AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS E JURÍDICAS
NA FAMÍLIA NO SÉCULO XXI
Ana Cláudia S. Scalquette*
*Advogada. Doutora em Direito Civil pela
Universidade de São Paulo - USP. Mestre
em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Professora da graduação e pós-graduação
da Faculdade de Direito da Universidade
Presbiteriana Mackenzie. Membro Efetivo
da Comissão de Biotecnologia e Estudos
sobre a Vida da OAB/SP e Titular da Cadeira de n. 68 da Academia Paulista de
Letras Jurídicas.
Sumário:
1. Início das transformações jurídicas na Família: uma abordagem constitucional. 2. Fotografia da Família na atualidade: destaque para os principais desafios. 3. A Família rumo ao século XXII. Referências.
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A mulher era considerada colaboradora do marido, detentor
absoluto do poder sobre a família e sobre os filhos, conhecido como pátrio poder.
1. INÍCIO DAS TRANSFORMAÇÕES JURÍDICAS NA FAMÍLIA: UMA ABORDAGEM CONSTITUCIONAL
N
ão há como iniciar qualquer abordagem sobre a
família contemporânea sem ressaltar a importância que a Constituição Federal de 1988 tem para o
direito de família.
Pode-se, sem exageros, afirmar que o direito de família é dividido em duas fases: uma anterior à promulgação do texto
constitucional de 1988 e outra depois de sua vigência.
Os fatores determinantes para tal afirmação são, predominantemente, os dois princípios constitucionais que revolucionaram a interpretação dos dispositivos legais relativos à
família e, por que não dizer, da própria vida em sociedade,
ou seja, a igualdade jurídica de todos os filhos e a igualdade
jurídica entre os cônjuges, fruto do tratamento isonômico
de gêneros.
Vivíamos, até então, em uma sociedade que privilegiava o
filho legítimo em detrimento daquele classificado como ilegítimo, maldosamente chamado de bastardo.
A igualdade, reconhecida constitucionalmente, portanto,
veio para proibir quaisquer espécies de designações discriminatórias quanto aos filhos - havidos ou não da relação
matrimonial - e garantir a isonomia entre homens e mulheres – maridos e esposas.
Porém o texto constitucional foi além. Reconheceu
como entidade familiar a família monoparental1 – formada por um só dos pais com a prole – e, de forma audaciosa para a época, também reconheceu expressamente
como entidade familiar a união estável, união classificada por muitas décadas como concubinária, relação tida
por libertina.
Note-se que, até então, todas as pessoas, ainda que solteiras, que se casavam apenas em cerimônia religiosa ou que
passavam a viver uma vida em comum com alguém não
faziam jus a qualquer proteção do direito de família, que se
atinha apenas ao casamento civil.
Com a abertura constitucional dissolveu-se o gargalo de
exclusão protetiva que se construiu de forma preconceituosa com famílias não matrimoniais, estendendo-se a tutela
do direito de família a esses novos núcleos familiares.
A abertura constitucional, porém, exigia detalhamento legal
que viria anos mais tarde com as Leis 8.971/94 e 9.278/96
que disciplinaram os direitos das pessoas que viviam em
uniões estáveis.
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Observe-se que as referidas leis entraram em vigor seis e
oito anos após a Constituição Federal de 1988, fato que
gerou inúmeras complicações pela falta de disciplina legal
específica para as uniões estáveis por quase uma década.
As próprias leis em comento, é de se ressaltar, também acabaram por trazer alguma confusão, especialmente quanto
às exigências de tempo de relacionamento e desimpedimento das partes envolvidas nas uniões, requisitos para
que fossem concedidos os direitos nelas previstos.
Embora tenha havido acertos e desacertos ao longo dos
anos em matéria de previsão legislativa, é inconteste o
avanço que se iniciou com as previsões constitucionais,
fato que possibilitou novas aberturas, outras interpretações
doutrinárias e jurisprudenciais do conceito de família, ensejando a atual, e por vezes polêmica, concepção que se tem
da família na contemporaneidade.
2. FOTOGRAFIA DA FAMÍLIA NA ATUALIDADE: DESTAQUE PARA OS PRINCIPAIS DESAFIOS
Para analisarmos a família contemporânea e alguns de seus
desafios no âmbito legislativo e social, fazemos, inicialmente,
uma reflexão sobre o papel dos tribunais em matéria complexas, ou em casos classificados como de difícil solução.
Muitos dos temas afeitos ao direito de família foram, são
e serão sempre polêmicos, pois acabam por afetar não só
convicções pessoais e morais, mas também religiosas de
toda a sociedade, o que os eleva à categoria de assunto de
interesse nacional, pautando, muitas vezes, debates políticos, mormente em época de campanhas eleitorais.
Se pensarmos na possibilidade de dissolubilidade do casamento permitida pela a Emenda Constitucional n. 9/77, na
aprovação da Lei do Divórcio - Lei n. 6.515/77 - e no reconhecimento da união estável como entidade familiar pela
Constituição Federal de 1988 teremos alguns exemplos de
alterações legislativas que movimentaram não só o mundo
jurídico, mas toda a sociedade.
Embora atualmente a discussão tenha pairado sobre outras
matérias, o fato é que a polêmica continua a ser vivenciada
no âmbito jurídico, político e social, como se pôde evidenciar com o julgamento do Supremo Tribunal Federal quanto
à possibilidade de reconhecimento das uniões homoafetivas como uniões estáveis.
Por muitos anos, parte da doutrina expôs o argumento de
que as uniões homoafetivas “possuem o mesmo elemento
valorativamente protegido nas uniões heteroafetivas, que é
o amor que vise a uma comunhão plena de vida e interesses, de forma pública”2, portanto, merecendo a proteção
integral do direito de família.
Em maio de 2011, a questão foi definitivamente julgada pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal3 que, ao acompanharem o voto do Ministro relator Ayres Britto, entenderam
que se deveria dar interpretação conforme a Constituição
Federal para excluir qualquer significado do artigo 1.723 do
Código Civil que impedisse o reconhecimento da união de
pessoas do mesmo sexo como entidade familiar, afirmando que o artigo 3.º, inciso IV, da Constituição Federal veda
qualquer discriminação em virtude de sexo, raça e cor e
que qualquer depreciação da união estável homoafetiva colidiria com esse mandamento constitucional.
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Após a posição firmada na Suprema Corte, a matéria alcançou o Superior Tribunal de Justiça que entendeu pela possibilidade de conversão das uniões estáveis homoafetivas
em casamento4.
Na sequência, algumas Corregedorias5, por provimentos, passaram a permitir o casamento civil de pessoas do
mesmo sexo, prática que culminou na Resolução n. 1756
do Conselho Nacional de Justiça - CNJ, de 14 de maio de
2013, que, em seu artigo 1.º prevê: É vedada às autoridades
competentes a recusa de habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas de mesmo sexo.
Pois bem, como se pode depreender dos fatos acima, o início do reconhecimento da possibilidade de casamento entre pessoas do mesmo sexo foi dado pelo poder judiciário,
situação absolutamente comum em questões polêmicas
envolvendo o direito de família, seja pela dificuldade que
representam os temas a serem discutidos no Congresso
Nacional, seja pela morosidade da pauta do processo legislativo que não acompanha o ritmo das mudanças sociais
no âmbito familiar.
A questão a ser destacada em matéria de direito de família
é o fato de que, em um primeiro momento, os entendimentos são firmados pelo judiciário, criando-se os precedentes que, por seu turno, acabam sendo o norte para outras
questões fáticas semelhantes, situação que demonstra a
inversão do sistema de civil law para common law7.
As uniões homoafetivas, porém, não são as únicas que têm pautado as discussões acerca do retrato da família contemporânea.
Desde agosto de 2012, por força de escritura pública
lavrada em cartório de notas na cidade de Tupã, no interior do Estado de São Paulo, a família poliamorosa
passou a ser tema recorrente em discussões jurídicas
e acadêmicas.
A escritura feita por três pessoas que declararam viver em
união estável ensejou debates sobre monogamia, fidelidade
e estabilidade conjugal.
Segundo Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho,
“o poliamor ou poliamorismo, teoria psicológica que começa a descortinar-se para o Direito, admite a possibilidade
de coexistirem duas ou mais relações afetivas paralelas, em
que os seus partícipes conhecem-se e aceitam-se uns aos
outros, em uma relação múltipla e aberta”8.
A nosso ver, se pensarmos nessa relação múltipla e aberta
e entendermos que a autonomia da vontade deverá superar
qualquer determinação legal que convencione a monogamia, como se depreende do dever expresso de fidelidade
– previsto no artigo 1.566, I do Código Civil -, devemos também idealizar um sistema coerente sobre, por exemplo, o
dever de mútua assistência entre os envolvidos e seu desdobro em alimentos, sobre a presunção de paternidade e
maternidade, que passaria a ser, também, plúrima, dentre
outros inúmeros efeitos dessa não tão nova relação na esfera social, mas ultra-moderna relação no âmbito jurídico,
chamada de relação poliamorosa.
Enfim, se, para muitos, estas reflexões já ultrapassaram o
limite do conceito progressista de família, não podemos
deixar de esclarecer que há muito mais a ser analisado.
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A realidade que envolve os transexuais, por exemplo, que
passam por cirurgia de readequação de sexo e conseguem
judicialmente a alteração de seus assentos de nascimento
está longe de ser pacífica no âmbito do direito de família.
Algumas indagações podem esboçar a complexidade da
questão. Há que se estabelecer, por exemplo, se poderá se
impor obrigação legal para o transexual revelar sua origem
biológica ao se relacionar com alguém? Caso seja afirmativa
a resposta, qual seria o momento? Pode o Estado autorizar
a alteração de assento de nascimento e depois permitir a
anulação de casamento por erro essencial quanto à pessoa
do cônjuge pelo fato de não ter sido revelada a identidade
sexual de uma das partes? Não seria um contrasenso?
Essas são perguntas ainda sem respostas que demandam
um debate aberto e sensato pela sociedade, a fim de que
seja estabelecida a tutela oportuna para todos os envolvidos.
Roberto Senise Lisboa, ao analisar a família moderna conclui que “a família não se resume mais ao casamento e à
prevalência dos poderes e direitos do chefe da família sobre
os demais integrantes. A maior dinamicidade das atividades
do homem, da mulher e dos filhos confere um novo papel
social a cada um desses agentes” 9.
deríamos deixar de analisar a questão da reprodução humana assistida.
Cumpre destacar que as técnicas de reprodução humana
assistida são terapêuticas e podem auxiliar pessoas que
sofrem de esterilidade ou infertilidade11.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária estima em 120 o
número de clínicas existentes no país, mas apresenta como
cadastradas no SisEmbrio – Sistema Nacional de Produção
de Embriões - apenas 9312.
Com esse dado já podemos notar que quase 25% das clínicas funcionam sem qualquer fiscalização por parte dos
órgãos governamentais, mas o problema é bem maior do
que o da falta de fiscalização.
As técnicas de reprodução humana por fertilização in vitro são utilizadas no mundo desde 1978 e no Brasil desde
198413, mas somente com o Código Civil de 2002 é que os
filhos gerados com o emprego dessas técnicas foram reconhecidos como filhos por presunção. Vejamos:
Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:
(...) III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo
O autor conclui que “o direito matrimonial, o direito parental
e o direito assistencial, assim, devem se fixar no princípio
da solidariedade das relações familiares”10, princípio que,
a nosso ver, ao lado da afetividade, vem pautando as relações familiares hodiernamente.
que falecido o marido;
IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial
homóloga;
V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde
que tenha prévia autorização do marido.
Por fim, nessa fotografia da família na atualidade não po-
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Como se pode depreender da leitura do artigo acima, os
filhos havidos das técnicas reprodutivas, leia-se - inseminação ou fecundação – são filhos por presunção, contudo, a
tutela legal da filiação havida com a utilização de técnicas
de reprodução humana se encerra com este artigo, ou seja,
não há qualquer previsão legislativa quanto aos efeitos jurídicos do uso e aplicação das técnicas médicas, tanto no
aspecto da relação médico-paciente, quanto sob a ótica
dos direitos dos filhos no âmbito das relações civis, familiares e sucessórias.
Questões como as que envolvem o controle na utilização
de material genético de doador, para que sejam evitados futuros casamentos entre pessoas biologicamente próximas,
como irmãos, por exemplo, é uma das tantas polêmicas
que cercam o tema.
A possibilidade - ou não - da utilização do útero de terceira
para a gestação de embrião também carece de disciplina
legal, sendo permitida, atualmente, apenas por Resolução
Médica emanada do Conselho Federal de Medicina – Resolução n. 2013/201314, que estabelece diretrizes éticas a
serem seguidas pela classe médica.
O destino a ser dado aos mais de 180 mil embriões15 criopreservados também não foi determinado por lei, matéria
que, anos atrás, foi discutida em audiência pública no Supremo Tribunal Federal em julgamento que questionava a
constitucionalidade do artigo 5.º da Lei de Biossegurança
– Lei 11.105/2005 que permite o envio de embriões inviáveis ou viáveis, congelados há mais de 3 (três) anos e com
a autorização dos genitores, para pesquisas com células
tronco embrionárias.
Embora a tese da inconstitucionalidade tenha sido derrotada e a possibilidade de pesquisa com embriões excedentários da fertilização in vitro tenha sido confirmada, o destino
dos embriões congelados após a data da entrada em vigor
da referida lei ainda é uma questão em aberto, pois o envio
para pesquisa somente foi permitido para embriões congelados na data da publicação da lei, ou seja, no ano de 2005.
Não há, portanto, permissão legal para que sejam enviados
à pesquisa os embriões congelados após essa data.
O sigilo do doador versus o direito à identidade genética do
filho nascido com utilização de material genético de terceiros e os direitos sucessórios dos filhos nascidos post mortem são outros dois exemplos de situações também ainda
não disciplinadas.
Abordamos na obra Estatuto da Reprodução Assistidade problemas a serem solucionados em matéria
de reprodução humana. Por força dessa pesquisa fomos
convidados pela Comissão de Biotecnologia e Estudos
sobre a Vida da OAB/SP, sob a Presidência do Professor
Doutor Rui Geraldo Camargo Viana, a elaborar um anteprojeto de lei que pudesse ser apresentado à sociedade em consulta pública e, posteriormente, submetido ao
Congresso Nacional.
16dezenas
O Anteprojeto do Estatuto da Reprodução Assistida, aprovado por unanimidade pela referida Comissão, foi disponibilizado para consulta pública por mais de 180 (cento e
oitenta dias) no site da OAB/SP e, após inúmeras contribuições, foi apresentado ao Congresso Nacional pelo Deputado Eleuses Paiva – PSD/SP - PL 4.89217, em 19 de dezembro de 2012 - onde, atualmente, está aguardando análise
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da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da
Câmara dos Deputados.
O fato a ser destacado ao final dessa análise da família contemporânea perpassa, neste momento, pela responsabilidade
do Estado quanto à efetivação de tutelas legais específicas a
fim de pacificar as relações familiares e sociais, não apenas
em tema de reprodução humana assistida, mas também para
todas as outras situações que foram por nós destacadas.
Álvaro Villaça Azevedo, ao analisar o dever de proteção do
Estado, assim conclui:
a maior missão do Estado é a de preservar o organismo familial sobre que repousam suas bases. Cada família que se
desprotege, cada família que se vê despojada, a ponto de
insegurar-se quanto à sua própria preservação, causa, ou
pelo menos deve causar, ao Estado um sentimento de res-
3. A FAMÍLIA RUMO AO SÉCULO XXII
O que esperar, após tudo o que foi analisado, da família
rumo ao século XXII?
Começa-se a nomear a família moderna como família mosaico ou família caleidoscópio, pois, atualmente, as famílias
são formadas por filhos de diversos casamentos que passam
a conviver como se irmãos fossem pela união de seus pais,
por relações que são criadas pela convivência amorosa, chamada de sócio-afetiva, dentre tantas outras possibilidades.
Vislumbramos que teremos, com mais frequência, situações de multiparentalidade, ou seja, de filhos com mais de
uma mãe ou mais de um pai, como forma de reconhecimento de que a realidade deve sobrepor-se a estigmas jurídicos
seculares que, até então, perduraram, mas que começam a
dar sinais de relativização.
ponsabilidade, fazendo-o despertar a uma realidade, que
clama por uma recuperação. O dever de proteção geral aos
indivíduos cabe ao mesmo Estado, que deve intervir, sempre, para coibir os excessos, para impedir a colisão de in-
A abertura jurídica para esses casos já pode ser verificada
no Artigo 1.593 do CC: O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem.
teresses, acentuando a salvaguarda dos coletivos mais do
que dos particulares, para limitar uma liberdade de ação,
para que ela não fira a alheia, ainda mais quando for letal
esse ferimento de quebra de uma estrutura de que dependem todos.18
O dever do Estado, portanto, não deve existir apenas para
que as relações familiares de uma ou algumas famílias sejam pacificadas, mas, sobretudo, para que seja garantida
a harmonização da estrutura social que depende de suas
células-base, ou seja, as famílias.
O termo outra origem traz a abertura legal para o reconhecimento de que a antiga família que costumávamos ver nos
porta-retratos, formada por pai-mãe e filhos poderá ainda
existir, mas compartilhando espaço com outras não tão
tradicionais, mas plenas de significado se as entendermos
como núcleos familiares afetivos.
Nesse sentido, Rolf Madaleno traz outros exemplos que
ressaltam o peso factual e jurídico do afeto nas relações
familiares:
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a maior prova da importância do afeto nas relações humanas está na igualdade da filiação (art. 1.596, CC), na maternidade e paternidade socioafetivas e nos vínculos de adoção, como consagra esse valor supremo ao admitir outra
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo.
Novo Curso de Direito Civil, volume 6: Direito de família –
As famílias em perspectiva constitucional. 2ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2012.
origem de filiação distinta da consanguínea (art. 1.593, CC),
ou ainda através da inseminação artificial heteróloga (art.
1.597, V, CC); na comunhão plena de vida, só viável en-
LISBOA, Roberto Senise. Manual de Direito Civil, v.5: direito de família e sucessões. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
quanto presente o afeto, ao lado da solidariedade, valores
fundantes cuja soma consolida a unidade familiar, base da
sociedade a merecer prioritária proteção
LÔBO, Paulo: Famílias. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
constitucional.19
Completa nosso raciocínio as considerações de Paulo Nader que, ao analisar as influências que sofreram as famílias,
reflete que “o progresso jurídico, diz a experiência, exige
a mudança de certos paradigmas, que fundamentam a legislação distanciada dos anseios sociais. Não há como se
eternizar os velhos paradigmas diante de um mundo novo,
pleno de desafios e de expectativas geradas pela ciência e
tecnologia”20.
Diante da diversidade das situações acima, reprise-se – famílias homoafetivas, poliamorosas, envolvendo transexuais, decorrentes de reprodução humana assistida, concluímos que não mais podemos nos atrelar a conceitos rígidos
que definam parâmetros legais específicos para núcleos
familiares, devendo ser levados em consideração aspectos
mais humanísticos e subjetivos como a solidariedade e o
afeto – razão primeira e maior da vida familiar.
REFERÊNCIAS
MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família. 3ª ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2009.
NADER, Paulo. Curso de Direito Civil, v.5: direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2010.
SCALQUETTE, Ana Cláudia Silva, SCALQUETTE, Rodrigo
Arnoni. Análise Contemporânea da Tutela dos Casos Difíceis: o precedente no direito brasileiro. In 60 Desafios do
Direito: Direito na Sociedade Contemporânea. Coordenadores Ana Cláudia Silva Scalquette e José Francisco Siqueira Neto. São Paulo: Atlas: 2013.
SCALQUETTE, Ana Cláudia Silva. Estatuto da Reprodução Assistida. São Paulo: Saraiva, 2010.
VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da homoafetividade jurídica do casamento civil, da união estável e da
adoção por casais homoafetivos. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2008.
AZEVEDO, Álvaro Villaça. Estatuto da Família de Fato. 3ª
ed. São Paulo: Atlas, 2011.
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Notas
1. Paulo Lôbo relembra que a família monoparental “pode ter causa em ato de vontade ou de desejo pessoal, que é o caso padrão da mãe solteira, ou
em variadas situações circunstanciais, a saber, viuvez, separação de fato, divórcio, concubinato, adoção de filho por apenas uma pessoa”. Famílias. 4ª
ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p.88.
2. VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da homoafetividade jurídica do casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos. Rio
de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2008, p. 224.
3. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=178931>. Acesso em 12 de setembro de 2014. Decisão proferida em julgamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4277 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, ajuizadas,
respectivamente, pela Procuradoria-Geral da República, no dia 22 de julho de 2009, e pelo Governador do Rio de Janeiro – Sérgio Cabral -, em 27 de
fevereiro de 2008.
4. Decisão da 4.ª Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ – REsp. 1183378/RS. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp
?livre=casamento+entre+pessoas+do+mesmo+sexo&&b=ACOR&p=true&t=JURIDICO&l=10&i=2> . Acesso em 12 de setembro de 2014.
5. Por exemplo, a Corregedoria do Tribunal de Justiça de Alagoas, pelo provimento n. 40/2011 da Corregedoria Geral de Justiça do Tribunal de Justiça
de Alagoas – CGJ/TJAL, autorizou o processamento de pedido de casamento entre pessoas do mesmo sexo perante as serventias extrajudiciais. Disponível em: <http://www.tjal.jus.br/corregedoria/?pag=provAno>. Acesso em 12 de setembro de 2014. No mesmo sentido, a Corregedoria do Tribunal
de Justiça de São Paulo, conforme artigo 88 CGJ/TJSP n. 41/2012, determinou que aplicar-se-á ao casamento ou a conversão de união estável em
casamento de pessoas do mesmo sexo as normas disciplinadas nesta seção. Provimento disponível em: <http://www.arpensp.org.br/principal/index.
cfm?tipo_layout=SISTEMA&url=noticia_mostrar.cfm&id=17387>. Acesso em 12 de setembro de 2014.
6. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/images/imprensa/resolu%C3%A7%C3%A3o_n_175.pdf>. Acesso em 12 de setembro de 2014.
7. Cf. SCALQUETTE, Ana Cláudia Silva; SCALQUETTE, Rodrigo Arnoni. Análise Contemporânea da Tutela dos Casos Difíceis: o precedente no direito
brasileiro. In 60 Desafios do Direito: Direito na Sociedade Contemporânea. Coordenadores Ana Cláudia Silva Scalquette e José Francisco Siqueira Neto.
São Paulo: Atlas: 2013, p. 45.
8. GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil, volume 6: Direito de família – As famílias em perspectiva constitucional. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 465.
9. LISBOA, Roberto Senise. Manual de Direito Civil, v.5: direito de família e sucessões. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 11-12.
10. Ibidem, p. 12.
11. Esterilidade indica a incapacidade de se iniciar uma gravidez e infertilidade é a incapacidade de ter filhos vivos e em condição de sobreviver.
12. Segundo dados disponíveis no site do Portal ANVISA. Acesso em 12 de setembro de 2014. <http://portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/ce47db004464c8c28cfbed6f58f405d3/7_relatorio+%282%29.pdf?MOD=AJPERES>.
13. Cf. SCALQUETTE, Ana Cláudia Silva. Estatuto da Reprodução Assistida. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 21-22.
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14. Disponível em: <http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/CFM/2013/2013_2013.pdf>. Acesso em 12 de setembro de 2014.
15. Dados obtidos nos 7 (sete) relatórios da SisEmbrio, publicados pela ANVISA, disponíveis em: <http://portal.anvisa.gov.br/wps/portal/anvisa/anvisa/
home/sanguetecidoorgaos/!ut/p/c4/04_SB8K8xLLM9MSSzPy8xBz9CP0os3hnd0cPE3MfAwN3f1dLA0__IEvLUE9DYwMDc_2CbEdFAPf30UY!/?1dmy&u
rile=wcm%3Apath%3A/anvisa+portal/anvisa/inicio/sangue+tecidos+e+orgaos/publicacao+sangue+tecidos+e+orgaos/relatorios+sisembrio+-+sistema
+nacional+de+producao+de+embrioes+1>. Acesso em 12 de setembro de 2014.
16. SCALQUETTE, Ana Cláudia Silva. Estatuto da Reprodução Assistida. São Paulo: Saraiva, 2010.
17. Vide <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=564022>. Acesso em 12 de setembro de 2014.
18. AZEVEDO, Álvaro Villaça. Estatuto da Família de Fato. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2011, p. 213.
19. MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família. 3.ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 65.
20. NADER, Paulo. Curso de Direito Civil, v.5: direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 17.
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