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ESTUDO SOCIOTÉCNICO EM UMA ASSOCIAÇÃO DE ARTESÃOS DO
MUNICÍPIO DE MARIA DA FÉ/MG
Guilherme Augusto Lemos Fest
Thelma Adielly de Carvalho Ribeiro
Bianca Martins Siqueira Domingos
Adilson da Silva Mello
Universidade Federal de Itajubá
Linha Temática: Design, Engenharia de Materiais e Tecnologia
RESUMO
O presente trabalho propõe um estudo sociotécnico acerca da Associação Casa do Artesão Mariense, localizada em
Maria da Fé-MG, de modo a compreender a inclusão desta no mercado local. Para isso, foram realizadas
entrevistas com os artesãos associados de modo a Compreender a história da Associação, dos artesãos e suas
técnicas produtivas . Concluiu-se que, devido à falta de estrutura para vendas e produção, o campo de
possibilidades de atuação da Associação ainda é limitado ao turismo sazonal e ao munícipes, impedindo que
alguns de seus associados possam se utilizar do artesanato como meio único de renda. Esta etapa de análise
sociotécnica servirá de base para o desenvolvimento de Tecnologias Sociais junto aos artesãos, desenvolvido de
forma interdisciplinar no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento, Tecnologias e Sociedade.
Palavras-Chave: Tecnologias Sociais; Associação Casa do Artesão Mariense; Artesanato
ABSTRACT
This work proposes a socio-technical study of the Mariense Craftsman House Association, located in Maria da
Fé-MG, in order to understand its inclusion in the local market. For this, interviews with associated artisans were
perfomed maked to understand the history of the Association, the artisans and their production techniques. It was
concluded that, due to the lack of infrastructure for sales and production, the possibilities of action of the
Association is still limited to tourism and seasonal residents, preventing some of its members may be used as the
only way of income. This stage of socio-technical analysis will serve as a basis for the development of social
technologies together with artisans, developed an interdisciplinary manner in the Pos-Graduate Program in
Development, Technology and Society.
Key-words: Social Technologies; Mariense Craftsman House Associatio; handicraft
INTRODUÇÃO
A presente pesquisa visa realizar um estudo sociotécnico da Associação Casa do Artesão
Mariense, em Maria da Fé. A importância da atividade do artesanato para o município esta
ligada tanto a história coletiva da cidade quanto a história individual dos artesãos, sendo
necessário entender o contexto histórico-social em que a Associação está inserida. A cidade de
Maria da Fé está localizada no estado de Minas Gerais, fazendo divisa com os municípios de
Itajubá, Pedralva, Cristina, Dom Viçoso, Virginia e Marmelópolis. Possui um total de 14.216
pessoas, sendo boa parte destas residentes em zona rural.
Até a década de 90, grande parte dos moradores trabalhava direta ou indiretamente na produção
de batatas (bataticultura), contemplando desde a etapa de plantio até a distribuição do produto
(IBGE, 2013). Seu apogeu foi durante a década de 70/80, quando a cidade se tornou a maior
produtora nacional do produto. Na década de 90, em decorrência de fatores como pragas nas
sementes, cortes de investimento governamental, baixa mecanização e competitividade com
outros mercados, a cidade sofreu uma grande crise do gênero, levando alguns moradores a
buscar soluções alternativas de renda. Parte desses moradores apostaram no artesanato e no
potencial turístico da cidade. Nesse contexto, nasce a Casa do Artesão Mariense, foco dessa
pesquisa.
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A partir da crise, cresceu a atividade artesanal na cidade, que na década de 90 se dava
principalmente por meio de bordadeiras e tricô. Entretanto ocorria de forma independente e
isolada. A partir disso o governo municipal resolveu criar a Casa do Artesão Mariense, onde os
artesãos podem expor e vender suas obras, em uma espécie de loja conjunta. Ela foi inaugurada
em 7 de junho de 2008 e conta com 40 integrantes. Na loja da associação são vendidos desde
obras de artesanato com fibra de banana, bucha, reaproveitamento de itens como relógios
quebrados, terços e botões, e até alguns produtos cosméticos, muitos deles feitos a partir da
oliveira, que é produzida em larga escala no município.
1. REFERENCIAL TEÓRICO
As Tecnologias Sociais (TS) aparecem no referido contexto enquanto uma via de
ruptura para o ciclo de exclusão dos artesãos da economia convencional. Essas são definidas
enquanto produtos, técnicas ou metodologias replicáveis, desenvolvidas na interação com a
comunidade e que representem efetivas soluções de transformação social (DAGNINO, 2008).
Pressupondo, por um lado, a absorção da realidade das necessidades locais pela universidade e
seus pesquisadores, anexando às teorias uma aplicação prática do conhecimento adquirido. Por
outro lado, o deslocamento do local para o centro, sem, entretanto, desconsiderar o global, com
a consolidação de uma cultura democrática pela participação dos atores implicados na busca de
resolução de seus próprios conflitos e demandas.
Compreendemos por Tecnologias Sociais: produtos, técnicas ou metodologias
replicáveis, desenvolvidas na interação com a comunidade e que representem efetivas soluções
de transformação social. Considera-se que geração de conhecimento para a inclusão, base sobre
a qual este projeto foi fundado, demanda uma mudança na configuração das relações entre os
diferentes sujeitos implicados, configurando uma estrutura não mais hierárquica, vertical, mas
sim horizontal, de trocas e benefício mútuo.
Os conceitos de Tecnologia Social, Economia Solidária, inclusão, mediação e
desenvolvimento ganham, através deste projeto, uma dimensão prática originada no
movimento exógeno da Universidade através de suas relações com os diferentes segmentos
sociais.
Segundo Dagnino (2008) não se trata de aproveitar conhecimento gerado com dinâmica
funcional para desenvolver tecnologias que satisfaçam outras demandas socioeconômicas e
políticas. O que se deseja é gerar uma nova dinâmica, que proporcione a construção social de
um conhecimento voltado às necessidades e aos interesses dos atores pertencentes, no caso, à
associação. Assim, se por um lado os horizontes universitários serão ampliados no sentido da
abertura da instituição aos movimentos sociais organizados, a estes serão levados os
instrumentos necessários para que adquiram autonomia jurídico -legal, econômica, política e
sustentável.
Tais técnicas e novas dinâmicas geradas só são possíveis ao se entender o
funcionamento das próprias comunidades estudadas. Latour (2005; 1994) traz a definição de
“coletividades sócio-técnicas”, na qual é sustentada uma simetria entre as agências de humanos
entre si e não-humanos. Ou seja, propõe-se a reflexão acerca dos limites da definição da agência
exclusivamente pela ação e relação dos “humanos-entre-eles”, ressaltando a necessidade da
incorporação das ações de não humanos, híbridos, e considerando que estes se expressam como
coletividades sócio-técnicas que produzem efeitos no curso da ação.
Para o autor, como foi anteriormente explicitado, a não inclusão dos artesãos no
mercado competitivo deriva não apenas de um quadro de precarização socioeconômico, mas
também sofre influência do produto do artesanato em si, ou seja, a não adequação do produto às
necessidades do consumidor é fator decisivo nesse processo de exclusão.
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2. METODOLOGIA
Para a coleta de dados deste estudo foram feitas diversas visitas a Associação Casa do
Artesão Mariense. Essas visitas foram constantes ao longo do período de estudo (Agosto de
2013 á Agosto de 2014) e objetivaram o reconhecimento do local, contato e aproximação com
os artesãos que lá trabalham e expõem suas obras, bem como realizar entrevistas com essas
pessoas.
Em um primeiro momento, as visitas objetivaram entrevistar os artesãos em busca de
relatos de suas histórias, tanto individuais quanto coletivas, a fim de se montar um mosaico
histórico e social da Associação. O relato aqui descrito contribui para entender um pouco da
história que lá se desenvolve dia-a-dia, bem como permite inferir algumas considerações que
possam auxiliar em uma maior incerção o mercado da Associação, sem que se perca o carater
pessoal e íntimo que a atividade do artesanato possui.
Durante o segundo semestre do estudo, o objetivo foi avaliar o processo de produção
dos artesãos. Para isso, foram feitas visitas a casa de alguns deles, uma vez que a confecção das
peças se dá em suas residências para posteriormente serem levadas a loja. Durante as visitas foi
observado o trabalho das pessoas bem como realizadas entrevistas informais, objetivando a
análise sociotécnica dos processos. Tudo foi registrado em arquivo de vídeo e posteriormente
analisado. Neste estudo estão descritas duas visitas consideradas mais significativas, uma
realizada no dia 12 de Agosto de 2014 e outra no dia 27 de Agosto de 2014.
1. Sobre a Associação Casa do Artesão Mariense e sua história
O artesanato na cidade de Maria da Fé era feito de forma isolada e descentralizada até
1999, quando algumas oficinas artesãs se juntaram e formaram a Cooperativa Gente de Fibra,
que existe até hoje. Essa cooperativa possui apoio do SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio as
Micro e Pequenas Empresas) e, na época, administrava uma loja, chamada “Com Arte”, onde
eram vendidas obras tanto dos artesãos associados a ela quanto dos não associados. Quando
esta loja fechou, a Prefeitura Municipal de Maria da Fé cedeu o espaço da antiga Estação
Ferroviária para a criação da Associação Casa do Artesão Mariense, que abrigaria boa parte
daqueles que não eram associados à cooperativa.
O município de Maria da Fé foi palco da luta árdua de moradores que, diante da crise
da monocultura da batata que abalou a cidade em 1994, encontraram no artesanato em
fibra de bananeira e papelão um meio de sobrevivência (...) Tudo começou quando os
moradores de Maria da Fé, ociosos com a queda da monocultura da batata, passaram a
se reunir, na tentativa de enfrentar a crise econômica. O principal desafio naquele
momento era aliar as carências da cidade às potencialidades dos marienses, com
objetivo de garantir o sustento das famílias. Por outro lado, inexistia um trabalho com
identidade própria, que representasse a região. Havia apenas pessoas isoladas que
confeccionavam artigos comuns em crochê, tricô, fuxico, bordado, entre outros tipos
de artesanato (SECRETARIA DE ESTADO DA CULTURA DE MINAS GERAIS,
2012).
A primeira visita à Associação foi feita pela equipe de pesquisa em maio de 2013.
Segundo a presidente da Associação, Marina, ela é composta por 40 artesãos, sendo 28 deles
mulheres. Dentre todos os artesãos, aproximadamente metade ajuda diretamente nas vendas da
loja, em um esquema de revezamento em que cada dia um artesão é responsável pelo
showroom.
Os artesãos que não participam do revezamento possuem um desconto de 20% no lucro
referente à sua parte. Aqueles que participam possuem um acréscimo de 15% em sua parte. O
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valor residual fica em poder da Associação para sua própria manutenção. Todo mês é feita uma
reunião com todos os associados, a qual ocorre sempre nas últimas segundas-feiras do mês, as
13:30h.
Uma das principais fontes de matéria prima para os artesãos que utilizam fibra de
bananeira em seu trabalho são os cerca de 400 pequenos produtores de bananicultura do bairro
Pedrão, na zona rural do município de Pedralva, que fica a 22 km de Maria da Fé
(PREFEITURA MUNICIPAL DE PEDRALVA, 2014). Além destes há dois produtores de
banana orgânica de médio porte na região. Juntos estes dois produzem, em média, uma tonelada
de banana por semana, a qual é escoada principalmente para o estado de São Paulo. Apesar de
Maria da Fé não possuir uma secretaria da agricultura, está em fase de implantação o Cadastro
Ambiental Rural (CAR) e o Programa de Recuperação Ambiental (PRA), os quais são
fiscalizados pela EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e pelo IBAMA
(Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).
Figura 1 – Concentração de bananicultura na Microrregião de Itajubá/MG
Fonte: IBGE (2013)
A fibra de bananeira utilizada pode ser de dois tipos: a rústica, que é utilizada pelos
artesãos e é feita por um dos associados, denominado pelos entrevistados como “Japonês”
(Soubata), e a lisa, que é preparada com processo de fabricação mais refinado, feita pela
cooperativa de artesanato “Gente de Fibra”, a qual possui mais recursos e melhor organização
operacional.
Em uma das entrevistas realizadas foi dito por uma das artesãs que as obras feitas em
papel rústico vendem mais devido ao caráter mais artesanal que aparentam. Alguns
funcionários de uma empresa local – localizada em Itajubá, a 26 km de Maria da Fé – parte
deles de nacionalidade francesa, procuram a Casa do Artesão para comprar produtos.
Normalmente, preferem os mais rústicos, pois transmitem a ideia de maior “sustentabilidade”.
(...) Tem um pessoal [de uma empresa local] que sempre vem aqui e são
franceses e procuram tudo o que é ecologicamente correto. Mas então
geralmente eles levam peças que tem fibra da bananeira, papel da fibra, palha,
sabe... (...)
Ela ressalta que os artesãos da Associação não fizeram qualquer tipo de curso de
artesanato. Sendo assim, cada um faz da maneira como acha melhor e emprega nas suas obras
sua característica pessoal. Ela cita o seu próprio exemplo, que faz anjos de fibra rústica e não
faz os olhos do boneco, sendo isso parte da sua identidade como artesã.
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É interessante ressaltar que os artesãos iniciaram a venda de suas peças na Casa do
Artesão, ao perceberem que de uma atividade que para eles era terapêutica e prazerosa, haveria
a possibilidade de se extrair renda.
A Associação Casa do Artesão existe há seis anos, porém, ao contrário da Cooperativa,
não é tão conhecida. Através de materiais como palha de milho, bucha, semente, jornais e
madeira MDF reciclada, são feitas peças como bonequinhas, anjos, flores, suportes de
guardanapo. O preço das peças é definido com base no custo do material e no tempo de
produção. O período de maior venda é entre maio e setembro (Outono/ Inverno) e o pico ocorre
durante o Festival de Inverno "Arte e Design".
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
No dia 12 de agosto de 2014, uma das artesãs da Associação Casa do Artesão
Mariense, chamada Cláudia, concedeu uma visita deste grupo de trabalho à sua casa. Durante a
conversa, ela criou duas bonecas, enquanto contava sobre a utilização da fibra da bananeira,
sobre o processo de fabricação das peças, seu valor histórico e sobre alguns aspectos da venda
das peças.
Cláudia contou que, ao participar de um curso, foi mostrada à ela uma técnica utilizada
para produzir um determinado tipo de peça que utiliza a fibra da bananeira, contudo, o instrutor
manteve o segredo da prática. Desta forma, através de tentativa e erro, a artesã descobriu a
técnica e passou a aplicá-la. Em outra ocasião, outra artesã pediu à Cláudia que lhe ensinasse a
produzir as bonecas que ela faz, porém Cláudia – em uma espécie de barganha – lhe disse que
em troca, esta artesã teria que lhe ensinar a produzir bolsas.
A boneca feita durante a entrevista foi composta basicamente de fibra de bananeira e
palha de milho e todo o processo de produção foi feito de maneira rústica, encaixando e
amarrando as palhas de milho e as fibras. Apenas durante o acabamento foi utilizada um pouco
cola. A artesã, durante a produção, associa um nome e uma história à peça, imaginados por ela
mesma. Alguns artesanatos são inspirados na história da própria região. Ela cita já ter feito
benzedeiras, parteiras, escravos e a Senhora Maria da Fé (1).
Sobre o valor de venda das peças, Cláudia disse ter recebido um curso do SEBRAE, em
que ela teria aprendido a relacionar o tempo de produção aos custos, definindo o preço do
produto. Ela ainda conta sobre outros aspectos da venda, o local. Disse que algumas bonecas
feitas na cooperativa, apesar de serem inferiores às dela, são vendidas por um preço maior. A
artesã associou também outra situação, em que determinada peça que ela produz não é colocada
à venda na Associação. Ela explana que lá o produto é desvalorizado – custando cerca de 20
reais –, em vista que, se ela negociar diretamente com algum comerciante – cuja loja é mais
sofisticada – a peça poderia valer até 80 reais.
(1)
Maria da Fé: O nome do município tem duas possíveis origens: a primeira homenagearia uma mulher
empreendedora e enérgica, que dirigia a fazenda e seus negócios. A outra seria a de uma jovem bonita,
vinda com uma das bandeiras que cruzaram aquelas paragens e que teria se casado com o cacique
Jiquitibá, por ter ele concordado em desvendar o segredo das minas de ouro da região para
exploradores. Como esposa do cacique, ela teria feito erigir um grande cruzeiro de madeira, símbolo de
sua fé, convertendo a tribo à religião cristã.
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No dia 27 de agosto de 2014, outra entrevista foi realizada, desta vez na própria Casa do
Artesão, com as irmãs Maria Ivone Siqueira Santos e Maria Regina Siqueira Santos, que são
artesãs e trabalham principalmente com o fuxico. Ambas aprenderam essa prática com a mãe, a
qual aprendeu com a avó, sendo uma cultura passada de geração em geração. Entretanto, Maria
Ivone conta que possui uma filha, de 38 anos, e um neto, os quais não se interessam pela pratica
do artesanato.
Maria Ivone nos mostrou uma capa de almofada de fuxico todo branco, feita por ela. Segundo
ela, este tipo de peça não vende muito hoje em dia pois a procura tem sido maior por peças
coloridas. Ela conta que há uns 12 anos, atrás quando trabalhava na Cooperativa (antes de
entrarem para a Associação), só eram feitas peças monocromáticas. Desde que ela saiu,
começou-se a fazer peças mais coloridas.
Elas contam que não costumam estocar peças: os tipos e a frequência com que produzem é
controlado pela demanda dos produtos. Além disso, uma das artesãs chegou a comentar que
sabe da existência de uma máquina de fazer fuxico e diz que tem consciência que um dia a
produção manual acabará.
A relação entre o artesão e sua obra pode ser analisada no fato de Cláudia criar histórias para
suas bonecas. Essa relação é extremamente pessoal e faz parte do imaginário e identidade de
cada artesão, pois ele projeta isso em suas obras. Ao invés de extinto, isto pode ser usado para
agregar mais valor comercial ao produto: durante a entrevista, foi dada a ideia à artesã de
adicionar etiquetas às peças, para contar essas histórias, pois isso aumentará o interesse pelas
peças.
Na entrevista de Cláudia também foi notada a relação de posse que alguns artesãos possuem
para com o conhecimento da técnica, como no caso da barganha realizada pela artesã, descrito
no tópico anterior. Esta tendência não favorece o crescimento do artesanato na região, visto que
impede a difusão e o aprimoramento do conhecimento. Isso é um aspecto da cultura que se
desfaz quando se transforma essa técnica em mera propriedade intelectual para fins
mercadológicos.
Essa preocupação com a preservação do carater cultural do artesanato se dá também devido a
fenômenos que já ocorrem com os artesãos. No caso de Maria Ivone, por exemplo, o relato de
que sua filha não se interessa pela prática do fuxico mostra a perda através das gerações de uma
tradição familiar. Isso ocorre devido a uma série de fatores, como evolução dos meios de
comunicação e da conciência de mundo. Há de se considerar que, embora seja feito um esforço
na direção contrária, em certa medida esse processo é natural e inevitavel.
As duas entrevistas também nos mostraram um aspecto interessante: O ambiente em que o
produto é vendido interfere diretamente no valor econômico da peça. As pessoas costumam
valorizar mais as peças vendidas em lojas de decoração, vistas como sofisticadas, do que as
mesmas peças vendidas na loja da Associação, por exemplo. Isso é preocupante pois mostra
uma visão equivocada de alguns setores da sociedade ao atribuirem menor valor ao trabalho do
artesanato. A mudança nesse tipo de pensamento se faz necessária não somente para a
valorização do artesão mas também para a construção de uma conciência mais madura e
positiva.
Uma preocupação das artesãs é com relação ao design da peça, uma vez que influencia
diretamente nas vendas. Isso inclui modelo, tipos de peças, cores e tipos de acabamento. Nesse
ponto, a universidade possui muito a contribuir em consultoria. Outro problema enfrentado pela
Associação é com relação a obtenção da matéria-prima necessária (em alguns tipos de
artesanato) e infra-estrutura necessária para a expansão do público-alvo. Isso possibilitaria
poderem vender seus produtos a clientes de regiões mais distantes, coisa que já é feita pela
Cooperativa.
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A questão de trazer soluções que insiram a Associação no mercado e economia regional
preservando suas caracteristicas cuturais só é possível se for concebida não apenas pela
universidade, mas sim desta em conjunto com os próprios artesãos. O objetivo é criar uma
dinâmica diferente, que permita aos artesãos manterem sua relação social com o trabalho que
desenvolvem e transforma-lo em uma atividade mais rentável. Essa é exatamente a proposta
das Tecnologias Sociais, logo, o embasamento em seus conceitos e métodos é fundamental para
o desenvolvimento do trabalho e da associação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados obtidos nos permitiram concluir que a formação da Associação não é só um
elemento de otimização das vendas, mas também algo enraizado na vivência e no imaginário
deles. A atividade de consultoria aqui se torna mais complexa, entretanto, também mais
profunda em termos de desenvolvimento social, que considera não apenas o aspecto
econômico, mas a complexidade do ser humano como um todo.
Mas reconhece-se que há mudanças passíveis de serem feitas, em especial em termos de
infraestrutura, que poderiam melhorar a rentabilidade da prática do artesanato. Sendo assim,
aconselha-se que a consultoria foque na valorização do produto através da evidência de seu
caráter cultural e na busca de novos mercados, utilizando para isso a teoria das Tecnologias
Sociais. A visão preconceituosa em relação ao dito “trabalho mais rústico” do artesãos deve ser
desconstruída para que o artesanato possa ser rentável equanto se preserva seu caráter cultural.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DAGNINO, Renato. Neutralidade da ciência e determinismo tecnológico. Campinas, Editora da Unicamp,
2008.
IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Dados do município de Maria da Fé, Minas Gerais, 2013.
Disponível em: < http://cod.ibge.gov.br/BJ7>. Acesso em: 05 outubro 2013.
LATOUR, B. Jamais fomos modernos: ensaio de antropologia simétrica. Rio de Janeiro, 1994.
LATOUR, Bruno. Reagregando o social. Editora EDUFBA/Edusc, 2005.
PREFEITURA MUNICIPAL DE PEDRALVA. Dados do município de Pedralva. Disponível em:
<http://www.pedralva.mg.gov.br/assets/file/DADOS%20DE%20PEDRALVA.pdf>. Acesso em: 17 janeiro 2014.
SECRETARIA DE ESTADO DE CULTURA DE MINAS GERAIS. Artesanato no Sul de Minas é destaque
internacional por promover inclusão social e revitalização econômica, 2012. Disponível em:
<http://www.cultura.mg.gov.br/component/gmg/page/680-artesanato-no-sul-de-minas-e-destaque-internacionalpor-promover-inclusao-social-e-revitalizacao-economica> Acesso em: 04 janeiro 2014.
Guilherme Augusto Lemos Fest1 ([email protected])
Thelma Adielly de Carvalho Ribeiro1 ([email protected])
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