TURISTIFICAÇÃO DE “ENTRE-LUGAR” EM LARANJEIRAS-SE. COMUNICAÇÃO,
CULTURA E ECONOMIA EM CIDADES HISTÓRICAS.
Janaina Cardoso de MELLO¹*, Lillian Maria de Mesquita ALEXANDRE².
Universidade Federal de Sergipe/Departamento de Museologia, Programa de Pós-graduação Profissional em História – ProfHistória/UFS – São
Cristóvão-SE; *[email protected]; 2Universidade Federal de Sergipe/Departamento de Turismo, Programa de Pós-graduação em
Geografia – PPGEO/UFS – São Cristóvão-SE.
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INTRODUÇÃO
Laranjeiras, município sergipano distante 18 Km da capital Sergipe, possui seu conjunto
arquitetônico tombado como patrimônio cultural pelo governo do Estado e pelo Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Por seu casario de tradição portuguesa do século XIX e
ruas de pedras pé-de-moleque construídas pelo trabalho escravo africano, perpassam grupos de
folguedos que mantém vivas tradições imateriais. Possuindo elementos econômicamente atrativos
para o fomento ao Turismo Cultural, a cidade apresenta um paradoxo: vive num “entre-lugar”
(Bhabha, 1998) onde a “Turistificação” é ainda um conceito permeado por uma frágil aplicação,
embora as Conferências Municipais de Cultura no local tenham apontado essa potencialidade.
Questiona-se os papéis dos diversos agentes envolvidos nesse processo: o poder público
municipal/estadual/federal e a sociedade civil. Em que medida a revitalização do Quarteirão dos
Trapiches – organizado para uso funcional e consumo estético – não acompanhou um processo de
Economia da Cultura viável e eficaz? Quais ganhos, perdas e negociações seriam necessários para o
desenvolvimento efetivo de uma atividade turística-cultural em Laranjeiras?
Sobre o arcabouço teórico da pesquisa parte-se da definição de “Turismo” como uma tividade
baseada em três fundamentos: tempo livre, rendimento, condições e sanções locais para sua fruição
(Assunção, 2012, p.XIII). Ainda o planejamento turístico pressupõem a oferta turística do Núcleo
Receptor (atrativos, equipamentos e infra-estrutura de apoio), bem como a comunidade local que
interfere diretamente na atividade turística, sendo ainda a principal impactada pelas consequentes
alterações socioeconômicas e ambientais (Braga, 2007, p.5-6). Já a acepção mais comum do termo
“Turismo Cultural” é apreendida como aquela atividade “que tem como objetivo conhecer os bens
materiais e imateriais produzidos pelo homem” (Barretto, 2010, p.22).
Tem-se portanto como objetivo avaliar as condições de conservação ambiental,
acessibilidade, circulação interna, serviços de alimentação, hospedagem e atrativos turísticos,
norteadas pela ideia de “escala de competitividade potencial” para compreender tanto a capacidade
atrativa de Laranjeiras-SE, quanto suas limitações de atração e uso.
MATERIAL E MÉTODOS
A “Turistificação” compreende a transformação da paisagem urbana em espaço de lazer e
recreação para residentes de outras cidades, atraídos pela singularidade arquitetônica e das tradições
populares (Portuguez, 2004, p.10). Vários processos são necessários para a concretização da
“turistificação”: 1. Existência de um contingente de visitantes de outros lugares para usufruir dos
recursos sócioespaciais; 2. A demanda de viagens para o núcleo receptor determina a frequencia
preferencial em pontos e atrativos turísticos; 3. Equipamentos de serviços especializados para uso
dos visitantes; 4. Uso de equipamento urbano pelos visitantes, mesmo ocasionalmente, interferindo
no ritmo da vida dos habitantes; 5. Substituição do comércio tradicional pelo comércio voltado para
o turismo; 6. Comércio informal também afetado pelas demandas turísticas; 7. Alteração na
estrutura urbana residencial voltando-se para visitantes (Portuguez, 2004, p.11-13).
O trabalho resulta de visitas-técnicas em Laranjeiras, coleta de dados estatísticos e
cartográficos e listagem de tombamentos na Secretaria de Cultura e de Turismo da Prefeitura
Municipal de Laranjeiras, Plano Municipal decenal de Cultura de Laranjeiras, entrevistas com
moradores de Laranjeiras que auxiliaram nas duas etapas metodológicas: 1. Caracterização Geral de
Laranjeiras no que diz respeito à escala de competitividade potencial; 2. Identificação da
Refuncionalização Urbana e do “entre-lugar” no processo de Turistificação de Laranjeiras.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
No que tange à primeira etapa do trabalho – a Caracterização Geral de Laranjeiras no que
diz respeito à escala de competitividade potencial – cidade de Laranjeiras localiza-se entre os
municípios da meia região do Cotinguiba, compondo seus limites geográficos com os municípios de
Riachuelo (Norte), Nossa Senhora do Socorro (Sul), Maruim e Santo Amaro das Brotas (Leste) e
com Areia Branca (Oeste). O padrão de ocupação do solo apresenta uma vila organizando-se junto
ao curso de um rio (período colonial) e linha férrea (já no século XIX). Assim, o rio Cotinguiba e as
fazendas de açúcar da região interligam-se ao eixo urbano cujo centro encontrava-se no antigo
Trapiche (alfândega) que servia “como porto secundário de convergência da produção agrícola
destinada aos grandes centros exportadores como Salvador e Pernambuco” (Santos, 2006, p.12). Na
atualidade o rio Cotinguiba apresenta-se poluído e assoreado. O crescimento da cidade apropriou-se
das encostas onde foram erguidas igrejas e moradias. As ruas irregulares e tortuosas buscaram
adequar-se ao relevo local. É possível perceber processos de erosão em algumas construções. Há
presença de terrenos baldios e edificações em ruínas. Um problema relativo ao conforto ambiental
ocorre com a regularidade é a incidência de carros de som, de cunho publicitário, com elevados
decibéis no centro histórico. A demografia do município totalizava 30.124 habitantes (IBGE, 2010).
A rua Samuel Oliveira – rua do Quarteirão dos Trapiches – concentra a maior poluição sonóra, além
do tráfego, de atividades comerciais e da própria universidade federal que nela estão instaladas.
Houve uma redução no fluxo de trânsito, impedindo a passagem de veículos pesados, mas mesmo
assim a intensidade de carros e motocicletas é alta. A estrutura turística da cidade é amplamente
deficitária, inexistindo hotéis que comportem um número razoável de visitantes (há somente uma
pousada com quatro quartos), o transporte é feito por viação intermunicipal (Coopertalse), táxis de
lotação ou mototaxistas. Os restaurantes não conseguem atender a demandas da universidade
federal, das fábricas da região e ainda dos turistas em momentos de festejos locais (Encontro
Cultural de Laranjeiras, dentre outros). Houve um significativo avanço com a criação do Bureaux
de Informações Turísticas e o Centro de Artesanato, localizados próximos à rodoviária
intermunicipal, mas há ausência de funcionários bilíngues e roteiros turísticos urbanos capazes de
promover a autonomia dos visitantes. A sinalização turística é recente e ineficiente. Os guias
turísticos atuam somente com agendamento prévio.
Igrejas
09
Museus
04
Tabela 1: Atrativos culturais de Laranjeiras
Centros de
Ruínas
Restaurantes
Artesanato
Históricas
01
03
05
Pousadas &
Hotéis
01
A segunda etapa desse trabalho – Identificação da Refuncionalização Urbana e do “entrelugar” no processo de Turistificação de Laranjeiras – institui-se à partir do momento em que se
compreende que “os lugares turísticos apresentam certo número de características naturais e sociais
que compõem seus aspectos visuais, perceptíveis tanto pelos sentidos físicos, quanto pela abstração
humana. São as formas espaciais, construídas ao longo de períodos históricos. As relações sociais,
por sua vez, imprimem funções para cada forma da paisagem” (Portuguez, 2004, p.17).
O Quarteirão dos Trapiches abriga na maior parte de seus prédios a Universidade Federal de
Sergipe (atendendo inicialmente à cinco cursos: Arqueologia, Arquitetura, Dança, Museologia e
Teatro). Essa forma acabou por determinar grande parte da funcionalidade dos serviços na cidade,
deixando em segundo-plano o potencial turístico. Assim, ao invés de hotéis ou pousadas, adotaram-
se os aluguéis de residências para repúblicas de estudantes universitários, sendo os restaurantes e
lanchonetes locais fomentados para esse mesmo público, com um cardápio rotineiro, sem
valorização da gastronomia tradicional sergipana que atrairia os visitantes. Em 2014, quando um
sério problema de segurança pública afetou a vida de alunos e professores da UFS, as repúblicas
foram transferidas para Aracaju, resultando em perdas de rendas substanciais para os locatários,
residentes em Laranjeiras.
A ausência de equipamentos turísticos de qualidade, direcionados aos turistas, faz com que
estes permaneçam pouco tempo na cidade, preferindo alojar-se e alimentar-se onde há maior
estrutura: em Aracaju.
Embora Laranjeiras possua um rico cenário cultural (Lambe sujo e caboclinhos, carnaval da
Micarême, cortejo dos grupos folclóricos, comunidade quilombola da Mussuca) ressente-se ainda
de uma atuação forte no campo da Economia voltada para a sustentabilidade regular através de seus
aspectos culturais. A articulação cultura/comércio é recente na Economia da Cultura, vista como: o
aprendizado e o instrumental da lógica e das relações econômicas – da visão de fluxos e trocas; das
relações entre criação, produção, distribuição e demanda; das diferenças entre valor e preço; do
reconhecimento do capital humano; dos mecanismos mais variados de incentivos, subsídios,
fomento, intervenção e regulação; e de muito mais – em favor da política pública não só de cultura,
como de desenvolvimento (Reis, 2009, p. 25).
CONCLUSÃO
Laranjeiras demonstra potencial atrativo para os segmento do turismo cultural com maior
qualidade de serviços, pois o município congrega edificações e eventos de cunho cultural e religioso
que delimitam múltiplas identidades. Laranjeiras possui ainda o maior acervo de cavernas
registradas junto à Sociedade Brasileira de Espeleologia (SBE). Todavia, o envolvimento da
comunidade local no processo de valorização, preservação e difusão do patrimônio cultural e
histórico ainda é um processo tenso com as instituições oficiais (prefeitura, governo do estado,
IPHAN e UFS). A população de Laranjeiras valoriza sua história e suas tradições, mas não tem
recebido o aporte necessário (linhas de crédito, oficinas do Sebrae) para ser protagonista no
desenvolvimento de serviços imersos no bojo da Economia da Cultura, deixando de cumprir assim
o Plano Municipal decenal de Cultura elaborado de forma coletiva entre sociedade civil e agentes
institucionais em 2013. Isso coloca Laranjeiras no “entre-lugar” (algo que pode vir a ser, mas não
consegue sê-lo) no segmento da Turistificação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ASSUNÇÃO, P. História do turismo no Brasil. Barueri/SP: Manole, 2012.
BARRETTO, M. Manual de Iniciação ao Estudo do Turismo. Campinas/SP: Papirus, 2010.
BHABHA, H.K. O local da cultura. Belo Horizonte: ED. UFMG, 1998.
BRAGA, D. C. Planejamento Turístico. Teoria e Prática. Rio de Janeiro: Elservier, 2007.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Censo Populacional –
Laranjeiras, 2010.
PORTUGUEZ, A. P. Turismo, Planejamento Socioespacial e Patrimônio Histórico-Cultural. In:
PORTUGUEZ, A. P. (Org.) Turismo, Memória e Patrimônio Cultural. São Paulo: Roca,
2004, p.3-31.
REIS, A. C. F.; MARCO, K. (orgs.) Economia da Cultura. Idéias e vivências. Rio de Janeiro:
Publit, 2009.
SANTOS, G. N. Turismo e cultura popular: Danças e folguedos de Laranjeiras como atrativos
diferenciais do turismo em Sergipe. 203f. 2006. Dissertação (Mestrado em Cultura e Turismo) –
Departamento de Economia, Universidade Estadual de Santa Cruz, Ilhéus, Bahia.
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“entre-lugar” em laranjeiras-se. comunicação, cultura e