1548
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO RIO DE JANEIRO
1a Vara Federal de Resende
JUIZ(A) FEDERAL
: JOÃO BATISTA MARTINS PRATA BRAGA
PROCESSO
: 0000013-54.2010.4.02.5109 (2010.51.09.000013-7)
AUTOR
: ASSOCIAÇÃO DOS AMIGOS DO ITATIAIA E OUTRO
RÉU
: UNIAO FEDERAL E OUTRO
TIPO DE SENTENÇA
: A – FUNDAMENTAÇÃO INDIVIDUALIZADA
CONCLUSÃO
Nesta data, faço os presentes autos conclusos ao(a) Exmo(a). ,
Dr(a). JOÃO BATISTA MARTINS PRATA BRAGA.
Resende, 19 de julho de 2011.
ROSANGELA PINTO LUCENA
Diretora de Secretaria
SENTENÇA
I - RELATÓRIO
A ASSOCIAÇÃO DOS AMIGOS DO ITATIAIA propõe AÇÃO CIVIL
PÚBLICA em face de UNIÃO FEDERAL e o INSTITUTO CHICO MENDES DE
CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE com pedido liminar, visando 1.a) “sejam
declarados nulos o decreto federal nº 87.586, de 20.09.82, e os atos administrativos
(normativos ou executório) nele apoiados – por vício formal, ilegalidade do objeto e
insubsistência de motivos (CC 104, I e II, 186/187, c/c. lei 4717/65, 2º)” ou,
alternativamente, 1.b) “seja declarado caduco o decreto federal 87.586, de 20.09.82, e sem
efeito os atos administrativos (normativos ou executórios) dele derivados , quer por inércia
do poder público no qüinqüênio decadencial, quer por superveniência de norma com novas
exigências”; (2) sejam os réus “proibidos” de 2.a) “expedirem atos expropriatórios dos
imóveis situados na área do Núcleo Colonial Itatiaia ou qualquer ato tendente a dissolver a
comunidade local e respectivo patrimônio social (histórico, cultural, científico)”; 2.b)
“aplicarem o programa de monitoramento do plano de manejo na área do Núcleo Colonial
Itatiaia”; 2.c) “turbarem ou esbulharem os direitos dos proprietários de imóveis no citado
Núcleo, especialmente no que concerne à entrada, saída e circulação de pessoas e coisas e à
construção, reforma e pintura das suas casas”; 2.d) “praticarem atos que impliquem
desvalorização dos imóveis ou que interfiram na respectiva negociação ou atividade
hoteleira”; 2.e) “derrubarem árvores sem as cautelas legais , tanto na área do Núcleo
Colonial, com na área do Parque Nacional” ; (3) “determinar aos réus” 3.a) “a devolução do
acervo ao Museu local”; 3.b) “a implantação do sistema de filtragem e fossas compatíveis
Assinado eletronicamente. Certificação digital pertencente a JOAO BATISTA MARTINS PRATA BRAGA.
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com a preservação da qualidade de vida, nas edificações da União, tanto as localizadas no
Núcleo Colonial (casas de funcionários, sede do Parque, Abrigo do Pesquisador) como as
localizadas no Parque Nacional (Abrigo Rebouças, Posto Marcão)”; 3.c) “ a restauração (i)
da estrada federal BR 485 na extensão do Núcleo Colonial e do Parque Nacional, (ii) das
vias de circulação interna do Parque Nacional”; 3.d) “que respeitem a autonomia municipal
e a iniciativa da Prefeitura Municipal de Itatiaia para criar unidade de conservação da
natureza no Núcleo Colonial Itatiaia do modo menos oneroso para a sociedade, para o
erário e para os proprietários, evitando desapropriações, remoção de famílias e dissolução
da comunidade local”. Pugna, outrossim, (4) pelas cominações legais em caso de
descumprimento e condenação nas custas e honorários advocatícios.
Como medida de urgência, pugna por provimento antecipatório referente ao
item 02 da inicial no sentido de que sejam os réus proibidos de: 2.a) “expedirem atos
expropriatórios dos imóveis situados na área do Núcleo Colonial Itatiaia ou qualquer ato
tendente a dissolver a comunidade local e respectivo patrimônio social (histórico, cultural,
científico)”; 2.b) “aplicarem o programa de monitoramento do plano de manejo na área do
Núcleo Colonial Itatiaia”; 2.c) “turbarem ou esbulharem os direitos dos proprietários de
imóveis no citado Núcleo, especialmente no que concerne à entrada, saída e circulação de
pessoas e coisas e à construção, reforma e pintura das suas casas”; 2.d) “praticarem atos
que impliquem desvalorização dos imóveis ou que interfiram na respectiva negociação ou
atividade hoteleira”; 2.e) “derrubarem árvores sem as cautelas legais , tanto na área do
Núcleo Colonial, com na área do Parque Nacional”, com as cominações legais em caso de
descumprimento.
Como causa de pedir assevera, em apertada síntese, que o decreto federal
nº 87.586, de 1982, que promoveu a ampliação do Parque Nacional, com a incorporação do
Núcleo Colonial e outras áreas da Serra da Mantiqueira encontra-se eivado de
antijuridicidade e vem sendo utilizado pelos réus como instrumento de turbação dos direitos
dos associados da autora, manifestado pelas mais diversas formas, tais como proibições,
exigências de posturas, represálias, etc. Cuida-se de ato não auto-executável, dependendo
de atos administrativos complementares, não conferindo a transmissão das propriedade
particulares ao Estado. Demais disso, o retro citado decreto federal, a seu juízo, perdeu
eficácia por inação estatal dada a demora de se editar os atos declaratórios de utilidade
pública e o decreto expropriatório da área. Defende a tese, nesse passo, que o decreto
federal consiste em instrumento político que cumpre apenas a primeira fase da vontade
estatal de ampliação, qual seja, “a fase declaratória” de um processo composto por outras
fases (qualificação da área e transferência de domínio), que, ao final, não se sucederam.
Demais disso, a legislação hoje, alterada, desafia outros requisitos para criação de unidade
de conservação (CF, art. 225; L. 9985/00, art. 22, §2º). Assevera que a relação do Poder
público com os proprietários associados é horizontal, não se permitindo, na hipótese, a
preponderância do primeiro sobre o segundo, mas uma relação regrada à luz do direito de
vizinhança. Traz a descrições de diversas ações do Poder Público que reduzem seus
direitos. Por fim, alega não haver razoabilidade na eleição do modelo de unidade de
conservação, por não escolhido, dentre os tipos possíveis, o menos oneroso aos cidadãos,
dado o reflexo que cada qual exerce através das limitações administrativas. Conclui: “se os
réus pretendem fazer do Núcleo Colonial Itatiaia unidade de conservação da natureza,
deverão fazê-lo através da prefeitura municipal, respeitando a autonomia e a competência
outorgadas ao Município pela Constituição Federal” (f. 16).
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A inicial vem acompanhada de documentos (f. 20-427), merecendo
destaque a de f. 21-29 (estatuto social).
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Protraída a apreciação da tutela de urgência, determinou-se a citação dos
réus e intimação do MPF e do Município de Itatiaia (f. 429).
O Município de Itatiaia manifestou o interesse de compor o pólo ativo,
como assistente (f. 439).
A União Federal ofereceu resposta, na forma de contestação a f. 442-492.
Junta documentos (f. 493-641). Suscitou preliminares: 1- inadequação da via eleita, pois a
presente tem por escopo apenas a proteção do patrimônio particular; 2- ilegitimidade do
pólo ativo, tem em vista a formação da entidade autora e sua modificação, pouco antes do
ajuizamento, de seus estatutos. Respondeu, também, o ICMBio, ofertando contestação a f.
642-656. Junta documentos (f. 657-952).
Manifestou-se a autora a f. 953-956, oportunidade em que requereu a
suspensão de editais de licitação por se tratarem de matéria afeta ao objeto da presente.
Manifestou-se o MPF pela necessidade de sua intervenção (f. 975).
Nova promoção da autora a f. 976; 981-982.
Vieram aos autos manifestações, na forma de moções, de diversas
entidades ligadas ao Parque Nacional (f. 983-987; 988-991).
Espontaneamente, a autora oferece réplica (f. 992-1009).
Analisado o presente, o feito é extinto, sem resolução do mérito, quanto
aos pedidos formulados nos itens I, II e III “d” da petição inicial. O pedido formulado no
item III, “a”, “b” e “c” é admitido. O pedido de antecipação de tutela é declarado
prejudicado e as partes são intimadas a manifestarem-se, querendo, o interesse na produção
de provas (f. 1010-1016).
O MPF informa que o item III “a” do pedido autoral, que trata da
remoção do acervo do Museu, está sendo acompanhado por meio do procedimento
ministerial nº 1.30.008.000023/2006-53 e requer a juntada da informação técnica nº
253/2009 emitida pela Eg. 4ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público
Federal (f. 1020- 1027).
A parte autora informa que pretende produzir prova testemunhal (f.
1028).
A parte autora interpõe agravo retido (f. 1029-1041).
A União e o ICMBio não se manifestaram quanto à produção de provas
(f. 1042).
Saneado o feito, é deferida a produção de prova testemunhal (f. 10471048).
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A União requer a oitiva do Chefe do Parque Nacional.(f. 1052).
O MPF junta documentos protocolados por servidor do Parque Nacional
do Itatiaia (1057-1302).
Embora intempestivo o pedido de produção de prova testemunhal, pela
União, em razão da relevância sócio-econômica da questão, é deferida a oitiva do Chefe do
Parque Nacional e designada audiência de instrução (f.1305-1306).
A União acrescenta testemunhas a seu rol (1307-1309),
intempestivamente, pelo que é indeferido o novo requerimento de produção de prova
testemunhal (f. 1307-1309).
É determinada a inclusão do Município de Itatiaia no pólo ativo da
presente demanda (f. 1329).
A União junta documentos (f. 1333-1488).
Em audiência, colhidos os depoimentos, a parte autora contradita a
testemunha da União. Não acolhida a contradita formulada, a parte autora recorre, na forma
retida. Encerrada a fase probatória é concedido prazo para as partes, querendo,
apresentarem alegações finais (f. 1493-1504).
Foram apresentadas as alegações finais pela parte autora (f. 1506-1508),
União(f. 1509-513), ICMBio (f. 1514-1523) e o MPF (f. 1528-1541). A União manifesta-se
às fls. 1542-1543 e junta documentos (f. 1544-1547).
II - FUNDAMENTAÇÃO
Conforme fundamentado na decisão de fls. 1010/1016, a apreciação da
controvérsia foi restringida para a análise dos seguintes pleitos: determinar aos réus: a) “a
devolução do acervo ao Museu local”; b) “a implantação do sistema de filtragem e fossas
compatíveis com a preservação da qualidade de vida, nas edificações da União, tanto as
localizadas no Núcleo Colonial (casas de funcionários, sede do Parque, Abrigo do
Pesquisador) como as localizadas no Parque Nacional (Abrigo Rebouças, Posto Marcão)”;
c) “a restauração (i) da estrada federal BR 485 na extensão do Núcleo Colonial e do Parque
Nacional, (ii) das vias de circulação interna do Parque Nacional”.
II.1.PRELIMINARES
II.1.1. Da Ilegitimidade Passiva
Pretende a parte autora ver os réus, União Federal e ICMBio, condenados
a promoverem a restauração da estrada federal BR 485 na extensão do Núcleo Colonial e
do Parque Nacional de Itatiaia.
Conforme preceitua a Lei n° 10.233/01 que, dentre outros, criou o
Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transporte – DNIT, autarquia federal
vinculada ao Ministério dos Transportes, são objetivo e atribuições do referido órgão:
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Art. 80. Constitui objetivo do DNIT implementar, em sua esfera de atuação, a política
formulada para a administração da infra-estrutura do Sistema Federal de Viação,
compreendendo sua operação, manutenção, restauração ou reposição, adequação de
capacidade, e ampliação mediante construção de novas vias e terminais, segundo os
princípios e diretrizes estabelecidos nesta Lei.
Art. 81. A esfera de atuação do DNIT corresponde à infra-estrutura do Sistema Federal
de Viação, sob a jurisdição do Ministério dos Transportes, constituída de:
II – ferrovias e rodovias federais;
Art. 82. São atribuições do DNIT, em sua esfera de atuação:
I – estabelecer padrões, normas e especificações técnicas para os programas de
segurança operacional, sinalização, manutenção ou conservação, restauração ou
reposição de vias, terminais e instalações;
II – estabelecer padrões, normas e especificações técnicas para a elaboração de projetos
e execução de obras viárias;
IV - administrar, diretamente ou por meio de convênios de delegação ou cooperação, os
programas de operação, manutenção, conservação, restauração e reposição de rodovias,
ferrovias, vias navegáveis, terminais e instalações portuárias fluviais e lacustres,
excetuadas as outorgadas às companhias docas;
V - gerenciar, diretamente ou por meio de convênios de delegação ou cooperação,
projetos e obras de construção e ampliação de rodovias, ferrovias, vias navegáveis,
terminais e instalações portuárias fluviais e lacustres, excetuadas as outorgadas às
companhias docas, decorrentes de investimentos programados pelo Ministério dos
Transportes e autorizados pelo Orçamento Geral da União;
Resta assim evidente que a satisfação do pleito autoral, acaso venha a ser
acolhido, não é de responsabilidade legal de nenhum dos réus arrolados na petição inicial,
sendo de competência do DNIT, ente de direito público distinto e autônomo dos demais
réus.
Deve, portanto, ser extinto o processo sem julgamento do mérito, com
fulcro no art. 267, VI do CPC, em relação ao pleito de restauração da BR 485.
II.1.2. Da Impossibilidade jurídica do pedido
Almeja a parte autora a restauração das vias de circulação interna do
Parque Nacional ao argumento de que “as trilhas e as vias de circulação estão em péssimo
estado” (fl. 06).
Conforme Decreto n° 87.586/82, que ampliou a área do Parque Nacional
de Itatiaia, referida unidade de conservação possui 30.000 hectares, equivalente à 300
quilômetros quadrados.
Com efeito, em área de tamanha dimensão, equiparável a uma cidade de
médio/grande porte (para se ter uma idéia, Resende-RJ possui 101km2)1, há infinitas trilhas
e vias de circulação interna, de sorte que qualquer comando judicial acaso manifestado
acerca do tema seria inexeqüível dada a imprecisão do objeto litigioso, levando à
constatação de que o pleito autoral não obedece ao quanto disposto no art. 286 do CPC.
A toda evidencia é impossível o prolatação de um comando judicial tão
incerto e impreciso como o pretendido pela parte autora, merecendo referido pleito ser
1
http://www.resende.rj.gov.br/page/informacoesgerais.asp
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extinto sem julgamento do mérito em face da sua manifesta impossibilidade (art. 267, VI,
CPC).
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II.2. MÉRITO.
II.2.1. Da devolução do acervo ao museu local.
Afirma a parte autora que “o acervo do museu da comunidade do Núcleo
foi removido para a cidade do Rio de Janeiro, desfalcando o patrimônio social (histórico,
cultural e científico) por decisão autoritária do atual administrador do parque. (...) acervo
removido à sorrelfa, contra a expressa vontade dos membros da comunidade (relatório
anexo). A memória cultural e a existência da comunidade estão ameaçadas para conduta
arbitrária dos réus.” (fl. 04)
Inicialmente, cabe destacar que o acervo existente no Centro de Visitantes
do Parque Nacional de Itatiaia, diferentemente do que entende a parte autora, não constitui
propriedade particular, mas sim bem público - administrado por esta unidade de
conservação vinculada ao Instituto Chico Mendes de Conservação Ambiental e
Biodiversidade, autarquia federal -, destinado, por sua natureza, à satisfação do interesse
coletivo, não podendo este ser preterido em prol de interesses particulares.
Analisando os autos, constata-se que o processo de remoção de parte do
acervo então existente no Centro de Visitantes do Parque Nacional de Itatiaia insere-se
dentro de um contexto de comemoração dos 70 anos do PARNA Itatiaia, tendo sido
adotadas medidas tendentes a preservar e revitalizar os bens públicos sob a tutela daquela
unidade de conservação.
Assim, imbuído desse espírito, o PARNA Itatiaia, por intermédio da
Autarquia à qual era ligada – IBAMA, celebrou convênio com o Instituo de Pesquisas
Jardim Botânico do Rio de Janeiro, cujo objetivo era de instituir um programa de
cooperação técnico-cientifico entre os participantes, visando ao avanço no conhecimento
sobre a vegetação e a flora do PARNA Itatiaia e o enriquecimento das coleção botânicas de
ambas as instituições, bem como apoiar o programados 70 anos do Parque, cujo extrato do
instrumento foi devidamente publicado no DOU, conforme consta às fls. 1119/1125.
Desta feita, promoveu o PARNA Itatiaia, em março/2007, a transferência
de espécies botânicas ao Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro (fls.
1129/1130). Deve ser destacado que, conforme parecer técnico lavrado por servidores
públicos vinculados ao Jardim Botânico do Rio de Janeiro (fls. 1062/1064), a coleção que
foi apresentada encontrava-se em péssimo estado de conservação, sendo que “cerca de 70%
da coleção estava em estado deplorável e foi perdida”, demonstrando que o parque
nacional não detinha condições necessárias à preservação desses bens.
Cabe destacar que, chegando no Instituto de Pesquisas Jardim Botânico
do Rio de Janeiro, o material botânico foi devidamente tratado, restaurado, limpado e
reorganizado, sendo que, após a restauração, as espécies passam por processo de
informatização de modo a possibilitar a visualização das mesmas através da rede mundial
de computadores (fls. 1135/1136).
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Com relação às espécies animais, fulcrado no mesmo intento de
preservação e revitalização imposto pela comemoração dos 70 anos do Parque de Itatiaia,
fora celebrado convênio entre o Instituto Chico Mendes e o Museu Nacional/UFRJ com o
escopo de manter, conservar e recuperar a coleção de espécimes vertebrados e/ou
invertebrados pertencentes ao Parque Nacional localizados nas dependências do seu Centro
de Visitantes (fls. 1296/1300), tendo sido então transferido parte do acervo.
Conforme reconhecido pelo próprio Parque Nacional, referida unidade de
conservação não detinha condições mínimas de restaurar e preservar o acervo existente no
Centro de Visitantes (fls. 1189/1190), encontrando-se a coleção infestada de fungos,
exposta a luminosidade excessiva, que provocou alteração da coloração de parte dos
animais, e bastante danificada (fls. 1191/1193). Esse fato é evidenciado pelas condições em
que se encontravam as espécies quando chegaram ao Museu Nacional (fls. 1158/1184),
podendo-se observar que diversos itens encontravam-se em mediano, ruim e péssimo
estado de conservação, sendo que muitos estavam quebrados.
Conclui-se então que a remoção das espécies da flora e do acervo do
Centro de Visitantes destinou-se a melhor tutelar os bens ambientais administrados pelo
PARNA Itatiaia, em razão da insuficiência de recursos técnicos, científicos e estruturais por
parte desta unidade de conservação para promover a melhor administração desse valioso
arquivo, não havendo sido constatada qualquer arbitrariedade nos atos administrativos que
deram ensejo às transferências, agindo a administração pública em estrita observância aos
ditames constitucionais que impõem ao Poder Publico o dever de defender e preservar o
patrimônio ambiental:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.
Deve ser afirmado também que a parte autora não demonstrou a
inveracidade dos motivos que levaram à remoção do acervo, não tendo ficado demonstrado
em nenhum momento que, ao contrário do que expressamente reconhecido pelo PARNA
Itatiaia, haveria condições de os bens ambientais lá permanecerem sem prejuízo de sua
correta e adequada defesa e preservação.
É compreensível que a comunidade de Itatiaia não queira perder de vista
esse patrimônio ambiental que tanto tempo lhe foi vizinho, mormente quando se tem em
mente a beleza natural que ostenta. Entretanto, esse interesse não pode se sobrepor ao
primado do interesse público, principio norteador de toda administração pública, muito
mais ainda no caso em análise, quando restou evidenciado que a permanência do mesmo no
parque nacional colocaria em risco a própria integridade do bem publico.
Ademais, é notório que a exposição dessas coleções, após os processos de
restauração, nos órgão públicos de destino (Jardim Botânico do Rio de Janeiro e Museu
Nacional do Rio de Janeiro) possibilita uma melhor e maior disseminação do estudo
relativo às espécies da flora e da fauna de que trata, dada a maior exposição e publicidade
que referidos órgãos possuem, situação que se compatibiliza inteiramente com o objetivo
inserto no VI do §1° do art. 225 da CF/88:
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Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização
pública para a preservação do meio ambiente;
Por fim, é de bom tom destacar que todo o procedimento relativo à
transferência do acervo da flora e da fauna do Parque Nacional de Itatiaia para o Jardim
Botânico do Rio de Janeiro e para o Museu Nacional/UFRJ foi devidamente acompanhado
pelo Ministério Público Federal tendo os analistas do parquet avalizado os procedimentos
destacando que: “relativamente à conservação do acervo científico (coleção botânicas,
entomológicas e de animais taxidermizados) e de sua exposição aos visitantes, não
apresentamos objeções à conduta adotada pelo PNI que, segundo infere-se nos autos,
dispõe de uma equipe técnica ativa na gestão dos recurso científicos disponíveis naquela
UC. Além disso, o material cientifico que não ficará sob a guarda direta do Parque estará
sob responsabilidade de instituições públicas conceituadas e de referência na temática,
que atuarão na desinfecção, limpeza, recuperação, registro e devida conservação dos
exemplares.” (fls. 1021/1027).
II.2.2. Da implantação do sistema de filtragem e fossas compatíveis com
a preservação da qualidade de vida
Afirma a parte autora que “nas casas dos funcionárias do parque e em
outras edificações existentes nos lotes da União, tanto as situadas no Núcleo Colonial
como as situadas no Parque Nacional, não há esgotamento sanitário correto do ponto de
vista ecológico; urina e fezes humanas são lançadas em fossas rústicas ou diretamente no
rio, poluindo águas que abastecem a cidade.”
As afirmações autorais, no que pertine ao pedido em análise, não
encontram lastro probatório nos autos, tendo inclusive uma testemunha por ela arrolada
afirmado que existem fossas construídas nas unidades administradas pelo parque,
afirmando, contudo, não saber como se dá o tratamento sanitário (fl. 1500).
Em que pese a afirmação autoral de que resíduos seriam lançados
diretamente nos rios não ter ressonância nos autos, o pleito em questão merece uma análise
mais detalhada sobretudo quando se observa o Plano de Manejo do Parque Nacional do
Itatiaia elaborado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
(ICMBio) em abril/2009, repousante às fls. 687/756.
Consta no referido documento ser uma necessidade do PARNA Itatiaia
“rever o sistema de esgotos das instalações do PNI e substituí-los por sistema mais
ecologicamente corretos, do tipo Sanetec, incluindo as ocupações funcionais.” (fl. 703).
Tal necessidade é confirmada pelo Chefe do Parque Nacional em
depoimento judicial (fl. 1496), admitindo ele que “a rede sanitária existente na ponte da
Maromba, no Centro de Visitantes e no Abrigo Rebouças foi construída há muitas décadas
atrás e que existe um projeto de substituição dessa rede por conta da comemoração dos 75
anos do PARNA-Itatiaia.”
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Tal fato, por si só, não daria ensejo a maiores conseqüências ante a
constante e natural necessidade de estar a administração publica se aperfeiçoando, visando
sempre a consecução do principio da eficiência, aqui tratada em sentido amplo. Entretanto,
um dado chama a atenção e impõe a adoção de providências: o reconhecimento pela
administração pública, não só da necessidade de substituição da rede sanitária, mas também
da gravidade da situação:
“Rever o sistema de esgotos das instalações do PNI e substituí-los por
sistema mais ecologicamente corretos, do tipo Sanetec, incluindo as
ocupações funcionais.
Iniciar pelos casos de maior gravidade, a exemplo do Abrigo 3 e a casa
do Pesquisador.” (fl. 703).
Evidencia-se, pois, não só que os sistemas de tratamento sanitário
utilizados no PARNA Itatiaia são antigos e ineficientes do ponto de vista ambiental, como
também que a sua manutenção é potencialmente lesiva ao meio ambiente dada a gravidade
em que se encontram os sistemas de instalação sanitária das unidades do parque.
Frise-se que, em que pese os próprios gestores do Parque Nacional
reconhecerem a deficiência e a necessidade de alteração da rede sanitária hoje existente,
planejando a correção do sistema, isso não indica ausência de interesse de agir por
desnecessidade de tutela judicial, pois, a simples previsão de determinado projeto não é
garantia de sua execução.
Não há ainda que se falar em impossibilidade de acolhida do pleito
autoral por inexistência de danos comprovados ao meio ambiente, vez que deve se ter em
mente que, em se tratando de meio ambiente, o termo prevenção guarda importância
primeira.
O princípio da prevenção é o mais importante princípio do ordenamento
jurídico ambiental, visto que parte do pressuposto incontestável de que a prevenção é o
grande objetivo de todas as normas ambientais, pois, uma vez desequilibrado o meio
ambiente, a reparação ou a recomposição é, na maior parte das vezes, difícil ou
praticamente impossível.
Esperar que o dano se concretize quando há indícios de sua ocorrência (os
próprios gestores falam em “casos de maior gravidade”) é atentar contra o comando
constitucional que impõe ao Poder Público o dever de defender e preservar o meio
ambiente (art. 225, CF/88).
Em sendo o Parque Nacional do Itatiaia uma unidade de conservação
federal vinculada ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, autarquia
responsável pela gestão, proteção e fiscalização das unidades de conservação (art. 1°, I, Lei
n° 11.516/07), deve ser, somente ele, responsabilizado pelas obras de alteração da rede
sanitária.
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III. DISPOSITIVO
Ante o exposto, com fulcro no art. 267, VI do CPC, extingo o processo
sem julgamento do mérito em relação ao pleito de restauração da estrada federal BR 485 na
extensão do Núcleo Colonial e do Parque Nacional, e das vias de circulação interna do
Parque Nacional. Com fulcro no art. 269, I do CPC, resolvo o mérito para julgar
PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos apenas para condenar o Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade a substituir, no prazo de 02 (dois) anos contados
do trânsito em julgado desta decisão, os sistemas de esgotos das instalações do PNI,
incluindo as ocupações funcionais, por sistemas do tipo Sanetec ou outro similar.
Fixo, desde já, multa de R$ 500,00 (quinhentos reais) por dia, limitada à
R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), em caso de descumprimento da obrigação de fazer ora
determinada, valor este a ser revertido em favor do Fundo Nacional do Meio Ambiente,
sem prejuízo da apuração de eventual prática de ato de improbidade administrativa.
Sem condenação em custas processuais e honorários advocatícios (art. 18,
Lei n° 7.347/85).
Sentença sujeita a reexame necessário.
Publique-se. Registre-se. Intime-se.
Resende, 07 de Fevereiro de 2012.
Assinado digitalmente
JOÃO BATISTA MARTINS PRATA BRAGA
Juiz Federal Substituto
Assinado eletronicamente. Certificação digital pertencente a JOAO BATISTA MARTINS PRATA BRAGA.
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A Sentença Judicial que confirma o acerto da pesquisa do