XIX SIMPÓSIO BRASILEIRO DE RECURSOS HIDRÍCOS
AVALIAÇÃO DO MODELO KINEROS2 NA ESTIMATIVA DO
HIDROGRAMA DE PROJETO PARA UMA PEQUENA BACIA
CARACTERÍSTICA DE MATA ATLÂNTICA.1
Fábio Alex Beling2; João Batista Dias de Paiva3; Eloíza Maria Cauduro Dias de Paiva3
Resumo – Este trabalho avalia o desempenho do modelo hidrológico Kineros2 em uma pequena
bacia de 17,7 km² nas cabeceiras do Rio Vacacaí Mirim, em Santa Maria, característica do bioma
Mata Atlântica, na estimativa do hidrograma de projeto. Os parâmetros característicos da bacia,
necessários para a execução do modelo, foram inicialmente estimados a partir de ensaios de
laboratório e de recomendações bibliográficas. Para a calibração dos parâmetros do Kineros2 foram
utilizados 8 eventos observados de precipitação/vazão, obtendo-se índice de eficiência de NashSutcliffe variando entre 0,92 e 0,50, com a vazão de pico variando em média ± 8,3% e o volume
escoado variando ± 14,8%. Na fase de validação, o índice médio de eficiência Nash-Sutcliffe variou
entre 0,93 e -1,63. Já o erro médio na vazão de pico ficou em ± 25,8% e, no volume escoado, ±
12,9%. Com o uso dos parâmetros médios obtidos da fase de calibração, obteve-se o hidrograma de
projeto com recorrência de 100 anos, tomando-se uma precipitação de projeto com igual tempo de
retorno. A vazão de pico do hidrograma para o período de retorno de 100 anos foi de 333 m³/s.
Abstract – This work evaluates the performance of the hydrologic model Kineros2 in a small basin
of 17.7 km² in the headwaters of the Vacacaí Mirim river, Santa Maria, characteristic of Mata
Atlântica biome, in estimating the hydrograph project. The characteristic parameters of the
watershed, necessary to run the model, were initially estimated from laboratory tests and
bibliographical recommendations. For the calibration of Kineros2 parameters, 8 observed
rainfall/flow events were used, resulting in a Nash-Sutcliffe efficiency index ranging between 0.92
and 0.50, with the peak flow ranging in average ± 8.3% and volume ranging ± 14.8%. In the
validation phase, the average Nash-Sutcliffe efficiency index varied between 0.93 and -1.63. The
average error in runoff peak flow was within ± 25.8% and the in the volume, ± 12.9%. Using the
mean parameters obtained from the calibration phase, the design hydrograph with recurrence of 100
years was obtained, taking up a project precipitation with equal return period. The hydrograph peak
flow for the return period of 100 years was 333 m³/s.
Palavras-Chave – Kineros2, modelo hidrológico, hidrograma de projeto.
1
Parte integrante do Trabalho de Conclusão de Curso do primeiro autor sob a orientação do segundo.
Engenheiro Civil, Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil da UFSM, Av. Roraima, Camobi, Santa Maria – DESA /Centro de
Tecnologia, Campus, UFSM. (55) 99997873. [email protected].
3
Eng. Civis, Drs., PQ-CNPq, Professores do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental. Centro de Tecnologia. UFSM. Emails: [email protected]
e [email protected].
2
XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos
1
INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo avaliar o desempenho do modelo hidrológico Kineros2 a uma
pequena bacia característica do bioma Mata Atlântica, situada no sul do Brasil, a fim de simular a
resposta da vazão gerada a partir de precipitações incidentes. A comparação do comportamento
simulado com o comportamento real da bacia, obtido a partir de dados observados, permite a
estimativa de seus parâmetros físicos, possibilitando a predição do hidrograma de projeto para um
determinado período de retorno de interesse.
O Kineros2, acrônimo na língua inglesa para modelo cinemático de escoamento superficial e
erosão, é o aperfeiçoamento do modelo Kineros, apresentado por WOOLHISER et al. (1990).
Trata-se de um modelo hidrológico distribuído, de base física, orientado a evento, que descreve os
processos de interceptação, infiltração, escoamento superficial e erosão em pequenas bacias rurais e
urbanas.
SMITH et al. (1995) referem que o Kineros foi testado em diversas bacias de características
semi-áridas, tendo sido encontrados resultados muito bons para áreas de até 7,6 km².
1
1.1
MATERIAIS E MÉTODOS
Área de Estudo
O presente estudo tem como base a bacia hidrográfica Menino Deus I, com 17,7 km²,
característica do bioma Mata Atlântica, localizada nas cabeceiras da bacia do Rio Vacacaí Mirim,
situada na região central do Estado do Rio Grande do Sul (Figura 1).
O modelo numérico do terreno é apresentado na Figura 2. A cobertura do solo da bacia,
predominantemente de mata nativa (55%), é apresentada na Figura 3, tendo sido obtida a partir de
fotointerpretação de imagens aéreas do ano de 1996, data compatível com a época dos eventos de
precipitação empregados.
Os tipos de solo presentes na bacia, de acordo com AZOLIN e MUTTI apud BRANCO
(1998), estão relacionados na Figura 4.
XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos
2
Figura 1 - Localização da área de estudo.
229000
230000
231000
±
232000
Legenda
6720000
Água
Ca mpo
Cu ltura Temp orá ria
Euca lipto
6719000
6718000
6717000
227000
228000
229000
230000
231000
232000
6716000
6718000
6716000
6717000
6719000
6720000
6721000
228000
6721000
227000
Impe rmeá vel
Ma ta Na tiva
Pin us
Terre no Exp osto
Escala
0
500
1,000
Metros
2,000
Coordenadas Plano Retangulares
Sistema UTM - Fuso 22 - Sul
DATUM HORIZONTAL
SAD69
Figura 3 - Uso do solo na bacia Menino Deus I.
1.2
Figura 2 - Modelo numérico do terreno.
Legenda: C1: Cambissolo; RLd1: Neossolo litólico distrófico, relevo
ondulado; RLe1: Neossolo Litólico Eutrófico Chernossólico; RLe1-CCo: Associação Neossolo Litólico Eutrófico ChernossólicoCambissolo-Colúvios; PVAa1-RLe: Associação Argissolo VermelhoAmarelo Alumínico Alissólico e Neossolo Litólico Eutrófico.
Figura 4 – Tipos de solo bacia Menino Deus I
Eventos
Os eventos empregados para as simulações com o Kineros2 foram os mesmos utilizados por
BRANCO (1998) e DIAS (2003). Os dados de precipitação e de vazão, parâmetro de entrada do
modelo, foram obtidos a partir do banco de dados do GHIDROS, grupo de pesquisas em recursos
hídricos e saneamento ambiental da UFSM, sendo necessários para a calibração e validação das
simulações realizadas no Kineros2. São 8 eventos observados na bacia do Menino Deus I e que
abrangem o período de 02/11/1996 a 19/06/1997. As características desses eventos são apresentadas
na Tabela 1.
Tendo em vista que o Kineros2 fornece como saída o escoamento superficial gerado após uma
precipitação incidente na bacia, para cada um dos períodos analisados foi realizada a separação do
XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos
3
escoamento através do método visual, com auxílio da plotagem do evento em escala
monologarítmica (TUCCI, 1997a, p. 397).
Tabela 1 – Características dos eventos empregados nas simulações.
∆T Ev.
PP
∆T PP
PP Média
tc4
Esc. Sup.
5
(mm)
(min)
(mm)
(min)
(mm/h)
min
340
02/11/1996
900
13
295
18,1
0,99
625
10/12/1996
1000
20
540
29,4
0,26
310
13/01/1996
405
22
90
23,1
0,51
330
14/01/1996
445
11
30
11,5
0,90
380
02/02/1997
500
27
60
27,6
0,18
295
19/02/1997
570
24
300
28,5
0,68
640
13/06/1997
1130
50
480
58,0
4,36
315
18/06/1997
840
46
470
53,6
2,61
724
27
283
31,2
405
1,31
Média
∆T Ev. – duração do evento; PP – precipitação; ∆T PP – duração da precipitação; PP Média – precipitação média;
tc – tempo de concentração; Esc. Sup. – escoamento superficial.
Evento
(Ev.)
1.3
Aplicação do modelo Kineros2
No modelo Kineros2, a bacia hidrográfica é discretizada em uma série de planos e canais
ordenados sequencialmente. Cada um desses elementos possui parâmetros específicos que tentam
representar as características geométricas, o tipo e o uso do solo na bacia. Para a simulação de
eventos chuva-vazão, são necessários, no mínimo, dezesseis parâmetros por elemento (Tabela 2).
Tabela 2 - Parâmetros necessários para o Kineros2.
Parâmetro
Length
Width
Slope
Manning
Relief
Spacing
Interception
Canopy
Saturation
CV
Ksat
G
Distribution
Porosity
Rock
Thickness
Descrição
Comprimento do elemento.
Largura do elemento.
Declividade do elemento.
Coeficiente de Manning equivalente do elemento.
Microtopografia. Altura média dos sulcos do terreno.
Microtopografia. Espaçamento dos sulcos do terreno.
Interceptação devido à cobertura do solo.
Fração da superfície que provoca interceptação.
Saturação inicial do solo relativo à porosidade do solo.
Coeficiente de variação de Ksat.
Coeficiente de condutividade hidráulica saturada do solo.
Potencial de capilaridade do solo.
Índice de distribuição do tamanho dos poros do solo.
Porosidade.
Fração de rochas presente no solo.
Profundidade da camada de solo.
Unidades
m
m
mm
m
mm
0-1
0-1
0-1
mm/h
mm
0-1
0-1
0-1
mm
Abrev.
L
W
SL
n
h
s
I
Can.
Sat.
CV
Ksat
G
Dist.
Por.
Rock
H
4
O tempo de concentração estimado a partir dos eventos foi obtido a partir da diferença entre o tempo do fim da
precipitação efetiva e o fim do escoamento superficial observado. Para a definição do final da precipitação efetiva,
empregou-se o método do índice Φ, conforme GENOVEZ (2001, p. 45).
5
Esta duração não se refere apenas ao escoamento superficial, mas desde o início da precipitação até alguns minutos
após o fim do escoamento superficial.
XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos
4
Obtidos os parâmetros de todos os elementos da bacia, a organização dessas informações em
um formato adequado permite fomentar o algoritmo do Kineros2 que irá realizar os cálculos,
fornecendo o hidrograma no exutório da bacia. O formato de entrada do modelo e a
operacionalização do software podem ser encontrados no trabalho de WOOLHISER et al. (1990),
cujas orientações estão condensadas no site http://www.tucson.ars.ag.gov/kineros/.
1.3.1 Discretização e parâmetros iniciais da bacia
Para a tarefa de discretização da bacia, foi empregado o software AGWA6 - Automated
Geospatial Watershed Assessment Tool - (Semmens et al., 2000), que integra-se à interface do
ArcGIS e permite a obtenção dos parâmetros da bacia a partir dos arquivos contendo as informações
do MNT, uso e cobertura dos solos.
No caso em estudo, foram obtidos e empregados no Kineros2 28 planos e 11 canais, cuja
disposição está representada na Figura 5 e na Figura 6. O AGWA, com base no MNT, extrai os
parâmetros geométricos das sub-bacias e canais como, por exemplo, largura, comprimento e
declividade.
Apesar de o AGWA permitir a estimativa dos parâmetros de uso e cobertura do solo, esta
funcionalidade não foi aproveitada neste trabalho, tendo em vista que os resultados obtidos pelo
programa possuem embasamento na classificação dos solos norte-americanos. No caso em estudo, a
tarefa foi realizada por intermédio de uma planilha eletrônica, onde foram tabulados os percentuais
do uso do solo e tipo de solo para cada um dos planos discretizados pelo AGWA.
Os parâmetros relativos aos solos, dentre os quais estão a porosidade e o coeficiente de
condutividade hidráulica saturada, foram estimados a partir do trabalho de DIAS (2003, p. 116 e
117), que coletou amostras de solo na região e submeteu-as a ensaios em laboratório. Informações
complementares foram obtidas do Relatório do Enquadramento do Rio Vacacaí Mirim (PAIVA et
al., 2008) e da correlação de distintas propriedades dos solos, como apresentados em RAWLS et al.
(1982) e em KINEROS2 (2010).
Os parâmetros relativos ao uso do solo como a altura de interceptação e o coeficiente de
Manning foram estimados a partir das recomendações trazidas pelo manual do Kineros
(WOOLHISER et al., 1990, p. 6 e p.20-21). Já os parâmetros de microtopografia foram
considerados, para todos os planos, iguais aos resultados obtidos por DARONCO (2008, p. 82).
6
O AGWA está disponível para download no endereço http://www.tucson.ars.ag.gov/agwa/.
XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos
5
Figura 5 – Discretização dos planos.
Figura 6 – Discretização dos canais.
Feita a atribuição inicial de valores para cada tipo e uso de solo, esses valores foram
ponderados para cada elemento de plano e canal discretizado, a fim de se obter parâmetros médios
representativos do comportamento da bacia.
1.3.2 Calibração
A fase de calibração visa ajustar os parâmetros da bacia inicialmente estimados de modo que o
hidrograma de saída seja o mais aproximado possível do hidrograma observado. Para a calibração
dos 8 eventos empregados neste trabalho, foi utilizado o método da tentativa e erro, tendo sido
automatizado o procedimento de geração dos parâmetros de entrada, execução do algoritmo do
Kineros2, importação e plotagem dos resultados em uma planilha eletrônica do Microsoft Excel®.
Com vistas a facilitar o processo de ajuste, ao invés de se calibrar um parâmetro de cada
elemento, foram usadas constantes que multiplicam os parâmetros dos planos e canais da bacia. Cada
parâmetro possui um multiplicador que se aplica a todos os elementos, escalando-os linearmente.
Assim, permite-se a variação progressiva do multiplicador, aumentando ou diminuindo o valor dos
parâmetros de entrada sucessivamente, até encontrar-se um bom ajuste.
Partindo-se dos valores iniciais estimados no tópico anterior, passou-se ao ajuste, em primeiro
lugar, da saturação inicial do solo, pois se trata do parâmetro mais sensível no Kineros2 e que
depende do evento analisado, em especial do índice de precipitação antecedente ao período
analisado. Atingido um hidrograma semelhante ao observado, ao menos no pico de vazão, partiu-se
para a calibração dos multiplicadores dos demais parâmetros, dando-se preferência à condutividade
hidráulica saturada, que também sensibiliza consideravelmente a resposta. Na seqüência, calibrou-se
o coeficiente de Manning dos planos e canais. Os parâmetros de porosidade e distribuição dos poros
XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos
6
foram calibrados apenas na hipótese de nenhuma combinação ter se mostrado eficiente ou para o
refino da qualidade do ajuste obtido. Também com o objetivo de refino, foram calibrados os demais
parâmetros.
Para a avaliação da qualidade do ajuste, foi utilizado o índice de Nash–Sutcliffe. No entanto,
também foi levada em consideração a variação entre o volume observado e o gerado, bem como a
variação entre a vazão de pico observada e a gerada. O índice de eficiência de Nash-Sutcliffe pode
variar de 1 até -∞, sendo que quanto mais próximo a 1, melhor o ajuste.
1.3.3 Validação dos resultados
Considerando o baixo número de eventos analisados, apenas oito, a validação das simulações
empregou os mesmos eventos. Para esta tarefa, foram calculadas as médias dos valores dos
parâmetros que conduziram aos melhores resultados na etapa de calibração. Considerando que o
parâmetro de saturação inicial do solo varia de evento para evento, este foi ajustado a fim de obterse o melhor resultado, mantendo-se os demais parâmetros fixos nas médias obtidas.
1.4
Hidrogramas de projeto
Para a obtenção dos hidrogramas de projeto foram gerados hietogramas para o período de
retorno de 100 anos, empregando-se a equação de chuvas intensas de Santa Maria, Equação ( 1 ),
(BELINAZO e PAIVA, 1991). Os distintos hietogramas serviram de entrada para a execução do
Kineros2, adotando-se os parâmetros médios obtidos na fase de calibração da resposta da bacia.
I=
a.TR d
( t + c)
b
(1)
Onde:
a = 807,801
b = 0, 7472.TR −0,028
c = 5, 67
d = 0,14
TR - período de retorno em anos
t
- duração da precipitação em minutos
I
- intensidade máxima da precipitação mm/h
Para a duração do evento extremo, a bibliografia recomenda adotar o tempo de concentração
da bacia (TUCCI, 1997b, p.549), definido como o período necessário para que toda a bacia
contribua para o escoamento observado no exutório (CHOW et al., 2000, p. 170), conceito ilustrado
pela Figura 7. No entanto, o tempo para que esta condição aconteça está vinculado à saturação
inicial do solo, sendo que, em saturações menores, o tempo de concentração é mais estendido do que
XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos
7
em condições próximas à saturação. Em função disso, PILGRIM e CORDERY (1992, p. 9.15)
comentam que o termo seria melhor conceituado se considerado como o tempo, após o início da
precipitação efetiva, para que toda a bacia contribua simultaneamente para o escoamento no
exutório.
Figura 7 - Ilustração do significado de tempo de concentração.
Fonte: Adaptado de HOLTZ e PINTO (1976, p. 138).
Para a avaliação das distintas abordagens no cálculo do conceito de tempo de concentração,
foram utilizadas 3 metodologias. A primeira considerou a duração da precipitação igual ao tempo de
concentração médio obtido a partir dos dados observados, calculado em 422 minutos. Todavia, em
vista das limitações do método do índice Φ, conforme aponta GENOVEZ (2001, p. 45), para a
estimativa mais realista do tempo de concentração da bacia, simulou-se a sua resposta no modelo
Kineros2, quando incidente uma precipitação de intensidade constante e duração suficientemente
longa, conforme a ideia trazida pela Figura 7. Empregaram-se os coeficientes médios obtidos na fase
de calibração para caracterização da bacia. O terceiro método considerou o tempo de concentração
calculado pela equação empírica de Picking ( 2 ).
 L2 
tc = 0,088333. 
 i 
0,333
(2)
Onde:
tc = tempo de concentração em horas.
L = comprimento do maior talvegue em km.
i = declividade do maior talvegue em m/m.
XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos
8
De posse do tempo de concentração e do período de retorno, calcularam-se os incrementos de
precipitação em intervalos de 5 minutos. Para tal, seguiu-se a metodologia descrita por TUCCI
(1997b, p. 555).
A fim de considerar a variação na distribuição temporal existente nas precipitações intensas,
empregou-se o método do Bureau of Reclamation, Soil Conservation Service (SCS), descrito em
(TUCCIa, 1997, p. 222), localizando-se o pico da precipitação a 25% do tempo de duração do
evento, a partir do seu início, uma vez que PAIVA (1996), ao analisar 2643 eventos chuvosos entre
os anos de 1963 e 1988, concluiu que o padrão de adiantamento do pico da precipitação em Santa
Maria é equivalente a 25% da duração do evento.
2
2.1
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Hidrograma e qualidade dos ajustes
A partir do método de calibração do modelo Kineros2 já explicitado, foram obtidos os
parâmetros que melhor resposta apresentaram. A Tabela 3 resume a qualidade dos resultados
obtidos e a Tabela 4 apresenta os parâmetros obtidos por evento, além da média empregada para a
realização da validação e da calibração. A qualidade obtida na validação de todos os eventos
encontra-se detalhada na Tabela 5. Ressalta-se que os parâmetros não listados nas tabelas a seguir
foram mantidos com valores idênticos às estimativas iniciais feitas.
Tabela 3 – Resumo da qualidade do ajuste obtida para cada evento.
10³ m³ 10³ m³ 10³ m³
ΔVol
Vobs
0,73
17,49
9,87
-7,6
43,60%
1,58
1,58 -0,005 -0,32%
20
0,67
4,57
5,02
0,4
9,80%
0,17
0,24
-0,07 -41,18%
405
22
0,84
9,01
9,92
0,9
10,10%
1,89
1,9
-0,006 -0,32%
14/01/1997
445
11
0,90
15,86
19,34
3,5
22,00%
4,06
4,06 -0,001 -0,02%
02/02/1997
500
27
0,50
3,14
2,99
-0,1
4,80%
0,52
0,52
19/02/1997
570
24
0,85
12,04
10,2
-1,8
15,20%
1,24
1,27 -0,027 -2,18%
13/06/1997
1130
50
0,84
77,21
84,04
6,8
8,80%
5,87
18/06/1997
840
46
0,92
46,13
48,32
2,2
4,70%
4,23
Média
724
27
0,78
-
-
0,54
14,88%
-
Duração
PP
Evento
Nash
min
mm
02/11/1996
900
13
10/12/1996
1000
13/01/1997
Vobs
Vsim
∆Vol
QPobs QPsim ∆QP
(m³/s) (m³/s) (m³/s)
6
0,002
ΔQP
QPobs
0,38%
-0,131 -2,23%
5,11 -0,879 -20,78%
-
-0,14
-8,33%
DP
0,14
4,19 12,91%
0,302 15,04%
PP – precipitação; Vobs – volume observado; Vsim – volume simulado; ∆Vol = Vobs – Vsim; QPobs – vazão de pico
observado; QPsim – vazão de pico simulada; ∆QP = QPobs – QPsim; DP – desvio padrão.
XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos
9
Tabela 4 – Parâmetros obtidos e a média empregada na validação.
Evento
Nash
n
n
Canais
Planos
h Inter. Sat.
H
Ksat G
Dist. Por.
2/11/1996 0,73 0,094
0,029
12
2,2
0,5
679,4 67,9 11,4 0,42 0,46
10/12/1996 0,67 0,474
0,14
29
3,6
0,39 679,4 88,3 11,4 0,42 0,46
13/1/1997 0,84 0,133
0,04
12
2,1
0,7
14/1/1997
0,9
0,08
0,029
29
3,6
0,75 679,4 74,7 10,4 0,42 0,46
2/2/1997
0,5
0,118
0,036
29
3
0,57 679,4 79,3 10,4 0,42 0,48
19/2/1997 0,85 0,134
0,033
15
7,2
0,438 679,4 76,1 10,3 0,42 0,46
13/6/1997 0,84 0,118
0,036
29
5,4
0,594 1358,8 66 13,8 0,42 0,46
19/6/1997 0,92 0,154
0,047
29
7,2
0,472 679,4 54,3 9,9 0,42 0,46
679,4 80,1 10,4 0,42 0,46
Média
0,78 0,163
0,049
23
4,3
0,552 764,3 73,3 11,0 0,42 0,46
DP
0,14 0,128
0,037
8
2,1
0,126 240,2 10,4 1,3
0
0,01
Nash – índice de eficiência de Nash-Sutcliffe; n – coeficiente de rugosidade de Manning; h – altura equivalente da
microtopografia do terreno em mm; Inter. – interceptação; Sat – saturação inicial do solo; H – profundidade da
camada de solo impermeável em mm; KSat – coeficiente de condutividade hidráulica saturada em mm/h; G –
capilaridade; Dist. – índice de distribuição do tamanho dos poros; Por. – porosidade; DP – desvio padrão.
Tabela 5 – Resumo da qualidade da validação obtida para cada evento.
Evento
Nash
Vobs
Vsim
∆Vol
10³ m³
10³ m³ 10³ m³
ΔVol
Vobs
QPobs
QPsim ∆QP
(m³/s) (m³/s) (m³/s)
ΔQP
QPobs
02/11/1996
0,49
17,49
19,02
1,53
8,7%
1,58
1,76
0,18
11,4%
10/12/1996
-1,63
4,57
5,29
0,72
15,7%
0,17
0,44
0,27 160,8%
13/01/1997
0,93
9,01
8,76
-0,25
-2,8%
1,89
1,63
-0,26 -13,9%
14/01/1997
-0,06
15,86
28,05
12,19
76,9%
4,06
3,75
-0,31
-7,6%
02/02/1997
0,43
3,14
2,09
-1,04
-33,3%
0,52
0,54
0,02
3,3%
19/02/1997
0,84
12,04
13,07
1,03
8,6%
1,24
1,50
0,26
21,1%
13/06/1997
0,75
77,21
97,01
19,80
25,6%
5,87
6,46
0,58
9,9%
19/06/1997
0,91
46,13
47,76
1,63
3,5%
4,23
5,12
0,89
21,0%
Média
0,33
-
-
4,45
12,9%
-
-
0,20
25,8%
DP
0,86
-
-
7,46
31,1%
-
-
0,403 56,0%
PP – precipitação; Vobs – volume observado; Vsim – volume simulado; ∆Vol = Vobs – Vsim; QPobs – vazão de pico
observado; QPsim – vazão de pico simulada; ∆QP = QPobs – QPsim; DP – desvio padrão.
Na sequência de gráficos abaixo, Figura 8, estão ilustrados os hidrogramas com melhor ajuste
na fase de calibração e validação, contendo tanto a vazão observada, quanto as vazões simuladas na
fase de calibração (sim. ótima) e na fase de validação (sim. média). Na legenda dos gráficos constam
ainda as saturações adotadas para cada situação.
XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos
10
0
25
50
75
100
125
150
175
200
225
250
275
300
325
350
375
400
425
450
475
500
525
550
EVENTO 19/02/1997
0
20
40
60
80
100
120
140
160
180
200
220
240
260
280
300
320
340
360
380
400
0,0
0,0
1,75
1,0
1,5
2,00
2,0
1,50
2,5
3,0
1,00
3,5
4,0
0,50
4,5
1,0
1,5
1,25
2,0
1,00
2,5
0,75
3,0
0,50
3,5
4,0
0,25
4,5
400
Sim. Ótima SAT=0,7
Sim. Média SAT=0,68
Precipitação
Sim. Ótima SAT=0,438
6,0
Tempo (min)
Vazão Observada
Sim. Média SAT=0,527
500
1,0
0,0
800
1100
900
1000
800
700
600
500
400
300
200
5,0
0
0,0
100
4,5
700
4,0
1,0
2,0
600
3,5
2,0
3,0
500
3,0
400
3,0
4,0
300
2,5
200
2,0
4,0
100
5,0
5,0
0
1,5
0,0
0,5
1,0
1,5
2,0
2,5
3,0
3,5
4,0
4,5
5,0
Precipitação (mm/5min)
0,5
1,0
6,0
Vazão (m³/s)
7,0
Vazão (m³/s)
7,0
EVENTO 19/06/1997
0,0
Precipitação (mm/5min)
EVENTO 13/06/1997
Vazão Observada
Sim. Média SAT=0,54
0
45
90
135
180
225
270
315
360
405
450
495
540
585
630
675
720
765
810
0
50
100
150
200
250
300
350
400
450
500
550
600
650
700
750
800
850
900
950
1000
1050
1100
Vazão Observada
Precipitação
Sim. Ótima SAT=0,594
400
Tempo (min)
Precipitação
8,0
300
Tempo (min)
200
5,0
100
0,00
0
300
200
100
5,0
0
0,00
0,5
1,50
Vazão (m³/s)
Vazão (m³/s)
2,50
Precipitação (mm/5min)
0,5
Precipitação (mm/5min)
EVENTO 13/01/1997
3,00
Tempo (min)
Precipitação
Vazão Observada
Sim. Ótima - SAT=0,47
Sim. Média - SAT=0,48
Figura 8 – Eventos de melhor ajuste na fase de calibração e validação.
2.2
Discussão da fase de calibração
Na fase de calibração, puderam ser obtidas algumas conclusões sobre o Kineros2, tendo sido
esta etapa fundamental para a criação de uma sensibilidade subjetiva na operação do modelo.
Considerando que o método adotado para a calibração foi a tentativa e erro, apesar da
automatização elaborada, o desenvolvimento da noção de quanto o hidrograma gerado será afetado
na variação de algum parâmetro agiliza o processo.
De modo geral, os eventos de menor pico de vazão observados, dias 10/12/2010 e 02/02/2010,
foram os que geraram as piores respostas, com índice de eficiência de Nash-Sutcliffe igual a 0,67 e
0,50 respectivamente. Já os eventos de picos de vazão mais elevados apresentaram melhor resposta,
variando o índice de Nash-Sutcliffe de 0,73 a 0,92.
Pela análise da variação entre o pico de vazão simulado e observado, pode-se obter um erro de
± 8,3%. Quanto ao volume total escoado, esse erro aumentou para ± 14,9%.
XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos
11
Quanto à sensibilidade dos parâmetros, constatou-se que a saturação inicial do solo afeta
fortemente os resultados. Isto reforça a necessidade de monitoramento desta variável para uma
maior confiabilidade nas respostas, em especial quando se opera o Kineros2 acoplado a sistemas de
monitoramento em tempo real. Considerando que não havia tal tipo de informação nos dados
analisados, tal parâmetro foi calibrado evento a evento. Esta metodologia pode revelar a falsa
eficiência da calibração, pois o erro da estimativa de uma variável de característica física permanente
da bacia – ou ao menos mais estável – fica mascarado frente à variabilidade da saturação, que
depende das condições antecedentes de precipitação e varia de evento a evento.
Apesar de calibrados, os resultados mostraram-se coerentes. Conforme explicitado na Tabela 3
e na Tabela 4 já apresentadas, a saturação variou de 0,39 a 0,75, sendo o valor de 0,75
correspondente ao dia 14/01/1997, dia que sucedeu o evento do dia 13, onde observou-se uma
precipitação de 22mm. Logo, depreende-se que a ligeira elevação da saturação obtida no dia 14
deveu-se à precipitação do dia 13.
Outro parâmetro de muita sensibilidade no Kineros2 refere-se à condutividade hidráulica
saturada. A calibração deste parâmetro revelou interessante efeito. Pela análise dos dados
inicialmente estimados, a média do Ksat foi igual a 135,8 mm/h, conforme os estudos apresentados
por DIAS (2003). No entanto, na fase de calibração, seu valor restou apenas em 54% daquele valor
inicialmente adotado, ou seja, uma média de 73,3 mm/h. Este efeito é reportado na bibliografia,
conforme observa DARONCO (2008, p. 81), citando os trabalhos de Rawls e Bouwer. RAWLS et
al. (1992, p. 5.34) comentam que a condutividade hidráulica saturada efetiva aplicável ao modelo de
Green-Ampt7 é, em média, a metade do valor estimado em laboratório, tendo em vista a existência
de ar aprisionado no interior do solo, o que diminui a capacidade de infiltração. GONZÁLEZ (2010)
e HERNANDEZ (2000) também aplicaram a recomendação em seus trabalhos.
Os parâmetros de saturação e condutividade hidráulica saturada possuem grande influência no
volume do escoamento superficial, razão pela qual foram calibrados por primeiro.
O coeficiente de Manning, tanto dos planos (n médio de 0,163), quanto dos canais (n médio de
0,049), não se manteve muito distante das faixas de valores recomendados pela bibliografia.
DARONCO (2008) encontrou médias de 0,76 para o Manning. Já SANTOS et al. (2007) adotaram
valores médios de 0,02. HERNANDEZ (2000) empregou em seu trabalho faixas de Manning
variando de 0,01 até 0,07. SMITH et al. (1999) aplicaram valores na faixa de 0,15 a 0,25.
7
O Kineros2 aplica a equação de Smith e Parlange para o cômputo da infiltração, no entanto, esta se aproxima da
formulação de Green-Ampt.
XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos
12
Pelas seguidas modificações realizadas no coeficiente de rugosidade, pode-se constatar que a
alteração de seu valor impacta principalmente o pico da vazão, tanto no tempo (adiantando ou
retardando), quanto na amplitude.
O parâmetro de interceptação variou na faixa de 2,1 mm a 7,4 mm, valores que também estão
coerentes com a média sugerida pelos desenvolvedores do Kineros (WOOLHISER et al. 1990, p. 6).
O parâmetro relativo à espessura da camada permeável de solo teve que ser reajustado apenas
no evento do dia 13/06/1997, pois o volume escoado simulado permanecia acima do valor
observado. Isto pode indicar que a espessura adotada inicialmente foi subestimada, sendo que
valores maiores deveriam ter sido empregados.
Os demais parâmetros pouco foram alterados, tendo em vista o resultado satisfatório
encontrado a partir da calibração dos parâmetros acima citados. Pequenos ajustes foram realizados
na capilaridade (G) e na porosidade, com intuito de refinar o resultado. No entanto, os valores
encontrados permaneceram próximos dos inicialmente estimados.
Um importante detalhe refere-se ao índice de distribuição do tamanho dos poros. Segundo
RIBEIRO et al. (2007), “para se entender melhor o comportamento do solo, a distribuição dos
poros por seus tamanhos é mais importante que a porosidade total”. Os autores ainda comentam
que, a depender do tamanho dos poros, o fluxo d’água no solo poderá ser restringido,
independentemente da porosidade. No Kineros2, o parâmetro é importante no cômputo da
redistribuição da água no solo (KINEROS2, 2010).
DARONCO (2008, p.84) empregou para todos elementos de sua discretização o valor de 0,01
para Dist, tendo sido esta recomendação inicialmente adotada no presente trabalho. No entanto, após
a revisão da bibliografia sobre o tema, redefiniu-se o uso dessa estimativa, pois o trabalho de
RAWLS et al. (1982) demonstra que sequer um solo argiloso possui o parâmetro Dist na ordem de
grandeza de 0,01. Ainda, a aproximada estimativa da distribuição dos poros tem especial relevância
em áreas com cobertura vegetal, pois o sistema radicular de plantas cria macroporos pelas quais a
água percola com maior facilidade.
2.3
Discussão da fase de validação
A fase de validação do modelo permitiu a comparação da qualidade dos parâmetros médios
obtidos na fase de calibração. Os resultados são apresentados nos hidrogramas e na Tabela 5.
De modo geral, a qualidade analisada pelo índice de eficiência de Nash-Sutcliffe variou
consideravelmente, tendo obtido-se uma média baixa, apenas 0,33, quando computados todos os
eventos. No entanto, esta média sobe para 0,64 se desconsiderados os eventos de menor pico de
vazão.
XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos
13
Os eventos do dia 10/12/1996 e do dia 14/01/1997 apresentaram baixa eficiência devido ao
retardo no pico de vazão. Isto pode estar relacionado a não representatividade na distribuição
espacial da precipitação, sendo toda a simulação realizada suscetível a este erro, considerando-se o
uso realizado neste trabalho de apenas um pluviômetro como fonte de dados para a entrada no
modelo. Ademais, a fonte dos dados observados sequer estava localizada no interior da bacia
(BRANCO, 1998).
Quanto à qualidade do volume total simulado, obteve-se um erro médio de ± 12,9%. Já a
vazão de pico apresentou erro de ± 25,8%.
Ainda, a coerência com relação ao parâmetro da saturação inicial manteve-se na fase de
validação tendo o evento do dia 14/1/1997 revelado um valor de 80% para a variável, frente aos
70% de saturação para o evento do dia antecedente.
2.4
Hidrograma de projeto
Para a determinação do hidrograma de projeto, geraram-se chuvas de projeto para o período
de retorno de 100 anos, com duração estimada pelos três métodos apontados: a partir dos dados
observados (Tabela 1), a partir da equação de Picking e a partir da simulação da resposta da bacia
quando sobre ela incide uma precipitação de intensidade constante.
Os resultados obtidos a partir da aplicação da duração média calculada a partir dos dados
observados (404 minutos) são apresentados na Figura 9. Nesta são apresentados os hidrogramas
para 3 condições iniciais do solo, com 20%, 50% e 90% de saturação. Percebe-se que a vazão de
pico é substancialmente afetada com a variação destas condições iniciais.
A Figura 10 apresenta o hidrograma de projeto para o período de retorno de 100 anos e
duração de 55 minutos, obtida da formulação proposta por Picking.
XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos
14
800
5
10
285
270
255
240
225
210
195
180
165
150
135
120
105
90
75
60
45
30
15
0
TR: 100 anos
Duração: TC Picking = 55 min.
QP = 322 m³/s
350
Precipitação (mm/5min)
TR: 100 anos
Duração: TC Obs. = 405 min.
QP = 725 m³/s
Hidrograma de Projeto
400
300
5
10
30
300
35
200
40
100
45
50
45
0
50
0
50
Vazão (m³/s)
400
15
250
20
200
25
150
30
35
100
Tempo (min)
Precipitação
Sat=0,2
250
200
150
50
100
40
0
600
500
25
400
500
300
20
200
600
100
15
0
700
Precipitação (mm/5min)
0
900
Vazão (m³/s)
0
0
25
50
75
100
125
150
175
200
225
250
275
300
325
350
375
400
425
450
475
500
525
550
575
600
Vazões de Projeto
1,000
Tempo (min)
Sat=0,5
Precipitação
Sat=0,9
Figura 9 - Hidrograma de projeto, Tr = 100
anos e duração de 405 min.
Sat=0,2
Sat=0,5
Sat=0,9
Figura 10 - Hidrograma de projeto, Tr = 100
anos e duração de 55 min.
O terceiro método considerou a duração obtida a partir da simulação com o modelo Kineros2.
Apesar de o tempo de concentração depender de fatores como a intensidade da precipitação e da
saturação inicial do solo, esta problemática foi contornada ao tomar-se o solo na condição saturada
desde o início do evento.
O resultado obtido para o tempo de concentração é apresentado na Figura 11, tendo resultado
em 200 minutos. O hidrograma de projeto obtido a partir da precipitação de projeto de tempo de
90
0,5
900
80
1,0
4,0
Precipitação
1200
Tempo (min)
1000
800
600
5,0
400
0
200
4,5
0
10
380
400
360
320
340
300
280
240
260
220
180
200
100
45
0
50
Tempo (min)
Precipitação
XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos
160
40
Vazão Sim.
Figura 11 – Tempo de concentração estimado
pelo Kineros2.
140
100
120
80
60
35
200
400
20
30
300
350
3,5
300
30
25
400
250
3,0
20
500
200
40
15
600
150
2,5
100
50
700
50
2,0
5
10
TR: 100 anos
Duração: TC Kineros2=200 min.
QP = 679 m³/s
0
1,5
60
0
800
Vazão (m³/s)
tc
Hidrograma de Projeto
Precipitação (mm/5min)
1.000
Precipitação (mm/5min)
0,0
70
Vazão (m³/s)
0
Tempo de Concentração
100
20
40
0
50
100
150
200
250
300
350
400
450
500
550
600
650
700
750
800
850
900
950
1000
1050
1100
1150
1200
retorno igual a 100 anos e duração de 200 minutos é apresentada na Figura 12.
Sat=0,2
Sat=0,5
Sat=0,9
Figura 12 - Hidrograma de projeto, Tr = 100
anos e duração de 200 min.
15
Conforme é revelado pela análise dos hidrogramas de projeto obtidos, a vazão de pico e
também o volume total escoado variaram muito quando alteradas as condições iniciais de saturação
do solo.
Todavia, pode-se perceber que a vazão de pico, para saturações de até 50%, alcançou, no
máximo, 265 m³/s, valor que pouco se alterou devido mudança da duração da precipitação.
Poder-se-ia adotar como vazão de projeto aquela de 725 m³/s. No entanto, esta condição
superestima em termos estatísticos a previsão para um período de retorno de 100 anos, pois a
combinação da condição de saturação máxima do solo e precipitação intensa seguramente terá um
período de recorrência maior no tempo.
Neste sentido, oportuno é o comentário de TUCCI (1997b, p.556):
As condições iniciais adotada (sic) para o modelo utilizado devem procurar condições
desfavoráveis de projeto e com chance de ocorrência. Não é recomendável combinar
situações desfavoráveis de pouca probabilidade de ocorrência, pois o hidrograma
passaria a ter um risco muito maior que o previsto. Por exemplo, numa bacia em que as
maiores intensidades de precipitação ocorrem no verão, quando o solo está em geral seco,
não devem ser combinadas com solo próximo da saturação, que é condição do inverno
quando as chuvas são pouco intensas mas de longa duração. TUCCI (1997b, p.556, grifo
nosso).
Em assim sendo, o valor obtido de 265 m³/s parece razoável a ser adotado como vazão de
projeto, quando se está estimando a vazão de pico para um período de retorno de 100 anos.
Ressalta-se que este resultado pouco variou em função da duração da precipitação adotada para a
saturação de até 50%. Evidentemente que dados estatísticos sobre as circunstâncias antecedentes à
precipitações intensas poderiam reforçar a qualidade das previsões.
Já a estimativa do aporte de volume de projeto, importante para o planejamento de
reservatórios, por exemplo, mostra-se mais sensível à adoção de uma duração mais larga.
Observa-se que o valor obtido para a vazão de pico, 265 m³/s, é, aproximadamente, 45 vezes
superior à maior vazão de pico (5,8 m³/s) observada, empregada na fase de calibração e validação
realizada. Portanto, trata-se de mais uma fonte de incerteza na estimativa do hidrograma de projeto,
devendo esta condição ser considerada na avaliação do uso ou não dos resultados aqui apresentados.
Cabe ainda considerar o erro médio na vazão de pico obtida, que no caso foi de ± 25,8%, ou
seja, resultando, para um período de retorno de 100 anos, uma vazão de pico de 333 m³/s,
CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
O uso de modelos hidrológicos distribuídos tem permitido a reprodução do comportamento de
uma bacia hidrográfica de maneira cada vez mais próxima ao seu comportamento real. A partir deles
XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos
16
é possível considerar a variabilidade da cobertura vegetal, bem como do tipo de solo existente em
determinada área.
Nesse sentido, os resultados obtidos neste trabalho com o uso do modelo Kineros2 foram
satisfatórios, tendo se alcançado na fase de calibração uma boa correlação entre o escoamento
superficial calculado e o observado na bacia Menino Deus I, característica do bioma Mata Atlântica.
A fase de validação revelou um bom ajuste para os eventos de maior pico de vazão, sendo a
conclusão também estendida para o volume gerado. No entanto, nesta fase houve a defasagem
temporal de alguns picos em certos eventos, o que pode estar relacionado com a não consideração
da distribuição espacial e temporal da precipitação empregada como parâmetro de entrada do
modelo.
Com o uso dos parâmetros médios empregados na fase de validação foi possível a obtenção
dos hidrogramas de projeto para um período de retorno de 100 anos, período típico para os projetos
de pontes e vertedores de pequenos açudes, por exemplo. Obteve-se, nesse caso, uma vazão de pico
de 333 m³/s, tomando-se o solo saturado a 50%. Essa vazão, para valores de saturação de 50%,
pouco variou, mesmo com a consideração de distintos valores de duração da precipitação.
Por fim, destaca-se que os modelos hidrológicos são importantes ferramentas para o
planejamento e avaliação de intervenções humanas no meio ambiente, prestando-se especialmente
para a previsão de cenários futuros, que refletem possíveis impactos de uma alteração no presente.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem ao CNPq pelo apoio e ao Prof. Dr. Daniel Allasia Piccilli pelas
oportunas sugestões na elaboração deste trabalho.
BIBLIOGRAFIA
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Desenvolvimento e aplicação aos solos de Santa Maria – RS. 1991. Dissertação (Mestrado em
Engenharia Agrícola) – Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 1991.
BRANCO, N. Avaliação da Produção de Sedimentos de Eventos Chuvosos em uma Pequena Bacia
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DARONCO, G. C. Avaliação dos parâmetros do modelo Kineros2 para simulação
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em Engenharia Civil) – Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2008.
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DIAS, Janaína Rios. Aplicação do modelo hidrológico AGNPS2001 utilizando dados observados na
bacia do Arroio Vacacaí-Mirim. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) – Universidade
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Fábio Beling 2011-enviado - Associação Brasileira de Recursos