Procedimento amostral para a quantificação de ácaros em soja
Lindolfo Storck1,3
Rubens Alex Fiorin3
Alberto Cargnelutti Filho3
Jerson Vanderlei Carus Guedes2
1 Introdução
Ácaros encontrados na superfície inferior do folíolo de soja alimentam-se através da
remoção do conteúdo citoplasmático das células. Sua importância como praga se agrava em
função do número elevado de espécies ([4]) e da falta de conhecimentos sobre os níveis de
controle. As amostragens normalmente são realizadas por meio de inspeções visuais da presença
e/ou ausência de indivíduos. A correta quantificação da população é problemática, sendo
necessário o detalhamento quanto ao local no folíolo a ser amostrado e o número de amostras
que devem ser realizadas.
Esse procedimento laborioso pode ser substituído pela contagem de parte de sua superfície,
desde que esta reflita, com segurança, a população da praga ([5]). O procedimento é dificultado
devido à distribuição espacial desuniforme ou hábito gregário das espécies ([8]).
No planejamento experimental, o tamanho ótimo de parcela é o que estabiliza a
variabilidade entre as parcelas na área experimental. Assim, este recurso metodológico, pode ser
usado para definir o tamanho ótimo das visadas em folíolos de soja, ou seja, o tamanho da visada
que estabiliza a variabilidade das visadas dentro do folíolo. Para definir o número de folíolos
(repetições) necessários para a quantificação do número de ácaros pode-se usar a metodologia de
reamostragem bootstrap ([1], [2], [7]). O objetivo deste estudo foi determinar o tamanho das
visadas por folíolo e o número de folíolos de soja para a quantificação de ácaros.
2 Material e métodos
Foi usada uma área de 15 ha (29°43'38"S; 53°45'23"O; altitude 102 m) com a cultura de
soja, cultivar BMX Potência, infestada com ácaros da espécie T. ludeni. Foram coletadas,
aleatoriamente, 100 plantas infestadas com ácaros. De cada planta, foi retirado um folíolo para a
contagem do número de ácaros ovos, ninfas e adultos. Em cada um dos folíolos foram
demarcados 32 quadros (1,0 cm2 quadro -1) dispostos em quatro colunas (divididas pela nervura
central) e oito linhas (Figura 1a). A contagem dos ácaros foi realizada com auxílio de uma lupa
com aumento de quatro vezes.
Para cada um dos caracteres, em cada um dos 100 folíolos, foram estimadas a média (m) e a
variância (s2) entre os 32 quadros. Também foi estimado o coeficiente de autocorrelação
1
PPG Agronomia, UTFPR – Pato Branco, PR – [email protected]
Dep Defesa Fitossanitária, UFSM
3
PPG Agronomia, UFSM
2
1
espacial de primeira ordem ( ̂ ), usando a sequência de numeração dos quadros mostradas na
Figura 1a. Sendo Xi igual ao número observado no quadro i, tem-se: Di  X i  X e
32
32
ˆ  i  2 Di Di 1 / i 1 Di2 .
O tamanho ótimo das visadas ( Xo , número de quadros adjacentes) por folíolo, foi estimado
por meio do método da curvatura máxima do modelo do coeficiente de variação (CMMCV) pela

expressão Xo  (10 / m) 2(1  ˆ 2 ) s 2m

1/ 3
([3]).
Considerando que, para cada um dos caracteres avaliados, os 100 valores das médias (m) e
dos tamanhos ótimos das visadas ( Xo ), em geral, não seguem uma distribuição de probabilidade
conhecida, foi adotada a metodologia de reamostragem bootstrap ([1], [2], [7]) para a estimação
da média por ponto e por intervalo.
Para as estimativas de m e de Xo , para cada um dos caracteres avaliados, foram geradas
J=3.000 amostras com reposição de valores e calculados a média de cada reamostra. Estas 3.000
médias, obtidas com reamostras de k=100 observações, foram ordenadas para a identificação do
quantil 0,025 como limite inferior ou LI(k) e do quantil 0,975 como limite superior ou LS(k). Os
limites LI(k) e LS(k) são estimativas por intervalo bootstrap com taxa de erro igual a 5%. A
amplitude (Ampl) do intervalo de confiança bootstrap (ICB) com reamostras de tamanho k, com
5% de erro, é Ampl(k)=LS(k)-LI(k). A média geral das 3.000 médias das reamostras é a
estimativa da média bootstrap (mB) da população amostrada. O mesmo procedimento foi
aplicado para diferentes tamanhos de reamostragens (k=2, 3, 4, ..., 300) para a identificação do
tamanho de amostra para uma amplitude (D) equivalente a D=4, D=3, D=2 e D=um ácaro cm-2.
Para os cálculos, foi usado o aplicativo SAEG, a planilha Excel e um aplicativo elaborado
em linguagem Pascal para o cálculo de m e Xo e para a simulação bootstrap.
3 Resultados e discussão
A distribuição espacial da percentagem de ácaros (adultos+ninfas) observados nos 32
quadros dos 100 folíolos evidencia que os ácaros concentram-se, principalmente, na base do
folíolo e em torno da nervura central. Neste estudo, constataram-se quadros com percentagem de
ácaros bem acima do dobro do esperado e outras abaixo da metade do esperado, logo a
distribuição do número de ácaros sobre os folíolos não é uniforme. Além disso, em 57% dos
folíolos, a hipótese da distribuição normal no número de ácaros (adultos+ninfas) nos 32 quadros
foi rejeitada (p=0,05), pelo teste de Lilliefors ([6]). Deve-se considerar ainda que, a média das
estimativas dos coeficientes de autocorrelação espacial de primeira ordem ( ̂ ) foi igual a 0,17
(variando entre -0,29 e 0,75), indicando, na maioria dos casos, dependência espacial ou falta da
2
independência entre os quadros, condição necessária para uma amostragem aleatória de n
quadros por folíolo.
Considerando o exposto, uma medida de avaliação do número de quadros adjacentes folíolo1
é buscado com as técnicas de estimação do tamanho ótimo de parcelas experimentais. Neste
caso, estima-se o número de quadros adjacentes ( Xo ) em que a variabilidade entre as visadas de
tamanho Xo se estabiliza dentro de cada folíolo.
Para o caractere número de ácaros (adultos+ninfas), a hipótese de distribuição normal, das
100 medidas de m e de Xo , foi rejeitada (p=0,05) pelo teste de Lilliefors. Esta falta de
normalidade justifica a necessidade da aplicação do método de reamostragem bootstrap ([1], [2])
para a estimação por ponto e por intervalo e para a determinação do tamanho amostral (número
de folíolos).
A média bootstrap de Xo variou entre 18,2 (adultos+ninfas) e 20,6 (ninfas) cm2 folíolo -1. As
estimativas dos percentis 2,5% e 97,5% e a amplitude foram semelhantes para as diferentes fases
de desenvolvimento dos ácaros (adultos, ninfas e ovos) (Tabela 1). Resumindo, pode-se
considerar que Xo =20 é o tamanho ótimo de visada nos folíolos de soja. Neste caso, deve-se
padronizar a contagem dos ácaros nos quadros das quatro colunas das cinco primeiras linhas, no
sentido da base para o ápice do folíolo (Figura 1b).
O número de folíolos necessários para a estimativa média de Xo com amplitude do ICB D =
4 cm2 (p=0,05) é igual a 23 folíolos (contagem de ácaros adultos+ninfas), bem inferior aos 100
folíolos usados para a determinação de Xo . Para amplitude do ICB menores (maior precisão), o
número necessário de folíolos aumenta, conforme os valores apresentados na Tabela 1.
A média bootstrap do número de ácaros (adultos+ninfas) foi igual a 3,15 cm-2 e, usando o
caso D = 4, a estimativa por intervalo é 3,15 ± 2, com 95% de confiança, se forem amostrados 12
folíolos com visadas de 20 cm2. Para uma amplitude D = 2, a estimativa por intervalo 3,15 ± 1,
com 95% de confiança, requer uma amostra de 50 folíolos com visadas de 20 cm2. Lembramos
que a amplitude do intervalo de confiança bootstrap não é, necessariamente, simétrica em relação
a média. Demais possibilidades podem ser analisadas com os dados apresentados na tabela.
Houve correlação linear positiva e significativa (r=0,98; p=0,001) entre a estimativa da
média bootstrap e do número de folíolos para uma dada amplitude do ICB. Infestação menor
requer menor tamanho de amostra (menor número de folíolos), fato decorrente do grande
número de folíolos com ausência de ácaro - valores nulos são homogêneos e requerem menor
tamanho de amostra.
4 Conclusão
A determinação do tamanho da área a ser avaliada dentro de cada folíolo de soja, no caso
igual a 20 cm2, e a estimativa por reamostragem bootstrap do número suficiente de folíolos, no
3
caso igual a 12 para uma amplitude do intervalo de confiança bootstrap igual a quatro ácaros
(adultos+ninfas) cm-2 ou 23 folíolos para uma amplitude do intervalo de confiança bootstrap
igual a três ácaros cm-2, é adequado para a padronização do procedimento de amostragem para a
quantificação de ácaros em folíolos de soja.
Bibliografia
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management. Bulletin of Entomological Research, v.83, p.291-303, 1993.
(a)
(b)
Figura 1. Esquema da identificação dos quadros (1,0 cm2 quadro -1) nos folíolos de soja para a
quantificação dos ácaros.
4
Tabela 1 - Estimativas da média, desvio padrão (DP) e coeficiente de variação (CV) para os 100 folíolos, percentis 2,5% (P025) e 97,5% (P975) do
intervalo de confiança bootstrap (ICB), média boostrap (MB) e amplitude do ICB, número de folíolos para amplitudes do ICB95% igual a 4, 3, 2 e um
ácaro (adulto, ninfa, ovos e adultos+ninfas).
Estimativas
Coleta
Média
DP
Estimativas bootstrap
CV
P025
MB
Amplitude do IC95%
P975
Ampl
-2
4
2
Número ácaros cm (média) - visadas de 32 quadros de um cm
Adultos (A)
Ninfas (N)
3
2
Visada Xo = 20 cm
1
2
2,01
(1)
2,91
144,82
1,50
2,01
2,62
1,12
6
10
23
94
1,35
(1)
1,58
117,04
1,05
1,35
1,72
0,67
4
6
12
45
10,31
137,83
5,61
7,49
9,59
3,98
106
201
299
>300
3,76
119,69
2,47
3,15
3,95
1,48
12
23
50
190
Ovos
7,48 (1)
A+N
(1)
3,15
2
-1
Número ótimo de quadros de um cm folíolo ( Xo )
Adultos (A)
19,13
4,60
24,06
18,19
19,12
19,98
1,80
20
35
81
>300
Ninfas (N)
20,58
5,69
27,67
19,38
20,59
21,85
2,47
31
54
118
>300
Ovos
20,13
6,08
30,22
18,95
20,13
21,31
2,36
36
63
133
>300
A+N
18,24
4,77
26,16
17,35
18,23
19,15
1,81
23
38
89
>300
(1)
Hipótese da distribuição de probabilidade normal rejeitada pelo teste de Lilliefors (p=0,05).
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