Folha Bancária São Pau lo, qu i nta-f e i rA | 12 de MARÇO de 2009 | e special A grande virada Há 30 anos, uma vitória que ajudou a mudar o sindicalismo e o Brasil N o final dos anos de 1970, a ditadura militar não conseguia mais segurar a luta pela liberdade que tomava conta do Brasil. As greves que explodiam principalmente no ABC paulista criavam um novo sindicalismo, que lutava pela redemocratização do país e contra a estrutura sindical autoritária imposta pela ditadura. Foi neste contexto que os bancários de São Paulo fizeram história há exatos 30 anos, quando, em 2 de fevereiro de 1979, um grupo de jovens funcionários dos bancos – entre eles Augusto Campos, Luiz Gushiken, Gilmar Carneiro e João Vaccari Neto que assumiriam a presidência do Sindicato posteriormente – conseguiu o que parecia impossível: vencer uma eleição que recolocou o Sindicato na luta pelos direitos da categoria e por uma sociedade mais justa e democrática. A posse foi no dia 12 de março daquele ano. A eleição acabou sendo um marco na história dos trabalhadores brasileiros e foi fundamental, por exemplo, para a criação da CUT, quatro anos mais tarde. As muitas vitórias da categoria de lá para cá não apagam aquele difícil começo, por conta da forte repressão dos militares e da falta de estrutura para mobilização do Sindicato, que contava apenas com uma máquina offset pequena para rodar boletins e um megafone. Nesses trinta anos, o Sindicato cresceu e se estruturou. Criou subsedes regionais que se espalharam pela cidade e aproximaram ainda mais a entidade dos bancários. A pequena e arcaica máquina offset deu lugar a uma das mais modernas e importantes gráficas do país, a Bangraf. Já no primeiro mandato, o número de sindicalizados saltou de 26 mil, em 1979, para 46 mil em 1981. Os bancários também ganharam um centro de formação que investe na educação dos profissionais. Além disso, a partir de 79, o Sindicato passou a atuar mais voltado para a sociedade, investindo em políticas públicas que favorecem todo o Brasil. Repressão e recessão – “Não havia liberdade nenhuma, a repressão era extremamente violenta”, lembra o diretor do Sindicato à época, Gilmar Carneiro, que foi preso por quinze vezes e alvo de dossiês com mais de mil páginas no Arquivo Nacional e na Delegacia Especializada de Ordem Política e Social de São Paulo, a Deops. “O país passava por uma grave crise econômica, havia um forte arrocho salarial, o desemprego era alto e a inflação descontrolada. Essa combinação era pior que a falta de liberdade e dos direitos humanos do ponto de vista da mobilização. A economia era o maior empecilho”, conta. Mas a conjuntura política era extremamente favorável, explica Deli Soares que, em 79, trabalhava no Banco do Brasil. “A categoria estava repleta de pessoas que também integravam o movimento estudantil e que queriam uma direção que enfrentasse a ditadura e os banqueiros, que brigasse pela anistia, pela volta das eleições diretas”, afirma Deli. O início e a consolidação – A primeira greve comandada pela nova diretoria, em 1979 (fotos), consolidou a nova proposta de sindicalismo, mas também acirrou as perseguições por parte do governo, resultando no afastamento de quatro dirigentes e no enquadramento de outros dezesseis na Lei de Greve e um na Lei de Segurança Nacional. Um ano antes, em 1978, os bancários já haviam encam- pado uma greve, que permitiu a vitória nas eleições da entidade. Essas duas paralisações serviram de aprendizado para consolidar uma organização no local de trabalho que permitiu a histórica greve nacional de 1985. Um movimento de massa que foi resgatado na greve da categoria do ano passado. A relação com os bancos – Os bancos, aliados do Estado e dos militares, endureciam nas relações com os bancários e com o Sindicato. “O Itaú contratava espiões profissionais para infiltrá-los em nossas reuniões. O Bradesco fazia o que queria com as leis. Era muito complicado, mas o fato de os bancários serem uma grande categoria, mais de 1 milhão na época, fazia a mobilização ser mais fácil”, comenta Gilmar. As eleições ocorreram entre 29 de janeiro e 2 de fevereiro de 1979 e as primeiras greves que os bancários encamparam em plena ditadura militar foram os embriões que formaram o que o Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região é hoje: uma das maiores e mais fortes entidades representativas dos trabalhadores do mundo. | Sindicato dos Bancários | quinta-feira, 12 de março de 2009 1 9 7 9 , o a n o d a v i ra d a Antes de tudo, uma luta pela liberdade Essa é a definição do líder sindical Luiz Gushiken para a retomada do Sindicato, em 1979 que assumiu o Sindicato em 1979 como vice-presidente (leia a íntegra no www.spbancarios.com.br). Novo sindicalismo – Em 1978, o ambiente político vivido pelo Brasil, em plena ditadura militar, era extremamente tenso. Para disputar as eleições para o Sindicato, o grupo de oposição precisou organizar uma campanha que dialogasse com toda a sociedade, com palavras de ordem como democracia e liberdade. “Precisávamos desse apoio porque sabíamos que a disputa teria um grande impacto no movimento sindical brasileiro. A partir daquela eleição, os bancários começaram a ganhar os sindicatos no Brasil inteiro, tirando os pelegos das direções”, lembra. “Sem medo de errar, posso dizer que, depois dos Metalúrgicos do ABC, o Sindicato dos Bancários de São Paulo foi a entidade mais importante para a construção do novo sindicalismo”, diz. Os primeiros anos – Com a vitória consolidada, a nova diretoria enfrentou um novo desafio: estruturar um Sindicato que há anos não representava de fato a categoria. “Era um sindicato burocrático, não tinha relação nenhuma com a massa. Para falar com os bancários na rua, tínhamos apenas um megafone a pilha”, recorda. “Evoluímos para os autofalantes ligados em bateria de carro ou numa tomada emprestada de um barzinho que ficava em frente ao banco Itaú, da Rua Boa Vista. Mas ainda não estava bom e foi aí que inventamos o aparelho de som com base em gerador de gasolina. Este tipo de som, usado muito hoje em dia, foi uma criação do nosso Sindicato”, conta. Ditadura – Gushiken não se esquece da perseguição sofrida por parte da ditadura, que cassou toda a diretoria um ano depois e nomeou um interventor para o Sindicato. Os bancos, por sua vez, utilizavam todo seu poder econômico e político para reprimir a organização dos bancários. “Os sindicalistas eram impedidos de entrar nos bancos. Se fazíamos greve, os bancos chamavam a polícia e apanhávamos muito. As negociações feitas com a diretoria anterior do Sindicato eram pró-forma, um rito para os bancários se curvarem à vontade do patronato. Conseguimos mudar isso quando passamos a divulgar o resultado das negociações nos jornais diários que tínhamos”, relembra. Na época da intervenção, Gushiken e os companheiros de Sindicato arrecadavam dinheiro na porta dos bancos para pagar o boletim diário. “Foi um momento bastante educativo. Antes de tudo, era uma luta política pela liberdade”, conclui. Greve dos bancários, em 1979 cedoc-seeb/sp No final da década de 1970, o jovem funcionário do Banespa Luiz Gushiken juntouse a um grupo de bancários de São Paulo para formar um movimento que visava retomar o Sindicato, que, então, só servia para homologar as decisões dos bancos. Depois de muita luta, o grupo tomou posse em 12 de março de 1979, reassumindo o Sindicato que, 30 anos depois, está entre as maiores e mais importantes entidades de representação dos trabalhadores em todo o mundo. Para comemorar, o Sindicato relançará um vídeo, gravado em 1989 e vencedor do prêmio Wladimir Herzog à época, que relata a história daquele movimento fundamental para os bancários e para a redemocratização do Brasil. E, ao longo do mês de março, uma série de entrevistas trará o ponto de vista dos protagonistas dessa história. Nesta edição, Luiz Gushiken, quinta-feira, 12 de março de 2009 | Sindicato dos Bancários | 3 1 9 7 9 , o a n o d a v i ra d a Apuração dos votos foi tensa Representantes dos bancos e da ditadura militar acompanharam clandestinamente o resultado cedoc-seeb/sp Bancários decidem em assembléia deflagrar greve em 1979 Foi uma noite tensa aquela em que o Sindicato foi retomado pela categoria, há 30 anos. Durante a apuração, representantes dos bancos e da ditadura militar infiltraram-se clandestinamente para acompanhar o resultado. “Governo não era uma coisa distante como é hoje. A ditadura militar tinha interesse nas eleições do Sindicato, tanto que o Ministério do Trabalho atrasou por seis meses o pleito”, conta o bancário João Vaccari Neto, que na época era militante de base da chapa de oposição. Vaccari ingressou na diretoria em 1985 e presidiu o Sindicato de 1998 a 2003. O dirigente destaca que o movimento que culminou na eleição da oposição no Sindicato foi de extrema importância para o Brasil naquele momento de ebulição. “O Lula já era diretor do Sindicato dos Metalúrgicos. O Olívio Dutra já era da dire- ção do Sindicato dos Bancários de Porto Alegre. Eles se rebelaram e arrancaram os pelegos da entidade. Aqui não. A oposição era formada por bancários de base que montaram uma chapa e arrancaram no voto uma diretoria que não era combativa e não tinha representatividade”, ressalta Vaccari. Os primeiros anos – Mudar a face assistencialista para um Sindicato combativo e que lutasse pela democracia e por políticas sociais não foi tarefa fácil. Sem dinheiro, sem estrutura e baixa sindicalização, a criatividade dos novos sindicalistas supria as deficiências. Logo na primeira greve, em 1979, os dirigentes perceberam que o passo inicial seria parar um centro importante para os bancos: a câmara de compensação. Equipes da Rota logo chegaram para conter os bancários. Vaccari lembra que os policiais chegaram perguntando pelo chefe da paralisação. Um gaiato levantou a mão e assumiu o comando. “Ele foi preso na hora e o resto apanhou da polícia”, completa. A política – Desde os primeiros anos da retomada do Sindicato, os novos dirigentes perceberam a importância de os bancários lutarem em outra frente, na política. “Sempre tivemos o entendimento de que era preciso eleger deputados estaduais e federais, vereadores. Assim conseguimos lutar com mais força por políticas sociais e na defesa dos trabalhadores. É uma tradição que mantemos até hoje”, diz Vaccari, que atualmente é suplente no Senado. Leia a matéria completa no www.spbancarios.com.br. O Sindicato ganhou vida nova Bancário do BB fala do clima na categoria nos dias seguintes à histórica eleição de 1979 só decidiu se sindicalizar seis meses antes das eleições de 79 para poder votar. “Era o prazo máximo. Eu não me sindicalizei nem um minuto antes para não dar um tostão para aquela diretoria que não me representava. Só me filiei para poder votar”, conta o bancário. Naqueles difíceis anos de da ditadura, qualquer manifestação era rapidamente reprimida com violência pela polícia militar. A censura e todos os outros instrumentos de coerção do governo, entretanto, só serviam para estimular a luta dos brasileiros pela redemocratização do país, segundo Genésio. “Muitos de nós, bancários, já participávamos do movimento estudantil. Entrar para a luta no Sindicato era mais um passo contra a ditadura. Todo esse caldo servia como estimulante para trabalharmos sempre em coletivo. Antes mesmo da retomada do Sindicato, invadíamos a entidade para nos reunir, seja para discutir questões do trabalho ou organizar a luta política. Às vezes, fazíamos reuniões no domingo à tarde que juntava mais de duzentos bancários”, lembra, destacando que o número de filiados ao Sindicato cresceu rapidamente após as eleições de 79. Mesmo com essa vontade toda de lutar pela liberdade, organizar as greves de 1978, 79 e 80 não foi fácil. Os bancos privados demitiam quem participasse do movimento e o governo reprimia os grevistas com violência. “Fazer greve significava certamente apanhar da polícia. Não tinha erro”, garante. Leia a íntegra da entrevista no www.spbancarios.com.br. Bancários desafiaram a ditadura e os bancos, com greves como a de 1979 cedoc-seeb/sp A retomada do Sindicato pela categoria em plena ditadura militar completa 30 anos, mas o bancário Genésio dos Santos Ferreira não se esquece da emoção que tomou conta dos trabalhadores nos dias que se seguiram à histórica eleição de 1979. “Foi uma grande festa, pela primeira vez eu vi o nosso Sindicato cheio de bancários. O clima de otimismo tomou conta da categoria, que não estava acostumada a encontrar dirigentes sindicais na porta do banco, com megafone na mão, lutando por melhores condições de trabalho. O sindicalista passou a ser de carne e osso e os bancários finalmente puderam se sentir representados. O Sindicato ganhou vida, uma novidade para todos, inclusive para os novos diretores”, recorda. Genésio era funcionário do Banco do Brasil desde 1974, mas quinta-feira, 12 de março de 2009 | Sindicato dos Bancários | 4 A RETOMADA História do Sindicato mudou a partir de 12 de março de 1979 H á trinta anos, no dia 12 março de 1979, tomava posse no Sindicato a primeira diretoria eleita democraticamente pelos bancários desde o início da ditadura militar. O endurecimento do regime com a edição do AI-5, em 1968, havia atingido em cheio o movimento sindical, com grande parte de suas lideranças presas ou assassinadas. Depois de anos de repressão e intervenções, em meados da década de 1970, com o refluxo dos anos de chumbo, o movimento sindical volta a se rearticular, em especial no ABC paulista. O bancário Augusto Campos, um dos líderes da oposição bancária e que assumiu a presidência do Sindicato em 1979, lembra daquele momento histórico. “Nós éramos oposição à estrutura sindical vigente. Em 1974, o então MDB teve uma vitória eleitoral esmagadora, que, se não aumentou o nosso grau de liberdade, diminuiu os espaços da Folha Bancária repressão. Assim, sobrevivemos à ditadura”, conta Augusto. A retomada do Sindicato dos Bancários de São Paulo foi de extrema importância para a redemocratização do Brasil. Foi fundamental, também, para a construção do novo sindicalismo, que culminou com a criação da Central Única dos Trabalhadores (CUT), em 1982. “A CUT nasceu porque era necessário que nós nos assumíssemos como classe trabalhadora. Precisávamos enfrentar os patrões como classe. O patronato defende um salário mínimo baixo, uma informalização absurda e que a CLT somente trate dos direitos individuais dos trabalhadores. Os patrões trabalham com um desemprego alto, uma vergonha de remuneração do FGTS (3% a.a.), o trabalho infantil e o trabalho escravo. E, mais importante de tudo, é que querem se apoderar de todo avanço de produtividade e socializar seus prejuízos. Assim, por mais que nós bancários sejamos organizados, seremos fracos, se não tivermos uma central que possa realmente organizar a todos nós como classe trabalhadora”, destaca Augusto. Assim que começou a abertura política no Brasil e o bipartidarismo acabou, os trabalhadores se organizaram ainda mais para ser protagonistas da reorganização partidária. “Não aceitamos ser o departamento sindical do então MDB e procuramos criar um partido político que nos representasse não só como trabalhadores, mas principalmente como cidadãos em busca de uma sociedade igualitária. Fato mais que auspicioso foi a vitória do PT, com a eleição do companheiro Lula para presidente da República. Quantos quadros do movimento sindical não foram servir a essa bandeira? Luiz Gushiken, Ricardo Berzoini, Jair Meneguelli, Paulo Okamoto, José Pimentel, Luiz Dulci, Olívio Dutra”, enumera. Futuro – Para Augusto Campos, a comemoração dos 30 anos da retomada do Sindicato deve apontar para os novos sindicalistas que um bom caminho foi percorrido, mas que não é suficiente. “Nossa caminhada ainda é dura, com novas idéias, novos valores, e aí comemoraremos mais. Não sou um saudosista que lembra das dificuldades da ditadura. Temos que olhar, sim, para o futuro, porque os desafios para uma geração serão sempre os mais difíceis, porque é sua existência, seus sonhos, seus valores”, finaliza. Comemoração – Nesta quintafeira, dia 12, o Sindicato realiza um ato solene em comemoração aos 30 anos da retomada da entidade. Lideranças do movimento que protagonizaram a luta dos trabalhadores no final dos anos de 1970 estarão presentes para falar dessa história de sucesso. Após a solenidade, haverá uma confraternização no Café dos Bancários. Presidente: Luiz Cláudio Marcolino. Diretor de Imprensa: Ernesto Shuji Izumi. e-mail: folhabancaria@spbancarios.com.br. Redação: André Rossi, Carlos Fernandes, Danilo Pretti Di Giorgi, Fábio Jammal Makhoul e Gisele Coutinho. Edição: Jair Rosa (Mtb 20.271). Edição Geral: Cláudia Motta. Diagramação: Thiago Cassiano Meceguel. Tiragem: 100.000 exemplares. Impressão: Bangraf, tel. 2940-6400. Sindicato: R. São Bento, 413, Centro-SP, CEP 01011-100, tel. 3188-5200. Regionais: Paulista: R. Carlos Sampaio, 305, tel. 3284-7873/3285-0027 (Metrô Brigadeiro). Norte: R. Banco das Palmas, 288, Santana, tel. 2979-7720 (Metrô Santana). Sul: R. Arizona, 1.o91, Brooklin, tel. 5102-2795. Leste: R. Icem, 67, tel. 2293-0765/2091-0494 (Metrô Tatuapé). Oeste: R. Gomes Freire, 241, Lapa, tel. 3836-7872. Centro: Rua São Bento, 413, tel. 3188-5295. Osasco e região: R. Presidente Castello Branco, 150, tel. 3682-3060/3685-2562. www.spbancarios.com.br