), inclusive de digitação.
13) A Diretoria de Pesquisa guardará por três
meses os artigos não aceitos para publica-
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
ção, ficando os mesmo à disposição do(s)
autor(s) neste período. Após os artigos
serão inutilizados.
14) Cada autor receberá uma revista, gratuitamente, independente do número de
artigos publicados na mesma.
Universidade Luterana do Brasil
Av. Farroupilha, nº 8001, Bairro São José,
Canoas, RS, Cep: 92425-900
Diretoria de Pesquisa, Prédio 14, sala 225
E-mail: [email protected]
Fone: (0XX51) 3477-9196
Fax: (0XX51) 3477-9239
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
263
264
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Índice de Autores
ABDALLAH, Patrízia Raggi
ALLGAYER, Mariângela da Costa
ALVES, Ana Marisa de Oliveira
ANDRADE, Heloisa Helena Rodrigues
ANGELI, Suelen
ANTUNES, Amilton Sangoi
ARAÚJO, Mitiyo Shoji
AROSSI, Guilherme Anziliero
207
29
51
de 75
115
237
105
75
BAIRROS, Fábio
BALESTRO, Fernanda Izidro
BARCELLOS, Regina Bones
BECKER JUNIOR, Benno
BIANCHI, André Luis
BITTENCOURT, Hélio Radke
BORIN, Graziele
BRUSAMARELLO, Valner João
229
193
115
97
229
19
85
229
CÂMARA, Sheila Gonçalves
CAMBRUSSI, Alan Knolsseisen
CANELLAS, Leonardo Canali
CAPPELARI, Shandale Emanuele
CARIATI, Stela Maris da Silva
CARVALHO, Fabiana da Silva
19
121
19
39
75
121
CASANOVA, Yara Silva
CERVEIRA, Fabricia Alves
COSTA, Larisse Katiele Vargas da
COSTA, Márcia Rosa da
CRUZ, Joana Kliemann da
63
63
167
157
147
DAL-FARRA, Rossano André
DAL’PIZZOL, Paula Pellizzer
DALPIAZ, Tiago
DIAS, Priscila Pedroso
147
217
115
173
FARIAS, Eduardo Machado
FEIJÓ, Flávio Tosi
FERLA, Maristela Rissi
FERRAZ, Alexandre de Barros Falcão
FIGUEIREDO, Maria Renita Burg
FONSECA, André Salvador Kazantzi
FONTOURA, Luiz Antonio Mazzini
FREITAS, Ana Paula
FREITAS, Cíntia de la Rocha
97
207
181
39
105
63
133
251
97
GERBER, Laura
GOMES, Greizy Modesto
GONÇALVES, Willian Mattes
115
121
207
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
265
GOTTSCHALL, Carlos Santos
19
GOULART, Bianca Daniete Chimello 181
GROENWALD, Rosa Maria Freitas
105
GROLLI, Dorilda
181
GUEDES, Neiva Regina
29
HEPP, Diego
HUBNER, Daniele Faccin
IKUTA, Nilo
63
KAHL, Vivian Francília Silva
KESPERS, Fábio Alves dos Santos
KOERICH, Priscilla Karina Vitor
39
121
63
LIMA, Martha Fogliato Santos
LOIKO, Márcia Regina
LONGO, Thais Basso
LÜDTKE, Cândida
LUNGE, Ricardo Wagner
251
29
39
39
63
PARIS, Rosana Maria
PASSOS, Daniel Thompsen
PEREIRA, Patrícia
PICADA, Jaqueline Nascimento
POLIDORO, Ketherine Picinin
POOLI, João Paulo
PROENÇA, Mariana
85
29
147
11, 29
39
39
85
157
147
RAMOS, Ricardo Luiz
REGNER, Andréa Pereira
RIBEIRO, Luís Alberto Oliveira
RICHTER, Marc François
ROCHA, Cristianne Maria Famer
RODRIGUES, Everton Eilert
RODRIGUES, Norma Centeno
ROSSETTI, Maria Lúcia Rosa
147
121
11
39
193
11
11
115
133
229
217
237
39
217
181
115
105
193
167
NACIUK, Fabrício Fredo
NOGUEIRA, Fernanda
133
157
SANT’ANA, Josué
SANTOS, João Carlos Vernetti dos
SCHWARTZ, Germano André Doerdelein
SEFFRIN, Carlos Fernando Guimarães
SEMEDO, Juliane Garcia
SILVA, Eliziani Vedoy da
SILVA, Lauraci Dondé da
SILVA, Márcia Susana Nunes
SILVA, Roberto Carvalho
SILVA, Sue Ellen Tatsch da
SOMMER, Luís Henrique
OAIGEN, Edson Roberto
OLIVEIRA, Édison
147
121
TEIXEIRA, Adriane Ribeiro
THEWES, Márcia Regina
MACIEL, Luciano Milesi
MARQUES, Pedro Rocha
MARTINS, Cristiane Rodrigues
MELO, Tiago André Fontoura de
MENDES, Tania Maria Scuro
MILLÃO, Luzia Fernandes
MONTICELLI, Gislene
MOREIRA, Fernanda Keeling
266
11
251
OLIVEIRA, Elias Pandonor Motcy de
OLIVEIRA, Sérgio José de
237
19
97
85
181
97, 105
173
63
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
97
51
TOMAZI, Ronaldo
237
VAGHETTI, Marcos Alberto Oss
VIEIRA, Aline Ferreira
237
97
WEIMER, Tania de Azevedo
WOBETO, Ana Paula
11
63
ZYNICH, Samanta Anuncito
51
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
267
268
Revista de Iniciação Científica da ULBRA - 2007
Download

revista IC 2007.p65