CÉSAR OLIVEIRA RIBEIRO
INAPLICABILIDADE DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE ÀS
PESSOAS JURÍDICAS
Salvador/BA
- 2011 -
RESUMO
O presente trabalho visa perquirir se cabe a extensão dos direitos da personalidade às pessoas
jurídicas, como este vem sendo aplicado rotineiramente nos tribunais brasileiros e pela
interpretação que vem sendo dada ao artigo 52 do código civil. Para tanto veremos as bases
que fundamentam a teoria das pessoas jurídicas, bem como dos direitos da personalidade,
com vistas a percebemos que a diferença de valores que permeiam estes institutos
impossibilita qualquer interpretação no sentido de fazer a aplicação dos direitos da
personalidade às pessoas jurídicas. Isto porque os direitos da personalidade fundamentam-se
na dignidade da pessoa humana, enquanto que as pessoas jurídicas têm por desiderato a
separação patrimonial e fomento à atividade econômica. Assim, o que tem se feito na doutrina
e jurisprudência é atentatório ao fundamento dos direitos da personalidade. Entretanto, tal
interpretação tem sido feita para resolver os casos de difícil comprovação ou liquidação de
danos, para os quais entendemos que a técnica de liquidação dos danos aos direitos da
personalidade pode ser estendida às pessoas jurídicas.
Palavras-chave: direitos da personalidade; pessoas jurídicas.
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ABSTRACT
This paper aims to question about the possibility to extend the personal rights to the
legal entities, as it is been done in the courts and by the interpretation of the civil law.
To accomplish this goal, we will study the base of the theory behind the corporations
and the personal rights, in order to understand the diference of values that exist in each
concept that makes impossible the extension of the individual rights to the legal entities.
This impossibility is due to the personal rights are based on the principle of human
dignity, while the corporations have the finality of segregate the patrimony and increase
the economy. What has been made in the studies and in the legal practice is offensive to
the foundation of the individual rights. However, this interpretation has been accepted
in order to solve the cases of hard proof or evidence of the amount of the damage, in
which we understand that the technique of liquidation of damage to the personal rights
can be extended to the corporations.
Keywords: personal rights; corporations.
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SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO.................................................................................................................
5
2. A PERSONALIDADE......................................................................................................
8
2.1. O RECONHECIMENTO DA PERSONALIDADE NA HISTÓRIA.............................
8
2.2. PERSONALIDADE JURÍDICA E PESSOA JURÍDICA............................................... 10
2.3. AS ESPÉCIES DE PESSOAS JURÍDICAS E SUA VINCULAÇÃO À
PATRIMONIALIDADE......................................................................................................... 15
2.3.1. As Sociedades.............................................................................................................. 16
2.3.2. As Fundações............................................................................................................... 18
2.3.3. As Associações............................................................................................................. 20
2.3.4. Os Partidos Políticos e as Organizações Religiosas................................................. 24
3. OS DIREITOS DA PERSONALIDADE........................................................................ 28
3.1. NOVAS PERSPECTIVAS DO DIREITO CIVIL........................................................... 28
3.2. ASPECTOS HISTÓRICOS............................................................................................. 32
3.3. NOÇÕES CONCEITUAIS.............................................................................................. 36
3.4. PRINCIPAIS CARACTERÍSITCAS.............................................................................. 39
3.5. PRINCIPAIS CLASSIFICAÇÕES E SUAS ESPECIFICIDADES................................ 42
3.5.1. Imagem......................................................................................................................... 45
3.5.2. Honra........................................................................................................................... 48
3.5.3. Privacidade.................................................................................................................. 51
3.5.4. Nome............................................................................................................................. 53
4. INAPLICABILIDADE DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE ÀS PESSOAS
JURÍDICAS........................................................................................................................... 57
4.1. DISPOSITIVOS LEGAIS E ENTENDIMENTOS JURISPRUDENCIAIS................... 57
4.2. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A INAPLICABILIDADE ÀS PESSOAS
JURÍDICAS............................................................................................................................ 59
4.3. PROTEÇÃO LEGAL AOS SUPOSTOS “DIREITOS DA PERSONALIDADE”
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DOS ENTES FICTÍCIOS....................................................................................................... 62
4.4. MÉTODOS DE APURAÇÃO DOS DANOS MATERIAIS DE DIFÍCIL
LIQUIDAÇÃO E/OU COMPROVAÇÃO SOFRIDOS PELAS PESSOAS JURÍDICAS.... 65
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................... 68
REFERÊNCIAS.................................................................................................................... 71
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1. INTRODUÇÃO
Com o advento da sociedade capitalista e a economia de escala, especialmente após a
Revolução Industrial, iniciou-se uma época de exploração do homem pelo próprio homem
diferente da escravidão que marcou a Antiguidade e a Idade Média.
Foram criados mecanismos de legitimação para que pudessem ser oprimidos os mais
fracos ou mais pobres em favor dos capitães de indústrias.
A partir daí começaram a surgir os movimentos humanistas, que pediam liberdade,
igualdade e fraternidade, numa tentativa de impor um respeito mínimo ao homem, enquanto
ser vivo diferenciado dos animais, dotado de inteligência e logo de compaixão e respeito ao
próximo.
Após as atrocidades vivenciadas na Segunda Guerra Mundial esse movimento ganha
ainda mais força e consolida os chamados direitos da personalidade.
O nosso objetivo com a presente pesquisa é perquirir se estes direitos da
personalidade, conquistados com muito sofrimento para a valorização dos seres humanos,
podem ser estendidos às pessoas jurídicas.
É importante salientar que o instituto da personalidade jurídica nasceu exatamente
para expandir as potencialidades humanas e permitir que o homem viesse a conseguir,
coletivamente, o que lhe é impossível individualmente. Além disso, as pessoas jurídicas foram
determinantes para a consolidação do modo de produção capitalista.
Por isso, o sistema jurídica dá personalidade e capacidade a estes entes, alçando-os a
um patamar de privilégios bastante semelhante ao das pessoas naturais.
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O tema da possibilidade de aplicação dos direitos da personalidade às pessoas
jurídicas é polêmico e sempre despertou querelas nos doutrinadores, posto que a divisão
entre os que apóiam e os que rechaçam a extensão sempre foi abissal.
Atualmente, aqueles que negam os direitos da personalidade aos entes fictícios têm
perdido espaço e adeptos, pois o Superior Tribunal de Justiça e o Código Civil parecem ter
encampado o posicionamento reverso. Desta forma, a quase totalidade dos manuais de direito
civil já verberam pela aplicabilidade dos direitos personalíssimos às pessoas jurídicas.
Ainda assim, doutrinadores como Pietro Perlingieri, Gustavo Tepedino, Renan Lotufo,
César Fiuza e Roxana Borges mantêm a resistência, fundamentando-se quase que
exclusivamente na tese de que os direitos da personalidade baseiam-se na dignidade da
pessoa humana, princípio fundamental do Estado Democrático de Direito Brasileiro, e logo não
poderiam ser aplicados aos entes coletivos.
A fundamentação trazida parece-nos bastante acertada, mas queremos ir além e
demonstrar que as pessoas jurídicas são entes vinculados aos seus patrimônios e
desenvolvimento de suas atividades, não podendo ter, desta maneira, vinculação com direitos
ligados a bens indisponíveis, inalienáveis e sem expressão econômica.
Por isso, entendemos que o nosso posicionamento tem originalidade, apesar de
fundamentar-se na doutrina dos citados juristas, tentando galgar um vôo um pouco mais
ousado.
Ao traçarmos estas idéias temos também que nos debruçar sobre a questão dos danos
de difícil comprovação e/ou liquidação sofridos pelos entes coletivos, posto que nestes casos é
que a jurisprudência tem se valido da doutrina dos direitos da personalidade, para liquidar tais
danos como morais e arbitrar um valor indenizatório. Veremos assim, qual a melhor forma de
resolver a questão sem sacrificar os direitos personalíssimos.
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Para chegar a tanto, utilizaremos a pesquisa bibliográfica como fonte principal, através
de livros, revistas especializadas, legislação, textos da rede mundial de computadores e
jurisprudência nacional.
Tentaremos, sempre que possível, utilizar uma abordagem relacionada à legislação
vigente, de forma a demonstrar que as idéias esposadas têm cabimento do direito positivo.
No segundo capítulo abordaremos as nuances das pessoas jurídicas, fazendo uma
abordagem histórica, conceitual e legal deste instituto, de forma a evidenciar que o mesmo se
fundamenta na patrimonialidade e na atividade econômica, sendo assim avesso aos princípios
da dignidade da pessoa humana. Explicitaremos as particularidades de cada tipo de pessoa
jurídica, limitando-nos ao campo do direito privado, para fundamentar o nosso
posicionamento.
No terceiro capítulo estudaremos os direitos da personalidade, revisando sua evolução
histórica para descobrirmos os pilares sobre os quais se erigiram estes direitos, bem como as
noções conceituais, características e classificações atuais que têm sido adotadas, explicitando
a incompatibilidade destas com os entes fictícios. Além disso, faremos uma breve
pormenorização das principais espécies de direitos da personalidade que são aplicados às
pessoas jurídicas.
Para finalizar, trataremos de como a jurisprudência e a legislação têm tratado o tema,
expondo suas fragilidades e construindo o nosso posicionamento, com base nas teorias de
diversos doutrinadores, e sugerindo uma resolução para a questão dos supostos direitos da
personalidade das pessoas jurídicas, de forma a não desampará-las, bem como para os danos
de difícil comprovação e/ou liquidação.
Para orientar o leitor, utilizaremos os termos pessoa jurídica, ente coletivo, ente moral
e ente fictício como indistintamente sinônimos, assim como os termos direitos da
personalidade e direitos personalíssimos. Também, o termo empresário será sempre
empregado no sentido de pessoa jurídica que explora atividade empresarial.
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As traduções existentes no texto foram livremente feitas por nós, assim como os grifos
das citações correspondem aos originais, salvo os casos em que expressamente avisaremos.
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2. A PERSONALIDADE
Este capítulo será dedicado ao estudo do surgimento da personalidade jurídica, tanto
para pessoas naturais quanto jurídicas, suas características e formas e também ao
entendimento dos conceitos e fundamentos das pessoas jurídicas, para entendermos a
possibilidade de aplicação dos direitos da personalidade as estes entes.
2.1. O RECONHECIMENTO DA PERSONALIDADE NA HISTÓRIA
Atualmente no Brasil, qualquer pessoa que nasce com vida tem personalidade jurídica
(como pessoa natural) sendo titular de direitos e podendo contrair obrigações, conforme
artigo 2º do Código Civil1. Também, a Lei Civil determina que determinadas agremiações de
pessoas ou patrimônios sejam dotadas de personalidade jurídica, com a mesma capacidade de
direitos e obrigações.
Entretanto, nem sempre foi assim.
Os registros históricos nos mostram que mesmo as pessoas naturais tinham restrições
para alcançar a personalidade plena.
Como registra Renan Lotufo, nos primórdios do direito romano, as pessoas poderiam ter
até três status, quais sejam status civitatis, status libertatis e status familiae. Apenas com a
cumulação das três condições o indivíduo poderia exercer plenamente seus direitos civis e
1
Art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a
concepção, os direitos do nascituro. BRASIL. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10/01/2002. Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>, acesso em 27/07/2011.
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políticos, sendo que no caso de perda do status libertatis, ou seja redução à condição de
escravo, o indivíduo perdia a personalidade jurídica.2
Pela lógica, concluímos que nesta época, aqueles que nasciam escravos, também
estavam desprovidos de possuírem direitos e obrigações, posto que eram tratados pelo direito
como res (coisa), como nos informa César Fiuza:
De qualquer forma, a personalidade é invenção do Direito. Por isso,
dizemos que personalidade é atributo ou valor jurídico. A
personalidade não é natural, tanto não é natural, que antigamente
havia seres humanos aos quais o Direito não atribuía personalidade.
Eram os escravos, considerados coisas perante o ordenamento
jurídico.3
Também em Roma, como informa Washington de Barros Monteiro, iniciou-se a
instituição de pessoas jurídicas, sendo que inicialmente, na primeira fase do Império Romano,
conheciam-se apenas certas associações de interesse público, como universitates, sodalitates,
corpora e collegia. Já no direito Justiniano, enriqueceu-se a pessoa jurídica com o acréscimo
das fundações.4
Vemos, assim, que os romanos subtraiam a algumas pessoas naturais o reconhecimento
da personalidade jurídica, enquanto que a atribuíam a entes fictícios. Desta forma, a
personalidade, nesta e outras épocas como veremos, era um direito subjetivo atribuído apenas
a certas pessoas naturais ou fictícias de acordo com a opção legislativa.
Durante a Idade Média, permaneceu a característica eletiva da atribuição da
personalidade pela lei, sendo que a Igreja Católica contribuiu para o desenvolvimento das
pessoas jurídicas, como veremos no próximo subitem.
Na modernidade, com o advento da economia capitalista e a necessidade da expansão
de mercados e de capacidade produtiva, passou-se a atribuir personalidade a todas as pessoas
2
LOTUFO, Renan. Curso Avançado de Direito Civil. Coordenação: Everaldo Augusto Cambler. Vol.
1: Parte Geral. 2ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. P. 90.
3
FIUZA, César. Direito Civil: Curso Completo. 7 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 109.
4
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 100.
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naturais e as pessoas jurídicas receberam regulamentação específica, com vistas ao
recrudescimento de suas atividades.
Mesmo com essa nova perspectiva, ainda prevalecia a ótica legalista da atribuição da
personalidade, sendo inclusive, que à época a teoria vigente das pessoas jurídicas era a da
ficção (como detalharemos adiante).
Por isso, após as duas guerras mundiais, com todas as atrocidades do holocausto, os
juristas voltaram a repensar os conceitos de personalidade para alterar o centro do universo
jurídico, deslocando o foco da lei para o ser humano. A partir desta mudança, até mesmo o
conceito das pessoas jurídicas foi alterado, para que estas passassem a ser reconhecidas como
meio de realização das necessidades humanas.
Quanto à esta mudança de foco, escrevem Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald:
Em quadro conclusivo, é lícito verberar que o reconhecimento da
fundamentalidade da dignidade da pessoa humana produz como
consectário lógico a reapreciação (em outras palavras, uma revisita)
dos velhos institutos (e dogmas) civilísticos, dentre os quais a
personalidade jurídica, a autonomia da vontade, o patrimônio, o
contrato, a propriedade e a família.5
Pelo exposto, esta brevíssima perspectiva histórica serve para relembrar que houve uma
mudança no paradigma da personalidade jurídica e, hoje, o epicentro e a justificativa é o ser
humano e sua realização plena, devendo este aspecto ser considerado em toda especulação
do ordenamento jurídico, abrangendo, especialmente os direitos da personalidade.
5
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito Civil – Teoria Geral. 7 ed. Rio de
Janeiro: Lúmen Júris, 2008. p. 101. (com grifos no original)
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Para Pietro Perligieri: “A personalidade é, portanto, não um direito, mas um valor ( o
valor fundamental do ordenamento) e está na base de uma série de situações existenciais, nas
quais se traduz a sua incessantemente mutável exigência de tutela”6.
Sendo assim, atualmente, temos um conceito de pessoa, inscrito na legislação civil
brasileira, que abarca todas as pessoas naturais (assim considerados todos os seres humanos
que nascem vivos) e também alguns tipos de associações de pessoas ou patrimônios, aos quais
se denominam pessoas jurídicas.
Resume desta forma Maria Helena Diniz,
pessoa é o ente físico ou coletivo suscetível de direitos e obrigações,
sendo sinônimo de sujeito de direito. Sujeito de direito é aquele que é
sujeito de um dever jurídico, de uma pretensão ou titularidade jurídica,
que é o poder de fazer valer, através de uma ação, o não-cumprimento
do dever jurídico, ou melhor, o poder de intervir na produção da
decisão judicial.7
Em apertada síntese poderíamos formular que pessoa é todo aquele ao qual o
ordenamento reconhece o direito de titularizar direitos, podendo exigi-los judicialmente.
Uma vez definido o conceito atual de personalidade, bem como os seus fundamentos
axiológicos e legais, passaremos, então, ao estudo mais detalhado das pessoas jurídicas que
constituem o objeto específico deste estudo.
6
PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil: Introdução ao Direito Civil Constitucional, tradução
Maria Cristina de Cicco. 3 ed. Riode Janeiro: Renovar, 2007. p. 155-156.
7
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 22 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 117-118.
v. 1.
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2.2. PERSONALIDADE JURÍDICA E PESSOA JURÍDICA
É da natureza do ser humano se reunir em grupamentos para a completude de sua
vivência ou para praticar certas atividades ou mesmo para alcançar determinados fins, para os
quais sua força e vontade individuais não são suficientes. Em certas ocasiões, esses
grupamentos se tornam tão sólidos e necessários, que passam a adquirir autonomia em
relação àqueles que o formam (conjunto de indivíduos), até mesmo sobrevivendo-lhes. Para
Caio Mário da Silva Pereira,
o sentimento gregário do homem permite afirmar que a associação é
inerente à natureza, corrigindo-lhe as fraquezas e suprindo com a sua
continuidade a brevidade da vida. O espírito criador engendra então
entidades coletivas, resultantes de um agregado de pessoas ou de um
acervo de bens, por via dos quais logra a obtenção de resultados mais
positivos e mais amplos do que consegue o esforço individual
isolado.8
A estes aglomerados coube à lei reconhecer a personalidade jurídica, como forma de
dar-lhes plenitude para o atingimento de seu objetivo maior, que é a realização dos seres
humanos que a eles se agregam.
Naturalmente, que este reconhecimento não foi de imediato e, na verdade, foi bastante
lenta a evolução histórica da pessoa jurídica, iniciando-se na Idade Média e ainda tendo
conflitos conceituais hodiernamente.
No direito romano, apesar da existência das societas e das universitates, não havia a
personalidade separada desses entes, apenas se reconhecendo a personalidade e capacidade
jurídica ao Estado.
Conforme ensina Ulhoa,
8
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 20 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p.
297. vol. 1.
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Os alicerces da teoria da pessoa jurídica encontram-se na Idade
Média, em noções destinadas a atender às necessidades de
organização da Igreja Católica e preservação de seu patrimônio.
Naquele tempo, o direito canônico separava a Igreja, como
corporação, de seus membros (os clérigos), afirmando que aquela tem
existência permanente, que transcende a vida transitória dos padres e
bispos. Também por ser a Igreja uma corporação independente de seus
integrantes, nem todos podem falar legitimamente por ela, mas,
dependendo do assunto, apenas os membros de determinada
hierarquia, consultando previamente, por vezes, alguns de seus pares.
Outra importante implicação do reconhecimento da Igreja como uma
corporação inconfundível com os seus integrantes era pertinente aos
bens. A afirmação da vida da Igreja em separado leva à distinção
entre o patrimônio dela e o de cada membro do clero.9
Sendo assim, curiosamente, foi a Igreja responsável pela fundação do instituto que, mais
tarde, serviria como um dos alicerces para o desenvolvimento do capitalismo.
Com a Revolução Comercial, o reconhecimento das pessoas jurídicas e sua legislação se
expande, surgindo as sociedades comerciais, nas quais o instituto ganha força e demonstra sua
verdadeira razão de ser. Principalmente no que tange à separação patrimonial e titularidade
obrigacional, revelou-se a relevância da pessoa jurídica.
Atualmente, podemos definir a pessoa jurídica como entidade formada por um conjunto
de pessoas ou de bens, que visam a determinado fim e à qual se reconhece a personalidade.
Nota-se que o mais importante da conceituação é formação de um único ente, que detenha
capacidade jurídica própria, ou seja, a personalização não é uma conseqüência aleatória da
formação do conjunto de pessoas ou bens com destinação específica, mas um de seus intuitos
primeiros.
Desta forma, cabe-nos reformular o conceito apresentado, adotando a lição de Fábio
Ulhoa, “a pessoa jurídica é uma técnica de separação patrimonial em que se atribui
9
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil. 1 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 1. p. 230. (sem
grifos no original)
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personalidade
própria
ao
patrimônio
segregado”
10
.
Este
conceito
inspira-se,
fundamentalmente, no desiderato da personificação.
Veja-se aqui, no conceito esposado pelo autor que o fundamento da pessoa jurídica e
sua dinâmica estão essencialmente ligados ao patrimônio sobre o qual esta se erige.
Por outro lado, Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, ao tratarem da fundamentação do
reconhecimento das pessoas jurídicas relembram que toda a nova ordem jurídica (e logo a
civil) deverá estar voltada para a realização da dignidade da pessoa humana, desta forma a
pessoa jurídica, independentemente de sua atividade (ou finalidade) deverá desempenhar
uma função social. Por isso, para os citados autores, a atribuição de personalidade para os
entes fictícios só tem razão de ser na medida em que estes contribuem para a plena realização
humana11.
Logo, são elementos da pessoa jurídica: uma vontade humana que lhe origina, que pode
ser coletiva ou singular, esta no caso da fundação, como veremos adiante; a conjugação de
pessoas ou dotação de um patrimônio para a afetação a determinado fim; licitude de sua
atividade; e capacidade jurídica reconhecida legalmente.
Existem diversas teorias para explicar a natureza jurídica da pessoa jurídica, assunto que
foi e é alvo de intrincadas discussões e teses, permanecendo, ainda hoje, como não resolvido
qual a teoria mais adequada, vez que as mais recentes ainda estão se amoldando. Apesar
disso, Orlando Gomes, com sua habitual precisão observava que a discussão sobre o tema
“carece de maior interesse, uma vez que, seja qual for a explicação, nenhuma influência
decisiva exerce na construção técnica hoje incorporada às legislações” 12 . Inobstante a
argumentação prática do citado doutrinador, abordaremos o tema de forma a melhor
solidificar o entendimento das pessoas jurídicas.
10
COELHO, Fábio Ulhoa. op. cit. p. 232.
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito Civil – Teoria Geral. 7 ed. Rio de
Janeiro: Lúmen Júris, 2008. p. 260-261.
12
GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 186.
11
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As teorias mais importantes são a da ficção, a realidade técnica e a realidade das
instituições jurídicas. A teoria da ficção, cujo maior expoente é Savigny, adota a idéia que só o
homem pode titularizar relações, sendo que a pessoa jurídica é uma criação artificial da lei
(ficção), logo inexistente no plano real. Esta teoria é criticada por não reconhecer a
necessidade e existência real da pessoa jurídica, estando em franco desuso. Já a teoria da
realidade técnica, “a pessoa jurídica é uma realidade (abstrata) reconhecida pelo direito. O
direito não a cria apenas a reconhece. Ela nasce da iniciativa de pessoas humanas e é deferida
pelo Estado”13.
A última teoria, da realidade das instituições jurídicas, cuja referência doutrinária está
em Hauriou, entende a pessoa jurídica como idéia derivada da lei, sendo concedida a certos
grupamentos de pessoas ou destinações patrimoniais, para a consecução de determinados fins
específicos. Logo, a pessoa jurídica seria uma realidade aliada a uma vontade humana, as quais
têm o reconhecimento legal.
Vê-se assim, que qualquer que seja a teoria adotada o principal fundamento é o
reconhecimento legal e a vontade humana.
A partir de sua constituição, que no direito brasileiro se dá no registro no órgão
competente, a pessoa jurídica adquire sua personalidade distinta, como bem ressalta Cristiano
Chaves de Farias,
A pessoa jurídica, regularmente constituída e personificada, conta com
os seguintes caracteres: a) personalidade distinta dos seus
instituidores; b) patrimônio também distinto dos seus membros; c)
existência jurídica diversa de seus integrantes; d) não podem exercer
atos que sejam privativos de pessoas naturais, em razão de sua
estrutura biopsicológica; e) podem ser sujeito ativo ou passivo em atos
civis e criminais14.
13
BRUSCATO, Wilges Ariana. Empresário Individual de Responsabilidade Limitada. São Paulo:
Quartier Latin, 2005. p. 148.
14
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito Civil – Teoria Geral. 7 ed. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 265.
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Desenham-se, aqui, mais uma vez, como características mais importantes da pessoa
jurídica sua separação patrimonial e sua capacidade jurídica.
A pessoa jurídica é pólo de relações autônomo, podendo titularizar direitos e cumprir
obrigações, como as próprias pessoas naturais. É reconhecida a capacidade jurídica geral a
esses entes, para que possam atuar no mundo real e desenvolver seus fins precípuos, sempre
o fazendo em nome próprio. Assim, também, quando uma sociedade pratica ato ilícito, ela
mesma deverá responder e arcar com este, pois uma ação contra os sócios recairia na
ilegitimidade passiva, posto que o sócio não praticou ato e sim a sociedade. Isto porque, para
atuar no mundo real, as pessoas jurídicas precisam se fazer representar por pessoas naturais,
de forma que se externe sua vontade.
Outro ponto fundamental da pessoa jurídica é a autonomia patrimonial, concernente na
segregação entre seu patrimônio e o de seus instituidores. Este é o ponto que mais interessa
ao Direito Empresarial e Civil, pois serve de fundamento à responsabilidade limitada. Assim,
por exemplo, ao instituir uma sociedade, cada sócio contribui com uma fração do capital
social, porém, constituída a sociedade, aquele capital passa a pertencer a ela, não mais
podendo utilizá-lo o sócio, o qual passa a ter uma participação societária. “A partir do instante
em que o sócio separa determinado bem ou quantia monetária de seu patrimônio pessoal e o
outorga à sociedade empresária, extinguem-se quaisquer vínculos entre a pessoa do sócio e o
bem”15, sendo assim, “não existe comunhão ou condomínio dos sócios relativamente aos bens
sociais; sobre estes os componentes da sociedade empresária não exercem nenhum direito, de
propriedade ou de outra natureza. (...) No patrimônio dos sócios encontra-se apenas a
participação societária”16.
Esta autonomia importa na conclusão de que, como titular de capacidade jurídica e de
patrimônio próprio por si administrada, a pessoa jurídica deve responder com os seus bens
pelas obrigações a elas imputadas. Só há de se falar em responsabilidade de sócios ou
15
16
BRUSCATO, Wilges Ariana. op. cit. p. 156.
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial, p. 15, v. 2.
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administradores em casos de fraude, como veremos adiante, ou de responsabilidade
subsidiária se a lei assim estipular. Logo, no caso de sociedades empresárias, respondem pelas
obrigações sociais apenas os bens sociais, apenas cogitando-se da busca ao patrimônio dos
sócios, nos casos de responsabilidade ilimitada, após o exaurimento do patrimônio da
sociedade.
Esta autonomia, entretanto, é mitigada, em alguns pontos, pela lei e também pela
jurisprudência. Sendo assim, tem-se tido a responsabilidade solidária dos sócios ou
administradores de pessoa jurídica nos casos de dívida fiscal, trabalhista, previdenciária,
consumerista, danos ao meio ambiente e atos prejudiciais ao livre mercado (livre
concorrência). Como bem resume o Fábio Ulhoa,
O princípio da autonomia patrimonial tem sua aplicação limitada,
atualmente, às obrigações entre empresários. Se o credor é empregado,
consumidor ou o estado, o princípio não tem sido prestigiado pela lei
ou pelo juiz17.
Estas exceções têm sua razão de ser em virtude das diversas fraudes perpetradas pelas
sociedades fictícias, às quais têm levado a uma perda para os empresários de boa conduta e da
sociedade como um todo.
Isto porque, o princípio da autonomia patrimonial é alicerce do direito societário, tendo
especial função de incentivar a aplicação de recursos em atividades produtivas, tirando-os da
exclusiva especulação.
Novamente, citamos Fábio Ulhoa:
Se não existisse o princípio da separação patrimonial, os insucessos na
exploração da empresa poderiam significar a perda de todos os bens
particulares dos sócios, amealhados ao longo do trabalho de uma vida
ou mesmo de gerações, e, nesse quadro, menos pessoas se sentiriam
estimuladas a desenvolver novas atividades empresariais. No final, o
potencial econômico do País não estaria eficientemente otimizado e as
17
Idem, ibidem, p. 20.
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pessoas em geral ficariam prejudicadas, tendo menos acessos a bens e
serviços.18
A personalidade jurídica distinta, então, deu vida à separação patrimonial, que por sua
vez permitiu que as pessoas jurídicas desenvolvessem e expandissem suas atividades de forma
impressionante.
Entretanto, como bem ressaltamos neste tópico e insistiremos no decorrer deste
estudo, o fundamento e todo o desenvolvimento das atividades das pessoas jurídicas tem seu
derredor no patrimônio social, ainda que permeado pelas vontades de seus integrantes.
Este patrimônio, uma vez destacado das pessoas naturais que o cederam, deixam de
instituir esfera humana, em seu sentido estrito, passando a compor empresa ou passará a ter
destinação não lucrativa, mas ainda voltada ao desenvolvimento da atividade de uma pessoa
jurídica.
Por isso, como passaremos a desenvolver, parece-nos que todas as pessoas jurídicas
estão intrinsecamente ligadas aos seus respectivos patrimônios e ampliação destes,
destoando, desta forma dos princípios que regem os direitos da personalidade,
especificamente da dignidade da pessoa humana.
2.3. AS ESPÉCIES DE PESSOAS JURÍDICAS E SUA VINCULAÇÃO À PATRIMONIALIDADE
O Código Civil vigente divide as pessoas jurídicas em de direito público (interno e
externo) e direito privado. Nesta análise, limitaremo-nos ao estudo das de direito privado,
posto que são as regidas pelo Direito Civil e mais especificamente sobre as quais tem girado a
controvérsia concernente aos direitos da personalidade.
18
Idem, ibidem, p. 16.
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A própria lei civil enumera, em lista fechada, quais são os tipos de pessoa jurídicas, a
saber:
Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado:
I - as associações;
II - as sociedades;
III - as fundações.
IV - as organizações religiosas;
V - os partidos políticos.19
Apesar de, a primeira vista, parecer que alguns tipos não serão vinculados à idéia de
patrimonialidade, ensejando um possível reconhecimento de direitos extrapatrimoniais a
estes, tal idéia deverá ser plenamente rechaçada, como demonstraremos.
Começaremos pelas sociedades, para as quais a defesa do nosso pensamento é de mais
fácil aceitação.
2.3.1. As Sociedades
Conceituando as sociedades, Cristiano Chaves e Nelson Rosenval apresentam a seguinte
síntese: “As sociedades são pessoas jurídicas que visam, almejam, o lucro, com o objetivo de
reparti-lo entre os sócios”20. Parece-nos que o conceito apresentado pelos autores já sintetiza
sem qualquer dúvida o que queremos explicar neste item, mas iremos além, após conceituálas.
O artigo 981 do Código Civil traz disposição de clareza solar sobre o conceito das
sociedades:
19
BRASIL. Código Civil – Lei nº 10.406, de 10/01/2002. Disponível
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm>, acesso em 27/07/2011.
20
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson, op. cit., p. 269.
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em
Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que
reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o
exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos
resultados.21
Vemos assim que objetivo da sociedade é exercer atividade para partilhar o resultado
entre seus sócios. Dependendo da forma de organização e da atividade a ser explorada, as
sociedades poderão ser empresárias ou simples, conforme artigos 966 e 982 do Código Civil.
Vale citar que a inclusão das disposições legais referentes às sociedades empresárias no
Código Civil foi de grande revolução no Direito Privado, caminhando no sentido da unificação
pretendida por muitos e rechaçada por outros.
O ato que dá surgimento às sociedades é o contrato social, como informam Pablo Stolze
e Rodolfo Pamplona, sendo este contrato, depois de devidamente registrado, o constitutivo da
personalidade jurídica da sociedade.
Em sua conceituação, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona registram que as sociedades são
pessoas jurídicas coletivas (corporações) que têm como finalidade precípua a exploração de
atividade econômica para partilhar os lucros desta auferidos.22
Importante salientar que as definições supracitadas referem-se a todos os tipos de
sociedades, não somente as empresariais, nas quais o intuito lucrativo é mais acentuado.
Sendo assim, temos que a sociedade é uma reunião de pessoas, em torno de um
patrimônio, para deste extrair o máximo retorno econômico, com a posterior divisão da renda
entre os componentes.
Inobstante todos os tipos societários existentes (limitada, anônima, em comandita ou
em nome coletivo) todas estarão intrinsecamente voltadas para o exercício de uma atividade
(prestação de serviço ou comércio), pela qual tentam auferir retorno financeiro para divisão
entre os sócios, conforme informa Flávio Tartuce:
21
BRASIL, Código Civil, op. cit.
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. 5 ed. São
Paulo: Saraiva, 2004. p. 220.
22
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a) Sociedades empresárias – são as que visam a uma finalidade
lucrativa, mediante exercício de atividade empresária.
(...)
b) Sociedades simples – são as que visam, também, a um fim
econômico (lucro), mediante exercício de atividade não empresária.23
É importante salientar ainda que as sociedades podem ser constituídas por pessoas
jurídicas, ou seja, os sócios podem ser pessoas jurídicas, inexistindo, desta forma, pessoas
naturais como sócias.
É o caso de sociedades controladas, conforme permissão do artigo 1.098 do Código Civil.
A Lei das Sociedades por Ações (Lei nº 6.404/76) também permite que a pessoa jurídica seja
acionista e, no caso das subsidiárias integrais, que uma única pessoa jurídica titularize todas as
ações de outra, na forma dos artigos 116 e 251 da referida lei, in verbis:
Art. 116. Entende-se por acionista controlador a pessoa, natural ou
jurídica, ou o grupo de pessoas vinculadas por acordo de voto, ou sob
controle comum, que:
a) é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo
permanente, a maioria dos votos nas deliberações da assembléia-geral
e o poder de eleger a maioria dos administradores da companhia; e
b) usa efetivamente seu poder para dirigir as atividades sociais e
orientar o funcionamento dos órgãos da companhia.
Art. 251. A companhia pode ser constituída, mediante escritura
pública, tendo como único acionista sociedade brasileira.24
Vê-se, desta forma, que o elemento humano, nas sociedades, apesar de importante
para a sua gênese e funcionamento, não estará no centro de suas atividades e mesmo de seus
interesses, posto que a finalidade precípua do lucro fatalmente sobrepujará qualquer outra,
uma vez que vivemos em regime capitalista.
23
TARTUCE, Flávio. Direito Civil, 1: lei de introdução e parte geral. 4 ed. São Paulo: Método, 2008. p.
227.
24
BRASIL. Lei nº 6.404, de 15/12/1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6404consol.htm>, acesso em 25/07/2011.
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Por isso, não há como se olvidar que nas sociedades o fim é o lucro, sendo certo que
todas as conseqüências de danos praticados a elas também serão patrimoniais, concernentes
na diminuição do patrimônio social ou mesmo na redução do lucro ou sua expectativa.
2.3.2. As Fundações
As fundações, curiosamente, são pessoas jurídicas que se organizam em torno de um
patrimônio, conforme nos informam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona:
Diferentemente das associações e das sociedades, as fundações
resultam não da união de indivíduos, mas da afetação de um
patrimônio, por testamento ou escritura pública, que faz o seu
instituidor, especificando o fim para o qual se destina.25
Vê-se, assim, que o epicentro sobre o qual se erige a fundação é um patrimônio, na
verdade, um patrimônio afetado a um fim.
Segundo Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, as fundações resultam da congregação
de três elementos: patrimônio, finalidade e afetação do patrimônio a uma finalidade
específica.26
Continuando a lição sobre fundações, os citados juristas referem que o ato de instituição
da fundação tem forma prescrita em lei, devendo ser feita através da reserva de determinados
bens pelo instituidor, sendo que esta reserva será feita por escritura pública (se o instituidor
25
26
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo, op. cit., p. 225.
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson, op. cit., p. 272.
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ainda estiver vivo – ato inter vivos) ou por testamento (caso o instituidor queira a destinação
para além de sua vivência – causa mortis).27
A grande questão que faz os juristas não perceberem a vinculação da fundação à
patrimonialidade é a sua finalidade altruística, conforme requisito do parágrafo único do artigo
62 do Código Civil28 e como bem define Maria Helena Diniz:
A fundação deve almejar a consecução de fins nobres, para
proporcionar adaptação à vida social, a obtenção da cultura, do
desenvolvimento intelectual e o respeito de valores espirituais,
artísticos, materiais ou científicos. Não pode haver abuso,
desvirtuando-se os fins fundacionais para atender a interesses
particulares do instituidor, por exemplo.29
Face a essas definições e requisitos, pode-se enganosamente concluir que a fundação
não estaria vinculada à patrimonialidade, contudo sua própria gênese assim está.
Veja-se que sem um patrimônio inicial, não se constitui uma fundação. Além disso, no
exercício de suas atividades, a fundação precisa gerir e extrair de seu patrimônio o máximo de
retorno possível, de forma a concretizar suas finalidades, posto que sem recursos econômicos,
estará condenada á ruína.
Devemos ressaltar que a atividade a ser exercida pela fundação, apesar de
possivelmente gerar retorno econômico, não pode ter esta conotação intrínseca. Assim, é
lícito à fundação que realiza pesquisas médicas patentear e explorar esta patente de uma
descoberta, devendo, muito embora, reverter os recursos aferidos para novas pesquisas e sua
manutenção administrativa.
27
Idem, ibidem, p. 273.
A fundação somente poderá constituir-se para fins religiosos, morais, culturais ou de assistência.
BRASIL. Código Civil – Lei nº 10.406, parágrafo único do artigo 62, de 10/01/2002. Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm>, acesso em 25/07/2011.
29
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: parte geral. V. 1. 22 ed. São Paulo: Saraiva,
2005. p. 211.
28
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É preciso entender que uma fundação, por ter um patrimônio limitado (no ato de sua
instituição), só sobreviverá por longa data se sua atividade tiver algum retorno econômico ou
se aqueles que dela participarem ou dela usufruírem fizerem doações.
O próprio Código Civil prevê, em seus artigos 63 e 69, que os bens destinados á
fundação podem ser ou virem a ser insuficientes ao seu funcionamento, hipótese em que a
pessoa jurídica será liquidada e seus bens direcionados a outra fundação de finalidade similar.
Sendo assim, a própria legislação prevê que os bens destinados à constituição do ente
fundacional devem ser suficientes e capazes de lhe conferir funcionalidade e autonomia
financeira e administrativa, pois do contrário inviabiliza-se a atividade.
Apesar de vinculada ao seu patrimônio e à rentabilidade deste ou graciosidade de seus
seguidores, a lei proíbe expressamente que aqueles que compõem sua diretoria ou conselho
diretivo venham a auferir remuneração em razão da rentabilidade deste patrimônio ou por
qualquer outra razão, posto que aí sim estar-se-ia dando finalidade lucrativa à fundação.
Neste sentido, é a lição de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona:
Cumpre-nos observar que o legislador cuidou de inserir parágrafo
único no referido art. 62 do CC-02 [Código Civil de 2002],
consagrando o elemento finalístico da fundação, que somente poderá
constituir-se ‘para fins religiosos, morais, culturais ou de assistência’.
Escapa, pois, do permissivo legal a entidade supostamente fundacional
que empreenda atividade econômica com escopo lucrativo.
Não se admite, por outro lado, sobretudo por sua precípua finalidade
social, que a diretoria ou conselho deliberativo da fundação,
desvirtuando inclusive a vontade do instituidor, aliene
injustificadamente bens componentes de seu acervo patrimonial.
Sustentamos que toda alienação demanda alvará judicial, devendo ser
devidamente motivada, em procedimento de jurisdição graciosa, com
a indispensável intervenção do Ministério Público.30
30
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo, op. cit., p. 226.
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Vemos, claramente que se proíbe o escopo lucrativo, mas a extração de resultados do
patrimônio é imperiosa para a sobrevivência da fundação, caso esta não seja sustentada pela
doação de seus asseclas.
Neste diapasão, a fiscalização do Ministério Público prevista na lei civil deve exatamente
impedir que sejam utilizadas as fundações como meio transverso de enriquecimento sem
causa ou evasão fiscal.
2.3.3. As Associações
A maior parte dos doutrinadores, ao realizar estudo sobre os tipos de pessoas jurídicas,
engloba as sociedades e associações num só gênero, denominado corporações. As
corporações, pela definição, são grupos de pessoas que se unem a partir de um sentimento
comum (affectio societatis), para alcançarem, conjuntamente determinado fim.31
Vemos assim que há uma similaridade entre as associações e sociedades, concernentes
no elemento que as fazem surgirem, qual seja a aglomeração de pessoas com o mesmo
objetivo e com o intuito de somarem esforços para alcançá-lo.
“As associações são entidades de direito privado, formadas pela união de indivíduos
com o propósito de realizarem fins não-econômicos”, conforme ensinam Pablo Stolze e
Rodolfo Pamplona e continuam informando que:
O traço peculiar às associações civis, portanto, é jsutamente a sua
finalidade não-econômica – podendo ser educacional, lúdica, religiosa
etc. Resulta, conforme se anotou, da união de pessoas, geralmente em
grande número (associados), e na forma estabelecida em seu ato
constitutivo denominado estatuto.32
31
32
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson, op. cit., p. 268-269.
GAGLIANO, Pablo Stolze; Rodolfo Pamplona. op.cit., p. 215.
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Temos assim que as associações resultam da conjunção de vontades de pessoas, para a
consecução de fins não-lucrativos.
As associações são constituídas pelo registro do seu estatuto nos Cartórios de Registros
de Títulos e Documentos.
O Código Civil, em seu artigo 54 já determina os requisitos de conteúdo dos estatutos,
que são: denominação, fins e sede; requisitos para admissão, demissão e exclusão dos
associados; direitos e deveres dos associados; as fontes de recursos para a sua manutenção;
constituição e funcionamento dos órgãos deliberativos; condições para alterações do estatuto
e dissolução; e forma de gestão administrativa e de aprovação das respectivas contas,
conforme redação alterada pela Lei nº 11.127, de 28 de junho de 2005.
É importante frisar que o direito de associação é constitucionalmente protegido,
devendo o Estado manter a mínima intervenção nas associações, consagrando-se a autonomia
administrativa.
Também, é oportuno mencionar, conforme discriminação acima, que a legislação cuidou
de obrigar aos associados a descreverem, desde a constituição de seu ente associativo, como
será o sustento deste, ou seja, de onde a associação extrairá recursos para a sua manutenção e
funcionamento, de forma a alcançar os fins almejados (artigo 54, inciso IV, do Código Civil).
O ponto nevrálgico da diferenciação entre as corporações está em sua finalidade.
Enquanto, como vimos, as sociedades perseguirão intrinsecamente o lucro, as associações, na
forma do artigo 53 do Código Civil, deverão ter fins não econômicos. Entendemos que estes
fins não econômicos das associações descritos na legislação equiparam-se à finalidade não
lucrativa supra mencionada no estudo das fundações.
Neste mesmo sentido manifestam-se Maria Nazaré Lins Barbosa e Carolina Felippe de
Oliveira, ao mencionarem que a expressão contida no referido artigo 53 da codificação civil,
“fins não econômicos”, deve ser entendida como “fins não lucrativos”. Assim, nada obstaria
que as associações, no exercício de suas atividades auferissem receitas financeiras, desde que
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estas receitas fossem reinvestidas para o atingimento de sua finalidade, proibida, em qualquer
hipótese, a distribuição de lucros ou quaisquer valores entre os associados.33
No mesmo passo é a lição de Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, ao afirmar que nada
impede que as associações tenham renda financeira, desde que não distribuam lucros e
tenham fins não econômicos:
Já as associações não têm em mira finalidade lucrativa, como estampa
o art. 53 da Lei Civil. É preciso, entrementes, uma interpretação cum
grano salis [com ponderação, com parcimônia] da referida norma.
Veja-se que as associações podem (e, por que não dizer, devem) ter
ganho financeiro. No entanto, o eventual lucro obtido será reaplicado
na própria entidade, vedando-se a partilha entre os sócios. Logo, a lei
não veda o lucro nas associações, mas a sua divisão entre os
associados.
Assim, a associação se consubstancia na união de pessoas naturais,
organizada para atender a fins não econômicos, que podem ser
literários, pios, esportivos, acadêmicos, etc., encontrando limites no
disposto no artigo 5º, XVII, da Constituição Federal que afirma ser
plena a liberdade associativa para fins lícitos, vedada a de caráter
paramiilitar.34
No mesmo sentido:
Note-se que pelo fato de não perseguir escopo lucrativo, a associação
não está impedida de gerar renda que sirva para a mantença de suas
atividades e pagamento do seu quadro funcional. Pelo contrário, o que
se deve observar é que, em uma associação, os seus membros não
pretendem partilhar lucros (pro labore) ou dividendos, como ocorre
entre os sócios nas sociedades civis e mercantis. A receita gerada deve
ser revertida em benefício da própria associação, visando à melhoria
de sua atividade.35
Vemos, pelas citações trazidas, que os juristas chegam a entender salutar para a
associação que a mesma venha a ter lucros, posto que assim terá sua subsistência garantida e
por conseguinte independência para almejar seus fins precípuos.
33
BARBOSA, Maria Nazaré Lins; OLIVEIRA, Carolina Felippe de. Manual de ONGS: Guia prático
de orientação jurídica. 5 ed. Rio de Janeiro: FGV, 2004.
34
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson, op. cit., p. 270.
35
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA, Rofolfo. op. cit., p. 215-216.
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Notamos também, que muitas associações que não desempenham atividades que
geram retornos econômicos instituem uma taxa a ser paga pelos associados, de forma a
manterem-se em atividade, como é o caso de associações de moradores e clubes esportivos.
Vemos assim que o intuito das associações não é intrinsecamente patrimonial, posto
que seu objetivo usualmente seja literário, pio, esportivo, acadêmico, científico, religioso, etc.
Ainda assim, para a pessoa jurídica, em si mesma considerada, a única coisa que interessa é a
sua sobrevivência para atingimento de suas finalidades.
Por isso, a associação necessita ter recursos financeiros suficientes para sua manutenção
e desenvolvimento pleno de suas atividades, uma vez que a míngua de sua renda levará à
inexorável diminuição de atuação e, por fim, liquidação.
Sendo assim, para as associações que exercem atividade econômica lucrativa, os danos a
si perpetrados atingirão diretamente à sua perspectiva de renda, ainda que ligados
exclusivamente ao tipo de imagem que a pessoa jurídica quer passar.
Podemos exemplificar com o caso de uma associação de pesquisas científicas acusada
de fraudar seus resultados. Neste caso, a conseqüência da imputação do ato de falsificação
estará ligado à imagem que o ente associativo passa de ser uma instituição não lucrativa que
contribui graciosamente para o desenvolvimento da humanidade e a repercussão será a
diminuição na procura de outras pessoas (jurídicas e físicas) que queira colaborar com esta
(com trabalho ou dinheiro) ou mesmo que queiram contratá-la.
No aspecto das associações que não exercem atividades econômicas, estas dependem
de seu conjunto de associados, de forma que os ataques à sua reputação, afastarão os atuais e
futuros contribuintes.
Outro ponto que merece destaque é a atribuição, por parte do Judiciário e dos juristas,
de um devido processo legal e contraditório quando da eventual exclusão de um associado.
Sendo assim, este indivíduo a ser excluído tem direito à defesa e a conhecer as acusações que
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lhe são imputadas. Em verdade, tal aplicação decorre da eficácia horizontal dos direitos
fundamentais, já consagrada na doutrina constitucional.
Em face desta eficácia, não se pode impedir o associado de exercer qualquer direito ou
função que lhe tenha sido legitimamente conferido. Sobre este aspecto manifesta-se Flávio
Tartuce:
Percebe-se a intenção do legislador em valorizar os direitos inerentes à
dignidade da pessoa humana, sendo o comando visualizado como uma
manifestação do princípio constitucional pelo qual ninguém pode ser
compelido a agir senão em virtude de lei (princípio da legalidade, art.
5º, II, da CF/1988 [Constituição Federal de 1988]).36
Apesar de em sua passagem o jurista fazer referência ao princípio basilar da dignidade
da pessoa humana, não vemos aqui nenhuma incongruência com o quanto defendido neste
estudo, posto que o referido autor apenas está se referindo à defesa do associado contra ato
ilegal da pessoa jurídica. Desta forma, certo continua a atribuição da dignidade da pessoa
humana como princípio capaz de proteger o ser humano contra ofensas e injustiças
perpetradas pelas próprias associações que integram.
É importante frisar que não queremos, em nenhum momento, mercantilizar ou tornar
as associações vilãs, contudo entendemos que o fim altruístico para o qual esta é criada só
poderá ser realizado se a mesma tiver condições de arcar com os custos da “empreitada”.
Mesmo assim, a necessidade do dinheiro não diminuirá a grandeza dos resultados que
poderão ser alcançados pelas associações.
Conforme pontua Renan Lotufo, as associações são as únicas pessoas jurídicas de direito
civil que podem vir a serem agraciadas com o título de utilidade pública (municipal, estadual
ou federal), passando, assim, a serem titulares de benefícios fiscais e administrativos ou
36
TARTUCE, Flávio. op. cit., p. 225.
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mesmo recebendo repasses governamentais, tudo isto em reconhecimento aos fins altruísticos
e benéficos que as mesmas hodiernamente promovem à sociedade como um todo.37
2.3.4. Os Partidos Políticos e As Organizações Religiosas
Conforme alteração introduzida pela Lei nº 10.825, de 22 de dezembro de 2003, o rol
dos tipos de pessoas jurídicas de direito privado ganhou mais duas figuras: os partidos políticos
e as organizações religiosas.
Para Flávio Tartuce, a alteração tem conotação política, no intuito de afastar os
requisitos legais da associação, como vimos supra, podendo-se criar regras mais brandas para
estes novos entes.38
De fato, muito antes das alterações trazidas pela lei, que é de 2003, já existiam diversos
partidos políticos, os quais eram constituídos em forma de associação.
Por isso mesmo, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona criticam a criação “forçada” destas
novas espécies de pessoas jurídicas, entendendo que ambas já estavam muito bem
agasalhadas sobre o manto das associações.
Pela legislação, tanto os partidos quanto as organizações religiosas não poderão sofrer
empecilhos em sua constituição e funcionamento, na forma dos parágrafos §1º e §3º do artigo
44 do Código Civil. Entretanto, tal previsão já estava inserida na garantia constitucional de
37
LOTUFO, Renan. Curso Avançado de Direito Civil: parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002. v. 1. p. 115.
38
TARTUCE, Flávio. op. cit., p. 228-229.
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associação (inserta no artigo 5º, XVII, da Constituição Federal), bem como na liberdade
religiosa (artigos 5º, VI e 19, I, também da Carta Magna).39
Apesar de todo o esforço do legislador em afastar da regulamentação os partidos e as
organizações religiosas, a lei nº 9.096/1995 regulamenta a constituição e funcionamento dos
partidos, enquanto que, conforme nos informa Anderson Casé, a terceira Jornada de Direito
Civil realizada pelo Superior Tribunal de Justiça aprovou o enunciado nº 143, segundo o qual as
organizações religiosas poderão sofrer controle de legalidade e legitimidade de seu registro,
bem como poderão ser reexaminados, pelo Poder Judiciário, a compatibilidade dos seus atos
com a lei e com os seus estatutos.40
Apesar de todas as definições legais, segundo Maria Helena Diniz, os partidos políticos
são:
Entidades integradas por pessoas com idéia comuns, tendo por
finalidade conquistar o poder para a consecução de um programa. São
associações civis, que visam assegurar, no interesse do regime
democrático, a autenticidade do sistema representativo e defender os
direitos fundamentais definidos na Constituição Federal.41
Sendo assim, parece-nos que tanto os partidos políticos quanto as organizações
religiosas nada mais são do que associações de finalidades específicas, de forma que, no que
tange à vinculação patrimonial destes entes, poderemos tecer os mesmos comentários feitos
no subitem anterior.
39
Artigo 5º, inciso XVII: “a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de
autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento”; Artigo 5º, inciso VI: “é
inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos
e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”; artigo 19: “É vedado à
União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas,
subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de
dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público”. BRASIL,
Constituição
Federal
de
1988.
Disponível
em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>, acesso em 26/07/2011.
40
CASÉ, Anderson George de Lima. Impossibilidade de dano moral às pessoas jurídicas. 2010.
Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Direito, 2010.
41
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 22 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. v. 1. p.
222-223.
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Além disso, vale acrescentar que, no que tange às instituições religiosas, devemos
lembrar, conforme já abordado, que a Igreja Católica foi uma das responsáveis pelo
desenvolvimento da pessoa jurídica, quando iniciou a segregação do seu patrimônio do de
seus clérigos, conforme informa-nos Arnold Wald:
No Direito Medieval coube aos canonistas desenvolver e hipertrofiar o
conceito de pessoa jurídica, a fim de atender à necessidade de
organização interna da igreja. A pessoa jurídica é, então, definida
como persona ficta [pessoa ficta] ou corpus mysticum [corpo místico],
pelos canonistas, que nela percebem uma realidade distinta e superior
à soma dos seus membros.42
Por isso, apesar de todo o ideário altruísta e não lucrativo que permeia as instituições
religiosas e os partidos políticos (estes um pouco menos no nosso país), na análise estrita das
pessoas jurídicas, vemos que existe a mesma lógica das associações.
No caso dos partidos e instituições religiosas, estes entes dependerão prioritariamente
das contribuições de seus afiliados e seguidores, que muitas vezes são obrigatórias, sob pena
de segregação do não contribuinte.
Mais uma vez reiteramos que todas as pessoas jurídicas de direito privado estão ligadas
ao seu patrimônio e a exploração deste, de onde provém a possibilidade de alcançarem os
objetivos para os quais foram instituídas.
Uma vez concluído o estudo das pessoas jurídicas, deixando claro que desde a gênese
deste instituto o mais fundamental foi a separação patrimonial e autonomia jurídica do ente
fictício, vimos que todas as espécies de pessoas jurídicas abrangidas pela lei civil estão
umbilicalmente ligadas ao seu patrimônio e à exploração deste, de forma direta ou indireta,
dependendo disto para a consecução de suas atividades.
42
WALD, Arnold. Direito Civil: Introdução e Parte Geral. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 147.
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Importante lembrar da lição de Fábio Ulhoa que conceitua: “a pessoa jurídica é uma
técnica de separação patrimonial em que se atribui personalidade própria ao patrimônio
segregado”43.
Ora, assim, só podemos entender que realmente o que importa para a personalização
dos entes fictícios é a autonomia patrimonial, com vistas a facilitar suas transações com os
outros entes da vida social e o desenvolvimento de suas atividades.
Podemos assim concluir que a pessoa jurídica, quando esvaziada de seu patrimônio e de
qualquer possibilidade de auferição de renda, não encontra fim em si mesma, tornando-se
impossível a sua manutenção e obrigatório o seu desfecho.
43
COELHO, Fábio Ulhoa. op. cit. p. 232.
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3. OS DIREITOS DA PERSONALIDADE
Estabelecidas definições, formas e finalidades das pessoa jurídicas cabe-nos agora
passar ao estudo mais específico dos direitos da personalidade para entender se a axiologia e
objeto de proteção destes pode ou não estenderem-se aos entes fictícios.
Entretanto, antes de adentrar o campo dos direitos personalíssimos, devemos
entender as novas perspectivas do direito civil, notadamente o direito civil-constitucional,
descentralização do direito civil e os novos princípios que permeiam a nova codificação
(Código Civil de 2002).
3.1. NOVAS PERSPECTIVAS DO DIREITO CIVIL
Após a Revolução Francesa, com o advento do Código Civil Napoleônico, muitos
juristas passaram a crer que todas as soluções para os problemas jurídicos da esfera civil
estariam insertos na codificação.
Norberto Bobbio chega a insinuar a pretensa completude dos códigos: “a miragem da
codificação é a completude: uma regra para cada caso. O Código é para o juiz um prontuário,
que lhe deve servir infalivelmente, e do qual não pode se afastar”.44
Neste sentido, chegou-se a crer que as disposições constitucionais deveriam ser
interpretadas à luz da lei civil, gerando uma total inversão valorativa, o que ocorreu no
ordenamento brasileiro por muito tempo, até a promulgação da Constituição de 1988.
44
BOBBIO, Norberto, apud Gustavo Tepedino. O Código Civil, Os chamados Microssistemas e a
Constituição: Premissas para uma Reforma Legislativa, in Problemas de Direito Civil Constitucional.
Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 2.
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Neste sentido nos informa Luíz Roberto Barroso:
A verdade, no entanto, é que a preocupação com o cumprimento da
Constituição, com a realização prática dos comandos nela contidos,
enfim, com a sua efetividade, incorporou-se, de modo natural à prática
brasileira pós-1988. Passou a fazer parte da pré-compreensão do tema,
como se houvéssemos descoberto o óbvio após longa procura. A
capacidade – ou não – de operar com as categorias, conceitos e
princípios de direito constitucional passou a ser um traço distintivo
dos profissionais das diferentes carreiras jurídicas. A Constituição,
liberta da tutela indevida do regime militar, adquiriu força normativa e
foi alçada, ainda que tardiamente, ao centro do sistema jurídico,
fundamento e filtro de toda a legislação infraconstitucional. Sua
supremacia, antes apenas formal, entrou na vida do país e das
instituilções.45
Uma vez que houve essa mudança do centro do sistema jurídico como um todo,
deslocando a base e suporte de toda a legislação para o texto constitucional, não mais cabia a
utilização do Código Civil de 1916, posto que este, conforme nos informam Cristiano Chaves e
Nelson Rosenvald, estava inspirado nas concepções individualista e voluntarista oitocentistas,
sob a influência do Código Civil francês de 1804 e do BGB alemão. Pela necessidade de romper
com a lógica feudal e da nobreza, estas codificações afirmavam valores individualistas e
queriam garantir o acesso a bens de consumo (patrimonialista).46
Além disso, para garantir a segurança das relações jurídicas em face do poder político,
estes códigos civis criavam “um mundo de segurança”, para garantir a estabilidade das
atividades privadas. Também, os textos almejavam abarcar a plenitude das situações jurídicas,
entrando numa casuística de disposições normativas e descritivas de cada sanção ou solução a
ser aplicada.47
É óbvio, então, que a Codificação de 1916 não poderia caminhar ao lado da Constituição
Cidadã de 1988, posto que aquele era individualista, patrimonialista, machista e centralizados;
45
BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas: limites e
possibilidades da Constituição Brasileira. 6 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. X, nota prévia.
46
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson, op. cit., p. 22.
47
Idem, ibidem, p. 22.
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enquanto que o texto constitucional traz como fundamentos a igualdade material, dignidade
da pessoa humana e proporcionalidade.
Desta forma, é impossível conceber-se atualmente a aplicação de qualquer dispositivo
legal sem a sua devida conformidade com o texto constitucional e este fenômeno, certamente
ocorre no direito civil, especialmente com o Código Civil de 2002, neste sentido manifesta-se
Paulo Luiz Netto Lôbo:
Na atualidade, não se cuida de buscar a demarcação dos espaços
distintos e até contrapostos. Antes havia uma disjunção, hoje há
unidade hermenêutica, tendo a Constituição como ápice conformador
da elaboração e aplicação da legislação civil. A mudança de atitude é
substancial: deve o jurista interpretar o Código Civil segundo a
Constituição e não a Constituição segundo o Código Civil, como
ocorria com freqüência (e ainda ocorre). A mudança de atitude
também envolve certa dose de humildade epistemológica.”48
Desta forma, hoje temos o que os doutrinadores chamam de direito civil constitucional,
que na forma da lição de Flávio Tartuce, apoiado em José Afonso da Silva, não é um novo ramo
do Direito, mas uma nova visão hermenêutica do antigo Direito Civil criado em Roma, que hoje
teve ter seus institutos e previsões legais permeados pelo conteúdo axiológico da Lei Maior.49
Por isso que o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana consegue fluir do
texto constitucional e impregnar o direito civil, trazendo a função social de toda atividade civil
e criando os direitos da personalidade, com previsão legislativa específica.
Além da desta nova postura de subordinar todo o Direito Civil aos fundamentos
constitucionais, também temos um novo fenômeno da descentralização no âmbito civil.
O fenômeno da descentralização não é exclusivo do Direito Civil, mas ocorre em todo o
ordenamento, posto que, uma vez que todos os fundamentos axiológicos estão presentes na
Constituição, não existe mais um imperativo de codificação completa, ou seja, os códigos não
precisam mais descrever todas as situações da vida, devendo apenas preocupar-se com os
48
49
LÔBO, Paulo Luiz Netto. Teoria Geral das Obrigações. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 2.
TARTUCE, Flávio, op. cit., p. 110-111.
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principais pontos de cada matéria, tecendo cláusulas abertas que serão complementadas por
legislações especiais ou mesmo pela interpretação da Carta Magna.
Sendo assim, a descentralização é a regulação de certas matérias de direito civil por
legislações especiais.
Aliás, esta descentralização só pode subsistir em conjunto com a constitucionalização do
direito civil, posto que, do contrário, teríamos uma série de legislações desconexas e isoladas
regulando cada aspecto do direito civil.
Em verdade, a descentralização iniciou-se na vigência do Código de 1916, posto que a
partir de certo momento, o código já estava defasado e era preciso legislar as novas situações
e anseios da vida. Como não se conseguia alterar o código, a solução foi criar microssistemas
civis de legislação, como informam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona:
Por tudo isso, a dificuldade em proceder a uma reforma generalizada
de nosso Código desencadeou, pois, o (inverso) fenômeno da
descentralização ou descodificação do Direito Civil, marcado pela
proliferação assustadora, à velocidade da luz, de estatutos e leis
especiais que disciplinariam não somente as novas exigências da
sociedade industrializada, mas também velhas figuras que se alteraram
com o decorrer dos anos, sob o influxo de novas idéias solidaristas e
humanitárias, e que não poderiam ser plena e eficazmente reguladas
por um código ultrapassado e conservador.50
Conforme noticia Flávio Tartuce, em face da descentralização já consolidada, ao
elaborar a nova codificação civil, Miguel Reale (coordenador do anteprojeto) definiu como
uma das diretrizes básicas a de
somente inserir no Código Civil matéria já consolidada ou com
relevante grau de experiência crítica, transferindo-se para legislação
especial questões ainda em processo de estudo, ou que, por sua
natureza complexa, envolvem problemas e soluções que extrapolam a
50
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA, Rodolfo, op. cit., p. 51.
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codificação privada, caso da bioética, do biodireito e do direito
eletrônico ou digital.51
Vê-se que, pelo exposto, que pretendeu-se dar à codificação civil apenas o conteúdo
que já estivesse consolidado na doutrina e jurisprudência, deixando as questões controversas
para complementações legislativas. Ao nosso ver, tal opção foi mais que acertada, posto que a
experiência que teve-se com o Código de 1916 mostrou que alterar um texto codificado é
trabalho hercúleo para a estrutura legislativa brasileira.
Além disso, o código civil baseou-se no sistema de textura aberta ou janelas abertas
que, conforme Judith Martins-Costa, que permite, em função de sua estrutura lingüística, a
constante incorporação e solução de novos problemas, seja pela jurisprudência, seja por uma
atividade de complementação legislativa. Segundo a referida jurista:
Nas cláusulas gerais a formulação da hipótese legal é procedida
mediante o emprego de conceitos cujos termos têm significado
intencionalmente vago e aberto, os chamados ‘conceitos jurídicos
indeterminados’. Por vezes – e aí encontraremos as cláusulas gerais
propriamente ditas -, o seu enunciado, ao invés de traçar
punctualmente a hipótese e as conseqüências, é desenhado uma vaga
moldura, permitindo, pela vagueza semântica que caracteriza os seus
termos, a incorporação de princípios e máximas de conduta
originalmente estrangeiros ao corpus codificado, do que resulta,
mediante a atividade de concreção destes princípios, diretrizes e
máximas de conduta, a constante formulação de novas normas.52
Além de tudo o quanto já explicitado, temos que trazer a lume, pela importância na
interpretação da codificação civil os princípios da eticidade, sociabilidade e operabilidade.
Segundo Flávio Tartuce,
o próprio Miguel Reale não se cansava em apontar os princípios ou
regramentos básicos que sustentam a atual codificação privada:
eticidade, socialidade e operabilidade. O estudo de tais princípios é
51
TARTUCE, Flávio, op. cit., p. 90-91.
MARTINS-COSTA, Judith. O Novo Código Civil brasileiro: em busca da “ética da situação”. In
BRANCO, Gerson Luiz Carlos e MARTINS-COSTA, Judith. Diretrizes Teóricas do novo Código Civil
brasileiro. São Paulo: saraiva, 2002. p.118.
52
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fundamental para que se possa entender os novos institutos que
surgiram com a nossa nova lei privada.53
O princípio da eticidade, parece-nos, estar umbilicalmente ligado á boa-fé, sendo uma
expectativa de que todos os indivíduos se comportem, frente ao demais, de forma proba,
como no antigo brocado do bonus pater familiae (bom pai de família).
Neste sentido apoiamo-nos no ex-Ministro do Superior Tribunal de Justiça, José
Delgado:
O típico de ética buscado pelo novo Código Civil é o defendido pela
corrente kantiana: é o comportamento que confia no homeme como
um ser composto de valores que o elevam ao patamar de respeito pelo
semelhante e de reflexo de um estado de confiança nas relações
desenvolvidas, quer negociais, quer não negociais. É, na expressão
kantiana, a certeza do dever cumprido, a tranqüilidade da boa
consciência.54
Já o princípio da socialidade, conforme informa Flávio Tartuce, procura superar o caráter
individualista da antiga codificação, deslocando o centro do universo jurídico do “eu” para
“nós”. Ao invés de primar pela liberdade individual, ter-se-á que priorizar o coletivo, a função
social, a humanidade.55
Sendo assim, os dispositivos do código devem ser interpretados com vistas à boa
convivência entre os indivíduos, harmonização dos interesses e valorização da coletividade.
Quanto ao último princípio, o da operabilidade, este visa dar ao Código Civil a máxima
efetividade, especialmente no que tange ao preenchimento das cláusulas abertas e soluções
dos conflitos.
Por isso, os juristas ao utilizarem o texto codificado devem preencher as lacunas
deixados pelo mesmo e concretizarem os princípios norteadores.
53
TARTUCE, Flávio, op. cit., p. 94.
DELGADO, José. A Ética e a Boa-fé no Novo Código Civil. In: DELGADO, Mário Luiz; ALVES,
Jonse Figueirêdo. Questões controvertidas do novo Código Civil. São Paulo: Método, 2003. p. 177.
55
TARTUCE, Flávio, op. cit., p. 96-97.
54
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Vistas as novas tendências e princípios que regem o Direito Civil, passaremos ao estudo
dos direitos da personalidade, os quais estão intrinsecamente ligados a esta nova
principiologia.
3.2. ASPECTOS HISTÓRICOS
A ampla proteção hoje conferida aos direitos da personalidade constitui fato recente na
história jurídica, cabendo-nos investigar a origem destes direitos para entendermos sua carga
axiológica.
Conforme noticiam Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, no Direito Romano não
existiam direitos da personalidade da forma como conceituamos atualmente, apenas existia,
para a proteção do indivíduo a actio injuriarum, uma espécie de ação contra injúria, que
estaria mais voltada a uma ação penal privada, do que a uma proteção civil. Ressaltam ainda
os autores que esta ação foi elastecida para abranger qualquer atentado contra a pessoa,
aproximando-se à forma atual de proteção, mas ainda muito embrionária.56
Durante a Idade Média, com a expansão do cristianismo, iniciou-se o pensamento de
fraternidade e temos então o embrião da dignidade da pessoa humana, posto que reconheciase um vínculo entre Deus e o ser humano.
Logo após, tivemos também o Iluminismo, que desflorou no antropocentrismo, levando
à valorização do homem e proteção ás suas liberdades. Além disso tivemos a Escola de Direito
Natural, com a teoria do Jusnaturalismo, ainda hoje utilizada por doutrinadores como
fundamento dos direitos da personalidade.
56
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 106.
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Como bem pontuam Carlos Bittar e Carlos Bittar Filho, na verdade, todos estes fatores
históricos foram se aglomerando para culminar no surgimento dos direitos da personalidade:
A construção da teoria dos direitos da personalidade humana deve-se,
principalmente: a) cristianismo, em que em que se assentou a idéia de
dignidade do homem; b) à Escola de Direito, que firmou a noção de
direitos naturais ou inatos ao homem, correspondente à natureza
humana, a ela unidos indissoluvelmente e preexistentes ao
reconhecimento do Estado; e, c) aos filósofos e pensadores do
iluminismo, em que se passou a valorizar o ser, indivíduo, frente ao
Estado.57
Entretanto, conforme noticia Roxana Borges, houve rejeição inicial a construir-se os
direitos da personalidade, liderada por Savigny, posto que não se poderia admitir que ao
mesmo tempo a pessoa fosse sujeito e objeto do direito, uma vez que tal assertiva legitimaria
o suicídio.58
Ainda assim, a proteção da pessoa continuou a avançar, notadamente no campo do
Direito Público, onde as liberdades e garantias fundamentais foram consolidando-se após as
revoluções burguesas (Revolução Francesa e Independência dos Estados Unidos). Todavia, aqui
o viés das garantias eram a proteção do indivíduo contra a opressão de um estado totalitário e
tirano.
Neste sentido registram Carlos Bittar e Carlos Bittar Filho:
Assim é que foi, primeiramente, no âmbito público, que os direitos da
personalidade ganharam a sagração legislativa, a começar pela
Declaração norte-americana, que refletia a tradição puritana das
antigas colônias, de liberdade de consciência frente ao Estado – pois
formadas, como se sabe por cidadãos ingleses.59
57
BITTAR, Carlos Alberto; BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Tutela dos direitos da personalidade e
dos Direitos Autorais nas Atividades Empresariais. Sâo Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 18.
58
BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Disponibilidade dos direitos da personalidade e a autonomia
privada. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 20.
59
BITTAR, Carlos Alberto; BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Tutela dos direitos da personalidade e dos
Direitos Autorais nas Atividades Empresariais. Sâo Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 19.
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Apesar de toda esta evolução, os direitos da personalidade só foram efetivados na
esfera civil após a II Guerra Mundial. Isto porque, durante a guerra as atrocidades do
holocausto e a degradação do ser humano vivenciados nos campos de concentração levaram a
uma necessidade de proteger-se o ser humano contra o seu igual, provendo-lhe de
instrumentos jurídicos de subsistência.
Conforme verberam Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, somente após a II Guerra
Mundial é que os códigos civis incorporaram a tutela dos direitos da personalidade. “Era
preciso assegurar uma tutela fundamental, elementar, em favor da personalidade humana,
salvaguardando a própria raça”.60
Sobre esta transição e consolidação dos direitos da personalidade, bem resume César
Fiuza:
Com a evolução do capitalismo industrial, a concentração, a
massificação, os horrores da segunda Guerra Mundial, com o
desenvolvimento da tecnologia, principalmente da biotecnologia etc.,
a perspectiva muda. O paradigma do Estado Liberal é substituído pelo
do Estado Social intervencionista, protetor do mais fraco. Os direitos
da personalidade passam a integrar a esfera privada, protegendo o
indivíduo, sua dignidade, contra a ganância e o poderio dos mais
fortes. Ao lado desse prisma privatístico, continua a subsistir o
público, em socorro do indivíduo contra o Estado. Tendo em vista
essas duas esferas, privada e pública, os direitos da personalidade
pertencem a ambas. Na esfera privada, fala-se em direitos da
personalidade, terminologia cunhada por Otto Gierke. Na esfera
pública, em direitos humanos ou direitos fundamentais.61
Sendo assim, temos que os direitos da personalidade resultam de uma progressão
histórica em que se expandiu a proteção do homem, inicialmente contra o Estado e hoje
também frente aos seus semelhantes e às corporações. Neste prisma, vemos que a pedra
angular dos direitos da personalidade é a dignidade da pessoa humana, princípio inafastável
do Estado Democrático de Direito, que foi assegurado historicamente após diversas afrontas
ao mesmo.
60
61
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 107.
FIUZA, César. Direito Civil: Curso Completo. 7 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 134.
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Em face desta conquista histórica, derivada de muitos percalços, deve-se proteger a
dignidade da pessoa humana enquanto valor e não mero atributo jurídico ou norma do
ordenamento, sob pena de retrocedermos à primeira alteração legislativa, conforme bem
defende Roxana Borges:
Considerar a historicidade da dignidade da pessoa humana é, segundo
a análise aqui desenvolvida, valorizar essa conquista do homem e, por
isso mesmo, protegê-la da melhor forma possível, já que não foi uma
outorga, mas algo conquistado, cuja conservação, proteção e
promoção, por sua vez, também requerem trabalho.62
E continua a jurista:
O fato de o princípio da dignidade da pessoa humana representar uma
conquista do homem torna-a ainda mais preciosa e mais merecedora
de proteção do que se tivesse sido outorgada por uma razão divina ou
natural. Exatamente por derivar de um momento histórico, de
conjunturas jurídicas, políticas, filosóficas, culturais, econômicas e
sociais localizadas e reais, é que o princípio da dignidade da pessoa
humana ganha enorme valor para nossa análise.63
No ordenamento jurídico brasileiro, os direitos da personalidade começaram a ser
inseridos pela jurisprudência, posto que à época que os mesmos estavam sendo desenvolvidos
em outras partes do mundo, estávamos sob regime militar que cerceava as liberdades e
garantias fundamentais (pós Segunda Guerra Mundial).
Entretanto, como bem aduz Anderson Casé, os direitos da personalidade passaram a ter
previsão expressa com a Constituição Federal de 1988, podendo-se citar os incisos V, X e XLI do
artigo 5º como exemplos. Além disso, a Lei de Imprensa (lei nº 5.250/67), Estatuto da Criança e
do Adolescente (lei nº 8.069/90) e a Lei do Transplante de Órgãos (lei nº 9.434/97) fazem
menção expressa aos direitos da personalidade, protegendo-os nos seus âmbitos64
62
BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. op. cit., p. 19.
Idem, ibidem, p. 19.
64
CASÉ, Anderson George de Lima. op. cit., p. 32.
63
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Embora a legislação supracitada já resguardassem os direitos da personalidade,
especialmente com a proteção constitucional, foi no Código Civil de 2002 que esta proteção se
consolidou, especialmente com as novas perspectivas e princípios trazidos pela codificação,
como vimos no subitem anterior.
Sobre este aspecto, manifesta-se Anderson Casé:
Portanto, a sistemática constitucional atual valoriza e privilegia a
tutela da dignidade da pessoa humana e das relações existenciais em
detrimento das relações patrimoniais. A constituição alçou o ser
humano ao patamar máximo do ordenamento jurídico brasileiro, pelo
simples fato de ser pessoa, pouco importando se detentora de
patrimônio ou não.
O código civil em respeito à importância da matéria, dedicou aos
direitos da personalidade especial atenção ao que prevê capítulo
próprio para tratá-la, nos artigos 11 a 21, não esgotando, contudo, a
matéria. Ressalte-se que, o código civil de 2002 é marcado pela
repersonalização e despatrimonialização do direito, ao contrário do
CC [Código Civil] de 1916, marcantemente patrimonialista e
individualista, elaborado numa sociedade majoritariamente agrícola,
tendo a maioria da sua população vivendo na zona rural, ocorrendo a
subversão dos seres humanos ao patrimônio65.
Por esta breve perspectiva histórica, percebemos que a lógica dos direitos da
personalidade é a exaltação e proteção do “humano”, logo não podemos concordar que este
princípio, conquistado a “ferro e fogo”, seja utilizado para a proteção das relações
instrinsecamente patrimoniais das pessoas jurídicas, o que levaria à fragilização axiológica do
instituto e sua conseqüente restrição gradativa.
65
Idem, ibidem, p. 33.
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3.3. NOÇÕES CONCEITUAIS
A noção conceitual atualmente mais aceita sobre os direitos da personalidade é a de
que os mesmos têm por objeto a proteção das projeções físicas e psíquicas das pessoas, suas
características mais importantes, visando garantir o pleno desenvolvimento das capacidades
do ser humano e sua existência, bem como resguardar a dignidade da pessoa humana.
É com base neste conceito que foram afastadas as objeções das teorias negativistas
(defendidas por Savigny, Jellineck e outros), pela qual não seria possível existirem direitos da
personalidade, posto que o objeto e o sujeito coincidiriam. Pela nova definição, os direitos da
personalidade estariam ligados à projeções do ser, seus atributos e qualidades, não
confundindo-se com o mesmo.
Neste sentido manifesta-se Roxana Borges:
Considera-se, atualmente, que o objeto dos direitos da personalidade
são projeções físicas ou psíquicas da pessoa, ou as suas características
mais importantes. As projeções da personalidade, suas expressões,
qualidades ou atributos são bens jurídicos e se apóiam no direito
positivo. Os direitos da personalidade são uma categoria especial de
direito, diferente dos direitos obrigacionais e dos direitos reais. Por
meio dos direitos da personalidade se protegem a essência da pessoa e
suas principais características. Os objetos dos direitos da
personalidade são os bens e valores considerados essenciais para o ser
humano.
Portanto, não há confusão, nos direitos de personalidade, entre sujeito
e objeto de direito. Embora o sujeito de direito possa ser, em última
instância, a personalidade mesma, são as várias qualidades ou
expressões desta, particularizadas, que são consideradas bens
jurídicos. Não é a personalidade o objeto dos direitos da
personalidade, mas alguma qualidades, expressões ou projeções
dela.66
66
BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. op. cit., p. 20.
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Vemos na explanação trazida que a referida autora ainda traz a distinção de que os
direitos da personalidade não se enquadram dentro das obrigações ou dos direitos reais,
sendo espécie nova de direito civil.
Neste mesmo sentido é a manifestação de Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald:
Ao lado destes direitos patrimoniais, com vocação econômica,
reconhecidos para satisfazer as necessidades variadas decorrentes da
vida em sociedade ( e materializados no campo dos direitos reais e
obrigacionais), existem os chamados direitos da personalidade,
domiciliados na esfera mais íntima da pessoa em não mensuráveis
economicamente.67
Pelas exposições, os direitos da personalidade estão conceitualmente afastados da
esfera patrimonial e na mesma medida ligados ao ser humano, pois, conforme pontua Orlando
Gomes, os direitos da personalidade são direitos essenciais à pessoa humana, a fim de
resguardar sua própria dignidade68
Carlos Bittar também traz em sua definição uma ligação dos direitos da personalidade à
pessoa humana:
Consideram-se como da personalidade os direitos reconhecidos à
pessoa humana tomada em si mesma e em suas projeções na
sociedade, previstos no ordenamento jurídico exatamente para a
defesa de valores inatos no homem, como a vida, higidez física, a
intimidade, a honra, a intelectualidade e outros tantos69.
Em texto clássico da doutrina dos direitos da personalidade, Adriano de Cupis vincula
estes direitos á realização mínima do ser, sem os quais a personalidade em si perderia seu
valor concreto. Para o autor, todos os direitos destinados a dar conteúdo à personalidade
67
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 108.
GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995. p. 153.
69
BITTAR, Carlos Alberto. Os Direitos da Personalidade. 7 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária,
2008. p. 1.
68
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serão direitos da personalidade, sendo esta nomenclatura restrita ao que é imprescindível à
personalidade, no que o jurista chama de “direitos essenciais”.70
Neste sentido, merece nossa citação a lição de Miguel Serpa Lopes:
Consideramos os direitos da personalidade como os atinentes à
utilização e disponibilidade de certos atributos inatos ao indivíduo,
como projeções biopsíquicas integrativas da pessoa humana,
constituindo-se em objetos (bens jurídicos), assegurados e
disciplinados pela ordem jurídica imperante71.
Apesar da extensa lista de doutrinadores trazidos que sustentam o conceito de direitos
da personalidade na pessoa humana, alguns assim não o fazem, como é o caso de Flávio
Tartuce, o qual apenas altera as palavras, suprimindo o “humana” e fazendo referência apenas
a “pessoa”. Assim, para o autor os direitos da personalidade têm por objeto os modos de ser,
físicos ou morais da pessoa, de forma que protegem-se os atributos específicos da
personalidade, sendo a personalidade a qualidade do ente considerado pessoa. Mesmo assim,
parece-nos que o jurista revolve ao fundamento da humanidade, quando informa que a
“proteção envolve aspectos psíquicos do indivíduo, além de sua integridade físical, moral e
intelectual, desde a sua concepção até a sua morte”72.
Sendo assim, por mais tente-se fundamentar ou elocubrar uma de conceituar os direitos
da personalidade sem o elemento humano, fatalmente seremos traídos pela ligação umbilical
deste elemento, ficando a possível conceituação sem supedâneo axiológico suficiente para
respaldar sua previsão constitucional.
Por isso, parece-nos que a noção conceitual apresentada por Cristiano Chaves e Nelson
Rosenvald define com maestria o que discutimos:
Nessa ordem de idéias é possível asseverar serem os direitos da
personalidade aqueles direitos subjetivos reconhecidos à pessoa,
70
CUPIS, Adriano de. Os Direitos da Personalidade. 2ed. São Paulo: Quorum, 2008. p. 23-24.
SERPA LOPES, Miguel Maria de. Curso de direito civil. 9 ed. rev. e atual. por José Serpa Santa
Maria. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2000. v. 1. p. 241.
72
TARTUCE, Flávio. op. cit., p. 153.
71
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tomada em si mesma e em suas necessárias projeções sociais. Isto é,
são os direitos essenciais ao desenvolvimento da pessoa humana, em
que se convertem as projeções físicas, psíquicas e intelectuais do seu
titular, individualizando-o de modo a lhe emprestar segura e avançada
tutela jurídica.
Os direitos da personalidade, portanto, possibilitam a atuação na
defesa da própria pessoa, considerada em seus múltiplos aspectos
(físico, psíquico, intelectual...).
Compõem, em verdade, um conjunto de faculdades jurídicas
reconhecidas á pessoa humana, cujo objeto são os bens jurídicos
caracterizados pelos diferentes aspectos da pessoa tomada em si
mesma e em suas projeções e prolongamentos73.
Vemos assim, que mesmo a conceituação dos direitos da personalidade está ligada à
essência da pessoa humana.
Antes de passarmos ao estudo das características destes direitos personalíssimos,
faremos breve digressão acerca da fonte dos direitos da personalidade, posto que é tema de
imbricada discussão.
A questão reside em saber se os direitos da personalidade são direitos naturais ou
decorrem da história (e da lei). Em verdade, a discussão é de corrente doutrinária, sendo que
os jusnaturalistas afirmarão que trata-se de direito do homem que cabe ao estado apenas
reconhecer; enquanto que os positivistas rebaterão que são direitos criados pela lei.
Renan Lotufo está entre os que entendem que a natureza dos direitos da personalidade
é de direito positivo74. Já Carlos Bittar defende que os direitos da personalidade são inatos,
cabendo ao estado reconhecê-los e sancioná-los75.
Nosso entendimento, com embasamento na doutrina de Pontes de Miranda, é de que
os direitos da personalidade decorrem, não de uma imposição sobrenatural, mas de uma
73
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 108-109.
LOTUFO, Renan. Código Civil comentado: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 54.
75
BITTAR, Carlos Alberto. op. cit., p. 7.
74
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evolução histórica que pressionou os legisladores a consagrarem estes direitos como positivos,
incluindo-os, assim, no ordenamento jurídico76.
3.4. PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS
Apesar de não haver uma unanimidade em torno das características dos direitos da
personalidade, podemos afirmar que existe um “quase” consenso em dizer que estes são
absolutos, extrapatrimoniais, inalienáveis, impenhoráveis, imprescritíveis, irrenunciáveis e
relativamente disponíveis, como veremos.
Gustavo Tepedino ainda adiciona a esta lista de características a generaidade, que para
o mesmo significa que os direitos da personalidade são concedidos a todos, pelo simpes fato
de estarem vivos, ou só pelo fato de ser. Conforme incita o mesmo autor, alguns
doutrinadores referem-se a esta característica como sendo os direitos da personalidade
“inatos”, entretanto considera tal terminologia ambígua, posto que pode sugerir a
anterioridade dos direitos à lei numa perspectiva jusnaturalista, que é rechaçada pelo referido
jurista, assim como fizemos alhures77.
Já Sílvio de Salvo Venosa, aponta que os direitos da personalidade seriam direitos
privados fundamentais, merecedores de respeito por representarem conteúdo mínimo que
permite a convivência harmoniosa da sociedade. Aponta ainda o autor as seguintes
características: inatos ou originários, porque se adquirem ao nascer (com a venia de nossa
discordância, conforme supra); vitalícios ou perpétuos, porque perduram por toda a existência
do ser humano; imprescritíveis, porque sempre se pode opor resistência às violações, não se
convalidando estas; inalienáveis ou relativamente disponíveis, posto que a princípio estão fora
76
PONTES DE MIRANDA. Tratado de direito privado. atual. por Vilson Rodrigues Alves. Campinas:
Bookseller, 1999. v. 1. p. 7.
77
TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. 3 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p.33.
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do comércio e não detêm valor econômico; absolutos, tendo em vista serem oponíveis erga
omnes.78
Os direitos da personalidade são absolutos, porque são oponíveis erga omnes (contra
todos), ou seja, toda a sociedade tem o dever de respeitar os direitos personalíssimos de um
determinado indivíduo, podendo este opor-se a qualquer violação contra o seu direito.
A extrapatrimonialidade refere-se à impossibilidade de aferição econômica estrita
destes direitos, ou como bem pontua Renan Lotufo, “porque não se reduzem a
dimensionamentode interesses, nem a avaliações econômicas” 79.
A imprescritibilidade dos direitos da personalidade deriva de estarem instrinsecamente
ligados ao mínimo existencial da pessoa humana, bem como, pela sua origem, por estarem
conexos à ordem pública, sendo neste sentido o entendimento de Maria Helena Diniz80.
Apesar da crítica de Fávio Tartuce ao termo imprescritíveis, assim materemos, por razões
didáticas, como ressalta o referido autor:
Melhor seria considerar que tais direitos não estão sujeitos à
prescrição do que usar a expressão imprescritíveis. Isso porque,
conforme veremos, não é o direito que prescreve, mas a pretensão (art.
189 do CC [Código Civil]). De qualquer forma continuaremos a usar
tal expressão, corriqueira que é na doutrina e jurisprudência. Em
suma, a utilização atende a fins didáticos.81
Uma das mais controvertidas características é a da disponibilidade relativa dos direitos
da personalidade. Alguns autores afirmam que os direitos da personalidade são
indisponíveis82. Contudo, a maior parte dos doutrinadores entendem que eles são, em
verdade, relativamente disponíveis, podendo o titular deles dispor de forma limitada e
78
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Parte Geral. São Paulo: Atlas, 2009. p. 170-171.
LOTUFO, Renan. Curso Avançado de Direito Civil. Coordenação: Everaldo Augusto Cambler. Vol. 1:
Parte Geral. 2ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 78.
80
DINIZ, Maria Helena.op. cit., p. 252.
81
TARTUCE. Flávio. op. cit., p. 167.
82
Neste sentido LOTUFO, Renan. op. cit. e TEPEDINO, Gustavo. op. cit.
79
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temporalmente restrita, desde que tal disposição não comprometa a própria dignidade do
titular, conforme pontuam Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald:
Vale notar que em casos específicos (não todos!), limitados pela
afirmação da própria dignidade humana e pela impossibilidade de
disposição em caráter total ou permanente, é permitido ao titular ceder
o exercício (e não a titularidade) de alguns direitos da personalidade.83
Nesta discussão, é importante lembrar a lição de Roxana Borges, no sentido de que os
direitos da personalidade não são disponíveis em sentido estrito, mas são transmissíveis as
expressões do uso destes direitos, ou seja existem aspectos patrimoniais dos direitos da
personalidade que podem, de forma temporária e de acordo com a dignidade da pessoa
humana, ser transmitidos.84
Pela sua disponibilidade relativa, não podem os titulares renunciarem ou alienarem os
direitos da personalidade, bem como são os mesmos impenhoráveis.
Quanto à impenhorabilidade, é importante lembrar que além de os direitos da
personalidade serem penhoráveis em si, estes constroem ao seu derredor uma barreira maior,
consistente na realização do mínimo existencial, que é hoje o fundamento das
impenhorabilidades constantes em toda a legislação brasileira.
Há também autores que sinalizam para a vitaliciedade dos direitos da personalidade, o
que para nós configura redundância com a imprescritibilidade, apesar de muitos
argumentarem pela impossibilidade de se aceitar que os direitos existiriam apenas enquanto
vivo o titular, posto que seus parentes poderão proteger estes direitos. Neste sentido,
Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald argumentam que esta proteção é dada aos vivos:
Não se esqueça, de qualquer forma, que se reconhece, como direito da
personalidade da pessoa viva, a proteção dos direitos da personalidade
de alguém que já morreu, como assinala o Parágrafo Único do art. 12
do Estatuto Substantivo. São os chamados lesados indiretos, 1que
estão legitimados para reclamar proteção aos direitos da personalidade
83
84
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALDO, Nelson. op. cit., p. 112.
BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. op. cit., p.
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do cônjuge faecido, bem como de seus parentes (mortos) em inha reta
ou colateral até o quarto grau.85
Além destas características, é importante pontuar, também, como ressalta Maria Heleza
Diniz, que os direitos da personalidade são ilimitados, posto é impossível entender um número
fechado de direitos da personalidade, sendo os mesmos uma categoria elástica, que deve ser
vislumbrada ampla e irrestritamente para a proteção do homem. Sendo assim, as previsões
legislativas de espécies de direitos personalíssimo, servem apenas à proteção mais eficaz de
direitos mais consagrados, que contudo não têm hierarquia com os demais86
Por fim, Gustavo Tepedino ainda acrescenta a essencialidade e a preeminência dos
direitos da personalidade, colocando-os em patamar superior e prioritário em relação aos
demais direitos subjetivos, dada a peculiar função e valor do seu objeto maior (dignidade da
pessoa humana).87
Vemos, desta forma e mais uma vez, que as características dos direitos personalíssimos
estão ligados ao desenvolvimento da personalidade enquanto valor contido no ordenamento
jurídico, em consonância com o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana.
Nesse espeque, é impossível conceber que direitos ínsitos a realizar plenamente os
seres humanos, provendo-lhe o mínimo existencial e a plenitude de sua personalidade possam
ser estendidos às pessoas jurídicas, entes ligados à patrimonialidade e persecução de renda,
seja por extensão ou mesmo analogia.
85
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 114.
DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 121.
87
TEPEDINO, Gustavo. op. cit., p. 35.
86
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3.5. PRINCIPAIS CLASSIFICAÇÕES E SUAS ESPECIFICIDADES
Como vimos anteriormente, uma das características dos direitos da personalidade é a
sua ilimitação, desta forma, impossível fazer-se uma classificação exata da quantidade e
espécies destes direitos, posto que outros surgirão, com novas especificidades, de acordo com
as necessidades de proteção da personalidade.
Ainda assim, existem alguns principais tipos de direitos personalíssimos já catalogados
ou mesmo positivados, quais sejam: direito à vida, integridade física, integridade psíquica,
honra, imagem e nome.
Novamente ressaltamos que qualquer lista de direitos da personalidade jamais será
exaustiva e mesmo a disposição legal não é numerus clausus, posto que, conforme já
ressaltamos, a dignidade da pessoa humana é princípio vivo e que demanda para a sua
proteção e efetividade a adaptação jurídica à realidade social.
Assim, as listas de direitos da personalidade contida no Código Civil e na Constituição
Federal não são exaustivas, pois conforme ressalta o próprio artigo 5º, § 2º:
§ 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não
excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela
adotados, ou dos tratados internacionais em que a República
Federativa do Brasil seja parte.
É importante ressaltar a discussão existente entre os monistas e pluralistas quanto à
proteção dos direitos da personalidade, questionando, de um lado, se existe um direito geral
da pessoa humana (com várias facetas) ou, pela outra corrente, se existe uma lista de direitos
autônomos entre si.
Para os pluralistas, existem diversos direitos da personalidade que servem à tutela da
dignidade da pessoa humana.
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Carlos Alberto Bittar, que filia-se ao pluralismo, descreve que, apesar de não exaustivo,
existe um rol direitos da personalidade, não um direito, posto que os bens jurídicos protegidos
por cada espécie seria diferente e desta forma teria peculiaridades singulares88.
Um dos defensores da teoria pluralista é San Tiago Dantas, que faz uma analogia entre
os direitos da personalidade e os direitos reais. Segundo o autor, o direito real sobre o
patrimônio é unitário (propriedade), contudo o mesmo se manifesta em diversas espécies
jurídicas. Da mesma forma, existiria uma cláusula geral de tutela da personalidade, a qual teria
várias facetas de proteção, identificadas nas espécies conhecidas, mas existindo entre estas
uma teia unificadora, determinando o tratamento unitário entre as mesmas89.
Neste mesmo sentido manifesta-se Pietro Perlingieri, pelo monismo:
A tutela da pessoa não pode ser fracionada em isoladas fattispecie
concretas, em autônomas hipóteses não comunicáveis entre si, mas
deve ser apresentada como problema unitário, dado o seu fundamento
representado pela unidade do valor da pessoa. Este não pode ser
dividido em tantos interesses, em tantos bens, em isoladas ocasiões,
como nas teorias atomísticas [pluralistas].90
Também apoiando a idéia da cláusula geral temos Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald,
para os quais esta concepção assegura proteção plena e eficaz à pessoa humana, pois permite
que novos e eventuais valores incorporados à personalidade não estejam carentes de tutela
jurídica. Ressaltam ainda que face as constantes mudanças do mundo moderno, que ocorrem
em ritmo aceleradíssimo, a cláusula geral de proteção permite salvaguardar a dignidade em
situações jurídicas inéditas que poderão ocorrer.91
Resolvendo a discussão de forma, Roxana Borges afirma não haver efeitos práticos entre
a adoção de uma ou outra corrente, posto que ambas fundamentam-se na dignidade da
88
BITTAR, Carlos Alberto. op. cit., 61.
SANTIAGO DANTAS, Francisco Clementino, apud BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. op. cit., p.
27.
90
PERLINGIERI, Pietro. op. cit., p. 154.
91
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 115.
89
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pessoa humana e nenhuma restringe a proteção aos direitos personalíssimos, acrescenta ainda
que:
No ordenamento jurídica brasileiro, as idéias de “séria aberta de
direitos”e direito geral de personalidade” não se excluem e ambas têm
a mesma relevância prática: a de ampliar a proteção da pessoa, nos
mais diversos aspectos de sua dignidade, mesmo que nem todas as
situações de risco à sua dignidade estajam previstas expressamente no
ordenamento legislado, ou seja, independentemente de tipicidade.92
Neste sentido, adotamos o posicionamento ora citado, posto que independentemente
da forma de expressão destes direitos da personalidade, o importante é que a proteção aos
mesmos seja irrestrita e para além dos limites legais.
Retornando às listas de direitos da personalidade, Renan Lotufo, leciona que estes
dividem-se em direitos à integridade física e à integridade moral. Seriam, assim, os direitos à
integridade física o direito sobre o próprio corpo, à vida e ao cadáver. Já os da integridade
moral seriam a honra, liberdade, privacidade, intimidade, imagem e nome93.
Gustavo Tepedino também divide os direitos da personalidade em integridade física e
moral:
De toda sorte, costuma-se distingui-los em dois grupos: os direitos à
integridade física e os direitos à integridade moral. No primeiro grupo
situam-se o direito à vida, o direito ao próprio corpo e o direito ao
cadáver. No segundo, encontram-se o direito à honra, o direito à
liberdade, o direito ao recato, o direito à imagem, o direito ao nome e
o direito moral do autor.94
Divisão parecida fazem Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, quando enumeram três
aspectos dos direitos personalíssimos: físico, psíquico e moral. No aspecto físico estaria o
92
BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. op. cit., p. 29.
LOTUFO, Renan. op. cit., 50.
94
TEPEDINO, Gustavo. op. cit., 35.
93
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direito à vida e ao corpo. Na seara psíquica compreende-se a liberdade, privacidade, saúde e
segredo. No aspecto moral ter-se-ia os valores da honra, imagem e nome.95
Com a mesma espécie de divisão, Limongi França segrega os direitos da personalidade
em: direito à integridade física, direito à integridade intelectual e direito à integridade moral.
Reconhece, muito embora, o autor que tais categorias não são compartimentalizadas e um
mesmo direito pode ao mesmo tempo manifestar-se na esfera física e na moral, como o
direito à imagem. Desta forma, o referido jurista enumera os direitos a partir das categorias
elencadas, ressaltando a forma não definitiva. O direito à integridade física, abrangeria: o
direito à vida e alimentos; o direito sobre o próprio corpo, vivo; o direito sobre o próprio
corpo, morto; o direito sobre o corpo alheio, vivo; direito sobre o corpo alheio, morto; o
direito sobre partes separadas do corpo, vivo; o direito sobre partes separadas do corpo,
morta. Já os direitos à integridade intelectual abarcariam as seguintes espécies: o direito à
liberdade de pensamento; o direito pessoa de autor científico; o direito pessoa de autor
artístico; o direito pessoal de inventor. Por fim, a integridade moral seria dividida da seguinte
forma: o direito à liberdade civil, política e religiosa; o direito à honra; o direito à
honorificência; o direito ao recato; o direito ao segredo pessoal, doméstico e profissional; o
direito à imagem e o direito à identidade pessoa, familiar e social96.
Parece-nos que esta lista trazida pelo supracitado autor é das mais completas,
abarcando as diversas facetas dos direitos da personalidade, inclusive os direitos de autor.
Conforme informa-nos Anderson Casé:
O Código Civil traz de forma exemplificada os direitos da
personalidade nos artigos 11 e 12, expondo as suas características. Já
os artigos 13 a 15 tratam da integridade psicofísica e nos artigos 16 a
19, do nome e sobrenome. Por fim, o artigo 20 traz o direito à imagem
e o artigo 21 à privacidade. Válido se faz ressaltar, que o legislador
ordinário não desejou regulamentar toda a matéria neste capítulo,
95
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA, Rodolfo. op, cit., p. 150.
LIMONGI FRANÇA, Rubens. Manual de direito civil. 4 ed. São Paulo: revista dos Tribunais, 1980.
v. 1. p.412.
96
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tendo em vista as infindáveis situações jurídicas em que se pode
deparar o ser humano.97
Como bem informam Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald:
Nessa linha de idéias, a despeito da proteção específica dispensada ao
nome (arts. 16 a 19, CC [Código Civil]), à imagem (art. 20, CC
[Código Civil]), à privacidade (art. 21, CC [Código Civil]), dentre
outros direitos, há uma cláusula geral de proteção da personalidade,
com o propósito de ampliar significativamente a tutela, impedindo o
exaurimento das espécies de direitos da personalidade, que não podem
ser esgotados, nem limitados.98
Desta forma, cremos que inobstante as variações nas listas de cada autor e mesmo face
à ilimitação das espécies de direitos personalíssimos, o que interessa-nos é analisar as espécies
que normalmente são utilizadas de forma “elástica” para as pessoas jurídicas e se esta
extensão se mostra cabível na lógica jurídica.
Sendo assim, passaremos a tratar mais minuciosamente das espécies que a doutrina e
jurisprudência comumente associam aos entes fictícios, quais sejam: honra, imagem,
privacidade e nome.
3.5.1. Imagem
Em nossa sociedade midiática e permanentemente vigiada, o direito à imagem constituise em direito da personalidade de grande relevância, assumindo, papel importantíssimo na
97
98
CASÉ, Anderson George de Lima. op. cit., p. 49.
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 115.
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identificação e mesmo valorização do ser humano. Tal aspecto é ainda mais evidente, face a
profusão de equipamentos eletrônicos de captação de imagem.99
O direito à imagem, então, pela sua relevância e amplitude na sociedade moderna
assume dois aspectos. O primeiro aspecto é o chamado imagem retrato, consistente nos
aspectos físicos da pessoa. O segundo é a imagem atributo, referente à forma como o
indivíduo é percebido na sociedade.
Assim explicam Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald:
Essa elasticidade conceitual, decorrente da proteção constitucional da
imagem (CF [Constituição federal], art. 5º, incisos V e X), faz
compreender, no conceito de imagem, diferentes aspectos: a imagemretrato (referindo-se às características fisionômicas do titular, à
representação de uma pessoa pelo seu aspecto visual, enfim, é ao seu
pôster, à sua fotografia, encarada tanto no aspecto estático – uma
pintura quanto dinâmico – um filme – art. 5º, X, CF [Constituição
Federal]; a imagem-atributo (que é o consectário natural da vida em
sociedade, consistindo no conjunto de características peculiares da
apresentação e identificação social de uma pessoa, referindo aos seus
qualificativos sociais, aos seus comportamentos reiterados. Não se
confunde com a imagem exterior, cuidando, na verdade, de seu retrato
moral) e a imagem-voz (caracterizada pelo timbre sonoro, que
também serve para a identificação de uma pessoa, até mesmo porque
não poderia imaginar que a personalidade não se evidencia menos na
voz que nas características fisionômicas).100
Vale ressaltar a nossa discordância com os doutrinadores citados quanto à identificação
de uma imagem-voz, posto que esta estaria abarcada pela imagem-retrato, no aspecto
exclusivo do timbre sonoro, e pela imagem-atributo, na faceta de forma de falar, impostação,
vocabulário e formas de expressão, não constituindo, a priori, categoria autônoma
(inobstante, alguns autores classificam um direito à voz, separado da imagem101).
99
Atualmente, qualquer fato mais proeminente está sempre sendo filmado por algum celular ou câmera
digital e, em poucos instantes, está disponível para todas as pessoas do globo através da rede mundial de
computadores.
100
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 140-141.
101
Neste sentido, GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA, Rodolfo. op. cit., p. 172.
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Nesta diferenciação é importante frisar a objeção de Luiz Alberto David Araújo, para
quem tal segregação parece desnecessária, pois o direito é o mesmo, sendo apenas
desdobrado em dois aspectos da imagem na sociedade. Desta forma, apesar da duplicidade de
formas, o direito protegido seria o mesmo: a imagem.102
Roxana Borges informa que o direito à imagem, em sua concepção negativa, não
permite a terceiros a utilização não autorizada, vedando-se mesmo, além da divulgação e da
reprodução, o registro. Conforma a autora, apenas admite-se o uso não consentido em casos
de interesse social, administração da justiça e manutenção da ordem pública, tais como a
imagem de políticos, fotos de fugitivos, imagens de locais públicos sem destaque para
determinada pessoa, dentre outros.
Conforme registra Anderson Casé, a violação do direito à imagem, além de ensejar
pleito de danos morais e materiais, permite ao ofendido requerer a cessação da exposição de
sua imagem, bem como a destruição dos suportes de registro da imagem, na forma do artigo
20 do Código Civil.103
Desta forma, para a utilização da imagem de determinada pessoa é imprescindível seu
consentimento, podendo-se este ser mesmo não-escrito ou tácito, como no caso de pessoa
que se deixa entrevistar por repórter (por óbvio que o entrevistado reconhece que o
depoimento será exibido pelo meio de comunicação e anue com tal condição).
Entretanto, como bem assinala Roxana Borges, este consentimento há de ser bastante
específico e, no caso de escrito, certamente deverá ser detalhado, limitado e especificar os
objetivos e condições de utilização da imagem cedida. Alerta ainda a jurista que a revogação
do consentimento jamais poderá ser objeto de execução forçada, ensejando apenas perdas e
danos, respeitando-se a boa-fé e coibindo-se o abuso de direito.104
102
ARAUJO, Luiz Alberto David. A Proteção Constitucional da Própria Imagem: pessoa física,
pessoa jurídica e produto. Belo Horizonte: Del Rey, 1996. p. 30.
103
CASÉ, Anderson George de Lima. op. cit., p. 51.
104
BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro, op. cit., p. 159-160.
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Neste sentido decidiu o Superior Tribunal de Justiça Brasileiro ao analisar caso em que a
imagem de uma pessoa foi utilizada em publicação diversa da que se tinha autorizado,
reconhecendo a violação ao direito e impondo a indenização:
Recurso Especial. Direito Processual Civil e Direito Civil. Publicação
não autorizada de foto integrante de ensaio fotográfico contratado com
revista especializada. Dano moral. Configuração.
- É possível a concretização do dano moral independentemente da
conotação média de moral, posto que a honra subjetiva tem
termômetro próprio inerente a cada indivíduo. É o decoro, é o
sentimento de auto-estima, de avaliação própria que possuem
valoração individual, não se podendo negar esta dor de acordo com
sentimentos alheios.
- Tem o condão de violar o decoro, a exibição de imagem nua em
publicação diversa daquela com quem se contratou, acarretando
alcance também diverso, quando a vontade da pessoa que teve sua
imagem exposta era a de exibí-la em ensaio fotográfico publicado em
revista especializada, destinada a público seleto.
- A publicação desautorizada de imagem exclusivamente destinada a
certa revista, em veículo diverso do pretendido, atinge a
honorabilidade da pessoa exposta, na medida em que experimenta o
vexame de descumprir contrato em que se obrigou à exclusividade das
fotos.
- A publicação de imagem sem a exclusividade necessária ou em
produto jornalístico que não é próprio para o contexto, acarreta a
depreciação da imagem e, em razão de tal depreciação, a proprietária
da imagem experimenta dor e sofrimento.105
Vê-se, assim, que a tutela do direito da imagem visa resguardar mais a própria
compreensão que o titular tem de si e a forma como este a quer exteriorizá-la, do que a
percepção que os outros têm da imagem do indivíduo, ou seja, busca-se mais proteger o
âmago da consciência da pessoa do que aquilo que a sociedade percebe dele, numa tutela
totalmente condizente com a dignidade da pessoa humana.
105
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 270730/RJ. Relator: Carlos Alberto
Menezes
Direito,
Brasília,
D.J.
07/05/2001,
disponível
em
<https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200000783994&dt_publicacao=07/05/2001>,
acesso em 27/07/2011.
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Para Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, a pessoa jurídica também titularizaria o
direito à imagem, apenas na modalidade imagem-atributo, através do conjunto de
caracteríticas que a particularizam socialmente.106
Devemos discordar frontalmente do pensamento dos citados autores, posto que,
conforme ponderamos supra e parece demonstrado nos conceitos e situações trazidas, o
direito à imagem, mesmo na categoria imagem-atributo, visa tutelar mais a concepção que o
indivíduo tem de si mesmo, concepção esta que o mesmo pretende ver reconhecida pelos
demais componentes da sociedade, sendo certo de que o contrário seria violação ao seu
direito.
Nestes termos, não podemos crer que o ente fictício tenha, em seu âmago, consciência
da imagem que tem e quer projetar no seio social, crença pela qual afastamos integralmente a
tese anteriormente referida.
3.5.2. Honra
A honra é direito da personalidade bastante vulnerável na sociedade midiática em que
vivemos, posto que a qualquer momento pode-se publicar uma manchete ou “postar-se” em
um blog, acusações ou imputações de fatos a outrem, ofendendo-lhe a honra.
Em síntese acurada, Adriano de Cupis conceitua a honra como:
A honra significa tanto o valor moral íntimo do homem, como a
estima dos outros ou a consideração social, o bom nome ou a boa
fama, como, enfim, o sentimento, ou consciência, da própria
dignidade pessoal.107
106
107
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 142.
CUPIS, Adriano de. Os Direitos da Personalidade. 2ed. São Paulo: Quorum, 2008. p.
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Pelo citado autor, a honra perfaz-se tanto do valor social ou renome de que seu titular
desfruta na sociedade, quanto daquilo que ele mesmo pensa sobre si.
Desta forma, como acrescentam Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, a honra constitui
a boa fama social da pessoa, devendo ser protegida contra falsas imputações e ataques que
possam maculá-la. Além disso, a honra também é a auto-estima, o juízo valorativo que cada
um faz de si próprio.108
Vê-se que a honra toca a cada indivíduo independente de sua conduta moral, frente aos
valores da sociedade, apesar deste fato ser ponderado quando da proteção de seu direito,
como bem ensina Paulo Luiz Netto Lôbo:
Também denominado direito à integridade moral ou à reputação, o
direito à honra tutela o respeito, a consideração, a boa fama e a estima
que a pessoa desfruta nas relações sociais. Toda pessoa, por mais que
se conduza de modo não ético, desfruta desse direito, em grau maior
ou menor, a depender de seu comportamento moral e da comunidade
em que vive ou atua. A honra, que se constrói no ambiente social, é o
mais frágil dos direitos da personalidade, porque pode ser destruída
em virtude de informação maliciosa ou dolosa. A honra há de ser
aferida pelo juiz considerando os valores do lesado em harmonia com
os valores cultuados na comunidade em que vive ou atua
profissionalmente. Costuma-se confundir o direito à honra com o
direito a imagem, mas este diz respeito apenas à retratação externa da
pessoa. A reputação relaciona-se à honra e não à imagem.109
Vê-se que no pensamento do citado jurista estão inscritas as noções de subjetividade da
honra, enquanto auto-valor de seu titular, bem como da reputação que este desfruta;
entretanto, como bem ressaltado, o valor subjetivo merece guarida ainda que a conduta do
indivíduo na sociedade seja reprovável. É o caso de crimonosos, mesmo os piores tipos, que
merecem a defesa de sua honra, por mais cruel que tenha sido o seu crime, não podendo ser
expostos e ridicularizados.
108
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 148-149.
LÔBO, Paulo Luiz Netto. Danos morais e direitos da personalidade. Disponível em:
<http://jus.uol.com.br/revista/texto/4445/danos-morais-e-direitos-da-personalidade>,
acesso
em
27/07/2011.
109
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Muitos autores, em virtude desta dupla faceta do direito à honra, entendem subdividi-lo
em honra subjetiva e honra objetiva, conforme lecionam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona:
Poderá manifestar-se de duas formas:
a) objetiva: corresponde à reputação da pessoa, compreendendo o
seu bom nome e a fama de que desfruta no seio da sociade;
b) subjetiva: corresponde ao sentimento pessoal de estima ou à
consciência da própria dignidade.110
Parece-nos, em verdade, que ambas nuances do direito à honra estão interligadas de
uma forma que não podem ser distinguidas como direitos autônomos, mas sim extensão de
uma mesa tutela.
Isto porque, se determinada conduta afeta aquilo que o indivíduo entende como sua
auto-estima, muito provavelmente afetará sua reputação e se alguma ofensa agride a sua
reputação, certamente repercutirá em sua auto-valoração. Desta forma, entendemos que, em
verdade, a forma com que se ofende a honra é que pode ser dividida em objetiva e subjetiva,
apenas e exclusivamente para caráter de valoração do dano, sendo certo que a ofensa sempre
atingirá ambos aspectos (objetivo e subjetivo).
Neste sentido Paulo Luiz Netto Lôbo, também tem entendido que a honra objetiva é
uma extensão do direito à honra exclusiva para abarcar as pessoas jurídicas:
A honra pode ser entendida como subjetiva, quando toca à pessoa
física, porque somente ela pode sofrer constrangimentos, humilhações,
vexames. Tem-se admitido a honra objetiva, no caso das pessoas
jurídicas, que também dependem de consideração, apreço e estimas
sociais.111
Também Renan Lotufo ressaltar que a tentativa de caracterizar a existência de uma
“honra objetiva” é uma analogia simplista que deve ser rechaçada, face complexidade e
caráter fundamental dos direitos humanos (dentre os quais está a honra). Para o citado autor,
110
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA, Rodolfo. op. cit., p. 182. Concordam com este
posicionamento FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 150; BITTAR, Carlos
Alberto. op. cit., p. 133.
111
LÔBO, Paulo Luiz Netto. op. cit.
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a reputação de uma pessoa jurídica constitui bem de seu patrimônio imaterial, logo ligado à
propriedade, a qual tem fundamento diametralmente oposto aos direitos da personalidade. 112
Ainda leciona que:
Não é qualquer empresa privada que consegue ter direito à fama, à
respeitabilidade e ao crédito quando nasce. São coisas diversas, são
coisas distintas. A fama, a boa fama, a honra objetiva da empresa é
algo que a empresa conquista no desenvolvimento de suas atividades.
É algo que ela faz integrar no seu patrimônio, é um bem imaterial que
ela desenvolve e faz com que seja meritória de proteção. Isso não
significa que tenha a mesma denominação, o mesmo conteúdo, a
chamada “dignidade humana”.113
Como bem informa-nos Anderson Casé, nossa opinião não é a majoritária na doutrina e
jurisprudência, contudo merece nota relembrar que não se aplica às pessoas jurídicas a honra
subjetiva, conclusão lógica em face da inexistência, por estes entes de uma consciência
própria. 114
Segundo os que defendem a aplicação da honra aos entes fictícios, estes sofreriam
abalos à sua reputação perante fornecedores, consumidores e toda a sociedade dos ataques
ao seu renome, prejudicando o seu crédito e receita.
Novamente discordamos desta orientação, aderindo ao explanado na citação de Renan
Lotufo, conquanto a reputação da pessoa jurídica integra o seu patrimônio, sendo certo que
merece proteção, contudo as ofensas mencionadas não atingem sua honra e sim seu
patrimônio, devendo ser assim entendidas.
112
LOTUFO, Renan. Dano Moral da pessoa jurídica. Revista Brasileira de Direito Comparado. n. 25.
Rio de Janeiro: Instituto de Direito Comparado Luso-Brasileiro, 2003. p. 298-301.
113
Idem, ibidem, p.299. (com grifos no original)
114
CASÉ, Anderson George de Lima. op. cit., p. 55.
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3.5.3. Privacidade
Este direito está literalmente insculpido no texto constitucional, inciso X do artigo 5º,
bem como no artigo 21 do Código Civil, sendo entendido como o direito ao segredo e o direito
de estar só.
Como bem ressalta Roxana Borges, este direito também compreende duas ascepções, a
primeira ligada à intimidade, à necessidade de proteger-se a esfera privada da pessoa contra a
publicidade, concedendo o direito do indivíduo de recato.115
Como bem explicam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona:
O elemento fundamental do direito à intimidade, manifestação
primordial do direito à vida privada, é a exigibilidade de respeito ao
isolamento de cada ser humano, que não pretende que certos aspectos
de sua vida cheguem ao conhecimento de terceiros. Em outras
palavras é o direito de estar só.116
Já no tocante ao direito de segredo, temos a definição de Paulo José da Costa Júnior
para quem este direito é o “círculo concêntrico de menor raio em que se desdobra a
intimidade: é o que reclama proteção mais veemente contra a indiscrição”.117
Temos assim, então, que o indivíduo tem proteção para exercer suas atividades
afastadas do conhecimento público e, além disso, de manter em sigilo seus dados, gostos,
comunicações, sentimentos e mesmo atos da vida comum.
É importante observar que o direito à privacidade é protegido independetemente de
ofensa à honra ou imagem, sendo assim se alguma conduta invade esta esfera de proteção
115
BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. op. cit., p. 167.
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA, Rodolfo. op. cit., p. 180.
117
COSTA JÚNIOR, Paulo José da. O Direito de Estar Só: tutela penal da intimidade. São Paulo: RT,
1970. p. 73.
116
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legal, é cabida indenização ainda que não se macule aqueles outros direitos, ou seja ainda que
não haja exposição.
Também ressalta-nos Maria Helena Diniz que mesmo as pessoas notórias têm direito à
privacidade, devendo ser respeitados os aspectos íntimos de sua vida.118
Além de todos os aspectos já mencionados, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona nos trazem
ainda o direito ao sigilo profissional, sendo que este direito não visa resguardar a atividade de
algum profissional, mas sim o direito da pessoa que teve de revelar algum segredo seu a
terceiro, por circunstância da atividade profissional deste, como no caso de médicos, padres e
advogados. Vemos que neste caso, está sendo resguardado o direito do indivíduo a manter sua
privacidade, mesmo frente à necessidade pontual de precisar expô-la a um profissional. Este
profissional passa a ter o dever de manter o segredo, sendo a violação crime conforme artigos
153 e 154 do Código Penal.119
Segundo pontua Anderson Casé, a doutrina e jurisprudência brasileiras têm entendido
existir uma espécie de direito à privacidade e intimidade das pessoas jurídicas que estaria
ligada ao segredo industrial, dando ensejo à percepção de danos morais quando de sua
violação.120
Neste sentido manifesta-se Carlos Bittar:
Desse direito desfruta também a pessoa jurídica, que, a par do
segredo, faz jus à preservação da sua vida interna, vedando-se, pois, a
divulgação de informações de âmbito restrito. Há, inclusive, normas
legais que proíbem a difusão de dados de cunho confidencial na
empresa (assim, no âmbito societário; no plano da publicidade; das
comunicações). Mas, de outro lado,por exigências do mercado, ficam
certas empresas obrigadas a divulgar informações (as companhias
abertas), integrando-se, aliás, em mecanismos regulamentadores
próprios de fluxo de dados, sob controle estatal.121
118
DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 129.
GAGLIANO, Pablo Stolze;PAMPLONA, Rodolfo. op. cit., 182.
120
CASÉ, Anderson George de Lima. op. cit., p. 58.
121
BITTAR, Carlos Alberto. op. cit., p. 114.
119
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Data venia, não podemos concordar com o pensamento esposado pelo supra
mencionado autor.
Parece-nos, em verdade, que as pessoas jurídicas são regidas pela publicidade, posto
que seus atos constitutivos são registrados e podem ser acessados por qualquer cidadão
(artigo 45 do Código Civil) e, mais atualmente, as entidades mais respeitadas são aquelas que
aderem ao Novo Mercado122 e mantêm divulgação constante da destinação de suas receitas e
bem como dos projetos em que investem.
Aliás, como bem ressalta o citado autor, as companhias abertas têm a obrigação de
divulgar os seus demonstrativos contábeis, conforme artigo 176 da Lei 6.404/76:
Art. 176. Ao fim de cada exercício social, a diretoria fará elaborar,
com base na escrituração mercantil da companhia, as seguintes
demonstrações financeiras, que deverão exprimir com clareza a
situação do patrimônio da companhia e as mutações ocorridas no
exercício:
I - balanço patrimonial;
II - demonstração dos lucros ou prejuízos acumulados;
III - demonstração do resultado do exercício; e
IV - demonstração das origens e aplicações de recursos.
IV – demonstração dos fluxos de caixa; e
V – se companhia aberta, demonstração do valor adicionado.
§ 1º As demonstrações de cada exercício serão publicadas com a
indicação dos valores correspondentes das demonstrações do exercício
anterior.123
Vemos assim, que tal determinação legal contrasta diretamente com o direito à
privacidade que tem a pessoa humana, especialmente porque esta tem direito ao seu sigilo
fiscal e bancário, que deve ser protegido de forma ampla e irrestrita.
122
Segundo Ivan Procoli Calvo, o Novo Mercado é um segmento de listagem de empresas que adotam
práticas mais claras de governança corporativa e de relacionamento com os seus acionistas. Assim, para
ingressar neste seleto grupo, uma companhia deve adotar regras mais rígidas que as legais quanto à
divulgação de informações contábeis e administrativas, gerando um “disclosure”, bem como ampliar os
direitos dos acionistas. CALVO, Ivan Procoli. O “Novo Mercado”, a Governança Corporativa e a
Arquitetura Financeira: aspectos comparativos e sua influência sobre o controle organizacional.
Disponível em <http://www.economiabr.net/colunas/calvo/novomercado.html>, acesso em 27/07/2011.
123
BRASIL. Lei nº 6.404, de 15/12/1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6404consol.htm>, acesso em 25/07/2011.
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Sendo assim, a mera existência de um direito ao segredo industrial, que conforme
veremos é direito patrimonial das pessoas jurídicas para o resguardo seu sucesso econômico,
não pode de qualquer modo ser confundido com o direito personalíssimo da privacidade, com
o qual não guarda qualquer semelhança.
3.5.4. Nome
O nome é um dos direitos da personalidade que também tem sido estendido aos entes
morais, para efetivar uma suposta proteção aos direitos daquelas personalidades, contudo
antes de perquirir esta questão específica, veremos o conceito de nome como direito da
personalidade.
O nome é a identificação da pessoa perante a sociedade, assim como sua imagem é a
sua conformidade exterior que lhe identifica, o nome é a designação civil que individualiza
cada ser.
Alguns autores referem-se a este direito como identidade.
Conforme ensinam Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald:
É certa e incontroversa a importância de cada pessoa ser identificada
socialmente, individualizando-se em relação às demais. Aliás data de
priscas eras a importância conferida ao nome, percebendo-se até
mesmo na Bíblia Sagrada que, entre os hebreus, emprestava-se nome
individual aos recém-nascidos logo aos oito dias de vida, momento em
que se dava a circuncisão, somente vindo a ser admitida a homonímia
tempo depois, fruto do crescimento populacional.124
124
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 170.
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Vemos assim, que o nome é elemento que distingue o ser humano e o dá
individualidade perante seus semelhantes, sendo, desta forma, indubitável componente da
personalidade.
O nome da pessoa física é composto de prenome e sobrenome (este relativo à sua
família, conotando assim a sucessão familiar). Além disso, o nome da pessoa natural é regido
pela imutabilidade relativa, só podendo ser alterado em casos excepcionais previstos na lei:
Art. 57. A alteração posterior de nome, somente por exceção e
motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida
por sentença do juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se o
mandado e publicando-se a alteração pela imprensa, ressalvada a
hipótese do art. 110 desta Lei.125
Por outro lado, o nome da pessoa jurídica pode ser alterado a qualquer momento e por
qualquer motivo, desde que haja consenso (ou maioria, dependendo dos casos) entre aqueles
que a compõem.
Segundo Carlos Alberto Bittar, o nome comercial (ou empresarial) também merece
proteção enquanto direito de personalidade, posto que serve à identificação do negócio e
individualização da empresa.
O nome comercial, em verdade, pode constituir-se de duas maneiras, uma delas é a
firma social, em que se utiliza elementos dos nomes dos sócios acrescidos ou não de menção
ao ramo da atividade a ser desenvolvida; a outra forma é a denominação é composta de um
“elemento fantasia” (expressão lingüística qualquer, não coincidente com o nome civil dos
sócios) acompanhado, obrigatoriamente, da designação do ramo de atividade.126
Vemos assim que o nome empresarial nem sempre guarda conotação de realidade com
os elementos identificadores dos sócios, pois pode ser constituído de elemento fantasia.
125
BRASIL. Lei nº 6.015 de 31 de dezembro de 1973. Dispõe sobre os registros públicos e dá outras
providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6015.htm>, acesso em
28/07/2011.
126
COELHO, Fábio Ulhoa. op. cit., p.177-178.
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Ainda assim, leciona Carlos Alberto Bittar:
Por sua vez, o nome comercial, submete-se a regime próprio, previsto
na legislação mercantil. Desdobrando-se em nome, firma ou razão
social (em que figuram nomes de pessoas) e em denominação (com
expressões de fantasia), sujeita-se, para os mesmos fins e efeitos do
nome civil, a registro próprio (disciplinado pela Lei nº 8.934/94).
Admite-se a defesa contra usos não consentidos, ou além dos limites
consentidos, em face da economicidade e da negociabilidade do
direito em causa, que, ao reverso do civil, goza de expressão
pecuniária e possibilita a expansão de negócios além fronteiras (como
no licenciamento de griffes), extinguindo-se com a baixa no
registro.127
Para nós, o pensamento do citado autor, por si só, demonstra a total incompatibilidade
do nome comercial com a tutela dos direitos da personalidade, posto que como vimos, estes
direitos não têm expressão econômica e são inalienáveis.
Já o nome comercial “goza de expressão pecuniária” e tem como característica a
“negociabilidade”. Não há, todavia, como se negar tais características ao nome comercial, uma
vez que o mesmo pode ser negociado, bem como pode o empresário ceder ou alienar sua
marca ou mesmo extingui-la, diferentemente do nome civil, o qual sempre será designativo
daquele ser e gozará da proteção respectiva.
Outro ponto importante é que o nome da pessoa jurídica empresária, uma vez
registrado e arquivado na Junta Comercial, tem proteção apenas no âmbito estadual, ou seja,
outro empresário poderá utilizar o mesmo nome em outra unidade da federação sem infringir
nenhuma lei. Neste sentido informa Fábio Ulhoa:
Tais arquivamentos, contudo, não impedem que, em outro Estado da
Federação (Rio de Janeiro, suponha-se), seja arquivado ato
constitutivo com nome empresarial colidente.
(...)
127
BITTAR, Carlos Alberto. op. cit., p. 131.
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Como o registro do nome empresarial tem abrangência estadual, e não
nacional, os seus efeitos estão restritos aos Estados em que o
empresário tem sede ou filial.128
Interessante notar a questão da marca, posto que esta, regulada pela Lei de Propriedade
Industrial (Lei nº 9.279/96), é definida como sinal distintivo que identifica produtos e serviços
de um determinado empresário e, por conseqüência, acaba por identificá-lo.129
Podemos assim, dizer que a marca, em última instância, é a identificação do empresário
frente aos seus consumidores. Pois bem, como a legislação brasileira adota o regime atributivo
do registro de marca, é possível que determinada pessoa explore uma marca durante anos e
depois venha a perdê-la para outrem que a registre primeiramente (ressalvado o direito de
precedência insculpido no artigo 129, § 1º da Lei 9.279/96).130
Desta forma, resta inconteste que o nome da pessoa natural não tem qualquer
similaridade com o nome da pessoa jurídica, o qual estará submetido à atividade econômica,
podendo ser alienado ou cedido.
Por isso, não se pode tentar conceder a ambos o mesmo tratamento jurídico, posto que
diferentes são seus fundamentos, devendo ser diferentes os seus tratamentos legais.
128
COELHO, Fábio Ulhoa. op. cit., p. 181-182
Idem, ibidem, p.139.
130
“O registro de natureza atributiva ocorre quando a propriedade sobre a marca vier a se constituir com a
concessão do registro da marca à primeira pessoa que protocolizar a solicitação do mesmo perante um
órgão público”. BARBOSA, Denis Borges. Direito de Precedência ao Registro de Marcas. Disponível
em <jus2.uol.com.br/revista/texto/4985/direitodeprecedencia.html>, acesso em 05/04/2011.
129
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4. INAPLICABILIDADE DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE ÀS PESSOAS JURÍDICAS
Após as anteriores explanações sobre personalidade e direitos personalíssimos,
podemos, enfim entender sobre o descabimento dos direitos da personalidade às pessoas
jurídicas, face a diferença principiológica que rege cada um destes institutos.
Entretanto, antes de debruçarmos sobre o assunto, convém uma revisão sobre o que diz
expressamente a legislação e a jurisprudência sobre o tema em análise.
4.1. DISPOSITIVOS LEGAIS E ENTENDIMENTOS JURISPRUDENCIAIS
O Código Civil de 1916 não trazia qualquer dispositivo acerca dos direitos da
personalidade, como vimos anteriormente, mesmo porque estes somente vieram a ser
plenamente desenvolvidos no pós guerra.
Contudo, como os direitos da personalidade foram desenvolvendo-se na doutrina antes
da legislação, chegou-se à questão de se estes caberiam aos entes fictícios.
Inicialmente, houve uma tendência a negar-se a extensão destes direitos aos ente
fictícios, como informa-nos Renan Lotufo, especialmente nos Tribunais de Justiça do Rio de
Janeiro e Rio Grande do Sul.
Tal pensamento também foi esposado pelo então ministro do Superior Tribunal de
Justiça, Carlos Alberto Menezes Direito, em voto no Recurso Especial nº 147702 / MA:
O conceito de honra objetiva, opondo-se ao conceito de honra
subjetiva, com todo o respeito, é, apenas, um artifício para o fim
colimado. Em nenhuma hipótese, e é um fato insuscetível de
contestação, a pessoa jurídica pode sofrer dano moral.
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Tudo o que se passa na esfera da atividade empresarial, ou não,
desenvolvida por sociedades organizadas de acordo com a lei, deve,
necessariamente, repercutir no patrimônio. Se, por exemplo, contra
uma instituição financeira é assacada informação mentirosa sobre sua
capacidade de cumprir os compromissos com seus clientes, é evidente
que não há falar em dano moral, mas, sim, em dano à credibilidade da
empresa com repercussão patrimonial, assim a fuga de clientes ou o
encerramento das contas. O que não pode existir é a empresa se sentir
ofendida em sua dignidade, na sua honra. Se fosse diferente, estar-seia no reino do absurdo. 131
Apesar da contundente opinião do citado ministro, a jurisprudência majoritária que se
firmou no Superior Tribunal de Justiça foi no sentido de conceder-se a aplicação dos direitos
personalíssimos às pessoas jurídicas.
Neste sentido:
CIVIL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - RESPONSABILIDADE
CIVIL – PESSOA JURIDICA - DANO MORAL.
I - A HONRA OBJETIVA DA PESSOA JURÍDICA PODE SER
OFENDIDA PELO PROTESTO INDEVIDO DE TÍTULO
CAMBIAL.
II - CABÍVEL A AÇÃO DE INDENIZAÇÃO, POR PESSOA
JURÍDICA; VISTO QUE A PROTEÇÃO DOS ATRIBUTOS
MORAIS DA PERSONALIDADE NÃO ESTÁ RESERVADA
SOMENTE ÀS PESSOAS FÍSICAS (RESP N. 60.033-2-MG - DJ DE
27.11.95).
III - RECURSO CONHECIDO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.132
Duplicatas fraudulentas. Protesto. Banco endossatário. Ciência do
vício. Dano moral. Pessoa jurídica.
1. Tendo ciência inequívoca o banco endossatário de que as duplicatas
eram fraudulentas, sem lastro algum, deve o mesmo responder pelos
danos morais decorrentes do protesto.
131
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 147702/MA. Relator: Carlos Alberto
Menezes
Direito,
Brasília,
D.J.
05/04/1999,
disponível
em
<https://ww2.stj.jus.br/processo/jsp/ita/abreDocumento.jsp?num_registro=199700638286&dt_publicacao
=05-04-1999&cod_tipo_documento=>, acesso em 27/07/2011.
132
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 58660/MG. Relator: Waldemar Zveiter,
Brasília,
D.J.
22/09/1997,
disponível
em
<https://ww2.stj.jus.br/processo/ita/listarAcordaos?classe=&num_processo=&num_registro=1995000047
63&dt_publicacao=22/09/1997>, acesso em 27/07/2011.
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2. Incidência, na espécie, da vedação da Súmula n° 07/STJ quanto à
verificação da boa-fé do endossatário, afastada no Acórdão recorrido.
3. Ressalvada a posição deste Relator, tem direito a pessoa jurídica de
postular indenização por danos morais ocasionados por ofensa à sua
honra. Precedentes da Corte.
4. Dissídio jurisprudencial que não sustenta a passagem do recurso
especial, a teor da Súmula n° 83/STJ.
5. Recurso especial não conhecido.133
Tal entendimento foi embasado pelo pensamento de doutrinadores que já sustentavam,
à época, o cabimento de tal extensão dos direitos da personalidade, como é o caso de Carlos
Alberto Bittar, para quem as pessoas jurídicas, assim como as naturais, atuam na sociedade
para a realização dos princípios jurídicos e por isso seriam detentoras de personalidade e dos
direitos a ela inerentes.134
Para o autor, apesar de certas peculiaridades não permitirem que todos os direitos
personalíssimos sejam aplicados aos entes morais, estes são detentores de direito ao nome,
marca, honra e segredo.135
Desta forma, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e, consequentemente, os
demais tribunais estaduais passaram a entender que estendiam-se às pessoas jurídicas os
direitos da personalidade.
É de notar-se que esta aplicação, conforme vimos nos acórdãos acima citados, deu-se
principalmente no que cabe à indenização por danos morais e mais especificamente nos casos
de protesto indevido ou inclusão em órgãos de restrição de crédito.
Parece-nos que assim ocorreu, porque nestas situações específicas é muito difícil
mensurar o dano sofrido, se tomarmos a visão estritamente patrimonial, tornando-se
complicada a indenização.
133
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 161913/MG. Relator: Carlos Alberto
Menezes
Direito,
Brasília,
D.J.
18/12/1998,
disponível
em
<https://ww2.stj.jus.br/processo/ita/listarAcordaos?classe=&num_processo=&num_registro=1998000069
90&dt_publicacao=18/12/1998>, acesso em 27/07/2011.
134
BITTAR, Carlos Alberto. op. cit., p. 28.
135
Idem, ibidem, p. 45.
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Em face da reiterada jurisprudência, editou-se, ainda na vigência do Código Civil de
1916, a súmula 227 do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe: “a pessoa jurídica pode sofrer
dano moral”. 136
Assim, consagrou-se o entendimento de que as pessoa jurídicas eram titulares dos
direitos da personalidade, podendo pleitear sua proteção.
Conforme informa-nos Anderson Casé, o Código Civil de 2002 fez a discussão pender
ainda mais no sentido da aplicabilidade:
O código civil de 2002 trouxe o artigo 52 afirmando que seria
aplicado no que coubesse, às pessoas jurídicas, a proteção dos direitos
da personalidade, previstos naquele capítulo. Este artigo vem sendo
interpretado pela doutrina e jurisprudência pátria de forma que as
pessoa jurídicas são detentoras de determinados aspectos dos direitos
da personalidade e, portanto, podem figurar no pólo passivo de uma
demanda que objetiva a reparação por danos morais.
Realmente, após a vigência do novo código, o tema que ora discutimos foi pacificado
nos tribunais, sendo inúmeros os exemplos de aplicação dos direitos da personalidade às
pessoas jurídicas.
Mesmo diante de tais obstáculos bastante alicerçados, entendemos que tal extensão é
descabida e desvirtua os direitos personalíssimos, conforme passaremos a discorrer.
4.2. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A INAPLICABILIDADE ÀS PESSOAS JURÍDICAS
Não obstante o artigo existente no Código Civil e a súmula editada pela jurisprudência
reiterada do Superior Tribunal de Justiça, temos que discordar no sentido de que não são
aplicáveis às pessoas jurídicas os direitos da personalidade, conforme explicitaremos.
136
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula 227. Brasília, D.J. 08/10/1999, disponível em <
http://www.stj.jus.br/SCON/>, acesso em 27/07/2011.
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Inicialmente cabe citar a lição de Pietro Perlingieri, que é claro e contundente em
afirmar que é incabível a tutela dos direitos da personalidade às pessoas jurídicas, utilizando
como fundamento a diversidade das razões de tutela:
Os chamados direitos da personalidade e as pessoas jurídicas. É
possível remover o equívoco sobre a extensão dos direitos da pessoa
humana às pessoas jurídicas. Se a tutela da pessoa humana afunda as
suas raízes na cláusula geral presente no art. 2º da Constituição e
qualquer aspecto ou interesse concernente à pessoa é tutelado na
medida em que sejam essenciais ao seu pleno e livre desenvolvimento,
é também verdade que qualquer interesse referidos às pessoas
jurídicas, não somente assume significados diferentes, mas recebe
também uma tutela que encontra um distinto fundamento. Para as
pessoas jurídicas o recurso à cláusula geral de tutela dos “direitos
invioláveis” do homem constituiria uma referência totalmente
injustificada, expressão de uma mistificante interpretação extensiva
fundada em um silogismo: a pessoa física é sujeito que tem tutela; a
pessoa jurídica é sujeito; ergo, à pessoa jurídica deve-se aplicar a
mesma tutela. Daqui uma concepção dogmática e unitária da
subjetividade como fato neutro. O valor do sujeito pessoa física é,
todavia, diverso daquele do sujeito pessoa jurídica.137
Conforme informa o citado autor, os direitos da personalidade fundamentam-se na
dignidade da pessoa humana, consoante princípio insculpido no artigo 1º, inciso III da
Constituição Federal (referido no texto como artigo 2º, em referência à Constituição Italiana)
e, conforme posiciona Renan Lotufo, este valor (da dignidade) transcende a qualquer outro,
tanto que decorreu de uma conquista histórica milenar, decorrente de incansáveis lutas e,
mais recentemente, de duas guerras mundiais, alcançando o patamar de Declaração
Universal.138
No mesmo sentido é a doutrina de Roxana Borges, entendendo que apesar das pessoas
jurídicas serem detentoras de personalidade e capacidade, não podem ser titulares de direitos
137
PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil: Introdução ao Direito Civil Constitucional, tradução
Maria Cristina de Cicco. 3 ed. Riode Janeiro: Renovar, 2007. p 39.
138
LOTUFO, Renan. op. cit., p. 298.
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da personalidade, pois estes são exclusivos dos seres humanos. Para a autora, incorre em erro
a jurisprudência quando adota o posicionamento reverso.139
Para Pablo Malheiros da Cunha Frota, só a pessoa humana pode titularizar direitos
personalíssimo, pois estes derivam exclusivamente da dignidade da pessoa humana e
realização do mínimo existencial, o que não pode ser aplicado às pessoas jurídicas. Além disso,
ressalta o autor, os direitos da personalidade estão ligados às situações existenciais, as quais
estão afastadas do cotidiano das pessoas jurídicas.140
As pessoas jurídicas, fundamentam-se na idéia de patrimônio e desenvolvimento da
atividade econômica, mesmo quando têm finalidade não-lucrativa. Estes entes estão
intrinsecamente ligados aos seus patrimônios e suas atividades, importando-lhes apenas como
manter seu sustento. Estes entes fictícios não têm a suscetibilidade e a beleza humana, não se
emocionam nem se deprimem; por conseguinte, não podem desfrutar daquilo que visa
resguardar o mínimo existencial humano, sob pena de perdermos esta proteção tão eficaz que
tem sido dispensada pelo Direito.
Como bem pontua Orlando Gomes: “tanto as pessoas físicas como as jurídicas são
sujeitos de direito, mas a naturalidade de umas e a artificialidade das outras obriga a
discipliná-las diversamente”. 141
Também no sentido de diferenciar as tutelas entre as pessoas:
Levando-se em conta a interpretação do direito civil constitucional, as
pessoas jurídicas são detentoras de valores diversos daqueles que
fundam a pessoa humana, pois os entes fictícios são meros
instrumentos para a promoção da pessoa humana, e não há como se
sobrepor o instrumento à substância. Desta forma, chega-se ao
entendimento de que a pessoa jurídica foi criada para desenvolver as
potencialidades e os projetos de vida dos seres humanos. Assim, a
139
BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. op. cit., p. 20.
FROTA, Pablo Malheiros da Cunha. Danos Morais e a Pessoa Jurídica. São Paulo: Método, 2008. p.
262
141
GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil. 10 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993. p. 146.
140
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pessoa humana é um fim em si mesmo, enquanto as pessoas jurídicas
são o meio.142
Sendo assim, a dignidade da pessoa humana, enquanto corolário que fundamenta e dá
valor aos direitos da personalidade, jamais poderá ser estendido às pessoas jurídicas, posto
que estas atuam na esfera econômica e ali desenvolvem suas atividades, requerendo, desta
maneira, proteção econômica de seus bens.
Por isso, também seria incabível para os entes fictícios a indenização por danos morais,
posto que esta visa resguardar ofensas aos direitos da personalidade.
Neste sentido é clara e contundente a lição de Gustavo Tepedino:
Com base em tais premissas metodológicas, percebe-se o equívoco de
se imaginar os direitos da personalidade e o ressarcimento por danos
morais como categorias neutras, adotadas artificialmente pela pessoa
jurídica para a sua tutela (a maximização de seu desempenho
econômico e de seus lucros). Ao revés, o intérprete deve estar atento
para a diversidade de princípios e de valores que inspiram a pessoa
física e a pessoa jurídica, e para que esta, como comunidade
intermediária constitucionalmente privilegiada, seja merecedora de
tutela jurídica apenas e tão-somente como um instrumento
(privilegiado) para a realização das pessoas que, em seu âmbito de
ação, é capaz de congregar.143
Salienta ainda o autor que a previsão contida no artigo 52 do Código Civil em nada
contradiz a impossibilidade de extensão dos direitos da personalidade às pessoas jurídicas.
Pelo contrário, o próprio artigo expressamente diz que se aplicará a proteção dos direitos da
personalidade. Desta forma, o texto legislativo não quis expandir a incidência dos direitos da
personalidade, apenas a forma de proteção ou a técnica de proteção.144
Também assim se manifesta Anderson Casé, informando:
Ressalte-se que a indenização por danos morais em relação aos seres
humanos, não repara prejuízos, tendo em vista serem irreparáveis os
142
CASÉ. Anderson George de Lima. op. cit., p. 113.
TEPEDINO, Gustavo. op. cit., p. 57-58.
144
Idem, ibidem, p. 55-56.
143
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referidos danos, mas sim compensam o ofendido. No caso do ente
coletivo, o mesmo entendimento não pode ser aplicado, porque não
sofre dor, não pode determinar indenização com fundamento
exclusivo na punição do ofensor, mas sim geram abalo de
credibilidade ou crédito ao ente coletivo.145
Neste sentido, parece-nos que a extensão sugerida pelo artigo 52 do Código Civil é para
que, nos casos de danos de difícil comprovação ou liquidação, seja-se aplicado aos entes
coletivos a indenização por arbitramento, como é feito nas indenizações decorrentes de
violações a direitos personalíssimos, podendo o juiz arbitrar o valor de acordo com critérios
similares.
Nos próximos subitens detalharemos as formas de proteção dos direitos das pessoas
jurídicas, especialmente nestes casos de difícil liquidação ou comprovação.
Pelo exposto, mais uma vez concluímos que os direitos da personalidade não podem ser
aplicados às pessoas jurídicas em face da diferença axiológica dos institutos em questão,
especialmente pelos fundamentos dos direitos personalíssimos. Além disso, a conformação e
os objetos de proteção dos direitos da personalidade são incongruentes com a tutela da
pessoa jurídica, especialmente no que tange ao desenvolvimento de suas atividades
econômicas e a persecução dos lucros.
4.3. PROTEÇÃO LEGAL AOS SUPOSTOS “DIREITOS DA PERSONALIDADE” DOS ENTES FICTÍCIOS
Apesar de nossa fundamentada posição pelo afastamento dos direitos da personalidade
para as pessoas jurídicas, entendemos que os direitos de tais entes não ficarão sem o devido
resguardo legal, posto que já são objeto de dispositivos de lei vigentes no ordenamento.
145
CASÉ, Anderson George de Lima. op. cit., p. 121.
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Conforme normalmente vemos na doutrina e jurisprudência, normalmente são
aplicados às pessoas jurídicas o direito ao nome, direito à imagem, direito à honra objetiva e
direito ao segredo.
No que tange ao nome, as pessoas jurídicas têm a proteção deste resguardada no
Código Civil, especialmente no artigo 1.166, que garante a exclusividade estadual do nome e,
no caso do seu parágrafo, nacional em se tratando de registro especial. A lei 8.934/94 também
traz dispositivos concernentes ao registro do nome empresarial e sua proteção, conforme
artigo 35 da mesma lei.
Em outro giro, temos a marca, que nos tempos atuais tem sido elemento principal de
caracterização das pessoas jurídicas (o que abrangeria uma proteção ao nome e à imagem).
Este instituto está conceituado e descrito na Lei 9.279/96, que dispõe sobre a propriedade
industrial, em seus artigos 122 a 182.
Segundo a citada lei, a marca é sinal distintivo utilizado para identificar um produto ou
serviço dos demais (artigos 122 e 123). Desta forma, a marca é o elemento caracterizador da
atividade de determinada pessoa jurídica.
Segundo o artigo 130 da Lei de Propriedade Industrial, um dos direitos conferidos ao
titular da marca é o de zelar pela integridade material e pela reputação da mesma. Sendo
assim, confere-se expressamente o direito ao empresário de resguardar a sua desígnia de
ofensas e má utilização, proteção esta que deverá ser efetivada pelo manejo de ações de
repressão e de indenização. Parece-nos que neste espeque, está-se protegendo também a
chama “honra objetiva”, posto que resguarda-se a reputação da marca registrada.
Outrossim, vemos também que a multicitada lei permite a cessão e licenciamento do
uso da marca pelo seu titular, seja a título oneroso ou gratuito (artigos 134 e 139).
Além de todas estas proteções, os artigos 189, 190 e 191 ainda tipificam como crimes a
utilização indevida da marca, nome comercial e título de estabelecimento:
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Art. 189. Comete crime contra registro de marca quem:
I - reproduz, sem autorização do titular, no todo ou em parte, marca
registrada, ou imita-a de modo que possa induzir confusão; ou
II - altera marca registrada de outrem já aposta em produto colocado
no mercado.
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa.
Art. 190. Comete crime contra registro de marca quem importa,
exporta, vende, oferece ou expõe à venda, oculta ou tem em estoque:
I - produto assinalado com marca ilicitamente reproduzida ou imitada,
de outrem, no todo ou em parte; ou
II - produto de sua indústria ou comércio, contido em vasilhame,
recipiente ou embalagem que contenha marca legítima de outrem.
Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) meses, ou multa.
Art. 191. Reproduzir ou imitar, de modo que possa induzir em erro ou
confusão, armas, brasões ou distintivos oficiais nacionais, estrangeiros
ou internacionais, sem a necessária autorização, no todo ou em parte,
em marca, título de estabelecimento, nome comercial, insígnia ou
sinal de propaganda, ou usar essas reproduções ou imitações com fins
econômicos.
Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) meses, ou multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem vende ou expõe ou
oferece à venda produtos assinalados com essas marcas.146
Apesar de toda esta proteção, como vige no direito de propriedade industrial brasileiro
o regime aquisitivo sobre a marca, conforme já vimos aquele que não a registra sobre ela não
detém qualquer direito.
Inclusive, se outra pessoa registrar a marca, esta que será a titular e poderá opor
pretensão face ao que não registrou, ressalvado o direito de “utilização anterior”. Ainda que
apoiado nesta prerrogativa legal queira-se defender-se a prescindibilidade do registro da
marca, a doutrina é unânime em asseverar que este direito é limitado, podendo o seu titular
perdê-lo pela inércia (como já abordamos no capítulo anterior), enquanto que os direitos da
personalidade, como vimos, são irrenunciáveis e imprescritíveis.
Além do que abordamos, entendemos que a proteção da comumente chama honra
objetiva das pessoas jurídicas, está eminentemente ligada ao abalo de credibilidade e mesmo
à retração de suas atividades econômicas causadas por ofensas à sua reputação.
146
BRASIL. op. cit.
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Neste sentido, concordamos com o Renan Lotufo, para quem a reputação da pessoa
jurídica (honra objetiva) é bem que integra seu patrimônio imaterial, merecendo guarida do
ordenamento jurídico.147
A questão que se configura é como dimensionar e comprovar estes danos causados à
reputação ou renome do ente coletivo, uma vez que este abalo de credibilidade produz efeitos
a longo prazo?
Responderemos a esta questão no próximo subitem, tecendo considerações acerca das
formas de apuração e indenização destas violações.
Por fim, temos que abordar o direito ao segredo que muitos doutrinadores imputam às
pessoas jurídicas. Para nós este direito em verdade não existe, posto que os entes coletivos
são regidos pela publicidade de seus atos, especialmente os constitutivos, sem o quê estes são
inválidos.
Na verdade, o que existe é um segredo industrial ou segredo de empresa, que resguarda
àqueles que estão na atividade econômica exclusividade no uso de métodos novos. Este
direito é concretizado quando do registro de patente, a partir do qual o inventor passa a ter o
direito de exclusividade de exploração.
Entretanto, ao registrar a patente o inventor dá publicidade ao seu invento e o método
que utilizou. Muitos empresários, por isso, exploram suas invenções sem registro, para manter
a novidade de seus inventos.
Ainda assim, informa-nos Fábio Ulhoa:
O segredo de empresa não está totalmente desamparado no direito
brasileiro. Pelo contrário, a lei tipifica como crime de concorrência
desleal a exploração, sem autorização, de “conhecimentos,
informações ou dados confidenciais, utilizáveis na indústria, comércio
ou prestação de serviços, excluídos aqueles que sejam de
conhecimento público ou que sejam evidentes para um técnico no
147
LOTUFO, Renan. op. cit., p. 300.
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assunto”, se o acesso ao segredo foi fraudulento ou derivou de relação
contratual empregatícia.148
Sendo assim, o que existe é uma proteção à atividade econômica, reprimindo-se a
concorrência desleal e não privilegiando-se um suposto direito à privacidade das pessoas
jurídicas
4.4. MÉTODOS DE COMPROVAÇÃO E/OU APURAÇÃO DOS DANOS MATERIAIS DE DIFÍCIL
LIQUIDAÇÃO SOFRIDOS PELAS PESSOAS JURÍDICAS
Parece-nos que a grande questão que levou tanto os juízes quanto o legislador a
apoiar a aplicabilidade dos direitos da personalidade às pessoas jurídicas está ligada à
dificuldade de apurar-se os danos patrimoniais sofridos em casos de abalo de crédito, ofensa
ao nome empresarial, utilização indevida da marca, entre outros.
Neste aspecto, poderemos “salvar” o artigo 52 do Código Civil de sua flagrante
inconstitucionalidade, atribuindo a este uma interpretação conforme, ressaltando-se o
vocábulo “proteção” como significado de que possam ser aplicados aos casos de danos
materiais de difícil liquidação e/ou comprovação sofridos pelas pessoas jurídicas o método de
arbitramento de valores indenizatórios, assim como os tribunais têm feito com os casos de
danos morais.
Desta forma, estar-se-á não somente resguardando-se a integridade dos direitos da
personalidade, bem como permitindo-se a plena indenização dos casos difíceis dos entes
fictícios.
Alguns doutrinadores tomam rumo diverso, manifestando que tais danos seriam os
chamados danos institucionais, que são aqueles que geram abalo na atividade econômica mas
148
COELHO, Fábio Ulhoa. op. cit., p. 140.
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não são propriamente materiais, conforme referem Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald.Para
estes autores os danos institucionais também poderiam ser arbitrados pela autoridade
judiciária a partir da análise da ofensa e seus potenciais prejuízos, ainda que não comprovados
estes.149
Para nós, novamente com base na tese de Renan Lotufo, estes danos à reputação ou
credibilidade das pessoas jurídicas são danos intrinsecamente patrimoniais150. Contudo, estes
atingem o patrimônio imaterial destes entes, tornando difícil a mensuração da perda
econômica ocasionada ou mesmo a comprovação dela.
Pensemos no exemplo de publicação de matéria jornalística atribuindo a determinada
associação científica falsidade nos seus estudos. Tal matéria certamente repercutirá no
conceito que esta associação desfruta no seio da sociedade, gerando um dano à atividade
daquela. Este dano terá como conseqüência a diminuição dos aportes de contribuições, perda
de patrocínios, redução de contratos e patentes que a associação detém, entre outros. Prima
facie a associação não tem como sequer comprovar este dano e ainda que assim o possa, o juiz
não terá como decidir com embasamento probatório a extensão deste.
Nestes casos, sustentamos que deve ser aplicado o disposto no artigo 52 do Código
Civil, atraindo para a resolução destas querelas a forma de liquidação dos danos aos direitos da
personalidade.
Importante frisar, estamos atraindo somente a técnica de resolução da quantificação
dos danos que tem se usado na experiência da defesa dos direitos da personalidade para
aplicação às pessoas jurídicas, o que pode ser feito sem qualquer sacrifício axiológico ou
mesmo ofensa ao enriquecimento ilícito.
Tal aplicação deverá, ainda assim, pautar-se na ilicitude da conduta, potencialidade do
dano, reputação do ofendido e situação econômica do ofensor, para que esta indenização não
149
150
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., 282-283
LOTUFO, Renan. op. cit., p. 300.
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venha a ser irrisória, deixando de resguardar os bens jurídicos tutelados, ou exacerbada,
levando ao enriquecimento ilícito e à insolvência do ofensor.
Em verdade, teremos, de um lado, a plena indenização dos danos causados e
penalização do infrator dos direitos do ente coletivo e, de outro lado, a compatibilização do
artigo 52 do Código Civil com a Constituição e a principiologia que cerca os direitos da
personalidade.
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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
É difícil argumentar contra um dispositivo de lei expresso, sendo que inclusive, a
legislação processual caracteriza tal atitude de litigância de má-fé; contudo no caso específico
do artigo 52 do Código Civil, somos forçados a crer que tal dispositivo dissona do princípio
constitucional sobre o qual se erigem os direitos da personalidade ou, numa tentativa de
mantê-lo no ordenamento, devemos utilizá-lo como alternativa legal para o arbitramento de
indenizações nos casos de difícil liquidação.
Vimos que os direitos da personalidade foram brandidos a ferro e fogo para a proteção
daquilo que o ser humano tem de mais essencial à sua existência e mesmo para garantir a sua
subsistência numa sociedade pautada pela economia.
Por isso, os direitos da personalidade representam uma categoria jurídica altamente
carregada de valor histórico e que por isso foi alçada ao patamar de direito fundamental e
recebeu as características de absolutos, extrapatrimoniais, inalienáveis, impenhoráveis,
imprescritíveis, irrenunciáveis e relativamente disponíveis.
Os direitos da personalidade devem assim permanecer como categoria segregada de
direitos que não podem ser vilipendiados, reduzidos ou relativizados, o que fatalmente
ocorrerá se a expansão que lhes tem sido feita perdurar.
Isto porque se tais possibilidades começarem a serem aceitas, poderemos ter,
futuramente, u movimento de redução dos direitos da personalidade, assim como ocorreu
com os direitos patrimoniais, que foram relativizados em face da função social.
Desta forma, uma vez que os direitos da personalidade forma concebidos e estão sendo
desenvolvidos para a proteção e exaltação dos seres humanos, não podemos entender como
se poderia aceitar a sua aplicação às pessoas jurídicas. Mesmo porque a própria Constituição
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Federal é expressa em dizer que um dos princípios fundamentais da República Brasileira é a
dignidade da pessoa humana.
As pessoas jurídicas baseiam-se no fundamento de separação patrimonial e autonomia
obrigacional, sendo importante para este instituto a possibilidade de negociação, no mercado,
de seus direitos e manutenção de sua atividade.
Conforme evidenciamos, toda a teoria da personalidade jurídica dos entes coletivos foi
acompanhada pela expansão do capitalismo e a necessidade de circulação da riqueza, que é
inerente a este.
Com a evolução das relações sociais surgiram entes fictícios que não estavam
direcionados ao lucro, mas que mesmo assim derivavam da mesma necessidade de separação
patrimonial e autonomia da vontade. Por isso, entendemos que mesmo as associações,
fundações, partidos políticos e organizações religiosas têm em seu cerne uma ligação muito
forte com os seus patrimônios e o desenvolvimento de suas atividade, pois todos precisam de
recursos para sobreviver.
Sendo assim, a aplicação dos direitos da personalidade às pessoas jurídicas iniciará um
processo de mitigação destes direitos, enfraquecendo as supracitadas características que os
protegem.
Pela diferença axiológica entre os institutos, concluímos que não se aplicam às pessoas
jurídicas os direitos da personalidade.
Ainda assim, o texto do Código Civil, no intuito de resolver questões ligadas à liquidação
de danos referentes ao abalo de crédito ou credibilidade, inseriu um artigo prevendo que
podem ser utilizados, nestes casos, os métodos de liquidação dos direitos da personalidade
para a proteção dos direitos das pessoas jurídicas.
Vemos assim, que não há qualquer confusão entre o dispositivo do código e os
fundamentos constitucionais dos direitos em tela, uma vez que o mesmo primou pela
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ampliação da reparabilidade dos direitos patrimoniais das pessoas jurídicas, emprestando-lhes
uma técnica de liquidação dos direitos personalíssimos.
Este empréstimo, em nada pode ser utilizado para concluir, da forma que vem
concluindo a jurisprudência brasileira, de que se estendem os direitos da personalidade às
pessoas jurídicas.
Ainda assim, os supostos direitos que a doutrina vem tentando resguardar com a
imprópria extensão dos direitos personalíssimos, já estão resguardados por outros institutos
do direito civil e empresarial.
Neste sentido, demonstramos que a marca protege o suposto direito de imagem das
pessoas jurídicas, inclusive possibilitando que estas negociem com este direito, o que é
interessante do ponto de vista da economia.
Também, o nome empresarial tem sua proteção na forma da legislação vigente, desde
que submetido ao registro regular, sendo que uma parte desta tutela se confundirá com o
direito de marca.
O segredo de indústria ou de empresa também tem sua proteção contra a apropriação
ilícita, seja na esfera cível como na criminal.
Por último o suposto direito à “honra objetiva” será resguardado pela tutela da
reputação ou renome, como bem imaterial pertencente ao patrimônio da pessoa jurídica,
desde que esta faça por merecer tal proteção.
Vemos assim, que os defensores da extensão dos direitos da personalidade não têm
razão ao dizer que estão tutelando direitos não resguardados às pessoas jurídicas, pois o
ordenamento já tratou de protegê-los. Obviamente o resguardo conedido para estes entes foi
mais limitado que o das pessoas humanas, pois assim ordena a própria tábua axiológica
esculpida na constituição cidadã.
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Pela nova principiologia do Direito Civil, a personalidade do ser humano não é mais um
atributo jurídico e sim um valor que deve fundamentar e permear todo o ordenamento,
servindo de guia para a resolução dos conflitos.
Isto porque o ser humano centraliza o foco de atenções do direito, sendo os seus
sentimentos, experiências e sua dignidade valores revestidos de proteção jurídica.
Apesar de algumas pessoas jurídicas desenvolverem atividades ligadas à filantropia,
mesmo estes entes ainda guardam a relação estreita com o seu patrimônio e atividade, não
tendo as projeções psíquicas e físicas que conceituam os direitos da personalidade.
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inaplicabilidade dos direitos da personalidade às pessoas jurídicas