UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS DEPARTAMENTO DE ECOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECOLOGIA Projeto de Pesquisa para Bolsa de Pós-Doutorado: Influência de fatores ambientais e espaciais sobre a diversidade de Arachnida em escala local e regional Área: Ciências Biológicas - Ecologia Coordenação: Prof. Dr. Valério De Patta Pillar Pesquisador: Ronei Baldissera Período: fevereiro de 2013 a janeiro de 2014 Porto Alegre, setembro de 2012 1 1. INTRODUÇÃO No presente projeto, serão analisados os padrões de diversidade alfa e beta de aracnídeos nos campos e ecótonos campo-floresta dos biomas Pampa e Mata Atlântica, acessando os papéis relativos de variáveis ambientais locais e regionais, e também de variáveis espaciais como determinantes dos padrões de diversidade observados. Especificamente, procuraremos responder: (1) qual a importância relativa de variáveis ambientais e espaciais para a descrição dos padrões de diversidade alfa e beta? (2) Qual a parcela de variação na diversidade alfa e beta de aracnídeos explicada somente por cada descritor local, regional e biogeográfico, e os efeitos hierárquicos dessas variáveis sobre a diversidade? A modelagem da distribuição de espécies utilizando variáveis ambientais e espaciais a fim de estudar suas contribuições relativas para explicar a diversidade alfa e beta em diferentes escalas espaciais tem sido utilizada em vários estudos recentes (e.g. Sattler et al. 2010; Carvalho et al. 2011; Carvalho et al. 2012). Essa abordagem se baseia na premissa de que os fatores que influenciam a biodiversidade são geralmente uma combinação de variáveis ambientais (em diversas escalas) e geográficas (Borcard et al. 1992). Nesse contexto, dois tipos de processos básicos podem ser apontados para explicar a origem dos padrões de diversidade (Legendre et al. 2005): o controle ambiental e o controle neutro. O controle ambiental propõe que a variação nas características ambientais é a maior responsável pela variação na distribuição e ocorrência de espécies pela diferenciação dos nichos das mesmas. Esse controle ambiental pode estar ligado a gradientes locais e/ou regionais na estrutura de habitat, tanto devidos a efeitos históricos naturais, quanto humanos. Essa escala na estrutura de habitats pode criar uma hierarquização de efeitos sobre a diversidade, de modo que a variação na diversidade associada com as estruturas locais pode ter uma parcela significativa explicada por variações regionais. Dessa forma, é importante uma abordagem de levantamento não só dos possíveis descritores ambientais locais, mas também dos regionais que influenciam na distribuição e ocorrência das espécies nos diferentes ecossistemas, pois as comunidades animais locais podem ter respostas diferentes, dependendo da sua história evolutiva e ecológica em cada ecorregião. Essa abordagem se torna ainda mais premente considerando o fato de que muitos ecossistemas são fragmentados e que ilhas de habitat são formadas em matrizes com diferentes graus de distúrbios. 2 Já o controle neutro pressupõe que uma estrutura espacial é criada por mecanismos ligados às diferenças de dispersão das espécies, assumindo que as mesmas são ecologicamente similares nas suas características populacionais como taxa de nascimento dentro de um mesmo grupo trófico (Bell 2001; Hubbell 2001; He 2005). Nesse caso, os padrões de diversidade seriam criados pela limitação de dispersão das espécies, a qual produziria agregados espaciais de espécies a partir da autocorrelação espacial na distribuição das mesmas. Dessa forma, os fatores ambientais seriam secundários para descrever os padrões de diversidade. Arachnida compreende 11 ordens e o presente projeto pretende focalizar esforços principalmente nas espécies da ordem Araneae, as quais são as mais abundantes na maioria das coletas nos diversos ecossistemas. Aranhas são predadores largamente distribuídos nos ecossistemas e se caracterizam por ter uma forte associação com a estrutura local do habitat (Uetz 1991), o que torna esse grupo um indicador de alterações ambientais ligadas ao manejo e fragmentação de habitats (Baldissera et al. 2004; Baldissera et al. 2008; Baldissera & Silva 2010; Baldissera 2012). 2. JUSTIFICATIVA Aracnídeos são abundantes e diversos nos ecossistemas terrestres, abrangendo diferentes níveis tróficos e possuindo várias características de vida de uso e seleção de habitat, bem como de dispersão no ambiente. Dessa forma, o estudo de sua distribuição e ocorrência, e dos descritores que influenciam nessas características nos ecossistemas riograndenses pode trazer informações importantes para o manejo e conservação desse grupo, e das condições necessárias para que seus habitats possam ser preservados e manejados (Harrison et al. 1992; Williams 1996; Lennon et al. 2001; Spector 2002; Wiersma & Urban 2005; McKnight et al. 2007). Essas informações são muito importantes, principalmente no bioma Pampa, considerando que o nível geral de conhecimento nos campos sulinos é precário (Bencke 2009). O estudo da biodiversidade de aracnídeos com uma abordagem de partição da variação explicada por fatores ambientais e espaciais multiescalares nos ecossistemas do Rio Grande do Sul é uma proposta inovadora, principalmente nos campos e ecossistemas associados, os quais possuem levantamentos pontuais e dispersos. Bencke (2009) apresenta uma revisão sobre o conhecimento atual dos endemismos e espécies ameaçadas das formações campestres de modo geral, indicando a necessidade de mais 3 levantamentos para a região. Baldissera (2012) realizou um dos primeiros estudos da diversidade de Araneae com essa abordagem no estado e no país, ressaltando a importância de fatores ligados ao manejo de entornos de fragmentos florestais na explicação da variação da diversidade beta da metacomunidade, bem como a influência sinergística de descritores locais e de paisagem na distribuição espacialmente estruturada da composição de aranhas. Em outros ecossistemas do RS, pesquisas têm mostrado que aracnídeos respondem às condições ambientais relacionadas com a alteração de habitats ao longo de bordas entre florestas e campos e ao manejo de florestas plantadas (Frainer & Duarte 2009; Baldissera et al. 2008). Adicionalmente, a formação e aprofundamento dos conhecimentos de profissionais capacitados nos diversos aspectos da pesquisa da biodiversidade, desde fundamentação da teoria ecológica, desenho amostral, coleta, triagem, identificação e análises estatísticas é extremamente importante para fazer frente ao crescente apelo social de proteção da biodiversidade brasileira e riograndense. Além disso, o conhecimento básico a respeito de alguns ecossistemas do RS, como é o caso dos campos, se faz imprescindível para subsidiar também as ações de planejamento da expansão econômica. Essa pesquisa estará vinculada ao Projeto Institucional Rede de Pesquisa SISBIOTA (MCT/CNPq/MEC/CAPES/FNDCT) “Biodiversidade dos campos e dos ecótonos campo-floresta no sul do Brasil: bases ecológicas para sua conservação e uso sustentável” do PPG-Ecologia da UFRGS, sob a coordenação do Prof. Dr. Valério De Patta Pillar. Vinculada a essa pesquisa, já está em andamento um levantamento de aranhas por parte da aluna doutoranda Luciana R. Poidgaiski, a qual abordará a diversidade de atributos funcionais desse grupo. O presente projeto vem, então, a complementar essa abordagem no aspecto da diversidade alfa e beta e expandir, se possível, para outros grupos de aracnídeos. O presente projeto estará vinculado ao Laboratório de Ecologia Quantitativa e ao Laboratório de Populações e Comunidades, do Departamento de Ecologia da UFRGS. 4 3. OBJETIVOS 3.1. Geral Analisar os padrões de diversidade alfa e beta de aracnídeos em áreas de campo e de ecótonos campo-floresta no estado do Rio Grande do Sul e como essas diversidades respondem à influência de descritores ambientais e espaciais em diferentes escalas. 3.2. Específicos 1. Fazer levantamentos quantitativos de aracnídeos em áreas de ecótono entre campos e florestas associadas no RS, aumentando o conhecimento científico sobre o grupo; 2. Determinar a importância relativa de variáveis ambientais e espaciais para a descrição dos padrões de diversidade alfa e beta de aracnídeos nos campos sulinos e ecótonos campo-floresta; 3. Acessar a variação na diversidade alfa e beta de aracnídeos explicada por descritores locais (habitat), regionais (paisagem) e biogeográficos (clima) e suas possíveis interações hierárquicas; 4. Determinar se há fatores ligados ao uso do solo nas diferentes escalas de estudo que expliquem a distribuição da diversidade observada. 4. MÉTODOS 4.1. Regiões de estudo 4.1.1. Campos sulinos Os campos do sul do Brasil já caracterizavam o Rio Grande do Sul antes da expansão das formações florestais ocorrida após a metade do Holoceno (Behling & Pillar 2007). Pela classificação do IBGE, estão incluídos no bioma Pampa na porção sul e oeste do RS. Nas partes mais altas do planalto, inserem-se no bioma Mata Atlântica associados a florestas com Araucária. Os campos são responsáveis por importantes serviços ambientais e têm sido a principal fonte forrageira para a atividade pastoril, que no RS é um dos principais setores da economia (Pillar et al. 2006, Pillar et al. 2009). 5 Esses ecossistemas campestres possuem alta biodiversidade, cerca de 2,2 mil espécies vegetais, cujo conhecimento sobre usos potenciais ainda é incipiente (Boldrini 2009), e com elevada diversidade faunística incluindo espécies ameaçadas de extinção (Bencke 2009). No entanto, o conhecimento, manejo e conservação desses ecossistemas ainda precisam ser expandidos. Nas últimas três décadas, a conversão dos campos para agricultura e silvicultura fez com que remanescentes com vegetação campestre natural cobrissem apenas cerca de 50% da área original (Cordeiro & Hasenack 2009). A perda de habitat, associada à fragmentação desses ecossistemas tem consequências nos padrões de distribuição da biodiversidade e incremento nos riscos de extinções de espécies da flora e da fauna silvestre. A rede de unidades de conservação do bioma Pampa tem apenas 0,33% do bioma protegidos no RS (Overbeck et al. 2007). Ou seja, a grande maioria das áreas que ainda hoje mantêm características ecossistêmicas dos campos típicos dessa região estão submetidas ao manejo tradicional com uso pastoril (Cordeiro & Hasenack 2009). 4.1.2. Ecótonos campo-floresta Ecótono é o contato entre tipos de vegetação com estruturas fisionômicas distintas e sua delimitação tende a ser facilmente perceptível. A Rede de Pesquisa SISBIOTA envolverá estudos de padrões de organização de comunidades florestais associadas aos campos bem como de processos ecológicos nesses ecótonos. Na região de estudo, os ecossistemas campestres formam ecótonos com florestas ombrófilas mistas (floresta com Araucária), no planalto, e florestas estacionais deciduais e semideciduais no noroeste e centro-sul do RS (Brasil 2004). As áreas campestres apresentam adensamento de espécies lenhosas e há registro de expansão florestal junto às bordas com as florestas (Müller et al. 2007; Dadalt 2010). Esses processos de expansão florestal estão associados a mudanças climáticas históricas (Behling et al. 2005), bem como a mudanças locais relacionadas aos regimes de manejo, especialmente aqueles relacionados com pastejo e fogo (Müller et al. 2007; Dadalt 2010). Os padrões de diversidade tendem a ser extremamente dinâmicos nestas áreas de ecótono, sendo ainda pouco conhecidos tanto em comunidades campestres quanto nas florestais associadas. Porém, considerando-se aracnídeos, tem-se registros de aumento da diversidade de aranhas em áreas de ecótono campo-floresta no planalto riograndense (Baldissera et al. 2004). 6 4.2. Desenho amostral e coletas As áreas, em escala regional localizam-se nos municípios de Aceguá, Alegrete, Cachoeira do Sul, Candiota, Capivari do Sul, Cruz Alta, Dom Pedrito, Palmares do Sul, Júlio de Castilhos e Rio Pardo. As áreas de ecótono estão sendo amostradas em Cambará do Sul, Encruzilhada do Sul, Herval, Jaquirana, Santana da Boa Vista, Santana do Livramento, São Francisco de Assis, São Francisco de Paula e São Miguel das Missões. Em escala de paisagem, unidades amostrais da paisagem (UAP) servem de base para as coletas em diferentes regiões dos campos e a identificação dos locais considerou parâmetros estruturais da paisagem em áreas remanescentes naturais e perturbadas com diferentes níveis de fragmentação de habitats a partir de imagens de satélite já disponíveis (Cordeiro & Hasenack 2009). Dessa forma, as áreas escolhidas representam variações nos níveis de fragmentação da paisagem. Cada UAP é delimitada com aproximadamente 4 km2. Em escala local, estão sendo alocadas dentro de cada UAP unidades amostrais locais (UAL) com tamanho de 4900 m2. Em áreas campestres, redes de varreduras foram utilizadas para coletar artrópodes ao longo de transecções que correspondem a um número fixo de acionamentos da rede. Cada transecção é considerada a unidade amostral básica, ou seja, a menor escala de amostragem. Nas áreas de ecótono entre campo e floresta, serão postadas cinco armadilhas de queda nos 100 metros para dentro do campo, cinco na borda e cinco nos 100 metros para dentro da floresta. 4.2.1. Descritores ambientais Na escala regional, as variáveis medidas são temperatura e pluviosidade (Worldclim 1.4 – Hijmans et al. 2005), considerando-se os valores anuais médios para o período 1950-2000; altitude (Topodata – Valeriano 2008), obtida a partir dos valores de Shuttle Radar Topographic Mission, com resolução de 30 m; e tipos de solos obtidos a partir de mapeamentos na escala 1:250.000 (IBGE 1986). As variáveis ambientais, na escala de paisagem, incluem geomorfometria (declividade, orientação, formas de relevo), características de uso e conversão da paisagem e na proporção de áreas com campo. Medidas de variáveis climáticas (Worldclim 1.4) também serão utilizadas nessa escala para caracterizar as paisagens. 7 Três níveis de paisagem estão sendo avaliadas: manchas, classes de manchas e paisagem. As seguintes variáveis são medidas em cada nível: 1. Mancha: área, índice da dimensão fractal, índice de contiguidade; 2. Classe de mancha: dimensão fractal da relação perímetro-área, distribuição do índice da dimensão fractal, distribuição do índice de linearidade, distribuição do índice de contiguidade; 3. Paisagem: dimensão fractal da relação perímetro-área, distribuição do índice fractal, distribuição do índice de contiguidade. Dentro de cada unidade de amostragem local (UAL), serão realizadas medidas da estrutura de habitat: altura média da vegetação, profundidade média da serapilheira e estimativa da cobertura vegetal. O projeto SISBIOTA prevê a amostragem de artrópodes em 20 UAPs para o RS, contendo cada UAP, no mínimo, três UALs. O presente projeto utilizará, principalmente, as coletas já realizadas naquele projeto para identificar as espécies de aracnídeos, compilar os descritores em escala regional e de paisagem e realizar as análises estatísticas propostas. As novas atividades de coleta serão realizadas somente nas áreas de ecótono campo-floresta. Em laboratório, os aracnídeos serão divididos e identificados em nível de ordem no primeiro momento. Um reconhecimento das unidades taxonômicas básicas (Recognizable Taxonomic Units) será realizado e os espécimes serão identificados no nível mais fino possível (pelo menos família e/ou gênero). Sempre que necessário, especialistas nas áreas serão consultados. 4.3. Análises estatísticas 4.3.1. Análises gerais Os diferentes níveis de diversidade são indissociáveis da escala na qual foram avaliados. Ou seja, há uma hierarquia de diferentes diversidades alfa, beta e gama, dependendo da escala que se adota. A diversidade alfa básica (local) será representada pela riqueza e a equidade dos táxons de cada transecção no campo e de cada armadilha de queda nos ecótonos. Sendo a riqueza dependente do tamanho amostral, os esforços amostrais serão padronizados. Adicionalmente, por causa da influência do tamanho da 8 amostra (abundância) sobre a riqueza, serão utilizados estimadores de riqueza (rarefação e extrapolação). A diversidade beta básica será representada pela substituição das espécies de um local para outro dentro da UAL, ou seja, de uma transecção e de uma armadilha de queda à outra. Como o que determina se a variação na diversidade beta (ou substituição das espécies) é significativa é o grau de heterogeneidade entre os locais, será realizada uma análise de partição aditiva da diversidade para acessar os padrões de variação nas diversidades alfa e beta nas diferentes escalas amostradas (Veech & Crist 2009). Nesse projeto, temos a presença de quatro níveis de diversidade: transecções/armadilhas de queda (alfa e beta nível 1), UALs (alfa e beta nível 2), UAPs (alfa e beta nível 3) e regiões (alfa e beta nível 4). Essa análise permitirá detectar em quais níveis há diferenças significativas nas diversidades alfa e beta. 4.3.2. Influência dos descritores sobre a diversidade alfa Será analisada a influência hierárquica dos descritores sobre a diversidade alfa. Dessa forma, o efeito dos descritores ambientais em cada unidade de descrição (UAL, UAP ou região) sobre a diversidade alfa será avaliado independente e conjuntamente para cada unidade de descrição, permitindo que se avaliem os efeitos conjugados (hierárquicos) dos descritores em níveis diferentes sobre a diversidade alfa. Para analisar esses dados será utilizado um modelo linear hierárquico (Hierarchical Linear Model – HLM). Esse tipo de modelo utiliza regressões aninhadas em diferentes escalas, o que leva em consideração como as observações podem estar correlacionadas nos grupos dentro da hierarquia (McMahon & Diez 2007). Testes de hipóteses podem ser aplicados não somente para acessar a significância das relações entre as variáveis em diferentes escalas, mas também a intensidade dessas relações e seu poder explicativo entre as escalas. Brevemente, pelo fato de que a variável resposta diversidade alfa (Y) está associada não apenas com as i observações na escala local, mas sim aninhada dentro de j grupos, os resíduos estão correlacionados e não se pode assumir que sejam independentes (Hurlbert 1984). Para corrigir esse problema de associação entre as amostras locais em HLM, as relações do primeiro nível são modeladas não pelos interceptos e declividade totais, mas sim por aqueles de cada um dos j = 1,...,J grupos do nível hierárquico imediatamente superior. Essa abordagem corrige a falta de independência dos erros gerados pela correlação das variáveis dentro dos grupos (McMahon & Diez 2007). 9 4.3.3. Influência dos descritores sobre a diversidade beta A partir da análise de partição aditiva da diversidade, será constatada em qual escala há uma variação significativa da diversidade beta e os valores nessa escala serão utilizados nessa análise. Ressalta-se que mesmo que a diversidade beta varie significativamente em uma escala maior do que as transecções/armadilhas de queda (consideradas as unidades amostrais básicas), ainda poderão ser utilizados os descritores desse nível, pois esses descritores podem ter parcelas significativas de efeitos conjuntos (joint effects) com descritores em outros níveis sobre a diversidade beta. Há várias abordagens diferentes para se analisar a diversidade beta (Anderson et al. 2011). Nesse estudo utilizaremos o método de partição da variância (Legendre et al. 2005). Esse método consiste em repartir a variância (soma de quadrados) de uma matriz multivariada n × p (sítios × espécies) explicada por diferentes conjuntos de matrizes multivariadas representando as variáveis explicativas ambientais e espaciais. O método se utiliza de uma série de análises canônicas (RDA). Inicialmente, é realizada uma seleção das variáveis explicativas (forward selection) de cada matriz ambiental e espacial baseadas em um R2adjustado e um valor de p (< 0,05) de um teste global com todas as variáveis (Blanchet et al. 2008). Em seguida, as variáveis escolhidas são agrupadas em uma nova matriz ambiental e espacial e é realizada a partição da variância de cada conjunto de variáveis. Essa abordagem permite desdobrar a variância da matriz de espécies em componentes explicados somente pelo ambiente, somente pelo espaço e pelo componente do ambiente espacialmente estruturado (joint effects). Os efeitos das variáveis ambientais escolhidas são analisados repartindo-se a fração ambiental + espacial. Dessa forma, podem-se analisar os efeitos individuais de cada variável e, também, seus efeitos conjuntos (joint effects). Adicionalmente, um modelo espacial escalar aditivo será utilizado para acessar a importância relativa do ambiente espacialmente estruturado e do espaço sozinho sobre a variância da diversidade beta a partir dos valores ajustados das regressões múltiplas em cada vetor de espécie na matriz multivariada (Laliberté et al. 2008; Carvalho et al. 2011). As variáveis espaciais serão medidas utilizando-se coordenadas principais de matrizes vizinhas (principal coordinates of neighbour matrices – PCNM), um método adequado para a detecção de padrões espaciais em uma amplitude de escalas (Borcard & Legendre 2002, Borcard et al. 2004, Dray et al. 2006). O método consiste em 10 primeiramente utilizar as coordenadas geográficas de cada localidade para construir uma matriz de distâncias euclidianas. Posteriormente, essa matriz é truncada na menor distância que mantém todas as localidades conectadas em uma única rede, a qual corresponde à distância máxima entre duas localidades sucessivas em estudos unidimensionais. A porção truncada é preenchida com um valor de distância arbitrário. Após isso, uma análise de coordenadas principais (PCoA) é realizada e os autovetores associados com os autovalores positivos são retidos como variáveis espaciais (variáveis PCNMs). 5. RESULTADOS ESPERADOS E PRINCIPAIS CONTRIBUIÇÕES CIENTÍFICAS 1. Contribuição para o conhecimento de aracnídeos das áreas campestres dos biomas Pampa e Mata Atlântica no Rio Grande do Sul; 2. Acesso aos padrões de distribuição da diversidade alfa e beta de aracnídeos em diferentes escalas e quais variáveis influenciam esses padrões; 3. Explicação dos processos que estão influenciando nos padrões de diversidade alfa e beta encontrados; 4. Reconhecimento da importância isolada e conjunta de fatores locais, regionais e biogeográficos para a distribuição da diversidade de aracnídeos em campos; 5. Qualificação do conhecimento sobre a distribuição de espécies de aracnídeos nos campos e subsídios para a produção de modelos de distribuição potencial; 6. Geração de informação a respeito das principais conversões de uso de terra na região do estudo e sobre os cenários de conectividade estrutural potencial para as comunidades de aracnídeos; 7. Descrição das unidades de paisagem nas diferentes regiões estudadas e como essa estrutura influencia nos padrões de diversidade encontrados, com ênfase na descrição de variáveis ligadas à fragmentação de habitats; 8. A partir dos resultados acima descritos, espera-se sugerir ações de conservação, restauração ou manejo que possibilitem a manutenção da diversidade de aracnídeos dos campos dos biomas Pampa e Mata Atlântica. Pelo fato desse projeto estar inserido no Edital “SISBIOTA: pesquisa em redes temáticas para ampliação do conhecimento sobre a biota, o papel funcional, uso e conservação da biodiversidade brasileira” (Edital 47/2010), ele vem contribuir para a 11 ampliação e consolidação de um banco de dados sobre a diversidade de espécies e funcional de animais de ecossistemas campestres e florestais associados. Além disso, contribuirá para a obtenção de parâmetros e indicadores robustos sobre os efeitos da fragmentação dos habitats campestres naturais. Por conseguinte, proporcionará, também, bases ecológicas mais sólidas para subsidiar políticas públicas de conservação, restauração e uso sustentável dos campos sulinos e ecossistemas florestais associados. Outros resultados previstos estão ligados ao desenvolvimento institucional, tais como uma integração das pesquisas dos laboratórios do PPG-Ecologia, gerando informações relevantes para um grande número de táxons; capacitação dos alunos e pesquisadores do PPG-Ecologia para trabalhar numa linha de pesquisa envolvendo outros grupos animais; uma aproximação do PPG-Ecologia com os órgãos governamentais de pesquisas, aliando esforços e gerando maior contribuição; o aumento da produção docente do PPG-Ecologia em periódicos qualificados; formação de recursos humanos do PPG-Ecologia, através de orientação, ou co-orientação de aluno(s) de mestrado e/ou de iniciação científica. 6. INFRAESTRUTURA DO DEPARTAMENTO DE ECOLOGIA O Departamento de Ecologia da UFRGS dispõe dos equipamentos necessários para a preparação e análise do material, que será realizada com o auxílio de estereomicroscópio e microscópio óptico, e balança de precisão. A biblioteca do Departamento possui uma vasta bibliografia especializada na área de Ecologia e, além disso, o Laboratório de Ecologia de Populações e Comunidades também conta com uma extensa lista de referências disponíveis. O PPG-Ecologia da UFRGS recebeu conceito 5 na última avaliação da Capes, pois tem forte produção científica internacional e ênfase na realização de convênios e intercâmbios nacionais e internacionais em busca da excelência científica. 7. PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA Atividade Coleta de artrópodes nos ecótonos Coleta de artrópodes Custeio Combustível Quantidade 1000 l Valor (R$) 2.800,00 Material para coleta (álcool, - 500,00 12 nos ecótonos Identificação e estoque do material Impressões diversas Publicação resultados armadilhas de queda, etc.) Material de laboratório (potes, álcool, etc.) Pôsters, planilhas, etc. Taxa publicação periódico Plos One Análise de dados e discussão Coleta de artrópodes Divulgação dos resultados da pesquisa Divulgação dos resultados da pesquisa Divulgação dos resultados da pesquisa Divulgação dos resultados da pesquisa Total Aquisição de bibliografias - 500,00 1 - 500,00 2.700,00 (US$ 1.350,00) 750,00 Diárias Diárias nacionais 20 5 2.000,00 500,00 Diárias internacionais 5 1.500,00 Passagem aérea nacional (ida e volta) Passagem aérea internacional 1 1.000,00 1 3.000,00 15.750,00 Fonte dos recursos: Taxa de bancada mensal Bolsa de Pós-Doutorado Júnior CNPq = R$ 4.800,00. Os demais recursos serão financiados pelo projeto SISBIOTA com recursos já aprovados em edital CNPq e FAPERGS. 8. PLANO DE TRABALHO Metas para o primeiro semestre - realização de 50% dos levantamentos com uso de armadilhas de queda nos ecótonos; - triagem e identificação do material; - realização de reuniões periódicas com a equipe; - organização dos mapas da paisagem para medidas dos descritores de manchas, classes e paisagens; - consulta ao banco de dados WorldClim – Global Climate Data para acesso aos dados dos descritores regionais. Metas para o segundo semestre - realização dos últimos 50% dos levantamentos com uso de armadilhas de queda nos ecótonos; - triagem e identificação do material; 13 - realização de reuniões periódicas com a equipe; - planificação das matrizes de dados de diversidade; - montagem final das planilhas de dados dos descritores paisagísticos e regionais; - análise descritiva das matrizes; - publicação de pelo menos dois artigos científicos com os resultados gerais da diversidade; - apresentação de seminário final aberto ao público para divulgar os resultados da pesquisa. OUTRAS ATIVIDADES DO BOLSISTA - publicação dos resultados em periódicos científicos; - participação em seminários, palestras, bancas examinadoras, reuniões científicas; - participação no Congresso Anual de Biologia Tropical e Conservação (ATBC); - participação no Annual Meeting of Ecological Society of America; - apresentação dos resultados da pesquisa em congressos e encontros nacionais e internacionais; - publicação dos resultados das pesquisas dos orientandos do bolsista PDJ em periódicos científicos; 9. ATIVIDADES ACADÊMICAS - participação, como professor visitante, na disciplina de Ecologia de Campo e na de Ecologia de Comunidades do PPG Ecologia da UFRGS. 10. REFERÊNCIAS ANDERSON, M. J., CRIST, T. O., CHASE, J. M., VELLEND, M., INOUYE, B. D., FREESTONE, A. L., SANDERS, N. J., CORNELL, H. V., COMITA, L. S., DAVIES, K. F., HARRISON, S. P., KRAFT, N. J. B., STEGEN, J. C., SWENSON, N. G. 2011. Navigating the multiple meanings of β diversity: a roadmap for the practicing ecologist. Ecology Letters, 14,19-28. 14 BALDISSERA, R., GANADE, G., FONTOURA, S.B. 2004. Web spider community response along an edge between pasture and Araucaria forest. Biological Conservation, 118:403-409. BALDISSERA, R., GANADE, G., BRESCOVIT, A.D., HARTZ, S.M. 2008. Landscape mosaic of Araucaria Forest and Forest monocultures influencing understorey spider assemblages in southern Brazil. Austral Ecology, 33:45-54. BALDISSERA, R., SILVA, V.R. 2010. Diversity and composition of arbustive spiders in an Atlantic Forest fragment and two adjacent areas. Neotropical Biology and Conservation 5: 77-85. BALDISSERA, R. 2012. Estrutura e composição de assembleias de aranhas em manchas de vegetação na porção austral da Mata Atlântica. Tese de Doutorado. Porto Alegre: UFRGS. 103 p. BEHLING, H., PILLAR, V.D., BAUERMANN, S.G. 2005. Late Quaternary grassland (Campos), gallery forest, fire and climate dynamics, studied by pollen, charcoal and multivariate analysis of the São Francisco de Assis core in western Rio Grande do Sul (southern Brazil). Review of Palaeobotany and Palynology 133: 235– 248. BEHLING, H., PILLAR, V.D. 2007. Late Quaternary vegetation, biodiversity and fire dynamics on the southern Brazilian highland and their implication for conservation and management of modern Araucaria forest and grassland ecosystems. Philosophical Transactions Royal Society B 362: 243–251. 10.1098/rstb.2006.1984 BELL, G. 2001. Neutral macroecology. Science, 293, 2413–2418. BENCKE, G.A. 2009. Diversidade e conservação da fauna dos Campos do Sul do Brasil. In Campos Sulinos: Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade (ed. V. D. Pillar, S. C. Müller, Z. M. S. Castilhos & A. V. A. BLANCHET, F.G., LEGENDRE, P., BORCARD, D. 2008. Forward selection of explanatory variables. Ecology 89: 2623-2632. 15 BOLDRINI, I.I. 2009. A flora dos Campos do Rio Grande do Sul. In Campos Sulinos: Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade (ed. V. D. Pillar, S. C. Müller, Z. M. S. Castilhos & A. V. A. Jacques), pp. 63-77. Brasília, Ministério do Meio Ambiente. BORCARD, D., LEGENDRE, P., DRAPEAU, P. 1992. Partialling out the spatial component of ecological variation. Ecology, 73:1045-1055. BORCARD, D., LEGENDRE, P. 2002. All-scale spatial analysis of ecological data by means of principal coordinates of neighbour matrices. Ecological Modelling, 153, 5168. BORCARD. D., LEGENDRE, P., AVOIS-JACQUET, C., TUOMISTO, H. 2004. Dissecting the spatial structure of ecological data at multiple scales. Ecology, 85, 18261832. BRASIL. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Diretoria de Geociências. Mapa de Vegetação do Brasil. Brasília, 2004. Escala 1:250.000. CARVALHO, J.C., CARDOSO, P., CRESPO, L.C., HENRIQUES, S., CARVALHO, R., GOMES, P. 2011. Determinants of beta diversity of spiders in coastal dunes along a gradient of mediterraneity. Diversity and Distributions, 17:225-234. CARVALHO, J.C., CARDOSO, P., CRESPO, L.C., HENRIQUES, S., CARVALHO, R., GOMES, P. 2012. Determinants of spider species richness in coastal dunes along a gradient of mediterraneity. Insect Conservation and Diversity 5:127-137. CORDEIRO, J.L.P., HASENACK, H. 2009. Cobertura vegetal atual do Rio Grande do Sul. In Campos Sulinos: Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade (ed. V. D. Pillar, S. C. Müller, Z. M. S. Castilhos & A. V. A. Jacques), pp. 285-299. Brasília, Ministério do Meio Ambiente. 16 DADALT, L.P. 2010. Padrões de diversidade da vegetação lenhosa da região do Alto Camaquã, Rio Grande do Sul, Brasil. In PPG-Ecologia, vol. Mestrado. Porto Alegre, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. DRAY, S., LEGENDRE, P., PERES-NETO, P. R. 2006. Spatial modelling: a comprehensive framework for principal coordinate analysis of neighbour matrices (PCNM). Ecological Modelling, 196, 483-493. FRAINER, A., DUARTE, M.M. 2009. Soil invertebrates in southern Brazilian Araucaria forest – grassland mosaic: differences between disturbed and undisturbed areas. Iheringia Série Zoologia 99:307-312. HARRISON, S., ROSS, S.J., LAWTON, J.H. 1992. Beta-diversity on geographic gradients in Britain. Journal of Animal Ecology, 61:151-158. HE, F. 2005. Deriving a neutral model of species abundance from fundamental mechanisms of population dynamics. Functional Ecology, 19:187–193. HIJMANS, R.J., CAMERON, A.C., PARRA, J.L., JONES, P.G., JARVIS, A. 2005. Very high resolution interpolated climate surfaces for global land areas. International Journal of Climatology 25: 1965- 1978. HUBBELL, S.P. 2001. The unified neutral theory of biodiversity and biogeography. Princeton University Press, Princeton. HURLBERT, S.H. 1984. Pseudoreplication and the design of ecological field experiments. Ecological Monographs 54:187-211. LALIBERTÉ, E, PAQUETTE, A., LEGENDRE, P., BOUCHARD, A. 2008. Assessing the scale-specific importance of niches and other spatial processes on beta diversity: a case study from a temperate forest. Oecologia 159:377-388. 17 LEGENDRE, P., BORCARD, D., PERES-NETO, P.R. 2005. Analyzing beta diversity: partitioning the spatial variation of community composition data. Ecological Monographs, 75:435-450. LENNON, J.J., KOLEFF, P., GREENWOOD, J.J.D., GASTON, K.J. 2009. Partitioning beta diversity in a subtropical broad-leaved forest of China. Ecology, 90:663-674. MCMAHON, S.M., DIEZ, J.M.2007. Scales of association: hierarchical linear models and the measurement of ecological systems. Ecology Letters 10:437-452. MCKNIGHT, M.W., WHITE, P.S., MCDONALD, R.I., LAMOREUX, J.F., SECHREST, W., RIDGELY, R.S., STUART, S.N. 2007. Putting beta-diversity on the map: broad-scale congruence and coincidence in the extremes. Public Library of Science – Biology, 5:2424-2432. MÜLLER, S., OVERBECK, G., PFADENHAUER, J., PILLAR, V. 2007. Plant functional types of woody species related to fire disturbance in forest-grassland ecotones. Plant Ecology 189: 1-14. OVERBECK, G.E., MÜLLER, S.C., FIDELIS, A., PFADENHAUER, J., PILLAR, V.D., BLANCO, C.C., BOLDRINI, I.I., BOTH, R., FORNECK, E.D. 2007. Brazil’s neglected biome: The South Brazilian Campos. Perspectives in Plant Ecology, Evolution and Systematics 9: 101-116. PILLAR, V.D., BOLDRINI, I.I., HASENACK, H., JACQUES, A.V.A., BOTH, R., MÜLLER, S.C., EGGERS, L., FIDELIS, A., SANTOS, M.M.G., OLIVEIRA, J.M., CERVEIRA, J., BLANCO, C., JONER, F., CORDEIRO, J.L., PINILLOS GALINDO, M. 2006. Workshop "Estado atual e desafios para a conservação dos campos", pp. 24. Porto Alegre, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. PILLAR, V.D., MÜLLER, S.C., CASTILHOS, Z.M.S., JACQUES, A.V.A. 2009. Campos Sulinos: Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade. Brasília, Ministério do Meio Ambiente. 18 SATTLER, T., BORCARD, D., ARLETTAZ, R., BONTADINA, F., LEGENDRE, P., OBRIST, M.K., MORETTI, M. 2010. Spider, bee, and bird communities in cities are shaped by environmental control and high stochasticity. Ecology 91:3343-3353. SPECTOR, S. 2002. Biogeographic crossroads as priority areas for biodiversity conservation. Conservation Biology, 16:1480-1487. UETZ, G.W. 1991 Habitat structure and spider foraging. In: Bell SS, McCoy ED, Mushinsky HR. Habitat structure: the physical arrangement of objects in space. Chapman & Hall: London. pp. 325–348. VALERIANO, M.M. 2008. TOPDATA: Guia de utilização de dados geomorfométricos locais, INPE. VEECH, J. A., CRIST. T. O. 2009. PARTITION 3.0 user’s manual. (unpublished document). WILLIAMS, P.H. 1996. Mapping variations in the strength and breadth of biogeographic transition zones using species turnover. Proceedings of the Royal Society B: Biological Sciences, 263:579-588. WIERSMA, Y.F., URBAN, D.L. 2005. Beta diversity and nature reserve system design in the Yukon, Canada. Conservation Biology, 19:1262-1272. 19