MORAL, RELIGIÃO E DIREITO: MECANISMO SIMBÓLICO DE
CONTROLE SOCIAL
Admilson Eustáquio Prates1
Kátia Suely de Melo Gusmão2
RESUMO
O presente trabalho se propõe a discutir a relação entre moral, religião e direito
entendidos como mecanismo simbólico de controle social. Isso se dá devido à
capacidade humana de transcender as coisas e construir relações entre elas.
A
moral prescreve o modo, a maneira como a pessoa deve-se comportar em grupo.
Direito e Moral regulamentam as relações de uns homens com outros por meio de
normas. A religião, além de apresentar os códigos de conduta, também mostra a
forma como será castigado caso as regras não sejam cumpridas.
Palavra chave: Moral; Religião; Direito; Relações Humanas.
O presente texto pretende explorar a ideia que a Moral, a Religião e o
Direito constituem mecanismo simbólico de controle social. Isto é, os humanos são
seres simbólicos. Eles não se relacionam com as coisas em sim, mas com a
representação das coisas. Isto é, os símbolos são produções, construções humanas
pelos quais os possibilitam relacionar com mundo objetivo e com o mundo subjetivo.
Por sua etimologia (do grego sum-ballo, ou sym-ballo), o símbolo refere-se
à união de duas coisas. Era um costume grego que, ao se fazer um
contrato, fosse quebrado em duas partes um objeto de cerâmica, então
cada pessoa levava um dos pedaços. Uma reclamação posterior era
legitima pela reconstrução (“pôr junto”=symballo) da cerâmica destruída,
cujas metades deviam coincidir. A união das partes permitia reconhecer que
a amizade permanecia intacta. (CROATTO, 2001, p.84-85).
1
Professor no Instituto Federal de Educação, Ciência e tecnologia de Goiás/Campus Formosa/GO. Doutorando
em Ciências da Religião pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP. Mestre em Ciências da
Religião pela PUC/SP.
2
Coordenadora adjunta do curso de Direito e professora de Direito nas Faculdades Integradas do Norte de
Minas.
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Dessa forma, entendemos símbolo como união, junção que permite ao
ser humano tornar presente aquilo que está ausente, ou seja, nos possibilita
representar o mundo. Por exemplo, quando nos referimos a cruz não significa
determinada cruz, mas a ideia, abstração de cruz.
Quando o mundo é representado, isto é, quando linguagem simbólica é
inventado, ela segue a convenção, aquilo que é aceito por todos do grupo. Enfim, o
símbolo é uma convenção, fruto de uma determinada cultura. Ele está circunscrito
em um determinado tempo e espaço. E, somente neste cenário cultural, ele terá
significado e sentido.
Dessa maneira, o ser humano não é somente um ser natural, mas
também um ser simbólico. Isto é, caminhar, correr, comer, rir/ sorrir, dormir são
atividades naturais de todo os ser humano saudável. Contudo, a maneira de
caminhar, de correr, de comer, de rir/ sorrir, de dormir é vivenciado e interpretado
conforme o grupo social no qual o indivíduo está inserido. O ato de caminhar, que é
uma ação natural de locomover-se de um lugar a outro, pode representar charme,
elegância, sensualidade ou ser repudiado, recebendo determinados adjetivos como
arrogância, soberba.
Isso acontece devido à capacidade humana de transcender as coisas
construindo representações acerca delas. Os indivíduos emitem juízo de realidade e
juízo de valor. O primeiro descreve a realidade, apresenta-a como ela é. Um
exemplo disso é: o carro é vermelho, a cadeira é velha, Joaquim retornou da
viagem, Arnaldo comprou um doce de leite, Maria está rezando, Maria é uma moça.
São exemplos que apresentam e descrevem a realidade sem realizar julgamento ou
avaliar o fato. O segundo emite um parecer, ele faz uma avaliação, ou seja,
apresenta um valor. Isto é, o carro vermelho é tão lindo quanto o prata, a cadeira
velha é mais confortável que a cadeira nova, Joaquim retornou da viagem antes de
concluir as atividades, Arnaldo comprou um doce de leite muito caro, Maria está
rezando para reconfortar o espírito, Maria é uma moça linda.
Na primeira frase, do exemplo, percebe-se uma avaliação estética
assim como na ultima frase. O segundo exemplo emite um juízo de utilidade; o
terceiro, um juízo moral; o quarto realiza uma avaliação acerca do valor econômico
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do produto; o quinto está ligado à dimensão religiosa e de fé. Assim sendo, entendese que a emissão de um juízo de realidade vem acompanhada de um juízo de valor.
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Além de o valor ser resultado das relações entre o individuo e ele
mesmo, e das relações entre o individuo o mundo é também herdado em parte pela
sociedade a pertence. Os valores são repassados para as novas gerações, por
exemplo, por meio da família, da escola, da igreja, das brincadeiras, dos jogos.
A cultura, a sociedade, o grupo social do qual o indivíduo faz parte o
objeto pedra - fragmento de rocha -, por exemplo, é compreendido como uma arma,
um enfeite, um ornamento, um símbolo sagrado ou profano, um objeto de
investimento financeiro.
[...] como a prata. Podemos falar nela tal como existe em seu estado natural
nas jazidas respectivas; é então um corpo inorgânico que possui estrutura e
composição, bem como determinadas propriedades naturais que lhe são
inerentes. Podemos falar também da prata transformadora pelo trabalho e,
então, já não possuímos um mineral em seu estado puro ou natural, mas
um objeto de prata. Como material trabalhado pelo homem, serve, nesse
caso, para produzir braceletes, anéis ou outros objetos de enfeite, para a
fabricação de serviços de mesa, cinzeiro, etc, podendo ser utilizada como
moeda. Temos assim uma dupla existência da prata: a) como objeto natural;
b) como objeto natural humano ou humanizado. Como objeto natural, é
simplesmente um fragmento da natureza com determinadas propriedades
físicas e químicas. (SANCHEZ VÁSQUEZ, 1998, p. 111-112)
Assim sendo, no universo humano as coisas passam até um valor
simbólico, uma representação resultado da ação humana.
A categoria valor tem sua origem nas atividades econômicas sendo
transferido e utilizado nas diversas áreas da atividade humana, sobretudo, na
dimensão acerca da moral.
Conforme Sanchez Vásquez o valor possui alguns
traços essências:
1) Não existem valores em si, como entidades ideias ou irreais, mas objetos
reais (ou bens) que possuem valor.2) Dado que os valores não constituem
um mundo de objetos que exista independentemente do mundo dos objetos
reais, somente existem na realidade natural e humana como propriedade
valiosa dos objetos da mesma realidade.3) Por conseguinte, os valores
exigem – como condição necessária – a existência de certas propriedades
reais – naturais ou físicas – que constituem o suporte necessário das
propriedades que consideramos valiosas.4) as propriedades reais que
sustentam o valor, e sem as quais este não existiria, são valiosas em
potência. Para passar a ato e transformar-se em propriedades valiosas
efetivas, é indispensável que o objeto esteja em relação com o homem
social, com seus interesses e com suas necessidades. Desta maneira, o
que vale somente em potência adquire um valor efetivo. (SÁNCHEZ
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VÁSQUEZ, 1998, p. 116)
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Dessa maneira, visualiza-se que o valor é uma atividade humana que
busca atribuir sentido ao mundo e a si mesmo. Quando atribuímos sentidos
fundamos regras, normas, e isso é resultado da prática valorativa, estabelecimento
de um plano de ação que direcionará as escolhas, buscando o bem e evitando
aquilo que prejudica.
Nesse raciocínio sobre a busca do bem entende-se que matar, roubar,
furtar, mentir, trair são ações imorais, rejeitadas pela sociedade. Na convivência
humana, sendo no mínimo duas pessoas relacionando, é impossível que exista
convívio sem um código moral. Assim sendo, visualiza-se que pode faltar alimentos
e água em uma sociedade, mas não pode deixar de existir um código moral.
O que é moral? Podemos entender por moral um conjunto de regras,
normas, valores que direciona ação do individuo em uma determinada sociedade,
grupo ou comunidade. Conforme Sánchez Vásquez: “Moral vem do latim mos ou
mores, “costume” ou “costumes”, no sentido de conjunto de normas ou regras
adquiridas por hábito. A moral se refere, assim, ao comportamento adquirido ou
modo de ser conquistado pelo homem” (1998, p.14).
Dessa maneira, entende-se que moral é algo que o individuo aprende,
isto é, é imposto ao sujeito desde o momento em que ele nasce. Ela inicialmente
não é uma escolha livre e consciente e, sim, uma imposição que a sociedade, a
comunidade, o grupo, a família impõem sobre a pessoa. Pode-se apresentar alguns
exemplos como: “Menino mastiga com a boca fechada!”; “Não brigue com seu
irmão!”; “Menina, senta direito. Cruza as pernas!”; “Meu filho, vai tomar seu banho,
agora”; “Não pode fazer isso!”; “Está na hora de dormir!”. Esses exemplos são
típicos e especifico de determinada sociedade, ou seja, o código moral é particular,
resultado singular de grupos específicos, e, além disso, está ligado a um
determinado tempo e espaço, como por exemplo, às mulheres há um tempo não era
permito frequentar escola; atualmente as mulheres estudam e ocupam cargos de
executivas em grande empresa, além de, ocupar cargos políticos como: prefeita,
governadora, presidente.
A moral prescreve o modo, a maneira como a pessoa deve-se
comportar em grupo. Ela é constituída estruturalmente em dois aspectos, sendo uma
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normativa e outro fatual. O aspecto normativo está relacionado às normas, as
regras, isto é, ao “dever ser”. O segundo, o fatual, é ato do individuo em ação, isto
é, sendo efetivado.
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Conforme esses dois aspectos podemos classificar a ação humana em
determinado grupo como sendo mora, imoral, amoral e não-moral. O ato moral é
quando a pessoa cumpre, obedece as normas instituída pela sociedade na qual ele
convive. Já a ação imoral é resultado de uma desobediência, uma refeição a regra,
como por exemplo, “Não xingar” e o ato de xingar é imoral.
[...] imoral e amoral. A diferença entre eles é que, enquanto o ato ou postura
imoral é a negação de um determinado código moral vigente, no sentido
corrente de devasso, desregrado, libertino, o termo amoral significa uma
postura de neutralidade frente a esta ou àquela moral em questão. Na
prática, não nega mas também não adere; simplesmente passa ao largo
das normas.Isso é muito comum entre as diferenças de padrões culturais de
conduta, notadamente com relação a valores religiosos. A obrigatoriedade,
por exemplo, das mulheres usarem véu sobre as cabeças numa
determinada seita pode não ter significado algum para outras mulheres
visitantes. Se uma mulher de uma determinada comunidade deixar de usar
o véu para infringir o costume, sua atitude pode ser tida ali como um ato
imoral [...] (PEREIRA, 2004, p.15).
No que tange o ato amoral está ligado a ação humana a margem de
qualquer regra ou respeito às normas. E a postura não-moral é quando recorre a
outros critérios de avaliação que não seja moral, por exemplo, analise de uma obra
de arte, uma obra literária isto é, a postura de um crítico de arte é não-moral.
A moral é dinâmica, pois ao mesmo tempo em que os códigos são
recebidos, transmitidos de uma geração para outra, sendo dessa maneira conhecida
como moral constituída ela também transgredi, rompe, enfim, a moral constituinte é
aquela a qual está em movimento, em mudanças. Um exemplo, no período da idade
média na Europa era permito chicotear pessoas em praça publicas e atualmente é
proibido esse comportamento; no Brasil colônia pode-se ter escravo, pessoa negras
eram mercadoria a qual podia-se vender e comprar, e além disso, ser trato como
coisa. No presente momento, a escravidão é proibido.
Segue abaixo um quadro que apresenta elementos comuns e elementos
diferentes entre Moral e Direito.
QUADRO 1
Moral e direito
Elementos comuns ente moral e Diferença ente moral e direito
direito
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As
normas
morais
se
cumprem
através da convicção íntima
dos
Direito e Moral regulamentam as indivíduos e, portanto, exigem uma
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relações de uns homens com outros adesão intima a tais normas. Neste
por
meio
de
normas.
Postulam, sentido, pode se falar de interioridade
portanto, uma conduta obrigatória e da vida moral (o agente moral deve
devida. O desrespeito de algumas fazer as suas
ou interiorizar as
dessas regras pode originar uma normas que deve cumprir). Já As
tácita
ou
manifesta
desaprovação;
atitude
de normas jurídicas não exigem esta
convicção íntima ou adesão interna, o
indivíduo
deve
cumprir
a
determinação legal mesmo que na
sua intimidade não concorde com ela
(daí falar se da exterioridade do
direito). O importante, no caso é que a
norma se cumpra, seja qual for a
atitude
do
voluntária)
sujeito
com
(forçada
respeitoa
ou
seu
cumprimento. Se a norma moral se
cumpre
por
motivosformais
ou
externos, sem que o sujeito esteja
intimamente convencido de que deve
atuar de acordo com ela, o ato moral
não será moralmente bom (senso
comum), de forma inversa, a norma
jurídica
é
cumprida
formal
ou
externamente, isto é, ainda que o
sujeito esteja convencido de que é
injusta e intimamente não queira
cumpri
la,
irrepreensível
implica
do
ponto
um
ato
de
vista
jurídico. Assim, a interiorizarão da
norma, essencial ao ato moral, não o
é, no âmbito do direito.
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As normas morais e jurídicas têm a O fenômeno da coação é exercido de
forma
de
imperativos
e,
por maneira diversa na moral e no direito:
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conseguinte, acarretam a exigência a coação é fundamentalmente interna
de que se cumpram, isto é, de que os na moral e externa no direito.
indivíduos
necessariamente
se
comportem
de
uma
certa
maneira. Mais ainda.
Respondem a uma necessidade da As normas morais não se encontram
vida social: regulamentar as relações codificadas formal e oficialmente ao
dos homens objetivando garantir a passo que as normas jurídicas gozam
coesão social;
desta
expressão
formal
(escrita,
material, positiva) e oficial em forma
de códigos, leis e diversos atos do
Estado;
Pode se resumir o que foi explanado
dizendo que na concepção de Direito
é
exigível,
enquanto
que
atuar
moralmente reside no campo da
espontaneidade.
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A esfera Moral é mais ampla do que a
Dinamismo Social: a moral e o direito do direito e atinge todos os tipos de
mudam quando muda historicamente relação entre os homens e as suas
comportamento
o conteúdo de sua função social. Em várias formasde
razões disto estas formas de qualquer comportamento pode ser
comportamento têm caráter histórico. objeto de qualificação moral (retomo
A moral varia de tempos em tempos, aqui os pensamentos de Kelsen se
assim como, o Direito. O Código Civil qualquer coisa pode ser direito em
da
norma
fundamental
Brasileiro de 1916, continha certas face
regras que não tinham mais uso na pressuposta, então é certo que o
sua concepção original para os dias Direito se fundamenta concepção
do moral).
grupamento social mudaram e o O Direito, pelo contrário regulamenta
as relações humanas mais vitais para
Direito exigiu nova codificação.
o Estado para as classes dominantes
de
hoje.
As
necessidades
ou para a sociedade em conjunto.
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Iremos observar que algumas formas
de
comportamento
(criminalidade,
por
humano
exemplo)
se
encontra na esfera do direito. O
mesmo se deve dizer de certas
formas de organização social como o
matrimônio
e
a família e as
respectivas relações. Outras relações
entre os indivíduos, como o amor a
amizade,
a
religiosidade,
sociabilidade, não são objeto
a
de
regulamentos jurídicos, apenas moral.
Fonte: Disponível em<http://www.ebah.com.br/content/ABAAAfJK4AF/direito-moral> .Acesso em 16
out. 2014.
Percebe-se que existe uma relação estreita ente moral, direito e religião,
isto é, pode-se compreender religião como sendo um controlador social que exerceu
e exerce um poder, um domínio sobre o ser humano. Paulo Nader, em sua obra
Introdução ao Estudo do Direito, apresenta a categoria religião da seguinte maneira:
Um sistema religioso não se limita a descrever o além ou a figura do
Criador. Define o caminho a ser percorrido pelos homens. Para este fim,
estabelece uma escala de valores a serem cultivados e, em razão deles,
dispõe sobre a conduta humana. [...] Religião é ‘um dos maiores controles
sociais de que dispõe a sociedade’[...] ‘a injustiça e a imoralidade que
diminuem o homem e impedem o desenvolvimento da personalidade, são
intoleráveis para as pessoas verdadeiramente religiosas’ [...] Nelson
Hungria, famoso penalista brasileiro, enfatizou a importância da religião na
paz e equilíbrio social: ’A Religião tem sido sempre um dos mais relevantes
instrumentos no governo social do homem e dos agrupamentos humanos.
Se esse grande fator de controle enfraquece, apresenta-se o perigo do
retrocesso do homem ás formas primitivas e antissociais da conduta, de
regresso e queda da civilização, de retorno ao paganismo social e moral. O
que a razão faz pela ideias, a religião faz pelos sentimentos’. (NADER,
2011, p. 34)
A religião, além de apresentar os códigos de conduta, também mostra a
forma como será castigado caso as regras não sejam cumpridas. Voltaire, em sua
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obra Dicionário Filosófico, apresenta a função social do inferno:
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Desde que os homens começaram a viver em sociedade devem ter
percebido que não poucos criminosos escapavam à severidade das leis.
Puniam-se os crimes públicos: restava estabelecer um freio para os crimes
secretos. Só a religião poderia ser esse freio. Persas, caldeus, egípcios,
gregos, imaginaram castigos depois da morte. [...] Enfim, fariseus e
essênios, entre eles os judeus, admitiram a crença de um inferno à sua
moda. Esse dogma já passara de gregos a romanos, e foi perfilhado pelos
cristãos. [...] “Meu caro, não creio no inferno mais que você. Mas é bom que
o creiam a sua criada, o seu alfaiate e também o seu procurador”.
(VOLTAIRE, 2002, p.304-306)
A religião organiza tanto o mundo físico, concreto material quanto o
mundo não físico, ou seja, o mundo invisível. Pode-se entender que religião atribui
sentido a existência do individuo impondo normas, regras e padrões de
comportamento. Isto é, o ser humano não pode ser guiado pelo desejo, pelo
principio de prazer caso isso acontece a sociedade é destruída, ou seja, viver em
sociedade é castrar os desejos, transformá-los em comportamentos aceitáveis pelo
grupo social a qual compõe. Conforme Rodrigo Arnoni Scalquette em História do
Direito: perspectivas histórico-constitucionais da relação entre estado e religião,“A
crença em Deus e, especialmente, o temor que se tem a Ele, traçaram a história da
humanidade, correlacionando poder e dominação.” (Scalquette, 2013, 1)
O Direito Primitivo ou Direito Arcaico, notadamente de um povo ágrafo, ao
estabelecerem regras para viverem em sociedade, usavam o nome dos deuses que
cultuavam para impô-las. Assim sendo, usavam o divino para governar.
Neste
aspecto, afirma Atônio Carlos Wolkmerem Fundamentos de História do Direito:
(...) além do formalismo e do ritualismo, o Direito Arcaico manifesta-se não
por um conteúdo, mas pelas repetições de fórmulas, através dos atos
simbólicos, das palavras sagradas, dos gestos solenes e da força dos rituais
desejados. (...)ainda que, por ser objeto de respeito e veneração, e ser
assegurado por sanções sobrenaturais, dificilmente o homem primitivo
questionava a sua validez e sua aplicabilidade. (Wolkmer, 2010, 4-.5)
No contexto do aparecimento da escrita, na região da Mesopotâmia, deuse a origem dos primeiros códigos da antiguidade, quais sejam, Hammurabi, o de
Manu, o de Sólon e a Lei das XII Tábuas. Estas codificações, eram, nada mais, nada
menos, do que a transcrição dos costumes, crenças e tradições, produzidos na
época. A percepção do fenômeno jurídico encontrava-se de maneira embrionária. O
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não cumprimento das regras estabelecidas pelas leis escritas, implicavam em
penalidades, que por vontade divina, deveriam se materializar em castigos. De
acordo com Rodrigo Freitas de Palma em História do Direito:
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era comum inserir neste vasto rol a mutilação, a decapitação, a empalação,
a crucificação, a flagelação, a morte na fogueira ou na forca, o
apedrejamento, o banimento, assim como a aplicação de uma série de
“ordálias” ou “juízos divinos”, que consistiam em práticas adivinhatórias para
verificar a culpabilidade ou a inocência do réu. Não raro, havia, como se
sabe, a aplicação do princípio ou lei de talião e de penas pecuniárias das
mais diversas. A vingança privada, pois, era a tônica do sentido punitivo
nessas sociedades. (Palmas, 2011, 42-43)
Mesmo com o despontar do monoteísmo, o Direito, que era baseado nos
dez mandamentos e o Sagrado ainda permaneceram indivisíveis e como efeito, atos
desumanos eram aplicados como sanção. Não porque estava previsto no Decálogo,
que possui seus textos legislativos no Antigo Testamento, mas sim pela cultura da
perversidade.
Alguns
doutrinadores
costumam
até
estabelecer um
íntimo
relacionamento entre a Legislação Mosaica e a nossa Carta Magna que zela pelas
garantias fundamentais da pessoa.
Na Escritura Sagrada, conforme a perspectiva cristã, na parte do Antigo
Testamento Salomão escreveu o livro Provérbios ao qual ele apresenta maneira de
como se comportar em sociedade.
1 A resposta branda desvia o furor, mas a palavra dura suscita a ira. 2 A
língua dos sábios destila o conhecimento; porém a boca dos tolos derrama
a estultícia. 3 Os olhos do Senhor estão em todo lugar, vigiando os maus e
os bons 4 Uma língua suave é árvore de vida; mas a língua perversa
quebranta o espírito. 5 O insensato despreza a correção e seu pai; mas o
que atende à admoestação prudentemente se haverá. Fonte: BÍBLIA DE
JERUSALÉM, Pro 15:1-5, p.1042-1043
A religião proporcionou um grande progresso moral para a humanidade,
mas não podemos esquecer ou ser ingênuos que algumas pessoas utilizam da
religião como instrumento para realizar os desejos destrutivos, ou seja, “os
fanatismos religiosos ajudaram a obscurecer muitas vezes a mensagem ética
profunda da liberdade, do amor, da fraternidade universal” (VALLS, 2003, p. 37).
Na sequência de pensamento acerca da exploração do conceito de moral
pode-se realizar uma distinção entre moral e direito, sendo que o direito está
relacionado ao Estado, ao poder do Estado que controla a sociedade mediante, por
exemplos, com leis, decretos. Para Paulo Nader:
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o movimento de separação entre o Direito e a Religião cresceu ao longo do
séc.XVIII, especialmente na França, nos anos que antecederam a
Revolução Francesa. Vários institutos jurídicos se desvincularam da
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Religião, como a assistência pública, o ensino, o estado civil.
Modernamente os povos adiantados separaram o Estado da Igreja, ficando
cada qual com o seu ordenamento próprio. Alguns sistemas jurídicos,
contudo, continuam a ser regidos por livros religiosos, notadamente no
mundo muçulmano. Em 1979, o Irã restabeleceu a vigência do Alcorão, livro
da seita islâmica, para disciplinar a vida do seu povo.( Nader, 2013, 33-34)
Assim sendo, mesmo com todo este contexto histórico, podemos
interpretar que a Moral, a Religião e o Direito são indissociáveis, uma vez que o
Estado é governado pelo povo que age de acordo com as noções que possuem
sobre o bem que aliado as normas técnicas que possuem neutralidade em relação
aos valores , procuram adequar os princípios adquiridos ao longo da existência, à
tomada de decisões, a fim de satisfazerem às necessidades humana. Afinal, é por
isso que o Direito existe.
Bibliografia
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CROATTO, José Severino. As linguagens da experiência religiosa. São Paulo:
Paulinas, 2001.
NADER, Paulo. Introdução ao Direito. São Paulo: Forense, 2011.
NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. Rio de Janeiro: Forense, 2013.
KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes. Trad. de Paulo
Quintela. Lisboa: Edições 70, 1995.
MORENTE, M. G., (1996). Fundamento de Filosofia – Lições Preliminares. 2. ed.
São Paulo: Mestre Jou.
PEREIRA, Otaviano. O que moral? São Paulo: Brasiliense, 2004. PALMA,
Rodrigo Freitas. História do Direito. São Paulo: Saraiva, 2011. SANCHEZ
VÁSQUEZ, Adolfo. Ética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998.
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SCALQUETTE, Rodrigo Arnoni. História do Direito: perspectivas históricoconstitucionais da relação entre estado e religião. São Paulo: Atlas S.A, 2013.
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VALLS, Alvaro, L.M. O que é ética? São Paulo: Brasiliense, 2003.
VOLTAIRE. Dicionário Filosófico. São Paulo: Martin Claret, 2002.
WALKER, Ralph. Kant: Kant e a lei moral. Trad. de Oswaldo Giacóia Júnior. São
Paulo: Unesp, 1999.
WOLKMER, Atônio Carlos (organizador). Fundamentos de História do Direito.
Belo
Horizonte:
Del
Rey,
2010.
Disponível
em
<http://www.ebah.com.br/content/ABAAAfJK4AF/direito-moral> acesso em 16 out.
2014.
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