Livros da Feira
Carlos Rolhais
Não há nada com um
bom livro para nos
proteger das agruras
da crise
vi, como o primeiro-ministro,
no último dia, à Feira do Livro de Lisboa. Encontrei por
lã bons saldos, com descontos
em alguns livros a passar os 50
por cento, o que mostra que as
grandes reduções não se limitam apenas aos supermercados no I.° de Maio. Voltei bem
fornecido porque não há nada
com um bom livro para nos proteger das
agruras da crise. A gente entra nele e a
crise fica cá fora. Se o leitor gosta, como
eu, de saldos de livros, saiba que as barraquinhas da feira estão a ser mudadas de
Lisboa para o Porto, onde ficarão de 31 de
Maio a 17 de Junho.
Proponho aqui, como vem sendo
hábito, uma selecção dos livros mais
recentes saídos pela Primavera ou quase.
A lei do preço fixo impede a venda
deles a preços de saldo, mas a feira
um pequeno desconto,
proporcionou-me
que pode também ser encontrado em
muitas livrarias. A ordem é a alfabética do
apelido do autor.
- Buescu, Jorge, Matemática
em Portugal.
Uma questão de Educação, Fundação
Francisco Manuel dos Santos. O autor,
matemático e divulgador da matemática,
traça um panorama da história da
matemática entre nós. Nunca fomos fortes
em números nem grandes em ciência e
isso aconteceu, acima de tudo, por défice
de educação. A leitura deste livrinho
talvez ajude a entender a crise nacional.
- Cavalcanti Filho, José Paulo, Fernando
Pessoa. Uma quase autobiografia, Porto
Editora. O autor, advogado e ex-ministro
brasileiro, e um apaixonado pela vida
e obra do poeta da Mensagem, tendo
reunido neste volume um manancial
impressionante de informação, alguma
dela nova. Uma leitura agradável que
conduz à releitura de Pessoa e, portanto, a
uma melhor compreensão de Portugal.
- Figueiredo, Lucas, A Última Pepita. Os
portugueses e a corrida ao ouro do Brasil,
Marcador. Outro autor brasileiro, neste
caso um jornalista bastante premiado,
conta a saga da exploração do ouro do
Brasil, o ouro que permitiu erguer obras
como a Biblioteca Joanina da Universidade
de Coimbra (a coroa cobrava o "quinto
do ouro", um imposto de 20 por cento).
Para ler numa altura em que muitos
portugueses olham de novo o Brasil como
o Eldorado.
- Franco, José Eduardo e Calafate,
Pedro (coordenadores),
A Europa segundo
Portugal. Ideias de Europa na cultura
portuguesa século a século, Gradiva. Dois
professores da Faculdade de Letras da
Universidade de Lisboa reuniram um
conjunto de ensaios, deles próprios e de
colegas, sobre o modo como, ao longo
da história, temos visto a Europa. Numa
altura em que a nossa relação com o
Velho Continente é ambivalente, o livro
ajuda-nos a compreender o nosso lugar de
sempre, tanto geográfico como cultural
(eu não acredito em jangadas de pedra).
- Gleick, James, Informação. Uma
história. Uma teoria. Um dilúvio, Temas
e Debates e Círculo de Leitores. Um
jornalista e dos melhores divulgadores
de ciência norte americanos (autor de
Caos, o seu primeiro livro, e biógrafo de
Feynman e Newton) apresenta-nos uma
história da informação, num tempo em
que, como o subtítulo sugere, o mundo
está inteiramente mergulhado nela. A ler
para perceber o tsunami de bits que é o
mundo global de hoje.
- Lehrer, Jonah, Imagine. De onde
Lua de Papel. O
vem a criatividade.
autor, neurocientista, jornalista e
divulgador de ciência, causou sensação
com o seu primeiro livro Proust era um
Neurocientista, recomendado entre outros
por António Damásio. Na nova obra fala
da origem de uma coisa preciosa que
pode ser ouro em tempo de crise - a
criatividade. Para saber quem somos e,
mais do que isso, quem poderemos ser.
- Levi, Primo e Regge, Tullio, Diálogo.
Sobre a ciência e os homens, Gradiva. Uma
conversa entre um químico e escritor
(o autor de Se isto é um homem, que
conheceu os horrores de Auschwitz, é
químico de formação) e um físico. Os
livros não se
medem aos palmos
e este pequeno
livro ajuda-nos a
perceber melhor
não só o século XX
Encontrei bons
como a relação,
saldos, o que
que é bem maior
do que geralmente
mostra que as
se imagina, entre a
reduções não
ciência e a arte.
- Mattoso, José,
se limitam aos
Levantar o Céu.
supermercados
Os labirintos da
Sabedoria. Temas
no 1.0 de Maio
e Debates e Círculo
de Leitores. Do
grande historiador
português
especialista na
Idade Média, um
conjunto de textos
sobre valores e espiritualidade
que nos
fazem reflectir. Por exemplo, este passo:
"Dominamos a matéria, manipulamos
as leis físicas, acumulamos
o poder e o
dinheiro, aperfeiçoamos a racionalidade,
e todavia, o caminho que escolhemos
parece conduzir directamente ao caos".
Boas leituras! O leitor não faça como o
primeiro-ministro,
que, a avaliar por uma
notícia do PÚBLICO, não encontra agora
tempo para ler livros.
êê
Professor universitário, [email protected]
Escreve mensalmente à quarta-feira
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