ISBN 978-85-8015-053-7 Cadernos PDE VOLUME I I Versão Online 2009 O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE Produção Didático-Pedagógica DADOS DE IDENTIFICAÇÃO PROFESSORA PDE: Antonia Leoni Kozanda Silva ÁREA PDE: Língua Portuguesa NRE: Curitiba PROFESSOR ORIENTADOR IES: Profº Dr. Juarez Poletto IES VINCULADA: Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR ESCOLA DE IMPLEMENTAÇÃO: Colégio Estadual Hasdrubal Bellegard. EFM. PÚBLICO OBJETO DA INTERVENÇÃO: Alunos das séries finais do ensino fundamental TIPO DE PRODUÇÃO DIDÁTICO-PEDAGÓGICA: Unidade Didática TÍTULO DA PRODUÇÃO DIDÁTICO-PEDAGÓGICA: Como trabalhar a leitura literária nas séries finais do ensino fundamental 6 1 APRESENTAÇÃO A presente unidade didático-pedagógica é parte integrante do projeto do Plano de Desenvolvimento Educacional - PDE, da Secretaria da Educação do Paraná, em desenvolvimento na sua terceira edição. Ao longo desta unidade pretende-se oferecer possibilidades para que se promova a leitura literária como um compromisso que deve ser assumido por toda a sociedade, mas principalmente pela escola em parceria com a família. Para isso devem-se criar condições para que a escola e a biblioteca desenvolvam atividades que despertem o interesse pelo livro e assim despertar o prazer de ler. O professor ocupa um papel fundamental como aquele que conduz o aluno ao mundo da leitura e literatura. Para ler é preciso gostar de ler: Esse é um objetivo: sabemos que a leitura é uma forma altamente ativa de lazer. Em vez de propiciar, sobretudo repouso e abnegação (daí massificação), como ocorre em formas passivas de lazer, a leitura exige um grau maior de consciência e atenção, uma participação afetiva do recebedor leitor. Seria, pois, muito importante que a escola procurasse desenvolver no aluno formas ativas de lazer, aquelas que tornam o indivíduo crítico, mais consciente e produtivo. (CUNHA, 1985, p.40) Devido a toda tecnologia existente nos dias atuais, faz-se necessário um trabalho diversificado e criativo para atrair os alunos para as leituras diversas. Muitos alunos estão chegando ao ensino médio com uma grande deficiência na leitura e na interpretação. Essa deficiência, muitas vezes, deve-se ao fato de os professores de Português não estarem priorizando a leitura e sim a gramática normativa. Além disso, muitos professores colocam a literatura em suas aulas de maneira autoritária, fazendo com que seus alunos sejam obrigados a ler determinados livros indicados pelo professor, sem levar em conta o seu gosto, a sua idade, o seu nível, etc. Isto faz com que se crie um distanciamento em relação à literatura. Além de todas essas dificuldades, muitos alunos não têm condições de adquirir livros. A única opção de leitura que tem é na escola e muitas vezes esta oportunidade não é dada, já que o professor tem que cumprir todo o seu cronograma com teorias e normas gramaticais, deixando para segundo plano a leitura literária. A criança, quando não lê, depende exclusivamente da voz adulta para que fique informada. A habilidade de ler é o primeiro passo para a conquista da 7 liberdade. ―Leitura e escola talvez devam recorrer à literatura para retomar o seu rumo e reavaliar seus respectivos propósitos. (ZILBERMAN, 2009, p. 29). A biblioteca assume um papel de suma importância para a promoção da leitura, pois é um local que para muitos se configura como a única oportunidade de ter contato com livros que não são didáticos. Por isso este local deve ser um ambiente dinâmico e acolhedor. Outro fator importante que deve ser levado em conta é a integração dos pais neste processo de leitura. É necessário que todos estejam comprometidos com a formação do leitor para que ele se torne capaz de se posicionar diante dessa realidade tão diversificada de maneira crítica. Silva (1983, p. 59) afirma que ―é infantilidade atribuir exclusivamente à escola a culpa pela não formação de leitores‖. 8 2 DESCRIÇÃO DE AÇÕES 2.1CONHECENDO A BIBLIOTECA DA ESCOLA Esta unidade propõe-se a despertar o valor que a biblioteca exerce no espaço escolar, promovendo ações em sala que estimulem o seu uso. Serão sugeridas atividades com a finalidade de romper com a visão de que ela é apenas um anexo da escola. Para isso é necessário o apoio da bibliotecária e o resgate da real função da biblioteca dentro da escola, transformando-a num ambiente dinâmico e acolhedor. Quem atua na escola percebe o distanciamento dos alunos em relação aos livros e a dificuldade de fazer entender a necessidade da leitura para a aprendizagem, proporcionando o livre acesso de forma dinâmica e interativa. Algumas sugestões de atividades para serem desenvolvidas na biblioteca com alunos das séries finais do ensino fundamental: Agendar momentos para que os alunos conheçam as regras de funcionamento. Levantamento e organização do acervo bibliográfico de acordo com o interesse, a idade e o sexo dos grupos de alunos. Leitura das sinopses das obras com a ajuda da bibliotecária e da professora. Seleção dos gêneros textuais e das prioridades pelos alunos: poemas, contos, crônicas, narrativas, etc. Elaborar fichas com perguntas ao aluno, constando sua opinião de leitura e colocar em edital os livros mais lidos durante o mês. 9 2.2 DESPERTANDO O INTERESSE PELA LEITURA ● O professor deverá fazer uma pesquisa sobre o interesse dos alunos por textos literários. A partir daí realizar a seleção dos textos, levando em consideração o seu interesse, a idade, o sexo e o nível sócio-econômico. Os textos devem atingir em cheio suas expectativas. Em seguida é preciso apresentar sugestões de leitura a serem feitas em sala de aula e também em casa, além de proporcionar debates e outras atividades de forma dinâmica voltados para a realidade do aluno. Desse ponto em diante, os alunos serão instigados a procurar obras literárias que extrapolem os limites até então alcançados, a fim de prosseguirem como leitores livres, capazes de escolhas motivadoras. ● Confeccionar um mural ou cartaz com frases que chamem a atenção sobre a importância da leitura e de utilizar a biblioteca. ● Escolher um autor, pesquisar sua vida e obra, elaborar cartazes que ficarão expostos. ● Incentivar a leitura de autores locais e contemporâneos, convidando-os para debates, entrevistando-os, a fim de estimular a interação entre autores e leitores. 10 2.3 EXPERIMENTAÇÃO DE LEITURAS LITERÁRIAS EM SALA DE AULA ● Apresentação do livro pelo professor: O professor lê o livro em voz alta na sala para os alunos, motivando-os a descobrirem o gosto pela leitura. No início os alunos podem ficar agitados, mas não se pode desistir, é preciso continuar lendo calmamente até que os alunos acostumem e tomem gosto pela leitura. ● Proporcionar aos alunos um momento na aula para que eles possam comentar sobre o que estão lendo, apresentar o livro, o autor preferido, o que mais lhes chamou atenção na história, fazendo assim a propaganda do livro. ● Também poderá ser aplicada a seguinte dinâmica: o professor indica um livro para cada fila. O primeiro aluno da fila leva o livro para casa e lê parte dele. Na semana seguinte conta para os demais alunos o que leu e o segundo da fila leva para continuar lendo a história em casa e contar na semana seguinte, e assim sucessivamente até terminar a história. ● Leitura silenciosa: enquanto os alunos leem silenciosamente, o professor também deve ler, deixando as atividades pedagógicas para depois. O professor está em aula e deve ser o exemplo. ●Os professores precisam se envolver com os textos e obras escolhidas. ―Simplesmente mandar o aluno ler é bem diferente do que envolvê-lo significativa e democraticamente nas situações de leitura, a partir de temas culminantes‖, afirma SILVA, 1991, p. 49. ● É importante o uso do dicionário nas aulas de leitura. Muitas vezes a leitura se torna incompreensível por não se conhecer o significado de algumas palavras. ● Os assuntos mais pertinentes das leituras devem gerar debates que visem a relações interdisciplinares e transdisciplinares. A leitura também deve ter sentido útil para outras disciplinas, a fim de se poder contar com outros professores na sua difusão e destaque de sua importância. ● Diversificar a forma de o aluno apresentar suas leituras com dramatizações, murais, contação das histórias, criação de desenhos, pinturas, revistas em quadrinhos, etc. 11 2.4 INTEGRAÇÃO DA COMUNIDADE ESCOLAR E PAIS NA ÁREA DA LEITURA ● Se for possível, será útil providenciar uma sala de leitura. ● Uma vez por mês convocar os pais para irem até a escola. Neste momento, apresentar as atividades desenvolvidas: exposição dos textos, desenhos, contação de histórias. A família terá motivos para perceber o crescimento de seus filhos nos estudos e sentirá orgulho do que fazem e, quem sabe, alguns desses pais possam também se tornar leitores. ● Propor aos pais que presenteiem seus filhos com livros como se fossem brinquedos. 12 UNIDADE 01 “OS ANSEIOS E AS DIFICULDADES NA ADOLESCÊNCIA” 3 SUGESTÕES DE LEITURAS ―Coisas que eu não agüento: qualquer forma de injustiça ou prisão e gente que quer cortar a alegria dos outros‖ (Ana Maria Machado) 3.1 ANA MARIA MACHADO 3.1.1 Biografia Autora de quase duzentas obras, publicadas em dezessete países, Ana Maria Machado ganhou o prêmio Hans Christian Andersen, o mais importante da literatura infantil no mundo, em 2000. No ano seguinte a Academia Brasileira de Letras lhe deu o maior prêmio literário nacional, o Machado de Assis, pelo conjunto da obra. Foi eleita para a cadeira número 1 da ABL em 2003. 13 Nascida no Rio de Janeiro, em 24 de dezembro de 1942, Ana formou-se em Letras e trabalhou como pintora, professora e jornalista antes de dedicar-se inteiramente à literatura infanto-juvenil, a partir de 1980. A escritora havia sido presa pelos militares durante a ditadura, tendo vivido exilada na Europa de 1969 a 1972. http://www.ftd.com.br/v4/Biografia.cfm?aut_cod=530&tipo=A Algumas de suas obras: Amigos secretos, Isso ninguém me tira, Bisa Bia e Bisa Bel, Ponto a Ponto, O Canto da Praça, Dona Baratinha, Beijos Mágicos, Gente bem diferente, entre outras... 3.1.2 Livro: ―ISSO NINGUÉM ME TIRA‖ Ana Maria Machado As expectativas e as dificuldades de uma jovem, que luta para realizar seus sonhos, são retratadas em toda sua profundidade por esta escritora internacionalmente consagrada. Mas também podemos perceber que nem só de problemas vive a adolescência. Para saber mais sobre o livro acesse o link: http://someteenbooks.wordpress.com/2007/12/28/isso-ninguem-me-tira-ana-mariamachado-19dez2006/ 3.1.3 Teatrinho de Bonecos de Massinha, Cena do Livro ―ISSO NINGUÉM ME TIRA‖ http://www.youtube.com/watch?v=-1PS1MRBAOg 3.1.4 Isso Ninguém Me Tira Imagine que você comece a gostar de alguém. E essa é justamente a paixão de uma pessoa muito amiga sua. Mas isso não é tudo. Pense ainda que a pessoa de 14 quem você gosta também gosta de você. Como é que fica a situação entre os três? Para complicar, suponha que existe um parentesco entre a concorrência e você. Que caso complicado! Continue lendo a história para descobrir o que aconteceu! Como tudo começou VERSÃO DA GABI Logo da primeira vez que eu vi o Bruno, soube que era o cara mais lindo que eu já tinha visto na minha vida. Foi só bater os olhos nele de longe, andando pela praia devagar em direção a nós duas. Não precisou mais. Um gato. Desses de deixar a gente meio sem fala. Não precisava esforço nenhum para ver que ele era demais. Mas o que não dava para saber assim logo, naquele instante, era que eu já sabia tudo da vida dele. Ou, pelo menos, um monte de coisa. O nome e o sobrenome. O colégio onde ele estudava. A rua onde morava. Que tinha – ainda tem, e acho melhor falar de tudo isso no presente – um irmão chamado Felipe e uma irmã de uns oito anos chamada Cláudia. Que o pai dele é italiano e a mãe é de Mato Grosso. Que ele tem uma bicicleta. Que estuda inglês num curso lá perto da casa da minha tia Carmem. Que joga basquete no clube e treina todo dia no fim da tarde. Que odeia dançar e nunca vai a nenhuma festa. Que nunca leva lanche de casa e todo dia come cachorro-quente com refrigerante na cantina do colégio. Que não tem namorada. Que tudo quanto é menina vive apaixonada por ele. Principalmente a minha prima Dora. Mais que minha prima, minha melhor amiga. Aquela amigona pra quem a gente conta tudo. Aquela pessoa com quem eu sei que posso contar para tudo. A qualquer momento. Por causa dela é que eu sabia tudo do Bruno. Menos a cara que ele tinha. Só faltava encontrar em pessoa. Acho que, desde que ela veio de Livramento para estudar na nossa cidade e foi morar em casada tia Carmem, a gente se falava ao telefone todo dia e se encontrava sempre que podia. E toda vez ela falava no Bruno. Foi assim que eu fiquei sabendo tanta coisa dele. 15 No começo, a gente nem sabia muita coisa. Ela só falava nele como ―o menino do sinal‖. Porque ele tem um sinal incrível no rosto, uma pinta bem pretinha, pouquinho acima do lado esquerdo da boca. E tem cabelo preto bem liso, comprido, sempre caindo na cara, e ele tem que jogar para trás com um gesto lindo da cabeça, que ele faz toda hora. E o nariz? Sabe o que é perfeito? Pois é, o dele é. Retinho, nem grande nem pequeno, parece desenhado. Nunca vi igual. Os olhos são meio rasgados, mas grandes. E bem pretos. E parecem que chamam mais a atenção porque os olhos são muito marcados, dão destaque – as maçãs do rosto saltadas, o queixo muito definido, meio quadrado. Os dentes são certinhos, sem nem precisar de aparelho, e se mostram num sorriso muito branco, por causa da pele. Ah, a pele morena é morena mesmo, bronzeada naturalmente. E ainda fica mais dourada pelo sol, claro. Parece um índio. Daqueles bem lindos, de filme, tipo ―último dos moicanos‖. No meio de todos aqueles surfistas louros que passam carregando as pranchas, ele é o único morenão. Está bem, exagerei. O único, não. Está cheio de menino de cabelo preto. Mas nenhum lindão como o Bruno. O tal ―menino do sinal‖. Um sinal aberto, pedindo para avançar. Minha prima Dora tinha toda razão. Aos poucos, ela foi descobrindo mais coisas sobre ele. E foi contando. Para mim e para a torcida do Flamengo – como diz meu pai. Mais a do Vasco, do Corinthians, de tudo quanto é time. Todo mundo na família sabia da paixão dela pelo Bruno – tias, tios, primos, avós, madrinhas, amigas da vizinha, acho que até o papagaio da área já devia ter aprendido a repetir ―Bruno! Bruno!‖. Às vezes eu ficava até com uma espécie de vergonha, porque eu sou muito diferente. Minha mãe diz que eu tenho mania de segredo. Mas não é verdade. Só que eu não gosto que fiquem sabendo da minha vida, não saio por aí contando tudo, que nem a Dora. [...] (Ana Maria Machado – Isso ninguém me tira. São Paulo: Ática) 16 ―Quando se ama não é preciso entender o que se passa lá fora, pois tudo passa a acontecer dentro de nós‖. (Clarice Lispector) 3.2 CLARICE LISPECTOR 3.2.1 Biografia De origem judaica, seu nascimento ocorreu em Chechelnyk, enquanto percorriam várias aldeias da Ucrânia. Clarice Lispector começou a escrever logo que aprendeu a ler na cidade do Recife, onde passou parte da infância. Falava vários idiomas. Faleceu no dia 9 de dezembro de 1977, um dia antes de seu 57º aniversário. ● Para saber mais sobre Clarice Lispector acesse o link: http://www.releituras.com/clispector_bio.asp Algumas obras: A hora da estrela, A bela e a fera, Um sopro de vida, O primeiro beijo e outros contos, Felicidade clandestina, Laços de família, A descoberta do mundo, entre outros... ―Escrevi livros que fizeram muitas pessoas me amar de longe‖. (Clarice Lispector) 17 3.2.2 Livro: ―O PRIMEIRO BEIJO E OUTROS CONTOS‖ Clarice Lispector Doze textos magníficos em que, a partir de histórias do cotidiano, se mergulha nas profundezas do ser. 3.2.3 O Primeiro Beijo Os dois mais murmuravam que conversavam: havia pouco iniciara-se o namoro e ambos andavam tontos, era o amor. Amor com o que vem junto: ciúme. - Está bem, acredito que sou a sua primeira namorada, fico feliz com isso. Mas me diga a verdade, só a verdade: você nunca beijou uma mulher antes de me beijar? Ele foi simples: - Sim, já beijei antes uma mulher. - Quem era ela? perguntou com dor. Ele tentou contar toscamente, não sabia como dizer. O ônibus da excursão subia lentamente a serra. Ele, um dos garotos no meio da garotada em algazarra, deixava a brisa fresca bater-lhe no rosto e entrar-lhe pelos cabelos com dedos longos, finos e sem peso como os de uma mãe. Ficar às vezes quieto, sem quase pensar, e apenas sentir – era tão bom. A concentração no sentir era difícil no meio da balbúrdia dos companheiros. [...] (Clarice Lispector – O primeiro beijo e outros contos) http://contosdocovil.wordpress.com/2008/05/19/o-primeiro-beijo/ 18 Todo adolescente tem sonhos, busca a felicidade, enfrenta momentos de surpresa, dor, descobertas e esperança na vida 3.3 IVAN ÂNGELO 3.3.1 Biografia Um dos destaques da nova geração de escritores brasileiros. Jornalista e autor de livros premiados, contista de mão cheia. Sua linguagem é clara, coloquial, mas extremamente poética. Nasceu em 1936 e é mineiro de Barbacena. Alguns livros do autor: Duas faces, A festa, A casa de vidro, A face horrível, O comprador de aventuras e outras crônicas, O ladrão de sonhos e outras histórias, O vestido luminoso da princesa, entre outros. 3.3.2 O livro: ―O LADRÃO DE SONHOS E OUTRAS HISTÓRIAS‖ Reúne histórias deliciosas que agradam o leitor de qualquer idade porque captam, com muita sensibilidade, momentos de surpresa, dor, esperança na vida de pessoas como qualquer um de nós. 3.3.3 O ladrão de sonhos - O Gênio. Você ainda não sabe nem a metade das coisas que eu sei sobre ele, nem a metade. Não é porque eu fiquei de rolo com ele, namoro, sei lá. Conheço o Gênio desde menino. Sabe como que ele ganhou esse apelido? Desde bebê. Não, não foi 19 porque ele falou aos seis meses de idade, não. Isso já é lenda. É verdade que ele falou, mas o apelido veio foi do segundo nome dele, Eugênio. Pois é ninguém sabe que ele se chamava Carlos Eugênio. O pai tirou o Eugênio, quando ele tinha oito anos, por causa da numerologia, do número de letras do nome. Superstição. É comum maluco ter filho gênio. Foram outros lances que firmaram o apelido dele. Ele jogou xadrez aos três anos, consertou um telefone aos seis, lia revistas de informática e vídeo como outros meninos liam gibi, passava na escola com dez em todas as matérias científicas e matemáticas, estudou e entendia todo o sistema de medicina computadorizada da clínica neurológica do pai dele aos doze anos, criava programas de computador aos quatorze, montava micros aos quinze, criava chips aos dezesseis e sistemas integrados de multimídia aos dezoito. Gênio mesmo. - Já ouviu falar da máquina dos sonhos que ele inventou? Claro, claro, a sua reportagem é sobre isso. Tem muita história em torno dessa máquina, mas eu sei os fatos. Como começou e como acabou. Ninguém sabe, por exemplo, por que ele quis criar esse negócio. - Não, não. Há muita lenda misturada nessa história. O Gênio nunca admitiu, nunca aceitou que alguém soubesse ou pudesse alguma coisa mais do que ele, no plano intelectual. Tirando a bicicleta dele, se lixava de não ser bom em esportes. Agora, qualquer habilidade maior dos outros na área mental perturbava ele. Foi isso que aconteceu com os sonhos. - Conto. Uma vez a gente, a turma do último ano do colégio, meninas e meninos, a gente alugou uma casa de férias em Ubatuba por uma semana, para zonear um pouco. Uma noite todo mundo ficou em casa tomando tequila com limão e açúcar, esparramados pelo chão, no escuro, e deu uma de contar sonhos. Um contava, outro contava, apareceu cada sonho mais interessante do que o outro, e ele mudo. Eu estava do lado dele, com a cabeça no colo de um menino com quem eu tinha ficado, e batia uma luz fraquinha de lua minguante na cara dele, do Gênio. Aí eu vi que ele foi ficando quieto, nervoso, e percebi que ele estava com medo de chegar a hora dele. Bateu aquela maldade de adolescente e eu falei: ―E você, Gênio, não vai contar nada? Deve ter cada sonho genial.‖ [...] (Ivan Ângelo –O ladrão de sonhos e outras histórias. São Paulo: Ática) 20 ―Mas eu desconfio que a única pessoa livre, realmente livre, é a que não tem medo do ridículo‖. (Luis Fernando Veríssimo) 3.4 LUIZ FERNANDO VERÍSSIMO 3.4.1 Biografia Nasceu em 26 de setembro de 1936, em Porto Alegre, RS. Filho do grande escritor Érico Veríssimo, iniciou seus estudos no Instituto Porto Alegre, tendo passado por escolas nos Estados Unidos quando morou lá, por dois anos. Com dezesseis anos voltou a morar nos Estados Unidos, onde também estudou música. Escritor prolífero é de sua autoria, dentre outros: O nariz e outras crônicas, A grande mulher, O analista de Bagé, O santinho, O gigolô das palavras, Zoeira, Sexo na cabeça... 3.4.2 O livro: ―O NARIZ E OUTRAS CRÔNICAS‖ Com seu humor sutil e sua linguagem deliciosa, o autor revela em cada história um lado engraçado da vida. 3.4.3 O nariz Era um dentista, respeitadíssimo. Com seus quarenta e poucos anos, uma filha quase na faculdade. Um homem sério, sóbrio, sem opiniões surpreendentes mas uma sólida reputação como profissional e cidadão. Um dia, apareceu em casa com um grande nariz postiço. 21 Passado o susto, a mulher e a filha sorriram com fingida tolerância. Era um daqueles narizes de borracha com óculos de aros pretos, sobrancelhas e bigodes que fazem a pessoa ficar parecida com Grou Cho Marx. Mas o nosso dentista não estava imitando o Grou Cho Marx. Sentou-se à mesa do almoço – sempre almoçava em casa – com a retidão costumeira, quieto e algo distraído. Mas com um nariz postiço. - O que é isso? – perguntou a mulher depois da salada, sorrindo menos. - Isso o quê? - Esse nariz. - Ah. Vi numa vitrine, entrei e comprei. - Logo você, papai... Depois do almoço, ele foi recosta-se no sofá da sala, como fazia todos os dias. A mulher impacientou-se. - Tire esse negócio. [...] (Luís Fernando Veríssimo – O nariz e outras crônicas – Para gostar de ler. Ática: São Paulo) 3.5 PAULO VENTURELLI 3.5.1 Biografia Nasceu em Brusque – SC, vive em Curitiba desde a década de 70. Formado em letras, é doutorado e professor da Universidade Federal do Paraná. Autor dos livros: Admirável ovo novo, O anjo rouco, A casa do dilúvio, No vale dos sentidos, etc. 3.5.2 Livro: O anjo rouco Fala de um jovem em busca de si mesmo que vive aventuras, conhece novas emoções e descobre algo importante para sua vida de adolescente. 3.5.3 O anjo rouco A casa era de madeira, grande e escura. A cada ano nascia outro irmão, e meu pai sempre dava um jeitinho de caber mais um. Existia um rio que sempre brincávamos todo dia, se chamava: Itajaí - mirim. Eu tinha quatro irmãos, eu era o mais-velho. Na época das cheias, o azar era que o rio transbordava. Nós ficávamos no sótão esperando a água abaixar, demorava. Quando a coisa ia apertando, a gente 22 passava pra casa de seu Rui, com uma tábua. A casa dele tinha dois andares, pois ele era rico. Meus irmãos e eu roubávamos algumas latas de vez em quando. À noite, quando fomos dormir, de repente fez um barulho. Todos os pais saíram até o portão de suas casas e ficaram escutando. [...] (Paulo Venturelli. O anjo rouco) 3.6 ROBERTO GOMES 3.6.1 Biografia Roberto Gomes nasceu em Blumenau, SC, em 1944 e reside em Curitiba desde 1964. Publicou várias obras: romances, contos, crônicas, literatura infantil, além de traduções. Sua primeira obra foi: Crítica da razão Tupiniquim (1977). Suas obras: Alegres memórias de um cadáver (1979), Antes que o teto desabe (1981), Terceiro tempo de jogo (1985), Os dias do demônio, Carolina do nariz vermelho, Sabrina de Trotoar e de Tacape, Exercício de solidão, O menino que descobriu o sol, etc. O seu romance mais recente é: Todas as casas (2004). 3.6.2 Livro: Terceiro tempo de jogo A fábrica de brinquedos foi fechada e acabaram com o campinho. Edmilson foi embora e Alice veio atrapalhar a cabeça dos garotos. É tempo de guerra total contra o bando do diabólico Luís, o Gordo, que deixou todo mundo pelado e foi embora dando risada. O Estrela tem grandes goleadores, mas o cruel Gordo tem muitos truques. 3.6.3 Terceiro tempo de jogo Todo dia é assim. Mal chegam do colégio, a bola rola solta pelo meio da rua. Bola meio envelhecida, às vezes murcha, talvez remendada. Aos pés de Tiziu, porém, ela é capaz de prodígios. Faz curvas, quica de leve, some entre as pernas do adversário. Desviada com um toque de astúcia, entra malandramente no gol, de mansinho, humilhando o goleiro. Tiziu não tem físico de atleta. É miúdo, frágil – mas é hábil. O maior inventor de dribles e firulas. [...] (Roberto Gomes. Terceiro Tempo de Jogo) 23 4 POESIAS A poesia oferece muitas interpretações, guardam tesouros a serem descobertos. A cada nova leitura de um mesmo poema, encontramos novos significados. 4.1 DÊ ASA A IMAGINAÇÂO LENDO O POEMA A SEGUIR: Eu Eu, eu mesmo... Eu, cheio de todos os cansaços Quantos o mundo pode dar. — Eu... Afinal tudo, porque tudo é eu, E até as estrelas, ao que parece, Me saíram da algibeira para deslumbrar crianças... Que crianças não sei... Eu... Imperfeito? Incógnito? Divino? Não sei... Eu... Tive um passado? Sem dúvida... Tenho um presente? Sem dúvida... Terei um futuro? Sem dúvida... A vida que pare de aqui a pouco... Mas eu, eu... Eu sou eu, Eu fico eu, Eu... (Álvaro de Campos) 4.2 Agora, escute e cante a música ―DAQUILO QUE EU SEI‖ de Ivan Lins /Vitor Martins para trocar impressões sobre os sentidos possíveis expressos pela música. 24 Daquilo que Eu Sei Daquilo que eu sei Nem tudo me deu clareza Nem tudo foi permitido Nem tudo me deu certeza [...] 4.3 Para fazer um levantamento das várias personalidades presentes em um único indivíduo leia com os alunos a crônica “Oito em um” de Carlos Drummond de Andrade. Em seguida estimule uma conversa sobre a presença de muitos ―eus‖ em uma mesma pessoa, deixando que cada um fale o que pensa sobre o assunto. Oito em um - O seguinte. Quero fazer análise de grupo, doutor. Não se preocupe com a formação do grupo. Eu formo sozinho, compreende? Posso contar ao senhor uma pá de infâncias que eu tive, uma pá de vidas que vou levando. Até que essa multiplicidade não me encucava. Quer dizer: até. Pois Fernando Pessoa não era muitos e simultâneos? Quando morreu o Alberto Caeiro, o Álvaro de Campos e o Ricardo Reis, sem falar no Bernardo Soares, continuaram sócio-existindo sem briga, mas comecei a me aborrecer quando os meus diferentes eus entraram a exigir de mim funcionamento sincrônico em lugares distantes uns dos outros. [...] (Carlos Drummond de Andrade – De notícias e não notícias faz-se a crônica, p. 125) 4.4 Leia o poema “Participação” de Guilherme de Almeida. Poderá ser feita uma leitura dramatizada ou jogralizada. Através do título ―Participação‖ levar os alunos a perceberem a ideia de: ação, atividade concreta, ato de partilhar, compartilhar. O primeiro e último verso mostram a impossibilidade de definir cada um dos ―eus‖. Poderá ler novamente o poema ―Eu‖ e ouvir a música ―Aquilo que Eu Sei‖, orientando os alunos para refletirem sobre si mesmos tentando identificar os vários ―eus‖ que existe em cada um de nós. Em seguida, estimule um debate sobre a dificuldade do processo de autoconhecimento. 25 Participação Não sei, mas sou eu. Quem acende as conchas, quem nega a folhagem, quem escuta a poeira, [...] (Guilherme de Almeida – Melhores poemas – seleção Carlos Vogt, p.101) 4.4.1 Após essa atividade cada um escolhe um poema para apresentá-lo à turma em forma de declamação, ou lendo com as devidas entonações rítmicas. Em seguida os alunos em duplas deverão elaborar um poema usando de recursos sonoros que tenham percebido no poema lido e então comparar com o mesmo verificando semelhanças e diferenças. Neste momento espera-se que eles possam então estar com interesse em buscar novas leituras. ―A LEITURA TORNA O HOMEM COMPLETO; A CONVERSAÇÃO TORNA-O ÁGIL; E O ESCREVER DÁ-LHE PRECISÃO.‖ (Sir Francis Bacon, 1561-1626. Filósofo e estadista britânico) 26 5 OUTROS POETAS Pesquise e leia também as obras dos seguintes autores: ● Almir Correia ● Álvares de Azevedo ● Ferreira Gullar ● Glória Kirinus ● João Cabral de Melo Neto ● Mário Quintana ● Olavo Bilac ● Paulo Leminski ● Vinícius de Moraes Esta unidade contém algumas sugestões de leitura, mas cada professor poderá fazer as adaptações de acordo com a realidade de cada turma. 27 6 REFERÊNCIAS AGUIAR,V.; BORDINE, M. G. Literatura a formação do leitor. 2. ed. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1993. ALMEIDA, G. Melhores poemas. 3.ed. São Paulo: Global Editora, 2004. ANDRADE, D, C. De notícias e não-notícias faz-se a crônica. 8.ed. Rio de Janeiro: Record, 2004. CEREJA, W, R. Ensino de Literatura: uma proposta dialógica para o trabalho com literatura. São Paulo: Atual, 2005. CUNHA, A, A, M. Literatura Infantil: teoria e prática. São Paulo: Ática, 1985. DCE –Língua Portuguesa. KLEIMAN, A. Texto e leitor. 12.ed. Campinas, SP: Pontes, 2009. KOCH, I. ; ELIAS, V, M. Ler e compreender os sentidos do texto. 2.ed. São Paulo: Contexto, 2008. LIMA, C, L. A Literatura e o Leitor. 2ª edição revista e ampliada. São Paulo: Paz e Terra, 2002. Literatura Juvenil: levando o jovem a descobrir o mundo. São Paulo: Ática, 1994 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL. Centro de Pesquisas Literárias. Diagnóstico da situação do ensino de 1° e 2° graus em escolas de Porto Alegre, RS. Relatório de pesquisa. Porto Alegre,CPL/PUCRS, 1985. SILVA, T, E. Leitura & Realidade Brasileira. Porto Alegre. Mercado Aberto, 1993 ZILBERMAN, R.; ROSING, T. Escola e leitura: Velha crise, novas Alternativas. 1ª ed. São Paulo, SP: Global Editora, 2009. Disponível em: http://contosdocovil.wordpress.com/2008/05/19/o-primeiro-beijo/ Acesso dia 21/06/2010. Disponível em: http://desbravadordobviocontos.blogspot.com/2009/03/o-nariz-luisfernando-verissimo.html. Acesso dia 28/06/2010. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/P%C3%A1gina_principal. 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