UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
RICARDO KLEIBER DE LIMA SILVA
CALÇADAS INVISÍVEIS: aspectos do passeio público, em Natal-RN,
como projeção de uma cidadania ausente
NATAL
2013
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
RICARDO KLEIBER DE LIMA SILVA
CALÇADAS INVISÍVEIS: aspectos do passeio público, em Natal-RN,
como projeção de uma cidadania ausente
NATAL
2013
RICARDO KLEIBER DE LIMA SILVA
CALÇADAS INVISÍVEIS: aspectos do passeio público, em Natal-RN, como
projeção de uma cidadania ausente
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Ciências Sociais da
Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, como parte dos requisitos para a
obtenção do título de Mestre em Ciências
Sociais.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Lisabete Coradini.
NATAL
2013
Catalogação da Publicação na Fonte.
Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes (CCHLA).
Silva, Ricardo Kleiber de Lima.
Calçadas invisíveis : aspectos do passeio público, em Natal - RN,
como projeção de uma cidadania ausente / Ricardo Kleiber de Lima Silva.
– 2013.
136 f.: il. Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Rio Grande do
Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programa de Pós
Graduação em Ciências Sociais, 2013.
Orientadora: Prof.ª Dra. Lisabete Coradini.
1. Acessibilidade – Natal(RN). 2. Arquitetura e deficiente. 3. Espaços
urbanos. 4. Mobilidade urbana. 5. Passeio público. I. Coradini, Lisabete. II.
Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.
RN/BSE-CCHLA
CDU 712.36(813.2)
RICARDO KLEIBER DE LIMA SILVA
CALÇADAS INVISÍVEIS: aspectos do passeio público, em Natal-RN, como
projeção de uma cidadania ausente
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Ciências Sociais da
Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, como parte dos requisitos para a
obtenção do título de Mestre em Ciências
Sociais.
Aprovada em:____ de ______________ de 2013.
______________________________________
Prof.ª Dr.ª Lisabete Coradini
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Orientadora
_______________________________________
Prof.ª Dr.ª Mónica Lourdes Franch Gutiérrez
Universidade Federal da Paraíba
Membro
_______________________________________
Prof. Dr. Lincoln Moraes de Souza
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Membro
AGRADECIMENTOS
Ao Criador, que me ensina por meio de pequenas coisas a importância de
amar a vida.
Aos meus pais, que me orientaram a lutar pela realização dos meus sonhos,
sempre colocando a frente o trabalho e a força de vontade.
Ao meu irmão, Rogério, pelas palavras de incentivo e pela colaboração nas
minhas necessidades em todos os momentos.
Aos meus amigos, Flávio César Oliveira da Rosa e Sandovânia Maria de
Oliveira, que sempre estiveram presentes nos momentos de dificuldade.
A minha orientadora, Professora Lisabete Coradini, por sua confiança e
incentivo à produção acadêmica.
Aos professores que fazem parte do programa de pós-graduação, em
especial aos professores Lincoln Moraes de Souza e Dalcy da Silva Cruz.
A professora Lélia Batista de Souza, pelo incentivo dado à continuidade dos
meus estudos.
O inferno dos vivos não é algo que será;
se existe, é aquele que já está aqui, o
inferno no qual vivemos todos os dias, que
formamos estando juntos. Existem duas
maneiras de não sofrer. A primeira é fácil
para a maioria das pessoas: aceitar o
inferno e tornar-se parte deste até o ponto
de deixar de percebê-lo. A segunda é
arriscada e exige atenção e aprendizagem
contínuas: tentar saber reconhecer quem e
o que, no meio do inferno, não é inferno, e
preservá-lo, e abrir espaço*.
(Italo Calvino)
*
Personagem Marco Polo de “Cidades Invisíveis” (CALVINO, 2003, p.158).
RESUMO
Esse estudo tem por objetivo estabelecer uma relação entre as características do
passeio público do bairro de Lagoa Nova, em Natal, e o tipo de cidadão que os
moldes de construção e manutenção desse espaço refletem. Entende-se aqui como
passeio público, especificamente, o local destinado ao trânsito de pedestres, situado
entre os lotes urbanos e a via de acesso aos veículos motorizados. Procura-se fazer
um breve histórico sobre a ocupação dessa região e uma descrição detalhada das
características físicas de suas calçadas, que apresentam inúmeros obstáculos á
acessibilidade dos transeuntes, tentando encontrar possíveis fatores que expliquem
o seu “traçado problemático”, visto que, aparentemente, em sua maior parte a
acessibilidade de pedestres é comprometida. Investiga-se, também, o pensamento
da população local em relação às noções de ocupação desse ambiente, bem como
aspectos culturais, políticos e econômicos que poderiam influenciar na apropriação
desse “espaço híbrido”, situado na fronteira entre o público e o privado. Confirma-se
que o formato atual do passeio público não é apenas reflexo da cidadania ou
ausência dessa, mas se constitui como agente ativo relacionado à construção
desse conjunto de direitos e deveres fundamentais ao convívio harmônico entre os
habitantes de uma cidade.
Palavras-chaves: Acessibilidade. Cidadão. Espaços Urbanos. Fotografia. Passeio
Público.
ABSTRACT
This study has as a goal to establish a relationship between public sidewalk
characteristics of Lagoa Nova District (neighborhood), in Natal and the kind of
citizens whose constructions and maintenance layouts reflects. It‟s understood here
as public sidewalk, specifically, the place reserved for passers-by traffic, located
between public lots and vehicles pavements. It‟s a concern to make a brief survey
about the occupation of this particular region and a detailed description over physical
characteristic of its sidewalks that shows several obstacles for passers-by
accessibility, trying to find possible factors that explain the “problematic format”,
once, at the first sight, most of accessibility of passers-by is compromised. It‟ also,
searched, local population thoughts regarding occupation notions about this
environment, just like as cultural, political and economical aspects that might
influence upon snatching these hybrid places located between private and public
border line. It‟s confirmed that the nowadays sidewalks‟ shapes is not only citizenship
reflection or a lack of it but shows it as an active agent related with the construction
of this set of fundamental rights and duties vital for harmonical co-living local citizens.
Key-words: Accessibility. Citizen. Urbans Places. Photography. Public Sidewalk.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Fotografia 01: Ruínas de Pompéia I .....................................................................
25
Fotografia 02: Ruínas de Pompéia II ....................................................................
25
Fotografia 03: Ruínas de Pompéia – III ................................................................
26
Fotografia 04: Vista Parcial de Natal – Começo do séc. XX ................................
27
Fotografia 05: Rua em Capim Macio, próximo à Av. Ayrton Senna .....................
28
Fotografia 06: Rua Neuza Farache, Capim Macio ...............................................
28
Fotografia 07: Calçada no Centro de Gramado/RS..............................................
29
Fotografia 08: Residência típica de Gramado/RS ................................................
30
Fotografia 09: Calçada portuguesa, formando mosaico, em Lisboa, Portugal .....
31
Fotografia 10: Calçadão da Praia de Copacabana, Rio de Janeiro......................
31
Fotografia 11: Avenida Roberto Freire, Ponta Negra, Natal/RN ...........................
31
Fotografia 12: Calçadão da Praia de Ponta Negra, Natal/RN ..............................
31
Fotografia 13: Calçada de pedra portuguesa em construção, Lagoa Nova .........
32
Fotografia 14: Calçada de pedra portuguesa em construção, Lagoa Nova .........
32
Fotografia 15: Calçada de pedra portuguesa em construção, Lagoa Nova .........
33
Fotografia 16: Travessa da Rua Henrique Góes, Bairro Lagoa Nova ..................
35
Fotografia 17: Calçadas, bairro Cidade Jardim, Natal/RN ....................................
39
Fotografia 18: Praça André de Albuquerque. Começo do séc. XX.......................
45
Fotografia 19: Praça André de Albuquerque. Visão atual ....................................
45
Fotografia 20: Localização do bairro Lagoa Nova em Natal. Mapa I ....................
49
Fotografia 21: Visão ampliada do bairro Lagoa Nova e seus limites. Mapa II ......
50
Fotografia 22: Estádio João Cláudio de Vasconcelos Machado, anos 1960 ........
53
Fotografia 23: Visão do Estádio (Machadão) em 2009 ........................................
53
Fotografia 24: Estádio (Machadão) em demolição no final de 2011 .....................
54
Fotografia 25: Travessia de pedestres, Lagoa Nova ............................................
54
Fotografia 26: Calçadas do canteiro de obras da Arena das Dunas ....................
55
Fotografia 27: Calçadas do canteiro de obras da Arena das Dunas ....................
55
Fotografia 28: Calçadas do canteiro de obras da Arena das Dunas ....................
55
Fotografia 29: Calçadas do canteiro de obras da Arena das Dunas ....................
55
Fotografia 30: Vista parcial da Avenida Senador Salgado Filho...........................
57
Fotografia 31: Final da av. Praia do Forte na Redinha .........................................
83
Fotografia 32: Av. Pres. Café Filho, Santos Reis .................................................
84
Fotografia 33: Terminal de ônibus na Av. Praia do Forte .....................................
84
Fotografia 34: Av. Praia do Forte / Início da Rua da Liberdade, Praia do Meio ...
85
Fotografia 35: Rua Erivan França. Orla de Ponta Negra (esgotos) ......................
85
Fotografia 36: Rua Erivan França. Orla de Ponta Negra (depósitos) ...................
86
Fotografia 37: Rua Erivan França. Orla de Ponta Negra (falta de manutenção) ..
86
Fotografia 38: Av. Pres. Café Filho, Praia do Meio ..............................................
87
Fotografia 39: Av. Pres. Café Filho, Praia do Meio ..............................................
87
Fotografia 40: Av. Dr. João Medeiros Filho, Redinha ...........................................
88
Fotografia 41: Rua Luiz XV, B. Nordeste .............................................................
89
Fotografia 42: Rua 25 de Março, Quintas ............................................................
89
Fotografia 43: Av. Cel. Estevam, Bairro do Alecrim .............................................
89
Fotografia 44: Rua da Liberdade, Santos Reis.....................................................
89
Fotografia 45: Trecho da Rua Jânio Cavalcante em Nova Descoberta ................
90
Fotografia 46: “Castelinho” do Zé do Monte. Rua 25 de Março, Quintas .............
90
Fotografia 47: Av. Dr. João Medeiros Filho, Bairro Igapó – Zona Norte de Natal.
91
Fotografia 48: Av. Jerônimo Câmara, Cidade da esperança ................................
92
Fotografia 49: Calçada do TCE – Av. Getúlio Vargas, Petrópolis ........................
92
Fotografia 50: Av. Getúlio Vargas, Petrópolis.......................................................
93
Fotografia 51: Rua São João de Deus, Rocas .....................................................
93
Fotografia 52: Av. Jerônimo Câmara, Lagoa Nova – CEASA ..............................
94
Fotografia 53: Rua Cel. Joaquim Correia – SEMURB ..........................................
94
Fotografia 54: Av. Rio Branco, Bairro Cidade Alta ...............................................
95
Fotografia 55: Av. Cap. Mor Gouveia Bairro, Felipe Camarão .............................
96
Fotografia 56: Rua próxima à SEMURB no Bairro Candelária .............................
96
Fotografia 57: Rua Gen. Glicério, Ribeira ............................................................
97
Fotografia 58: Rua Dr. Solon de Miranda Galvão, Próximo a UFRN ....................
97
Fotografia 59: Rua São José, Lagoa Nova. A regra .............................................
98
Fotografia 60: Av. Bernardo Vieira. Entrada Shopping Midway Mall. A exceção .
98
Fotografia 61: Rua São Joaquim. Fundos do Shopping Midway Mall ..................
99
Fotografia 62: Av. Bernardo Vieira. Entrada do Shopping Midway Mall ...............
99
Fotografia 63: Travessia de pedestres – ao fundo o estádio Arena das Dunas ... 100
Fotografia 64: Travessia de pedestres – Av. Romualdo Galvão .......................... 100
Fotografia 65: Passarela I – Av. Senador Salgado Filho ...................................... 101
Fotografia 66: Passarela II. Av. Senador Salgado Filho ....................................... 101
Fotografia 67: Passarela III. Av. Senador Salgado Filho .................................... 101
Fotografia 68: Passarela IV. Av. Senador Salgado Filho ................................... 101
Fotografia 69: Rua do Caulim, campo de futebol – Potilândia, Lagoa Nova ........ 102
Fotografia 70: Rua do Ouro, conjunto Potilândia, Lagoa Nova ............................ 103
Fotografia 71: Rua da Granada, conjunto Potilândia, Lagoa Nova ...................... 103
Fotografia 72: Rua Berilo Wanderley, Lagoa Nova .............................................. 104
Fotografia 73: Avenida Capitão Mor Gouveia, Lagoa Nova ................................. 104
Fotografia 74: Anel Viário do Campus da UFRN, Lagoa Nova............................. 105
Fotografia 75: Av. Senador Salgado Filho, próximo ao Midway Mall ................... 105
Fotografia 76: Rua Dr. Francisco Maiorana. Condomínio de “alto padrão” .......... 105
Fotografias 77, 78 e 79: Avenida Senador Salgado Filho, Lagoa Nova ............... 106
Fotografia 80, 81 e 82: Túnel. Avenida Senador Salgado Filho, Lagoa Nova ...... 107
Fotografias 83, 84, 85, 86 e 87: Avenida Senador Salgado Filho, Lagoa Nova ... 108
Fotografia 88: Muro gigantesco, Avenida Senador Salgado Filho, Lagoa Nova .. 109
Fotografia 89: Avenida Airton Senna, Natal/RN ................................................... 109
Fotografias 90, 91 e 92: Avenida Bernardo Vieira, Natal/RN ............................... 110
Fotografia 93: Avenida Bernardo Vieira, Natal/RN ............................................... 111
Fotografia 94: Avenida Bernardo Vieira, Natal/RN ............................................... 111
Fotografia 95: Avenida Dr. Mário Negócio, Natal/RN ........................................... 112
Fotografia 96: Avenida Dr. Mário Negócio, Natal/RN ........................................... 112
Fotografia 97: Rua Auris Coelho, Nova Descoberta ............................................. 113
Fotografia 98: Rua Nelson Matos, Nova Descoberta ........................................... 113
Fotografia 99, 100, 101 e 102: Calçadas no bairro Cidade Jardim, Natal/RN ...... 114
LISTA DE SIGLAS
ABNT
Associação Brasileira de Normas Técnicas
CAERN
Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte
CEASA
Centro Estadual de Abastecimento S/A
IBGE
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IHG
Instituto Histórico e Geográfico
IPEA
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
NBR
Norma Brasileira (elaborada pela ABNT)
OSCIP
Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
SENAI
Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SESC
Serviço Social do Comércio
SESI
Serviço Social da Indústria
SEMOB
Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana
SEMOPI
Secretaria Municipal de Obras Públicas e Infraestrutura
SEMOV
Secretaria Municipal de Obras e Viação
SEMURB
Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo
TCE
Tribunal de Contas do Estado
TCU
Tribunal de Contas da União
UFRN
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ..........................................................................................
1
13
“FAÇAM-SE AS CALÇADAS”: UM CAMINHO ENTRE O PÚBLICO E
O PRIVADO ...............................................................................................
25
1.1
GÊNESE ....................................................................................................
25
1.2
OS CRIADORES E A CRIATURA .............................................................
29
1.3
DEFINIÇÃO E NOMENCLATURA .............................................................
33
1.4
A CALÇADA COMO ESPAÇO PÚBLICO ..................................................
35
1.5
CIDADANIA: TRAJETÓRIA E ESPAÇO ....................................................
39
2
CALÇADAS DAS DUNAS ........................................................................
45
2.1
A URBANIZAÇÃO DE NATAL ...................................................................
45
2.2
O BAIRRO LAGOA NOVA .........................................................................
49
2.3
CARACTERÍSTICAS ATUAIS DO PASSEIO PÚBLICO............................
57
3
DIALOGANDO COM O CAMPO DE PESQUISA .....................................
63
3.1
TRAJETÓRIAS DA PESQUISA .................................................................
63
3.2
CONVERSANDO COM ALGUNS CIDADÃOS ..........................................
65
3.3
VISITANDO A SECRETARIA MUNICIPAL DE MEIO AMBIENTE E
URBANISMO (SEMURB) ..........................................................................
75
3.4
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE AS ENTREVISTAS ....................
77
4
O PASSEIO PÚBLICO E SUAS IMAGENS ..............................................
81
4.1
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE AS IMAGENS ............................
81
4.2
CALÇADA DAS DUNAS: PANORAMA GERAL DAS CALÇADAS EM NATAL
83
4.3
IMAGENS DE LAGOA NOVA ....................................................................
98
4.4
ESSE CAMINHO FOI PRODUZIDO EM PRETO E BRANCO ................... 107
4.5
PARA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DAS FLORES................................. 114
4.6
RECURSOS UTILIZADOS ........................................................................ 114
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................... 115
REFERÊNCIAS ......................................................................................... 118
APÊNDICE ................................................................................................ 124
ANEXO ...................................................................................................... 128
13
INTRODUÇÃO
O tema Mobilidade Urbana tem sido bastante debatido na atualidade, em
especial, no Brasil, devido ao mega evento esportivo da Copa do Mundo de 2014.
Conforme o Relatório do Tribunal de Contas da União 2011, o termo Mobilidade
Urbana deixou de tratar ou priorizar apenas aspectos ligados à circulação de
veículos, assumindo, hoje, o significado de deslocamento de pessoas e bens dentro
do espaço das cidades, mediante utilização de veículos, de vias públicas e da
infraestrutura disponível1. Assim, passa a ter como foco as pessoas, está ligado à
organização do território e à sustentabilidade das cidades.
A capital no Rio Grande do Norte será uma das cidades brasileiras que
sediará esse campeonato mundial de futebol. Sobre o tema mobilidade urbana em
questão, nessa capital, podem-se destacar alguns problemas – que são comuns à
maioria das cidades de mesmo porte – como a deficiência nos meios de transporte
coletivos, o constante congestionamento das principais avenidas, devido ao excesso
de veículos motorizados individuais, a falta de acesso às pessoas com necessidades
especiais etc. Dentre esses problemas, foram pesquisadas as condições de
acessibilidade aos pedestres no espaço denominado passeio público, conhecido
mais popularmente como calçada.
Entre as definições mais completas sobre passeio público cita-se a que consta
na legislação da capital Paulista2 de 25 de agosto de 2004 que assim o define:
Passeio público é a parte da via pública, normalmente segregada em nível
diferente, destinada à circulação de qualquer pessoa, independente de
idade, estatura, limitação de mobilidade ou percepção, com autonomia e
segurança, bem como à implantação de mobiliário urbano, equipamentos de
infraestrutura, vegetação, sinalização e outros fins previstos em leis
específicas (Lei Municipal nº 13885, Art. 1º).
É também, uma das normas que mais se aproxima do conceito europeu de
acessibilidade3, segundo o qual:
1
2
3
O relatório completo do TCU sobre Mobilidade Urbana pode ser acessado diretamente pelo site:
www.tcu.gov.br/contasdogoverno.
Decreto nº 45.904 de 19 de maio de 2005. Regulamenta o artigo 6º da Lei nº 13885, de 25 de
agosto de 2004, no que se refere à padronização dos passeios públicos do município de São Paulo.
Disponível em: <http://ww2.prefeitura.sp.gov.br/passeiolivre/pdf/Decreto.pdf>.
Relatório do Grupo de Peritos criado pela Comissão Europeia – 2003. Disponível em:
<http://issuu.com/uc-para-todos/docs/cea>.
14
Um meio edificado acessível constitui elemento chave para o funcionamento
de uma sociedade assente em direitos iguais, dotando os seus cidadãos de
autonomia e de meios para a prossecução de uma vida social e
economicamente activa. Constitui o fundamento de uma sociedade
inclusiva, baseada na não discriminação. A nossa sociedade assenta na
diversidade, que exige a construção de um meio físico sem barreiras e que
não crie deficiências e incapacidades. Significa que a acessibilidade é uma
preocupação de todos, não só de uma minoria com necessidades especiais.
Numa sociedade cada vez mais diversificada e a envelhecer, o objectivo
traduzir-se-ia e traduzir-se-á na promoção e adopção crescente da
acessibilidade para todos (CONCEITO EUROPEU DE ACESSIBILIDADE,
2003, p.21).
A orientação dessa pesquisa será a partir desse conceito amplo de
acessibilidade, que o define de acordo com as necessidades coletivas e não de uma
minoria com necessidades especiais, em específico.
Quando um meio edificado incorpora as características desse conceito é dito
que possui um Desenho Universal. A Associação Brasileira de Normas Técnicas,
quando trata sobre acessibilidade a edificações, mobiliário e equipamentos urbanos
estabelece que o Desenho Universal é “aquele que visa atender à maior gama de
variações possíveis das características antropométricas e sensoriais da população”
(NBR 9050, 2004)4.
Por meio da leitura de alguns trabalhos acadêmicos, como as seguintes
dissertações de mestrado: “Avaliação da política pública de acessibilidade no
período de 1992 a 2002 na cidade do Natal” (SOUSA JÚNIOR, 2005); “A cidade sem
barreiras é para todos? Avaliação das condições de deslocamento no bairro Cidade
Alta, Natal/RN, face às intervenções em acessibilidade processadas entre 1993 e
1998” (PIRES, 2007), apresentadas ao Programa de Pós-Graduação em Arquitetura
e Urbanismo da UFRN e “Natal século XX: do urbanismo ao planejamento urbano”,
tese de doutorado defendida por Pedro Antônio de Lima Santos, na USP, em 1998,
que trata, especificamente, dos planos urbanísticos concebidos para Natal desde o
início do século passado, além de dados estatísticos relacionados ao tema e do
conhecimento das normas legais5 que regulamentam esse espaço, chega-se à
seguinte problematização: as características do passeio público podem refletir o
4
5
O arquivo completo sobre acessibilidade a edificações, mobiliário e equipamentos urbanos
encontra-se disponível em: <http://portal.mj.gov.br/corde/arquivos/ABNT/NBR9050-31052004.pdf>.
Lei Municipal nº 4.090, de 03 de julho de 1992 (Dispõe sobre a eliminação de barreiras
arquitetônicas para portadores de deficiência nos locais de fluxo de pedestres e edifícios do uso
público e dá outras providencias); Lei complementar nº 055, de 27 de janeiro de 2004 (Institui o
Código de Obras e Edificações do Município de Natal e dá outras providências); Lei complementar
nº 082/2007 (Dispõe sobre Plano Diretor de Natal e dá outras providências). Disponível em:
<http://www.natal.rn.gov.br/semurb/paginas/ctd-102.html>.
15
perfil do cidadão de uma determinada região. Por meio da construção, manutenção
ou formas de apropriação desse espaço, existe a possibilidade de perceber como
esse cidadão demonstra, na prática, seu grau de compromisso com os demais
moradores de um aglomerado urbano e como esses moradores reagem diante dos
possíveis obstáculos que lhes tiram o direito de transitar de forma livre e segura
pelas calçadas de sua cidade.
Pode-se questionar, também, a influência do poder público como regulador
desse espaço, visto que para grande parte dos entrevistados a responsabilidade
pelo atual estado do passeio público recai sobre a própria administração municipal.
De qualquer forma, indiretamente, acaba-se voltando a problematização anterior,
pois as mesmas pessoas que responsabilizam o governo são também responsáveis
por manter, eleger e reeleger seus administradores.
Em trabalho anterior, Silva (2010), em que pesquisei a mesma temática,
apresentada na conclusão do curso de graduação em Ciências Sociais na UFRN, no
final de 2010, que teve como campo de trabalho o Bairro Lagoa Nova, em Natal RN, também está servindo como base, por apresentar os primeiros exercícios e
reflexões realizados durante a pesquisa. Pretende-se, agora, ampliar e aprofundar
algumas
questões
já
tratadas
anteriormente,
assim
como,
incluir
novos
conhecimentos pertinentes ao tema.
O estudo desse espaço surgiu, inicialmente, pelo interesse em identificar as
razões pelas quais o passeio público, na cidade de Natal, encontra-se, na maior
parte de suas regiões, fora dos padrões funcionais e satisfatórios de acessibilidade
aos transeuntes, bem como a relação com os problemas sociais decorrentes desse
quadro. Cabe destacar que, de acordo com o conceito citado anteriormente, a
condição necessária seria a construção de um meio físico adequado ao trânsito
seguro a todos, que não apresentasse deficiências e incapacidades para o acesso
de todo e qualquer pedestre, o que justifica ser a acessibilidade uma preocupação
comum à sociedade em geral.
Ao caminhar atentamente pela cidade, constata-se que é quase impossível
percorrer completamente, de forma contínua e segura, qualquer quarteirão sobre suas
calçadas. Geralmente, independentemente da nossa condição física, encontramos
algum tipo de obstáculo que impede, total ou parcialmente, o acesso. Devido a isso, é
comum perceber, pelas principais ruas e avenidas, pessoas que, sem alternativa,
caminham perigosamente pelo asfalto, competindo com os automóveis.
16
Ouve-se, também, de algumas pessoas com idade avançada e, consequente
diminuição de sua capacidade física natural de locomoção que, como não existem
calçadas adequadas em sua cidade, preferem, muitas vezes, não saírem de casa.
De acordo com uma pesquisa6 realizada pelo IPEA (Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada), em 2003, sobre “Impactos Sociais e Econômicos dos
Acidentes de Trânsito nas Aglomerações Urbanas”, a cidade de São Paulo revelou
um número de nove quedas por grupo de mil habitantes, devido às más condições
do passeio público ao longo de ruas e avenidas, a um custo médio em torno de R$
2,5 mil para cada um desses tipos de acidente. Esses dados demonstram que a
inadequação das calçadas pode causar inúmeros transtornos e prejuízos à
população em geral.
O abandono, o acúmulo de lixo e o despejo de esgoto a céu aberto, flagrados
nas calçadas de alguns lotes – até mesmo em bairros considerados nobres, como é
o caso de Lagoa Nova – podem ser responsáveis pela multiplicação de insetos e,
consequentemente, a propagação de doenças por esses vetores. O esgoto
despejado às margens dessas calçadas, além de trazer prejuízos à saúde pública,
pode, até mesmo, indiretamente, prejudicar o trânsito dos automóveis, pois parte
desse fluxo de água, muitas vezes vai se infiltrando em alguns trechos de ruas e
avenidas destruindo o seu revestimento.
Apesar do aumento do número de veículos particulares circulando pela cidade
nas últimas décadas, o transporte público ainda é o principal meio de locomoção da
maioria da população nos centros urbanos e, mesmo parecendo óbvio, não se deve
6
“Tradicionalmente, os acidentes de trânsito incluem apenas os acidentes envolvendo veículos. As
estatísticas referentes a esses acidentes já destacam o pedestre, vítima de atropelamento – cerca de
50% das mortes - como o elemento mais vulnerável no trânsito. No entanto, a queda de um pedestre
na calçada ou na própria via, sem a participação direta ou indireta de um veículo, não é considerada
como um acidente de trânsito, ainda que a queda tenha ocorrido em razão de um defeito na calçada
ou na via. Os estudos de custos de acidentes de trânsito realizados em outros países não costumam
considerar os custos decorrentes das quedas de pedestres. Segundo pesquisas origem-destino,
realizadas em algumas cidades brasileiras, mais de 30% dos deslocamentos realizados em área
urbana são feitos a pé. A fim de conhecer a importância desse fenômeno, optou-se por estudá-lo
nesta pesquisa. Para isso, foi realizada pesquisa domiciliar em 354 domicílios da aglomeração
urbana de São Paulo, totalizando 1426 moradores entrevistados para identificar a freqüência das
quedas e os seus custos. A pesquisa realizada na Aglomeração Urbana de São Paulo revelou nove
quedas por grupo de mil habitantes, a um custo médio em torno de R$2,5 mil por queda. Embora os
valores encontrados estejam sujeitos a variações significativas, dado o pequeno número de casos
identificados, esta pesquisa mostra a importância da formulação específica de políticas e projetos
voltados para a segurança de pedestres, principais vítimas dos acidentes de trânsito – tanto por
atropelamentos como por quedas – através da melhoria de calçadas, da sinalização, implantação de
passarelas e faixas de travessia” (IPEA, 2003).
Disponível em: <http://www.pedestre.org.br/downloads/IpeaSinteseAcidentesTransitoMaio2003.pdf>.
17
esquecer, portanto, que as pessoas para terem acesso a esse tipo de transporte e
seus pontos de embarques, obrigatoriamente, precisam circular pelas calçadas.
A importância do formato desse espaço não se resume, apenas, em garantir o
direito de ir e vir com segurança e conforto pelas ruas da cidade ou em facilitar os
mais diversos tipos de interações sociais que esse recorte do espaço urbano pode
proporcionar. Essa faixa complexa de tecido urbano, tal qual uma malha ou rede,
que se estende por toda a cidade, ocupando uma porção considerável do território,
pode interferir também no equilíbrio ecológico desse ambiente.
Assim, os milhares de quilômetros quadrados somados, quando totalmente
impermeabilizados, impedem a infiltração natural das águas pluviais no solo - o que,
segundo alguns estudos, contribuem para que algumas substâncias tóxicas fiquem
concentradas nas reservas aquíferas do subsolo, inviabilizando o uso dessa água
pelas companhias de abastecimento que atendem a população local – isso faz com
que os poços de coleta de água subterrânea sejam perfurados cada vez mais
distantes dos aglomerados urbanos e com custos, certamente, mais elevados. Esse
somatório de áreas impermeabilizadas também contribui no período de chuvas,
como fator de risco às pessoas, devido às possíveis inundações.
O passeio público é também, por excelência, um dos locais mais utilizados
para o plantio de vegetação arbórea nos centros urbanos. Esse tipo de vegetação,
quando constituída de espécies apropriadas e controladas por um serviço
especializado de manutenção, não apenas acolhe vários tipos de pássaros e
pequenos animais, como embeleza e valoriza as áreas edificadas, contribui para
diminuição da poluição sonora e o excesso de radiação solar, além de, entre os
benefícios mais importantes para cidades de climas quentes, como é o caso da
Capital Potiguar, promover o conforto térmico. Conforme Velasco (2007)7, pesquisas
realizadas em São Paulo revelam que ruas densamente arborizadas podem diminuir
a temperatura local ou a sensação térmica em até 2Cº. Porém, para que as calçadas
possam oferecer todos esses tipos de vantagens à população, elas deveriam ser
realmente bem planejadas e adaptadas para esse fim.
Alguns obstáculos que tornam as nossas calçadas intransitáveis são
facilmente
7
identificáveis,
como:
muros,
paredes
e
degraus
construídos,
Tese de doutorado defendida na USP, em 2007, por Giuliana Del Nero Velasco, sobre o “Potencial da
arborização viária na redução do consumo de energia elétrica na cidade de São Paulo”. Disponível
em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/11/11136/tde-03032008-165228/pt-br.php>.
18
arbitrariamente, dentro dos limites do passeio; estacionamento indevido de veículos;
comerciantes fixos ou ambulantes, que se apropriam parcial ou totalmente do
espaço. Além de outros, gerados por invasões fixas ou temporárias, somam-se,
ainda, aqueles causados pelo descuido e o abandono (caracterizados por buracos,
crescimento de vegetação desordenada, depósito de lixo) ou, ainda, pelo isolamento
dessa via de acesso (pela construção de muros altos em lotes particulares, que
impedem totalmente a visão da rua, contribuindo para tornar esse espaço invisível e
favorável a alguns tipos de ações criminosas).
A partir dessas constatações, pode-se concluir que “cidadãos”, enquanto
pedestres, trilham por um caminho duplamente inseguro, seja pelos riscos de
acidentes físicos, decorrentes da grande quantidade de obstáculos e irregularidades
em nosso passeio público ou pela construção de ambientes que facilitam práticas
violentas do cotidiano urbano, por sua invisibilidade. Segundo Jacobs (2000, p. 29),
“quando as pessoas dizem que uma cidade, ou parte dela, é perigosa ou selvagem,
o que querem dizer, basicamente, é que não se sentem seguras em suas calçadas”.
Partindo dessa realidade, cabe questionar quem seriam os responsáveis pelo
planejamento, construção e manutenção das calçadas.
De acordo com Jacobs (2000, p. 30):
[...] as calçadas e aqueles que as usam não são beneficiários passivos da
segurança ou vitimas indefesas do perigo. As calçadas, os usos que as
limitam e seus usuários são protagonistas ativos do drama urbano, da
civilização versus barbárie.
Desse modo, pode-se pensar nesse espaço como consequência do
pensamento, das ações e da forma como se estabelecem as relações com o
ambiente e o restante das pessoas com quem se convive diariamente na cidade.
Influencia-se e se é influenciado por esse ambiente, que não é somente utilizado
para circulação, mas para vários tipos de interação social. Nas calçadas, encontrase o comércio informal e extensões do comércio legal, trabalhadores ambulantes,
profissionais do sexo, praticantes de esportes, visitantes de outras cidades, pessoas
trocando informações, pedintes e, até mesmo, indivíduos que transformam esse
local em uma espécie de moradia. Neste sentido, pode-se dizer que se está diante
de um outro universo social contido dentro dos limites da sociedade urbana.
19
Yázigi (2000) aponta toda a complexidade desse tema e propõe que se pense
esse conflituoso espaço urbano como um retrato da nossa sociedade. O estado
atual de precariedade ou pouca funcionalidade do passeio público é algo
imperceptível para maioria da população e quando percebida parece ser ignorada
por pessoas que ainda não desenvolveram a capacidade e o hábito de lutar por
direitos coletivos e cumprir muitos dos seus deveres individuais. Uma sociedade em
que esses componentes básicos ao exercício da cidadania estão muito ausentes.
Seguindo esse raciocínio, poder-se-ia levantar algumas questões: Por que
esse espaço está tão distante da sua finalidade prática e funcional? O que leva as
pessoas a aceitarem essa situação tão passivamente? Será possível perceber isso?
Conforme Ferrara (1988, p.3):
A percepção urbana é uma prática cultural que concretiza certa
compreensão da cidade e se apóia, de um lado, no uso urbano e, de outro,
na imagem física da cidade, da praça, do quarteirão, da rua, entendidos
como fragmentos habituais da cidade. Uso e hábito, reunidos, criam uma
imagem perceptiva que se sobrepõe ao projeto urbano e constitui o
elemento de manifestação concreta do espaço. Entretanto, essa imagem,
porque habitual, apresenta-se homogênea e ilegível.
O envolvimento e o trabalho desenvolvido na área de paisagismo,
possivelmente, fez com que eu percebesse a questão estética da despadronização
do nosso passeio público.
Mas junto à desarmonia visual das calçadas, é
perceptível, também, a falta de planejamento para que sirvam como espaços
funcionais que permitam a circulação livre e segura dos pedestres.
Além disso, a iniciação dos estudos na área de sociologia ampliou ainda mais
minha visão sobre as questões relacionadas a esse local de convivência entre as
pessoas, fazendo com que eu percebesse as calçadas como um lugar complexo,
onde ocorrem diversos tipos de interações sociais, pois não serve apenas como
meio de acesso entre as regiões da cidade, mas também como local de trabalho,
lazer, conversas e troca de informações, razão pela qual me senti motivado a
estudar os problemas sociais relacionados à constituição desse espaço. Espero,
dessa maneira, poder contribuir com outros trabalhos dedicados ao planejamento e
melhoria dos espaços urbanos em nossas cidades, assim como aos estudos
sociológicos ligados à formação da nossa cidadania.
Como objetivo geral desse trabalho tenta-se estabelecer relações entre as
características do passeio público no bairro de Lagoa Nova em Natal e o tipo de
20
cidadão que os moldes de construção e manutenção desse espaço refletem.
Especificamente, deseja-se alcançar os seguintes pontos: traçar um perfil geral das
calçadas na cidade e mais detalhadamente do bairro estudado; identificar os
possíveis fatores que explicam o seu “traçado problemático”; analisar o
posicionamento dos moradores que trafegam, diariamente, no bairro nesse contexto;
e, finalmente, investigar o pensamento dessa população em relação às noções de
ocupação dos espaços sociais urbanos.
Ao caminhar pela cidade, pode-se perceber que muitas obras parecem não
ter sido planejadas de acordo com a sua verdadeira finalidade, o passeio público,
por exemplo. Volta-se às seguintes questões: Quem planejou? Por que planejou
algo tão distante da realidade? Pelo menos da realidade da maioria das pessoas
que utilizam esses espaços.
Jacobs (2000) faz uma crítica a quem planeja a cidade e diz que as cidades
deveriam ser vistas como laboratórios. Os bairros mais antigos poderiam servir de
modelo para que se evitassem cometer os mesmos erros na hora de planejar, por
exemplo, os passeios públicos em bairros mais recentes. Porém, quem projetou o
traçado, na maioria dos novos bairros em Natal, não contemplou as áreas
destinadas aos pedestres. Para a pesquisadora:
As cidades são um imenso laboratório de tentativa e erro, fracasso e
sucesso, em termos de construção e desenho urbano. É nesse laboratório
que o planejamento urbano deveria aprender, elaborar e testar suas teorias.
Ao contrário, os especialistas e os professores dessa disciplina, (se é que
ela pode ser assim chamada) têm ignorado o estudo do sucesso e do
fracasso na vida real, não têm tido curiosidade a respeito das razões do
sucesso inesperado e pautam-se por princípios derivados do
comportamento e da aparência das cidades, subúrbios, sanatórios de
tuberculosos, feiras e cidades imaginárias perfeitas – qualquer coisa que
não as cidades reais (JACOBS, 2000, p. 5).
Pode-se comprovar essa realidade analisando a Avenida Airton Senna,
(Fotografia 89 na página 109) cuja construção é recente. Nela percebe-se um
enorme descaso com o passeio público, situação similar à Avenida Mário Negócio
(Fotografias 95 e 96 na página 112) uma das avenidas mais antigas da cidade, onde
é praticamente impossível encontrar linha contínua de pelo menos um quarteirão
com calçadas apropriadas.
Esse tipo de planejamento, se é que se pode chamar assim, desconsidera
componentes básicos ao exercício da cidadania, como a segurança, o conforto e a
21
tranquilidade para quem usa as calçadas como meio de acesso. Quando se dificulta
o trânsito de pedestres nas calçadas por meio de barreiras arquitetônicas ou se
esconde através de muros altos e portões – que isolam totalmente a visão da rua
(Fotografia 88 na página 109) – constrói-se, indiretamente, um local duplamente
inseguro. Torna-se um local arriscado tanto para o público que passa, quanto para
os próprios moradores que chegam motorizados, mas precisam parar nessa fronteira
antes de entrarem no “seu mundo privado”. Constata-se que o passeio público não
se limita apenas as suas características físicas, mas ao significado que vai sendo
construído socialmente, junto ao desenvolvimento das cidades e os objetos com os
quais as calçadas faz limite, no caso citado acima, o muro.
As campanhas realizadas na cidade, as reportagens de jornais e revistas, e
alguns trabalhos científicos associam à melhoria desse espaço à conscientização da
população sobre o conceito de cidadania. Predomina na mídia, no entanto, uma
ideia muito vaga e incompleta desse termo, tanto quanto o conceito de público e
privado e os limites entre cada um deles.
Sabe-se que existem normas para a construção de qualquer obra em nossa
cidade e, se por acaso, não são conhecidas, o bom senso deveria mostrar que um
local destinado ao trânsito de pedestres deve estar livre de barreiras que impeçam o
livre acesso. O problema é que, até mesmo, quanto a esse aspecto legal já existe
um grande obstáculo. Como se pode esperar que as leis sobre os passeios públicos
sejam cumpridas, se cumprir a lei para os brasileiros, segundo DaMatta (1997, p.
82), parece significar assumir ser um cidadão inferior? “Uma obediência às leis
configura na sociedade brasileira uma situação de pleno anonimato e grande
inferioridade [...]”.
Para fundamentar todas essas questões, além da leitura de artigos midiáticos,
trabalhos acadêmicos e obras de autores que abordam assuntos relacionados ao
tema, dialoga-se mais profundamente com os seguintes autores: Yázigi (2000), que
fornece uma visão ampliada e específica sobre as calçadas; DaMatta (1997), que
trata de questões ligadas à cidadania como um universo relacional e Santos (2000),
que aborda a influência geográfica espacial na construção da cidadania.
Conta-se, ainda, como suporte teórico para a pesquisa autores como: Covre
(1999), que apresenta um panorama geral sobre a origem e adaptação do conceito
de cidadania; Lynch (1997), que trata da imagem e do significado da calçada;
Jacobs (2000), que discorre sobre a construção social e a segurança desse espaço,
22
além de Carvalho (2006), que faz uma reconstrução histórica do conceito de
cidadania no Brasil.
A compreensão dos aspectos visuais e a utilização de imagens na pesquisa
foram ampliadas com a leitura das seguintes obras: “Os argonautas do Mangue”, de
André Alves (2004), “Ver a Cidade”, de Lucrecia D‟Aléssio Ferrara (1988) e
“Sociologia da Fotografia e da Imagem”, do sociólogo José de Souza Martins (2008).
Para a constituição do corpus dessa pesquisa optou-se por um tipo de
amostra intencional, cujo método comporta os mais variados tipos de pessoas e
problemas ligados ao tema. Enfatizou-se o aspecto qualitativo, entretanto, procurouse manter o equilíbrio entre as quantidades de variáveis e atores/agentes
semelhantes pesquisados, tentando se aproximar do que os professores Fernando
Lefevre e Ana Maria Lefevre (2010) chamam de método qualiquantitativo (utilizado
em suas recentes pesquisas sobre representações sociais).
Em relação aos atores/agentes envolvidos, decidiu-se por entrevistar os
seguintes estratos: homens e mulheres adultos proprietários ou não de lotes
urbanos, transeuntes do bairro Lagoa Nova, funcionários públicos da área de
planejamento e urbanização da prefeitura, além de profissionais da área de
arquitetura e urbanismo.
O estudo foi realizado no bairro de Lagoa Nova, em Natal, no Rio Grande do
Norte. Dentre outras razões que justificam a escolha desse bairro, destacam-se os
seguintes pontos: no contexto histórico da cidade é uma das regiões de ocupação
mais recente, aproximadamente cinco décadas; está, geograficamente, situado em
uma região central da porção mais urbanizada da cidade; apresenta aspectos
urbanísticos variados que tanto podem ser encontrados em bairros mais novos ou
periféricos, como em bairros antigos ou centrais; apesar do predomínio de imóveis
residenciais apresenta um grande fluxo de pessoas, pois contêm também grandes
centros comerciais (conhecidos como Shopping Centers), redes de supermercados
e muitos estabelecimentos de ensino públicos e particulares, entre eles o Campus
Central da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e, também, pela facilidade
de acesso por ser o bairro onde eu, como autor da pesquisa, trabalho e resido.
Como forma de destacar o passeio público visualmente e facilitar a
observação desse espaço em momentos posteriores, foi construído um acervo de
imagens de vários pontos da cidade e do próprio bairro pesquisado por meio de
registros fotográficos. Estes registros foram realizados ao longo de várias ruas e
23
avenidas, buscando observar curiosidades apresentadas em suas calçadas, bem
como flagrantes de situações cotidianas. Procura-se justificar a técnica e analisar
com mais detalhes e profundidade cada um dos momentos registrados pela câmera.
No primeiro capítulo, é apresentado um histórico geral sobre o surgimento
desse espaço, desde os primeiros vestígios arqueológicos encontrados na cidade de
Herculano e Pompéia, na Itália, até as primeiras calçadas que foram sendo
construídas no Brasil, em São Paulo, descritas por Yázigi (2000). Procura-se
demonstrar como os aspectos culturais, históricos e econômicos, apesar de
influenciar, não são isoladamente determinantes para a qualidade – no quesito
acessibilidade – na constituição desse espaço. Apresentam-se algumas definições
sobre o que se entende por passeio público e o que é descrito pela legislação.
Finalmente, situa-se a calçada dentro de um contexto chamado de espaço público.
No segundo momento, descreve-se o processo de urbanização da capital
potiguar, a ocupação e o desenvolvimento do bairro Lagoa Nova, as características
atuais do passeio público na cidade e, especificamente, no bairro estudado. Neste
histórico da região, trata-se brevemente sobre o planejamento urbano em Natal e seus
desdobramentos, incluindo o papel do Estado, as políticas públicas adotadas até o
momento8, a participação popular nesse contexto e, consequentemente, uma reflexão
sobre a formação específica do “cidadão local” que vai se moldando nesse processo.
No terceiro capítulo, descreve-se a trajetória da pesquisa, assim como,
analisa-se o material colhido por meio das entrevistas realizadas com os
atores/agentes envolvidos com o campo de pesquisa, fazendo-se as considerações
necessárias que podem ser conectadas às teorias relacionadas ao tema.
No último capítulo, apresenta-se uma seleção de imagens mais significativas,
que levem o leitor a perceber o campo de pesquisa com mais intensidade, além de
elaborarem-se algumas considerações mais detalhadas sobre esses registros
fotográficos.
8
Como exemplos têm-se os projetos “Cidade Sem Barreiras (1993)” e o projeto “Cidade Para Todos”
(1995), implantados pela prefeitura de Natal com o objetivo de solucionar os problemas relativos à
acessibilidade e à mobilidade urbana, especialmente para os portadores de necessidades
especiais. O segundo plano fazia parte de um projeto nacional e foi financiado pelo governo
federal. Maiores detalhes, sobre as intervenções realizadas na cidade a partir desses projetos,
foram analisadas por PIRES (2007), na dissertação de mestrado “A cidade sem barreiras é para
todos? Avaliação das condições de deslocamento no bairro Cidade Alta, Natal/RN, face às
intervenções em acessibilidade processadas entre 1993 e 1998”.
24
CAPÍTULO I
“FAÇAM-SE AS CALÇADAS”: um caminho entre o público e o privado
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (jul./2009).
25
1 “FAÇAM-SE AS CALÇADAS”: UM CAMINHO ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO
1.1 GÊNESE
Quando esse espaço, pavimentado e destinado, especialmente, à circulação
de pedestres, foi criado? Quais fatores históricos e culturais podem explicar
características tão diversificadas na construção e modo de apropriação desse
espaço? Não existem dados que indiquem uma data precisa de sua criação, nem
que tenha surgido com os mesmos objetivos atuais para os quais vem sendo
aperfeiçoado. Percebe-se que os fatores históricos e culturais podem exercer grande
influência na arquitetura desses espaços, mas não são determinantes. É possível
haver uniformidade e, até mesmo, extremas diferenças em trechos edificados num
mesmo período histórico ou em regiões que possuam culturas semelhantes.
Imagens, ao longo do trabalho, demonstrarão essa diversidade.
Há vestígios arqueológicos que demonstram que as calçadas já existiam em
civilizações muito antigas.
Calçadas bem pavimentadas eram também marca registrada da Roma
antiga. Cidades como Herculano e Pompéia permitiam que as famílias se
deslocassem com segurança pelas vias comerciais que compreendiam
padarias, saunas e anfiteatros, posteriormente destruídos pelo vulcão
Vesúvio em 79 da nossa era (CARIM, 2007, p. 1).
Fotografia 01: Ruínas de Pompéia – I
Fonte: Arquivo Adriana Nascimento
9
9
Fotografia 02: Ruínas de Pompéia – II
Fonte: Autor desconhecido.
10
Disponível em: <http://www.drieverywhere.blogger.com.br/2005_08_01_archive.html>. Acesso em:
13 dez. 2009.
10
Disponível em: <http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?p=28732190>. Acesso em: 13.
dez. de 2009.
26
Fotografia 03: Ruínas de Pompéia – III
Fonte: Autor desconhecido.
11
Yázigi (2000) escreve que, no Brasil, no início da urbanização de São Paulo,
quando as ruas não eram pavimentadas e não havia separação nesse espaço para
a circulação de pessoas, cavalos ou veículos de tração animal.
[...] chamava-se calçada ou calçadinha uma faixa horizontal empedrada, de
pequena largura, colada à parede externa da construção, destinada a
proteger as fundações da infiltração de águas pluviais – de onde, talvez,
tenha vindo a atual denominação. E, à medida que os beirais avançavam
sobre as mesmas, serviam de passagem protegida para o pedestre, nos
trechos em que existia (YÁZIGI, 2000, p. 31).
Imagens antigas da capital potiguar demonstram o que relata Yázigi (2000).
Como se pode perceber pelas fotografias, não há, historicamente, linearidade
quanto ao formato desse espaço, conforme imagem 04. Esse dado pode ser
comprovado pelas imagens no desenvolvimento do trabalho. Ainda hoje, moradores
de bairros mais recentes, em que as ruas não são pavimentadas, costumam
construí-las da maneira como descreve o autor. Esta iniciativa dos moradores pode
11
Disponível em: <http://deiatatu.wordpress.com/category/italia/pompeia-italia/>. Acesso em: 10 set. 2012.
27
explicar, de certo modo, porque, em alguns trechos as calçadas, apresentam uma
grande quantidade de desníveis entre um lote urbano e outro. Nessas ruas, não
pavimentadas, normalmente, não existe uma demarcação indicando o local em que
será o calçamento. Muitos proprietários foram construindo “suas calçadas” adotando
níveis individuais e aleatórios sem consultar a prefeitura12, conforme pode ser
observado nas imagens 05 e 06.
Fotografia 04: Vista parcial de Natal e suas primeiras calçadas no começo do séc. XX (esquina
13
da atual Praça André de Albuquerque com a Praça João Tibúrcio, ao fundo, o rio Potengi)
Fonte: Arquivo de Bruno Bougard (Acervo IHG/RN).
13
Natal Ontem e Hoje / Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo. – Natal (RN):
Departamento de Informação Pesquisa e Estatística, 2006.
28
Fotografia 05: Rua em Capim Macio e suas calçadas desniveladas (próx. à Av. Ayrton Senna).
Fonte: Arquivo Pessoal Ricardo Silva (Jun./2010).
Fotografia 06: Rua Neuza Farache, Capim Macio. Local próximo à Av. Eng. Roberto Freire.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Ago./2012).
29
1.2 OS CRIADORES E A CRIATURA
Certas paisagens urbanas, em nosso país, lembram a origem étnica ou
cultural dos seus criadores. Observando a arquitetura de alguns municípios do sul
do Brasil, como Gramado e Canela, são perceptíveis traços da colonização alemã,
em Caxias do Sul e Bento Gonçalves, por exemplo, traços da cultura italiana. A
maioria das cidades, entretanto, traz marcas dos portugueses. Apesar da
diversidade de etnias que povoaram ou vieram povoar o Brasil, somos,
predominantemente, frutos da colonização lusitana.
Conforme
Freyre
(2000),
os
brasileiros
apresentam
características
extremamente mescladas por outras culturas. De acordo com o autor, os
colonizadores portugueses, além de terem desenvolvido uma vocação comercial
marítima, que lhes proporcionavam contatos com uma grande diversidade de povos
no mundo, estavam situados geograficamente em uma região intermediária entre o
continente Europeu e a África. Soma-se a isso, ainda, o que ele chamou de
“plasticidade cultural”, certa facilidade em “misturar-se” ou “adaptar-se” a outras
culturas. Isto poderia ser explicado, em parte, porque o conjunto das calçadas,
herdeiras, em sua maior parte, desta cultura lusitana, seja como uma colcha de
retalhos, refletindo um pedacinho de cada povo que mesclou a cultura brasileira.
Fotografia 07: Calçada no Centro de Gramado/RS.
14
Fonte: Autor desconhecido .
14
Disponível em: <http://farm4.static.flickr.com/3343/3269103693_42db1154b4_o.jpg>.
30
Fotografia 08: Residência típica de Gramado/RS.
15
Fonte: Autor desconhecido .
Dentre as diversas heranças artísticas e culturais deixadas no Brasil pelos
lusitanos está a “calçada portuguesa” ou “mosaico português”16. Este tipo de calçada
se destaca pelo modo artesanal, formado por pequenas pedras de cores
contrastantes (geralmente em preto e branco), que resultam em uma estampa
decorativa ao longo dos seus encaixes. Este modelo tornou-se muito popular no
Brasil a partir do século passado e continua fazendo parte das paisagens urbanas,
como é o caso do famoso calçadão da praia de Copacabana no Rio de Janeiro. Em
Natal, encontram-se extensos exemplares com este tipo de revestimento,
principalmente em áreas públicas, como as calçadas da orla da praia de Ponta
Negra ou o calçadão ao longo da Avenida Roberto Freire, no bairro Capim Macio.
15
16
Disponível em: <http://i556.photobucket.com/albums/ss2/Acmfonseca/Gramado/DSC02070.jpg>.
“A calçada portuguesa, conforme a conhecemos, foi empregada pela primeira vez em Lisboa no ano
de 1842. O trabalho foi realizado por presidiários (chamados "grilhetas" na época), a mando do
Governador de armas do Castelo de São Jorge, o Tenente-general Eusébio Pinheiro Furtado. O
desenho utilizado nesse pavimento foi de um traçado simples (tipo zig-zag), mas, para a época, a
obra foi de certa forma insólita, tendo motivado cronistas portugueses a escrever sobre o assunto.
Após este primeiro acontecimento, foram concedidas verbas a Eusébio Furtado para que os seus
homens pavimentassem toda a área da Praça do Rossio, uma das zonas mais conhecidas e mais
centrais de Lisboa, numa extensão de 8.712 m². A calçada portuguesa rapidamente se espalhou por
todo o país e colônias, subjacente a um ideal de moda e de bom gosto, tendo-se apurado o sentido
artístico, que foi aliado a um conceito de funcionalidade, originando autênticas obras-primas nas
zonas pedonais. Daqui, bastou somente mais um passo, para que esta arte ultrapassasse fronteiras,
sendo solicitados mestres calceteiros portugueses para executar e ensinar estes trabalhos no
estrangeiro”. Disponível em: <http://blog.transporteativo.org.br/2007/07/25/calcada-democracia/>.
31
Fotografia 09: Calçada portuguesa formando
mosaico, em Lisboa, Portugal.
Fonte: Autor desconhecido.
Fotografia 10: Calçadão da Praia
de Copacabana, Rio de Janeiro.
17
Fonte: Autor desconhecido.
Fotografia 11: Avenida Roberto Freire,
Ponta Negra, Natal/RN.
Fonte: Autor desconhecido.
Fotografia 12: Calçadão da Praia de
Ponta Negra, Natal/RN.
18
Fonte: Autor desconhecido.
17
18
As Fotos 09 e 10 estão disponíveis em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Cal%C3%A7ada_portuguesa>.
As Fotos 11 e 12 estão disponíveis em: <http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=524061>.
32
Fotografia 13: Calçada de pedra portuguesa, em construção. Avenida Salgado Filho, Lagoa Nova.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2010).
Fotografia 14: Calçada de pedra portuguesa, em construção. Avenida Salgado Filho, Lagoa Nova.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2010).
33
Fotografia 15: Calçada de pedra portuguesa, em construção. Avenida Salgado Filho, Lagoa Nova.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2010).
1.3 DEFINIÇÃO E NOMENCLATURA
A palavra calçada é de origem latina e seria derivada do termo calcatura
(ação de calcar ou pisar). De acordo com Yázigi (2000, p. 31):
Entende-se por calçada o espaço existente entre o lote do quarteirão e o
meio fio, superfície usualmente situada a cerca de 17 centímetros acima do
leito carroçável das vias urbanas. Sua denominação mais correta é passeio,
mas consagrou-se como calçada por causa de alguns fatos históricos.
Hoje, as calçadas fazem parte do planejamento urbano, possuem normas de
padronização previstas em lei, no código de obras da maioria das cidades. O grau
de prioridade e cuidado destinado a esse espaço foi ou continua sendo dado de
acordo com o desenvolvimento dos aglomerados urbanos e as características
particulares de cada local. Aqui em Natal, está presente na lei complementar nº. 55,
de 27 de janeiro de 2004, que certifica a calçada como área de circulação pública,
razão pela qual deve estar livre de obstáculos que impeçam o trânsito das pessoas
por essa via de acessibilidade, é, entretanto, da responsabilidade do proprietário de
cada lote urbano a construção e a manutenção das calçadas (conforme o código de
obras da cidade em anexo).
34
As calçadas reúnem características de “um outro mundo complexo”, dentro
das cidades. Possuem uma história e uma geografia “particular”, estão numa linha
de tempo não linear, cuja ocupação ocorre das mais diversas formas. Em alguns
trechos, ainda podem ser encontradas pessoas sentadas em “suas” calçadas para
conversarem e olharem o movimento das ruas, fato comum em décadas passadas19.
Em outras regiões, as calçadas são utilizadas como ponto comercial (vendese de tudo), possui horário e dias fixos de “funcionamento”. Vendedores ambulantes
fazem, de toda a extensão do passeio, um espaço de sobrevivência, local em que
são comuns, também, profissionais do sexo e moradores em situação de risco. Mas
será que existe espaço para todos?
Nesse contexto, encontram-se, ainda, moradores que, invadem essa área de
domínio público, privatizando-o, inclusive, até mesmo, com construções de alvenaria,
tomando esse espaço, em alguns casos, totalmente para si, outros constroem suas
calçadas de maneira inadequada, há muitas barreiras arquitetônicas, que impedem o
trânsito seguro dos transeuntes. Existem, ainda, vários quilômetros de calçadas
“abandonadas”, tanto pelo poder público, quanto pelos proprietários particulares,
principalmente, de alguns imóveis mantidos vazios, possivelmente, alimentando a lista
de imóveis utilizados para a especulação imobiliária20.
[...] alguns terrenos vazios e algumas localizações são retidas pelos
proprietários, na expectativa de valorizações futuras, que se dão através da
captura do investimento em infra-estrutura, equipamentos ou grandes obras
na região ou nas vizinhanças. Isto provoca a extensão cada vez maior da
cidade, gerando os chamados „vazios urbanos‟, terrenos de engorda, objeto
de especulação (ROLNIK, 1994, apud CAPISTRANO, 2002, p.11).
19
20
Sobre esse aspecto destacamos duas monografias apresentadas no curso de Ciências Sociais, na
UFRN, respectivamente em 2002 e 2003: “Alma da Rua: um estudo sobre a apropriação do
espaço público urbano no conjunto Cidade Satélite” de Rosa de Lima Câmara Guaignier e
“Memórias que passam, cadeiras que ficam. A construção histórica do hábito de conversar nas
calçadas a partir da chegada dos primeiros moradores da Rua Olinda, na Cidade da Esperança,
Natal” de Josenilton Tavares.
Sobre especulação imobiliária em Natal, ver: CAPISTRANO, Ana Claudia M. Alves. Imagens do
Futuro: visões sobre a modernidade na cidade do Natal. UFRN, 2002, e OLIVEIRA, Jean Barbosa
de. A Expansão Urbana Dentro do Bairro Planalto: reflexo da expansão imobiliária. UFRN, 2002.
35
Fotografia 16: Dois terrenos com aspecto de abandono (Travessa da Rua Henrique Góes,
Bairro Lagoa Nova).
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2008).
1.4 A CALÇADA COMO ESPAÇO PÚBLICO
Cruz (1994) descreve que “os termos público e privado datam do Império
Romano e se referem, respectivamente, ao Direito Público e ao Direito Privado que
são as pedras fundamentais do Direito Romano, que é, por sua vez, a pedra
fundamental de todo o Direito da civilização ocidental”. No entanto, a ideia de
espaço público aparece desde a antiga civilização grega.
Na polis grega o espaço público é a esfera de ação do cidadão, é o espaço
onde se compete por reconhecimento, precedência e aclamação de idéias. É
nesse ambiente, com condições de homogeneidade moral e política e de
ausência de anonimato, que existe a perseguição da excelência entre os iguais.
Por oposição, o espaço privado é onde se dão as relações entre os que não
são cidadãos, os comerciantes, as mulheres, os escravos (CRUZ, 1994, p. 1).
Assim, originalmente, o termo público é associado à ideia de coletividade e ao
exercício do poder. Nas palavras desse mesmo autor, “à sociedade dos iguais”. O
privado, de outro lado, estaria no âmbito particular ou na “sociedade dos desiguais”.
36
De acordo com os estudos sociológicos, porém, a sociedade é dinâmica, está em
permanente estado de transformação.
O período moderno é marcado por profundas mudanças políticas e
econômicas, consequentemente, essas mudanças e transformações atingiram
também o campo das relações sociais. Esse novo cenário formado pelos Estados
Nacionais deixa cada vez mais claro uma relação de poder na esfera pública, entre
desiguais, ou seja, entre governantes e governados.
Com o fortalecimento do Mercado, começa a ser entendido como públicas, as
relações estabelecidas entre o Estado e a sociedade através das leis, porém,
estabelecera-se um código particular privado entre os comerciantes e donos de
empresas. Segundo Cruz (1994), “surge, também, nesse momento, a dicotomia
entre bens públicos e bens privados”.
Interessante observar que a divisão teórica entre o poder público, associado ao
Estado e a esfera privada, ligada, exclusivamente ao Mercado, parece ter existido e
ainda existir apenas na teoria. Os fatos mostram a existência de uma relação muito
afinada entre as partes, mesclando-se em alguns momentos e até se confundindo.
Hoje, assiste-se a mais uma fase desse relacionamento em que cada vez
mais o Estado como espaço de poder público vai sendo engolido pelo sistema
capitalista, mantendo, no entanto, a aparência teórica de que cada um exerce papéis
diferenciados na sociedade. Na visão teórica neoliberal, o Estado não deveria se
intrometer nas questões do mercado. Na prática, deve ajudar as grandes empresas
a crescerem ainda mais ou socorrê-las em momentos de crise para que possam
enfrentar possíveis dificuldades financeiras durante as turbulências do mercado.
As políticas públicas, de todas as ordens – entre elas as políticas públicas de
acessibilidade – estariam muito bem definidas dentro dessa divisão e encaixadas,
perfeitamente, dentro da esfera pública e estatal. Porém, mesmo admitindo que na
relação entre Estado e políticas públicas, o primeiro sempre exerceu papel de
destaque e nunca esteve ausente. De acordo com Souza (2009):
Como sabemos, a visão atual do Estado como detentor do monopólio da
dimensão ou esfera pública decorre principalmente da ideologia liberal e daí
expressões habituais como gestão pública, administração pública, funcionário
público e outros congêneres. Ora, se isso fosse correto, toda ação ou política
estatal seria pública por excelência. Em outras palavras, as ações estatais
seriam caracterizadas pela transparência, acessibilidade, continuidade e
participação da população. O que, evidentemente, não encontra respaldo na
realidade de uma sociedade capitalista (SOUZA, 2009, p. 12).
37
Nesse contexto, a calçada é, legitimamente, um espaço público, mas localizase numa região de fronteira entre a casa e a rua. Possui características híbridas, ora
mostra-se como pública – inclusive contando com investimentos da iniciativa privada
para construí-la ou revitalizá-la –, ora é mesclada com o domínio privado ou
totalmente privatizada – quando alguns “cidadãos” se apropriam dessa área para
fins particulares, acoplando a calçada à sua residência ou a utilizando como uma
extensão do seu estabelecimento comercial.
Assim como Yázigi (2000), entende-se que o formato do nosso passeio
público é concebido como um espelho da nossa sociedade. Pode-se ver,
concretamente, através dos seus contornos, que a cidadania ou o seu pleno
exercício, está longe de ser alcançado. As barreiras existentes tornam-se, muitas
vezes, invisíveis. Ora porque estamos habituados, geralmente, a olhar aquilo que
está a nossa volta de maneira muito superficial ou, simplesmente, porque nos
acostumamos com esses obstáculos.
Isso nos remete a outro ponto de vista, que se soma a ideia desse ambiente
como reflexo da sociedade, a questão do espaço como agente ativo formador. Milton
Santos (2000), no seu livro “O espaço do Cidadão”, propõe que se veja o espaço
físico das cidades não apenas como um reflexo da nossa sociedade, mas como um
instrumento ativo, que exerce grande influência na formação dos indivíduos.
O passeio público parece impor limites ao pleno exercício da cidadania. Crescer
circulando por esse espaço naturaliza esse caminho e seus obstáculos. É como se as
calçadas formassem algum tipo de trilha desenhada pela própria natureza.
A Antropologia ensina a relativizar o pensamento e estranhar aquilo que
parece familiar. Olhar a calçada de vários ângulos é importante para se
compreender a sua complexidade. A Sociologia, através de Durkheim (1993),
propõe refletir sobre o peso que a sociedade exerce sobre os indivíduos, assim a
existência do nosso cidadão parece ser formada ou deformada pelo nosso sistema
econômico, por nossa tradição histórica e pelos acontecimentos políticos que, tantas
vezes, negam direitos individuais ou coletivos aos cidadãos, deixando sempre como
resultado uma cidadania incompleta. Por outro lado, há autores que mostram a
influência exercida pelos indivíduos, dependendo do grau de consciência desses, e
de outros fatores complexos que podem ampliar o seu raio de ação.
38
Ao analisar esse espaço, percebe-se a importância de se considerarem todos
esses conhecimentos e constata-se a difícil tarefa de separar o objeto de estudo do
seu contexto e da subjetividade própria de cada um.
A calçada é uma obra social impregnada de características individuais. Para
analisá-la, é preciso compreender esses dois aspectos que se mesclam e dão forma a
um só corpo, público e privado. Parece haver uma tendência em se fazer uma mistura
entre esses dois territórios21. Alguns lugares destinados ao trânsito e a convivência
entre os pedestres são construídos e mantidos pela iniciativa privada como é o caso
dos shoppings, clubes sociais de lazer e condomínios residenciais fechados.
O Privado, assim, abre espaço para o Público, mesmo que esse “público” seja
selecionado ou formado em sua maioria por “cidadãos-consumidores”, de maior
poder aquisitivo. Outras áreas públicas como praias, reservas de mata nativa (dentro
e fora dos limites urbanos) são privatizadas por pessoas ou apropriadas por
empresas particulares.
A realidade mostra um mundo confuso, onde não há limites bem definidos
entre esses dois lados. É bastante claro que essa confusão sempre beneficiou uma
pequena parcela da nossa sociedade. A ideia de espaço público é captada pelo
nosso sistema econômico que o molda de acordo com seus interesses, assim como
se concebe o conceito de cidadania. No capitalismo moderno, conforme Santos
(2000) cidadão vira sinônimo de “usuário-consumidor”.
Como se viu anteriormente, a lei estabelece a calçada como um espaço
público. Mas parece haver certa dificuldade para grande parte da população em
diferenciar os espaços urbanos públicos e privados.
Não é fácil estabelecer um limite entre esses dois conceitos em relação à
apropriação dos espaços urbanos. Para se ter uma ideia, quando um cidadão qualquer
pretende construir uma obra particular dentro de uma cidade, deveria ter em mente que
o próprio lote particular que compra e o chama de “seu”, e que está localizado,
totalmente, antes do limite da “calçada”, portanto área de domínio privado, não lhe dá o
direito de construir, por exemplo, uma casa, da maneira que bem entender. Existem leis
e normas que irão determinar: qual a fração do lote que poderá ser edificada; qual a
altura máxima ou mínima das paredes que poderão ser levantadas; qual o recuo que
21
Sobre a mescla desses dois conceitos temos o trabalho de Ângela Lúcia de Araújo Ferreira e Sônia
Marques, “Privado e Público: inovação espacial ou Social?”, levanta as questões sobre a privatização
dos espaços públicos e a publicização da vida privada. Disponível em: <http://www.ub.es/geocrit/sn69-20.htm>.
39
deverá ser obedecido pela obra em relação aos limites da calçada e aos lotes vizinhos,
entre outras regras (ver código de obras do município).
Logo, mesmo que se trate como uma área de domínio privado, dever-se-ia,
como bons cidadãos, respeitar certas normas que beneficiam a coletividade. Por que
com as calçadas seria diferente? Mesmo que não se tivesse a certeza desse espaço
como público, o bom senso motivaria a procura pelos órgãos competentes para
informar sobre a maneira correta de construir esse espaço.
Fotografia 17: Exemplo de calçada do tipo ideal no bairro Cidade Jardim, Natal/RN.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2008).
1.5 CIDADANIA: TRAJETÓRIA E ESPAÇO
A cidadania sempre esteve ligada à vida em sociedade, pode ser associada
ao surgimento da vida na cidade e à capacidade que os homens desenvolveram de
se relacionarem mediante o exercício de direitos e deveres de uns para com os
outros. Apesar de não existir uma precisão quanto ao aparecimento desse conceito,
existem indícios de que a ideia de cidadania já circulava entre os gregos dentro de
40
suas primeiras cidades, conhecidas como polis22. Fez parte, também, dos ideais
romanos, mas até esse período, apenas um grupo muito restrito de indivíduos tinha
a “sorte” de nascer com essa dádiva e poderia ser considerado um cidadão. A
cidadania era um privilégio concedido de acordo com a origem ou o sexo dos
indivíduos. Essa situação gerou muitos conflitos. Numerosas batalhas foram
travadas ao longo da história para que o direito à cidadania fosse estendido a um
número maior de habitantes dessas primeiras cidades.
Na idade média, pouca coisa mudou nesse aspecto, poucos tinham o
privilégio de serem definidos como cidadãos. Nesse tipo de organização social,
formada basicamente pelos nobres, pelo clero e uma grande massa de
camponeses, apenas os dois primeiros grupos, constituídos por um número reduzido
de indivíduos, tinham esse direito garantido.23
Com o Renascimento e o fortalecimento dos Estados Nacionais, através de
muitas lutas, esse direito foi sendo ampliado a um contingente maior de pessoas. A
ascensão da Burguesia, que teve como um dos marcos a Revolução Francesa,
trouxe mudanças profundas nesse campo. O lema “Liberdade, Igualdade e
Fraternidade” dos revolucionários franceses, serve de inspiração até hoje para a
maioria das sociedades modernas. Criou-se então, nesse período, o que se conhece
como “Estado de Direito”.24
Este surge para estabelecer direitos iguais a todos os homens, ainda que
perante a lei, e acenar com o fim da desigualdade a que os homens sempre
foram relegados. Assim, diante da lei, todos os homens passaram a ser
considerados iguais, pela primeira vez na história da humanidade (COVRE,
1999, p.16).
22
A polis era composta por homens livres, com participação política contínua numa democracia
direta, em que o conjunto de suas vidas em coletividade era debatido em função de direitos e
deveres... Na polis grega, a esfera pública era relativa à atuação dos homens livres e à sua
responsabilidade jurídica e administrativa pelos negócios públicos. Viver numa relação de iguais
como a da polis significava, portanto, que tudo era decidido mediante palavras e persuasão, sem
violência. Eis o espírito da democracia. Mas a democracia grega era restrita, pois incluía apenas os
homens livres, deixando de fora mulheres, crianças e escravos (COVRE, 1999, p.16).
23
Baseado no artigo “A Evolução do Conceito de Cidadania”. Escrito pelos professores Cyro de
Barros Resende Filho e Isnard de Albuquerque Câmara Neto, da Universidade de Taubaté.
Disponível em: <http://www.unitau.br/scripts/prppg/humanas/download/aevolucao-N2-2001.pdf>.
Acesso em: 15 jun. 2010.
24
De acordo com Covre (1999), “esse fato foi proclamado principalmente pelas constituições francesa
e norte-americana, reorganizado e ratificado, após a II Guerra Mundial, pela Organização das
Nações Unidas (ONU) com a declaração Universal dos Direitos do Homem (1948)”.
41
Segundo Carvalho (2006), a cidadania possui três dimensões básicas: “os
direitos civis fundamentais à vida, à liberdade, à propriedade e à igualdade perante a
lei; os direitos políticos, ligados à participação do cidadão no governo da sociedade;
e, por último, os direitos sociais, que seria a garantia na participação na riqueza
coletiva”. No entanto, a ordem dessas conquistas e a ênfase ou prioridade
estabelecida em relação a alguma delas foi desenvolvida de forma particular pelas
diferentes nações, assim como o próprio tipo de cidadão formado. “Quando falamos
de um cidadão inglês, ou norte-americano e de um cidadão brasileiro, não estamos
falando exatamente da mesma coisa” (CARVALHO, 2006, p. 12).
Isso parece ocorrer também em escalas menores. Por exemplo, dentro da
nossa sociedade, parece não existir um cidadão brasileiro, porém tipos variados e
de diversas ordens, além daqueles totalmente excluídos desse tipo de classificação,
mesmo que denominados, teoricamente, como tal. Além dos elementos de origem
histórica, essas diferenças podem ser evidenciadas, entre outros fatores, pelas
características dos espaços ocupados por esses indivíduos. Segundo Santos (2006),
os espaços em nossas cidades, não só se constituem como elementos de
identidade para o indivíduo como também contribuem ativamente na formação de
um determinado tipo de cidadão.
Apesar dessa diversidade de formas, de acordo com a tradição histórica e o
sistema econômico que marcou e marca até hoje a sociedade brasileira, podem-se
traçar alguns pontos gerais próprios da construção desse direito no Brasil.
A colonização e a exploração do Brasil foi produto da expansão comercial
europeia e decorrente do início do processo de acumulação de riquezas do sistema
capitalista. A maioria dos habitantes desse novo território multiplicou-se dentro de
um contexto de submissão. Primeiramente, em relação à metrópole Portuguesa,
depois à Inglaterra – patrocinadora da “independência” desse novo país, em
seguida, rendeu-se ao domínio norte-americano e, hoje, ao chamado mercado
globalizado e ao monopólio das gigantescas multinacionais (atualmente, algumas
tão poderosas quanto às nações mais desenvolvidas do planeta).
Essa sociedade tem marcas profundas de um longo período de escravidão e
de muitos anos de governos ditatoriais. Muitos direitos concedidos ao povo brasileiro
não foram conquistados, exclusivamente, através de lutas ou reivindicações, mas
sim utilizados como estratégia de governo para manipulação das massas. Os
direitos foram e são representados até hoje como se fossem um favor da elite
42
concedido às classes populares, sempre com o objetivo de domesticar esses
indivíduos e mantê-los subjugados e conformados diante do quadro de exploração e
extrema desigualdade de direitos reais.
Assim, encontra-se, genericamente, nesse país, uma forma de cidadania
muito incompleta ou totalmente adaptada para dar suporte ao modelo econômico
capitalista. A maioria dos brasileiros não tem liberdade de escolha para decidirem
onde morar, qual profissão seguir ou sobre a maneira de circular pela cidade. A
participação política se resume, praticamente, ao voto no período de eleições –
lembrando-se que, segundo as normas do país, é obrigatório. Por último, de acordo
com dados da ONU, o Brasil figura numa lista entre os oito países que apresentam
os piores índices de distribuição de renda do planeta25. Dentro desse quadro, ainda,
tem-se a ideologia capitalista, que tenta reduzir o conceito de cidadania apenas ao
direito de consumo.
Não basta ter uma “Constituição Cidadã”, é preciso conseguir por em prática
o que nela está escrito. Para isso, é necessário que os brasileiros sejam educados
para reivindicar o direito de cobrar pelos seus próprios direitos assim como exigir
que as normas sejam cumpridas pelos demais.
Em relação ao espaço, o trabalho de Coradini (1995), Praça XV: espaço e
sociabilidade, realizado em uma praça central na cidade de Florianópolis, além de
trazer uma rica contribuição ao conceito de apropriação social do espaço, possui
também um conjunto de imagens que nos transportam para uma Florianópolis vista
através de alguns fragmentos visuais antigos e de outros mais recentes. Recortes de
certo espaço, flagrantes de seus usos, que podem ser lembrados ou imaginados,
pois as fotografias retratam particularidades e especificidades, comuns ao cotidiano
de muitos outros lugares.
Ainda, nesse trabalho, Coradini (1995) escreve sobre a diversidade da
concepção do termo espaço nas ciências sociais. A pesquisadora reúne conceitos
dados ao termo desde o ano de 1890 em Durkheim (1983), até os teóricos mais
25
O conceito de desigualdade social é um guarda-chuva que compreende diversos tipos de
desigualdades, desde desigualdade de oportunidade, resultado, etc., até desigualdade de escolaridade,
de renda, de gênero, etc. De modo geral, a desigualdade econômica – a mais conhecida – é chamada
imprecisamente de desigualdade social, dada pela distribuição desigual de renda. No Brasil, a
desigualdade social tem sido um cartão de visita para o mundo, pois é um dos países mais desiguais.
Segundo dados da ONU, em 2005 o Brasil era a 8º nação mais desigual do mundo. O índice Gini, que
mede a desigualdade de renda, divulgou em 2009 que a do Brasil caiu de 0,58 para 0,52 (quanto mais
próximo de 1, maior a desigualdade), porém esta ainda é gritante. Disponível em:
<http://www.brasilescola.com/sociologia/classes-sociais.htm>. Acesso em: 15 set. 2010.
43
atuais com características interdisciplinares como Bourdieu (1989), Maffesoli (1984)
e Foucault (1987), detalhando o enfoque desses e outros autores citados por ela. A
autora escreve:
O espaço pode ser considerado o mais interdisciplinar objeto de análise. Ele
é hoje tema de reflexão de arquitetos, geógrafos, historiadores,
antropólogos e até mesmo de físicos e matemáticos. Isto força
necessariamente a quem deseja trabalhar com ele buscar referências
dispersas muitas vezes em outras áreas (CORADINI, 1995, p.13).
Como pode se observar diversas são as definições do termo espaço. Para a
pesquisa que se trata aqui, ou seja, a tentativa de associar, principalmente, as
características físicas das calçadas ao tipo de cidadão que ocupa esse espaço,
optou-se por adotar a conceituação de espaço proposta pelo geógrafo Milton
Santos. Para ele “o espaço é formado por um conjunto indissociável, solidário e
também contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não
considerados isoladamente, mas como um quadro único na qual a história se dá”
(SANTOS, 2008, p.63), e ainda, “constitui um dado ativo, devendo ser considerado
com um fator e não exclusivamente como reflexo da sociedade. É no território tal
como ele atualmente é, que a cidadania se dá tal como ela é hoje, isto é,
incompleta” (SANTOS, 2000, p. 06).
No capítulo seguinte será apresentado um histórico da fundação e formação
da cidade, bem como sua urbanização e expansão, além da formação do bairro
Lagoa Nova, uma explanação de sua constituição e imagens que retratam o objeto
de estudo desse trabalho – as calçadas.
44
CAPÍTULO II
CALÇADAS DAS DUNAS
*
*
Fotografias antigas retiradas do Anuário Natal 2009 – Secretaria Municipal de Meio ambiente e
Urbanismo – Natal (RN): Departamento de Informação, Pesquisa e Estatística, 2009.
45
2 CALÇADAS DAS DUNAS
2.1 A URBANIZAÇÃO DE NATAL
De acordo com Souza (2008), segundo os historiadores Câmara Cascudo e
Hélio Galvão, Natal tem hoje pouco mais de 400 anos. Seu primeiro aglomerado de
casas começou a se desenvolver na região que conhecemos hoje como Cidade Alta
e Ribeira.
A cidade de Natal foi fundada no pequeno planalto que se estende da atual
Praça das Mães, na Avenida Junqueira Aires (hoje, Câmara Cascudo), até a
descida do Baldo. O “chão firme e elevado”, a que se refere Varnhagen é o
espaço ocupado, hoje, pela Praça André de Albuquerque, Palácio Potengi,
Catedral Velha e a Igreja de Santo Antonio. No espaço atualmente ocupado
pela Praça André de Albuquerque, realizou-se o ato de fundação da cidade
(SOUZA, 2008, p. 58).
Fotografia 18: Praça André de Albuquerque
começo do séc. XX.
Fonte: Arquivo Bruno Bougard (Acervo IHG/RN).
Fotografia 19: Praça André de Albuquerque,
visão atual.
Fonte: Acervo SEMURB.
Apesar de receber o título de “Cidade”, permaneceu, durante muito tempo,
apenas como um pequeno conjunto de edificações simples, só começando a
merecer crédito a esse título a partir do século XVIII26. Segundo o historiador Olavo
de Medeiros Filho, citado por Souza (2008, p. 61), “até o ano de 1700, parece ter
havido duas ruas em Natal: a primeira corresponde à que fica em frente à Matriz, na
26
Somente no século XVIII, foi que Natal começou a adquirir uma fisionomia urbana tradicional, os
dois bairros primitivos – Cidade Alta e Ribeira – se consolidaram no seu espaço geográfico, surgindo,
assim, as primeiras ruas (SOUZA, 2008, p. 61).
46
atual Praça André de Albuquerque; a segunda, o caminho do rio de beber água, as
atuais ruas Santo Antônio e da Conceição” (MEDEIROS FILHO, 1991, p. 70).
Ao longo do século XVIII, foram construídas as primeiras igrejas, praças e
prédios da administração pública. Para se ter uma ideia, de acordo com Cascudo (apud
SOUZA, 2008, p. 62), até a metade do século na cidade havia aproximadamente 118
casas. O seu crescimento permaneceu muito lento até o final do século XIX.
Em uma citação de Henry Koster, datada de 1810, em que descreve a cidade
encontra-se um dos primeiros relatos sobre a construção de calçadas na cidade. “A
cidade não é calçada em parte alguma e andasse sobre uma areia solta, o que obrigou
alguns habitantes a fazerem calçadas de tijolos ante suas moradas. Esse lugar contará
com seiscentos ou setecentos habitantes” (KOSTER, 1978, p.89, apud SOUZA, p. 62).
Natal começou a desenvolver-se mais rapidamente a partir do século XX.
Itamar de Souza destaca quatro momentos decisivos para esse crescimento,
conforme citação:
Primeiro, a Proclamação da República. A implantação do regime
republicano despertou nas Províncias o interesse de suas respectivas elites
dirigentes para a construção de sua identidade e o desenvolvimento de
suas potencialidades. Segundo, após a revolução de 30, cessadas as
turbulências do poder político, Natal teve uma década de muito progresso
nos governos do Interventor Mário câmara e de Rafael Fernandes Gurjão,
impulsionado também pela vinda dos americanos na II Guerra Mundial.
Terceiro, o surto de desenvolvimento regional, iniciado nos anos 60 pela
Sudene, ocasionou mudanças fundamentais em Natal, sobretudo no que se
refere à energia elétrica para a indústria e o consumo doméstico. Quarto, na
década de 70, Natal foi profundamente beneficiada pelo governo federal
que, através do II PNAD, investiu muitos recursos nas capitais dos Estados
do Nordeste, visando elevar o padrão de vida da população urbana e,
assim, diminuir as tensões sociais (SOUZA, 2008, p. 67).
Conforme esses dados pode-se concluir que a capital potiguar é uma cidade
com um histórico de planejamento urbano e de urbanização 27 recentes, iniciados
27
“A urbanização não é simplesmente o aumento do número e tamanho das cidades. Ela se
manifesta em duas dimensões: (a) a do espaço social, referente a um modo de integração
econômica, capaz de mobilizar, extrair e concentrar quantidades significantes de produto excedente
e, também, de uma integração ideológica e cultural, capaz de difundir os valores e comportamentos
da vida moderna; (b) a do espaço territorial, correspondente ao crescimento, multiplicação e arranjo
dos núcleos urbanos, cuja feição particular está vinculada ao seu papel no padrão geral de circulação
do excedente, no planejamento estatal e na articulação deste com a sociedade local” (BECKER,
1991, p.52-53).
“O termo urbanização refere-se ao mesmo tempo à constituição de formas espaciais específicas das
sociedades humanas, caracterizadas pela concentração significativa das atividades das populações
num espaço restrito, bem como à existência e à difusão de um sistema cultural específico, a cultura
urbana” (CASTELLS, 1983, p. 46).
47
aproximadamente no final do século XIX. Ao se percorrer a cidade, percebe-se logo
essa contradição, apesar de seus quatrocentos anos de fundação, por ter crescido e
se desenvolvido mais significativamente apenas nas últimas décadas, quase não se
encontram vestígios de um passado arquitetônico tão antigo.
De acordo com Scherer (1991), pode-se conceituar o planejamento urbano
com um projeto de intervenção física e social instalado para a ação sobre a cidade
no Estado de Bem-estar que tem como pressupostos a universalização dos direitos
sociais. Natal, assim como muitas outras cidades brasileiras, não parece ter seguido
esses pressupostos. A tese de doutorado de Pedro Antônio de Lima Santos (1998)
traz uma análise sobre a história do planejamento urbano em Natal ao longo do
século XX. Segundo o autor, muitos planos foram concebidos, mas poucos
implementados ou executados em sua totalidade. Parte das propostas de
intervenções que distribuiriam direitos iguais a todos os moradores da cidade
geralmente não se concretizaram.
Os governos municipais sempre seguiram um modelo que priorizava o
investimento e o melhoramento das áreas, já, historicamente, contempladas por um
maior número de equipamentos urbanos e, “naturalmente”, mais valorizadas do
município, locais em que, coincidentemente, a população possui um poder aquisitivo
maior. Pode-se comprovar, ainda, que esse modelo persiste até hoje, quando se
analisam os bairros e regiões da cidade em que estão sendo concentrados os
investimentos para a Copa do Mundo de 2014, entre eles o bairro Lagoa Nova.
Santos (1991) acrescenta que “as intervenções urbanas propostas ou realizadas em
Natal, durante o século XX, não mudaram a forma de apropriação do espaço
urbano, preservando, portanto, a segregação sócio-espacial”.
Essa forma de desenvolvimento pode fornecer pistas sobre a razão pela qual
essas administrações nunca priorizaram o planejamento e execução de projetos
urbanísticos, inclusive os destinados a facilitar as vias de acesso aos pedestres e/ou
usuários de transportes coletivos – que, de certa forma, percorrem boa parte do seu
trajeto completo, de casa para o trabalho, escola ou lazer, a pé.
Enrique Peñalosa, ex-prefeito de Bogotá, ficou conhecido por revolucionar,
em termos de mobilidade urbana, a capital colombina entre 1998 e 2001. De acordo
“[...] a noção ideológica de urbanização refere-se ao processo pelo qual uma proporção
significativamente importante da população de uma sociedade concentra-se sobre um certo espaço,
onde se constituem aglomerados funcional e socialmente interdependentes do ponto de vista interno,
e numa relação de articulação hierarquizada (rede urbana)” (CASTELLS, 1983, p. 47).
48
com a entrevista, concedida ao Jornal Zero em junho de 2012, disse que, em sua
administração, a prioridade dos investimentos na área de mobilidade urbana foi
direcionada aos pedestres, aos ciclistas e ao transporte público, conforme Peñalosa,
este tipo de iniciativa significa que há, realmente, uma forma democrática de
governo. Questionado sobre quais seriam os exemplos fundamentais para o
desenvolvimento de uma cidade, Peñalosa responde: “O que diferencia uma cidade
atrasada de uma avançada não são os metrôs, nem as autopistas. É a qualidade
das calçadas28”.
28
Disponível em: <http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/geral/transito/noticia/2012/06/somente-a-restricaode-automoveis-solucionara-os-engarrafamentos-diz-palestrante-do-fronteiras-do-pensamento-3792
678.html> Acesso em: Set/2012.
49
2.2 O BAIRRO LAGOA NOVA
Fotografia 20: Mapa de localização do Bairro I – Lagoa Nova – Natal.
Fonte: SEMURB – Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo (2009).
50
Fotografia 21: Mapa de localização do Bairro II – Visão ampliada – Lagoa Nova e seus limites.
Fonte: SEMURB – Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo (2009).
51
De acordo com Souza (2008), a expansão urbana de Natal em direção à zona
Sul começou com a construção desse bairro nos anos 60. Mas, antes disso, na
década de 40, período da II Guerra Mundial, a ligação do centro de Natal, por uma
rodovia asfaltada, até o município de Parnamirim, ao sul da Cidade, já deu o primeiro
impulso a esse crescimento, devido à base aérea de apoio aos americanos ter sido
construída nesse município vizinho. “Com a construção da base americana em
Parnamirim, em 1942, cresceu a necessidade de um intercâmbio entre aquela
unidade militar e Natal” (SOUZA, 2008, p. 446). Atualmente, essa rodovia asfaltada
faz parte do complexo rodoviário da BR 101, é a principal avenida que corta o bairro
no sentido Norte-Sul, nesse trecho recebe o nome de Avenida Senador Salgado Filho.
A expansão urbana do bairro Lagoa Nova, ocorrida nas décadas de 70 e 80
do século XX, foi impulsionada, em grande parte, pela construção de vários
conjuntos habitacionais para a população de classe média, quando o
Sistema Financeiro de Habitação, através do Banco Nacional de Habitação
(BNH) e seus agentes, deu prioridade para os investidores voltados para a
classe média brasileira (SOUZA, 2008, p. 611).
A fundação oficial do Bairro, em 1947, não coincide com o início de sua
urbanização29. Nesse período, a região era caracterizada, ainda, com uma zona
rural da cidade, formada por sítios e granjas. O processo de urbanização começa,
efetivamente, a partir da construção dos conjuntos habitacionais na década de 60.
As primeiras 100 residências, nessa área, foram entregues em 1967. Além
dos conjuntos D. Jaime Câmara e do SESC na área, atualmente, conhecida como
Potilândia, foram edificados vários outros conjuntos como: Lagoa nova I e II,
Roselândia, Nova Dimensão, Ouro Branco, Bandeirantes, Interlagos, São José, São
Marcos, Monza, Jardim Rivera, Castelo Branco, Santo André, Rebelo Flor, Potiguar
II, Parque das Serras e outros, todos eles compostos por um número, máximo, em
torno de 100 unidades residenciais.
Destaca-se que esse foi um dos bairros que mais recebeu investimentos e
equipamentos urbanos da Capital ao longo desses anos. Entre eles, podemos citar
oito das maiores escolas públicas estaduais (construídas entre 1960 e 1980); o
principal estádio de futebol, inaugurado em 1972, que ficou conhecido como
29
O bairro de Lagoa Nova foi criado oficialmente pelo prefeito Sylvio Pedrosa, através do Decreto –
Lei nº. 251, de 30 de setembro de 1947. Somente 46 anos depois, isto é, em 5 de abril de 1993, os
seus limites foram redefinidos, através da Lei 4328, editada pelo prefeito Aldo da Fonseca Tinoco
Filho (SOUZA, 2008, p. 601).
52
“Machadão” – hoje demolido e em cujo espaço está sendo construída a Arena das
Dunas, estádio que sediará a copa em 2014 –, o complexo de edifícios que formam
o Centro Administrativo do Estado30; a Central de Abastecimento (CEASA-RN),
inaugurada em 1976; a Universidade Federal do Rio Grande do Norte; o Palácio do
Tribunal Regional de Justiça do Trabalho; vários grandes empreendimentos da
iniciativa privada como o Centro de Atividade Integrada – SESI–SENAI, funcionando
desde 1979, grandes hipermercados e centros comerciais de compras (conhecidos
como Shoppings). A lista inclui ainda hospitais, clínicas, enfim, praticamente todos
os equipamentos urbanos necessários à vida na cidade31.
Com o advento da copa do mundo 2014, assiste-se, mais uma vez, a uma
concentração de investimentos governamentais em uma das regiões mais ricas e
bem servidas de equipamentos urbanos da cidade, o bairro Lagoa Nova e
adjacências. Para se ter uma ideia da facilidade com que a administração pública
direciona recursos para investir nessa região, em 2007 foram gastos algo em torno
de R$ 13 milhões na reforma do antigo estádio “Machadão”, demolido no final de
2011 para dar espaço ao novo complexo em andamento intitulado Arena das Dunas,
orçado em aproximadamente 450 milhões de reais.32
Apesar desse volume de recursos, essa construção estimada para ser
concluída em dois anos, não priorizou a acessibilidade de pedestres ao seu redor,
durante as obras. Esse descaso deve ser evidenciado, já que faz parte de um plano
de projeção internacional, além de estar sendo acompanhado e noticiado, quase que
diariamente, pela imprensa nacional.
Imaginando o antigo estádio “Machadão” como o coração do bairro Lagoa
Nova e seguindo essa metáfora, os locais destinados à circulação dos pedestres ao
redor do estádio seriam seus principais vasos sanguíneos. O trágico é que esses
vasos já nasceram com uma má formação congênita, nunca se constituiu,
completamente, num formato em que as pessoas pudessem andar livremente. O
novo e caríssimo coração que está sendo transplantado, já está herdando essa falta
de cuidado por seus cirurgiões. Em uma linguagem mais direta, a área em volta do
30
Fontes não oficiais sugerem que a existência de uma lagoa, na atual área do Centro Administrativo,
antes de sua construção é o que teria dado origem ao nome do bairro.
31
Maiores detalhes sobre cada um desses investimentos, no que se refere à urbanização do bairro
Lagoa Nova, encontra-se no livro “Nova História de Natal”, de Itamar de Souza, no capítulo XIX
intitulado de “Lagoa Nova, um bairro nobre” (pp. 604-628).
32
Informações fornecidas em artigo, publicado pelo atual prefeito de Natal Carlos Eduardo, publicado
no site do jornal Tribuna do Norte em 29 de Junho de 2011. Disponível em:
<http://tribunadonorte.com.br/noticia/a-reforma-do-machadao/187051>. Acesso em: 10 set. 2012.
53
antigo estádio, desde que foi concluído, era formada por areal e alguns barrancos. A
nova obra piorou o espaço de circulação para os pedestres. Mesmo se tratando,
agora, de uma situação provisória (dois anos ou mais). A mensagem é bem clara, o
pedestre nunca foi e nem é prioridade (ver sequência de figuras 25 a 29).
Fotografia 22: Estádio de Futebol João Cláudio de Vasconcelos Machado (Machadão),
em construção na década de 60, no bairro Lagoa Nova, Natal/RN.
33
Fonte: Jaeci E. Galvão (Internet) .
Fotografia 23: Visão do Estádio (Machadão) em 2009, ao fundo, o Bairro Lagoa Nova.
34
Fonte: Júnior Santos (Out./2009) .
33
34
Disponível em: <http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=766584>. Acesso em: 10 jun. 2009.
Disponível em: <http://arquivos.tribunadonorte.com.br/fotos/52945.jpg>. Acesso em: 10 jun. 2009.
54
Fotografia 24: Estádio Machadão em demolição no final de 2011, ao fundo, o Bairro Lagoa Nova.
35
Fonte: Autor desconhecido (Dez./2011).
Fotografia 25: Calçada da obra do novo estádio Arena das Dunas na Av. Lima e Silva
próximo á Av. Romualdo Galvão. Detalhe: A calçada não poderá ser reconstruída, já que
nunca existiu.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2012).
35
Disponível em: <http://www.cimentoitambe.com.br/massa-cinzenta/wp-content/uploads/2011/12/
Natal.jpg>. Acesso em: 10 set. 2012.
55
Fotografia 26: Calçadas do canteiro de
obras da Arena das Dunas.
Av. Prudente de Morais, Lagoa Nova.
Fonte: Arquivo Ricardo Silva (jun./2012).
Fotografia 27: Calçadas do canteiro de
obras da Arena das Dunas.
Av. Prudente de Morais, Lagoa Nova.
Fonte: Arquivo Ricardo Silva (jun./2012).
Fotografia 28: Calçadas do canteiro de
de obras da Arena das Dunas.
Av. Lima e Silva.
Fonte: Arquivo Ricardo Silva (Jun./2012).
Fotografia 29: Ponto de ônibus na calçada
da obra da Arena das Dunas.
Av. Lima e Silva.
Fonte: Ricardo Silva (Jun./2012).
56
Atualmente, o bairro Lagoa Nova, localiza-se na região administrativa Sul,
limitando-se com os seguintes bairros: ao Norte com Alecrim, Lagoa Seca e Tirol; ao
Sul com Capim Macio e Candelária; ao Leste com Nova Descoberta e com o Parque
das Dunas (reserva de mata nativa); finalmente, a Oeste, com Candelária, Cidade da
Esperança, Nossa Senhora de Nazaré e Dix-Sept Rosado (Ver mapa, p. 49 e 50).
De acordo com dados da SEMURB, com base nos dados do IBGE36, a região
possui 10.660 domicílios particulares permanentes e 35.569 habitantes. Quase 27%
dessa população ultrapassam a faixa dos 50 anos de idade (esse é um dado
importante quando se trata de mobilidade urbana, muitas pessoas, a partir dessa
idade, têm o seu poder de locomoção reduzido por fatores biológicos naturais).
Praticamente 100% das residências recebem água tratada, mas apenas
18,81% estão ligadas à rede pública de coleta de esgotos37. De acordo com os
dados da Secretaria de Municipal de Obras e Viação (SEMOV), em 2009, 90% do
bairro possuía obras de drenagem e pavimentação.
Quanto aos equipamentos urbanos, os dados emitidos pela SEMURB,
parecem não estar completos, mesmo assim, apresenta-se sua síntese. Nesse
aspecto, o bairro conta com 36 estabelecimentos de Educação, 10 unidades de
saúde, 10 espaços destinados à prática de esportes, seis unidades de serviço de
segurança pública, 25 praças e nove organizações comunitárias. De acordo com a
pesquisa sobre qualidade de vida38 em Natal, realizada em 2003 por Arimá Viana
Barroso, na época, chefe do setor de estatística e informações da Prefeitura de
Natal, o bairro Lagoa Nova estava entre os bairros que apresentaram os melhores
desempenhos, concentrando a maior taxa de saneamento básico, o melhor nível
médio de escolaridade e moradores com os mais altos salários da cidade.
Percebe-se que, apesar de todas as características positivas em termos de
infraestrutura, renda e grau de escolaridade de sua população, o bairro Lagoa Nova
apresenta sérios problemas no quesito acessibilidade de pedestres. Os governos, ao
logo do desenvolvimento dessa região, parecem ter priorizado, sempre, obras para
circulação dos veículos motorizados (ver fotografia número 30 – o espaço destinado
ao trânsito de pedestres é mínimo, mal é possível perceber nessa imagem). Quanto
36
Censo demográfico 2000 e contagem populacional 2007.
Fonte: SEMURB – Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo, com base nos dados da
CAERN – Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte, 2009.
38
Para realização da pesquisa foram levadas em consideração três dimensões: renda, ambiente e
educação.
37
57
à população, parece não ter sido educada para reivindicar seus direitos ao livre
acesso, nem mesmo para construir, quando lhe compete, espaços públicos
apropriados à circulação livre e segura a todos os demais moradores da cidade, o
que se pode constatar no conjunto de imagens contidas nesse trabalho.
Em uma relação dialética, pode-se dizer que o traçado do passeio público
desse bairro, tanto pode refletir o tipo de cidadania presente nesse universo como
também impor aos moradores ou trabalhadores dessa região, quem e como esses
indivíduos devem circular por suas ruas e avenidas, construindo uma identidade
cidadã contrária ao princípio de igualdade.
Fotografia 30: Vista parcial da Av. Senador Salgado Filho, à direita, o Centro Administrativo.
Bairro Lagoa Nova.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2008).
2.3 CARACTERÍSTICAS ATUAIS DO PASSEIO PÚBLICO
A
campanha
Mobilize
Brasil39
realizada
pela
associação
Abaporu,
organização sem fins lucrativos, qualificada como OSCIP, teve como objetivo
estimular o debate público sobre Mobilidade Urbana Sustentável, divulgando
39
Mobilize Brasil é uma realização da Associação Abopuru (OSCIP – Organização da Sociedade Civil
de Interesse Público). Foi fundada em 2003, atua nas áreas de educação, cultura e cidadania. O
site da campanha pode ser acessado no seguinte endereço eletrônico: <www.mobilize.org.br>.
58
informações, referências internacionais e exemplos de melhores práticas por meio
de textos e matérias sobre esse assunto.
Essa campanha/pesquisa ocorreu em duas etapas, a primeira entre janeiro e
março de 2012 e a segunda em abril e julho de 2012. O objetivo do trabalho foi
estimular a melhoria das condições de mobilidade para pedestres, chamar a atenção
da opinião pública para o problema da má qualidade, falta de manutenção ou
ausência de calçadas no país e estimular as pessoas a denunciar os problemas em
suas cidades, além de pressionar as autoridades, buscando conscientizar os
cidadãos sobre o assunto.
Essa pesquisa foi realizada em 12 capitais brasileiras, entre elas, Natal 40.
Foram considerados os seguintes critérios para avaliação: irregularidades no piso,
largura mínima de 1,20m (conforme norma ABNT), degraus que dificultam a
circulação, outros obstáculos, como postes, telefones públicos, lixeiras, bancas de
ambulantes e de jornais, entulhos, etc., existência de rampas de acessibilidade,
iluminação adequada da calçada, sinalização para pedestres, paisagismo para
proteção e conforto.
Conforme o relatório, nesse levantamento, os dados eram de fácil observação
por qualquer pessoa que caminha e utiliza o espaço urbano, razão que permite que o
formulário de que se utilizaram os pesquisadores fosse utilizado para avaliar as
condições do passeio público em quaisquer outras cidades. Além da observação da
avaliação realizada nas calçadas, os autores do estudo procuraram informar-se também
sobre as repartições públicas e leis municipais específicas que tratam do tema.
As condições de mobilidade urbana foram consideradas precárias. A média
nacional ficou em 3,40, quando a nota mínima para uma calçada de qualidade seria
8, segundo critérios estabelecidos pelo Mobilize. Dos locais avaliados, apenas
2,19% obtiveram nota acima desse indicador, enquanto 74,13% obtiveram médias
abaixo de 5. Cabe destacar que um problema bastante comum observado nas
diversas calçadas das capitais brasileiras é a ocupação dessas por mesas, cadeiras
e vendedores ambulantes, o que impede a passagem dos pedestres e cadeirantes.
Outro detalhe importante é a falta de paisagismo, áreas antes ocupadas por jardins
hoje são cercadas por muros e grades de proteção.
40
As demais capitais foram Belo Horizonte (MG), Brasília (DF), Curitiba (PR), Fortaleza (CE),Goiânia (GO),
Manaus (AM), Porto Alegre (RS), Recife (PE), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA), São Paulo (SP).
59
No ranking das cidades, Natal ocuparia uma posição média em relação às
demais capitais brasileiras, recebeu nota 5,08, no entanto, bem abaixo da mínima
aceitável. Belo Horizonte, Curitiba, Fortaleza e Porto Alegre estariam mais próximas
da nota 8. Manaus, Recife, Salvador e Rio de Janeiro apresentaram os piores
resultados.
Sobre os critérios de avaliação das calçadas em Natal, pode-se destacar uma
falha na avaliação das calçadas do shopping Midway Mall, que recebeu nota
máxima, o que não se justifica, pois parece terem sido consideradas apenas as que
dão acesso as entradas para clientes, a calçada dos fundos por onde é feito o
abastecimento de mercadorias está, no entanto, totalmente fora dos padrões de
acessibilidade como mostram as fotos 61 e 62 na página 105, fato que poderia
diminuir a nota atribuída a Natal.
Importante destacar que em penúltimo lugar ficou a cidade do Rio de Janeiro,
mesmo havendo por parte da prefeitura, dados estatísticos sobre notificações,
número de casos resolvidos e cobrança de multas por irregularidades encontradas
nesse espaço. Conforme entrevista ao G1.com, Carlos Alberto Osório 41, Secretário
Municipal de Transportes do Rio de Janeiro, informou que, em caso de
irregularidades encontradas na calçada, é encaminhada uma notificação ao
proprietário do imóvel, se não resolver o problema no prazo estipulado, recebe uma
multa no valor R$ 200,00, caso persista o problema a multa passa a ser diária, em
última instância a prefeitura pode fazer os reparos e cobrar do proprietário.
Segundo dados da Secretaria de Conservação e Serviços Públicos do Rio de
Janeiro publicados no site Deficienteciente42, foram emitidas notificações a 573
condomínios e concessionárias só no mês de janeiro de 2012, desses apenas 17%
não foram atendidas. Já quanto à vistoria, a secretaria informou que, de junho de
2011 a março de 2012, foram feitas em 19 bairros. “Ao todo, foram identificadas
5.081 não conformidades e 72% dos casos, resolvidos”. Natal, embora na pesquisa
Mobilize Brasil, tenha sido melhor classificada que a capital carioca, não há
quaisquer levantamento ou controle sobre notificações e irregularidades, conforme
entrevista realizada com funcionários da SEMURB, na página 79.
41
42
Disponível em: <http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2012/04/rio-e-segunda-cidade-com-piores
-calcadas-do-brasil-diz-pesquisa.html.>. Acesso em: 02 mar. 2013.
Disponível em; <http://www.deficienteciente.com.br/2012/04/portal-mobilize-brasil-calcadas-do-rjestao-entre-as-piores-do-pais.html>. Acesso em: 02 mar. 2013.
60
A média de melhores notas no ranking se concentrou nas cidades do Sul e
Sudeste. O que se reflete, também, na opinião dos moradores dessas regiões
quanto à percepção no sentimento de respeito à condição de pedestres e de
ciclistas, de acordo com dados de uma pesquisa do IPEA (2011).
[...] o Sul se destaca positivamente, com 42,4% dos entrevistados
respondendo que sempre há sentimento de respeito na condição de pedestre
e ciclista, enquanto 17% acham que isso acontece na maioria das vezes. No
extremo oposto, está o Nordeste, em que 47,3% das pessoas acham que
nunca há sentimento de respeito na condição de pedestre e ciclista, e 15,9%
acham que isso ocorre raramente (SIPS/IPEA, 2011, p.168).
A situação de Natal, dentro do quadro geral, parece ser muito semelhante à
realidade das calçadas de outras várias cidades brasileiras. Ao se percorrerem os
mais variados bairros da Capital potiguar, percebe-se que a falta de padronização e
o grande número de obstáculos nesse espaço destinado à circulação de pedestres
são generalizados. Além disso, existe um completo estado de abandono, ao longo
de muitos trechos. As características históricas, sociais e econômicas de uma
determinada região, parecem influenciar na qualidade das calçadas, mas não são
determinantes quando consideradas de uma forma isolada.
O poder público mostra-se, de maneira geral, ausente, seja pela falta de
planejamento, seja pela fiscalização ineficaz e ineficiente, ou ainda pelo mau
exemplo do péssimo estado de conservação dos espaços que deveriam ser
planejados, mantidos ou recuperados pela própria administração pública municipal
ou estadual43.
Em alguns bairros mais antigos e compostos, predominantemente, por
populações mais pobres como: Rocas, Ribeira, Santos Reis, Mãe Luísa, uma parte
de Nova Descoberta, Quintas e Bairro Nordeste, assim como na Zona Norte, fica
evidente que apresentam, como pode ser observado nas imagens 32, 33, 40, 41, 42,
44, 45 e 47, piores condições de acessibilidade aos pedestres em comparação às
regiões consideradas mais nobres da cidade, como é o caso do próprio bairro Lagoa
Nova, em estudo.
43
De acordo com informações obtidas na SEMOB (2012), em entrevista realizada com o Engenheiro
Civil Raimundo Moisés Leite e Silva e com o Arquiteto Urbanista Francisco Xavier De Oliveira
Neto, alguns espaços destinados à circulação de pedestres que fazem margem ao longo de
avenidas estaduais ou federais são de competência e responsabilidade dos órgãos de suas
respectivas esferas.
61
Boa parte da ocupação desses aglomerados foi marcada por invasões e/ou
construções irregulares que nem sempre deixaram uma porção mínima de área
física destinada à elaboração de um espaço para circulação de pedestres. Encontrase nesse aspecto uma contradição, pois é possível perceber que é, justamente,
nesses bairros em que um maior número de pessoas circula a pé pelas ruas.
Essa contradição é reforçada quando se observam os bairros de tradição mais
comercial como é o caso da Cidade Alta e do Alecrim ou, ainda, outras regiões da
Capital, que recebem um grande número de visitantes turistas, como é o caso dos
calçadões ao longo das praias urbanas. Pode-se dizer, resumidamente, que os bairros
e regiões, onde a circulação de pedestres é mais intensa e visível, parecem liderar na
diversidade e na quantidade de obstáculos à acessibilidade dos transeuntes.
Destaca-se, negativamente, o passeio público do Bairro Alecrim por
apresentar extensas áreas ocupadas pelo comércio ambulante. Os comerciantes
chegam a invadir, até mesmo, às margens de uma das principais avenidas do bairro.
Em alguns trechos, as calçadas, transformam-se em uma espécie de túnel entre as
barracas dos camelôs e os prédios comerciais. Outro aspecto negativo é que,
apesar de ser um bairro antigo, ainda é comum, muito esgoto correndo a céu aberto.
O calçadão de Ponta Negra, em uma das praias mais famosas da cidade,
está bem deteriorado, e, de acordo com algumas reportagens, não se pode culpar
apenas a última administração municipal. O que aparece hoje é fruto de várias
administrações anteriores que sempre realizaram obras de efeito paliativo.
Algumas imagens registradas mostram o esgoto sendo jogado na principal rua de
acesso à praia, descendo pelo meio da escadaria, destinada aos pedestres e
hóspedes de alguns hotéis próximos. Segundo alguns vendedores ambulantes,
essa situação não é recente.
No próximo capítulo é feita uma análise das entrevistas na tentativa de
perceber a consciência dos usuários no que diz respeito à construção, à ocupação e
à manutenção desse espaço, assim como uma possível relação entre o
conhecimento dos direitos e deveres dos entrevistados no tocante ao exercício da
cidadania e ao tratamento prático dado ao espaço público.
62
CAPÍTULO III
DIALOGANDO COM O CAMPO DE PESQUISA
Avenida Bernardo Vieira, Natal/RN.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jul./2009).
63
3 DIALOGANDO COM O CAMPO DE PESQUISA
3.1 TRAJETÓRIAS DA PESQUISA
Na medida em que fotografava as calçadas com tão variadas formas de
ocupação, ora um amontoado de lixo e restos de construção, ora uma garagem ou
mesmo extensão de algum barzinho, motivei-me a questionar a percepção que
diferentes segmentos da sociedade tinham em relação a esse espaço que, embora
público, era tratado por tantos como privado, visto que dele se apropriavam para
atender a interesses particulares.
Apesar de não estarmos tratando especificamente de uma pesquisa de
representação social, segui algumas orientações do trabalho dos professores
Fernando Lefevre e Ana Maria Cavalcante Lefevre (2010) sobre pesquisa de
representação social e o enfoque qualiquantitativo.
Dessas orientações surgiram os seguintes questionamentos. O que eu,
pesquisador, percebo como problema corresponde ou significa, realmente, um
problema para as pessoas que serão entrevistadas? Como as pessoas que
responderão às perguntas poderão representar qualitativamente a opinião sobre a
questão da acessibilidade das calçadas ou o sentido atribuído ao termo cidadania?
Como esses dados poderão contribuir para uma pesquisa posterior de caráter
predominantemente quantitativo?
De acordo com esses autores (2010, p.37), o que devemos eleger como
problemas
de
pesquisa
“são
aqueles
cujo
conhecimento,
solução
ou
equacionamento passam necessariamente pelos sentidos a ele atribuídos pelos
atores sociais envolvidos”. Acrescentam, ainda, que:
Atribuir sentido como ato social envolve, entre outras coisas, perguntas do
tipo: o que o indivíduo pensa sobre o problema pesquisado, o que acha de,
qual a sua opinião sobre, como vê tal problema, como o representa, como o
percebe, como o define, como o vive, como o avalia, como o sente, como se
posiciona diante dele etc. (LEFEVRE, 2010, p.37).
Assim, tomando como base essas orientações, foi elaborado um formulário de
perguntas44 para as entrevistas, estruturado com os seguintes objetivos: captar a
percepção física e social do espaço pelos entrevistados; saber quem eles,
44
O formulário de perguntas encontra-se no anexo.
64
entrevistados, responsabilizam pelo atual estado do passeio público; sondar como
as pessoas classificam esse espaço e como definem o que é público ou privado;
confrontar o que pensam sobre esse espaço e o que fazem na prática; verificar o
alcance das informações legais em relação à construção e a manutenção desses
espaços; perceber as práticas cidadãs e os motivos que estimulam ou desestimulam
suas ações; confrontar o que pensam sobre cidadania e o que enxergam como
práticas cidadãs no espaço pesquisado; sondar a capacidade dos entrevistados de
apontarem os problemas do seu próprio espaço físico e social, assim como a
percepção geral da cidade em relação ao tratamento dado aos pedestres.
As entrevistas foram do tipo qualitativa, semiestruturada e individual. Com a
realização de um pré-teste45 foram alterados alguns detalhes das perguntas iniciais.
Foi elaborado, também, uma espécie de cartão de visitas – contendo alguns dados
pessoais do entrevistador, número da matrícula na instituição de ensino, endereço
eletrônico do programa de pós-graduação com código de confirmação de dados –
esse recurso teve como objetivo conquistar a credibilidade das pessoas que seriam
entrevistadas e facilitar a marcação das entrevistas.
Na escolha das pessoas que participariam das entrevistas, procurei
contemplar a maior variedade de tipos de relação de uso desse espaço e o
problema principal em questão: as características atuais de acessibilidade do
passeio público. Foram selecionados homens e mulheres adultos, proprietários ou
não de lotes urbanos, transeuntes do bairro Lagoa Nova, funcionários públicos da
área de planejamento e urbanização da prefeitura, além de profissionais da área de
arquitetura e urbanismo.
Totalizando um número de 22 pessoas selecionadas da seguinte forma: um
funcionário responsável pela manutenção desse espaço no maior Shopping Center da
cidade; um deficiente cadeirante; um deficiente visual; um morador, síndico de um
condomínio de alto padrão (que apresentava a calçada irregular); cinco moradores
cujas calçadas poderiam apresentar diversos tipos de situações irregulares ou não;
um morador que utilizava a calçada como extensão do seu comércio há alguns anos;
outro que utilizava a calçada como extensão do seu comércio há alguns meses; dois
funcionários públicos, técnicos – um Engenheiro Civil e outro Arquiteto da Secretaria
Municipal de Mobilidade Urbana (SEMOB); três funcionários técnicos administrativos e
45
O pré-teste serve para avaliar se o tipo de pergunta elaborada consegue fazer com que os
entrevistados respondam dentro do objetivo estabelecido para cada pergunta.
65
Arquitetos da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo (SEMURB); quatro
transeuntes, moradores de outros bairros ou municípios vizinhos – homens e
mulheres; dois vendedores ambulantes – homem e mulher.
É importante registrar que, apenas, três pessoas das que haviam sido
escolhidas para responder as perguntas não as responderam. Duas alegaram falta
de tempo e foram adiando as datas das entrevistas até o limite de não poder incluílas no trabalho e outra, que comentou que não gostaria de participar da pesquisa.
No primeiro contato, foi explicado para esses entrevistados que não era
objetivo da entrevista classificar respostas com certas ou erradas, o mais importante
é que respondessem de forma espontânea. Esta espontaneidade foi mais
perceptível em alguns entrevistados. Outros, somente após o término da entrevista,
relatavam a lembrança de algum acontecimento ou situação relacionada ao tema.
O contato direto com esses atores/agentes da pesquisa foi muito importante
para a análise desse trabalho. A realidade vivida por alguns desses entrevistados
me fez rever algumas opiniões preconcebidas do senso comum, como por exemplo,
a ideia do camelô com um dos invasores desse espaço. Ouvi-los, saber sobre suas
dificuldades, sobre as pressões que sofrem por estarem ali, sentir de perto o difícil
ambiente de trabalho onde vendem os seus produtos, me fez percebê-los mais
como vítimas de um desequilibrado sistema de relações econômicas e sociais.
Na sequência serão apresentadas ideias e percepções provenientes das
entrevistas, bem como a transcrição de alguns fragmentos que reforçam, de maneira
bastante objetiva, na visão dos entrevistados, a concepção do espaço em estudo.
3.2 CONVERSANDO COM ALGUNS CIDADÃOS
Ao perguntar “como é para o senhor(a) caminhar pelas calçadas do seu bairro
e da sua cidade? Por quê?” Obtive, na maioria quase que absoluta das respostas,
pontos negativos relacionados à acessibilidade desse espaço. Mesmo as pessoas
que não foram tão radicais em afirmar que era péssimo ou muito ruim, sempre
acrescentavam, no transcorrer da entrevista, a percepção de que havia vários
obstáculos. Respondiam, de início, com palavras para suavizar os problemas como:
“são boazinhas, mas tem muito buraco ou o piso escorrega demais”, “são mais ou
menos, mas tem muito desnível”, “parece que algumas pessoas não querem que a
66
gente ande em suas calçadas, ela são cheias de elevações”, “é complicado, cheio
de altos e baixos”, “é aceitável, mas...”.
A sinceridade de uma moradora do bairro, que reside há 18 anos no mesmo
local e nunca construiu sua calçada, pareceu-me surpreendente. Ela respondeu: “É
péssimo. A começar pela minha. Pra mim, tinha que ser tudo igual, se você estiver
de cadeira de rodas não consegue andar” (Vânia, 48 anos, do Lar). Assim como
algumas respostas bastante elaboradas como a desse entrevistado, que respondeu
da seguinte forma:
Difícil, existe muito despreparo dos pedreiros e donos de imóveis...
(Citou a ABNT46, fez uma pausa e recomeçou)... Primeiro, devia-se
evitar os batentes entre uma casa e outra; segundo, as subidas dos
carros (rampas) não deviam interferir no passeio, mas ninguém faz isso,
constroem as rampas atrapalhando a passagem; terceiro, as calçadas
do bairro são muito estreitas, têm cestos de lixo, postes... imagino que
os cadeirantes não conseguem passar (José, 36 anos, Analista de
Sistemas, deficiente visual).
No geral, as respostas das mulheres foram mais detalhistas, talvez pelo tipo de
calçado que costumam usar (com saltos), como o caso de uma corretora de imóveis
que trabalha no bairro. Esta se queixou de calçadas revestidas com paralelepípedo
(pedras utilizadas comumente para vias de automóveis) e a resposta de uma senhora,
que reclamou desse calçamento e de um outro tipo que, em sua avaliação, era ruim
para caminhar. Ela responde: “É Muito ruim. Falta calçamento, tem entulho, buraco.
Tem tipo de calçamento que fica fácil de tropeçar” (Rosa, 52 anos, aposentada),
referindo-se a área ao redor de uma das igrejas do bairro, que é revestida com
paralelepípedo, além da praça onde fica o centro comunitário, em que a calçada foi
construída e revestida, recentemente, com uma mistura de cimento e brita.
Algumas pessoas apontaram uma solução rápida e prática para resolver o
problema da falta de calçadas adequadas, como Ana, que respondeu: “É bom
caminhar, mas, como as calçadas apresentam muitos desníveis ou em alguns pontos
não existe calçada é mais fácil andar pela rua mesmo” (Ana, 37 anos, Bióloga).
Na
sequência,
a
opinião
de
uma
transeunte,
que
se
ofereceu,
espontaneamente, para participar da pesquisa quando eu estava entrevistando um
vendedor ambulante na parada de ônibus, em frente ao Natal Shopping. Dentre as
46
Associação Brasileira de Normas Técnicas.
67
diversas respostas referentes a essa questão, a seguinte considero sintetizar, de
uma forma mais completa, as ideias que apareceram na maioria das entrevistas.
É um malabarismo. Não existe padronização. Altas, baixas, buracos,
vendedores ambulantes – nada contra eles, diretamente, mas o ideal é que
tivesse um local melhor para eles... Mau estado de conservação, como
outras coisas que estão em poder da administração pública (Vânia, 35 anos,
auxiliar administrativo).
A segunda pergunta objetivava saber, na opinião dos entrevistados, de quem
era a responsabilidade pelo atual estado das calçadas além de alguma justificativa
para a resposta. Foram indicados os seguintes responsáveis: a Prefeitura, o prefeito,
os governantes, o presidente do centro comunitário, o vereador, os políticos, o
pessoal da igreja, ou seja, associados em geral, a um poder público. Como indica a
resposta do senhor André, “pertence à prefeitura, porque é público” (André, 69 anos,
dentista e síndico). Mesmo nessa resposta a seguir que, de certa forma,
responsabiliza individualmente, os proprietários dos imóveis, ainda sim, acaba
direcionando a responsabilidade, indiretamente, ao poder público.
Era para ser o dono da calçada, mas para isso teria que ter sido
catequizado antes. Portanto, acho que é o governo federal, a
prefeitura... que deveria fazer campanhas para isso. Os meios de
comunicação não divulgam o suficiente... se existissem campanhas
desse tipo, você poderia responsabilizar as pessoas... (José, 36 anos,
Analista de Sistemas, deficiente visual).
Das pessoas entrevistadas, que demonstraram não ter conhecimento técnico
sobre o assunto, apenas três disseram considerar que a responsabilidade em “parte
era do dono do imóvel e em parte da administração pública”, uma única disse que a
responsabilidade seria individual de cada um dos proprietários como mostram as
respostas a seguir.
Os governantes, a prefeitura. Porque nós pagamos impostos para eles
darem conta disso. Eu digo isso, mas 50% ou mais são os moradores que
colocam lixo e não cuidam das calçadas. Já perdi a conta de quantas vezes
pedi para a prefeitura limpar as calçadas aqui do centro comunitário e nada.
Acabo fazendo uma vaquinha com alguns moradores e mando alguém
limpar (Maria de Fátima, 54 anos, diretora de um centro comunitário).
É um misto. Omissão da administração pública. Nós, nordestinos, que
somos mal educados, o que é público é privatizado. O público para mim, de
certo modo, deve ser tratado como algo privado, mas em relação aos
cuidados que se deveria ter sobre esse espaço... É o imposto que eu pago
68
que mantém esse espaço... Não é porque é público que você pode
depredar (Vânia, 35 anos, auxiliar administrativo).
Cada pessoa tem que ter consciência... Eu sempre deixo o espaço do
pedestre passar... Cada pessoa fazendo sua parte fica mais fácil (Pedro, 37
anos, Comerciante).
Para sondar como as pessoas classificam esse espaço e como definem o que
é público ou privado foram feitas as seguintes perguntas: Para o senhor(a) a calçada
é um espaço público ou privado? Por quê?
Todos os entrevistados responderam que as calçadas são espaços públicos,
mas as justificativas variaram um pouco, conforme transcrições: “é público porque
são os políticos que mandam”; “é público porque se a prefeitura quiser fazer algum
serviço na calçada o proprietário não pode impedir; “público, qualquer pessoa deve
ter acesso a ele”; “público, porque você só manda até o fim do seu lote, mas muita
gente diz que é dele, que é particular”. Muitas pessoas justificaram a sua resposta
associando-a a ideia de posse desse espaço.
A resposta a seguir mostra que, muitas vezes, a privatização da calçada, na
concepção de alguns proprietários, pode ultrapassar os próprios limites desse
espaço, chegando até a um recorte da própria rua.
Público... de certa maneira é público sim, mas algumas pessoas consideram
até o espaço da rua em frente a sua casa como particular, não querem nem
que a gente estacione na frente (Sílvia, 27 anos, corretora de imóveis).
Alguns entrevistados foram um pouco mais além, dando a idéia de que, era
um espaço público, porque era um local de uso coletivo. Como Ana e Vânia, que
responderam da seguinte forma: “A calçada é um espaço público. Todos podem
passar sem pedir autorização, porque o dono não pode impedir a passagem das
pessoas” (Ana, 37 anos, Bióloga).
As calçadas são públicas. Esse espaço está além dos limites do
proprietário... É de uso comum. Tudo que for ser feito nela deve ser
compartilhado com todos que a usam. Tem gente que coloca carro com
som muito alto, isso não deveria acontecer (Vânia, 40 anos, auxiliar
administrativo).
Quanto à ocupação desse espaço, um jovem transeunte, baseando-se no
exemplo da calçada de um centro comercial, que existia em frente ao seu local de
trabalho, deu a seguinte resposta:
69
Público, mas às vezes privada. Quando é muito larga pode ser as duas
coisas. Depende do tipo de calçada. Olha aquela calçada ali na frente...
temos o lugar dos carros e dos pedestres (Henrique, 24 anos, caixa de uma
sorveteria).
Para confrontar o que se pensa sobre esse espaço e o que se faz na prática,
foi perguntado o que fariam, para construir ou reformar a calçada de suas
residências e possíveis justificativas para suas ações. Mais da metade dos
entrevistados disseram que chamariam um pedreiro e como justificativa predominou
a ideia de que construir uma calçada é algo tão simples que não precisaria ter
conhecimento especializado sobre isso, todas as respostas foram bastante
similares. Como exemplo, essa de um estudante.
Chamaria um pedreiro. Não precisa de um engenheiro para fazer ou
reformar uma calçada. Porque é algo tão simples. É só botar cimento,
cerâmica ou pastilha, qualquer coisa desse tipo (Rafael, 18 anos).
Um dos entrevistados que, por coincidência, foi o profissional mais indicado
para construir a calçada, relativizou um pouco o problema respondendo: “chego e
faço. A pessoa já sabe o que tem que fazer. Agora, se for um serviço grande, tem
que ter um projeto (José, 32 anos, Pedreiro).
Outro entrevistado considerou também que a questão era relativa, de certa
forma. Apresentou uma solução ambígua, pois, de acordo com a sua resposta, a
construção e a reforma desse espaço exigiriam procedimentos diferentes.
Para construir chamaria um pedreiro, mas se for para reformar consultaria a
prefeitura, acho que teria que colocar rampa... Piso especial... Consultar
porque agora tem que deixar o espaço para o cadeirante, etc. Como é
pública tem que servir melhor para as pessoas. (Henrique, 24 anos, caixa
de uma sorveteria).
Quatro dos entrevistados disseram que procurariam a prefeitura para saber
como deveriam construir ou reformar a calçada, porque essa entidade pública seria
responsável por esse espaço ou saberia orientar sobre o procedimento adequado.
A ideia mais clara de que teria que ser algo projetado para benefício de uma
coletividade surgiu apenas nessa única resposta a seguir.
Faria um projeto. Tenho três amigos deficientes que têm muita dificuldade em
transitar pela cidade, inclusive um que estuda e anda de ônibus. O projeto da
calçada deve beneficiar a todos (Silvia, 27 anos, corretora de imóveis).
70
A quinta questão – em que se perguntava se os entrevistados conheciam
alguma norma sobre a construção, reforma ou manutenção desse espaço –
apresentou respostas surpreendentes, constata-se um total desconhecimento das
leis que regem esse espaço por parte de todos os entrevistados, com exceção
apenas dos profissionais técnicos da área de arquitetura e engenharia, funcionários
da prefeitura, ligados ao setor que trata dessas questões e um comerciante, que só
revelou conhecer as normas depois que havia terminado todo o questionário e falou,
espontaneamente, sobre a sua situação específica.
A calçada desse entrevistado possui jardineiras entre o limite da calçada e a
rua. Durante a noite preenche todo o espaço com mesas e cadeiras para
comercializar produtos alimentícios (bebidas, lanches, etc.) Abriu esse negócio há
pouco tempo, aproximadamente, dois meses. Localiza-se em uma rua secundária do
bairro, pouco movimentada, mas com um detalhe, há uma academia de ginástica e
natação em frente ao seu estabelecimento. A entrevista foi realizada na própria
calçada.
Depois
de
concluídas
as
suas
respostas,
começou
a
falar
espontaneamente, dizendo que consultou a SEMURB e sabia que não era permitido
utilizar a calçada da forma que ele estava utilizando (colocando mesas, cadeiras,
jardineiras, etc.). Falou também sobre o toldo que cobria a sua calçada...
Eles disseram que poderia cobrir com o toldo desde que não usasse pilares
na calçada para apoiar... estou providenciando um espaço interno aqui na
minha casa para isso... se o negócio der certo mesmo... eu conversei
também com esses outros comerciantes aqui do bairro... sabe? Eles
disseram que nunca se incomodaram sobre isso” (Joaquim, 47 anos,
Gastrônomo e Comerciante).
O senhor(a) já reclamou para algum vizinho ou fez alguma denúncia sobre a
construção ou reforma irregular de alguma calçada no seu bairro ou na sua cidade?
Por quê? Essa foi a sexta pergunta, que tinha o objetivo de perceber as práticas
cidadãs e os motivos que estimulam ou não suas ações.
O Senhor Fábio, Arquiteto e funcionário da prefeitura, foi o único dos
entrevistados que relatou ter feito uma denúncia formal sobre a reforma irregular de
uma calçada em sua vizinhança. De acordo com o seu relato, nada foi feito pelo órgão
responsável (SEMURB) para que o problema fosse corrigido. Ao reclamar diretamente
para o funcionário do setor de fiscalização, ouviu o seguinte questionamento: “como
71
eu iria notificar aquele proprietário pela irregularidade da reforma de sua calçada se,
praticamente, todas as calçadas daquela rua estavam irregulares?”.
Outro caso de denuncia formal foi relatado pela Sra. Fátima, que contou o
seguinte episódio:
Eu nunca reclamei ou denunciei, mas teve um caso de um vizinho que
fizeram a denúncia, sim. Ele estava aumentando a garagem para conseguir
colocar dois carros e estava usando o espaço da calçada para conseguir
aumentar o tamanho dela. Nesse caso, quando a fiscalização veio, ele teve
que desmanchar a parede que estava construindo em cima da calçada. Eu
não denuncio porque acho que uns pagam pelos outros. Tem gente que tem
conhecimento lá em cima e não acontece nada se agente denunciar. É só
ver aqui no bairro, está cheio de casos de gente que construiu na calçada
(Maria de Fátima, 54 anos, diretora de um centro comunitário).
Esse relato aponta, também, um dos motivos comuns que apareceram em
outras respostas e que parecem desestimular a prática de reivindicar direitos, ou
seja, a falta de solução quando se reclama para os órgãos públicos “competentes”
ou responsáveis por esse tipo de fiscalização. Frases como “não reclamei porque
acho que ninguém dá jeito não”, que apareceu como resposta, entre outros trechos
das transcrições a seguir, que reforçam a predominância desse tipo de percepção: a
ineficiência da administração pública.
Não. Porque eu acho ineficiente o serviço público... Já tenho muitos
problemas pessoais. Acho uma perda de tempo procurar órgão público para
isso... Já reclamei sobre um posto de saúde e nenhuma das reivindicações
foram atendidas (Joaquim, 47anos, Gastrônomo e Comerciante).
Já reclamei, até de onde moro hoje, sobre o esgoto de uma vizinha que
corre para frente da minha casa. Além do mau cheiro, faz o mato crescer
muito rápido... Outro dia tive que pagar cinquenta reais para limparem.
Reclamei só para vizinha, mas não resolveu. Não reclamei para a SEMURB
porque eles não resolvem também (Vânia, 40 anos, auxiliar administrativo).
Quando entrevistei um funcionário responsável pela manutenção do passeio
público do maior Shopping da cidade, na sua resposta destaca também a questão
da ineficiência da administração pública na resolução desse problema. Quanto a
maior dificuldade para manter as calçadas do estabelecimento de acordo com o que
foi planejado, ele diz:
Quanto à questão física, relacionada ao desgaste natural do material da
calçada, a situação é rapidamente resolvida quando solicitamos
providências junto à administração do Shopping. A maior dificuldade está na
quantidade de vendedores ambulantes. É um caso da prefeitura, ela é
72
responsável. O Shopping não vai entrar em conflito com eles. Nós já
comunicamos a SEMURB, pedindo que esse problema seja resolvido, foram
feitas várias solicitações, durante sete anos, mas o problema não foi
solucionado (Melo, 36 anos, Engenheiro civil, gerente de operação adjunto).
Um fato curioso é que do grupo que respondeu nunca ter reclamado, apenas
quatro se justificaram por achar que “nunca sentiram necessidade” ou “nunca
perceberam como algo que os afetasse”. O restante afirmou não ter reclamado para
não se indispor com os seus vizinhos. Como respondeu o Sr. José: “Não
reclamamos porque nós somos pacatos, não costumamos chamar a atenção dos
vizinhos, mesmo que eles estejam errados” (José, 36 anos, Analista de Sistemas,
deficiente visual).
Já a Sra. Íris, que disse nunca ter reclamado ou denunciado sobre algo
relacionado às calçadas, falou que já foi alvo de denúncia pelo tipo de atividade que
exerce. Ela comentou:
Já recebi reclamação da SENSUR. Eles sempre vêm dizendo que são
ordens da prefeita. Disseram que quando for no tempo da copa vai tirar a
gente daqui. Talvez a gente esteja incomodando o Shopping. (Íris, 29 anos,
vendedora ambulante de calçados).
A sétima pergunta foi “O que é cidadania para o senhor(a)?”. Também foi
surpreendente o número de pessoas que afirmaram não saber responder. Pensei
ser interessante transcrever as respostas de todos aqueles que tentaram responder,
da sua forma, o que pensavam sobre o termo cidadania:
Ter direitos coletivos respeitados, respeitar e cumprir os meus deveres
(Ana, 37 anos, Bióloga).
É uma pergunta um pouco complexa... o direito de ir e vir, trabalhar, comer,
beber, ter lazer... acho que é isso... votar, ser votado, pagar impostos –
infelizmente temos que pagar para “os caba” fazer festa... – respeitar os
direitos do próximo e ter os seus direitos respeitados pelo próximo... (José,
36 anos, Analista de Sistemas, deficiente visual).
Seria o respeito a tudo que nos temos direito e é justamente isso que falta.
Não é só porque eu sou cadeirante, mas para todas as pessoas (Alexandre,
41 anos, Pedagogo, cadeirante).
Cada um fazendo a sua parte, sempre pensar no próximo... É só você
pensar que se fechar esse espaço não tem como as pessoas passarem
(Joaquim, 47anos, Gastrônomo e Comerciante).
Não sei, mas imagino o que as pessoas deficientes passam por causa
da falta de sensibilidade das outras pessoas diante desse problema....os
73
idosos também...acho que é respeitar os direitos das pessoas (Silvia, 27
anos, corretora de imóveis).
É um conjunto de normas que eu devo cumprir e direitos que eu devo
ter... E deve ser igual para todos os homens. Ter ciência dos direitos e
fazer valer. Fazer algo pelos outros. Promover a qualidade de vida do
coletivo... Dos espaços em que você está inserido... (Vânia, 40 anos,
auxiliar administrativo).
Respeitar o direito do outro. Também fazer com que respeitem os seus
direitos (Henrique, 24 anos, caixa de uma sorveteria).
Não sei não. Acho que é o amor pelo outro, um certo cuidado... um certo
respeito pelo outro (Rafael, 18 anos, estudante).
Com o objetivo de sondar sobre a capacidade dos entrevistados de apontarem
os problemas do seu próprio espaço físico e social, assim como a percepção que
tinham desse espaço no contexto geral da cidade foram elaboradas as seguintes
perguntas:
 Como o (a) senhor (a) descreveria a sua calçada e a de seus vizinhos mais
próximos? Por quê?
 Em sua opinião, em qual ou em quais pontos da cidade existem mais
problemas relacionados à acessibilidade de pedestres?
Quanto a essa penúltima questão geral, apesar de, praticamente, todos
apontarem problemas sobre a manutenção desse espaço, foi óbvio que, conforme a
necessidade individual de utilização de cada pessoa foi dada maior ou menor ênfase
a esses problemas, apontados maiores ou menores quantidades de obstáculos
relacionados à questão da acessibilidade. Como veremos a seguir, as respostas que
apontavam maior percepção do problema e com mais detalhes foram dadas,
principalmente, pelos portadores de deficiência.
Péssimas. Hoje eu sei que são péssimas. Tem umas que são todas de
paralelepípedo (mesma pedra usada para calçar ruas), são desniveladas...
Eu tenho uma mãe de 80 anos... já é ruim para ela também... As calçadas
são cheias de buracos, em forma de ladeira (Alexandre, 41 anos,
Pedagogo, cadeirante).
Irregulares. Não obedecem o nivelamento da rua, tem entrada de carro
(rampa) atrapalhando o caminho, lixeiras. Tem gente que além da rampa,
bota mais um batente no meio, aí fica bem massa (com ironia). Quando eu
ando aqui, eu prefiro o meio da rua, acho mais seguro. Você não vai
encontrar um poste e outros obstáculos. Eu, particularmente, prefiro andar
pela rua (José, 36 anos, Analista de Sistemas, deficiente visual).
74
Já as respostas dos que circulam, sempre em veículos motorizados
individuais, foram bastante breves, como as seguintes respostas: “são ruins”, “acho
que não são boas para caminhar” ou “não sei dizer, sempre ando de carro”.
O mesmo ocorreu com a última questão, relacionada à percepção geral desse
problema na cidade.
A resposta do Sr. Alexandre foi detalhada, não se referiu
apenas aos problemas das calçadas, mas as dificuldades de acesso enfrentadas por
um cadeirante em diversas situações. Para ele esse problema é generalizado.
Na cidade inteira. No km 6 (avenida que passa pelos bairros das Quintas e
Felipe Camarão), lembro da dificuldade quando dava aulas lá... Em
hospitais têm problemas, nos elevadores tem problemas, no Hospital do
Coração. No PAPI não preciso levar minha cadeira. No teatro Riachuelo,
que é novo, é difícil. Tive problemas na loja de material de construção
AGAE e processei um funcionário da loja que me destratou, mas tive
problemas até em relação ao estacionamento do veículo, no dia da
audiência, no prédio da justiça, localizado na Av. Ayrton Senna. Havia um
carro do promotor estacionado na vaga para deficientes (e ele não era
deficiente) e o segurança não queria que minha irmã estacionasse na outra
vaga, reservada para os promotores. Aqui em Natal só teve um lugar que fui
tratado como um rei... No Banco do Nordeste, na Av. Prudente de Morais...
(Alexandre, 41 anos, Pedagogo, cadeirante).
A indicação dos bairros mais problemáticos em relação à acessibilidade das
calçadas, de acordo com o que responderam essas pessoas, parece ter seguido
uma lógica de maior utilidade de uso. Assim, os bairros, predominantemente
comerciais, apareceram em grande parte das respostas. O Bairro do Alecrim foi o
mais citado, seguido pelo Bairro Cidade Alta (Centro). O terceiro que mais apareceu
foi o próprio Bairro da nossa pesquisa, Lagoa Nova. O conjunto de bairros,
comumente chamado de Zona Norte, apareceu em quarto lugar. Os outros bairros e
pontos citados foram: Bairro Nordeste, Quintas, Nova Descoberta e Ribeira (partes
mais antigas), além das Calçadas do Shopping Via Direta, da Orla de Ponta negra,
da UFRN e da Av. Maria Lacerda.
Um dos entrevistados respondeu elaborando uma certa ordem, “em uma
escala do pior para o melhor... Alecrim, Centro, Tirol, Petrópolis” (Joaquim, 47anos,
gastrônomo e comerciante).
75
3.3 VISITANDO A SECRETARIA MUNICIPAL DE MEIO AMBIENTE E URBANISMO
(SEMURB)
Com o objetivo de saber a opinião de especialistas sobre o assunto e
perceber o papel da administração pública na construção e manutenção do espaço
pesquisado, conversei com engenheiros, arquitetos e funcionários de órgãos da
prefeitura ligados ao setor de planejamento e mobilidade urbana da cidade.
Antes de visitar a SEMURB, conversei com o Engenheiro Civil Raimundo
Silva e o Arquiteto Francisco Oliveira Neto, ambos funcionários da SEMOB 47. Eles
me deram os primeiros esclarecimentos técnicos sobre o assunto e indicaram outras
pessoas na SEMURB para que eu pudesse dar continuidade ao trabalho.
Sobre o planejamento, a execução e a fiscalização dos espaços destinados
ao trânsito de pedestres na cidade do Natal, eles disseram que esses projetos,
quando de autoria da SEMOB, são elaborados sempre de acordo com a legislação.
Quando há necessidade de interferências nas obras, elas não voltam para o
mesmo setor de planejamento dessa secretaria. Seguem para o SEMOPI 48. Deram o
exemplo do projeto da Av. Do Contorno, afirmando que sofreu muitas alterações na
hora da execução. De acordo com eles, questões políticas, econômicas, de relação
entre governo e construtoras, além de fatores ligados à fiscalização influenciam
muito no resultado final da obra.
Esclareceram também que algumas obras de mobilidade dentro do município
podem pertencer a esferas administrativas diferentes. A Av. Senador Salgado Filho,
que corta o bairro Lagoa Nova, por exemplo, é uma das principais vias de acesso da
cidade, mas faz parte de um complexo rodoviário federal, como parte da BR-101. As
calçadas, túneis e passarelas de pedestres nessa via, não são de responsabilidade
apenas do município, cabe também a órgãos específicos do Governo Federal.
Antes de falar sobre as informações obtidas na SEMURB, penso ser relevante
descrever a sua localização e área física. Ela está instalada, atualmente, no bairro
de Candelária. De acordo com informações de alguns funcionários, o prédio foi
alugado pela prefeitura há alguns anos.
O edifício de poucos andares, construído para abrigar apartamentos
residenciais, está sendo utilizado pela prefeitura de forma improvisada para o
47
48
Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana.
Secretaria Municipal de Obras Públicas e Infraestrutura.
76
funcionamento dessa secretaria. Os setores dentro dessa instituição aparentam
estar funcionando de forma precária. No dia da entrevista, nenhum dos elevadores
estava funcionando. Nos corredores havia um mau cheiro exalado dos banheiros,
que estavam sujos e o prédio sem água. Próximo ao local, destinado às refeições
dos funcionários, havia muito lixo acumulado em sacos plásticos. Finalmente, boa
parte da calçada lateral do prédio, apresentava buracos e estava tomada por ervas
daninhas não podendo ser considerada um exemplo de passeio público para os
moradores da cidade. Com pude constatar, nem mesmo a secretaria municipal
responsável pela fiscalização e planejamento urbanístico da cidade estava em
conformidade com as leis.
Quanto às informações, procurei saber sobre os seguintes pontos: como era
feita a fiscalização dos espaços destinados ao trânsito de pedestres na cidade; se
havia alguma política pública ou campanha atual da prefeitura em relação à
construção e à manutenção dos espaços destinados ao trânsito de pedestres; se
essa política existia, como era feita a divulgação e a avaliação; se havia algum
estudo ou avaliação a respeito de campanhas e projetos anteriores sobre
acessibilidade aos pedestres em Natal e, se existiam, o que apontavam; se era
realizada alguma estatística sobre o número de denúncias feitas por moradores da
cidade ou autuações da prefeitura em relação à construção ou à manutenção de
calçadas irregulares; e, finalmente, se havia algum estudo ou números estatísticos
que relacionassem o número de denúncias recebidas pela prefeitura sobre esse tipo
de irregularidade e a quantidade de casos solucionados.
O Sr. Carlos Ney, que trabalha no setor de licenciamento, disse não ter
conhecimento sobre nenhuma dessas questões. Afirmou apenas que para construir
ou reformar esses espaços de forma legal as pessoas ou entidades deveriam se
dirigir a SEMURB, “aqui na secretaria monta-se o processo, cada tipo de obra tem
uma tramitação específica, passa pela visualização dos técnicos, se estiver de
acordo com as normas, é aprovado” (Carlos Ney, Assistente de licenciamento de
obras privada). Quanto à fiscalização, políticas públicas ou dados estáticos sobre
essa questão, indicou que, talvez, essas informações fossem encontradas em outros
setores da secretaria. Indicou que eu poderia me dirigir primeiro ao Setor de
Fiscalização Urbanística e Ambiental.
77
Conversou-se então, em seguida, com o Sr. Gley Medeiros, Arquiteto e
funcionário do referido setor, que falou um pouco sobre a questão da fiscalização.
Segundo ele:
Existem três formas, em geral, pelas quais a fiscalização entra em ação:
através das denúncias feitas por qualquer pessoa a Ouvidoria; denúncias
encaminhadas pelo Ministério Público, que são bastante comuns; e
recebemos, também, ofícios de entidades – associações, ONGs, etc. –
ligadas a pessoas com deficiências. Uma outra forma é a fiscalização de
rotina, mas não muito comum (Gley Medeiros, Arquiteto e funcionário do
Setor de Fiscalização Urbanística e Ambiental).
Ele comentou também sobre as dificuldades de fiscalização devido ao
reduzido número de fiscais em relação à área de cobertura da cidade.
A respeito de políticas públicas e campanhas de orientação sobre a
importância da construção e manutenção de calçadas com boa acessibilidade, disse
que já houve a algum tempo várias iniciativas por parte de determinados governos,
mas não tiveram continuidade. De acordo com ele, a própria administração atual
preparou um material de campanha, iniciou a construção de um site, mas também
não deu continuidade.
Quanto ao número de denúncias sobre irregularidades ou dados estatísticos,
fui encaminhado para a Ouvidoria. Porém, segundo os funcionários desse setor,
não era possível, no momento, encontrar dados estatísticos específicos sobre o
tema. O sistema de arquivos estava passando por uma reforma e alguns dados
antigos eram muito generalizados. Poderia até ser possível encontrar números sobre
denúncias, mas não, especificamente, sobre o caso de calçadas irregulares.
Também não era possível saber, estatisticamente, sobre dados relacionados ao
número de casos solucionados.
3.4 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE AS ENTREVISTAS
De acordo com essas entrevistas, a percepção sobre a qualidade das
calçadas parece ser medida de acordo com o grau de necessidade e/ou dificuldade
individual de mobilidade de cada morador. Poucos entrevistados justificaram suas
respostas baseando-se em dificuldade de acessibilidade que outras pessoas
poderiam ter relacionados à variedade de características físicas da população.
78
A fala de um dos entrevistados, que se tornou cadeirante após um acidente
de automóvel há alguns anos, resume bem essa ideia de individualidade que
apareceu na maioria das respostas. Quando questionado sobre o que faria para
construir ou reformar a sua calçada, caso necessário e por que tomaria “essa ou
aquela atitude” deu a seguinte resposta:
Hoje, na situação em que me encontro, chamaria alguém que entendesse
do assunto... sei que não poderia fazer uma calçada só para mim...
pensando no que eu passo, penso no que outras pessoas possam passar.
Penso que nós todos, em grande parte, somos egoístas... (faz uma grande
pausa) Depois do acidente meus amigos se afastaram, tem gente que faz
quatro anos que não liga, nem pra saber se eu faleci (Alexandre, 41anos).
Destacou, ainda, no seu depoimento, é que, em sua opinião, muitos dos seus
amigos se afastaram pela dificuldade de acessibilidade que existe na cidade e/ou
equipamentos que não são projetados para acolher pessoas com necessidades
especiais, de acordo com ele, até para ele circular na quadra onde mora é muito
difícil, as calçadas são cheias de obstáculos.
Em grande parte das respostas, em termos de acessibilidade, o passeio
público é considerado ruim, ou seja, é percebido como um problema para a maioria
dessas pessoas. Isso também pode ser comprovado, indiretamente, pelo número de
respostas objetivas de um formulário aplicado durante as entrevistas, apontando que
a maioria dos entrevistados ou já sofreu ou conhece alguém vítima de acidente por
causa de alguma característica do passeio público.
Todos consideraram esse espaço como público, de responsabilidade do
governo ou, com alguma exceção, governo e proprietário do imóvel. A ideia de
espaço público é percebida, predominantemente, como algo de responsabilidade
apenas de administradores ou entidades públicas.
Com exceção dos profissionais técnicos na área de construção e funcionários
da prefeitura, nenhum dos outros entrevistados tinha conhecimento ou certeza sobre
a existência de leis que regem esse espaço, também nunca fizeram denúncias
formais sobre irregularidades relacionadas a esse local. De acordo com as suas
colocações, o desestímulo a fazer reclamações ou denúncias está baseado,
respectivamente, em dois fatores principais: a possibilidade de conflitos com
vizinhos e o descrédito nos órgãos da administração pública responsáveis pela
fiscalização de obras.
79
Sobre cidadania, objetivamente, mais da metade não soube responder e, de
acordo com as outras respostas, teríamos um perfil de cidadão que – pelo menos
em relação à questão da acessibilidade – mesmo admitindo que existem muitos
problemas, não reivindica o seu direito de ir e vir com conforto e segurança. Por
outro lado na hora de construir esses espaços, mesmo que admitam ser público, não
pensa em atender às necessidades de uma coletividade.
A administração pública mostrou-se pouco articulada, organizada ou
empenhada na resolução desse problema. Pôde-se perceber durante as entrevistas
que não existe um trabalho conjunto entre as secretarias e órgãos públicos
relacionados à questão do planejamento e urbanização da cidade. Soma-se a isso
um trabalho de fiscalização pouco eficiente.
Esse levantamento não tem a pretensão de apontar essas características
como dados que podem ser generalizados, mas as respostas apresentadas nas
entrevistas podem fornecer pistas para a realização de outros trabalhos que
relacionem o que pensa a população sobre o que é público, a falta de conhecimento
sobre as leis e o que pode estimular ou não às práticas de cidadania.
No próximo capítulo, serão apresentadas diversas imagens que retratam a
problemática de que se trata nessa pesquisa. Além da indicação do local em que
foram feitos os registros fotográficos, bem como algumas considerações sobre o uso
de imagens na perspectiva de pesquisadores que tratam do tema.
80
CAPÍTULO IV
O PASSEIO PÚBLICO E SUAS IMAGENS
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (jun./2012).
81
4 O PASSEIO PÚBLICO E SUAS IMAGENS
4.1 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE AS IMAGENS
De acordo com José de Souza Martins (2008) – um dos mais importantes
Sociólogos brasileiros – no seu livro “Sociologia da Fotografia e da Imagem”, a
Sociologia e a Antropologia têm esperado que o registro de imagem, seja por meio
de fotografia ou vídeo,
[...] possa ser utilizada como fonte e registro factual de informações de trato
sociológico (e antropológico) sobre a realidade social. Uma fonte que
documentasse o que os instrumentos usuais e já tradicionais de pesquisa
não documentam ou documentam insuficientemente, uma novidade mágica
na revelação de dimensões novas e inesperadas da realidade social
(MARTINS, 2008, p.9).
A nossa sociedade vem se tornando cada vez mais visual e sobre essa
importância da imagem ele acrescenta:
[...] o visual se torna cada vez mais documento e instrumento
indispensáveis na leitura sociológica dos fatos e dos fenômenos sociais.
Não só como documento em si, mas também como registro que perturba as
certezas formais, oriundas do cientificismo que domina a Sociologia desde o
seu nascimento (MARTINS, 2008, p.10).
É preciso reconhecer que, além de suas vantagens na ampliação de
possibilidades para a realização de um determinado tipo de investigação, existem
também as suas limitações. Mesmo assim, isso não anula os seus méritos, visto que
os variados meios de documentação tradicional também possuem seus limites.
Assim como se levantam dúvidas sobre a “verdade” de um registro fotográfico é
possível fazer o mesmo em ralação a qualquer outra forma de documentação
utilizada pelas ciências sociais.
Se uma fotografia pode ser concebida como algo artificial – quando as
pessoas sabendo que estão sendo fotografadas fazem pose ou mudam o seu
comportamento diante de uma câmera, da mesma maneira, é possível, segundo
Martins (2008), também, que um método tradicional de documentação possa ser
questionado sobre esse mesmo aspecto. De acordo com ele, há interferência
causada pelo contato entre o pesquisador e o seu entrevistado durante uma
entrevista, “a informação está necessariamente contaminada” por essa presença.
82
Kubrusly (1998) faz os seguintes questionamentos:
Afinal, o que é fotografia? A capacidade de parar o tempo, retendo para
sempre uma imagem que jamais se repetirá? Um processo capaz de gravar
e reproduzir com perfeição imagens de tudo que nos cerca? Um documento
histórico, prova irrefutável de uma verdade qualquer? Ou a possibilidade
mágica de preservar a fisionomia, o jeito e até mesmo um pouquinho da
alma de alguém de quem gostamos? Ou apenas uma ilusão? Uma ilusão de
ótica que engana nossos olhos e nosso cérebro com uma porção de
manchas sobre o papel, deixando a sensação tão viva de que estamos
diante da própria realidade retratada? (KUBRUSLY, 1998, p. 8).
Após esses questionamentos conclui que fotografia pode ser tudo isso e
muito mais, que não existe uma resposta definitiva, que não é um assunto esgotado.
Diante disso é possível complementar que, assim como os processos de obtenção
dessas imagens e a forma de serem interpretadas pela sociedade também não
encontraram um formato absoluto e imutável. De acordo com Martins (2008), A
fotografia é uma forma de construção social, assim, pode-se dizer que está
conectada e se conecta com as tecnologias e a realidade social do seu tempo.
Sobre o julgamento da qualidade de uma imagem fotografada Kubrusly
(1998) aponta que existe uma visão estreita e deformada que separa de um lado os
que dominam a técnica, os chamados fotógrafos profissionais, e, de outro aqueles
que apreciam a prática e fotografam livremente por intuição. Penso que não me
enquadraria, exclusivamente, dentro de um desses grupos, pois, ao decidir
fotografar e selecionar imagens do meu objeto de estudo, utilizei os dois processos.
Mesmo não sendo fotógrafo profissional, procurei obter as minhas imagens por meio
de técnicas que valorizassem o que me propus mostrar ou evidenciar.
Preocupei-me com o ângulo da máquina em relação ao que pretendia
fotografar e enquadramentos das imagens (o que era interessante mostrar dentro de
um conjunto e o que era necessário captar com mais detalhes de forma individual);
confirmei a utilidade de algumas técnicas que já se popularizaram como a escolha
de horários para captar imagens sob a luz solar, captar várias imagens de um
mesmo ponto, com ângulos variados ou não, para selecionar posteriormente as
melhores imagens. E, por fim, mesmo no caso das imagens que não foram obtidas
por mim, selecionei as imagens com a intenção de que fossem mais do que uma
simples ilustração.
83
Se o conjunto de conhecimentos e intencionalidades de quem está
fotografando ou selecionando imagens são sociológicos, pode-se dizer que essas
imagens também podem adquirir essa especificidade.
Destaco aqui a importância do estímulo ao uso de imagens nesse trabalho
pela Professora Lisabete Coradini, bem como agradeço as pessoas que gentilmente
permitiram serem fotografadas, e os responsáveis por alguns estabelecimentos
comerciais que autorizaram o registro de imagens em “suas” calçadas.
A seguir, apresenta-se uma galeria de imagens em que aparece um
panorama geral do passeio público em vários pontos da cidade e no bairro
pesquisado, seguido de breves comentários.
4.2 CALÇADA DAS DUNAS: PANORAMA GERAL DAS CALÇADAS EM NATAL
Fotografia 31: Fim da Av. Praia do Forte na Redinha – ao fundo, a Ponte Newton Navarro.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Ago./2012).
84
Fotografia 32: Av. Pres. Café Filho, Santos Reis – próx. à Ponte Newton Navarro. Praia do Forte.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jul./2012).
Fotografia 33: Terminal de ônibus na Av. Praia do Forte.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jul./2012).
85
Fotografia 34: Fim da Av. Praia do Forte / Início da Rua da Liberdade, Praia do Meio.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2012).
Fotografia 35: Rua Erivan França. Orla de Ponta Negra – Constantes escoamentos de esgotos.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2012).
86
Fotografia 36: R. Erivan França. Orla de Ponta negra. Usada como depósito pelos comerciantes.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2012).
Fotografia 37: Rua Erivan França. Orla de Ponta Negra. A visível falta de manutenção.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2012).
87
Fotografia 38: Av. Pres. Café Filho, Praia do Meio.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jul./2012).
Fotografia 39: Av. Pres. Café Filho, Praia do Meio.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jul./2012).
88
Fotografia 40: Av. Dr. João Medeiros Filho, Redinha.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Ago./2012).
A sequência de imagens acima mostra lugares onde é frequente o grande fluxo
de turistas e muito utilizado para o lazer de muitos moradores da cidade. Pela falta de
manutenção e limpeza é uma paisagem constante a calçada da imagem 31 estar
sempre coberta pela areia da praia. Esgoto e lixo a céu aberto também fazem parte
desse quadro, como mostram as imagens números 32, 33 e 34. No calçadão de uma
das praias mais famosas da cidade (Fotografia 35), uma área molhada por uma
corrente de água servida que, de acordo com os vendedores ambulantes do local, corre
há vários meses. Detalhe: esse fluxo de esgoto a céu aberto começa em uma rua
acima, desce por uma escadaria – um dos principais acessos de pedestres à praia –,
atravessa a avenida e deságua na praia pela rede de esgoto fluvial.
Na imagem 33, que mostra o terminal de ônibus em frente à Praia do Forte,
além do acúmulo de lixo e do mau cheiro, no momento da obtenção da imagem,
havia uma enorme poluição sonora causada pela música em altíssimo volume
proveniente de bares em frente ao local, mesmo havendo um posto policial vizinho a
esse terminal. Pessoas caminhando pela rua por causa de calçadas inapropriadas
também é uma cena bastante comum nas proximidades (ver Fotografia 34).
Longos trechos desse passeio público na Praia de ponta Negra, cedo da
noite, são utilizados como depósito de mesas, cadeiras e guarda-sóis pelos
89
comerciantes, como mostra a imagem 36. A impressão que se tem é que, realmente
tudo é permitido. A fotografia 40 mostra uma piscina exposta à venda em uma
calçada, na principal via de acesso à Praia da Redinha.
Fotografia 41: Rua Luiz XV, B. Nordeste.
Fonte: Arquivo Ricardo Silva (Jun./2012).
Fotografia 42: Rua 25 de Março, Quintas.
Fonte: Arquivo Ricardo Silva (jun./2012).
Fotografia 43: Av. Cel. Estevam,
Bairro do Alecrim
Fonte: Arquivo Ricardo Silva (Jul./2012).
Fotografia 44: Rua da Liberdade,
Bairro de Santos Reis.
Fonte: Arquivo Ricardo Silva (Jul./2012).
90
Fotografia 45: Trecho da Rua Jânio Cavalcante em Nova Descoberta.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2008).
Fotografia 46: “Castelinho” do Zé do Monte. Rua 25 de Março, Quintas.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2012).
A sequência acima mostra algo frequente nos bairros mais populares e com
população de baixa renda. É muito comum encontrar calçadas cercadas por grades
de ferro ou servindo como extensão de uma garagem. As imagem números 42 e 44
são um caso extremo, a parte.
91
A primeira é conhecida no bairro das Quintas como “Castelinho”, mostra a
construção de uma espécie de gaiola gigante que ocupa toda a calçada e parte da
rua. O autor dessa obra é o Sr. José Antonio Barreto, conhecido como Zé do Monte,
ficou famoso na região por construir “Castelos” no interior do Estado, inspirado na
orientação de uma Santa que, segundo ele, apareceu-lhe quando era criança49.
Detalhes da obra na foto ampliada número 46.
O segundo caso, a imagem número 44, mostra uma sequência de calçadas
de três lotes no Bairro de Santos Reis. Ao fundo, uma igreja evangélica que fez um
muro e colocou grades, depois outra bem abaixo do nível da rua e com uma mureta
– provavelmente para não entrar água fluvial ou de esgotos da rua –, e por último, a
calçada que está em destaque na fotografia. Essa é uma espécie de pérgula para
ventilação e iluminação de um cômodo da casa que existe no subsolo.
A próxima sequência mostra com está sendo tratada essa questão em
grandes e importantes áreas de responsabilidade direta do setor público.
Fotografia 47: Av. Dr. João Medeiros Filho, Bairro Igapó – Zona Norte. Quadra esportiva, á
direita, construída pela Prefeitura.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Ago./2012).
49
Mais detalhes sobre a história do Zé do Monte pode ser encontrada no site:
<http://tribunadonorte.com.br/especial/redescobrindo/010128/010128.htm>.
92
Fotografia 48: Av. Jerônimo Câmara, Cidade da esperança. Terreno pertencente ao
Poder Judiciário Estadual.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Ago./2012).
Fotografia 49: Calçada do Tribunal de Contas do Estado – Av. Getúlio Vargas, Petrópolis.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jul./2012).
93
Fotografia 50: Av. Getúlio Vargas – Petrópolis – ao fundo o Hospital Universitário da UFRN.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jul./2012).
Fotografia 51: Rua São João de Deus. Rocas – ao fundo o Hospital dos Pescadores.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jul./2012).
94
Fotografia 52: Av. Jerônimo Câmara, Lagoa Nova – CEASA. Mau exemplo do poder público.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jul./2012).
Fotografia 53: SEMURB – R. Cel. Joaquim Correia esquina com a R. Francisco Maia Sobrinho.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Ago./2012).
95
Estas últimas fotos do panorama geral da cidade, comprovam que o descuido
com esse espaço é generalizado, não se restringindo aos bairros pobres ou
periféricos. Ele atinge bairros antigos, novos, centrais, históricos, turísticos,
predominantemente residenciais ou comerciais. Em maior ou menor escala, está
presente ao longo de todas as ruas e avenidas da cidade. Fica evidente que nos
bairros mais pobres existem menos calçadas acessíveis, mas calçadas totalmente
inapropriadas ou que servem de depósito de lixo inadequado estão espalhadas por
todos os bairros, mesmo os considerados nobres. Como mostraram a sequência de
imagens do bairro Lagoa Nova em estudo. É como se essa área da cidade
representasse o todo, em termos de uso e qualidade desse espaço público.
Fotografia 54: Av. Rio Branco, Bairro Cidade Alta. Calçada em frente a Central do Cidadão.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jul./2012).
96
Fotografia 55: Av. Cap. Mor Gouveia Bairro, Felipe Camarão.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Ago./2012).
Fotografia 56: Rua próxima à SEMURB no Bairro Candelária.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Ago./2012).
97
Fotografia 57: Rua Gen. Glicério, Ribeira. Ao fundo a Igreja Bom Jesus das Dores
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jul./2012).
Fotografia 58: Rua Dr. Solon de Miranda Galvão. Capim Macio – Próximo a UFRN.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Ago./2012)
98
4.3 IMAGENS DE LAGOA NOVA
Fotografia 59: Rua São José, esquina com a Rua Rodolfo Garcia, Lagoa Nova. A regra
dos terrenos desocupados: o espaço não possuir revestimento e virar depósito de lixo.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jul./2012).
Fotografia 60: Av. Bernardo Vieira. Entrada Shopping Midway Mall. Lagoa Nova. A exceção.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2012)
99
A imagem anterior mostra um trecho excepcional de uma calçada exemplar em
frente a um grande Shopping. Infelizmente, este mesmo estabelecimento não seguiu
esta conduta para a extensão de toda área destinada ao passeio público do seu
prédio. A sequência a seguir mostra o mesmo estabelecimento em ruas diferentes.
Fotografia 61: Rua São Joaquim. Fundos
do Shopping Midway Mall.
Fonte: Arquivo Ricardo Silva (Jun./2012).
Fotografia 62: Av. Bernardo Vieira.
Entrada do Shopping Midway Mall.
Fonte: Arquivo Ricardo Silva (jun./2012).
As próximas imagens demonstram bem o descaso e a falta de planejamento,
uma completa inadequação dos equipamentos destinados a transferir informações
de segurança ao pedestre. A placa onde tem escrito “Pedestre atravesse na faixa”
está bem na frente da própria faixa, ou o que resta dela. Além disso, existe um poste
de energia e uma outra placa indicando o nome das ruas do cruzamento. Segundo a
orientação da faixa, o pedestre irá chegar a um trecho de passeio público que nunca
foi revestido, está todo desnivelado e se não for muito atencioso, corre o riso de um
possível tropeço.
100
Fotografia 63: Travessia de pedestres no cruzamento da Av. Lima e Silva com a Av.
Romualdo Galvão – ao fundo as obras do novo estádio Arena das Dunas.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2012).
Fotografia 64: Travessia de pedestres no cruzamento da Av. Lima e Silva com a Av.
Romualdo Galvão – em frente às obras do novo estádio Arena das Dunas.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2012).
101
Fotografia 65: Passarela I.
Fonte: Arquivo Ricardo Silva (Jun./2012).
Fotografia 66: Passarela II.
Fonte: Arquivo Ricardo Silva (Jun./2012).
Fotografia 67: Passarela III.
Fonte: Arquivo Ricardo Silva (Jun./2012).
Fotografia 68: Passarela IV.
Fonte: Arquivo Ricardo Silva (Jun./2012).
O conjunto de imagens mostra as condições de uma das principais
passarelas de pedestres do Bairro Lagoa Nova, na Av. Senador Salgado Filho,
102
próximo à obra do novo estádio de futebol Arena das Dunas. Este equipamento
urbano já apresentava problemas desde 2003. Segundo alguns moradores do bairro,
o elevador que facilitaria o acesso para gestantes, idosos e deficientes, funcionou
apenas alguns dias após sua inauguração. A rampa que deveria substituir o
elevador nunca foi concluída. Em 2009, o morador Marcelo fez a seguinte denúncia
no site “Eu cuido da minha cidade”:
A passarela de pedestres que cruza a Avenida Salgado Filho, bem ali na
entrada de Natal, está pedindo uma manutenção urgente. O lugar serve de
banheiro para moradores de rua e por isso quem utiliza a passarela tem que
conviver com o mau cheiro. Além disso, o elevador que deveria servir para
que pessoas descapacitadas pudessem usar a passagem, está depredado
50
e cheio de lixo [...]
A última sequência mostrará diversas situações e flagrantes do uso desse
espaço, em que se podem observar formas de apropriação bastante comuns em
outros pontos da cidade, como demonstrado nas imagens ao longo do trabalho.
Fotografia 69: R. do Caulim, campo de futebol do centro esportivo de Potilândia, Lagoa Nova.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Ago./2012).
50
Disponível em: <http://www.eucuidodaminhacidade.com.br/nat/observa.html?page=show_ad&adid=
3&catid=33>. Acesso: 10 jan. 2013.
103
Fotografia 70: Rua do Ouro, Conjunto Potilândia, Lagoa Nova.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2008).
Fotografia 71: Rua da Granada, Conjunto Potilândia, Lagoa Nova.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2008).
104
Fotografia 72: Rua Berilo Wanderley, Lagoa Nova.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2008).
Fotografia 73: Avenida Capitão Mor Gouveia, Lagoa Nova.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2008).
105
Fotografia 74: Anel Viário do Campus da UFRN, Lagoa Nova.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2008).
Fotografia 75: Av. Senador Salgado Filho,
Lagoa Nova. Próximo ao Midway Mall.
Fonte: Arquivo Ricardo Silva (Jun./2012).
Fotografia 76: Rua Dr. Francisco Maiorana,
Lagoa Nova – Condomínio de “alto padrão”.
Fonte: Arquivo Ricardo Silva (Jun./2012).
Na próxima sequência, percebe-se a aparência de uma via moderna para
circulação de veículos que deveria contemplar, também, a acessibilidade aos
pedestres, porém foi construído um espaço mínimo, quase que imperceptível como se
pode ver nesse conjunto de imagens (77, 78 e 79). As duas últimas sequências de
106
imagens foram nomeadas respectivamente de “Esse caminho foi produzido em preto
e branco” e “Para não dizer que não falei das flores”. A primeira, enfatizando o traçado
predominantemente encontrado ao longo da pesquisa. A segunda, mostrando que
poderia ser diferente, pois apesar de raras, essas últimas calçadas têm um toque
especial, além da funcionalidade, embelezam a dureza da paisagem urbana.
Fotografias 77, 78 e 79: Av. Sen. Salgado Filho, Lagoa Nova. Ao lado do Centro Administrativo.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2010).
107
4.4 ESSE CAMINHO FOI PRODUZIDO EM PRETO E BRANCO
Fotografias 80, 81 e 82: Túnel sob a Avenida Senador Salgado Filho, Lagoa Nova.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2008).
108
Fotografias 83, 84, 85, 86 e 87: Avenida Senador Salgado Filho, Lagoa Nova. Vários tipos de
obstáculos em um único trecho.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2008).
109
Fotografia 88: Muro gigantesco, Avenida Senador Salgado Filho, Lagoa Nova.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2008).
Fotografia 89: Avenida Airton Senna, Natal/RN.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2008).
110
Fotografias 90, 91 e 92: Avenida Bernardo Vieira, Natal/RN.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jul./2009).
111
Fotografia 93: Avenida Bernardo Vieira, Natal/RN.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jul./2009).
Fotografia 94: Avenida Bernardo Vieira, Natal/RN.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jul./2009).
112
Fotografia 95: Avenida Dr. Mário Negócio, Natal/RN.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jul./2009).
Fotografia 96: Avenida Dr. Mário Negócio, Natal/RN.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jul./2009).
113
Fotografia 97: Rua Auris Coelho, Nova Descoberta.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2008).
Fotografia 98: Rua Nelson Matos, Nova Descoberta.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2008).
114
4.5 PARA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DAS FLORES
Fotografias 99, 100, 101 e 102: Calçadas no bairro Cidade Jardim, Natal/RN.
Fonte: Arquivo Pessoal – Ricardo Silva (Jun./2010).
Esse acervo de fotografias foi gradativamente sendo montado há mais de três
anos. Devido ao grande número de imagens houve uma certa dificuldade em
selecionar aquelas que corresponderiam aos objetivos do trabalho.
Durante o desenvolvimento da pesquisa em apresentações acadêmicas
constatei o quanto algumas fotos surpreendiam as pessoas, em especial, a foto do
castelinho, imagem 46, na página 90, no bairro das Quintas e a do túnel sob a Av.
Salgado Filho, em frente à UFRN, imagens 80, 81 e 82, página 107.
4.6 RECURSOS UTILIZADOS
Câmera Digital Kodak, modelo Easy Share CX7439 - 4.0 Mega Pixels.
Câmera Digital Sony, modelo Cyber-shot WX-50 – 16.2 Mega Pixels.
Editor: Microsoft Office Picture Manager (Microsoft Office Enterprise 2007).
115
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O pressuposto que orientou a presente pesquisa foi o de tentar perceber o
grau de compromisso dos moradores desse local com os demais moradores de um
aglomerado urbano e como essas pessoas reagem diante dos possíveis obstáculos
que lhes tiram o direito de transitar de forma livre e segura pelas calçadas de sua
cidade. Além disso, foi demonstrado que a falta de acessibilidade das calçadas não
é um problema que afeta, apenas, as pessoas portadoras de necessidades
especiais. Por sua dimensão física, pode influenciar na qualidade de todo o
ambiente que se conhece como cidade.
Esse compromisso com o outro e as relações que tentam equilibrar direitos
e deveres entre as partes pode ser associado à formação de uma cidadania. Por
meio do formato do passeio público de uma determinada região, pôde-se
perceber, na prática, que esse espaço não é apenas um reflexo de uma cidadania
em formação ou a sua ausência, constitui-se um instrumento ativo na sua
construção. As pessoas nascem e crescem mergulhadas nesse ambiente, por
isso costumam naturalizar o formato dessas calçadas e os limites que esse
espaço, criado artificialmente, lhes impõe.
Quanto ao passeio público, no município de Natal, encontra-se, na maior
parte de suas regiões, fora dos padrões funcionais e satisfatórios de acessibilidade
aos transeuntes. Como fatores observados – independente das características
históricas, sociais e econômicas das regiões analisadas – pode-se destacar algumas
situações constantes.
Com raras exceções, quase todos os terrenos desocupados na cidade não
estão de acordo com as normas da prefeitura. Geralmente, não estão devidamente
limpos, cercados e/ou com suas calçadas construídas. Boa parte da área
destinada à construção do passeio público desses lotes é transformada em
depósito de lixo; calçadas que estão de acordo com as normas são verdadeiras
exceções. Não foi observado, pelo menos, uma linha contínua de calçadas
acessíveis que chegassem a ser completas dentro de algum quarteirão. Parece
haver certa contradição: quanto maior o número de pessoas que circulam a pé em
uma determinada região, coincidentemente, parecem ser esses os lugares em que
é maior o número de problemas relacionados à acessibilidade; finalmente, as áreas
de responsabilidade da administração pública, em grande parte, não podem servir
116
de exemplo para a população – a própria calçada da SEMURB não estava em
boas condições no momento em que foram realizadas algumas entrevistas com os
funcionários desse órgão.
Observou-se, também, que um conjunto de fatores pode influenciar na
formação desse espaço, mas nenhum deles de forma isolada pode ser considerado
determinante. Era esperado, por exemplo, que um bairro como Lagoa Nova, criado e
desenvolvido tão recentemente, ricamente contemplado por equipamentos urbanos
e situado hoje em uma região central da cidade, fosse bem planejado e oferecesse
melhores condições de acessibilidade para os pedestres. Mas não é o que
comprovou a pesquisa. Todos os tipos de problemas relacionados à acessibilidade
de pedestres encontrados em outros pontos da cidade também fazem parte da
paisagem desse Bairro.
Boa parte das imagens mostrou o descaso do poder público em relação às
vias de acessibilidade aos pedestres. O peso dessa responsabilidade do poder
público como exemplo é, ainda maior, quando se constata que para grande parte
dos entrevistados a responsabilidade pelo atual estado do passeio público recai
sobre a própria administração municipal. De qualquer forma, indiretamente, acabase
voltando
à
problematização
anterior,
pois
as
mesmas
pessoas
que
responsabilizam o governo são também responsáveis por manter, eleger e reeleger
seus administradores.
Ainda, de acordo com as entrevistas, é possível constatar que esse espaço
previsto para circulação de pedestres não é respeitado, devido à afirmação
generalizada de desconhecimento da lei por parte dos proprietários de imóveis
urbanos, como também pela dubiedade de sentido que adquire ao ser um espaço
público, porém – conforme a lei municipal – de responsabilidade individual privada. A
visão sobre o que é público para a maioria consiste naquilo que deve ser uma
preocupação apenas do próprio poder público ou figura política que o representa.
Pode-se apontar, também, como uma das causas para esse descaso quanto
à construção e manutenção desse espaço, tanto pelo poder público quanto por
grande parte da população local, a consciência ou a experiência vivida dentro de um
tipo de cidadania, voltada apenas para os direitos e deveres individuais, deixando
em último plano o entendimento de que o cidadão é aquele que também pratica
ações que contribuem para o bem da coletividade.
117
O conceito de cidadania parece estar sendo adaptado de forma com que as
pessoas não consigam projetar uma realidade maior do que a de defender seu mundo
individual. Talvez o problema não esteja apenas em saber o significado desses
conceitos, mas na maneira como são utilizados em beneficio próprio. A impressão que
se tem é a de que as calçadas são públicas quando o cidadão não quer se sentir
responsável por elas, privadas quando é vantagem se apropriar desse espaço.
Tem-se a impressão de que as pessoas se colocam como cidadãos quando
lhes é negado à possibilidade de circular livremente pelas calçadas, mas quando
questionados sobre os seus deveres, parecem esquecer parcialmente o significado
do termo cidadania. O cidadão é aquele indivíduo que possui direitos negados e
deveres que devem ser cumpridos apenas pelos outros.
Como afirma Damatta
(1997, p. 75), “Em situações históricas e sociais diferentes, a mesma noção de
cidadania, o mesmo conceito de indivíduo engendram práticas sociais e tratamentos
substancialmente diversos [...]”.
Espero, dessa maneira, poder contribuir com outros trabalhos dedicados ao
planejamento e melhoria dos espaços urbanos em nossas cidades, assim como aos
estudos sociológicos ligados à formação da nossa cidadania.
Uma calçada bem planejada, além de embelezar e valorizar o imóvel, entre
outras coisas, favorece um caminhar mais seguro e facilita as interações entre as
pessoas nesse ambiente. Numa cidade como Natal, são centenas de quilômetros
lineares de calçadas que se cruzam, formando uma malha gigantesca espalhada por
toda a cidade, só esse aspecto físico já mostra a importância de estudar e fazer algo
para melhorar seu aspecto.
118
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124
APÊNDICE
APÊNDICE A – FORMULÁRIO DE ENTREVISTAS – AGO/2012
CADASTRO DO ENTREVISTADO
Nome:______________________________________ Sexo: ( ) M ( ) F
Idade:_____anos.
Endereço: _________________________________________________________________________
E-mail:_______________________________ Telefone: ___________________________________
Quanto tempo mora em Natal?
___________________________________________
Nasceu em:___________________________ Morou até os 18 anos em:______________________
Morou em: ____________________________ por ______ anos, antes de residir em Natal.
É praticante de alguma religião ou irmandade? ______
Qual? ______________________________
Participa de algum tipo de associação de bairro, profissional ou estudantil? _____________________
Qual? ____________________________________________________________________________
Grau de escolaridade: _________________________ Profissão: ____________________________
Renda familiar: entre_____ e _____ salários mínimos. Mais de _____ salários mínimos.
Reside em imóvel: ( ) próprio
( ) alugado
( ) de algum parente
Proprietário de imóvel: ( ) residencial ( ) comercial ( ) misto ( ) não possui imóveis urbanos
Como se locomove, com mais frequência, pelas ruas da cidade:
( ) a pé ( ) de bicicleta ( ) de veículo motorizado individual ( ) de transporte coletivo
Apresentou ou apresenta alguma característica física que dificulta ou dificultou a sua locomoção
pelas calçadas?________ De que tipo? ( ) visual
( ) auditiva (
) motora
Qual situação?_______________________. Essa característica é: ( ) fixa ( ) temporária
Sofreu algum tipo de acidente na calçada ou tem conhecimento de alguém próximo que tenha sofrido,
devido às más condições desse espaço?_______ De que tipo? ______________________________
__________________________________________ Quantas vezes? _________________________
Sofreu algum tipo de assalto na calçada ou tem conhecimento de alguém próximo que tenha sido
assaltado nesse espaço?______________________ Quantas vezes? _________________________
O senhor (a) utiliza a calçada para:
( ) caminhada esportiva
( ) necessidade de ir e vir
( ) sentar e conversar
( ) estacionar seu veículo
( ) depositar entulho
( ) outra______________________
Questões abertas para os moradores do bairro e transeuntes:
1. Como é para o senhor (a) caminhar pelas calçadas do seu bairro e da sua cidade? Por quê?
Objetivo: Captar a percepção física e social do espaço pelos entrevistados.
_______________________________________________________________________________
2. Em sua opinião, quem é responsável pela atual situação das calçadas? Por quê?
Objetivo: Saber sobre quem recai a responsabilidade do atual estado do passeio público na
opinião dos entrevistados.
_______________________________________________________________________________
3. Para o senhor (a) a calçada é um espaço público ou privado? Por quê?
Objetivo: Sondar como as pessoas classificam esse espaço e como definem o que é público ou
privado.
_______________________________________________________________________________
4. O que o senhor (a) fez ou faria para construir ou reformar a sua calçada, caso necessário? Por quê?
Objetivo: Confrontar o que se pensa sobre esse espaço e o que se faz na prática.
_______________________________________________________________________________
5. O senhor (a) tem conhecimento sobre alguma lei que trata sobre a construção ou manutenção das
calçadas em sua cidade?
Objetivo: Sondar sobre o alcance das informações legais em relação à construção e a
manutenção desses espaços.
_______________________________________________________________________________
6. O senhor (a) já recebeu reclamação ou reclamou para algum vizinho, fez ou recebeu alguma
denúncia sobre a construção ou reforma irregular de alguma calçada no seu bairro ou na sua
cidade? Por quê?
Objetivo: Sondar sobre as práticas cidadãs e os motivos que estimulam ou desestimulam suas
ações.
_______________________________________________________________________________
7. O que é cidadania para o senhor (a)?
Objetivo: Confrontar o que pensam sobre cidadania e o que enxergam como práticas cidadãs no
espaço pesquisado.
_______________________________________________________________________________
8. Como o senhor (a) descreveria a sua calçada e a de seus vizinhos mais próximos? Por quê?
_______________________________________________________________________________
9. Em sua opinião, em qual ou em quais pontos da cidade existem mais problemas relacionados à
acessibilidade de pedestres?
Objetivo: Sondar sobre a capacidade dos entrevistados de apontarem os problemas do seu
próprio espaço físico e social, assim como a percepção geral da cidade.
_______________________________________________________________________________
Questões abertas para profissionais de arquitetura e funcionários públicos da área de
planejamento e urbanização da prefeitura
1. Como funciona o planejamento, a execução e a fiscalização dos espaços destinados ao trânsito
de pedestres na cidade de Natal?
2. Existe alguma política pública ou campanha atual da prefeitura em relação à construção e à
manutenção dos espaços destinados ao trânsito de pedestres? Como é feita a divulgação e a
avaliação?
3. Existe algum estudo ou avaliação sobre campanhas e projetos anteriores sobre acessibilidade aos
pedestres em Natal? O que apontaram?
4. Existe alguma estatística sobre o número de denúncias feitas por moradores da cidade ou
autuações da prefeitura em relação à construção ou à manutenção de calçadas irregulares?
5. Existe algum estudo ou números estatísticos que relacionem o número de denúncias recebidas
pela prefeitura sobre esse tipo de irregularidade e a quantidade de casos solucionados?
6. Em sua opinião, quem é responsável pela atual situação das calçadas? Por quê?
Objetivo: Obter a visão de especialistas sobre o assunto e perceber o papel da administração pública
na construção e manutenção do espaço pesquisado.
Questões abertas para administração de grandes empresas localizadas nas imediações do
bairro: (Shopping Midway Mall, Supermercado Nordestão, UnP, etc.)
1. Como foi planejado o passeio público desse estabelecimento?
2. Quais os objetivos?
3. Qual a maior dificuldade para manter esse passeio público de acordo com o que foi planejado?
4. Em sua opinião, quem é responsável pela atual situação das calçadas? Por quê?
Objetivo: Obter algumas noções sobre o comportamento dos grandes empreendimentos, da iniciativa
privada, na construção e manutenção do espaço pesquisado.
128
ANEXO
ANEXO 01
INSTRUMENTOS DO ORDENAMENTO URBANO DE NATAL (PARCIAL)
LEI Nº 4.090, DE 03 DE JULHO DE 1992.
Dispõe sobre a eliminação de barreiras arquitetônicas para portadores de deficiência
nos locais de fluxo de pedestres e edifícios do uso público e dá outras providencias.
LEI COMPLEMENTAR Nº 055, DE 27 DE JANEIRO DE 2004.
Institui o Código de Obras e Edificações do Município de Natal e dá outras
providências.
TÍTULO III
NORMAS ESPECÍFICAS DAS EDIFICAÇÕES
Capítulo I
DO FECHAMENTO DOS TERRENOS
Art. 105 - Compete ao proprietário do imóvel conservar cercas, muros e calçadas
existentes.
Capítulo II
DOS ACESSOS ÀS EDIFICAÇÕES, DOS ESTACIONAMENTOS E DAS CALÇADAS
Art. 126 -. Toda calçada deve possuir faixa de, no mínimo, um metro e vinte
centímetros (1,20m) de largura, para a circulação de pedestres – passeio – com piso
contínuo sem ressaltes ou depressões, antiderrapante, tátil, indicando limites e
barreiras físicas.
Art. 127 - É vedada a implantação ou permanência sobre o passeio de qualquer
obstáculo que possa interferir no livre trânsito de pedestres.
Art. 128 - Todo mobiliário urbano edificado em calçada e local de uso coletivo deve
atender às exigências contidas nas NBR´s específicas, quanto ao seu uso,
instalação e sinalização.
Art. 129 - Nas áreas em que houver descontinuidade entre a calçada e o limite do
lote, principalmente quando se tratar de serviços com tráfego de veículos, é
obrigatório que se estabeleça uma faixa com tratamento diferenciado, de modo a
permitir a sua fácil identificação às pessoas portadoras de deficiência visual.
Art.130 - A execução das calçadas deve obedecer às seguintes exigências:
I – largura mínima igual a dois metros e cinqüenta centímetros (2,50 m);
II – declividade longitudinal paralela ao grade do logradouro lindeiro ao lote, vedada
a mudança brusca de nível ou degrau;
III – declividade transversal, com a variação de um por cento (1%) a três por cento
(3%),em direção ao meio-fio.
Art. 132 - O proprietário da obra em terreno de esquina, ou em terrenos indicados
pelo município, fica obrigado a executar a construção de rampas de transição entre
o leito carroçável e o passeio em todas as vias que margeiam sua utilização,
conforme as NBR´s específicas, sem nenhum ônus para o município.
Art. 133 - Fica vedada a construção de degraus nas calçadas cuja declividade seja
inferior a quatorze por cento (14%).
Parágrafo único. Para execução de calçadas com declividade superior a quatorze
por cento (14%) é necessária a análise por parte do órgão municipal de
licenciamento e controle com a finalidade de se adotar soluções possíveis para cada
caso.
Art. 134 - Nas vias coletoras e nas vias locais é permitida, junto ao meio-fio, a
execução de faixa gramada nas calçadas, desde que a largura da faixa pavimentada
nunca seja inferior a um metro e vinte centímetros (1,20m) e que a faixa gramada
não seja utilizada para a construção de jardineira ou canteiro.
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