A crise dos projetos estratégicos
brasileiros: o caso do Programa Espacial∗
Roberto Amaral∗∗
INTRODUÇÃO
Este texto se destina a público formado por nãoespecialistas em tecnologia espacial, mas interessado em
questões estratégicas nacionais. Resulta de exposição oral
dirigida aos integrantes do Conselho de Altos Estudos e
Avaliação Tecnológica, da Câmara dos Deputados, em abril
de 2009, revista e ampliada (agosto/2009) para integrar o
presente livro.
Procura resposta para o fato de o Brasil ainda não ser
autônomo na construção de satélites e veículos lançadores
e, na primeira década do Terceiro Milênio, ainda perseguir
capacitação tecnológica em setores estratégicos como o
cibernético, o espacial e o nuclear. Assim, o atraso do
Programa Nuclear Brasileiro e, principalmente, dos estudos
de física nuclear, considerando os estágios que havíamos
alcançado nos anos 50; assim, o atraso do projeto do
submarino brasileiro de propulsão nuclear, velho de 30
anos1; assim, a renúncia ao domínio das terras raras; assim,
∗
Capítulo do livro NETO. Manuel Domingos(Org.), O militar e a ciência no Brasil. O
autor agradece as contribuições de Aluízio Weber e João Ribeiro Jr. E a leitura de
Pedro Amaral. As deficiências persistentes, por obvio, são de sua inteira
responsabilidade.
∗∗
Ex-Ministro da Ciência e Tecnologia e Diretor-geral da Alcântara Cyclone Space-ACS.
Escritor e professor universitário.
1
EUA, Grã-bretanha, Rússia, França e China desenvolveram seus submarinos de propulsão
nuclear a partir de 1955, quando entrou em operação o pioneiro Nautilus, americano. O
Brasil tenta desenvolver o seu, na base de Reator de Água Pressurizada, há cerca de 30
1
o atraso na exploração do petróleo, retardando por décadas
nossa auto suficiência desse combustível. Ainda assim, a
dieta de parcos recursos que tem emperrado nosso
desenvolvimento
científico
e
tecnológico,
comparativamente aos demais países chamados, como o
nosso, de ‘emergentes’. Assim, finalmente, o impasse que
coarta o programa espacial. Este será nosso ‘estudo de caso’.
Para tal efeito, discutiremos os principais óbices que sobre
ele se abatem, e o estado da arte do projeto Alcântara
Cyclone Space, fruto de acordo de cooperação entre o Brasil
e a Ucrânia.
Ver-se-á, desde logo, que a questão espacial é um só
aspecto de um tema central, que é a crise do Estado:
porque, em nosso país, os projetos estratégicos são tratados
como secundários e
as raras políticas de Estado
subordinadas
a
uma
estrutura
jurídico-burocrática
descomprometida com os interesses nacionais. Os projetos
estratégicos sofrem com a insuficiência de recursos, com a
intermitência das políticas ou planos de governo, padecem
nas mãos de uma estrutura burocrática perrengue e ainda
tem de enfrentar a interferência de dezenas de instituições
públicas, autônomas entre si e livres de coordenação,
voltadas prioritariamente à construção de meios e controles
aos quais não podem resistir as metas de produção. Não há
política de Estado se não há continuidade na eleição das
prioridades, variáveis não só como resultado da periódica
alternância de governos, mas, até, em função do humor ou
das simpatias do administrador de plantão ou do burocrata
(seja o funcionário público, seja o juiz federal, seja o
representante do Ministério Público, seja o ministro do
Tribunal de Contas) que faz andar ou parar o processo, as
petições, os esclarecimentos, os pareceres, os pedidos de
anos. Para sua conclusão, mesmo se adquirir tecnologia francesa, e principalmente, se a
Marinha obtiver os recursos financeiros que lhe são devidos e até aqui fornecidos em doses
de conta-gotas, são estimados mais 15 anos de trabalho. Com 45 anos de idade terá sua
quilha batizada 70 anos após o Nautilus. Ele é desenvolvido no Centro Experimental de
Aramar, em Iperó, interior de São Paulo, pela Marinha brasileira.
2
informação, as liberações de recursos e mais isso e mais
aquilo.
O pano de fundo é o silêncio da sociedade,
desinformada, e, portanto, sem opinião, um meio
acadêmico pouco afeito a discussões estratégicas ou que
sugiram temas supostamente de origem militar, uma ordem
militar que ainda supõe que as questões estratégicas estão
reservadas
à
sua
domesticidade,
uma
imprensa
desinteressada dos temas nacionais e intoxicada pela busca
do
escândalo,
e,
finalmente,
um
Congresso
permanentemente em crise, esvaziado politicamente,
acuado pelos meios de comunicação de massa e assim
voltado para sua própria sobrevivência como instituição,
esta restritivamente entendida como a sobrevivência
eleitoral de cada um de seus membros.
Não há a menor possibilidade de construção de
políticas estratégicas sustentáveis sem o apoio de uma
opinião pública bem informada.
O Programa Espacial brasileiro como projeto
estratégico
Todo e qualquer programa espacial compreende um
espaço físico (base de lançamentos), veículos lançadores
(foguetes) e suas cargas (satélites ou espaçonaves). Sua
arquitetura depende, fundamentalmente, de decisão
política, como atestam as experiências daqueles países que
nos superaram nessa matéria.
A ausência de política de Estado, todavia, parece ser a
carência que mais tem afetado os projetos estratégicos em
nosso país, o que encerra contradição insanável.
O Programa Espacial brasileiro, vítima de injustificáveis
atrasos, principalmente a partir dos anos 90, foi elevado,
recentemente, pela Estratégia Nacional de Defesa-END, à
categoria de ‘Projeto Estratégico Nacional’. De tal promoção
aguardam-se consequências objetivas. Por enquanto,
permanecemos, embora animados de muita esperança, no
3
nível do discurso e das formulações de propósitos que não
alcançaram a descoordenação das ações dos diversos e
inumeráveis órgãos intervenientes. A END não passa, por
enquanto, e até quando não sabemos, de um manifesto de
boas intenções. Até porque não basta titular este ou aquele
projeto de estratégico, se a legislação relativa aos
procedimentos continua a mesma, se os mesmos são os
condicionantes orçamentários, se o projeto ‘estratégico’
permanecerá à mercê do arbítrio da burocracia e dos
órgãos de controle que não consideram os interesses
estratégicos do País, nem respondem pelos prejuízos
causados ao erário pela atraso de obras públicas, erário cuja
proteção deveria ser seu objetivo.
Tratemos da END,
porém.
A Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência
da República (no momento em que escrevo, sem titular) e o
Ministério da Defesa, definiram uma nova Estratégia
Nacional de Defesa (END), a qual, submetida ao Presidente
da República por meio de Exposição de Motivos
Interministerial2, é aprovada em 18 de dezembro de 2008.
Nela se lê a eleição dos programas cibernético, nuclear e
espacial, nessa ordem, como de ‘interesse estratégico’.
Depois de ressaltar a necessidade de fortalecê-los, aqueles
programas, por constituírem ‘tecnologias sensíveis’, diz a
END que “Os setores espacial e cibernético permitirão, em
conjunto, que a capacidade de visualizar o próprio país não
dependa de tecnologia estrangeira e que as três Forças, em
conjunto, possam atuar em rede, instruídas por
monitoramento que se faça, também, a partir do espaço”3. A
todas as razões justificadoras de um Programa Espacial
autônomo para país com nossas características físicas -sensoriamento
remoto,
controle
de
queimadas
e
desmatamentos, acompanhamento da fronteira agrícola,
comunicações em geral, serviços meteorológicos, controle
2
EMI nº 00437/MD/SAE-PR de 17/12/2008
D.O.U., 19 de dezembro de 2008, p. 4 e segs. O texto integral está acessível no endereço
http://www.fab.mil.br/portal/defesa/estrategia_defesa_nacional_portugues.pdf
3
4
do espaço aéreo e de fronteiras, GPSs,
etc., e mais
interesses
econômicos
e
financeiros
—,
somam-se
necessidades ditadas por razões de Segurança Nacional no
Estado democrático. Assim, o Programa Espacial foi,
finalmente, elevado à categoria ‘Política de Estado’, e é isso
que releva assinalar.
Até poucos anos passados, a maioria dos veículos
lançadores de satélites era constituída de mísseis
convertidos para uso pacífico. Para sorte da humanidade, as
ogivas nucleares, tornadas um anacronismo com o fim da
Guerra Fria, são substituídas por satélites. Mas hoje, embora
já exista uma série de veículos lançadores
projetados
especificamente
para
fins
de
transporte
espacial,
permanecem os foguetes como ‘tecnologia dual’.
Em face do que a esta altura não precisa mais ser
explicado, a tecnologia de fabricação e lançamento de
foguetes foi protegida pelos seus pioneiros (URSS e EUA)
com o mesmo rigor com o qual os EUA haviam tratado os
conhecimentos relativos à fissão nuclear. Sob o pretexto de
evitar a disseminação de armas de destruição em massa,
tratava-se, com o monopólio, de tão simplesmente assegurar
o equilíbrio entre as grandes potências e impedir o acesso
dos países periféricos às novas tecnologias, mesmo para fins
pacíficos.
Da mesma forma como ocorrera com a energia nuclear
(refiro-me ao Tratado de Não-Proliferação Nuclear-TNP, de
1968, cujo objetivo era tão simplesmente limitar as armas
nucleares aos cinco países então sócios em seu monopólio, a
saber, EUA, URSS, China, Grã-Bretanha e França), os países
não detentores de tecnologia espacial foram chamados a
firmar Tratado que estabelece rigoroso regime de controle
de tecnologia.
O Brasil aderiu a essa política
discriminatória, repetindo a saga, iniciada nos anos 50, de
renúncia de sua projeção no campo nuclear4, ao ratificar o
‘Tratado sobre Princípios Reguladores das Atividades dos
4
Este tema é tratado em Amaral, Roberto & Tranjan, Alfredo Filho. ‘Porque o Brasil
precisa de um Programa Nuclear”, Comunicação&política, v. 25, nº 2, p. 125-169
5
Estados na Exploração e Uso do Espaço Exterior, inclusive a
Lua e demais Corpos Celestes’ aprovado pela Assembléia
Geral da ONU em 19 de dezembro de 1966.
A disseminação dos novos conhecimentos, sensíveis ou
duais, passou a ser tratada como interesse de Estado,
subordinada à geopolítica dominante nos anos da Guerra
Fria, e permanece intacta até aqui, nada obstante o fim da
URSS.
Qualquer cooperação entre países visando ao
desenvolvimento
de
políticas
espaciais
comuns
é
condicionada não só à adesão ao MTCR (Missile Technology
Control Regime) como subordinada à prévia assinatura de
Acordo de Salvaguardas, acordo cuja última finalidade é
impedir a transferência de tecnologia. Exemplar cumpridor
de seus compromissos internacionais, o Brasil, tentando
abrir para si as pesadas portas que dão acesso ao restrito
Clube dos países espaciais, firmaria Acordos de
Salvaguardas com os EUA, a Ucrânia e, mais recentemente,
com a Rússia5.
O Acordo com os EUA é paradigmático da
renúncia à soberania6. Vejamos alguns de seus muitos
pontos polêmicos:
5
O marco legal é o “Tratado do Espaço” [Tratado sobre Princípios Reguladores das
Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico, inclusive a Lua e demais
Corpos Celestes”, Resolução da Assembléia Geral das Nações Unidas nº 2222 (XXI)], em
vigor desde 1967. Nele encontram-se as diretrizes básicas as quais vieram a ser
complementadas por outros tratados e convenções. Até o momento, o Brasil assinou e
ratificou: I. O Tratado do Espaço [Decreto Legislativo nº 41/1968, Promulgado pelo
Decreto nº 64.362, de 17 de abril de 1969]; II. O Acordo sobre Salvamento de Astronautas
[Decreto Legislativo nº 80/1972, Promulgado pelo Decreto nº 71.989, de 26 de março de
1973] e, III. A Convenção de Responsabilidade [Decreto Legislativo nº 77/1972,
Promulgado pelo Decreto nº 71.981, de 23 de março de 1973]. Ainda sob a apreciação do
Congresso Nacional, encontra-se a Convenção de Registro da qual o Brasil é signatário.
6
O acordo com os EUA foi assinado em 18 de abril de 2000 pelo embaixador Ronaldo
Sardenberg (então Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia) e pelo embaixador dos
Estados Unidos da América, Anthony S. Harrington. Em 2003 os Ministros da Ciência e
Tecnologia, Defesa e Relações Exteriores decidiram recomendar à base parlamentar do
governo sua não aprovação pelo Congresso brasileiro. Seu texto integral pode ser
conhecido no endereço http://www.aeb.gov.br/download/PDF/AcordoEUA2000-2.pdf
6
1. possibilidade de veto político dos EUA a
lançamentos a partir do Centro de Lançamento de
Alcântara (art.III, A);
2. proibição de o Brasil cooperar (aceitar ingresso
de equipamentos, tecnologias, mão-de-obra ou
recursos financeiros) com países que não sejam
membros do Regime de Controle de Tecnologia de
Mísseis – Missile Techonology Control Regime-MTCR
(art. III, B);
3. proibição de o Brasil se apoderar de ‘quaisquer
equipamento ou tecnologia que tenham sido
importados para apoiar Atividades de Lançamento’(art.
III, C);
4. proibição de o Brasil utilizar recursos
decorrentes dos lançamentos no desenvolvimento de
seus próprios lançadores (artigo III, E);
4. obrigatoriedade de o Brasil assinar novos
acordos de salvaguardas com outros países, de modo a
obstaculizar a cooperação tecnológica (art.III, F);
5. proibição de os participantes norte-americanos
prestarem qualquer assistência aos representantes
brasileiros
no
concernente
ao
projeto,
desenvolvimento, produção, operação, manutenção,
modificação, aprimoramento, modernização ou reparo
de Veículos de Lançamento, Espaçonaves e/ou
Equipamentos Afins (art. V, 1);
6. exclusividade dadas às pessoas autorizadas pelo
Governo dos EUA para o controle, vinte e quatro horas
por dia, do acesso a Veículos de Lançamento,
Espaçonaves, Equipamentos Afins, dados Técnicos e
das áreas restritas referidas no artigo IV, parágrafo 3,
bem
como
do
transporte
de
equipamentos/componentes,
construção/instalação,
conexão/desconexão, teste e verificação, preparação
para lançamento, lançamento de Veículos de
Lançamento/Espaçonaves,
e
do
retorno
dos
equipamentos e dos dados Técnicos (art.VI, 2);
7
7. concessão exclusiva aos servidores dos EUA (i.
é. negada aos brasileiros) de livre acesso, a qualquer
tempo, ao Centro de Lançamento para inspecionar
Veículos etc. (art.VI, 3);
8. garantia do governo brasileiro de que todos os
Representantes Brasileiros portarão, de forma visível,
crachás
de
identificação
enquanto
estiverem
cumprindo atribuições relacionadas com Atividades de
Lançamento;
referidos
crachás
serão
emitidos
unicamente pelo governo dos EUA, ou por Licenciados
Norte-Americanos (art. VI, 5).
Ao rejeitar tal Acordo, ou ao simplesmente não
apreciá-lo, o projeto de Decreto Legislativo permanece na
Câmara, o Parlamento brasileiro cuidou de preservar a
soberania brasileira e assegurar, no futuro, a possibilidade
de nosso país possuir um Programa Espacial Autônomo.
Por outro lado, a inexistência
de acordo de
salvaguardas com os EUA, eis um primeiro impasse, poderá
pôr em risco a autossutentação comercial do Projeto
Cyclone-4, uma vez que algo como 40% do mercado
internacional de satélites são dominados por aquele país, e,
em sua maioria, satélites de qualquer origem contêm algum
componente sujeito a autorização do governo americano
para exportação. Não se trata de recuperar aquele Acordo,
mas de negociar com os EUA um acordo de salvaguardas
específico para permitir o lançamento, a partir do CLA, pelo
foguete Cyclone-4, de satélites de empresas norteamericanas, e satélites de outros países que contenham
componentes fabricados nos EUA. Haverá de ser, porém,
acordo bem diverso daquele assinado em 2000 pelo
governo do presidente Fernando Henrique Cardoso7. Eis um
segundo impasse.
O que é um programa espacial
7
Consultados pelo Governo ucraniano, os EUA afirmaram nada obstar ao acordo entre
aquele governo e o brasileiro, embora continuassem entendendo que o Brasil não deveria
ter programa espacial.
8
Conditio sine qua non de qualquer programa espacial
completo é o seu centro de lançamentos8. O Brasil dispõe de
duas bases de lançamentos, o Centro de Lançamento da
Barreira do Inferno-CLBI9, em Natal, tornado hoje quase
inviável, como era previsível, desde sempre, em decorrência
do adensamento demográfico da cidade. Esse centro,
porém, servirá, ainda por algum tempo, a lançamentos de
foguetes de sondagem de pequeno porte, destinados à
ciência espacial. O segundo centro é o CLA, Centro de
Lançamento de Alcântara, Maranhão, de acesso precário,
encravado numa península paupérrima, sem serviços e
infraestrutura de qualquer ordem, hoje limitado em sua
expansão física por decisão do próprio governo10, e carente
de
investimentos.
Mas
de
excepcional
localização
geográfica.
O país não dispõe de veículo lançador. Seu principal
projeto, o VLS, planejado e construído pelo CTA, amarga,
em 25 anos de esforços e investimentos, três tentativas
frustradas de lançamento, a última delas com o custo
dramático de vítimas humanas11. Os satélites brasileiros SCD
8
Centro de Lançamento Espacial, Cosmódromo para os russos e Espaçoporto para os
EUA, é formado por instalações habilitadas a assegurar o processamento (montagem e
testes) de veículos espaciais e satélites e os seus lançamentos em órbita da terra ou ao
espaço sideral. Um Centro pode ser composto de um ou mais sítios de lançamento, estes,
por sua vez, podendo ter mais de uma plataforma de lançamento.
9
Embora usualmente denominemos o CBLI como ‘Centro’, ele não atende aos requisitos
dessa classificação internacional, pois não permite, por questões de segurança, a decolagem
de um veículo lançador, por menor que seja.
10
Refiro-me ao Relatório de Identificação e Delimitação editado pelo INCRA ( D.O.U. de
4/11/2008).
Seu
inteiro
teor
pode
ser
encontrado
no
endereço
http://www.in.gov.br/imprensa/visualiza/index.jsp?jornal=3&pagina=110&data=04/11/208
11
O Brasil não possui nem foguete nem plataforma de lançamento. Episódio exemplar do
tratamento oferecido, em nosso país, às questões consideradas ‘estratégicas’, é oferecido
pelas dificuldades quase insuperáveis que a AEB vem enfrentando para reconstruir a
plataforma de lançamento do VLS, destruída, como todos se recordam, no acidente de
2003. Paralisada inicialmente sua construção por liminar concedida pela Justiça Federal a
concorrente vencido na Licitação (2006), suas obras foram em seguida suspensas pelo
TCU que só as liberou em fevereiro de 2009. Três anos de completa paralização! Não há
9
1/2 (Satélite de Coleta de Dados), previstos inicialmente
para serem lançados pelo VLS, dentro do contexto da mal
sucedida MEB (Missão Brasileira Completa) que tinha como
objetivo lançar um satélite brasileiro, com um veiculo
nacional e em solo brasileiro, foram levados ao espaço pelo
veículo Pegasus, norte-americano, a preço de ouro. De sorte
que o
descompasso entre o desenvolvimento dos três
segmentos -- inicialmente controlado pela COBAE (Comissão
Brasileira de Atividades Espaciais) e depois pela Agência
Espacial Brasileira-AEB — revelou-se pura e simplesmente
desastroso.
Os
satélites CBERS (China-Brazil Earth Resources
Satellite), desenvolvidos em parceria com a China, são
lançados por esse país de seu centro em Taiyuan, com
foguete chinês, o “Longa Marcha 4B”.
A experiência dos países que estão em nossa dianteira,
muitos tendo largado de posições mais atrasadas,
aconselha-nos a necessidade, estratégica, de mais de um
centro, independentemente das condições objetivas de cada
um, e indica, principalmente, a necessidade de um
programa espacial completo, ou seja, constituído daqueles
três elementos, o que, aliás, foi fixado como política
brasileira em 1979, quando da aprovação da MECB12.
Ademais,
nossos
‘centros’
apresentam
graves
deficiências, como foi demonstrado em relação à Barreira
do Inferno, e como será demonstrado relativamente a
Alcântara (CLA).
O ‘melhor centro do mundo’
porém uma instância, seja política, seja administrativa, onde se possam avaliar os
transtornos que três anos de inércia podem significar para um projeto que emprega alta
tecnologia e disputa o seu lugar na comunidade internacional. Muito menos há quem se
pergunte quem responderá perante a Nação pelos prejuízos financeiros, inevitavelmente
resultantes do reajuste de preço da obra.
12
O acesso ao texto da MECB- Missão Espacial Completa Brasileira está disponível no
endereço http://www.aeb.gov.br/download/PDF/pnae_web.pdf - Anexo I – Marco Legal
das Atividades Espaciais p. 83.
10
Quando dizemos que possuímos “o melhor centro do
mundo”, nos referimos, evidentemente, à área hoje
destinada ao Centro de Lançamento de Alcântara, do
Ministério da Defesa, sob jurisdição do Comando da
Aeronáutica, no Maranhão. Tal qualificação decorre de sua
proximidade (2, 2 graus) com a Linha do Equador e do nível
de segurança apresentado pelo imenso corredor marítimo,
tanto para o Norte quanto para Leste, possibilitando o
retombamento seguro dos estágios descartados durante o
vôo do veículo. Aliás, essa característica é comum a todo o
litoral que se estende do Estado do Amapá ao Ceará, o que
assegura nossa possibilidade de escolha vantajosa de novas
áreas. Essa observação torna-se necessária quando
consideramos que o Centro de Alcântara encontra-se
impossibilitado de qualquer expansão física em face de
recente decisão do INCRA que transformou em “Território
Quilombola” quase toda a Península, inclusive a maior parte
da área que, desde 1980, fôra desapropriada para
atividades espaciais. Assim, a “melhor localização do
mundo” começa a apresentar deficiências, as quais
compreendem, além da questão étnica e da incontornável
limitação territorial, suficientes para inviabilizar a expansão
do projeto, o difícil acesso à Península (sem porto de cargas,
dependente o tráfego São Luiz-Alcântara de precário serviço
marítimo, condicionado pelas elevadas variações das
marés), inexistência de infraestrutura (estradas, escolas,
hotéis, serviços públicos), e o conflito com as comunidades
locais, originário dos métodos que presidiram sua
instalação em 1983 e da remoção de comunidades de
pescadores para agrovilas, tensão natural manipulada por
interesses exógenos. Como é impossível abrir mão da
capacidade de expansão do centro, o governo federal
precisa pensar em nova localização para um segundo ou,
como queiram (se considerarmos o modesto CLBI), terceiro
centro, para assegurar o programa civil, como tal
identificado o projeto da AEB. E, ainda que aja
11
imediatamente, estará agindo com muito atraso. Caso
resolva, como pretende o Ministério da Defesa, e com
estimáveis resultados políticos desfavoráveis, alterar a
decisão do INCRA, permitindo a expansão do projeto militar
(VLS) a noroeste da Península, atingindo comunidades
quilombolas (Mamuna, Baracatatiua e Brito), restará sem
espaço o projeto civil, da Agência Espacial Brasileira. O
problema permaneceria, donde a necessidade de opção por
novo território.
Na verdade, dentro do impreciso Programa Espacial
Brasileiro, temos três projetos.
CLA militar
Assim identifico o atual e originário Centro de
Lançamento de Alcântara, administrado pelo Comando da
Aeronáutica, cujo objetivo é o lançamento do VLS,
desenvolvido pelo CTA e cujo quarto protótipo deve ser
lançado dentro de quatro a cinco anos, com ajuda
tecnológica russa. O Ministério da Defesa pretende a
ampliação da atual área reservada e sua expansão, de sorte
a poder abrigar em suas dependências, além do VLS e da
ACS (Cyclone 4), mais cinco ou seis sítios de lançamentos,
comerciais ou não.
Alcântara Cyclone Space
A ACS encerra um programa autônomo resultado de
Tratado de Cooperação firmado entre os governos brasileiro
e ucraniano, cujo objetivo é a construção e lançamento, de
base brasileira, do Cyclone-4. Por questões exclusivamente
táticas, derivadas de i. óbices representados pela temática
quilombola e ii. pela decisão do INCRA que reservou grande
parte da Península (e nela a área anteriormente reservada
para o centro de lançamento da ACS) como área
quilombola, a Alcântara Cyclone Space obteve permissão
para instalar-se, pelo prazo de duração do Tratado, em área
do CLA que lhe foi reservada pelo Comando da Aeronáutica,
CLA e CTA.
O complexo da AEB
12
Como ‘complexo da AEB’ denomino o projeto do
grande Centro Espacial de Alcântara, desconstituído pelo
Tribunal de Contas da União após dois anos de análises, e
atualmente em revisão, pela AEB, como ‘Complexo Espacial
Brasileiro’. Ele compreende uma série de sítios de
lançamentos, derivados de outros acordos bi-nacionais dos
quais o Tratado com a Ucrânia é um só exemplo. Esses
centros seriam, é o projeto, apoiados por campi
universitários, unidades industriais de última geração e
tecnologia
limpa,
centros
de
pesquisa
e
ensino,
constituindo-se em grande parque espacial, similar ou
mesmo superior ao de Kourou, na Guiana Francesa. A esta
base de apoio científico e tecnológico somar-se-ia o apoio
logístico de infraestrutura, lazer e serviços. Esse complexo
foi projetado, evidentemente, para instalação fora da atual
área do CLA, instalação esta presentemente inviabilizada
pela já referida decisão do INCRA, objeto de outros
comentários na sequência deste estudo.
A busca por um terceiro sítio
Independentemente da política brasileira relativa ao
CLA, a busca por novos espaços é necessidade do Centro (ou
‘Complexo’ Espacial Brasileiro, pensado pela AEB e
maltratado no Tribunal de Contas da União.
ÁREAS (AMARELAS) PREVISTAS NO PROJETO "CEB" DA AEB
13
(SÍTIO ORIGINAL DA ACS ASSINALADO COM "AL-1" E ÁREA DO CLA COM ATUAL SÍTIO
O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
(INCRA), por intermédio de seu Relatório Técnico de
Identificação e Delimitação (RTID), declarou
a quase
totalidade da área externa da sede do município e externa
ao atual CLA, incluindo, portanto, sua área de expansão e
aquela pretendida pela AEB para seu ‘Complexo’, como
‘área quilombola’. Essa decisão (questionada por outra
parte do governo) impede igualmente a necessária
14
expansão do CLA (projeto do Ministério da Defesa) e a
localização do CEB (projeto da AEB) na Península ao mesmo
tempo em que obriga a instalação da ACS dentro do CLA.
A necessidade de busca de uma alternativa a Alcântara
parece óbvia, principalmente quando se considera que sua
importância se encerra na proximidade com o Equador.
Outra localização com similares características deve ser
identificada o quanto antes para um novo Centro de
Lançamento. As regiões litorâneas do Amapá e do Ceará
apresentam boas condições, sendo que o litoral cearense
oferece mais vantagens devido à infra-estrutura de
transportes (acesso ao porto marítimo de Pecém, estradas
asfaltadas e ferrovia),
a vizinhança de centros
universitários de Sobral e Fortaleza e ausência de conflitos
étnicos ou sociais. Em qualquer hipótese, permaneceríamos
nas proximidades do Equador, usufruindo todos os
benefícios dessa localização e conservando as vantagens
estratégicas de praticamente sermos a única opção do
Hemisfério Sul, ressalvada a companhia de Kourou, da
Comunidade Européia.
Por óbvias razões, todos os centros de lançamento
estão localizados no hemisfério Norte, longe da Linha do
Equador. Próxima a essa linha, além de Alcântara, há uma
única exceção, imediatamente ao Norte, a já referida base
de Kourou, na Guiana Francesa.
Ela está nos nossos
calcanhares. Pertence à União Européia e dela participam
investimentos russos. Assim, foi a França o único país que
conseguiu se aproximar da Linha do Equador, por causa
dessa possessão ultramarina. Kourou está a 5,2° de latitude
norte, bem mais distante da Linha do Equador do que
Alcântara, que está a 2,2° de latitude sul. O litoral cearense
está a 3° de latitude sul, diferença não significativa com
vistas a Alcântara, e ainda vantajosa relativamente a
Kourou.
AMÉRICA DO SUL
15
A proximidade do Equador faz com que um veículo
lançado de nossa base entre em órbita mais fácil e
diretamente para as órbitas equatoriais que constituem o
maior nicho do mercado comercial do transporte espacial.
O aproveitamento do maior impulso da rotação da Terra e a
injeção direta, sem a chamada manobra “dog leg”13 que
consome muito combustível, significa vantagem competitiva
em relação a outros centros. Utilizando o mesmo veículo e a
mesma quantidade de propelente, pode-se comercializar a
satelitização de cargas mais pesadas, quando lançadas na
direção Leste, para órbitas equatoriais.
Outra grande vantagem ensejada por Alcântara,
Kourou e pelo litoral nordestino é terem o Oceano Atlântico
a Leste. Isso facilita muito a tarefa de interdição das áreas
de queda dos primeiros estágios do foguete. Os veículos são
13
Manobra para corrigir o azimute.
16
compostos de estágios, que se vão desprendendo à
proporção que termina sua fase de propulsão; também a
coifa (‘nariz’) se abre e se solta do veículo que voa até a
altitude de injeção em órbita, com a propulsão do último
estágio e sua carga útil, que, satelizada, se separa do estágio
ficando em sua órbita. Com exceção do último estágio, os
demais segmentos vão caindo - e isso, por óbvio, não pode
ocorrer sobre regiões habitadas.
Mas não basta ter área propícia, é necessária a
existência de um sítio
para lançamento de grandes
veículos, assim como o próprio veículo lançador e os
satélites e demais cargas úteis, que são a razão de todo o
sistema espacial de lançamento. Já fizemos lançamentos de
pequenos satélites brasileiros de coleta de dados (SCD-1 e –
2) a partir dos EUA, a preços exorbitantes, como observado
anteriormente. Agora, estamos lançando um satélite com
desenvolvido em cooperação com a China, com baixa
transferência de tecnologia, custos também elevados e
lançado a partir do território chinês. O Programa CBERS
conta já com mais de 20 anos. Só no período 2001-2005
consumiu aproximadamente 400 milhões de reais14.
A Alcântara Cyclone Space
O projeto da Alcântara Cyclone Space-ACS, empresa
binacional resultante de Tratado de cooperação na
exploração espacial firmado pelos governos brasileiro e
ucraniano15, supre exatamente essas deficiências. Esse
projeto já possui um veículo, o Cyclone-4. É a parte de
competência da Ucrânia. O Cyclone-4 provém de uma
família de veículos lançadores da antiga União Soviética,
com mais de duzentos lançamentos bem sucedidos. Com
esse veículo, podemos construir uma plataforma em
14
Dados fornecidos pela AEB
O
texto
integral
do
Tratado
Brasil-Ucrânia
http://www2.mre.gov.br/dai/b_ucra_20_5176.htm
15
está
no
endereço
17
Alcântara e lançar não só os nossos satélites, deixando de
mandar divisas para fora, como também - e este é o objetivo
da empresa - fazer lançamentos comerciais para outros
Estados possuidores de satélites. Ou seja, passaremos a
receber divisas.
Se o Brasil levar avante o projeto Cyclone-4, seremos
o primeiro país do hemisfério Sul e o único da América
Latina -- considerando que a Guiana é uma extensão do
território francês --, a lançar satélite a partir do seu próprio
território.
Começamos a implantar o Programa Espacial
Brasileiro em 1961, antes de muitos países hoje lançadores,
muitos anos antes da Coréia do Sul, mas chegamos a 2009
ainda sem o nosso veículo. O Irã, com toda a sua ebulição e
enfrentando pressões externas, acaba de fazer um
lançamento espacial. O mesmo ocorreu com a Coréia do
Norte, país sabidamente pobre, em dificuldades, isolado
pela comunidade internacional. Tão bem sucedida, porém,
foi sua experiência, que está causando traumas na ONU,
junto à Rússia, aos EUA e aos seus vizinhos, Coreia do Sul e
Japão.
Nosso atraso é questão sobre a qual todos
precisamos refletir, inclusive a silente comunidade
acadêmica. Dentre as várias razões determinantes,
adiantarei apenas três, às quais retornarei adiante.
• A primeira refere-se à fragilidade do nosso sistema de
administração do programa espacial. A estrutura que
deveria coordenar o programa espacial como um todo
está distribuída em vários órgãos, sem coordenação,
agindo de forma dispersiva e, em muitos casos, até,
conflitante; hoje, atuam no desenvolvimento e
administração do programa espacial a AEB, ACS, INPE
(Ministério da Ciência e Tecnologia), CTA, COMAR,
COMAER, CLA, IAE (Ministério da Defesa). Não há uma
Agência Central, como por exemplo a NASA, nos EUA
18
ou o CNRS na França, ou o ISRO16 da Índia. Paradigma
desse imbróglio é a malha de órgãos que interferem no
Programa, ou dos quais depende a Alcântara Cyclone
Space para operar. Nomeio: Ministério da Fazenda
(Receita Federal e Procuradoria Geral da Fazenda
Nacional); Ministério da Defesa (Comando da
Aeronáutica, CTA, CLA, COMAER); Ministério do MeioAmbiente (IBAMA); Ministério do Planejamento e
Orçamento; Ministério das Minas e Energia; Ministério
do Desenvolvimento Agrário (INCRA), Ministério da
Cultura (Fundação Palmares), Secretaria Especial de
Políticas Promoção da Igualdade Social, Secretaria
Especial dos Portos, Governo do Estado do Maranhão;
Prefeitura Municipal de Alcântara; Ministério Público
Federal.
• A segunda, é a inexistência de uma política de
contínua liberação de recursos. Ver-se-á, mais à frente,
que, às vésperas dos lançamentos do 2º e do 3º
protótipos do VLS, nos anos de 1999 e 2003, o
Governo reduziu (1998, 1999 e 2002) drástica e
irresponsavelmente as verbas destinadas ao projeto;
• A terceira é uma distorção. Embora o projeto brasileiro
priorize os lançadores — porque é fundamental ter
lançador —, os investimentos e as preocupações foram
desviadas para a fabricação de satélites. Nessa área,
ainda nos demos ao luxo de remeter grandes recursos
para outros países, para a China (programa CBERS) e
para os EUA, para lançarem nossos SCD-1 e -2, e para
cooperação com a estação orbital internacional (ISS), a
qual tive a ocasião de interromper em 2003.
16
Indian Space Research Organization.
19
Exemplo paradigmático de descontinuidade
administrativa: o Porto de Alcântara
É
inimaginável o Centro de Lançamento de
Alcântara sem porto; sem porto a ACS e o projeto Cyclone 4
tornam-se inviáveis. A construção do Porto faz parte dos
compromissos do Brasil com a Ucrânia, responsável pela
infraestrutura do CLA. Mas nem a ACS, nem o CLA, tem
porto de cargas, nem o terá em menos de quatro anos,
embora o voo de qualificação do Cyclone-4 tenha, por
decisão de governo, a data certa de 2010. Examinemos esta
saga, que começa exatamente em 1998, com o
levantamento hidrográfico na foz do Rio Salgado, a
elaboração do Estudo conceituai e do Memorial do
Anteprojeto do Atracadouro de Cargas. No ano de 2009,
passados onze anos, o Porto não está, sequer, no papel.
Apesar de o Projeto haver obtido do IBAMA a Licença
Prévia, de ter-se realizado uma licitação e declarado um
vencedor (2006), apesar de haver sido elaborado o Projeto
Executivo, a obra não foi executada. Chamado, o Consórcio
vencedor pediu reajuste de preço, pois não podia manter
em 2008 preços cotados em 2005. O reajuste ultrapassava
os limites permitidos em lei. Enquanto soluções
burocráticas eram pesquisadas (além do mais a burocracia
se esquecera da previsão orçamentária para 2007...), a ACS
é informada de que, a Marinha do Brasil, após sobrevoo
sobre a área, verificara que a localização em Ponta das
Pedras (que sobrevivera ao processo acima descrito) era
inconveniente por força do assoreamento, indicando como
alternativa um porto oceânico, na Ponta Tatinga, porto o
qual, ademais, poderia abrigar suas fragatas (2ª Esquadra)
e por ela ser administrada. O contrato com a Secretaria
Especial do Portos, incumbida da construção original é
rescindido pelo MCT e firmado convênio entre a Agência
Espacial Brasileira e a Fundação Getulio Vargas-ISAE, que
inclui estudos hidrográficos e oceanográficos, para
definição de nova localização do Porto de Cargas.
20
Finalmente, em abril de 2009, a AEB solicita à FGV-IESAE
que estude a construção de um atracadouro de pequeno
porte nas proximidades do sítio da ACS no CLA. Em síntese,
passados onze anos não sabemos onde será construído o
atracadouro, e muito menos quando.
Por que um Programa espacial?
Pergunta comum em auditórios sem formação
política: por que o Brasil, que carece de quase tudo, vai
investir em lançamento de foguete e construção de
satélites? Ao examinar a questão do ponto de vista
estratégico, diremos que se trata de exigência para a
soberania e o desenvolvimento do nosso País. O Programa
Espacial procura corresponder às necessidades de uma
Nação com território de 8,5 milhões de km², quase 200
milhões de habitantes, cerca de 10 mil km de litoral e mais
de 16,8 mil km de fronteira terrestre com nove países
independentes e mais a Guiana Francesa. Do lado Oeste,
destacam-se fronteiras totalmente desguarnecidas; ao Norte,
a vastidão desabitada da Amazônia (com todas as
implicações geopolíticas e militares consabidas) e, à Leste,
no litoral, nossas principais cidades e a maior densidade
populacional, a concentração do parque industrial e algo
como 90% das reservas de petróleo. Essa extensão é
impossível guarnecer fisicamente se não dispomos de um
programa espacial autônomo. Há um outro aspecto
importante: o controle do espaço aéreo. Tanto o controle da
aviação civil17, quanto o desempenho de nossa aviação
militar.
17
Estima-se a participação do Brasil no projeto Global da ICAO (International Civil
Aviation Organization), OACI em português, denominado de CNS/ATM (Communication
Navigation and Surveillance Air Traffic Management). Sem programa Espacial, teremos de
alugar satélites a outros países.
21
Não há uma terceira alternativa: ou controlamos nós
o nosso espaço, ou, na melhor das hipóteses, com todas as
consequências estratégicas e econômicas óbvias, teremos de
transferir essa tarefa, mediante aluguel, a satélite dos
Estados Unidos, da França, da Rússia, da Índia, da China
ou... do Irã ou... da Coreia do Norte. Defendemos a opção
própria.
Há outros pontos que precisamos ressaltar. Em
1961, pouco depois do lançamento do primeiro Sputinik
(em 1957), o Brasil já se preocupava com o desafio espacial:
nascia então o CNAE, atual Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais. Mas ainda hoje nosso programa está em busca de
terreno para pousar. A opção por Alcântara se deu em
1979, mas do CLA só seria lançado o primeiro foguete, de
sondagem, em 1989. Em 2009, o CLA não está consolidado,
pois, ainda não colocou um só grama no espaço, para o que
foi concebido, e é dependente de área para sua necessária
expansão. Mesmo seu sítio atual aguarda regularização
jurídica. E os projetos da AEB – o Centro Espacial de
Alcântara e depois o Complexo Espacial de Alcântara— não
saíram do papel.
Assim temos que, passado mais de um quarto de
século, ao CLA não foram dadas condições para realizar
com sucesso uma só operação justificadora de sua criação e
os gastos de instalação e manutenção, pois os lançamentos
suborbitais poderiam todos ter sido realizados a partir do
CLBI.
Histórico das atividades espaciais no Brasil
• 1961: Instituída a CNAE, embrião do Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) que veio a ser
inaugurado em 1971;
• 1965: inauguração do Centro de Lançamento da
22
•
•
•
•
•
•
Barreira do Inferno (CLBI);
1969: - criação do Instituto de Atividades Espaciais IAE
1979: aprovação da Missão Espacial Completa
Brasileira (MECB); e escolha de Alcântara para o
novo centro de lançamento;
1980: desapropriados 62 mil hectares em Alcântara
para o Centro de Lançamento;
1984: 1º e bem sucedido lançamento do grande e
complexo foguete suborbital SONDA IV, no CLBI;
1989: inauguração do CLA;
1990: início da década em que ocorreu o gradativo e
forte estrangulamento do Programa Espacial
Brasileiro, especialmente quanto a lançadores e
centro de lançamento;
(cont.)
Temos aí o roteiro das preocupações. No final dos
anos 70, nossa Barreira do Inferno se esgotava, por variados
motivos. O principal, derivava de nossa incompetência,
porque permitimos que ela fosse inviabilizada pelo
previsível adensamento demográfico, o que levou o governo
à conclusão óbvia de que deveríamos ter um segundo (ou,
na verdade, um primeiro, para valer) centro. Estávamos em
1979.
Em 1980, iniciamos a desapropriação de 62 mil
hectares (620 km²) em Alcântara e, em 1993, logramos o
primeiro lançamento de satélite brasileiro, mas nos EUA.
Observe-se quanto tempo levamos da decisão de fazer
Alcântara até o primeiro lançamento: 15 anos. De 1979 a
1993:
HISTÓRICO DAS ATIVIDADES ESPACIAIS NO BRASIL (cont.)
• 1993: colocado em órbita nos EUA o pequeno (115
kg) e 1º satélite artificial totalmente projetado,
23
•
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•
construído, testado e operado no Brasil: o SCD-1;
1993: lançado do CLA, com pleno sucesso, o grande
foguete suborbital VS-40, desenvolvido pelo CTA,
que alcançou cerca de 1.000 km de altitude e quase
3.000 km de distância;
1994: criada a Agência Espacial Brasileira (AEB) pela
Lei nº 8.854;
1996: aprovado o Programa Nacional de Atividades
Espaciais - PNAE
1997: 1ª tentativa (frustrada) de lançamento do
VLS;
1998: colocado em órbita nos EUA o 2º satélite
artificial totalmente projetado, construído, testado e
operado no Brasil: o SCD-2 (115 kg);
1999: nível mínimo de recursos para o Programa
Espacial Brasileiro; e 2ª tentativa (frustrada) de
lançamento do VLS;
2003: explosão do 3º protótipo do VLS na
plataforma de lançamento, causando a morte de 21
especialistas;
2003 em diante: lenta retomada dos investimentos
na área espacial;
2004: Relatório Final da Comissão Externa da
Câmara dos Deputados, criada para investigar o
acidente com o VLS-3, conclui que “A falta de
recursos é um dos aspectos fundamentais para
explicar a falta de sucesso até agora do VLS e para
explicar o acidente ocorrido no dia 22 de agosto de
2003”.
2009: o Ministério da Defesa, irresignado com a
decisão do INCRA, pleiteia a extensão do CLA à área
hoje ocupada por comunidades quilombolas.
Em 1994, criamos a Agência Espacial Brasileira que,
lamentavelmente, não foi pensada atendendo a projeto
24
estratégico ou como resposta a uma política de Estado.
Carece do indispensável poder de coordenação. Resultou,
mais do que tudo, da necessidade de oferecer uma
satisfação internacional, para deixar claro que nossa
iniciativa era civil, ou seja, sem qualquer implicação militar,
apesar de o CLA pertencer ao Ministério da Defesa e ser
operado pela Força Aérea. Assim, como Pilatos entrou no
“Creio em Deus Padre”, civis foram chamados para dirigir a
Agência Espacial Brasileira. Mas a tendência inevitável,
porque necessária, é o atual CLA transformar-se em uma
grande e moderna base militar, abrigando Base Aérea,
Capitania dos Portos e ancoradouro de fragatas, neste caso
em convênio já em negociações com a AEB. O imperativo
estratégico deriva de sua localização entre o fim do
Nordeste e o início da Amazônia legal, de frente para o
Atlântico.
São compreensíveis as restrições que nos impõem as
grandes potências à transferência de tecnologia; sabemos o
que significa lidar com área dual. E todas as áreas assim são
muito sensíveis, principalmente para quem controla a
tecnologia e não deseja sua disseminação, seja por questões
de segurança, estratégico-militares, seja por motivações
puramente comerciais, como é o caso das restrições norteamericanas, russas e francesas ao projeto Cyclone-4. Para
aguçar mais ainda a intenção no cerceamento ao acesso
dos países
em desenvolvimento à tecnologia espacial,
registra-se a
preocupação das grandes potencias em
assegurar atividades às suas próprias equipes e linhas
produção, fazendo com que, mesmo ao custo de subsídios,
continuem fornecendo equipamentos espaciais aos países
mais pobres. As iniciativas espaciais enfrentam ambas as
restrições, pois constituem ameaça ao restrito clube dos
fornecedores de lançamentos, e podem, pelo menos
teoricamente, ainda ter uso militar, caso que é o do projeto
da Coréia do Norte.
Mas não foram dadas condições operacionais à
Agência Espacial Brasileira, que se transformou – e de certa
25
forma ainda o é, até hoje - numa simples repassadora de
recursos. A AEB repassa 94% de seu orçamento e não
interfere na programação do CTA, que atua na área de
lançadores; não interfere na programação do INPE, que está
voltado à produção de satélites, e não interfere em nenhum
dos organismos que atuam na área do Programa Espacial
Brasileiro. A AEB financia o CLA, mas é despojada de
competência legal e administrativa de gerência. Cobra-se
dessa agência uma coordenação de atividades que não lhe
cabe exercer18, desprovida que está, formalmente,
legalmente, administrativamente, politicamente de poderes.
Já em 1997, tem início a saga do VLS, quando da
primeira e já falha tentativa de lançamento. Em 1999, foi o
ano da segunda e igualmente fracassada tentativa de
lançamento; e, em 2003, da terceira frustração, muito mais
grave do que as anteriores, porque naquelas foi possível a
interrupção controlada do voo. É terrível, dramático,
lamentável e angustiante ter de repetir e de relembrar
(estou me referindo à terceira tentativa) : dois dias antes do
lançamento, houve um erro humano (curto-circuito), que
fez com que um dos motores detonasse. Daí derivou uma
explosão em cadeia: foram destruídos o foguete, o satélite, a
plataforma e computamos ainda a perda irreparável de 21
brasileiros.
Ao analisar as falhas ocorridas com o VLS, percebese claramente que houve uma grande perda de competência
e conhecimento do sistema em relação aos idos de 80,
quando foi lançado no CLBI, o veículo Sonda IV, com 7
toneladas, saindo na vertical, com controle de atitude
(pilotagem automática) nos três eixos e com êxito total.
O estrangulamento dos recursos
18
Este desarranjo institucional está denunciado no Relatório da CPI da Câmara dos
Deputados que analisou o acidente com o VLS-3. Seu texto está acessível em
http://www2.senado.gov.br/bdsf/bitstream/id/88923/1/CPMIAtraso.pdf
26
Quando ocorreu a explosão do terceiro VLS, o autor
deste texto era Ministro da Ciência e Tecnologia e declarou
que a causa do desastre remontava à dieta de recursos. Essa
afirmação provocou celeuma, inclusive no Governo, mas
cabe reiterá-la: foi a ausência de recursos que destruiu os
três foguetes. Foi a ausência de recursos que apertou o
botão da explosão e matou os 21 cientistas e técnicos
brasileiros. Não se faz um cientista em dois minutos; não se
faz um técnico em Aeronáutica e Espaço em cinco minutos.
Isso leva cinco, dez, quinze anos. Não adianta tão-só formálo, a custos altíssimos, se não lhe asseguramos trabalho,
porque a tecnologia se aprende fazendo. Como hoje é
sabido, um detonador desse acidente foi uma série de erros
de concepção, processos e operação,
derivada da
inexperiência da nossa equipe.
Inauguramos o CLA em 1983. Em 26 anos tivemos
apenas três lançamentos de veículo lançador, defasados de
anos um do outro. Quando se lança o subsequente, a
experiência adquirida com o lançamento anterior já se
esvaeceu, implicando uma nova reaprendizagem. Qual é a
experiência que essa equipe vai acumular? Como resultado,
os
fracassos das três tentativas e as incertezas
relativamente ao futuro.
O próprio parque industrial não de sustenta com
uma escala tão baixa de produção. As empresas tem que
partir para outras atividades como alternativa ao fim das
operações. Ademais, a lei de licitações não permite que,
depois de haver sido qualificada para o desenvolvimento de
um determinado componente com tecnologia agregada, a
mesma empresa possa ser contratada para os lotes futuros,
no sentido de garantir a qualidade e utilização de seus
meios de produção devidamente qualificados. Obriga o
sistema a abrir nova licitação e recomeçar tudo de novo,
não raro em uma outra empresa que também só raramente
tem condições de fornecer dentro dos mesmos requisitos.
A carência de recursos também leva à diminuição de
ensaios em solo, pois requerem materiais e instalações
27
complexas e caras para testar os equipamentos em
desenvolvimento. Muitas vezes as configurações desses
modelos de ensaio são simplificadas em nome da
diminuição dos custos e outros ensaios são suprimidos,
levando-se ao voo materiais com baixa qualificação em solo.
A causa mais importante do atraso brasileiro em
seu Programa Espacial, a sangria dos investimentos, está
registrada no gráfico abaixo: os recursos, razoáveis no
período Sarney, caem no governo Collor; na administração
Itamar têm um soluço positivo e voltam a cair no governo
FHC, principalmente na medida em que se aproximava a
terceira tentativa de lançamento do VLS, e só começam a se
recuperar na administração Lula.
Os recursos cresceram e mantiveram-se em razoável
patamar de 1986 a 1989, com um pico máximo da ordem
de US$ 120 milhões em 1988. Despencaram, porém, nos
anos 90, chegando praticamente a zero em 1999. Naquele
28
ano, foram carreados ínfimos US$ 8 milhões para tudo:
satélites, centros de lançamento, foguetes de sondagem
suborbitais, lançadores VLS, laboratórios, usina de
propelente etc.
O gráfico mostra o total executado em cada ano, mas
não evidencia outro ingrediente de nossa quase tragédia:
com os satélites, desde 1992, investimos bem mais do que
em lançadores e centros de lançamento. Em 2002, ainda às
vésperas do lançamento do 3º VLS, os recursos destinados a
satélites foram duas vezes superiores aos da construção de
veículos.
Diante
do
estrangulamento
dos
anos
90,
especialmente do programa nacional de lançadores, a AEB,
pouco antes daquele patamar mínimo no ano de 1999,
pagou aos EUA, em 1998, quantia elevada para assegurar o
lançamento do pequeno e simples satélite SCD-2. Os norteamericanos cobraram o hoje equivalente a cerca de R$ 100
milhões para os dois lançamentos com o veículo Pegasus. O
valor total pago aos norte-americanos para os dois
lançamentos (SCD-1 e 2) foi equivalente ao custo de
construção e lançamento de cinco VLS! E ficou por isso
mesmo! Fortunas maiores foram remetidas para o exterior
para lançarmos os outros satélites de sensoriamento remoto
e de comunicações comprados pelo Brasil:
29
Satélites lançados
(todos no exterior)
Coleta de dados ambientais
• SCD 1 (lançado por Pegasus - EUA em 9/2/1993)
• SCD 2 (lançado por Pegasus - EUA em 22/10/1998)
Sensoriamento remoto
• CBERS 1 (lançado por Longa Marcha - China em 14/10/1999)
• CBERS 2 (lançado por Longa Marcha - China em 21/10/2003)
• CBERS 2b (lançado por Longa Marcha - China em 18/09/2007)
Comunicações
•
•
•
•
•
•
•
•
•
Brasilsat A1 (Canadense, lançado em 1985 em Kourou)
Brasilsat A2 (Canadense, lançado em 1986 em Kourou)
Brasilsat B1 (Estadunidense, lançado em 1994 em Kourou)
Brasilsat B2 (Estadunidense, lançado em 1995 em Kourou)
Brasilsat B3 (Estadunidense, lançado em 1998 em Kourou)
Brasilsat B4 (Estadunidense, lançado em 2000 em Kourou)
StarOne C1* (Francês, lançado em 2007 em Kourou)
StarOne C2* (Francês, lançado em 2008 em Kourou)
StarOne C12* (Estadunidense, antigo AMC-12, lançado em 2005 em
Kourou; comprado da empresa SES Americon)
O.b.s.: (*) StarOne é a subsidiária da área satélites da Embratel, alienada a grupo
estrangeiro em 1998.
Assim,
contrariando
a
Política
Nacional
de
Desenvolvimento de Atividades Espaciais, que foi reduzida
um livrinho que descansa nas mesas das instituições, ou
dorme em suas gavetas, e que priorizava nossos lançadores
e centros de lançamento no Brasil, somente os gastos para
lançamentos nos EUA, pelo Pegasus, com os pequeninos e
simples satélites SCD, bem como com os CBERS e seus
lançamentos na China pelo “Longa Marcha”, e com a
Estação Espacial-ISS nos EUA, passaram a suplantar em
muito, desde 1994, os investimentos em lançadores e
centros de lançamento nacionais, que deveriam ser
30
prioritários. Mereciam atenção especial, inclusive, por
envolverem maiores avanços e complexidade tecnológica e
por serem submetidos às barreiras de outros países.
Dentre todos os grandes países emergentes, somente o
Brasil, intrigantemente, resolveu, naquela década, sufocar e,
praticamente, extinguir o próprio programa espacial. Índia
e China investiam e continuaram a investir forte e
continuamente em seus programas espaciais. A Índia, na
ordem de US$ 750 milhões/ano e a China algo como US$
1,5 bilhão por ano (dados de 2005). O montante chinês é
12 vezes maior que o “pico” dos investimentos do Brasil
(em 1988), e 188 vezes maior que o orçamento brasileiro
em 1999, para todo o Programa Espacial!
Hoje, China e Índia colhem os resultados do avanço
tecnológico e da valorização de suas indústrias e produtos,
alcançando patamar muito mais elevado do que o Brasil em
soberania, valor agregado de seus produtos industriais e em
imunidade a cerceamentos das grandes potências contra
seu desenvolvimento tecnológico.
PAÍSES QUE POSSUEM PROGRAMA ESPACIAL
COMPLETO
PAÍS
ANO DO 1º
LANÇAMENTO DE
SATÉLITE
EX-URSS*
1957
ESTADOS UNIDOS*
1958
FRANÇA
1965
CHINA*
1970
JAPÃO
1970
REINO UNIDO
1971
ÍNDIA
1980
ISRAEL
1988
IRÃ
2009
COREIA DO NORTE
2009
CENTROS DE
LANÇAMENTO
5
5
1
4
2
0
3
1
1
1
31
* Rússia, EUA e China possuem numerosos outros centros menores, do porte
do nosso CLBI.
ELIMINAÇÃO DOS RECURSOS HUMANOS
Pari
passu
àquele estancamento dos recursos
financeiros, decisão de governo, medidas correspondentes
foram adotadas nos anos 90 todas elas contribuindo para o
esvaziamento de nossos quadros de pessoal técnico. O
Comando
Geral
de
Tecnologia
Aeroespacial-CTA,
encarregado de desenvolver o veículo lançador e adequar o
CLA, sofria drástica e crescente carência de recursos
humanos, perdendo cerca de 2.500 servidores naquela
década, permanecendo sem autorização governamental
para reposição.
Registra-se o processo crescente e continuado de
evasão de funcionários, engenheiros e cientistas, formados e
especializados com muito esforço, tempo e recursos
públicos que não retornaram na forma de benefícios para o
país. São variadas as explicações, a começar pela
desmotivação
causada
pela
descontinuidade
ou
desmantelamento dos projetos e pelos cada vez mais baixos
salários na área de ciência e tecnologia, muito menores do
que os de todas as demais carreiras de Estado. Por exemplo,
um pesquisador com doutorado, em fim de carreira,
ganhava menos do que um jovem iniciante agente policial
federal de nível médio.
O já referido relatório da CPI da Câmara dos
Deputados, que investigou o acidente com o VLS em 2003,
denunciou: “O vencimento básico do pessoal de nível
superior se situa (números de 2003) entre R$1.600,00 e
R$2.500,00. A remuneração total vai de R$2.800,00 a
R$3.800,00, podendo alcançar valores entre R$4.000,00 e
R$5.000,00 por titulação (Mestre) e, em apenas dois casos,
em função da gratificação por titulação (Doutor) a
remuneração
passa
de
R$5.000,00,
mesmo
assim
alcançando R$5.177,20.”
32
E continua o Relatório: “Há que se considerar, ainda,
que a não autorização para reposição do pessoal que se
desligava das atividades e o não aumento dos quadros [para
“enxugar o Estado inchado”] impedia a renovação das
equipes”.
A conclusão da Câmara dos Deputados resume bem
os problemas até aqui descritos:
CPI – ACIDENTE VLS
“A Comissão preocupou-se com a condução do Programa
Espacial Brasileiro e chegou à conclusão de que a causa
remota do acidente foram os baixos investimentos no
Programa e, pior do que isto, investimentos que foram
diminuindo gradativamente nos últimos 16 anos (a partir
de 1988).
Pode-se dizer que a Política de Pessoal do setor também está
ligada aos baixos investimentos. Baixos salários, falta de
reposição dos que se desligavam, não aumento do quadro
que seria exigido se o programa fosse intensificado, são
conseqüência deste baixo investimento e, também,
funcionaram como causa remota do acidente.
A organização institucional do setor também foi um
problema detectado pela Comissão Externa, já que a AEB,
teoricamente responsável pelo Programa Espacial Brasileiro,
não tem comando efetivo sobre as atividades, pois nem o
IAE/CTA, nem o INPE lhe são subordinados.”
Novos tempos?
33
No atual governo, desde 2003, houve significativo
aumento de recursos financeiros, como indicado no gráfico
seguinte:
Contudo, apesar da melhoria na injeção dos recursos
financeiros, eles ainda estão em patamares 10 ou mais vezes
inferiores aos de países de importância equivalente à nossa,
como a Índia e a China, e, principalmente, indicam a
construção de uma curva de queda a partir de 2005.
Vejamos os níveis dos dispêndios dos outros países
em atividades espaciais:
34
35
Como revela o gráfico, nosso País aplica em seu
Programa Espacial percentual do PIB inferior, até, ao de
36
países sem tradição na área, como Portugal, o grão ducado
de Luxemburgo, Espanha, Finlândia e muitos outros.
Brasil–Ucrânia: o Cyclone-4
O último acidente com o VLS reforçou a necessidade
de saltarmos etapas. Se houvéssemos conhecido o sucesso
em 1997, ainda que tardio, o país teria sido o sétimo a
lançar satélite com foguete próprio; em 2009, seria o nono.
Precisamos recuperar o tempo perdido. A etapa a vencer é,
no nosso entendimento, a do veículo lançador, e a melhor
forma para isto é o acordo com a Ucrânia firmado em 2003
e aprovado pelo Congresso Nacional em 2004. Este acordo
oferece um foguete confiável e tecnologia para a construção
de uma plataforma de lançamentos. E mais, poderá nossa
indústria participar da produção de partes dos foguetes, e
técnicos nossos acompanhar os trabalhos nas fábricas
ucranianas. Profissionais serão treinados em Universidades
ucranianas e técnicos ucranianos darão cursos no Brasil.
O Cyclone-4 representa duplo avanço tecnológico
sobre o projeto VLS, a saber, i. o avanço de classe do
lançador19, e ii. a introdução do propelente líquido. É que o
Cyclone-4 transporta uma carga 25 vezes maior do que o
VLS, na mesma altura de órbita, ou seja, 5.300kg do
lançador ucraniano contra 200kg do VLS. Por outro o
Cyclone-4 é abastecido com propelente líquido nos três
estágios, condição necessária no desenvolvimento de
lançadores de grande porte. Assim, é fácil compreender que
a associação Brasil-Ucrânia possibilitará ao nosso país, em
pouco tempo, e a relativamente baixo custo, adquirir o
domínio operacional de lançamento de veículos lançadores
de grande porte com combustível líquido. Num segundo
momento, de especial nas novas versões do veículo Cyclone,
19
Os lançadores, segundo seu tamanho, são identificados pelas seguintes classes: micro,
pequeno, médio, intermediário e pesado. O VLS se enquadra na categoria dos micro
lançadores e o Cyclone-4 na classe dos médios para intermediários.
37
nosso país participará do desenvolvimento e fornecimento
de componentes de veículos.
OBS: GTO = “Geosynchronous Transfer Orbit” (±580 km x 35786 km x 7°)
SSO = “Sun Synchronous Orbit” (±800 km x 800 km x 98.6°)
O Cyclone-4 resulta da evolução de ótima família de
veículos lançadores. Incorpora dois primeiros estágios
idênticos aos dos veículos Cyclone-2 e Cyclone-3, com a
experiência bem sucedida em 227 missões e somente 6
falhas em quase 40 anos de operação (total de lançamentos
= 227, sendo: 106 Cyclone-2 e 121 Cyclone-3). Nesses 227
vôos realizados, o 1º e o 2º estágios tiveram 100% de
sucesso. O 3º estágio é a parte mais crítica, pois seu
desempenho afeta diretamente a colocação do satélite em
órbita. Houve apenas quatro falhas do 3º estágio em 121
lançamentos de Cyclone-3.
38
Para o Cyclone-4, foi desenvolvido um novo 3º
estágio, usando conceitos e componentes no estado-da-arte.
Aproveita a experiência ucraniana com os foguetes Zenit,
Dner e Zenit-3SL. O novo terceiro estágio do Cyclone-4 tem
maior capacidade de propelente e motor foguete capaz de
múltiplas ignições. Utiliza sistema de controle aperfeiçoado
para inserções orbitais mais precisas.
O Tratado de cooperação Brasil-Ucrânia pode ser
assim resumido: a Ucrânia entra com o desenvolvimento do
Cyclone-4, que, como já referido, é o aperfeiçoamento do
Cyclone-3; o Brasil entra com o centro de lançamento e com
a infraestrutura geral necessária ao apoio do lançamento do
Cyclone 4, e as partes brasileira e ucraniana, que compõem
a ACS, devem criar o sitio de lançamento específico para a
preparação e lançamento do veículo Cyclone 4, o que é
muito relevante. Entre prédios, estradas e outras obras
viárias menores, são 103 itens-obras a serem executados em
Alcântara. Os dois países construirão a plataforma de
lançamento em Alcântara utilizando também a indústria
nacional como fornecedora e contando com a participação
de técnicos brasileiros na implantação do sítio e operação
de lançamento do veículo.
Como resultado, o Brasil disporá de conhecimento
para construir suas futuras plataformas. A parte ucraniana
já informou, expressamente, estar disponível para que
técnicos brasileiros do CTA acompanhem na Ucrânia os
trabalhos do Cyclone-4. Assim, com o Projeto Cyclone-4,
asseguraremos a aquisição de tecnologia, que nos foi
vedada nos demais acordos. E estamos planejando, para
daqui a 15, 20 anos, projetar, em conjunto, uma nova
versão, o Cyclone-5, que será desenvolvido pelos dois
países.
Por que o acordo é vantajoso para os dois países?
Para o Brasil, além da transferência de tecnologia, o acordo
é vantajoso simplesmente porque nos supre com aquilo de
que mais carecemos: lançador. Para a Ucrânia é vantajoso
porque, dominando a tecnologia de lançadores e de
39
construção de plataformas, não tem como lançar veículos
de seu próprio território, e atualmente já não pode contar
com as bases russas em Plesestk e Baikonur, que ficam no
Cazaquistão, por sinal, ambas extremamente inadequadas
para lançamentos espaciais. O acordo com o Brasil lhe
assegura um centro de lançamento na maior proximidade
possível do Equador, e de frente para o oceano Atlântico.
Mas
qualquer
projeto
estratégico
enfrenta
dificuldades neste País: a tentativa de constituir a ACS
começou em 1991, com o primeiro acordo com a Ucrânia, e
ganhou objetividade em 1997, quando nossa representante
era a INFRAERO, que negociou com uma empresa italiana, a
Fiat Avio, a construção da plataforma para o veículo
ucraniano. A empresa italiana, porém,
retirou-se do
projeto, ‘aconselhada’ por autoridades norte-americanas.
Como sabemos, a construção dessa plataforma, todavia, em
2009, ainda não foi iniciada, dependente o início das obras
ora da Justiça Federal, ora do Ministério Público, ora do
INCRA, ora do IBAMA. Talvez logremos começa-la em 2010
se conseguirmos atender às exigências ambientais,
condicionantes da Licença de Instalação.
As alterações da política internacional decorrentes
da implosão da União Soviética e do fim da Guerra Fria,
possibilitaram empreendimento desta envergadura, a saber,
o deslocamento de veículo tão potente para ser lançado em
outro país para fins pacíficos e bases comerciais. Essa
experiência abre oportunidade única para o Brasil, agora
em condições de saltar etapas no domínio da tecnologia
espacial, o que de imediato vai capacitá-lo com o domínio
completo da operação de um veículo de grande porte
movido a propulsão líquida. Essa experiência abre caminho
para, numa segunda fase, adquirir o domínio completo de
um sistema de lançamento espacial.
De outra forma, se tivéssemos decidido partir para
o desenvolvimento totalmente próprio de
motores a
propulsão líquida, característica do Cyclone, precisaríamos
40
de investimentos superiores a 2 bilhões de dólares n.a. e
pelo menos 10 anos de intensos trabalhos.
Temos que retornar a 17 anos passados quando o
Brasil sofreu duramente com
embargos dos países
ocidentais no desenvolvimento do VLS, obrigando-nos
reprojetar grande parte do veículo, posto que nos era
negada licença de importação até para os mais simples
componentes, como conectores elétricos. O Brasil sofreu
pressões dos EUA para que empresas nossas suas
fornecedoras de equipamentos (como a EMBRAER) não
participassem do programa do VLS, sob o risco de terem
suas exportações embargadas. O Brasil, assim, era impedido
de beneficiar-se dos serviços de sua própria e avançada
indústria aeronáutica, na qual tanto investira o poder
público, para o desenvolvimento de veículos lançadores.
CRONOLOGIA DA ACS
Em 1997, a empresa italiana Fiat Avio propõe consórcio
para promover lançamentos comerciais utilizando o foguete
ucraniano Cyclone-4 a partir do CLA.
Em 1999, a Fiat Avio desligou-se do empreendimento
julgando-o inviável, em decorrência de comunicação do
Governo norte-americano ao Ministério dos Assuntos
Estrangeiros italiano, contrária ao empreendimento.
Em 2002, em 17 de janeiro, é assinado o “Acordo sobre
Salvaguardas Tecnológicas Relacionadas à Participação da
Ucrânia em Lançamentos a partir do Centro de Lançamento
de Alcântara”.
Em 2003 em 21 de outubro, assinatura em Brasília do
“Tratado entre a República Federativa do Brasil e a Ucrânia
sobre a Cooperação de Longo Prazo na Utilização do Veículo
Lançador Cyclone-4 no Centro de Lançamento de
41
Alcântara”. O Tratado criou a empresa binacional Alcântara
Cyclone Space (ACS).
Em 2004 a AEB solicitou a formal concordância da
Aeronáutica quanto à aprovação da área especificada para a
ACS no interior do CLA. O DEPED, em 19/05/2004,
comunicou à AEB sua aquiescência.
Também em 2004, em 26 de outubro, o DEPED informou à
AEB que não mais poderia ser concedida aquela área no
interior do CLA, pois ela estaria destinada aos sítios dos
veículos lançadores nacionais VLS-2.
Ainda em 2004, o Decreto Legislativo nº 5.666, de
2/11/2004, promulga o Acordo sobre Salvaguardas com a
Ucrânia.
Em 2005, o Decreto Legislativo nº 5.436, de 28/04/2005,
promulga o Tratado entre o Brasil e a Ucrânia.
Em 2006 é aprovado o Estatuto da ACS.
Em 2006, a AEB comunica à Ucrânia a delimitação de área
destinada ao sítio da ACS fora do CLA20.
20
Em 2004 a AEB solicitou a formal concordância da Aeronáutica quanto à aprovação da
área especificada para a ACS no interior do CLA. A Aeronáutica, por intermédio do
DEPED (Departamento de Pesquisas e Desenvolvimento da Aeronáutica, futuro CTA), em
19/5/2004, comunicou à AEB sua aquiescência. Todavia, apenas cinco meses passados,
volta à AEB agora para dizer que não mais poderia ser concedida aquela área pois ela
estaria destinada aos sítios dos futuros VLS-2. Em 20/12/2006 a AEB comunicou à NSAU
a localização e delimitação de novo sítio, agora fora do CLA, e dentro do complexo CEB,
afinal abandonado, com 1.280 hectares, situado imediatamente ao norte e adjacente à região
atualmente ocupada pelo CLA. Em face dos obstáculos levantados pelos quilombolas, que
reivindicam a área, a ACS retorna ao CLA. Em 8/8/2008 a ACS obteve autorização do
Ministério da Defesa para uso, pelo Projeto Cyclone-4, de, agora, apenas 462 hectares de
área no interior do CLA. Em julho de 2009, passado quase um ano da pronta autorização do
Ministro da Defesa, a ACS ainda aguarda a formalização da cessão de uso, de que depende
para a obtenção das licenças exigidas pelo IBAMA para o início das obras e para qualquer
negociação visando ao financiamento do Projeto.
42
Em 2007 (5 de dezembro) tem início as atividades da ACS.
Em 2008 (18 fevereiro) começou o piquete dos quilombolas
em Alcântara, impedindo a continuidade dos trabalhos no
sítio concedido pela AEB para a ACS fora do CLA.
Em 2008, em 8 de agosto, foi formalizada a autorização do
Ministério da Defesa para o uso pela ACS, para o Projeto
Cyclone-4, de 462 hectares de área interna ao Centro de
Lançamento de Alcântara – CLA.
Também em 2008, em 04 de novembro, o INCRA emitiu o
Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) que
transformou 781 km2 da península de Alcântara em
território quilombola, inviabilizando todos os sítios
planejados pela AEB, inclusive o sítio original da ACS fora
do CLA.
Ainda em 2008, em 18 de dezembro, o Governo Federal
aprovou a Estratégia Nacional de Defesa, que elege três
setores decisivos para a defesa nacional: o cibernético, o
espacial e o nuclear.
Em 2009 (6 março), a Justiça Federal autorizou a realização
em território quilombola dos trabalhos de interesse da ACS
para atender às exigências do IBAMA para obtenção de
licenciamento para a construção do sítio no interior do CLA.
O licenciamento será outorgado provavelmente entre
dezembro de 2009 e fevereiro de 2010.
Para viabilizar-se, a ACS renunciou ao seu direito,
derivado do Tratado, a uma área em Alcântara específica
para a instalação de seu Centro, e concordou em instalar-se,
em área inferior, no interior do CLA, sob a jurisdição do
43
Comando da Aeronáutica, dependente, em agosto de 2009,
de negociações visando à assinatura de um termo de cessão.
Em resumo: desde 1997, com o primeiro ato específico do
Projeto Cyclone-4, até agora, em 2009, estamos
completando 12 anos, e ainda aguarda-se autorização
formal de órgãos governamentais para começar a
implantação do sítio do Cyclone-4 dentro do CLA.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Parece evidente que a sociedade brasileira -- nem a
sociedade civil nem a sociedade política – ainda não
compreendeu que somente mediante investimentos,
maciços e sistemáticos, isto é, contínuos,
em ciência,
tecnologia e inovação, conseguirá o País superar as amarras
do subdesenvolvimento, como superaram, entre outros,
Coréia do Sul e China. A alternativa é uma situação de
periferia, como o de todos os que se conformaram com o
destino de exportadores de matérias-primas e de bens de
baixo valor agregado. Certamente a crédito de sagas
passadas, como a luta pelo desenvolvimento da tecnologia
nuclear, a defesa do petróleo, a industrialização do país, a
indústria de aviação, compreendeu o governo brasileiro, e
este é o grande mérito da EDN, que o país, velho comprador
de ‘caixas-pretas’ e pacotes tecnológicos, terá de investir na
produção e aquisição de tecnologia de última geração.
Nada, porém, será possível se não houver competência para
identificar as questões estratégicas e administrá-las como
políticas de Estado.
A evidência, porém, é que nada neste país constitui
política de Estado, pois os programas não atravessam
administrações e numa mesma administração estão a
depender das idiossincrasias da burocracia governamental,
desapartada
dos
interesses
estratégicos
do
país,
descompromissada com o destino dos projetos nacionais e
finalmente desvinculada de compromissos com seu
provedor, o Estado. Este, parece múltiplo. Há um Estado que
44
toma decisões, outro que executa, outro que fiscaliza,
pondo o controle acima dos objetivos. Não se entendem, e
não há linha hierárquica entre si, de sorte que o Estadomeio pode desfazer e sistematicamente desfaz as políticas
do Estado-fim.
Esse, o Estado que herdamos do neoliberalismo (e nada fizemos para mudá-lo), uma estrutura
paquidérmica, inepta, simplesmente incapaz de operar.
Essa burocracia não se questiona a propósito das
consequências de seus atos e de suas omissões, nem se
pergunta ela pelos prejuízos que de seus atos e omissões, de
sua desídia, podem advir para o interesse público. Do
atraso de uma licitação deriva perda de milhões de reais, e
atraso inestimável de cifrões no desenvolvimento
econômico e social do país.
Embora as negociações, como vimos, remontem ao
início dos anos 90, o Tratado de Cooperação Brasil-Ucrânia
é de 2003, e só em 2006, foi publicado o estatuto da ACS e
só em setembro de 2007 a empresa se instalou. Levamos
quatro anos para fazer essa operação. Pior, desde 1997,
com o primeiro ato específico do Projeto Cyclone-4, até
agora, em 2009, estamos completando 12 anos, e a ACS
ainda não adquiriu o direito de instalar-se dentro ou fora
do CLA.
45
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A crise dos projetos estratégicos brasileiros: o caso do