UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI
Andrea Pereira Gomes de Souza
O DESIGN DOS CATÁLOGOS DE EXPOSIÇÕES DE
ARTE EM SÃO PAULO ENTRE 1912 E 1950
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
MESTRADO EM DESIGN
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU
SÃO PAULO
Janeiro/2013
UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI
Andrea Pereira Gomes de Souza
O DESIGN DOS CATÁLOGOS DE EXPOSIÇÕES DE
ARTE EM SÃO PAULO ENTRE 1912 E 1950
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação Stricto Sensu em Design – Mestrado,
da Universidade Anhembi Morumbi, como
requisito parcial para obtenção do título de
Mestre em Design.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Gisela Belluzzo de
Campos.
São Paulo
Janeiro/2013
UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI
Andrea Pereira Gomes de Souza
O DESIGN DOS CATÁLOGOS DE EXPOSIÇÕES DE ARTE
EM SÃO PAULO ENTRE 1912 E 1950
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em
Design – Mestrado, da Universidade Anhembi Morumbi, como requisito parcial
para obtenção do título de Mestre em Design.
____________________________
Profª. Dra. Gisela Belluzzo de Campos
Orientadora
Mestrado em Design – Universidade Anhembi Morumbi
______________________________________
Profª. Dra. Anna Mae Tavares Bastos Barbosa
Examinadora Interna
Universidade Anhembi Morumbi
__________________________________
Prof. Dr. Francisco Inácio Homem de Melo
Examinador Externo
Universidade de São Paulo – USP
ANDREA PEREIRA GOMES DE SOUZA
Pós-Graduada em Fundamentos da Cultura e das Artes – Instituto de Artes Unesp
Graduada em Desenho Industrial com habilitação em Programação Visual pela Faculdade
de Belas Artes de São Paulo
Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução
total ou parcial do trabalho sem autorização do autor.
ANDREA PEREIRA GOMES DE SOUZA
Pós-Graduada em Fundamentos da Cultura e das Artes
– Instituto de Artes Unesp; Graduada em Desenho
Industrial com habilitação em Programação Visual pela
Faculdade de Belas Artes de São Paulo
S713d
Souza, Andrea Pereira Gomes de
O design dos catálogos de exposições de arte em São
Paulo entre 1912 e 1950 / Andrea Pereira Gomes de Souza. –
2013.
109 f.: il.; 30 cm.
Orientador: Profª Drª. Gisela Belluzo de Campos.
Dissertação (Mestrado em Design) – Universidade
Anhembi Morumbi, São Paulo, 2013.
Bibliografia: f. 109.
1. Design. 2. Design gráfico. 3. Catálogos. 4. Exposições
de arte. 5. Elementos gráficos. I. Título.
CDD 741.6
Dedico este trabalho aos meus pais Dora e
Licinio por estarem sempre presentes desde o
início da minha trajetória acadêmica. Amo-os.
Agradecimentos
Em cada caminhada, nossos trajetos nunca são traçados de maneira solitária. Assim,
para a realização deste projeto, direta ou indiretamente, algumas pessoas colaboraram, e a elas
devo meus sinceros agradecimentos.
Aos meus pais, pelo estímulo, carinho, confiança e ajuda das mais variadas formas.
À Prof.ª Drª Gisela Belluzzo de Campos, pela orientação e disponibilidade do início
ao fim da pesquisa.
A Antonia Costa – assistente do curso de mestrado, pela paciência e competência.
Aos funcionários da Biblioteca do Museu de Arte Moderna de São Paulo; em especial
Léia C.Cassoni e Maria Rossi pela valiosa colaboração na realização desta pesquisa desde seu
estado embrionário até o final.
À equipe da Biblioteca Walter Wey, especialmente à generosidade de Leandro
Antunes Araújo.
À equipe da Coleção de Artes Visuais do IEB – USP, em especial Bianca Maria
Abbade Dettino pela atenção, agilidade e articulação em conseguir, dentro do prazo estimado,
disponibilizar os catálogos de arte digitalizados do Acervo de Mario de Andrade.
Agradeço igualmente aos colegas do Mestrado Roberto Sorima, Yanaí Mendes, Augusto
Gottsfritz, Raquel Carvalho e Jaqueline Nogueira, pela troca de ideias, apoio e por ajudar a
tornar este trajeto mais leve.
Por fim, agradeço a Alexandre Venâncio, Fernanda Gomes e Fernanda Martins, pela
amizade, incentivo, ajuda e companhia durante este período solitário e aflitivo.
“Na prática, não existe o passado. O que
existe ainda hoje e não morreu é o presente
histórico. O que você tem que salvar –
aliás, salvar não, preservar – são certas
características típicas de um tempo que
ainda pertence à humanidade”.
(Lina Bo Bardi)
Resumo: A pesquisa consiste no levantamento e análise dos catálogos de exposições de arte
ocorridas na cidade de São Paulo entre 1912 e 1950. O objetivo é resgatar esses catálogos
com pouco registro histórico e reapresentá-los como objetos do design gráfico. Há uma grande
carência bibliográfica quanto à história do design brasileiro. Assim, consideramos importante
contribuir com uma pesquisa que objetiva preencher determinada lacuna temporal histórica e,
ao mesmo tempo, favorecer o reconhecimento da linguagem do design no passado. Delimitamse como área de investigação os catálogos de exposições artísticas paulistanas do período
citado acima, tendo como base de análise o processo de identificação das estruturas visuais
destas publicações, a partir dos elementos gráficos presentes nestas peças gráficas, tais como
imagens, tipografias, fios e brasões.
Palavras-chave: Design gráfico, catálogos, exposições de arte, elementos gráficos
Abstract: This research consists of a survey and analysis of the catalogs of art exhibits that took place in
the city of São Paulo from 1912 to 1950. The purpose is to rescue these catalogs with scarce historical record
and reinsert them as graphic design objects. There is a great lack of literature on the history of Brazilian
design. Thus, we consider it important to contribute through a research that aims to fill a certain historical
time gap and simultaneously encourage recognition of a former language of design. Catalogs of art exhibits
occurred in Sao Paulo in the period mentioned above are defined as the research frame; this analysis was based
on the identification process of such publications’ visual structures – graphic elements such as pictures, prints,
lines and coats of arms.
Keywords: graphic design, catalogs, art exhibits, graphic
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...........................................................................................................................14
1. O CATÁLOGO DE EXPOSIÇÃO DE ARTE COMO PEÇA DE DESIGN .....................16
1.1 Conceituações do design gráfico: a prática antes da teoria..................................17
1.2 O catálogo de arte como documento: a memória da exposição.........................24
1.3 Catálogos de arte: a multiplicidade dos formatos................................................37
2. OS CATÁLOGOS DE EXPOSIÇÕES DE ARTE: MAPEAMENTO.................................47
2.1 São Paulo e as exposições de Arte: delimitações de tempo e espaço
Contexto Cultural ....................................................................................................48
2.2 O acervo dentro da biblioteca: onde vivem os catálogos....................................58
3. CATÁLOGOS DE ARTE: CATEGORIAS VISUAIS...........................................................68
3.1 Imagens......................................................................................................................68
3.2 Tipografias.................................................................................................................76
3.3 Fios..............................................................................................................................89
3.4 Brasões........................................................................................................................99
CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................................103
BIBLIOGRAFIA.........................................................................................................................104
LISTA DE FIGURAS *
Figura 1 – Catálogos com padrões decorativos .......................................................................15
Figura 2 – Temas centrais do capítulo 1....................................................................................16
Figura 3 – William Morris, marca registrada da Kelmscott Press, 1892..............................21
Figura 4 – Linha do Tempo.............................................................................................................23
Figura 5 – Catálogo, IV Salão Paulista de Belas Artes, 1936...................................................24
Figura 6 – Listagem de obras e suas categorias........................................................................25
Figura 7 – Listagem de obras e suas categorias: escultura, aquarela, desenho, arquitetura,
água forte e xilogravura. Miolo, RASM, 1939. .........................................................................25
Figura 8 – Ordem das obras presentes no índice .....................................................................26
Figura 9 – Catálogo da Exposição: Tarsila Viajante.................................................................27
Figura 10 – Planta do VII Salão Paulista de Belas Artes,1940................................................27
Figura 11 – Catálogo, VII Salão Paulista de Belas Artes, 1939..............................................28
Figura 12 – Catálogo, PINACOTECA, 1950............................................................................28
Figura 13 – Texto de apresentação, Lasar Segall......................................................................29
Figura 14 – Catálogo “A nova pintura francesa e seus mestres – De Manet a nossos dias”,
realizada no MAM, 1949.............................................................................................................29
Figura 15 – Texto Biográfico – Edouard Manet .......................................................................30
Figura 16 – Texto e imagem do Catálogo, Portinari, Exposição sua obra 1920/1948.........31
Figuras 17 e 18 – Texto “Confissão – Tarsila do Amaral e sua Obra” Texto “Pintura
Contemporânea” Catálogo, Tarsila – 1918 a 1950, in: Pintura Contemporânea – Quadros
do acervo do Museu de Arte Moderna de São Paulo, 1950.....................................................31
Figura 19 – Reprodução obra Mural de Tiradentes. Catálogo, Exposição Mural Tiradentes,
de Cândido Portinari, MAM – Museu de Arte Moderna São Paulo, 1949............................32
Figura 20 – Capa Levite de’ più eccellenti pittori, scultori e architettori, versão 1568..........33
Figura 21 – Página do “Libro de’ Disegni”, possível data 1480-1504.....................................33
Figura 22 – O arquiduque Leópold Guillaume em sua galeria em Bruxelas, 1650.............34
Figura 23 – O Cabinet Crozat ....................................................................................................34
Figura 24 – Capa e quarta capa do Catalogo Illustrado da Exposição Artistica na Imperial
Academia das Bellas-Artes, 1884 ...............................................................................................35
Figura 25 – Fernando Bryce, “Visión de la Peinture Occidental”, 2002 ................................36
Figura 26 – Catálogo de arte: IV Salão Paulista de Bellas Artes, dez1936 a jan1937..........37
Figura 27 – Formatos de catálogo de arte..................................................................................38
Figura 28 – Catálogo/Folder, 1º Salão de Verão, 1945, criado para Galeria de Arte Itá...........38
Figura 29 – Catálogo/Folder – Convite; Exposição Aldo Bonadei, 1939..............................39
Figura 30 – Catálogo/Folder Exposição do Art Club de Roma, 1950....................................39
Figura 31 – Catálogo/Folder Exposição Cícero Dias, 1949.....................................................40
Figura 32– Catálogo/Folder Exposição Diego Rivera – guaches e desenhos, 1950...................40
Figura 33 – RASM – Revista Anual III Salão de Maio, realizado na Galeria Itá, 1939...............41
Figura 34 – Capa para Depero futurista, 1927..........................................................................41
Figura 35 – Fac-símile. RASM – Revista Anual do III Salão de Maio, Galeria Itá, 1939...........42
Figura 36 – Homenagem ao Governo. Catálogo XIII Salão Paulista de Belas Artes, Galeria
Prestes Maia, 1947.......................................................................................................................43
Figura 37 – Patrocínio do Trabalho, Indústria e Comércio. 1º Salão de Arte – Feira Nacional
de Indústrias, realizado no Parque da Água Branca, SP, 1941.................................................44
Figura 38 – Agradecimentos. 1º Salão de Arte – Feira Nacional de Indústrias, realizado no
Parque da Água Branca, SP, 1941..............................................................................................44
Figura 39 – Patrocínios. Catálogo 28ª Bienal Internacional de Arte São Paulo, 2008...............45
Figura 40 – Periódico Art et Décoration, 1934..........................................................................45
Figura 41 – Patrocínios/ Anúncios. Exposição do Livro Italiano, 1950.................................46
Figura 42 – Patrocínios/ Anúncios. Exposição do Livro Italiano, 1950.................................46
Figura 43 – Recorte cronológico e geográfico..........................................................................47
Figura 44 – Endereço da Redação e Escritório da Revista “A Cigarra”.................................49
Figura 45 – Senhoras na Rua XV de Novembro......................................................................49
Figura 46 – Pessoas presentes à abertura da I Exposição Brasileira de Bellas-Artes – Jornal
O Estado de S. Paulo, 27 de dezembro de 1911.........................................................................50
Figura 47 – Grupos de expositores fotografados no dia da inauguração, numa das galerias
do Liceu de Artes e Ofícios - Jornal O Estado de S. Paulo, 27 dez1911................................50
Figura 48 – Catálogo de Quadros, 1912....................................................................................50
Figura 49 – Parte interna do Catálogo de Quadros, 1912.......................................................51
Figura 50 – Catálogo Geral – Galeria de Bellas Artes, 1917...................................................51
Figura 51 – Quarta Capa do Catálogo Geral – Galeria de Bellas Artes, 1917......................51
Figura 52 – Parte interna do Catálogo de Quadros, 1912.......................................................52
Figura 53 – Catálogo 1º Salão de Maio, 1937...........................................................................53
Figura 54 – Na Villa Kyrial, Victor Brecheret (terceiro a partir da esquerda, na primeira fila) e
Menotti Del Picchia (sentado à direita). Foto: reprodução do livro Semana de 22.....................54
Figura 55 – Anúncio de aulas de desenho e pintura...............................................................56
Figura 56 – Anúncio de aulas de desenho, pintura e arte decorativa no Catálogo da 1ª
Exposição de Bellas Artes, Palácio das Indústrias, Maio de 1928.........................................56
Figura 57 – Convite, Carnaval - SPAM, 1933..........................................................................57
Figura 58 – Levantamento de catálogos de arte, Biblioteca Walter Wey..............................60
Figura 59 – Levantamento de catálogos de arte, Biblioteca Jenny Klabin Segall.................61
Figura 60 – Levantamento de catálogos de arte, Arquivo - IEB – Fundo Anita Malfatti....61
Figura 61 – Levantamento de catálogos de arte, Coleção de Artes Visuais - IEB – Acervo
Mario de Andrade........................................................................................................................62
Figura 62 – Seleção Geral - Categoria Imagem........................................................................69
Figura 63 – Categoria Imagem – capas com obras de artistas...............................................69
Figura 64 – Categoria Imagem – ilustrações e obras de artistas............................................70
Figura 65 – Categoria Imagem – Elementos das Artes plásticas...........................................71
Figura 66 – Categoria Imagem – Elementos das artes plásticas............................................72
Figura 67 – Categoria Imagem – Elementos das artes plásticas: Colunas............................72
Figura 68 – Categoria Imagem – Elementos das Artes plásticas: Objetos Artísticos..........72
Figura 69 – Categoria Imagem – Elementos das Artes Plásticas: Artistas Criando............73
Figura 70 – Categoria Imagem – Elementos das Artes Plásticas: Artistas Criando............73
Figura 71 – Categoria Imagem – Autônomas ..........................................................................75
Figura 72 – Categoria Imagem – Autônomas ..........................................................................75
Figura 73 – Seleção Geral - Categoria Tipografia....................................................................77
Figura 74 – Zang Tumb Tumb, capa livro Parole in Libertá, de Filippo T.Marinetti (1914)......78
Figura 75 – Capa dadaísta para a revista Le Coeur à Barbe, 1922.........................................78
Figura 76 – El Lissitzki, páginas de Dlia golosa, de Maiakóvski, 1922.................................79
Figura 77 – Theo van Doesburg, cartaz de exposição, 1920...................................................79
Figura 78 – László Moholy-Nagy, sobrecapas para quatro livros da Bauhaus, 1924-1930........79
Figura 79 – Categoria Tipografia – Layout Harmônico .........................................................80
Figura 80 – Categoria Tipografia: Variações de dimensões .................................................81
Figura 81 – Categoria Tipografia – Variações de dimensões ................................................82
Figura 82 – Categoria Tipografia – Matriz, técnica serigrafia ...............................................82
Figura 83 – Categoria Tipografia – detalhe da numeração dos capítulos.............................83
Figura 84 – Categoria Tipografia – Matriz, técnica xilogravura............................................83
Figura 85 – Categoria Tipografia – sinais visuais....................................................................84
Figura 86 – Categoria Tipografia – sinais visuais....................................................................84
Figura 87 – Categoria Tipografia – layout geométrico - Detalhe da identidade visual, Casa
Warchvchik...................................................................................................................................84
Figura 88 – Categoria Tipografia – layout geométrico - Detalhe da identidade visual, Casa
Warchvchik...................................................................................................................................85
Figura 89 – Categoria Tipografia – layout geométrico............................................................85
Figura 90 – Tipografias desenhadas por George Auriol.........................................................86
Figura 91 – Categoria Tipografia: caracteres ornados.............................................................87
Figura 92 – Categoria Tipografia – caracteres ornados..........................................................87
Figura 93 – Categoria Tipografia: caracteres ornados – Iluminuras.....................................88
Figura 94 – Estilos variados de fios...........................................................................................89
Figura 95 – Seleção Geral – Categoria Fios..............................................................................90
Figura 96 – Categoria Fios – Fios Fantasia...............................................................................91
Figura 97 – Detalhe Sutil - Alteração do desenho na parte superior....................................91
Figura 98 – Categoria Fios – Fios Fantasia...............................................................................91
Figura 99 – Categoria Fios – Fios Fantasia...............................................................................92
Figura 100 – Detalhe – fios da figura 99...................................................................................92
Figura 101 – Categoria Fios – Fios Fantasia.............................................................................93
Figura 102 – Categoria Fios – Fios Fantasia.............................................................................93
Figura 103 – Categoria Fios – Fios Fantasia.............................................................................94
Figura 104 – Categoria Fios – Fios Fantasia.............................................................................94
Figura 105 – Ornamentos em detalhe.......................................................................................95
Figura 106 – Categoria Fios: Fio Claro......................................................................................96
Figura 107 – El Lissitzki, estrutura de texto ............................................................................96
Figura 108 – Herbert Bayer, nota promissória.........................................................................96
Figura 109 – Categoria Fios: Fio Preto......................................................................................97
Figura 110 – Categoria Fios – Fio de Intestação......................................................................98
Figura 111 – Categoria Fios – Anúncios........................................................................................98
Figura 112 – Categoria Fios – Anúncio....................................................................................99
Figura 113 – Seleção Geral – categoria Brasão.......................................................................100
Figura 114 – Categoria Brasão - Grupo 1...............................................................................100
Figura 115 – Categoria Brasão - Grupo 2...............................................................................101
Figura 116 – Capas dos Catálogos do Salão Paulista de Belas Artes...................................101
* Organização do autor (2012)
INTRODUÇÃO
Este projeto tem como propósito fazer levantamento e análise de catálogos de exposições
de arte ocorridas na cidade de São Paulo entre 1912 e 1950. A escolha se beneficia da formação
e experiência da mestranda como designer gráfica, docente, pesquisadora e produtora em Museus
e Bienais de Arte de São Paulo, para quem o interesse pelo design e pelas artes plásticas sempre
caminharam juntos.
Ademais, os catálogos de arte levantados e analisados apresentam pequena circulação
e pouco registro na história da cultura visual e do design brasileiro. Esta lacuna foi o estímulo
adicional para pesquisar tais peças, com o intuito de inseri-las como peças de design gráfico e
compor o repertório do design brasileiro.
A mais antiga publicação gráfica de exposição de arte do século XX encontrada durante
o levantamento realizado é o “Catálogo dos Quadros”¹ , publicado em dezembro de 1912 –
fato que determinou o início do recorte cronológico. O período de pesquisa se encerra com os
catálogos da década de 1950, por ser esse um momento pouco contemplado em estudos acerca da
história do design gráfico brasileiro. O término da delimitação cronológica deve-se a dois aspectos
– o primeiro: ao interesse em abordar um momento no qual esse tipo de publicação não era
considerado produto de design – se comparado à institucionalização acadêmica no país, uma vez
que a gênese da atividade no Brasil estaria vinculada à década de 1960, quando surgiram as escolas
de design em São Paulo e no Rio de Janeiro. Tomando como referência as pesquisas de Rafael
Cardoso publicadas em seu livro O Design Brasileiro antes do Design, de 2005, entende-se que antes de
1960, a denominação “design” nem era usada. Porém, na época que precede a década de 1960, na
qual este trabalho é contextualizado, existiu sim um universo de atividades e produções projetuais,
conforme referenciado nas publicações de Cardoso (2005) e de Homem de Melo (2011). Dentre
elas, insere-se o objeto de estudo deste projeto, que busca realizar uma leitura visual e analítica dos
catálogos, na condição de objetos de design gráfico, visando o interesse em contribuir para a história
do design brasileiro. O segundo aspecto do posicionamento do marco cronológico final em 1950
diz respeito ao levantamento de catálogos de arte que precedessem a 1ª Bienal Internacional de
Arte de São Paulo, a qual seria realizada em 1951 e anunciava um tempo de crescente pesquisa de
material gráfico.
O catálogo de arte é elemento do design editorial e pode assumir a forma de livro, folheto,
folder. Quando em suporte impresso, é produzido em escala e direcionado a um público específico.
Na óptica de Porta (1958), o catálogo consiste em uma lista, relação metódica de coisas ou p
essoas, geralmente seguindo a ordem alfabética acompanhada de algum elemento descritivo ou
informativo sobre cada item. Em entrevista a Christophe Cherix², o curador e pesquisador Seth
Siegelaub afirmava entender o catálogo de arte como um impresso que visa representar a instituição
1 Catálogo dos Quadros, dezembro de 1912. Fonte: Pinacoteca do Estado de São Paulo.
Esta publicação foi a mais antiga encontrada durante o levantamento de catálogos de arte feito para esta pesquisa.
2 Christophe Cherix, entrevista telefônica com Seth Siegelaub em 10 de setembro de 1996, apud PANEK, Bernadette.
O Livro de Artista e o Espaço da Arte. In: Fórum de Pesquisa Científica em Arte, 3, 2005. Anais... Curitiba: Escola de
Música e Belas Artes do Paraná, 2005.
14
de arte, galeria ou museu, tornando-se um espaço de “apresentação pública” e disseminação de
arte para um público mais específico.
Os catálogos elencados na pesquisa apresentam variadas composições visuais no uso de
tipografias, cercaduras e ornamentações, configurando padrões decorativos que transitam pelo
Art Nouveau e Art Déco, entre outros.
Figura 1 – Catálogos com padrões decorativos
Fonte: Biblioteca Walter Wey
Apresentam também variedade de formatos, dobras e materiais, como a Revista Anual do
Salão de Maio (RASM), de 1939, cuja capa é feita em metal.
O presente trabalho visa levantar, digitalizar e analisar os catálogos de arte no contexto da
linguagem visual, e elencá-los nas seguintes categorias – imagens, tipografias, fios e brasões.
Entre as fontes bibliográficas, foram privilegiadas aquelas que contemplassem definições
sobre o catálogo como artefato e peça gráfica – textos produzidos por teóricos abordando definições
do design gráfico, publicações com análise do design gráfico dentro do recorte cronológico, além da
contextualização cultural da cidade de São Paulo antes da década de 1960.
Nos aspectos metodológicos, a pesquisa qualitativa teve caráter analítico-histórico,
bibliográfico e documental. Quanto aos procedimentos de campo, foi feito levantamento de peças
gráficas em bibliotecas de museus e acervos pessoais.
Para melhor elucidação dos relatos apresentados, propomos a apresentação desta pesquisa
em três capítulos, sendo o capítulo 1 sobre o design gráfico e sua conceituação; e o catálogo de arte
visto por duas vertentes – artefato e mídia impressa. Desta forma, buscamos definir sua função
e apresentar sua variedade de formas para, no último capítulo, expor a análise do catálogo de arte
e seus elementos gráficos e compositivos próprios do design gráfico. O segundo capítulo discorre
sobre a organização da pesquisa de campo, a partir do contexto cultural e artístico da cidade de
São Paulo e o mapeamento das peças gráficas. O capítulo 3 apresenta a seleção das peças gráficas
e os elementos gráficos que constituem a composição visual destes impressos, organizados em
categorias como: imagens, tipografias, fios e brasões.
15
1. O CATÁLOGO DE EXPOSIÇÃO DE ARTE COMO PEÇA DE DESIGN
O primeiro capítulo é constituído por dois temas centrais que norteiam a pesquisa – o design
e o catálogo de arte. Ao pensarmos no catálogo, a peça pode ser vista no campo interdisciplinar
do design e apresenta dois desdobramentos – como artefato e como mídia impressa. É certo que
a linguagem gráfica participa de um diálogo mais ativo no projeto; portanto, optamos por dar
enfoque maior à conceituação do design gráfico.
O segundo assunto aborda o catálogo e sua fundamentação como artefato. Para tanto, ele foi
observado sob dois pontos de vista: por sua função como catálogo e pela multiplicidade de formas.
Design:
Artefato;
Conceituação de Design Gráfico
CATÁLOGO:
Função, Forma
Figura 2 – Temas centrais do capítulo 1
Embora possa parecer demasiado técnico conceituar o catálogo de arte, é necessário
entendê-lo em seu conjunto para fragmentá-lo. O catálogo de arte é o protagonista, o fio condutor
para chegar ao recorte proposto nesta pesquisa. Não fosse o contato com o material – folhear,
observar, entender sua função –, o estudo teria possivelmente tomado outros caminhos. Havia
uma inquietação da pesquisadora em compreender esse objeto, em analisar a sua forma de atuação.
Mostrou-se também importante entender o catálogo de exposição de arte, pois notamos que há
pouca literatura sobre o tema.
Na apresentação do livro “Conceitos-Chave em Design”, o autor Luiz Antonio L. Coelho
(2008) considera que o saber se delineia a partir da identificação de seus termos básicos, em
especial no caso do design, que sustenta uma multiplicidade de aplicações e acepções de termos.
16
Entender as aplicações terminológicas do objeto de análise visa complementar o processo de
pesquisa. Reconhecer, entender o objeto a ser estudado, mesmo já tendo o recorte definido, é
importante para compreender o objeto de estudo.
Deste modo, abordamos brevemente o catálogo no contexto do design – sua forma como
artefato. Em seguida, nós o consideramos como produto do design gráfico. Segundo Coelho (2008),
a palavra “artefato”, em seu sentido etimológico, deriva de “feito com arte”, do latim arte factus.
Nesse quesito, o homem transforma a ideia em matéria e promove a ação humana sobre a matériaprima; no âmbito do design, isso corresponde ao ato de projetar. Complementamos com a visão
de Cardoso (2000): “artefato” – o que é produzido em série por meios mecânicos. Isso confere ao
design características de produção industrial, diferenciando-o do artesanato.
Configura-se, assim, o catálogo de arte como elemento da indústria gráfica, sendo
produzido em série. Em seu livro recém-lançado, Cardoso (2012) aponta que entre 1850 e 1930,
havia novos profissionais – alguns deles já apelidados de “designers” – com a tarefa de conformar a
estrutura e a aparência dos artefatos de modo que ficassem mais atraentes e eficientes.
A atribuição acima segue como forma comparativa capaz de estabelecer o catálogo como
artefato produzido no campo da indústria, sendo reproduzido, seriado. O catálogo também adota
aspectos da configuração visual que o torna atraente, sendo este o assunto que recebe maior
atenção na presente pesquisa.
Uma vez apontado o Catálogo de Arte como peça de design – artefato – produto impresso,
industrial, seguem-se as conceituações históricas e teóricas do design gráfico.
1.1 Conceituações do design gráfico: a prática antes
da teoria
Estabelecemos dois eixos para pontuar e guiar as relações de diálogo entre o design gráfico e os
catálogos de arte – artefato a ser analisado. Partimos inicialmente de conceituações teóricas sobre o design
gráfico. Sendo este um terreno de vasta possibilidade, o conceito visa atenuar os impasses gerados ao se
definir o termo design. O segundo eixo é apresentado posteriormente, no capítulo Três; parte da própria
análise do objeto – o catálogo de arte e a presença do design gráfico com base nos elementos projetuais
e composições visuais presentes no catálogo de exposições de arte.
A pesquisa abrange uma cronologia compreendida entre 1912 e 1950, período em que as
definições apontam diversos olhares para o design quanto ao uso do termo e à área de atuação; em
especial quando se trata de uma pontuação histórica a partir da atividade acadêmica no Brasil, datada no
início da década de 1960.
Neste estudo, não propomos delimitar pontuações históricas e marcos acadêmicos para
fundamentar o design. Porém, julgamos importante apresentar uma breve explanação sobre os conceitos
do design gráfico, por considerarmos o material exposto e discutido incluso nesse segmento.
Dentro de um contexto global e histórico, o design surge com a Revolução Industrial. Porém,
no âmbito nacional, teve sua gênese nos anos de 1960. Este marco cronológico decorre de um novo
rumo que o design tomou em termos de consciência e ideologia entre as décadas de 1950 e 1960,
como pontua Cardoso (2005). A abertura do Instituto de Arte Contemporânea do Masp ocorreu
em 1951; a inauguração da Escola Superior de Desenho Industrial – ESDI, em 1963. Seguindo o
17
pensamento de Cardoso, alguns considerarão equivocada a aplicação do termo “design” a qualquer
situação anterior a essa gênese ideológica. Porém, na época que precede a década de 1960, quando
este trabalho é contextualizado, existiu sim um universo de atividades e produções projetuais. Em
razão disso, o percurso cronológico desta pesquisa regride a um momento anterior à origem do
design acadêmico no Brasil. Consideramos quatro autores que revalorizam e reconceituam as peças
gráficas e a história do design brasileiro; estes pesquisadores são fontes de inspiração para a pesquisa
– Chico Homem de Melo, Edna Cunha Lima, Guilherme Cunha Lima e Rafael Cardoso.
Apoiamo-nos também no ponto de vista de Villas-Boas (2007) para compreender o
design antes de sua gênese acadêmica; o autor pontua que é possível entender o design a partir de
uma mera intenção, mesmo que não esteja formalizada como metodologia acadêmica. Para que
uma peça seja de design gráfico, ela segue a metodologia que é a própria razão de ser do design.
Priorizar a definição do design a partir de um marco histórico e da aplicação de um termo é uma
questão que seguiria rumos alheios ao enfoque da pesquisa, quando o intuito é identificar peças
gráficas existentes como design, pela simples ação consciente do profissional, independente de sua
formação acadêmica.
Conforme entendimento de Villas-Boas, as peças gráficas fazem parte do “ser design”. O
trabalho não visa uma formalização acadêmica no campo do design – segue os aspectos analíticos
a partir da presença dos elementos visuais no design gráfico. Porém vislumbramos a necessidade
de compreender o design nacional antes da sua afirmação como atividade profissional e acadêmica,
contribuindo para um novo olhar sobre as origens do design brasileiro.
Há grande carência bibliográfica acerca da história do design brasileiro. Segundo Cardoso
(2005), o Brasil é notoriamente um país “sem memória”. Se existiram atividades projetuais
anteriores à importação de um ensino ulmiano¹, de design gráfico. Cardoso (2005) aponta que,
para os relatos históricos serem construídos com vigor, é imprescindível que as fontes primárias
sejam cada vez mais conhecidas e divulgadas. A identificação de fontes ligadas à evolução do design
brasileiro é tarefa premente.
Sobre o mesmo contexto, diante da carência de publicações referentes à identidade do design
gráfico nacional, o escritor e designer Steven Heller, no prefácio da publicação “Linha do Tempo
do Design Gráfico” (2011), demonstra surpresa ao deparar com as peças gráficas apresentadas
no livro de Chico Homem de Melo. Heller comenta que não supunha que o Brasil contasse com
um legado de design tão antigo, nem que fosse tão rico em termos estilísticos e conceitualmente
sofisticados. A história do design deriva da história da indústria e da tecnologia; como Cardoso
(2005) aponta, é o artefato em si que é decodificado e estudado na investigação histórica – estes
produtos, peças gráficas, servem de suporte para gerar informações sobre a história do design.
Conforme apontamento de Heller, pouco é apresentado sobre este material em livros de design e
pesquisas acadêmicas no Brasil; surpreendeu-o constatar que havia inovações em termos projetuais
1 Referente à Escola de ULM, conhecida como Escola Superior da Forma. Localizada na Alemanha, é um centro de
ensino e pesquisa de design e criação industrial, concebida em 1947 e fundada em 1952 por Inge Aicher-Scholl (19171998) e Otl Aicher (1922-1991), professores da já existente Escola Popular Superior da Forma de Ulm, e por Max Bill
(1908-1994), antigo aluno da Bauhaus. Trata-se de um empreendimento privado de caráter interdisciplinar, que reúne
arquitetos, designers, cineastas, pintores, músicos, cientistas e outros. http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/
enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=instituicoes_texto&cd_verbete=5696. Acesso em: 23.07.12
18
no Brasil, numa época em que supostamente “não havia design”. Já no caso do Brasil, as peças
gráficas antigas são pouco expostas e pesquisadas no âmbito acadêmico e editorial.
Ao mencionarmos a história do design e a legitimidade da profissão, vemos que estes
contextos recebem fundamentações diferentes que se sobrepõem e se confundem; não
priorizamos considerar design apenas a partir do início da conceituação da profissão designer.
Se seguíssemos essa lógica, a abordagem que envolve esta pesquisa estaria nula. Optamos por
favorecer a contextualização do design a partir da análise das peças gráficas; serão elas o ponto
de apoio e é a partir do argumento dos elementos visuais que a presença do design gráfico se
torna significativa. Porém, mesmo delimitado o recorte, temos que compreender a aplicação
do termo design, o conceito, para entendermos sua presença nos catálogos de arte.
Sob o ponto de vista de Cardoso (2005), a disputa na história do design gira em torno
da aplicação do termo e o sentido da palavra em si. Esse termo gera anacronismo, devido a
seus percalços linguísticos. Coelho (2008) confere à palavra design um caráter polissêmico, por
entender que abrange uma variedade de sentidos – em inglês design, pela origem latina designo.
Sendo assim, abrange as acepções de designar, indicar, representar, marcar, ordenar, dispor,
regular; pode significar invento, planejamento, projeto e configuração, diferenciada da palavra
drawing (desenho). Flusser (2007) insere também o verbo “to design” – o design como ação –
simular, projetar, esquematizar, configurar, proceder estrategicamente. Assim, observamos
que a etimologia da palavra design é ambígua, além de portar uma gama de possibilidades de
atuação que vão desde o lighting design ao design vernacular.
Por essa variedade de campos de atuação que o design abrange, neste item, optamos por
apresentar uma delimitação orientada para o design gráfico, conceituando e compreendendo
sua prática e teoria. Desse modo, faremos referência a diferentes autores que abordam o design
gráfico, e ao modo como os conceitos publicados por eles dialogam com o objeto gráfico
enfocado na pesquisa.
Apoiado no prefácio da primeira edição da “História do Design Gráfico” (2006),
Meggs comenta que o designer de livros William Addison Dwiggins teria cunhado o termo
“design gráfico” em 1922, buscando descrever um profissional que desenvolve uma forma
visual e confere uma ordem estrutural à comunicação impressa. Mesmo o termo tendo sido
apresentado apenas na década de 1920, Meggs considera que o design seja preexistente. Desde
a pré-história, o homem procura transformar seus conceitos em formas visuais e dar clareza
a sua forma de comunicação. Ao longo da história, há registros de como estas informações
visuais vão em contínua evolução, desde os escribas até os designers contemporâneos.
A autora Ana Claudia Gruszynski (2008) cita Meggs, indicando que ele reconhece
cinco momentos fundamentais na história do design gráfico: o primeiro refere-se à escrita;
o segundo, denominado Renascença Gráfica, diz respeito à origem das tipografias
europeias e ao design voltado para a impressão. A revolução industrial traz um novo
impacto à comunicação visual, juntamente com o início da fotografia e com movimentos
como Artes & Ofícios e Art Nouveau. O quarto período abrange a Era Modernista, que
tem como expoentes a Bauhaus e a Nova Tipografia. Por fim, a Era da Informação,
quando o design se insere na globalização. O recorte que Meggs emoldura parte da
aparência visual analisada em determinadas peças gráficas, não representando apenas um
estilo estético, mas buscando evidenciar o contexto cultural de cada época para pontuar
19
aspectos marcantes na história do design gráfico. É importante observar que, ao longo
da história, o design gráfico existia antes mesmo da profissão como prática reconhecida e
remunerada. No seguinte trecho² , William Morris firma esse reconhecimento, justificando
seus objetivos ao fundar a editora Kelmscott Press:
Comecei a imprimir livros com a esperança de produzir alguns com clara
pretensão à beleza, ao mesmo tempo fáceis de ler, sem ofuscar a vista nem
perturbar o intelecto do leitor pela excentricidade na forma das letras.
Sempre fui um grande admirador da caligrafia da Idade Média e das primeiras
impressões que a substituíram. Quanto aos livros do século XV, observei que
sempre eram belos pela força da simples tipografia, mesmo sem o acréscimo
dos ornamentos que abundam em muitos deles. E constituía a essência de
meu empreendimento produzir livros para os quais fosse um prazer olhar
enquanto peças de impressão e organização dos tipos. Olhando para a minha
aventura por este ângulo, eu tinha de considerar principalmente os seguintes
elementos: o papel, a forma do tipo, o espaço relativo entre letras, palavras e
linhas e, finalmente, a posição da matéria impressa na página.
Nessa nota, percebemos que antes que uma terminologia o denominasse designer
gráfico, havia em Morris um profissional consciente de suas atividades ligadas à produção
de um artefato e com referências estéticas para produção do seu material gráfico
– um exemplo significativo de como as habilidades estão inseridas no design gráfico,
independente de terminologia e formação acadêmica.
Pelo olhar de Hollis (2001), o design gráfico faz parte da relação entre imagem
e fundo: no caso, o papel recebe as imagens e signos que são pensados entre o espaço
com tinta e o espaço sem tinta, o positivo e o negativo – elementos fundamentais para
a estética do produto gráfico como um todo. E não seriam estes elementos o impulso
para que Morris se dedicasse à área editorial, criando uma proposta de design como
agente transformador? E pensar que, nos anos de 1830, como aponta Cardoso (2004), o
excesso de mercadorias, antes visto como sinônimo de conforto começou a ser encarado
como decadência do bom gosto. Surgiram reformistas que defendiam a qualidade, em
oposição ao consumismo que a industrialização provocara. A introdução das máquinas
no processo de fabricação do papel tornou os materiais gráficos – cartazes, folhetos,
livros – uma mercadoria abundante e barata, possibilitando aumento na produção de
impressos com custo reduzido, como aponta Cardoso (2004). O livro estava diante da
rápida evolução dos impressos. Porém, sob a ótica do autor (2004), esse artefato tinha
apresentação descuidada e resultado insignificante, em razão da carência de mão de obra
qualificada. Segundo Cardoso (2004), Morris esteve à frente do seu tempo como designer
e escritor, e foi um dos primeiros reformistas a buscar um novo olhar para a produção de
livros, obtendo resultados marcantes para a história do design gráfico. Empenhou-se em
recuperar padrões elevados no aspecto da produção editorial, entregando-se às tarefas de
projetar fontes, páginas e volumes e de pesquisar papeis, tintas e tipos.
Segundo Meggs (2006), a editora Kelmscott estava determinada a resgatar a
beleza dos livros criados nos primórdios da imprensa com tipos móveis.
2 Nota de William Morris sobre seus objetivos ao fundar a Kelmscott Press (1898).
In: http://www.escritoriodolivro.com.br/. Tradução de Dorothée de Bruchard. Acesso em: 25.07.12
20
Figura 3 – William Morris, marca registrada da Kelmscott Press, 1892
Fonte: História do Design Gráfico, p. 223
Emery Walker, que compartilhou as ideologias de Morris, é citado no livro de
Meggs (2006). Walker considerava o design de livro semelhante à arquitetura, uma vez que
somente o cuidadoso planejamento de cada aspecto – papel, tinta, tipo, espaçamento,
margens, ilustração e ornamento – poderia resultar num projeto com unidade.
A comparação entre arquitetura e design também é vista na análise de Hendel
(2006), quando afirma que “os designers estão para os livros assim como os arquitetos
estão para os edifícios”. Para o autor, os designers escrevem especificações para projetar
livros, da mesma forma que os arquitetos escrevem para construir edifícios.
Villas-Boas (2007) nota o objeto como atividade de projeto sendo reproduzido
por meio gráfico – são cartazes, páginas de revistas, capas de livros e de produtos
fonográficos, folhetos etc.
Quanto à ação de projetar no design gráfico, Hollis (2001) comenta que este é um
dos itens que diferenciam o designer do artista plástico: o ato de projetar, de pensar a questão
estética, de modo que a mensagem apresentada seja compreendida pelo público-alvo.
Notamos que a prática do design antecede sua teoria. Gruszynski (2008) aponta que,
em sua transição histórica, a práxis do design gráfico agrega uma diversidade de artefatos,
práticas e informações que permitiram sua conceituação como campo de conhecimento
específico. O design gráfico articula signos visuais com o objetivo de produzir uma
mensagem, abrangendo aspectos informativos, estéticos e persuasivos. Coelho (2008)
indica que diversos conceitos inseridos na área do Design Gráfico precedem a palavra
“gráfico” e podem traduzir, por exemplo, o indivíduo que trabalha na indústria gráfica,
um esquema para sintetizar determinada informação a partir dos infográficos, ou outra
possibilidade relacionada à representação visual.
Notando o verbo “projetar” tão recorrente nas conceituações do design gráfico, o
autor considera que, como projeto, o design abriga um conceito amplo – o design gráfico
vincula-se ao visual, que ultrapassa as questões gráficas, a ponto de tornar-se sinônimo dele.
No caso do presente trabalho, que configura o catálogo de arte como uma peça impressa,
outra delimitação é adotada para este artefato gráfico: como parte da área editorial –
21
livros, folhetos. Em “O Valor do Design” – Guia ADG Brasil de Prática Profissional do
Designer Gráfico, os designers conhecidos por projetar livros, folhetos, revistas e jornais
passam a figurar no segmento de design editorial, que consiste na intervenção do designer
ao criar e desenvolver publicações, incorporando a linguagem visual.
Levantamos alguns apontamentos sobre a teoria do design gráfico sob a ótica do
impresso. Dentro deste universo que abriga sua terminologia e áreas de atuação, o catálogo
de arte está inserido no design gráfico e mantém estreito relacionamento com o design editorial.
Antes mesmo de apontar aspectos e elementos que trazem estreito diálogo entre o catálogo
de arte e o design, a partir da análise do objeto, vamos compreender a função e a estrutura
do catálogo de arte – o que ele representa. Nos próximos itens do capítulo Um, serão
mencionados o catálogo de arte e sua representação, tanto como função quanto forma.
22
Figura 4 – Linha do Tempo³
3 Referências das datas na Linha do Tempo:
1) PAIXÃO, Fernando (org). Momentos do Livro no Brasil. São Paulo: Ática, 1998
2) HOMEM DE MELO, Chico; RAMOS, Elaine. Linha do Tempo do Design Gráfico no Brasil. São Paulo: Cosac Naify, 2011
23
1.2 O catálogo de arte como documento:
a memória da exposição
A primeira tarefa consiste em entender a função, definição e origem do catálogo de arte – o
elemento propulsor da pesquisa. O catálogo de arte em alguns casos apresenta a aparência externa
de um livro, mas seu conceito textual e iconográfico segue informações específicas, inerentes ao
contexto das artes. Antes de observarmos a exterioridade do objeto; buscamos entender qual o
significado do catálogo em uma exposição de arte. O questionamento é – o que se entende por
catálogo de arte?
De acordo com o glossário de termos e verbetes da ADG�, denomina-se o catálogo como:
[...] livro, catálogo ou folheto volumoso apresentando fotos e textos de
exposições, coleções particulares de artistas, trabalhos impressos de coleções
de obras de arte, livros, moedas, selos, cartões etc., segundo catalogação
realizada por entidade física ou jurídica.
De acordo com o dicionário Houaiss (2001, p. 650), o termo catálogo diz respeito a:
1. lista, rol ou enumeração, ger. por ordem alfabética, de pessoa ou coisa
[c. de fábrica] 2. BIBL lista ou fichário em que se relacionam, de maneira
ordenada, os livros e documentos diversos de uma biblioteca.
Já este verbete apresentado no glossário do Museumuseu (2006, p. 8), aponta:
Catalogar: 1. Anotar e descrever itens de uma coleção durante a realização de
inventário. Geralmente objetiva reforçar o registro de pertencimento e/ou
fazer conhecer a guarda permanente ou provisória. O resultado geralmente
assume forma de livro indexado. 2. Indexar. 3. Relacionar em forma de
catálogo; lista específica de coisas da mesma natureza. 4. Organizar para
formar um catálogo. 5. Separar e identificar um grupo de coisas. 6. Listar
em ordem.
Das pontuações apresentadas acima, selecionamos algumas palavras e ações que
merecem atenção, tais como coleções de obra, lista ordenada, registro, identificar, guardar
algo de forma permanente ou provisória. Ao refletir sobre o objeto pesquisado – o
catálogo de arte – observamos que apresenta a ação de registrar e de guardar; em especial
Figura 5 – Catálogo, IV
Salão Paulista de Belas
Artes, 1936
Fonte: Biblioteca Walter
Wey, Pinacoteca do Estado
de São Paulo
4 Associação dos Designers Gráficos do Brasil. http://www.adg.org.br/ Acesso em: 25.06.12
24
quando pautado como permanente – forma de manter, conservar e abrigar a obra; isso
remete à memória da exposição, seja ela documentada por listagem ou por imagem.
As coleções de obras podem ser guardadas, listadas por uma disposição onde
abrigam segmentos de gêneros artísticos tais como pintura, escultura, fotografia entre
outros. Essa organização provavelmente segue organização definida pela própria
instituição que cria o catálogo.
Nas figuras 6, 7 e 8 reunimos três exemplos de listagem de obras e categorias,
organizadas por lista e imagem.
Figura 6 – Listagem de obras e suas categorias
Miolo do catálogo-folder – 1ª Exposição de Pintura de Flavio de Carvalho, 1934
Fonte: Coleção de Artes Visuais – IEB
Figura 7 – Listagem de obras e suas categorias: escultura, aquarela, desenho, arquitetura, água forte e xilogravura.
Miolo, RASM – Revista Anual do Salão de Maio, 1939.
Fonte: Coleção de Artes Visuais – IEB
25
Figura 8 – Ordem das obras presentes no índice
Miolo do Catálogo, IV Salão Paulista de Belas Artes, 1936
Fonte: Biblioteca Walter Wey, Pinacoteca do Estado de São Paulo
Se pensarmos na instituição museu5, algumas das reflexões pautadas acima se
aproximam da definição do catálogo de arte. O museu, por si só, já é um arquivo: de
objetos históricos, de obras de arte, de coleções diversas, dentre tantos outros objetos;
nesse recinto, o espectador pode observar as qualidades dos objetos em sua presença
física e material, tais como pinceladas, cores e formas de pinturas, esculturas etc. Já o
catálogo pode ser um lugar para arquivar e resgatar o que foi visto.
Ao reproduzir as obras em meio impresso, o catálogo também se torna um
objeto de divulgação da exposição, atua como produtor de comunicação, como meio de
circulação e propagação das obras expostas, de divulgação do artista. Enfim, o catálogo
não apenas apreende a arte exposta como também atua na realidade presente, uma vez
que o evento é retransmitido e as imagens circulam para além do espaço expositivo.
Em alguns casos, o arquivo físico do museu pode estar presente no arquivo
impresso. Este se estabelece como um espaço impresso que desempenha o papel de
disseminador e mediador da arte para um público específico. O curador e pesquisador
Seth Siegelaub6 define estes objetos gráficos como um espaço de uma galeria de arte.
Devido à natureza que os trabalhos de artistas adquirem nas páginas dos impressos, ele
entende que elas substituem as paredes dos museus.
5 Museu é um estabelecimento de caráter permanente, administrado para interesse geral, com a finalidade de conservar, estudar, valorizar de diversas maneiras o conjunto de elementos de valor cultural: coleções de objetos artísticos,
históricos, científicos e técnicos, jardins botânicos, zoológicos e aquários. Comitê Internacional de Museus – ICOM.
Fonte: http://www.museus.gov.br/museu/ acesso 28.11.2012
6 Christophe Cherix, entrevista telefônica com Seth Siegelaub em 10 de setembro de 1996, apud PANEK, Bernadette.
O Livro de Artista e o Espaço da Arte. In: Fórum de Pesquisa Científica em Arte, 3, 2005. Anais... Curitiba: Escola de
Música e Belas Artes do Paraná, 2005.
26
Figura 9 – Catálogo da Exposição: Tarsila Viajante
Exposição realizada na Pinacoteca do Estado de São Paulo
Fonte: http://www.viaimpressa.com.br/wordpress/?galleries=tarsila-viajante-viajera.Acesso:25.06.12
Na realização de uma exposição de arte, há uma ordem a ser seguida, um raciocínio, uma
linha de pensamento na escolha de obras e em como elas serão distribuídas e “diagramadas”
no espaço expositivo sob a visão do curador e sua equipe. Ao pensar no catálogo, a exposição
é transferida para o impresso; a exposição acaba tendo continuidade a partir do registro
gráfico; é a memória impressa sob a ótica do curador, do crítico, do artista, da instituição, do
editor, do designer – são estes profissionais presentes e atuantes que fazem parte do processo
de criação de um catálogo, o qual valida a exposição na memória.
Figura 10 – Planta do VII
Salão Paulista de Belas
Artes,1940
Fonte: Biblioteca Walter
Wey, Pinacoteca do
Estado de São Paulo
Segue uma descrição de “catálogo” e sua multiplicidade de interpretações pelo
olhar de cada profissional envolvido direta ou indiretamente com a exposição:
1. Para o artista/escritor – um registro permanente de sua exposição.
2. Para a galeria – para os arquivos.
3. Para o mecenas – um álibi e um registro para os arquivos.
4. Publicidade – para informar ao público, à mídia e a outras galerias sobre as
27
atividades ou progresso do artista.
5. Educacional – para informar o público sobre a exposição e fornecer
informações do projeto para os estudantes.
6. Para contextualizar um grupo de mostras que ilustrem uma tese curatorial.
(BROKER, 2000 apud NUNES, 2010, p. 146. trad. nossa)
No catálogo, as sensações do observador diante de uma obra, tais como o vigor
da pincelada, as sobreposições e nuances de cores, o volume da escultura, a dimensão real
da obra e sua monumentalidade, são vivenciadas pela lembrança da obra vista em uma
exposição.
Estas sensações são certamente alteradas diante das obras impressas no catálogo
de arte, mas o intuito desta reflexão comparativa é atentar como a peça gráfica retém as
informações e adquire uma forma de documentação, conforme observado por Broker
(2000) onde, de certa maneira, cada item refere-se à ação do arquivar. Ao folhear um
catálogo, a memória da exposição é reconstruída. O catálogo de arte possibilita a ação
de arquivar para não esquecer –
seja por uma listagem de obras
ou mesmo a obra reproduzida
no impresso. Na mídia impressa,
as sensações diante da obra
não são as mesmas; contudo,
em alguns casos, as obras
que ocupavam as paredes dos
museus podem ocupar o espaço
impresso, como referenciado
por Siegelaub anteriormente.
Figura 11 – Catálogo, VII Salão Paulista de Belas Artes, 1939
Fonte: Biblioteca Walter Wey, Pinacoteca do Estado de São Paulo
Figura 12 – Catálogo,
PINACOTECA, 1950
Fonte: Centro de Documentação e
Memória da Pinacoteca do Estado
de São Paulo
Algumas vezes, a reprodução da obra vem acompanhada de uma reflexão ou
comentário, que pode ser de um crítico ou mesmo do próprio artista, o que pode gerar
reflexões não pensadas ao visitar a exposição.
Um exemplo de comentário com cunho didático é visto no texto inicial do
28
Catálogo de arte – Exposição do Pintor Russo Lasar Segall. Ali, o próprio artista escreve o
texto de apresentação da exposição e pontua sua inovação na linguagem plástica, onde
explica sua atuação como pintor expressionista:
Devendo expor ao público os meus trabalhos expressionistas tão differentes
de tudo quanto tem sido exposto até hoje em São Paulo, achei de bom aviso
abrir este catálogo com algumas palavras de explicação. [...] O espectador
está geralmente habituado, graças às suas idéias tradicionaes sobre a arte,
a reclamar de pintura a photographia, o assumpto, a realidade, effeitos
technicos, coisas sentimentaes bem arranjadas. E encontrando uma nova
tendência na arte, esse espectador fica disorientado e começa a torturar-se
com mil perguntas inúteis. Será possível ser bello isto? (SEGALL, 1924)
Outro exemplo de didatismo presente
no catálogo de arte pode ser presenciado
no gráfico como elemento de apoio à
própria leitura. Na imagem apresentada
na figura 14, observamos uma tentativa de
esclarecer o contexto central da exposição
– pintura francesa. Nas linhas horizontais,
são apresentadas as datas, os movimentos
artísticos inseridos em retângulos, assim
como os principais artistas que fizeram
parte do movimento, marcados na data que
corresponde ao movimento específico. O
gráfico não apenas auxilia o texto histórico
para entender o impressionismo e outros
movimentos de arte francesa, como
complementa a parte textual. De acordo
com Araújo (2000), os gráficos constituem
uma forma de representação cujo objetivo
é demonstrar informações sem o auxílio do
discurso escrito.
Figura 13 – Texto de apresentação, Lasar Segall
Catálogo: Exposição do Pintor Russo Lasar Segall, São
Paulo, 1924
Fonte: Biblioteca Jenny Klabin Segall, no Museu
Lasar Segall (São Paulo)
Figura 14 – Infográfico.
Catálogo “A nova pintura
francesa e seus mestres – De
Manet a nossos dias”, realizada
no MAM, 1949
Fonte: Centro de Estudos Luís
Martins – Biblioteca do MAM
(Museu de Arte Moderna de SP)
29
Ao lermos um texto antes ou depois de visitar uma exposição, seja ele histórico,
do próprio crítico, curador ou artista; esse texto possibilita a mediação entre a obra e o
espaço expositivo, oferecendo ao observador um apoio para refletir sobre a exposição.
No caso dos catálogos de arte, os textos podem apresentar a coleção da mostra
exposta, as características e dados biográficos dos artistas que exibiram obras, além de
especificações sobre determinado movimento artístico que contextualize a temática da
exposição, como o exemplo apresentado na figura 15.
Figura 15 – Texto Biográfico – Edouard Manet
Texto “Do Figurativismo ao Abstracionismo”.
Catálogo, A nova pintura francesa e seus mestres – De Manet a nossos dias, 1949
Fonte: Centro de Estudos Luís Martins – Biblioteca do MAM (Museu de Arte Moderna de SP)
Na peça gráfica, observamos a ação de catalogar, listar, arquivar. Entre outras funções,
podemos identificar no catálogo uma fluidez organizativa; ora por exemplos de catálogos que
apresentam apenas a listagem de obras, ou como nos dois exemplos anteriores, em que o
texto e o gráfico servem de apoio à temática da exposição. Quando a questão é o suporte
nos catálogos para mediar as informações das exposições, a imagem também pode ser um
elemento complementar de apoio para a listagem das obras e o texto, ou ser inserida apenas
como elemento ilustrativo. Para Coelho (2008), a imagem faz mediação entre o referente e/
ou objeto e a percepção e/ou interpretação pelo sujeito. Seguem alguns exemplos de imagens
dispostas nos catálogos.
Na figura 16 – A Mulher Chorando, 1948 –, a pintura apresentada ao lado do texto
serve de suporte. A seguir, um trecho do texto que, de certa maneira, dialoga com a imagem:
[...] mas toda gente percebe os substratos de melancolia e
compreende que as histórias da miséria, das pobres coisas de
Brodowski, estão anotadas como se ainda estivessem sob os olhos
do espectador menino.
30
Figura 16 – Texto e imagem do Catálogo, Portinari, Exposição de sua obra de
1920 até 1948.
Fonte: Biblioteca Jenny Klabin Segall, Museu Lasar Segall, São Paulo
Outro exemplo é o texto diagramado em duas colunas e ilustrado por duas
imagens inseridas em lados opostos, no qual observamos equilíbrio na construção da
página, com espaço em branco ao redor das obras expostas e sem gerar conflito entre
texto e imagem.
Figuras 17 e 18 – Texto “Confissão – Tarsila do Amaral e sua Obra”
Texto “Pintura Contemporânea”
Catálogo, Tarsila – 1918 a 1950, in: Pintura Contemporânea – Quadros do acervo do Museu de Arte Moderna de São
Paulo, 1950
Fonte: Centro de Estudos Luís Martins – Biblioteca do MAM (Museu de Arte Moderna de SP)
Na figura 17, mesmo com a organização assimétrica da página, a composição
apresenta harmonia entre texto e imagem. Nas figuras 17 e 18, notamos o aproveitamento
do branco e a sensação de ritmo, em virtude das proporções equilibradas do bloco de
texto; porém, faltam ousadia e inovação na diagramação e nos recursos tipográficos.
As obras “A Cuca” e “O Sono”, de Tarsila do Amaral, servem de suporte ao texto
escrito pela própria pintora. O texto seguinte apresenta o Museu de Arte Moderna de São
Paulo na mostra de oposição à arte tradicional. Como exemplo, são inseridas imagens do
abstracionismo; analogias no catálogo que denomina o artista abstrato como um artista
diante do espírito contemporâneo.
Para encerrar o exemplo das imagens presentes nos textos, observamos outros
31
recursos na estrutura do catálogo de arte, no esforço de provocar sensações e esclarecer
a informação da obra impressa. É o caso da reprodução da imagem muralista de Portinari
– publicada numa única página horizontal composta por quatro folhas, na tentativa de
demonstrar a grandiosidade da obra Mural Tiradentes.
Figura 19 – reprodução da
obra Mural de Tiradentes.
Catálogo, Exposição Mural
Tiradentes, de Cândido
Portinari, realizada no MAM
– Museu de Arte Moderna
de São Paulo, 1949
Fonte: Centro de Estudos
Luís Martins – Biblioteca
do MAM (Museu de Arte
Moderna de SP)
Conforme a época, o catálogo de arte possibilita a ação de arquivar as obras, a
qual pode ser realizada de múltiplas formas de registros.
Com base na observação de Nunes (2010), elencamos abaixo cinco exemplos
dentro do contexto histórico, os quais pontuam essa transposição de suportes para
registro da imagem com o viés da documentação.
Giorgio Vasari é conhecido como o precursor da história da arte e utilizava
o desenho como forma de documentação. Segundo Bazin (1989), sua iniciativa mais
notável no domínio da técnica de registro foi constituir uma coleção pessoal de obras
dos artistas em seu livro Le Vite de’ più Eccellenti Pittori, Scultori e Architettori, de 1550. O
registro das obras que via e estudava era constituído por desenhos. Como apontado por
Nunes (2010), Vasari, em seu Libro de’ Disegni, criou e organizou uma memória voluntária
32
dos quadros que viu e estudou, perfazendo um conjunto de oito a doze volumes com
aproximadamente 3000 desenhos.
Figura 20 – Capa do Le vite de’ più eccellenti pittori, scultori e architettori, versão de 1568
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Vite.jpg . Acesso 03.011.2012
Figura 21 – Página do “Libro de’ Disegni”, possível data 1480-1504
Fonte: http://oldmasterdrawings.net/drawings-artist-workshop-collecting/#.UJQjm5ium_w . Acesso 02.11.2012
Segundo o curador Lloyd De Witt em seu texto no site do Philadelphia Museum,
historicamente, o primeiro catálogo ilustrado impresso tendo a pintura como coleção
principal é datado de 1660 – o Pictorium Theatrum (“Teatro de Pintura”), coleção organizada
por David Téniers, o Jovem, pintor também das diversas versões de L’Archiduc Léopold
Guillaume dans sa galerie à Bruxelles (1639, 1640, 1641, 1647, 1651 etc.), cujos títulos variam
levemente de acordo com a versão apresentada. O catálogo foi publicado em quatro
idiomas – latim, francês, holandês e espanhol e em cinco edições, sendo a última em
1755.
Antes do catálogo publicado, Téniers já apresentava pinturas a óleo que constituem
um conjunto de obras. Não há catalogação a partir de uma listagem, mas é apresentada
uma ordem de figuras e dada atenção ao que se quer representar nesse ambiente onde
elas estão armazenadas. Segundo Perec (2005), são uma homenagem ao colecionador
integrado à sua coleção, apresentada como local de estudo e entretenimento. Nunes
(2010) denomina esse registro como “catálogo a óleo”.
33
Figura 22 – O arquiduque Leópold Guillaume em sua galeria em Bruxelas, 1650
Fonte: http://es.wikipedia.org/wiki/Archivo:El_archiduque_Leopoldo_Guillermo_en_su_
galer%C3%ADa_de_pinturas_en_Bruselas_(David_Teniers_II).jpg
Acesso 02.11.12
Entre 1729 e 1742, Pierre Crozat, o principal mecenas de Watteau7, publicou
dois volumes do Cabinet de Feu M.Crozat, com a coleção do Duque de Orleans. Em sua
pesquisa, Nunes (2010) comenta que essa documentação marcou época e ficou conhecida
em razão da fidelidade e qualidade das gravuras. Além das gravuras, a publicação trazia
a vida dos pintores, uma descrição de cada quadro ou desenho gravado, bem como sua
história, dimensões e características do suporte.
Figura 23 – O Cabinet Crozat
Fonte: http://openlibrary.org/books/OL24829982M/Description_sommaire_
des_desseins_du_cabinet_de_feu_M._Crozat
Acesso 02.11.12
7 Jean-Antoine Watteau, pintor francês do Movimento Artístico Rococó.
34
Do ponto de vista da história do catálogo de arte no Brasil, temos o Catalogo
Illustrado da Exposição Artística na Imperial Academia das Bellas-Artes, publicado no Rio de
Janeiro em 1884, como observado no site Dezenove e Vinte:
A Exposição Geral de Belas Artes de 1884, diferenciando-se das demais, além
de contar com o catálogo distribuído pela Academia Imperial, no qual vinham
listadas as obras nela expostas, contou também com esboços originais dos
próprios artistas. A iniciativa de produzir e custear tal catálogo (apenas 100
exemplares numerados) foi de L. de Wilde, dono de uma das mais famosas
galerias de arte do Rio de Janeiro de fins dos oitocentos. (VALLE; DAZZI)
Figura 24 – Capa e quarta capa do Catalogo Illustrado da Exposição Artistica na Imperial Academia das Bellas-Artes, 1884
Fonte: http://www.dezenovevinte.net/catalogos/catalogos_1884_ilust.htm
Acesso 04.11.2012
A tiragem numerada foi feita mediante um cálculo cuidadoso: o catálogo ilustrado
não pretendia substituir o catálogo distribuído pela própria Academia, e que só contava
com a listagem das obras expostas. Com certeza, as ilustrações foram um “mimo” para
cativar a clientela da futura galeria de Wilde, uma forma de promover a venda e não
uma iniciativa documental; conforme pontua Nunes (2010). Ainda assim, mesmo com
as ilustrações, preservou-se a lista nominal de expositores, com indicação numérica das
obras na exposição.
Em se tratando de uma produção de impressos oitocentistas no Brasil, segundo
Cardoso (2005), essa produção gráfica não contou com a figura do designer tal como é
conhecida hoje. Ela se deu a partir de gravuras, a exemplo do Catalogo Illustrado da Exposição
Artistica na Imperial Academia das Bellas-Artes e, posteriormente, evoluiu do processo
artesanal ao industrial. Quanto à responsabilidade pelo projeto, esta ficava a cargo de
um ilustrador, artista, litógrafo ou o próprio cliente. Os termos desenhistas e litógrafos
35
eram largamente utilizados e podiam abranger desde o empregado apenas habilitado
na escrita, típica da litografia, até talentosos artistas e caricaturistas de reconhecimento
internacional. Foram estes profissionais que começaram a desenhar a história gráfica no
Brasil.
Finalizamos essa pontuação histórica com uma obra contemporânea, Vision de La
Peinture Occidental (2002), do artista Fernando Bryce, exposta na 28ª Bienal de São Paulo.
No texto de apresentação do seu trabalho, o artista traz uma reflexão crítica sobre a
história contemporânea, tendo como fonte as próprias imagens e textos que a divulgam.
Conforme texto apresentado no site da Bienal8, o que traz a discussão é a reprodução
deste material impresso, pôsteres de artistas, reproduções de catálogos de arte, e também
documentos de governo enfatizando o modo como os fatos são construídos, como a
história é contada e como a cultura é descrita. Optamos por encerrar esta pontuação
histórica com a obra de um artista contemporâneo. Embora seja um trabalho de arte
conceitual e não um catálogo de arte, a ideia da obra dialoga com um discurso apresentado
neste item; a escolha da obra é o deslocamento que ela traz – o catálogo, o impresso é
colocado como obra. Bryce define “transposição do reino dos fatos para o reino da arte”
com um olhar não apenas do viés das artes, mas da temática em questão. A memória da
arte é armazenada por Bryce.
Figura 25 – Fernando Bryce, “Visión de la Peinture Occidental”, 2002
Fonte: http://entretenimento.uol.com.br/arte/bienal/2008/artistas/fernando-bryce/ acesso 02.11.2012
Retornamos ao ponto de partida quando apontamos que o modo de documentar
imagens de arte apresenta, ao longo da história, uma multiplicidade de linguagens visuais
e variedade de técnicas que vão de desenhos a litografias. A importância desse tipo de
documento é atestada quando vemos o exemplo de Bryce, em que o catálogo serve
como referência gráfica para realização de uma produção artística. Trazemos com estes
apontamentos uma reflexão sobre algumas funções dos catálogos no que se refere às
possibilidades de documentar e representar obras de arte.
Uma vez apresentado um breve panorama referente à função do Catálogo de
8 http://entretenimento.uol.com.br/arte/bienal/2008/artistas/fernando-bryce/
36
Arte, podemos concluir que o impresso é importante para abrigar a memória de uma
exposição. Consideramos outro aspecto que merece atenção – o fato de o próprio catálogo
apresentar uma pluralidade de formas, caracterizando-se dentro do setor editorial como
“publicações avulsas”, segundo Homem de Melo (2011). O próximo item visa apresentar
exemplos deste artefato e suas várias possibilidades de configuração e formato.
1.3 Catálogos de arte: a multiplicidade dos formatos
Buscaremos aqui compreender as alterações do catálogo de arte observadas em suas
variações de formatos – o artefato atua de maneira singular a cada publicação.
Inicialmente, partimos do pressuposto de que o catálogo equivale ao formato externo de
um livro; e em alguns casos, observamos que o artefato- catálogo pode efetivamente se aproximar
da forma de livro. Porém, durante o levantamento realizado, surgiu uma questão – se o catálogo é
comparado a um livro, os outros formatos de impressos que serão apresentados no presente item
– aqueles que o distanciam da forma livro –, estes outros deixariam de ser catálogos?
Figura 26 – Catálogo de arte: IV Salão Paulista de Bellas Artes, dezembro 1936 a janeiro 1937
Fonte: Centro de Estudos Luís Martins – Biblioteca do MAM (Museu de Arte Moderna de SP)
Dessa forma, antes de iniciar a pesquisa, partimos da definição – o que se entende
por catálogo de arte? para avançar a outro questionamento – os catálogos possuem uma única
maneira de apresentar seu formato externo? Observamos no item anterior 1.2 O catálogo de arte como
documento: a memória da exposição – que para atuar como catálogo de arte, o impresso precisa contar
basicamente com uma listagem de obras exibidas numa ordem “x” de acordo com a instituição,
curadoria ou o próprio artista. Observamos também que o seu conteúdo, tendo a listagem das
obras como elemento principal, pode agregar outros elementos para complementar informações,
como imagens das obras, texto de apresentação da exposição, comentários históricos sobre o que
está sendo exposto, entre outros.
37
Notamos que esse conteúdo sofre transição: ora o impresso é apresentado apenas com
a listagem de obras, ora com um texto do curador, imagens das obras, breve relato do tema da
exposição. Em nossa avaliação, não há consenso para apontar a forma exata do catálogo de
exposição de arte. O que será impresso pode variar de um grande texto a uma simples lista de
obras. Afinal, cada exposição é única e cada catálogo estabelece uma identidade de acordo com a
exposição. A seguir, procuramos ilustrar a multiplicidade de formatos.
Estreito
Oblongo
Quadrado
Francês
Figura 27 – Formatos de catálogo de arte9
Os catálogos na figura acima apresentam uma variedade, tanto nos formatos como na
quantidade de páginas.
O catálogo estreito possui um aspecto que o configura como catálogo/folder. Segundo o
ABC do Design – Sebrae-SP ¹0, o termo folder corresponde a um folheto composto de uma folha
só, e pode receber uma, duas ou mais dobras. Denominamos estas peças gráficas de catálogo/
folder a fim de facilitar seu entendimento, pois, independente da quantidade de páginas, o catálogo/
folder é um catálogo de exposição de arte, contendo a relação de obras apresentadas na exposição
e suas categorias, como escultura, pintura...
Figura 28 – Catálogo/Folder, 1º Salão de
Verão, 1945, criado para a Galeria de Arte Itá
Fonte: Biblioteca Jenny Klabin Segall, no
Museu Lasar Segall (São Paulo)
9 Os termos vistos na figura 27 tiveram como referência as denominações aplicadas por Araújo (2000).
10 http://antigo.sp.sebrae.com.br/principal/.../documentos...//abc_design.pdf. Acesso em: 12.07.12
38
Figura 29 – Catálogo/Folder – Convite; Exposição Aldo Bonadei, 1939
Fonte: Biblioteca Lourival Gomes Machado, no MAC (São Paulo)
No exemplo da figura 29, o catálogo apresenta formato folder e é, ao mesmo tempo, o
convite da exposição – em um único impresso notamos duas funções – apresentar as obras do
artista Aldo Bonadei e convidar o público para a exposição.
Apresentamos outra variação de catálogos de exposições de arte, a qual, além da relação de
obras apresentadas, contém um texto crítico sobre o artista ou sobre a mostra expositiva. Temos,
nestas peças gráficas, apresentações de exposições elaboradas por grandes críticos de arte e teóricos,
como: a Exposição do Art Club de Roma, com texto de Waldemar Cordeiro; a Exposição Cícero Dias,
apresentada por Gilberto Freire e Diego Rivera, com texto de Leon Degand.
Figura 30 – Catálogo/Folder Exposição do Art Club de Roma, 1950
Fonte: Centro de Estudos Luís Martins – Biblioteca do MAM (Museu de Arte Moderna de SP)
Em comparação com os dois exemplos já apresentados nas figuras 28 e 29, o impresso da
Exposição do Art Club Roma denota maior preocupação visual e o texto impresso em papel cartonado.
Há uma imagem composta por uma ilustração de traços finos que remetem a peças escultóricas e um
azul que quebra a rusticidade do papel e delimita o espaço da imagem. Porém, a cor azul atua como
mancha; ela não ocupa o espaço por inteiro, além de a tipografia em caixa alta tomar o espaço de um fio
e ser sobreposta na mancha azul. Outra imagem de traços com espessura maior é inserida à esquerda
do texto – o olhar súbito dá a sensação de ser uma capitular, mas a figura atua apenas como elemento
ilustrativo. Na publicação sobre a exposição do pintor Cícero Dias, a atenção gráfica permanece.
39
Figura 31 – Catálogo/Folder Exposição Cícero Dias, 1949
Fonte: Centro de Estudos Luís Martins – Biblioteca do MAM (Museu de Arte Moderna de SP)
Figura 32– Catálogo/Folder Exposição Diego Rivera – guaches e desenhos, 1950
Fonte: Centro de Estudos Luís Martins – Biblioteca do MAM (Museu de Arte Moderna de SP)
A publicação sobre a exposição individual do muralista Diego Rivera apresenta uma
aproximação do impresso visto na figura 32 quanto ao uso de uma única cor; à semelhança entre os
papeis utilizados e à divisão entre texto e imagem.
40
Nas imagens apresentadas acima, vimos uma multiplicidade de formatos e dobras, mesmo
sendo os catálogos de exposições de arte apontados como catálogos/folders. Estes impressos apresentam
natureza variada; desde múltiplas dobras a outras probabilidades de leitura, como textos apresentados na
folha por inteiro, textos compartimentados em blocos, textos que acompanham a forma do impresso
– vertical ou horizontal – propondo outras possibilidades de diagramação e leitura.
Tratando ainda sobre o tema catálogo versus forma, temos o catálogo da RASM – Revista Anual
do III Salão de Maio, observado não apenas em seu formato quadrado, mas também sob o aspecto
de objeto industrial. A capa desse catálogo foi produzida em metal, e, em razão do custo, foi feita em
quantidade reduzida e destinada a um público seleto. Um detalhe curioso é a forma de encadernação
feita com rebites. Para análise comparativa, apresentamos a figura 34 – o catálogo criado por Depero
“futurista, compilação de experiências tipográficas, anúncios, projetos de tapeçarias e outros trabalhos”.
(MEGGS, 2006). A capa apresenta planos chapados de cor vibrante, composição diagonal e formas
angulares, encadernada com enormes parafusos cromados; com isso, este livro de Depero também
expressa sua condição de objeto físico. Assim como o catálogo do III Salão de Maio.
Figura 33 – RASM – Revista Anual do III Salão de Maio, realizado na Galeria Itá, 1939
Fonte: Coleção de Artes Visuais, IEB
Figura 34 – Capa para Depero futurista,
1927
Fonte: História do design Gráfico,
Meggs, 2006, p.325
A Metal Leve foi pioneira em incentivos, na prática de preservação e divulgação do
conhecimento do livro como resgate da memória literária, e também em projeto gráfico. Segundo
41
Kikuchi (2004), em 1975, José Mindlin – presidente na época – sugeriu que a empresa reeditasse
documentos importantes da literatura. Com isso, passaram a patrocinar edições de fac-símiles
com inúmeros temas, como A Revista, de Carlos Drummond de Andrade; A Menina do Narizinho
Arrebitado, de Monteiro Lobato; a RASM – Revista Anual do Salão de Maio, de Flavio de Carvalho,
entre outras publicações. No caso do catálogo do III Salão de Maio, publicado em 1939, Kikuchi
(2004) aponta esta peça gráfica como relevante para o estudo do modernismo brasileiro, por trazer
depoimentos de Lasar Segall, Anita Malfatti, Carminha de Almeida, Guilherme de Almeida, Oswald
de Andrade Filho, Luis Martins, Rino Levi entre outros, fato que havia gerado o interesse da Metal
Leve em publicar esta edição específica em fac-símile. Contudo, observamos que, nessa versão, não
foi reproduzida a capa de metal rebitada do catálogo original; no fac-símile, a diagramação da capa
permaneceu, embora o material tenha sido alterado, passando a contar com uma capa cartonada
que remete à cor do metal, mas distancia do formato arrojado da versão original.
Figura 35¹¹ – fac-símile. RASM – Revista Anual do III Salão de Maio, realizado na Galeria Itá, 1939.
Fonte: Centro de Estudos Luís Martins – Biblioteca do MAM (Museu de Arte Moderna de SP)
No decorrer do levantamento dessas peças gráficas – avaliamos que alguns catálogos
de arte possuem um melhor acabamento, desde papel, impressão, composição e inovação
visual. Segundo Santos (2010, apud NUNES, 1992), a variação e investimento de custo
provavelmente se devem aos aspectos da visibilidade da mostra expositiva e do próprio
artista. Outro aspecto é o sistema de distribuição a um público direcionado – o Catálogo
de Exposições de Arte é um objeto gráfico específico enviado e distribuído gratuitamente
ao público ligado à Arte e Cultura, instituições artísticas e culturais, Galerias de Arte; é um
impresso que informa a abertura e/ou permanência da mostra expositiva.
Para realização de uma mostra expositiva, há uma série de custos inseridos: desde
montagem e manutenção de obras a produção de catálogos de arte. Na maioria das vezes, o
catálogo de arte conta com um sistema de distribuição gratuita. Para tanto, o investimento
pode também vir de patrocínio ou do próprio governo. Em alguns dos catálogos de arte, os
agradecimentos fazem referência a quem viabilizou a concretização da mostra expositiva.
Listamos três exemplos de agradecimentos: a políticos, a empresários e/ou senhoras da alta
sociedade e, por último, a anunciantes patrocinadores.
11 Da edição fac-símile de RASM, patrocinada pela Metal Leve, foram produzidos 1500 exemplares em papel offset
90g. A capa original, feita em chapa metálica, não pôde ser reproduzida fielmente, pois isso dificultaria a publicação.
Acabou sendo impressa em outubro de 1984, nas oficinas da Prol Editora Gráfica, com fotolitos da Fototraço e
supervisão gráfica de Diana Mindlin.
42
Em especial nos catálogos do Salão Paulista de Belas Artes, as imagens dos políticos
são dispostas nas páginas iniciais, como expressão de agradecimento. Percebemos, com isso,
que a política engendrava possibilidades de realização dessas mostras, embora em quantidade
reduzida, se comparada à iniciativa privada e à elite paulistana, como menciona Cintrão (2011).
Considerando a forma como são apresentadas as imagens destes políticos, os
agradecimentos demonstram reafirmar a parceria e, consequentemente, o apoio e incentivo à
realização de tais projetos culturais.
Figura 36 – Homenagem ao Governo.
Catálogo XIII Salão Paulista de Belas Artes, Galeria Prestes Maia, 1947
Fonte: Biblioteca Walter Wey, Pinacoteca do Estado de São Paulo
1. Excelentíssimo Senhor General Eurico Gaspar Dutra, Digníssimo Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil;
2. Excelentíssimo Sr. Dr. Adhemar de Barros, Digníssimo Governador do Estado de São Paulo;
3. Excelentíssimo Senhor Prof. Dr. Francisco Brasiliense Fusco, Digníssimo Secretário de Estado dos Negócios da Educação;
4. Excelentíssimo Sr. Dr. Paulo Lauro, Digníssimo Prefeito Municipal de São Paulo.
Quando se trata de parceria, observamos também o envolvimento de membros da
indústria e senhoras da alta sociedade do Estado de São Paulo, apoiando e patrocinando as artes.
43
Figura 37 – Patrocínio do Trabalho, Indústria e Comércio.
1º Salão de Arte – Feira Nacional de Indústrias, realizado no
Parque da Água Branca, SP, 1941
Fonte: Centro de Estudos Luís Martins – Biblioteca do MAM
(Museu de Arte Moderna de SP)
Figura 38 – Agradecimentos.
1º Salão de Arte – Feira Nacional de Indústrias, realizado no Parque da Água Branca, SP, 1941
Fonte: Centro de Estudos Luís Martins – Biblioteca do MAM (Museu de Arte Moderna de SP)
1. Dr. Roberto Simonsen – Presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo
2. Sra. Baby de Almeida
3. Ernestina Pinto Alves de Almeida
4. Sra. Marietta Alves de Lima Meirelles (desenho de Florita)
44
Um último item que gerava aproximação com os incentivos a projetos culturais eram
as propagandas impressas nas páginas iniciais de alguns catálogos de arte. Isso equivalia às
formas de patrocínio que se encontram nos catálogos de arte atuais.
Figura 39 – Patrocínios. Catálogo da 28ª Bienal Internacional de Arte de São Paulo, 2008
A apresentação dos patrocinadores adotada hoje em dia organiza sua diagramação de forma
condensada. No exemplo acima, em apenas três páginas estão contidos todos os apoios para a
realização da Exposição.
Notamos que até a década de 1940, em alguns casos, as páginas internas dos catálogos de arte
traziam anúncios¹² variados, desde propagandas de cigarros a metalúrgicas. Por vezes, elas apareciam
até mesmo na quarta capa, como no catálogo “Exposição do Livro Italiano”, reproduzido a seguir.
Em alguns dos catálogos de arte pesquisados, os anúncios ocupavam páginas inteiras,
totalizando em média seis páginas, frente e verso. Quanto à diagramação, a distribuição de anúncios
e até o próprio formato, o catálogo de exposição de arte podia se aproximar de características de
revistas¹³, em seu aspecto gráfico. Apresentamos a seguir o periódico francês Art et Décoration da
década de 1930. Se comparado ao catálogo “Exposição do Livro Italiano”, fica clara a aproximação
dos elementos pautados no parágrafo acima, dada a significativa semelhança entre a publicação e o
periódico francês.
Figura 40 – Periódico Art et
Décoration, 1934
Fonte: Biblioteca Lourival Gomes
Machado, no MAC (São Paulo)
12 Referente ao surgimento dos anúncios nas revistas – O conceito de revista como mídia de massa surge no início do
século XX, antes da Primeira Guerra. A demanda e circulação crescentes provocam queda no custo da manufatura –
quanto maior a tiragem, menor o custo por exemplar. Muitos leitores passam a optar pela revista em detrimentos dos
livros, caros e, muitas vezes, elitistas. A alta circulação atraía anunciantes, que, em grande quantidade, propiciavam o lucro
necessário para sustentar preços abaixo do custo de produção. Fonte: História revista: Associação Nacional de Editores
de Revistas 25 anos (1986 – 2011). À Associação: São Paulo, 2011, pp. 15-16.
13 Segundo o glossário de termos e verbetes da ADG, a publicação revista, trata-se de uma mídia impressa periódica que
aborda vários assuntos ou se dedica a uma área específica de estudo. Produzida habitualmente em brochura, pode ter
formato e acabamento bastante variáveis, sendo impressa em preto e branco ou em cores, sem número de páginas
limitado. Fonte: ABC da ADG: glossário de termos e verbetes utilizados em design gráfico.
45
Anúncio na quarta capa
Figura 41 – Patrocínios/ Anúncios. Exposição do Livro Italiano, 1950
Fonte: Centro de Estudos Luís Martins – Biblioteca do MAM (Museu de Arte Moderna de SP)
Figura 42 – Patrocínios/ Anúncios. Exposição do Livro Italiano,
1950.
Fonte: Centro de Estudos Luís Martins – Biblioteca do MAM
(Museu de Arte Moderna de SP)
Além de apoiar a realização da Exposição, os anúncios apresentados nestes catálogos
eram uma forma de comunicação acessível para a captação de outros potenciais apoiadores e
patrocinadores das artes, e de acesso a um público considerado mais sofisticado e específico.
Ao abordar o catálogo de arte e suas variações de formato, expusemos uma tentativa
de caracterizar diferentes formatos e avaliamos que os catálogos não buscam apenas uma
determinada forma; a peça gráfica pode apresentar desde uma encadernação quadrada, com
grampo, com rebites – uma variação de páginas conforme o conteúdo da peça – texto e
imagem, somente texto, apenas listagem das obras; além de, em outros impressos, abrigar
apenas dobras.
Apontamos no capítulo 1 o catálogo como um impresso e um produto da indústria
gráfica, que agrega elementos de uma composição visual a fim de enriquecê-lo e conceder-lhe
características distintas de outras peças editoriais, tais como livros, revistas. Em alguns aspectos, os
catálogos aproximam-se destes meios citados, embora seu sistema de distribuição, sua construção,
estrutura textual e visual façam do catálogo de exposição de arte uma peça singular.
46
2. OS CATÁLOGOS DE EXPOSIÇÕES DE ARTE: MAPEAMENTO
O capítulo dois aborda a organização da pesquisa de campo e o mapeamento das peças
gráficas a serem analisadas. Foi feito um levantamento minucioso deste material; sendo assim,
consideramos significativo apresentar as etapas percorridas.
Dada a escolha do objeto de pesquisa – o catálogo de arte –, seguimos a outra delimitação:
o recorte cronológico. Este se inicia com a mais antiga publicação gráfica de exposição de arte
encontrada durante a fase de levantamento – o Catálogo dos Quadros¹ , publicado em dezembro
de 1912. O período pesquisado se encerra com os catálogos da década de 1950, cuja escolha se
justifica por englobar um momento pouco contemplado em estudos da história do design gráfico
brasileiro, conforme já referido no capítulo anterior. A delimitação cronológica deve-se também
ao nosso interesse em levantar peças gráficas pouco consultadas.
1912
1950
1920
1925
1930
1935
1940
1945
Figura 43 – Recorte
cronológico e geográfico
São Paulo
A definição do catálogo de arte como objeto de estudo diz respeito à aproximação
da pesquisadora com o tema “exposição de arte” e à localização das peças na cidade de São
Paulo. Nessa decisão, também pesaram a facilidade de acesso e a relevância do material de
pesquisa, uma vez que um número significativo dessas exposições aconteceu nesta capital, a
qual também sedia as instituições de arte mais relevantes do Estado de São Paulo.
Antes de prosseguir com os apontamentos referentes ao material levantado, é
importante fazer algumas observações acerca da cidade de São Paulo e sua produção artística
anterior aos anos de 1950.
1 Catálogo dos Quadros, dezembro de 1912. Fonte: Pinacoteca do Estado de São Paulo.
47
2.1 São Paulo e as Exposições de Arte: delimitações de tempo
e espaço. Contexto Cultural
O recorte temporal apresentado na pesquisa concentra quatro décadas – de 1912 a 1950.
Sabemos que o catálogo de arte é produto de uma mostra expositiva e que registra dados dos
acontecimentos artísticos. Investigar, ainda que de modo panorâmico, o contexto cultural das artes
plásticas em São Paulo da época é relevante tanto para a escolha dos materiais de estudo como para a
obtenção de informações complementares que nos auxiliarão a compreendê-lo melhor.
Inicialmente, feita a delimitação espaço-temporal, questionou-se a perspectiva de uma
quantidade restrita de catálogos produzidos, visto que, na época, a cidade de São Paulo abrigava
poucas instituições de arte. De acordo com Martins e Silva (2009), há pouco mais de sessenta anos,
ela contava com apenas dois museus – o Museu Paulista, conhecido como Museu do Ipiranga e a
Pinacoteca do Estado. Nenhuma galeria de arte.
O recorte é finalizado nos anos de 1950, quando surgiam dois novos ambientes de
exposição, o MASP – Museu de Arte de São Paulo, em 1947 e o MAM – Museu de Arte Moderna
de São Paulo, em 1948.
Ao levantar os catálogos de arte na Biblioteca da Pinacoteca, deparamo-nos com a informação
de que estas exposições não se restringiam a espaços de arte institucionalizados da época e permeavam
locais não oficiais. Sendo assim, o problema da escassez de material tornou-se mais e mais distante, a
cada catálogo descoberto, a cada exposição mencionada em bibliografia.
Para entender o contexto cultural das artes plásticas no período e ter melhor compreensão
dos locais que hospedavam exposições de arte, demos início a um levantamento de dados coletados
nos próprios catálogos de arte e em publicações como a revista A Cigarra e o jornal O Estado de
São Paulo, os quais contextualizavam a cena cultural da cidade de São Paulo e complementaram a
bibliografia inicial.
Nos primórdios do século XX, São Paulo não era o que se pode chamar de uma metrópole
cultural. Contudo, já buscava, e com certo êxito, um lugar de destaque no país. Esse rápido
crescimento deve-se ao fato de ter sido a cidade o centro da economia cafeeira, a qual fez gerar
um acúmulo de capital que foi investido na indústria. Esse movimento originou uma mudança
econômica e sociodemográfica, como apontado por Cintrão (2011).
Pela óptica do historiador Sevcenko (1992), nas décadas de 1910 e 1920, surgiam os primeiros
sinais de modernidade: a metrópole demonstrava ampla circulação de pessoas e dinheiro; as fábricas
e os serviços aumentavam conforme a demanda; o lazer acompanhava o intenso desenvolvimento da
indústria e do comércio, e o consumo expandia-se proporcionalmente.
Entre 1911 e 1913, começava a verticalização da cidade e, no contexto da cultura e do lazer,
São Paulo já oferecia cinemas, cassinos e apresentações de cancan importadas de Paris. As atividades
da cidade concentravam-se no famoso “Triângulo2” formado pelas elegantes ruas XV de Novembro,
Direita e São Bento, seguindo uma predileção parisiense. Conforme menciona Cintrão (2011), o local
abrigava entretenimento: confeitarias, restaurantes, livrarias, além das redações dos principais jornais – O
Estado de S. Paulo, Diário Popular e Correio Paulistano – e da revista A Cigarra. Alguns destes locais também
abrigavam exposições de arte durante os primeiros trinta anos do século XX.
2 Nascimento (2003) denomina “Triângulo” a área da antiga cidade de São Paulo em cujos vértices situam-se os Conventos de
São Francisco, São Bento e Carmo, compreendendo as atuais ruas Direita, Quinze de Novembro e São Bento.
48
Figura 44 – Endereço da Redação e
Escritório da Revista “A Cigarra”
Fonte: A Cigarra, agosto, 1914.
Notamos na imagem apresentada na figura 45, e mesmo nos comentários da autora
Rejane Cintrão (2011), que era a elite paulistana quem frequentava o “Triângulo”, munida de
referências europeias, em especial da cidade de Paris.
Figura 45 – Senhoras na Rua XV de Novembro
Fonte: A Cigarra, maio, 1914
Até 1905 – destaca Cintrão (2011) –, São Paulo abrigava apenas o Museu Paulista, conhecido
também como Museu do Ipiranga, cuja coleção reúne de animais empalhados a mobiliário, não
priorizando as artes plásticas. Com o centenário da Independência, em 1922, o museu tinha como
propósito trazer ao público um discurso mais paulista sobre aquele período da história. No ano de
1905, também fora inaugurada a Pinacoteca do Estado, inicialmente ocupando duas salas no andar
superior do Liceu de Artes e Ofícios e, mais tarde, vendo esse espaço duplicado para quatro salas.
A coleção da Pinacoteca seguia padrões acadêmicos – Cintrão (2011) pontua – e buscava copiar o
que ocorria nos Salões de Paris.
Segundo Cintrão (2011), a I Exposição Brasileira de Belas-Artes foi realizada na
Pinacoteca do Estado de São Paulo no período de 24 de dezembro de 1911 a 31 de janeiro de
1912, sendo as quatro salas dedicadas respectivamente a arquitetura, escultura, pintura e artes
aplicadas. Participaram 67 pintores, oito escultores, oito arquitetos e oito representantes das artes
decorativas, totalizando 363 obras.
Não foi encontrado o catálogo dessa / Exposição Brasileira de Belas-Artes, nem na Biblioteca Walter
Wey – Pinacoteca do Estado de São Paulo, nem no CEDOC – Centro de Documentação e Memória
da Pinacoteca do Estado de São Paulo. Porém, obtivemos imagens da inauguração da mostra no jornal
O Estado de São Paulo. Já as imagens da mostra ocorrida no ano seguinte – 1912 – estão em catálogo.
Dos catálogos de arte preservados pela Pinacoteca do Estado de São Paulo como documentação das
mostras ali ocorridas, o da figura 48 é o mais antigo.
49
Figura 46 – Pessoas presentes à abertura
da I Exposição Brasileira de Bellas-Artes
– Jornal O Estado de S. Paulo, 27 de
dezembro de 1911.
Fonte: CEDOC – Centro de Documentação
e Memória da Pinacoteca do Estado de
São Paulo
Figura 47 – Grupos de expositores fotografados no dia da inauguração, numa das galerias do Liceu de Artes
e Ofícios - Jornal O Estado de S. Paulo, 27 de dezembro de 1911.
Fonte: CEDOC – Centro de Documentação e Memória da Pinacoteca do Estado de São Paulo
Figura 48 – Catálogo de
Quadros, 1912
Fonte: CEDOC – Centro de
Documentação e Memória
da Pinacoteca do Estado de
São Paulo
50
Figura 49 – Parte interna do Catálogo de
Quadros, 1912
Fonte: CEDOC – Centro de Documentação e
Memória da Pinacoteca do Estado de São Paulo
Sobre a Pinacoteca do Estado de São Paulo, Cintrão (2011) menciona que a montagem das
obras expostas seguia uma divisão em seções, agrupadas por gênero artístico. Inserimos a seguir figuras
do catálogo da Galeria de Bellas Artes, de 1917, que apoiam tais observações da autora. As divisões no
impresso apresentam uma diagramação por seções, como quadros a óleo, gessos e terracota, fotografias
e gravuras, além da seção de arquitetura e artes decorativas.
Figura 50 – Catálogo Geral – Galeria de Bellas Artes, 1917
Fonte: Biblioteca Walter Wey, Pinacoteca do Estado de São Paulo
Na figura 51, com a quarta capa também do catálogo da Galeria de Bellas Artes, de 1917, notamos
uma pequena anotação com nome e endereço do Liceu de Artes e Ofícios. Segundo Cintrão (2011),
as histórias do Liceu de Artes e Ofícios e da Pinacoteca do Estado de São Paulo se confundem, em
especial quando o Liceu cede duas salas para a Pinacoteca, e mesmo em 1911, quando a Pinacoteca se
torna um museu estadual, ainda compartilhando espaço físico com o Liceu.
Figura 51 – Quarta Capa do Catálogo Geral – Galeria de
Bellas Artes, 1917
Fonte: Biblioteca Walter Wey, Pinacoteca do Estado de
São Paulo
51
Ainda no contexto da Pinacoteca do Estado de São Paulo e suas primeiras mostras de arte,
segundo Tarassantchi (1996)3, algumas exposições poderiam ter recebido público ainda maior, uma vez
que algumas delas tinham ingresso pago – a exemplo da 2ª Exposição de Bellas Artes, em 1912.
Figura 52 – Parte interna do Catálogo de Quadros, 1912
Fonte: CEDOC – Centro de Documentação e Memória da
Pinacoteca do Estado de São Paulo
Mesmo com o início da Exposição Brasileira de Belas-Artes, se comparada ao Rio de Janeiro, São
Paulo ainda estava no processo de desenvolvimento cultural no que se refere às instituições públicas.
Nesse período, o Rio já abrigava a Escola Nacional de Belas Artes, os Salões de Arte e o Museu
Nacional de Belas-Artes. Ainda assim, o crescimento de São Paulo era notável. Embora contasse
com apenas dois museus, conforme mencionado anteriormente, a cena cultural da cidade crescia em
espaços não institucionalizados, como aponta Cintrão (2011). Exposições já ocorriam em espaços ditos
alternativos – em 1913, São Paulo já abrigava 46 cinemas – alguns dos quais promoviam exposições em
seus saguões, com mostras de artistas como Emma Voss (1910), Alfredo Norfini (1911), Clodomiro
Amazonas (1912) e Túlio Mugnaini (1913).
Como menciona o historiador e crítico de arte Walter Zanini (1983), fora das salas no Liceu de
Artes e Ofícios e na Pinacoteca, havia exposições de arte improvisadas, adaptando-se aos espaços no
velho centro. Os artistas e grupos esforçavam-se em busca de lugares onde expor; sendo assim, muitas
das mostras ocorreram em espaços comerciais do “Triângulo histórico”.
O Banco Construtor também foi local de exposição e nele foram exibidos
quadros de Benjamin Parlagreco, Aurélio de Figueredo, Oscar Pereira
da Silva e Benedito Calixto. A Casa de Moldura Seabra e a Casa Mundo
Elegante também ofereciam sua vitrines. As paredes das salas de chá eram
aproveitadas, entre elas as da Confeitaria Castellões, altos do Café Faria, salão
da Rotisserie Sportsman, Confeitaria Fazoli, Salão de Chá da Casa Alemã.
Muitas vezes os locais não possuíam iluminação adequada e os quadros
ficavam atulhados, misturados aos móveis e outros objetos. Outro espaço
aproveitado eram os escritórios de redação das revistas, como: A Cigarra
3 apud Cintrão (2011)
52
(depois de 1914), A Vida Moderna (depois de 1908), a vitrine de O Estado
de S. Paulo, salões de clubes, como o Commercial e o Clube Internacional.
E, mais tarde, a Casa Mappin [...]. Os estrangeiros em geral expunham no
hall de hotéis, como o Grande Hotel [...]. Quando apareceram os cinemas, os
pintores colocavam seus quadros nas entradas dos cines Central, Alhambra e
Odeon. (TARASSANTCHI, 1986, apud CINTRÃO, 2011, p.27)
De acordo com Nascimento (2003), galerias do velho centro da cidade abrigavam exposições;
porém, tais atividades eram inconstantes, sendo que algumas vezes os artistas deviam alugar paredes
sem garantia do tempo que as obras ficariam expostas. Por conta dessa instabilidade oferecida por
galerias e por haver poucos espaços oficiais de exibição de obras de arte, a possibilidade vislumbrada
pelos artistas, como acrescenta Nascimento, era montar suas exposições em “vitrines de lojas, livrarias,
casas de chá, escritórios das redações de jornais e revistas e em saguões de cinemas”.
De acordo com Cintrão (2011), durante muito tempo, além dos espaços para venda de
produtos, o Mappin Stores também dispôs de uma sala de leitura ao lado do salão de chá, na qual
ocorreu a primeira mostra individual de Anita Malfatti, em 1914. Dessa forma, a autora aponta que
o Mappin Stores, a exemplo das lojas de departamento francesas e americanas, também buscava
ampliar seu público oferecendo atividades culturais.
Segundo Cintrão (2003) o potencial da cidade também crescia com hotéis de luxo, entre os quais
o Hotel de França e o Grande Hotel, sendo que este último organizou várias exposições em seu saguão.
Mesmo na década de 1930, algumas exposições ainda ocorriam em saguões de hotel, como
o 1º Salão de Maio4, no Esplanada Hotel, em 1937.
Figura 53 – Catálogo 1º Salão de Maio, 1937
Fonte: Biblioteca Jenny Klabin Segall, no Museu Lasar Segall (São Paulo)
4 Os “Salões de Maio” aconteceram em 1937, 1938 e 1939. Um dos poucos eventos modernistas a divulgar a arte abstrata
estrangeira no Brasil, ocorreu no final da década de 1930, quando o movimento moderno passava por reformulação em seus
princípios. Era um momento conturbado entre dois acontecimentos relevantes: o golpe de Estado de Getúlio Vargas (1937)
e o início da Segunda Guerra Mundial (1939). O investimento para realização do salão foi engrossado por personalidades
da elite paulistana e também pela Prefeitura de São Paulo, provavelmente com o conselho de Mário de Andrade, então
(1937) à frente do Departamento de Cultura do Município. (MONTEIRO, 2008). Fonte: http://www.scielo.br/scielo.
php?pid=S1678-53202008000200008&script=sci_arttext - Acesso 31.07.2012
53
Em paralelo a mostras nos espaços ditos alternativos, o gosto pela novidade e o novo circuito
de consumo da elite paulistana no “triângulo histórico” também fizeram surgir coleções particulares,
como menciona Maria França Lourenço:
[...] morando na cidade e não mais nas fazendas, os paulistas passaram a
desenvolver vida social, demandando um requintar nos costumes, de forma a
alentar uma imagem atualizada. Ao lado das porcelanas de Sèvres, dos tapetes
orientais e dos móveis do Liceu, começaram a adquirir e colecionar obras de
arte. (LOURENÇO apud CINTRÃO, 2011)
Os espaços dedicados a objetos de decoração disputavam espaços com as obras de
arte. Dessa forma, os proprietários das lojas de acessórios decorativos, os organizadores de
exposições “alternativas” e muitas vezes até o próprio artista fazia o papel de marchand, como
comenta Regiane Cintrão (2011).
Sobre a elite paulistana e a vida cultural, outro fator mencionado por Homem (CINTRÃO,
2011) eram as atividades artísticas e intelectuais dos palacetes da cidade: as residências começaram
a abrigar atividades culturais a partir da mudança de hábitos sociais. É o que aconteceu na Vila
Fortunata – de propriedade de René Thiollier5 (na Avenida Paulista), no chalé de Paulo Prado
(na Avenida Higienópolis) e na Villa Kyrial – do Senador Freitas Valle6 (na Vila Mariana). Tais
palacetes não só abriram as portas a artistas e intelectuais, como deram início ao mecenato privado,
sendo Freitas Valle um expoente entre os mecenas da época.
De acordo com Cintrão
(2011), Freitas Valle patrocinava
vários artistas por meio do
Pensionato para estudos na
Europa. Entre os contemplados,
estiveram: José Wasth Rodrigues
(1910), Victor Brecheret (1921)
e Anita Malfatti (1923). Também
apadrinhava mostras em espaços
alugados pelos artistas, a exemplo
da primeira exposição de Lasar
Segall, em 1913.
Figura 54 – Na Villa Kyrial, Victor Brecheret (terceiro a partir da
esquerda, na primeira fila) e Menotti Del Picchia (sentado à direita).
Foto: reprodução do livro Semana de 22
Fonte: http://www.cartacapital.com.br/cultura/uns-poucos-modernos_
Acesso: 17.11.2012
5 René Thiollier (1882-1968) foi um dos mecenas da Semana de Arte Moderna de 1922. Advogado e escritor paulistano,
morou por 55 anos em um casarão na Avenida Paulista. Em 1972, o imóvel foi demolido, mas o terreno ainda preserva seus
5.400 metros quadrados. Fonte: http://vejasp.abril.com.br/materia/quem-foi-rene-thiollier _Acesso 17/11/2012
6 José Freitas Valle (1870-1958) foi eleito senador estadual pelo PRP em São Paulo, em 1903. Exerceu a função até 1924,
sempre procurando privilegiar questões ligadas à educação e cultura. Foi um dos responsáveis pela fundação da Pinacoteca
do Estado, e foi também responsável pela regulamentação do Pensionato Artístico, em 1912. (CINTRÃO, 2011, p.38)
54
Segundo Amaral (1997) com a Semana de Arte Moderna, na década de 1920, a Villa Kyrial
cedeu seu posto de destaque ao palacete de Paulo Prado. No mesmo período, outro local de encontro
foi a residência modernista de D. Olívia Guedes Penteado.
Foi no seu regresso da França, em 1923, que D. Olívia começou a se interessar pelas vanguardas
artísticas e se dispôs a incentivar o modernismo no Brasil. O Pavilhão Modernista, como Aracy Amaral
denomina a residência de D. Olívia Penteado, teve seu projeto decorativo realizado por Lasar Segall. O
pintor também descreve os frequentadores modernistas:
Oswald de Andrade, Guilherme de Almeida, Mário de Andrade, Godofredo
Telles, Tarsila do Amaral, Marcel Telles, todos os cultores da arte moderna ali
estão mobilizados. As poucas senhoras que completam o grupo de artistas
– somados, damos 18 a 20 pessoas – praticam ou admiram a arte moderna,
constituindo para os poetas da modernidade paulista um ambiente esquisito
de espírito e de interesse. (SEGALL, 1982 apud CINTRÃO, 2011, p.47)
Apesar dos diversos estabelecimentos comerciais que hospedavam exposições e das
residências da elite paulistana que incentivavam a arte, Aracy Amaral comenta que, no que
tange o ensino das artes, São Paulo ainda não contava com uma Escola de Belas-Artes como
no Rio de Janeiro. Nesse âmbito, a oferta se restringia à Escola Profissional Masculina7 e ao
Liceu de Artes e Ofícios8.
Segundo Cintrão (2011), a Escola Profissional Masculina teve papel significativo no
contexto artístico da cidade. Ficava localizada no Brás, bairro cuja população era formada por
imigrantes portugueses, italianos e espanhóis, no meio de fábricas e vilas operárias. A região
apresentava um contexto diferente do centro da cidade, distante do “Triângulo histórico”,
seu cenário cultural atuante e sua população elitizada. Ainda assim, foi nessa área isolada
que surgiram destaques nas artes visuais, como Alfredo Volpi, Mario Zanini, Aldo Bonadei,
Francisco Rebolo e Hugo Adami. Esses artistas estabeleceram o Grupo Santa Helena de
1937 a 1939. A respeito da formação do grupo, o escritor Almeida (1976) comenta que
Rebolo Gonzales improvisou, em seu escritório no edifício Santa Helena, região central
de São Paulo, um ateliê onde se reunia um grupo de artistas de forma espontânea e sem
programas preestabelecidos.
Em paralelo à Escola Profissional Masculina e ao Liceu de Artes e Ofícios, notamos
a presença de anúncios de aulas particulares de artes nas revistas e catálogos de exposições
de arte da época. A figura 55, por exemplo, mostra anúncio de curso de desenho e pintura.
Reverenciando o status francês presente na cidade, destaca a formação artística da professora,
diplomada pela Escola de Belas Artes de Paris. E a figura 56 apresenta o catálogo de arte, com
um anúncio de aulas particulares com Theodoro Braga; novamente a formação do professor
está presente, realçando sua participação no Conselho Superior de Bellas Artes.
7 As Escolas Profissionais Masculinas e Femininas do Brás, em São Paulo, foram criadas pelo Decreto nº 2118-B, de 28 de
novembro de 1911, destinadas ao público infanto-juvenil e adulto. Eram escolas especializadas no ensino de artes e ofícios,
visando à formação e qualificação das camadas populares para o mercado de trabalho na indústria, no comércio. Para os
rapazes, artes industriais: marcenaria, serralheria, pintura, mecânica entre outras. Fonte: http://www.itaucultural.org.br/
aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=instituicoes_texto&cd_verbete=5397. Acesso: 16/11/2012
8 O Liceu de Artes e Ofícios iniciou suas atividades em 1874, objetivando ao ensino teórico e prático das artes e ofícios e à
formação de profissionais em várias áreas, como mobiliário, ferro ornamental, estética e manufatura decorativa e indústria
mecânica, além de formar artistas pintores, escultores, desenhistas e gravadores.. O período áureo do Liceu ocorreu entre
1900 e 1930 sob a direção de Ramos de Azevedo. (CINTRÃO, 2011, p.77)
55
Figura 55 – Anúncio de aulas de
desenho e pintura
Fonte: A Cigarra, setembro, 1919
Figura 56 – Anúncio de aulas de desenho, pintura e arte decorativa no Catálogo da 1ª Exposição
de Bellas Artes, Palácio das Indústrias, Maio de 1928
Fonte: Biblioteca Walter Wey, Pinacoteca do Estado de São Paulo
Ainda no âmbito do ensino das artes: em 1892, houve a tentativa de criação do Instituto
Paulista de Belas-Artes. Porém isso se efetivou apenas em 1926 com a Academia de BelasArtes, atual Escola de Belas Artes, como citado por Cintrão (2011). A autora complementa este
apontamento com a hipótese – no final do século XIX e início do século XX, embora com poucos
espaços institucionais de arte em São Paulo, a cidade continuava a se desenvolver culturalmente em
pequenos eventos e iniciativas culturais privadas. Alguns destes eventos contribuíram, mesmo que
de forma indireta, para a realização da Semana de Arte Moderna.
Organizada por um grupo de empresários e artistas liderados por Mário de Andrade, a
Semana de Arte Moderna, em 1922, assinalou uma nova data para a cultura. A mostra expositiva ocorreu
no saguão do Teatro Municipal, reunindo artistas de vanguarda, segundo notas de Cintrão (2011).
Dentre as propostas de modernidade na arte, criou-se o SPAM – Sociedade Pró Arte
Moderna9 em 1932, com a finalidade de aproximar os intelectuais e artistas paulistas, promovendo
movimentos culturais num envolvimento direto e pessoal. Segundo Paulo Mendes de Almeida
(1976), o SPAM contou com o trabalho incessante do artista Lasar Segall, responsável pela
9 A reunião do SPAM aconteceu na casa do arquiteto Gregori Warchavchik, com 39 assinaturas. Após a votação dos estatutos,
a diretoria eleita foi composta por Olívia Guedes Penteado (colecionadora), Mina Klabin Warchavchik (colecionadora),
Tarsila do Amaral (artista), Chinita Ullman (bailarina), Lasar Segall (artista), Paulo Rossi Osir (arquiteto), Carlos Pinto Alves
(professor), Jayme da Silva Teles (então esposo de Yolanda Penteado) e Paulo Mendes de Almeida (escritor). (ALMEIDA,
1976, pp. 45-60)
56
organização de dois Bailes de Carnaval nos
anos de 1933 e 34, os quais reuniram as pessoas
para divertimento e também mantiveram a
sociedade financeiramente. Destituído de
seus principais membros, principalmente pelo
falecimento de Olívia Guedes Penteado no
final de 1933, o SPAM deixou de existir no
segundo baile (ALMEIDA, 1976, pp. 59-60).
No convite criado pelo próprio Lasar
Segall, a ilustração traz um grupo de senhores
elegantes, demonstrando ligação entre os
membros do SPAM; ao mesmo tempo, veemse indícios de irreverência pela presença de um
personagem sem sapato, além de uma onça. A
referência ao SPAM também está em um dos
sujeitos que segura um folder da Sociedade
Pró Arte Moderna embaixo do braço – o
desenho de Segall dialoga diretamente com o
poema que fez parte desse convite, escrito por
Mario de Andrade:
Figura 57 – Convite, Carnaval - SPAM, 1933
Fonte: Biblioteca Jenny Klabin Segall, no Museu Lasar
Segall (São Paulo)
E se abre a farra fanfarra!
Doutores, mendigos, exóticas
Pernas, carruagens estrambóticas
[...]
É a fauna urbana e suburbana
[...]
Vinde ver isso ao Trocadero
Na carnavalada de Spam!
Segundo Almeida (1976), a 1ª Exposição de Arte Moderna do SPAM aconteceu no dia 23
de abril de 1933, na Galeria Guatapará, à Rua Barão de Itapetininga, com obras de artistas nacionais
e estrangeiros.
Na década de 1930, outra importante iniciativa no setor das artes plásticas em São Paulo
foram os Salões de Maio, ocorridos em 1937, 1938 e 1939. Em especial o III Salão de Maio, de
1939, foi regido pelo multifacetado Flávio de Carvalho. Amaral (2006) pontua que este destaque
deve-se ao fato de o Salão possuir a maior vocação internacionalista das Bienais. A autora refere o
III Salão de Maio como precursor direto das Bienais, já com a participação de artistas destacados no
meio artístico internacional e com a polêmica das novas tendências contemporâneas da arte. Outra
observação de Amaral (2006) a respeito do III Salão e sua internacionalização é vista no próprio
catálogo – bilíngue –, o que demonstrava interesse em exportar ideias; para a autora, o próprio
catálogo do Salão oferece o panorama amplo do ambiente cultural da cidade; o salão confirma um
clima de amadurecimento artístico na cidade.
Para Amaral (2006), a década de 1930 é o período de sedimentação das conquistas
modernistas. Há também três galerias que divulgam e expõem a arte moderna – segundo
57
Nascimento (2003 apud MACHADO, 2009), a Galeria Casa e Jardim, primeira a expor artistas
modernos com alguma regularidade em São Paulo, por iniciativa de Theodor Heuberger10; a Prestes
Maia, localizada na passagem subterrânea entre a Praça do Patriarca e o viaduto, que recebia em seu
salão ‘Almeida Junior’ exposições de obras que necessitavam de grandes espaços; e a Galeria Itá, do
marchand francês Bénéteau, que recebeu artistas estrangeiros, bem como exposições individuais e
coletivas do Grupo Santa Helena e da Família Artística Paulista11.
Segundo Almeida (1976), pode-se dizer que sucessivas manifestações de arte, isoladas
a princípio, ou com reduzidíssimo número de artistas e intelectuais, aos poucos convertidas em
pronunciamentos e atividades coletivas como o SPAM, o Clube dos Artistas Modernos, o Salão de
Maio, a Família Artística Paulista, o próprio Sindicato dos Artistas Plásticos e o Clube dos Artistas
e Amigos da Arte propiciaram, a criação de uma iniciativa mais ambiciosa e de caráter permanente
em São Paulo, qual um organismo que polarizasse a arte moderna. Era a articulação incipiente que
daria base à fundação do Museu de Arte Moderna de São Paulo – MAM em 1948, com sua sede
social estabelecida à Rua Sete de Abril no ano seguinte.
No período do pós-guerra, em 1947, um ano antes da fundação do MAM, Assis
Chateaubriand liderava a fundação do MASP – Museu de Arte de São Paulo. Segundo Amaral
(2006), Pietro Maria Bardi dirigia o museu e desenvolvia atividades até então desconhecidas do
público, tais como cursos de iniciação artística, conferências e exposições.
O intuito desta contextualização foi reunir brevemente algumas exposições e mostras de
arte que ocupavam espaços alternativos na cidade, independente dos dois museus existentes na
São Paulo do início do século XX. Posteriormente, no fim da década de 1940, com o surgimento
de outros dois museus de grande importância, vale constatar que um conjunto de esforços, não só
de grupos de artistas, como de espaços comerciais e instituições de arte mantiveram São Paulo no
contexto artístico. Dessa forma, a partir dos dados bibliográficos e do próprio levantamento dos
catálogos de artes, sanou-se o questionamento inicial sobre as escassas exposições de arte na cidade
no período pesquisado.
2.2 O acervo dentro da biblioteca: onde vivem os catálogos
O contexto dos espaços artísticos de São Paulo nos levou a indagar quanto aos rumos dos
catálogos e peças gráficas da época.
Neste trabalho inicialmente refletia uma presença histórica da cena cultural na metrópole e
uma ausência física do objeto a ser pesquisado – a dicotomia da presença-ausência¹2. Observamos
10 Theodor Heuberger – galerista e, durante duas décadas, animador de movimentos artísticos, como acontecimentos musicais
de grande importância para a renovação e formação de novas gerações de compositores e do público musical. (AMARAL,
2006, v.1, p. 125). Foi também fundador da Sociedade Pró-Arte, no Rio de Janeiro, a fim de promover intercâmbio cultural
com seu país de origem, a Alemanha. (NASCIMENTO, 2003).
11 A Família Artística Paulista foi um grupo de artistas liderados por Mário de Andrade no período de 1937 a 1939; o grupo
tinha como objetivo alinhar ao movimento modernista o senso de equilíbrio, o respeito pelos conhecimentos técnicos, a
crença no métier como elemento imprescindível para a realização da obra de arte perdurável. (ALMEIDA, 1976)
12 Termo criado pelo curador Felipe Chaimovich (2012) determinando a constituição da memória e seus arquivos – o conceito
é refletido sobre o antigo acervo do MAM – Museu de Arte Moderna, de São Paulo.
58
que ocorreram mostras artísticas significativas e essas exposições possivelmente geraram publicações
– o passo seguinte era descobrir onde estavam alguns destes catálogos.
A busca do catálogo de arte em suas possíveis fontes de pesquisa foi delimitada por uma
periodização – vislumbrávamos inicialmente obter peças gráficas de 1905, data de fundação da Pinacoteca
do Estado de São Paulo; porém, o registro mais antigo que obtivemos durante a pesquisa foi o Catálogo
dos Quadros, publicado em dezembro de 1912. Dessa forma, a cronologia iniciaria em 1912 e o limite
para encerramento seria 1950, com o levantamento de catálogos de arte que antecedessem a 1ª Bienal
Internacional de Arte de São Paulo, em 1951. Outro fator que entrou em questão foi contemplar peças
gráficas criadas antes do ensino de design no país – anteriores à criação do Instituto de Arte Contemporânea
do MASP (1951-1953) em São Paulo e a ESDI – Escola Superior de Desenho Industrial (1963) no Rio
de Janeiro. Dessa forma, a cronologia encerrou-se em 1950.
Delimitado o objeto de pesquisa, o recorte cronológico e o contexto cultural no qual o
objeto em questão está engendrado, o passo seguinte foi investigar os locais que possivelmente
abrigam catálogos de arte, sua localização e formas de acesso. Partimos para um levantamento em
bibliotecas de museus.
Os locais de levantamento dos catálogos, em sua grande maioria, giram em torno de
acervo13, arquivo14, biblioteca15 e museu16. Embora todos tenham a função de guardar, têm
objetivos diferentes.
O levantamento das peças gráficas parte dos dois museus existentes no início do século
XX na cidade de São Paulo – a Pinacoteca do Estado de São Paulo e o Museu Paulista. A Biblioteca
Walter Wey oferece apoio às pesquisas realizadas na Pinacoteca; no local, encontramos grande
quantidade de catálogos de arte. A Pinacoteca também conta com o CEDOC – Centro de
Documentação e Memória, onde foram encontrados os documentos mais antigos da pesquisa. Os
materiais encontrados na biblioteca e no Cedoc já seriam suficientes para a realização do presente
projeto; porém, o intuito era levantar catálogos de arte de locais distintos e observar a variedade de
elementos gráficos e as composições diferentes ou próximas, de acordo com cada local de exibição,
ano, mostra artística, entre outros aspectos. Partindo desse desafio, continuamos a pesquisa no
Museu Paulista. Contudo, por figurar num eixo mais histórico do que artístico, o material que
a biblioteca abriga não vinha ao encontro do interesse da pesquisa, além de suas publicações se
distanciarem do nosso recorte cronológico.
Partimos também de um pressuposto a partir de associações – se a Pinacoteca, em
sua fundação, dividia o espaço físico com o Liceu de Artes e Ofícios, buscamos obter outros
catálogos na biblioteca do Liceu; mas os catálogos existentes e que fazem parte da Pinacoteca
estão concentrados na biblioteca Walter Wey. Na biblioteca do Liceu, em termos de publicações e
documentos, permanecem documentos relacionados à educação.
13 Acervo – diz respeito a bens que integram um patrimônio ou a coisas ou a pessoas e acumula-se por aprovisionamento, por
tradição ou por herança. Fonte: http://conceito.de/acervo_Acesso: 25.11.2012
14 Arquivo – é a acumulação ordenada dos documentos, em sua maioria textuais, criados por uma instituição ou pessoa,
preservados para a consecução de seus objetos, visando à utilidade que poderão oferecer no futuro.
15 Biblioteca – é o conjunto de material, em sua maioria impresso, disposto ordenadamente para estudo, pesquisa e consulta.
16 Museu – instituição de interesse público criada com a finalidade de conservar, estudar e colocar à disposição do público
conjuntos de peças e objetos de valor cultural. (Paes, 2004, p. 16)
59
Figura 58 – Levantamento de catálogos de arte, Biblioteca Walter Wey
Guiados pela frente de pesquisa – biblioteca em museus – buscamos um levantamento
a partir dos museus existentes no final da década de 1940; o Museu de Arte de São Paulo Assis
Chateaubriand (MASP) e o Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo. O MASP abriga
uma seleção de catálogos anteriores a 1950; porém, o material não pode ser fotografado e a
documentação pode ser apenas fotocopiada; sendo assim, o registro do material afasta-se da
proposta da pesquisa, que tem o registro fotográfico como processo da seleção dos catálogos
para criar um banco de imagens digitalizadas. Com isso, descartamos a possibilidade de levantar
material no MASP.
Adiante: a biblioteca Paulo Mendes de Almeida17, situada no Museu de Arte Moderna
conta com grande quantidade de catálogos de arte. Embora a fundação do museu tenha ocorrido
em 1948, um volume significativo de publicações reside no Centro de Estudos Luís Martins18
(CELM) e funciona no mesmo espaço físico da biblioteca, abrigando um núcleo de documentação e
arquivos pessoais de Luis Martins e Paulo Mendes de Almeida, conforme histórico da biblioteca19.
Na sequência, fizemos mapeamento da cena cultural entre as décadas de 1910 e 1920 – e
optamos por buscar peças gráficas de dois artistas que tiveram mostras individuais no período
referido – Lasar Segall, um jovem pintor russo que, em abril de 1913, viera mostrar ao público
paulistano suas telas modernas, como aponta Almeida (1976); e a artista Anita Malfatti, que
apresenta a primeira individual fauve no Brasil, a primeira exposição transgressora em dezembro de
1917, como menciona Amaral (2006). Decidimos fazer um levantamento dos catálogos dos dois
17 Paulo Mendes de Almeida (1905-1986) foi diretor artístico do MAM e autor do livro De Anita ao Museu.
18 Luís Martins (1907-1981), escritor, jornalista e crítico de arte desde os anos de 1940.
19 Histórico da biblioteca Paulo Mendes de Almeida. Fonte: http://www.mam.org.br/paginas/ver/apresentacao-biblioteca_
Acesso: 21.11.2012
60
artistas, Segall e Malfatti – por sua significativa presença e militância no cenário das artes plásticas
da cidade. Para tal, seguimos a dois locais de consulta: a Biblioteca Jenny Klabin Segall20, situada
no Museu Lasar Segall, onde encontramos catálogos de arte dentro do recorte estabelecido, pois o
espaço abriga em seu acervo21 os mais de 6.000 itens de documentação de Lasar Segall, com livros,
catálogos de exposições individuais, coletivas e de leilão, artigos de jornais e revistas, convites,
álbuns, cartazes, entre outros. E, no mesmo local, dando amplitude ao material levantado, constam
também impressos e publicações do grupo SPAM – Sociedade Pró-Arte Moderna.
Figura 59 – Levantamento de catálogos de arte, Biblioteca Jenny Klabin Segall
Parte dos impressos de caráter especial foi localizada nos acervos de artistas e críticos
de arte em bibliotecas. Como exemplo, o MAM com o Centro de Estudos Luís Martins –
CELM e o acervo de Lasar Segall, na biblioteca Jenny Klabin Segall. Dessa forma, a consulta
manteve como continuidade o acervo da própria artista – Anita Malfatti. A pesquisa sobre
Malfatti prosseguiu no IEB22, localizado na USP – Universidade de São Paulo; o local abarca
acervos distintos divididos por arquivo, biblioteca e coleção de artes visuais.
Figura 60 – Levantamento de catálogos de arte, Arquivo - IEB – Fundo Anita Malfatti
20 Dados referentes à biblioteca Jenny Klabin Segall. Fonte: http://www.museusegall.org.br/mlsTexto.asp?sSume=26_Acesso:
21.11.2012
21 Dados referentes ao Acervo de Lasar Segall. Fonte: http://www.museusegall.org.br/mlsTexto.asp?sSume=27_Acesso:
21.11.2012
22 IEB - Instituto de Estudos Brasileiros, criado por Sérgio Buarque de Holanda em 1962. É um centro multidisciplinar de
pesquisa e documentação sobre a história e as culturas do Brasil.
Fonte: http://www.ieb.usp.br/historico. Acesso: 21.11.2012
61
Figura 61 – Levantamento de catálogos de arte, Coleção de Artes Visuais - IEB – Acervo Mario de Andade
Na própria USP, a última fase de levantamento de catálogos ocorreu no MAC, tanto
na biblioteca Lourival Gomes Machado23 como na coleção histórica do pintor e arquiteto
Paulo Rossi Osir. Embora Rossi seja um artista presente na cena cultural de São Paulo, sua
coleção agregou pouco material do recorte cronológico da pesquisa.
Outras frentes de buscas foram o Centro Cultural São Paulo, onde foi feito
levantamento tanto na biblioteca como na coleção de arte da cidade; a Biblioteca Mario de
Andrade; o Museu do Teatro Municipal de São Paulo; o Arquivo Histórico Wanda Svevo,
na Fundação Bienal de São Paulo; além de consultas ao Arquivo Público do Estado de São
Paulo, Sindicato dos Críticos de Arte e algumas possibilidades de visitas a coleções privadas
levantadas junto a Ana Luisa Martins (filha do crítico Luis Martins) e ao crítico de arte José
Armando Pereira da Silva, porém nos locais e coleções particulares citadas não encontramos
catálogos da época. Destas outras frentes, a partir da linha do tempo apresentada no capítulo 1
e de alguns catálogos onde constava o nome das gráficas nas quais foram impressos, tentamos
obter material ou relatos junto a editoras e gráficas – Companhia Paulista de Papéis e Artes
Gráficas – COPAG, Editora Melhoramentos de São Paulo, Companhia Editora Nacional,
Editora José Olimpio (hoje Grupo Editorial Record), Livraria Martins Fontes, Imprensa
Oficial do Estado de São Paulo e Editora Revista dos Tribunais (hoje incorporada à Thomson
Reuters).
As frentes de pesquisas citadas neste item foram listadas para apontar o processo de
levantamento dos catálogos de arte. Neste primeiro momento, o critério adotado consistiu na
delimitação por local e período; e resultou em 182 catálogos que foram registrados digitalmente,
criando um acervo visual das imagens reproduzidas. A segunda etapa, que veremos no capítulo 3,
terá a tarefa de agrupar as peças mais significativas graficamente por categorias.
23 Lourival Gomes Machado era um crítico de arte bastante atuante entre as décadas de 1940 e 1960, e também dedicado
à direção do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM/SP) e a 1ª Bienal Internacional de São Paulo realizada nesse
museu. Fonte: Itaú Cultural http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=artistas_
biografia&cd_verbete=8818&cd_idioma=28555&cd_item=1 Acesso: 25.11.2012
62
TABELA: Levantamento total das peças gráficas –
divididas por locais e quantidades encontradas nos respectivos espaços.
63
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3. CATÁLOGOS DE ARTE: CATEGORIAS VISUAIS
No capítulo anterior, foi apresentado um levantamento de catálogos de artes,
estabelecido por limite cronológico e geográfico. Uma vez criado um banco de dados digital
com todo o material levantado, esses catálogos foram divididos por categorias, a partir da
observação dos elementos gráficos e suas relações.
De acordo com Meggs (2006), para considerarmos um produto como design gráfico,
ele precisa ter por função armazenar conhecimento ou transmitir informações ordenadamente
numa estrutura visual. Dessa forma, a escolha da seleção dos catálogos é eleita a partir de uma
estrutura visual merecedora de atenção – organizada em categorias que serão analisadas.
Segundo Arnheim (2006), a análise do objeto serve, antes de tudo, para informar
sobre a natureza das coisas através das aparências. Ao analisarmos os elementos gráficos,
tais como tipografia, imagem, cores, tipos de suporte, entre outros, criam-se padronizações
e agrupamentos com base em repetições e comportamentos que denominamos categorias
visuais.
O conjunto de elementos visuais é formado tanto por um texto diagramado e suas
composições tipográficas quanto por ilustrações, fotos e grafismos que se reúnem numa
área preponderantemente bidimensional. De acordo com Villas-Boas (2007), estes elementos
visuais – textuais e não textuais – resultam em um projeto gráfico.
No caso dos catálogos analisados e selecionados, buscamos um olhar atento
aos elementos visuais e os representamos conforme quatro categorias visuais – imagens,
tipografias, fios e brasões. Embora haja uma seleção por categorias específicas; por gêneros
gráficos – vale lembrar que estas peças gráficas analisadas possuem uma infinidade de leituras
visuais. Sendo assim, um catálogo pode figurar em duas ou mais categorias.
3.1 IMAGENS
Segundo Neiva Jr. (1994), a caracterização da imagem é basicamente uma síntese
que oferece traços, cores e outros elementos visuais em simultaneidade. Após contemplar a
síntese, é possível explorá-la aos poucos; só então emerge novamente a totalidade da imagem.
Quando o autor discorre sobre esta configuração, notamos que o recurso visual pode nos
conduzir a um traço técnico, a um projeto gráfico. Como a imagem também pode seguir para
inúmeras expressões e interpretações, ao observar esta totalidade, notamos qualidades que
vão desde traçados finos e delicados a uma densidade de manchas.
Dentro da categoria imagem, começamos por uma organização em publicações que
transmitem uma mensagem direta do conteúdo – no caso das mostras individuais dos artistas,
a capa pode agregar a própria obra de arte que foi exposta. Estendemos a categoria imagem a
ilustrações com elementos que dialogam com o tema Artes Plásticas. Por último, estabeleceuse um agrupamento de imagens com característica de autonomia, isto é, o discurso visual da
capa não está atrelado diretamente ao conteúdo.
68
Figura 62 – Seleção Geral - Categoria Imagem
Da seleção por imagens com a presença de obras dos artistas inseridas nas capas das
publicações, temos Tarsila do Amaral, Lucy Citti Ferreira, Paulo Rossi Osir e Flávio de Carvalho.
Figura 63 – Categoria Imagem – capas com obras de artistas
69
Um recurso gráfico inserido na obra pode criar uma solução visualmente atraente,
como no Catálogo Tarsila – 1918 a 1950, onde uma mancha na cor azul é sobreposta aos
traços finos do desenho da artista, delimitando o espaço onde a obra está inserida. Na capa
da Exposição de Lucy Citti Ferreira, a obra xilográfica se faz presente, circunscrita em um
retângulo. Já no catálogo de Paulo Rossi Osir, a capa referencia o suporte azulejo, por ser essa
a temática da exposição. E o catálogo-folder Flavio de Carvalho usa fios como base para inserir
os desenhos de dois nus femininos.
Segundo Cardoso (2005), ao referenciar um projeto gráfico, os elementos artísticos
– no caso da ilustração – não são aleatórios; há uma tentativa sistemática e a imagem não é
aplicada apenas num suporte bidimensional, ela é inserida na capa de um produto industrial,
agregando um grau de programação visual, como o autor menciona – a imagem inserida no
artefato é capaz de enriquecê-lo como objeto de comunicação não verbal.
Imagens de obras e ilustrações dos artistas Tarsila do Amaral, Anita Malfatti, Cícero
Dias e Diego Rivera também mereceram atenção ao longo desta seleção, sendo que as
seguintes imagens não estão inseridas na capa, e sim no miolo da publicação.
Figura 64 – Categoria Imagem – ilustrações e obras de artistas
70
As imagens gráficas são mais do que ilustrações que representam coisas observadas
ou imaginadas, são signos cujo contexto dá um sentido especial e cuja disposição pode
oferecer um novo significado. Para Hollis (2001), as imagens, além de comunicarem, também
conferem expressão única à publicação.
Seguem exemplos de ilustrações que não possuem necessariamente um diálogo direto
com as obras apresentadas na exposição: a ilustração da capa, neste caso, utiliza a temática de
Belas Artes de forma ampla, sem transmitir uma mensagem direta acerca dos artistas e das
obras que estarão contidas na publicação.
Figura 65 – Categoria Imagem – Elementos das Artes plásticas
Observamos nestas capas elementos que se repetem como, por exemplo, a figura
feminina. Muitas delas utilizam as figuras de estátuas e elementos da arquitetura grecoromana, como colunas e capitéis, provavelmente por serem eles, sobretudo em determinada
época, associados à ideia de Belas Artes.
71
Figura 66 – Categoria Imagem – Elementos das artes plásticas
Organização do autor (2012)
Figura 67 – Categoria Imagem – Elementos das artes
plásticas: Colunas
Organização do autor (2012)
São representados também materiais de trabalho usados pelos artistas na produção de
suas obras, como pincel, godê, esteca de madeira e tela; além de ilustrações com os próprios
artistas em ação – a exemplo da imagem criada por Fulvio Pennacchi¹, demonstrando as
atividades da pintura e da escultura.
Figura 68 – Categoria Imagem – Elementos das Artes plásticas: Objetos Artísticos
1 Fulvio Pennacchi (1902 – 1992), pintor, ceramista, desenhista, ilustrador, gravador e professor. Convive com os
artistas do Grupo Santa Helena. Fonte: http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.
cfm?fuseaction=artistas_biografia&cd_item=1&cd_idioma=28555&cd_verbete=895. Acesso: 05.12.2012
72
Figura 69 – Categoria Imagem – Elementos das Artes Plásticas: Artistas Criando
A capa do Catálogo do 3º Salão Paulista de Arte Fotográfica também faz parte do
conjunto Elementos das Artes Plásticas: Artistas Criando, por trazer a imagem de um fotógrafo
em close com foco na câmera, seu instrumento de trabalho; o contexto fotográfico também
surge na quarta capa, onde é retratado o centro da cidade de São Paulo – a composição segue
a mesma da capa e ocupa o espaço como um todo.
Optamos por inserir a imagem da figura 70 isolada do conjunto por duas questões:
pelo fato de o suporte da imagem ser fotografia e não ilustração e por se tratar também
de uma imagem onde o objeto representado resulta da máquina, não atuando no processo
manual, e sim mecânico.
Figura 70 – Categoria Imagem – Elementos das Artes Plásticas: Artistas Criando
Fonte: Biblioteca IEB
No que tange as imagens inseridas nas capas das peças editoriais, Cardoso (2005)
comenta que, no Brasil, esse elemento visual é constituído de pioneirismo e originalidade –
em poucos lugares do mundo desenvolvem-se tão cedo e com tanta riqueza as soluções na
arte de integrar imagem e textos nas capas das publicações.
73
Três catálogos chamam a atenção: o do 12º, 13º e 14º Salões Paulistas de Belas Artes
(figura 65), por apresentarem soluções originais e criativas na forma de compor a imagem.
Na capa do catálogo do 12º Salão Paulista de Belas Artes, a mancha azul nas bordas do
artefato lembra uma pincelada que invade a imagem branca central como uma pintura na
tela – em torno da figura grega, do godê, da tela em branco, uma mancha suave na cor cinza,
delimita a espacialidade destes elementos visuais. Além dos traços, os elementos de destaque
na capa do 13º Salão são a cor e suas variações de contorno mescladas ao fundo. Contornos e
manchas brancas que dão luminosidade à página são solucionados com poucas cores; porém,
os recursos apontados dão a impressão de uma variedade maior de cores. No 14º Salão de
Belas Artes, a composição é explorada na forma de integrar o godê e a voluta da coluna, além
do emprego de ranhuras e estrias, sugerindo a técnica de xilogravura.
Quando a obra de arte não é inserida na capa, observamos que poucos artistas e ilustradores
assinam seus trabalhos: é o caso da ilustração na figura 70, de Pennacchi. Outros três exemplos em
que a assinatura está presente ocorrem nos catálogos do 13º e do 14º Salões Paulistas de Belas Artes, e
da Semana de Arte Moderna. A capa do material sobre o 13º Salão tem ilustração idealizada
pelo pintor paulista Henrique Manzo². No catálogo do 14º Salão, quem assina a capa é Fred
Jordan³, designer gráfico autodidata, alemão naturalizado brasileiro, profissional de comunicação
visual por mais de 40 anos na cidade de São Paulo. Outro exemplo onde o artista atua como
ilustrador é a capa do catálogo da Semana de Arte Moderna, concebida por Emiliano Di
Cavalcanti� (figura 72). Em 1914, suas ilustrações e caricaturas já eram apresentadas na revista
Fon-Fon; o artista, reconhecido sobretudo por sua obra pictórica, publicou também álbuns
com gravuras e serigrafias, ilustrou livros, bilhetes de loteria e desenhou joias.
Referindo-se à edição de luxo da coleção dos Cem Bibliófilos do Brasil –
empreendimento voltado para colecionadores sofisticados, com o mérito de estimular a
ilustração de livros e valorizar a gravura artística – as autoras Edna Lúcia Cunha Lima e
Márcia Christina Ferreira mencionam a atuação dos artistas na função de ilustrar publicações.
Para as 23 obras que a sociedade publicou de 1943 a 1969, Castro Maya
selecionou obras de escritores brasileiros que, sob a direção técnica do
gravador Darel Valença Rins, foram colaborar, além de Santa Rosa, os mais
ilustres artistas plásticos da época, como Portinari, Aldemir Martins, Clóvis
Graciano, Di Cavalcanti, Djanira, Eduardo Sued, Livio Abramo, Marcelo
Grassman e Poty Lazzarotto. (CARDOSO, 2005, p.228)
Na sequência, consideramos dois blocos de imagens, cada qual dividido em
três impressos, e os denominamos “imagens autônomas”, por não apresentarem uma
especificidade conjunta, e sim atuarem de maneira independente. O primeiro agrupamento
mantém autonomia, mas os elementos e signos visuais contidos em cada peça gráfica se
articulam com o tema da exposição. No primeiro exemplo, o próprio pôster da mostra de
cartazes é inserido no catálogo-convite; na Exposição de Livro Italiano, o artefato é visto
2 Henrique Manzo – pintor, desenhista e cenógrafo; estudou no Liceu de Artes e Ofícios, participou da fundação
da Sociedade Paulista de Belas Artes, além atuar como restaurador no Museu Paulista. Foi também membro da
comissão organizadora do Salão Paulista. Fonte: http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.
cfm?fuseaction=artistas_biografia&cd_verbete=2042&cd_idioma=28555&cd_item=3 _Acesso: 05.12.2012
3 Fred Jordan. http://www.iade.pt/designist/pdfs/002_02.pdf. Acesso: 05.12.2012
4 Emiliano Di Cavalcanti. Fonte: http://www.macvirtual.usp.br/mac/templates/projetos/percursos/percursos_mod_
di_cavalcanti_biog.asp. Acesso: 05.12.2012
74
aberto e geometrizado, e sua paleta de cores, composta pelo branco, preto e cinza, mantém
uma neutralidade enquanto se aproxima de um padrão concretista. Por último, a fauna e flora
canadense são inseridas em espaços delimitados por padrões de cores.
Figura 71 – Categoria Imagem – Autônomas
Figura 72 – Categoria Imagem – Autônomas
As imagens do conjunto de peças gráficas na capa do catálogo da Exposição do Art
Club de Roma de 1950 não apresentam uma mensagem direta e informativa do conteúdo
da mostra; as ilustrações, neste caso, agem de forma autônoma. Ao observar essas peças
blocadas, notamos a ausência de cores – ou apenas a combinação de uma cor a mais; porém,
o que chama a atenção são os pesos dos traços – o grafismo do traço geométrico sobreposto
por uma mancha azul. Do mesmo modo, a delicadeza do traço na capa do catálogo Nove
Artistas de Engenho de Dentro apresenta linhas tão finas que chegam a quase desaparecer na
superfície do papel, em contraponto à gestualidade expressiva da linha mais espessa traçada
no programa da Semana de Arte Moderna.
As relações entre o design e a imagem abrangem um universo amplo. Expusemos,
neste item, apenas uma síntese da análise de algumas imagens, com o intuito de observar a
imagem e suas atuações por diferentes linguagens gráficas e como elas complementam as
informações sem o uso de textos. Notamos também que, em alguns exemplos, essa imagem
atua de maneira autônoma, e, nestes casos, a criatividade e a inovação contam mais do que o
próprio conteúdo, ou seja: não é apenas a qualidade do traço, da impressão ou da técnica que
garante qualidade à imagem; o poder expressivo e singular do traço do designer, ilustrador ou
artista pode resultar em um procedimento gráfico.
75
3.2 Tipografias
A categoria seguinte aborda a tipografia5. Ao observar a presença tipográfica nos
catálogos de arte, observamos que a beleza da letra não é constituída de maneira singular, mas
da composição e conjunto de seus caracteres estabelecendo uma unidade harmônica.
Esta categoria não remete à questão técnica e à denominação de fontes, e sim à
análise das variações de estilos e formatos, tais como a espessura dos traços, a largura dos
espaços internos e dos intervalos, o desenho com e sem serifas, as linhas de conexão, entre
outros sinais.
Além de ser fonte de informação verbal, a letra é aplicada como elemento visual. Um
dos responsáveis por esta mudança na comunicação tipográfica foi a Revolução Industrial.
De acordo com Meggs (2006), o ritmo mais rápido e as necessidades de comunicação de
massa em uma sociedade cada vez mais urbana e industrializada produziram uma expansão
rápida de impressores de material publicitário, anúncios e cartazes. Maior escala, mais impacto
visual e novos caracteres acessíveis e expressivos eram necessários. Não era mais suficiente
que as letras do alfabeto funcionassem apenas como símbolos fonéticos. A era industrial
transformou esses sinais em formas visuais e abstratas, projetando figuras de forte contraste
e grandes dimensões.
5 Tipografia é a arte de compor e imprimir com tipos. (PORTA, 1958)
76
Figura 73 – Seleção Geral - Categoria Tipografia
As vanguardas modernas, como futurismo, dadaísmo, construtivismo e De Stijl
propuseram uma nova plasticidade. Além de agregar maneiras de olhar as palavras e usar o
alfabeto para formar imagens, tais expressões visuais ocupam a mente dos designers e artistas,
77
inspirados nessas linguagens contemporâneas. De acordo com Meggs (2006), no meio de
tanta efervescência, não admira que o design e a arte visual experimentassem revoluções
criativas e apresentassem outras abordagens em suas composições visuais. Para o autor, a
tradicional visão do mundo foi destruída – as ideias sobre tipografia, cor, forma, imagens e
sistemas de impressão seguem o rumo das vanguardas, e o artista guia no caminho entre a
improvisação e a criatividade.
De acordo com Hollis (2001),
no movimento futurista, Marinetti6 usou
a “pintura verbal” – expressão rotulada
pelo autor, apresentando tipografias que
expressam em onomatopeias os sons da
batalha de Trípoli, uma poesia explosiva e
emocionalmente carregada. As palavras e as
letras podiam ser usadas quase como se fossem
imagens visuais. A importância do futurismo
consiste na ruptura com o layout simétrico e
tradicional da página impressa, dando vida a
um design tipográfico novo e pictórico.
Figura 74 – Zang Tumb Tumb, capa do livro Parole in Libertá,
de Filippo Tommaso Marinetti (1914)
Fonte: http://www.colophon.com/gallery/futurism/2.html.
Acesso: 05.12.2012
O dadaísmo também sofreu influência do uso
das letras como experiência visual. Meggs (2006) pontua:
os artistas dadaístas dedicaram muito de suas atividades
artísticas à comunicação visual, com uma linguagem
desarmônica e aleatória no uso das tipografias. A letra
criada como experimento visual torna-se elemento
compositivo do design gráfico – rompe-se a apatia e
simetria visual, despertando ao olhar do receptor uma
nova estrutura textual, ao mesmo tempo pictórica.
Por sua vez, o construtivismo segue uma versão
disciplinada, pautada nas formas geométricas simples e
básicas, e no emprego racional do material, em busca
de soluções para problemas de comunicação. Suas
propriedades matemáticas e estruturais convergem à
Figura 75 – Capa dadaísta para a revista
Le Coeur à Barbe, 1922
(MEGGS, 2006, p. 327)
6 Filippo Tommaso Marinetti – poeta italiano, idealizador do movimento futurista. Fonte: Hollis (2001)
78
tipografia, com composições estruturadas
em ordem matemática. Segundo Raimes
e Bhaskaran (2007), o construtivismo
acredita que o design gráfico deveria
privilegiar a legibilidade, baseando-se
numa escrita simplificada. As fontes
mais convencionais eram uma mistura
de caracteres blocados em estilo cirílico
e fontes góticas sem serifas – o texto
era elemento essencial na construção de
cada projeto.
Figura 76 – El Lissitzki, páginas de Dlia golosa, de
Maiakóvski, 1922
Fonte: Meggs (2006 p.379)
O De Stijl mantém o conceito nas bases do construtivismo – ordem e geometria,
visando o equilíbrio e a harmonia. De acordo com Meggs (2006), a experimentação na
tipografia consistia em tipos sem serifa e compostos em blocos retangulares, além de o
próprio formato da letra remeter a uma tipologia geométrica.
As características citadas nos movimentos – futurismo,
construtivismo e De Stijl – refletem a estética tipográfica da
Bauhaus que, por sua vez, influencia a Nova Tipografia7 – Jan
Tschichold, ao ver os desenhos gráficos de László MoholyNagy na exposição Bauhaus em 1923, começa a incorporar
em seus trabalhos os conceitos elaborados pela Bauhaus e
pelos construtivistas.
Figura 77 – Theo van Doesburg,
cartaz de exposição, 1920
Fonte: Meggs (2006, p. 393)
Figura 78 – László Moholy-Nagy, sobrecapas para quatro livros da Bauhaus, 1924-1930
Fonte: Meggs (2006, p. 411)
7 Die Neue Typographie – a nova tipografia; estando à frente o designer e tipógrafo Jan Tschichold. Fonte: Raimes e
Bhaskaran (2007)
79
Segundo Meggs (2006), Tschichold procurou por um design funcional – rejeitava
a decoração, a favor de uma tipografia planejada; privilegiava a forma elementar, sem
embelezamento – tipo sem serifa, com pesos (leve, médio, negrito, extranegrito, itálico) e
proporções (estreito, normal, expandido) variados. Essas características eram atreladas ao
tipo moderno.
A Bauhaus foi o alicerce para a tipografia moderna, com textos e tipologia que utiliza
blocos geométricos; a tipografia é moldada por necessidades funcionais, por uma forma
simples e concisa.
Herbert Bayer, professor da Bauhaus, dedicou-se à criação de uma série de alfabetos. Um
dos seus princípios foi a defesa da tipografia em caixa baixa, conforme cita Hollis (2001, p.53):
Ao nos limitarmos a usar maiúsculas, nossos tipos não perdem, mas tornamse mais legíveis, mais fáceis de serem aprendidos e substancialmente mais
econômicos. E questiona – por que é que um som, como por exemplo a,
tem dois signos, A e a? um som, um signo. Para que dois alfabetos para uma
palavra? Para que dobrar o número de signos, quando o uso da metade atinge
o mesmo objetivo?
No processo de criação da composição tipográfica, as letras podem seguir os mais
diferentes motivos – funcionais ou meramente decorativos – conforme menciona Frutiger (1999):
os desvios da forma padrão da letra podem ser distintos em duas categorias – a primeira consiste
em uma variação ou extensão, na qual a forma básica da letra permanece reconhecível e apenas
as dimensões dos caracteres se alteram. O segundo tipo de desvio compreende o processo de
ornamentação ou de aproximação das letras a uma representação pictórica.
Consideramos a categoria “tipografia” uma organização por grupos que distingue: layout
harmônico, variações de dimensões, manuscritos, matrizes, sinais visuais, layouts geométricos e
caracteres ornados.
Os catálogos dos artistas Franco Cenni, Anita Malfatti e Cândido Portinari apresentam
uma distribuição tipográfica simples e limpa, mantida em caixa alta, com pequenas variações de
deslocamentos do layout, de elementos centralizados e organizados na parte superior a elementos
compostos no lado direito da borda. Nos catálogos de Malfatti e Portinari, as informações referentes
ao conteúdo são expressas apenas pelo sobrenome dos artistas. No caso da capa do catálogo de
Portinari, na parte superior e inferior ao sobrenome, notamos as datas que mencionam os seus
primeiros trabalhos até os mais recentes da década de 1940. As cores chapadas do suporte, assim
como as letras, também possuem variações; porém, mantêm estabilidade e unidade entre a letra e o
fundo – não há ruído visual que desestabilize essa organização. A capa do catálogo de Malfatti, por
exemplo, agrega a sobriedade e a neutralidade do fundo e do próprio azul escuro em contraponto
ao branco – concede maior destaque à palavra – o contraste, neste caso, atua de forma harmônica.
Figura 79 – Categoria Tipografia –
Layout Harmônico
80
No aspecto variação de dimensões, notamos nos catálogos abaixo um caractere tendo
maior destaque na distribuição das letras, devido ao seu tamanho maior em face das demais. As
variações quebram o ritmo da leitura, causam um destaque visual diante das outras informações
textuais e delimitam outros espaços para composição tipográfica.
Figura 80 – Categoria Tipografia: Variações de dimensões
Nos dois exemplos da figura 81, é apresentada a tipografia relacionada à escrita a mão –
o catálogo-folder de Cícero Dias é composto por uma tipografia manual, com o nome do pintor
apresentado na dobra da frente do impresso e remetendo à ideia da assinatura gestual do artista.
Observa-se também o jogo gráfico, ao intercalar o tamanho das caixas. No caso, a palavra “Cícero”
é apresentada em caixa baixa e “Dias” alterna caixa alta e baixa. O nome de Cícero Dias também
está inserido em uma mancha preta na horizontal, a qual quase chega a sangrar na borda do lado
direito; a tipografia também aparece de forma vazada sobre o fundo. O jogo visual entre positivo e
negativo se mantém na capa do catálogo Família Artística Paulista – a capa dividida ao meio brinca,
ao intercalar as cores do fundo de forma inversa na tipografia. A caligrafia com espessura grossa
favorece o jogo de contraste e preenchimento das cores; a escrita manual apresentada na parte
superior da capa é associada de maneira habilidosa e harmônica ao desenho, mantendo quase que
um único diálogo de fios e contrastes para compor o desenho da página.
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Figura 81 – Categoria Tipografia – Variações de dimensões
O Catálogo RASM – Revista Anual do Salão de Maio, projetado por Flávio de
Carvalho, apresenta uma ousadia visual para o design da década de 1930, ao agregar não
apenas a inovação no formato e no material presente na capa, como também no desenho
da própria tipografia da RASM, a qual mostra plasticidade e gestualidade no traço – as letras
se materializam em imagem. Outra observação se dá pelo ritmo, a variação de espessuras,
onde a letra pode começar fina e depois tornar-se densa e volumosa – há um contraponto
entre elas, um jogo de leveza e peso. Quanto às cores apresentadas na tipografia, na época
foram realizadas três versões de cores para os caracteres na capa, com a técnica de serigrafia:
azul, vermelho e amarelo. No contexto contraponto, merece atenção o miolo do catálogo
– o número situa-se sozinho na parte inferior da página branca e atua como indicador dos
capítulos; o caractere numérico informa o início do capítulo e não há pontuação textual – um
título, apenas a presença numérica. Por seu caráter inovador e conteúdo significativo na arte
moderna no Brasil, José Mindlin reeditaria o catálogo da RASM na década de 1980.
Figura 82 – Categoria Tipografia – Matriz, técnica serigrafia
82
Figura 83 – Categoria Tipografia – detalhe da numeração dos capítulos
A capa do 2º Salão também é projetada por um artista: o gravador e ilustrador Lívio
Abramo. Assim como no catálogo da RASM, observa-se a plasticidade no desenho da letra, pela
técnica de xilogravura, resultante dos caracteres entalhados na própria madeira. Percebe-se as letras
com características retas e traçados geometrizantes, além do jogo de preenchimento dessas letras
e o contraste entre positivo e negativo. Assim como o catálogo da RASM, é uma capa produzida
a partir de uma matriz, com a técnica de xilogravura.
Figura 84 – Categoria Tipografia – Matriz, técnica xilogravura
Essas são três peças consideradas notáveis no âmbito da seleção tipográfica, por exibirem
um conjunto de caracteres compostos da letra não apenas como informação textual, mas
também como sinais gráficos visuais. As letras da sigla SPAM são sobrepostas e mantêm desenho
tipográfico – surgem entrelaçadas, criando uma estrutura vertical. Em torno deste experimento
visual, inserem-se as palavras Sociedade Pró Arte Moderna, as quais nos remetem a espontaneidade
e aletoriedade, associando a composições dadaístas. As cores se alternam entre o azul e o vermelho
na estrutura vertical; já as palavras associadas à instabilidade e movimento são apresentadas no
tom cinza, enquanto as letras iniciais na cor preta sugerem neutralidade a essa instabilidade.
Pela opção das cores, insinua-se ao observador ver primeiramente o SPAM e posteriormente as
palavras “Sociedade Pró Arte Moderna”. O catálogo da pintura canadense contemporânea utilizase do próprio grafismo das árvores para compor e complementar as tipografias da palavra Canadá.
De forma planejada, o catálogo-folder Osir Arte apresenta a tipografia inserida no suporte circular,
entre o quadriculado dos azulejos, cujo material é o tema central da exposição. Os peixes criam
uma composição entre texto e imagem, percebida como sinal gráfico.
83
Figura 85 – Categoria Tipografia – sinais visuais
Figura 86 – Categoria Tipografia – sinais visuais
A seguir, apresentamos um conjunto de impressos
compostos por catálogo de arte, convite e envelope da
Exposição Casa Modernista. Estes impressos apresentam
características visuais compostas por layouts geométricos
com seus textos blocados, distribuição de caracteres tanto
na horizontal quanto na vertical, caixa alta. Vale um destaque
especial para o monograma8 “CW” inserido no símbolo, que
remete à casa modernista. As peças usam as inicias CW, da
Casa Warchvchik9.
A opção deste agrupamento deve-se ao fato de os
elementos visuais, assim como sua composição, se aproximarem
de estilos artísticos como o construtivismo e o De Stijl.
Figura 87 – Categoria Tipografia –
layout geométrico
Detalhe da identidade visual, Casa
Warchvchik.
8 Monograma: conjunto formado por duas ou mais letras entrelaçadas, geralmente as iniciais de um nome próprio; cifra,
sigla. Caráter tipográfico. (PORTA, 1958)
9 Gregori Warchvchik (Ucrânia 1896 – São Paulo 1972). Arquiteto. Casa-se com Mina Klabin, filha de um industrial da elite
paulistana, naturaliza-se brasileiro e se insere na sociedade paulistana e nos círculos modernistas. Em 1930, constrói a casa
modernista. Fonte: http://www.itaucultural.org.br/aplicExternas/enciclopedia_IC/index.cfm?fuseaction=artistas_
biografia&cd_verbete=8724&%20cd_item=1&cd_idioma=28555_Acesso: 16.12.2012
84
Figura 88 – Categoria Tipografia – layout geométrico
Detalhe da identidade visual, Casa Warchvchik.
No contexto layout geométrico e bloco de texto, outro exemplo é visto no catálogofolder do 2º Salão da Família Artística Paulistana. Para manter o texto justificado, o espaçamento
entre as letras é forçado, produzindo imagem associada a um jogo de caça-palavras. Por
último, no grupo layout geométrico, é apresentada uma página do 3º Salão da PRO Arte – a
linguagem textual é blocada, sobreposta em fios cinza, e mantém um peso pela densidade das
letras; a tipografia traz aproximação à estética expressionista alemã.
2º Salão da Família Artística Paulistana
3º Salão da PRO Arte
Figura 89 – Categoria Tipografia – layout geométrico
85
O último conjunto da categoria tipográfica dá-se pela sinuosidade das letras. Os
catálogos Exposição de Arte Antiga, 5º Salão Internacional de Arte Fotográfica, O catálogo
de Quadros e a Galeria Geral de Belas Artes remetem à tipologia do Art Nouveau¹0, por
possuírem características de letras elegantes, orgânicas e agregadas a acabamentos decorativos.
Figura 90 – Tipografias desenhadas por George Auriol¹¹
A capa do catálogo Exposição de Arte Antiga resulta numa tipografia com dois tipos
de espessuras – fina e grossa – além de empregar dois tipos de tipografias estabelecidas em
caixa alta, com caracteres arredondados e alongados.
O 5º Salão Internacional de Arte Fotográfica (figura 91) traz uma tipografia com
aspectos decorativos, sendo que alguns caracteres apresentam terminais ornados, em especial
na extremidade inferior do número 5 e na letra S obtendo um aspecto espiralado. A capa é
10 Nikolaus Pvsner, Pioneers of modern design (Os pioneiros do desenho moderno), publicado em 1936, 1949 e 1960, foi um
dos primeiros a dar ao Art Nouveau uma posição significativa no desenvolvimento da arte e da arquitetura do século
XX. Ele via as características principais do movimento como “curva longa e sensível semelhante ao caule de um lírio, à
antena de um inseto, ao filamento de uma flor, ou por vezes a uma delgada chama, a curva ondulante, fluente, conjugada
a outras, surgindo dos cantos e cobrindo assimetricamente todas as superfícies disponíveis”. Fonte: Meggs (2006, p.249)
11 George Auriol – http://theredlist.fr/wiki-2-343-917-998-view-type-profile-renner.html#photo. Acesso: 16.12.2012
86
acompanhada de uma tipografia simples em caixa alta e sem serifa. Este exemplo de capa
transmite a imagem de uma publicação acerca de uma mostra fotográfica, pela mera inserção
da expressão Arte Fotográfica. Porém, sua composição visual se distancia de aspectos que
podem ser associados à fotografia e seus elementos.
Figura 91 – Categoria Tipografia: caracteres ornados
O ecletismo tipográfico está presente no Catálogo de Quadros: são tipografias
alongadas e com e sem serifa, desenhadas a mão e preenchidas de forma sólida; em outra
parte, seu preenchimento é constituído por traços.
O tipógrafo Augusto Siqueira de Campos também compõe o Catálogo Geral da
Pinacoteca com uma variedade tipográfica e dispõe o título Galeria de Belas Artes sobre um
semicírculo. O jogo de tamanhos é apresentado nas iniciais da palavra “Catálogo Geral”.
Figura 92 – Categoria Tipografia – caracteres ornados
87
As iluminuras¹² mostradas a seguir fazem parte do grupo caracteres decorados. Estas
imagens foram encontradas nas páginas iniciais dos impressos e por essa característica, são
denominadas capitulares¹³. As imagens foram descobertas nos textos introdutórios dos
seguintes catálogos: 3º Salão da PRO Arte, Exposição de Pintura e Arte Decorativa de
Theodoro Braga e Catálogo da Primeira Exposição de Belas Artes. As tipografias denominadas
iluminuras se aproximam do estilo dos manuscritos medievais; imagens de tema floral ou
cercaduras geralmente unem-se a letras.
Figura 93 – Categoria Tipografia: caracteres ornados - Iluminuras
Os exemplares apresentados configuram a tipografia não apenas como elemento
textual, mas com características que assemelham a composição tipográfica a uma imagem. Por
sua vastidão de possibilidades entre dimensões, espessuras, larguras, cores e ornamentos ao
compor os caracteres, surge um vasto universo de sua composição observados nos exemplos
apresentados; sendo os textos e as letras entendidos não apenas como elementos geradores
de palavras, mas também como elementos de forte presença visual.
12 Segundo o dicionário de artes gráficas, de Porta (1958), iluminura é um trabalho de ornamentação em livros e pergaminhos
antigos, consistindo em letras ricamente coloridas, flores, folhagens e cenas diversas, tudo pintado a mão.
13 Capitular, palavra portuguesa/espanhola, significa uma letra no início de um texto. Uma inicial pode ter a altura de várias
linhas de texto, o seu corpo sendo substancialmente maior que o do texto corrido. Em manuscritos medievais, algumas iniciais
abrangiam o tamanho de uma página inteira. Fonte: http://tipografos.net/glossario/capitulares.html_Acesso 16.12.2012
88
3.3 FIOS
Os fios guardam características particulares, conforme o desenho da linha. Podem
apresentar variações que abrangem linhas ornamentais, as quais nos remetem às referências
do Art Nouveau e Art Déco, a fios com traços retos e encorpados. Nestes recursos gráficos,
notamos aproximação com os estilos De Stjil e o construtivismo – estendendo-se a estéticas
modernas da Bauhaus.
Estilo Art Decó
Estilo Art Nouveau
Pöster
Georges Auriol
Página A maçã
Autor não identificado
Estilo De Stijl
AnúnciosTheo Van Doesburg
Figura 94 – Estilos variados de fios¹�
14 Fonte da imagem Estilo Art Nouveau: http://www.imagesmusicales.be/search/illustrator/Georges-Auriol/3889/
ShowImages/8/Submit/. Acesso: 16.12.2012
Fonte da imagem Estilo Art Déco: CARDOSO, Rafael (2005, p.111)
Fonte da imagem Estilo De Stjil: MEGGS (2006, p.392)
89
Figura 95 – Seleção Geral – Categoria Fios
Selecionamos a seguir um conjunto de catálogos que chamaremos fios fantasia –
denominação empregada por Porta (1958) para qualquer fio que, fugindo aos traçados mais
comuns, atua especialmente no trabalho e ornamentação. As qualidades visuais dos exemplos
a seguir denotam proximidade com características do Art Nouveau – por apresentar linhas
orgânicas e fluidas à medida que definem e decoram o espaço.
90
Figura 96 – Categoria Fios – Fios Fantasia
Figura 97 – Detalhe Sutil - Alteração do desenho na parte superior
Figura 98 – Categoria Fios – Fios Fantasia
91
Figura 99 – Categoria Fios – Fios Fantasia
Os catálogos da figura 99 apresentam uma cercadura¹5 densa em comparação com
os exemplos anteriores, observando-se nessas duas imagens combinações por repetição de
linhas, agrupadas muito próximas ou em desenhos preenchidos na cor preta, criando na
borda uma maior espessura.
Figura 100 – Detalhe – fios da figura 99
No mesmo contexto – fios fantasia – os catálogos da figura 101 distinguem-se dos
catálogos da Galeria de Bellas Artes, os quais apresentavam uma linha mais sinuosa e fluida.
Estas publicações mantêm a linha ornamental, porém adotam uma abordagem mais retilínea,
aproximando-se do estilo Art Déco.
15 Cercadura – contorno de fios ou vinhetas usado em composição ou gravura. Chamada guarnição, orla, tarja, quadro.
(PORTA, 1958).
92
Figura 101 – Categoria Fios – Fios Fantasia
Os exemplos apresentam um estilo de fios fantasia compostos por cercaduras
presentes nas capas dos catálogos. Além das capas, notamos a presença dos fios em outras
estruturas do catálogo. Selecionamos alguns exemplos a seguir.
Figura 102 – Categoria Fios – Fios Fantasia
93
Figura 103 – Categoria Fios – Fios Fantasia
Figura 104 – Categoria Fios – Fios Fantasia
O ornato da figura 105 aplica-se à vinheta¹6 na parte superior. Constituída por
elementos naturais – flores e folhagens –, atua como elemento decorativo, uma vez que não
tem função de cercar ou delimitar o espaço.
16 Vinheta – baseada em linhas geométricas, flores, folhagens, seres vivos ou coisas inanimadas para servir de enfeite ou
cercadura em página de composição e trabalhos de fantasia. (PORTA, 1958)
94
Nos catálogos na categoria fios fantasia, observaram-se ornatos cuja multiplicidade
de linhas e textos não nos permite atentar a seus detalhes, uma vez que esses elementos de
ornamentação atuam como conjunto único na estrutura gráfica. No processo de seleção
dos fios, observamos algumas destas vinhetas isoladamente. Nesse modo, apresentam ricas
variações de formas visuais constituídas com rigor de detalhes, compostas por imagens que
variam de elementos com linhas mais geometrizadas a temáticas botânicas.
Figura 105 – Ornamentos em detalhe
Os fios com traços retos, Rossi (2001) conceitua como fio linha reta, usualmente
especificada pelo arranjo e espessura, ou “peso”. Conforme a utilidade, recebem nomes
particulares, como: fio de corte, fio de coluna, fio duplo. Selecionamos os fios retos, variações
de espessuras – Fio Claro¹7 e Fio Preto¹8. Apresentamos na figura 106 três exemplos de fio
claro e suas variações. No catálogo da Exposição de Pintura e Arte Decorativa de Theodoro
Braga, o fio apresenta uma cercadura limitada ao espaço do título, criando um jogo de espaços
abertos e fechados, conforme a composição tipográfica. No catálogo do V Salão Paulista de
Belas Artes, o fio também estabelece espaços abertos, criando também um jogo visual em
que a tipografia ultrapassa a delimitação do espaço da linha. No terceiro exemplo, referente
à exposição de esculturas, o fio atua como delimitador do espaço da figura e do texto, além
de servir como base para apoio da imagem – nota-se também a tipografia sendo estendida a
fios, em especial nas letras C, L e N.
17 Fio Claro – o que produz no papel um traço reto e muito fino.
18 Fio Preto – aquele cujo olho ocupa toda a parte superior da lâmina, produzindo um risco negro da grossura do respectivo
corpo: um, dois, três pontos etc. (PORTA, 1958).
95
Figura 106 – Categoria Fios: Fio Claro
O fio preto, por sua vez, atua com linhas densas que separam a tipografia. Essas
barras pretas com volume denotam aproximação dos princípios modernistas do movimento
De Stijil. De acordo com Meggs (2006), eliminaram-se as linhas curvas e os tipos sem serifas
tornaram-se preferenciais. Os tipos eram compostos em blocos retangulares estreitos, mas
o quadrado era a principal baliza para o design de letras. Essas características também são
presenciadas nos impressos da Bauhaus. De acordo com Hollis (2001), os fios tornaram-se
o estereótipo da tipografia Bauhaus, como ficou popularmente conhecida. Herbert Bayer,
responsável pela oficina tipográfica da Bauhaus, realizou grandes inovações no campo do
design tipográfico, utilizando linhas funcionais e construtivistas. De acordo com Meggs (2006),
Bayer experimentou a composição alinhada à esquerda, desalinhada à direita. Em seus layouts,
explorou o contraste de tamanho e peso, além de empregar barras, fios e quadrados para
subdividir o espaço, unificar elementos diversos, conduzir o olhar do observador numa
página e chamar a atenção para determinados elementos.
Figura 107 – El Lissitzki, estrutura de texto
Fonte: Meggs (2006, p. 380)
Figura 108 – Herbert Bayer, nota promissória
Fonte: Meggs (2006, p.411)
96
Algumas peças gráficas, como aquelas mostradas na figura 109, apresentam
composição com fortes linhas horizontais e verticais que remetem aos estilos de vanguarda
De Stijil, construtivismo e Bauhaus. Chama atenção, neste contexto da linguagem, o fio como
elemento de composição, o convite da exposição de Flavio de Carvalho, o qual brinca com o
formato do caractere do número um, que vai se tornando um fio.
Figura 109 – Categoria Fios: Fio Preto
Há também a combinação entre o fio claro e o fio escuro. De acordo com o dicionário
de artes gráficas (1958), essa combinação é chamada fio de intestação, filete constituído por um
ou dois traços, sendo um fino e o outro bastante encorpado, muito usado no encabeçamento
de tabelas e na composição de quadros. Na figura 111, os fios atuam de formas múltiplas e
aplicam o jogo da cercadura aberta e fechada com linhas horizontais e verticais para delimitar
o espaço dos anúncios.
97
Figura 110 – Categoria Fios – Fio de Intestação
Figura 111 – Categoria Fios – Anúncios
98
Figura 112 – Categoria Fios – Anúncio
Na categoria fios, que estabelece esta seleção, observamos a possibilidade de múltiplas
combinações que transitam entre a complexidade e o excesso de informações visuais, e num
estilo oposto, podem adquirir características de harmonia e equilíbrio, especialmente nos fios
retos. Embora visualmente possam ter formas diversas, preservam as funções de delimitar o
espaço e como elemento decorativo.
3.4 Brasões
De acordo com referências no glossário de termos técnicos em comunicação gráfica,
um brasão é entendido como um escudo, insígnia, emblema, divisa ou distintivo ornamental que
representa uma nação, uma família, uma corporação, uma cidade etc. O desenho é geralmente
criado com o desígnio de identificar indivíduos, famílias, cidades e nações. Originariamente
vinculados à cavalaria medieval, estes símbolos evoluíram, ligando-se à representação de
famílias e grupos pela composição de elementos que expressassem as qualidades desejadas;
porém o Estado controlava, autenticava e autorizava tal arte, segundo Lilia Schwarcz (1998).
De acordo com a autora, pagava-se um imposto pelo selo e, aparentemente, pelo direito de
ostentar tal título e tê-lo impresso. Isso significava dispor de uma significativa quantia de
dinheiro para sua confecção.
99
Figura 113 – Seleção Geral – categoria Brasão
No levantamento dos catálogos de arte, algumas peças trazem a aplicação do brasão,
sobretudo por características associadas à documentação institucional, em detrimento de seu
uso para emitir alguma mensagem referente à mostra expositiva. Neste caso, a aplicação do
brasão é ampla e pode ser feita em uma variedade de documentos e impressos.
A seleção desta categoria foi dividida em dois grupos: o primeiro bloco tem o brasão
como símbolo do país ou cidade, constituído por Brasão de armas de São Vicente, Brasão de
armas da República do Brasil e, por último, o escudo – parte integrante do Brasão de armas
do Estado de São Paulo. (figura 114)
Figura 114 – Categoria Brasão - Grupo 1
100
O segundo grupo não aplica elementos visuais associados à identidade nacional ou
municipal. No catálogo do 3º Salão da Sociedade Paulista de Belas Artes, o brasão compõe a
identidade da Escola de Belas Artes, enquanto o impresso do 3º Salão da Sociedade Paulista
de Bellas Artes apresenta uma temática egípcia.
Figura 115 – Categoria Brasão - Grupo 2
No levantamento dos 14 catálogos do Salão Paulista de Belas Artes, pelo menos
cinco deles trazem o brasão aplicado, sendo que a grande maioria não apresenta inovações
gráficas, mantendo uma estética institucional. A presença de composições com elementos
visuais mais atrativos ocorre a partir de 1946, no 12º Salão. Os catálogos da coleção do acervo
da Pinacoteca do Estado de São Paulo até a década de 1950 também apresentam esse viés
institucional – em suas capas também era aplicado o brasão de armas da República do Brasil.
Figura 116 – Capas dos Catálogos do Salão Paulista de Belas Artes
101
Selecionamos o brasão como categoria pelo fato de ser constante a presença deste
símbolo nas capas dos catálogos levantados, em especial os brasões de armas da República
do Brasil e do Estado de São Paulo. Conforme exposto na análise dos exemplos anteriores,
esteticamente, sua aplicação não torna a publicação atraente e inovadora em termos gráficos;
no entanto, se observarmos o símbolo brasão isoladamente, perceberemos uma diagramação
e organização de imagens e textos concisos que refletem os valores de, por exemplo, um país,
estado ou município. Por derivar de um projeto e ter a função de informar e comunicar a
partir de um símbolo, podemos aproximar o brasão – a sua forma e projeto – de um trabalho
de design gráfico.
Ao categorizar os elementos gráficos como imagens, linhas, tipografias e brasões,
observamos a atuação singular de cada elemento visual e sua extensão a subcategorias. Além
disso, eles dão apoio a outros gêneros gráficos pelos mais variados recursos, suportes e processos
de criação. A seleção das peças por categorias visuais nos remeteu à questão documental que
estes impressos apresentam e às inúmeras possibilidades de novos agrupamentos – o que foi
apresentado no capítulo 3 é apenas um recorte destas tantas perspectivas.
102
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa buscou analisar a presença do design em artefatos, com o intuito de contribuir
para o repertório histórico do design no Brasil.
Para atender tal necessidade, definimos como estratégia a escolha de um artefato pouco
contemplado – no caso, o catálogo de arte. Consideramos a categorização por grupos de elementos
visuais, buscando inserir esses documentos como peças de design gráfico. Adicionalmente,
restringimos o recorte cronológico ao período que antecede a década de 1960, cientes da presença
de atividades e produções projetuais antes da origem do design acadêmico no país.
Originalmente, o propósito deste trabalho consistia em levantar e examinar catálogos de
arte, que talvez existissem em quantidade restrita. A partir de levantamento feito em bibliotecas e
outros espaços de guarda e exposição de documentos ligados às artes plásticas e visuais, a hipótese
de um número reduzido de catálogos foi eliminada. Em números globais, foram levantadas,
analisadas e digitalizadas 182 publicações, entre catálogos e outros impressos, tais como convites.
Destas, cerca de 60 peças foram selecionadas por seus elementos gráficos e compositivos
merecedores de atenção, sob a ótica do autor. Desta seleção, as peças foram ainda organizadas
em grupos a partir de elementos que se repetissem e possuíssem maior aproximação com as
categorias – imagem, tipografia, fios e brasões.
Para entender a presença de tais elementos, constituiu-se um tipo de curadoria visual
das peças selecionadas. Luis Pérez-Oramas, em seu texto introdutório ao guia da 30ª Bienal de
Arte, compara metaforicamente a série de temáticas de sua curadoria a agrupamentos constelares,
por entender que toda curadoria e toda constelação são mais ou menos arbitrárias, conforme a
perspectiva de o observador criar outros vínculos. Fazendo uso da metáfora de Oramas, entendemos
como um paradigma a arbitrariedade do recorte imposto na presente análise, na medida em que ou
orienta o olhar ou abre a perspectiva de o leitor criar seus próprios agrupamentos. Sendo assim,
as categorias aqui elencadas podem ser vistas como quatro propostas constelares, ativando outras
possíveis associações e incontáveis organizações por categorias.
O processo aqui adotado – de escolha por conjuntos de acordo com os elementos gráficos
e sua estrutura de composição – aproxima e identifica estes catálogos de arte como objetos
visuais pertencentes à área do design gráfico, dotados de dinâmicas de composição entre imagens,
textos e formatos que apresentam características do design, mesmo que, na época, nem mesmo os
profissionais fossem denominados designers. Ainda assim, eles executavam peças que, observadas e
analisadas, validam o projeto gráfico.
Este projeto buscou apontar a necessidade de incorporar à história do design gráfico
publicações que contribuam para a preservação do design brasileiro. Segundo Cardoso (2005, p.16),
se os designers continuarem a desconhecer a riqueza histórica do material gráfico presente em nosso
país há mais de um século, o processo de criação poderá ocasionar contextos redundantes. E,
conforme o autor, a pólvora continuará sendo descoberta e a roda reinventada a cada geração.
Entendemos que o conhecimento do passado contribui para uma melhor compreensão
daquilo que pode ser a identidade brasileira no campo do design atual.
103
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