José William Vesentini O ensino da Geografia e as mudanças recentes no espaço geográfico mundial a 2 edição ampliada e atualizada Com encarte a cores: três mapas atualizados da ex-URSS, da Europa e do mundo. EDITORA ÁTICA, 1992 José William Vesentini P r o f e s s o r d o u t o r d o D e p a r t a m e n t o d e Geografia d a U S P - F F L C H V á r i o s a n o s de experiência c o m o p r o f e s s o r do ensino público e particular de I °. e 2° grau A u t o r d o s livros: A Capital da Geopolítica, Sociedade e Espaço, firasil - Sociedade e Espaço e Geografia Crítica (4 v o l u m e s , em co-autoria c o m Vânia Vlach) C o o r d e n a d o r da série paradidática "Viagem pela Geografia", da Editora Ática 2a. edição ampliada e atualizada, 1 9 9 2 editora atica I. Introdução Questões que surgem Objetivo deste folheto Vivemos num período revolucionário II. A crise do "mundo socialista" A perestroika: seus objetivos e dilemas O fim da perestroika e da União Soviética O golpe de agosto O problema das repúblicas A economia planificada e seus problemas O problema da burocratização O "modelo soviético" e seu ocaso III. A nova divisão internacional do trabalho IV. A nova ordem geopolítica mundial A ascensão e queda das grandes potências O novo papel da O N U V. A redescoberta da complexidade do mundo V I . Sugestões de leitura e de atividades didáticas No início de 1991, elaboramos um folheto que destacava as transformações recentes e importantes no espaço geográfico mundial. Ele resultou de um pedido de professores de Geografia por ocasião de um curso de reciclagem que havíamos ministrado. De fato, a velocidade das mudanças no cenário internacional ocorridas nos últimos anos foi enorme, fato que desatualizou praticamente todos os manuais e atlas geográficos elaborados até aquela data. Nos útimos anos, especialmente em 1989, em 1990 e também em 1991, enormes transformações ocorreram no espaço mundial. A perestroika na (ex-) União S o v i é t i c a - e o seu final em agosto de 1991, com todas as suas conseqüências, ainda não completamente definidas - mudou a face desse enorme país, que se desagregou. A progressiva - ou, em alguns casos, acelerada - implementação de mecanismos de mercado nas economias planificadas acabou gerando dúvidas sobre a viabilidade ou continuidade nos anos 90 deste último tipo de vida econômica. A área de influência geopolítica da (ex -) União Soviética em grande parte ruiu. O Pacto de Varsóvia foi extinto em meados de 1991, e os europeus ocidentais já começam a se sentir incomodados pela presença em seu continente das tropas norte-americanas da OTAN. Levanta-se inclusive a idéia de um novo tratado, que começa embrionariamente com a coordenação das tropas militares da França e da Alemanha, para com o tempo substituir ou redefinir a OTAN, no sentido de ampliar o poderio europeu. A Alemanha Ocidental e a Alemanha Oriental se uniram em 1990, formando um único país, fato que até há alguns anos parecia impossível ou extremamente improvável para este século. A rapidez desse processo surpreendeu a todos: a partir da crise do "mundo socialista", especialmente da Europa Oriental, no final dos anos 80, tudo indicava que a reunificação alemã pudesse ocorrer. Só que os analistas políticos, os jornais e demais meios de comunicação, inclusive os germânicos, divulgavam uma data mais longínqua, possivelmente 1997. A velocidade das mudanças nestes dois últimos anos foi realmente impressionante, o que entre outras conseqüências acabou desatualizando atlas e livros de Geografia de todos os recantos do planeta. Por um lado, isso gerou angústias em alguns, pelo fato de não haver respostas seguras e pelas freqüentes cobranças feitas pelos alunos ou pelo público em geral. Por outro lado, contudo, isso tem sido extremamente gratificante pelo renovado interesse que a Geografia vem suscitando, pela crescente busca de subsídios ou opiniões de geógrafos por parte da imprensa em geral. Nunca houve tanta procura pelos conhecimentos ou procedimentos geográficos, por parte dos principais jornais, das principais revistas e pelas principais redes de televisão, como nestes três últimos anos; e isso em todo o mundo. Noções ou temas que antes eram quase que restritos aos meios educacionais ou acadêmicos, tais como fronteiras e suas redefinições, mapas-múndi, geopolítica, nações e territórios, Estados-nações e t c , hoje começam de alguma forma a ser usados na vida cotidiana pelas pessoas e pela mídia. Q u e s t õ e s que s u r g e m Nestas condições, é comum que os professores de Geografia coloquem aos especialistas em Geografia Política, em Geografia Regional e até em Cartografia, aos professores universitários e pesquisadores, dúvidas e indagações sobre a atual estruturação do espaço mundial: • Existe ainda uma Europa Oriental? • Como ensinar o tema Europa para os alunos? • Pode-se falar ainda num Segundo Mundo ou conjunto de países "socialistas" ? • Como é ou será a geopolítica internacional neste momento de enfraquecimento ou final da Guerra Fria? • Com o final, ou pelo menos com o visível enfraquecimento da oposição Leste x Oeste, quais as novas contradições que emergem com vigor em seu lugar? Essas e outras questões semelhantes de fato fazem sentido neste momento de indefinições, de rápidas e radicais transformações na ordem mundial gerada pela Segunda Guerra Mundial, ordem essa que se manteve de forma mais ou menos estável durante cerca de 45 anos. Os anos 90 parecem ser de transição entre uma ordem que envelhece e começa a se transformar rapidamente e uma nova ordem internacional que ainda não está plenamente constituída, mas que pode ser vislumbrada através de alguns fatos que descreveremos a seguir. Objetivo deste folheto O objetivo deste folheto é o de auxiliar os professores de Geografia na tarefa de entender o mundo de hoje. E claro que ele seria desnecessário se os livros em geral, especialmente os didáticos ou paradidáticos, estivessem completamente atualizados, contendo estas considerações ou análises que faremos aqui. Isso, contudo, é impossível em face da rapidez das mudanças e da necessidade de um tempo mínimo (alguns meses ou até cerca de um ano) para a reelaboração de uma obra já pronta e estruturada nos textos e nas ilustrações, especialmente os mapas. Além disso, existe a demora da reflexão, pois mesmo tendo os dados à disposição, o intelectual ou cientista sempre precisa de um tempo mínimo para repensar a ordem das coisas, as teorias e as interpretações. Como afirmou Hegel ainda no início do século passado, a coruja da minerva (isto é, a sabedoria) só levanta vôo ao anoitecer, o que significa que existe a necessidade de um lapso de tempo entre o acontecimento e a interpretação, assim como é preciso que a poeira assente para se enxergar mais claramente. No momento em que elaboramos a primeira versão deste fascículo (primeiros meses de 1991), ainda não havia nenhum livro perfeitamente atualizado em relação a esses fatos relevantes dos últimos anos. Alguns poucos conseguiram se atualizar desde então, mas já neste início de 1992 percebe-se que novas transformações ou fatos importantíssimos ocorreram desde o final do ano passado, e que não puderam ser incorporados nessas obras. Afinal, para ser adotado no início de um ano letivo, todo manual costuma ser impresso já em agosto/setembro do ano anterior, para fins de distribuição aos professores que o irão analisar. Só que vivemos numa época excepcional, em que poucos meses fazem uma grande diferença a respeito da nova ordem internacional e do novo mapa-múndi. Mesmo que os livros fossem impressos em fevereiro ou março, por exemplo, também haveria em agosto ou setembro uma defasagem face às mudanças ocorridas desde então. Há alguns momentos da História em que um livro ou atlas pode passar anos ou até décadas sem grandes ou profundas atualizações; são momentos de transformações lentas ou quase imperceptíveis. Mas existem momentos nos quais as mudanças históricas se aceleram, com rápidas redefinições de fronteiras e nas relações econômicas e geopolíticas. V i v e m o s n u m período revolucionário Desde 1989 vivemos num desses períodos revolucionários, no qual pode-se dizer que oconem transformações sem dúvida nenhuma comparáveis àquelas resultantes da Segunda Guerra Mundial ( 1 9 3 9 - 1 9 4 5 ) . Naquele momento, em meados do nosso século, uma velha ordem internacional conheceu seu fim, com o declínio da Inglaterra e demais potências européias (Alemanha e França) e a ascensão de novas potências hegemônicas (Estados Unidos e União Soviética), as quais, durante mais de quatro décadas, lideraram seus respectivos campos ou "blocos" (o "mundo" capitalista e o mundo do socialismo real). Neste e nos três últimos anos, estamos assistindo à desagregação dessa ordem bipolar gerada pela guerra. No seu lugar vemos a construção paulatina, já estruturada em vários aspectos e ainda indefinida em alguns outros, de uma nova ordem internacional multipolar, com o final da oposição capitalismo versus socialismo e a ascensão de novos "blocos" ou potências econômicas, tecnológicas e, possivelmente, polí- tico-diplomáticas e militares (em especial o Japão e a nova Europa unificada). Consideramos nossa obra Sociedade e espaço em sua nova edição reformulada, de 1992 (mas impressa em setembro de 1991), como o que existe hoje de mais recente e moderno, assim como a coleção Geografia crítica, 4 volumes ( I edição de agosto de 1990 e 3 edição atualizada em setembro de 1991), de nossa autoria em conjunto com Vânia R. F. Vlach. Todavia, mesmo nestes casos de rápida atualização de textos, mapas e informações, também permanece uma pequena defasagem oriunda do fato de haver um inevitável lapso de tempo entre a impressão e os meses seguintes, quando novos acontecimentos alteraram mais uma vez o mapa político mundial. Este folheto, dessa forma, também em nova edição ampliada, visa mais uma vez suprir uma lacuna aberta pela História atual, por recentíssimos e relevantes fatos que nos levam a repensar diversos aspectos da ordem econômica e geopolítica internacional. Julgamos assim ser necessário ainda este ano oferecer novos subsídios aos professores, tanto sob a forma de texto como de orientação bibliográfica e de atividades didáticas, no sentido de que não se perca o papel da Geografia escolar, que é o de ajudar o educando a compreender criticamente o mundo em que vive. a 3 [Foto ilegível] Festa de comemoração da união politica e econômica das duas Alemanhas, no dia 3 de outubro de 1990. Nasce daí a nova Alemanha, com 357 042 km2 e 78 milhões de habitantes, que se constitui hoje no terceiro PNB do mundo, após os Estados Unidos e o Japão, e o verdadeiro líder econômico e tecnológico da nova Europa unificada. V i v e m o s hoje um momento histórico em que a experiência auto-intitulada "socialista" parece estar se esgotando. Talvez nem seja mais possível falar-se num Segundo Mundo, ou "mundo socialista", no século X X I , que já se avizinha. A propriedade privada dos meios de produção - inclusive da terra - foi novamente admitida na ex-União Soviética, na China e em quase todos os países da Europa Oriental. Conseqüentemente, as bolsas de valores desses países, que foram fechadas durante inúmeras décadas, encontram-se agora reabertas. Mecanismos de mercado - tais como maior liberdade para as empresas tomarem suas decisões, independentemente do plano qüinqüenal em vigor, os preços oscilando novamente de acordo com a lei da oferta e da procura; o final de inúmeros subsídios estatais para atividades ou setores econômicos; o final do pleno emprego para os trabalhadores, com a volta do mercado de trabalho; a falência ou fechamento de empresas constantemente deficitárias, que só eram mantidas por recursos públicos etc. - passam a ser introduzidos nesses países, o que diminui o rigor e a centralização da planificação da economia. Apesar de essas mudanças terem se acelerado a partir de 1989, não é essa a data inicial desse processo. A Hungria, desde o início dos anos 70, já havia pioneiramente ingressado numa paulatina introdução de mecanismos de mercado em sua economia planificada. E a China, desde a morte de Mao Tse-tung e a ascensão de Deng Xiaoping, em 1976, também já vinha abrindo sua economia para o capitalismo (com um avanço notável em suas exportações e importações, com a reabertura da bolsa de valores de Xangai, com a busca de tecnologia ocidental e t c ) . Nos anos 70 foram inúmeros os acordos entre os países "socialistas", especialmente a URSS e algumas nações da Europa Oriental, com empresas multinacionais capitalistas, que instalaram filiais nessas áreas: para as empresas tratava-se de buscar mão-de-obra barata e "disciplinada" (pois o direito de greve nesses países só foi conquistado após 1989), para essas nações tratava-se de adquirir tecnologia e tentar ampliar um pouco o padrão de consumo de suas populações, um padrão baixo quando comparado com o Primeiro Mundo. Somente no ano de 1985, por exemplo, já existiam cerca de 140 filiais de empresas multinacionais na URSS e na Europa Oriental. Mas em 1989 ocorreu uma aceleração nessas mudanças. Com os ventos liberalizantes trazidos pela política da perestroika na União Soviética, algumas repúblicas resolveram proclamar sua independência, a começar pela Lituânia. Em muitas dessas repúblicas soviéticas, começou novamente a ser valorizada a cultura nacional tradicional, sendo inclusive abolido o idioma russo como obrigatório nas escolas. Na Europa Oriental, milhões de pessoas saíram às ruas exigindo democracia, eleições livres, o fim do monopólio de um só partido político no poder. Governos foram derrubados e houve de fato a introdução de radicais mudanças econômicas e políticas nesses países. Quais foram os motivos desses protestos que geraram mudanças? Foi a economia planificada um fracasso? O que significou a perestroika e qual foi a sua importância nessas transformações? Vamos examinar essas questões nas linhas a seguir, mas temos que enfatizar o fato de que essas radicais mudanças no "mundo socialista" não ocorreram isoladamente; elas constituem na verdade uma parte de transformações globais no espaço mundial. próprio Produto Nacional Bruto do país, tido durante décadas como o segundo do mundo, atrás somente do norte-americano, era às vésperas da desintegração (final de 1991) no máximo o quarto, atrás do produto japonês e do alemão. E lógico que esses dados variam de acordo com a fonte de informações. Afinal, calcular a produção anual de cada nação não é tarefa fácil. Há, em primeiro lugar, o problema da confiabilidade dos dados, algo gravíssimo em especial numa economia centralmente planificada, onde os burocratas decidem em seus gabinetes o que "foi produzido" oficialmente, mesmo que esse oficial não corresponda à realidade. Como não há competição nem falências de empresas nessas economias cujos meios de produção foram estatizados, tal procedimento de colocar nos relatórios produções exageradas ou fictícias não ocasiona problemas às empresas. Apenas os consumidores, os menos atendidos numa economia desse tipo, é que serão prejudicados pela carência de bens e pelas intermináveis filas. Além desse fato, há ainda o problema de expressar essa produção numa moeda internacional comum, para se poder comparar os PNBs. Durante muitas décadas, por exemplo, o PNB do Japão foi subvalorizado devido ao A perestroika: seus objetivos e dilemas Mikhail Gorbatchev, secretário geral do Partido Comunista e presidente da ex-União Soviética, propôs em 1986 a política da perestroika, palavra russa que significa reestruturação. Em que constituiu a política da perestroika . Resumidamente, pode-se dizer que ela tinha como objetivo dinamizar a economia soviética, especialmente o setor civil, constituindo-se num projeto geopolítico destinado a manter o país entre as grandes potências do século X X I . Para compreendermos essa política, temos que recordar que o mundo sofreu importantes mudanças nas últimas décadas e a própria posição soviética como grande potência econômica já nos anos 80 encontrava-se ameaçada pelo crescimento japonês e pelo avanço da unificação européia. Do ponto de vista econômico, de fato, a União Soviética já era nos anos 80 uma potência em crise. O 1 8 fato de o iene estar com uma cotação muito baixa frente ao dólar. E o contrário ocorreu com o PNB soviético, que durante muito tempo foi supervalorizado em face da cotação do rublo, artificialmente exagerada frente ao dólar. Outro elemento a ser ressaltado é que a economia soviética - e, nos dias atuais, a economia russa - é claramente dividida em duas partes: uma militar, dinâmica e competitiva, que concorre com o setor armamentista norte-americano em condições de igualdade; e a outra civil, que sempre recebeu menos recursos humanos e financeiros que a militar e que acabou dominada por normas burocráticas; esta última é um tipo de economia que não precisa concorrer com nenhuma outra e que se encontra visivelmente atrasada em relação ao setor militar. Como afirmou Gorbatchev no seu livro Perestroika - novas idéias para meu país e o mundo, a União Soviética conseguiu, por um lado, enviar astronautas e sondas de pesquisas para a Lua e para Marte, mas, por outro lado, não conseguiu fabricar televisores, gravadores ou mesmo simples liqüidificadores com qualidade e em quantidade comparáveis à indústria francesa ou italiana (isso para não falar da norte-americana, alemã ou japonesa). De um lado, no setor militar, uma economia dinâmica e competitiva, que utilizou e ainda utiliza em.parte a melhor tecnologia, que dispõe dos melhores cérebros do país. E do outro lado, no setor civil, uma economia esclerosada, burocratizada, que se caracteriza até hoje pela carência de bens e pela predominância de objetos alheios aos gostos e interesses dos consumidores (roupas pouco variadas, cores simples, padrões comuns e únicos e t c ) . A famosa "prioridade aos bens de produção", tão divulgada pela União Soviética desde os anos 1930, na realidade escondeu uma valorização do setor armamentista. E isso fez em detrimento do setor civil da economia, ou seja, do consumo da população. E por isso que a perestroika foi tanto uma política interna como externa: para ampliar o consumo da população, incentivando mais a economia civil, era necessário enfraquecer ou eliminar a guerra fria com os Estados Unidos, a constante competição pela renovação de armamentos e por "áreas de influência" (ou de dominação político-militar e às vezes até econômica). Os acordos com os Estados Unidos e com países europeus ocidentais da OTAN foram necessários para aplacar os militares, a chamada "linha dura". Diminuir os gastos militares foi uma condição indispensável para ampliar os recursos à disposição da economia civil. E como agilizar a economia civil? Aqui a opção consistiu na introdução gradual de uma economia de mercado, com empresas estatais ou particulares sendo regidas pela competição, com possibilidade de falências ou de elevados lucros. No tocante à política interna, outro importante aspecto da perestroika foi aglasnost, palavra russa que significa transparência, abertura, e que implicou na liberalização política (isto é, maior liberdade para a imprensa, para as pessoas expressarem suas opiniões, mesmo contrárias às do governo etc.). Esta foi uma grande diferença da abertura soviética frente à chinesa, que por sinal é anterior: enquanto nesta última só houve descentralização econômica e não política (com os protestos e a oposição sendo reprimidos pelo poder centralizado e autoritário que busca permanecer a todo custo), na perestroika as duas vieram ao mesmo tempo e acabaram se influenciando mutuamente. O grande "calcanhar de Aquiles" da perestroika, que levou ao seu final, foi a diversidade étnico-nacional dentro da União Soviética. A União Soviética, nome criado em 1922 após um domínio russo sobre inúmeras outras repúblicas, sempre foi um país de frágil unidade do ponto de vista da nacionalidade. E muito mais uma continuidade do império czarista russo, no qual havia uma dominação russa sobre outras etnias e nacionalidades. 9 As décadas de "socialismo" não esconderam o fato de que os russos sempre tiveram privilégios na União Soviética: na cúpula do partido oficial e dominante, o PC soviético, nos altos escalões das Forças Armadas, na localização das mais importantes indútrias etc. A liberalização no país, mesmo sem o pretender, deu espaços para o ressurgimento de sentimentos nacionais que durante muito tempo foram reprimidos e abafados. Manter a unidade do país por meio da implantação de um sistema federativo foi um duro desafio para o futuro da perestroika, que afinal ela não conseguiu vencer. O fim da perestroika e da U n i ã o Soviética Pode-se dizer que a perestroika acabou em agosto de 1991, por ocasião de um frustrado golpe militar. Essa política liberalizante na realidade enfrentava três tipos principais de oposição ou pressão. De um lado havia a chamada "linha dura" ou stalinista, representada pelas camadas dominantes que se sentiam atingidas pela abertura econômica e política: alguns militares de alta patente e importantes membros do Partido Comunista, único a monopolizar o poder político e até o poder econômico durante quase oitenta anos; essas camadas no fundo desejavam manter a situação vigente nas últimas décadas. De outro lado havia os chamados "progressistas", entre os quais o nome de Bóris leltsin sempre era mencionado; os progressistas pressionavam Gorbatchev no sentido de apressar a política da perestroika e, conseqüentemente, as reformas que ela acarretava; criticavam o ritmo tido como demasiadamente lento da abertura para a economia de mercado e da vida política. Havia ainda os interesses de maior autonomia (ou, em alguns casos, até de independência total) das diversas repúblicas que compunham a União Soviética. O setor tido como mais forte era a "linha dura", pelo menos até agosto de 1991. Tanto que freqüentemente se aventava a possibilidade de um golpe militar comandado por esse setor, o que realmente acabou acontecendo. Muitos ministros do governo de Gorbatchev eram desse setor conservador, o que é um fato bem conhecido, e foram mantidos no poder exatamente porque inspiravam um certo temor e respeito. Foi em especial por esse motivo que o ritmo da abertura de fato não era muito intenso até 1991. Havia mais retórica e discursos da perestroika e da glasnost do que mudanças reais, profundas e irreversíveis. Mikhail Gorbatchev, último presidente da ex-URSS e idealizador da p e r e s t r o i k a , que desempenhou um papel histórico fundamental nas transformações mundiais dos últimos anos. A partir de agosto de 1991, Gorbatchev passou a ter pouca importância nos acontecimentos da Rússia e das demais repúblicas da ex-URSS. Bóris leltsin, primeiro presidente da Federação Russa eleito por voto direto em toda a história dessa nação e personagem histórico de primeiro plano após agosto de 1991. 10 As transformações do final do anos 80 até 1991 indubitavelmente foram mais intensas na Europa Oriental que na própria União Soviética. Basta lembrar que até meados de 1991 grande parte dos recursos financeiros do Estado soviético ainda era destinada ao setor militar e o Partido Comunista continuava na prática a monopolizar o poder político. Até agosto de 1991 esse setor da "linha dura" ainda dominava grande parte dos principais cargos políticos e militares no país, mesmo convivendo arduamente com a perestroika. Naquele momento discutia-se um tratado da União que concedesse mais autonomia (mas não a independência) às diversas repúblicas; no fundo o tratado objetivava manter a integridade do país, com algumas concessões aos interesses das repúblicas, e que estava em vias de ser assinado. na Lituânia), fato que paralisou as tropas. Houve um momento em que os soldados não sabiam se obedeciam aos golpistas, entre os quais estava o próprio ministro do exército, ou aos políticos que se opunham ao golpe e contavam com amplo apoio popular. Estes últimos acabaram vencendo e o resultado do golpe malogrado foi o contrário do que pretendiam os golpistas: ao invés de manter a integridade da União Soviética e impedir novas aberturas na vida política, consolidando o poder nas mãos do Partido Comunista, o golpe acabou acelerando a desagregação do país, gerando novas aberturas e provocando o fim do próprio Partido Comunista da União Soviética. Com o fracasso do golpe, que contou com o apoio ou a cumplicidade da imensa maioria dos burocratas do Partido Comunista, as autoridades das diversas repúblicas ganharam mais força. Esses governos sempre foram subordinados aos interesses do governo central, o soviético, mas a reação ao golpe praticamente esvaziou esse poder centralizado e fortaleceu as diversas autoridades regionais das repúblicas. Após a rendição dos golpistas e a libertação de Gorbatchev, percebeu-se que este já não tinha mais autoridade nem poder. O poder de fato estava com o governo da Rússia, em primeiro lugar, e com o governo das outras repúblicas. Gorbatchev teve um importante papel histórico, mas acabou o governo com pouca representatividade popular. Apesar de seu gênio reformista, na realidade ele foi o último governante eleito por via indireta pelos parceiros do Comitê do Partido Comunista. Já os presidentes das repúblicas de uma forma geral, como leltsin da Rússia e alguns outros, foram eleitos por via direta, em eleições populares. E o Partido Comunista da U R S S saiu arrasado com o fracasso do golpe: edifícios foram depredados, membros eminentes perderam seus cargos e elementos de menor prestígio se apressaram em repudiar suas antigas O golpe de agosto A tentativa de um golpe militar depondo Gorbatchev e criando uma junta para substituí-lo, implementada em agosto de 1991, visava exatamente impedir a assinatura desse tratado e a continuidade da política de abertura da perestroika. Se fosse bem sucedido, esse golpe poderia talvez reavivar a guerra fria e o papel da superpotência "socialista" da União Soviética, algo de futuro duvidoso num momento de ascensão de novas potências e de declínio econômico e tecnológico desse imenso país. Ocorreu todavia algo que ninguém esperava: uma rápida e maciça reação do povo nas ruas se opondo aos tanques. Ao prenderem Gorbatchev e anunciarem pelos meios de comunicação que havia um novo governo no país, ao enviarem tanques para controlar os edifícios públicos, os golpistas não esperavam a manifestação popular, que foi acompanhada pela reação de políticos progressistas e de outros políticos ligados aos interesses nacionais de suas repúblicas (por exemplo, 11 idéias e adotar novas posições. Daí se afimar que a perestroika foi liquidada com o resultado do golpe: ela consistia antes de mais nada numa política de reformas que pressupunha a liderança desse partido. Era uma política de abertura "de cima para baixo", conduzida de forma controlada, buscando manter a integridade da União Soviética e a hegemonia desse partido que tomou o poder em outubro de 1917. Como as radicais transformações no país a partir de agosto de 1991 fugiram do controle desse partido, que praticamente deixou de existir, pode-se dizer que a perestroika morreu. A partir do golpe começou a era pósperestroika. Foi também o fim da U R S S , tal como ela existiu desde 1922. Logo em setembro de 1991, as três repúblicas bálticas - Lituânia, Letônia e Estônia conseguiram a sua independência, fato imediatamente reconhecido pela O N U e pela maioria dos países, inclusive a Rússia. As demais repúblicas encontram-se num impasse: ou ficam juntas, numa comunidade federativa, ou se fragmentam de vez. Desde o final de 9 1 , estão associadas na Comunidade de Estados Independentes (CEI), organização supranacional inspirada no Mercado Comum Europeu. Deixaram de participar da CEI as três repúblicas bálticas e a Geórgia. Esta, desde dezembro de 1991, vive num impasse entre um governo eleito pelo voto e adepto à total independência de país (contrário portanto à participação na CEI) e revoltosos com amplo apoio nas Forças Armadas, que tomaram o poder em janeiro de 1992 mas enfrentam freqüentes protestos populares e cuja posição é favorável a uma aproximação da Geórgia com as demais onze repúblicas. Nos primeiro meses de 1992, a CEI já era uma realidade, só que problemática: para uns ela deveria constituir somente uma comunidade econômica, um mercado comum; para outros, deveria ser também uma organização político-militar, com a função de coordenar 12 a defesa e as Forças Armadas. Os governantes da Rússia, a maior e mais populosa república da ex-URSS, evidentemente desejam recriar esse imenso país sob um novo rótulo. Daí apregoarem a coordenação centralizada das Forças Armadas, que na prática significaria a continuidade do domínio russo sobre as demais repúblicas. Outras repúblicas, especialmente a Ucrânia, insistem em ter seu próprio exército, independente da CEI. O problema das repúblicas As repúblicas meridionais (Casaquistão, Turquemenistão, Uzbequistão, .Azerbaijão, Tadiquistão e Quirguízia), vizinhas do Oriente Médio, nas quais grande parte da população segue a religião muçulmana, começam a se aproximar do mundo islâmico, em especial do Irã. A crescente expansão do fundamentalismo religioso nessa região poderá afastar algumas dessas repúblicas das demais da CEI. E a "política do liqüidificador" implementada pelo ditador soviético Joseph Stálin nos anos 1930 e 40, que consistia na migração forçada de povos de uma etnia para repúblicas com outras nacionalidades, visando embaralhar as inúmeras etnias desse imenso país, hoje cobra o seu preço ao jogar algumas nações contra outra>. A autonomia das inúmeras repúblicas não é um processo tranqüilo, em especial pelo fato de normalmente existirem populações de outras nacionalidades no território de cada uma delas. Veja-se o exemplo da Armênia e do Azerbaijão, duas repúblicas com conflitos de fronteiras: há um território reivindicado pela Armênia, Nagorno-Karabakh, no qual hoje existe uma mistura de povos principalmente dessas duas nacionalidades, que pertencia à Armênia e foi entregue por Stálin em 1923 ao Azerbaijão. Veja-se ainda a própria Rússia, com seu imenso território: existe aí um predomínio da etnia russa (83 % ) , mas também há a forte presença, especialmente em determinadas regiões, de outras etnias que almejam maior autonomia frente aos russos (tais como tártaros, ucranianos, tchuvachos e outros). Os conflitos étnico-nacionais, dessa forma, ainda persistem na e x - U R S S e deverão se agravar nos próximos meses ou anos. Não se pode esquecer que a "linha dura" foi derrotada em agosto de 1991 mas ainda sobrevive, esperando a melhor ocasião para tentar novamente ganhar mais espaço. Se persistir a atual situação de declínio econômico e do padrão de vida da população, sobretudo com a carência de alimentos, é bastante provável que muitos dos que repudiaram o malogrado do golpe conservador de agosto do ano passado revejam suas posições, iludidos pela propaganda da antiga superpotência "socialista". Afinal, bem antes da perestroika os problemas econômicos e sociais soviéticos já se agravavam (com o declínio econômico e tecnológico frente ao Primeiro Mun- do, com um déficit de 25 milhões de moradias em meados dos anos 80, com a queda da produtividade na agricultura, com o progressivo aumento nas taxas de mortalidade geral e infantil, daí advindo uma diminuição na expectativa média de vida etc.). Acontece que esses problemas eram escondidos ou censurados, o que criava em muitas pessoas a ilusão de que tudo ia bem. Com a perestroika e a glasnost esses problemas vieram a público, sendo divulgados nos meios de comunicação. Na verdade, alguns deles até se aprofundaram a partir da desestruturação da planificação econômica e a introdução meio atabalhoada de mecanismos de mercado, o que acabou provocando a falência de empresas, o aumento do desemprego, inflação etc. O prolongamento dessa crise poderá fortalecer a "linha dura" e suscitar novas investidas desse setor, mesmo que ele dificilmente consiga uma volta completa a um passado em grande parte já superado e não mais reproduzível. A e x - U n i ã o Soviética Com a desintegração da União Soviética, em fins de 1991, as repúblicas que a constituíam associaram-se na Comunidade de Estados Independentes - CEI. A Geórgia não aderiu à CEI. Letônia, Estônia e Lituânia se haviam desmembrado em setembro de 1991. As 1 5 Repúblicas da e x - U R S S ( 1 9 9 0 ) República 2 Área (km ) População Etnias dominantes Renda per-capita (em rublos ) ! Lituânia 65 200 3,7 l i t u a n o s (80%), r u s s o s (8,5%) e p o l o n e s e s (7,7%) 2 147 Letônia 64 589 2,7 l e t õ e s (54%), r u s s o s (32%) e b i e l o r u s s o s ( 5 % ) 2 647 Estônia 45 100 1,6 estonianos(65%), russos(83%) e ucranianos(3%) 2 522 17 045 400 147,0 r u s s o s (83%), t á r t a r o s ( 4 % ) e u c r a n i a n o s ( 2 , 8 % ) 2 397 Ucrânia 603 700 51,7 u c r a n i a n o s (74%), r u s s o s (20%), b i e l o r u s s o s ( l % ) e j u d e u s (1%) 1 896 Bieiorússia 207 600 10,2 b i e l o r u s s o s (80%), r u s s o s (11 %) e p o l o n e s e s (4,3%) 2 355 Uzbequistão 447 400 20,0 u z b e q u e s (69%), r u s s o s (11 %) e t á r t a r o s (4,2%) 1 209 2 717 300 16,5 r u s s o s (41 % ) , c a s a q u e s (36%) e u c r a n i a n o s (6%) 1 605 Geórgia 69 700 5,4 g e o r g i a n o s (69%), a r m ê n i o s (9%) e r u s s o s (7,5%) 2 063 Azerbaijão 86 600 7,0 a z e r b a i j a n o s (78%), a r m ê n i o s (8%) e r u s s o s (8%) 1 730 Moldávia 33 700 4,3 m o l d a v o s (15%), u c r a n i a n o s (64%) e r u s s o s ( 12%) 1 709 Quirguizia 198 500 4,3 q u i r g u i z e s (41 % ) , r u s s o s (22%) e u z b e q u e s (11%) 1 209 Tadiquistão 143 100 5,2 t a d z i q u e s (59%), u z b e q u e s (23%) e r u s s o s (10%) 1 042 29 8 0 0 3,3 a r m ê n i o s (90%), a z e r b a i j a n o s (5,3%) e r u s s o s (2,5%) 1 938 4 8 8 100 3,5 t u r c o m e n o s (13%), r u s s o s (65%) e u z b e q u e s (8,5%) 1 375 Rússia Casaquistão Armênia Turquemenistão * O valor do rublo em 1990, na ocasião da coleta desses dados, era de 1,6 dólar no câmbio oficial. No câmbio negro, todavia, que é mais realista, o valor do rublo era somente 15 centavos de dólar. Constituída até 1991 por 15 repúblicas e p e r capita acima da média da ex-URSS, embora 126 nacionalidades, a União Soviética deixou de abaixo da Rússia), alcançaram sua independên- existir no final desse ano, num processo ainda não cia em setembro de 1991. completamente definido de autonomia de algu- Essas três repúblicas banhadas pelo mar mas repúblicas e tentativas de definir as normas Báltico foram ainda as últimas a serem incorpo- de uma confederação, a CEI - Comunidade de radas à União Soviética, somente em 1940, e Estados Independentes. Como se percebe pelo conviveram portanto menos tempo com a expe- mapa e pela tabela, a Rússia é a verdadeira riência da planificação centralizada da vida eco- sucessora da ex-URSS, uma imensa república nômica, algo que tornou mais fácil a sua sepa- com mais de 17 milhões de km e cerca de 147 ração das demais repúblicas. 2 milhões de habitantes (por volta de 76% da área Já as repúblicas meridionais, onde há uma e 55% da população da ex-URSS). A Rússia na forte presença de muçulmanos, são as mais po- realidade não é uma república unitária e sim bres, com mais baixa renda per capita A Ucrâ- uma federação onde há várias regiões e repúbli- nia possui uma renda per capita relativamente cas relativamente autônomas. As demais repúbli- baixa, mas é uma república com um território cas via de regra são mais pobres que a Rússia, duas vezes maior que a nova Alemanha ou que o com renda per capita bem rríõ/s baixa. As duas Japão, com uma população significativa (mais de exceções a esse respeito são as repúblicas bálti- 50 milhões) e com alguns dos melhores solos do cas da lituânia e da Estônia, que juntamente com mundo, sendo considerada um "celeiro agrícola" a Letônia para as demais repúblicas. (que também possui uma renda . Tanques em agosto de 1991 cercados por populares em Moscou. O golpe da "linha dura' fracassou exatamente porque multidões cercaram os tanques e impediram que as tropas controlassem os edifícios - sede do poder. A e c o n o m i a planificada e seus problemas É difícil hoje saber se a experiência da planificação centralizada da economia vai se repetir em algum outro país do globo. Por enquanto, essa parece ser uma experiência praticamente esgotada, ao menos na forma em que foi adotada e que teve na União Soviética o seu grande exemplo. É evidente que as coisas não mudam de um dia para o outro, e nem o que foi construído durante inúmeras décadas desaparece em alguns poucos anos. A economia planificada deixou profundas marcas ou heranças na organização social e espacial desses países e por esse motivo eles ainda formam, mesmo que provisoriamente, um grupo à parte, um Segundo Mundo que se industrializou, total ou parcialmente, através de uma planificação da economia e que não pode ainda ser incluído sem problemas no Primeiro Mundo nem no mundo subdesenvolvido. A quase totalidade desses países, todavia, há alguns anos está abolindo a planificação centralizada, que vai sendo substituída por mecanismos de mercado e por formas de planejamento capitalistas. A planificação da economia deu certo ou errado? 15 É difícil responder à essa pergunta. Provavelmente nem mesmo os economistas e planificadores desses países têm respostas conclusivas. Não existem certezas seguras neste caso, mas somente respostas provisórias que certamente irão se alterando com o tempo, com novas experiências e reavaliações. E provável inclusive que a resposta seja sim e não: a planificação da economia deu certo por um lado e fracassou por outro. Ela foi melhor para implantar um setor pesado de indústrias de bens de consumo. Ela foi mais apropriada para desenvolver a atividade industrial do que para a agricultura. Ela funcionou melhor numa época de predominância das indústrias consideradas avançadas nos anos 50 ou 60 (petroquímica, de cimento, metalúrgica e t c ) , mas parece ter fracassado totalmente no momento de crescimento de novos setores avançados da atualidade (informática, telecomunicações, química fina, robotização, biotecnologia e t c ) . A União Soviética, por exemplo, conheceu um notável arranque industrial nas décadas de 3 0 , 4 0 , 5 0 e parte da década de 60, mas já a partir dos anos 70 esse país passou a perder terreno frente ao maior dinamismo das economias do Japão, da Alemanha e outros, em especial no campo da tecnologia moderna. Em meados do anos 80, como já vimos, a União Soviética era um país que lutava para se manter no "grupo dos grandes" nos anos 90 e especialmente no século X X I . Daí ter surgido a política da perestroika, uma tentativa da facção mais esclarecida da elite dominante soviética de corrigir os problemas econômicos e sociais e reforçar a posição desse país no grupo das grandes potências. rência entre elas nem falências, podia-se produzir realmente bem menos que o registrado oficialmente, pois o único prejudicado seria o consumidor comum (os "consumidores especiais" , a elite privilegiada da burocracia, dispunha de lojas exclusivas, onde nada faltava). A ausência de iniciativa e de criatividade propagou-se mesmo entre os trabalhadores, também funcionários públicos e com emprego normalmente garantido, sem nenhum interesse pelo desempenho da empresa. Caso uma máquina quebrasse, por exemplo, mesmo se os operários soubessem consertá-la em poucos minutos, eles preferiam enviar um relatório ao setor competente, que podia levar semanas para providenciar o conserto. Como não existia a necessidade de lucros para garantir os salários, atitudes desse tipo não alteravam os ganhos dos trabalhadores. Também a inovação tecnológica (e a introdução de novos modelos de bens) era desestimulada nesse tipo de economia, pois como não há concorrência entre empresas nem necessidade de agradar aos consumidores, as inovações tornam-se desnecessárias. Para que introduzir um novo tipo ou modelo de sapato, ou de calças, por exemplo, se o importante é apenas a quantidade (o plano estabelece que tal fábrica irá fazer x pares de sapatos em 5 anos, não dizendo nada sobre modelos, cores etc) e nunca a qualidade ou o gosto do consumidor? Funcionando dessa forma durante décadas, o sistema de planificação da economia mostrou-se incapaz de oferecer à população a variedade e qualidade de produtos que as indústrias do Primeiro Mundo jogam continuamente nas lojas de todas as cidades. Para tentar dinamizar suas economias, os países que adotavam a planificação centralizada passaram a substituí-la há alguns anos por mecanismos de mercado, oferecendo inclusive incentivos aos trabalhadores mais produtivos, o que passou a ampliar as diferenças salariais. Concorrência entre empresas, descentralização das decisões, propriedade O problema da burocratização Um dos principais problemas encontrados em toda economia planificada é a burocratização: como todas as normas vêm de cima, isto é, órgãos de planificação, as pessoas com cargos de decisão (diretores de empresas, por exemplo) acabam perdendo a capacidade de iniciativa e a criatividade, pois se acostumam a fazer apenas aquilo que está previsto no plano em vigor. A centralização da economia não prevê os problemas que podem surgir durante a execução do plano, em função das características de cada lugar e de cada momento. E como, para enfrentar esses problemas específicos, são exigidas flexibilidade e capacidade de adequação, o plano emperra porque está baseado no centralismo e não na descentralização. Os planos qüinqüenais estabelecem de antemão o quê e quanto produzir, de quem e onde comprar, a que preços vender e t c , e a grande preocupação do burocrata nomeado como diretor de uma empresa é cumprir essas determinações, para continuar no cargo ou subir na carreira. Esse burocrata não vai se preocupar com o fato de que poderia eventualmente comprar mais barato as matérias-primas que utiliza, ou que os produtos que fabrica não agradam aos consumidores. Sua única preocupação é "cumprir as metas" estabelecidas para sua empresa, mesmo que para isso tenha que recorrer à ficção estatística (relatórios falsos). Como numa economia desse tipo todas as empresas são estatais, não havendo concor- 16 privada em inúmeros setores: estas são algumas outras modificações que foram sendo introduzidas nesses países nos últimos anos. O "modelo soviético" e seu ocaso O modelo seguido pelos países do "socialismo real" não se limitou "a planificação centralizada da economia. Ele implicava também uma vida política dominada por um partido único e oficial, que dizia representar os trabalhadores e que nunca deixava o poder. Não havia liberdade para outros partidos e menos ainda para eleições periódicas com rotatividade nos cargos. O partido oficial, geralmente denominado comunista, se confundia com o estado e com o governo. E como ele apregoava representar os trabalhadores, as greves eram proibidas por lei. Afinal, como se justificariam greves de operários contra um governo (as empresas eram todas estatais) que seria deles próprios? Foi exatamente este o singelo argumento utilizado em 1921 por Lênin, o fundador do Estado soviético: o direito de greve só deveria existir no capitalismo, onde há a propriedade privada dos meios de produção; com a socialização ou estatização dos meios de produção, tal direito passaria a ser um crime passível de prisão e até fuzilamento, uma "traição à nação socialista". Esse "modelo soviético", como era chamado por ter sido introduzido inicialmente na União Soviética e posteriormente nos demais países "socialistas", começou a mudar em 1989. Na maior parte desse países, a começar pela União Soviética e pelas nações da Europa Oriental, o monopólio de um partido único praticamente já cedeu lugar ao pluripartidarismo, o direito de greve é plenamente admitido e eleições livres para cargos políticos importantes foram realizadas. A imensa maioria dos antigos partidos comunistas ou dos trabalhadores mudou de nome e de objetivos, passando a encaminhar-se na direção da social-democracia. E interessante registrar que tanto o "modelo soviético" ou leninista como a socialdemocracia tiveram origens comuns, oriundas do movimento trabalhista do final do século passado e dos primórdios deste. Ambos buscaram, em grande parte, mesmo que tenham deixado isso de lado a partir de um certo momento, inspiração nos teóricos socialistas do século passado, em especial Karl Marx. A separação e até oposição radical entre essas duas correntes de esquerda ocorreu por ocasião da Primeira Guerra Mundial, devido a diferentes estratégias dos movimentos trabalhistas na Europa Ocidental e na Rússia. Em resumo, podemos dizer que a socialdemocracia apregoa mudanças paulatinas dentro do capitalismo, um avanço da democracia e da justiça social sem "revolução violenta" para estatizar os meios de produção. E o leninismo, que gerou o "modelo soviético", apregoa uma "revolução", dirigida por um partido político que pretende ser o único representante dos trabalhadores ou do proletariado, que significaria o final do capitalismo e a sua substituição por um novo modelo de economia e de sociedade, o socialismo. No primeiro caso temos conquistas graduais, com uma progressiva melhoria do padrão de vida (salários, condições e tempo de trabalho, moradia , participação na vida política e nas decisões das empresas, melhorias no meio ambiente e t c ) . No segundo caso temos um tudo ou nada, uma ilusão de mudanças repentinas e radicais: sai o capitalismo (o mal) e entra o socialismo (o bem), como se as relações cotidianas entre as pessoas dependesse de "modelos" sócio-econômicos, de sistemas que estariam acima dos indivíduos. A social-democracia ganhou terreno na Suécia, na Alemanha, na Dinamarca, na Inglaterra (com o trabalhismo) etc. Ela produziu, durante várias décadas, um "Estado do sou o "mundo socialista" desde meados dos anos 80. E por esse motivo que tantas estátuas de Lênin, o grande inspirador do modelo soviético e do socialismo real, foram derrubadas em Moscou, em São Petersburgo (ex-Leningrado), em Praga, em Bucareste e t c , onde no lugar do leninismo entram novas propostas, talvez até ilusórias a longo prazo, em geral oriundas dos regimes social-democratas. bem-estar social" - no qual há seguro-desemprego, moradia subsidiada para as famílias de baixa renda, excelente serviço médico-hospitalar e previdenciário gratuitos, boa escolarização etc. - que hoje serve de inspiração para grande parte do mundo, inclusive para os países que adotaram até há pouco tempo o socialismo real. Existem evidentemente problemas na social-democracia, em especial na Suécia, mas eles são incomparavelmente menos graves que a profunda crise pela qual pas- Estátua de Lénin no chão. Lênin, o criador do Partido Bolchevique (depois Comunista), que tomou o poder em outubro de 1917 na Rússia, é considerado o inspirador do "modelo soviético", tão repudiado apartir de 1989 na Europa Oriental e na ex-URSS. Várias estátuas de Lênin foram derrubadas por manifestações populares, tanto em São Petersburgo (ex-Leningrado) como em outras cidades soviéticas e européias. 18 próprio Comecom foi extinto. A Comunidade de Estados Independentes, sucessora da e x - U R S S , procura desesperadamente se integrar na Europa e os países europeus orientais começam a ter mais relações com a Europa Ocidental que com a Rússia, que era o seu parceiro comercial privilegiado até o início dos anos 80. A antiga Alemanha Oriental, o mais industrializado dos países "socialistas" da Europa, acabou sendo anexada a Alemanha Ocidental. No lugar de uma união ou integração em bases igualitárias, o que ocorreu de fato foi uma incorporação de uma parte pela outra. Praticamente todas as leis da parte ocidental passaram a vigorar na parte oriental; o marco alemão ocidental tornou-se a única moeda alemã: e as normas econômicas do lado ocidental foram ou não introduzidas no lado oriental, inclusive com desmanches de fábricas que não se encaixavam nos padrões (de combate"a poluição, de tecnologia etc.) do lado ocidental. Pouco sobrou do mercado socialista, que existiu com seus parceiros e até preços diferenciados até o final dos anos 80. Há ainda alguns resquícios, como é o caso do Camboja, do Vietnã, da Albânia ou de Cuba, que mesmo tentando atrair capitais estrangeiros, ainda não se adaptaram muito bem a nova ordem internacional multipolar. Cuba, por exemplo, até agosto do ano passado recebia petróleo a baixos preços da U R S S e vendia açúcar aos países do Comecom por valores até cinco vezes superiores àqueles vigentes no mercado internacional capitalista. Só que hoje isso não é mais possível, fato que vem provocando uma imensa crise de abastecimento nessa ilha. Cuba na realidade foi um modelo explicável pelo contexto da guerra fria e do mundo bipolar, ou seja, uma forma de economia que perdeu a sua razão de existir. Outra modificação ocorrida na divisão internacional do trabalho foi com os países subdesenvolvidos. Eles exportam cada vez v A t é por volta dos anos 70 o mundo era bipolar tanto do ponto de vista político-militar como no aspecto econômico. Havia de um lado a área ocidental ou capitalista, liderada pelos Estados Unidos e, de outro lado, a área "socialista", liderada em grande parte pela União Soviética. Existiam na prática dois mercados internacionais: a divisão internacional capitalista do trabalho, onde havia um centro (Estados Unidos, principalmente, mas também Europa Ocidental è Japão, embora secundariamente) e inúmeras periferias (América Latina, África, Ásia em geral); e o pequeno comércio entre os países do Segundo mundo, representado em especial pelo Comecom. Mais de 9 0 % do comércio mundial era realizado por países capitalistas, sendo que os países de economia planificada eram quase auto-suficientes. v Hoje a situação é completamente diferente. Sob o ponto de vista econômico - e também, em parte, político - , o mundo de hoje não é bipolar e sim multipolar. Os Estados Unidos continuam sendo um importante pólo econômico, mas há outros talvez mais importantes: o Mercado Comum Europeu, onde se destaca a Alemanha, e o Japão com sua periferia imediata ou países por ele liderados (os "tigres asiáticos", Austrália, Nova Zelândia etc.). Não há mais um mercado socialista. O 19 mais bens industrializados e comerciam bastante entre si. Inúmeros países doTerceiro Mundo são hoje grandes exportadores de produtos manufaturados, que vão desde sapatos até automóveis, passando por aço, produtos eletrônicos (inclusive microcomputadores), tecidos e roupas etc. Entre esses países encontram-se principalmente a Coréia do Sul, Hong Kong, Malásia, Taiwan e Cingapura, embora também possam ser incluídos o México, o Brasil, a África do Sul e outros. E as trocas entre países periféricos ampliou-se enormemente nas últimas décadas. Há uns 30 anos, por exemplo, menos de 2 0 % das exportações brasileiras iam para a África, o Oriente Médio ou o restante da América Latina. Hoje essa proporção já atinge quase 5 0 % . O mesmo se pode dizer de outros importantes países do Terceiro Mundo, que progressivamente passam a exportar cada vez mais para outros países subdesenvolvidos, de onde também estão importando mais produtos. Outra forte tendência do mercado mundial é a criação de "blocos econômicos" ou mercados supranacionais, cujo grande exemplo é o M C E - Mercado Comum Europeu. Este conta atualmente com 12 países-membros, mas poderá contar daqui a alguns anos com 19 e possivelmente até com 23 ou 25: há vários países europeus na fila de espera para ingressarem nesse mercado bem sucedido (primeiramente a Suécia, a Suíça, a Finlândia e outros países da Europa Ocidental, depois as nações da Europa Oriental com maior afinidade com a economia de mercado, tais como a Hungria e a Polônia; há também as três repúblicas bálticas da e x - U R S S , por fim a Eslovénia e a Croácia, as duas repúblicas mais ricas da ex-Iugoslávia e t c ) . Mas há outros mercados supranacionais importantes: Estados Unidos, Canadá e México já possuem economias bastante integradas e discutem os pontos de um novo mercado comum da América do Norte. E na Ásia se aventa a possibilidade de criação de um mercado comum com a participação destacada do Japão e dos "tigres asiáticos". Esses são hoje os grandes centros econômicos, tecnológicos e comerciais do espaço mundial: o Mercado Comum Europeu, no qual se destaca a Alemanha, o Mercado da América do Norte, com forte presença dos Estados Unidos, e a área ao redor do Japão. A Rússia e as demais repúblicas da exU R S S não compõem esse grupo dos três principais centros ou pólos da economia mundial nem têm chances de acompanhar esse grupo ainda nesta década. 20 A ordem geopolítica internacional que prevaleceu desde 1945 está ruindo. A guerra fria acabou, ao que parece definitivamente. A partir de 1989, a União Soviética deixou de garantir com suas tropas os regimes políticos da Europa Oriental, deixou de criticar violentamente o capitalismo e a economia de mercado, deixou, enfim, de assumir os papéis que vinha desempenhando desde pelo menos o final da Segunda Guerra Mundial. A área de influência geopolítica desse país desagregou-se vísivel e rapidamente a partir de 1989. O Pacto de Varsóvia, poderoso instrumento de domínio soviético sobre a Europa Oriental, foi extinto em 1991. Parece que a própria posição de superpotência militar da e x - U R S S - e das repúblicas dela remanescentes que possuem ainda hoje um forte arsenal de armamentos nucleares, em especial a Rússia - encontra-se em crise, devendo desaparecer definitivamente. A própria unidade da Rússia, bem como da CEI, é frágil e pode dar margem a novos separatismos e mesmo a conflitos sangrentos. Todavia, não podemos esquecer que quatro repúblicas da e x - U R S S - Ucrânia, Casaquistão, Bielorússia e principalmente a Rússia - possuem armamentos nucleares estocados, os quais provavelmente tem um poderio suficiente para acabar com a vida humana no planeta. O final da guerra fria, dessa forma, 21 não encerrou com a possibilidade de uma guerra nuclear, ou de uma terceira guerra mundial. Os Estados Unidos, por sua vez, prosseguem desempenhando seu papel políticomilitar com igual ou talvez com até maior desenvoltura do que antes. E como se atualmente houvesse apenas uma superpotência militar. Em 1989, por exemplo, os Estados Unidos invadiram o Panamá, destituindo o dirigente desse país, general Noriega, a pretexto de combater o tráfico de drogas (cocaína). E bastante provável que antes da perestroika e da política de abertura da União Soviética e dos países da Europa Oriental, os Estados Unidos não tivessem coragem de tomar uma atitude desse tipo, que ocasionaria uma resposta semelhante por parte da superpotência rival. Com a crise do "mundo socialista", os Estados Unidos parece que se sentiram mais "livres" para continuar desempenhando seu papel de superpotência militar. Em 1990, por exemplo, lideraram um cerco econômico e militar ao Iraque, que tinha invadido o Kuait em julho daquele ano. Cinco meses depois, em j aneiro de 1991, o governo de Washington liderou também a ação militar das "forças aliadas" contra o Iraque, da qual resultou a libertação do Kuait. Este cerco e a subseqüente "guerra do golfo" teriam sem dúvida fracassado se realizados antes de 1989, pois a União Soviética iria fornecer armamentos e outros bens ao Iraque. No entanto, em 1990 e 1991 os soviéticos não tomaram essa atitude típica da Guerra Fria porque estavam mais interessados, nesta sua nova fase de abertura para a economia de mercado, nas trocas comerciais e tecnológicas com os países do Primeiro Mundo. Com o término da Guerra Fria, inúmeras perguntas são colocadas: • Novas superpotências militares surgirão? • Cessarão ou diminuirão os conflitos armados no globo? • A nova ordem geopolítica mundial é monopolar (isto é, com uma só superpotência), como apregoam vários autores, ou se encaminha também para a multipolaridade? pecial, a Segunda Guerra Mundial, vieram somente confirmar o declínio britânico, colocando os Estados Unidos como a nova grande potência capitalista internacional. Foram, contudo, necessárias duas guerras mundiais para substituir uma grande potência por outra. Hoje isso não é mais possível: uma guerra mundial poderia exterminar a humanidade. E convém não esquecer que nas últimas décadas as elevadíssimas taxas de crescimento econômico do Japão e da Alemanha decorreram em parte do fato de eles não terem grandes gastos militares. Suas economias poderiam passar por problemas crescentes caso eles investissem bastante no setor militar. Para se tornar uma superpotência com armamentos nucleares no atual nível dos Estados Unidos e da ex-União Soviética, um país deveria investir dezenas de trilhões de dólares, uma quantia gigantesca, que, se desviada para o setor militar, certamente acarretaria um grande sacrifício da economia civil. Os gastos militares são improdutivos mas até certo ponto necessários para uma grande potência econômica. Isso porque há um custo e um risco nos investimentos no exterior; além disso, o fornecimento de matérias-primas ou de combustíveis deve ser garantido a qualquer preço. Veja-se a crise recente no Oriente Médio, deflagrada pela invasão do Kuait pelo Iraque. Os preços do petróleo poderiam ter disparado e essa fonte de energia é básica para a economia moderna. Uma potência econômica deve ter - e costuma ter, dentro da lógica dominante há séculos - meios político-militares para contornar ou resolver tais crises. Os Estados Unidos foram o país que enviou mais tropas e instrumentos bélicos ao Oriente Médio - e não se pode esquecer no que tudo isso implica em termos de gastos econômicos. Sabemos contudo que uma elevação excessiva do preço do petróleo prejudica mais as economias japonesa e alemã do que a norte-americana. A ascensão e queda das grandes potências Durante os últimos séculos, ou até milênios, a regra geral é de ascensão e declínio de grandes potências econômicas e militares, mesmo que suas hegemonias perdurem durante séculos. Tal foi o caso do Império Romano, na Antiguidade, ou, a partir do desenvolvimento do capitalismo, das inúmeras potências que tiveram durante algum tempo uma supremacia internacional: Portugal e Holanda, nos séculos XV e parte do X V I ; Espanha no século XVII; Inglaterra nos séculc - XVIII e XIX; e Estados Unidos a partir da Segunda Guerra Mundial. Normalmente uma potência inaugura sua hegemonia pelo poderio econômico, seguido pelo militar. Segundo essa norma, o Japão e a Alemanha deveriam começar a investir no seu poderio militar nos dias atuais, pois desde os anos 80 superaram a (ex-) União i ética e estão quase alcançando os Estado? Unidos em poderio econômico e tecnológico. Contudo, há dois elementos complicadores a esse respeito. Primeiro, vivemos numa época em que a humanidade pode se autodestruir. Segundo, ficou já evidente que os gast - militares reduzem o dinamismo da economia. Até por volta de meados deste século, o declínio de uma potência e a ascensão de outra era fato relativamente banal, que provocava guerras e mortes, porém nunca colocava em risco o futuro da humanidade. A Inglaterra, por exemplo, que era praticamente a dona do mundo no século XIX, começou - ainda nas últimas décadas daquele século - a perder sua supremacia para outras economias em ascensão, como a norte-americana e a alemã. A Primeira e, em es- 22 Até quando os Estados Unidos vão continuar atuando como o cão de guarda do "mundo ocidental ou capitalista", numa época em que não há outro mundo e o poderio econômico dessa superpotência não mais corresponde ao excessivo papel político-militar? Já faz alguns anos que as autoridades norte-americanas pressionam o Japão no sentido de que esse país amplie seus gastos militares e passe a cuidar de sua própria segurança e talvez até das áreas vizinhas no oceano Pacífico. E os países europeus da OTAN, com a nova conjuntura internacional e com o final do Pacto de Varsóvia, já começam a se sentir incomodados com as tropas norte-americanas em seu continente. Eles já começaram a falar num novo tratado militar europeu, que excluiria os países de fora (isto é, os Estados Unidos). Enfim, este é um momento de mudanças e de indefinições a esse respeito. O mais provável para os próximos anos, entretanto, é que o atual poderio político-militar e diplomático norte-americano acabe sendo repartido com uma crescente influência da nova Europa e do Japão. Há uma ordem econômica multipolar, embora aparentemente a ordem geopolítica seja monopolar, mas isso é um fato provisório, gerado pela rapidez da decadência soviética. A Europa e o Japão, acostumados durante mais de quatro décadas a seguir a liderança dos Estados Unidos em face do "perigo socialista", vivem neste momento uma fase de redefinição de sua política externa e de busca de maior influência para contrabalançar a liderança norte-americana, que já não tem mais fundamento. Afinal, com o fim da Segunda Guena Mundial e o advento do mundo bipolar, os Estados Unidos sozinhos possuíam um volume de produção econômica maior que toda a Europa Ocidental e o Japão somados. Hoje isso mudou substancialmente, com um enorme declínio relativo dos Estados Unidos frente ao fortalecimento do Japão e dos países europeus ocidentais em geral. 23 Normalmente a influência político-militar de uma nação corresponde mais ou menos ao seu poderio econômico e tecnológico, que implica no fato de que o enorme e desproporcional papel dos Estados Unidos na definição da nova ordem internacional deverá ser disputado ou repartido com uma maior presença da Europa e do Japão. O novo papel d a O N U Outro aspecto a assinalar com o final da guerra fria e da bipolaridade é o reforço da O N U e do grupo dos países mais industrializados do Primeiro Mundo, os chamados "sete ricos" (EUA, Alemanha, Japão, Grã-Bretanha, França, Itália e Canadá). A O N U nunca desempenhou um papel muito ativo nos conflitos internacionais porque o poder de veto no Conselho de Segurança dos Estados Unidos e da União Soviética (além da China, da Inglaterra e da França) sempre fez com que nenhuma decisão realmente dura ou importante pudesse ser sancionada. Com o final da oposição Leste x Oeste, que deu origem a tantos impedimentos da O N U desde sua criação até 1989, percebe-se que há um novo e mais ativo papel para essa organização internacional. Pela primeira vez desde que foi criada, a O N U em 1990-1991 autorizou uma ação de natureza militar ofensiva: a libertação do Kuait por um conjunto de forças liderado pelos Estados Unidos e integrado também por tropas italianas, inglesas, sauditas, egípcias etc. O grupo dos "sete ricos", por sua vez, vem ampliando a sua importância econômica e até política no cenário internacional devido ao enorme poder de investimentos que possui (grande parte do PNB mundial localizase nesses sete países) e devido também à crise dos países "socialistas" e dos países endividados do Terceiro Mundo. O final da oposição Leste x Oeste, dessa forma, vem reforçar ainda mais as disparidades entre o Norte rico, especialmente esse grupo de sete países, e o Sul pobre e menos industrializado. Quanto aos conflitos armados, o que se vem notando desde 1989 é que a paralisação da Guerra Fria não os diminuiu. Talvez até mesmo os tenha aumentado. Com o apogeu da Guerra Fria e a divisão do mundo em "áreas de influência" dos Estados Unidos e da União Soviética, ocorriam guerras, mas não de maneira tão intensa. Isso porque as duas superpotências sempre procuravam evitar conflitos que pudessem gerar uma crise mundial. Afinal, a Guerra Fria não era somente uma competição ou oposição, mas também uma forma implícita de cooperação ou conivência, uma política de tentar controlar os demais países e as oposições internas. vos atores entraram em cena, aproveitando o vazio deixado pelo congelamento da Guerca Fria. Houve, por exemplo, casos de governantes de países do Terceiro Mundo que invadiram territórios vizinhos ou ainda que procuraram ou procuram desenvolver armamentos nucleares, visando possivelmente uma situação futura de potências regionais. E provável aindaqueo "clube atômico", isto é, o conjunto de países que possuem bombas nucleares, se amplie consideravelmente nas próximas décadas. Tudo isso vem produzindo um mundo mais instável e menos previsível. Por um lado, isto é positivo, pois surgem novas possibilidades e opções, que eram obstaculanzadas pela Guerra Fria. Mas, por outro lado, essa situação encerra perigos de violentas guerras ou conflitos armados internos. Nos últimos anos o que se nota é que no- [Foto ilegível] Reunião dos sete grandes e ou sete ricos (Itália, Alemanha, França, Estados Unidos, Inglaterra, Canadá e Japão). A nova ordem internacional em grande parte vai sendo definida pelas politicas - de ajudas, renegociações de dívidas, reconhecimentos de novas nações etc desses países mais industrializados. 24 O M U N D O B I P O L A R DE I 945 A T É OS A N O S 80 M U N D O CAPITALISTA M U N D O SOCIALISTA Areas satelizadas pela superpotência "socialista" O M U N D O MULTIPOLAR DOS A N O S 90 ÁREAS / . C E I - C o m u n i d a d e d e E s t a d o s Independentes ( e x - U R S S ) . Por um fado, pode vir a tomar-se uma periferia da Europa; por outro lado, pode ocorrer a incorporação das Repúblicas meridionais c islâmicas ao Oriente Médio. Pode também vir a ser um mercado comum efetivo, menos importante que os três principais. AINDA INDEFINIDAS 2. C h i n a Pode ser periferizada pelo Japão ou toma-se uma nova potência. 3. Oriente Médio. Área de disputa entre os três pólos ou centros importantes, com vantagem momentânea para Estados Unidos; pode também vir a ser uma região original pela união dos povos e Estados islâmicos, com tendência a não se alinhar preferenúalmente em nenhum dos três centros. os mo", como faziam alguns até há pouco tempo), das culturas ou civilizações, das especificidades nacionais e até regionais. E do lado dos que defendiam o "modelo soviético" (mesmo que tenham em Cuba seu grande exemplo), já não há mais um "paraíso" a ser apontado como exemplo para o futuro sob o capitalismo. A economia planificada e o partido político de inspiração leninista (o partido que se pretende único, guardião dos dogmas marxistas-leninistas, extremamente centralizado e burocratizado, mas que diz representar os trabalhadores) fracassaram em todas as partes onde vigoraram. Nessas condições, há uma redescoberta da complexidade do mundo. A questão das culturas - vide a importância do islamismo no Oriente Médio, por exemplo, ou do hinduísmo na índia e do confucionismo na China passa a ser revalorizada. Os projetos políticos que muitas vezes redefinem as condições econômicas - como o da unificação européia - voltam a ser também valorizados. Enfim, redescobre-se a pluralidade de caminhos e opções que existem ou que podem ser criados. O dogmatismo do "caminho único" está em baixa e a nqueza cultural da pluralidade e da diversidade ganha espaços nas teorias e explicações do mundo. Isso, a nosso ver, é enriquecedor para o ensino da Geografia. E enfrentando desafios e refletindo sobre as mudanças que se desenvolvem o raciocínio e a criticidade. Uma das variantes da ideologia da Guerra Fria, que chegou a ter alguma importância na Geografia humana, foi a filosofia determinista da história baseada na sucessão de etapas ou" modos de produção": comunidade primitiva, escravismo, feudalismo, capitalismo e socialismo. Trata-se de uma vulgarização do marxismo operada em especial pelo stalinismo e que dá ênfase à economia, e à produção. E como se houvesse "leis da história" que levassem necessariamente a estágios e, no seu final, ao socialismo e ao comunismo (com etapa posterior do socialismo). redescoberta da complexidade do mundo A Guerra Fria possuía uma ideologia, que consistia na supervalorização da oposição entre capitalismo (para uns sinônimo de opressão, para outros de liberdade) e socialismo ou comunismo (para uns sinônimo de paraíso na Terra, para outros de totalitarismo). E como se não houvesse outras opções ou vias, mas somente duas: uma simbolizada pelos Estados Unidos e outra pela União Soviética. Como se o século XX pudesse ser interpretado como a luta ou oposição entre esses dois sistemas sócio-econômicos ou "modos de produção". Essa ideologia, felizmente, já se encontra superada. Podemos até encontrá-la, sob diversas roupagens, em inúmeras obras dogmáticas; mas essa interpretação simplificadora e falsa já não faz mais adeptos nem tem base de sustentação na realidade empírica; não tem futuro, afinal. Do lado dos que defendiam o modo de vida norte-americano ou do capitalismo já não há mais o "inimigo", o "outro lado" a ser combatido. O que começa a surgir com clareza é o fato de que "capitalismo" não explica tudo, que esse sistema sócio-econômico existetanto na Suécia como na índia, realidades extremamente diferenciadas. Redescobre-se a importância das lutas sociais (não confundir com "lutas pelo socialis- 27 Mesmo essa variante hoje se encontra em crise. Até os grandes teóricos-historiadores, filósofos ou sociólogos russos, tchecos, poloneses etc. - que procuravam fundamentar esse esquema evolucionista estão revendo suas idéias e reelaborando suas obras e suas interpretações sobre o mundo com uma crítica desse economicismo de inspiração stalinista (e que era tabu nesses países até alguns anos; era uma espécie de "teoria científica oficial"). Não precisamos nomear o futuro. Sabemos que as conquistas sociais - quaisquer que sejam: reforma agrária, redistribuição mais igualitária da renda nacional, normas de defesa dos consumidores, menor poluição nos rios ou na atmosfera, moradia para os sem teto, seguro-desemprego etc. - sempre resultam de lutas sociais, de reivindicações populares que se tornam vitoriosas. E isso é válido em qualquer parte do mundo: também nos países do Primeiro Mundo o elevado padrão de vida para os trabalhadores resultou de conquistas populares. Não é portanto necessário nenhum rótul o - s e j a "socialismo", seja "comunismo", seja modelo cubano" ou seja "modelo norteamericano" - para se nomear uma sociedade mais justa e igualitária. Somente as mentes autoritárias é que precisam de certezas prévias, de definições já prontas quanto ao futuro, de perspectivas bem delineadas e esquematizadas. E por isso que o "modelo soviético" foi extremamente autoritário e repressor: mesmo carregando boas intenções (a sociedade igualitária), a atitude de pretender representar as" leis da história", a dialética ou "verdade do social" acaba conduzindo à intransigência em relação a todos os que pensam de forma diferente. tos e as novas idéias. O final da bipolaridade e da oposição Leste x Oeste cede lugar a novas contradições e tensões. Em primeiro lugar, a disparidade Norte x Sul, com o agravamento do abismo entre os países líderes da economia e da tecnologia modernas e o pelotão de retardatários da Africa em geral, do sul e sudeste da Ásia e da América Central. O Terceiro Mundo aparece cada vez mais como complexo e heterogêneo, com situações bem diferenciadas. A idéia de periferia hoje se diversifica, podendo se reconhecer pelo menos três situações principais. Em primeiro lugar temos a periferia imediata ou privilegiada de um centro ou pólo econômico e tecnológico importante, países que são incorporados em mercados comuns e conhecem uma grande melhoria nos padrões de vida. Neste caso temos o México na América do Norte, Portugal e Grécia na Europa (e talvez até futuramente a Europa Oriental e repúblicas da ex-URSS), os "tigres asiáticos" no Extremo Oriente. Em segundo lugar temos a periferia intermediária, os países que se industrializaram e exportam bens manufaturados mas que estão à margem dos principais mercados supranacionais. Aqui entram o Brasil, a Argentina, o Uruguai, a Venezuela e inúmeras outras nações, que são dependentes tecnológica e financeiramente dos centros internacionais da economia mas nunca meros fornecedores de matérias-primas. Em muitos casos eles tentam criar mercados regionais, como por exemplo o Mercosul. Por fim, temos a periferia mais pobre e dependente, constituída pelos países que não ingressaram no processo de modernização e só dispõem de minérios, produtos agrícolas pouco variados e valorizados e mão-de-obra barata (e cada vez menos necessária na economia informatizada e robotizada). Este é o chamado "quarto mundo", o mundo dos países africanos, centro-americanos e de partes (sul A atitude mais democrática é sempre a de aprender continuamente, de se abrir para novas experiências, de aceitar a pluralidade e a complexidade do mundo. Não precisamos de nenhum esquema teórico que nos dê (e aos alunos) certezas quanto ao futuro, mas apenas de abertura para os novos acontecimen- 28 a humanidade - e países do Primeiro Mundo em especial, sempre na vanguarda do conhecimento científico - percebeu desde os anos 70 que a vida moderna e seus efeitos (poluição, armamentos nucleares, destruição da paisagem natural etc.) pode destruir a vida humana no planeta e também que a biodiversidade é positiva e necessária para o avanço da qualidade de vida. A preservação de patrimônios ecológicos (e também culturais) e o controle da poluição passam assim a ser condições sine qua non para manter ou até elevar os benefícios do progresso, que sempre se concentraram em poucas áreas. A definição do que seja "patrimônio da humanidade" (ecossistemas, heranças da história etc) será com certeza um dos grandes pontos de disputa e conflitos entre nações nos próximos anos. Por fim, não se pode negligenciar o avanço do racismo, que infelizmente deverá prosseguir. Este mundo cada vez mais interdependente, com um notável acréscimo a cada ano das trocas de mercadorias e serviços, do turismo e das migrações internacionais, convive com o agravamento das disparidades entre países ricos e pobres. Milhões de "bárbaros", como são chamados na imprensa do Primeiro Mundo, todos os anos deixam seus países na África, na América Latina e na Ásia, em busca do Primeiro Mundo, das economias centrais que hoje não necessitam de tanta força de trabalho barata como nos anos 60 e 70 (graças ao avanço da robotização e devido à crise da Europa Oriental), fato que desemboca no racismo contra esses imigrantes que possuem outros costumes e muitas vezes mal falam o idioma do país onde se encontram. e sudeste) da Ásia, inclusive muitos dos oriundos da dissolução do "mundo socialista" (como Vietnã, Camboja, Moçambique, Laos etc). As contradições ou tensões políticas (em especial a oposição democracia e autoritarismo), étnico-nacionais, culturais-religiosas e até ambientais se reforçam e ganham uma renovada importância nos destinos do mundo. A luta pelos direitos humanos - e, em muitos casos, pela sua extensão ou ampliação no sentido ambiental, das crianças, das minorias etc. - está mais do que nunca na ordem do dia. As nacionalidades oprimidas no interior de Estados-nações dominados por outras etnias (veja-se o caso representativo da ex-Iugoslávia, dos curdos no Iraque, dos tibetanos na China, dos chechenos na Rússia etc.) cada vez mais se organizam e reivin*dicam, às vezes até pela luta armada, a sua autonomia. E a importância das culturas ou civilizações, que em muitos casos possuem um forte componente religioso (especialmente no caso do mundo islâmico), novamente vem se opor ao processo incompleto de ocidentalização do planeta. E a questão ecológica ou ambiental no sentido amplo ganha a cada ano mais evidência, constituindo seguramente uma das mais importantes frentes de lutas dos anos 90 e do início do século X X I . Daí se discutir tanto sobre o papel da ecologia na nova ordem internacional, sobre a Amazônia, a Antártida, o efeito-estufa, a biodiversidade etc. A questão ambiental deixou de ser um elemento secundário, como foi no mínimo até os anos 60, e passou a representar um dos temas mais candentes e polemizados na imprensa em geral e até na vida política. E que 29 que dificulta a separação entre elas. A Sérvia, por exemplo, argumenta que há numerosos sérvios na Croácia e no Kosovo e se opõe violentamente a uma verdadeira autonomia dessas áreas. Desde meados de 1991, o exército federal iugoslavo, que na realidade é controlado pelos sérvios, invadiu e continua ocupando enormes áreas na Croácia, onde ocorrem violentos combates, e também no Kosovo, embora sem tantos conflitos. A Iugoslávia na realidade não existe mais. O principal objetivo da Sérvia com essas invasões é anexar mais terras à sua república, criando uma "grande Sérvia" que disporia de mais recursos numa desagregação total desse país. E bastante provável que teremos uma Eslovénia e uma Croácia independentes, embora neste último caso perdendo trechos de terras para a Sérvia, e grande parte das regiões remanescentes poderão criar uma espécie de mercado comum, ou de federação, algo ainda a ser definido nos próximos meses e anos. (Até março de 1992, Croácia, Eslovénia, Bósnia-Herzegovina e Macedónia haviam declarado sua independência). A Iugoslávia é um pais que praticamente deixou de existir nos últimos anos, assolado por uma guerra civil que sempre prossegue após alguns períodos de tréguas. Esse país na realidade foi uma criação artificial a partir da Primeira Guerra Mundial e só se manteve unido durante várias décadas devido ao contexto internacional da guerra fria e ao carisma do legendário líder Joseph Tito, morto em 1980. Com a morte de Tito, as repúblicas criaram um sistema político que implica na rotatividade do poder entre as várias nacionalidades. Com a crise do "mundo socialista" e da Europa Oriental, a partir do final da década de 80, as contradições entre as etnias desse país se agravaram. A Eslovénia e a Croácia, as repúblicas mais ricas e industrializadas, almejavam sua independência, o que era contrariado pela Sérvia, a mais populosa das repúblicas e que sempre dominou a federação iugoslava pelo maior número de políticos, de militares, de destinação de verbas etc. Também aqui a mistura parcial de nacionalidades dentro do mesmo território ou região é um elemento 30 DARENDORF, Raif. Reflexões sobre a revolução na Europa. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 1991. GORBATCHEV, Mikhail. Perestroika Novas idéias para meu país e o mundo. U- edição, São Paulo, Best Seiler, 1987. Sugestões de leitura e de atividades didáticas 5 HAESBAERT, Rogério. Blocos internacionais de poder. São Paulo, Contexto, 1990, col. Repensando a Geografia. Por enquanto nada é mais recente e atualizado do que os jornais e as revistas, que ampliaram consideravelmente as informações e mapas sobre o espaço mundial, sobre as redefinições de fronteiras e as mudanças ou novos rumos da ordem econômica e geopolítica internacional. Eles acompanham de perto os acontecimentos e a cada dia trazem os novos fatos. Por isso, uma boa atividade didática com os alunos é orientá-los para recortarem notícias e reportagens sobre a e x - U R S S , a ex-Iugoslávia, o MCE, o Oriente Médio, o mercado da América do Norte etc. e depois elaborarem um trabalho escrito e um jornal mural na escola. Quanto aos livros de reflexão, existem alguns que fornecem valiosos subsídios para se entender as transformações recentes na ordem mundial e as perspectivas futuras. Podemos mencionar: ASH, T.G. Nós, o povo. A revolução de 1989 em Varsóvia, Budapeste, Berlim e Praga. São Paulo, Companhia das Letras 1990. KENNEDY, Paul. Ascensão e queda das grandes potências. Rio de Janeiro, Campus, 1989. LlPIETZ, Alain. Audácia - uma alternativa para o século XXI. São Paulo, Nobel, 1991. . Miragens e milagres. Problemas da industrialização no Terceiro Mundo. São Paulo, Nobel, 1989. NAISBITT, J. e ABURDENE. P Megatrends 2000. São Paulo, Amanakey, 1990. NOVE, Alec. A economia do socialismo possível. São Paulo, Ática, 1989. POMERAZNZ, Lenina (org.). Perestroika desafios da transformação social na URSS. São Paulo, Edusp, 1990. VESENTINI, J.W. Geopolítica e problemática ecológica. In: Geografia, natureza e sociedade. São Paulo, Contexto, 1989, col. Repensando a Geografia. WORLD MEDIA. A nova desordem mundial. In: Folha de S. Paulo, de 19, 20 e 21 de dezembro de 1990, encarte especial. CASTORIADIS, Cornélius. A criação histórica e o projeto da autonomia. Porto Alegre, Livraria Palmarinca, 1991. 31 OS QUINZE NOVOS PAÍSES ORIUNDOS DA DESAGREGAÇÃO DA UNIÃO SOVIÉTICA A União Soviética durou cerca de setenta anos, de 1922 até dezembro de 1991, ocasião em que se consolidou a tendência de separatismo que existia desde o final dos anos 80 nas quinze ex-repúblicas que a formavam e que atualmente são países independentes. Esse imenso país (com 22 400 000 km e cerca de 250 milhões de habitantes) foi um dos dois Estados mais importantes do século XX, juntamente com os Estados Unidos. Todavia, a União Soviética foi sempre um Estado multiétnico e multinacional, com diferentes etnias e nacionalidades que sempre se queixavam do domínio russo. A grande herdeira da União Soviética, a Rússia (com 17 075 400 k m e cerca de 147 milhões de habitantes), também é um imenso Estado multinacional, embora predomine amplamente a etnia russa: em algumas de s u a s regiões ou repúblicas existem etnias ou nacionalidades que querem a autonomia. 2 2