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Revista Eletrônica da Facimed, v.3,n.3, p.371 – 384 ,jan/jul.2011
ISSN 1982-5285 - ARTIGO ORIGINAL
O USO DO LÚDICO EM HEMODIÁLISE: BUSCANDO NOVAS PERSPECTIVAS
NA QUALIDADE DE ATENDIMENTO AO PACIENTE NO CENTRO DE DIÁLISE
USE OF HEMODIALYSIS PLAYFULNESS IN: SEEKING NEW
PERSPECTIVE ON QUALITY OF PATIENT CARE IN CENTRAL DIALYSIS
Francielly Almeida Cavalcante1
Greice Quelle Saar2
Lillian Sampaio Ramos3
Angela Antunes de Morais Lima 4
RESUMO
A hemodiálise é o método que consiste na filtração dos líquidos extracorporais do sangue por uma
máquina que substitui as funções renais. Com o tratamento, o paciente passa a freqüentar a clínica
constantemente, em um ambiente de monotonia, onde o corpo sofre e a mente padece. Para a
maioria, o mais difícil não é conviver com essas mudanças, e sim o tratamento, visto que este altera
significativamente a sua rotina, provocando desesperança nos resultados. Com o intuito de favorecer
um atendimento humanizado durante as sessões de hemodiálise, verificou-se a necessidade de
inserção de atividades lúdicas no Centro de Diálise de Cacoal, objetivando proporcionar momentos
de descontração, avaliar a resposta ao uso destas atividades pelos pacientes e a participação e
aceitação da equipe de enfermagem. Foi realizada uma pesquisa de campo de caráter exploratório
com abordagem qualitativa, utilizando-se como instrumento de coleta e avaliação dos dados a
entrevista, falas e expressões do paciente e equipe de enfermagem e uma ficha denominada de
Emocionômetro para avaliação do humor. O estudo foi realizado em sete encontros, com dezessete
pacientes submetidos a hemodiálise no período matutino. De acordo com os resultados, as atividades
lúdicas influenciaram positivamente durante o tempo que permaneceram no local, observando que
durante o período, o sorriso emergia no rosto dos pacientes e de toda a equipe de enfermagem,
diminuindo, assim, as intercorrências durante as sessões.
Palavras-chave: Hemodiálise, Atividades Lúdicas, Enfermagem
ABSTRACT
Hemodialysis is the method that consists in filtering liquids extracorporeal blood by a machine that
replaces kidney function. With treatment, the patient began to attend the clinic constantly in an
atmosphere of monotony, where the body suffers and the mind suffers. For most, the hardest thing is
not to live with these changes, but the treatment, as this significantly alters his routine, causing despair
in the results. With a view to promoting a humanized during hemodialysis sessions, there was the
need for engaging in playful activities Dialysis Center of Cacoal, aiming to provide moments of
1
Enfermeira graduada pela Faculdade de Ciências Biomédicas de Cacoal- FACIMED, (2010). E-mail:
[email protected]
2
Enfermeira graduada pela Faculdade de Ciências Biomédicas de Cacoal- FACIMED, (2010).
3
Enfermeira graduada pela Faculdade de Ciências Biomédicas de Cacoal- FACIMED, (2010).
4
Enfermeira graduada pela Universidade Federal de Mato grosso do Sul (UFMS, 2000) especialista em Saúde da
Família pela Universidade Federal de Rondônia - UNIR (2002) e em Didática o Ensino Superior pela Faculdade
de Ciências Biomédicas de Cacoal- FACIMED (2007).
372
relaxation, to evaluate the response to the use of these activities and participation by patients and
acceptance nursing team. We conducted a field study of exploratory qualitative approach, using as an
instrument for data collection and assessment interviews, speeches and expressions of the patient
and nursing staff and a form called Emocionômetro for assessing mood. The study was conducted in
seven meetings, with seventeen patients undergoing dialysis in the morning. According to the results,
the recreational activities positively influenced during the time that remained in place, noting that
during the playful smile emerged in patients' faces and the entire nursing staff, thus reducing the
complications during the sessions.
Key words: Hemodialysis, Recreational Activities, Nursing
1. INTRODUÇÃO
A insuficiência renal crônica (IRC) é um desafio que impõe ao paciente
mudanças de hábitos, ocasionando um grande impacto em seu cotidiano, sendo
necessário a adaptação de novas rotinas na vida diária. Diante dessa situação
conflituosa, é de suma importância considerar não apenas a patologia do paciente,
mas todo seu contexto biopsicossocial.
Segundo Queiroz (2008), as alterações na vida dos pacientes são
incômodas e contínuas, permitindo-lhes sentir-se excluídos por terem que se
submeter ao tratamento dialítico, usarem medicamentos continuamente, reduzir sua
ingesta hídrica e restringir-se de certos tipos de alimentos. O tratamento de
hemodiálise torna o paciente insatisfeito consigo mesmo, pois ele passa a freqüentar
a clínica constantemente, em alguns casos, até três vezes por semana, ficando em
média 4 (quatro) horas por sessão, em um ambiente de monotonia, onde o corpo
sofre e a mente padece.
Diante do exposto, constrói-se uma problemática na qual é questionada a
importância da utilização das atividades lúdicas durante as sessões de hemodiálise
e se estas atividades favorecem a interação entre a equipe de enfermagem e o
paciente.
A pesquisa baseia-se na hipótese de que as atividades lúdicas quando
empregadas, permitem ao paciente, melhoras no enfrentamento da doença e
proporcionam ao mesmo, momentos de alegria, trocas de experiência e esperança
com relação ao tratamento, além de estimular a interação com a equipe de
enfermagem.
Neste contexto, com o intuito de favorecer um atendimento humanizado
durante as sessões de hemodialise, verificou-se a necessidade da inserção das
atividades lúdicas no Centro de Diálise de Cacoal, com o objetivo de analisar a
373
percepção e aceitação do paciente frente a doença e as sessões de hemodiálise,
proporcionar momentos de descontração, avaliar a resposta ao uso destas
atividades pelos pacientes e a participação e aceitação da equipe de enfermagem.
Buscando uma assistência de enfermagem mais qualificada, prestada aos
pacientes com IRC em programa de hemodiálise, a redução do tempo ocioso e
angustiante, que essas sessões de diálise causam, na maioria das vezes, justificase a importância da elaboração e execução desta pesquisa, uma vez que, o
envolvimento do paciente em atividades lúdicas proporcionam todos os benefícios
mencionados.
2. A HEMODIÁLISE
A insuficiência renal crônica (IRC) resulta de numerosas doenças e
representa o declínio da função renal de forma lenta e progressiva (FILHO, 2006).
Lomba e Lomba (2005), relatam que com a diminuição da função renal, todo
o organismo fica comprometido, pois a doença manifesta alterações bioquímicas,
endócrinas e metabólicas, acarretando problemas como insuficiência cardíaca,
hipertensão arterial, edema, hálito amonical, úlceras gastrointestinais, neuropatias
(parestesias,
convulsões,
e
outros),
anemias,
problemas
de
coagulação,
desequilíbrio ácido-básico, redução da libido, graves alterações nos ossos e outros.
Nos casos mais graves da IRC, quando os pacientes não são tratados, ocorre
acúmulo de líquido, formando edema e desequilíbrios metabólicos [...], correndo o
risco de não sobreviver por mais de três ou quatro dias (ZATZ, 2000 apud
PIETROVSKI, 2005).
De acordo com Kusumoto (2008), uma das formas de tratamento da IRC, é a
diálise, do tipo hemodiálise ou diálise peritonial. Estas, apesar de prolongarem a
vida, não promovem a cura. Somente o transplante renal resolverá definitivamente o
problema do paciente.
Lomba e Lomba (2005) afirmam ser a hemodiálise o método de escolha na
diálise, consistindo na filtração dos líquidos extracorporais do sangue por uma
máquina substitutiva das funções renais. Para iniciar o tratamento, é necessário
criar, cirurgicamente, uma fístula arteriovenosa, para ter acesso à circulação do
paciente.
374
2.1 As Atividades Lúdicas
As atividades lúdico-educativas tem sido objeto de transformação na vida de
indivíduos doentes. O lúdico não cura o paciente mais proporciona grandes
melhoras, ajudando no enfrentamento da doença.
Para Erdmann (1998) apud Marisco (2002 p. 36), “o lúdico é um momento de
encontros e iluminação, de fantasias e realidades, [...] de querer brincar, festejar, rir,
enfim, divertir-se, e são momentos de cuidar de si.”
As atividades lúdicas são necessidades humanas inerentes a cada indivíduo,
que permitem a compreensão de experiências mais dolorosas, o aumento da
criatividade e prazer e, assim, facilitam as relações interpessoais (OLIVO, 1998
apud BRASIL & SCHWARTZ, 2005).
Em seus estudos, Beuter (2004), relata que cada paciente responde de
maneira particular as atividades lúdicas, podendo apresentar-se negativamente a
elas, para tanto, cabe a equipe de enfermagem saber empregá-las, materializandose nestas e reconhecer o lúdico como instrumento espontâneo e livre, permitindo a
expressão e a singularidade de cada indivíduo. O mesmo autor ainda diz que nesta
abordagem ambos, enfermeira e cliente são sujeitos criadores, capazes de
reinventar modos e formas de cuidado.
2.2 As Atividades Lúdicas na Hemodiálise
Ao deparar-se com a doença o paciente sente-se amedrontado diante do
dilema entre a morte e a total dependência ao longo de sua vida do tratamento.
Marisco (2002), relata que o cliente quando se vê diante do diagnóstico de uma
doença incurável, de ter que se submeter a um tratamento longo e incerto, de ter
limitações físicas, uma vida social diminuída e um futuro incerto, sofre sérios abalos
tanto em seu estado físico, psíquico, emocional e social.
Além de modificar desfavoravelmente a vida do renal crônico, a doença
consome as perspectivas de vida do paciente. Portanto, é crucial para o resgate de
cada indivíduo, outrora esquecidos e desacreditados, a dedicação da equipe de
enfermagem não apenas com a assistência tecnicista, evidenciando, principalmente
o fato de a hemodiálise não ser o fim, e sim o meio de prolongar a vida.
375
Beuter (2004) considera a enfermagem como arte e ciência, que assiste o
indivíduo em seu estado físico, biológico e espiritual, e reconhece a doença como
instrumento que fere seu bem-estar, utilizando-se, para isso, do lúdico como arte.
Brasil & Schwartz (2005), em sua pesquisa, observaram que o único meio de
distração
dos
pacientes
submetidos
a
hemodiálise
era assistir
televisão,
especificamente aos telejornais, onde as noticias sempre despertavam sentimentos
tristes e depressivos, principalmente para eles que ficam conectados a uma máquina
por quatro horas.
A finalidade do lúdico, durante as sessões de hemodiálise, é transformar o
tempo inativo do paciente em algo produtivo, que possa animá-los e já para a equipe
de enfermagem, o objetivo é promover a integração junto aos clientes, de forma
criativa (MARISCO, 2002). Assim, o apoio terapêutico que ocorre por meio das
atividades lúdicas pode contribuir para todas as questões referentes ao paciente
renal crônico que busca a completa aceitação de si, preservando a dignidade, direito
nato de todo ser humano (BRASIL & SCHWARTZ, 2005).
Desta forma, o uso do lúdico em pacientes portadores de IRC, durante as
sessões de hemodiálise, pode representar novas perspectivas para o cliente com a
relação à doença, ao tratamento e até mesmo a vida.
3. MATERIAIS E MÉTODOS
A pesquisa realizada é de caráter exploratório com abordagem qualitativa,
desenvolvida com pacientes renais crônicos que participam do programa de
hemodiálise no Centro de Diálise de Cacoal (CDC). Esta clínica, atende em média
68 pacientes com IRC por mês, realizando os atendimentos nas segundas, quartas e
sextas-feiras em 3 (três) turnos e nas terças, quintas feiras e sábados em 2 (dois)
turnos. Os pacientes assistidos residem nos municípios de Pimenta Bueno, Cacoal,
Rolim de Moura, Ministro Andreazza, São Miguel do Guaporé, Novo Horizonte entre
outros.
Iniciou-se com a implantação das atividades lúdicas que foram realizadas no
período matutino, com 1 (um) a 2 (dois) encontros semanais, durante 4 (quatro)
semanas, totalizando 7 (sete) encontros, alternando entre as terças, quintas e/ou
sábados, nos meses de agosto a setembro/2010. A amostra se constituiu de 17
pacientes escolhidos de forma seletiva, de acordo com o total de pacientes que
376
freqüentaram o turno em que foram executadas as ações da pesquisa, além de 06
técnicas de enfermagem e 02 enfermeiras que estavam trabalhando durante o turno
selecionado.
A pesquisa não seguiu com exatidão as propostas metodológicas do préprojeto, pois houve redução no número de encontros e alterações no tipo de
atividade a ser realizada, devido ao curto prazo para execução da pesquisa e
limitações encontradas no ambiente físico, respectivamente.
O estudo foi desenvolvido em quatro etapas. Na primeira etapa foi realizada
uma reunião com a enfermeira responsável pela equipe e com a psicóloga da
clínica, onde foram apontadas as limitações dos pacientes e do ambiente e,
sugeridas algumas idéias referentes às atividades. A segunda etapa consistiu na
abordagem aos pacientes através de entrevistas (Anexo 1), onde a proposta desta
pesquisa foi apresentada e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)
assinado. Na terceira etapa foram realizados encontros semanais, executando,
assim, as atividades lúdicas propostas aos pacientes. Na quarta etapa, houve o
encerramento dos encontros, onde foi aplicado um questionário aos pacientes e
equipe de enfermagem (Anexo 2), para avaliação dos resultados.
Os métodos utilizados durante os encontros foram musicoterapia, pinturas e
jogos como: resta um, pega vareta, dominó, dama, trilha maluca, cubo mágico, caçapalavras, baralho e bingo; foi usado ainda uma ficha de avaliação de humor, através
de um instrumento denominado Emocionômetro, que possui caracteres com as
seguintes descrições: alegre, normal, triste, irritado e amedrontado (Anexo 3).
Foram inclusos na pesquisa, pacientes de ambos os sexos, com faixa etária
igual ou superior a 18 anos, sem problemas que os impediram de falar ou participar
da pesquisa, participaram também a equipe de enfermagem, após assinar o TCLE,
sendo exclusos da pesquisa os indivíduos que se negaram a participar das
atividades, menores de 18 anos e qualquer outro motivo que não favoreceu a
realização da mesma.
Para identificar a fala dos participantes da pesquisa, foram utilizados
pseudônimos, sendo P para os pacientes, T para os técnicos de enfermagem e E
para a enfermeira, preservando assim, a identidade dos mesmos. Para divulgação
de fotos dos pacientes em eventos científicos e na apresentação da pesquisa,
participantes assinaram um termo de autorização para sua exibição.
377
4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DE DADOS
Ao longo do tratamento os pacientes hemodialíticos, passam a viver a vida
de uma forma passiva. No início da pesquisa, antes da execução das atividades
lúdicas, procurou-se conhecer as perspectivas dos pacientes durante as sessões de
hemodiálise, visto que o tratamento ocupa um tempo considerável na vida desses
indivíduos, impedindo-os até mesmo de permanecer em suas atividades rotineiras.
Foi selecionado um turno, contando com a presença de 16 a 17 pacientes
por sessão, cujas idades variavam entre 26 e 64 anos. O tempo de tratamento do
início da hemodiálise entre um paciente e outro, variou de 30 dias a 7 anos, sendo
que, alguns desses pacientes já realizaram tratamento em outros municípios.
Pascoal et al (2009) afirmam que “o tratamento dialítico é responsável por
um cotidiano restrito onde suas atividades são limitadas após o início do mesmo”.
Embora a doença cause limitações na vida diária dos pacientes como restrições
alimentares, mal-estar e outros, para alguns deles o mais difícil não é conviver com
essas mudanças, e sim o tratamento, visto que este altera significativamente a sua
rotina, provocando, assim, um desgaste físico e emocional, e às vezes a
desesperança nos resultados.
Há o relato de alguns pacientes que chegaram a manifestar-se da seguinte
forma: - “Até chego bem a clínica, mais saio daqui mal, não acredito nesse
tratamento...” (P1); - “Gostaria de estar em casa... isso é um cabresto, não tenho
liberdade.” (P2).
Já outros dizem que se acostumaram a essa nova rotina, já que não há
solução. Com o tempo ocioso, os dialíticos começam a pensar nos problemas que
estão enfrentando, gerando preocupações e angústias, o que interfere em seu bemestar psicobiológico.
Quando interrogados sobre o que faziam durante as sessões as respostas
foram: 61% dos pacientes dormiam, 23% dormiam e conversavam, 8% permanecia
sempre acordado, observando os colegas e a equipe e 8% dormia e ouvia música.
Alguns pacientes desejavam ocupar-se enquanto esperavam, mas devido as
suas limitações e a falta de atividades, acabavam sem ter o que fazer. Outros
relataram que já participaram de atividades quando hemodialisavam em outra cidade
e que gostaria de participar, caso houvesse a oportunidade.
378
Ao serem questionados sobre que atividades mais lhe interessavam, e que
gostariam de realizar durante as sessões, responderam: - “Eu gostava de ler, mais
minha visão não me ajuda mais... se tivesse uma revista pra mim ver seria bom.”
(P3); - “Eu não gosto muito de jogo não, mais aqueles caça-palavras é legal, dá pra
gente tentar né.” (P5); - “O mais legal de tudo é o bingo, lá onde eu fazia era a única
coisa que todos participavam e gostavam.” (P7)
Visando proporcionar uma quebra no ócio ocasionado pelo tratamento,
propôs-se empregar a ludicidade durante as sessões, uma vez que essas atividades
lúdicas “constitui uma necessidade humana que facilita o processo das relações
interpessoais, permitindo ao indivíduo desvelar e compreender as experiências
dolorosas e mais conflituosas com espontaneidade, criatividade e prazer” (OLIVO,
1998 apud BRASIL e SCHWARTZ, 2005, p. 104).
Com as atividades propostas, a princípio, poucos pacientes interagiram,
porém ao observarem um ou outro participando, brincando, se distraindo, acabaram
se animando para interagir também.
Quadro 1: Quantitativo de pacientes presentes em cada encontro e
participantes das atividades lúdicas empregadas. CDC, Cacoal, 2010.
Encontros
Pacientes
presentes
Pacientes
participantes
Porcentagem
(%)
1º
16
9
56,25
2º
16
3
18,75
Jogos individuais
3º
16
15
93,75
Bingo
4º
16
1
5,55
Jogo individual
5º
17
2
11,76
6º
16
15
93.75
7º
16
16
100
Fonte: Cavalcante, Saar e Ramos, 2010
Atividades
realizadas
Jogos individuais e
dinâmica
Jogos individuais e
Pintura
Concurso de Pintura e
dinâmica
Bingo
379
O quadro acima demonstra o quantitativo de pacientes participantes com
relação ao número de pacientes presentes. Observou-se que houve uma maior
interação e aceitação, quando as atividades empregadas envolviam todo o grupo,
tanto para os pacientes quanto para a equipe de enfermagem, como visualizado no
3º, 6º e 7º encontro (Quadro 1). Das atividades em grupo, o bingo foi a que teve
maior interação entre eles, resultando em momentos de descontração, alegria e
interação, onde por alguns instantes, a mensagem que transmitiam era a de que não
estavam em uma unidade de tratamento, mas sim em um momento de lazer. Ao fim
do jogo alguns pacientes relataram: - “Não precisava nem de brindes, só pela
diversão já estava bom”.(P8); - “Poderia ter isso pelo menos uma vez por mês” (P5);
- “Nossa! O tempo passou que eu nem vi”. (P9).
Durante as atividades, as tensões ocasionadas pelo ambiente foram
minimizadas e a interação com a equipe de enfermagem estimulada, o sorriso
emergia no rosto dos pacientes e de toda a equipe de enfermagem, confirmando o
Conceito de Variação proposto por Nightingale (1989) apud Barros e Gomes (2000),
onde as alterações do ambiente é um fator importante para a recuperação do
paciente, preocupando-se com os efeitos da mente sobre o corpo e defendendo a
necessidade de atividades de distração que eliminassem os pensamentos negativos,
de forma a facilitar, a recuperação do paciente.
As atividades lúdicas realizadas individualmente, como jogos e pinturas,
obtiveram menor participação, como observado no 1º, 2º, 4º e 5º encontros (Quadro
1), porém os resultados alcançados diferiram daqueles encontrados nos jogos em
grupos,
pois
os
pacientes
que
optavam
em
participar
dessa
atividade
especificamente eram em sua maioria, aqueles que pouco interagiam durante as
atividades em grupo, portanto através desses jogos, foi possível trabalhar até com
os pacientes mais desanimados e tímidos, possibilitando maior diálogo e
proximidade com o paciente, compreendendo melhor suas angústias.
Durante as atividades, foram encontradas algumas dificuldades como
restrições auditivas e visuais. As mesmas impediram alguns pacientes de
participarem das brincadeiras em determinados encontros, com isso, buscou-se
alternativas, oportunizando a participação dos mesmos. Mas, o uso do lúdico
possibilitou aos pacientes novas experiências. Ao enfrentar os desafios propostos, a
primeira reação era recusar-se a participar devido as suas limitações físicas, como o
ocorrido no jogo pega-vareta, quando desafiados a desenvolver novas habilidades,
380
visto que o jogo se dificulta ao utilizar apenas uma das mãos. Um dos pacientes
expressou-se da seguinte forma: - “Ah não, esse aí não tem como jogar não... eu só
posso mexer um dos braços, desse jeito você vai ganhar tudo...” (P5)
Porém, mediante ao estímulo e a tentativa, admitiram a possibilidade. Os
jogos proporcionaram aos pacientes quebra nas barreiras impostas por eles
mesmos e com isso acreditou-se na busca de alternativas para resolução dos
desafios propostos: - “Esse jogo é legal, eu não conhecia... e olha que só com uma
mão eu ganhei de você... (risos)” (P5).
A pintura foi outro desafio, pois para alguns se tratava de algo desconhecido:
- “[...] Pintar... eu nunca pintei na minha vida, mais acho que ia gostar...” Observouse que através dessa atividade, os pacientes que pouco se expressavam por
palavras, passavam a se expressar através da arte. Essa foi a atividade que mais
envolveu o paciente em sua atenção, provocando uma dedicação total naqueles que
participavam. Enquanto isso a serenidade invadia o ambiente. Marisco (2002), diz
que o lúdico estimula a criatividade do indivíduo, possibilitando-o descobrir o seu ser
mais profundo. Ao finalizar essa atividade, alguns pacientes relataram: - “[...] Foi
muito bom, pelo menos o tempo passou mais rápido”. (P11); - “Que legal. Pintar!
Hoje nem vi o tempo passar.” (P7); - “Nossa! Eu nunca tinha pintado, mais eu gostei
bastante... a hora passou bem mais rápido.” (P10)
Por um instante o lúdico permitiu aos pacientes esquecerem de suas
preocupações e se envolver no mundo das brincadeiras, descobrindo o prazer de
jogar e de viver, como verificado nas falas abaixo: - “Gostei demais, é uma alegria,
uma união.” (P10); - “Muito bom, até ajudou a funcionar a mente da gente” (P8);
- “Não gostaria que vocês parassem as atividades, porque me faz esquecer, pelo
menos no momento, os problemas, a dor no braço e a chatice da pressão.
Esquecemos tudo...” (P7). Sobre o assunto Aquino, Bortolucci e Marta (2004),
concluem que o riso elimina toxinas e melhora a circulação sanguínea e a
oxigenação dos pulmões, promovendo o relaxamento muscular, contribuindo para o
esquecimento das experiências ruins e para melhorar a perspectiva futura.
Em concordância, Brasil e Schwartz (2005) declaram que a felicidade obtida
por meio do lúdico é o melhor dos fortalecimentos, acelerando a circulação do
sangue, facilitando o cumprimento de todas as funções, tentando, portanto, não só
alimentar e aumentar a saúde, quando existente, mas restaurá-la quando perdida.
Abaixo o quadro 2 demonstra o humor verificado antes e depois das atividades
381
aplicadas, observando melhoras no ânimo e auto-estima dos pacientes, pois alguns
encontravam-se tristes, sonolentos e até mesmo desanimados.
Quadro 2 - Emocionômetro: evolução do humor dos pacientes durante os
encontros, antes e depois da inserção de atividades, CDC, Cacoal, 2010.
Encontros Momento Normal Alegre Triste Irritado
1º
2º
3º
4º
5º
6º
7º
Antes
Depois
Antes
Depois
Antes
Depois
Antes
Depois
Antes
Depois
Antes
Depois
Antes
Depois
14
13
11
10
10
05
09
08
13
11
07
03
10
04
02
03
04
06
05
11
06
07
03
05
07
13
03
12
01
01
01
01
01
01
02
02
-
-
Medo
Total de
pacientes
01
-
16
16
16
16
17
16
16
Fonte: Cavalcante, Saar e Ramos, 2010
Com relação à equipe de enfermagem, houve expressiva colaboração e
participação durante a execução das atividades propostas, pois ao mesmo tempo
em que prestavam os cuidados, participavam das brincadeiras, interagindo com o
grupo, proporcionando assim uma assistência não somente técnica, mas também
humanizada e autêntica, proporcionando bem-estar tanto ao cliente, como a própria
equipe.
Sobre o assunto, Marisco (2002) destaca como objetivo da enfermagem
humanística a melhora do paciente tanto física quanto emocionalmente. Quando
questionados sobre a importância das atividades para os pacientes, alguns
afirmaram que: - “O paciente distrai, esquece os problemas. É um descanso para a
mente.” (T1); - “O paciente acaba se distraindo. Quando ficam parados, começam a
passar mal, a pressão cai, devido as preocupações.” (T2); - “É bom sim, ainda mais
para eles que estão com o psicológico afetado” (T3); - “[...] Distrai, não vê o tempo
passar... quando ficam pensativos, eles ficam deprimidos. Mas a distração faz até
382
reduzir a dor e as intercorrências. Foi muito interessante, por que nunca ninguém fez
esse trabalho aqui.” (E1).
Ao término dos encontros, verificou-se que os laços de amizade e
companheirismo se estreitaram com a equipe e outros pacientes, mostrando que o
desânimo presente em maior parte deles, no início, já não fazia parte mais do
contexto, quando aplicado as atividades lúdicas.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa atingiu os objetivos propostos, pois foram desenvolvidas
atividades lúdicas - jogos, pinturas e dinâmicas - para os pacientes hemodialisados,
onde a presença destas atividades no Centro de Diálise ocorreu positiva e
gradativamente, pois a confiança e amizade dos pacientes foram conquistadas a
cada encontro.
O uso do lúdico em pacientes portadores de IRC durante as sessões de
hemodiálise, embora não tenha contribuído significativamente para aceitação da
doença, permitiu melhor percepção frente às sessões, possibilitando assim,
conhecê-los
mais
profundamente,
proporcionar
momentos
agradáveis
de
descontração e alegria, redução das intercorrências durante as sessões e até
mesmo redução do tempo ocioso, trocas de experiência e esperança com relação ao
tratamento, além de estimular a interação com a equipe de enfermagem, pois por
meio das experiências vivenciadas e compartilhadas, através do diálogo, foi possível
estabelecer um elo, não só profissional, como de amizade e companheirismo.
Esta pesquisa tornou-se um projeto de extensão, cuja continuidade se dá
pelas autoras e outros acadêmicos de enfermagem, com o intuito de oferecer, ainda
na graduação, uma experiência do uso do lúdico.
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