GT 4: CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL Este GT contempla trabalhos empíricos e teóricos sobre as seguintes questões: C&T e desenvolvimento; Tecnociência e capitalismo no século XXI; C&T na América Latina; C&T no Brasil; Inovação no Brasil; Políticas Públicas de C&T e desenvolvimento territorial/local/regional; CT&I na visão (neo)schumpeteriana; C&T segundo os estudos inspirados na Rede Sócio-Técnica; C&T e a atualidade do Pensamento Latino-Americano de Ciência Tecnologia e Sociedade [PLACTS]; C&T e diversidades socioculturais; C&T e meio ambiente; Relações Universidade-Empresa; Possibilidades e limites das Tecnologias Sociais. Coordenação: Paula Casagrande Marimon (UDESC – SUL); Ana Cristina de Almeida Fernandes (UFPE – NE); Rafael Dias (UNICAMP – SE). 1 SUMÁRIO 4 Como a educação não formal incorpora o auto-registro audiovisual no ensino e popularização da ciência? Raquel da Silva Santos 14 A Importância dos PCTs para o Desenvolvimento Local e Territorial: A Experiência do Parque Tecnológico da Paraíba Elis Regina Neves BARREIRO Ângela Maria Cavalcanti RAMALHO 26 Pós-Graduação e Desenvolvimento: Uma Análise da Visão Contida no PNPG Brasileiro Cidoval Morais de SOUSA Georgia Simonelly Lima NASCIMENTO 38 O Uso do Novo Paradigma Ambiental nas Ações do Marketing Ecológico: Um Estudo de Caso de Uma Fábrica de Calçados na Cidade de Campina Grande-PB José Austerliano RODRIGUES Allice Montenegro LIMA 50 A contribuição das políticas de Ciência & Tecnologia e Inovação na dinâmica da acumulação de capital no Brasil Ester Cristina Bevian GRAF Tatiane Thaís LASTA Daniel Rodrigo STRELOW 62 Diversidade de abordagens na produção científica das ciências humanas e sociais: uma breve revisão de literatura Antônio Pereira Cardoso da Silva Filho Thiago Lima Mathias Cidoval Morais de Sousa Ângela Maria Cavalcante Ramalho 74 Território e os Programas de Pós-graduação com Mestrado e Doutorado na Área de Planejamento Urbano e Regional no Brasil Christiane Fabíola MOMM Marcos Antônio MATTEDI 2 86 Potencial Tecnológico da Universidade Pública e Sua Contribuição Para o Desenvolvimento Regional e Local Felipe Augusto Lopes Carvalho Janiel Célio Dos Santos Romário Lustosa De Oliveira Elizabete Cristina Sousa Araújo Simone Silva Dos Santos Lopes 98 O Setor de Tecnologia da Informação e Comunicação no Conjunto da Economia Brasileira Danillo Alves de OLIVEIRA Ângela Cristina Trevisan FELIPPI Cidonea Machado DEPONTI Carlos Eduardo Ruschel ANES 110 Estratégias Locais de Desenvolvimento e Incubadoras de Empresas de Base Tecnológica no Brasil Maria Alice Lahorgue 123 Cisternas: Uma Tecnologia Social em Prol do Desenvolvimento Maysa Porto FARIAS Hermes Alves de ALMEIDA 135 Técnicas e Tecnologias no Contexto da Educação do Campo: análises sobre os espaços e objetos técnicos na Pedagogia da Alternância Giovanna Pezarico Gilson Leandro Queluz Maria de Lourdes Bernartt 147 Transmissão de Tecnologias Socioambientais para as Comunidades visando o Desenvolvimento Sustentável Wellington Marchi PAES Maria Cristina CRISPIM 159 Inovação em empresas catarinenses: uma exceção no cenário nacional Franklin Carlos Zummach Ivo Marcos Theis 171 AS DETERMINAÇÕES E DESAFIOS DA PESQUISA: REGISTRO DAS IES DA REGIÃO DO VALE MÉDIO IGUAÇU E O DESENVOLVIMENTO REGIONAL GUMBOWSKY, ARGOS SIQUEIRA, EDITE 3 Como a educação não formal incorpora o auto-registro audiovisual no ensino e popularização da ciência?1 GT4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional Raquel da Silva Santos – Instituto Nacional do Semiárido (Insa) Resumo O presente artigo apresenta em linhas gerais alguns dos pressupostos que norteiam o projeto piloto Semiárido em Tela realizado em Nova Palmeira –PB pelo Instituto Nacional do Semiárido (Insa). O objetivo principal do projeto é transmitir e re-pensar a ciência através da formação em auto-registro audiovisual. Através do estudo sobre popularização da ciência e metodologias participativas tentou investigar como a utilização de ferramentas da comunicação colaboram no ensino e aprendizagem da ciência e na promoção de um re-conhecimento sobre um semiárido de riquezas e saberes em espaços não formais de educação. Palavras-chave Popularização da Ciência & Tecnologia; Semiárido; Educação; Cinema Texto do trabalho O cinema foi inventado em 1895 na França pelos irmãos Lumière para fins científicos, a partir da criação do cinematógrafo, com intuito de estudar a formação de uma imagem. No Brasil, ele foi trazido por Affonso Segretto em 1898. As primeiras imagens projetadas tanto em Paris como no Rio de Janeiro eram o cotidiano dos meios de transporte: na Europa a chegada do trem em uma estação, aqui os navios se atracando no Porto. O cinema nessa época era fonte de divulgação cultural da sociedade. A maioria dos realizadores do início 1 Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional – II SEDRES, Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014 4 do século XX era fotógrafo que se convertera em cinegrafista. E a predominância nas décadas de 10 e 20 no Brasil era uma produção intitulada de cinema natural, com a produção de documentários e cine-jornais. Desta forma, as câmeras cinematográficas foram incorporadas ao material de trabalho de antropólogos que viajavam pelo país para registrar e documentar produções indígenas. O documentário é um gênero do cinema que possibilita a quem produz registrar leituras de realidades a partir de um olhar subjetivo. Em 1936, o governo federal cria o Instituto Nacional do Cinema Educativo (INCE) onde são produzidos séries de documentários rurais, de fauna e flora, de instituições e de cerimônias oficiais, mas predominam os filmes científicos. Desde sua invenção, o cinema está atrelado à ciência. Ciência entendida como conjunto de saber adquirido que tem como finalidade explicar a realidade de forma objetiva. A partir dos estudos de ilusão de ótica, luz e formação da imagem invertida através da captura do olho humano é que se origina o cinema e este se torna também importante instrumento de registro para a pesquisa científica. As imagens são entendidas nesse contexto não apenas como espelhos de uma dada mentalidade, mas como constituintes de dado imaginário e produtoras dessa realidade social como enfatiza Bohnsack: Nesta diferença (entre o desenvolvimento de uma compreensão através da imagem em oposição a uma compreensão sobre a imagem) estão implícitas hipóteses sobre a ação e a compreensão cotidiana que estendem-se às teorias da ação, do conhecimento, da percepção e dos signos. Que nós compreendemos o cotidiano através de imagens significa que nosso mundo, nossa realidade social (gesellschaftliche Wirklichkeit) não é apenas representada de forma imagética, mas também constituída ou produzida dessa forma. (BOHNSACK, 2005. p. 3) As imagens carregadas de símbolos e intenções são apresentadas diariamente pelos meios de comunicação de massa e influenciam fortemente o imaginário da população, interferindo em seus modos de pensar e agir. Quando se pensa 5 em semiárido, por exemplo, uma das primeiras imagens que vem ao pensamento da maioria das pessoas é de uma região pobre e seca. Essa característica está não somente ligada a construção imagética que a grande mídia até hoje insiste divulgar, mas as políticas públicas voltadas à região. Desde a criação do Departamento Nacional de Combate às Secas (DNOCS) em 1945. Somente na década de 80 a partir das ações dos movimentos sociais é que se inicia um novo olhar sobre o semiárido: o da convivência. “Fatores como temperaturas elevadas, fracas amplitudes térmicas anuais, solos pedregosos, curto período de chuvas e alto índice de evaporação das águas, especialmente de açudes, barreiros e locais irrigados definem o semiárido. No entanto, essas características não impedem a sobrevivência de pessoas nessa região. A possibilidade de convivência com as secas é condicionada por fatores sociais e políticos, cuja importância é pelo menos igual, senão maior do que as condições climáticas” (REVISTA DE ARTICULAÇÃO DO SEMIÁRIDO PARAIBANO – junho de 2001). O cinema documentário, mais precisamente o auto registro audiovisual documental, entendido como ferramenta para se ler e produzir realidades sobre esse semiárido e o seu entrelaçamento com a ciência conceituada como um conjunto de saberes que analisados e sistematizados permitem fazer leituras desse contexto social econômico e político é o ponto de partida para o projeto Semiárido em Tela apresentado neste artigo. O Semiárido em Tela foi um projeto piloto, uma parceria entre o Instituto Nacional do Semiárido (Insa) e o Cine Mandacaru, que ocorreu no período de agosto a novembro de 2013, no município de Nova Palmeira, região do semiárido da Paraíba. O diálogo entre o projeto Cine Mandacaru e o Insa teve início em fevereiro do mesmo ano, em um momento importante para se colocar em prática as concepções de popularização da ciência e tecnologia (C&T) que permeiam o discurso e as ações do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) desde o lançamento do Livro Branco: Ciência, Tecnologia e Inovação (MCT; 6 2002)2. Na publicação algumas diretrizes para atingir os objetivos de popularização da ciência e tecnologia são apontadas, dentre elas a educação para a sociedade do conhecimento a partir do desenvolvimento de ações específicas no âmbito da educação não formal e do ensino das ciências: Induzir um ambiente favorável a um aprendizado permanente, difundir a cultura cientifica e tecnológica na sociedade, incentivar o envolvimento dos meios de comunicação na cobertura dos assuntos de CT&I; contribuir para modernizar e aperfeiçoar o ensino das ciências; promover e apoiar a implantação de museus e exposições da C&T (MCT, 2002, p.67) A popularização da ciência e tecnologia é entendida para além de uma ação de difusão da informação cientifica ou tradução da pesquisa em ciência e está relacionada a uma perspectiva dinâmica análoga às relações e construções sociais, como esclarece Lozano: O que se entende por popularização da ciência e da tecnologia em um espaço e um tempo determinado se encontra influenciado pela concepção que se tem da ciência e da tecnologia pelas relações entre elas e a sociedade no seu conjunto. Com essa perspectiva popularização da ciência e da tecnologia aparece como um campo dinâmico, cujos conceitos, definições, objetivos, estratégias e públicos são redefinidos de maneira constante (LOZANO, 2005b, p.48). A partir do entendimento conceitual iremos apresentar nesse artigo o resumo do Projeto Semiárido em Tela em Nova Palmeira e demonstrar como o uso de ferramentas tecnológicas comunicativas é importante para o ensino e aprendizagem da ciência em espaços não formais e por que não dizer formais de educação. Semiárido em Tela Atualmente, com o avanço e o fácil acesso às tecnologias novos sujeitos do discurso surgem e utilizam o vídeo para se autodocumentar, produzir reflexões 2 Livro Branco é resultado da II Conferência Nacional de C&TI realizada em setembro de 2001 que aproxima o debate entre ciência, tecnologia e sociedade. 7 e experiências singulares (BENTES, 2007). Em uma rápida pesquisa pelo google, podemos encontrar inúmeros vídeos com este formato. Os grupos que mais produzem tais vídeos são crianças e jovens que crescem em uma sociedade cada vez mais tecnológica e imagética, mesmo àqueles inseridos em zonas rurais também estão conectados em decorrência de programas sociais de inclusão digital. A partir desse contexto, o projeto Semiárido em Tela incorporou o auto-registro audiovisual documental em oficinas de formação com objetivo de popularizar a ciência para um público que até então o Insa não conseguia dialogar e construir uma imagem do Semiárido a partir da reflexão sobre a prática de uma política de convivência e não de combate a seca. Foram realizadas 35 oficinas com a metodologia de pesquisa ação onde a construção de conceitos e técnicas audiovisuais foram construídas em conjunto com os participantes, e a partir do conhecimento adquirido foram produzidas por eles curtas-metragens sobre a região, a comunidade e o Projeto Plantas Medicinais da Caatinga. A pesquisa-ação é então vista como principal contribuição para a dinâmica de tomada de decisão no processo do Projeto Semiárido em Tela. Ou seja, nesse processo há um reconhecimento do papel ativo de cada um dos participantes durante as oficinas: Para que uma ação seja realizável, não basta a vontade subjetiva de alguns indivíduos. A ação proposta tem de corresponder as exigências da situação. Tais exigências são conhecidas por meio da observação, da análise da situação e por meio de uma ação das possibilidades. A ação é baseada em descrição objetiva mas subjetivamente é assumida pelo conjunto dos participantes que se comprometem na sua efetiva realização (THIOLLENT, 2011, p.108) Além da pesquisa ação, as práticas realizadas tiveram como referência a educomunicação que buscou possibilidades de intervenção social no sentido de transformar a realidade de acordo com a vontade e as possibilidades do próprio grupo. Procuramos vivenciar através da produção coletiva audiovisual 8 quais eram os entendimentos e desejos dos participantes em relação à sua comunidade e a região onde estão inseridos: “A questão da educomunicação busca ressignificar os movimentos comunicativos inspirados na linguagem do mercado de produção de bens culturais, mas que vão se resolver no âmbito da educação como uma das formas de reprodução de organização de poder da comunidade, como um lugar de cidadania, aquele índice do qual emergem novas esteticidades e eticidades (modos de perceber e estar no mundo). (SHAUN, 2002. p 15)” As oficinas do Projeto Semiárido em Tela iniciaram em três etapas, conforme detalhado abaixo: 1) Articulação com autoridades e entidades locais e regionais/Mobilização dos participantes. 2) Realização das oficinas, subdivididas em módulos: Módulo I – Introdução ao fazer ciência e ao cinema: Neste primeiro momento construímos com os participantes as definições de ciência, semiárido e cinema. A ideia era compreender como os jovens e educadores entendiam os termos e a relação que tais termos tinham com o cotidiano de cada um deles. Exposição dos desenhos feitos a partir do tema: “Convivência com o semiárido” e discussão sobre a leitura que os moradores do semiárido tem sobre sua própria região. Desenho feito por uma das educadoras a partir do tema “Convivência com o semiárido”. Módulo II – Pesquisa e Roteiro: Quais as histórias podem tornar filmes e por que é importante contar tais histórias. Os participantes neste módulo aprendem a investigar e aprofundar sobre determinado assunto para subsidiar a escrita de um roteiro/guia para a produção do documentário. No caso das educadoras 9 da comunidade quilombola Serra do Abreu houve uma solicitação por parte delas para que a construção do roteiro fosse feito com e na própria comunidade. “Acho que temos que conversar com seu Aécio, pois ele sabe de toda a história sobre os escravos até chegar aos dias atuais. Podemos iniciar nosso filme com os negros que fugiam pra cá, depois com o reconhecimento pela Fundação Palmares”, (Vera Lúcia dos Santos Dantas, aluna do Projeto Semiárido em Tela, setembro 2013). “E temos que contar como conseguimos dinheiro através da venda de nossas panelas de barro. Vamos mostrar como se faz uma panela de barro e como a dona Maria aprendeu com a dona Tetinha e hoje ela passa para a Solange”, complementou Diana. “Eu poderia mostrar minhas plantações também e de como conseguimos plantar mesmo no período seco”, (dona Josefa da Silveira Santos, aluna do Projeto Semiárido em Tela). Roda para a construção do roteiro do curtametragem documental da comunidade remanescente quilombola Serra do Abreu, Nova Palmeira –PB. Roteiro sendo construído em conjunto com toda a comunidade. Módulo III – Produção de curta-metragem: todos os participantes com os roteiros em mãos iniciaram a série de filmagens sobre os temas levantados por eles. Cada um deles a partir de afinidade e interesse escolheu o que fazer durante as filmagens: direção, fotografia, operador de boom, e produção. Módulo IV – Edição e Finalização que consistiu na montagem e edição dos 10 curtas-metragens. A montagem foi feita pelos participantes após a finalização das filmagens. Cena sendo gravada do filme sobre a Filmagens do curta sobre os artesãos de Nova comunidade remanescente quilombola Serra do Palmeira-PB que utilizam como matéria prima as Abreu. madeiras da caatinga. 3) Após finalização dos curtas-metragens foi realizada a 1ª Mostra de Cinema de Nova Palmeira. Os jovens e educadores apresentaram os resultados de suas produções para toda a população de Nova Palmeira e aprenderam a montar um evento de cinema em praça pública já que toda a organização foi feita pelos participantes. Mais de 400 pessoas estiveram presentes na Moradores assistem aos filmes produzidos Mostra Semiárido em Tela em Nova Palmeira- pelos alunos do Projeto Semiárido em Tela. PB. 11 Conclusão O Projeto promoveu uma interação entre ciência, cultura e a arte, com maior aproximação da Ciência e Tecnologia ao cotidiano das pessoas e valorizando os aspectos culturais e humanísticos da ciência. Os curtas-metragens produzidos recontam histórias dos moradores e sua convivência com a seca e cultura local. Desde seu Adonias que em certa época criou o cinema no município, abrindo às portas de sua casa para exibir filmes nacionais e estrangeiros até as tecnologias sociais que foram construídas na comunidade quilombola Serra do Abreu e colaboraram no desenvolvimento da comunidade, passando pelo Projeto Plantas Medicinais e apresentando a importância do cultivo e produção de remédios com as espécies da caatinga. As educadoras participantes puderam aprender sobre alternativas de trabalho didático-pedagógico com a ciência através do cinema, utilizando não somente de exibições de filmes de fora, mas também e principalmente dos vídeos produzidos por eles mesmos. Isso possibilitou o despertar pela curiosidade científica e o envolvimento de um maior número de pessoas, em atividades, debates e discussões acerca da ciência. Para os jovens e educadoras foram ainda compartilhados além de ciência e cinema, posturas e diálogos nas relações sociais. Muitos encontros foram perpassados por conversas sobre o respeito ao tempo de cada um seja na criação ou na execução de determinada atividade, também trocamos experiências e brincadeiras com o corpo como elemento importante quando desenvolvemos processos educacionais. Além desses resultados qualitativos, o Projeto Semiárido em Tela também promoveu uma mostra de cinema com um público estimado em mais de 400 pessoas. Um momento de apresentação das atividades do Insa, de aproximação da educação cientifica à população através da exibição dos sete 12 filmes de curtas metragens3 produzidos pelos jovens e educadores, e principalmente possibilitou o acesso da população às linguagens artísticas da sua própria cultura. Referências bibliográficas BENTES, I. Redes Colaborativas e Precariado Produtivo. In: Caminhos para uma Comunicação Democrática. São Paulo: Le Monde Diplomatique e Instituto Paulo Freire, 2007. BOHNSACK, R. Métodos qualitativos de interpretação de imagens e o método documentário de interpretação. In: IV Fórum de Investigação Qualitativa – IQ 2005. Juiz de Fora, 2005. FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2011. LOZANO, M. Programas y experiencias em popularización de la ciência y la tecnologia: Panorámica desde los países del convenio Andrés Bello. Bogotá: CAB, 2005b, 267 p. NAVAS, A.M. Concepções de popularização da ciência e da tecnologia no discurso político: impactos nos museus de ciências. 2008. 126 p. Dissertção (Mestrado). Faculdade de Educação, Univsersidade de São Paulo, 2008. MINISTÉRIO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO. Livro Branco: Ciência, Tecnologia e Inovação. Brasília. CT Brasil. 80 p. 2008. SCHAUN, A. Educomunicação: reflexões e princípios. Rio de Janeiro: Mauad, 2002. THIOLLENT, M. Metodologia da pesquisa-ação – 18. ed. São Paulo: Cortez, 2011. 3 Os vídeos produzidos pelos participantes estão disponíveis no endereço: https://www.youtube.com/channel/UCatcJ0-UqtrJTYsdR-sCeCA 13 GT 4: CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL A Importância dos PCTs para o Desenvolvimento Local e Territorial: A 1 Experiência do Parque Tecnológico da Paraíba Elis Regina Neves BARREIRO2 Ângela Maria Cavalcanti RAMALHO3 Universidade Estadual da Paraíba, Campina Grande, PB. Resumo Ambientes de inovação implantados em países desenvolvidos e em desenvolvimento para dinamizar economias regionais e nacionais, os Parques Científicos e Tecnológicos, através da relação Governo-Universidade-Empresa, podem desempenhar o papel de impulsionador do desenvolvimento cientifico e tecnológico local e territorial, tornando as localidades mais competitivas, gerando empregos de qualidade e bem-estar social. O objetivo deste artigo é analisar a relevância dos PCTs para o desenvolvimento local e territorial e apresentar a experiência do Parque Tecnológico da Paraíba, demonstrando o estabelecimento de empresas inovadoras e de parcerias públicas e privadas. Palavras-chave: Parques Científicos e Tecnológicos; Arranjos institucionais; Desenvolvimento local e territorial. Abstract Innovation environment deployed in already developed and developing countries to boost regional and national economies, the Scientific and Technological Parks, through the relation Government-University-Industry can play the role of catalyst of scientific development and technological local and territorial, making localities more competitive, creating quality jobs and social welfare. The objective of this paper is to analyze the relevance of PCTs to local and regional development and present the experience of the Paraíba Technology Park, demonstrating the establishment of innovative public and private partnerships. Key-words: Science and Technology Parks; Institutional arrangements; Local and territorial development. 1 Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional – II SEDRES, Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014. 2 Mestranda do PPGDR/UEPB, e-mail: [email protected] 3 Professora do PPGDR/UEPB, e-mail: [email protected] 14 1. Introdução Os Parques Científicos e Tecnológicos (PCTs) são amplamente discutidos na literatura mundial como sendo de grande importância para o desenvolvimento territorial, para a integração econômica e criação de inovações tecnológicas, além da geração de produtos com maior valor agregado, o que resulta em um encadeamento industrial e por resultância um aumento da competitividade das regiões. São ambientes de inovação implantados em países desenvolvidos e em desenvolvimento para dinamizar economias regionais e nacionais, agregandolhes conteúdo de conhecimento. Com isso, essas economias tornam-se mais competitivas no cenário internacional e geram empregos e bem-estar social. Desse modo, o objetivo deste artigo é analisar a relevância dos PCTs para o desenvolvimento local e territorial, bem como, apresentar a experiência do Parque Tecnológico da Paraíba, a partir das relações Governo-UniversidadeEmpresa, como impulsionador do desenvolvimento científico e tecnológico local. Para atingir tal propósito, utilizou-se a pesquisa bibliográfica e documental. Busca-se, portanto, com base na análise da trajetória do PaqTcPB e nos resultados alcançados pela pesquisa, demonstrar o estabelecimento de empresas inovadoras e de parcerias públicas e privadas, no período de 20112013. 2. Discussão da literatura Reconhecidos instrumentos indutores dos processos de inovação tecnológica, caracterizados pela integração de múltiplos atores e instituições públicoprivadas, os Parques Científicos e Tecnológicos (PCTs) constituem locais privilegiados, compostos por infraestruturas físicas e organizacionais de articulação, em que se combinam os conhecimentos científico-tecnológicos 15 (universidades), aplicados (empresas/mercado), organizacionais (práticas/relacionamentos). De acordo com Vedovelo; Judeci; Maculan (2006), a literatura internacional vem tratando Parque Tecnológico como um instrumento de promoção a diversos objetivos econômicos e políticos, servindo como mecanismos de desenvolvimento local e territorial. Cumprindo funções de suporte à integração entre agentes sociais similares (pequenas e grandes empresas) ou distintos (universidade e indústria), aos parques tecnológicos vem também sendo imputado o papel de ser um mecanismo de desenvolvimento regional/local de estímulo à maior competitividade e performance empresarial, gerando crescimento e desenvolvimento econômicos (Idem, 2006, p.104). Assim sendo, as experiências pioneiras de implantação de Parques Científicos e Tecnológicos ocorreram entre fins dos anos 1940 e início dos 1960, na Universidade Stanford, Califórnia, com o Parque de Pesquisa Stanford Research Park, hoje conhecida como Vale do Silício e a Rout 128, na região de Boston, Massachusetts, onde estão localizadas o Massachusetts Institute of Technology (MIT) e a Harvard University. Evidencia-se que as experiências norte-americanas contribuíram significativamente para implantação de PCTs na Europa, em 1970, tais como, Sophia-Antipolis na França e Cambridge na Inglaterra (VEDOVELLO; JUDECI; MACULAN, 2006). A conjuntura do pós-guerra foi um fator que influenciou e determinou o avanço das iniciativas de PCTs. Os países economicamente abatidos passaram a acreditar no processo de inovação, fomentando maior sinergia entre centros de conhecimento e pesquisa e as empresas, dando início a políticas públicas, em níveis nacional, regional e local, como forma de induzir a revitalização de regiões. Depois do surgimento nos Estados Unidos, o modelo expandiu-se pelo mundo. No início dos anos 1970 até 1980, na Europa e Japão, em 1980, na Ásia e 16 Pacífico e em 1990 no resto do mundo industrializado. Deste modo, esta iniciativa marca de forma revolucionária a ciência, tecnologia e inovação como diferencial competitivo para a sociedade industrialmente avançada. No Brasil, especificamente, eles surgiram nos anos 1980, através da iniciativa do então presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Lynaldo Cavalcanti de Albuquerque. Foi criado através do Programa de Implantação de Parques de Tecnologia. Os primeiros projetos foram implantados em Campina Grande-PB, Joinvile-SC, Manaus-AM, Petrópoles-RJ, Santa Maria–RS e São Carlos-SP. As experiências geraram mudanças nas concepções das lideranças acadêmicas e científicas no país, que passaram a potencializar a interface universidades, centros de pesquisa e os segmentos da indústria. Nesta fase inicial, foram estabelecidas diversas políticas de fortalecimento da inovação tecnológica nos níveis local, regional e nacional, com ênfase na relação entre empresas e universidades, estimulando a implantação dos Parques Científicos e Tecnológicos (PCT). Essa institucionalização de políticas públicas de incentivo a criação e expansão de PCT em escala internacional (Estados Unidos, Europa, Ásia e América Latina) resulta em várias experimentações e adaptações que ampliam e modificam o conceito de PCT com relação ao seu sentido original. Assim, constata-se a inexistência de um único conceito, um modelo padrão que possa ser aplicado a todas as iniciativas, gerando, inclusive, dificuldade em estabelecer indicadores de desempenho para avaliar tais experiências. Apesar das dificuldades conceituais, segundo a International Association of Science Parks – lASP (2014), um Parque Científico e Tecnológico pode ser definido como uma estrutura organizacional que tem como objetivo principal incrementar a riqueza da comunidade onde estão inseridos, promovendo a inovação e competitividade das empresas. Além disso, gere e estimula o fluxo de conhecimento e tecnologia entre universidades, instituições de pesquisa, 17 empresas e mercado, promovendo a criação de empresas inovadoras, através dos mecanismos de incubação de empresas e spin-off 4. Já para a Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores – ANPROTEC (2013), os PCTs constituem um complexo produtivo industrial e de serviços de base científico-tecnológica. Desta forma, eles atuam como indutores da cultura da inovação, da competitividade e da capacitação empresarial e têm como fundamento a transferência de conhecimento e tecnologia, com o objetivo de possibilitar o aumento da produção de riqueza de uma determinada região. Sendo assim, as abordagens de PCT não são consensuais, porém, apresentam características convergentes, tais como, reforço da infraestrutura local e o enriquecimento do capital social e institucional, dando maior visibilidade, atratividade e trabalho em rede para fomentar a aplicação de estratégias mais amplas no campo da pesquisa e do desenvolvimento e do conhecimento (GIUGLIANI; SELIG; SANTOS, 2012). Além disso, os distintos modelos de PCTs estão enraizados no conceito da Triple Helix (hélice tríplice). “Em qualquer análise que se possa tecer sobre os distintos modelos de PCTs existentes hoje, é possível detectar a presença do trinômio das hélices definidas por Etzkowitz e Leydersdorff 5 – governo, universidade e indústria” (MIRANDA; BEVILACQUA, 2011, p. 83). A Triple Helix é um modelo alternativo para explicar o atual sistema de pesquisa no contexto social, no qual a universidade pode exercer um importante papel na inovação. É visto como um modelo analítico que agrega uma variedade de arranjos institucionais e modelos políticos para explicar suas dinâmicas. Desta forma, a relação Governo-Universidade-Indústria é comparada com modelos alternativos para explicar o atual sistema de investigação em seus 4 As spin-offs, de forma geral, podem ser entendidas como empresas juridicamente constituídas que tiveram como principal fator de criação o aproveitamento de uma oportunidade de negócios gerada pelos resultados finais ou parciais de uma pesquisa acadêmica, ou seja, criação de empresas baseadas em tecnologias desenvolvidas no interior das universidades. Cf. AZEVEDO, Gustavo Carrer I. Spin-Offs Acadêmicas e a Inovação: Estudos de caso da USP e UFSCar. Curitiba, 2011. 5 ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The dynamics of innovation: from National Systems and "Mode 2" to a Triple Helix of university-industry-government relations. Research Policy, v. 29, Issue 2, p.109-123, 2000. 18 contextos sociais. Comunicações e negociações entre parceiros institucionais podem gerar um sobreposição que reorganiza cada vez mais os arranjos de base. O conjunto institucional pode ser considerado como mecanismo de execução de políticas públicas que visam o desenvolvimento tecnológico. Este conceito evidencia que os arranjos institucionais entre universidades, empresas e governo desempenham um papel fundamental para inovação e, consequente, para o desenvolvimento econômico e tecnológico em níveis nacional, regional e local, baseados no conhecimento. Segundo Etzkowitz e Leydersdorff (2000), diferentes resoluções possíveis das relações entre as esferas institucionais da universidade, indústria e governo podem ajudar a gerar estratégias alternativas para o crescimento econômico e transformação social. Giugliani (2012) ratifica que as organizações PCTs visam fomentar o desenvolvimento econômico e tecnológico, baseados no conhecimento e inovação, a partir sinergia governo-universidade-indústria. Há, neste sentido, a necessidade de parceria entre o setor governamental, o setor privado (onde ocorre a transformação do conhecimento em riqueza) e a academia (com o objetivo de formar recursos humanos e gerar conhecimento) para formulação de políticas de inovação bem-sucedidas. A partir dos enfoques elucidados, parte-se da premissa de que o Parque Científico e Tecnológico se constitui em uma matriz de projetos no território, a partir de instâncias e dinâmicas em que se combinam articulação interinstitucional e participação social, a partir de uma lógica sistêmica de construção social que tem alavancado o desenvolvimento local sustentável. 3. Metodologia Este trabalho é ressultante da revisão de literatura sobre Parques Científicos e Tecnológicos e análise documental de relatórios elaborados pela Fundação Parque Tecnológico da Paraíba e Incubadora Tecnológica de Campina Grande. 19 A pesquisa bibliográfica teve a finalidade de explicitar os pressupostos teóricos, conceitos e ideias que norteiam à temática. Ou seja, a construção da fundamentação teórica. Neste sentido, foram utilizados livros, teses, artigos, revistas e outros documentos para construção de uma base de dados. Além disso, esta metodologia possibilitou identificar, descrever e entender a organização e as principais características dos Parques Científicos e Tecnológicos. A pesquisa documental foi realizada através da análise de relatórios, projetos, convênios, contratos e acordos de cooperação arquivados na Fundação Parque Tecnológico da Paraíba – PaqTcPB ou publicados em eletrônicos. Este procedimento possibilitou identificar as parcerias meios e as empresas criadas em torno deste arranjo e verificar os resultados destas iniciativas. Assim, as discussões apresentadas neste trabalho têm origem no arcabouço teórico sobre Parques Científicos e Tecnológicos, aliado à pesquisa documental realizada no PaqTcPB e na ITCG. 4. Análise dos Resultados 4.1 O Parque Tecnológico da Paraíba O Parque Tecnológico da Paraíba – PaqTcPB foi criado em 21 de dezembro de 1984, um dos quatro primeiros parques tecnológicos do país. Atua como promotor do empreendedorismo inovador no Estado da Paraíba, apoiando a criação e crescimento de empresas de base tecnológica e de empreendimentos sociais, através da apropriação dos conhecimentos e tecnologias geradas nas Instituições de P&D e da inserção de produtos, serviços e processos no mercado, inclusive no exterior, contribuindo para o desenvolvimento do país (PaqTcPB, 2013). A sua implantação, na cidade de Campina Grande, teve como influência significativa a existência das duas universidades públicas, uma federal e uma 20 estadual. É possível perceber que o Parque Tecnológico incentiva e apoia a criação de empresas de base tecnológica e tecnológica na região, configurando-se assim à difusão de informação como uma das principais instituições articuladoras do desenvolvimento tecnológico local, através da aproximação entre a universidade e a empresa. Nesta perspectiva, cabe destacar o papel da Incubadora Tecnológica de Campina Grande – ITCG, criada em 1986, que constitui uma das unidades de negócios do PaqTcPB. Ela apoia empreendimentos inovadores nascentes com ênfase na geração e consolidação dos mesmos, bem como, na sua capacitação e inserção no mercado. Assim, a ITCG faz parte do Programa de Incubação de Empresas do Parque Tecnológico, que tem como missão ações para o desenvolvimento de novos empreendimentos nascentes inovadores através de suporte técnico e gerencial no âmbito empresarial, amadurecimento buscando dessas o empresas crescimento como forma sustentável de e o promover o empreendedorismo inovador local e territorial. 4.2 As empresas incubadas Segundo dados apresentados pelo PaqTcPB, atualmente, são 18 empresas residentes incubadas, 19 empresas incubadas virtualmente, 82 empresas associadas e 98 empresas beneficiadas pelo PRIME6. Além disso, com a ideia de apoiar outras incubadoras localizadas em outros municípios do Estado, foi criada a REPARI, a Rede Paraíba de Parques e Incubadoras que apoia outras seis incubadoras em operação, garantindo o compartilhamento de conhecimentos e de ações para desenvolvimento de novos produtos e acesso ao mercado. 6 O PRIME (Primeira Empresa Inovadora) é um programa da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP) que entrou em operação no inicio de 2009. Seu objetivo é criar condições financeiras favoráveis para que um conjunto significativo de empresas nascentes de alto valor agregado possa consolidar com sucesso a fase inicial de desenvolvimento dos seus empreendimentos (FINEP, 2014) 21 A análise dos dados apresentados pela Incubadora Tecnológica de Campina Grande demonstra que, desde 1986 até 2014, foram incubadas 93 empreendimentos, dentre eles, empresas de tecnologias da informação e comunicação, eletroeletrônica, biotecnologia, petróleo e gás natural, biocombustíveis, agroindústria, tecnologias ambientais e design. A pesquisa mostra que das empresas incubadas até hoje, residentes e virtualmente, aproximadamente 48% encontram-se ativas, conforme gráfico 1, a seguir. Gráfico 1: Empresas do Programa de Incubação. 31% 14% 48% ATIVAS INATIVAS 7% FECHADAS NÃO ENCONTRADAS FONTE: PaqTcPB, 2013. Elaborado pelas autoras. Face ao exposto, observa-se que do número de empresas incubadas e graduadas ao longo de aproximadamente três décadas de atividade da Incubadora Tecnológica de Campina Grande-PB menos da metade continuam funcionando. E que um elevado percentual delas, em torno de 31%, é considerado como “não encontradas”, porque perderam o relacionamento com a instituição. 4.3 As parcerias institucionais: contratos, convênios e acordos de cooperação. 22 A pesquisa dos contratos, convênio e acordos de cooperação firmados entre 2011-2013, possibilitou a identificação dos principais parceiros/atores (universidades, institutos de pesquisa, empresas, agentes financeiros, governo e agências de desenvolvimento) envolvidos nos arranjos institucionais do PaqTcPB. Com base nesta análise, o gráfico 2, a seguir, apresenta a evolução dos números de convênios, contratos e acordos estabelecidos entre o PaqTcPB e as instituições públicas e privadas parceiras. Gráfico 2: Parcerias Públicas e Privadas. 60 50 Instituições Públicas (Universidades, Institutos de Pesquisa, Agentes Financeiros, Governo e Agência de Desenvolvimento) 40 30 20 Instituições Privadas (Empresas) 10 0 1 2011 2 2012 3 2013 FONTE: PaqTcPB, 2013. Elaborado pelas autoras. É possível perceber que neste arranjo institucional a presença e os investimentos públicos são expressivos em relação aos privados. Em 2013, este cenário tendeu a ficar mais equilibrado, devido a estabelecimento de convênios com grandes empresas de eletroeletrônicos e produtos de informática, inclusive multinacionais. Além disso, evidencia-se a presença da Universidade Federal de Campina Grande como a instituição parceira de maior atuação na hibridização interorganizacional do Parque Tecnológico da Paraíba. Em números, ela 23 aparece como executora ou co-executora de aproximadamente 55% dos projetos desenvolvidos, no período de 2011-2013. 5. Considerações Notadamente, os Parques Científicos e Tecnológicos, no contexto dos arranjos institucionais, possuem a capacidade de acelerar o crescimento econômico e o desenvolvimento local/territorial, através da criação de tecnologia e inovação. Desta forma, com a articulação e ação conjunta com os centros de pesquisa, universidades e empresas, eles potencializam a criação de recursos humanos de alto nível, favorecendo a maximização da criatividade e atividades inovativas e, com isso, elevam a competitividade local e territorial. Nesta perspectiva, é possível observar que o PaqTcPB tornou-se uma peça fundamental no fomento à Ciência e Tecnologia no Estado e para a criação de empresas inovadoras. Além disso, apoiado nas sinergias das relações entre o Governo, a Universidade e Empresa, tornou-se uma alternativa viável para promoção do desenvolvimento científico e tecnológico local e territorial. No entanto, seria necessário um estudo mais profundo que tivesse como foco a geração de empregos, o estabelecimento de novas empresas, interação entre as universidades e as empresas localizadas no parque e o favorecimento da difusão de tecnologias inovadoras. Assim, com mais indicadores de desempenho seria possível avaliar melhor os impactos do empreendimento PaqTcPB no desenvolvimento das localidades e regiões onde se insere. Referências ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE ENTIDADES PROMOTORAS DE EMPREENDIMENTOS INOVADORES (ANPROTEC) - http://anprotec.org.br/site/pt/aanprotec/. Acesso em: 10 de outubro de 2013. AZEVEDO, Gustavo Carrer I. Spin-Offs Acadêmicas e a Inovação: Estudos de caso da USP e UFSCar. Curitiba, 2011. Disponível em 24 http://coletanea.sebraesp.com.br/index.php/sebraesp/article/view/16/110. Acesso em: 15 de fevereiro de 2014. ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. 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A ideia de que o avanço da ciência e tecnologia é um meio para superar o subdesenvolvimento e alcançar o progresso encontrase presente na política adotada nos cinco documentos analisados. Palavras-chave: Pós-Graduação; Desenvolvimento; PNPG. Introdução O Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG) faz parte da política científica e tecnológica brasileira e, segundo a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), é o documento que sintetiza as diretrizes que norteiam as políticas públicas em nível de mestrado e doutorado. Sua principal finalidade é fazer um diagnóstico dessa modalidade de ensino e pesquisa. Com base nas informações levantadas, são propostas diretrizes e metas que guiarão o sistema de pós-graduação por um período determinado. 1 Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional – II SEDRES, Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014. 2 Doutor em Geociências pela UNICAMP. Professor e pesquisador da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) vinculado aos Programas de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional e Ensino de Ciências e Matemática. Diretor da Editora da Universidade Estadual da Paraíba (EDUEPB). E-mail: [email protected]. 3 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional (UEPB). MBA em Marketing e Comunicação com o Mercado. Graduada em Comunicação Social (UEPB). Bolsista CAPES. E-mail: [email protected]. 26 O objetivo central deste artigo é mostrar como se apresenta a relação entre desenvolvimento e pós-graduação, assim como explicitar as estratégias de desenvolvimento sugeridas através da implantação do PNPG. A história da pós-graduação no Brasil tem origem nos anos 30 com a criação das primeiras universidades, conforme destaca Balbachevsky (2005), no entanto, foi apenas em 1965 que o Ministério da Educação regulamentou os primeiros cursos. A partir de 1948, com a criação da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a política científica e tecnológica do país se torna mais sistemática. Nesse momento, como afirmam Moser e Theis (2010), a ciência era vista como meio para superar o subdesenvolvimento e alcançar o progresso. As políticas implantadas a partir da década de 1950 têm base nesse pressuposto. Um elemento que teve bastante influencia na propagação dessa ideia foi o relatório “Science The Endless Frontier”, produzido em 1945 por Vannevar Bush, então diretor do Escritório de Pesquisa Científica e Desenvolvimento dos Estados Unidos. Bush (1945) defende que o avanço da ciência permitiria padrões de vida mais elevados, aumento do número de empregos, levaria à prevenção ou cura de doenças, assim como também à preservação dos recursos naturais. Esses seriam alguns dos benefícios apontados no documento, contudo, para atingi-los seria preciso um fluxo contínuo e substancial de novos conhecimentos. Essa visão foi bastante propagada na época, servindo como base para as políticas de ciência e tecnologia (C&T) adotadas por gestores em diversos países. Segundo Dias (2010), o relatório continha alguns dos aspectos que viriam a compor a visão tradicional acerca da relação entre ciência, tecnologia e desenvolvimento nas décadas posteriores. Em particular, a noção de que não poderia haver progresso sem o avanço científico e tecnológico (DIAS, 2010, p. 72). A relação existente entre pós-graduação e desenvolvimento não é facilmente percebida de forma direta. Porém uma maneira de observá-la é, 27 tomando por base a visão citada por Dias (2010), enxergando a pós-graduação como uma extensão da ciência. O desenvolvimento e sua relação com o progresso da C&T Tomando por base a visão tradicional, o desenvolvimento pode ser compreendido como sinônimo de crescimento econômico, admitindo-se, dessa forma, a ideia de que a industrialização, o avanço tecnológico e a modernização seriam capazes de elevar o padrão de vida da sociedade. No entanto, essa abordagem passou a ser revista a partir da década de 1990, quando o debate centrou-se no desenvolvimento humano. Nesta conjuntura, aspectos qualitativos ganharam espaço em detrimento dos quantitativos. Como mostra Veiga (2008), a visão tradicional passou a ser contestada depois que o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) lançou o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), levando em conta fatores não econômicos. Amartya Sen (2000) defende que desenvolvimento é a expansão das liberdades substantivas. O autor admite que o crescimento pode contribuir para expandir a liberdade humana, mas depende de outras influências, como oportunidades econômicas, liberdades políticas, poderes sociais, boa saúde, educação básica, participação nas decisões públicas, entre outras. De maneira análoga, Sachs (1995) propõe formular uma teoria integrada de desenvolvimento visto como “processo social e cujo centro seja o homem e todos os homens” (p. 39). Para reavaliar a temática, o autor propõe que o economicismo4 seja superado; entendendo que o desenvolvimento deve ter uma finalidade social. Assim, defende-se que o desenvolvimento deve ser encarado a partir de uma concepção ampla e plural, deixando de lado a ideia de progresso e adotando-se uma postura mais humana, na qual as decisões sejam centradas nas pessoas, ao invés de focar na geração de riquezas. 4 “O economicismo se traduz pela aceitação explícita ou implícita da teoria da percolação (trickle down theory), segundo a qual é a economia que está no comando” (SACHS, 1995). 28 No entendimento de Veiga (2008), o crescimento toma rumos heterogêneos na estrutura social, podendo contribuir tanto de forma positiva quanto negativa. O desenvolvimento depende da maneira como os recursos gerados pelo crescimento econômico são utilizados – se para fabricar armas ou para produzir alimentos, se para construir palácios ou para disponibilizar água potável (VEIGA, 2006, p. 85). Antes de buscar relacionar diretamente ciência com desenvolvimento, faz-se necessário abordar de forma suscinta o primeiro tema. A ciência, como um fenômeno cultural, tem impactado fortemente nossa vida cotidiana. Esta afirmação de French (2007) ilustra de forma significativa o lugar que essa forma de conhecimento tem ocupado em todos os tipos de atividade humana. Conforme o autor coloca, além dos benefícios práticos – como a cura de doenças através do desenvolvimento da teoria genética ou do uso de célulastronco, por exemplo – existe o modo profundo como a ciência e seus produtos formou e mudou a visão vigente de mundo, sendo percebida em grande medida através de dois extremos: como verdade absoluta ou como vilã. Seguindo o segundo viés, o sociólogo Simon Schwartzman (1997) aborda a “demonização da ciência”, não somente pelo seu poder de destruição através das bombas atômicas e das armas químicas, mas também responsabiliza a ciência e a tecnologia moderna por “destruir o meio ambiente, gerar desemprego, danificar a saúde e controlar a sociedade através de seus computadores, burocracias e instituições educacionais”. Para Sachs (1995), “o nosso domínio da ciência e tecnologia continua bastante imperfeito”. Ele afirma que o progresso científico e técnico não cumpriu as promessas de um bem-estar generalizado para o conjunto da humanidade, defendendo que nosso poder tecnológico seria suficiente para oferecer aos homens um conforto material razoável, mas o que observamos é o acirramento das desigualdades. Esse panorama caracteriza o cerne da noção de “maldesenvolvimento” ou “desenvolvimento desequilibrado”, caracterizado quando o processo de 29 desenvolvimento não permite progressos nos campos econômico, social e ecológico ao mesmo tempo, que para Sachs (1995) seria o ideal. Uma das maneiras de perceber a materialização dessas assimetrias no que se refere as atividades de C&T é através da sua distribuição desigual, que segundo Moser e Theis (2010) revelam uma tendência de acompanhar a acumulação do capital, fazendo a propagação da base técnica do centro e reforçando sua capacitação técnico-científica. Os autores chamam atenção para o fato de que o modelo de desenvolvimento dos países subdesenvolvidos foi implementado com base no modelo dos países desenvolvidos, considerando o papel da tecnologia a partir do conceito de desenvolvimento na evolução destes últimos. Deste modo, como enfatizam Moser e Theis (2010), a tecnologia seria desenvolvida em um processo independente dos desejos humanos e dos fatores externos resultando em um processo fechado e neutro. Em decorrência dessa forma de pensar a tecnologia os para os países sistemas de P&D5 criados subdesenvolvidos foram baseados nesses critérios para promover a industrialização. Os objetivos explícitos desses planos eram, em primeiro lugar, interagir com o sistema produtivo – principalmente industrial – para satisfazer as demandas do mercado internacional e, em segundo lugar, gerar inovações para competir nesse mercado internacional (MOSER e THEIS, 2010). De acordo com Sachs (1995) uma forma de colocar a C&T a serviço do desenvolvimento social é não sujeitar a pesquisa nos países do Sul aos modos dominantes nos laboratórios do Norte e não aguardar passivamente a transferência das tecnologias idealizadas sob outras latitudes e em outros contextos [...] O fortalecimento da capacidade local em matéria de ciência, tecnologia e formação de executivos altamente qualificados constitui ponto fundamental das estratégias de desenvolvimento baseadas na aptidão de elementos nativos para pensarem de maneira autonôma e por em execução os projetos nacionais (SACHS, 1995, p. 52). 5 Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). 30 Diante do exposto, a chave para alcançar o caminho no qual a ciência possa servir ao desenvolvimento é apostar em um modelo que valorize a competência local, considerando o homem e sua própria cultura, minimizando a importância exclusiva dos aspectos econômicos. A visão de desenvolvimento contida no PNPG Os trabalhos para a elaboração do 1⁰ Plano Nacional de PósGraduação (PNPG) tiveram início em 1973, durante a gestão do presidente Ernesto Geisel, quando por iniciativa da Secretaria-Geral do Ministério da Educação e Cultura foi criado o Conselho Nacional de Pós-Graduação, instituído através do Decreto n. 73.411/1974. O documento é a expressão dos trabalhos iniciais do conselho, que foi constituído para propor as medidas introdutórias que definiriam a política de pós-graduação do país. O I PNPG foi elaborado para guiar as decisões entre 1975 e 1979. Do ponto de vista estratégico e operacional, este plano foi integrado com as políticas estabelecidas no II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND 1975-1979) e no Plano Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PBDCT). Seu objetivo era fazer “evoluir o sistema universitário brasileiro para uma nova etapa, na qual as atividades de pós-graduação tinham uma importância estratégica crescente”. Dadas as limitações de extensão deste artigo, somente alguns aspectos que se relacionam diretamente com a ideia de desenvolvimento serão tratados. Um aspecto fruto de atenção no I PNPG diz respeito aos problemas sociais e técnicos do país, onde coexistiam (e ainda hoje coexistem) vários estágios de desenvolvimento. O que poderia ser suprido, segundo a avaliação da época, com a importação de conhecimentos e serviços, ao mesmo tempo em que haveria um estímulo da produção científica própria e regular. Como metas do primeiro plano destacam-se duas: (1) utilizar os meios e instrumentos de ensino e pesquisa, para transformação efetiva das condições materiais e culturais da sociedade, no sentido de seu crescimento social e 31 econômico, (2) formar, treinar e qualificar os recursos humanos de nível superior em volume e diversificação adequados para o sistema produtivo nacional e para o próprio sistema educacional (I PNPG, 1974). A distribuição regional também era alvo dessa política, existia a intenção de procurar manter uma relação de proporcionalidade em cada região geoeducacional com objetivo de evitar o acirramento das disparidades regionais, o que até hoje não foi conseguido, como podemos observar na tabela 1 (abaixo), na qual ainda se observa uma excessiva concentração de cursos no Sudeste. Tabela 1: Cursos reconhecidos pela CAPES Fonte: CAPES, 2014. Desde 1975 foram elaborados 5 PNPGs, a princípio, os 4 primeiros tinham duração de cinco anos, o que muda no último que ganha o dobro de tempo, entre 2011 e 2020. Foi durante o governo do presidente João Figueiredo, em 1982, que o II PNPG foi publicado. Novamente, as diretrizes deste documento harmonizam-se com as orientações do III PND (1980/85) e do III PBDCT. Duas grandes conquistas dos 2 primeiros planos foram o aumento da absorção de pessoal em regime de tempo integral e dedicação exclusiva nas instituições federais de ensino superior e a implantação do Programa Institucional de Capacitação de Docentes. Outro avanço relevante foi a 32 implantação e a consolidação do Sistema de Acompanhamento e Avaliação da Pós-Graduação, sob a responsabilidade da CAPES. O PNPG 1982-1985 aborda de forma mais direta a utilização do conhecimento como forma de interagir com o setor produtivo, o que já é um indício do que posterioremente seria chamado de modelo da tríplice hélice – caracterizado pela parceria entre Universidade, Estado e empresas. No trecho a seguir essa ideia fica clara. Especificamente, as funções da pós-graduação se dividem entre a formação de docentes pesquisadores para a esfera acadêmica; a capacitação e o treinamento de pesquisadores e profissionais destinados a aumentar o potencial interno de geração, difusão e utilização de conhecimentos científicos no processo produtivo de bens e serviços e a formação de recursos humanos para o desenvolvimento cultural do País (II PNPG, 1982). Outra passagem que merece destaque no 2 ⁰documento, diz respeito à natureza do conhecimento a ser produzido e reproduzido. A recomendação é que o estágio de desenvolvimento sócio-econômico que o país requer, oriente o perfil da demanda em termos de mercado de trabalho e capacitação. A institucionalização da pós-graduação, objetivo comum dos primeiros planos, continuou presente no III PNPG, uma vez que apesar do progresso alcançado, ainda não havia sido concluída. Além disso, a ampliação das atividades de pesquisa – elemento indissociável da pós-graduação – configurou como meta importante dessa política. O III plano foi publicado durante o mandato do presidente José Sarney e do Ministro da Educação, Jorge Bornhausen, em 1986. Apesar dos indícios presentes nos planos anteriores, o PNPG 19861989 é o primeiro documento a abordar pontualmente o papel da produção e criação do conhecimento gerado na pós-graduação no processo de desenvolvimento nacional. O III PNPG apresenta três objetivos gerais, nos quais destaca-se o terceiro: “integração da pós-graduação no sistema de Ciência e Tecnologia, inclusive com o setor produtivo” (III PNPG, 1986). 33 Entre as diretrizes gerais, se estabelece que o estímulo e apoio as atividades de investigação científica e tecnológica são parte essencial do Sistema de C&T, que garante a pesquisa básica como suporte para o desenvolvimento tecnológico, destaca-se ainda a importância de consolidar a pós-graduação, garantindo sua qualidade, “para assegurar sua função como instrumento de desenvolvimento científico, tecnológico, social, econômico e cultural”. Como estratégia sugerida no tocante a essa temática, a proposta foi envolver os órgãos de desenvolvimento regional nos programas de desenvolvimento científico e de formação de recursos humanos, buscando articular a academia com o planejamento estatal. Este plano expressava uma tendência vigente àquela época: a conquista da autonomia nacional. O IV PNPG começou a ser elaborado em 1996, quando foi formulada uma pauta para sua realização, mas apesar das diversas redações preliminares, nenhuma chegou a se constituir como documento público. Somente publicado em 2004, já no governo Lula, o IV PNPG “incorpora o princípio de que o sistema educacional é fator estratégico no processo de desenvolvimento sócio-econômico e cultural da sociedade brasileira”. Assim, caberia à pós-graduação produzir profissionais aptos para contribuir com o processo de modernização do país. No balanço apresentado neste documento considerou-se que a pósgraduação é uma das mais bem sucedidas realizações do sistema de ensino do país, ressaltando-se que o seu desenvolvimento foi produto de uma deliberada política indutiva, conduzida e apoiada pelas instituições públicas com o engajamento da comunidade acadêmica. Uma novidade deste plano, é que pela primeira vez foi realizada uma consulta com interlocutores da comunidade científica e acadêmica, convidados a enviar sugestões. Para concretizar a participação desses atores, foram realizadas audiências com os Fóruns Regionais de Pós-Graduação, cobrindo as cinco regiões do país. O desenvolvimento da pesquisa e a integração com o sistema de C&T eram as ênfases principais do IV plano, desse modo, as atividades de pesquisa 34 científica, tecnológica e inovação deveriam ser responsáveis pela inserção competitiva do Brasil no mercado mundial. A ênfase em setores estratégicos também aparece, sugerindo que a política industrial fortaleça “os programas espacial e de energia, a criação de programas de exploração do mar e da biodiversidade, assim como o efetivo desenvolvimento da região amazônica como instrumento de integração nacional” (IV PNPG, 2005). Por fim, com um horizonte temporal mais vasto foi publicado o V PNPG, editado pela CAPES em 2010, no final do segundo mandato do presidente Lula. Um fato novo foi a introdução das diretrizes e políticas do ensino de pósgraduação ao Plano Nacional de Educação (PNE). A exemplo do plano anterior, também foram ouvidos diferentes segmentos da comunidade acadêmica e da própria sociedade, além de especialistas de diversas áreas do conhecimento e do ensino, que elaboraram estudos e sugestões. Podemos destacar o aparecimento do modelo da tríplice hélice que surge explicitamente no V PNPG. Dividido em dois volumes, este plano faz uma síntese geral dos anteriores e detalha minuciosamente a discussão dos problemas apontados de forma superficial nos demais. Novamente, a visão do sistema de pós-graduação como fator propulsor do desenvolvimento econômico e social está fortemente presente. Os resultados da pesquisa, ao serem aplicados, levam a tecnologias e a procedimentos, podendo ser usados no setor público e no sistema privado, e fazendo do conhecimento e da tecnologia uma poderosa ferramenta do desenvolvimento econômico e social. Neste quadro a parceria entre a Universidade, o Estado e as empresas dará lugar ao chamado modelo da tríplice hélice. Este modelo levará a colocar no centro do Plano, ou melhor, na sua base, aquilo que poderá ser chamado de Agenda Nacional de Pesquisa (V PNPG, 2011, p. 18). Em nível conceitual, a principal novidade do novo Plano é a adoção de uma visão sistêmica em seus diagnósticos, diretrizes e propostas. O combate às assimetrias é um tema importante, cuja complexidade visa uma ação 35 conjunta dos diversos órgãos envolvidos. A novidade em relação a essa proposta é o foco nas mesorregiões. Considerações finais A criação do PNPG representou um esforço no sentido de estabelecer uma política nacional voltada exclusivamente para a pós-graduação, uma vez que é neste nível que a maior parte da produção científica do país é desenvolvida. Observa-se ainda que suas propostas e diretrizes seguem a questão central das políticas de C&T adotadas no Brasil a partir da década de 1970, quando o governo buscou articular o desenvolvimento científico e tecnológico como uma estratégia mais ampla de desenvolvimento econômico e social. Fica bastante evidente que a percepção de desenvolvimento presente no PNPG volta-se para integrar as atividades da pós-graduação ao sistema empresarial, buscando a inovação e a utilização da tecnologia para ganhar competitividade no mercado internacional, valorizando a ciência pela sua força produtiva, ou seja, pelo seu valor mercadológico. Referências BALBACHESVKY, E. A pós-graduação no Brasil: novos desafios para uma política bem-sucedida. 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Foi possível observar que a fábrica aparenta possuir leve tendência a estar alinhada com as dimensões do Novo Paradigma Ambiental na condução de suas ações ambientais. Palavras–Chave: Marketing Ecológico; Dimensões; Novo Paradigma Ambiental; Fábrica de Calçados; Campina Grande-PB. 1. INTRODUÇÃO Segundo Dias (2009), com o surgimento da sociedade industrial, houve crescimento e concentração da população em áreas urbanas, que passaram a ocupar espaços em detrimento do ambiente natural, e as terras e florestas foram convertidas em mercadoria para atender à intensificação da produção e do consumo. Esse processo foi baseado na exploração do trabalho humano e no alto consumo de matérias-primas e fontes de energia não renováveis, que ao 1 longo do processo produtivo geravam resíduos poluentes que Trabalho apresentado no GT4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional – II SEDRES, Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014 2 Doutorando em PUR,DINTER/IPPUR/UFRJ-UEPB. email: [email protected] 3 Graduanda em Administração pela UEPB. email: [email protected] contaminavam o ar, o solo e as águas num volume sem procedentes. E é nesse sentido que podemos afirmar que o modelo de desenvolvimento resultante da Revolução Industrial é o responsável pela atual crise ecológica. Ademais, com a importância da temática ambiental, a gestão ambiental precisa ser administrada diariamente, com atenção especial sem comprometer os cuidados dispensados aos recursos humanos, consumo de matérias-primas e fonte de energia da organização; já que as empresas que dominam os problemas ambientais têm melhores condições de crescer e sobreviver em um ambiente de mercado competitivo. Segundo Dias (2009), o marketing nesse contexto, principalmente durante a segunda metade do século XX, foi visto como "vilão", pois seu aspecto mais visível era a indução ao maior consumo possível de mercadorias, prestando desse modo, um precioso serviço às empresas, mas que, no entanto, desconsiderava os efeitos na sociedade como um todo. O fato é que o crescimento do consumo, sem responsabilidade ambiental, intensificou a exploração predatória dos recursos naturais e gerando resíduos poluentes de todo tipo, que foram produzidos tanto no processo produtivo, como pelo descarte de produto e suas embalagens. O propósito da escolha da fábrica de calçados para o presente estudo deve-se ao fato da existência do setor de Segurança, Saúde e Meio Ambiente, que possibilitou a verificação das ações do marketing com base nas dimensões do Novo Paradigma Ambiental (NPA). Diante das preocupações ambientais, algumas questões precisam ser respondidas no tocante as ações do marketing ecológico da fábrica de calçados pesquisada, e suas interações entre homem e a natureza. Neste contexto, questiona-se: até que ponto as ações do marketing ecológico estão alinhadas com as dimensões do NPA? O presente estudo tem como objetivo verificar as ações do marketing ecológico, com base no uso das dimensões do Novo Paradigma Ambiental em uma fábrica de calçados na cidade de Campina Grande-PB. 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1 Meio Ambiente “Existem três estruturas da filosofia ambiental e conceitos relacionados representam as primeiras escolas de pensamentos quanto ao relacionamento homem-natureza. O paradigma social dominante não é uma perspectiva “ambientalista” per se, mas representa a visão tradicional de mundo da sociedade industrializada, o status quo contra o qual são comparadas outras perspectivas ambientalistas. A perspectiva do ambientalista radical representa a visão de mundo daqueles que defendem a mudança transformacional. A perspectiva do ambientalista renovado representa aqueles que ocupam a área intermediária na filosofia e na prática ambiental (CLEGG, 2007, p.365)”. Na moderna sociedade industrial, o Paradigma Social Dominante (PSD) representa uma aderência aos princípios e objetivos econômicos neoclássicos (crescimento econômico e lucro), com os fatores naturais tratados ou como externalidades ou como recursos exploráveis infinitamente. Se existem problemas ambientais observáveis, estes podem facilmente (ou eventualmente) serem resolvidos por meio do progresso científico e tecnológico (Daly e Cobb, 1994; Hawken, 1994 e Milbrath,1989 apud CLEGG, 2007, p.366). O PSD está mais intimamente associado às sociedades capitalistas ocidentais, nas quais imperam os princípios de “livre mercado” e de propriedade privada. Contudo, os sistemas econômicos fechados, informados pela filosofia marxista, também estão incluídos nessa perspectiva. O “Novo Paradigma Ambiental” (NPA) surgiu em contraste com o Paradigma Social Dominante, que é um conceito baseado em uma visão social, antropocêntrica e ortodoxa, que tem por base as condições sociais e econômicas que emergiram da revolução industrial. O NPA representa uma visão ecológica das relações do ser humano com seu entorno, que constitui um sistema de crenças que pode predispor ou manter determinadas crenças, atitudes e condutas a respeito de temas específicos do meio ambiente (DIAS, 2009, p. 105). De acordo com Milbrath (1986, p. 100 apud Dias, 2009, p.105), diante de um grupo de crenças próprias do “Paradigma Social Dominante”, surge um conjunto alternativo de crenças representando pelo o “Novo Paradigma Ambiental”, como uma nova forma de conceber a organização da realidade que paulatinamente pode ser incorporada no sistema social, mostrados no Quadro 2.1. Novo Paradigma Ambiental Alta valorização da natureza a. A natureza por si mesma – amor pela natureza. b. Relações totais entre os humanos e a natureza. c. Proteção ambiental acima do desenvolvimento econômico. Paradigma Social Dominante Baixa valorização da natureza a. Natureza para produzir bens. b. Dominação humana da natureza. c. Crescimento econômico acima da proteção ambiental. Compaixão generalizada para com a. Outras espécies. b. Outros povos. c. Outras gerações. Plano e atuação cuidadosa para evitar riscos a. Ciência e tecnologia nem sempre são boas. b. Deter o desenvolvimento do poder nuclear. c. Desenvolvimento e utilização de tecnologia branda. d. Regulação governamental para proteger a natureza. Compaixão somente pelos mais próximos a. Exploração de outras espécies para atender às necessidades humanas. b. Desinteresse por outros povos. c. Interesse somente por esta geração. Aceitar riscos para maximizar o bem-estar a. Ciência e Tecnologia são benefícios para a humanidade. b. Desenvolvimento rápido do poder nuclear. c. Impulsionar tecnologia dura. d. Desvalorização da regulação governamental de proteção da natureza. Limites ao crescimento a. Escassez de recursos. b. Explosão demográfica. c. Conservação. Nenhum limite ao crescimento a. Não-escassez de recursos. b. Nenhum problema de população. c. Produção e consumo. Necessidade de sociedade completamente nova a. Os humanos prejudicam seriamente a natureza e a si mesmos. b. Abertura e participação. c. Ênfase nos bens públicos. d. Cooperação. e. Pós-materialismo. f. Estilos simples de vida. g. Ênfase na satisfação no trabalho. Sociedade atual correta a. Os humanos não prejudicam seriamente a natureza. b. Hierarquia e eficácia. c. Ênfase no mercado. d. Competição. e. Materialismo. f. Estilos completos e estáveis de vida. g. Ênfase no trabalho para atender necessidades econômicas. Nova política a. Consultiva e participativa. b. Partidária de discutir sobre relação de ser humano com a natureza. c. Desejo de usar a ação direta. d. Realizar a previsão e o planejamento. Velha política a. Determinada por especialistas. b. Partidária de discutir sobre a gestão da economia. c. Oposição à ação direta. d. Realizar o controle pelo mercado. Fonte: Milbrath (1986, p.100) apud González (2002). Quadro 2.1: Contraste entre os paradigmas. 2.2 O Conceito do marketing Ecológico “Na óptica do comportamento do consumidor, os anos 60 podem ser descritos como a época do despertar da consciência ecológica, os anos 70 como o início da ação e os anos 80 como um período de responsabilidade, marcado pelo aumento dramático da consciência ecológica no mundo. A década de 90 impõe-se como a era do poder do mercado. (MAKOWER, 1993, apud AFONSO, 2010)”. O marketing ecológico (ou ambiental ou verde ou ecomarketing ou marketing sustentável) é de interesse não só de entidades ambientalistas; algumas com atuação em âmbito mundial ao defender do equilíbrio ecológico ao social, mas também de empresas que começam apoiar e desenvolver atividades que procuram ou eliminar causas de degradação social e ecológica e, como isso, melhorar a qualidade de vida das pessoas. É evidente que a preocupação das empresas não é apenas em relação ao planeta e com a sociedade, mas predominantemente com a imagem da organização (Zenone, 2006, p. 159). Então, o termo marketing ecológico não se refere apenas às questões ecológicas, mas devem-se incluir as questões comunitárias, políticas, culturais, religiosas, entre outras (ZENONE, 2006, p. 160). Para Polonsky (1994 apud DIAS, 2009, p. 74), o marketing ecológico “consiste de todas as atividades designadas para gerar e facilitar qualquer troca com o objetivo de satisfazer os desejos ou necessidades humanas, desde que a satisfação dessas necessidades e desejos ocorra, com um mínimo de impacto prejudicial sobre o meio ambiente”.O conceito tradicional do marketing, baseado no Paradigma Social Dominante, não contempla ações que evitam o declínio ambiental, isso exige novos enfoques do marketing por parte dos profissionais da área (Kilbourne, 2008). Portanto, o próprio conceito do marketing verde (ou green marketing) tem suas limitações para alcançar uma verdadeira cidadania ecológica. 2.3 O Conceito de Cidadania Ecológica É reconhecido que o conceito de cidadania mudou e ainda está mudando. Por essa razão, existem inúmeras e conflitantes interpretações na noção de cidadania, embora seja frequentemente entendida em termos de um conjunto de direitos e obrigações (Janoski, 1998). Em muitos países, por exemplo, existem alguns direitos políticos fundamentais e obrigações normalmente associados à cidadania - voto, deliberação ou a participação no processo político, bem como o acesso ou o direito à prestação de informações. Então, como melhorar a cidadania e as práticas políticas previstas no núcleo político de direitos e obrigações? Assim, o conceito de cidadania varia e vem mudando historicamente, colocando desafios para a sociedade contemporânea. Os diversos entendimentos do termo cidadania exigem uma ampla gama de debates e discussões filosóficas, sociológicas e da teoria política. Numa visão estreita, cidadania consiste de um compacto de direitos legais, proteções e deveres entre o governo e os membros individuais da sociedade. Em um sentido amplo, a cidadania representa um quadro universal de direitos - civis, sociais e políticos. Segundo Janoski (1998), a cidadania ativa e passiva inclui direitos e obrigações. Em suma, não existe nenhuma definição universal de cidadania, considerada como um conceito com várias definições. A cidadania é "um conceito peculiar e escorregadio com uma longa história” (RILEY, 1992, p.180). Ao lidar com o conceito de cidadania vale à pena mencionar as duas tradições diferentes no debate atual sobre cidadania: a tradição liberal e a tradição republicana. A tradição liberal caracteriza a política como um "mercado" de natureza privada, alegando que os cidadãos agem com base em interesses (HOLFORD e EDIRISINGHA, 2000, p.7). Cidadania corporativa e do consumidor são baseadas na tradição liberal que considera a transferência do conceito de cidadão para os agentes do mercado. Por outro lado, a tradição republicana (ou comunitária) considera a política pública de natureza não “mercadológica”. "Atores políticos não são concebidas como consumidores, mas como participantes na discussão pública. A política é entendida a sendo uma atividade aberta e pública, distinta das escolhas isoladas e privadas de partes interessadas” (WIKLUND, 2005, p. 704). A cidadania ecológica, também conhecida como cidadania ambiental, emergiu no debate acadêmico, promovendo valores ecológicos. Assim, a cidadania ecológica tenta explorar os limites das existentes formas de cidadania, na tentativa de unir ecologia com a justiça social. Neste sentido, ser cidadão significa respeitar e cuidar do ambiente em que vivemos. No mundo moderno, a poluição do ar, da água, a devastação das florestas, a extinção de espécies animais e vegetais são problemas cada vez mais sérios. 3. MÉTODO DE PESQUISA A realização do estudo envolveu pesquisa descritiva de caráter exploratório. O sujeito da pesquisa foi o técnico do setor de Segurança, Saúde e Meio Ambiente de uma fábrica de calçados na cidade de Campina Grande – PB. Os dados coletados foram informatizados em um banco de dados eletrônicos compatível com software Microsoft Excel 2010. Foi realizada análise quantitativa, utilizando-se análise de freqüência absoluta, percentuais com múltiplas respostas e de escolha (MATTAR, 2011). Para a pesquisa de campo, realizada no período de maio de 2013, foi utilizado um questionário semi-estruturado, composto de dezessete questões, com perguntas fechadas, baseadas e agrupadas nas seis dimensões do Novo Paradigma Ambiental: alta valorização da natureza, compaixão generalizada, plano e atuação cuidadosa para evitar riscos, limites ao crescimento, necessidade de sociedade completamente nova e nova política, de modo a levantar informações quantitativas, utilizando-se a escala de Likert (“concordo”, “discordo” e “neutro”) (MATTAR, 2011, p. 111). As questões elaboradas, divididas em suas respectivas dimensões, juntamente com suas justificativas metodológicas estão descritas no Quadro 3.1, abaixo. Dimensão 1 - Alta valorização da natureza Questão Importância metodológica Q01. A fábrica adota alguma política de proteção Através desta variável, procurou-se identificar se é ambiental? adotada alguma política de proteção ambiental. Q02. A fábrica possui proteção ambiental acima do Com esta variável, procurou-se identificar se há desenvolvimento econômico? proteção ambiental e desenvolvimento econômico. Q03. A fábrica desenvolve o seu planejamento Com esta variável, procurou-se identificar se é econômico levando em consideração às exigências levado em consideração o seu planejamento econômicas e ecológicas do país? econômico e as exigências ecológicas do país. Dimensão 2 - Compaixão generalizada Questão Importância metodológica Q04. A fábrica possui algum trabalho voltado para Através desta variável, procurou-se identificar se há a valorização das espécies? algum trabalho voltado à valorização das espécies. Q05. A fábrica possui parcerias com alguma ONG Através desta variável, procurou-se identificar se há de proteção ambiental? parceria com alguma ONG de proteção ambiental. Dimensão 3 - Compaixão generalizada Questão Importância metodológica Q06. A fábrica investe ou desenvolve tecnologias Através desta variável, procurou-se identificar se sustentáveis no processo produtivo? são realizados investimentos tecnológicos e sustentáveis no processo produtivo. Q07. A fábrica é certificada por algum órgão de Através desta variável, procurou-se identificar se a regulamentação ambiental? fábrica possui certificado de regulamentação ambiental. Dimensão 4 - Limites ao crescimento Questão Importância metodológica Q08. A fábrica investe ou realiza pesquisas com Através desta variável, procurou-se identificar base em fontes ecológicas de matéria-prima? investimentos ou pesquisas com base em fontes ecológicas de matéria-prima. Q09. A fábrica leva em consideração o crescimento Através desta variável, procurou-se identificar se é populacional em função da produção indústria? considera o crescimento populacional em função da produção industrial. Dimensão 5 - Necessidade de sociedade completamente nova Questão Importância metodológica Q10. Há alguma preocupação ou ação que Através desta variável, procurou-se identificar a desenvolva uma sociedade de consumo existência de ações que desenvolvam uma ecologicamente consciente por parte da sua sociedade de consumo ecologicamente consciente. fábrica? Q11. A fábrica atende às exigências da cidadania Através desta variável, procurou-se identificar se é ecológica? atendida ás exigências da cidadania ecológica. Q12. Os colaboradores têm consciência sobre as Através desta variável, procurou-se identificar se os ações ecológicas praticadas pela fábrica? colaboradores têm consciência sobre as ações ecológicas praticada. Q13. A fábrica minimiza os impactos gerados pelo Através desta variável, procurou-se identificar se seu processo produtivo? são minimizados os impactos gerados pelo processo produtivo. Q14. A política da fábrica está condizente com as Através desta variável, procurou-se identificar se a diretrizes governamentais? política adotada está condizente com as diretrizes governamentais. Dimensão 6 - Nova política Questão Importância metodológica Q15. O planejamento estratégico da fábrica Através desta variável, procurou-se identificar se o contempla cidadania ecológica? planejamento estratégico contempla cidadania ecológica. Q16. A alguma política interna de discussão sobre Através desta variável, procurou-se identificar se há a relação fábrica-natureza? política interna e discussão sobre a relação fábricanatureza. Q17. Há alguma participação do fornecedor, fábrica Através desta variável, procurou-se identificar se há e consumidor no processo produtivo? participação do fornecedor, fábrica e consumidor no processo produtivo. Fonte: Pesquisa Direta, maio 2014. Quadro 3.1: Questões da pesquisa e justificativa metodológica. 4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Nesta análise, procurou-se verificar como está sendo utilizadas as ações do marketing ecológico, com base no uso das dimensões do Novo Paradigma Ambiental de uma fábrica de calçados; através das respostas do técnico do setor de Segurança, Saúde e Meio Ambiente. Conforme as dezessete questões aplicadas, observam-se as ações ambientais mais utilizadas, como mostram os resultados resumidos no Quadro 4.1 Perfil das respostas Concordo Neutro Discordo Q01 X Q02 X Q03 X Q04 X Q05 X Q06 X Q07 X Q08 X Q09 X Q10 X Q11 X Q12 X Q13 X Q14 X Q15 X Q16 X Q17 X Fonte: Pesquisa Direta, maio 2014. Quadro 4.1: Respostas das questões relativas ao Novo Paradigma Ambiental. Questão Pode-se observar no Gráfico 4.1, a percepção geral do técnico do setor se Segurança, Saúde e Meio Ambiente sobre as ações do marketing ecológico, com base no uso das dimensões do NPA. Das dezessete questões analisadas, apenas nove estão relacionadas com o que a fábrica faz para que as dimensões do Novo Paradigma (NPA) atenda suas necessidades. Estas questões foram divididas em três aspectos, no primeiro aspecto analisado – nível de concordância – as questões Q01, Q03, Q06, Q08, Q10, Q11, Q12, Q13 e Q14. No segundo aspecto analisado – nível de neutralidade – as questões Q02, Q04, Q05, Q07, Q09, Q15, Q16 e Q17, estão relacionadas com o que ela pode fazer para que as dimensões do NPA atendam as suas necessidades (oito questões). Estas questões revelam que há uma percepção clara por parte do entrevistado de que a fábrica têm diversas necessidades a serem atendidas, para que o NPA seja usado efetivamente. O terceiro aspecto – nível de discordância – não apresentou respostas que possibilitassem obtenção de resultados. Os resultados foram quantificados e agrupados nos três aspectos, e demonstrados na forma de percentual no Gráfico 4.1. Proporção das repostas 0% Concordância 47% 53% Neutralidade Discordância Fonte: Pesquisa Direta, maio 2014. Gráfico 4.1: Proporção das respostas quanto à adequação das ações do marketing ecológico, com base no uso das dimensões do Novo Paradigma Ambiental em uma fábrica de calçados na cidade de Campina Grande- PB. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS De acordo com as tendências apontadas no tocante a situação da fábrica encontrada pela pesquisa, no que diz respeito às ações do marketing ecológico com base no uso das dimensões do NPA na condução da prática ambiental, aparenta haver uma leve tendência da fábrica a estar alinhada com as dimensões do Novo Paradigma Ambiental (NPA), na condução das suas ações ambientais, representada pelo percentual de 53% de nível de concordância. Esse fato pode indicar que a fábrica tende a refletir de maneira positiva nos seus sistemas de crenças ambientais como crenças sociais, a relação entre o ser humano e a natureza, que variam desde uma preocupação antropocêntrica, até uma ecocêntrica. A postura antropocêntrica coloca o ser humano como referência central, e a visão ecocêntrica considera que todo ser vivo tem seu valor inerente. O Paradigma Social Dominante se baseia na perspectiva antropocêntrica de que o ser humano é o centro da vida e, por isso, o considera um ser único, excepcional; pelo contrário, sob os postulados do Novo Paradigma Ambiental, ou visão ecocêntrica, considera-se que os seres humanos seriam somente mais um, parte do conjunto ecológico (DIAS, 2009). A análise do segundo maior percentual foi de 47% de neutralidade, revelou que o entrevistado tem uma percepção realista das necessidades das ações do marketing ecológico, com base no uso das dimensões no Novo Paradigma Ambiental, ou seja, o alto percentual de neutralidade, em relação ao de concordância, indica que ainda pode haver ações do marketing ecológico a ser implementadas, afim de que estejam em conformidade total com o uso das dimensões do NPA. Por fim, o menor percentual – discordância, com 0% das respostas – pode indicar que a fábrica está em posição favorável para a construção de ações ecológicas com base no uso das dimensões do NPA, já que questões de discordância representariam limitações nas ações do marketing ecológico com base nas dimensões do NPA praticadas pela fábrica. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AFONSO, A. C. B. O consumidor verde: perfil e comportamento de compra. 2010. Dissertação (Mestrado em Marketing) - Instituto Superior de Economia e Gestão de Lisboa, Universidade Técnica de Lisboa, Lisboa, Portugal, 2010. CLEGG, S. R. et al. Handbook de estudos organizacionais: modelos de análise e novas questões em estudos organizacionais. 1 ed. São Paulo: Atlas, 2007. DIAS, R. Marketing ambiental: ética, responsabilidade social e competitividade nos negócios. São Paulo: Atlas, 2009. GONZÁLEZ LÓPEZ, A. La preocupación por la calidad del médio ambiente. Un modelo cognitivo sobre La conducta ecológica. 2002. Tese (Doutorado) – Departamento de Psicologia Social, Universidade Complutense de Madrid, Madrid, Espanha, 2002. HOLFORD, H.; EDIRISINGHA, P. Citizenship and governance education in Europe: a critical review of the literature. School of Educational Studies, University of Surrey, UK. November, 2000. JANOSKI, T. Citizenship and civil society. Cambridge: Cambridge University Press, 1998. KILBOURNE, W. E.; CARLSON, L. The dominant social paradigm, consumption, and environment attitudes: can macromarketing education help? Journal of Macromarketing, 28 (2): 106-121, Jun., 2008. MATTAR, F. N. Pesquisa do marketing.Edição Compacta. São Paulo: Atlas, 2011. RILEY, D. Citizenship and the Welfare State. In: Allan, J., Braham, P. Lewis, P (Eds). Political and Economic Forms of Modernity. Cambridge: Polity Press, 1992. WIKLUND, H. A Habermasian analysis of the deliberative democratic potential of ICT-enabled services in Swedish municipalkities. New Media & Society, 7 (5): 701-723, 2005. ZENONE, L C. Marketing social. São Paulo: Thomson Larning, 2006 GT4 - CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL A contribuição das políticas de Ciência & Tecnologia e Inovação na dinâmica da acumulação de capital no Brasil1 Ester Cristina Bevian GRAF2 Tatiane Thaís LASTA3 Daniel Rodrigo STRELOW 4 Resumo: O objetivo deste artigo foi problematizar a implementação das políticas de C&T e Inovação no Brasil, na tentativa de evidenciar o papel que vem exercendo no processo de acumulação de capital. Evidenciou-se que tais políticas contribuem para o desenvolvimento geográfico desigual acompanhando o processo de acumulação de capital pela concentração de investimentos nas regiões desenvolvidas. O capital privado brasileiro não inova, mas sim importa máquinas e equipamentos de países centrais. Tal prática não possibilita o desenvolvimento socioeconômico, mas sim, um maior nível de acumulação de capital e o agravamento das disparidades. Propõe-se um novo modelo de C&T e Inovação, capaz de reduzir as desigualdades. É onde surge a Tecnologia Social, uma alternativa à Tecnologia Convencional, hegemônica no Brasil. Palavras - chave: Ciência, Tecnologia e Inovação; Desenvolvimento Geográfico Desigual; Acumulação de Capital. 1 INTRODUÇÃO Tem-se observado mudanças positivas em alguns indicadores sociais no Brasil, principalmente no último decênio. Não obstante, é preciso atentar ao fato de que a 1 Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, tecnologia e desenvolvimento regional. II SEDRES, Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014. 2 Graduanda em Psicologia, Bolsista de Iniciação Científica pela FURB, membro do Núcleo de Pesquisa em Desenvolvimento Regional, e-mail: [email protected] 3 Economista, mestranda em Desenvolvimento Regional pela FURB, membro do Núcleo de Pesquisas em Desenvolvimento Regional, e-mail: [email protected]. 4 Economista, mestrando em Desenvolvimento Regional pela FURB, membro do Núcleo de Pesquisas em Desenvolvimento Regional, e-mail: [email protected]. desigualdade continua, seja nas regiões, ora ganhadoras, ora perdedoras, ou nas gritantes assimetrias entre as classes sociais. De fato, não há como analisar o desenvolvimento capitalista brasileiro sem a marca do desenvolvimento desigual, muito menos, sem perceber as idas e vindas da acumulação primitiva permanente, que assume variadas formas no decorrer da história (BRANDÃO, 2010). Historicamente, as atividades científicas e tecnológicas também cumprem uma tendência de distribuição desigual no território brasileiro, acompanhando a acumulação do capital e sua expansão. O que se pretende neste artigo é problematizar a implementação das políticas de Ciência & Tecnologia e Inovação no Brasil no período pós Constituição de 88 até o período recente, na tentativa de evidenciar o papel que vem exercendo no processo de acumulação de capital no Brasil. Para isso, se utilizou os aportes teóricos de Marx (acumulação primitiva) e Harvey (desenvolvimento geográfico desigual), além de indicadores do estado de inovação no Brasil, como os da PINTEC/IBGE. Este artigo está dividido em quatro seções. Após esta introdutória, segue pequeno debate conceitual. Na terceira seção problematiza-se a política de ciência, tecnologia e Inovação no Brasil. Por fim, são apresentadas considerações finais. 2 ALGUNS CONCEITOS IMPORTANTES Neste primeiro capítulo, cabe uma pequena discussão do marco teórico, que vai desde o desenvolvimento geográfico desigual, até o processo de acumulação primitiva de capital. Estes que são elementos importantes de nossa análise. O processo de “acumulação primitiva" precede mesmo o processo de acumulação capitalista, não sendo, desta forma, resultado de sua produção, mas seu ponto de partida, ou seja, está na gênese do modelo em questão. No contexto da economia política, compara-se ao “pecado original” na teologia. A base de todo este processo é a expropriação/separação dos meios de produção dos próprios trabalhadores. E este ato de expropriação não foi resultado do acaso, da “mão invisível” ou de métodos pacíficos. Pelo contrário. Todos os métodos que permitiram a acumulação primitiva, base do modo de produção capitalista, são resultado de ações cuja violência é característica comum e marcante (MARX, 1984). Em suma, são todos os processos que serviram de base para a ascensão e consolidação da classe capitalista, advinda das antigas ruínas feudais. “Se o dinheiro [...] ‘vem ao mundo com manchas naturais de sangue sobre uma de suas faces’, então o capital nasce escorrendo por todos os poros sangue e sujeira da cabeça aos pés” (MARX, 1984, p.292). O economista Carlos Brandão (2010) também nos ajuda a entender o processo de acumulação de capital, sustentando a continuidade deste e afirmando que tem caráter permanente ao longo da história do capitalismo, não meramente circunstancial. Em sua análise, centrada no Brasil, evidencia que a ocupação do território brasileiro e o modelo de desenvolvimento em que está alicerçado esteve e está a serviço da acumulação primitiva de capital. O modelo de desenvolvimento e crescimento econômico brasileiro esteve submetido à lógica de acumulação de capital nas mãos de alguns poucos. Evidentemente, o formato de uso (predatório e extensivo) e de ocupação do espaço territorial seguiram esta lógica. Suas características nada mais são do que a materialização do que intitula de acumulação primitiva permanente. De fato, não há como analisar a realidade brasileira, urbana e rural, sem que se leve em consideração que o desenvolvimento capitalista brasileiro vem sendo marcado por um desenvolvimento desigual. E mais do que isso, é preciso atentar ao fato de que esta desigualdade continua, seja nas regiões, ora ganhadores, ora perdedoras, ou nas gritantes assimetrias entre as classes sociais. Em suma, não há como analisar o desenvolvimento brasileiro sem se perceber as idas e vindas da acumulação primitiva, que assume variadas formas no decorrer da história (BRANDÃO, 2010). Um dos fenômenos causados pela dispersão do capital no espaço é que se denomina por desenvolvimento geográfico desigual. De acordo com Lowy (1995) a noção de desenvolvimento desigual surge com os estudos de Lênin e adquire maior importância nos estudos de Trotsky, que passa a utilizar a expressão desenvolvimento desigual e combinado. A Teoria do desenvolvimento geográfico desigual é mais recente e busca abordar a espacialidade do desenvolvimento desigual, ou seja, “a natureza especificamente geográfica da desigualdade socioeconômica entre as regiões e os países” (THEIS, 2009, p. 244-245). De acordo com Harvey (2004) é a acumulação do capital, com bases no livre mercado que produz as diferenciações geográficas em termos de riqueza e poder. De forma que a acumulação de capital sempre foi uma questão geográfica. Assim, o desenvolvimento geográfico desigual é tanto o produto quanto a premissa geográfica do desenvolvimento capitalista. Como produto, o padrão é altamente visível na paisagem do capitalismo, tal como a diferença entre espaços desenvolvidos e subdesenvolvidos em diferentes escalas: o mundo desenvolvido e o subdesenvolvido, as regiões desenvolvidas e as regiões em declínio, os subúrbios e o centro da cidade. Como premissa da expansão capitalista, o desenvolvimento desigual [...] é a desigualdade social estampada na paisagem geográfica e é simultaneamente a exploração daquela desigualdade geográfica para certos fins sociais determinados (SMITH, 1988, p. 221). Para se compreender o desenvolvimento geográfico desigual basta observar a prática de ocupação dos espaços no território, o capital busca o que o se chama de ajuste espacial. Portanto, ignoram-se espaços e regiões não promissores indo à busca de espaços e regiões promissoras para se instalar motivado por um conjunto de fatores como: fácil maximização de lucros, exército reserva, facilidades de transportes e escoamento de produção. Esse processo de acumulação capitalista do espaço resulta em regiões perdedoras e regiões ganhadoras. Com essa expressão se traduz claramente que: enquanto regiões crescem a altas taxas, concentram os maiores investimentos por parte do Estado (são detentoras de ciência e tecnologia, investimento, universidades), outras experimentam estagnação, recebem migalhas do poder público, populações pobres vivendo a mercê de direitos. Essas diferenças entre ricos e pobres, entre uma região desenvolvida e uma região sub desenvolvida cresce no território, produzindo uma paisagem que não encontra melhor nome do que desenvolvimento geográfico desigual (HARVEY, 2006; SMITH, 1988). 3 AS POLÍTICAS DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO NO BRASIL O modelo de tecnologia produzido e consumido nos países subdesenvolvidos é a tecnologia convencional (TC), que possui as seguintes características: poupa mais mão de obra do que o necessário, a ponto de cada nova onda de tecnologia otimizar ainda mais a produção; implica uma desvantagem competitiva aos pequenos em relação aos grandes empresários, de modo que os primeiros não tem recursos necessários para acompanhar os segundos; e por fim; é insustentável ambientalmente, já que não leva em consideração impactos ambientais (DAGNINO, 2010). E é justamente a tecnologia que toma conta das ações empreendidas pelo setor público brasileiro. Uma tecnologia voltada para a grande empresa e que reforça o que se configura como dualidade capitalista, ou seja, submissão de trabalhadores aos donos dos meios de produção, regiões ricas a regiões mais pobres, países periféricos aos países do centro, e mais do que isso: consolida as "assimetrias de poder dentro das relações sociais e políticas" e a constante degradação da democracia (NOVAIS, DIAS, 2009, p.18). O discurso dominante quer fazer enxergar as políticas de Ciência, Tecnologia e Inovação como propulsoras do desenvolvimento socioeconômico, sustentando a máxima de que um maior desenvolvimento científico levaria a um desenvolvimento econômico e, por conseqüência, social do país. Todavia, maior alguns dados parecem revelar o contrário. Justamente, este é intento da demonstração abaixo: primeiramente são trazidos dados do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e posteriormente, dados da última PINTEC. 3.1 C&T e inovação e o desenvolvimento geográfico desigual Os investimentos em C&T e Inovação vêm experimentando crescimento ao longo dos anos. Para se ter uma ideia, entre 2000 e 2012 o crescimento foi de 383%. Passou-se de 15 bilhões em 2000 para 76,5 bilhões em 2012. O que representava 1,34% de investimentos em relação ao total do PIB passou a ser 1,74%. Não é claro a distinção entre investimentos de empresas privadas e estatais, de modo a concluir que o setor público tem maior presença no montante de investimentos do período, verificado na presença das estatais (MCTI, 2014). Regionalmente, o aumento também ocorreu, mas seguiu a tendência histórica de distribuição desigual sobre o território brasileiro. De acordo com os dados do MCTI (2014), ficou claro que há um maior montante de investimentos concentrado nas regiões “mais desenvolvidas”, ou seja, Sudeste e Sul. Estas, por sinal, concentram mais pólos industriais. Enquanto na região Norte foram investidos 595,1 mi em 2012, na região Sudeste esse investimento chega a 9.524,4 mi no mesmo período. Vale dizer que a soma de todas as regiões (Sul, Centro-oeste, Norte e Nordeste) não se chega ao total investido na região Sudeste, que deteve 70% de todo investimento em C&T e Inovação no ano de 2012. Os documentos oficiais e planos sustentam que os investimentos em C&T e Inovação promovem o desenvolvimento regional, econômico e social. Se de fato isso se aplicasse, não dever-se-ia aplicar um maior volume de investimentos em regiões como o Norte e Nordeste, que concentram maiores índices de pobreza e desigualdades e a menor fatia do PIB? Ainda mais, porque se desconsidera as especificidades/realidades que se diferem e muito em cada uma das regiões brasileiras? Não se pode aplicar o mesmo modelo de C&T e Inovação a que se aplica no Sudeste igualmente no Nordeste. O que se evidencia é que tais disparidades regionais são fomentadas pelo próprio Estado, através das políticas distantes dos problemas sociais locais. Podemos dizer que não há uma devida atenção as particularidades de cada região. Segue tal desigualdade outra característica desse processo, a saber, que a base técnica das regiões mais desenvolvidas tendeu a se propagar para os espaços menos desenvolvidos, levando a estes a cópia do modelo de desenvolvimento do centro, desconsiderando as particularidades de cada lugar. E mesmo um aumento dos dispêndios em C&T e Inovação nas regiões periféricas não seria suficiente para transformar a paisagem das desigualdades regionais (THEIS; MOSER, 2012). Não restam dúvidas de que o território vem sendo usado a partir de seus acréscimos de ciência e tecnologia, mas não para promover desenvolvimento social (BARROS, 1999, 2000; SANTOS; SILVEIRA, 2001). A realidade analisada demonstrou que o desenvolvimento científico e tecnológico não tem contribuído para a redução dessas desigualdades, pois devido as características estruturais do subdesenvolvimento brasileiro, tendem a concentrar o capital nas regiões mais desenvolvidas economicamente. Essa concentração aparece na centralização dos diferentes atores em pólos que integram pesquisa, empresas e uma localização favorável. O presente cenário de Ciência, Tecnologia e Inovação vigente no país contribui para agravar as disparidades regionais. Esta concentração do desenvolvimento científico e tecnológico nas regiões centrais do país contribui e é resultado do desenvolvimento geográfico desigual (THEIS e MOSER, 2012). 3.2 C&T e inovação e a acumulação de capital Os dados sobre a dispersão da atividade inovativa no território brasileiro confluem às mesmas conclusões da seção acima. A maioria das empresas inovadoras concentra-se no Sudeste, mais especificamente em São Paulo. Do total destas (100.496), 54,15 %, ou seja, 54.418 localizam-se nesta região. Vale destacar que é a região com maior PIB (IBGE/PINTEC, 2008). Além disso, do total dos dispêndios das empresas inovadoras (R$ 43.727.462), 73,23 % (R$ 32.020.170) corresponde à região Sudeste. Isso demonstra uma grande concentração regional dos investimentos privados em inovação, especificamente. Evidencia-se assim que o aumentos das inovações não contribuiu para a redução das desigualdades, pelo contrário: seguindo a lógica da cadeia linear da inovação, o efeito tem sido o contrário, ou seja, de fomentar as desigualdades inter-regionais historicamente herdadas. Além é claro, de seguirem a linha de acumulação de capital. Outro dado que pode ser utilizado para mensurar o aumento das inovações em um determinado país são os pedidos e concessões de patentes. De acordo com estes, houve significativo aumento do registro de patentes brasileiras no período de 1997 a 2011: cerca de 256,10%. Apesar de significativo em termos percentuais, o número ainda é irrisório: passou-se de 67 concessões em 1997 para 254 em 2011. Ainda mais se comparado ao registro de outros países, à exemplo, EUA com 82 mil apenas no ano de 2009, e como, Taiwan com 6.642 patentes em 2009. O Brasil aparece com 148 concessões no mesmo ano, o que demonstra não ser uma economia inovadora frente ao cenário internacional (MCTI; USPTO5, 2012). Nesse contexto, se reforça a distância entre ciência e tecnologia, mesmo diante dos esforços para a passagem da pesquisa básica para a pesquisa aplicada apontados na PCT desde a década de 1990. Esse descompasso entre ciência e tecnologia pode ser explicado pela forma como se deu a constituição do desenvolvimento científico e tecnológico em países desenvolvidos e subdesenvolvidos. No caso dos países centrais os investimentos em C&T e Inovação permitiram que o desenvolvimento tecnológico acompanhasse o científico, enquanto, no caso dos países periféricos o desenvolvimento científico se sobrepõe ao tecnológico. Ficou nítido que, apesar do esforço do governo brasileiro em patrocinar a inovação, o setor privado não parece muito propenso a inovar. Através de estudos sobre a Pintec, Theis (2012) revela que do universo total das empresas em 2000, apenas 1,7% eram inovadoras, entre 2003 a 2005 houve queda nesta taxa, para 1,6% e chegando a 2,3% em 2008. O autor avalia neste crescimento a diminuição do número total de empresas, afirmando que o crescimento das empresas inovadoras é de 17% entre 2000 a 2003, 13% entre 2003 a 2005 e apenas 12% entre 2005 a 2008. Outro fator importante a considerar é o tipo de inovação que o empresariado brasileiro pratica. A atividade inovativa considerada hoje no Brasil pela PINTEC (cabe atentar que no Brasil para uma empresa ser considerada “inovadora” basta que ela adquira algum novo equipamento) tem forte predomínio de aquisição de máquinas e equipamentos de outros países, ou seja, compreende fortemente certa dependência tecnológica de países do centro. O aumento dessa atividade foi 108,14% entre os anos 2000 e 2008. Atividades de Pesquisa & Desenvolvimento são praticamente insignificantes no país (IBGE/PINTEC, 2008). Este é mais um indicador de que o capital privado brasileiro timidamente inova. Se “inova”, o faz importando C&T de países centrais. E este processo não possibilita o desenvolvimento socioeconômico, mas sim, um maior nível de acumulação de capital e logicamente, o agravamento das disparidades no território. Cabe perguntar, por que o 5 United State Patent and Trademark Office http://www.uspto.gov/web/offices/ac/ido/oeip/taf/cst_all.htm empresariado brasileiro não inova já que o governo brasileiro tem se mostrado bastante generoso em patrocinar a “inovação”? O problema da inovação no Brasil não é a falta de dinheiro. O que se evidencia como gargalo é o próprio empresariado brasileiro. Além disso, Dagnino e Bagatolli (2009) trazem a luz mais algumas reflexões que possibilitam responder a esta questão. Contrariamente à premissa Schumpeteriana que explica a dinâmica inovativa pela concorrência intercapitalista na corrida do “ganha – ganha” do mercado, os empresários de países periféricos (como é caso brasileiro) não inovam por que no processo de produção, na relação com os trabalhadores não é necessário "progresso tecnológico" a fim de garantir a mais valia (nos países avançados garante o que se chama mais valia relativa). Ao longo dos anos as políticas nacionais concentradoras possibilitaram a deterioração continuada do salário real e conseqüentemente "à instauração de uma forma de extração da mais-valia (absoluta) que prescinde da inovação" (DAGNINO; BAGATOLLI, 2009, p. 169). Ficam ainda alguns questionamentos: seria uma desculpa a necessidade em aumentar os investimentos neste modelo de C&T e inovação para que se tenha uma transferência fácil de dinheiro público ao setor privado, facilitando assim as coisas para a acumulação de capital? Bem - estar social e desenvolvimento socioeconômico seriam apenas termos bonitos para enfeitar os planos e documentos oficiais e tornar eficaz o discurso dominante? Seria preciso um trabalho mais minucioso para dar conta de todos estes questionamentos. O que se evidencia é o papel fundamental da tecnologia e da mudança tecnológica na economia capitalista. A busca incessante por inovações tecnológicas, para obter super - lucros está intimamente vinculada ao processo de produção e reprodução do capital (MARX, 1984, p.254). Vale destacar ainda que “os enfoques convencionais da inovação não oferecem alternativas adequadas (em termos de políticas científico-tecnológicas e territoriais) para o processo de inovação voltado ao desenvolvimento de formações sócio-espaciais periféricas”. As linhas que vem contrapor estas correntes clássicas e neoclássicas afirmam que a inovação tecnológica não se propaga a todas as firmas e convém a acumulação de capital por parte do empresariado (RATTNER, 1980, p. 27). Evidencia-se ainda que se faz mais do que necessário reorientar os amplos volumes de recursos que o setor público está disposto a gastar com a inovação em tecnologias alternativas. É necessário repensar o modelo de Ciência, Tecnologia e Inovação que se faz no Brasil. CONSIDERAÇÕES FINAIS O tema proposto neste artigo foram as Políticas de Ciência, tecnologia e Inovação e sua relação com o processo de acumulação de capital no Brasil. Ficou evidente que as políticas de C&T e Inovação contribuem para o desenvolvimento geográfico desigual acompanhando o processo de acumulação de capital pela concentração de investimentos nas regiões desenvolvidas. Os dados revelam ainda que o capital privado brasileiro não inova, mas sim importa máquinas e equipamentos de países centrais. Logicamente, tal prática não possibilita o desenvolvimento socioeconômico, mas sim, o contrário: um maior nível de acumulação de capital e o agravamento das disparidades Faz-se necessário repensar o modelo de desenvolvimento e de C&T e Inovação brasileiro. O que se sugere é um modelo democrático, alternativo onde o grande objetivo não seja a maximização do lucro, do “incremento da conta corrente” do capital privado e sim o atendimento das reais necessidades de nossos territórios e populações marginalizadas, que como sabemos, são muitas. Como afirmam Dagnino e Thomas (1999) isso só será possível a medida em que o processo de democratização política de lugar ao processo de democratização econômica. O que se propõe é justamente um modelo que leve em consideração a melhora da qualidade de vida dos indivíduos, que promova uma redistribuição das rendas geradas e acumuladas durante os séculos, ou seja, um desenvolvimento que seja capaz de reduzir as desigualdades regionais, e mais do que isso, que seja democrático. Que além de desenvolver para as pessoas, seja democrático e participativo para desenvolver com as pessoas. E isto requer que se respeite o ambiente físico (o meio ambiente!) e a cultura dos lugares onde tais pessoas vivem. Evidentemente, esse “desenvolver” não significa "levar mais modernidade", "mais bens industrializados" para as regiões "subdesenvolvidas", mas despertar nas pessoas a energia (que elas têm) para decidirem, elas mesmas e serem protagonistas do "desenvolvimento" - isto é, a qualidade de vida - que querem para elas. É aí que surge a Tecnologia Social, uma alternativa à Tecnologia Convencional, hegemônica no Brasil. Preocupa-se com um enfoque tecnológico voltado a “inclusão social” e se orienta para a produção coletiva, pautando nas realidades das sociedades locais, buscando respostas dos próprios sujeitos aos seus problemas. (DIAS, NOVAES, 2009, p.19). São muitos os exemplos no Brasil afora. Pequenos, mas que partem da realidade do povo, onde as comunidades, os atores, constroem o processo de mudança por meio de seu modo de vida. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARROS, Fernando Antônio Ferreira de. Os desequilíbrios regionais da produção técnicocientífica. São Paulo em Perspectiva, 14 (3), p. 12-19, 2000. . Confrontos e contrastes regionais da ciência e tecnologia no Brasil. Brasília, D.F.: Ed. da UnB : Paralelo 15, 1999 BRANDÃO, Carlos. Acumulação primitiva permanente e desenvolvimento capitalista no Brasil contemporâneo. ALMEIRA, Alfredo Wagner Berno de [et al.] In: Capitalismo globalizado e recursos territoriais: fronteiras da acumulação no Brasil contemporâneo. 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Dando viabilidade a pesquisa realizou-se um levantamento referencial, utilizando-se a análise de conteúdo para a compilação dessas informações. Percebe-se que os temas identificados correspondem, dentro outros, à saúde coletiva e pesquisa qualitativa. Os trabalhos analisados incidem discursos que demonstram uma tendência à projeção de fatores multidisciplinares que já constitui uma realidade complexa vivenciada no meio científico. Palavras-chave: Ciência; Abordagens do conhecimento; Pesquisas científicas. Introdução A interdependência e complexização dos fatores socioambientais no território culminam em diversas discussões em torno do reconhecimento de que os aspectos humanos e físicos do espaço assumem conotações indissociáveis. Assim, a tendência à especialidade nos campos científicos é analisada como um dos fatores que contribui para própria fragmentação do saber, uma vez que resulta na captação e desenvolvimento de conhecimentos da realidade os quais tendem a se produzir em ambientes em que inter/transdisciplinar (MORIN, 2005). 1 Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, tecnologia e desenvolvimento regional Mestrando do PPGDR/UEPB. E-mail: [email protected] 3 Mestrando do PPGDR/UEPB. E-mail: [email protected] 4 Professor Dr. do PPGDR/UEPB. E-mail: [email protected] 5 Professora Dra. do PPGDR/UEPB. E-mail: [email protected] 2 62 é rarefeito o diálogo De acordo com Jonas (2006), que parte de uma concepção ética do pensamento, as diferentes abordagens e alternativas científicas devem abarcar distintas concepções de manutenção tanto dos meios naturais, quanto das relações espaciais que influenciam e sofrem influência da natureza. Neste viés, essa perspectiva dicotômica da estruturação do pensamento científico evidencia discursos diferenciados no que tange ao papel da ciência na sociedade, sobretudo, quando se remete a compreensão da complexidade da realidade e à manutenção e desenvolvimento de técnicas que se estruturam em torno das lutas entre os interesses sociais envolvidos. A tecnociência, indicada por vários estudiosos como uma forma de conhecimento atrelada aos interesses capitalistas, pode ser um exemplo destas questões. Ziman (2003) em uma análise pautada essencialmente na relação entre ciência e sociedade, afirma a agregação de uma parte da estrutura social que no geral, assegura que o papel social da ciência é altamente suspeito e ambíguo e possui um encontro com o público verdadeiramente limitado. Segundo este autor, a dimensão política da produção e articulação da ciência, tornou-se um fator relevante na vida coletiva, sendo influenciada por diversos poderes públicos, que lhe atribuem diversos papeis sociais. O lugar da ciência na sociedade é determinado pelas forças que permeiam as relações entre autores e instituições que a produzem, caracterizados por diferentes intencionalidades e funções. Um outro aspecto relativo a esta discussão, é o papel instrumental da ciência, o qual, por um lado determina a ação dos produtores e por outro propicia a formação de atitudes dos indivíduos que a consomem em debates públicos. Nestes, por sua vez, encontra-se níveis diferenciados de disponibilização e acesso ao conhecimento científico acerca de temas de interesse público em geral, tais como, saúde, educação, fontes de energia, conservação dos recursos ambientais e alimentares. Considerando as implicações destes processos em áreas distintas do conhecimento científico e da vida social, Leff (2003) e Capra (1982), com base em 63 uma perspectiva ambiental, afirmam a necessidade do diálogo entre os diferentes campos dos saberes, uma vez que os fatores ambientais resultam e simultaneamente são resultados da auto-organização social e da ecologização do pensamento. Soares et. al., (2010), por sua vez, defendem a diversidade de recursos teórico-metodológicos na produção cientifica das ciências humanas e sociais, uma vez que existe uma preocupação efetiva com questões relativas ao avanço das disciplinas e ao modo como o conhecimento se estrutura nessas áreas específicas. Em uma análise dos aspectos característicos da produção científica em ciências da saúde, Canesqui (2012) também aponta a existência de inovações teórico-metodológicas relacionadas à integração de abordagens transdisciplinares, assim como à diversidade de elementos de interesse dos pesquisadores. Daí emergem acepções acerca do objeto e do sujeito, da ciência e da consciência, da ideologia e da ética, as quais assumem papel substancial na consolidação de um pensamento multilateral e multidimensional. Defende-se aqui como pressuposto a ser adotado na produção do conhecimento científico sobre aspectos da vida cotidiana, a agregação da necessidade de discutir a interdependência das diversas abordagens disponíveis, uma vez que a monoabordagem significaria necessariamente a simplificação de situações complexas, enquanto a própria complexidade reuniria todos os aspectos da realidade. Trata-se de pensar o homem e os cenários que ele produz e nos quais é produzido não apenas como algo biologicamente constituído, porém formado por uma consciência resultante de um contexto histórico, cultural e ambiental (MORIN, 2005). Diante desta perspectiva, Canesqui (2012) aponta discussões metodológicas em torno da combinação de métodos qualitativos e quantitativos nas ciências humanas de modo geral, como também o aprofundamento em torno das discussões voltadas à necessidade de levar em consideração a teoria da complexidade. O pensamento complexo, de acordo com Morin (2005), é constituído por tecidos heterogêneos inseparavelmente associados, uma vez que 64 a agregação isolada desses tecidos constituiria um modelo simplificador de pensamento. O modelo proposto da complexidade proposto por Morin (2005) pauta-se na concepção do pensamento como um conjunto de práticas que capacitem os cientistas e os consumidores do que eles produzem para lidar e negociar com o real, posicionando-se de forma adversa ao modelo que busca o controle e domínio do real através de abordagens simplificadoras, disjuntivas, e portanto, incompletas. É pensando a corrente da complexidade e as correntes que a combatem, que discutimos aqui o perfil das pesquisas desenvolvidas atualmente na área das ciências humanas, interação do processo de produção científica no território e sua interface com o desenvolvimento coletivo. Dentre as questões que nortearam nossa pesquisa, a partir da qual produzimos este artigo, destacamos as seguintes: Como se configura as abordagens cientificas na produção das ciências humanas e sociais? Qual a relação entre estes estudos e as necessidades sociais coletivas? Procedimentos teórico-metodológico Quando nos propomos a estudar as linhas mais gerais da produção científica nas ciências humanas e sociais disponibilizada na internet em Língua Portuguesa, contruímos de forma não aleatória, um corpus ao qual aplicamos os procedimentos da metodologia da análise de conteúdo. Assim, através da busca no Google Acadêmico de três palavras chaves: meio ambiente, sociedade e tecnologia, foram coletados os cinco primeiros artigos listados para cada palavra na ferramenta de busca do site acima citado, totalizando quinze documentos analisados (SOARES et. al, 2002; TAUCHEN & BRANDLI, 2006; SILVA ET al, 2013; SOUZA, 2009; JACOBI, 2003; ORTH, 2010; SOUZA & CAVALARI, 2009; LEITE & GALIAZZI, 2013; ABERS & KECK, 2008; NAVARRO & CARDOSO, 2005; OLIVEIRA & GIROLETTI, 2013; PASSOS et. AL, 65 2013; TAVARES et. al, 2011; PACHECO & KERN, 2003; STRAPSSON & JOB, 2006). Com relação à análise de conteúdo dos textos, foram elencados itens de observação para indicar a presença e o nível de interação entre ciências e suas abordagens indicado em cada trabalho analisado, sendo desenvolvido um quadro síntese para a organização e apresentação destas informações nos níveis em que elas se apresentaram. De acordo com Pereira (2011), na análise de conteúdo podem-se destacar três níveis de representatividade do item ou categoria observadas. O alto nível corresponde a uma intensa representatividade do item avaliado, o nível elementar corresponde à existência mínima de interações dos aspectos em avaliação e, por fim, a ausência é quando determinado aspecto não é observado no corpus analisado. Os itens/categorias que considerados mais indicados para a observação foram os seguintes: A afiliação dos autores a áreas distintas do conhecimento científico; O uso de pesquisa qualitativa; O uso de pesquisa quantitativa; A realização de trabalho de campo; A caracterização da ciência produzida enquanto não instrumental e tecnociência; A produção de contribuições relativas ao desenvolvimento. A utilização de autores de diferentes áreas do conhecimento se relaciona com à identificação de trabalhos que atendam à inspiração da matriz da complexidade, que envolve um esforço de integração das diversas áreas de estudo. O uso das técnicas de pesquisa qualitativa e quantitativa ou qualiquantittiva também indicam em que medida se adota o pluriperspectivismo em termos metodológicos. A utilização do trabalho de campo, de acordo com Thiollent (1994), trata-se da estruturação de uma perspectiva de análise que busque um conhecimento mais concreto e real da problemática, se posicionado de forma a compreender as especificidades e situações do local. Nesta perspectiva, assumindo posicionamento contrário a pesquisa de gabinete, o trabalho de campo vincula-se a análise de aspectos concretos da realidade empírica. 66 Com relação a ciência não instrumental, aborda-se a ideia da relevância social do conhecimento cientifico produzido em interface com as estratégias de produção do que se concebe como desenvolvimento social. Já no que se refere a tecnociência, a vinculação do processo científico com a promoção de interesses econômicos, configura um instrumento de alcance a habilidades com fins de ampliação competitiva e mercadológica. Por fim, no que tange às contribuições para o desenvolvimento das pesquisas, compreende-se os procedimentos que podem ser aplicados pelas variadas instâncias a partir dos estudos analisados para favorecer o equilíbrio do crescimento econômico, a preservação do meio ambiente e a melhoria da qualidade de vida das populações. Resultados e discussão Foram observados que os trabalhos analisados correspondem a pesquisas desenvolvidas por estudiosos da área da saúde coletiva, ciência ambiental, ciências humanas, ciências da informação e gestão industrial. Observa-se inicialmente que se trata de estudos diferenciados em que são estudadas problemáticas relacionadas a sujeitos, objetos e condições naturais sociais. A perspectiva de análise de conteúdos utilizada foi contituída a partir das indicações de Franco (2005), que sugere considerar não apenas os aspectos linguísticos, mas também a produção de inferências acerca de dados verbais e/ou simbólicos. Assim, segundo a autora, este tipo de análise enfatiza uma concepção crítica e dinâmica da linguagem, sendo esta, por sua vez, considerada como uma construção real que reflete o dinamismo existente entre o pensamento e a ação. Partindo deste pressuposto, os tipos de comparações dos conteúdos podem ser multivariados, a depender da intencionalidade do pesquisador. Sendo assim, compreende-se claramente que a viabilização das análises dos documentos selecionados corresponde necessariamente a uma atividade intelectual de abstração (FRANCO, 2005). 67 Esta análise constou não apenas na identificação da observação das ocorrências de cada um dos aspectos avaliados em cada trabalho avaliado, mas também da discussão teórica voltada ao reconhecimento da existência ou importância dos mesmos no cenário científico do qual os trabalhos fazem parte. Assim, as palavras-chave aqui empregadas, implicam em especificidades diferenciadas quanto a cada aspecto do qual se optou para efetivação da análise cujos resultados aqui apresentamos. Logo, a esquematização das informações trabalhadas no decorrer deste trabalho constitui-se como um desafio organizacional, de modo que, buscando minimizar as dificuldades correspondentes a este processo, relacionaram-se os itens analisados com todos os trabalhos científicos correspondentes a cada palavra chave utilizada durante o período de exame do corpus de artigos (Quadro 01). Quadro 01: Análise de conteúdo dos trabalhos avaliados Itens analisados Artigos Científicos Sociedade Meio ambiente 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 Tecnologia 12 13 14 15 Autores de áreas distintas conhecimento científico Pesquisa qualitativa Pesquisa quantitativa Trabalho de campo Ciência não instrumental Tecnociência Sugestões desenvolvimento Auto nível Nível elementar Ausência Observou-se nos artigos que com relação a primeira palavra chave (meio ambiente), houve uma alta representatividade de autores de áreas distintas do conhecimento científico em nível elementar. Já a pesquisa qualitativa teve representação em quatro dos cinco artigos analisados, sendo concebida em nível alto e elementar, a pesquisa quantitativa incidiu apenas em um documento. 68 O trabalho de campo não foi constatado em nenhum dos artigos descritos, bem como a verificação de uma interpretação alinhada à tecnociência para esta palavra-chave. Quanto à associação destes trabalhos as características da ciência não instrumental, observou-se a sua totalidade alinhada a uma perspectiva social, sendo apresentada, em três dos cinco documentos analisados, algumas sugestões relativas à promoção do desenvolvimento. Com relação à segunda palavra-chave (sociedade), no que tange à presença de autores de áreas distintas, bem como a pesquisa qualitativa, observou-se grande representatividade, variando entre níveis altos e elementares. A pesquisa quantitativa incidiu em dois documentos, enquanto o trabalho de campo não foi observado e a tecnociência indicada em um trabalho. A pesquisa qualitativa e sugestões para o desenvolvimento aplicado à temática surgiram em três documentos. Os aspectos relativos à ciência não instrumental foi visualizado em todos os artigos desse subcampo, variando entre o nível alto e elementar. Finalmente, através da terceira palavra-chave (tecnologia), foi averiguada uma alta representatividade de todos os elementos. A pesquisa quantitativa e sugestões de desenvolvimento foram os únicos aspectos constatados em todas as publicações analisadas. A pesquisa qualitativa e o trabalho de campo possuíram quatro ocorrências. Dois dos trabalhos estudados apresentaram aspectos da tecnociência na sua constituição, enquanto três estão associados a um papel não instrumental do conhecimento. Diante da apreciação desta pequena amostra não aleatória, compreende-se que a presença dos itens analisados correspondem a vieses expressivos da existência da interdisciplinaridade aplicada aos artigos avaliados e, em alguns casos, o seu aproveitamento social. Considerando a produção de conhecimentos generalizáveis e descrições mais aprofundadas de vários objetos de investigação, afirma-se que a projeção de interesses multilaterais já se constitui como uma realidade complexa indicada nesta pesquisa. Por fim, considerando, sobretudo, os aspectos da ética e da responsabilidade que emergem em meio a essa metamorfose, ressaltam-se a indissociabilidade dos aspectos quantitativos e qualitativos, científicos e 69 empíricos, reais e abstratos. Podemos otimizar que vivenciamos um período de transformações e evoluções complexas das quais deve-se lançar novos e constantes questionamentos que atendam ao processo de construção do conhecimento acerca da objetividade e subjetividade do real, no qual a ciência é uma das bases fundamentais. Nesta perspectiva, este contexto trata de análises diferenciadas quanto aos objetivos e procedimentos teórico-metodológicos analisados. Deste modo, a produção científica da qual se efetivou os procedimentos metodológicos, assumem denotações científicas que se instituem desde pesquisas unicamente bibliográficas, até estudos empíricos e de percepção. Considerações finais O desenvolvimento de perspectivas que estendam diálogos com os contextos reais de produção científica assume relevância considerável, haja vista que o reconhecimento das tendências seguidas pelos autores através de aspectos característicos, é norteador para compreender como ocorre o processo de construção do próprio conhecimento científico e seu reflexo na sociedade. Trata-se de uma análise de baixa possibilidade de generalização, contribuindo, no entanto, para formulação de novas questões e hipóteses de pesquisa, como por exemplo, quais as principais áreas do conhecimento científico dentro das ciências humanas e sociais apresentam maior resistência à difusão do pensamento complexo? Quais as implicações desta situação na progressão do conhecimento científico? Como estes conhecimentos podem ser vinculados a uma reflexão em termos mais holísticos do que apenas economicistas? Referências ABERS, Rebecca Neaera; KECK, Margareth E. 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Conclui que os programas estão concentrados no sul do país; há assimetrias em relação à produção de conhecimento científico e ao território, pois não há programas de mestrado com doutorado na área de PUR no norte e centro-oeste do Brasil. PALAVRAS-CHAVE: Desenvolvimento Regional; Doutorado; Mestrado; Planejamento Urbano e Regional; Território. INTRODUÇÃO O mundo está cada vez mais territorializado, e um aspecto que demonstra essa territorialização pode ser identificado quando as pessoas se defrontam com informações sobre o que é ou não permitido ou proibido, ou ainda, com placas de “somente pessoal autorizado” ou “proibida entrada”. Storey (2012, p.1), descreve que “todos os dias avisos e advertências refletem tentativas para impor formas de poder (através de regras e regulações) sobre porções do espaço geográfico”. Costa (2006) descreve que o território é usualmente focalizado em quatro dimensões, quais sejam: a política, a cultural, a econômica e a “natural”. Um território pode ser 1 Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional – II SEDRES, Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014. 2 Doutoranda em Desenvolvimento Regional na Universidade Regional de Blumenau – FURB, Blumenau – SC. Bolsista CAPES. [email protected] 3 Doutor em Ciências Sociais e Pós- Doutor no Centre de Sociologie de L’innovation-ENMP/Paris. Professor Titular no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da Universidade Regional de Blumenau – FURB, Blumenau – [email protected] reconhecido pelas características relacionadas ao meio ambiente (naturais) ou por sua cultura (identidade de uma determinada comunidade). Nesse contexto, observa-se que há uma ciência que estuda principalmente a intervenção humana no território, a ciência regional (BENKO, 1999, p.2). Essa ciência possui influências de campos de estudo como a economia, a geografia, a sociologia, a antropologia, as ciências políticas, o urbanismo, que se tornaram perceptíveis em função das proposições para avaliar questões que, dentre outros aspectos, contemplavam a sociedade (ser humano), o território, o planejamento, as políticas públicas, o ambiente, a economia, as desigualdades regionais, locais, os recursos sustentáveis. Dessa forma, a ciência regional apresenta uma variedade de domínios que podem ser analisados sob a ótica dessa ciência. De acordo com Benko (1999), é possível realizar análises a partir do agrupamento em quatro grandes temáticas: localização das atividades econômicas, organização e estruturação do espaço, interações espaciais e desenvolvimento regional. Assim, a ciência regional possibilita estudar, não só o desenvolvimento regional, mas também, possibilita desenvolver estudos não só sobre a sociedade e outras temáticas já elencadas, mas sobre o território.Na percepção de Delaney (2005, p. 12) o “Território, por sua vez, informa aspectos chaves das identidades coletivas e individuais. Ele molda e é moldado pelo coletivo social e pela autoconsciência”. Além disso, o conceito de território pode ser definido como: “o espaço econômico socialmente construído, dotado não apenas de recursos naturais de sua geografia física, mas também da história construída pelos homens que nele habitam, através de convenções de valores e regras...” (MARINI; SILVA, 2011, p. 110). Esses valores e regras podem condicionar ações e direcionar decisões. Nesse sentido, estudos sobre o território, bem como, sobre o desenvolvimento no território, são objeto das análises da comunidade científica.No que se refere ao Desenvolvimento Regional no Brasil, o conhecimento científico produzido está vinculado à atuação da comunidade científica alocada no território, nos programas de pós-graduação stricto sensu. O processo de desenvolvimento do campo de estudo resulta como consequência da produção do conhecimento na área e, no Brasil, os programas de pós-graduação stricto sensu desenvolvem e 2 contribuem para a construção do conhecimento. No entanto, essa comunidade científica encontra-se dispersa pelo território brasileiro e a formação de massa crítica em torno de uma determinada área pode não ocorrer de forma equitativa. Assim, o objetivo principal do trabalho é analisar a configuração territorial dos programas de pós-graduação em Desenvolvimento Regional no Brasil, a partir dos programas que possuem, além do mestrado, também o curso de doutorado na área. O trabalho está pautado em pesquisa exploratória, bibliográfica e documental e está estruturado a partir dessa introdução, seguida das seções “A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior e a pós-graduação no Brasil: um breve histórico, Programas de Pós-graduação na área de Planejamento Urbano e Regional no Brasil”, Metodologia e conclui com as Considerações. 2 A COORDENAÇÃO DE APERFEIÇOAMENTO DE PESSOAL DE NÍVEL SUPERIOR E A PÓS-GRADUAÇÃO NO BRASIL: UM BREVE HISTÓRICO No território brasileiro a história da pós-graduação, em âmbito stricto sensu, data do ano de 1951, quando foi criada a “Campanha Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior”, hoje conhecida como CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, pelo decreto de nº 29.741, que objetivava “assegurar a existência de pessoal especializado em quantidade e qualidade suficientes para atender às necessidades de empreendimento que visavam ao desenvolvimento do país” (BRASIL, 2013). É no ano de 1965 que a pósgraduação tem cursos classificados, sendo 27 cursos em nível de mestrado e 11 em nível de doutorado, totalizando 38 cursos no país. Após o parecer 977 de 1965 (regulamentação da pós-graduação), no plano educacional há destaque para a política de ensino superior, ciência e tecnologia, tendo em vista que a CAPES (BRASIL, 2013) “ganha novas atribuições e meios orçamentários para multiplicar suas ações e intervir na qualificação do corpo docente das universidades brasileiras”. Assim, a CAPES passou a ter papel de destaque na formulação da nova política para a pós-graduação. No ano de 1981, a CAPES, passa a ser responsável pelo Plano Nacional de Pós-graduação Stricto Sensu e pelo Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia no país, enfocando a 3 elaboração, avaliação, acompanhamento e coordenação de atividades vinculadas ao ensino superior (BRASIL, 2013). No entanto, o primeiro plano nacional de pósgraduação refere-se ao período de 1975-1980. No ano de 1990, após um período conturbado, em função de sua extinção (período do Governo Collor) e intensa mobilização da comunidade científica e do Ministério da Educação, a CAPES é recriada. Em 1995, com o novo governo, a CAPES passa por uma reformulação e se torna responsável pelo acompanhamento e avaliação de cursos de pós-graduação stricto sensu do território brasileiro. É nesse período que o sistema de pós-graduação ultrapassa a marca de 1000 cursos de mestrado e 600 cursos de doutorado, envolvendo 60 mil alunos. Atualmente, a CAPES, é responsável também pela formação inicial e continuada dos professores da educação básica no país (BRASIL, 2013). Esses cursos de pós-graduação permitem a formação de massa crítica nas áreas de conhecimento e ao mesmo tempo promovem a produção do conhecimento científico. Para Velho (2011, p. 137), o conhecimento científico só pode ser produzido por cientistas especificamente treinados para produzir conhecimento objetivo. Ressalta-se ainda que, para Velho (2011, p. 137), “a ciência é vista como a base, a origem da tecnologia”. Nesse sentido, ciência e tecnologia podem ser ‘motores’ para o progresso, Gouveia (2009) destaca que a competitividade de um dado território, está cada vez mais relacionada com o conhecimento de seus ativos humanos e com a capacidade de produção do conhecimento. Verificou-se junto às informações disponibilizadas pela CAPES, que o Brasil possui na grande área das Ciências Sociais Aplicadas, a área de avaliação do Planejamento Urbano e Regional (área em que se insere o desenvolvimento regional), 32 cursos de pós-graduação stricto sensu na área de Planejamento Urbano e Regional. Parte da produção do conhecimento científico em Desenvolvimento Regional é desenvolvida em programas de pós-graduação stricto sensu que estão concentrados, em sua maioria, nos estados do litoral do Brasil e outros programas de pós-graduação que se encontram em regiões do interior do país. Gouveia (2009, p.14) ainda menciona a importância das instituições de ensino superior tendo em vista que 4 transformam-se em elementos cruciais da equação da competitividade e da capacidade de atrair investimento de uma dada região, desde que conscientes do seu papel de não transmissores de conhecimento “importado”, mas sim produtores de conhecimento local e que seja reconhecido como uma centralidade, mesmo fora dos limites do território onde estão inseridas. Destaca-se que para Rolim e Serra (2009, p. 85) “as universidades sempre deram contribuições para o desenvolvimento das nações. Entretanto, a preocupação com o papel que elas desempenham no desenvolvimento das regiões em que estão inseridas é recente”. Para os autores, a educação superior vem sendo identificada como o principal motor para o desenvolvimento econômico, cultural e social dos países e, principalmente, das regiões. De fato, a dimensão regional passa a ter uma importância capital na medida em que o ambiente regional/local é tão importante quanto à situação macroeconômica nacional na determinação da habilidade das empresas em competir numa economia globalizada, ou seja, a disponibilidade dos atributos regionais/locais (conhecimento, habilidades, etc.) (...), o que faz das universidades que estão umbilicalmente ligadas às suas regiões...(ROLIM; SERRA, 2009, p. 87). Diante do exposto, a seguir serão apresentados os programas de pósgraduação em Desenvolvimento Regional que integram a área de avaliação de Planejamento Urbano e Regional/Demografia conforme o disposto pela CAPES. 3 PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO NA ÁREA DE PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL NO BRASIL ACAPES, recomenda e reconhece 32 programas de pós-graduação stricto sensu na área de Planejamento Urbano e Regional (BRASIL, 2013). O histórico dos programas de pós-graduação na área de Planejamento Urbano e Regional inicia a partir da década de 1970, em Porto Alegre, no Rio de Janeiro, no Recife, Brasília e São Paulo. Esses primeiros cursos estavam vinculados à área da Arquitetura e Urbanismo e somente a partir da década de 1980 os programas de pós-graduação foram agregados à área da demografia em função da criação de um mestrado e doutorado nessa área. Na década de 1990 foram criados 11 mestrados acadêmicos e surgiram 4 doutorados vinculados aos programas mais antigos. Atualmente, os programas de pós-graduação em Planejamento Urbano e Regional possuem estrutura pautada nas orientações e avaliações da CAPES considerando dentre outros aspectos, a área de concentração, conforme poderá ser observado a seguir: 5 Quadro 1 – Programas de Pós-graduação recomendados e reconhecidos pelas CAPES na área de Planejamento Urbano e Regional (PUR) IES (Universidade) Universidade Federal do Rio Grande do SulUFRGS Cidade/UF Porto Alegre/RS Nome do Programa Planejamento Urbano e Regional M/D M/D Início 1970 2004 Áreas de Concentração • Planejamento urbano e regional e os processos sociais • Sistemas de suporte à decisão em planejamento e desenho urbano IPPUR - Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional na Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ Universidade Federal de Pernambuco - UFPE Rio de Janeiro/RJ Planejamento urbano e regional M/D 1971 1993 • Planejamento Urbano e Regional Recife/PE Desenvolvimento urbano M/D • Desenvolvimento Urbano Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC/RS Universidade Salvador –UNIFACS Santa Cruz do Sul/ RS Desenvolvimento regional M/D • Desenvolvimento regional Salvador /BA Desenvolvimento regional e urbano M/D 1975 1999 1994 2005 1999 2006 • • • • Processos urbanos e regionais do desenvolvimento Desenvolvimento e políticas regionais Desenvolvimento, políticas urbanas e redes de cidades Turismo e Desenvolvimento Circuitos Internac. e Locais do Turismo Desenvolvimento regional sustentável • Desenvolvimento regional e do agronegócio • • Planejamento Urbano e Regional/Demografia Territorialização e Desenvolvimento Social • Planejamento e Gestão do Território • • Universidade Regional de Blumenau – FURB/SC Universidade do Oeste do Paraná – UNIOESTE Pontifícia Universidade Católica do Paraná PUC/PR Universidade Católica de Salvador – UCSAL Blumenau/SC Desenvolvimento regional M/D Toledo/PR Desenv. regional e agronegócio Gestão urbana M/D M/D Universidade Federal do ABC - UFABC Santo André/SP Planej. territorial e desenvolvimento social Planej. e gestão do território Curitiba/PR Salvador/BA M/D M/D 2000 2012 2002 2003 2009 2005 2012 2011 2012 Fonte: CAPES, 2014. 6 É possível verificar que dos programas de pós-graduação que possuem mestrado e doutorado na área, cinco programas estão localizados na região Sul, três na região Nordeste e dois na região Sudeste. Pode ser válido refletir sobre essa configuração territorial e observar um aspecto apontado ainda no primeiro Plano Nacional de Pós-graduação (1975-1980) uma vez que, “com a concentração geográfica verificada, tem ocorrido um indesejável processo de migração pós-universitária em um único sentido predominante - do interior para as áreas das grandes capitais -...” (BRASIL, 1975, p. 11). Além disso, retomando o histórico dos programas de pós-graduação na área de Planejamento Urbano e Regional é possível visualizar que os primeiros programas se localizaram em metrópoles, dispersos nas regiões sul do país, sudeste e nordeste. 4 METODOLOGIA Para atender o objetivo proposto, foi realizado um estudo exploratório pautado em pesquisa bibliográfica e documental. Foi consultada a base de dados da CAPES, considerando-se a lista dos cursos recomendados e reconhecidos na grande área de Ciências Sociais Aplicadas, área de escopo de Planejamento Urbano e Regional/Demografia enfocando os programas de mestrado e doutorado na área no Brasil, bem como, documentos de área e Planos Nacionais de Pós-Graduação. Quanto à configuração territorial dos programas de pós-graduação com mestrado e doutorado na área, esta se apresenta conforme a figura 1 a seguir: 80 Figura 1 – Programas de Pós-Graduação com Doutorado em Desenvolvimento Regional Fonte: Extraído do sítio do IBGE (2014). Diante da figura 1, observa-se que há uma concentração de programas de pós-graduação com mestrado e doutorado na área de Planejamento Urbano e Regional. Na região sul do país estão alocados (5 programas), seguido da região nordeste (3 programas) e região sudeste (2 programas). Todos fazem parte da faixa litorânea do território nacional. Desses, cinco enfocam o Desenvolvimento, quatro enfocam o Planejamento e um enfoca a Gestão Urbana (conforme exposto no quadro 2), ambos com temáticas pouco distintas mas com preocupação similar: promover a discussão acerca dos elementos que integram a área. No entanto, são 14 áreas de concentração4 em 10 programas de pós-graduação que estudam o planejamento urbano e regional (cinco áreas de concentração), desenvolvimento (seis áreas de concentração), 4 Ver Quadro 1 - Programas de Pós-graduação recomendados e reconhecidos pelas CAPES na área de Planejamento Urbano e Regional/Demografia. 81 territorialização (uma área de concentração), turismo (duas áreas de concentração) e processos urbanos (uma área de concentração). Pode-se inferir que 10 programas de pós-graduação (mestrado e doutorado) concentrados especialmente na região sul do país dificilmente poderão investigar as realidades existentes no território nacional. Esse aspecto pode gerar assimetrias não só quanto à questão da formação de massa crítica para atuar, mas também, acerca da produção do conhecimento científico, das pesquisas sobre as dimensões retratadas por Costa (2006), bem como, das problemáticas do próprio território (dentre outros) conforme retratado por Marini e Silva (2011) e Delaney (2005). A percepção acerca de assimetrias quanto à Pós-Graduação está retratada no PNPG 2011-2020, onde é citado que “programas foram idealizados para ampliar o número de docentes doutores e o número de cursos de mestrado e doutorado nas regiões Norte, Centro Oeste e Nordeste, reconhecidamente possuidoras das maiores carências de recursos humanos” (BRASIL, 2011, p.285). No caso da área de Planejamento Urbano e Regional evidencia-se que as regiões Norte e Centro-Oeste não possuem nenhum programa de pós-graduação (mestrado e com doutorado) que possa desenvolver pesquisas e auxiliar na compreensão dos fenômenos relativos ao Desenvolvimento Regional, Planejamento Urbano e Regional, Território e afins. Diante disso, percebe-se que se faz necessário atentar para a questão das assimetrias, que é notória, em virtude de que a própria discussão acerca do Desenvolvimento Regional (Programas de Pós-Graduação em Planejamento Urbano e Regional) e das temáticas do campo de estudo não estarem sendo exploradas em sua totalidade. Outra questão a ser analisada, decorre do fato de que de acordo com Abramovay (2006, p. 1-2) “territórios não se definem por limites físicos e sim pela maneira como se produz, em seu interior, a interação social” e quanto à configuração territorial, para Delaney (2005, p. 12), “Configurações territoriais não são artefatos simplesmente culturais. Eles são conquistas políticas”.. 82 Assim, destaca-se que a análise sobre a configuração territorial dos programas de pós-graduação (mestrado e doutorado) na área de Planejamento Urbano e Regional pode culminar na ênfase das assimetrias em relação à formação de massa crítica, desenvolvimento do conhecimento científico e dos fenômenos que ocorrem no próprio território. 5 CONSIDERAÇÕES A partir da análise realizada nesse trabalho observou-se que muito embora estejam elencados pela CAPES 32 programas de pós-graduação stricto sensu, somente 10 programas possuem mestrado e doutorado na área. A formação de massa crítica para atuar na área concentra-se na região sul (cinco programas com mestrado e doutorado), sudeste (dois programas) e nordeste (três programas com mestrado e doutorado) do país. A alocação destes programas no território brasileiro configura-se na faixa litorânea. O debate acerca das problemáticas inerentes à área precisam ocorrer em todo o território de forma que a configuração territorial não seja um empecilho, mas sim, um motivo para gerar reflexões, que auxiliem na compreensão ou proposições sobre planejamento urbano e regional no Brasil. Além disso, as regiões Norte e Centro-Oeste, hoje, não possuem programas de pós-graduação stricto sensu com mestrado e doutorado, o que evidencia a questão da assimetria relatada nesse estudo. Assim, que tipo de território está sendo construído nessas regiões? E as interações sociais como se desenvolvem? Outras reflexões surgem relacionadas às constatações do presente estudo, mas, percebe-se que a configuração territorial atual pode privilegiar alguns em detrimento de outros. REFERÊNCIAS ABRAMOVAY, R. Para uma teoria dos estudos territoriais. In: VIEIRA, P. F. et al. Desenvolvimento territorial sustentável no Brasil. Florianópolis: APED: SECCO, 2010. 83 BENKO, G. A ciência regional. Oeiras: Celta Editora, 1999. BRASIL. Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES. Relação de cursos recomendados e reconhecidos. Disponível em: < http://conteudoweb.capes.gov.br/conteudoweb/ProjetoRelacaoCursosServlet?acao=pe squisarIes&codigoArea=60500000&descricaoArea=&descricaoAreaConhecimento=PL ANEJAMENTO+URBANO+E+REGIONAL&descricaoAreaAvaliacao=PLANEJAMENT O+URBANO+E+REGIONAL+%2F+DEMOGRAFIA> Acesso em: 20 mar 2014. DELANEY, D. Territory: a short introduction. Oxford – UK: Blackwell publishing, 2005. COSTA, R. H. da. 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Conceitos de Ciência e a Política Científica, Tecnológica e de Inovação. Sociologias, Porto Alegre, v. 13, n. 26, 2011 . Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S151745222011000100006&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 17 mar 2013. 85 GT4- CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL Potencial Tecnológico da Universidade Pública e Sua Contribuição Para o Desenvolvimento Regional e Local¹ Felipe Augusto Lopes Carvalho²; Janiel Célio Dos Santos²; Romário Lustosa De Oliveira²; Elizabete Cristina Sousa Araújo³; Simone Silva Dos Santos Lopes 4 Núcleo de Inovação e Transferência Tecnológica – NITT/UEPB RESUMO As universidades produzem diversas tecnologias resultantes de suas pesquisas que podem atender às demandas sociais e auxiliam o desenvolvimento nacional. A Universidade Estadual da Paraíba – UEPB vem aumentando o número de pesquisas nas várias áreas do conhecimento, bem como a sua capacidade de gerar produtos inovadores. Prospectar o potencial inovador das pesquisas realizadas na UEPB representa um compromisso institucional com o desenvolvimento econômico, tecnológico e social da região, além de incentivar a cultura da inovação no ambiente da universidade. O objetivo deste trabalho é apresentar o mapeamento tecnológico realizado nas pesquisas desenvolvidas no Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da UEPB, visando avaliar o potencial e capacidade que as suas pesquisas têm de gerar inovação, novos produtos e processos aptos a contribuir com o desenvolvimento tecnológico regional. PALAVRAS-CHAVE: Inovação Tecnológica; Universidade; Desenvolvimento Regional; Mapeamento tecnológico ¹ Trabalho apresentado no GT 4 – CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL – II SEDRES, Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014 ² Graduando na Universidade Estadual da Paraíba ³ Técnico Administrativo do Núcleo de Inovação e Transferência Tecnológica – NITT/UEPB 4 Coordenadora da Pesquisa – Professora do Departamento de Biologia- CCBS/UEPB. E-mail: [email protected] INTRODUÇÃO O desenvolvimento de um país está alicerçado sob a coluna do conhecimento, expresso no conhecimento científico, e na produção tecnológica. A produção tecnológica é caracterizada pela geração de produtos e de processos tecnológicos, com o intuito de contribuir na solução de problemas práticos, o que pode ser comumente chamado de inovação. Segundo o site Inventta, o conceito de inovação é bastante variado, dependendo, principalmente, da sua aplicação. De forma sucinta, a inovação ocorre quando se cria ou se descobre uma nova utilidade, com um valor comercial para uma ou mais invenções, sempre em resposta às necessidades sociais e comerciais por novas ideias, tecnologias, processos, infraestruturas, compromissos, problemas ou possibilidades. Pode- se dizer que no processo de inovação tecnológica de um país, três atores têm papel preponderante, estando nos vértices do famoso “triângulo de Sábato”: a iniciativa privada, com as Empresas; a iniciativa pública, com o Governo; e as Universidades, incluindo as instituições públicas e as privadas. Cada um possui um papel importante no processo de inovação, e a integração e cooperação desses três componentes constitui um desafio para qualquer país que almeja uma posição de destaque em sua produção tecnológica. Historicamente, no Brasil, a pesquisa científica ficou adstrita ao universo acadêmico, enquanto a produção tecnológica era vista como um tema alheio ao interesse das salas de aula e laboratório das universidades, ficando concentrada nas empresas. Nesse sentido, Edwin Mansfield (1996), pesquisando as fontes de ideias para inovação tecnológica no estudo Contribuições da nova tecnologia para a economia, descobriu que menos de 10% dos novos produtos ou processos introduzidos por empresas dos Estados Unidos tiveram contribuição essencial e imediata de pesquisas acadêmicas: “A maioria dos novos produtos ou processos que não poderiam ter sido desenvolvidos sem o apoio de pesquisa acadêmica não foram inventados em universidades”, reitera Mansfield. No Brasil, a realidade é bem diferente da americana. Enquanto nos EUA as empresas investem massivamente em pesquisa e desenvolvimento, a realidade brasileira ainda se firma na ideia que apenas a universidade deve investir em Pesquisa, conforme aduz Cruz (2006): “O entendimento de que a pesquisa aplicada e o desenvolvimento necessários à criação de inovação tecnológica e competitividade deve ocorrer na empresa é um conceito ainda incipiente no Brasil. Acontece que, como a quase totalidade da atividade de pesquisa que ocorre no Brasil se dá em ambiente acadêmico, o senso comum tende à conclusão de que seria normal apenas universidades fazerem Pesquisa e Desenvolvimento.” Embora ocupe um lugar de destaque em termos de produção científico-literária, o Brasil ainda encontra-se engatinhando no que diz respeito à inovação tecnológica advinda de pesquisas realizadas nas universidades, reflexo da falta de uma interação empresa-universidade. Segundo Cruz (2006), o Brasil construiu uma base acadêmica forte, mas ainda não conseguiu inserir a pesquisa na indústria, sendo esta a raiz das dificuldades em se converter conhecimento em desenvolvimento. Com o passar do tempo, começou a ser percebida a necessidade de unir a protagonista na produção de conhecimento científico, as universidades, e o setor empresarial, aquele capaz de transformar esse conhecimento em riqueza, sob a fiscalização e incentivos do governo. Neste cenário de mudanças culturais para o avanço da inovação tecnológica do país, começa a ser difundida a ideia de “Universidade Empreendedora”, uma atualização para o modelo tradicional das universidades, configurando-se agora como aquela que desenvolve um sistema interno que compreende a comercialização do conhecimento gerado nas pesquisas e inclui, não apenas estruturas, tais como os escritórios de transferência de tecnologia (que auxiliam nas relações entre as empresas e a academia), mas também incentivos para o ajuste de linhas de estudo e a alocação de orçamentos de pesquisa para a demanda dos setores público e privado. Este modelo acadêmico visa ressaltar o potencial econômico de seus esforços de pesquisa, e considera que, para as empresas, a academia pode ser uma fonte de novidades científicas e rupturas tecnológicas para alimentar seu processo de inovação (PARREIRAS, apud SILVEIRA, 2005). Sem dúvidas, a universidade constitui um dos ambientes com a maior incidência de produção tecnológica, aliando o conhecimento científico, adquirido com as pesquisas executadas, ao desenvolvimento social e econômico, quando os frutos das pesquisas resultam em produtos e processos que atendem as necessidades sociais. De acordo com Fava-de-Moraes “a pesquisa básica executada ‘espontaneamente’ pela Universidade ainda é comprovadamente a maior fonte de resultados aplicáveis do que a pesquisa dita ‘encomendada’ por empresa”. O levantamento do potencial tecnológico de uma universidade permite a identificação do seu retrato tecnológico, ou seja, a identificação das áreas de maiores produções e consequentemente contribuição para o desenvolvimento regional e o local, por meio da transferência do conhecimento gerado internamente para a sociedade. O CASO DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA No Brasil, as Instituições de Ciência e Tecnologia – ICTs produzem diversas tecnologias resultantes de suas pesquisas que, de alguma maneira, solucionam problemas científicos e tecnológicos com a finalidade de desenvolvimento nacional. A Universidade Estadual da Paraíba – UEPB, a cada ano, vem aumentando o número de pesquisas nas várias áreas do conhecimento, bem como a sua capacidade de gerar produtos inovadores. Em breve, poderá estar mais bem posicionada nas pesquisas e rankings sobre as ICT geradoras de inovação tecnológica do País. A UEPB possui oito campi distribuídos pelo estado, num total de 17 programas de pós-graduações, 46 cursos de graduação e 2 de nível técnico, sendo estruturada em 12 centros de estudos. Seguindo a tendência tecno-científica atual, a UEPB se insere nos trilhos do desenvolvimento nacional como uma ICT dotada de grande potencial inovador, especialmente com a implantação do Núcleo de Inovação e Transferência Tecnológica – NITT, responsável pela gestão da propriedade intelectual e pela transferência de tecnologias da instituição. A inclusão das atividades da inovação na agenda da UEPB, mediada pelas atividades do seu Núcleo de Inovação e Transferência Tecnológica - NITT, representa o compromisso institucional de se inserir no arranjo nacional da política de inovação, contribuindo, também, com soluções inovadoras para superação dos problemas regionais, através da possibilidade da transferência dessas tecnologias para a sociedade. O objetivo deste trabalho é expor o mapeamento realizado pelo NITT das pesquisas desenvolvidas em um dos Centros da Universidade Estadual da Paraíba, o Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS), especificamente nos cursos de Farmácia, Ciências Biológicas e Odontologia, visando avaliar o potencial e capacidade que as pesquisas têm de gerar inovação, desenvolvendo produtos e processos inovadores aptos a contribuir com o desenvolvimento tecnológico regional; identificar as pesquisas cujos resultados são passíveis de proteção com base nas leis de propriedade industrial; avaliar e fomentar a interação universidade-empresa; além de identificar e divulgar o perfil tecnológico da UEPB com base nas pesquisas desenvolvidas com potencial tecnológico. METODOLOGIA A metodologia interdependentes: empregada no mapeamento envolveu cinco etapas 1 – Análise, por área, de todas as pesquisas cadastradas nos programas institucionais de pesquisa e pós- graduação; 2 – Identificação dos pesquisadores e grupos de pesquisas que desenvolvem projetos com potencial inovador no CCBS; 3- Aplicação de questionários aos pesquisadores e grupos de pesquisas da UEPB vinculados aos programas institucionais de iniciação científica, visando obter informações referentes às pesquisas desenvolvidas na instituição; 4- Classificação das pesquisas para identificação dos tipos de proteção mais adequado para cada produto ou processo desenvolvido em cada pesquisa; 5 – Criação de um banco de dados com todo acervo tecnológico do CCBS da UEPB, que vise contribuir com o desenvolvimento local e regional, por meio da divulgação das ofertas que possam contribuir com a demanda da sociedade; Resultados e Discussões Seguindo a proposta metodológica do projeto, foram aplicados questionários aos pesquisadores do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS) ligados aos programas institucionais de pesquisa, como Programa Institucional de Iniciação Científica (PIBIC) e Pós-graduação, com o intuito de obter informações acerca do potencial inovador das pesquisas desenvolvidas na UEPB. No total, foram analisados 54 projetos de pesquisa, sendo 12 do curso de Ciências Biológicas, 21 de Farmácia e 21 de Odontologia. Dentre os 12 projetos do curso de Ciências Biológicas, 2 apresentam potencial inovador, visando à obtenção de um processo na área da ecologia. Ambos estão associados ao desenvolvimento de sistemas de tratamento de águas de abastecimento. Tendo em vista que a Paraíba, especialmente o semiárido paraibano, traz em sua história sequelas das secas que ano após ano afligem a população, garantir a segurança hídrica e a qualidade do abastecimento de água é um objetivo que permeia a atuação dos governantes em todas as épocas. Dessa forma, não restam dúvidas que o desenvolvimento de um processo que venha a inserir no mercado inovações no tratamento de águas de abastecimento representa uma enorme contribuição ao desenvolvimento tecnológico e social. Dos 21 projetos analisados do curso de Farmácia, 17 foram avaliados como possuidores de potencial inovador, dentre os quais 11 para a introdução de produtos no mercado, envolvendo medicamentos potencialmente comercializados com empresas de farmacologia bioquímica e molecular; e 6 voltados ao desenvolvimento de processos farmacêuticos. O mercado farmacêutico movimenta anualmente R$ 28 bilhões e a tendência é de expansão. O Brasil tem cerca de 540 indústrias farmacêuticas cadastradas, configurando-se como o nono maior mercado de fármacos e medicamentos do mundo, segundo dados do Portal Brasil (2014). Um grande investimento em pesquisa é realizado pelas indústrias farmacêuticas, atendendo às demandas em escala global por inovações nessa área. A pesquisa realizada nas universidades, tomando por paradigma os resultados obtidos na UEPB, representa um forte aliado no desenvolvimento de novos produtos e processos farmacêuticos, impulsionando o desenvolvimento tecnológico regional. Dotados de alto valor comercial, quando esses produtos e processos são introduzidos ou aperfeiçoados no ambiente produtivo, contribuem também com o desenvolvimento social, disponibilizando à sociedade fármacos outrora inexistentes ou restritos aos laboratórios universitários, e em grande parte com valores mais acessíveis para a população. Foram analisadas 21 pesquisas do curso de Odontologia. Destas, verificou-se que 2 são dotadas de potencial inovador. Uma delas está voltada ao desenvolvimento de produtos farmacêuticos aplicados na clínica odontológica; e a outra relacionada ao desenvolvimento de um processo aplicável em clínicas odontológicas. A UEPB dispõe atualmente de uma clínica-escola que atende a população local, além de inúmeros projetos de extensão que oferecem serviços odontológicos gratuitamente à comunidade. As pesquisas com potencial inovador na área odontológica resultam em melhorias no atendimento a população já beneficiada, além do potencial mercadológico que certamente pode resultar no desenvolvimento regional, alcançando um número indeterminado de pessoas. A partir dos resultados obtidos no Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS/UEPB), do total de 54 pesquisas analisadas, 21 apresentam potencial inovador, representando cerca de 39%, divididos entre os cursos de Ciências Biológicas, Farmácia e Odontologia, conforme demonstrados na tabela abaixo (Tabela 1). Tabela 1. Pesquisas com potencial inovador por curso Ciências Biológicas Farmácia Odontologia Pesquisas analisadas 17 21 21 Pesquisas com potencial inovador 2 17 2 12% 81% 1% Porcentagem das pesquisas com potencial inovador Farmacologia Áreas Ecologia Bioquímica e molecular Clínica Odontológica Fonte: autoria própria, 2014 De acordo com NELSON (1993), um Sistema Nacional de Inovação (SNI) pode ser definido como uma rede de instituições públicas e privadas que interagem para promover o desenvolvimento científico e tecnológico de um país. Nesse Sistema, interagem as universidades, escolas técnicas, institutos de pesquisa, agências governamentais de fomento, empresas de consultoria, empresas industriais, associações empresariais e agências reguladoras. Quanto maior a integração dos agentes de um SNI, mais desenvolvido será o país. Durante a análise dos resultados, percebeu-se que muitas pesquisas são desenvolvidas com a colaboração de outras instituições, a grande maioria universidades públicas. Essas instituições estão descritas na tabela abaixo. (Tabela 2) Tabela 2. Instituições colaboradoras das pesquisas por curso Curso Instituições colaboradoras * Ciências Biológicas UFPB, UFPE Farmácia UFPB, UFPE, FIOCRUZ/BA, UFCG, USP, CETENE, INSA Odontologia UFCG, UFMG, UFRN, UPE-FOP, HOSPITAL NAPOLEÃO LAUREANO, UNICAMP Fonte: autoria própria, 2014 Como se percebe, a maioria das instituições que desenvolvem pesquisas em conjunto com a UEPB são igualmente universidades públicas. No que se pese a importância destas parcerias para o crescimento da inovação tecnológica do país, não se pode deixar de reconhecer a pouca participação de empresas no desenvolvimento de pesquisas inovadoras, ratificando as dificuldades apontadas por Cruz (2006) no tocante à necessidade de implementação de esforços conjuntos, por parte das empresas e universidades, em Pesquisa & Desenvolvimento. Conforme visto, cerca de 39% das pesquisas analisadas no CCBS/UEPB apresentam potencial inovador, podendo resultar em produtos e processos industrializáveis, aptos a contribuir com o desenvolvimento tecnológico e social. *Instituições colaboradoras: UFPB: Universidade Federal da Paraíba UFPE: Universidade Federal de Pernambuco FIOCRUZ/BA – Centro de Pesquisa Gonçalo Moniz UFCG: Universidade Federal de Campina Grande USP: Universidade de São Paulo CETENE: Centro de Tecnologias Estratégicas do Nordeste INSA: Instituto Nacional do Semiárido UFMG: Universidade Federal de Minas Gerais UFRN: Universidade Federal do Rio Grande do Norte UPE-FOP: Faculdade de Odontologia de Pernambuco UNICAMP: Universidade Estadual de Campinas Apesar do desconhecimento por parte dos pesquisadores da importância e a viabilidade tecnológica de sua pesquisas, observa-se que o potencial retratado pelo UEPB tem buscado atender a demanda local, solucionando problemas que afetam a população como a questão da água e saúde bucal da população. Indubitavelmente, o setor empresarial é aquele capaz de transformar o conhecimento científico em riqueza, quando os pesquisadores comercializam suas tecnologias com as empresas. Entretanto, a falta de interação universidade-empresa reside no fato de que, até o momento, em nenhuma das pesquisas analisadas existe o contato com alguma empresa interessada nos produtos ou processos advindos das pesquisas. De acordo com estes resultados, pode-se afirmar, de modo empírico e superficial, que a Lei de Inovação (10.973/04) não está produzindo os efeitos desejados quando da sua promulgação, pois a Lei enfatiza em diversos dispositivos a interação universidade-empresa, como ao facultar às ICT’s a possibilidade de celebrar contratos de transferência de tecnologia e de licenciamento para outorga de direito de uso ou de exploração de criação por ela desenvolvida às empresas, ou a possibilidade de a universidade compartilhar de seus laboratórios e demais instalações com as empresas interessadas, mediante acordo ou parceria. Conclusões Em primeiro lugar, pode-se concluir que, a partir dos resultados obtidos tomando por paradigma a Universidade Estadual da Paraíba, a universidade pública é um grande instrumento para o desenvolvimento tecnológico de uma nação, pois desenvolve inúmeras pesquisas cujos resultados podem acarretar em produtos e processos aptos a ingressarem no mercado, atendendo às demandas sociais, contribuindo assim para o desenvolvimento local e regional. O Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS) da UEPB apresenta um perfil tecnológico voltado às áreas de ecologia, especificamente relacionado a sistemas de tratamento de água; e o desenvolvimento de medicamentos utilizando biomateriais e moléculas bioativas, com aplicação também em clínicas odontológicas. Dessa forma, há de se reconhecer o papel da UEPB como catalisadora do desenvolvimento tecnológico e social, caminhando a passos largos para uma posição de destaque no arranjo nacional da política de inovação. Entretanto, apesar do potencial tecnológico que a UEPB apresenta, percebe-se que a interação universidade-empresa ainda é bastante precária, inviabilizando a introdução de produtos e processos inovadores para a sociedade. Dessa forma, conclui-se também pela necessidade de se fomentar a interação universidade-empresa, visando o aprimoramento das relações de comercialização de tecnologias advindas de pesquisas desenvolvidas na Universidade para atender a demanda local e regional. Referências Bibliográficas: BERNARDES, J.; Desafios das Universidades Empreendedoras: Universidade Tradicional X Universidade Corporativa. Fortaleza, CE, 2006. Disponível em: < http://www.abepro.org.br/biblioteca/ENEGEP2006_TR470319_8126.pdf>. Acesso em maio de 2014 BRASIL. Lei n. 10973, de 2 de dezembro de 2004. Dispõe sobre incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato20042006/2004/lei/l10.973.htm> Acesso em março de 2014 CRUZ, C.; A Universidade, a Empresa e a Pesquisa. Disponível http://www.ifi.unicamp.br/~brito/artigos/univ-empr-pesq-rev102003b.pdf Acesso maio de 2014 em: em FAVA-DE-MORAES, F. Universidade, inovação e impacto socioeconômico. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 14, n. 3, 2000. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010288392000000300003&lng=pt&nrm=iso>. MANSFIELD, E.; Contributions of new technology to the economy, em Technology, R&D and the Economy, ed. Bruce Smith e Claude Barfield. P. 125 The Brookings Institutions, Washington, DC, 1996. PARREIRAS, Viviane Masseran Antunes. Processos de transferência de conhecimento e interações entre universidades e empresas: o caso da PUC-Rio. 2010. 88p. Dissertação de Mestrado em Engenharia de Produção – Universidade Federal do Rio de Janeiro/COPPE, Rio de Janeiro, 2010 Portal Brasil. Saiba mais sobre a indústria farmacêutica do País. Disponível em:<www.brasil.gov.br/ciencia-e-tecnologia/2010/12/industria-farmaceutica> Acesso em 07/07/2014 GT4 - CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL O Setor de Tecnologia da Informação e Comunicação no Conjunto da Economia Brasileira1 Danillo Alves de OLIVEIRA2 Ângela Cristina Trevisan FELIPPI3 Cidonea Machado DEPONTI4 Carlos Eduardo Ruschel ANES5 RESUMO O processo de globalização ocorrido nas últimas três décadas do século XX, ocasionou profundas transformações nos âmbitos, político, econômico, científico e tecnológico em escala global, especialmente nos meios de produção, onde a busca por competitividade levou as empresas e corporações a buscarem a máxima eficiência produtiva, tendo como foco a redução dos custos de produção e aumento da produtividade. Entretanto, tal fato somente poderia ser alcançado com adoção de recursos tecnológicos nos diversos segmentos que compõem as economias. O objeto deste estudo consistiu em analisar e discutir o comportamento do setor de Tecnologia da Informação e Comunicação - TIC no Brasil a partir do período compreendido entre 2003 a 2006, tendo como referência os segmentos da indústria, comércio e serviços, evidenciando assim a importância do setor de TIC para o conjunto da economia nacional, nos níveis de geração de emprego e renda, e composição da balança comercial, sendo demonstrado que o segmento que mais absorveu TIC foi o de serviços, entretanto o que apresentou maiores índices de crescimento foi o comércio. Com relação às importações e exportações, ficou visível o predomínio da dependência tecnológica. PALAVRAS-CHAVE: Competitividade, Produtividade, Setores Econômicos, Tecnologia. 1 Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Doutorando em Desenvolvimento Regional pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC ([email protected]). 3. Professora do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC ([email protected]). 4. Professora do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC ([email protected]). 5. Doutorando em Desenvolvimento Regional pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC ([email protected]). 2 98 INTRODUÇÃO A busca pela eficiência produtiva e competitiva destacada em plena era estabelecida pelo processo de globalização, levou as empresas, em especial, a partir da segunda metade da década de 1970, a redesenhar seus processos produtivos, cujo foco incidiu-se, principalmente, sobre a redução dos custos de produção, do aumento da capacidade produtiva e do ganho de competitividade. Entretanto, essa condição somente seria alcançada a partir de um processo pautado na utilização de tecnologias, efetivadas através do uso de sistemas computacionais, essencialmente propiciados pelo desenvolvimento da microeletrônica, da inteligência dos softwares e pela organização e expansão das redes de telecomunicação, reestruturando desta forma o modelo dos processos produtivos, permitindo assim a inserção de mecanismos de automação que alavancasse ganhos de produção em escala. Desta forma, os investimentos em tecnologia seriam imprescindíveis, e a adoção de tais mecanismos tornou-se estratégico para obtenção de competitividade frente aos mercados interno e externo, ao tempo em que a informação assumia uma importância ainda maior na estrutura organizacional e produtiva das empresas, onde até então, a acumulação de riqueza estruturavase quase que unicamente na produção de bens tangíveis. Para o conjunto da economia brasileira, esta condição não é contrária, e, portanto, a investigação do complexo de elementos que estruturam a dinâmica dos agregados econômicos contidos no setor de TIC no país, tal como, sua observância no comportamento da economia nacional, faz-se importante para a compreensão dos aspectos que influenciam as variáveis econômicas, como, número de empresas de TIC, número de pessoal ocupado, salários e composição da balança comercial. Este estudo consiste em analisar as variáveis econômicas acerca do setor de TIC no Brasil, buscando evidenciar dentre os setores da indústria, comércio e serviços, o valor econômico adicionado por este segmento nos níveis de geração de empregos, renda e pela participação nas importações e exportações, mediante os produtos e serviços ofertados por este segmento no mercado brasileiro. Os dados aqui constantes foram coletados a partir da pesquisa divulgada pelo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística em 2009. Este trabalho contempla o levantamento de dados do setor de Tecnologia da Informação e Comunicação entre os anos de 2003 e 2006. Apesar dos dados não serem de um período tão recente, torna-se relevante enfatizar que até o presente momento, esta é a atual pesquisa levantada pelo IBGE, que relaciona os agregados econômicos da economia, ao setor de TIC. Para análise da evolução dos resultados será utilizada a taxa geométrica de crescimento TGC, que consiste em verificar o comportamento do agregado em relação ao tempo, utilizando o valor inicial e o valor final ou ajustando a uma regressão. 99 DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO A busca contínua pelo crescimento econômico, diversas tecnologias foram desenvolvidas e aprimoradas no decorrer do século XIX e início do século XX, até se chegar à era da informática, nas proximidades da década de 1940, quando surge o primeiro computador programável, que naquele instante, não tinha fins comerciais apenas militares, cabendo aqui ressaltar, que a utilização para fins comerciais somente ocorreu a partir do final da década de 1950. Entretanto, até meados da década de 1970 a computação era dominada pelos chamados computadores de grande porte ou mainframes, que restringia o seu uso ao governo e as grandes corporações. A popularização dos computadores tem início a partir do final desta última década, propiciada através do surgimento do microcomputador e a sua massificação nas décadas seguintes. Castells (2005, p.91), relata que a década de 1970 influenciou de forma significativa o contexto estrutural das inovações que ali emergiram, e, por sequência, desenvolveram-se nas décadas seguintes, modo pelo qual, tornaram-se determinantes na forma como a tecnologia estabeleceu sua interação com a sociedade, especialmente a partir do século XXI. E nesta perspectiva do surgimento de novas tecnologias e inovações, a utilização de computadores no desenvolvimento das atividades produtivas expandiu-se rapidamente e chegou à indústria ainda nas décadas de 1970 e 1980, causando, em primeira instância, profundas transformações nos modelos de produção e, seguidamente, nas formas de negócios, permitindo automação dos processos industriais, e, por consequência redução de custos e ganho de produtividade em escala. Neste sentido, Fusfeld (2003), salientou a importância do crescimento econômico a partir do contexto tecnológico. O crescimento econômico também estimulou rápidos avanços tecnológicos. Computadores e controles eletrônicos tornaram possível a automação em larga escala, particularmente na manufatura e na administração de empresas. À medida que o capital foi substituindo o trabalho em escala crescente, a natureza do trabalho e da força de trabalho começou a mudar. Novos tipos de ocupações altamente qualificadas apareceram, tais como programadores e operadores de computadores, e novas qualificações foram exigidas da gerência. [...] (FUSFELD, 2003, p.227). Neste novo cenário, contextualizado e contemplado pelas mudanças de ordem tecnológica, concatenadas a um complexo de elementos como, o desenvolvimento, expansão e popularização gradativa do uso dos computadores, dos softwares, e dos meios de comunicação e a internet, foram importantes fatores que despertaram para o uso das tecnologias da informação e comunicação (TIC) para diversos fins, incluindo, o industrial, comercial e serviços, fato, essencialmente acontecido a partir da segunda metade da década de 1990, contudo, massivamente difundido nas primeiras décadas de 2000. 100 Para Cardoso (2001, p.39), “O desenvolvimento das capacidades tecnológicas dos sistemas de informação, durante os vários ciclos de investimentos em informática, produziu a cada momento novas modalidades de organização empresarial [...]”. As mudanças tecnológicas nas indústrias de computadores e de telecomunicação têm aumentado as economias de escala e de escopo, ocasionando um profundo impacto no funcionamento das empresas. A tecnologia tem auxiliado na habilidade de manipular um grande volume de transações num custo unitário médio decrescente, de apoiar operações geograficamente dispersas por intermédio do processamento distribuído e de oferecer novos produtos e canais de distribuição (ALBERTIN 2001, p.43-44). Nesta direção, Castells (2005, p.119) atenta para o surgimento de uma nova economia em âmbito global nas décadas remanescentes do século XX, cujo alicerce, estabeleceu-se fundado na “[...] conexão histórica entre a base de informações/conhecimentos da economia, seu alcance global, sua forma de organização, em rede e a revolução da tecnologia da informação que cria um novo sistema econômico distinto”. Cardoso (2001) reforça que a utilização dos recursos tecnológicos na atualidade não está unicamente vinculada às questões que se referem ao contexto da produtividade e da competitividade, mas que sim, tornou-se um elemento decisivo para as empresas que queiram inserir-se e estabelecer-se nos novos mercados, especialmente aos que estão convergidos e estruturados por meio do comércio eletrônico, através da Internet. Ainda de acordo com Cardoso (2001, p.40), nesta circunstância que compreende o campo da adoção das tecnologias da informação e comunicação nos negócios, o que está em curso é a convergência de três principais elementos que caminham de forma conjunta dentro deste processo “[...] os negócios, a Internet e os sistemas de informação – estabelece novos esquemas de comunicação que visam a substituir antigos dispositivos, hoje insuficientes para atender novas necessidades de um mercado crescente e integrado, onde a informação está cada vez mais disponível e onde as mudanças ocorrem em ritmo muito mais acelerado”. E para concluir o debate teórico acerca da evolução das tecnologias da informação e comunicação, torna-se relevante enfatizar a importância que o conhecimento e a informação exerceram e ainda exercem sobre o processo de determinação e desenvolvimento do conjunto das atividades econômicas desempenhada pelas sociedades ao longo do progresso humano, que em consonância com Rosenberg & Birdzell (1986); Mokyr (1990), citado por Castells (2005, p.119), “Sem dúvida a informação e o conhecimento sempre foram elementos cruciais no crescimento da economia, e a evolução da tecnologia determinou em grande parte a capacidade produtiva da sociedade e os padrões de vida, bem como formas sociais de organização econômica”. 101 O SETOR DE TIC NO BRASIL O emprego nos setores econômicos O emprego é um agregado macroeconômico importante em qualquer economia do mundo, pois está diretamente vinculado à renda do trabalhador. Na Tabela 1, são apresentados os dados que se referem ao número de empresas pertencentes ao setor de TIC no período compreendido 2003 e 2006. TABELA 1 – Número de empresas no setor de TIC e variação anual de crescimento Ano 2003 2004 2005 2006 Número de empresas 55.597 55.667 58.359 65.754 Variação anual (%) 0,13% 4,84% 12,67% Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor. O setor de TIC tem apresentado crescimento considerável no número de empresas, passando de 55.597 em 2003 para 65.754 em 2006 no número de estabelecimentos, que representa um aumento de 18,3% no período, e uma taxa de crescimento de 5,5% ao ano. Comparando os dados de crescimento em número de empresas deste segmento com o da indústria nacional, no mesmo período, nota-se que o setor de TIC tem proporcionado maior contribuição, sendo que a quantidade de estabelecimentos industriais variou 11,9% a uma taxa de 3,6% anualmente, conforme mostra a Tabela 2. TABELA 2 – Número de empresas no setor da indústria e variação anual de crescimento. Ano 2003 2004 2005 2006 Número de empresas 138.612 143.979 147.414 155.056 Variação anual (%) 3,87% 2,39% 5,18% Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor. Essa elevação no número de empresas tem impactado o número de pessoal ocupado, mostrando que as empresas de TIC contribuem para o aumento do nível de empregos no país, conforme dados na Figura 1. 102 Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor. FIGURA 1 – Número de pessoal ocupado nas empresas de TIC e taxa de crescimento, em % ao ano, no período de 2003 a 2006. Pode-se constatar no gráfico acima, que houve um aumento significativo no número de pessoas ocupadas, passando de 478.446 em 2003 para 673.024 em 2006, que correspondeu à variação no período de 40,7%, com uma taxa de crescimento de 11,2% ao ano. Outro dado importante a ser observado refere-se à comparação do número total de pessoal ocupado do setor de TIC em relação aos demais setores econômicos, permitindo assim evidenciar o percentual de participação deste setor no nível de emprego na economia brasileira. Neste caso é importante salientar que os dados dos demais setores econômicos são representados pela junção dos segmentados da indústria, comércio e serviço, conforme demonstrado na Tabela 3. TABELA 3 – Número total de pessoal ocupado do setor de TIC em relação ao total dos demais setores econômicos – indústria, comércio e serviço, no período de 2003 a 2006. Setores econômicos e TIC Setor TIC (A) Demais setores econômicos (B) Participação (A/B) - % Total de pessoal ocupado 2003 2004 2005 2006 478.446 542.005 593.654 673.024 18.333.651 19.685.344 20.847.579 22.527.924 2,61 2,75 2,85 2,98 Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor. Com base nos dados da tabela acima, nota-se que o número de pessoal ocupado no setor de TIC apresentou um crescimento em percentual, frente aos demais setores econômicos, evoluindo sua participação em 2003 de 2,61% do total de pessoal ocupado para 2,99% em 2006, a uma taxa de crescimento do percentual de 4,39% ao ano (Figura 2). 103 Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor. FIGURA 2 – Evolução da participação do setor de TIC em relação aos demais setores econômicos, no período de 2003 a 2006. O número de pessoal ocupado pelo setor de TIC também pode ser fragmentado individualmente nos setores da indústria, comércio e serviço, possibilitando a observação do percentual de postos de trabalho em relação a cada um destes setores econômicos. Estes dados são apresentados nas Tabelas 4, 5 e 6. TABELA 4 – Participação de pessoal ocupado do setor de TIC no segmento da indústria. Setores econômicos Indústria TIC Setor TIC (%) Variação anual (%) Total de pessoal ocupado 2003 2004 2005 2006 5.971.280 6.386.190 6.430.682 6.776.736 126.416 147.028 153.343 172.370 2,12 2,30 2,38 2,54 16,30 4,30 12,41 Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor. TABELA 5 - Número de pessoal ocupado do setor de TIC no segmento de comércio. Setores econômicos Comércio TIC Setor TIC (%) Variação anual (%) Total de pessoal ocupado 2004 2005 2006 2003 5.965.861 6.360.723 6.915.768 7.599.505 13.071 14.531 18.172 22.003 0,22 0,23 0,26 0,29 11,17 25,06 21,08 Fonte: IBGE (2009), adaptada pelo autor. 104 TABELA 6 – Número de pessoal ocupado do setor de TIC no segmento de serviços. Setores econômicos Serviços TIC Setor TIC (%) Variação anual (%) Total de pessoal ocupado 2004 2005 2006 2003 6.396.510 6.938.431 7.501.129 8.151.683 338.959 380.446 422.139 478.651 5,30 5,48 5,63 5,87 12,24 10,96 13,39 Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor. Analisando os dados das três últimas tabelas apresentadas pode-se extrair uma série de informações econômicas de relevância ao setor de TIC. Na primeira identificou-se que dentre os setores da indústria, comércio e serviços o segmento que possuem menor participação em números de pessoas ocupadas do setor de TIC é o comércio. Entretanto, analisando a variação de crescimento no período, observa-se que foi o segmento que apresentou a maior variação de crescimento, chegando a 68,33% e a uma taxa de crescimento 17,86% ao ano. Com base na análise dos números, conclui-se que no período verificado o comércio é o setor que mais cresceu em número de pessoas ocupadas. É importante ressaltar que o setor de comércio nos últimos anos vem passando por fase de adaptação nas relações entre consumidores e fornecedores em função do crescimento do comércio eletrônico, ou seja, as vendas de produtos e serviços pela internet. Nesse tipo de transação tornou-se comum o pagamento por meio eletrônico, através do uso dos cartões de crédito e débito em substituição ao papel moeda, fazendo-se necessário maior investimento em tecnologia por parte desse segmento, de modo que venha a dar suporte e segurança a esse novo modelo de negócio que se estabelece, justificando maior número de contratações. Dentre os setores citados o que apresentou uma menor variação no período foi o segmento da indústria com 36,35% de crescimento no período e a uma taxa 9,72% ao ano. Quanto ao setor de serviços, pode-se observar que é o segmento que absorve a maior quantidade de pessoal de TIC, comparando aos setores da indústria e comércio, e possui a segunda maior taxa de crescimento no período com 41,21% a uma taxa 11,39% ao ano. A Figura 3A ilustra a comparação da taxa de crescimento ao ano do número de pessoas ocupadas do setor de TIC dentro dos segmentos da indústria, comércio e serviços, evidenciando o alto crescimento do comércio em relação aos demais setores. É possível avaliar de forma gráfica a variação de crescimento no período do número de pessoas ocupadas, entre os setores da indústria, comércio e serviço, conforme apresentado na Figura 3B. 105 (A) (B) Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor. FIGURA 3 – (A) Comparação do TGC entre os setores da indústria, comércio e serviço no período de 2003 a 2006. (B) Variação do número de pessoal ocupadas do setor de TIC em relação aos segmentos da indústria, comércio e serviço no período de 2003 a 2006 Outra informação relevante que também pode ser demonstrada e corresponde à distribuição percentual do total de pessoas ocupadas do setor de TIC em 2006 nos segmentos da indústria, comércio e serviços (Figura 4). Fonte: IBGE (2009). FIGURA 4 – Percentual de pessoas ocupadas do setor de TIC em 2006. A renda dos setores econômicos O setor de TIC é caracterizado pela absorção de mão de obra com maior qualificação técnica e por consequência com remuneração salarial maior que a média de mercado, gerando desta forma outro agregado econômico de importância para a economia, a renda per capta. Segundo IBGE (2009), o salário médio mensal pago pelo setor de TIC em 2006 equivalia à R$ 2.025,18, enquanto a média da economia geral no mesmo período correspondia R$ 937,48, uma variação de 116,02% a mais para os ocupados no setor de TIC. Entretanto é importante enfatizar que mesmo tendo o salário médio mensal mais alto em relação aos demais setores econômicos, o segmento de TIC apresentou redução do nível salarial, enquanto os demais segmentos da indústria, comércio e serviços, apresentaram crescimento, conforme ilustrado na Tabela 7. 106 TABELA 7 – Variação salarial do setor de TIC em relação aos segmentos. Setores Econômicos TIC Indústria Comércio Serviços Nível salarial (R$ per capita) 2003 2004 2005 2006 2.056,85 2.042,28 2.025,69 2.025,18 1.232,69 1.247,24 1.302,32 1.337,93 549,24 569,52 595,30 623,72 845,13 849,54 862,85 897,09 Variação (%) - 1,54 8,54 13,56 6,15 Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor. Na tabela observa-se a variação salarial dos setores de TIC, indústria, comércio e serviços, com destaque para o segmento do comércio que atingiu uma variação de 13,56% entre 2003 e 2006, representando um crescimento anual de 4,26%, sendo seguidos pelos segmentos da indústria e serviços com variação de 8,54% e 6,15% e com taxa de crescimento anual de 2,89% e 1,95%, respectivamente. Já no segmento de TIC observa-se uma variação de 1,54% no período, com salário médio de R$2.056,85 em 2003 reduzindo para 2.025,18 em 2006, correspondendo a um decréscimo de 0,50% ao ano. O decréscimo de renda do setor de TIC ocorreu em função do subsetor de telecomunicação que passou por um processo de ajuste nas contratações, sendo neste período absorvido um número maior de pessoas, porém com nível salarial menor IBGE (2009). A participação dos produtos de TIC nas importações e exportações Outro agregado econômico que pode ser analisado corresponde à participação do setor de TIC nas importações e exportações brasileira no período compreendido entre 2003 e 2006. A Tabela 11 mostra a participação do setor de TIC nas exportações brasileira. TABELA 11 – Participação dos produtos de TIC nas exportações brasileira no período de 2003 a 2006. Total Exportação (A) % Total TIC (B) % Equipamentos de telecomunicação Computadores e equipamentos relacionados Componentes eletrônicos Equipamentos de áudio e vídeo Outros bens de TIC 100 3,2 1,8 100 2,3 1,2 100 3,4 2,4 100 3,2 2,3 0,3 0,5 0,3 0,2 0,3 0,4 0,3 0,2 0,3 0,3 0,1 0,2 0,3 0,2 0,1 0,3 Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor. Conforme demonstrado na Tabela 11, não houve variação do percentual total das exportações brasileiras de produtos de TIC no período, porém 107 observa-se que os equipamentos de telecomunicação são responsáveis pela maior parte de produtos de TIC exportados e neste segmento verifica-se uma variação do percentual de partição no período saindo de 1,8% para 2,3%, correspondendo a uma variação de 27,78% no período e a uma taxa de crescimento de 14,29% ao ano. Já nas importações observa-se um cenário diferente das exportações, sendo denotada uma dependência do Brasil de tecnologia externa e tal fato é demonstrado através do crescimento das importações de produtos de TIC. Na Tabela 12 são analisados os dados com referência ao total das importações e comparadas com o total de importações do setor de TIC. TABELA 12 – Participação dos produtos de TIC nas importações brasileira no período de 2003 a 2006. Total importação (A) % Total TIC (B) % Equipamentos de telecomunicação Computadores e equipamentos relacionados Componentes eletrônicos Equipamentos de áudio e vídeo Outros bens de TIC 100 12,5 1,2 100 13,4 1,4 100 14,1 1,5 100 14,3 1,3 2,4 6,2 0,7 1,9 2,3 6,9 0,9 1,9 2,5 7,2 1,1 1,8 2,8 7,3 1,2 1,7 Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor. Com base nos dados da Tabela 12, verifica-se que houve um crescimento das importações de produtos do setor de TIC no período, saindo de 12,5% do total das importações para 14,3%, representando uma variação de 14,40% no período. Dentre os produtos os que tiveram maior crescimento no percentual de importação foram os componentes eletrônicos com 17,74% e computadores e equipamentos relacionados com 16,67% de variação no período analisado. CONSIDERAÇÕES FINAIS Na análise dos dados, constatou-se uma alta taxa de crescimento do número de empresas de TIC no período, que por consequência influenciou de forma direta no número de pessoal ocupado do setor, cuja variação demonstrada foi inclusive superior ao aumento de número de empresas. Ainda com relação ao número de ocupados, o setor de TIC aumentou sua participação percentual no total de empregos gerados nos setores econômicos avaliados. Tal fato evidencia a expansão do setor de TIC dentro dos segmentos da indústria, comércio e serviço. Concomitantemente, o estudo contemplou a análise dos dados de pessoal empregado de forma fragmentada dentro de cada segmento econômico, ficando constatado que o setor de serviços é o segmento que mais emprega pessoal de TIC, sendo seguido pela indústria e por último o comércio. 108 Entretanto, ao comparar os dados, notou-se que apesar do setor de comércio possuir a menor representatividade em números de ocupados, foi o segmento que mais evoluiu no número de empregos gerados no período, ficando em segundo lugar o setor de serviços e por último a indústria. Com relação à análise dos dados sobre a renda, verificou-se que o setor de TIC possui a maior média salarial ou “renda per capta” entre os demais segmentos econômicos comparados. Essa diferença de renda pode ser justificada em função do tipo de mão de obra empregada nesse setor, sendo exigida maior qualificação técnica o que, por consequência, exige maior tempo de escolaridade. Todavia, é importante salientar que mesmo tendo o maior nível de renda, o setor de TIC apresentou um pequeno decréscimo nas remunerações, enquanto os demais segmentos da economia obtiveram crescimento no período avaliado, destacando-se novamente o setor de comércio que teve a maior variação salarial em relação à indústria e serviços respectivamente. O decréscimo da renda de TIC é justificado em função do maior número de contratações do subsetor de telecomunicações, entretanto com remunerações menores. Quanto aos dados de importação e exportação fica claro que o Brasil ainda é dependente de importação de tecnologia. No período observado, observou-se que o percentual de exportações de produtos de TIC se manteve no mesmo patamar, enquanto as importações apresentaram crescimento. E por fim, foi possível observar que o comércio, apesar da sua pequena representatividade frente ao setor de TIC brasileiro, demonstrou ser o segmento com maiores índices de crescimento no período verificado, sendo esta informação, justificada pela hipótese que compreende a mudança de comportamento da relação consumidor e fornecedor, ocasionada pelo crescimento do comércio eletrônico de produtos e serviços, incentivando desta forma os investimentos em TIC pelo comércio. REFERÊNCIAS ALBERTIN, Alberto Luiz. Valor Estratégico dos Projetos de Tecnologia da Informação. RAE – Revista de administração de empresas, São Paulo, v.41, n.3, p.42-50, jul./set. 2001. CARDOSO, Claudio. Cadeias Cooperativas nos Negócios Eletrônicos. In: Lemos, André; Palacios, Marcos (Org.). As janelas do Ciberespaço. Porto Alegre: Editora Sulina, 2001. p.39-50. CASTELLS, Manuel. A Sociedade em Rede. 8.ed. São Paulo: Terra e Paz, 2005. 698p. FUSFELD, Daniel Ronald. A Era do economista. São Paulo: Saraiva, 2001. 356p. IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. O setor de Tecnologia da Informação e Comunicação no Brasil 2003 – 2006. Rio de Janeiro: Diretoria de Pesquisas, 2009. 109 GT4 CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL Estratégias Locais de Desenvolvimento e Incubadoras de Empresas de Base Tecnológica no Brasil1 Maria Alice Lahorgue Universidade Federal do Rio Grande do Sul Resumo Existem no mundo cerca de 7.000 incubadoras de empresas. No Brasil, elas são 384, distribuídas em todo o território nacional, tendo fortes elos com as localidades onde estão implantadas. Este artigo investiga, a partir da percepção de gerentes de incubadoras brasileiras, quais os limites dos governos municipais para um maior protagonismo em relação à inovação. Para isso foi utilizado um questionário baseado no conceito de recursos territoriais. Foram entrevistados 14 gerentes de incubadoras localizadas em todas as grandes regiões do país, com exceção do Centro-Oeste. Os resultados mostram que ações de incentivo e de reestruturação dos governos municipais serão necessárias para sua integração ao sistema nacional de inovação. Palavras-chave Incubadoras de empresas; recursos territoriais; sistemas de inovação; sistemas locais de inovação. INTRODUÇÃO As incubadoras de empresas já têm mais de 50 anos de história. Considera-se que a primeira incubadora de empresas tenha surgido nos Estados Unidos, na cidade de Batavia, estado de Nova Iorque. Em 1959, foi criado o Batavia Industrial Center, aproveitando as instalações de uma fábrica de máquinas e implementos agrícolas que havia fechado as portas. Esse empreendimento propôs-se a abrigar várias pequenas empresas ao mesmo tempo, mediante a subdivisão dos pavilhões (HACKETT, 1 DILTS, 2004). Um Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional - II SEDRES, Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014. 110 desses empreendimentos era uma incubadora de pintos, dando origem à designação que se popularizou nos anos seguintes. No Brasil, na década de 1980, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq implantou o primeiro Programa de Parques Tecnológicos no país, baseado em estudos realizados em incubadoras e parques científicos britânicos e americanos. Essa iniciativa desencadeou o surgimento de incubadoras de empresas, pois o país não tinha ainda massa crítica para a implantação de parques tecnológicos, o que veio a acontecer mais recentemente. Inicialmente, as incubadoras estavam focadas apenas em setores tecnológicos, de informática, biotecnologia e automação industrial e tinham como propósito a criação de empresas que pudessem levar ao mercado novas ideias e tendências tecnológicas. Atualmente, além do objetivo inicial, elas têm o propósito de contribuir para o desenvolvimento local e setorial. De maneira geral, as incubadoras de empresas são caracterizadas por serem organizações que oferecem um conjunto de elementos facilitadores do desenvolvimento de empresas emergentes: espaço físico, consultoria e capacitação, acesso a financiamento, acesso a redes de negócios, acesso a tecnologia (LAHORGUE, 2004, ZEDTWITZ, GRIMALDI, 2006). As diferenças serão encontradas nas combinações feitas desses elementos pelas incubadoras para cumprir com suas funções. Buscando organizar melhor o setor no Brasil, vários passos já foram dados, além da inserção das incubadoras nos diferentes planos de desenvolvimento, entre eles: criação do PNI, promovendo a integração entre os principais atores do sistema, implantação do SAPI (Sistema de Acompanhamento de Parques e Incubadoras) no Portal Inovação, oportunizando o acesso às informações e indicadores de desempenho das incubadoras e das empresas incubadas de forma padronizada, e a introdução do CERNE (Centro de Referência para Apoio a Novos Empreendimentos), que se constitui num sistema de qualidade promovido pela Anprotec , sua idealizadora, e pelo Sebrae , que o colocou no centro de sua ação de apoio às incubadoras. 111 Dessa evolução aparecem duas fortes tendências: a primeira é a adaptação das incubadoras às necessidades locais de desenvolvimento, espelhada na diferenciação ocorrida; a segunda é traduzida pela sua inserção nas políticas públicas. Essa segunda tendência ainda se manifesta mais fortemente no âmbito federal, que detém os principais programas de apoio, sejam públicos, como CNPq ou Finep, sejam parapúblicos, como o Sebrae Nacional. Dessa forma, parece existir um relativo vácuo entre a ação local das incubadoras, que é incentivada pelo CERNE, e as políticas públicas a elas direcionadas. No que se refere às políticas municipais, esse descompasso pode dificultar o atingimento por parte das incubadoras de objetivos de contribuição ao desenvolvimento local, diminuindo seu impacto. Este artigo investiga como os gerentes de incubadoras no país percebem a capacidade institucional, social e econômica local para planejar o desenvolvimento, dando indicações sobre os maiores gargalos e as principais potencialidades a serem consideradas para o preenchimento da lacuna ora observada. Além dessa seção introdutória e das conclusões, o artigo está organizado em três seções. A primeira trata da visão da literatura sobre a interação entre incubadoras, ambiente local e sistema de inovação. O método é apresentado na próxima, que é seguida pela análise dos resultados obtidos. INCUBADORAS DE EMPRESAS E AMBIENTE LOCAL Existem cerca de 7.000 incubadoras de empresas no mundo, segundo estimativa atual da National Business Incubation Association (NBIA). Elas têm muitos pontos comuns, independentemente de sua localização: disponibilização de espaço cedido mediante taxa de uso a pequenas empresas emergentes, oferecimento de serviços básicos (limpeza, secretaria) e de serviços de capacitação e apoio (consultorias em gestão, comercialização, desenvolvimento), objetivos de criação de empregos e dinamização da economia, ausência de fins lucrativos na maioria dos casos, entre outros. Esses elementos comuns indicam a existência de um padrão mínimo do que se conceitua como uma incubadora de empresas, favorecido pela relativa juventude de sua 112 existência e pela disseminação de sua criação mediante políticas públicas de caráter nacional e, mesmo, multilateral. As incubadoras de empresas tiveram um impulso forte e espraiado a partir da crise dos anos 1980, quando as ideias de desenvolvimento nacional começaram a serem revistas face ao esfacelamento da produção fordista, à rápida introdução das novas tecnologias em todos os âmbitos do cotidiano (produção, relações interpessoais, comunicações e assim por diante) e ao novo papel das pequenas e médias empresas na criação de empregos e renda. Com efeito, as estatísticas nacionais mostram um crescimento acelerado das incubadoras na década de 1990, como instrumentos de superação da crise e de alteração cultural, especialmente nos países onde o empreender não havia ainda se tornado uma alternativa de mesma qualidade que o “empregar-se” (LAHORGUE et al., 2012). A aceleração da implantação de incubadoras de empresas foi o resultado de políticas públicas de fomento. Isso aconteceu na Coréia do Sul, França, Alemanha, Estados Unidos, Canadá, Brasil e em tantos outros países onde o financiamento público, seja ele direto ou por meio dos editais das agências de fomento ao desenvolvimento e à inovação, ainda é a principal fonte de receitas das incubadoras de empresas. O envolvimento dos governos centrais indica que as incubadoras de empresas fazem parte dos sistemas nacionais de inovação (SNI), funcionando tanto no oferecimento de estruturas físicas quanto no apoio imaterial aos negócios emergentes, com consultorias e acesso a redes, especialmente voltados às micro e pequenas empresas de base tecnológica. A partir de uma definição estreita, incluindo somente organizações e instituições envolvidas na busca e exploração do conhecimento (como os departamentos de P&D, os institutos tecnológicos e as universidades), o conceito de SNI ampliou-se para agregar todas as partes e aspectos da estrutura econômica e da formatação institucional que afetam o aprendizado, a busca e a exploração: sistema produtivo, o sistema de mercado e o sistema de financiamento (LUNDVALL, 2010). Globalização, liberalização, desmaterialização e revolução tecnológica são elementos que estão na base das transformações dos SNI. Essas transformações tiveram início com a turbulência provocada pela primeira crise do petróleo (1973), sendo reforçada pela introdução de novas tecnologias, especialmente as tecnologias de comunicação e informação. 113 “A evolução sistêmica teve profunda influência nas políticas industriais, tecnológicas e econômicas no passado, e terá mais ainda no futuro” (GALLI, TEUBAL, 2011, p. 343). A razão dessa crescente influência pode ser encontrada na igualmente crescente importância da coordenação não-mercantil. Esse movimento resulta do caráter sistêmico da inovação e do fato que as economias estão cada vez mais integradas, sem que o mercado consiga exercer sua coordenação. De acordo com Galli e Teubal (2011), os sistemas nacionais apresentam as seguintes tendências fortes: • Papel-crítico na aproximação entre organizações de todos os tipo em situações onde o mercado ainda não existe; • Criação de infraestruturas, voltadas para o mercado, para auxiliar as empresas individuais, especialmente PMEs, a enfrentar os desafios do alargamento das opções tecnológicas; • Importância das infraestrututras para prover informação e consultorias para áreas como saúde, educação, cultura, lazer, entre outras; • Crescente complexidade. O SNI face à complexidade atual se transforma. Nesse processo, a questão política é das mais importantes. Seu tratamento separado das infraestruturas tem, pelo menos, duas justificativas: a primeira é a crescente necessidade de coordenação nãomercantil e a segunda é a própria complexidade da tomada de decisão, com o envolvimento de atores de diferentes escalas. Entretanto, essa nova feição encontra obstáculos na ação dos governos, que, como lembra Lundvall (2010), dão o ritmo de desenvolvimento dos SNI. Se os governos centrais muitas vezes não estão capacitados para realizar a coordenação entre os diferentes elementos do sistema de inovação, essa situação se agudiza no caso dos governos locais. Em pesquisa recente (LAHORGUE et al, 2012), foi possível observar o caráter localista das incubadoras de empresas no Brasil. Essa pesquisa utilizou um survey com 60 incubadoras respondentes e entrevistas com 24 gerentes de incubadoras, localizadas em todas as regiões brasileiras. De acordo com essa pesquisa, as empresas e os empreendimentos graduados localizam-se majoritariamente no mesmo município da incubadora de origem, confirmando o caráter local dos processos de incubação e resultados de pesquisas anteriores. 114 Os empreendimentos das incubadoras são captados majoritariamente na microrregião de sua localização. A cidade aparece em segundo lugar, sendo que 5% das incubadoras captam seus projetos em algumas áreas da cidade. Configura-se assim uma atuação claramente microrregional, o que corrobora os resultados referentes à localização dos empreendimentos graduados. Ainda segundo a mesma fonte, as incubadoras mantêm alianças estratégicas prioritariamente com universidades, seguidas pelo Sebrae e outras organizações empresariariais. É interessante notar que, mesmos que as incubadoras declarem majoritariamente sua preocupação com o desenvolvimento local, entre os três níveis de governo, é exatamente o local que aparece com o menor número de citações quando se trata das alianças estratégicas. Isso pode ser efeito dos programas de fomento nos âmbitos estadual e federal, mais ativos na busca do desenvolvimento tecnológico. Tendo em vista esses resultados, caberia investigar quais as capacitações e os recursos locais para o desenvolvimento, privilegiando o ponto de vista dos gerentes das incubadoras, que são os atores de interface entre os produtores de conhecimento, os elaboradores de políticas públicas e o setor produtivo. O interesse nessa abordagem tem origem no conceito de recursos territoriais e de território. Como Courlet (2008, p.87 ) observa: (...)o território é visto como « produtor » de memória local e, ao mesmo tempo, como « criador » de um « código genético local », no qual se tecem recursos e valores que se constroem no passado, mas cuja valorização permite dar sentido às ações e aos projetos do presente e do futuro. A territorialidade que decorre dessa concepção do território é uma territorialidade ativa (em oposição à territorialidade passiva como estratégia de controle do espaço por separação e exclusão), isto é, a capacidade de valorizar o mais vasto conjunto possível de recursos e de atores, mediante estratégias de endogeneização visando à autonomia local. A competitividade local está fortemente articulada às capacidades e aos recursos locais, que não se restringem aos recursos materiais, mas que englobam recursos cognitivos e simbólicos (DORMOIS, 2007) MÉTODO Para a coleta dos dados necessários para aferir a percepção dos gerentes das incubadoras de empresas sobre o ambiente local, foram selecionadas 14 115 incubadoras2, todas, exceto três, localizadas em capitais estaduais. Os critérios de escolha foram os seguintes: idade da incubadora, distribuição inter-regional e intrarregional, reputação de qualidade dos serviços prestados. A coleta foi feita com o auxílio de formulário estruturado e realizada presencialmente, entre os meses de maio e julho de 2013, tendo como respondentes os gerentes das incubadoras. A coleta foi distribuída por todas as grandes regiões brasileiras, com exceção do Centro-Oeste. A metodologia usada neste exercício foi desenvolvida na França para apoio ao “diagnóstico local de recursos” (LORTHIOIS, 1997), tendo sido adaptada para a realidade latino-americana. A metodologia aborda três dimensões locais: institucional, da sociedade local e econômica. Procura mostrar a situação de um território em relação a essas dimensões, utilizando para tanto diferentes condições e critérios: •Condições são circunstâncias, situações ou fatos cuja existência é indispensável para a viabilidade do desenvolvimento local, quaisquer que sejam os territórios, setores ou tipos de programas. •Cada condição é caracterizada por um conjunto de critérios. O Quadro 1 mostra as condições e critérios por cada dimensão analisada. DIMENSÃO CONDIÇÃO CRITÉRIOS Vontade política Capacidade da administração Capacidade de análise e de previsão pública local para conduzir Capacidade estratégica processos de mudança Memória Capacidade de cooperação Institucional Poder de decisão Avaliação dos parceiros Elos fortes e capilarização Infraestrutura de apoio Estruturas e corpo técnico para o Articulação entre acompanhamento de projetos desenvolvimento os instrumentos de Órgão específico para o desenvolvimento 2 A amostra foi de conveniência, buscando diversidade em termos de desempenho conhecido das incubadoras, mas privilegiando aquelas com maior idade, significando um histórico possível de interações com a sociedade local. 116 Pessoal permanente dedicado à promoção do desenvolvimento Capacidade coletiva de reação e de solidariedade Estabilidade da população Identidade local Existência de organização para participação e qualidade desta Existência de soluções inovadoras desenhadas e Grau de empreendedorismo da implementadas pela comunidade comunidade local Independência em relação aos recursos públicos Existência de cultura empreendedora Sociedade local Existência de redes de interação e qualidade destas Potencial e organização da Existência de estruturas formais comunidade local para o Capacidade de poupança desenvolvimento Adequação da mão-de-obra em qualidade e quantidade Atividade empreendedora Existência de articulações fortes entre as empresas de uma mesma cadeia de valor Crescimento acima da média do estado ou do país Características do setor produtivo Oferta de empregos local Capacidade de inovação Serviços às empresas Quantidade de empresas com políticas de inclusão, respeito ambiental, ação comunitária, entre outras Capacitação técnica Econômica Capacidade de C&T Grau de preservação do ambiente natural Importância do patrimônio cultural Potencial turístico Potencial existente e que pode Disponibilidade de ser mobilizado construídos preços a terrenos e adequados espaços para a localização das atividades econômicas Qualidade da infraestrutura viária, de relação às saneamento, de comunicações Grau de liberdade local em localizações das infraestruturas e atividades Quadro 1 – Dimensões, condições e critérios 117 As questões do questionário utilizaram uma escala de Likert, de 1 a 5 e os resultados foram calculados de acordo com a seguinte ponderação: 1 = 0; 2 = 1; 3 = 2; 4 = 3; e 5 = 4. ANÁLISE DOS RESULTADOS Em relação à dimensão Institucional e setor público, os critérios mais salientes são os de “vontade política” e “existência de órgão específico para o desenvolvimento”. O discurso e a formalização da função de promoção do desenvolvimento não são, na opinião dos entrevistados, acompanhados de capacitação adequada para a condução dos processos de mudança e acompanhamento de projetos. No primeiro caso, chama a atenção a baixa capacidade de memória e de análise e prospectiva, indicando que há tendência à falta de continuidade em face de alternâncias no poder municipal e à baixa qualidade dos planos e políticas públicas. Em relação aos parceiros, os respondentes têm uma opinião positiva, mas não otimista, pois avaliam que a capacidade de cooperação é apenas média, apesar de serem estabelecidos elos fortes e haver capitalização dentro das organizações parceiras. Ao mesmo tempo, é interessante observar que os representantes dessas organizações nas parcerias têm poder de decisão relativamente alto, o que auxilia a tomada de decisão mais rápida e consequente para os projetos desenvolvidos. As incubadoras pesquisadas estão localizadas em cidades de médio e grande portes. Esse fato explica a estabilidade da população, que não é afetada por movimentos sazonais de estudantes e de outros tipos de flutuação. É interessante observar que, apesar da existência relativamente baixa de organização para processos participativos, na opinião dos respondentes, a capacidade coletiva de reação e solidariedade é alta. Isso pode significar que processos de participação popular têm grande possibilidade de sucesso de implantação. 118 Ainda na dimensão da Sociedade Local, coerentemente com os resultados anteriores, a comunidade tem implementado soluções inovadoras por conta própria. O empreendedorismo das comunidades é considerado alto pelos pesquisados, mas sua autonomia em relação a recursos públicos é baixa, indicando limites à implantação independente de projetos de seu interesse. Na condição “Potencial e organização da comunidade para o desenvolvimento”, observa-se a existência de estruturas formais, como cooperativas e associações, que parecem funcionar bem em rede. Esses seriam elementos a agregar em favor do aprofundamento e consolidação de processos participativos de decisão. No pertinente à atividade empreendedora, a opinião dos gerentes é bastante favorável, já que a média se aproxima de 4,0. Entretanto, essa característica empreendedora não é acompanhada pela capacidade de poupança local ou pela adequação da mão-de-obra em qualidade e quantidade, colocando uma dúvida sobre sua sustentabilidade. O setor produtivo local tem dois pontos fortes que são a articulação entre empresas de uma mesma cadeia ou APL e a capacidade de oferta de empregos. Abaixo, mas bastante próximo, de 4,0, ou seja, de uma situação considerada muito boa, aparecem o crescimento do setor produtivo, a capacidade de inovação, a disponibilização de serviços às empresas e a existência de empresas com praticas inclusivas ou sustentáveis. Esse panorama mostra uma percepção positiva dos gerentes em relação ao setor produtivo de suas localidades. Quando se analisam os resultados sobre o “Potencial existente”, podem-se classificar os critérios utilizados em três grupos: no primeiro, estão aqueles melhor situados na percepção dos pesquisados. São eles: capacitação técnica, capacidade em C&T e potencial turístico. Os dois primeiros têm evidente interesse para o desenvolvimento das incubadoras e dos sistemas de inovação, enquanto que o último apresenta potencial de atratividade à la Florida . No segundo grupo, estão a preservação do ambiente natural e a importância do patrimônio natural, que complementam o potencial turístico. O terceiro grupo traz os pontos fracos do potencial a ser mobilizado. São três 119 pontos ligados à infraestrutura: disponibilidade de terrenos adequados para a localização das empresas, a qualidade das infraestruturas viárias, de energia e de comunicação e a autonomia local sobre seu próprio plano diretor. CONCLUSÃO No conjunto das três dimensões analisadas, ressaltam comunidades empreendedoras e solidárias, mas que não possuem mecanismos adequados de participação nas decisões. O setor produtivo tem, segundo a opinião dos pesquisados, desempenho muito bom, mas sua sustentabilidade encontra obstáculos na falta de mão-de-obra adequada e na carência de infraestruturas. Os governos dessas localidades mostram vontade política, mas não conseguiram ainda estruturar e capacitar o serviço público para as funções de planejar e acompanhar projetos de desenvolvimento. É interessante notar que alguns dos respondentes tiveram dificuldade em responder às questões colocadas, demonstrando baixo conhecimento dos atores locais. Durante a aplicação do formulário, além do gerente, participaram outros membros da equipe da administração da incubadora. Para algumas respostas, houve discussão entre os participantes para chegar a um consenso, indicando que as questões colocadas não parecem fazer parte do debate interno das equipes. Incubadoras de empresas constituem importantes mecanismos de apoio à inovação e ao desenvolvimento local e regional. Entretanto, ainda há uma tendência a analisá-los de forma independente e desconectada das estratégias de desenvolvimento. A adequação desses mecanismos para a criação e consolidação de empresas emergentes está confirmada pela experiência internacional, onde se destacam os programas dos governos nacionais de sua promoção e fomento, como visto acima. A construção de pontes de política e de estratégias entre as incubadoras de empresas e os governos locais aparece como necessidade e oportunidade para o desenvolvimento local e regional. Nesse sentido, não há como não 120 integrá-las na consolidação dos sistemas locais e regionais de inovação, conjuntamente com as instituições de ensino e pesquisa e os setores públicos e privados. Ações que fomentassem a inserção clara da inovação nas políticas de desenvolvimento local e regional, mediante planos abrangentes e articulados entre si, seriam promotoras do reconhecimento dos sistemas locais e regionais de inovação e sua consolidação. Na ausência dessas ações, em face dos resultados obtidos nessa pesquisa, os governos municipais dificilmente se capacitarão para integrarem efetivamente o sistema nacional de inovação e aproveitarem as oportunidades abertas pela infraestrutura científico-tecnológica local. Em contrapartida, as incubadoras tenderão a atender demandas das escalas estadual e federal, que continuarão responsáveis pelas diretrizeschave referentes à inovação e por parte substancial do financiamento do setor, colocando em xeque os objetivos de sua transformação em plataformas de desenvolvimento local, que estão expressos em políticas e programas nacionais, como o CERNE, por exemplo. 121 REFERENCIAS ANPROTEC. Aventura do possível. Brasília: Anprotec, 2007. CORÉIA DO SUL. Promoting business and technology incubation for improved competitiveness of small and medium-sized industries through application of modern and efficient technologies in the Republic of Korea. Korea: Seul, 2002 COURLET, C. L’économie territoriale. Grenoble : PUG, 2008. DORMOIS, R. Pour une analyse dynamique des ressources dans la conduite de l’action publique. in GUMUCHIAN, H., PECQUEUR, B. (ed.). La ressource territoriale. Paris : Economica, 2007. EBN. BIC Observatory in 2011.Disponívelemwww.ebn.br GALLI, R., TEUBAL, M. Paradigmatic shifts in NSI. in EDQUIST, C. (ed.). Systems of innovation. Londres: Routledge, 2011 HACKETT, S., DILTS, D. A systematic review of business incubation research. Journal of Technology Transfer. 29. 55-82. 2004 INFODEV. Mixed-use incubator handbook: a start-up guide for incubator developers. 2009. Disponível em www.infodev.org. LAHORGUE, M. A. et al. Estudo, análise e proposições sobre as incubadoras de empresas no Brasil. Relatório Técnico. Convênio de Cooperação Técnica MCTI e ANPROTEC. 2012. LAHORGUE, M. A.et al. Pólos, parques e incubadoras. Brasília: Anprotec / Sebrae, 2004 LORTHIOIS, J. Le diagnostic local de ressources. Lusigny-sur-Ouche : Éd. W, 1997. LUNDVALL, B-A (ed.). National systems of innovation. Londres: Anthem Press, 2010. PARK, S. Business incubators and entrepreneurship in Korea: analyzing historical development and current situation. Far Eastern Studies.Vol. 7.Maio 2008. pp. 65-81. 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Entretanto a Captação de água da chuva e o armazenamento correto da água tratada na cisterna, permite resolver, o principio fundamental da permanência das famílias nos seus locais de origem, promovendo o desenvolvimento local. Utilizaram-se alguns dados socioeconômicos e pluviais, cedidos por diversos órgãos públicos oficiais. Os principais resultados mostraram que o regime pluvial das localidades analisadas é extremamente irregular, dificultando o principal setor econômico. No entanto, deve-se conhecer o regime pluvial e o dimensionamento correto dos volumes da cisterna e os da necessidade de consumo de água para cada família. Palavras-chave: Água; tecnologia social; Desenvolvimento. Introdução A água é um elemento indispensável à vida e, por isso, constitui num dos maiores problemas sociais do mundo. Embora, a disponibilidade de água potável não vem aumentando na mesma proporção que o crescimento populacional. Essa condição se agrava ainda mais na zona rural do semiárido paraibano, onde a falta de água potável e a desnutrição alimentar são fatores que mais afetam a população rurícola. Essas questões são amplamente discutidas há muito tempo, mas ainda não 1 Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Mestranda do PPGDR/UEPB, email: [email protected] 3 Professor Doutor do Curso Geografia e do PPGDR da UEPB. email: [email protected] 2 123 se conseguiu acabar nem com a fome nem tão pouco com a sede. A precipitação pluvial é o elemento do clima com maior variabilidade espacial e temporal, cujas características, no semiárido paraibano, associam-se à irregularidade na quantidade e em distribuição. Mesmo na curta estação chuvosa, que perdura por cerca dois a quatro meses, os totais de chuvas são extremamente irregulares em quantidade e em distribuição, quando se compara um local com outro. Essa condição tem limitado o abastecimento de água, até para fins potáveis, e o uso da água para atividades de desenvolvimento rural local. Por isso, a insegurança hídrica contribui não somente pela fragilidade ambiental da caatinga, mas com o subdesenvolvimento e os elevados índices de pobreza. O semiárido nordestino contempla uma extensa região do país, cujas peculiaridades requerem adoções de medidas e de alternativas para manter o homem do campo no seu habitat, sem degradar o ambiente e permitir a convivência harmônica com o ambiente, tendo-se na captação da água da chuva a única e/ou a principal alternativa para a vivência nessa região. De acordo com Brito et al. (2007) a cisterna domiciliar é uma tecnologia milenar e pode responder aos parâmetros de qualidade e quantidade da água para beber das famílias de comunidades, onde haja limitação de recursos hídricos, desde que sejam seguidos os critérios de dimensionamento, armazenamento e manejo da água coletada da chuva. Neste contexto, houve a necessidade de um estudo estatístico que permitisse estabelecer o potencial de captação de água da chuva nas localidades mais secas do cariri da Paraíba através da cisterna como tecnologia social e alternativa para o desenvolvimento, sendo essas determinações os objetivos principais deste trabalho. Metodologia Localização da área de estudo A área de abrangência deste trabalho correspondeu especificamente a duas localidades que compõem a microrregião do Cariri Oriental do Estado da Paraíba, como mostra a Figura 1. 124 Utilizaram-se séries pluviais de oito localidades que compõem a microrregião do cariri da Paraíba apenas para caracterização do regime pluvial. Os dados foram cedidos pela Agência Executiva de Gestão das Águas do Estado da Paraíba (AESA), período: 1962-2012, em seguida foram escolhidas duas localidades mais secas: Cabaceiras e Riacho de Santo Antonio da referida microrregião, para as análises comparativas e socioeconômicas. Os dados de chuvas, nas diferentes escalas de espaço e tempo, foram analisados mediantes critérios da estatística climatológica e das distribuições estatísticas de frequências, de medidas de tendência central (média e mediana) e de dispersão (desvio padrão). Foram estabelecidos os regimes pluviais que possibilitaram estimar os VPCs anuais e em seguida adotado seis cenários com totais anuais de chuvas, referentes à mediana, o ano mais seco e o mais chuvoso e aos níveis de 25, 50 e 75 % de probabilidade. Adotando-se vários tamanhos de áreas de captação (60, 80, 100 e 200m2). Para efeito deste estudo, compararam-se as principais características hídricas das localidades mais secas, enfatizando o volume potencial de captação de água e as suas relações socioeconômicas. Analisaram-se também os tipos de cisternas, os dados populacionais e socioeconômicos (fecundidade, renda, setores econômicos, escolaridade, dentre outros.) extraídos diretamente do banco de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e 125 Estatísticas (IBGE), Ministério de Desenvolvimento social (MDS), do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA),Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA) e da Organização das Nações Unidas(ONU). Resultados e Discussões A partir dos dados socioeconômicos e hídricos obtidos através de órgãos oficiais do governo, aplicaram-se análises estatísticas descrevendo-se as principais características das duas localidades mais secas, ambas inseridas na microrregião do Cariri Oriental paraibano, Cabaceiras e Riacho de Santo Antônio, respectivamente. Na tabela 1, observa-se a localidade de Cabaceiras com 56 e 49,5% da população residentes na zona rural e masculina, respectivamente. Já, a localidade de Riacho de Santo Antônio apenas 31% da população são residentes na zona rural. Tabela 1- Dados populacionais para as localidades Cabaceiras e Riacho de Santo Antônio. Dados populacionais Cabaceiras Riacho de S. Antônio População (censo-2010) 5.035 hab Área da unidade territorial (km²) Densidade demográfica (hab/km²) População residente masculina População residente feminina 401,74 92,0 12,53 18,72 2.493 871,0 2.542 851,0 2.217 1.186 2.818 536 1722 hab População Urbana População Rural Fonte: Tabela adaptada por Farias (2014) e dados extraídos no (IBGE- cidades). De acordo com as publicações do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) houve um decréscimo na taxa de fecundidade (filhos por 126 mulher),consequentemente o número de residentes por domicílio diminuíram. Em 1991, 2000 e 2010 a taxa de fecundidade era de 5, 3 e 2 filhos, respectivamente, para a localidade de Cabaceiras. Enquanto que para a localidade de R. de S. Antônio esses valores ainda eram um pouco maiores de 7, 4 e 3, respectivamente, para (1991, 2000 e 2010). Considerando a renda como fonte de remuneração mensal familiar, destacam-se na (Figura 2) uma evolução na renda per capta em ambas as localidades registrando os maiores valores em 2010(R$ 283 e 275,00 reais). No entanto ressalta-se que as maiorias das famílias ainda sobrevivem apenas com auxílios e/ou políticas publicas advindas do governo, a exemplo o Programa assistencialista Bolsa Família que transferi renda do Governo Federal as famílias pobres (com renda per capta de até R$ 154,00 reais). Para o Ministério do Desenvolvimento Social e Cobate á fome (MDS) o valor do auxílio recebido pode variar a partir de R$ 35,00 a 325, 00 reais, na localidade de Cabaceiras e R. de S. Antônio são beneficiadas 764 e 268 famílias, respectivamente. Figura 2- Renda per capta para as localidades Cabaceiras e Riacho de Santo Antônio. 300 Cabaceiras R. de Santo Antônio Renda(R$) 250 200 150 100 50 0 1991 2000 2010 Fonte: Elaborada pela autora, dados extraídos do (Pnud). Esse baixo nível de renda da população esta associado ao baixo nível de escolaridade, comprometendo o desenvolvimento econômico e social local. 127 Segundo os dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) para a localidade de Cabaceiras entre 2000 e 2010, a taxa de atividade da população de 18 anos ou mais (ou seja, o percentual dessa população que era economicamente ativa) passou de 54,75% em 2000 para 55,64% em 2010. Ao mesmo tempo, sua taxa de desocupação (ou seja, o percentual da população economicamente ativa que estava desocupada) passou de 9,74% em 2000 para 7,15% em 2010. Dos 55,64% referente a população ativa, 48,49% se encontrava ocupada e apenas 26, 25% com ensino médio completo.Já, para a localidade de R. de S. Antônio o quadro é pouco melhor em 2010, dos 67,46% ativos apenas 5,28% estavam desocupados. Em relação a atividade profissional, destaca-se na (Fígura 3) o setor agropecuário com a principal ocorrência( 41,29 e 39, 60%) para Cabaceiras e R. de S. Antônio, respectivamente, e, as menores frequências para ambas as localidades ressalta-se a Indútria extrativa seguida pelos setores públicos. Figura 3- Frequência Relativa das principais atividades econômicas para as localidades de Cabaceiras e Riacho de Santo Antônio. FR(%) Cabaceiras Riacho de Santo Antônio 45 40 35 30 25 20 15 10 5 0 Fonte: Elaborada pela autora, dados extraídos do (IPEA). Sintetizando-se os dados apresentados e classificando-os nos diferentes Setores econômicos observa-se ainda na (Fígura 3) que o Setor Terciário registrase ocorrência acima de 40% em ambas as localidades, no entanto o Setor Primário continua sendo o mais representativo, embora sabe-se que a grande vulnerabilidade 128 deste setor remete-se principalmente ao clima, especificamente em relação a baixa disponibilidade de água no semiárido nordestino que gera insegurança hídrica e alimentar, comprometendo o abastecimento humano, animal, a agricultura e, consequentemente, o desenvolvimento social e econômico. Em relação à disponibilidade hídrica, a cisterna surge como a principal alternativa para captar a água da chuva, pois aumentando a oferta da água melhora a qualidade de vida da população, permitindo a fixação da família no seu local de origem. Segundo a definição publicada pela Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA) a Tecnologia social compreende produtos, técnicas ou metodologias reaplicáveis, desenvolvidas na interação com a comunidade e que representem efetivas soluções de transformação social. As tecnologias sociais são simples, baratas e de domínio popular. Existem vários tipos de implementações para captar água da chuva, destacam-se alguns tipos: cisterna-calçadão, cisterna-enxurrada, cisternas de placas, cisternas de plástico/PVC (polietileno), barragem subterrânea, barreiro-trincheira, barraginha, tanque de pedra, dentre outros. Comumente no semiárido paraibano a maioria das captações da água da chuva são realizadas especialmente pelas cisternas (placas, plástico e calçadão), entretanto a cisterna de calçadão possui uma especificidade, pois ela depende da declividade do terreno. Já as cisternas de placa e de plástico de uma maneira geral, água da chuva que escorre do telhado da casa é captada pelas calhas e cai direto na cisterna, onde é armazenada. De acordo com as publicações do Ministério de Desenvolvimento Social e combate á fome (MDS, 2014) na Paraíba já forma construídas 25.488 cisternas que estão distribuídas em vários municípios paraibanos, identifica-se na (Figura 4) que a localidade de Cabaceiras foi contemplada com 278 cisternas ao decorrer de três anos (2011-2013) e a localidade de R. de Santo Antônio apenas com 47,1% comparando-se ao total das cisternas implementadas em Cabaceiras. 129 Figura 4- Quantidade de cisternas construídas para armazenar água da chuva para as Localidades de Cabaceiras e Riacho de Santo Antônio. Cabaceiras 300 R. De Santo Antônio Nº de cisternas 250 200 150 100 50 0 2011 2012 2013 Total Fonte: Elaborada pela autora, dados extraídos do (MDS). Diante disto, há necessidade de um estudo que permita estabelecer as características pluviais da microrregião do Cariri Oriental paraibano, a fim de estimar o Volume Potencial de Captação (VPC) em diferentes cenários para as duas localidades analisadas. O comportamento do regime pluvial da microrregião do Cariri Oriental é mostrado na (Figura 5). Observa-se que as médias aritméticas mensais estão sempre associadas a uma elevada dispersão, mostradas através dos respectivos desvios padrão da média, nota-se que a precipitação pluvial mensal é irregularmente distribuída, ou seja, de agosto a fevereiro os desvios padrão são superiores a própria média aritmética. Em qualquer mês do ano as médias aritméticas são sempre maiores que as medianas e, portanto, a distribuição de probabilidade é assimétrica e o coeficiente de assimetria é positivo. Para esse tipo de distribuição, a média não é o valor mais provável de ocorrer e, por isso, deve-se usar a mediana, o que concorda com os resultados encontrados por Almeida & Gomes (2011) e Almeida (2012). Observa-se (Figura 5) que o período mais chuvoso inicia em fevereiro-março e dura até abril- maio. Essas sequências mostram a estação chuvosa da microrregião do Cariri Oriental, no entanto quando se analisa isoladamente todas as 130 localidades da microrregião os inícios, durações e quantidade, podem diferenciar, demonstrando-se que a chuva é extremamente irregular, há uma predominância que estação chuvosa dure por dois a quatro meses, caracterizando o semiárido nordestino. O mês de abril registra o maior valor médio (86,7 mm) e o total acumulado da estação chuvosa, contabiliza-se 50% do total médio anual e o mais seco é o mês de novembro. Figura 5- Médias mensais das médias, medianas e desvio padrão da precipitação pluvial da microrregião do Cariri paraibano, médias do período: 1962/2012. média mediana DP 100,0 100,0 90,0 90,0 80,0 80,0 70,0 70,0 60,0 60,0 50,0 50,0 40,0 40,0 30,0 30,0 20,0 20,0 10,0 10,0 0,0 0,0 jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez Fonte: Elaborada pela autora, dados extraídos da (AESA). Com objetivo de garantir água em quantidade suficiente para o consumo (beber, cozinhar e higiene pessoal) das famílias que tem como única fonte hídrica no período de estiagem as cisternas, foram calculados com base na taxa de fecundidade (dois filhos) acrescentando-se os pais, totalizando-se quatro pessoas por domicílio. De acordo com os dados divulgados pela Organização das Nações Unidas (ONU) o consumo médio por pessoa equivale a 20L/dia. Os principais resultados identificou que para cada pessoa nessas duas localidades analisadas são necessários 4,2m3 ou (4.200L) de água para suportar os 210 dias (sete meses) sem chuva. No entanto, a maioria das cisternas rurais e principalmente aquelas construídas pelo Governo Federal e outras Instituições possuem uma capacidade 131 para armazenar apenas 16m3 de água que neste cenário observa-se(Tabela 2), torna-se insuficiente para atender a demanda do número médio de pessoas durante o período de estiagem. Tabela 2-Volume de água necessário (VNEC) para as localidades Cabaceiras e Riacho de Santo Antônio. Nº de pessoas/domicílio Litros 4 16800 m3 16,8 6 25200 25,2 8 33600 33,6 42000 42,0 10 Sumarizando-se as Figuras 6 e 7, nota-se que apenas os cenários correspondente aos valores mínimos para as diferentes áreas de captação são insuficientes para suprir a demanda hídrica familiar, entretando esses valores mínimos não ocorrem com frequência, com probabilidade de apenas 1,92 e 1,96% de chances de ocorrer. Ainda com valores baixos em ambas as localidades destacase o cenário com a probabilidade de 25% que equivale ao primeiro quartil, ou seja, esse valor acontece uma vez a cada quatro anos, contudo observa-se também que quando aumentam-se as áreas de captação, especificamente acima de 80m2, consequetemente os valores superam consideravelmente 16m3 de água. Analisando-se o volume potencial dos cenários medianos, ainda nas mesmas fíguras, nota-se que em todas as áreas de captação conseguem obter o VPC suficiente para família com até quatro pessoas/por domicílio. Destaca-se que o VPC mediano com a área de captação de 200m2 correspondente a cisterna de calcadão, conseguindo captar 58,5 e 55,4m3 de água para as localidades de Cabaceiras e R. de S. Antônio, respectivamente, superando a capacidade da própria citerna(52m3) e garantindo o abastecimento hídrico para família de até 14 pessoas. 132 Figura 6- Potenciais de captação de água de chuvas(VPC) mediante aos seis cenário pré- estabelecidos. 60m² 80m² 100m² 200m² 140 Cabaceiras 120 VPC(m³) 100 80 60 40 20 0 mediana máximo mínimo 0,25 0,5 0,75 Figura 7- Potenciais de captação de água de chuvas(VPC) mediante aos seis cenário pré- estabelecidos. 60m² 140 80m² 100m² 200m² R. de S. Antônio 120 VPC(m³) 100 80 60 40 20 0 mediana máximo mínimo 0,25 0,5 0,75 CONCLUSÃO Os dados socioeconômicos apresentaram índices crescentes ao decorrer dos anos analisados, no entanto o baixo nível de renda da população, associado ao 133 baixo nível de escolaridade, compromete significadamente o desenvolvimento econômico e social local. O regime pluvial da microrregião do Cariri Oriental é extremamente irregular, dificultando o principal setor econômico (Agropecuário). Os modelos de distribuição de chuvas são assimétricos. A curta estação chuvosa dura cerca de três a quatro meses, mas difere em quantidade e em distribuição. As duas localidades Cabaceiras e Riacho de Santo Antônio, respectivamente, possuem um potencial mediano de captação de água de chuva de 390 e 369L/m2 e a área de captação mínima necessária, para armazenar 16 mil litros de água, varia em função da localidade, sendo de 55 e 58 m2, respectivamente. A priori deve-se conhecer o regime pluvial e a quantidade de água necessária para atender a demanda hídrica específica de cada família e o tipo de cisterna correspondente REFERÊNCIAS ALMEIDA, H. A. de. Climate, water and sustainable development in the semi-arid of northeastern Brazil. In: Sustainable water management in the tropics and subtropics and case studies in Brazil, Unikaseel, Alemanha, v.3, p.271-298, 2012 ALMEIDA, H. A. de, GOMES, M. V. A. Potencial para a captação de água da chuva: alternativa de abastecimento de água nas escolas públicas de Cuité, PB. In: Congresso Brasileiro de Agrometeorologia, 17, Guarapari, ES, 2011, Anais..., Guarapari: CD-R. BRITO, L. T. L., SILVA, A. S., PORTO, E. R., AMORIM, M. C. C., LEITE, W. M. Cisternas domiciliares: água para consumo humano. Potencial de captação de água de chuva no semi-árido brasileiro. Petrolina, PE: Embrapa Semi-árido, 2007, Cap.4, p.81-101. IBGE – Instituto de Geografia e Estatísticas. Cidades@. 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Disponível em: < http://www.pnud.org.br/>, Acessado em : 02 jul. 2014. 134 GT 4 – CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL Técnicas e Tecnologias no Contexto da Educação do Campo: análises sobre os espaços e objetos técnicos na Pedagogia da Alternância1 Giovanna Pezarico2 Gilson Leandro Queluz3 Maria de Lourdes Bernartt4 Universidade Tecnológica do Paraná – Câmpus Pato Branco e Curitiba Resumo O presente estudo está inserido na temática Tecnologia e Sociedade. É a partir desta temática, que de modo mais específico, buscou-se esmiuçar as relações entre Tecnologia, Educação e Trabalho no contexto da Educação do Campo, tendo por mediação, a Pedagogia da Alternância. O estudo tem como objetivo principal analisar processos de apropriação técnica no contexto da Pedagogia da Alternância, a partir das interações entre espaços técnicos e objetos, vivenciadas em algumas Casas Familiares Rurais – CFR´s e Casa Familiar do Mar - CFM, localizadas na região Sul do Brasil, durante os anos de 2010 a 2013. Palavras-Chave Técnicas; Tecnologias; Educação do Campo; Espaços e objetos; Pedagogia da Alternância. Introdução O presente estudo está inserido na temática Tecnologia e Sociedade. É a partir desta temática, que de modo mais específico, buscou-se esmiuçar as relações entre Tecnologia, Educação e Trabalho no contexto da Educação do Campo, tendo por mediação, a Pedagogia da Alternância. O estudo tem como objetivo principal analisar processos de apropriação técnica no contexto da Pedagogia da Alternância, a partir das interações entre espaços técnicos e objetos, vivenciadas em algumas Casas Familiares Rurais – CFR´s e Casa Familiar do Mar - CFM, localizadas na região Sul do Brasil, durante os anos de 1 Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento – II SEDRES, Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014. 2 Docente do Curso de Administração da UTFPR. Pesquisadora do CEPAD – Centro de Pesquisa e Apoio ao Desenvolvimento Regional – Câmpus Pato Branco. 3 Docente do Programa de Pós-Graduação em Tecnologia – PPGTE – UTFPR – Câmpus Curitiba. 4 Docente do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional. Pesquisadora do CEPADCentro de Pesquisa e Apoio ao Desenvolvimento Regional – UTFPR – Câmpus Pato Branco. 135 2010 a 2013. É importante considerar que o estudo parte da premissa teóricometodológica que considera a tecnologia como uma prática social e histórica. É no espaço da sociedade que a tecnologia surge de modo a constituir-se como relação social, e, portanto, com a faculdade de transformar as relações sociais no contexto histórico, refutando assim o determinismo tecnológico. Isso permitiu compreender a tecnologia como uma linguagem que estaria a provocar relações sociais. É a partir desta reflexão inicial, que se pode examinar a noção de tecnologia que permeia este estudo por meio de uma perspectiva crítica. Destaca-se, além disso, as singularidades em torno da construção, elaboração e apropriação dos objetos e espaços, cujos significados ou re(significações), códigos técnicos ou designs são atravessados por interações que se dão em espaços-tempos de tensões, contradições e resistências, e que dialogam permanentemente com as questões da técnica e da tecnologia. 1 A técnica e a tecnologia no contexto da Pedagogia da Alternância Analisar a Pedagogia da Alternância demanda, inicialmente, considerar as implicações das Casas Familiares Rurais originadas no interior da França. As primeiras Maisons Familiales Rurales – MFR´s surgiram em meio a profundas transformações e tensões no espaço rural francês. O evento da criação da primeira MFR ocorreu em Lauzun, no ano de 1937, no bojo de longas discussões e reflexões no meio camponês francês que se estendiam desde a década de 1920 (GARCIA-MARIRRODRIGA, 2010). O cenário que brevemente ilustra o contexto do rural francês em relação aos seus movimentos de resistência a processos educativos pensados e implantados para o contexto urbano também representava um processo de resistência aos processos técnicos engendrados àquela lógica. Esta perspectiva permite também compreender a recusa em torno do conhecimento técnico dissociado das singularidades inerentes às ruralidades e aos seus processos produtivos. Por este raciocínio, a tecnologia, nosso objeto de análise em específico, também passa a dialogar com este contexto e constituir-se como um elemento 136 importante para a compreensão e análise da construção de relações sociais, favoráveis ou não, para o processo de produção e reprodução da vida no campo. É por meio de elementos imbricados que se torna possível compreender assim, a Pedagogia da Alternância como um processo também de resistência e empoderamento no mundo rural. Para além, permite-nos visualizar a fase embrionária deste movimento, afirma Begnami (2003) como a produção resultante de um longo e sofrido processo histórico de movimentos sociais, particulares ao meio rural, cujas raízes possuíam matizes inspiradores democráticos e cristãos. É a partir dos múltiplos elementos componentes desta bricolagem, que podemos avançar sobre a primeira experiência em torno da criação da MFR de Lauzun, na década de 1930, que desencadearia na expansão dos movimentos de formação por alternância posteriormente e que chegariam ao Sudoeste do Paraná no final da década de 1980. Contudo, para estabelecermos as relações pretendidas, entre a Pedagogia da Alternância e as construções em torno da técnica e da tecnologia, recorremos a Dussel (1984), quando afirma que para que a tecnologia sirva ao homem e não a um sistema de exploração do homem, se devem contemplar muitos condicionantes estruturais concretos, históricos que não são propriamente tecnológicos. Assim, em termos de tecnologia, Silva (1999) ao analisá-la no âmbito da agricultura familiar admite-a como uma relação social e não um conjunto de “coisas”, tais como máquinas, os adubos químicos, as sementes, etc. A tecnologia é o conjunto dos conhecimentos aplicados a um determinado processo produtivo que afeta diretamente o funcionamento das economias camponesas, sendo muitas vezes responsável por transformações profundas tanto em nível interno da unidade produtiva como em nível de suas relações com a sociedade capitalista, bem como em diálogo com os processos de formação. Assim, analisar tais especificidades demanda resgatar os motes principais que cercam a organização produtiva inerente ao contexto rural, especificamente da agricultura familiar e da racionalidade camponesa: a reprodução das relações sociais e a manutenção das condições da vida e da família, diretamente e da comunidade. 137 Logo, o desenvolvimento da técnica nessa perspectiva dialoga com as condições de estrutura da exploração natural, que se compõem da intensidade do cultivo e formas organizativas proporcionais à medida de extensão da terra utilizável, do tamanho da família trabalhadora e da extensão de suas necessidades, bem com dos laços que estabelece com o espaço, enfim, como seu projeto. Além disso, a relação entre natureza e técnica no âmbito rural é bastante distinta da perspectiva da indústria convencional. As relações estabelecidas pelo espaço-tempo, terra e tempo necessário para o cultivo e a perspectiva de consumo preciso são fundamentais para pensar um processo de desenvolvimento técnico repleto de requisitos específicos. Logo, o desenvolvimento do aparato técnico arranja-se de modo a responder, por um lado, às exigências agronômicas (os potenciais cultivos em virtude das condições climáticas e das condições do solo), mas também às necessidades da família (vestuário, ampliação da dieta). Este contexto reforça a perspectiva de Veira Pinto, ao enfatizar que a essência da tecnologia é a mediação dialética entre o ser e o meio, numa correlação recíproca. Em se tratando do trabalho no campo, parece evidenciada a hipótese de que o mundo se apresenta ao existente humano como campo de ações possíveis, que se revelam mediante ações específicas sobre os objetos dispostos ao redor do homem, que podem tornar-se utensílios e que permite investigar a cultura daqueles que tem acesso imediato à realidade (VEIRA PINTO, 2005). Diante deste cenário, se verificam cada vez mais a pertinência e relevância de iniciativas como os movimentos familiares de formação rural, como por exemplo, as Casas Familiares Rurais e a Pedagogia da Alternância como elementos de um sistema técnico voltado para reprodução de relações sociais desta natureza. Estas circunstâncias dialogam diretamente com o sistema técnico e suas apropriações, na medida em que o desenvolvimento técnico auxiliou na imposição de limites efetivos produzindo o esgotamento das possibilidades de reprodução social frente ao latifúndio e à intensificação da produção agrícola. 138 2 Objetos e Espaços Técnicos: interações no contexto da Pedagogia da Alternância Ao avançar das leituras, realizações dos estágios de vivências, observações e entrevistas junto às Casas Familiares Rurais e do Mar, nas quais emergiram uma diversidade de objetos e discursos, práticas e percepções, ora convergentes, ora contraditórias, por vezes fundamentadas, outras vezes empíricas, as relações entre técnica e tecnologia no âmbito da Pedagogia da Alternância, impuseram a responsabilidade e o comprometimento teórico que implicou na preocupação permanente daquilo que Álvaro Vieira Pinto (2005) definiria como concepções ingênuas sobre tecnologia. Nestes termos, julgou-se prudente iniciar as discussões em torno das técnicas e da tecnologia no âmbito da Pedagogia da Alternância, tendo como ponto de partida o horizonte proposto pelo autor, a partir do seguinte questionamento: “que papel desempenha a técnica no processo de produção material da existência do homem por ele mesmo?” (VIEIRA PINTO, 2005, p. 155). É por meio de tal questionamento que as decisões metodológicas em torno da materialidade e o simbólico presente nos objetos e espaços técnicos no âmbito da Pedagogia da Alternância parecem encontrar ressonância. Tendo em vista suas propostas e dinâmicas singulares, emerge daí a produção material como manifestação da cultura ou da formação social no contexto do laboratório terra e do laboratório mar. O constructo acima evidencia o apego ou a ênfase à técnica como elemento que transcende a perspectiva de mediação, na medida em que as noções de fabrico, de uso e ao produzir materialmente seus bens (artefatos, objetos) extrapola a satisfação de necessidades concretas para produzir também cultura, implicando na tecitura de relações sociais fluídas. Assume-se assim, a perspectiva que no presente estudo, os objetos naturais e artificiais (que em alguns momentos sequer podem ser percebidos com tal distinção) encontram-se imbricados a processos biográficos complexos. Neste sentido, cabe resgatar a relação entre objeto e biografia (APPADURAI, 2008). Isso significa dizer, que apesar dos objetos e espaços técnicos estarem no horizonte de análise do estudo, as aproximações 139 permitidas durante os estágios de vivências propiciaram outras abordagens e ressignificações sobre os mesmos, principalmente justificadas pelas suas riquezas, enquanto possibilidades e desafios de análise. É a partir de concepções como estas que os objetos e espaços técnicos puderam ser percebidos e, principalmente, permitiram o estabelecimento de relações, tensionamentos, contradições, resistências e cooptações no âmbito da Pedagogia da Alternância, considerando, porém, que estes não podem ser colocados em primeiro plano, e principalmente, desvinculados dos sujeitos de suas criações, usos e manipulações. Ou seja, assim, como a tecnologia não pode ser compreendida como determinante da vida social, os objetos e espaços técnicos por si só, também não tem este condão. Mas em oposição a esta racionalidade, para o estudo presente, assumem a condição de elementos presentes no contexto da cultura material e simbólica destas relações. Por tais razões, e com a compreensão da incompletude permanente na análise de tais circunstâncias, a trajetória do estudo conduziu-o de modo a estabelecer três recortes analíticos acerca dos objetos e espaços técnicos em diálogo com as técnicas e tecnologias, no âmbito das Casas Familiares Rurais e do Mar, vinculadas à Pedagogia da Alternância. O primeiro recorte evidenciou as relações estabelecidas entre os processos de construção, uso e manipulação de objetos, compreendidos, como artefatos em diálogo com a arte, o artesanato, o trabalho e o lazer e as relações engendradas a todas estas dimensões. O segundo recorte, e talvez, o último ponto de análise consolidado em termos de síntese, diz respeito à perspectiva assumida pelas próprias Casas Familiares Rurais e do Mar como “objetos” e “espaços técnicos” revestidos de materialidade cultural e simbólica. 2.1 Os objetos: lazer, trabalho e arte Apurar o olhar no sentido de estabelecer relações a partir da biografia dos objetos no contexto da Pedagogia da Alternância implicou, por certo, na observância do que Gimonet (2009) elucidava acerca do ambiente. Mais do 140 que isso, da necessidade de ampliar a perspectiva para além dos objetos vinculados diretamente aos processos de apropriação técnica, mas também à diversidade dos espaços e dos tempos de formação (pilares para a formação em alternância). Neste primeiro momento, considera-se relevante iniciar as principais análises em torno dos objetos verificados junto às Casas Familiares, a partir das dinâmicas percebidas e dedicados ao lazer e ao brincar e que repercutiram para o encontro de objetos elaborados pela intencionalidade de constituírem-se como brinquedos, por exemplo. Neste sentido, ainda que não mencionado nas falas dos sujeitos da pesquisa, foi inevitável deparar e perceber a Casa Familiar, inserida no laboratório terra ou mar, como um cenário profícuo para interações mais amplas, do qual o lazer também se consistira em perspectiva formativa de valores, princípios e convivência comunitária. Além disso, há que se evidenciar, que as próprias dinâmicas atinentes à alternância, principalmente, no que diz respeito à permanência dos jovens em formação durante a alternância, terminam por estabelecer lógicas distintas da escola tradicional, próprias desta modalidade de formação. Neste sentido, o lazer, o brincar, compreendidos como atividades lúdicas, recreativas e interativas fomentadas no âmbito das Casas Familiares analisadas podem ser considerados como processos inseridos numa rede de relações que visariam superar a tradicional triangulação entre professor-saberes-estudante, ambientada na sala de aula, exclusivamente. Para além deste enfoque, há que se mencionar o brinquedo como objeto efetivo de representações, e neste caso, de imbricações com o laboratório terra ou mar. Assim, a função do brinquedo ao introduzir e compor o espaço da brincadeira, não necessariamente demandando de uso preciso, possibilita também o desviar os objetos de suas funções para tornar-se brinquedo, e mesmo fabricar os objetos-brinquedos. Trata-se de fornecer imagens e representações. No que diz respeito às concepções em torno da elaboração de artefatos destinados a compor o mobiliário da casa ou de objetos produzidos com a intencionalidade de uso para o trabalho. Todavia, este a priori não pode ser analisado sem considerar as experiências vivenciadas no âmbito da Pedagogia da Alternância 141 que dialogam com as perspectivas teóricas de recusa à neutralidade da tecnologia. Isso significa dizer que a partir do tema gerador vinculado às questões ambientais, presentes nos planos de formação da maior parte das Casas Familiares Rurais e do Mar que compuseram o lócus da pesquisa, residem também posturas políticas que conduzem os modos de elaboração e apropriação técnica. Neste sentido, destacam-se os conteúdos voltados ao manejo das propriedades sob a perspectiva agroecológica, a introdução de técnicas de cultivo de produtos orgânicos, a homeopatia como forma de tratamento dos rebanhos e as preocupações em torno da manutenção da vida. Ante o exposto, é possível considerar que os objetos naturais ou artificiais inseridos no contexto da Pedagogia da Alternância são também atravessados por relações atreladas a designs e códigos técnicos que lhe imprimem singularidades, principalmente, no que diz respeito ao processo de construções relacionais engendradas não apenas ao trabalho, mas à vida social e principalmente familiar. 2.2 A Casa Familiar Rural e do Mar: objeto-espaço e tempo Os estágios de vivência, conduzidos a partir da condição de visitante permitiram estabelecer indícios consistentes no sentido de considerar as Casas Familiares Rurais e a Casa Familiar do Mar, no âmbito da Pedagogia da Alternância, para além de sua dimensão enquanto espaço técnico, mas próprio objeto construído nas dinâmicas complexas que nela se concretizam materialmente e simbolicamente a partir dos sujeitos individuais e coletivos que delas são participantes. Foi no assentamento das ideias, no amadurecimento teórico que uma compreensão mais ampla, acerca dos feixes de relações estabelecidas, que se considerou que tal nomenclatura desempenharia papel mais contundente do que apenas mera formalidade. Deste modo, a perspectiva assumida pela “Casa Familiar”, foi a de objeto-espaço, mimetizada a partir dos aspectos que por ela são tomadas, ora como objeto material e simbólico de valores, família, escola, aprendizagem, convivência e interação comunitária, enfim, de cultura. Neste sentido, nos apoiamos também na concepção de que a 142 Casa Familiar é também espaço que se “confunde com a própria ordem social de modo que, sem entender a sociedade com suas redes de relações sociais ou valores, não se pode interpretar como o espaço é concebido” (DAMATTA, 1997, p. 30). A partir das manifestações, é possível perceber as singularidades assumidas pela relação tempo-espaço, distinta do ambiente escolar tradicional, mas que é estabelecida entre a Casa Familiar Rural ou do Mar e seus sujeitos a partir das peculiaridades de suas dinâmicas formativas, das concepções de diversidades de espaços e tempos, e de outras gramáticas e construções sociais. As dinâmicas verificadas e explicitadas nos depoimentos dos sujeitos de pesquisa estão também relacionadas ao quotidiano da Casa Familiar Rural ou do Mar, por meio da realização coletiva das atividades domésticas, tais como a limpeza e arrumação da casa, preparação das refeições, pequenos consertos elétricos e serviços de manutenção, por exemplo. É importante reforçar neste cenário a abordagem também do trabalho como princípio educativo, mas também como construção de relações que perpassam as questões de gênero e construção de papeis familiares, muito enfatizados no âmbito da Pedagogia da Alternância. Outro aspecto que merece análise é a relação decorrente dos processos de aprendizagem que ocorrem no espaço da Casa Familiar Rural e o modo como são apropriados no contexto familiar, que contemplam desde saberes sobre alimentos e receitas a medicamentos fitoterápicos e cuidados com a saúde. Apesar das intenções iniciais deste estudo estabelecer como foco aspectos biográficos em torno das interações e objetos no âmbito das Casas Familiares Rurais e do Mar, na medida em que os estágios de vivência foram sendo realizados, uma categoria analítica tornou-se cada vez evidente: os espaços técnicos. Neste sentido, é importante salientar que em se tratando da temática, ora em discussão, não se pode estabelecer hierarquias entre objetos e espaços técnicos, tendo em vista que as interrelações construídas pelos sujeitos da Pedagogia da Alternância não apenas demandam de ambos, mas integram um complexo processo de imbricação, no qual tempo-espaço, sujeitoobjeto, espaço-objeto podem ser interpretados como um continuum. 143 Logo, se resgata a concepção de laboratório, representado principalmente pela terra e pelo mar, como os espaços privilegiados para a discussão intencionada, principalmente pela sua diversidade em termos de heterogeneidade não apenas de suas características naturais, mas também pelos modos pelos quais os objetos – naturais ou artificiais – deles se ocupam e das interações estabelecidas entre os sujeitos para além de processos de mediação, mas de permanente construção da cultura, material e simbólica, permeados pela técnica e pela tecnologia. Primeiramente, há que se considerar que os espaços técnicos no âmbito da Pedagogia da Alternância, apesar de muitas vezes em termos de localização estarem vinculados ao objeto-espaço Casa Familiar, produzem ações concretas e simbólicas com implicações, principalmente de reprodução e apropriação técnica no âmbito da propriedade familiar ou da comunidade pesqueira. Ademais, é salutar evidenciar a importância assumida pelos espaços destinados à experimentação num caminho de dupla via entre os aprimoramentos realizados nas Casas Familiares Rurais, assim como do Mar, que terminam por serem inseridas nas propriedades e vice-versa. Análise fundamental neste contexto, se refere aos espaços técnicos como dimensões de difusão e construção de técnicas e códigos técnicos elaborados em condições singulares, estabelecidas em diálogo com o local e com os sujeitos que dele participam. Destaca-se neste sentido, o espaço técnico composto pelo pinheiral existente em uma das Casas Familiares Rurais visitadas, utilizado para difusão de saberes e elaboração de técnicas destinadas à formação de jovens e famílias que possuem no extrativismo do pinhão suas principais atuações junto às propriedades, juntamente como a erva-mate. Mais do que isso, significa interpretar o espaço técnico da horta ou do pinheiral numa conjuntura mais ampla relacionada às racionalidades dos sujeitos que neles desenvolvem atos poiéticos que dialogam com códigos técnicos amparados em tradições, concepções e modos de divisão do trabalho, papeis de gênero, construídos socialmente, relações de poder estabelecidos entre pais e jovens, mas também pelas opções pelo uso de técnicas específicas, que perpassam também pelas opções políticas 144 orientadoras das tecnologias selecionadas. Além disso, se as dinâmicas que se desenvolvem a partir da Pedagogia da Alternância no contexto das Casas Familiares Rurais possuem laços estreitos junto aos espaços técnicos, em se tratando da Casa Familiar do Mar analisada, as perspectivas assumidas para os mesmos possuem igual relevância, contudo com as suas singularidades. Considerações Finais Como consideração tem-se como ponto de partida a perspectiva assumida pela Casa Familiar como um objeto técnico em diálogo com os instrumentos e diretrizes pedagógicas inerentes à Pedagogia da Alternância. Compreender a Casa Familiar como objeto-espaço significa tomá-la como construção biográfica concreta, material que efetivamente se ressignifica em espaço, mas também como objeto simbólico de um sistema pedagógico atravessado por relações de afeto, de poderes, de interações que se estabelecem entre seus sujeitos e pelo trabalho como princípio pedagógico. Há que se considerar ainda, a relevância da Casa Familiar como objeto que está dialogando permanentemente com a técnica e com a tecnologia, na medida em que suas dinâmicas, seus funcionamentos, seu projeto e seu design terminam por incorporar ou estabelecer códigos técnicos engendrados ao seu contexto. Daí novamente a necessidade de reforçar a Casa Familiar como objeto-espaço no âmbito da Pedagogia da Alternância, tendo em vista a diversidade de projetos e designs verificados nas casas visitadas, bem como das dinâmicas de ensino-aprendizagem (imagens, materiais, ambientes) que buscam construir a partir da Casas Familiar sentido para os conteúdos em discussão. Neste sentido, destacam-se as percepções em torno dos espaços técnicos primeiramente assumidos como dimensões de difusão e construção de técnicas e códigos que possuem vinculações com os aspectos locais, seja da propriedade familiar, das configurações da comunidade pesqueira. No entanto, mais do que ambiente de difusão, o espaço técnico pode ser considerado como um tempo singular no âmbito da Pedagogia da Alternância por significar também espaço para a construção de relações sociais, da construção, reforço 145 ou desconstrução de tradições e de saberes. Destaca-se neste enfoque a importância assumida durante o estudo, pelas hortas, como espaço de construção de autonomias, apropriação de técnicas, construção de papeis, inclusive para além da dimensão tecnológica. Do mesmo modo, os pinheirais nas comunidades no qual o extrativismo ainda carrega importância considerável no que diz respeito às possibilidades do campo. E em se tratando de espaço técnico, o mar para a comunidade pesquisa, laboratório por excelência, somente pôde ser analisado a partir da premissa de se constituir como lócus privilegiado para a interação não apenas de seus sujeitos, nas relações com a natureza, mas nestas por meio dos objetos naturais e artificiais que o compõem. Referências Bibliográficas APPADURAI, A. Mercadorias e a política de valor. In: A vida social das coisas. Niterói: EDUFF, 2008. BEGNAMI, J. B. Formação pedagógica de monitores das escolas famílias agrícolas e alternâncias: um estudo intensivo dos processos formativos de cinco monitores. 2003. Dissertação (Mestrado)- Universidade Nova de Lisboa/Universidade François Rabelais/UNEFAB. Brasília. 2003. DAMATTA, G. A casa e a rua: espaço, cidadania, mulher e a morte no Brasil. Rio de Janeiro: Rocco, 1997. DUSSEL, E. Tecnología y necesidades básicas. In: Filosofia de la producción. Bogotá: Nueva America, 1984, In: http://www.ifil.org/dussel/. GARCÍA-MARIRRODRIGA, R.; CALVÓ, P. P. Formação em alternância e desenvolvimento local: o movimento educativo dos CEFFAS no mundo. Belo Horizonte: O Lutador, 2010. GIMONET, J.C. Lograr y comprender la Pedagogía de la Alternancia. Guatemala: AIMFR, 2009. SILVA, J. G. Tecnologia & Agricultura Familiar. Porto Alegre: UFRGS, 1999. VIEIRA PINTO, A. O conceito de tecnologia. V.1, Rio de Janeiro: Contraponto, 2005. 146 GT4- CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL Transmissão de Tecnologias Socioambientais para as Comunidades visando o Desenvolvimento Sustentável1 Wellington Marchi PAES² Maria Cristina CRISPIM³ ² Mestrando do PRODEMA - Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Ambiente da Universidade Federal da Paraiba, e-mail: [email protected] ³ Professora Associada da UFPB/PRODEMA, e-mail: [email protected] Resumo Desenvolvimento sustentável deve ser pensado em ações conjuntas entre pesquisadores e atores, transmitidas e divulgadas, para que cada localidade possa aplicar os conhecimentos de forma contextualizada. Sendo assim, a apropriação pelas comunidades de tecnologias que visem o DS é essencial, nesse processo de evolução conjunta. As Tecnologias Socioambientais são transdisciplinares e multidimensionais, promovendo uma interação entre as ciências sociais e naturais e entre o conhecimento científico e os outros diversos saberes. Este trabalho visou levar a diferentes comunidades da Paraíba, conhecimentos que lhes proporcionassem melhor qualidade de vida, através do desenvolvimento de TSA, baseadas em técnicas de Permacultura, com atividades de hortas agroecológicas, de reuso de resíduos sólidos e da gestão de efluentes residenciais com a implementação de fossas ecológicas, todas as ações realizadas e apreendidas pelos moradores locais. Palavras-chave: Biotecnologias; Desenvolvimento Sustentável; Permacultura; Saneamento Ecológico; Tecnologias Socioambientais 1. Introdução As comunidades humanas estão distanciando-se da relação e dos conhecimentos que os antepassados tinham com o ambiente, em nome da “civilização e progresso”. Nos grupos étnicos ou tradicionais, conhecimentos milenares vão sendo substituídos por atitudes de desperdício, baseadas no consumo exacerbado, cada vez mais divulgados por uma mídia alienante subsidiada pelo capitalismo inescrupuloso. 1 Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional – II SEDRES, Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014. 147 O desenvolvimento sustentável busca criar condições de associar o crescimento econômico com a manutenção da qualidade ambiental, de forma a proporcionar uma melhor qualidade da vida. Quando se pensa em desenvolvimento sustentável, tem-se de pensar em ações conjuntas entre pesquisadores e atores, que possam ser transmitidas e divulgadas, para que cada localidade, urbana ou rural, aplique tais conhecimentos de forma contextualizada e as divulgue dentro das suas relações pessoais. De acordo com Novaes e Dias (2009), as Tecnologias Sociais (TS) surgem como uma crítica aos métodos da tecnologia convencional (TC) e um dos seus objetivos é justamente transformar a tendência excludente imposta pela tecnologia capitalista, apontando para uma produção coletiva e não mercadológica. Furtado (2003, p.31), ressaltou que é imprescindível desenvolver tecnologias que desempenhem um papel direto ou indireto no aprimoramento da qualidade ambiental, portanto, que sejam ecoeficientes “com especial destaque para o uso de recursos (matérias primas, água e energia)” além da minimização da geração de resíduos e efluentes, sendo denominadas de Tecnologias Ambientais (TA). As Tecnologias Socioambientais (TSA), estão na interface que labuta e abrange as TS e TA, dessa forma, são transdisciplinares e multidimensionais, promovendo uma interação entre as ciências sociais e naturais, assim como, entre o conhecimento científico com outras diversas formas de sabedoria, como a tradicional e popular, a filosófica, a artística, a espiritual, entre outras (ANDRADE, et al., 2012). Podem ser compreendidas como um conjunto de técnicas ou metodologias transformadoras, desenvolvidas em interação com as pessoas e comunidades e apropriadas por elas, voltados para as resoluções de problemas das populações mais carentes em aspectos fundamentais, que promovam a melhoria das condições de vida, bem como propiciem melhor qualidade ambiental (RODRIGUES; BARBIERI, 2008). Nesse sentido, “um passo importante e muito comum é aliar a pesquisa e a extensão universitária com as práticas populares. Várias tecnologias, ao 148 serem analisadas nesse âmbito, passam a ter status de solução recomendada pela academia” (LASSANCE JR.; PEDREIRA, 2004, p.74). Técnicas permaculturais são alternativas que vêm sendo desenvolvidas no intuito de produzir uma cultura permanente, que reintegra o ser humano ao ambiente, levando em consideração diversos fatores que estão auxiliando a degradar a vida e a natureza, com métodos para o melhor aproveitamento da energia disponível, minimização dos desperdícios, manutenção da fertilidade do solo, saneamento ecológico, entre outros (MOLLISON; SLAY, 1994). Este trabalho, visou aproximar a Universidade de comunidades rurais e periurbanas, com o desenvolvimento de algumas TSA, baseadas em técnicas de Permacultura, proporcionando aos moradores locais conhecimentos e métodos para alavancar melhor qualidade de vida, através da Ecopedagogia e atividades de hortas agroecológicas, da reutilização de resíduos sólidos e produção artística e da gestão dos efluentes domésticos com implantação de fossas ecológicas. Os projetos foram desenvolvidos em diferentes comunidades da região metropolitana de João Pessoa, na Paraíba. 2. Ecopedagogia e horta agroecológica De acordo com Leff (2007), é na construção da racionalidade ambiental, desconstrutora da racionalidade capitalista, que se forma o saber ambiental. Nesse sentido, busca-se uma cultura emancipatória à hegemônica deturpação natural, formalizando, o que Capra (2005) chama de Ecoalfabetização, um sistema de educação voltado para a vida sustentável, que utiliza os princípios básicos da ecologia, propondo uma pedagogia centrada na compreensão da vida, com uma experiência no mundo real, empregando o espírito de participação e integração à natureza. Segundo o autor, a horta é um ambiente de aprendizagem rico e multissensorial, perfeito para experimentar o pensamento sistêmico e os princípios da ecologia em atuação. Pois, há nos vegetais a doação celestial à evolução universal dos organismos vivos no planeta e isso inclui a espécie humana. O projeto de Permacultura na Escola, realizou-se no primeiro semestre de 2011, com dois grupos de alunos da Escola Municipal de Ensino 149 Fundamental de Nova Vida – EMEFNV, no Viveiro de mudas do Assentamento de Nova Vida, que é um assentamento de reforma agrária do MST, pertencente ao município de Pitimbu, na Região Metropolitana de João Pessoa na Paraíba. Os encontros aconteceram uma vez por semana no período matutino, em horários distintos. Uma das turmas, com cerca de vinte alunos que estudavam no 1°ano no período matutino, a maioria com 06 anos idade, foram acompanhados pela professora durante as atividades. O outro grupo foi de alunos que frequentavam a escola no período vespertino, do 2° ao 5° ano, com idades entre 07 e 13 anos, com uma média de quinze alunos por aula. Na perspectiva de “plantar a semente” no coração dessas crianças e jovens, para a preservação de seus ambientes, fomentando o desenvolvimento de uma sustentabilidade socioambiental e instituindo o cuidado com a mãe Terra e suas vidas, desenvolveu-se um trabalho cooperativo entre os participantes. Para isso foram empregadas técnicas permaculturais, as quais visam à criação de sistemas ecologicamente corretos e economicamente viáveis, que supram suas próprias necessidades e sejam sustentáveis no longo prazo (MOLLISON; SLAY, 1994). O trabalho em todos os encontros dividiu-se em duas etapas, uma expositiva de sensibilização e aprendizagem no interior de uma das salas no Viveiro de mudas, valendo-se de dinâmicas interativas e jogos pedagógicos. A segunda parte de atividades práticas, relacionadas com o cultivo e manejo de espécimes vegetais, utilizadas como alimento humano, e desenvolvidas na área externa do Viveiro de mudas. Durante as atividades práticas, foram elaborados e construídos dois canteiros circulares no formato de “buraco de fechadura” pelas crianças em Nova Vida. Depois de demarcados os canteiros, um deles foi delimitado com cerca de 130 garrafas plásticas do tipo Pet de 2 litros, recolhidas pelos alunos, expostos na Figura 01a,b. A Figura 01c, apresenta o canteiro buraco de fechadura finalizado, com a cobertura vegetal e o desenvolvimento de alguns espécimes vegetais transplantadas pelas crianças de Nova Vida dentro das atividades permaculturais desenvolvidas no local. 150 Figura 01. a) Demarcação do canteiro pelas crianças da escola; b) Trabalho cooperativo dos alunos no canteiro; c) O canteiro buraco de fechadura confeccionado com garrafas plásticas pelos alunos da EMEFNV no Viveiro de mudas do Assentamento Nova Vida em Pitimbu, PB. Fotos: Wellington Paes (2011). Considerou-se frente ao trabalho realizado com as crianças da escola e do relato de alguns pais, a necessidade de atividades que pudessem inserir valores educacionais diferenciados e complementares à educação formal, na perspectiva da Ecopedagogia, para uma melhor percepção, interação e gestão de seus ambientes. Desta forma, desenvolver o interesse e desenvoltura pela cultura de subsistência, no intuito de promover a sensibilização para a sustentabilidade socioeconômica e ambiental de suma importância na atual conjuntura das sociedades humanas e prepará-las adequadamente para a vida que se abre, resgatando o amor, a solidariedade e a criatividade na melhoria da qualidade das vidas da comunidade, foi fundamental. 151 3. Reuso de materiais para a produção artística A Comunidade Quilombola de Ipiranga situa-se no distrito de Gurugi, município do Conde na Paraíba. O município do Conde está localizado na Mata Paraibana, 13 km ao sul da capital e junto à Bayeux, Santa Rita e Cabedelo forma a Grande João Pessoa. O projeto em Ipiranga ocorreu no segundo semestre de 2012, com cerca de sete pessoas de três famílias na comunidade quilombola. Os encontros ocorreram uma vez por semana, geralmente no período noturno, turno mais conveniente para as participantes devido às suas atividades diárias. Devido à ineficiência do serviço de coleta de lixo municipal no distrito de Gurugi, onde localiza-se a comunidade de Ipiranga, moradores locais costumam incinerar os resíduos sólidos domésticos. A incineração dos resíduos sólidos é uma prática tradicional e comum em comunidades rurais modernas e em toda essa região da Paraíba. Porém, ao reunir os resíduos naturais dos quintais com o lixo doméstico, que não mais é composto apenas por resíduos orgânicos, como no início das civilizações, contendo diversos tipos de materiais agregados e que quando cremados liberam substâncias nocivas à saúde ambiental e humana. Como exemplo temos a dioxina, que é uma das substâncias mais tóxicas produzidas pela ação humana, sendo liberada para atmosfera com a combustão de todos os tipos de plásticos, entre outros materiais componentes do lixo doméstico4. Deste modo, apresentaram-se alternativas às pessoas da comunidade de Ipiranga para que elas solucionassem essa questão dentro da comunidade, transformando problemas em soluções. Com a reutilização dos materiais, promove-se o desenvolvimento criativo, artístico e cognitivo, diminui a disposição dos resíduos no ambiente quilombola e, ainda, pode-se incrementar a renda familiar com a minimização do consumo e a venda dos produtos. Neste trabalho, visou-se a reutilização de alguns resíduos, no sentido de discutir e experimentar as infinitas possibilidades artísticas para a transformação dos materiais, proporcionando nova utilidade para os descartados e seu retorno ao 4 A HISTÓRIA DAS COISAS. Produção de Anne Leopard. 2007. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=7qFiGMSnNjw> Acesso em: 15 ago. 2013. 152 ciclo produtivo. Nesse sentido, foram promovidas rodas de conversa com as pessoas da comunidade que participaram da ação, enfatizando o Repensar atitudes e valores, em que os cidadãos passam a assumir efetivamente o seu papel na coletividade e na preservação de seu ambiente, com a Redução na geração de resíduos, a Reciclagem e a Reutilização dos materiais descartados, como medidas de minimizar os impactos ambientais, buscando a formação de multiplicadores numa perspectiva da prática desses 4R’s. Desenvolveram-se algumas oficinas para a reutilização dos resíduos sólidos da comunidade e produção artística com essas pessoas, como a confecção de vassouras, pufes e borboletas de garrafas plásticas descartadas e a produção de mandalas de fios Olho de Deus, com reuso de palitos de madeira e outros resíduos, apresentados na Figura 02. Figura 02. a) Uma das vassouras de garrafas Pet confeccionadas nas oficinas de arte com reuso de resíduos sólidos; b) O pufe construído e encapado por uma das participantes dos trabalhos; c) A produção de borboletas de Pet das oficinas; d) As Mandalas de Fios “Olho de Deus” produzidas nas oficinas de reuso de materiais realizadas na comunidade quilombola de Ipiranga no municipio do Conde, Paraíba. Fotos: Wellington Paes (2012). 153 A reutilização dos materiais é uma forma de redução de consumo e de descarte de resíduos, pois consiste em utilizar o mesmo produto de outras maneiras, ao invés de descartá-lo no ambiente, prolongando a sua vida útil e isto depende da criatividade do gerador, podendo-se confeccionar diversos artigos numa perspectiva de economia criativa. A Economia Criativa é uma abordagem holística e multidisciplinar, que labuta com as interfaces entre a economia, a cultura e a tecnologia, resultantes de uma mudança gradual de paradigma na promoção do desenvolvimento sustentável (DUISENBERG apud LIMA, 2012). 4. Saneamento ecológico em comunidades O saneamento ecológico é uma abordagem sistêmica, que representa uma mudança na forma de pensamento e de atuação das pessoas em relação aos esgotos domésticos, reconhecendo a necessidade e os benefícios da promoção da saúde e o bem-estar humano e ambiental. O saneamento proporciona a proteção e conservação das águas e solos, ao mesmo tempo em que promove o fluxo circular, com a recuperação e reciclagem de nutrientes para a produção de alimentos e ornamentação local (ESREY; ANDERSSON, 2001). Segundo Alsén e Jensen (2004), o saneamento ecológico é fundamentado na separação dos esgotos domésticos na fonte, divididos em águas cinzas (águas de pias, chuveiros, lavanderia e limpezas em geral) e águas negras (águas com fezes e urina dos banheiros), o que facilita soluções mais sustentáveis para os efluentes residenciais do que os sistemas convencionais. A admissão do conceito de separação na fonte, permite o tratamento adequado dos distintos tipos de esgotos domésticos, que necessitam de tratamentos diferenciados de acordo com suas características, “esta é a chave de soluções técnicas para o reuso eficiente da água, energia e nutriente” dos efluentes (GALBIATI, 2009, p. 02). Neste sentido, de acordo com Diniz (2012), as alternativas tecnológicas da Permacultura têm muito a contribuir, pois além da simplificação e eficiência no tratamento dos efluentes domiciliares segregados, em seus princípios 154 agregam-se os valores ambientais e humanos, dessa forma, as águas são reutilizadas, os dejetos viram adubo e os ambientes tornam-se mais belos e agradáveis com a produção de alimentos saudáveis e nutritivos, como bananas e mamões, entre outros, além de evitar o aumento da eutrofização, impedindo que esses nutrientes alcancem os corpos d’águas. Por outro lado, os sistemas de saneamento ecológicos podem ser construídos em locais em que o saneamento básico municipal não está presente, auxiliando na contenção da poluição difusa, grande responsável pela contaminação de solos e águas. De fácil construção e manejo, o Círculo de Bananeiras (CB) é um elemento fundamental na habitação urbana ou rural, por cumprir mais de uma função importante: tratar a água residual localmente; compostar os resíduos orgânicos dos quintais e os materiais lenhosos, evitando a queimada desses; e a produção de alimentos, podendo ser associado a várias outras espécies vegetais, tudo num círculo de dois metros de diâmetro (CASTAGNA, s/d.). O Tanque de Evapotranspiração (TEvap) é um sistema de tratamento de esgoto e reaproveitamento dos nutrientes de águas negras, provenientes do vaso sanitário, para a produção de flores e frutas. Consiste em um sistema de filtros e com plantas na superfície, em seu interior ocorre decomposição anaeróbia da matéria orgânica, a mineralização e absorção das águas e dos nutrientes pelas raízes, estes incorporando-se à biomassa das plantas e a água sendo eliminada por evapotranspiração (PAULO; BERNARDES, 2009). Este trabalho foi desenvolvido com os moradores nas comunidades do Vale do Gramame e do Condomínio Amizade em João Pessoa na Paraíba, no decorrer do ano de 2013. Os trabalhos foram realizados em forma de mutirão, com o auxílio de voluntários, jovens e crianças. Nessas localidades, desenvolveram-se oficinas práticas de técnicas permaculturais de saneamento ambiental ecológico, com a construção de cinco CB experimentais em três residências da região do Vale do Gramame, para o tratamento e aproveitamento das águas residuárias das residências e dos resíduos orgânicos de lenta decomposição dos quintais, para a produção de alimentos e composição paisagística local (Figura 03a,b). Essas, também, são as finalidades 155 do TEvap, construído no Condomínio Amizade para o tratamento e aproveitamento de efluentes domiciliares, no qual, ainda, promoveu-se a reutilização de resíduos sólidos humanos dispersos no ambiente, como pneus e entulhos da construção civil, apresentados na Figura 03c,d,e,f. Figura 03. A eficiência das Tecnologias Socioambientais implementadas em João Pessoa, Paraíba: a) Destino dos efluentes do banheiro em uma das residências trabalhadas no Vale do Gramame antes da implementação da TSA, as águas cinzas seguiam no buraco com balde; b) O Círculo de Bananeiras implantado, com o plantio das mudas ao redor da fossa repleta de matéria orgânica de lenta decomposição e a cobertura do canteiro, para o aproveitamento das águas cinzas deste local na propriedade; c) A situação do local no Condomínio Amizade antes da implantação do Tanque de Evapotranspiração com os esgotos correndo a céu aberto; b) O local após a implantação do TEvap; c) Produção de melões com a água tratada do sistema ecológico; d) Melhorias na composição da paisagem no Condomínio Amizade. Fotos: Wellington Paes (a,b,c: 2013; d,e,f: 2014). 156 Com esses sistemas, os esgotos domiciliares, que na maioria do país contaminam águas e solos, são tratados localmente e aproveitados para a produção de alimentos e paisagismo, diminuindo o escoamento de esgotos para os rios. Assim, com a implantação das TSA de saneamento ecológico nessas comunidades, minimizaram-se a contaminação humana e ambiental cessando com a exposição de esgotos a céu aberto nesses ambientes, dessa forma, contribuindo com a melhoria na qualidade de vida das pessoas na periferia da capital paraibana. Outro resultado importante foi a reaplicação das técnicas apreendidas pelos moradores locais em três das quatro localidades trabalhadas, com a construção de mais dois CB no Vale do Gramame e um TEvap no Condomínio Amizade. Todas essas tecnologias foram bem aceitas pelas comunidades e devem ser divulgadas para outras, para que possam gerenciar melhor o saneamento básico, tanto os resíduos sólidos, quanto os líquidos. Para finalizar, pode-se considerar que com as ações desenvolvidas neste trabalho, viu-se a possibilidade de melhorias socioambientais de comunidades a partir da efetivação de atividades práticas conjuntas entre pesquisadores e sociedade, no intuito da capacitação das pessoas para a promoção da qualidade da vida e salubridade ambiental. Isso foi possível com a implementação de técnicas simples e eficazes de saneamento ambiental ecológico, reuso de materiais e hortas agroecológicas, para a minimização da degradação e contaminação do ambiente por atividades humanas, contribuindo para o desenvolvimento sustentável regional. Referências ALSÉN, K.W.; JENSSEN, P. (Eds.). Ecological Sanitation: for Mankind and Nature. Aas: Norwegian University of Life Sciences, 2004. ANDRADE, M. O. et al. Gestão e desenvolvimento socioambiental na Paraíba através das pesquisas do Prodema. In: ANDRADE, M. O.; LIMA, G. F. C. (Org.). Gestão e desenvolvimento socioambiental na Paraíba: concepções e práticas. João Pessoa: Editora da UFPB, v. 1, 2012. p. 11-46. CAPRA, F. Alfabetização ecológica: a educação das crianças para um mundo 157 sustentável. São Paulo: Pensamento e Cultrix, 2005. CASTAGNA, G. Construção de círculo de bananeiras. Disponível em: <http://www.ipcp.org.br/References/seAlimentando/Composteiras/CARTILHA%20circul o%20de%20bananeiras.pdf> Acesso em: 20 maio 2012. DINIZ L. T. Municípios podem diversificar saneamento básico nos mananciais com alternativas tecnológicas. ISA - Instituto socioambiental, 2012. Disponível em: <http://site-antigo.socioambiental.org/nsa/detalhe?id=2742>. Acesso em: 13 out. 2013. ESREY, S. A.; ANDERSSON, I. Ecological Sanitation-Closing the loop. RUAF, Resource Centre on Urban Agriculture and Forestry, n. 3, p. 1-3, 2001. FURTADO, J. S. 2003. Gestão com responsabilidade socioambiental. Ferramentas e tecnologias. São Paulo: Produção Limpa, 2003. Disponível em: <http://www.gerenciamento.ufba.br/Downloads/Desenvolvimento%20sustent%C3%A1 vel%20e%20comunidade.pdf>. Acesso em: 17 jan. 2014. GALBIATI, A. F. Tratamento domiciliar de águas negras através de tanque de evapotranspiração. 2009. 38 f. Dissertação (Mestrado em Tecnologias Ambientais) Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Centro de Ciências Exatas e Tecnologia. Campo Grande, 2009. LASSANCE JR., A. E.; PEDREIRA, J. S. Tecnologias sociais e políticas públicas. In: LASSANCE JR., A. E. et al. Tecnologia social: uma estratégia para o desenvolvimento. Rio de Janeiro: Fundação Banco do Brasil, 2004. p. 65-81. LEFF, E. Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2007. LIMA, P. Por uma Economia Criativa, divertida e sustentável. In: FONSECA, A. C. et al. Economia criativa: um conjunto de visões (recurso eletrônico). 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A análise de dados comparativa com médias nacionais revela que a suposta condição diferenciada em termos de inovação não se confirma, sendo que as empresas catarinenses apresentam, inclusive, várias desvantagens, o que acaba por desmistificar o caráter inovador de Santa Catarina. Neste sentido, sugere-se que a Política Catarinense de Ciência, Tecnologia e Inovação seja reorientada, tirando foco da inovação empresarial e voltando mais atenção às necessidades sociais e ao desenvolvimento regional. Palavras-chave: Inovação; Santa Catarina; Empresas catarinenses; PINTEC. Introdução Inovação é uma palavra recorrente em nossas vidas. Ela parece ser um fenômeno inerente ao ser humano. É difícil imaginar o mundo atual sem as inovações científicas e tecnológicas ocorridas no passado. Ainda assim, a 1 Trabalho apresentado no GT4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional – II Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014. SEDRES, 2 Estudante de Graduação em Ciências Econômicas da FURB e integrante do Núcleo de Pesquisas em Desenvolvimento Regional. Email: [email protected] 3 Economista, doutor em Geografia pela Universität Tübingen, professor e pesquisador da FURB, e coordenador do Núcleo de Pesquisas em Desenvolvimento Regional. Email: [email protected] 159 importância da inovação nem sempre foi tão grande como é atualmente (FAGERBERG, 2005). Neste sentido, no Brasil, falar em inovação tornou-se algo comum apenas recentemente. De fato, o debate sobre inovação vem ganhando corpo não somente nas esferas governamental e acadêmica, mas também, no meio empresarial. Todavia, enquanto no cenário internacional, sobretudo nos países desenvolvidos, a inovação é, há muitos anos, preocupação perceptível das empresas, observa-se um consenso de que a realidade brasileira está bem distante da ideal. Diversos autores vêm chamando a atenção para o fato das empresas situadas no território brasileiro pouco inovarem. De fato, análises comparativas internacionais com base em indicadores de inovação revelam que o desempenho do Brasil deixa muito a desejar. Dentro desse contexto, o estado de Santa Catarina aparenta, num primeiro momento, ser uma exceção. Situado na macrorregião Sul do Brasil, Santa Catarina é tida, por muitos, como uma experiência socioeconômica diferenciada. Algumas evidências corroboram com tal inferência: o dinamismo e a diversificação de sua indústria, a presença de vários polos tecnológicos e o suposto perfil empreendedor de sua população. Diante do exposto, a problemática de pesquisa deste trabalho pode ser expressa através pergunta: Qual a situação das empresas catarinenses em termos de inovação? Com base na problemática proposta, o objetivo geral é analisar a inovação em empresas catarinenses. Apoia-se, para tal, em dados oficiais oriundos da Pesquisa de Inovação – PINTEC, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Como em toda pesquisa científica, este estudo faz uso de métodos científicos. A seguir, estão descritos os componentes metodológicos empregados. Quando ao método de abordagem, o método dialético mostra-se como ideal para permitir o alcance dos objetivos propostos, pois, pressupõe-se que o estudo da inovação em empresas catarinenses deve ser compreendido em meio a um contexto social, político e econômico. No que diz respeito ao método de procedimento, são utilizados vários métodos concomitantemente, no entanto, um deles merece especial atenção, o método estatístico. Considerando-se à 160 técnica de pesquisa, esta é caracterizada por dois tipos: a pesquisa bibliográfica e a pesquisa documental. Apesar de estar apoiada em dados estatísticos, a pesquisa é classificada, além de quantitativa, como qualitativa. Temporalmente, os dados coletados e posteriormente analisados concentramse no período de 1998 a 2011, contemplando, assim, o universo temporal dos cinco triênios (1998-2000; 2001-2003; 2003-2005; 2006-2008 e 2009-2011) analisados nas cinco edições da PINTEC/IBGE. Espacialmente, a pesquisa está delimitada ao território catarinense e, com o propósito de comparar o seu desempenho, é considerado também o território brasileiro. Os dados abrangem a totalidade de empresas industriais com dez ou mais pessoas ocupadas, localizadas nestes dois recortes espaciais. Inovação em empresas catarinenses: alguns indicadores Esta seção é dedicada à apresentação e análise de dados relativos à dinâmica inovativa catarinense, com base em dados oriundos da PINTEC. Para isso, são feitas comparações com dados nacionais. Os indicadores selecionados estão relacionados aos resultados inovativos (taxa de inovação), ao esforço empreendido para inovar (dispêndios e recursos humanos) e aos problemas e obstáculos (razões da não implementação). Taxa de inovação Um dos resultados inovativos mais comuns é a taxa de inovação, que consiste no quociente da divisão entre o número de empresas inovadoras e a quantidade total. A Tabela 1 apresenta a quantidade de empresas que implementaram inovações de produto e/ou processo dentre a quantidade total de empresas consideradas pela PINTEC no respectivo período. A partir desses dados, tem-se a taxa de inovação. 161 Tabela 1 - Empresas que implementaram inovações de produto e/ou processo, 1998-2011 Que implementaram Quantidade Indústrias Período inovações de Total produto e/ou processo 1998-2000 72.005 22.698 2001-2003 84.262 28.036 Brasil 2003-2005 91.055 30.377 2006-2008 100.496 38.299 2009-2011 116.632 41.470 1998-2000 5.268 2.046 2001-2003 6.915 2.480 Santa Catarina 2003-2005 7.585 2.648 2006-2008 8.472 3.209 2009-2011 10.275 3.555 Fonte: Elaboração própria com base em IBGE (2002; 2005; 2007; 2010; 2013). Taxa de inovação (%) 31,52% 33,27% 33,36% 38,11% 35,56% 38,84% 35,86% 34,91% 37,88% 34,60% A tabela evidencia que o Brasil apresenta, ao longo dos períodos, um aumento gradativo do número de empresas inovadoras, passando de 22.698 empresas em 1998-2000 para 41.470 em 2009-2011, o que corresponde a 82,70%. Esse aumento é percentualmente superior ao da quantidade total de empresas consideradas pela PINTEC, que passou de 72.005 para 116.632 (61,98%). Logo, há um crescimento da taxa de inovação ao longo dos períodos, passando de 31,52% em 1998-2000 para 35,56% em 2009-2011, o que representa 12,82% em termos relativos. Contudo, observa-se que a taxa de inovação, que sofreu variações positivas até 2006-2008, teve variação negativa no último período (2009-2011), já que passou de 38,11% para 35,56%, uma diminuição, em termos relativos, de 6,69%. Em Santa Catarina, nota-se igualmente um aumento do número de empresas que implementaram inovações ao longo dos períodos, passando de 2.046 em 1998-2000 para 3.555 em 2009-2011. Porém, ao se analisar a evolução percentual em relação ao total de empresas investigadas, percebe-se uma queda de 2,47% da taxa de inovação (de 38,84% para 34,60%) no mesmo período. Ou seja, as empresas catarinenses eram mais inovadoras no primeiro triênio (1998-2000) da PINTEC do que no último (2009-2011). 162 No comparativo entre Brasil e Santa Catarina, os dados revelam que o número de empresas catarinenses que implementaram inovações de produto e/ou processo é superior, em valores relativos, ao Brasil nas três primeiras edições da PINTEC. Portanto, entre 1998-2000 e 2003-2005, a taxa de inovação das empresas catarinenses estava acima da nacional. Contudo, nas duas últimas edições da PINTEC (2006-2008 e 2009-2011) Santa Catarina fica abaixo da média nacional, pois a taxa de inovação das empresas catarinenses é inferior à taxa das empresas brasileiras: 37,88% contra 38,11% em 2006-2008 e 34,60% contra 35,56% em 2009-2011. Dispêndios Os dispêndios relacionados às atividades inovativas é um dos indicadores mais comuns para analisar o esforço empreendido pelas empresas para inovar. Tabela 2 - Empresas, total e as que realizaram dispêndios nas atividades internas de Pesquisa e Desenvolvimento, 1998-2011 Indústrias Período Total de empresas que implementaram inovações Dispêndios realizados nas atividades inovativas pelas empresas que implementaram inovações Atividades internas de Dispêndios totais P&D Número de empresas % 1998-2000 22.698 19.165 84,43% 2001-2003 28.036 20.599 73,47% Brasil 2003-2005 30.377 19.951 65,68% 2006-2008 38.299 30.645 80,02% 2009-2011 41.470 32.616 78,65% 1998-2000 2.046 1.712 83,68% 2001-2003 2.480 1.917 77,30% Santa 2003-2005 2.648 1.666 62,92% Catarina 2006-2008 3.209 2.710 84,45% 2009-2011 3.555 2.732 76,85% Fonte: Elaboração própria com base em IBGE (2002; 2005; 2007; 2010; 2013). Número de empresas % 7.412 4.941 5.046 4.268 5.876 654 480 354 407 497 32,65% 17,62% 16,61% 11,14% 14,17% 31,96% 19,35% 13,37% 12,68% 13,98% Durante os cinco triênios, das empresas brasileiras que implementaram inovações, 76,44% realizaram dispêndios em atividades inovativas e 17,12% realizaram dispêndios especificamente em atividades internas de P&D. Nas empresas catarinenses inovadoras, os percentuais foram praticamente 163 similares: 77,03% para atividades inovativas e 17,16% para atividades internas de P&D. Os dados mostram variações no que diz respeito a quem mais investiu, em termos relativos, em atividades inovativas. As mesmas variações ocorrem em relação aos dispêndios em atividades internas de P&D. Verifica-se em cada triênio que a indústria que mais investiu em atividades inovativas também teve o maior percentual em dispêndios em atividades inovativas. Ademais, nota-se, conforme a Tabela 2, que em ambas as indústrias há redução do percentual de empresas que investiram em atividades inovativas. No Brasil, o percentual de 84,43% em 1998-2000 passou para 78,65% em 2009-2011, enquanto que em Santa Catarina, o valor de 83,68% em 1998-2000 passou para 76,85% em 2009-2011. Já nos dispêndios em atividades internas de P&D, há redução não apenas relativa, mas também absoluta de empresas que realizaram dispêndios em atividades de P&D. No Brasil, o número de empresas que investiram em P&D passou de 7.412 em 1998-2000 para apenas 5.876 em 2009-2011 e o percentual sobre o montante de empresas de 32,65% em 1998-2000 passou para 14,17% em 2009-2011. Em Santa Catarina, as 654 empresas em 1998-2000 diminuíram para 497 em 2009-2011, à medida que o percentual de 31,96% em 1998-2000 passou para apenas 13,98% em 20092011. A redução do número de empresas que realizaram dispêndios em P&D indica uma concentração cada vez maior de P&D em menos empresas. Tabela 3 - Número de empresas com dispêndios de acordo com as atividades inovativas desenvolvidas, 2000-2011 Indústrias Atividades inovativas desenvolvidas 2000 Brasil Período 2003 2005 2008 2011 2000 Atividades internas de P&D 7.412 4.941 5.046 4.268 5.876 654 480 354 407 497 Aquisição externa de P&D 1.668 1.202 1.227 1.422 1.834 194 117 54 86 181 Aquisição de outros conhecimentos externos 2.914 2.053 2.300 3.681 3.699 347 332 137 245 235 164 Santa Catarina Período 2003 2005 2008 2011 Aquisição software de Não dispon. Não dispon. 3.565 8.307 10.336 Não dispon. Não dispon. 255 645 1.194 Aquisição de máquinas e equipamentos 15.540 16.250 15.680 24.252 26.379 1404 1.500 1.435 2.128 2.301 Treinamento 6.855 5.657 5.217 11.825 9.328 713 527 482 793 652 5.723 5.181 5.889 9.672 8.242 441 622 464 910 754 8.145 8.590 6.842 10.080 8.360 670 881 460 844 640 19.165 20.599 19.951 30.645 32.616 1.712 1.917 1.666 2.710 2.732 Introdução das inovações tecnológicas no mercado Projeto industrial e outras preparações técnicas Total Fonte: Elaboração própria com base em IBGE (2002; 2005; 2007; 2010; 2013). A Tabela 3 contabiliza o número de empresas que realizaram dispêndios em atividades inovativas, distribuídas em oito categorias: atividades internas de P&D; aquisição externa de P&D; aquisição de outros conhecimentos externos; aquisição de software; aquisição de máquinas e equipamentos; treinamento; introdução das inovações tecnológicas no mercado; e projeto industrial e outras preparações técnicas para a produção e distribuição. Nas empresas brasileiras, a aquisição de máquinas e equipamentos aparece, nos cinco triênios, como sendo a atividade inovativa na qual o maior número de empresas realizou dispêndios: 81,09% em 2000; 78,89% em 2003; 78,59% em 2005; 79,14% em 2008; e 80,88% em 2011. Em Santa Catarina, do mesmo modo que nas empresas brasileiras, a atividade inovativa na qual mais empresas realizaram dispêndios foi a aquisição de máquinas e equipamentos: 82,01% em 2000; 78,25% em 2003; 86,13% em 2005; 78,52% em 2008; e 84,22% em 2011. Desse modo, constata-se que, tanto para as empresas brasileiras quanto catarinenses, a atividade inovativa predominante é a aquisição de máquinas e equipamentos. 165 Recursos humanos Dados relativos aos recursos humanos ocupados nas atividades inovativas também são relevantes para analisar o esforço das empresas catarinenses para inovar. A próxima tabela relaciona o nível de qualificação dos recursos humanos das atividades internas de P&D das empresas brasileiras e catarinenses que implementaram inovações. Tabela 4 - Pessoas ocupadas nas atividades internas de P&D das empresas que implementaram inovações, por nível de qualificação, 2000-2008 Pessoas ocupadas nas atividades internas de P&D das empresas que implementaram inovações, por nível de qualificação Indústrias Período Nível superior Nível médio ou fundamental Total / Outros Pós-graduados Graduados 2000 41.467 2.953 17.161 21.353 2003 38.523 3.121 18.674 16.728 20.029 2005 47.628 4.330 23.269 Brasil 18.838 2008 48.096 4.398 24.860 23.594 2011 71.351 5.733 42.024 2000 2.742 143 1.120 1.479 2003 2.945 189 1.133 1.623 Santa 1.751 2005 3.637 333 1.553 Catarina 1.746 2008 3.562 208 1.608 2011 5.128 372 2.419 2.337 Fonte: Elaboração própria com base em IBGE (2002; 2005; 2007; 2010; 2013). Inicialmente, cabe destacar que, em ambas as indústrias, houve um aumento significativo do número total de pessoas ocupadas nas atividades internas de P&D ao longo dos períodos, sobretudo, no último. O total de pessoas ocupadas nas indústrias brasileiras cresceu em 72,07% de 2000 para 2011, enquanto que nas indústrias catarinenses o crescimento foi ainda maior: 87,02%. Constata-se também que, desde os dados da primeira PINTEC, o pessoal ocupado nas atividades internas de P&D das empresas brasileiras inovadoras tem, de forma predominante, nível superior, correspondendo a 48,51% em 2000; 56,58% em 2003; 57,95% em 2005; 60,83% em 2008; e 66,93% em 2011, do pessoal total ocupado em atividades internas de P&D. No entanto, deste pessoal de nível superior, os números relacionados aos pós-graduados são bastante inferiores aos apenas graduados: representam 14,68% em 2000; 166 14,32% em 2003; 15,69% em 2005; 15,03% em 2008; e 12,00% em 2011, do total de pessoal ocupado de nível superior. O que, por sua vez, representa 7,12% em 2000; 8,10% em 2003; 9,09% em 2005; 9,14% em 2008; e 8,03% em 2011, do montante total de pessoas ocupadas em atividades internas de P&D nas empresas brasileiras que implementaram inovações. Em Santa Catarina, a realidade não é diferente. O pessoal ocupado nas atividades internas de P&D das empresas catarinenses inovadoras desde os dados da primeira PINTEC tem, predominantemente, nível superior: 46,06% em 2000; 44,89% em 2003; 51,86% em 2005; 50,98% em 2008; e 50,43% em 2011, Dentre o pessoal de nível superior, os pós-graduados correspondem a 11,32% em 2000; 14,30% em 2003; 17,66% em 2005; 11,45% em 2008; e 13,33% em 2011. Em relação ao montante total, os pós-graduados são 5,22% em 2000; 6,42% em 2003; 9,16% em 2005; 5,84% em 2008; e 7,25% em 2011 – valores, em geral, inferiores às empresas brasileiras. Através desses dados, é possível concluir que, apesar do crescimento do número de pessoas ocupadas em atividades internas de P&D e do pessoal de nível superior corresponder a mais da metade do pessoal ocupado, as empresas brasileiras e catarinenses vem investindo pouco em recursos humanos com maiores qualificações, ou seja, pós-graduados. Razões da não implementação de inovações A tabela abaixo aponta as razões da não implementação das empresas que não implementaram e nem desenvolveram inovações. Os entraves para não inovar estão dispostos em três opções: inovações prévias, condições de mercado4 e outros fatores impeditivos.5 4 A PINTEC dá uma explicação bastante vaga do que vem a ser as condições de mercado: “[...] uma deficiência de demanda (agregada e/ou setorial) ou uma estrutura de oferta (concorrencial ou capacidade instalada) que desestimulou a inovação” (IBGE, 2013, p. 25). 5 Diz respeito ao conjunto das seguintes razões para não implementação de inovações: riscos econômicos excessivos; elevados custos de inovação; escassez de fontes apropriadas de financiamento; rigidez organizacional; falta de pessoal qualificado; falta de informação sobre tecnologia; falta de informação sobre mercados; escassas possibilidades de cooperação com outras empresas/instituições; 167 Tabela 5 – Empresas que não implementaram inovações e sem projetos, com indicação das razões porque não desenvolveram nem implementaram inovações, 1998-2011 Empresas que não implementaram inovações e sem projetos Razões da não implementação Indústrias Período Inovações Condições de Outros fatores Total prévias mercado impeditivos Nº % Nº % Nº % 1998-2000 46.182 5.365 11,62% 25.698 55,65% 15.119 32,74% 2001-2003 53.911 5.984 11,10% 35.253 65,39% 12.674 23,51% Brasil 2003-2005 58.621 6.619 11,29% 41.080 70,08% 10.923 18,63% 2006-2008 59.586 9.329 15,66% 33.127 55,60% 17.130 28,75% 2009-2011 72.419 9.799 13,53% 47.905 66,15% 14.714 20,32% 1998-2000 2.953 412 13,95% 1.370 46,39% 1.172 39,69% 2001-2003 4.279 472 11,03% 2.625 61,35% 1.182 27,62% Santa 2003-2005 4.724 672 14,23% 3.253 68,86% 799 16,91% Catarina 2006-2008 5.056 878 17,37% 2.914 57,63% 1.263 24,98% 2009-2011 6.594 963 14,61% 4.287 65,02% 1.343 20,37% Fonte: Elaboração própria com base em IBGE (2002; 2005; 2007; 2010; 2013). A partir dos dados, tanto nacionais quanto catarinenses, é possível verificar que, em todos os triênios das cinco pesquisas PINTEC, as condições de mercado são de longe a principal razão para a não implementação de inovações, sendo que outros fatores impeditivos ficam em segunda ordem e inovações prévias em último lugar. Nota-se, assim, que entraves normalmente ditos como principais impeditivos da inovação (aqueles que fazem parte do conjunto “outros fatores impeditivos”), não são os motivos primordiais. Considerações finais Esta pesquisa abarcou o tema da inovação em empresas catarinenses. O problema da pesquisa foi dado pela seguinte pergunta: Qual a situação das empresas catarinenses em termos de inovação? Partiu-se da hipótese de que, embora o Brasil estivesse em condição desfavorável internacionalmente em se tratando de inovação, Santa Catarina aparentava, num primeiro momento, ser exceção no cenário nacional. Para testar a hipótese, o objetivo do trabalho foi analisar a inovação ema empresas catarinenses. dificuldade para se adequar a padrões, normas e regulamentações; fraca resposta dos consumidores quanto a novos produtos; escassez de serviços técnicos externos adequados; e centralização da atividade inovativa em outra empresa do grupo. 168 Embora parcialmente, o trabalho atingiu o objetivo proposto. Considera-se que os indicadores apoiados na análise histórica (1998-2011) são suficientes para terem permitido uma série de considerações a fim de explicar a dinâmica da inovação nas empresas situadas no território catarinense. Os principais resultados obtidos e as principais inferências a partir deles seguem abaixo. Em relação à taxa de inovação catarinense, os dados não se mostraram animadores. As empresas catarinenses eram mais inovadoras no primeiro triênio contemplado pela PINTEC (1998-2000) do que no triênio mais recente (2008-2011), além de a análise comparativa ter evidenciado que as empresas catarinenses se tornaram menos inovadoras do que as brasileiras nos dois últimos triênios. No que tange aos dispêndios efetuados pelas empresas catarinenses em atividades inovativas, os dados possibilitaram constatar que a maior parte delas investiu na compra de máquinas e equipamentos. Viu-se, ademais, que o número de empresas que investiram em atividades internas de P&D foi decrescendo. Quanto aos recursos humanos, detectou-se que as empresas catarinenses apresentaram investimentos baixos em profissionais de maior qualificação, aqueles com pós-graduação, para realizar atividades internas de P&D. As comparações das empresas de Santa Catarina com as do Brasil dão suporte para afirmar que a indústria catarinense não representa uma exceção em termos de inovação no cenário nacional. Pelo contrário, alguns indicadores aqui apresentados revelam uma desvantagem catarinense. Afinal, então, o que explica a baixa propensão a inovar das empresas catarinenses? É pertinente resgatar que os dados da PINTEC tornaram nítido que a aversão à inovação está associada fundamentalmente às condições de mercado. Logo, ao que tudo indica, o que acontece, assim como nas empresas brasileiras, é uma opção racional e puramente mercadológica para as empresas catarinenses não inovarem. Portanto, inovação aparenta ficar unicamente no discurso. Obviamente não se pode desconsiderar que existem 169 várias empresas inovadoras atuando em Santa Catarina. No entanto, elas coexistem simultaneamente com uma imensa maioria de não inovadoras. As considerações e inferências feitas acima desmistificam o caráter supostamente inovador das empresas localizadas em solo catarinense. Assim, a hipótese de que se partiu na realização da pesquisa não se confirmou como verdadeira. Os resultados aqui obtidos negam a situação privilegiada das empresas dentro do cenário nacional e colocam em xeque a, até então, inegável importância da inovação para a competitividade empresarial catarinense. Neste sentido, sugere-se que a Política Catarinense de Ciência, Tecnologia e Inovação seja reorientada, tirando foco da inovação empresarial e voltando mais atenção às necessidades sociais e ao desenvolvimento regional. Referências FAGERBERG, Jan. Innovation: a guide to the literature. In: FAGERBERG, Jan; MOWERY, David; NELSON, Richard. The Oxford handbook of innovation. Oxford: Oxford University Press, 2005. p. 1-26. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de inovação 2000. Rio de Janeiro: IBGE, 2002. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de inovação 2003. Rio de Janeiro: IBGE, 2005. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de inovação 2005. Rio de Janeiro: IBGE, 2007. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de inovação 2008. Rio de Janeiro: IBGE, 2010. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de inovação 2011. Rio de Janeiro: IBGE, 2013. 170 AS DETERMINAÇÕES E DESAFIOS DA PESQUISA: REGISTRO DAS IES DA REGIÃO DO VALE MÉDIO IGUAÇU E O DESENVOLVIMENTO REGIONAL GUMBOWSKY, ARGOS1 SIQUEIRA, EDITE2 RESUMO O estudo teve como objetivo geral analisar, junto ao instrumento de planejamento das instituições de educação superior (PDI) da região do Vale Médio Iguaçu, a concepção da pesquisa, visando o crescimento institucional e o desenvolvimento regional. A pesquisa caracteriza-se como exploratória (levantamento bibliográfico e pesquisa documental) e de campo. Desenvolveu-se nos municípios de União da Vitória (PR) e Porto União (SC). Constatou-se que não existe uma política institucionalizada. Somente a UnC possui grupos de pesquisa registrados no CNPq. Verificou-se que a prática da transferência de tecnologia não ocorre na região pelas IES pesquisadas. Palavras-chave: Desenvolvimento Regional. Pesquisa. Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI). Educação Superior 6.INTRODUÇÃO As mudanças que marcaram o Século XX promoveram desafios significa- tivos em relação à formação humana e universitária. Entre elas, destaca-se a pesquisa. Aos poucos, vai-se apagando aquela noção herdada de pesquisa e de ciência, com procedimentos experimentais, realizadas em laboratórios, e vê-se emergir o conceito de pesquisa como modo de transformar a realidade de forma crítica e consciente, interagindo, criando condições, buscando soluções para os mais diversos problemas da sociedade, e, principalmente, inovando. A prática da pesquisa articulada ao ensino e à extensão possibilita a formação de profissionais capazes de atuar científica e tecnicamente nos diferentes contextos da sociedade contemporânea, teorizando e produzindo conhecimentos sobre essa 1 Doutor em Educação, docente do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da Universidade do Contestado (UnC). [email protected] 2 Graduada em Pedagogia – Habilitação em Orientação Educacional e Especialista em Psicopegadogia pela FAFIUV. Especialista em Metodologia da Ação Docente, pela UNIUV-União da Vitória. Mestre em Desenvolvimento Regional, pela UnC. [email protected] 171 prática. O Relatório da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) sobre Ciência, documento publicado a cada cinco anos, dedica um capítulo especial ao Brasil, em que elogia o crescimento do número de publicações, que dobrou em cinco anos (2005 – 2009), mas ressalva que o país ainda não aposta como deveria em inovação, em parte porque a iniciativa privada não investe o suficiente nas universidades (Unesco, 2010). Apesar das dificuldades da realização de pesquisas científicas no Brasil, também cresceu a quantidade de bolsas de iniciação científica concedidas por instituições de ensino superior, públicas e privadas. Este relato tem como temática central a análise da concepção e dos de- safios da pesquisa no Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) das Institui- ções de Ensino Superior (IES) da Região do Vale Médio Iguaçu, como fator propulsor do crescimento institucional e do desenvolvimento regional. 7.MATERIAIS E MÉTODOS A pesquisa caracterizou-se como exploratória. Em relação ao método, op- touse pela pesquisa qualitativa. Para o desenvolvimento da pesquisa explorató- ria, realizou-se levantamento bibliográfico para contextualizar teoricamente o objeto de estudo. Também foi realizada uma pesquisa documental, buscando analisar os documentos institucionais das IES da Região do Médio Iguaçu, com o propósito de conhecer sua estrutura e desenvolvimento, procurando analisar como essas instituições abordam a pesquisa e qual sua relação com as empresas locais e regionais. As informações foram tratadas por meio de uma análise qualitativa, buscando relatar as diferenças e semelhanças existentes entre as IES, sua metodologia, missão, objetivos e a forma com que se posicionam em relação à pesquisa e transferência de tecnologia. A pesquisa desenvolveu-se nos municípios de União da Vitória (PR) e Porto União (SC), onde estão localizadas as Instituições de Ensino Superior 172 (IES): Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras (FAFI), Centro Universitário de União da Vitória (UNIUV) e Universidade do Contestado (UnC) – Núcleo Universitário de Porto União O universo da investigação constitui-se de 37 professores com titulação de mestrado ou doutorado e 6 gestores de IES. Buscou-se conhecer o posicionamento dos empresários e representantes de entidades de classe sobre a inserção das IES, situadas na região do Vale Médio Iguaçu, na sociedade regional através da pesquisa. Foram entrevistados gestores de 7 empresas e 9 representantes de entidades de classe, totalizando 16 entrevistados. Para a coleta dos dados optou-se por questionário semiestruturado, constituído por perguntas fechadas, utilizando-se a escala de Likert. 8.ENSINO SUPERIOR NA REGIÃO DO MÉDIO VALE DO IGUAÇU De acordo com o Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social – Ipardes (2006), a região Vale Médio Iguaçu é composta pelos seguintes municípios: União da Vitória, Bituruna, General Carneiro, Mallet, Paula Freitas, Paulo Frontin, Cruz Machado e Porto Vitória, no Paraná, e em Santa Catarina, pelo município de Porto União. A economia da região, historicamente, caracterizou-se pela instalação de indústrias madeireiras, devido à existência de extensas florestas naturais de Araucárias, atividade que perdura até os dias atuais, sendo possível encontrar grandes complexos industriais do ramo da madeira, tais como laminação e compensados, serrarias, tacos, casas pré-fabricadas, móveis e papel. A Região do Vale Médio Iguaçu, de acordo com o último censo do IBGE (2010), possui uma população de 163.157 pessoas, entre elas, 19,3% são jovens com idade entre 17 e 24 anos, faixa etária em que a maioria ingressa no ensino superior. Por meio desta pesquisa verificou-se que mais de 3.000 jovens encontram-se matriculados nas IES da Região, o que corresponde a 9,6% da população de jovens. Dessa forma, constata-se que mais de 28.000 jovens (mais de 90%) encontram-se fora dos bancos universitários ou estudando em outras regiões. 173 O desenvolvimento do ensino superior está intimamente ligado ao desenvolvimento regional, porém, para vincular a relevância do ensino superior para o desenvolvimento regional, faz-se necessário, inicialmente, a compreensão do que é desenvolvimento regional e como ele acontece. De acordo com Boisier (1999), o conceito de desenvolvimento regional tem suas raízes na economia neoclássica, fundamentada no pós-guerra, inicialmente, associado ao crescimento, mensurado pelo PIB, como pode ser observado na afirmação de Echevérnia, espanhol, considerado o pai da Sociologia latino-americana do desenvolvimento: El desarrollo económico es un proceso continuado cuyo mecanismo esencial consiste en la aplicación reiterada del excedente en nuevas inversiones, y que tiene, como resultado la expansión asimismo incesante de la unidad productiva de que se trate. Esta unidad puede ser desde luego una sociedade entera...3(citado por BOISIER, 1999, p.2). A partir da década de 1970, vários estudiosos apontaram as diferenças entre desenvolvimento e crescimento, sendo o desenvolvimento caracterizado pelo aumento ou redução da pobreza, desemprego e desigualdade e o crescimento pela geração de riquezas. O processo de desenvolvimento regional se produz pela utilização efici- ente do potencial econômico local, o que é facilitado pelo bom funcionamento das instituições e por eficientes políticas públicas, que promovam as mudanças estruturais necessárias para mudar a visão da região, de mero suporte físico dos objetos, atividades e processos econômicos, para uma agente de transformação social. A economia de cada região está vinculada ao sistema de relações econômicas do país, em função de sua especificidade territorial, e de sua identidade econômica, política, social e cultural (VAZQUEZ-BARQUERO, 2000). Boisier (1999) traz duas dimensões do desenvolvimento, o humano e o social, ficando clara a ideia de que não existe desenvolvimento de uma região, se as pessoas que dela fazem parte não se desenvolverem da mesma maneira. Portanto, para 3 "O desenvolvimento econômico é um processo contínuo, cujo mecanismo é essencial a aplicação repetida do excedente em novos investimentos, o que também resultou na expansão incessante da unidade de produção em questão. Esta unidade pode ser, naturalmente, uma Sociedade inteira [...] " (tradução nossa) 174 que uma região desenvolva-se, não basta agregar capital social, na mesma proporção existe a necessidade do capital humano e intelectual. Nesse sentido, pode-se encontrar na educação um forte argumento de favorecimento ao desenvolvimento regional, não apenas para a formação de mão de obra e geração de emprego, mas também na criação de processos que conduzam à inovação e à busca de alternativas de diversificação de produtos e processos. Dessa maneira, os sistemas produtivos dinâmicos introduzidos nas regiões podem criar em seu entorno relações formais e informações entre atores públicos e privados, com objetivo de gerar e disseminar conhecimento tecnológico. Partindo desse pressuposto, as Instituições de Ensino Superior figuram como elemento chave no processo de desenvolvimento das regiões. 8.1 AS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR DA REGIÃO VALE MÉDIO IGUAÇU • ldade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras - FAFI Na década de 1950, União da Vitória estava entre as maiores e mais prós- peras cidades do Estado; era o mais importante município do sul e do sudoeste do Paraná, exercendo influência social e cultural sobre toda a região. Nessa conjuntura, começou a ser pensada a possibilidade de criação de curso superior na cidade. Em 22 de dezembro de 1956, foi criada a Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras (Fafi), no entanto, a primeira aula inaugural deu-se três anos depois (28/03/1960), sendo pioneira no ensino superior, fora da capital, oferecendo ensino público e gratuito. Iniciou suas atividades com os cursos de História e Pedagogia. Os cursos de Geografia e Letras foram criados em 1967 e, mais tarde, em 2003, foram criados os cursos de Ciências Biológicas e Química. Desde 1986, a Fafi promove cursos de pós-graduação lato sensu em suas áreas de conhecimento. Com objetivo de avançar na criação de cursos para União da Vitória, além de aperfeiçoamento de docentes e expansão física da instituição, no ano de 2013, ocorreu a fusão da Fafi com a Universidade Estadual do Paraná (Unespar), 175 criada por meio da Lei Estadual nº17.590, de 12 de junho de 2013, com sede no município de Paranavaí. • Fundação Municipal Centro Universitário da Cidade de União da Vitória (Uniuv) Em 12 de setembro de 1974, o Parecer nº. 086/74, do Conselho Estadual de Educação do Paraná (CEE/PR) foi favorável à criação da Fundação Faculdade Municipal de Administração e Ciências Econômicas de União da Vitória (FACE), hoje Uniuv, cujo projeto inicial partiu da iniciativa de lideranças locais, interessadas em trazer para a região cursos na área do comércio, haja vista que até então somente havia cursos oferecidos voltados à formação docente. Em 19 de setembro de 1974, o prefeito municipal promulgou a Lei Municipal nº. 974/74, instituindo a Face, incluindo no texto dessa lei a dotação à Instituição de recursos financeiros necessários à instalação e funcionamento regular. Iniciou suas atividades com os cursos de Administração e Ciências Econômicas, ampliou o seu perfil na área de Ciências Empresariais em 1994, com a implantação do curso de Ciências Contábeis, diversificando a sua atuação. Em 2006, pelo Decreto Estadual nº. 7226, de 19 de setembro de 2006, a Fundação Municipal Faculdade da Cidade de União da Vitória (Face) foi transformada em Fundação Municipal Centro Universitário de União da Vitória (Uniuv). • versidade do Contestado (UnC) A Universidade do Contestado (UnC), teve seu projeto de criação iniciado em março de 1990, aglutinando cinco Instituições Isoladas de Ensino Superior (Funploc, Funorte, Feauc, Fearpe e Feplac) com área de abrangência de 52 municípios e a maior extensão territorial de Santa Catarina. A implantação ocorreu a partir de 1992. Constituiu-se como instituição de caráter regional e comunitário, de fins públicos, filantrópicos e científico-culturais. O reconhecimento da Universidade do Contestado ocorreu com a aprovação pelo Conselho Estadual de Educação de Santa Catarina do Parecer no 246 em 21 de outubro de 1997. Pelo 176 Decreto Estadual nº1.106, de 6 de agosto de 2012, a UnC teve a renovação do credenciamento por meio de avaliação institucional externa. Portanto, a Universidade do Contestado (UnC) é uma instituição de Educação Superior vinculada ao Sistema Estadual de Santa Catarina, mantida por uma Fundação de origem pública e de natureza do direito privado (PDI, UnC, 2010). Desde 2006, a UnC oferece pós-graduação stricto sensu, em Desenvolvimento Regional. 9.RESULTADOS E DISSCUSSÃO A pesquisa no Ensino Superior oferecido pelas IES da Região do Vale Médio Iguaçu está limitada ao tipo da instituição a que o professor está vinculado (universidade, centro universitário e faculdades integradas). Efetivamente, as IES, independente de sua configuração acadêmica, precisam ter vocação para a pesquisa, não basta o desejo de formar pesquisadores, faz-se necessário um planejamento institucional, baseado em políticas voltadas para esse fim. Na docência, consideram-se os anos de ensino e a formação para a transmissão dos conhecimentos, a adesão a novas práticas de ensino, as alterações curriculares adaptadas às novas realidades e as inovações de pesquisas nas áreas, as condições de materiais de trabalho (laboratórios e bibliotecas). Já na pesquisa, a preparação do pesquisador envolve a coleta de dados, a decisão sobre qual metodologia utilizará, os experimentos e verificações, os ensaios e os erros, o que faz com que, muitas vezes, o pesquisador necessite reiniciar a pesquisa devido à necessidade de recursos materiais e de pessoal para o progresso da pesquisa (CHAUÍ, 2001). Todos esses entraves fazem com que, muitas vezes, as IES optem apenas pelo ensino, por não comportarem (física e financeira) tamanho investimento. Além da vocação para a pesquisa como fator primordial para o seu desenvolvimento, também pode-se citar o fator ‘cultura de pesquisa’, que, como afirma Franco (1997, p.41) “[...] tem ligação com o nível educacional geral de um povo, e como foi formada a massa crítica para valorizar e demandar as transposições da ciência para a vida cotidiana”. Neste sentido, a cultura de pesquisa 177 está relacionada às parcerias e associações possíveis de se realizarem na sociedade em que a IES está inserida, como uma troca, em que as organizações apresentam seus problemas e as IES, por meio dos grupos de pesquisas, buscam soluções. Essas parcerias geram subsídios para novas pesquisas, formando um ciclo. Constatou-se que a pesquisa existente nas IES da região é pouco expres- siva, senão inexistente, e está limitada ao tipo da instituição à qual o professor está vinculado. Isto é, na Uniuv, em que a pesquisa não é obrigatória, essa temática é tratada de forma superficial, embora a proposta apresentada no PDI seja consistente; na Fafi, que passa por um momento de transição, de Faculdade Isolada para Universidade, observa-se certa discrepância entre gestores e professores e mesmo entre professores, em que gestores acreditam no ótimo desenvolvimento da pesquisa, enquanto professores acreditam na necessidade de estruturação; na UnC, até então única IES que efetivamente necessita do desenvolvimento da pesquisa, por exigência legal, apresenta um quadro mais avançado, com professores mais satisfeitos com o desenvolvimento da pesquisa que seus gestores. Dessa forma, retoma-se uma afirmativa lançada anteriormente, de que as IES precisam ter vocação para a pesquisa, não basta que os professores finalizem seus cursos de pós-graduação, desenvolvam as pesquisas para finalização de suas dissertações ou teses, se, ao retornarem às suas instituições de origem, essa prática não se efetive, e seja pouco motivada. Em todas as IES existem professores com dedicação exclusiva, os quais, teoricamente, deveriam dedicar percentual de seu tempo à sala de aula e outra para o desenvolvimento de pesquisas. Verificou-se que, muitas vezes, esse tempo é utilizado com atividades administrativas, além da docência. Quanto à qualidade do desenvolvimento da pesquisa na IES a maioria acredita ser regular, porém, apareceram respostas como excelente e péssima, o que leva a crer que, se existente, o desenvolvimento e os resultados das pesquisas não estão sendo bem divulgados em seu meio. A pouca comunicação interna foi sentida em todas as IES da Região. Pode-se citar como exemplo a 178 questão levantada sobre a existência de intercâmbios e convênios para pesquisa (transferência de tecnologia) com instituições nacionais/internacionais. A resposta esperada seria sim, para a existência e não, para a não existência, porém as respostas foram variadas dentro da mesma IES. Pode-se afirmar que não existe uma política institucionalizada no que diz respeito ao desenvolvimento da pesquisa e, dessa forma, observa-se preocupação em relação à qualidade e à continuidade das pesquisas desenvolvidas. Quanto a articulação entre ensino, pesquisa e extensão, as respostas mais encontradas foram ‘frequentemente’ e ‘poucas vezes’, o que denota que o princípio da indissociabilidade na tríade (ensino, pesquisa e extensão) não tem ocorrido de forma articulada. Isso compromete a formação acadêmica completa, efetivando conhecimentos de forma prática e interagindo com a sociedade. Constatou-se que a pesquisa desenvolve-se na modalidade de iniciação científica na Região do Vale Médio Iguaçu, com exceção daquelas realizadas no programa de pós-graduação stricto sensu da UnC, cujo locus está sediado no município de Canoinhas, pouco impactando na sua extensão no Núcleo Universitário de Porto União. No que se refere ao incentivo e motivação das IES, por meio de bolsas de fomento à pesquisa, notou-se a falta de comunicação nas IES, principalmente na Uniuv, que não apresenta uma política consolidada. Na Fafi, as bolsas de pesquisa são oferecidas por meio de concessão de tempo integral e dedicação exclusiva (TIDE), em que o professor precisa aprovar projeto para ser beneficiado e também com bolsas de iniciação científica para discentes vinculados a projetos de pesquisa docente ou próprios. A UnC é beneficiada pelo governo do estado de Santa Catarina que concede bolsas de estudo e de pesquisa para alunos economicamente carentes. Observa-se que, em termos gerais, as IES costumam investir na qualificação dos docentes, algumas com mais frequência, como a Uniuv e a UnC; já na Fafi, pelo relato, tanto dos gestores quanto dos professores, esse investimento é menos acentuado, porém, é preciso considerar que na Fafi o ingresso na carreira docente é condicionado à titulação de mestre ou doutor, dessa forma os 179 incentivos para a qualificação são menos expressivos. Foi constatada falta de incentivo para a formação de grupos de pesquisa. Observou-se que a maioria dos entrevistados participa de grupos em outras IES. Somente a UnC possui grupos registrados no CNPq. Quanto ao posicionamento dos empresários e representantes de entidades de classe sobre a inserção das IES na sociedade regional por meio da pesquisa, os mesmos mostraram-se mais satisfeitos que os representantes das entidades de classe, embora as IES não participem efetivamente na resolução de problemas nas empresas. Elas preparam profissionais para o mercado de trabalho, qualificam mão de obra, que nem sempre é absorvida ou valorizada por esse mercado. Tanto empresários quanto representantes de entidades de classe esperam maior participação das IES, que estas encontrem soluções para os seus problemas, embora tenham relatado que poucas vezes procuraram as IES propondo parcerias. Verificou-se que os entrevistados acreditam que as IES da região contribuem de forma positiva ao crescimento social e cultural dos indivíduos e também para o desenvolvimento da sustentabilidade ambiental, atendendo a uma necessidade mundial. Quando questionados sobre a importância das IES para o desenvolvimento regional, acreditam que sim, elas colaboram, porém, poderia existir um melhor relacionamento entre as IES, empresas e entidades de classe, pois acredita-se que a cooperação entre esses segmentos pode ser importante para o desenvolvimento da região, possibilitando um estreitamento com a sociedade. Pode, ainda, fazer com que as IES captem as necessidades reais, e possibilitem que seus professores e alunos compreendam a dimensão do compromisso com o desenvolvimento do país. 180 10. CONSIDERAÇÕES FINAIS Embora os gestores parecessem mais otimistas, os docentes foram bem realistas quando das afirmações relativas à falta de motivação, incentivo e suporte para a pesquisa e formação de grupos. Também foi constatada falha na comunicação interna das IES, pois, em muitos momentos, mostraram um discurso desconexo entre gestores e docentes. Por meio desta investigação, verificou-se que a pesquisa nas IES da região do Vale Médio Iguaçu é incipiente, quando não inexistente. Embora figure de forma estruturada nos PDIs das IES, essa prática está longe de ser a ideal, e de atender aos anseios dos docentes e às necessidades das empresas, no que se refere à transferência de tecnologia. Constatou-se que existe uma necessidade latente de aproximar as IES e o setor produtivo, criando pontes, buscando benefícios mútuos, em que as IES se fortaleçam, obtendo mais reconhecimento, legitimidade, confiança e recursos para desenvolvimento de pesquisas, além de atraírem mais talentos e competência. No contexto do desenvolvimento regional, as IES devem figurar como geradoras de novos conhecimentos, por meio de pesquisas. Nas regiões onde elas são mais atuantes, são consideradas peças-chave para o desenvolvimento, inclusive em se tratando de mobilidade social. Dessa forma, é inegável o fato de que nas regiões onde existem Instituições de Ensino Superior instaladas e atuantes, o desenvolvimento torna-se evidente e inevitável, assim como a geração de capital social/intelectual e a capacidade de associar-se e de organizar-se. Assim, conclui-se que existe a necessidade urgente de que as IES da Re- gião do Vale Médio Iguaçu busquem seu lugar, de fato, como gestoras, gerado- ras e disseminadoras do conhecimento sistematizado e aplicável; que encontrem meios de cooperação entre elas e a sociedade que as cerca, efetivando suas práticas com base nos preceitos da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, consolidando-se, e, a partir de seu crescimento e amadurecimento, proporcionarem, de fato, o desenvolvimento da região. 181 5 REFERÊNCIAS CHAUÍ, M. S. Cultura e democracia: o discurso competente e outras falas. 9.ed. São Paulo: Cortez, 2001 DEMO, P. Pesquisa: princípio científico e educativo. 5.ed. São Paulo: Cortez, 1997. FACULDADE ESTADUAL DE FILOSOFIA, CIÊNCIAS E LETRAS - FAFI. Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI). União da Vitória, PR: Uniuv, 2012. FRANCO, M.E.D. (org.) Universidade, pesquisa e inovação: o Rio grande do Sul em perspectiva. Porto Alegre: Ediopucrs, 1997. FUNDAÇÃO MUNICIPAL CENTRO UNIVERSITARIO DA CIDADE DE UNIÇÃO DA VITÓRIA – Uniuv. Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI). União da Vitória, PR: Uniuv, 2012. LONGHI, S.M. Nova geografia de investigação. In: FRANCO, M.E.D.P.; LONGHI, S.M.; RAMOS, M.G. (orgs). Universidade e pesquisa: espaços de produção do conhecimento. Pelotas,RS: UFPEL, 2009. MARCONI, M.A.; LAKATOS, E.M. Técnicas de pesquisa. 5.ed. São Paulo: Atlas, 2002. MARTINS, Gilberto de Andrade; THEÓPHILO, Carlos Renato. Metodologia da investigação científica para ciências sociais aplicadas. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2009. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Secretaria de Educação Superior. Plano de Desenvolvimento Institucional – PDI: diretrizes para elaboração. 2004. Disponível em: <http://www.cpd.ufv.br/cpa/doc/pdi_sapiens.pdf> Acesso em 16 nov. 2011 SAMPIERI, R. H.; COLLADO, C. F.; LUCIO, P. B. Metodologia de pesquisa. 3.ed. São Paulo: McGraw Hill, 2006. UNESCO. 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