1 Análise de características físico-químicas e de salinidade, no Núcleo de Desertificação dos Cariris/PB(1). Leonardo Bezerra de Melo Tinôco (2); Cassiana Felipe de Souza (3); José Amilton Santos Junior(4); Aldrin Martin Perez-Marin(5); Salomão de Souza Medeiros(6); Antonio Ramos Cavalcante(7). (1) Trabalho executado com recursos do PPGCS/CCA/UFPB-CAPES e do CNPq/INSA. Estudante de Pós-Graduação/doutorado do Programa de Pós-Graduação em Ciência do Solo, da Universidade Federal da Paraíba – PPGCS/CCA/UFPB e pesquisador bolsista do Instituto Nacional do Semiárido – INSA; Areia, PB, (3) (4) [email protected]; Mestranda do PPGCS/CCA/UFPB; [email protected]. Técnico do INSA; (5) (6) [email protected]; Pesquisador do INSA; [email protected]; Pesquisador do INSA; [email protected]; (7) Técnico agrícola do INSA, [email protected]. (2) RESUMO As áreas em processo de desertificação constituem-se espaços onde a degradação ambiental se expressa na perda da capacidade biológica do solo para produção vegetal. Esse fenômeno vem-se ampliando globalmente, afetando regiões áridas, semiáridas e subúmidas. O Estado da Paraíba apresenta duas áreas características, denominadas núcleos de desertificação do Seridó e dos Cariris Velhos. Este trabalho tem por objetivo pesquisar as características químicas, físicas e de salinidade de solos do Núcleo de Desertificação dos Cariris Velhos. As áreas pesquisadas nesse Núcleo, foram selecionadas por apresentarem características visuais que sugeriam a ocorrência de processo de desertificação, particularmente referente à erosão, ausência de cobertura vegetal, e presença de horizonte C ou Cr exposto em boa parte da área. As análises laboratoriais consideraram os aspectos químicos, físicos e de salinidade. Os resultados demonstraram divergências entre as características de baixa fertilidade auferida a solos desertificados e os resultados obtidos neste estudo. Termos de indexação: Fertilidade do solo; Semiárido; Solos desertificados. INTRODUÇÃO A desertificação é um problema de proporções mundiais que afeta a humanidade, conceituada como processo de degradação do solo sob seus aspectos físico-químico e biológicos, da fauna e flora, e dos recursos hídricos (PARAÍBA, 2011). As evidências de degradação estão presentes no Semiárido brasileiro e, em alguns locais, são tão flagrantes que levaram a ser designados como núcleos de desertificação (Vasconselos Sobrinho, 1971 e 2002). Em geral, esses núcleos são áreas com grandes manchas desnudas e/ou com cobertura vegetal baixa e com sinais claros de erosão. Há outros locais com aparência de degradação semelhante e não assim reconhecidos (Sampaio et al., 2003). Atualmente, consideram-se seis Núcleos no Semiárido brasileiro: Seridó, (RN/PB), Cariris Velhos (PB), Inhamuns (CE), Gilbués (PI), Sertão Central (PE), Sertão do São Francisco (BA) (Vasconcelos Sobrinho, 2002). Ceará e Pernambuco são os estados mais castigados, embora, proporcionalmente, a Paraíba tenha a maior extensão de área comprometida: 71% de seu território. Os Núcleos do Seridó-RN/PB e dos Cariris Velhos/PB já estão unidos, pois não apresentam divisas claras entre si (Perez-Marin et al., 2012). Embora tantas evidências, sua organização em um sistema de indicadores quali-quantitativos ainda é muito incipiente e não fornece resultados consistentes para alimentar tomadas de decisão sobre esse grave processo evolutivo, mesmo mediante as tentativas de mensuração. Porém, nenhuma delas é conclusiva, tampouco consideram a multiplicidade dos aspectos imbricados nesse fenômeno. A desertificação implica mudança no tempo e, para ser caracterizada, demanda uma serie temporal de dados (Sampaio et at., 2003; Santos et al., 2012). Isso é fundamental para a determinação de risco, na estimativa da progressão de desertificação e na avaliação de ações preventivas (Sampaio et al., 2003). Diante desse contexto, o Instituto Nacional do Semiárido (INSA/MCTI) e o Programa de PósGraduação em Ciência do Solo (PPGS/UFPB) vêm conduzindo linha de pesquisa sobre os processos de desertificação. Inclui-se a caracterização de solos, especialmente quanto a suas propriedades químicas, físicas e biológicas. Assim, este trabalho teve por objetivo caracterizar química e fisicamente, na camada de 0-20 cm de profundidade, três solos Núcleo de desertificação dos Cariris Velhos/PB, segundo o Plano Estadual de Combate a Desertificação do referido Estado. MATERIAL E MÉTODOS Localização e descrição das áreas de estudo 2 As áreas de estudo foram selecionadas de acordo com o Programa de Ação Estadual de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca no Estado da Paraíba (PAE PB, 2011) em três municípios da região semiárida paraibana com susceptibilidade ao processo de degradação do solo. Dessa forma, foram escolhidos manchas de solos nos municípios de Junco do Seridó (Ponto 1), Cabaceiras (Ponto 2) e Juazeirinho (Ponto 3) para caracterização físico-química e salina do solo (Figura 1). Os pontos amostrados foram selecionados e georreferenciados em áreas que demonstravam sinais do processo de degradação e que não tinham atividades agrícolas há pelo menos uma década, com vegetação natural ou, na ausência dessas. Figura 1. Pontos de coletas dos solos, no Semiárido Paraibano. Amostragem do solo A coleta das amostras de solo foi realizada em janeiro de 2013, nos municípios de Junco do Seridó (S 06°57.073’W 36°48.631’; Seridó Ocidental, 612m altitude), Cabaceiras (S 07°26.842’W 36°23.055’; Cariri Oriental, 461m altitude) e Juazeirinho (S 07°02.223’W 36°34.143’, Cariri Oriental, 609m altitude). A vegetação prevalecente é a Caatinga hiperxerófila rala. No momento da coleta, ainda não havia ocorrido precipitação pluviométrica, no corrente ano,nos municípios de Cabaceiras e de Juazeirinho,mas havia precipitado 30 mm em Junco do Seridó, dois dias antes da coleta do solo. O procedimento de coleta seguiu as recomendações do Manual de Descrição e Coleta de Solo no Campo (Santos et al., 2005).Foram coletadas amostras deformadas do horizonte superficial do solo(0-20 cm) de cada município para as análises físicas, químicas e de salinidade para caracterização. Após secagem em casa de vegetação por 96 h, as amostras foram destorroadas, passadas em peneira de 2mm (Terra Fina Seca ao Ar – TFSA) e encaminhadas para o Laboratório de Irrigação e Salinidade – LIS/UFCG, para realização das análises. Análises físico-químicas e de salinidade As análises físico-químicas e de salinidade dos solos foram realizadas também Laboratório de Irrigação e Salinidade – LIS/UFCG seguindo metodologia da EMBRAPA (2009). As determinações químicas foram: pH (água),condutividade elétrica (CE, suspensão 2+ 2+ solo-água), cálcio (Ca ), magnésio (Mg ), + + 3+ potássio (K ), sódio (Na ), alumínio (Al ), + hidrogênio (H ), carbono orgânico (CO), matéria orgânica (MO), nitrogênio (N), fósforo assimilável 5+ (P ). As análises físicas foram: densidade do solo (Ds), pelo método do anel volumétrico (KIEHL, 1979); densidade de partícula (Dp),pelo método do balão volumétrico (EMBRAPA, 1997). A granulometria das frações areia, silte e argila foi realizada segundo Ruiz (2005). A umidade dos solos na capacidade de campo (0,33 atm) e no ponto de murcha (15,0 atm) também foram realizadas. As determinações de salinidade foram: pH (extrato de saturação), condutividade elétrica (CE, extrato de saturação), cloreto (Cl), carbonato -2 (CO3 ), carbonato de cálcio (CaCO3), bicarbonato 22+ (HCO3 ), sulfato (SO4 ), cálcio (Ca ), magnésio 2+ + + (Mg ), potássio (K ), sódio (Na ) e percentagem de saturação. Em seguida, foram calculados: soma de bases, CTC, saturação por bases, porosidade total, relação de adsorção de sódio (RAS), salinidade e classe do solo. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os solos analisados se encontram em uma área identificada como Núcleo de Desertificação dos Cariris Velhos. Esses dados corroboram com aqueles encontrados por Souza et al (2009), ao avaliar os efeitos da desertificação em solos do Cariri Paraibano. Atributos químicos e de salinidade Os resultados das análises químicas estão apresentados na Tabela 1. Para os parâmetros de avaliação de fertilidade do solo, tomou-se como base as recomendações de adubação para a o Estado de Pernambuco - 2 aproximação (IPA, 2008). Os teores de fósforo apresentaram-se muito baixos em Cabaceiras, Juazeirinho e Junco do Seridó. O potássio apresentou níveis medianos nos três solos e a Matéria Orgânica, Carbono Orgânico e o Nitrogênio apresentaram teores baixos em Junco do Seridó, muito baixos em 3 Juazeirinho e teores medianos em Cabaceiras. O teor de C orgânico tem sido utilizado frequentemente como indicador-chave da qualidade do solo, tanto em sistemas agrícolas como em áreas de vegetação nativa (MARTINS, et al., 2010). O Cálcio apresentou teores baixos nos três solos e o Magnésio apresentou teores baixos em Junco do Seridó e Juazeirinho e médio em Cabaceiras. Nos três locais os solos apresentaram saturação em bases (V%) bastante elevadas. A CTC apresentou-se levemente baixa em Juazeirinho, média em Junco do Seridó e elevada em Cabaceiras. A soma de bases foi baixa em Juazeirinho, mediana em Junco do Seridó e elevada em Cabaceiras. O pH (água) apresentou níveis de acidez baixo em Junco do Seridó, nível bom em Juazeirinho e alto em Cabaceiras. O alumínio não apresentou teores representativos. Quanto a salinidade (Tabela 2) a Condutividade Elétrica apresentou índices para solos não salinos; A porcentagem de sódio trocável e a relação de adsorção de sódio também apresentaram-se em níveis de solos normais. Tabela 1 - Atributos analisados. Atributos pH H2O CE(mmhons/cm) 1 2+ Ca (meq/100g) 2+ Mg (meq/100g) + K (meq/100g) + Na (meq/100g) 3+ Al (meq/100g) + H (meq/100g) CO (%) MO (%) N (%) 5+ (mg/100g) P SB(meq/100g) CTC(meq/100g) V (%) (1) (4) Suspensão solo-água; Juazeirinho. químicos dos solos Local de Coleta Ponto Ponto Ponto (2) (3) (4) 1 2 3 5,36 8,07 6,50 0,10 0,11 0,05 2,55 3,15 0,23 0,14 0,00 1,09 0,77 1,33 0,07 2,79 6,07 7,16 84,77 21,90 5,29 0,23 0,20 0,00 0,00 1,38 2,38 0,13 1,89 27,62 27,62 100 1,32 2,13 0,16 0,05 0,00 0,30 0,31 0,38 0,03 1,09 3,66 3,96 92,42 (2) Junco do Seridó; (3) Cabaceiras; Tabela 2 - Atributos de salinidade dos solos analisados Local de Coleta Atributos pH(1) Ponto (2) 1 5,23 Ponto (3) 2 6,45 Ponto (4) 3 7,79 0,47 0,26 0,25 1,75 0,00 0,75 0,00 1,00 0,00 CE (mmhons/cm)(1) Cl(meq/l) 2 CO3- (meq/l) 2- SO4 (meq/l) Ausente Ausente Ausente 2+ 1,75 0,62 1,00 2+ 4,62 5,38 4,25 K (meq/l) + Na (meq/l) 0,88 1,91 0,10 0,90 0,35 RAS (%) 1,09 0,52 0,99 0,61 % de saturação 24,33 34,00 20,00 Não Salino Normal Não Salino Normal Não Salino Normal Ca (meq/l) Mg (meq/l) + Salinidade Classe do solo (1) (4) Extrato de saturação; Juazeirinho. (2) Junco do Seridó; (3) Cabaceiras; Atributos físicos Os três solos situam-se na faixa de solo francoarenoso (Tabela 3), bem drenado e com bons teores de umidade natural, porém com baixa capacidade de retenção de água (Tabela 4). Tabela 3 - Atributos físicos dos solos analisados. Local Ar(1) St(1) Arg(1) Ds Dp P Ponto 1 (2) Ponto 2 (3) 57,8 32,3 9,86 Ponto 3 (4) 86,2 11,0 2,77 (1) (3) 3- ----------------%-------------84,1 10,1 5,8 Ar: Areia, St: Silte, Arg: Argila; (4) Cabaceiras; Juazeirinho. (2) -----gcm ---1,3 2,7 2 1,3 2,7 51,1 1,3 50,4 2,7 % 50,3 Junco do Seridó; Tabela 4 - Umidade dos solos analisados. Umidade Natural 0,33(1) 15,0(1) Local -----------------------%---------------------(2) Ponto 1 84,1 10,1 5,8 (3) Ponto 2 57,8 32,3 9,9 (4) Ponto 3 86,2 11,0 2,8 (1) (4) Atmosferas (atm); Juazeirinho. (2) Junco do Seridó; (3) Cabaceiras; A análise da fertilidade pode demonstrar que, em um dado momento, as condições de solo 4 podem ser caracterizadas como degradadas e por isso, serem inferidas como em processo de desertificação (Travassos e Souza, 2011). Porém isso pode se constituir em equívoco. Se de um lado verifica-se que a região enfrenta recorrentes períodos de estiagens, o que reduz sobremaneira a cobertura vegetal, especialmente quando ocorre em longos períodos, de outro, os indícios de maior intensidade de degradação do solo, apresenta-se em áreas onde a atividade antrópica, iniciada pelo desmatamento e associada a falta de práticas conservacionistas, têm resultado em processos erosivos com diferentes intensidades (Albuquerque et al, 2002). Destaque-se o uso anteriormente verificado nos diferentes solos onde em Junco do Seridó há mais de 40 anos produzia-se algodão, seguido de feijão e milho, sendo também utilizado como pastagem; em Cabaceiras há 50 anos produziase milho, feijão e algodão; e em Juazeirinho há mais de 10 anos produzia-se milho e feijão, além de ter servido como áreas de pastagens. Ou seja, há anos que a área estudada apresentava-se como área com aptidão agrícola, porém essas áreas não mais foram utilizadas para estes fins. No entanto, segundo os resultados observados neste estudo, pode-se inferir que a degradação local pode ser revertida com medidas de correção de fertilidade do solo, o que não necessariamente, significaria reversão de um processo de desertificação, por esse motivo. CONCLUSÕES Contraditoriamente a identificação da área estudada como Núcleo de Desertificação, os indicadores quali-quantitativos de fertilidade do solo, não permitem classificá-la como áreapadrão em desertificação, ainda que a mesma apresente necessidade de correção de sua fertilidade química para plena retomada de seu potencial produtivo. AGRADECIMENTOS À UFPB, à CAPES, ao CNPQ e ao INSA, pelo apoio técnico e financeiro concedido. REFERÊNCIAS ALBUQUERQUE, A. W.; LOMBRADI NETO, F.; SRINIVASAM, V. S. Efeito do desmatamento da caatinga sob as perdas de solo e água em um Luvissolo em Sumé (PB). Revista Brasileira de Ciência do Solo. Viçosa, v. 25, p. 695-703, 2002. EMBRAPA. Centro Nacional de Pesquisa de Solos. Manual de métodos de análise de solos. 2.ed. Rio de Janeiro: EMBRAPA, 1997. 212p. INSTITUTO AGRONÔMICO DE PERNAMBUCO. Recomendações de adubação para o Estado de a a Pernambuco: 2 aproximação. 3 ed. Recife: Instituto Agronômico de Pernambuco, 2008. KIEHL, E. J. 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