ENTALPIA DE COMBUSTÃO DE CASTANHA DO PARÁ: PROPOSTA DE EXPERIMENTO DE TERMOQUÍMICA 1 ALINE MARQUES DA SILVA2; ANA CARLA PENTEADO FELTRIN3; ANÁLIA MARIA LOPES4; CANDICE KEMMERICH5; GILMAR BENINI6; JULIETA SALDANHA DE OLIVEIRA7; MÁRCIO MARQUES MARTINS8. 1 Trabalho de Pesquisa realizado na disciplina de Físico-Química IV – QMC286 Curso de Química do Centro Universitário Franciscano (UNIFRA), Santa Maria, RS, Brasil E-mail:[email protected] 2-8 RESUMO Experimentos de termoquímica costumam exigir complexos equipamentos para serem devidamente realizados. Esse trabalho propõe um experimento para determinar o calor de combustão de alimentos a partir de uma montagem simples, usando apenas equipamentos e vidrarias básicas de laboratório. O alimento usado no experimento foi a castanha-do-pará, cujo conteúdo oleoso é alto e, portanto, de grande inflamabilidade. A castanha é presa a uma espiral de cobre, é então incendiada e posicionada sobre um copo de Béquer contendo gelo e envolto por folhas de alumínio. A temperatura no interior de Béquer é mantida constante por inspeção da temperatura e adição de gelo. O presente experimento foi realizado de forma preliminar na disciplina de Físico-Química IV. O calor de combustão foi de, respectivamente, 2619,9 cal/g e 4142,5 cal/g, contra um valor teórico de 3133,3 cal/g. Os erros experimentais encontrados foram 16,5% e 32,2%. Fatores de erro são discutidos ao final desse trabalho. Palavras-chave: Físico-Química; Termoquímica; Ensino de Química. 1. INTRODUÇÃO Calorimetria é uma parte da Termoquímica que permite determinar o calor envolvido em reações químicas, mudanças de fase, etc. Uma das categorias de reações químicas que pode ter o calor envolvido determinado experimentalmente é a combustão Ao determinar o calor de combustão de uma substância, determina-se a quantidade de energia liberada na queima deste na presença de oxigênio puro, em outras palavras o seu valor calórico. As medições de valor calórico são frequentemente feitas usando uma bomba calorimétrica. A bomba calorimétrica é um dispositivo composto por um cilindro de aço inoxidável de paredes rígidas, o qual pode ser lacrado e preenchido com oxigênio gasoso puro sob alta pressão. Nesse dispositivo, a amostra pesada é colocada em um recipiente preparado para incendiar a amostra por meio de uma centelha elétrica. Ao redor da amostra, há uma quantidade conhecida de água, a qual absorverá o calor liberado pela combustão do alimento. A amostra incendiada na atmosfera de oxigênio puro aquece a bomba e a água 1 circundante. Quando se estabelece o equilíbrio térmico, a bomba e a água terão a mesma temperatura. Usando o princípio de conservação da energia. Calor liberado pela combustão do alimento = calor absorvido pela água + calor absorvido pela bomba ou, na forma da equação: qreação = (qágua + qbomba ) (onde q é o símbolo para o calor) O qreação, por convenção, tem um valor negativo, porque a reação de combustão é exotérmica (ou seja, ela libera energia para a vizinhança). O qágua e o qbomba são calculados a partir da variação de temperatura da água e da bomba calorimétrica, necessitando-se conhecer a capacidade calorífica da água e da bomba. A soma desses termos resulta no calor de combustão da amostra que foi usada. A construção de uma bomba calorimétrica é complicada e demanda tempo e dinheiro. Normalmente, não é possível dispor de tal equipamento em sala de aula, devido aos fatores acima expostos. O calor é a quantidade de energia que flui através da fronteira do sistema durante uma transformação, devido a um gradiente de temperatura,isso é, uma quantidade de energia que ‘escoa’ de um ponto a uma temperatura mais elevada para outro ponto a uma temperatura mais baixa. Convencionou-se o sinal positivo para o calor absorvido pelo sistema e o sinal negativo para o calor liberado pelo sistema. Como calor é uma manifestação de energia ele é descrito na unidade como calorias ou Joules, sendo que 1 cal = 4,184 J. Neste trabalho, apresentamos uma proposta de experimento para a determinação do conteúdo calórico de alimentos através de uma construção simplificada de calorímetro. As nozes e castanhas são alimentos ideais para o desenvolvimento de experimentos desse tipo, pois são ricos em óleos vegetais e, portanto, altamente combustíveis. Essa característica é desejável, visto que o experimento será realizado em ambiente aberto, ao contrário da combustão realizada em uma bomba calorimétrica com excesso de oxigênio e em ambiente isolado, a fim de garantir a combustão completa da castanha. 3. EXPERIMENTAL 3.1.MATERIAIS Béquer de 250 mL revestido com folha de alumínio; Espiral de fio de cobre; Termômetro de mercúrio (até 150ºC); 2 proveta graduada ou copo de Béquer; Agarrador de madeira Castanha-do-pará ou outros frutos de casca rija, como amêndoas, cajus, pecans, nozes, amendoim, etc. gelo 3.2.DESENVOLVIMENTO A montagem do experimento é descrita na figura 01 (abaixo): Figura 01: Aparato usado para a determinação do calor de combustão da castanha O Béquer a ser usado deve estar limpo e seco, a fim de evitar alterações na massa de água obtida por derretimento do gelo. Com uma braçadeira ajustável grande, prende-se o Béquer ao suporte universal. A espiral de fio de cobre é usada para prender a castanha e permitir a queima completa. A massa da castanha deve ser medida antes de iniciar o procedimento. O gelo deve ser adicionado ao Béquer apenas alguns instantes antes da combustão da castanha, para evitar a formação de água líquida por derretimento natural do gelo. Deve-se posicionar a castanha de forma que a parte superior da chama apenas toque o fundo do Béquer a fim de permitir que o alimento queime completamente. 3 Após a combustão completa da castanha, usando o agarrador de madeira, deve-se segurar o Béquer e cuidadosamente derramar a água líquida (mas sem gelo) numa proveta graduada. Deve-se determinar a massa de água obtida pelo derretimento do gelo. Para eliminar a necessidade da determinação do calor específico do Béquer (que cumpre o papel de bomba calorimétrica) é necessário que o calor liberado pela castanha seja, o máximo possível, absorvido pelo Béquer. Para viabilizar isso, o Béquer é revestido com uma folha de alumínio que cumpre o papel de concentrar o calor liberado pela chama da castanha. As demais condições experimentais são controladas para manter uma temperatura constante e igual a 0OC dentro do Béquer. O Béquer é preenchido com uma grande quantidade de gelo, e o derretimento do mesmo deve ser acompanhado da renovação do gelo derretido. O operador deve monitorar a temperatura do meio a fim de assegurar-se que a temperatura não sofre incrementos significativos. O calor evoluído pela combustão da castanha derrete o gelo e produz água líquida. Enquanto há a passagem de água da forma sólida para a forma líquida, não ocorre variação de temperatura, pois todo o calor absorvido pelo gelo é, teoricamente, usado para a mudança de fase. Dessa forma, a quantidade de água líquida presente ao final da combustão da castanha é proporcional ao calor liberado pela queima do alimento. 4. RESULTADOS E DISCUSSÃO Nesta experiência, o calor é medido em calorias. Uma caloria é a quantidade de calor necessária para elevar a temperatura de 1,0 g de água de 1ºC (ORTEGA, NETZ, 2002). Devido ao excesso de gelo no Béquer, a temperatura do sistema deve permanecer constante em 0ºC, assim acontecendo o derretimento do gelo em água líquida à uma temperatura constante. O calor necessário para derreter um grama de gelo a 0ºC é conhecido como o calor de fusão e tem um valor tabelado de 80 cal/g de água (ORTEGA, NETZ, 2002). Em caso de não haver acesso a uma balança eletrônica, pode-se usar o volume de água medido na proveta para determinar a massa de água obtida usando-se a aproximação 1,0 mL H2O = 1,0 g H2O. O calor produzido por combustão do amendoim é calculado através da equação: 4 qcastanha = mágua x 80 cal/g, onde: qcastanha = calor produzido pela castanha (em calorias) mágua = massa de água em g 80 cal/g = calor de fusão do gelo (o calor necessário para derreter um grama de gelo) O experimento foi realizado em duplicata. Na primeira tentativa, o controle sobre a temperatura do meio foi rigorosa. Na segunda tentativa, o controle da temperatura interna não foi tão criterioso. A descrição dos resultados obtidos é feita a seguir: Tentativa 1: mcastanha = 2,749 g mH2O = 89,725 g qcastanha = (89,725 g x 80 cal/g) = 7194 cal Cálculo da massa de castanha que efetivamente sofreu combustão: mcastanha,inicial - mcastanha,final = 2,749 g – 0,270 g = 2,479 g Cálculo do calor liberado por grama de castanha: 2,479 g castanha -------------------- 7194 cal 1,000 g castanha -------------------- q q = 2616,9 cal/g Consultando as informações nutricionais do fabricante da castanha: 5 Figura 01: Informações nutricionais da castanha-do-pará O conteúdo energético de 15,0 g de castanha é de 47000 cal. Dividindo 47000 cal por 15 g retorna um valor de 3133,3 cal/g. Esse é o valor que nosso experimento deve reproduzir. Comparação do dado experimental com o dado “teórico”: 3133,3 cal ----------------------- 100% 2616,9 cal ----------------------- X X= 83,52% (erro relativo de 16,5%) Tentativa 2: Nessa segunda realização do experimento, a temperatura dentro do Béquer subiu a 10OC e não foi realizada uma limpeza adequada do mesmo. O fundo do Béquer estava sujo de fuligem proveniente da queima anterior de castanha. Esses dois fatores contribuíram para um erro experimental maior. mcastanha = 2,367 g mH2O = 112,884 g qcastanha = (112,884 g x 80 cal/g) = 9030,72 cal 6 Cálculo da massa de castanha que efetivamente sofreu combustão: mcastanha,inicial - mcastanha,final = 2,367 g – 0,187 g = 2,180 g Cálculo do calor liberado por grama de castanha: 2,180 g castanha -------------------- 9030,72 cal 1,000 g castanha -------------------- q q = 4142,5 cal/g Comparação do dado experimental com o dado “teórico”: 3133,3 cal ----------------------------- 100% 4142,5 cal ----------------------------- X X= 132,20% (erro relativo de +32,2%) . Os valores obtidos nos cálculos de calor liberado pela castanha estão quase que de acordo com as informações nutricionais do fabricante, sendo a primeita tentativa com menor erro relativo de 16,5%, e a segunda com mair de 32,20%. Baseando-se que o experimento foi realizado sem o devido isolamento térmico e sem o ambiente controlado provido por uma bomba calorimétrica. 5. CONCLUSÃO Os dados experimentais de calor de combustão da castanha (2616,9 cal/g e 4142,5 cal/g) comparado com as informações nutricionais fornecidas pelo fabricante (3133,3 cal/g), mostram através dos cálculo de erro experimental (16,5% e 32,20%) um erro experimental aceitável. Alguns fatores podem ser enunciados como possíveis fontes de erro e que afastaram os valores experimentais dos valores esperados: 1) A combustão é realzada em ambiente aberto, parte do calor de combustão 7 escapa para a vizinhança e não é usado no aquecimento do Béquer e do gelo. 2) A falta de controle sobre a temperatura interna do Béquer durante a combustão da castanha leva a um derretimento excessivo de gelo, o que influencia negativamente o cálculo de calor de combustão. 3) A adição de gelo previamente derretido também mascara a quantidade de calor liberada pela queima da castanha. 4) A premissa de que o calor absorvido pelo Béquer é desprezível é parcialmente verdadeira. Parte do calor liberado pela combustão é absorvido por ele e reduz a quantidade de água ao final do processo de combustão. O revestimento do Béquer com alumínio apenas minimiza a perda de calor para a vizinhança e para o Béquer. 5) A quantidade de água formada pelo derretimento do gelo pode, ainda, ser mascarada pela absorção de calor do meio. Tendo-se em vista todos esses fatores de erro levantados, pode-se dizer que o experimento proposto mostrou-se bastante adequado para a determinação do calor de combustão de alimentos. Como perspectivas futuras, novas determinações de calor de combustão envolvendo a castanha e outros alimentos serão realizadas a fim de determinar com maior precisão a validade do método. Se a exigência de precisão não for tão alta, pode-se adotar essa metodologia sem maiores preocupações. A técnica descrita, por ser de baixo custo e de fácil execução, é adequada para uso em aulas experimentais de disciplinas de Físico-Química de nível superior e médio. REFERÊNCIAS ORTEGA, George Gonzáles; NETZ, Paulo A. Fundamentos de Físico-Química, Uma abordagem conceitual para ciências farmacêuticas. 1ªed. São Paulo: ARTMED, 2002. KATZ, David A., Energy of a peanut: an experiment in calorimetry, < http://www.chymist.com/energy%20of%20a%20peanut.pdf>, 22/09/2010 8 acessado em