INSTITUTO BRASILEIRO DE AVALIAÇÕES E PERÍCIAS DE ENGENHARIA XIII COBREAP - Congresso Brasileiro de Engenharia de Avaliações e Perícias. ANÁLISE DINÂMICA DE ROMPIMENTO EM BARRAGEM DE REJEITOS Maia Neto, Francisco Engenheiro Civil e Advogado, CREA-MG 34.192/D, IBAPE-MG nº 226 Rua Benvinda de Carvalho, nº 239, 5º andar. 30.330180, Belo Horizonte, MG. Fone: (31) 3281-4030 – FAX: (31)3281-4838 e-mail: [email protected] RESUMO: O presente trabalho pericial teve como objetivo a vistoria em uma cava de mineração utilizada como depósito de rejeitos, onde ocorreu rompimento de uma das bordas, analisando as causas do acidente e a origem do evento. Destacamos o trabalho de reconstituição dinâmica do acidente, feito com a contratação de empresa especializada, que elaborou os efeitos especiais que simularam o sinistro ocorrido no local. Palavras-chave:Perícia, Rompimento, Barragem de rejeitos 1 I) DESCRIÇÃO DO OBJETO PERICIAL: Vistoria em uma cava de mineração utilizada como depósito de rejeitos, onde ocorreu rompimento de uma das bordas, analisando as causas do acidente e a origem do evento. II) DETALHAMENTO DA VISTORIA: A Mineração Mata Virgem encontra-se apta a explorar três jazidas de minério de ferro em áreas limítrofes, situadas em Zodíaco e Fazenda do Grilo, Município de Gente Grande, MG. Estimativas da empresa dão conta de que suas atuais reservas são da ordem de 200 milhões de toneladas de minério de ferro - hematita e itabirito - indicando mais 40 anos de lavra. 2.1) Localização: A área pertencente a Mineração Mata Virgem encontra-se localizada no Município de Gente Grande-MG, na Região Metropolitana de Jacaré, cujo acesso é feito pela BR-925, tomando-se no quilômetro 543 a estrada para Morada dos Deuses, onde logo no início encontra-se a área da mineração. 2.2) Planta de exploração da mina: A jazida mineral da empresa situa-se à margem esquerda da BR 925 (sentido Jacaré - Ponto do Anjo), Município de Gente Grande, MG. A jazida de minério tem uma formação alongada, aproximadamente na direção norte-sul. 2.3) Cavas de mineração (C1 e C2): Cava ou cavidade é a depressão que resulta no solo, após a retirada do material decorrente da lavra. Encerrada a mineração, há que se recompor o terreno. As empresas mineradoras têm optado em preencher a cavidade com estéril, polpa ou água. A recomposição com estéril tem a vantagem de facilitar a revegetação. A recomposição com polpa permite que se armazene finos de minério, com a possibilidade de futuro reaproveitamento do material. A formação de lago indica uma interessante alternativa paisagística, mas se encontra ainda em fase de estudo. A empresa tem optado pelo preenchimento das cavas com polpa. Até 25/02/1999, data do acidente, toda a polpa gerada no tratamento úmido do minério vinha sendo disposta na Cava C1. A empresa encontra-se em fase final de lavra da Cava C2, cujo minério está sendo tratado somente via seca. Tão logo termine a lavra, a Cava C2 passará a ser preenchida com a polpa do tratamento úmido de minério extraído de outras cavas. 2.4) Beneficiamento úmido: Conforme já afirmado, o tratamento úmido é aquele que, em determinada fase do processo, adiciona água no minério em beneficiamento. Antes de receber injeção de água, o minério passa por processo de moagem. Pode-se dizer que, em geral, a água retira impurezas e finos do minério. Portanto, o rendimento neste tipo de tratamento é menor, mas, em contrapartida, o produto é mais puro. A água retira as impurezas e partículas finas por dissolução e/ou e por arraste. A empresa conta com duas estações de tratamento de minério: a ITM-3 (via úmida) e a ITM-4 (via seca). Alguns dados médios da ITM-3: alimentação de 700 t/h, recuperação em massa de 67% e produção final de 469 t/h. Com rendimento de 85%, as produções mensais e anuais são de 99.662,5 t e 1.195.950 t, respectivamente. O rendimento operacional é o quociente das horas trabalhadas pelas horas programadas. No cálculo acima, foram considerados regime de trabalho de 10 h/dia, 25 dias/mês e 12 meses/ano. 2 2.5) Transporte do rejeito: Conforme já assinalado, todo o rejeito da atividade da empresa provem da ITM-3, onde é realizado o tratamento úmido. Devido às posições relativas entre a Cava C1 e a ITM-3, o rejeito gerado era bombeado para a Cava C1. Para tanto, eram utilizadas algumas estações de bombeamento, empregando 7 bombas acionadas por motor de cv cada e tubulação de aço de 75". Atualmente, devido ao acidente de 25/02/1999 e a conseqüente interdição da Cava C1, toda esta parte da mineradora encontra-se desativada. Assim que a Cava C2 for liberada para deposição do rejeito, voltando a ITM-3 a funcionar, o transporte da polpa será todo feito por gravidade. É que a ITM-3 situa-se em nível bem superior à Cava C 2, permitindo o escoamento por gravidade. Para tanto, a empresa já instalou a tubulação, em manilha. 2.6) Preenchimento da cava C1: Conforme já assinalado, até 25/02/1999, todo o rejeito ou polpa da ITM-3 era bombeado e lançado na Cava C1. A polpa chega à cava na fase líquida. Tão logo é lançada, rapidamente se inicia a decantação da fração sólida, que fica retida, liberando água. Há cerca de 5 anos, o rejeito da ITM 3 vinha sendo lançado na Cava C1, a qual recebia progressivos alteamentos em determinados locais, a fim de aumentar a sua capacidade volumétrica. Diga-se de passagem que este é um procedimento usual na contenção de rejeitos de mineração. Até o acidente citado, a estimativa da empresa é que a Cava C1 pudesse ser utilizada por cerca de mais 4 anos. Ressalte-se que eventualmente parte do rejeito da ITM3 se escoava por gravidade até a Barragem B3, onde os finos de minério eram retidos, com o efluente líquido passando para a Barragem B4, de onde era bombeado para o reservatório da instalação de beneficiamento. A perícia não localizou estudo científico sobre a maneira mais indicada para o preenchimento com rejeito de uma cava de mineração. A empresa despejava o rejeito na C1 em local bem afastado da barragem de contenção da mesma, entendendo que tal solução minimizava o volume de água sobre a barragem de contenção. Ocorrido o acidente tratado neste laudo, especialistas passaram a admitir que o mais correto teria sido o despejo do rejeito bem próximo da barragem, pois a porção sólida, rapidamente decantada, estaria contribuindo para dar maior resistência à contenção. Acreditamos que o assunto merece maior investigação. 2.7) Retorno da água: A água constitui-se em imprescindível insumo na atividade mineradora e seu consumo é significativo. Portanto, há necessidade de se reciclar o maior volume possível de água. A água contida no rejeito deve ser obviamente reutilizada. Tão logo a parte sólida seja decantada, a água resultante deve ser captada e transportada para pontos de demanda. Na empresa, a água da cava é drenada para um reservatório menor, cavado no solo, e que serve de tomada para bombeamento ou escoamento por gravidade, se for o caso. Tal procedimento facilita o manejo da água e reduz o seu volume na cava. 2.8) Rompimento da cava: O acidente envolvendo o rompimento da Cava 1 da Mineração Mata Virgem (empresa), ocorreu no dia 25 de fevereiro de 1999, por volta das 16:45 hs., no município de Gente Grande-MG, distrito de Morada dos Deuses. 3 Conforme indicado anteriormente, a Cava 1 situa-se na extremidade norte da planta de exploração da mina, tendo sido a primeira frente de lavra da empresa, cuja interrupção, decorrente da exaustão mineral imposta pela geometria de escavação resultou na utilização do local como depósito de rejeitos de minério de ferro, originários do beneficiamento úmido. Em função da geometria das bordas da cava, que apresentavam cotas topográficas inferiores na parte limítrofe à estrada de acesso à região conhecida como Capivaras, foi executado o projeto de alteamento no local, através da construção de um barramento. O processo de ruptura teve início nesta borda alteada, resultando no rompimento de uma extensão de aproximadamente 300,00 do barramento, com a liberação de expressivo volume de material contido, representado pelos rejeitos de minério de ferro. 4 A ocorrência do evento foi instantânea, gerando movimentos rotacionais do maciço em direção às duas laterais, de forma assimétrica, sendo que a maior porção deslocou-se transversalmente à estrada de acesso à Morada dos Deuses. Em decorrência da ruptura do dique de contenção, ocorreu a rápida liberação do material armazenado, que resultou em deslizamentos retroprogressivos do rejeito, buscando um ângulo final de repouso, formando bermas naturais de equilíbrio na superfície remanescente dos rejeitos. 5 Em função do posicionamento da Cava 1, situada em frente ao vale do Córrego Mourisco, a massa corrida originária do rompimento foi levada imediatamente à calha drenante, atingindo a vegetação ao longo de seu talvegue, uma extensão de aproximadamente 4,0 Km, formando depósitos de material assoreado nos pontos de menor declividade. III) NORMAS E REGULAMENTOS ESTUDADOS: 3.1) NBR-13.028/93 – (Elaboração e apresentação de projeto de disposição de rejeitos de beneficiamento, em barramento, em mineração): Norma Brasileira produzida pela ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas, cuja validade iniciou-se em 30 de agosto de 1993, cujos trechos relevantes apresentamos a seguir. “1 Objetivo 1.1 Esta Norma fixa as condições exigíveis para elaboração e apresentação de projeto de disposição de rejeitos de beneficiamento, em barramento, em mineração, visando a atender as condições de segurança, higiene, operacionalidade, economia, abandono e minimização dos impactos ao meio ambiente, dentro dos padrões legais. 1.2 Esta Norma não trata de disposição em pilhas e de rejeitos radioativos, os quais devem ser objeto de normas ou diretrizes específicas. 4 Condições específicas Este Capítulo trata das recomendações específicas, de caráter orientativo, visando a atender os objetivos desta Norma. Devem ser observados, no projeto, os condicionantes relativos à localização do barramento e reservatório de rejeitos, aos métodos e sequenciamento de disposição e ao projeto do barramento. 4.1 Localização do barramento e reservatório de rejeitos 4.1.1 As disposições de rejeitos devem ser: a) o mais próximo possível do sistema de beneficiamento; b) de preferência em áreas lavradas e já exauridas ou em áreas degradadas; c) dentro dos limites legais do empreendimento; d) preferencialmente em locais de níveis inferiores ao sistema de beneficiamento. 4.1.2 Deve-se evitar a implantação do barramento em: a) áreas de preservação permanente e unidades de conservação; 6 b) áreas com vegetação nativa exuberante; c) áreas com solos férteis; d) áreas a montante de captação de água para abastecimento público e atividades agrícolas, caso o rejeito seja quimicamente ativo; e) áreas a montante, com captação de água para abastecimento público. 4.1.3 O barramento deve ser preferencialmente implantado em: a) locais com fundação firme e de baixa permeabilidade; b) locais que evitem interceptar cursos d’água perenes; c) locais em que uma eventual ruptura não cause sérios transtornos e prejuízos à população e propriedades vizinhas; d) local que permita o uso múltiplo. 4.2 Métodos e sequenciamento de disposição de rejeitos Não se recomenda o alteamento de barragem pelo método a montante. A disposição de rejeitos deve ser planejada: (grifo nosso) a) de modo a permitir a clarificação de água liberada pela polpa; b) de forma a permitir o remanejamento e manobras nas tubulações de rejeito, sem afetar a continuidade do lançamento e a segurança do empreendimento; c) de modo a permitir, no caso de rejeitos tóxicos, a liberação do efluente final dentro dos padrões previstos pela legislação ambiental.” 3.2) CNEN-NE-1.10/80 – (Segurança de Sistemas de Barragem de Rejeitos Contendo Radionuclídeos): Documento elaborado pela CNEN - Comissão Nacional de Energia Nuclear, através da Resolução CNEN-07/80, publicada no Diário Oficial da União de 27 de novembro de 1980. “5.2 REQUISITOS BÁSICOS DE CONSTRUÇÃO 5.2.1 As propriedades dos materiais de construção do SBR devem ser minuciosamente investigadas, especialmente no que concerne a índices físicos, resistência ao cisalhamento, adensamento, expansibilidade, permeabilidade, compactação, susceptibilidade de ruptura e de erosão interna, e erosão pelo vento e pela água. 5.2.2 Os materiais, antes de serem utilizados para a construção do SBR, devem ser analisados para verificação da presença de materiais degradáveis, deletérios ou de outros inconvenientes. 5.2.3 Os rejeitos ou o estéril, contendo concentrações apreciáveis, a juízo da CNEN, de radionuclídeos de meia-vida longa, são inaceitáveis como materiais de construção do SBR. 5.2.4 A presença de formigueiros ou túneis escavados por animais, bem como o crescimento de arbustos nos taludes, que poderiam causar percolações danosas do SBR, devem ser verificados. 5.2.5 No caso de barragens de terra e/ou enrocamento a serem erigidos por etapas, deve ser adotado o método de construção de montante para jusante. (grifo nosso) 5.2.6 O cronograma de construção do SBR deve assegurar a existência da borda livre necessária durante as épocas de ocorrência de cheias. 5.2.7 Os taludes da barragem devem ter proteção adequada contra erosão pela ação e do vento e contra intemperismo. 7.2 PROGRAMA DE INSPEÇÃO E MANUTENÇÃO 7.2.1 O RAS deve incluir a descrição detalhada do programa de inspeção e manutenção sistemáticas para detectar e reparar danos passíveis de diminuir a integridade do SBR, abrangendo, no mínimo, as seguintes inspeções de campo: 7 a) exame dos maciços de terra e/ou de enrocamento e as áreas adjacentes aos seus pés de jusante, para o registro de qualquer evidência de recalque localizado ou global, depressões ou cavidades. b) exame dos taludes dos maciços para verificação de alinhamentos e discrepâncias das superfícies uniformes e planas, variações anormais do alinhamento e cotas de crista, em relação ao projeto, evidências de deformações ou movimentos nos pés ou adjacentes a eles e trincas superficiais com indícios de movimentação. c) Exame das superfícies de jusante das ombreiras, taludes e pés dos maciços, contatos das transições entre os maciços de terra e as áreas do vale a jusante, para a verificação de evidências de percolações atuais ou anteriores. d) Investigação das fontes de percolação, incluindo a presença de formigueiros ou túneis escavados por animais e o crescimento de arbustos nos taludes. e) Exame de todos os sistemas de drenagem para se verificar se os mesmos deixam passar livremente as vazões previstas e se a água não carreamento material do maciço ou da fundação. f) Exame das proteções dos taludes para a verificação de ravinas formadas por erosão e entalhes ou plataformas produzidas por ondas. g) Exame da evolução das pressões neutras da barragem, fundações, ombreiras e margens do reservatório.” (grifos nossos) 3.3) Guia Básico de Segurança de Barragens (CBDB/1999): Documento elaborado pelo Comitê Brasileiro de Barragens, tendo sido apresentado ao público no XXIII Seminário Nacional de Grandes Barragens, acontecido em Jacaré-MG, em março de 1999. “Cada barragem deve ser classificada de acordo com as conseqüências de sua ruptura. A classificação constitui a base para a análise da segurança da barragem e para fixar níveis apropriados de atividades de inspeção. A Tabela 1-1 apresenta o sistema de classificação mais comumente aceitável, que está baseado no potencial de perda de vidas e nos danos econômicos associados à ruptura da barragem. Este sistema de classificação é usado para relacionar as conseqüências da ruptura aos requisitos constantes nos itens de 2 a 10. (grifo nosso) As “consequências incrementais” da ruptura de uma barragem devem ser avaliadas em termos de : Perda de vidas; Valor econômico de outras perdas e/ou danos a propriedades, instalações, outras barragens, bem como a perda na geração de energia e fornecimento de água. Onde apropriado, os custos devem ser classificados como de impacto social, cultural e ambiental; Outras conseqüências menos quantificáveis relacionadas a impactos sociais, culturais e ambientais, que não possam ser avaliadas economicamente, podem exigir condições baseadas no local específico da ocorrência. 8 TABELA 1.1 CLASSIFICAÇÃO DA CONSEQÜÊNCIA DE RUPTURA DE BARRAGENS POTENCIAL CONSEQÜÊNCIA INCREMENTAL DA RUPTURA (a) CONSEQÜÊNCIA DE PERDA DE VIDAS ECONÔMICO, SOCIAL E RUPTURA DANOS AMBIENTAIS Muito alta Significativa Dano excessivo (a) Alta Alguma Dano substancial Nenhuma Dano moderado Baixa Muito baixa Nenhuma Dano mínimo (a) – os critérios de classificação de categorias de danos econômicos, sociais e ambientais devem ser baseados nas conseqüências das perdas em relação a região afetada. (grifo nosso) A reavaliação da segurança da barragem é uma avaliação sistemática da segurança desta, por meio de inspeções pormenorizadas das estruturas, avaliação do desempenho e verificação dos registros originais de projeto e construção, para assegurar que estes obedeçam os critérios em vigor. (grifo nosso) No relatório de cada reavaliação deve-se fixar a data da próxima. A Tabela 2-1 fornece indicativos das recomendações para os períodos de reavaliação, baseado no sistema de classificação por conseqüência de ruptura da Tabela 1-1. Um sistema de classificação diferente pode ser usado, incorporando a avaliação do nível de proteção por probabilidade de ruptura da barragem, considerando fatores tais como tipo, altura e condições da barragem. Nesse caso, baseado nas condições e comportamento da barragem, os períodos apropriados de reavaliação, podem ser diferentes.” TABELA 2.1 FREQÜÊNCIA DE REAVALIAÇÕES DA SEGURANÇA DE BARRAGENS (Baseado no sistema de classificação de conseqüência da Tabela 1-1) CONSEQÜÊNCIA DE RUPTURA Muito alta Alta Baixa Muito baixa PERÍODO ENTRE REAVALIAÇÕES 5 anos 7 anos 10 anos 10 anos (grifo nosso) IV) DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO PERICIAL: 4.1) O solo como material de construção: Logo após a descoberta da Mecânica dos Solos, ciência voltada aos estudos sobre o comportamento e as características dos solos, descobriu-se em pesquisas que o solo é capaz de exercer função de material de construção, caindo a tese de que o mesmo exercia função apenas de suporte de obras, exemplo disso são barragens, aterros, pavimentos de rodovias e aeroportos. Para tanto o solo deverá satisfazer determinadas exigências. Quando isto não acontece, ele deverá ser submetido a um tratamento adequado, tornando possível sua utilização. Quando o solo não atinge a resistência necessária, recomenda-se a alteração de sua estrutura no ângulo de atrito interno, coesão ou em ambos. Estes parâmetros estão ligados diretamente 9 a granulometria, compacidade e umidade do solo, conforme transcrito à seguir, obtido em bibliografia técnica especializada 1 . “A granulometria interfere através das frações grossa (pedregulho e areia) e fina (silte e argila) do material. A primeira entra como elemento inerte, contribuindo para o atrito interno e, a segunda, como elemento aglutinante influindo na coesão. A compacidade desejável é obtida pela “compactação”, cujo objetivo é melhorar a qualidade do solo, não só quanto à resistência, mas também nos aspectos: permeabilidade, compressibilidade e absorção de água. No estado atual da técnica, sabe-se que o efeito da compactação depende fundamentalmente da energia despendida e do teor de umidade. A umidade faz-se sentir predominantemente na coesão do terreno, mostrando assim a influência da porcentagem da fração fina do solo sobre o seu comportamento.” Existem duas formas de estabilização dos solos, estabilização mecânica e estabilização por aglutinantes, citadas na bibliografia técnica1, * como segue: “ Na estabilização mecânica, a granulometria do solo é conservada ou corrigida pela mistura com um ou mais solos, antes da compactação, procurando-se assim aumentar a coesão ou ângulo de atrito interno, ou ambos parâmetros. Na estabilização por adição de aglutinantes, junta-se ao solo uma substância que aumenta a sua coesão ou que impermeabilize, impedindo a diminuição de sua resistência pela ação da água. Os produtos mais utilizados para essa finalidade são o cimento, a cal, os betumes e produtos químicos.” Nas últimas décadas o sistema de estabilização mecânica tem sido geralmente mais aconselhado, analisando todo o contexto e particularidades da obra, esse método é indicado pelo baixo custo. 4.2) A água como fator de instabilidade: O solo é constituído de três fases: ar, água e sólido. 1 Livro “Mecânica dos Solos e suas Aplicações”, Homero Pinto Caputo, Livros Técnicos e Científicos Editora, 3ª edição. 1 Livro “Mecânica dos Solos e suas Aplicações”, Homero Pinto Caputo, Livros Técnicos e Científicos Editora, 3ª edição. 10 sendo: Var = volume de ar; Vag = volume de água; Vs = volume de sólido; V = volume total; Vv = volume de poros do solo “volume dos vazios”. O grau de saturação, ou índice de saturação (IS), do solo pode variar desde o solo saturado: IS = 100 % até o seco IS = 0 %. Quando falamos em solo saturado, significa que o volume de vazios está total ou parcialmente preenchido por água, portanto, estando ele 100 % saturado, é o mesmo que dizer que Vag = Vv. ; Ruptura hidráulica Por ruptura hidráulica de um solo entende-se a situação em que se registra perda de resistência e estabilidade, levando à danificação de sua estrutura ou da fundação, o que ocorre por meio das pressões de percolação d’água sobre o maciço. ; Liquefação Liquefação é o tipo de ruptura hidráulica em que o solo perde total ou parcialmente sua resistência devido à perda de peso, que ocorre devido à percolação de água no sentido oposto ao peso do maciço, gerando um estado de fluidez e escoamento de sua estrutura. ; “Piping” “Piping” é a outra forma de ruptura hidráulica, que ocorre nos casos onde registra-se erosão, através de carreamento dos grãos do solo pelas forças de percolação, que, embora aconteça internamente, seu mecanismo é semelhante à erosão superficial provocada pela chuva. Seu início se dá num ponto de surgência d’água, progredindo para trás em torno de um filete d’água que arrasta os grãos, cujo resultado é a formação de um tubo, o que leva a ser conhecida também como retroerosão tubular. No caso de barramentos, cumpre observar as águas que atingem o reservatório, seja junto com os rejeitos, por precipitação direta ou ainda através de escoamento superficial, bem como o seu destino, para utilização no processo produtivo ou por processos de evaporação, e, particularmente, aquelas que percolam pelo maciço, que merecem especial atenção, conforme figura a seguir. No sistema de contenção de barragens de rejeitos alteadas pelo Método de Montante não existe previsão de compactação, impermeabilização ou instalação de filtros. O lançamento do material é feito através de uma polpa, onde estão presentes materiais grosseiros (areias), e finos representados por siltes e argilas. 11 Os materiais mais grosseiros, sedimentam-se logo após o lançamento, enquanto que os finos misturados à fase líquida, por segregação, correm em direção à bacia de decantação. Caso haja a separação dos materiais por ciclones, os finos poderão ser lançados diretamente na bacia e os grosseiros são dirigidos à construção do alteamento do barramento. Devido a não existência de “free board”, e às variações do nível d’água da bacia de decantação, a praia pode chegar bastante próximo do aterro do barramento. Devido à permeabilidade dos materiais arenosos, estabelece-se no corpo da barragem um fluxo d’água, e conseqüentemente o nível freático, cuja posição pode ser função do nível do lago, e portanto proximidade da crista do barramento da segregação dos materiais e ainda da permeabilidade das fundações. 4.3) Sistemas construtivos de contenção de rejeitos: Os sistemas construtivos de contenção de rejeitos são basicamente executados sob a forma de um barramento ou através de barragem não convencional, uma vez ser característica destas 12 estas estruturas não serem construídas em etapa única, pois esta atividade quase sempre implica na contratação de uma empresa construtora. As minerações apresentam atividades permanentes, o que exige a presença de canteiro de obras, oficinas, equipamentos e pessoal, tornando a sistemática por alteamentos sucessivos executados pela própria empresa mineradora possível e mais atraente financeiramente, além de permitir maior flexibilidade construtiva, aliada à produção de minérios. O processo construtivo inicia-se sempre à partir da execução inicial de um dique piloto, ou dique de arranque, sendo que os alteamentos sucessivos irão acompanhar o nível de rejeitos lançados no reservatório, preservando uma borda livre para armazenamento da água a ser aproveitada e contenção da água das chuvas. A escolha do método de alteamento das estruturas é função da combinação de diversas variáveis, condicionantes do projeto, tais como topografia, hidrologia, geologia, granulometria e concentração dos rejeitos, velocidade de deposição, variação da capacidade de armazenamento do reservatório com o aumento da altura e disponibilidade de equipamentos. Embora possam existir variações dos métodos conhecidos para alteamento, os mais comuns denominam-se MÉTODO DE MONTANTE, MÉTODO DE JUSANTE e MÉTODO DE LINHA DE CENTRO, cuja diferenciação é o deslocamento do eixo da estrutura durante sua construção e, conseqüente, elevação. ; Método da linha de Montante Tem como critério reduzir significativamente o custo de barramento e portanto, procura aproveitar os rejeitos depositados como parte da estrutura de contenção construindo-se um dique inicial. Simultaneamente com a deposição dos rejeitos vai-se alteando a barragem, construindo-se novo dique a montante do eixo do dique inicial apoiado no próprio rejeito depositado. Esta operação é repetida sucessivas vezes até alcançar-se coroamento final do barramento, conforme seqüência apresentada na figura seguinte. 13 O dique inicial é sempre construído de solo compactado, podendo os alteamentos sucessivos serem executados com terra compactada ou com a fração grossa do rejeito arenoso desde que seja viável tecnicamente. Neste tipo de barragem, o rejeito, por razões técnicas e construtivas, é lançado por sobre a crista da barragem de modo que haja segregações granulométricas, ficando a fração grossa depositada próximo ao maciço para servir de suporte ao próximo alteamento, formando uma praia que servirá como fundação para o próximo alteamento, enquanto as frações mais finas (lamas) são direcionadas ao lago de decantação, que deve ser posicionado na extremidade oposta. Cumpre ressaltar que essas barragens são suscetíveis de colapso por liquefação, principalmente em regiões sujeitas a abalos sísmicos. Dentre as vantagens e desvantagens da utilização deste método podemos destacar o seguinte2: 3 * Vantagens: • menores volumes envolvidos no alteamento; • menor custo de construção; • pouco uso de equipamentos de terraplenagem; • maior velocidade de alteamento. * Desvantagens: • menor coeficiente de segurança, em função da linha freática estar geralmente situada muito próxima ao talude de jusante; • superfície crítica de ruptura passar pelos rejeitos sedimentados, porém não devidamente compactados; • possibilidade de ocorrência de “piping” devido ao surgimento de água na superfície do talude de jusante, principalmente quando ocorre concentração de fluxo entre dois diques compactados; • risco de ruptura devido à liquefação da massa de rejeitos por efeito de sismos naturais ou vibrações causadas por explosões ou movimentação de equipamentos. 2 Apostila “Barragem de Rejeitos: Metodologia de Implantação, Operação e Manutenção”, Escola Politécnica da USP, Prof. Dr. Lindolfo Soares. 14 Algumas recomendações são necessárias para adoção desta técnica, conforme relacionado a seguir *2: z O lançamento dos rejeitos deve se dar no perímetro do lago, imediatamente a montante do talude do dique inicial e dos alteamentos subseqüentes; z Evitar retenções de água próximo à crista ou em áreas confinadas, através de um planejamento de lançamento de rejeitos e das manobras da tubulação de seu lançamento; z Os rejeitos devem ter fração arenosa drenante e serem lançados em uma concentração de sólidos que possibilite a segregação do material junto à crista da barragem; z O nível d’água do reservatório deve ficar afastado da crista da barragem, adotando-se sistemas para esgotamento das águas de chuvas, e aquelas liberadas pela polpa; 2 Apostila “Barragem de Rejeitos: Metodologia de Implantação, Operação e Manutenção”, Escola Politécnica da USP, Prof. Dr. Lindolfo Soares. 15 z Em áreas que ocorram vibrações, seja de origem tectônica (sismos naturais) ou motivada por escavações na mina ou ainda por passagem de veículos (sismos induzidos), recomenda-se que o alteamento por este método seja descartado; z As barragens não deverão ter grande altura e a velocidade de alteamento fica condicionada às propriedades dos rejeitos, visto que a segurança da barragem depende da resistência mobilizável dos rejeitos que é condicionada pelas pressões neutras. Estas pressões estão relacionadas 1) a velocidade de aumento das sobrecargas devido a velocidade de alteamento da barragem e 2) a velocidade de dissipação das pressões neutras; z A estabilidade destas obras são também ditadas pelo avanço do lago de decantação, pois seu avanço pode elevar a superfície do nível freático no corpo da barragem, fazendo com que surja água em partes altas no talude de jusante da barragem, possibilitando o estabelecimento do processo de “piping”; z Praias com baixa segregação dos rejeitos lançados, apresentam normalmente baixa permeabilidade, ocasionando a elevação do nível freático no corpo da barragem, podendo neste caso, também ocorrer “piping” devido a surgência d’água no talude de jusante da barragem; z O nível freático poderá também elevar-se caso as fundações da barragem sejam impermeáveis, o que obriga a passagem da água apenas pelo corpo do barramento, podendo provocar o surgimento de água no talude de jusante, possibilitando assim a formação de “piping”; z Tratamento do talude de jusante contra erosões, provocadas pela ação de chuvas à medida que a barragem vai sendo alteada. Este tratamento compreende a condução das águas por meio de canaletas e caixas de passagem e ainda a proteção superficial por cobertura vegetal; z O monitoramento da obra deve ser feito durante todo o período de alteamento, continuando na fase de abandono. 16 ; Método da linha de Jusante Para reduzir os riscos de colapsos que importunam as barragens construídas pelo método de montante, foram aplicados esforços e iteração de conhecimentos e estudos, resultando o método de jusante que consiste no alteamento da barragem para jusante do dique inicial, conforme seqüência a seguir representada. A construção pode ser feita empregando-se o próprio rejeito, solos de empréstimos ou estéril proveniente da lavra. Quando a barragem é executada com rejeito, o mesmo é separado com emprego de ciclones de modo que no maciço da barragem sejam utilizadas apenas a fração grossa. O sentido da construção é de montante para jusante, construindo-se previamente um dique inicial, impermeável, que deve ser dotado de drenagem interna, através de filtro vertical e 17 tapete drenante, devendo o talude de montante ser impermeabilizado com argila compactada ou matas de geotêxtil. A construção por este método utiliza somente os rejeitos grossos no alteamento, podendo a barragem ser projetada para grandes alturas, sempre incorporando o sistema de impermeabilização e drenagem. Da mesma forma, as barragens pelo método de jusante podem ser executadas com solo compactado ou o estéril da lavra. O método de jusante é uma solução mais cômoda e atualmente mais aceita pela segurança que apresenta, uma vez que o risco de ruptura por liquefação e “piping” é reduzido já que o aterro normalmente é bem construído e bem controlado. Em contra-partida é uma solução que requer maior custo de investimento. Como vantagens e desvantagens do método da linha de jusante, podemos relacionar o seguinte *2: * Vantagens: • Maior segurança devido alteamento controlado; • Menor probabilidade de “piping” e de rupturas horizontais, devido maior resistência ao cisalhamento; • Maior resistência à vibrações provocadas por sismos naturais e vibrações devido ao emprego de explosivos nas frentes de lavra; • Instalação de sistema de drenagem e impermeabilização à medida que se processa o alteamento. * Desvantagens: • Custo mais elevado; • Maior volume de material a ser movimentado e compactado; • Menor velocidade de alteamento da barragem; • Não possibilita a proteção com cobertura vegetal, e tampouco drenagem superficial durante a fase construtiva, devido à superposição dos rejeitos no talude de jusante; • Requer o emprego de ciclones, e a construção de enrocamento de pé para conter o avanço do “underflow”. ; Método da Linha de Centro O método da linha de centro é geometricamente uma solução intermediária entre o método de jusante e o de montante, inclusive em termos de custos, embora seu comportamento estrutural se aproxime mais do método de jusante, conforme seqüência mostrada na figura seguinte. 2 Apostila “Barragem de Rejeitos: Metodologia de Implantação, Operação e Manutenção”, Escola Politécnica da USP, Prof. Dr. Lindolfo Soares. 18 A barragem é também construída primeiramente com um dique de partida (dique inicial), sendo os alteamentos executados sucessivamente mantendo-se inalterado o eixo de barramento, de modo que o espaldar de montante apóie-se na praia anteriormente formada, e o de jusante sobre toda a etapa subjacente, resultando no eixo da crista do dique inicial e dos diques resultantes dos sucessivos alteamentos serem coincidentes. Teoricamente, este método procura reunir as vantagens dos dois métodos anteriores, além de buscar minimizar as desvantagens, como segue *2: * Vantagens: z Facilidade construtiva; z O material para o alteamento pode vir de áreas de empréstimo, estéril ou do “underflow” dos ciclones; z Permite o controle da linha freática no talude de jusante. * Desvantagens: z A área a montante é passível de escorregamentos; z Faz-se necessário o uso de ciclones; z Este método além do dique inicial requer um enrocamento de pé para conter o avanço do “underflow”; z Não permite tratamentos da superfície do talude de jusante. Em resumo o quadro a seguir2* procura sintetizar as características, vantagens e desvantagens dos diferentes métodos: 2 Apostila “Barragem de Rejeitos: Metodologia de Implantação, Operação e Manutenção”, Escola Politécnica da USP, Prof. Dr. Lindolfo Soares. 2 Apostila “Barragem de Rejeitos: Metodologia de Implantação, Operação e Manutenção”, Escola Politécnica da USP, Prof. Dr. Lindolfo Soares. 19 MÉTODO DE MONTANTE MÉTODO DE JUSANTE MÉTODO LINHA DE CENTRO CARACTERÍSTICAS GERAIS • Método mais antigo, e o mais empregado na atualidade. • Lançamento a partir da crista por “spigots”. (as frações grossas se depositam junto ao corpo da barragem). • Também podem ser usados hidrociclones. • Construção de dique inicial impermeável e barragem de pé. • Separação dos rejeitos na crista do dique por meio de hidrociclones. • Barragem com dreno interno e impermeabilização a montante. • Variação do método de jusante VANTAGENS • Menor custo. Maior velocidade de alteamento. • Maior segurança. • Compactação de todo o corpo da barragem. • Variação do volume de “underflow” em relação ao met. jusante DESVANTAGENS • Maior probabilidade de instabilidade devido a presença de finos não adensados junto ao corpo da barragem. Baixa compacidade do material; possibilidade de liquefação. • Necessidade de grandes quantidades de “underflow” (problemas nas 1as. Etapas). • Deslocamento do talude de jusante (proteção superficial só no final da construção). • Pode ser necessário estender os trabalhos de compactação a montante do eixo da barragem. Outro quadro *2 procura reunir uma comparação entre as características e aspectos de segurança entre estruturas construídas pelos diferentes métodos e aquelas executadas de forma convencional, em uma única etapa. 2 Apostila “Barragem de Rejeitos: Metodologia de Implantação, Operação e Manutenção”, Escola Politécnica da USP, Prof. Dr. Lindolfo Soares. 20 CONVENCIONAL MONTANTE JUSANTE L. DE CENTRO • Qualquer tipo • Mais de 40 % de areia • Baixa densidade de polpa para promover segregação • Qualquer tipo • Areias ou lamas de baixa plasticidade ARMAZENAMENTO D’ÁGUA • Boa • Não recomendado para grandes volumes • Boa • Não recomendado para armazenament o permanente RESISTÊNCIA SÍSMICA • Boa • Pobre em áreas de alta sismicidade • Boa • Aceitável RESTRIÇÕES DE ALTEAMENTO • De uma só vez, ou em poucas etapas • Recomendável menos de 5 a 10m/ano • Nenhuma • Pouca REQUISITOS DE ALTEAMENTO • Materiais naturais e/ou estéril • Solo natural • Rejeitos ou estéril • Rejeitos ou estéril • Rejeitos ou estéril • Alto (3 Vm) • Baixo Vm* • Alto Vm) • Moderado (2Vm) TIPO DE REJEITO RECOMENDADO CUSTO RELATIVO DO CORPO DO ATERRO (3 * Vm = volume da barragem alteada pelo método de montante. 4.4) Projetos de barramentos: Na execução de projetos de barramentos faz-se necessário observar primeiramente alguns critérios na escolha do local de contenção dos rejeitos, devendo ser considerados os seguintes fatores2. * z Maior relação entre o volume de reservatório e o volume do aterro da barragem (menor custo/benefício); z Menor área da bacia de drenagem, tendo em vista que ocorre menor aporte de sedimentos, e ainda objetivando a construção de vertedouro de menor porte, ou mesmo sua eliminação; z Menor interferência do reservatório junto à comunidade local, obtendo-se assim menores custos com relocações e desapropriações; z Menor distância possível à planta de beneficiamento o que resulta em menor comprimento das linhas de condução dos rejeitos e de retorno d’água; z Menor distância possível da área da mina, ou de áreas de empréstimo, o que possibilita de forma mais econômica a utilização do estéril ou de materiais adequados à construção da barragem inicial. 2 Apostila “Barragem de Rejeitos: Metodologia de Implantação, Operação e Manutenção”, Escola Politécnica da USP, Prof. Dr. Lindolfo Soares. 21 Após análise dos fatores que influenciaram no projeto do barramento, apresentamos a seguir um fluxograma, extraído de conceituada bibliografia técnica2, onde encontram-se as etapas a serem cumpridas na concepção e projeto de barramento de rejeitos. Finalmente, cumpre observar que a construção de depósitos de rejeitos deve ser a mais econômica e segura, segundo as seguintes premissas2: * 2 Apostila “Barragem de Rejeitos: Metodologia de Implantação, Operação e Manutenção”, Escola Politécnica da USP, Prof. Dr. Lindolfo Soares. 22 * Premissas econômicas: z A barragem deverá se localizar o mais próximo possível da área de beneficiamento; z Sempre que possível situado a um nível mais baixo, de forma as necessidades energéticas sejam mínimas; z Que a barragem para contenção dos rejeitos necessite do menor volume de material de construção possível; z Que a água possa ser recuperada facilmente. * Premissas de segurança: z Que o lago de decantação onde serão lançadas as lamas esteja localizado o mais longe possível da barragem; z Que a água possa ser removida do reservatório, para minimizar a saturação dos rejeitos, melhorando assim sua estabilidade; z Que as fundações apresentem resistência, compressibilidade e permeabilidade condizentes com as boas técnicas construtivas; z Que a barragem seja construída com materiais adequados colocados em áreas adequadas; z Que os materiais menos resistentes e mais compressíveis sejam mantidos o mais longe possível da barragem; z Que os taludes da barragem sejam os mais seguros possíveis, dentro das características de altura, do nível d’água e dos materiais disponíveis; z Que não haja conseqüência séria, principalmente ao ser humano, devido a ocorrência de ruptura total ou parcial. 4.5) Análise da ocorrência do deslizamento: Dados estatísticos sobre as principais causas de acidentes de barragens de contenção de rejeitos mostram que os processos de ruptura estão em sua maioria ligados ao fenômeno de “piping” (erosão interna progressiva) e liquefação, alcançando segundo alguns autores valores acima de 71%. Salienta-se que, dados apresentados por outros autores indicam valores de cerca 44% de acidentes causados por liquefação (slope failures) e “piping” (seepage), porém indicam separadamente como causa de ruptura os terremotos (24%). Entendendo que os abalos sísmicos seriam na realidade causas predisponentes que provocariam (por vibração) um adensamento dos materiais com geração de sub-pressões e portanto aumento da possibilidade de ruptura por liquefação. Assim, poderíamos chegar ao total de acidentes causados por “piping” e liquefação ao redor de 68%, valor este bem próximo à outras fontes. Destaca-se que os dados estatísticos apresentados referem-se a acidentes com barragens de contenção de rejeitos alteadas apenas pelo método de montante. Embora não se disponha de elementos descritivos de que a ruptura tenha sido causada por processo de liquefação, as características dos materiais, a forma construtiva do aterro, e a inexistência de dados e observações de campo apontando para ocorrência de fugas d’água pelo corpo e/ou fundação da obra indicativo de processos de “piping”, sugerem que a ruptura tenha se dado por processo de liquefação. Tal sugestão pode ainda ser corroborada pela alta fluidez e a alta velocidade que a massa rompida atingiu em sua corrida para jusante, além da grande distância percorrida. Liquefação, segundo definição apresentada em glossário de termos técnicos “é a repentina redução da resistência ao cisalhamento de um solo devido a um acréscimo rápido da pressão intersticial, fenômeno este normalmente ligado à solicitações dinâmicas sobre solos granulares”. 23 As principais solicitações dinâmicas responsáveis pelos processos de liquefação são os terremotos, impacto de ondas, explosões, tráfego de equipamentos pesados e cravação de estacas. A liquefação acarreta uma transformação temporária das areias ou siltes em uma suspensão altamente concentrada. Para melhor compreensão do processo, devemos em princípio entender que um rejeito pode ser considerado como um esqueleto de partículas sólidas, englobando vazios preenchidos por água. Se um elemento deste rejeito for solicitado por tensões tais que resulte em uma variação volumétrica, existem 3 fatores aos quais esta compressibilidade do material poderia estar atribuída: • compressão das partículas sólidas; • compressão da água dentro dos vazios; • fuga d’água dos vazios. As tensões a que são submetidos os rejeitos são tais, que a compressibilidade dos sólidos e da água deve ser desprezada, portanto considera-se que a redução do volume do material lançado deve-se totalmente à fuga de água de seus vazios, assim, a compressibilidade de um rejeito depende da rigidez de seu esqueleto, que por sua vez depende do arranjo estrutural das partículas sólidas. Quando uma pressão é aplicada a um elemento de rejeito ocorre uma redução de seu volume e, para que esta redução ocorra, é necessário que um volume de água equivalente escape do material. Este processo gradual, que envolve simultaneamente uma lenta fuga de água e uma compressão a ela associada é chamado de adensamento. Claro está, que se o material for de alta plasticidade (argilas), a sua permeabilidade será diminuta e o tempo necessário para que ocorra a compressão será bastante grande. Caso contrário a compressão poderá se dar rapidamente. Como os materiais lançados em aterros hidráulicos que constituirão o corpo da barragem de rejeitos são normalmente constituídos por areias (40-60% nos métodos de montante) geralmente finas argilosas, siltosas, e silto-argilosas, vários autores recomendam um alteamento máximo da obra de cerca de 10 m anuais para que ocorra a compressão gradativa do aterro, sem o surgimento de pressões. O aterro, caso submetido à perturbação do equilíbrio dos sólidos lançados, devido a esforços cisalhantes, choques de ondas, vibrações (naturais ou induzidas), terá possibilidade de diminuir sua porosidade e portanto ocorrerem pressões neutras (sub-pressões). A porosidade do aterro, e, conseqüentemente, seu sistema de drenagem, pode também sofrer variações devido à colmatação, ou a variação da granulometria do rejeito e perder sua eficiência gradativamente, assim, as condições de porosidade/ permeabilidade, associadas à saturação do aterro podem torná-lo susceptível ao processo de liquefação. V) CAUSAS PROVÁVEIS ESTUDADAS: 5.1) Projeto do barramento: Uma das causas apontadas no início das investigações sobre as causas do acidente refere-se à eventual “ausência de projeto” do barramento construído sobre a borda da Cava 1, onde ocorreu o rompimento. Conforme já relatado anteriormente, bem como demonstra a documentação analisada, a empresa mineradora contratou um projeto de alteamento da borda da Cava 1, com o objetivo de restaurar a topografia local, através do lançamento dos rejeitos originários do beneficiamento úmido sobre a mina exaurida. 24 Este fato encontra-se demonstrado primeiramente através da análise do documento, onde constam, além de referência expressa: à “PROJETO DE DISPOSIÇÃO DE REJEITO”, os elementos necessários a um projeto básico tais como situação em planta, cortes e métodos construtivos. Pode-se admitir, por hipótese, a necessidade de um complemento, relativo a um maior detalhamento dos elementos referentes à fase construtiva, não obstante, fica clara a existência desta providência pela empresa mineradora. Em depoimento à Comissão de Sindicância do CREA-MG, a responsável técnica pelo projeto afirma textualmente: “...disse ter exercitado uma análise de estabilidade em um método que considerava um talude infinito e não possuía mais a memória de cálculo.” Mais importante, ao registrar o trabalho junto ao CREA-MG, através da respectiva ART, o fez através do código 4355, que significa “projeto geotécnico”. 5.2) Execução do barramento: Na execução do barramento foram utilizados materiais identificados como itabirito pobre, não comercializável, material estéril, oriundo de outras frentes da própria mina, e material extraído do talude localizado na face oposta da mesma Cava 1. Não foram previstos sistemas de drenagem nos diques dos alteamentos sucessivos, o que não é citado na bibliografia técnica, em função da notória dificuldade de sua implantação. Com relação aos sinais deixados pelo acidente, cabe ainda observar a posição de repouso nas laterais do sítio do rompimento, mostrando que grande parte do barramento existente estacionou em posição perpendicular à borda rompida, tendo descrito um movimento rotacional sem se romper. 5.3) Concepção do lançamento dos rejeitos: O lançamento dos rejeitos no interior da Cava 1 era feito na borda sul, situada em local oposto à estrutura rompida, conforme consta do projeto encomendado à Bioma Meio Ambiente. 25 Esta situação levou ao acúmulo de água junto ao barramento rompido, o que contraria toda a bibliografia técnica referente ao assunto, mostrada anteriormente, cujo correto seria o lançamento sobre a crista do barramento, fazendo com que a água se acumulasse na extremidade oposta, junto ao terreno natural. Estas situações podem ser visualizadas nos desenhos juntados a seguir, onde o número 1 representa a situação concebida no projeto encomendado, e o desenho nº 2 a situação correta e desejável. Desenho 1 26 Desenho 2 5.4) Presença de água no barramento: A presença de água em qualquer estrutura de solo pode provocar comprometimento de seu desempenho, uma vez ocorrer o preenchimento dos espaços intergranulares, conforme desenho a seguir. O próprio alteamento do barramento vai provocando lentamente a aproximação dos grãos (adensamento), fazendo com que ocorresse a diminuição dos espaços intergranulares e a consequente expulsão da água destes espaços. Se caso o alteamento do barramento foi muito rápido (o aumento do peso do aterro, portanto, se dará de forma muito rápida) a velocidade do adensamento será também incrementada com diminuição dos espaços intergranulares de forma mais rápida. Se a permeabilidade do maciço for baixa, ou não uniforme (trechos da barragem com permeabilidade menor devido a presença de materiais mais finos, siltes e argilas) a água poderá apresentar dificuldades de escoamento, isto é, sua rápida saída do aterro será prejudicada. 27 Esta água, contida nos espaços intergranulares que está diminuindo, passará a desenvolver sub-pressões nos materiais sólidos do aterro, que teoricamente perdem (ou diminuem) a coesão e a consequente resistência ao cisalhamento, criando assim condições mais favoráveis para que ocorra a ruptura do barramento. Caso a diminuição dos espaços se dê de forma muito rápida (devido, por exemplo, à vibrações, sismos naturais ou induzidos, etc.), o desenvolvimento das sub-pressões se dará mais rapidamente, ocasionando assim a ruptura do maciço por liquefação. O material assim instabilizado, normalmente apresenta características de um líquido de alta viscosidade, “correndo” por longos trechos mesmo que apresentem baixa declividade. Do ponto de vista macro, no que se refere à interferência com as estruturas de contenção, podemos descrever a situação, conforme previsto na concepção original do projeto, da maneira mostrada a seguir. Caso ocorresse o lançamento dos rejeitos sobre a crista do barramento, como recomenda a bibliografia técnica, a situação no local do acúmulo de água, resultaria na situação seguinte. 28 Por outro lado, poderíamos admitir a concepção de lançamento dos rejeitos nos termos do projeto, entretanto, seria recomendável o alteamento do barramento pelo MÉTODO DE JUSANTE, cuja situação seria a seguinte: VI) CONCLUSÃO: 6.1) Considerações gerais: ; Quanto ao objetivo do lançamento na Cava 1 Antes de quaisquer considerações sobre o acidente ocorrido na Mineração Mata Virgem, torna-se imperativo explicar que o objetivo do lançamento do rejeito no interior da Cava 1 era a recomposição do local nas condições anteriores à exploração mineral no local. * “...o objetivo que se propôs para a reabilitação da área era uma conformação bem próxima do que existia originalmente...” (Engº Juca Pedroso); ; Quanto ao projeto do barramento Conforme consta do presente trabalho, a empresa mineradora encomendou um plano de controle ambiental da mina, à empresa Beija-Flor Meio Ambiente, onde foi previsto o preenchimento da Cava 1 com rejeitos. Fazia parte deste trabalho a elaboração do projeto geotécnico de alteamento da borda da referida cava. 29 ; Quanto ao método de alteamento: A concepção do alteamento do barramento, conforme consta do projeto apresentado pela Beija-Flor Meio Ambiente, foi o denominado MÉTODO DE MONTANTE, cuja utilização é questionável, conforme demonstrado a seguir. * “...método de montante ... apresenta menor fator de segurança.” (Prof. Ney Rosário Amorim). ; Quanto à execução do barramento O barramento foi executado com a utilização de itabirito não minerável, material estéril da própria mina e retirado do talude oposto ao alteamento, sempre em camadas de, no máximo 30,00 cm, compactado com maquinário existente na mina, inclusive rolos compactadores, conforme depoimento do Engº Potigar Indígena ao CREA-MG. 30 Após a ocorrência do deslizamento, grande parte do barramento encontrava-se íntegra no local, posicionada em posição perpendicular à sua situação original, conforme indicado anteriormente, demonstrando não ter ocorrido rompimento de sua estrutura. ; Quanto à Norma da ABNT No que se refere à Normatização Técnica da ABNT, existe uma Norma Brasileira específica sobre o assunto (NBR-13.028/93), onde consta textualmente o seguinte. * “Não se recomenda o alteamento de barragem pelo método de montante.”. ; Quanto ao lançamento dos rejeitos Um aspecto técnico relevante refere-se ao posicionamento do lançamento dos rejeitos, efetuado pela tubulação originária do beneficiamento úmido, posicionado na extremidade oposta à borda rompida, nos termos do projeto elaborado pela Beija-Flor Meio Ambiente, o que contraria a bibliografia técnica, como segue. * “Neste tipo de barragem, o rejeito, por razões técnicas e construtivas, é lançado sobre a crista da barragem...” (Prof. Lindolfo Soares); * “O lançamento dos rejeitos deve se dar no perímetro do lago, imediatamente a montante do dique inicial...” (Prof. Lindolfo Soares); * “Lançamento dos rejeitos junto ao barramento e não à montante, mantendo-se a lâmina d’água afastada da estrutura de contenção.” (Laudo Pericial – Ministério Público). ; Quanto à saturação do barramento Não resta dúvida que a situação colocada anteriormente, referente à concepção do lançamento dos rejeitos, levou à saturação do maciço do barramento, como extraído do corpo do presente trabalho. 31 * “...resultando na formação de uma lâmina d’água nesta região, com conseqüente saturação do maciço adjacente.” (Laudo Pericial – Ministério Público) * “Evitar retenções de água próximo à crista...” (Prof. Lindolfo Soares) * “...o lago de decantação onde serão lançadas as lamas esteja localizado o mais longe possível da barragem.” (Prof. Lindolfo Soares). ; Quanto ao controle e monitoramento A questão relativa ao controle e acompanhamento das condições do barramento demonstra que eram feitas inspeções visuais da estrutura, o que encontra respaldo nas seguintes informações. * “Nós todos acompanhávamos ele constantemente,..., eu estive lá e verificando, olhando a barragem toda...” (Engº Pitangui Moreno); * “... a FEAM realizava vistorias periódicas nas dependências da mineração” (Sr. Juca Procópio); * “... seguintes inspeções de campo: a) exame dos maciços... b) exame dos taludes... c) exame das superfícies... d) exame das fontes de percolação... e) exame de todos os itens de drenagem... f) exame das proteções dos taludes...” (Segurança de Sistemas de Barragem de Rejeitos Contendo Radionuclídeos); * “O controle de comportamento de uma barragem é feito por inspeções visuais...” (Engº Cássio Baumgratz Viotti). ; Quanto à fiscalização ao longo dos anos Com relação à fiscalização realizada no local, não resta dúvida quanto à existência de constantes vistorias no local, que podem ser comprovadas pelo seguinte. * “... toda vez que alguma irregularidade era constatada nas realizadas pela FEAM, a empresa era autuada...” (Sr. Juca Procópio); * “A FEAM não foi informada sobre essa operação, nem a constatou em suas inspeções” (Relatório Técnico – SEMAD); * “A partir de 25-9-1989 foram efetuadas 20 fiscalizações ao empreendimento da Mineração Mata Virgem Ltda.,... (FEAM)” (Relatório Técnico – SEMAD); * “A primeira fiscalização ocorreu em 26/05/60 e a última em 18/10/00. Foram ao todo 12 (doze) vistorias,... (DNPM)” (Relatório Técnico – SEMAD). ; Quanto à ocorrência de vibrações A ocorrência de vibrações induzidas por evento extremo é uma hipótese que não pode ser descartada, especialmente no que se refere à existência de um elemento imperceptível, centrado principalmente em possíveis detonações ocorridas nas áreas de lavra vizinhas. * “...as cargas dinâmicas introduzidas na barragem, sejam pelas detonações vizinhas sejam pelos equipamentos, devem ser objeto de preocupação permanente.” (Geólogo Sérgio Brito); * “Um aspecto que merece ser comentado é o da segurança perante a tremores de terra,..., caso estejam situados em regiões em que se estima possam ocorrer acelerações superiores a 0,2 g.” (Engº Cássio Baumgartz Viotti); * “Em áreas que ocorram vibrações,... recomenda-se que o alteamento por este método de montante seja descartado.” (Prof. Lindolfo Soares). ; Quanto à surgência de água no barramento 32 Um item que igualmente chegou a ser alardeado, em função do depoimento do Sr. Luiz Sartori, refere-se a uma presumida surgência de água no barramento, o que foi esclarecido pelas condições locais. * “Essa água é normal lá, sempre teve, ali é um lugar de passagem de água.” (Engº Pitangui Moreno); * “...na junção entre a cava da Mineração Mata Virgem e a divisa da mineração vizinha existe... uma calha natural... e que por lá desce água em período de chuva.” (Engº Juca Pedroso); * “...tem o pátio também da mineração vizinha, que quando molhado sempre tem um corrimentozinho de água.” (Engº Juca Pedroso). ; Quanto à segurança do maciço Ao contrário do que se chegou a noticiar, especialmente através de notícia veiculada na mídia, não existia qualquer registro de funcionários da empresa quanto à segurança no local, conforme confirmaram os depoimentos prestados por familiares das vítimas junto ao Ministério Público Estadual. * “...o irmão não comentou sobre possibilidade de risco no trabalho.” (Sra. Maria das Tranças); * “...nunca mencionou a respeito de situações de risco no local...” (Sr. Murilo Pernalta); * “...nunca se queixou da falta de segurança...” (Sr. Pantaleão Cabreira). ; Quanto ao mecanismo do deslizamento Uma característica marcante do acidente foi o seu mecanismo de ocorrência, que preservou, em parte, o dique do barramento executado, com movimento rotacional facilmente identificável. * “...uma espécie de jorro de material já liquefeito busca saída empurrando para os lados as partes laterais do dique, como se fossem porteiras,...” (Relatório da Comissão de Sindicância – CREA-MG); * “...gerou um violento movimento de rotação de parte do dique de contenção na zona de ruptura sobre a estrada de acesso a Morada dos Deuses.” (Laudo Pericial – Ministério Público); 33 ; Quanto à postura da empresa mineradora Merece destaque a postura da empresa mineradora, que, desde a ocorrência do acidente, colaborou com as autoridades e órgãos públicos, conforme destacado a seguir. * “No dia 22-06-2001, por volta das 16 h e 45 min, a FEAM foi comunicada acerca de um acidente ocorrido na Mineração Mata Virgem Ltda.” (Auto de Fiscalização – FEAM); * “...dar o testemunho aqui que todas as vezes que nós solicitamos informações da Mineração Mata Virgem, nós sempre tivemos muito boa acolhida por parte deles em fornecer as informações solicitadas. Parabéns à empresa...” (Engº Patinhas Bernardes); * “...que a empresa sempre cumpriu essa exigência.” (Sr. Juca Procópio); ; Quanto à participação dos proprietários Muito importante destacar manifestação ocorrida no ano de 1987, durante o VXII Seminário Nacional de Grandes Barragens, com relação à acidente análogo ao registrado na Mineração Mata Virgem. * “...não podemos também condenar totalmente a proprietária, porque o órgão fiscalizador também não tinha cobrado nada disso.” (Engº Cássio Baumgartz Viotti,). ; Quanto à previsibilidade do acidente Por tudo o que foi analisado, torna-se claro que o acidente não foi previsível por aqueles que compartilharam do cotidiano da empresa, uma vez não existirem registros de quaisquer evidências anteriores de instabilidade do maciço rompido, que poderia indicar a possibilidade de ocorrência do evento. Isto se evidenciaria através do surgimento de trincas, inclinações, surgência de água, erosões ou focos de crescimento vegetal na superfície do talude ou vibrações ou afundamentos no piso da crista do barramento, e ainda abatimento na pista de rolamento da estrada, o que não ocorreu. Para corroborar o caráter imprevisível do acidente, reproduzimos trecho de trabalho técnico relativo a evento similar, já relatado em item anterior. *“A previsão de ruptura de uma barragem, principalmente no que diz respeito ao momento de sua ocorrência, é praticamente impossível dentro do conhecimento atual da engenharia.” (Engºs Paulo César Parra e Nivio Tadeu Lasmar). ; Quanto ao estado da técnica Um tópico relevante refere-se ao desenvolvimento da tecnologia referente ao assunto em tela, seu estágio de conhecimento e atual estado da técnica, o que se reflete nas declarações expostas a seguir. * “Ainda hoje a “TECNOLOGIA DE BARRAGEM DE REJEITO” é pouco desenvolvida...” (Engº José Jaime Rodrigues Branco); * “...tal conhecimento não está bem difundido.” (Relatório da Comissão de Sindicância – CREA-MG,); * “Que barragens de rejeito são diferentes, não há a menor dúvida.” (Geólogo Sérgio Brito); * “O desconhecimento ainda existente sobre o comportamento dos fenômenos naturais,...” (Geólogo Sérgio Brito); * “Há todo um campo aberto para desenvolvimento de uma tecnologia específica de projeto de barragens de rejeito...” (Geólogo Sérgio Brito); * “Grandes sinistros com ruptura de barragens de rejeitos tem ocorrido no mundo inteiro, inclusive no Brasil.” (Engº Riad Chammas); * “Os casos de ruptura de barragens brasileiras de rejeito estão em fase de cadastramento...” (Engº João Francisco Alves Siqueira); * “Além de pioneiro, o projeto resolva...” (Revista Mineral & Minerales) 34 6.2) Conclusão final: Diante do exposto nos itens anteriores, e após analisarmos todos os fatos que interferem ou possam vir a interferir com o assunto objeto deste laudo, concluímos o seguinte: * O rompimento foi causado pelo fenômeno da liquefação, que é registrado quando ocorre um rápido decréscimo da resistência ao cisalhamento do maciço, fazendo com que, após iniciado o movimento, o material corra como se fosse um líquido, até encontrar um ângulo de repouso que permita sua estabilização. * A origem deste fenômeno foi o estado de saturação do maciço do barramento, fazendo com que a água contida entre os grãos do material passassem a desenvolver sub-pressões nos materiais sólidos do aterro, que perderam a coesão e, conseqüentemente, a resistência ao cisalhamento, criando as condições propícias à ocorrência da ruptura. * Toda esta seqüência de fatos foi decorrente do acúmulo de água junto ao barramento, resultado da concepção equivocada do lançamento de rejeitos na extremidade oposta ao alteamento executado no local do rompimento, cujo método adotado foi o de montante. * Finalmente, cabe ressaltar que este método não é recomendado na literatura técnica, bem como na Norma Brasileira da ABNT, sendo que, na hipótese de sua utilização, o correto seria o lançamento ocorrer sobre a crista do barramento, fazendo com que a água se acumulasse na extremidade oposta, conforme figura a seguir. 35 VII) CURRICULUM VITAE: Francisco Maia Neto ; Graduado em Engenharia Civil (julho/1983) e Direito (dezembro/1996) pela Universidade Federal de Minas Gerais. ; Pós-Graduação em Engenharia Econômica - Fundação Dom Cabral (julho/84). ; Extensão universitária em Direito Imobiliário - Faculdades Metropolitanas Unidas (setembro/1997). ; Sócio da PRECISÃO CONSULTORIA (Avaliações, Perícias e Arbitragens). ; Professor de disciplinas relacionadas à “Engenharia de Avaliações e Perícias” em cursos universitários, pós-graduação e de treinamento, em diversos estados brasileiros. ; Autor de livros, trabalhos e artigos sobre avaliações, perícias, arbitragem e mercado imobiliário. ; Participação em entidades: 9 IBAPE – Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia (Entidade Federativa Nacional) – Presidente (2003/2004); 9 ABRAP – Associação Brasileira de Entidades de Engenharia de Avaliações e Perícias – Vice-Presidente (1988/1990); 9 IBAPE-MG – Instituto Mineiro de Avaliações e Perícias de Engenharia - Presidente (1989/1990 e 1991/1992); 9 IBAPE-SP – Instituto Mineiro de Avaliações e Perícias de Engenharia de São Paulo – Membro do Conselho Presidencial (2006); 9 CREA-MG – Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia de Minas Gerais – Vice-Presidente (1992/1993); 9 COBREAP – Congresso Brasileiro de Engenharia de Avaliações e Perícias – Presidente – XII COBREAP (Belo Horizonte-MG/2003); 9 ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas – Diretor de Engenharia de Avaliações e Perícias do COBRACON (1991/1996); 9 SME – Sociedade Mineira de Engenheiros – Membro fundador e Presidente da Comissão Técnica de Perícias, Mediações e Arbitragens (2000/2001) 9 CAMARB – Câmara de Arbitragem de Minas Gerais – Membro do quadro de árbitros; 9 CAMINAS – Câmara Mineira de Conciliação, Mediação e Arbitragem – Coordenador da Câmara Setorial do Mercado Imobiliário e Construção Civil. 9 IPEAD – Instituto de Pesquisas Econômicas e Administrativas de Minas Gerais (UFMG) – Membro do Conselho Superior (1997/2005). 9 CMI-MG – Câmara do Mercado Imobiliário de Minas Gerais – Chanceler da Medalha do Mérito Imobiliário (1996/1997/1999/2001). 9 ASPEJUDI – Associação de Peritos Judiciais, Árbitros, Conciliadores e Mediadores de Minas Gerais – Vice-Presidente de Cultura Profissional (2006/2007). 9 AAAEE – Associação dos Antigos Alunos da Escola de Engenharia da UFMG – Membro do Conselho Deliberativo (2000/2002). 36 VIII) BIBLIOGRAFIA: 1) CAPUTO, Homero Pinto. Mecânica dos Solos e suas Aplicações – 5ª edição, Rio de Janeiro/1980; 2) VARGAS, Milton. Introdução à Mecânica dos Solos, São Paulo/1977; 3) NETO, Antônio Filho. Dicionário do Engenheiro, Recife/1999; 4) KRIEGER, Maria da Graça. Dicionário de Direito Ambiental – 1ª edição, 1998; 5) Anais do Seminário Nacional de Grandes Barragens. Comitê Brasileiro de Grandes Barragens, Rio de Janeiro/1983; 6) CRUZ, Paulo Teixeira da. 100 Barragens Brasileiras, São Paulo/1996; 7) ARNEZ, Fernando Ivan Vasquez e SOARES, Lindolfo. Boletim Técnico da Escola Politécnica da USP – Departamento de Engenharia de Minas. Avaliações das Principais Causas de Acidentes em Barragens de Contenção de Rejeitos Devido a Fatores Geológicos e Geotécnicos, São Paulo/2000; 8) COLLISCHONN, Walter. Análise do Rompimento Hipotético da Barragem de EnertinaRS. Ministério da Educação e Cultura, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Instituto de Pesquisas Hidráulicas, Porto Alegre/1997; 9) SOARES, Lindolfo. Barragens de Rejeitos. Metodologia de implantação, operação e manutenção. Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, Departamento de Engenharia de Minas; 10) KRIEGER, Maria Graça; MARCIEL, Ana Maria Becker; ROCHA, João Carlos de Carvalho; FINATTO, Maria José Bocorny e BEVILACQUA, Cleci Regina. Dicionário de Direito Ambiental, Porto Alegre/1998; 11) VIDOSSICH F e FURLAN O. Dicionário de Novos Termos de Ciências e Tecnologia, São Paulo/1996; 12) XVIII Seminário Nacional de Grandes Barragens, Anais volume III, Brasília/1987. 37