Texto: Ferrarezi Ilustrações: Dodô Apresentação: Cristiane Carvalho icionário em ducação “Feliz o homem que encontra forças para rir de si mesmo e o faz de coração aberto, pois, por esse riso, poderá, talvez, alcançar purificação.” presentação: O enfrentam Dicionário uma sem série de Educação problemas lança no um seu desafio dia-a-dia aos em docentes, sala de que, aula. como Este sabemos, desafio, entre outras coisas, é encarar o ensino com uma pitada de humor. O livro foi montado a partir Ferrarezi publicou no portal de recepção foi boa que vários incentivo. tão Esta é uma da cultura pequena Artefato leitores prova reunião de Cultural, interagiram de que verbetes a com sobre durante três sugestões, combinação educação que meses. elogios E e humor/internet a muito pode dar certo para encarar coisas sérias e uma demonstração de como utilizar essas ferramentas. A partir Dicionário em mas frisar para da aceitação veículo dos impresso, que, no dias internautas, não de só para hoje, pensou-se alcançar existem na possibilidade um público ferramentas de maior importantes transformar e o diferenciado, que ajudam na transformação social como meios de Educação. Dentre charge. Essas absorção do essas duas ferramentas, linguagens, conhecimento e além da combinadas proporcionam internet na já arte alegria citada, de a estão Ferrarezi um o e cotidiano humor escrito Dodô, escolar auxiliam e a na historicamente maltratado e triste. Sendo lançada entre em alunos assim, solo e fértil, esperamos sem professores e que dúvida, gerar o Dicionário para uma fazer corrente sem florescer de Educação um boas seja novo notícias a primeira modelo no semente de convivência âmbito educacional do Brasil. Cristiane Carvalho ma nota do autor Dizem máscaras. É por a aí que os mundialmente gregos conhecida foram os “comédia inventores grega”. da Tenho comédia minhas no teatro dúvidas, mas de pode ser... Os chineses faziam algo parecido bem antes, quando a Grécia ainda não era Grécia, mas um monte não exige máscaras de vilas esparsas, mas isso teste de pensão. Então, deixa o moda grega (será que à instrumento eficaz para fazer povo si importa DNA tinha o não pra lá... uvas-passas, rir de si muito De como mesmo. aqui. toda o Pra Afinal, forma, arroz quê? à essa a comédia grega?) Pra criança fazer de era um pensar! Pra fazer mudar! A da vontade orgulho doeu no no orgulho; rir de esconder os problemas que se O que b. meio b. de rua fica a que em isso. da começa acho disposição processo fazer corpo; isso, Bocage de de consegue tombaço Por capacidade tem, de ser essas “purificação” já e os si capaz superar também sujeito bons tenta de rir si só, tem. Só uma escorrega na casca apenas sem das iniciou. Os de gregos todos está falhas de ser, sabiam os de fantástico. Denota pessoa descolada de é creio, e de seu leva um chora, se xinga, se doeu no a superar forma uma Gil e de a. e uma libertação reações: disposto disso. tempos banana três levantar se próprias além algo uma pressa, falhas, humoristas por desesperadamente mesmo mesmas se é, geralmente, bravo, rir mesmo prova Vicente todas de as as dores. demonstrar de que também nações, o sabia, mesmo que intuitivamente, de uma ou de outra buscaram essa purificação. O si Dicionário mesmo! Foi sem ilustrado Educação por um foi escrito caricaturista por um crítico professor. e É preocupado um com riso as enorme de coisas da escola, até porque foi aluno nessa escola. É um riso enorme do outro, sobre a Educação, mas também um riso enorme de si mesmo! Isso foi assim construído justamente fazer o educador e o educando rirem de e pensarem em suas falhas e problemas. 4 pra Para desnudador cada gota alcançar e cruel. de tinta traduz na tentativa menos em algumas isso, Mas, o texto sempre estão aí de fazer partes por do é, às sincero. uma vezes, E nunca razão com que texto: “Isso que o discreto; desprezível. precisa educador aqui tem às ser e a o vezes, Cada minha cara!”. ele é de humor e essa razão se tom descoberta. educando porém, E possam dizer, Pobres do pelo educador e do educando que terminarem o livro dizendo: “Nada disso me diz respeito!”. Espero longo das acrescentar dessa que esse objetivo seja internéticas dos dos verbetes aqui o do publicações que forma, muitos inéditos para leitor alcançado. textos, creio contidos Portal. Considerando Da não que os isso foram mesma e-mails acontece. publicados forma, na que recebi Aliás, é Internet nenhuma das ao bom e são, ilustrações deu as caras por lá. Tudo é exclusivo do livro. Bem... e – Afinal, quem pra depois sabe que – olhar dessa algum o prosa choro. nosso toda, desejo Mas, retrato se a todos sem nenhuma não for pra uma leitura raiva ver e onde cheia de boas risadas impropérios, por favor... temos que melhorar? Se for só pra passar raiva, melhor pegar ele e esconder no fundo da gaveta... Ferrarezi 5 ma nota do ilustrador 6 oto da nossa Formatura (a gente conseguiu!) 7 A lfabetização – 1. Segundo o Prof. Cristovam Buarque, o princípio do processo de alforria de um brasileiro (que só ganha mesmo sua carta de alforria quando recebe o diploma de nível superior, mas que nunca será alforriado, nem parcialmente, se não souber ler e escrever). 2. “Má alfabetização” - Experiência traumática e danosa pela qual passam alguns de nossos alunos e que define uma vida escolar inteira de insucesso e infelicidade. 3. Em alguns sistemas educacionais, castigo aplicado ao professor que está ingressando na carreira do magistério. Ex. pessoal (foi assim que eu comecei no magistério...): “É novato? Então vai pra classe de alfabetização...”. 3. Uma coisa que todo novo governo diz que vai oferecer a todos os brasileiros, mas que nunca oferece. 4. Parte tão importante do processo educacional que deveria ser conduzido pelos melhores e mais qualificados professores de um sistema educacional, os quais precisariam de concurso público específico para alfabetizador e deveriam ganhar os melhores salários oferecidos a professores nesse sistema. A luno – 1. O sujeito da própria educação. O sujeito que se não for sujeito da própria educação deixará de ser aluno e não passará de uma marionete. 2. Sujeito altamente privilegiado por que tem acesso à educação, embora muitas vezes não reconheça esse privilégio. 3. Aquele que aprende. Nesse caso, está também incluído o professor, que sempre é aluno no processo educacional. A mor – 1. Palavrinha muito difícil de definir... 2. Dizem que é o princípio de todo processo educacional... Mas, não deveria ser também o princípio de todos os outros tipos de relacionamento humano?... 3. Já ouvi dizer que é a principal característica de um professor... Sei não... 4. Palavrinha muito desgastada, confundida com “sexo” (Ex.: “O professor João anda fazendo amor com as alunas do 2º ano...”), com “dedicação” (Ex.: Isso é que é amar a profissão: o João é sempre o primeiro a chegar e o último a sair da escola.”), com “esforço pessoal” (Ex.: “O João sempre tenta oferecer o melhor de si aos alunos.”), com “egocentrismo” (Ex.: “Eu me amo demais pra deixar um aluno falar alto comigo.”) e até com “preguiça” (Ex.: “O João ama a 4ª série: vamos deixar ele lá esse ano de novo, porque ele já tem pronto todo material do ano...”), entre muitas 8 outras conotações possíveis... fica até difícil saber qual dessas se encaixa melhor na Educação... ou se nenhuma é adequada. 5. Um sentimento que todo mundo sabe que é importante na Educação, mas que, ao que parece, ninguém sabe muito bem como. A nálise – 1. Análise é assim como que uma tara da Ciência, que a escola adota sem contestação. É análise pra todo lado: análise morfológica, análise sintática, análise química, análise filosófica, análise histórica, análise literária, análise de fezes, análise da análise... tanta análise que eu acho que é por isso que quase todo cientista e quase todo mundo na escola acaba tendo que fazer análise em algum psic...analista! 2. Tentativa quase sempre malograda de descobrir como uma coisa é de verdade. Então, como a gente não descobre de jeito nenhum como as coisas são, inventa uma teoria que serve de base para uma nova análise e daí o objeto da análise fica exatamente do tamanho e da forma que a gente imaginou que ele deveria ser analisado: está pronta a análise! Nesse sentido, a análise é quase sempre um ato de criação. A postila – 1. Na maioria das escolas privadas de classe média e alta, o mesmo que livro didático, só que muito mais caras, embora igualmente ruins. 2. Ainda nessas escolas, argumento comumente usado pelo vendedor de matrículas para convencer os pais da qualidade do ensino oferecido. 3. Na maioria das escolas públicas que não receberam livros didáticos ou que não têm biblioteca, calhamaço de fotocópias ilegais de pedaços de livros que compõem um pretenso “material didático”. 4. Muuuuuuuito raramente, algo que o próprio professor escreve para compartilhar com seus alunos como referência para discussões escolares. A A prender – 1. Ato de transformar-se. Tudo que se aprende transforma o homem. Tudo o que se aprende, mesmo sendo mal é bom, desde que um dia se consiga reconhecer o que é mal e o que é bom. O problema não está no que se aprende, mas na consciência do que se aprende. provação – 1. Para o aluno que conseguiu se adaptar ao jogo da escola, aprovação é aquilo que ele já sabia desde o começo que iria acontecer no final do ano. 2. Para o aluno que sempre se dá mal e que, por isso, tinha certeza que ia reprovar mais uma vez, aprovação é quase como um orgasmo. 3. Para aqueles que adotam o discurso politicamente correto da escola, aprovação é apenas “o resultado do estudo e da dedicação” (ah! se fosse tão fácil assim!!). 4. Para os pais do aprovado, aprovação é argumento para mostrar aos vizinhos como o filho é inteligente. 5. Para o aluno que comprou o trabalho e colou na prova, aprovação é a confirmação incontestável de que ele é mais esperto que o professor. 6. Para quem entende um pouco de Educação, aprovação não é nada disso... mas, pensando bem, um pouco disso tudo ao mesmo tempo... De qualquer forma, sem dúvida alguma, é algo que, nos moldes em que subsiste hoje - e juntamente com a reprovação - deveria ser extirpado do processo educacional de uma vez por todas. 9 A ula – 1. Para grande parte dos alunos, sessão de tortura que dura entre 40 e 60 minutos, em média, dependendo do estabelecimento, e em que eles têm que executar três tarefas essenciais: a. responder “presente”; b. manter-se calados (e se possível acordados); c. responder a eventuais perguntas de forma ridícula ou não-ridícula, dependendo do papel social exercido em sala pelo aluno argüido (“burro” ou “inteligente”, respectivamente). 2. “dar aula” - para muitos professores, a única obrigação que lhes compete na escola. Observe-se que o verbo “dar” utilizado em detrimento de verbos como “ministrar”, “desenvolver”, “conduzir” ou “coordenar” provavelmente decorre da sensação de gratuidade advinda dos baixos salários recebidos pelos professores. 3. Unidade comumente utilizada para medir a eficiência do trabalho de um professor. Um professor será tanto melhor quanto mais aulas “der” na escola, permitindo a integralização da “carga horária” das matérias, independentemente de qualquer parâmetro de qualidade. 4. Em muitos casos, entidade abstrata que aparece exclusivamente nos registros e diários de classe, sem que efetivamente tenha ocorrido, no âmbito da realidade, nada que se relacione a esse nome. 5. Em raros casos, experiência profunda, marcante e plena de significado em que professor e aluno encontram respostas para as questões que o mundo coloca diante deles. Nesse caso, falamos de aula bem-sucedida. Aula A valiação – 1. Instrumento de coerção por meio do qual grande parte de professores mantém a sala calada. Ex.: “Se vocês não ficarem quietos, vou aplicar um teste agora!”. 2. Forma de intimidação comumente utilizada nas escolas para pretensamente atestar a superioridade intelectual de certos professores. Neste caso, um tipo de instrumento de auto-afirmação para o professor que não se impõe pelo caráter e pela competência acadêmica. 3. Para a maioria dos alunos, o mesmo que pesadelo. 4. Espécie de agente etiológico extremamente agressivo capaz de causar, em alguns alunos, amnésia temporária, desarranjo intestinal, crises de choro, taquicardia, sensação aguda ou crônica de burrice, crises de baixa auto-estima e até desmaios, entre outros males. Para se livrar desses 10 sintomas, é normal que os alunos recorram a “remédios” altamente tóxicos como a cola, a compra de trabalhos “em pessoa” ou pela Internet e o suborno a professores e a outros colegas. 5. Atividade em que, se o aluno não se der bem, não ganha bicicleta, não viaja, não ganha computador, não ganha etc., mas corre o risco de ficar de castigo, apanhar, ser humilhado diante da família e dos amigos, entre outras coisas desagradáveis, embora comuns. 6. Mais raramente, experiência educacional significativa que permite ao aluno e ao professor progredir construtivamente no processo de construção e compartilhamento de saberes. 11 B agunça – 1. Sintoma que se manifesta freqüentemente nos alunos que são obrigados a assistir aulas chatas ou participar de experiências escolares não-significativas. 2. Mais raramente, demonstração de falta de educação mesmo. 3. Ainda mais raramente, reflexo de distúrbios sócio-emocionais ou biológicos. Nesse caso, o termo “bagunça” é impróprio, embora comumente aplicado. B iblioteca – 1. Portal mágico da imaginação e do saber, capaz de conduzir uma pessoa a qualquer lugar do universo e de si mesma por meio de um simples passeio entre os corredores de estantes, pela escolha de um livro (objeto mágico de inestimável valor) e pelo simples folhear de páginas, mesmo que amareladas. 2. Na prática? Ah... na prática... Bem... na maioria das escolas públicas brasileiras, o que se chama de biblioteca é uma sala de aula rudemente adaptada, que funciona como depósito de livros didáticos não distribuídos ou devolvidos e de maquetes velhas feitas por alunos, em que se coloca um professor em final de carreira ou um zelador com problemas de coluna pra tomar conta, e em que os alunos não acham quase nada que valha a pena se ler. Nesses termos, a biblioteca da escola é tudo, menos uma biblioteca. É, inclusive, uma prova incontestável de que Educação, neste país, ainda é uma coisa que não foi elevada ao patamar de prioridade e nunca foi assumida oficialmente como artigo de necessidade básica. B ico – 1. Atividades de variados cunhos a que a maioria dos professores brasileiros tem que recorrer caso queira sobreviver de forma minimamente digna. 12 B iologia – 1. Segundo a filha da minha vizinha (que também é minha vizinha...): “ficar o tempo todo falando de bactérias sem entender nada”. 2. Ainda segundo a mesma filha da vizinha: “tentativa de imaginar de que tamanho é uma bactéria”. 3. Poderia ser uma ótima oportunidade escolar para compreender um pouco sobre a vida neste planeta, sua importância e a necessidade de sua preservação, bem como sobre as condições que a mantém, mas costuma mesmo ser uma imensa falação sobre bactérias... sem entender nada. 4. Segundo um professor de Biologia amigo meu: O “estudo da vida”, mas como, segundo a biologia darwinista que ele segue, a vida começou pelas bactérias... e lá vêm as bactérias de novo... B oletim – 1. Instrumento legal de natureza meramente burocrática, absolutamente desnecessário, que se destina a rotular a mercadoria chamada “aluno”, como forma de atestar a qualidade do processo educacional, sob a desculpa da necessidade de prestar informações detalhadas sobre esse aluno em uma possível transferência para outra instituição. Por isso, se o aluno tem um boletim todo azul, é porque a escola é boa e 13 o aluno aprendeu; se o aluno tem o boletim todo vermelho, boa que o aluno – burro – não consegue acompanhar. 14 é porque a escola é tão C antina – 1. Na maioria das escolas públicas brasileiras, oportunidade de negócio em que a escola deposita sua esperança de arrumar algum dinheiro para, ao menos, trocar as lâmpadas queimadas das salas. 2. Na maioria das boas escolas privadas brasileiras, boa oportunidade de negócio pra melhorar os negócios. 3. Para uns poucos alunos de escolas públicas que têm algum pra gastar com merenda, espaço alternativo que proporciona uma alternativa não saudável – mas gostosa - à pretensamente saudável - mas terrível - merenda escolar. C aráter – 1. Está para o professor como o alicerce para a casa. 2. Está para o professor como a essência está para o mais precioso perfume. 3. Está para o professor como o tempero está para a comida. 4. Está para o professor como a âncora está para o navio. 5. O caráter do professor está para os alunos como o farol junto aos rochedos está para o barco que navega em águas perigosas. C arteira escolar – 1. Tradicional instrumento de tortura minuciosamente planejado para causar dores, desconforto e irritação, a curto prazo, e, a longo prazo, problemas de postura, problemas ósseos e nevrálgicos. É aplicado nos alunos em longas sessões diárias de, em média, 4 horas. Na maioria das escolas, substitui, a título de economia de espaço e dinheiro, as eficientes “mesa e cadeira” independentes. C omputador – 1. Aparelhinho metido e terrivelmente sentimental (só faz o que ele quer, quando ele quer e do jeito que ele quer, deixando quem depende dele, quase sempre, doido...), que alguns profetas da modernidade pensaram que substituiria o professor em poucos anos. Depois, descobriram que tinham que colocar um professor on line do outro lado... 2. Símbolo maior da pós-modernidade e da globalização, pretende-se que simbolize isso nas escolas também e assuma papel central na pós-modernidade educacional. Mas, não tem dado muito certo essa tal de substituição... esses alunos cabeçudos sempre querem ter um HUMANO junto deles, mesmo que seja um desses 15 humanos com hardware ultrapassado e softwares chamar de “professor”. Por que será, né?? não atualizados que os meninos costumam C onfiança – 1. Para o aluno, é a certeza de que o professor é o tipo de sujeito que vale a pena. 2. Para o professor, é a certeza de que o próprio trabalho é o tipo de trabalho que vale a pena. 3. Para ambos, é a certeza de que a Educação é o tipo de coisa que mais vale a pena. C onhecimento – 1. É quando a informação passa a tomar parte da gente. 2. Também, pode ser quando a gente mesmo cria a informação que, por isso mesmo, faz parte da gente. 3. Ver sabedoria. C onteúdo – 1. O mesmo que “universo”, só que ministrado com o não dar indigestão. 2. Tudo-e-qualquer-coisa que se possa aprender. C ooperação – 1. Atitude que determina o sucesso do processo educacional. 2. O mesmo que “boa vontade”, como no verso bíblico “... e paz na Terra aos homens de boa vontade”. C conta-gotas, para oragem – 1. Segundo o para-muitos-saudoso e ex-um-monte-de-coisa-do-Brasil Ulisses Guimarães, coragem é a mais importante de todas as virtudes. O raciocínio é simples: não adianta alguém ser um poço de virtudes, se não tem coragem para botar essas virtudes todas pra funcionar. Como o mundo só aprecia as virtudes da garganta pra fora, mas nos recônditos do coração as virtudes alheias incomodam os pouco virtuosos (por acaso, a maioria absoluta da história), é preciso ter coragem pra exercer a virtude na vida real. 2. Nesses termos, quanto melhor for um professor, mais corajoso precisará ser pra que seus alunos possam usufruir de tudo o que ele tem a oferecer. 3. Ainda no mesmo raciocínio, condição absolutamente necessária para a transformação de nossa Educação em algo que mereça esse nome. 16 C orrupção – 1. Vírus altamente destrutivo (e ainda sem cura conhecida?... Afinal, se conhecem uma cura, por que não a aplicam??) que contamina grande parte da comunidade escolar, desde o aluno que cola na prova até o professor que usa sua “autoridade acadêmica” (entenda-se: “possibilidade de reprovar os alunos”) pra transar com as adolescentes bonitas da classe, desde a merendeira que leva pra casa os ingredientes da merenda, até o secretário que some com uma resma de papel ou o diretor que recebe propina pra garantir vagas a certos alunos ou liberar diplomas e certificados falsos, e por aí vai. Todos esses “pequenos” atos de corrupção na escola dão sustentação a uma cultura de corrupção no país, cuja expressão máxima aparece quase que diariamente nos telejornais nacionais com as notícias sobre o comportamento de certos políticos e servidores públicos, em todas as instâncias de governo – e paramos aí porque os telejornais não divulgam quanto cada notícia que eles veiculam custou nem a quem custou... 2. O mesmo que burrice auto-destrutiva crônica, também conhecida como “mal dos espertalhões.” C ultura – 1. Uma coisa que todo mundo tem, nem todo mundo sabe que tem, e que muitas pessoas acreditam que a de alguns vale mais do que a de outros, o que, certamente, não é uma verdade absoluta. Ex.: Certo professor universitário, em missão de pesquisa pela Amazônia, estava sendo levado, por um jovem caboclo, de uma margem para outra de um rio imenso, em uma rude canoa. A certa altura, o professor, 17 convencido da necessidade de mudar a visão de mundo do rapaz, inicia o seguinte diálogo: - Você conhece o Museu do Louvre? - Não sinhô... – Pois perdeu metade de sua vida... (algumas remadas adiante...) - Você já leu alguma obra de Dostoievsky ou Machado de Assis? – Não sinhô... sei lê não sinhô... – Pois perdeu metade de sua vida... (mais algumas remadas adiante...) – Você já ouviu – pelo menos! – falar da Semana de Arte Moderna? – Não sinhô... nunca não sinhô... – Pois perdeu metade de sua vida... (algumas remadas adiante, já bem no meio do rio) O caboclo, então, pergunta: - Moço, o sinhô sabe nadá? – Não, meu jovem, eu não sei nadar. Por quê?... – Entonce eu acho que o sinhô predeu sua vida intêêêêra, pruque a canoa tá fazeno água e vai alagá agorinha... 2. O tipo de coisa que quanto mais a gente adquire, mais se sente vazio dela, desenvolvendo em nós um sentimento profundo de humildade e pequenez, que faz muito bem a todos os homens. Observação: Alertamos o leitor, para que não se deixe enganar: existe uma pseudo-cultura, modista e formada por meia dúzia de informações-pré-fabricadas, que idiotas de plantão se põem a decorar pra ter o que dizer em rodas de bar e festinhas bobas, e que têm o efeito contrário: torna as pessoas arrogantes e enfadonhas. C urrículo – 1. Projeto em que se especifica detalhadamente o processo de construção das novas gerações. Se não presta, como o adotado hoje no Brasil, as novas gerações estarão comprometidas; se presta, as novas gerações e o planeta Terra agradecem. 2. Documento que deveria ser construído pela escola juntamente com as comunidades por ela atendidas, de forma democrática e descentralizada, adequado às necessidades específicas de cada localidade, para somente então ser aplicado na construção das novas gerações. 18 D atashow – 1. Símbolo maior da pós-modernidade escolar, que se tornou figurinha corrente nas pós-modernas aulas das melhores pós-modernas escolas e universidades do país, em que professores up to date projetam (e lêem, apontando com aquele pontinho vermelho da caneta laser) apresentações de PowerPoint que eles baixaram da Internet, enquanto a galera da classe curte um som nos seus iPod´s, troca uns torpedos pelo celular ou curte uma sleep session, já que a sala tem que ficar assim meio dark pra gente enxergar alguma coisa. 2. Aparelinho caro pra caramba, sonho de consumo de toda escola pública brasileira que, quando quebra, a escola não tem dinheiro pra consertar... Daí ser muito comum a escola perguntar aos palestrantes que convida: “- O senhor vai usar datashow, professor? Sabe o que é, a nossa escola tem um sim, mas deu um probleminha na semana passada e até agora o técnico não veio ver...” D emagogia – 1. Crime doloso bastante comum no Brasil que consiste em intentar contra a sanidade mental de outra pessoa, pretendendo “tirar seus pés do chão” e fazer com que ela acredite na exeqüibilidade de coisas que, embora atrativas, são absolutamente inexeqüíveis. Numa primeira fase, todo demagogo sabe o que está fazendo e, portanto, tem consciência de estar mentindo; numa segunda fase, quando a demagogia se torna doentia (há famosos casos nacionais, principalmente na classe política), o demagogo começa a acreditar nas próprias mentiras, o que não o exime do dolo de seu crime. 2. Num certo sentido, o mesmo que “promessa/discurso de político”, “conto da carochinha” ou “conto do vigário”. 3. Em Educação, o mesmo que “nada vai mudar, logo, estamos todos lascados e nosso país continua sem futuro.”. D icionário – 1. O primeiro portal virtual inventado pelos homens. 2. O pai do hipertexto, em que cada verbete funciona como um link para um universo próprio de conhecimento. 3. O verdadeiro pai dos inteligentes, que nunca foi pai de burro algum – e que, se adotou algum burro, foi para torná-lo inteligente. 4. O mesmo que “chaveiro de São Pedro”, abrindo aos mortais todas as portas daqui, de lá e de acolá. 19 D inheiro – 1. Artigo de primeira necessidade que não traz a felicidade, segundo dizem. Observe-se que ninguém – ninguém mesmo! - acredita nessa definição. No Brasil, essa afirmação corresponde, em credibilidade, àquela de que “nem todo político é corrupto”. 2. Elemento volátil e instável que desaparece da conta bancária do professor toda vez que ele pensa em verificar o saldo. Assim, parece que a volatilidade e a instabilidade do dinheiro estão, na verdade, telepaticamente ligadas à intenção do professor em gastá-lo. Ao que parece, a solução é o professor não pensar em dinheiro... Se não resolve o problema financeiro do professor, essa estratégia, pelo menos, diminuiria muito as greves na Educação. 3. Aquilo que o professor pensa que recebeu no final do mês a título de salário, mas que, quando ele vai conferir, o banco já seqüestrou tudo. Nesse caso, a expressão “salário de professor” equivale à expressão “orelha de freira”: todo mundo sabe que existe, mas ninguém jamais viu. 4. Forma de recompensa devida, e que deveria ser justa, a todo trabalhador. Tal recompensa demonstra, na vida da sociedade, o valor real que se dá a esse profissional. Isso fica muito claro, no Brasil, se compararmos o dinheiro destinado a jogadores de futebol, a mulheres popozudas que dançam funk na TV e a professores. D iretoria – 1. Sala misteriosa em que acontecem coisas que todo aluno quer descobrir, mas ninguém quer experimentar pessoalmente. 2. Também, sala misteriosa, com poderes místicos malévolos que transformam aquele professor que era nosso humilde amigo até ontem num sujeito arrogante, que esqueceu que é professor e que, ao invés de defender a escola e os interesses de seus pares, passa a defender intransigentemente os interesses do santo sujeito que o nomeou. 3. Em certo sentido, o mesmo que tribunal escolar sem 20 júri. 4. Ir para a Diretoria - Ameaça que não amedronta mais a maioria dos alunos. 5. Segundo uma funcionária de uma escola que conheci, local em que o Diretor ensinou para a Supervisora (ou vice-versa) as artes do Kama Sutra, a portas fechadas e a título de “reunião de planejamento institucional”. D isciplina – 1. Também chamada de “matéria”, é um pedacinho besta de conhecimento, que serve mais pra fazer o aluno achar que o conhecimento é uma coisa fragmentada e que cabe em gavetinhas do que pra facilitar o processo educacional. 2. Prova de que os pensadores do mundo têm algum distúrbio grave de personalidade: primeiro, o conhecimento era “conhecimento” e tudo era uma coisa só; depois, resolveram dividir tudo em pedacinhos bestas e surgiram as disciplinas. Aí cada um foi pro seu canto e esqueceu do resto; agora, querem juntar tudo de novo e mostrar que todo conhecimento é “conhecimento” e tudo está inter-relacionado... e surgiu a interdisciplinaridade... Vai ser indeciso assim lá na casa da vovó! Tô falando: isso é distúrbio... D D iversidade – 1. Princípio natural cuja negação determina o fracasso total do processo educacional. 2. É a principal característica que se deve enxergar quando se olha para a realidade. 3. O melhor remédio para a Síndrome dos Horizontes Estreitos. ó – 1. Tom pelo qual a música da Educação nunca pode ser executada, seja um dó maior, seja um menor, seja um médio, seja apenas um resquício de dó. 2. O pior sentimento que um ser humano pode desenvolver em relação a outro: dó humilha, impede o crescimento do outro, demonstra desrespeito da parte de quem sente para com quem recebe e, no íntimo, é apenas uma demonstração tola de orgulho. 3. Dó é uma das principais causa mortis do respeito. D outorado – 1. Curso ou grau de formação acadêmica que corresponde, no fundo, a uma autorização pública pro sujeito dizer suas próprias besteiras, sem ter que ficar repetindo as besteiras que os outros já disseram antes dele. A isso se chama de “originalidade científica”. 2. Curso ou grau de formação acadêmica que, no Brasil, ao que parece e s.m.j. (cuidado com o processo!), muito bacharel em Direito, Medicina, Odontologia e Engenharia, entre outros tantos bacharéis, acredita que tem. Daí muitos advogados, médicos, dentistas ou engenheiros fazerem questão ser chamados de “Doutor”. Ex.: Na comarca de uma das cidades em que morei, chegou uma vez um juiz que fazia tanta questão de ser chamado de doutor, que exigia o tratamento por parte da esposa! No primeiro Tribunal do Júri que ele presidiu, um advogado se dirigiu a ele: “Meretíssimo...” e ele cortou: “- Doutor Meretíssimo! O senhor deve me tratar assim, doutor Advogado!”. O advogado, acostumado com o tratamento comum, deixou escapar outro “Meretíssimo” solitário e veio a imediata reprimenda: “- É a última vez que o aviso, 21 doutor Advogado: Se não me tratar como Doutor Meretíssimo, mando prendê-lo por desacato à minha pessoa!”. Pode?? Pode! No Brasil pode! Dizem que esse mal se chama “juizite”, ou seja, “inflamação no juízo do juiz”. Outro ex.: Em outra cidade, conheci um dedetizador de casas conhecido do povo como “Doutor Barata”: Esse sim merecia o título! 22 E E ducação – 1. O pão de cada dia. 2. Processo de transformação do ser-humano-e-só em ser- humano-pleno. 3. O mínimo que uma geração deve legar à geração posterior, sob a pena de estar cometendo, se não o fizer, um crime contra a humanidade. ducação Artística – 1. A mais previsível de todas as aulas da escola: “pegue uma folha de papel e faça um desenho a sua escolha – e pinte bem bonito, viu!”. 2. Do jeito que é desenvolvida na maioria das escolas, a maior perda do preciosíssimo tempo do aluno, quando, na verdade, poderia ser uma das mais significativas e transformadoras disciplinas escolares. 3. Quando é bem desenvolvida, o mesmo que “porta mágica para o universo da estética, que abre os horizontes individuais e transforma a vida com a incombatível força do belo em todas as artes.” E uma é... ducação Básica – 1. Nível de formação escolar composto por Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio (Lei Federal nº 9394/96, Artigo 21, inciso I) com o qual o governo brasileiro se contenta como sendo suficiente para a construção de nação não-caudatária, igualitária e soberana, embora o mundo inteiro saiba que não E ducação Física – 1. Também chamada de “Física” (só fui entender a diferença no Ensino Médio!), é uma tentativa quase sempre frustrada de proporcionar saúde física aos alunos, seguindo aquela idéia de que mens sana in corpore sano. 2. Disciplina quase sempre relegada a terceiro plano nas escolas públicas: o infeliz do professor, se quiser material, tem que se virar, pedir no comércio, fazer vaquinha com os alunos. Mas, na hora das olimpíadas escolares, a direção cobra desse tal professor a vitória do time da escola... vai entender! 3. Disciplina que os alunos das escolas de classe média alta e alta não precisam fazer, porque já fazem aula de tênis, de balé e de artes marciais. E que os de escolas que atendem a classe baixa também não precisam, porque já treinam correndo da polícia, praticando balé e malabarismos nos semáforos das grandes cidades, empurrando carrinhos de papelão e sucata pelas ruas, perdendo os braços nas máquinas de 23 desfiar sisal no Norte, e puxando enxada ou é para todos!... carregando sacos de carvão em carvoarias clandestinas por todo país cortando cana nas áreas agrícolas do país. Afinal de contas: saúde E nciclopédia – 1. Conjunto de livros vermelhos (eventualmente azuis ou marrons) muito bem encadernados, que servem para enfeitar a estante da sala. Observe-se que deve haver um enorme cuidado na hora de retirar algum desses livros da estante (quando, por exemplo, o pai quer mostrar ao vizinho que está investindo no futuro dos filhos, mais exatamente, que está investindo 24 prestações de R$ 314,00) porque a capa de um livro costuma grudar na capa dos outros ao lado e, quando não vem tudo junto, se rasga aquela aba superior em que a gente enfia o dedo pra puxar o tal (geralmente o Atlas do Corpo Humano, que é ricamente ilustrado...) da estante, danificando o patrimônio enciclopédico. Aliás, esta é uma forma bastante precisa de verificar quantos livros de uma enciclopédia já foram retirados da estante: basta contar quantos estão com a aba superior rasgada. E E nsinar – 1. O mesmo que aprender, só que de uma posição muito mais privilegiada. nsino Fundamental – 1. Ensino que, pelo nome, deveria estabelecer os fundamentos da formação educacional da criança, embora todo mundo saiba que esses fundamentos são estabelecidos, na realidade, durante a educação infantil (dos 0 aos 6 anos), que é grandemente desprezada no Brasil. Mas, de qualquer forma, como primeiro contado da maioria das crianças brasileiras com a escola e como início, para essas crianças, do processo formal de alfabetização, não deixa de ser uma fase crítica em que, o que se acerta vai certo pelo resto da vida e o que se erra também tem grandes chances de ir errado até o túmulo. E nsino Médio – 1. Ensino que, se fosse bom, não seria médio: seria “ensino ótimo”! Aliás, no Brasil, quando o Ensino Médio for médio, será ótimo, porque hoje em dia ele anda péssimo, muito longe de médio. Sabe comé, né: o fundamental não fundamenta, no médio não dá pra fazer milagre... 2. Nível de ensino que, se fosse ótimo, tornaria muitas pessoas realizadas como cidadãos e como profissionais, sem a necessidade de cursar nível superior, mas que, como não é ótimo (nem médio...), acaba mesmo é frustrando os alunos e servindo como uma excelente desculpa pra proliferação de cursinhos preparatórios pro vestibular. Sabe comé, né: vamos tentar aprender na “facu” o que a gente não aprendeu no ensino péssimo...ops! médio... 24 E nsino Superior – 1. Sonho de consumo de quase todo estudante brasileiro, na maioria das vezes, destruído por uma monstruosidade chamada vestibular. 2. Deveria ser, como o nome diz, SUPERIOR! Se assim fosse, seria um nível de ensino que libertaria todo aluno de qualquer amarra mesquinha de pseudo-conhecimento ou preconceito. Nesses termos, o ensino superior seria o mesmo que “ensino libertador”. Infelizmente, em grande parte de nossas instituições públicas sucateadas e sem professores, é o mesmo que desilusão e em muitas das instituições privadas, é apenas um tipo funesto de pagou-passou meramente comercial. Só o futuro será capaz de mostrar a magnitude do erro que se comete hoje no Brasil em relação ao ensino superior. E E rudito – 1. Segundo Nietzsche, o sujeito que leu tantos livros dos tanto as idéias alheias que esqueceu como é que se pensa. erudito é um repetidor estéril. 2. Concordo com Nietzsche... outros Nesse e absorveu caso, todo scola – 1. O mesmo que hospital. No Brasil, assim como os hospitais do corpo, às vezes funciona, às vezes não serve pra nada, ou ainda ajuda a piorar a situação do paciente. Deve-se notar, porém, que, ao invés de curar malária, tuberculose e câncer, a escola deveria curar: a. Ignorância crônica e aguda; b. Síndrome dos Horizontes Estreitos; c. Síndrome da Desumanificação do Homem; d. Síndrome da Ausência de Futuro; e. Mal do Individualismo Pernicioso e; f. Mal de Ingenuidade, entre outras tantas bobices que atacam a mente humana. Mas, porém, contudo, todavia e entretanto, nem sempre isso acontece... Outro detalhe interessante sobre a escola é que, diferentemente dos hospitais do corpo, em que se pressupõe que, pelo menos, os médicos e enfermeiros estejam saudáveis, na escola, tem-se a certeza de que todos estão doentes e que, por isso, precisam construir juntos uma cura. 25 E sforço – 1. Parte essencial e insubstituível do processo educacional, por qualquer ângulo que se olhe. 2. Ao contrário do que se pensa, esforço não é sinônimo de “coisa ruim”. Ao contrário, existem coisas ótimas de se fazer que exigem muito esforço... e a gente ainda pede pra repetir. 3. Lembrando um conceito matemático: se só o esforço não garante a qualidade do processo educacional, por outro lado a falta de esforço é, quase sempre, diretamente proporcional ao tamanho da porcaria que se pratica em nome da Educação. E isso explica muita coisa que acontece por aí... E specialização – 1. Forma muito eficiente utilizada pelas instituições de nível superior para ganhar dinheiro fácil e farto (o que implica complementar a renda dos professores universitários) ao mesmo tempo em que fazem os alunos (espoliados por mensalidades elevadas) acreditarem que estão aprendendo algo realmente novo e verdadeiramente significativo, o que não é o caso. 2. Se colocado nos termos de uma metáfora da “hospitalidade”, é como oferecer arroz de tresantonte com feijão aguado pra visita, quando em casa a gente tem um maravilhoso banquete completo escondido (quem quer banquete, tem que partir pro mestrado ou pro doutorado...) E E sperança – 1. Está para o professor como “a certeza de que a próxima respiração trará ar” está para qualquer animal. Ou seja, a gente não pensa nisso: vive isso. 2. Para o aluno, o mesmo que sonho de vida. studar – 1. Privilégio sem medida e sem qualquer possibilidade de valoração que, talvez por ser tão precioso, se torna incompreensível e acaba sendo desprezado por muitos. 2. Uma coisa que a gente deseja do fundo do coração antes de entrar na escola, e que, alguns meses depois, já está odiando. 3. Espécie de castigo terrível imposto a certas crianças devidamente estragadas pela escola: “Vai estudar menino!”. 4. Profissão de quem ainda não tem profissão. E xecução (verbete fúnebre, dolorido e angustiado) – 1. Há alguns anos atrás, era apenas o ato de fazer alguma das muitas coisas que há para fazer na escola, como executar uma tarefa ou um atividade extraclasse. 2. Hoje, execução é levar, sumariamente e por razão fútil, o outro a óbito. Ex. tristíssimo: Notícia veiculada em um telejornal de alcance nacional aos 14 de agosto de 2008: “Três indivíduos armados e não identificados invadiram hoje uma escola em Porto Velho e executaram um adolescente dentro do refeitório. O motivo da execução ainda é desconhecido.” 26 F alar direito – 1. Obrigação de todo bom aluno de todo bom professor de Português de toda boa escola brasileira, embora não se explique bem o que “falar direito” significa. 2. Coisa que muita gente acredita que será capaz de fazer assim que terminar de ler a Gramática que o professor de Português recomendou. E ninguém avisa essa gente que isso é mentira? E é das grossas! 3. Sonho de todo esquerdista arrependido. 4. Em muitos casos, o mesmo que envergonhar-se de suas origens culturais e marcas identitárias. F érias – 1. Tanto para a maioria dos professores quanto para a quase totalidade dos alunos, a melhor época do ano. 2. Para muitos pais, a pior época do ano. 3. Para mim, o período de férias deveria ser visto por todos como um período de severo castigo a que os alunos são submetidos anualmente, sendo-lhes negado o contato diário com a escola e com os professores. Mas, conhecendo as coisas como andam em nossa Educação, acabo acolhendo a idéia de que é mesmo a melhor época do ano... F ilosofia – 1. Dizem que é a disciplina “amiga da sabedoria”... mas, que parece mais a amiga da chatice, isso parece! 2. Dizem que, quando nasceu, era uma coisa ligada à vida, uma coisa repleta de interesses legítimos e que transformava a visão das pessoas, mas que, ao longo do tempo, evoluiu (ou involuiu?...) para uma discussão absurda sobre coisas absurdas que acaba não prestando pra nada, salvo as raríssimas exceções (de filósofos e de filosofias). 3. Segundo um conhecido meu, filósofo: “A Filosofia enquanto ciência não foi ainda consolidada como ciência, mas está mais para uma teoria do conhecimento.” Ah! Então tá, né... tão fácil e eu que nem tinha entendido o que é Filosofia!... Burro eu... 27 F ísica – 1. Negócio que dá mais certo no papel que na vida real. Ex. pessoal: Meu professor de Física ensinou nossa classe que, se um automóvel sai do ponto A e se dirige ao ponto B - a 200 km de distância, por exemplo - retornando depois ao ponto A, o deslocamento é igual a zero. Perguntei a ele: - Se o deslocamento é igual a zero, porque acabou a gasolina do tanque? Ele me respondeu: - O SEU problema é SEU conceito de deslocamento. Pensei um pouco e supliquei: - Dá pro senhor ensinar o SEU conceito de deslocamento pro carro do MEU pai? Por favor!... 2. Negócio que dá mais certo nos supercomputadores do que na vida real. Ex.: Declaração de um engenheiro da NASA logo após a explosão do ônibus espacial: “Todos os cálculos físicos estavam corretos e foram conferidos em supercomputadores. Algo inesperado deve ter acontecido!”. “Algo inesperado”? Não diga! É... os astronautas é que devem ter achado esse algo bem inesperado... 28 29 G eografia – 1. Segundo o filho de um amigo meu, a Geografia na escola é um paradoxo (é claro que a criança não falou em “paradoxo”: eu é que estou falando aqui). Ela explicou a coisa assim: “Como é que a matéria que tem o livro mais legal, cheio de mapas e fotografias, e que fala do mundo inteiro, pode ser tão chata, tio?! Eu não agüento mais decorar aquelas coisas que o professor de Geografia manda.” 2. E não é que o menino tem razão?... G iz – 1. Símbolo máximo do atraso educacional e da prática “aulista” preponderante no Brasil. 2. A pedra de giz é, na verdade, a ponta disfarçada de um funil, pela qual somente passam algumas gotas de tudo o que deveria fazer parte da educação de uma criança. Nesse caso, o professor é a boca do funil. 30 H istória – 1. Meu professor de História do ensino médio repetia sempre (eu até decorei!): “A História é o conhecimento do passado, para a compreensão do presente e a construção do futuro.” Cara, que coisa linda! Fiquei até emocionado de lembrar isso!... 2. ... ... ... Pensando melhor... pensando um pouco mais... por que ele nunca fez isso com a gente? A gente tinha que se contentar em decorar um monte de baboseiras... Eca!... H umor - 1. Capacidade de rir e de fazer rir daquilo que o homem faz, e nunca daquilo que o homem é. 2. Elemento absolutamente necessário ao processo educacional, tanto quanto a esperança, a cooperação e o conteúdo. 31 I deal – 1. Espécie de coisa que um professor não vive sem. 2. Espécie de coisa que um professor não vive sem, para que possa desenvolver nos alunos, que também não podem viver sem. 3. Espécie de coisa que um professor não vive sem, para que possa desenvolver nos alunos, que também não podem viver sem, para que a sociedade, que também não deve viver sem, possa, então, ter um. 4. Espécie de coisa que um professor não vive sem, para que possa desenvolver nos alunos, que também não podem viver sem, para que a sociedade, que também não deve viver sem, possa ter um e o mundo, enfim, possa ter esperança no futuro, coisa que não se constrói sem um bom ideal. É só tudo isso. I gnorância – 1. Doença altamente contagiosa que acomete toda a humanidade, de uma forma ou de outra. Não existe ser humano algum que não seja acometido por ela de alguma forma, donde se dizer que “todo mundo é ignorante em relação a alguma coisa”. O pior é que isso parece tão óbvio, mas tem gente que se recusa a aceitar. São os chamados “sabe-tudo”. 2. Erradicação da ignorância: principal razão para a existência da Educação, embora isso ainda esteja bem longe de acontecer... 3. Em termos genéricos, o mesmo que “câncer da humanidade”. 4. Ainda de forma genérica, o mesmo que “princípio de todos os males do início e até o fim”. 32 I nformação – 1. É uma coisa que não presta pra nada se a gente não sabe o que fazer com ela, mas que tem um monte de gente que insiste em dizer que é a coisa mais importante do mundo hoje em dia. Besteira! Como alguém pode achar que ser bem informado é mais importante do que ser plenamente feliz? 2. Ver sabedoria. 33 J uramento – 1. Recurso muito utilizado pelos que vão melhorar, vão estudar mais, vão Recurso muito utilizado pelos professores do mês a dívida será quitada. Quase nunca professor fala no dia da formatura, mas que muitos esqueçam ao longo da carreira. alunos para convencer pais e professores de conversar menos. Quase nunca funciona... 2. pra convencer o cobrador de que no final funciona... 3. Negócio muito bonito que todo os problemas de cada dia fazem com que J uros – 1. Taxas descabidas e cruéis que os bancos e agiotas em geral impõem aos professores só porque o pagamento daquela pequena dívida demorou um pouquinho pra acontecer. Deveria haver leis contra isso neste país!!! E tenho dito! 2. Pura crueldade financeira a que os professores e demais funcionários da Educação são submetidos. 3. Espécie de tortura monetária. 4. Algo que quando é o banco que paga pra você, tem que olhar no microscópio e quando é você que paga pro banco, tem que levar num caminhão... 34 L aboratório – 1. Pelo nome, deveria ser um lugar onde todos trabalham em alguma coisa, afinal, é um lugar de labor. Na prática, é o lugar onde um (geralmente o professor) faz alguma coisa, de vez em quando, e os outros (geralmente os alunos) ficam fazendo de conta que estão entendendo o que o um está fazendo. 2. Um teatro místico caríssimo de se montar e muito mais caro ainda de se manter. Isso explica a freqüência com que os vemos de portas fechadas e sua chave perdida na gaveta do diretor da escola. 3. Sala mágica da escola (é o que se pensa...) em que daria pra fazer muita coisa legal se não fosse... Aliás, já perceberam que sempre tem um “se-nãofosse” vinculado a um laboratório? Disso se conclui que além de pipetas, lunetas e outras tretas, computadores e instrumentos de medição física, vidrinhos e coisas esquisitas aos montões, enfim, seja lá de qual natureza for o tal laboratório, ele tem que contar obrigatoriamente! – com um “se-não-fosse”, que nem precisa assim ser de tão boa qualidade... Isso pra NÃO funcionar direito, é claro! L egislação Educacional – 1. Conjunto de diplomas legais muito mais interessantes quando são lidos do que quando comparados com a realidade educacional brasileira. 2. Conjunto de escritos legais que funcionam apenas no papel. 3. Em muitos aspectos, o mesmo que “contos de fadas”. Ex.: Artigo 67 da Lei Federal nº 9394/96, que trata da valorização dos profissionais do magistério. L eitura – 1. O mesmo que viagem. 2. O mesmo que descoberta. 3. Um dos mais profundos prazeres experimentados pelo ser humano em todas as épocas. 4. Experiência insubstituível e intransferível pela qual todo ser humano tem o direito de passar. 5. Está para a mente como o alimento para o corpo. L ingerie, cosméticos e produtos naturais – 1. Artigos muito freqüentes nas salas de professores das escolas brasileiras, vendidos pelos próprios professores e comprados – fiado, é claro – pelos próprios professores e pelos demais funcionários da escola. 2. Tentativa 35 de fazer circular os parcos recursos existentes no ambiente escolar de maneira a que uma mesma nota de R$ 20,00 consiga pagar várias contas diferentes em seqüência. Quando isso acontece, é quase como brincar de “escravos de Jó” com uma nota de R$ 20,00. A cantiga fica assim: “Escravos de Jó, mandaram te pagar! Ai que pena: lá vão meus reais! Peguei daqui, já dei ali, nem deu pra esquentar! Só vou pagar, se el´me pagar, depois vou chorar!” E repete o refrão: “Peguei daqui, já dei ali, nem deu pra esquentar! Só vou pagar, se el´me pagar, depois vou chorar!”. Quem ficar com a nota quando a cantiga acabar sai correndo da sala antes 3. O mesmo que “produto de bico”. que 36 os colegas comecem a cantar novamente... L íngua Portuguesa – 1. O estudo de uma língua (será que aquilo é uma língua?) que todo professor de Língua Portuguesa diz que é a nossa, mas que a gente sabe que nunca falou. Ex.: “- Atenção classe, para a justificativa do exercício de colocação pronominal: Pegá-lo-emos, o pronome oblíquo do caso reto, que embora meio torto ande por aqui anaforicamente deslocado, e colocá-lo-emos em mesóclise enclítica no futuro do presente do pretérito composto gerundivo da terceira conjugação, que tem relação direta com o núcleo conjuminado da oração subordinada adverbial final reduzida de infinitivo proclítica ao pleonasmo vicioso da hipérbole da oração principal. Entenderam? Não? Nem eu!” 2. Estudo dedicado à decoreba temporária de regras gramaticais que não prestam pra nada... nada mesmo! 3. Uma das matérias mais detestadas da escola que, assim como a Matemática, serve pra separar quem á CDF dos demais mortais comuns. Ex.: “- A minha disciplina preferida é Língua Portuguesa!” E todo o resto da classe resmunga: “CDF...”. 4. Uma disciplina que todo mundo diz que, do jeito que ela é hoje, é muito importante, mas que ninguém até agora conseguiu provar por que nem como. 5. Por outro lado, uma disciplina que se estudasse de verdade a língua que a gente fala e os valores sociais relacionados a ela, que estudasse essa língua vinculada à vida, à cultura, aos valores de nossa gente, poderia transformar pessoas, abrir horizontes, quebrar preconceitos e, aí sim, ser muito útil. L iteratura – 1. Poderia, juntamente com o estudo das outras artes, ser o mais prazeroso instrumento de aprendizagem e ampliação de horizontes à disposição da escola, uma disciplina amada por todos os alunos e útil para a transformação das realidades. Poderia... 2. Na prática, o mesmo que decorar nomes de autores, listas de obras e datas, aprender a contar sílabas métricas de poesias que não se entende e odiar as obras literárias (das quais se tem que fazer um resumo para o dia 23). 3. Segundo um sobrinho meu, quando era adolescente: “Nem a fessora sabia por que a gente estudava aqueles escritores, porque nem ela entendia o Machado do Alencar. Era tudo enrolação...”. “Machado do Alencar”... durma-se com um barulho desses... L ivro – 1. A mais bela invenção do ser humano. 2. O retrato mais fiel da humanidade. 3. O mais eficiente instrumento de educação jamais inventado, tanto que é a forma escolhida por todas as religiões para eternizar os conhecimentos sagrados. 4. Fechado, o mesmo que escuridão. 5. Aberto, o mesmo que luz (o que é confirmado no verso bíblico “Lâmpada para os meus pés é a Tua Palavra e luz para o meu caminho.”). 6. O mesmo que dádiva, pois todo livro é bom, mesmo que seja ruim, uma vez que a eles se aplica o mesmo princípio básico de consciência que se aplica ao conteúdo aprendido. 37 L ivro didático – 1. Forma corrompida, imposta e meramente comercial de “livro”. 2. Para alguns professores, o mesmo que muleta. 3. Para a maioria dos alunos, o mesmo que prisão da mente. 4. Para a Educação, o mesmo que desperdício (de tempo, dinheiro, criatividade, cooperação e esperança). 5. Para o futuro, o mesmo que veneno. 38 M atemática – 1. Definição do meu filho: “É o bicho! Muito melhor do que Português!”. 2. Minha definição: “Coisa mais chata do mundo! Extasiante é estudar línguas!” 3. Pensando bem, acho que nossos conceitos de Matemática e Português têm a ver como os nossos professores de Matemática e de Português... 4. Conceito de um professor de Matemática que trabalhou comigo no ensino fundamental: “Matemática é a forma de organização do mundo, uma vez que o mundo é matematicamente organizado.” Maravilha! Então, por que é que ele não ensinava isso na escola? 5. Conceito de uma aluna de 12 anos com a qual conversei recentemente: “Não sei, não senhor. Nunca entendi direito aqueles números todos... Só estudo pra passar mesmo.” M atéria – 1. Aí depende... tem aula que diz que é uma treta que existe assim, como os troço que a gente pega, como o lápis que tem matéria que é a coisa de que o lápis é feito e porque, se não tem matéria, não existe, entendeu? 2. Agora, nas outras aulas, matéria é as próprias aulas, entendeu? Exemplo: a matéria do Português, da Matemática, da Geografia. E por isso a gente tem os cadernos de várias matérias. 3. Agora, também pode ser a matéria nova que o professor passa na aula. Aí tem a matéria nova da matéria do Português, entendeu? 4. E também tem a matéria da prova, que não é uma matéria nova, mas que a gente também pode não saber, entendeu? Isso é que é a matéria, entendeu?... - Sim, claro! Mais claro impossível... M erenda – 1. Única razão realmente significativa para grande parte dos alunos brasileiros de escolas públicas freqüentarem o ambiente escolar diariamente. 2. Argumento bastante utilizado por grande parte dos políticos brasileiros para desviar verbas públicas da educação. Ex.: Recentemente, vi documentos sobre o caso de um prefeito que, para as 3 (isso mesmo: três!) escolas municipais de sua cidade, adquiriu de 39 uma única vez e para uma entrega única, 5 (isso mesmo: cinco!) toneladas de tomate para a merenda escolar. Coitadinhos dos alunos entomatados! Imagine o cardápio: tomate cozido com salada de tomate com suco de tomate e doce de tomate, todo dia e por todo o ano... Enquanto isso, nas escolas, de verdade, se servia leite com achocolatado e bolacha de água e sal para os alunos. M estrado – 1. Meio termo entre a dúvida sobre a própria incompetência (que ocorre na graduação) e a certeza absoluta da própria incompetência (que se concretiza no doutorado). Adendo importante: Apenas um pseudo-doutor absolutamente tomado por um tipo tosco de orgulho ridículo pode, diante do universo do conhecimento, achar que já chegou onde devia... tadinho dele! E o que dizer de um mestre que pensa que já chegou lá?... Melhor não comentar... 40 N ota – 1. Aquilo que você só ganha porque merece e ainda dizem que é a “sua cara”. 2. Nota vermelha: prova incontestável da sua burrice. 3. Nota azul: Bem... essa já não prova nada... pode ser cola, compra de trabalho ou até, em alguns casos, inteligência... 4. Nota preta: o que todo professor gostaria de ganhar no final do mês. Se isso acontecesse eles juram! – dariam nota azul pra todos os alunos, só pra distribuir sua felicidade! N inguém - 1. Estranhamente – na verdade, muito estranhamente! – “ninguém” é a condição em que os alunos são enquadrados em muitas escolas brasileiras: “condição de ninguém” ou de “zé-ninguém”. Não cheira nem fede, não grita nem apita. Mas, por outro lado, o diretor é “o cara”, o supervisor é “autoridade escolar”, o professor é “alguém”. Até quando vai essa patuscada? 41 O O ntem – 1. Dia em que o aluno pediu... mas hoje ele esqueceu... sempre mbro – 1. Para muitos e muitos alunos de nossas escolas, a parte mais importante do corpo (e da alma) do professor. O uvido – 1. Infelizmente, a parte do corpo do aluno mais valorizada em nossas escolas. Freqüentemente, o ouvido é mais valorizado que o cérebro. O stra – 1. Estágio final de muitos professores que passaram grande parte de suas vidas tentando transformar a educação brasileira, mas que, depois de tanto apanhar e de dar murro em ponta de faca, desistiram. 42 lembra de trazer o trabalho que você P alestra – 1. Tipo de atividade que a gente chama alguém conhecido pra desenvolver na escola, em uma “semana de alguma coisa” (mas tem mesmo que ser conhecido, pra ser de graça...) sob a alegação de que isso vai melhorar a qualidade educacional dos alunos. Poderia e, eventualmente, isso de melhorar até acontece, mas, às vezes, é um baita tiro que sai pela culatra, porque a gente nem imaginava como aquele cara tão conhecido era tão ruim falando em público! 2. Nesses casos, palestra é o mesmo que “decepção coletiva, perda de tempo e encheção de lingüiça”. P esquisa – 1. Uma das atividades mais naturais do ser humano, do mesmo nível que respirar e soltar pum (só pra falar das atividades naturais relacionadas a elementos etéreos...), mas que a academia fez o desfavor de transformar em um monstro aterrador, ridículo e complicado. Explico: quando a criança nasce, ela imediatamente começa a pesquisar: pesquisa cheiros, pesquisa o próprio corpo, pesquisa sabores e cores, faz suas descobertas e assim vai “virando gente”. Pesquisar é a forma primordial de descobrir o mundo. Mas, na academia não! Se é acadêmico, tem que ter complicação! Então aparecem os projetos, as metodologias, os procedimentos e a pesquisa vira coisa de cientista! Pior que isso só acreditando que a academia é que está certa!... 2. Algo que é tão importante na vida, que nunca deveria ser proibido para nossos alunos. Infelizmente, a tradição de transformar o aluno em um arquivo passivo do conhecimento alheio equivale a uma proibição de fazer descobertas. 3. Pesquisa bibliográfica: ato de descobrir o que já foi descoberto e repetir o que já foi dito. 4. Pesquisa de campo: a mais chique de todas: dá a impressão de que a coisa é séria e, ao mesmo tempo, cheia de adrenalina... Mas, muitas vezes, é só impressão mesmo... 5. Pesquisa por amostragem: ato de fé que se baseia na idéia de que todos os indivíduos de um grupo são iguais. 6. Pesquisa científica: nome esnobe para diferenciar as descobertas das pessoas comuns das descobertas recompensadas com certificados e diplomas acadêmicos. 43 P lanejamento – 1. Uma das maiores deficiências da educação brasileira em todos os níveis, desde o sistema federal até cada um dos estabelecimentos escolares. 2. Algo que, quando é feito no Brasil, é feito de forma independente e fragmentária, sem a compactuação dos sistemas federal, estaduais e municipais, o que, no final, é o mesmo que não ter feito nada. Ou seja, é algo que, no Brasil, quando se faz não se faz. 3. Na dimensão meramente burocrática da escola, trata-se de um documento anual (também chamado de “plano de curso”) que cada professor tem que entregar para cumprir uma obrigação tosca junto à supervisão escolar (ou seja, ele não tem que planejar de verdade, tem que entregar o plano, o que é bem diferente... e tosco...). Observe-se que, se o mesmo professor for dar aula da mesma matéria para a mesma série, está valendo trocar apenas a data e deixar todo resto igual ao do ano passado, mesmo que nada do que está ali tenha sido cumprido naquele ano, no retrasado, no antepassado e por aí vai. P oder – 1. Oportunidade (isso mesmo: para os homens, o poder não é um estado infinito, embora quase todo “poderoso” nunca tenha entendido isso! É uma mera oportunidade transitória!) circundada de energias místicas e tenebrosas que faz com que a maioria das pessoas perca o senso de realidade e a capacidade de auto-avaliação. 2. Poderia ser uma oportunidade de fazer o bem, mas como é difícil ver isso acontecer... 3. O mais íntimo, verdadeiro e acariciado sonho de consumo de quase todo mundo nesse Mundo, embora quase todo mundo negue. É assim desde Eva, aquela do Paraíso: “- Se você comer a fruta, vai ser igual a Deus...” E não é que ela comeu?! Sonho de consumo! P reconceito – 1. Provavelmente, a mais funesta e deplorável manifestação da ignorância humana. 2. Uma coisa que todo mundo que tem diz que não tem. 3. Uma coisa que todo mundo que não tem, não precisa dizer nada, porque a gente já percebe se a pessoa não tem pela maneira como a pessoa vive. 4. Uma coisa tão hedionda que me deixa assim... sem palavras... P rimeiro dia de aula – 1. Pra muitos alunos e muitos professores, nada mais do que o “maldito fim das férias”. 2. Pra maioria dos integrantes da comunidade escolar, dia de colocar a fofoca em dia. 3. Pra uns poucos, o reinício da maravilhosa e insubstituível jornada da educação escolar... Nesse caso, pensando bem e com toda essa “poesia”, pra poucos mesmo... P rincípios – 1. Embora se chamem “princípios”, eles funcionam no começo, no meio e no fim da história. Os princípios constituem um conjunto de regras de vida que só prestam se a gente mesmo é que escolhe por quais vai se conduzir e que, 44 quando a gente realmente acredita nelas, vale a pena morrer por elas. Daí a frase: “Isto não está em negociação: é uma questão de princípios.” 2. Embora a gente tenha se acostumado a ver os “princípios” apenas como coisas boas, tem gente que adota princípios de vida bem estranhos, como “o dinheiro acima de tudo e de todos”, “o mundo é dos espertos” ou “o que interessa é curtir a vida hoje, logo, dane-se o futuro.” Esses princípios (tortuosos?), entre outros tantos que rolam por aí, têm custado muito caro à humanidade. 3. Nem precisa dizer que bons princípios são fundamentais a esse sujeito que a gente chama de professor, sob pena da desgraça própria e da dos alunos. P rofessor – 1. Aquele que professa uma crença e que, se necessário, morre por ela. 2. Sujeito constituído por três dimensões (caráter, filosofia de vida e formação técnica), cujo principal objetivo na vida é aprender. 3. Sujeito absolutamente desprovido de egoísmo que tem o hábito (muitas vezes doentio) de compartilhar com os outros tudo-etudo o que aprende. 4. Sujeito cuja profissão se confunde com a própria existência (um professor nunca é um indivíduo, no “sentido psicótico” da palavra). 5. No Brasil, sujeito que tenta se realizar profissionalmente usando como argumento a esperança de que a cruel realidade que o cerca um dia vai mudar pela Educação (e, assim, se esforça para acreditar que ele mesmo está contribuindo para essa mudança) e de que um dia ele será novamente reconhecido como alguém realmente importante para a humanidade. 6. Sujeito altamente suscetível à Síndrome de Bournot (em conseqüência da definição 5...). P vida rojeto Pedagógico – 1. Deveria ser a “boa cara” da escola, na forma de um projeto construído democrática e participativamente, pela escola e pela comunidade por ela atendida, a fim de atender às demandas dessa comunidade, formando pessoas para a e transformando as vidas das pessoas formadas e das que com ela se relacionem, 45 revisto e atualizado periodicamente em função das mudanças ocorridas nessa comunidade. 2. Mas... (Caramba! Por que sempre tem que ter um “mas...” quando falamos em educação?!!) na prática, é um documento formal e inconsistente, para meros fins burocráticos, elaborado por meia-dúzia de “iluminados” (quase sempre a chamada “equipe técnica” da escola), iniciado às pressas e terminado um dia antes do último prazo determinado pela Secretaria de Educação... e para todo o sempre amém! P rova – 1. Documento que não prova nada. 2. Instrumento sistematicamente idealizado para não provar nada em relação ao aluno, ao mesmo tempo em que convence o aluno e os pais do infeliz de que prova tudo. 3. Instrumento de tortura ou de barganha minuciosamente planejado por alguns professores pra provar que os alunos não aprenderam nada (como se o próprio professor não tivesse nada a ver com isso...). 4. Poderia ser um instrumento de ensino que proporcionasse significativas experiências de aprendizagem para os alunos. Poderia... 5. Documento que o aluno lê inteiro quando recebe pela primeira vez e que lê apenas aquele numerinho vermelho que vem em cima quando recebe pela segunda vez, antes de amassar e jogar no lixo. 6. Documento que, quando o aluno recebe pela segunda vez, geralmente é saudado com as seguintes frases (ou suas variantes mais explícitas...), isoladamente ou todas elas juntas: “-Me ferrei!!!”, “Meu pai vai me matar!!!” e “Esse professor filho da mãe!!!”. 46 Q uadro negro – 1. Situação atual da educação brasileira. 2. Grande quadro colado na parede da sala e pintado de preto em que o professor escreve as coisas que quer que os alunos aprendam e em que os alunos escrevem os próprios nomes e/ou palavrões na ausência do professor. Em sua evolução, o quadro negro ficou verde – provavelmente de raiva – e, posteriormente, branco – talvez de susto. Q uímica – 1. Matéria em que, depois que a gente aprendeu o que era “reação”, vivia torcendo para o professor explodir alguma experiência dentro da sala... e quem sabe, com sorte, ele perder um braço ou ficar cego de um olho na explosão... 2. O mesmo que decorar a tabela periódica dos elementos – “E com todos aqueles numerinhos, viu!”. 47 R ecreio – 1. Melhor hora de um período de aula, até porque é no horário do recreio que a gente come! 2. Espaço de tempo compreendido entre duas sessões diárias de tortura escolar. 3. Aquilo que você vai ficar sem, se não parar de bagunçar na minha aula! (O que é uma prova incontestável de que o recreio é mais interessante do que a aula. Se fosse o contrário, a ameaça seria: “Se não parar de bagunçar, mando você para o recreio!”) 4. Hora de fazer cobrança na sala dos professores. Por isso, tem alguns que só aparecem por lá no dia imediatamente seguinte ao do pagamento... e alguns não aprecem nunca! R ecuperação – 1. O mesmo que desencargo de consciência da escola em relação aos alunos de baixo aproveitamento. 2. Para muitos alunos e professores, o mesmo que pesadelo de final de ano. 3. Na quase totalidade das vezes, uma forma de provar que a escola fez o que podia, embora soubesse que o aluno não ia mesmo recuperar, em uma semana, o que deixou de aprender em um semestre ou em um ano. 4. Doloroso e humilhante período do ano escolar que seria absolutamente desnecessário se a educação prestasse de verdade e cumprisse seus objetivos precípuos de atender a todos os alunos em suas especificidades. R ecursos didáticos – 1. Um monte de coisas que deveriam servir pra ensinar, mas que às vezes só servem pra mostrar como o professor é “dedicado”. 2. O mesmo que “tudo”. Se “tudo” não serve para ensinar, como ensinar “tudo” às crianças? 3. A diferença entre uma palmatória e um recurso didático está na forma como a palmatória é usada: pelourinhos devem ser preservados para que o sangue que os marca nos ensine sobre os horrores que eles presenciaram. 48 R edação (escolar) – 1. A coisa mais importante pra quem quer passar no vestibular, dizem... 2. Do jeito que é feita hoje, segundo o filósofo Pierre Bourdieu, um ato de insanidade escolar (as razões, já as expliquei em outro canto...) 3. Uma coisa que os alunos detestam fazer e os professores detestam corrigir: ou seja, deve mesmo ser uma coisa detestável!... 4. Seria o mesmo que falar das minhas férias que eu não tive? É, pode ser... R efeitório – 1. Para muitos alunos de escola pública, o mesmo que paraíso. 2. Para quem não precisa da merenda, local que se visita de vez em quando pra ver se “a gororoba de hoje dá pra comer”. 3. Para outros tantos, que certamente comem bem em casa e que não compreendem a necessidade de oferecer alimentação na escola, é a ante-sala do inferno, onde um monte de demônios se mela de comida, agindo como um bando de porcos, comendo de boca aberta, fazendo barulho e babando... um nojo! R elatório – 1. Do professor pro diretor – registro inútil e mentiroso – e um saco de fazer! -das coisas que deveriam ter acontecido na escola, mas não aconteceram por um monte de razões... Mas quem é doido de escrever que não aconteceram e sobrar pro diretor?... Afinal, a corda sempre quebra do lado mais fraco... 2. Do diretor pra Secretaria de Educação – tentativa inútil e mentirosa de mostrar que a escola está 49 melhor do que ela realmente está, e isso justamente por causa do trabalho incansável do diretor e do apoio incondicional da santa pessoa que o nomeou. 3. Do professor sobre o aluno – Geralmente, retrato mais cruel do que precisaria ser, pintado sobre o aluno na tentativa de apontar todos os erros dele para os responsáveis, acreditando que isso geraria mudanças positivas. Bem, ninguém suporta que todos seus erros sejam apontados e nem consegue modificar todos os seus erros de uma única vez. Nesse sentido, os relatórios são instrumentos terrivelmente eficazes de destruição da imagem e da auto-estima dos alunos. Seriam mais úteis se enfocassem um único problema de cada vez: um pequeno defeito vencido na vida dá forças para vencer um mais grave, e assim até a perfeição. R eprovação – 1. Demonstração inequívoca de que o aluno é burro ou de que a escola é muito superior ao que o aluno (que continua burro) consegue alcançar. 2. Em certo sentido, demonstração inequívoca de que o sistema educacional brasileiro é burro. 3. Um dos mais drásticos resultados de se transformar uma vida em um número ou em um conceito escolar. R espeito – 1. Está para a relação ser humano vs. ser humano (e, por conseqüência, para a relação professor vs. aluno) como a integração de funções está para a relação entre o estômago, o fígado e o intestino. Ou seja, cada um sabe o seu lugar e faz a sua parte da melhor forma possível, sabendo que, quando a integração perfeita faltar, todos sofrerão. R etroprojetor – 1. Ex-símbolo maior da modernidade educacional, era o causador de uma demanda insaciável dos professores por transparência. Aliás, foi justamente na época do retroprojetor que mais se falou em transparência na Educação brasileira. Pena que era o tipo de transparência que não mudava muito as coisas... Mas, pelo menos se falava em transparência! Foi aí que inventaram o datashow, substituto impiedoso do retroprojetor. Isso aconteceu provavelmente para que não sobrasse nenhum resquício de transparência na Educação brasileira. 2. Um dia desses, perguntei lá na universidade se a gente ainda tinha algum retroprojetor funcionando. Fui informado de que retro tinha, o que não tinha mais era transparência. Concordei. Pura verdade!... 3. E continuamos na mesma... 50 S abedoria – (Observação preliminar: Se você veio parar aqui depois de ler os verbetes conhecimento e informação fica tudo mais fácil. Se não, peço que vá lá e leia os dois, e depois volte.) 1. Sabedoria é o terceiro estágio da informação, que era só informação no começo e depois virou conhecimento e, finalmente, se tornou conhecimento aplicado para o bem, que é a sabedoria. Fácil, né? É mais ou menos assim: você coloca uma vaca na frente de um esplêndido piano de cauda e diz pra ela: “-Vaca, isto é um piano de cauda, maravilhoso, afinadíssimo e pronto pra tocar as mais belas melodias já criadas pelo homem!”. A vaca vira pra você e: “Muuuuu!!!!”. E a desgraçada da vaca ainda começou a morder as teclas do piano! Sai daí, vaca maldita! Isso é informação. Ninguém pode negar que a vaca está informada a respeito do piano... Estágio 1 terminado. Mas, se a vaca senta ao piano e executa a 3ª Sinfonia de Rachmaninoff, bem... aí já é mostra de que a vaca entende das coisas. Ela pode até fazer um comentário sobre a afinação do piano ou sobre a suavidade de acionamento das teclas. Mas a única a tirar proveito disso é ela mesma. Isso é conhecimento. Conhecimento transforma os seres, mas não ajuda ninguém além de quem o detém. Estágio 2 terminado. Mas, se a vaca olha pra você e diz: “- Poderíamos montar aqui, com esse piano e o que eu sei, uma escolinha de música pros animais carentes, fazer apresentações pros bezerrinhos em situação de risco e tentar modificar essa sociedade animalizada com o poder da arte.” E, efetivamente ela fizer isso, aí estamos diante de um caso de sabedoria. Sábio é aquele que usa seu conhecimento pra tornar os outros mais felizes e, assim, tornar-se também mais feliz. Estágio 3, que nunca termina, mas sempre se multiplica, eternamente, até depois que o sábio morre. S ala de Informática – 1. Principal projeto de todo diretor que ainda não tem uma em sua escola. 2. Salas de aula adaptadas, quase sempre inauguradas com “pompa e circunstância” e depois devidamente fechadas até que os equipamentos fiquem obsoletos. Isso acontece por várias razões, dentre as quais são especialmente comuns: a. falta de quem saiba usar e ensinar a lidar com os equipamentos; b. falta de dinheiro 51 pra manter a sala funcionando; c. falta de vontade de fazer a sala funcionar; d. burrice crônica do diretor, que acha que aquilo ali é enfeite da escola e não quer que ninguém mexa pra não quebrar os computadores. 3. O mesmo que “museu pessoal do diretor da escola”. 4. Argumento pra mostrar que o diretor provocou uma revolução educacional com seu “mandato” (e por isso deve ser reconduzido...). 5. Em certos municípios pequenos, o Secretário Municipal de Educação constrói e inaugura pomposamente uma dessas em alguma escola especialmente visível, isso pra mostrar como ele cuida da Educação. Depois, a sala quase sempre segue o mesmo caminho histórico das outras: vira museu do diretor. 6. Pra ficar mais chique, muitas vezes, a sala de informática é chamada de “laboratório de informática.” Mas a história é a mesma... S ala de Vídeo – 1. Nos áureos tempos da TV Escola, quando a Internet não havia ainda se tornado o must da Educação, as salas de vídeo eram o símbolo maior da modernidade escolar no Brasil. Estávamos na era FHC. Toda escola ganhou um kit tecnológico, composto por parabólica, TV e videocassete, e um montão de fitas e mais fitas, virgens e desvirginadas, que deveriam ser assistidas por professores e alunos, além de se sintonizar a TV Escola e sua gloriosa grade de programação. A sala de vídeo guardava os equipamentos e as fitas, e deveria servir como um pequeno auditório pra utilização do material. 2. Daí, na prática, o que aconteceu foi: as escolas fizeram um sacrifício danado pra adaptar uma sala de aula, colocar um ar-condicionado e comprar um armário pra guardar aquela fitaiada de dar medo. Algumas investiram em cortinas e pintaram as salas de preto por dentro, pra dar aquele clima de cinema. Aí alguém tinha que tomar conta do mausoléu, e sobrava sempre pra algum professor em fase de aposentadoria ou algum funcionário com problema de saúde. As salas de vídeo ficavam fechadas a maior parte do tempo e começaram a cheirar mofo. As fitas começaram a estragar. A parabólica sintonizava tudo menos a TV Escola. As salas eram usadas como auditório pra tudo menos pra assistir ao material que ali havia e raríssimos professores tiraram algum proveito daquilo tudo. Hoje, está quase tudo abandonado. Em suma: tempo, dinheiro e esforço jogados fora mais uma vez. Por quê? Porque no Brasil se faz tudo ao contrário, goela abaixo, principalmente quando existe algum kit tecnológico pro governo comprar... 2. Essa eu tenho que contar: visitando escolas ribeirinhas na Amazônia, conheci uma que havia recebido um kit tecnológico do Governo Federal, mas que não era beneficiada com energia elétrica... Estava tudo lá no canto da única sala, devidamente encaixotado, e o professor procurando um focinho de porco pra ligar a TV. Será que ia funcionar?! S ala dos professores – 1. Quando existe, o mesmo que refúgio de professores na hora do recreio. 2. Quando existe, importante setor comercial da escola em que os professores vendem cosméticos, lingerie e produtos naturais, entre outras coisas, e em que, eventualmente, a gente encontra um vendedor de livros ou assinaturas de revistas (daqueles bem chatos, que pensam que estão vendendo pra executivos de multinacionais e não pra 52 professores brasileiros!). 3. Quando escola; o primeiro é a Secretaria. S S existe, segundo lugar em que as fofocas ala-de-aula – 1. O mesmo que Planeta Terra. 2. Todo e qualquer lugar consegue aprender alguma coisa. Se não for assim, o que se estará será Educação, será aprisionamento. correm na em que se fazendo não alário (do professor) – 1. Valor em dinheiro que o professor recebe, a título de justa remuneração, pelo suor de seu rosto. Na verdade, ele sua o corpo inteiro, mas só recebe o correspondente ao suor do rosto. 2. Piso salarial nacional – demonstração inequívoca do governo brasileiro sobre importância dada aos professores. Explico: Quando o tema é juiz, promotor, delegado, general, prefeito, governador, deputado ou senador, o que se discute é “teto salarial”; quando o tema é professor o que se discute é a “impossibilidade de implantação do piso salarial”... “Teto”... “piso”... “impossibilidade”... sacou a “importância” atribuída ao professor?... S ecretaria – 1. Império da burocracia escolar. É quase uma “entidade transcendental” com existência e regras próprias dentro da escola. O que acontece ali não pode ser contestado por ninguém, nem mesmo pelo diretor, que não manda nada ali dentro. 2. Deveria ser apenas um local de registro burocrático mas, não é incomum que, na prática – e eu já vi acontecendo! – funcione como ponto lucrativo de comércio ilegal de vagas, de notas, de documentos que saem mais rapidamente ou que até não saem, dependendo de “quanto sai por fora”, e por aí vai... Nesses casos, é quase uma sucursal do Congresso Nacional dentro da escola. 3. Primeiro lugar onde corre uma fofoca na escola. Por que será? Sinceramente, nunca entendi bem isso... S eminário – 1. Atividade que deveria ser realizada coletivamente buscando a socialização do saber e o desenvolvimento dos alunos. Deveria... 2. Seminário de classe: maneira interessante de colocar os alunos pra dar aula no lugar do professor, sob a justificativa de socializar o saber e desenvolver os alunos (e é bom porque não tem que corrigir prova...). 3. Não sejamos excessivamente ácidos... às vezes até funciona... S upervisão – 1. Setor técnico da escola que, geralmente, exerce as seguintes importantíssimas e insubstituíveis funções do cotidiano escolar: a. cobrar e assinar os planos de aula dos professores, mesmo que eles não sejam cumpridos; b. vistoriar diários pra ver se estão corretamente preenchidos, mesmo que as aulas não tenham sido ministradas; c. idealizar festinhas e outros eventos inúteis (que os professores realizarão a título de “colaboração com os projetos da escola”...); d. brigar com e encher o saco dos 53 professores para provar autoridade; e. fazer fofoca dos professores ao diretor da escola; f. no caso específico do supervisor, pedir pra sair mais cedo, porque tem que levar o filho ao médico (Êta menino que só vive doente!... Será que existe no mundo algum menino que fique mais doente do que o filho do supervisor??). 2. E só de pensar que podia ser tão diferente, tão útil, tão relevante... S uspensão – 1. Para quem realmente a merece, é uma saborosa bonificação ofertada pela Direção da escola. 2. Forma de extensão do período de férias para quem não quer nada com a hora do Brasil. 3. Muitíssimo rarissimamente, uma forma de corrigir o comportamento inadequado de um aluno. Quando essa correção acontece, certamente ela seria possível sem a suspensão, pois se trata de um aluno sensível à disciplina escolar. 54 T arefa de casa – 1. Para a maioria dos alunos, o mesmo que castigo. Ex.: O professor anuncia: “- Hoje não tem tarefa de casa.” E a classe responde: “- OBA!!!! UHHUUUU!!”. 2. Para a maioria dos professores, uma tentativa de compensação da absoluta impossibilidade de fazer um trabalho que preste com o tempo ridículo que um sistema que adota uma jornada de 4 horas diárias de estudo lhe concede para ensinar. 3. Tentativa desesperada e quase sempre frustrada de fazer com que os alunos aprendam um pouquinho mais. T emas Transversais – 1. Um monte de coisas importantíssimas – na verdade, parece que são as coisas mais importantes que a escola tem pra ensinar – e que deveriam ser ditas a todo o tempo em todas as disciplinas, mas que “nunca dá tempo” pra tratar e que, por isso, acabam quase sempre sendo totalmente esquecidas. E nossos alunos continuam na análise sintática, na tabela periódica dos elementos, nas equações de segundo grau... T este – 1. Miniatura de prova (ver prova). 2. Provinha que o professor consegue elaborar de supetão, sem planejar, o que prova que ele é bom, e os alunos, como não conseguem responder de supetão, não sabem nada. T rabalho (escolar) – 1. Atividade desenvolvida por alguém – que inclusive pode, até e eventualmente, ser o aluno – no intuito de complementar a aprendizagem restrita do cotidiano escolar, mas que quase nunca consegue isso. 2. Forma usada por muitos alunos pra demonstrar pro professor que são sabidos e caprichosos, mesmo que isso custe muito caro (tem gente que cobra caro pra fazer um trabalho escolar... Nesse sentido, trabalho escolar é o mesmo que “oportunidade de mercado”). 3. Em certas situações, documento comprobatório de que o aluno não quer nada com nada. 4. Aquela 55 coisa que o aluno fez com tanto esforço e tanto zelo, mas que esqueceu em casa justamente hoje, embora tenha trazido na mochila por toda a semana e então... com uma tremenda cara de choro e piedade...: “- Posso entregar amanhã, professor? Juro que está feito!” T rabalho em grupo – 1. Forma de trabalho escolar em que, quase invariavelmente, dois trabalham, o resto mama e todos ganham nota. 2. Eficiente fórmula matemática que os professores desenvolveram que resulta em expressiva diminuição do número de trabalhos que eles tinham que levar pra casa para corrigir. 3. Forma de trabalho escolar que, sob a justificativa da socialização do conhecimento e do desenvolvimento de traços de cooperação, no fundo e quase sempre incita um profundo e funesto tipo de individualismo tolo, inclusive no nível universitário. Ex.: O professor estabelece: “- O trabalho de vocês é a apresentação do capítulo 4 do livro, no dia 27.” Os alunos se reúnem depois das aulas e o mais despachado do grupo determina: “- Você lê as páginas 34 e 35, eu 36 e 37, tu 38 e 39 e ela 40 e 41. Cada um fala sua parte na apresentação. Beleza!” E no tal dia 27: “- Olha, professor, a menina que ia apresentar essa parte faltou. É problema dela. Não é justo o senhor tirar nota da gente só por causa dela... né?...” 56 U HUUUU!!! – 1. Expressão muito ouvida na escola nas seguintes ocasiões, entre outras: a. o aluno conseguiu, finalmente, tirar uma nota boa; b. o aluno descobriu que conseguiu passar de ano em Matemática e Português; c. chegaram as férias; d. amanhã é feriado; e. o professor ficou doente e a escola não arrumou substituto. U rgente – 1. Tudo aquilo que chega nas mãos do professor pra fazer, principalmente se é ordem da Secretaria de Educação ou algum projeto da escola. 2. O mesmo que “pra ontem e não tem conversa”. U rticária – 1. Manifestação muito comum em professores brasileiros quando vai terminando o domingo e eles lembram que amanhã têm que dar aula de novo. 2. Também costuma ocorrer quando chega o contracheque ou holerite e o professor abre pra ver quanto vai ganhar naquele mês. 57 V ergonha – 1. Sentimento altamente educativo que as pessoas de gerações passadas costumavam sentir quando pegas praticando ou tendo praticado alguma atitude errada, mas que, pelo menos no Brasil, definitivamente está saindo de moda. 2. Em Educação, sentimento altamente educativo que se manifestava a cada falha de um aluno ou de um professor quando do descumprimento de qualquer de seus deveres éticos, estudantis ou profissionais e que, também, infelizmente, está saindo de moda (ou já saiu e eu ainda estou cheio de esperança?...) V iolência (verbete dolorido e angustiado) – 1. Tipo de coisa que uma boa educação deveria fazer sumir da face da Terra. Mas, como não temos uma boa educação, é o tipo de coisa que está fazendo a boa educação sumir da face da Terra. 2. A relação entre a violência e a educação é mais ou menos como a da coruja e da águia na fábula: quem encontrar primeiro o filhote da outra o devora. 3. Algo que acontecia de vez em quando dentro da escola e chocava todo mundo; aí foi se tornando cada vez mais e 58 mais comum; e aí a gente se acostumou com ela! Pode haver maior grau de decadência educacional? Nesses termos, a violência na escola é o próprio retrato do inferno que o futuro nos reserva. V ivência – 1. Como o próprio nome sugere, aquilo que resulta de cada segundo da existência de um ser vivo. No caso dos seres humanos, cuja consciência permite avaliar as vivências, toda vivência é boa, mesmo sendo ruim. 2. O mesmo que oportunidade de aprendizagem. 3. O mesmo que oportunidade de fazer a escolha certa e promover o bem. 59 X X da questão – 1. O que todo mundo na escola passa a vida inteira procurando, mas ninguém nunca achou. 2. Ou achou? Bem, se alguém achou, por que todo mundo continua procurando?... iiii... – 1. Expressão freqüentemente ouvida na sala assim que o professor entrega a prova, tanto a que deve ser resolvida, quanto a que já foi corrigida. 2. Manifestação comum na sala dos professores assim que os contracheques ou holerites são entregues a cada mês. 3. Forma comumente ouvida nas escolas como expressão do sentimento geral em relação às novas idéias do novo diretor que quer, a todo custo, revolucionar o estabelecimento educacional. ixi – 1. Aquilo que sempre dá vontade de fazer na aula do professor mais bravo, justamente aquele que não deixa a gente sair da sala pra ir no banheiro. 2. Palavra feia que os alunos pequenos gostam de cochichar apenas no ouvido do professor, pra ninguém descobrir o que eles vão fazer lá fora... Se for cocô, então... X 60 Z ebra – 1. Ocorrência inesperada do tipo: a. o salário do professor não vai sair na data prevista; b. e não é que o pior aluno da sala se deu bem na prova? Mardito! Assim vai passar de ano!!; c. O diretor entrou na sala dos professores justamente quando a gente estava falando mal dele...; d. o governo aceitou as reivindicações dos professores em greve logo na primeira semana de paralisação e a greve já acabou!! Pois é... Z zzzzzz.... – 1. Som freqüentemente ouvido nas aulas chatas. 2. Também é muito comum nas palestras chatas, nos seminários chatos, nas preleções chatas, nos discursos de formatura chatos, nas defesas de dissertação e de tese chatas, enfim, “zzzzzzzzz...” é um som que tem a ver diretamente com a chatice!. Z isperado – 1. É como o professor fica a maior parte do tempo, seja por conta do baixo salário, seja por conta das péssimas condições de trabalho, seja por conta do descaso dos pais para com a educação das crianças, seja por conta da falta de esperança em mudanças substanciais em nossa educação... ou seja, tem que ser sempre por causa de um “seja por conta”... 61 62