AVALIAÇÃO DA DI ÂMICA DA ÁGUA A ZO A VADOSA EM SOLOS DE DIFERE TES USOS COM O MODELO HYDRUS-1D Aline de Almeida Mota1 & Masato Kobiyama2 RESUMO --- O uso do solo é um fator importante no planejamento territorial, pois influencia diretamente no movimento da água no solo. Neste contexto, o presente trabalho teve como objetivo avaliar a influência do uso do solo na dinâmica da água na zona vadosa com a aplicação do modelo HYDRUS-1D, na região de Rio Negrinho/SC. Foram considerados quatro tipos de uso do solo para comparação: pastagem, reflorestamento, floresta nativa e agricultura (solo nu). Foram determinadas textura, condutividade hidráulica saturada e porosidade total em laboratório de cada tipo de solo. Com a aplicação do Rosetta Lite Version 1.1, que implementa funções de pedotransferência, estimou-se os parâmetros das equações de van Genuchten. Os perfis de potencial matricial e umidade volumétrica ilustram a variabilidade da dinâmica da água no solo. Entre os tipos de solo a variabilidade é evidente, sendo que entre eles o perfil de Pinus é o único que se satura, e mata nativa é o que apresenta a frente de molhamento mais lenta. ABSTRACT --- Land use is an important issue in the land planning, because it influences directly on hydrological processes. Thus, the present study aimed to evaluate the water dynamics in the vadose zone in different land uses by applying the HYDRUS-1D model in the region of Rio Negrinho/SC. For a comparative study, four types of land use were considered: pasture, reforestation, native forest and agriculture (bare soil). In laboratory, texture, saturated hydraulic conductivity, and saturated water content (total porosity) of soils at two different depths for each land use were determined. The parameters of van Genuchten equations were estimated by using Rosetta Lite Version 1.1 that implements pedotransfer functions. The time-variation profiles of pressure head and soil-water content illustrate the variability of soil water dynamics. Among the land uses, the reforestation was the only profile that was saturated, and the native forest presented the slower wetting front movement. Palavras-chave – Dinâmica da água no solo, manejo do solo, HYDRUS-1D. 1 Bolsista do CNPq, Mestranda no Programa de Pós-graduação em Engenharia Ambiental da UFSC, CTC/ENS/LabHidro, Caixa Postal 476, Florianópolis/SC, 88040-900, Brasil. E-mail: [email protected] 2 Bolsista do CNPq, Professor associado III, UFSC, CTC/ENS/LabHidro, Caixa Postal 476, Florianópolis/SC, 88040-900, Brasil. E-mail: [email protected] XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 1 1 I TRODUÇÃO As propriedades hidráulicas do solo são alteradas de acordo com seu uso e cobertura. Diversos estudos comprovaram essa variação das propriedades do solo. Por exemplo, Abreu et al. (2003) verificaram que a variabilidade espacial de propriedades físico-hídricas do solo apresenta relação direta com fatores de formação e manejo do solo e afeta a produção de culturas. Souza e Alves (2003) concluíram que as diferentes formas de uso e manejo do solo promovem alterações no movimento da água no solo. É notável que a maioria dos estudos tenta auxiliar na escolha do manejo mais adequado para as culturas agrícolas, e poucos tratam da influência dos diferentes usos do solo (pastagem, reflorestamento, entre outros) na variação das propriedades hidráulicas do mesmo. O uso e manejo do solo influenciam no que diz respeito à qualidade e quantidade dos recursos hídricos (Tucci e Clarke, 1997; Merten e Minella, 2002). Atualmente, a questão da escolha do uso de solo mais adequado é uma das temáticas mais discutidas. Essa também é a situação atual na região do município de Rio Negrinho/SC, onde a cobertura vegetal original, caracterizada predominantemente pela floresta de araucária (Floresta Ombrófila Mista), foi degradada pela exploração de seus espécimes e pela substituição para reflorestamento e agricultura. Com isso, ambientalistas e comunidades começaram a questionar sobre o uso de solo mais adequado para a preservação dos recursos hídricos. Neste caso, uma base para a tomada de decisões pode ser o estudo da influência do uso do solo nos processos hidrológicos (Nosetto et al., 2011). Assim, deve haver um planejamento para que sejam dados o uso e manejo mais adequados para determinada área. Para isso, deve-se conhecer a influência dos diversos usos/manejos do solo no movimento da água nesse meio, com base em estudos científicos. Um de tais estudos pode ser feito através da modelagem que é uma importante ferramenta de estimativa e previsão dos processos hidrológicos. Especialmente quando se trata de um processo que apresenta uma variabilidade temporal e espacial como o movimento da água no solo. Neste contexto, o objetivo do presente trabalho foi avaliar a dinâmica da água na zona vadosa em diferentes manejos do solo utilizando o modelo HYDRUS-1D proposto por Šimůnek et al. (2008), na região de Rio Negrinho/SC. 2 MATERIAIS E MÉTODOS 2.1 Área de estudo Esse trabalho foi desenvolvido na Bacia do Rio Preto que faz parte da Rede de Bacias-escola de Kobiyama et al. (2008). Essa rede se localiza na região do município de Rio Negrinho, XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 2 aproximadamente entre os paralelos 25º55’00’’ e 26º42’00’’ de latitude sul e meridianos 48º57’00’’ e 49º55’30’’ de longitude oeste (Figura 1). A região se caracteriza por rochas sedimentares pertencentes aos Grupos Itararé, do SuperGrupo Tubarão. As formações pertencentes a este grupo são: Formação Campo do Tenente, Mafra e Rio do Sul. A principal unidade geomorfológica encontrada na região é Patamar de Mafra, cujas características são: relevo com superfície regular, quase plana, de baixa energia de relevo (SANTA CATARINA, 1986). Segundo EMBRAPA (2004) e Santa Catarina (1986), os solos da região se classificam predominantemente por Cambissolos, sendo que uma pequena porção é Gleissolos. Os Cambissolos compreendem os solos minerais, não hidromórficos, com horizonte B incipiente bastante heterogêneo, em relação à cor, espessura e textura, e em respeito à atividade química da fração argila e saturação por bases. Figura 1 – Localização de coleta (AG: agricultura, PT: pastagem, PN: pinus, e N: mata nativa) XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 3 O modelo econômico do município de Rio Negrinho contribuiu para a alteração da paisagem natural. Atualmente restam apenas poucas áreas de mata nativa (Floresta Ombrófila Mista), e muitas áreas são utilizadas pelo reflorestamento de pinus. As atividades agropecuárias também são praticadas na região. As principais culturas agrícolas encontradas são: milho, soja, feijão e fumo. As áreas de pastagem são para criação de bonivos, suínos, caprinos. Além disso, são criadas aves na região (PREFEITURA DE RIO NEGRINHO, 2009). Assim, os usos e cobertura do solo predominantes na região são Floresta Ombrófila Mista, reflorestamento de pinus e agricultura, sendo encontradas também áreas de pastagem. 2.2 Análise do solo 2.2.1 Coleta em campo Foram coletadas amostras de solo deformadas e não-deformadas em quatro pontos (Figura 1). Para a coleta das amostras deformadas se utilizou o trado holandês. As amostras não-deformadas foram coletadas com a utilização de um conjunto de instrumentos composto por: 1 trado SoilControl modelo TAI capacidade para cilindro com cabo de 15 cm, 2 hastes prolongadoras de 40 cm, 1 Cabo extrator, 1 marreta de ferro revestida com borracha, cilindro de inox de 52 mm de altura x 50 mm de diâmetro, 2 chaves com boca 16 mm e 1 espátula fina. A amostragem foi realizada em duplicata nas profundidades de 15 e 45 cm. 2.2.2 Ensaio das amostras em laboratório A análise granulométrica (amostras deformadas) foi realizada segundo a NBR7181. Com as amostras não-deformadas obteve-se dois parâmetros hidráulicos dos solos: condutividade hidráulica saturada (KS) e porosidade total (θs). As amostras saturadas foram submetidas ao ensaio com permeâmetro de carga variável (Cauduro e Dorfman, 1986), pois se tratam de solos com baixos valores de KS. Após a realização desse ensaio, as amostras foram completamente secas em estufa. A partir da diferença entre a massa da amostra totalmente saturada e seca foi obtida a porosidade total dos solos. 2.3 Caracterização do solo com as equações de van Genuchten O modelo computacional Rosetta Lite Version 1.1, baseado em redes neurais, foi aplicado a fim de obterem-se as equações de van Genuchten (1980), para a retenção de água: θ (Ψ ) = θ r + θs − θr [1 + (αΨ ) ] n m XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos (1) 4 onde θ é a umidade volumétrica do solo (cm3/cm3); θr é a umidade residual (cm3/cm3); θs é a umidade saturada (cm3/cm3) que é igual á porosidade total; Ψ é o potencial matricial (cm); α, m e n são os parâmetros de ajuste sendo que m=1-(1/n). E para permeabilidade: [ 1 − (α Ψ )n −1 1 + (α Ψ K (Ψ ) = K s m n 2 1 + (α Ψ ) [ )] n −m ] 2 (2) onde Ks é a condutividade hidráulica saturada (cm/s) e K é a condutividade hidráulica não saturada (cm/s). Além disso, derivando a Equação 1, obtemos a capacidade específica da água, definida como C (Ψ ) = (∂θ ∂Ψ ) : C (Ψ ) = − m ⋅ n ⋅ α n ⋅ (θ s − θ r ) ⋅ Ψ n −1 [1 + (α Ψ ) ] (3) n m +1 O modelo Rosetta Lite Version 1.1 está inserido no modelo HYDRUS-1D e implementa funções de pedotranferência hierárquicas cujos dados de entrada podem ser classe textural, distribuição de textura, densidade do solo e um ou dois pontos de retenção de água (Schaap et al., 2001). Esse modelo não permite estimar os parâmetros das equações de retenção e de KS aplicando θS e KS como dados entrada. Então, por tentativa, foram utilizados valores de textura que correspondessem a uma aproximação dos valores de θS e KS medidos em laboratório. Portanto, foram considerados dois casos para estimativa das equações de van Genuchten. O primeiro corresponde àquelas estimadas a partir dos dados de textura obtidos em laboratório; e no segundo caso, a partir de tentativas de textura, foram obtidas as curvas de retenção e permeabilidade cujos parâmetros θS e KS são muito próximos àqueles dos ensaios de laboratório. 2.4 Simulação da dinâmica da água na zona vadosa O HYDRUS-1D é um modelo numérico para simulação unidimensional do fluxo de água, calor e múltiplos solutos em meios saturados e/ou não saturados. Além disso, permite considerar a absorção de água pelas raízes, o crescimento das raízes e o transporte de CO2. O modelo resolve a equação de Richards para fluxo unidimensional (Equação 4) e tipos de equação de advecçãodispersão para transporte de calor e soluto. ∂θ ∂Ψ ∂ = C (Ψ ) = ∂t ∂t ∂z ∂Ψ K (Ψ ) ∂z − K (Ψ ) XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos (4) 5 onde z é a profundidade da camada orientada positivamente para baixo; t é o tempo; e C(Ψ) é a capacidade específica, representada pela derivada da umidade em função da tensão (∂θ/∂Ψ), (Equação 3). A Equação 4 considera apenas fluxo de água na fase líquida e desconsidera os efeitos do vapor no balaço geral de massa. A Figura 2 apresenta o fluxograma da simulação com HYDRUS-1D. Classe textural Condições de contorno ou % de areia, silte e argila Critérios de iteração ou % de areia, silte e argila e ρss ou % de areia, silte e argila, ρss e θ33KPa ou Parâmetros hidráulicos das equações de van Genuchten (1980) Informações geométricas do perfil % de areia, silte e argila, ρss, θ33KPa e θ1500KPa Discretização no tempo Funções de pedotransferência Sendo: ρss: densidade do solo; θ33KPa: umidade volumétrica na tensão de 33 KPa; θ1500KPa: umidade volumétrica na tensão de 1500 KPa. Equação de Richards Informações de saída: • Tensão matricial; • Umidade; • Condutividade hidráulica; • Capacidade hidráulica. Figura 2 – Fluxograma da aplicação do modelo HYDRUS-1D A profundidade dos perfis de solo considerados na simulação foi verificada em campo (Tabela 1). Foram consideradas duas camadas para cada uso, sendo a camada superior com profundidade de 15 cm, e a inferior varia de acordo com a profundidade total correspondente a cada uso de solo. Na simulação, foi utilizada a discretização no tempo de intervalos de 1 s, e no espaço, dz varia para cada perfil, portanto o modelo divide a profundidade do perfil automaticamente em 100 células iguais (Tabela 1). XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 6 Tabela 1 – Discretização no espaço utilizada nas simulações e a profundidade dos perfis dz Profundidade do perfil (cm) (cm) Mata nativa 0,90 90 Agricultura 0,92 92 Pastagem 1,10 110 Pinus 0,65 65 Uso do solo A respeito das condições de contorno, foi simulada uma precipitação de 50 mm/dia constante durante toda a simulação com duração de 1,5 dias. Na parte inferior do perfil foi considerada a condição de contorno de drenagem livre. Além disso, como condição inicial se considerou uma carga de pressão = – 100 cm. Como para cada uso do solo a interceptação varia, os dados de precipitação na simulação da dinâmica da água na zona vadosa devem ser diferenciados. Chaffe (2009) investigou a interceptação de pinus através de monitoramento, mostrando que houve uma média da perda de 21,4% por interceptação. Então, o presente estudo aplicou uma chuva com 21,4% de redução no caso do solo com pinus. 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO 3.1 Ensaios de laboratório A Tabela 2 apresenta os resultados dos ensaios de textura de cada uso do solo nas profundidades de 15 e 45 cm. O solo que mais apresenta diferença entre as duas profundidades é aquele que se caracteriza pelo reflorestamento de pinus. Segundo o clássico triângulo de classificação textural (MONIZ, 1972), os solos se classificam majoritariamente como franco. Sendo que o solo cujo uso é reflorestamento de pinus se classifica como argiloso ou franco argiloso na profundidade de 45 cm. Tabela 2 – Resultados das análises de textura dos solos Profundidade Areia grossa Areia fina Silte Argila Classificação textural (cm) (%) 15 8 58 20 14 * Mata nativa 45 6 54 25 15 * 15 3 40 27 30 ** Agricultura 45 3 36 37 24 *** 15 6 46 30 18 *** Pastagem 45 12 40 23 25 **** 15 4 21 35 40 ** Pinus 45 9 31 19 41 ** Uso do solo *Franco-arenoso; **Franco-argiloso; ***Franco; **** Franco argilo-arenoso XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 7 Os parâmetros hidráulicos θS e KS obtidos em laboratório são apresentados na Tabela 3. Na profundidade de 15 cm, o solo na mata nativa resultou no mais poroso, e com a menor KS. Essas características indicam que esse solo deve apresentar alta capacidade de retenção alta. Por outro lado, o solo do reflorestamento de pinus possivelmente possui baixa capacidade de retenção, apresentando os maiores valores para os dois parâmetros. Tabela 3 – Propriedades hidráulicas do solo obtidas nos ensaios de laboratório. Uso do solo Mata nativa Agricultura Pastagem Pinus θS (cm3/cm3) 15 cm 45 cm 0,46 0,38 0,38 0,44 0,42 0,39 0,44 0,42 KS (cm/s) 15 cm 45 cm 1,13E-03 2,51E-03 3,35E-03 5,16E-03 1,51E-03 3,17E-03 5,31E-03 6,82E-03 3.2 Aplicação do Rosetta Lite Version 1.1 Como resultado da aplicação do Rosetta Lite Version 1.1 obteve-se os parâmetros da equação de retenção e KS (Tabela 4). Quando consideradas as equações estimadas a partir da textura, o solo com menor KS é aquele caracterizado por agricultura, e o maior é o coberto por mata nativa. Inversamente, o perfil de mata nativa apresentou a menor θs, e o de pinus o maior. Uma possível razão para isso é o fato de a área de mata nativa, onde foi feita a amostragem, já não se apresentar na sua forma mais natural, e então não ser tão argiloso como esperado. Tabela 4 – Parâmetros da equação de van Genuchten: (a) estimados pela textura aplicando Rosetta Lite Version 1.1; e (b) aproximação dos medidos, por tentativas de textura. (a) Uso do solo Mata nativa Agricultura Pastagem Pinus Profundidade (cm) 15 45 15 45 15 45 15 45 θr θs (cm3/cm3) (cm3/cm3) 0,049 0,38 0,051 0,39 0,076 0,41 0,069 0,41 0,057 0,39 0,068 0,40 0,089 0,46 0,085 0,43 α (cm-1) 0,0304 0,0252 0,0179 0,0113 0,0183 0,0218 0,0136 0,0233 n (-) 1,3876 1,3867 1,3578 1,4604 1,4092 1,3506 1,3573 1,2604 KS (cm/s) 3,74E-04 2,98E-04 7,36E-05 8,72E-05 1,89E-04 1,29E-04 1,07E-04 8,84E-05 Profundidade (cm) 15 45 15 45 15 45 15 45 θr θs (cm3/cm3) (cm3/cm3) 0,042 0,38 0,045 0,38 0,041 0,39 0,047 0,38 0,042 0,38 0,040 0,40 0,056 0,37 0,052 0,38 α (cm-1) 0,0391 0,0380 0,0413 0,0364 0,0399 0,0429 0,0301 0,0327 n (-) 1,6974 2,2159 2,4918 2,8494 1,8590 2,4433 2,8060 3,0831 KS (cm/s) 1,13E-03 2,51E-03 3,36E-03 5,14E-03 1,50E-03 3,19E-03 5,42E-03 6,82E-03 (b) Uso do solo Mata nativa Agricultura Pastagem Pinus XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 8 O perfil de pinus apresentou alto teor de argila e silte, o que influencia nas propriedades hidráulicas do solo. Além disso, como o solo é heterogêneo, essa amostra pode não representar satisfatoriamente este solo. Comparando os valores de θS estimados por funções de pedotransferência (textura como dado de entrada), o maior erro encontrado em relação aos dados medidos em laboratório foi de 8%. Por outro lado, os valores de KS, estimados da mesma maneira, apresentam um erro da ordem entre 10-1 e 10-2 cm/s em relação aos valores medidos (Tabela 3). Esta variação relativamente alta na estimativa de KS também foi observada por Sonneveld et al. (2003). Uma explicação para essa variação é que, muitas vezes, as funções de pedotransferência não conseguem considerar a existência de fluxos preferenciais. Nas simulações foram utilizados os parâmetros das equações de van Genuchten correspondentes aos apresentados na Tabela 4(a) e 4(b), identificados como estimados e medidos, respectivamente. Os valores de KS obtidos pela aproximação com tentativas de textura (Tabela 4(b)) apresentam erros menores que 1% em relação aos medidos (Tabela 3). Foi observada uma alta correlação entre os valores de KS para as duas profundidades (Figura 3). Assim, pode-se dizer que nessa região, a variação dessa propriedade com a profundidade é uniforme. Essa linearidade pode se dar pelo fato de os parâmetros hidráulicos do solo desta região 8.0E-03 4.0E-04 6.0E-03 3.0E-04 4.0E-03 y = 1.0169x + 0.0015 R² = 0.9911 KS 45 (cm/s) KS 45 (cm/s) serem mais influenciados pela pedogênese que propriamente pelas características da rocha mãe. 2.0E-04 2.0E-03 1.0E-04 0.0E+00 0.0E+00 1.0E-03 2.0E-03 3.0E-03 4.0E-03 5.0E-03 6.0E-03 0.0E+00 5.0E-05 KS 15 (cm/s) (a) y = 0.7295x + 1E-05 R² = 0.9654 1.5E-04 2.5E-04 3.5E-04 4.5E-04 KS 15 (cm/s) (b) Figura 3 – Correlação entre KS das camadas de 15 e 45 cm de profundidade. (a) medidos no ensaio de laboratório, e (b) obtidos pela aplicação do Rosetta Lite Version 1.1 utilizando a textura como dado de entrada XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 9 3.3 Simulações com HYDRUS-1D Nas simulações foram considerados 3 critérios de comparação: (1) Perfis de diferentes usos de solo, porém com θS e KS obtidos da mesma forma; (2) Perfis de mesmo uso do solo, para comparar os resultados de θS e KS obtidos de ensaio em laboratório e aqueles obtidos pelo Rosetta Lite Version 1.1; (3) Perfis caracterizados pelo reflorestamento de Pinus, porém considerando a interceptação obtida por Chaffe (2009). Com relação ao critério de comparação (1), os perfis de Ψ se apresentam bem diferentes para cada uso do solo (Figura 4). Sendo que as maiores diferenças são encontradas no caso dos medidos. O único perfil que se satura inteiramente para as condições dessa simulação é PN (Figura 4(e)), sendo que no tempo de 28,8 horas já se apresentava saturado. Além disso, o perfil AG (Figura 4(a)) no tempo total de simulação se apresenta também quase saturado. Entre todos os usos analisados, aquele caracterizado por mata nativa apresentou maiores características de retenção. Comparando os perfis de mesmo uso de solo, e com parâmetros medido e estimado (comparação (2)), a alteração na dinâmica da água é em termos de magnitude, porém a forma de saturação se mantém parecida. Apenas para os perfis AG e PN, no caso das propriedades KS e θS estimados, chega próximo da saturação. E quando são consideradas as propriedades medidas em laboratório, a água infiltra rapidamente se afastando da condição de saturação. Nos outros perfis, apesar de os valores serem diferentes, a tendência se mantém. Nas Figuras 4(i) e 4(j) são apresentados os perfis de PNI, em que foi considerada interceptação. Assim, observa-se que o perfil, no caso das propriedades estimadas, também chega à saturação, porém 7,2 h depois. XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 10 Agricultura (AG) Estimado Medido 0 0 -18.4 -18.4 LEGENDA Tempo (h) Profundidade (cm) Profundidade (cm) T0 0 -36.8 -55.2 -73.6 -92 -100 -78 -56 -34 -12 10 T1 7,2 T2 14,4 -36.8 T3 21,6 T4 28,8 T5 36 -55.2 -73.6 -92 -100 -78 -56 -34 -12 10 h [cm] [cm] Ψh(cm) Ψ (cm) (b) (a) Pastagem (PT) Medido 0 0 -22 -22 Profundidade (cm) Profundidade (cm) Estimado -44 -66 -88 -110 -100 -78 -56 -34 -12 -44 -66 -88 -110 -100 10 -78 [cm] Ψh(cm) (c) -56 -34 -12 10 -12 10 [cm] Ψh(cm) (d) Pinus (PN) Medido 0 0 -13 -13 Profundidade (cm) Profundidade (cm) Estimado -26 -39 -52 -65 -100 -78 -56 -34 [cm] Ψh (cm) (e) -12 10 -26 -39 -52 -65 -100 -78 -56 -34 h [cm] Ψ (cm) (f) Figura 4 – Perfis de Ψ obtidos com HYDRUS-1D, sendo (a) AG estimado; (b) AG medido; (c) PT estimado; (d) PT medido; (e) PN estimado; (f) PN medido; (g) N estimado; (h) N medido; (i) PNI estimado; e (j) PNI medido XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 11 Mata Nativa (N) Estimado Medido 0 0 -18 -18 LEGENDA Tempo (h) Profundidade (cm) Profundidade (cm) T0 0 -36 -54 -72 -90 -100 -78 -56 -34 -12 T2 14,4 -36 T3 21,6 T4 28,8 T5 36 -54 -72 -90 -100 10 T1 7,2 -78 -56 [cm] Ψh (cm) (g) -34 -12 10 [cm] Ψh (cm) (h) Pinus com Interceptação (PNI) Medido 0 0 -13 -13 Profundidade (cm) Profundidade (cm) Estimado -26 -39 -52 -65 -100 -78 -56 -34 -12 10 -26 -39 -52 -65 -100 h [cm] -78 -56 -34 -12 10 h [cm] Ψ (cm) (i) Ψ (cm) (j) Figura 4 – Continuação A Figura 5 apresenta a mesma organização da Figura 4, porém para os perfis de θ. Como foram consideradas duas camadas com diferentes θS e KS, existe uma descontinuidade que aparece mais evidente nos perfis de θ que nos de Ψ, principalmente nos quais se consideraram θS e KS medidos. Embora essa variação possa ser gradativa na condição real, ela aparece mais bruscamente na simplificação do perfil em 2 camadas. XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 12 Agricultura (AG) Estimado Medido 0 0 -18.4 -18.4 LEGENDA Tempo (h) Profundidade (cm) Profundidade (cm) T0 0 -36.8 -55.2 -73.6 -92 T1 7,2 T2 14,4 -36.8 T3 21,6 T4 28,8 -55.2 T5 36 -73.6 -92 0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0 0.1 0.2 Theta [-] 0.3 0.4 0.5 Theta [-] θ (cm) θ (cm) (a) (b) Pastagem (PT) Medido 0 0 -22 -22 Profundidade (cm) Profundidade (cm) Estimado -44 -66 -88 -110 -44 -66 -88 -110 0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0 0.1 [-] θTheta (cm) 0.2 0.3 0.4 0.5 0.4 0.5 [-] θTheta (cm) (c) (d) Pinus (PN) Medido 0 0 -13 -13 Profundidade (cm) Profundidade (cm) Estimado -26 -39 -52 -65 -26 -39 -52 -65 0 0.1 0.2 0.3 [-] θTheta (cm) (e) 0.4 0.5 0 0.1 0.2 0.3 [-] θTheta (cm) (f) Figura 5 – Perfis de θ obtidos com HYDRUS-1D, sendo (a) AG estimado; (b) AG medido; (c) PT estimado; (d) PT medido; (e) PN estimado; (f) PN medido; (g) N estimado; (h) N medido; (i) PNI estimado; e (j) PNI medido XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 13 Mata Nativa (N) Medido 0 0 -18 -18 Profundidade (cm) Profundidade (cm) Estimado -36 -54 -72 -90 -36 -54 -72 -90 0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0 0.1 Theta [-] 0.2 0.3 0.4 0.5 0.4 0.5 [-] θTheta (cm) θ (cm) (g) (h) Pinus com Interceptação (PNI) Medido 0 0 -13 -13 Profundidade (cm) Profundidade (cm) Estimado -26 -39 -52 -65 -26 -39 -52 -65 0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 [-] θTheta (cm) 0 0.1 0.2 0.3 Theta [-] θ (cm) (i) (j) Figura 5 – Continuação Considerando o critério de comparação (1), os perfis apresentam dinâmicas bem diferentes, para θS e KS estimados, porém, a faixa de variação de θ é estreita. No caso do critério de comparação (2), a diferença é muito mais marcante entre os perfis de mesmo uso do solo. Porém, os perfis “medidos” se aproximam mais aos resultados esperados, que aqueles estimados pela textura. Portanto, pode-se pensar que a estimativa por funções de pedotranferência não tenha apresentados resultados satisfatórios, ou os ensaios de textura (dados de entrada para estimativas no Rosetta Lite Version 1.1) tenham erros embutidos. No caso da comparação (3), praticamente não se pode verificar alteração nos perfis. Assim, pode-se dizer que a intensidade da chuva não influencia muito nos perfis de θ. XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 14 4 CO CLUSÕES O presente trabalho avaliou a influência do uso do solo na dinâmica da água no solo. Para isso, mediram-se textura, condutividade hidráulica saturada (KS) e porosidade total (θs) em laboratório. A textura do solo foi utilizada para estimar os parâmetros de van Genuchten por funções de pedotransferência. Os valores de θS estimados por pedotranferência foram muito próximos aos medidos por ensaio de laboratório. Porém, os valores de KS estimados se apresentaram entre 10-1 e 10-2 cm/s menores que aqueles medidos em laboratório. Isto implica uma fragilidade das funções de pedotransferência, ao não considerar possíveis caminhos preferenciais, geometria e dimensão dos poros. Ou pode estar ligado a um erro embutido nos ensaios de textura. Com a aplicação do modelo HYDRUS-1D, foi feita a simulação da dinâmica da água na zona vadosa. O movimento da água no solo se altera de acordo com as propriedades hidráulicas do solo. Como o uso do solo altera as propriedades hidráulicas do solo, então a dinâmica da água varia com o uso do solo. Entre todos os usos analisados, aquele caracterizado por mata nativa apresentou maiores características de retenção. Além disso, considerando a interceptação de 21,4% na área de reflorestamento de Pinus, o perfil se satura mais lentamente. Com relação à condutividade hidráulica saturada, a alta correlação entre valores de KS nas profundidades 15 e 45 cm, indica uma variação uniforme desse parâmetro ao longo da profundidade na região de estudo. 5 AGRADECIME TOS Os autores agradecem ao Prof. Antônio Augusto Alves Pereira, coordenador do Laboratório de Irrigação e Drenagem do Centro de Ciências Agrárias (CCA) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) pela disponibilização do laboratório para a realização dos ensaios de solo. BIBLIOGRAFIA ABREU, S.L.; REICHERT, J.M.; SILVA, V.R.; REINERT, D.J.; BLUME E. (2003). “Variabilidade espacial de propriedades físico-hídricas do solo, da produtividade e da qualidade de grãos de trigo em Argissolo Franco Arenoso sob plantio direto”. Ciência Rural. v. 33, n. 2, marabr, pp. 275 – 282. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. (1984). NBR-7181: Solo – análise granulométrica: Método de ensaio. Rio de Janeiro, pp. 13. 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