UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES
DEPARTAMENTO DE RELAÇÕES PÚBLICAS, PROPAGANDA E
TURISMO
Relações Públicas
como uma Função Integradora
Ligia Ungaretti Jesus
Trabalho apresentado à Escola de
Comunicações e Artes da
Universidade de São Paulo para
obtenção do título de Bacharel em
Comunicação Social com Habilitação
em Relações Públicas
Prof. Dr. Paulo Nassar
orientador
SÃO PAULO, Outubro/2011
Banca Examinadora
____________________________
Prof. Dr. Paulo Nassar
____________________________
Prof. Dr. Arlindo Ornellas Figueira Neto
____________________________
Resumo
A linguagem surge da prática social e é a forma pela qual o indivíduo define e
comparte sua percepção da realidade com o mundo. É parte constituinte da cultura,
esta entendida como o espírito formador da sociedade, elemento de conexão e
construção de significados em comum. A cultura como o que permite que indivíduos
se relacionem e dêem origem à práxis social em si.
Toda essa análise aplicada ao contexto organizacional amplia os horizontes
da atuação do profissional de relações públicas, que tem na cultura organizacional o
seu contexto de trabalho.
É aí que esse profissional assume a função de mediador na construção de
significados da realidade organizacional, ou seja, é parte atuante na gestão dos
processos comunicativos que definem as relações no ambiente de trabalho, o que é
em si a realidade vivida pelas pessoas que formam a organização.
A partir disso, fica claro o potencial da gestão da comunicação organizacional
e o poder assumido pelo profissional que o faz. Consequentemente, aflora a
consciência da responsabilidade que tem aquele que trabalha com relações públicas
e comunicação. Sendo assim, questiona-se: qual a intenção do profissional de
Relações Públicas em gerir a comunicação organizacional?
A partir dessa pergunta se abre um leque de possibilidades para a atuação
em comunicação, as quais são nesse trabalho analisadas através de dois
estereótipos em relações públicas aqui denominados função ideológica e função
integradora.
Enquanto a função ideológica diz respeito ao uso da gestão da comunicação
para controle de subjetividade e alienação do trabalhador, a função integradora
propõe uma nova forma de atuar em relações públicas, onde interesses da
sociedade e do trabalhador, como reconhecimento profissional, responsabilidade
socioambiental, necessidades emocionais, entre outros, passam a ser atendidos de
forma genuína.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................. 10
1. A CONSTRUÇÃO DA REALIDADE ............................................................. 13
1.1 O surgimento da Linguagem ................................................................ 13
1.1.2 A percepção da realidade como uma imagem da mesma .............. 14
1.1.3 Importância de um sistema de signos em comum .......................... 15
1.2 Um zoom na organização ..................................................................... 17
1.2.1 A organização como sociedade ....................................................... 17
1.2.2 A organização como indivíduo ......................................................... 18
1.3 A importância da cultura dentro das organizações ........................... 19
1.3.1 Cultura ............................................................................................. 19
1.3.2 Cultura organizacional ..................................................................... 22
1.3.3 Cultura ideal x Cultura real .............................................................. 23
2. A FUNÇÃO DO PROFISSIONAL DE RELAÇÕES PÚBLICAS .................. 26
2.1 Questionamento por uma nova consciência em Relações Públicas 26
2.1.1 Dois caminhos que servem de estereótipos
na atuação do Relações Públicas .................................................... 28
2.1.2 Sobre a intenção do profissional de Relações Públicas .................. 29
2.1.3 A consciência em relação ao potencial
da comunicação na construção da realidade ................................... 30
2.2 Uma função ideológica ......................................................................... 32
2.2.1 Controle da subjetividade ................................................................ 33
2.3 Então, por que se faz a gestão da comunicação? .............................. 35
2.4 Função Integradora ............................................................................... 36
2.4.1 Uma Nova Era ................................................................................. 38
2.4.2 O que nasce do novo ....................................................................... 38
2.4.3 O surgimento de uma nova linguagem ............................................ 39
2.4.5 A importância de rever a prática do profissional de comunicação .. 41
2.4.6 Uma nova forma de atuar como
Relações Públicas gestor de comunicação...................................... 41
2.4.7 O fazer político em Relações Públicas ............................................ 45
2.4.8 Uma pequena revolução – integração de partes ............................. 47
3. SOBRE PROCESSOS DE TRABALHO ....................................................... 49
3.1 Reflexão epistemológica.......................................................................... 49
3.2 A presença do novo na prática do Relações Públicas ............................ 49
3.3 Levantamento da Memória Organizacional ............................................. 53
3.4 O Relações Públicas como pesquisador ................................................. 58
3.5 A entrevista .............................................................................................. 60
3.6 Identificando os entraves no contexto da comunicação organizacional .. 61
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................... 63
5. BIBLIOGRAFIA ............................................................................................ 64
6. ANEXOS ....................................................................................................... 67
6.1 Roteiro de Entrevista ............................................................................... 67
6.2 Entrevista Gilberto Colorni - Gerente de Design Industrial da Arcor ....... 68
6.3 Entrevista Schuler – anotações ............................................................... 75
Agradecimentos
A gratidão bate forte, e eu ponho isso aqui: Grata ao meu pai, Tonico e à minha
mãe, Marcia, tanto pela vida quanto pela ajuda na produção desse trabalho.
Grata Roseli Figaro, por abrir meus olhos para a responsabilidade em trabalhar
com comunicação. Grata aos amigos de jornada na ECA, pelas conversas e
devaneios sobre relações públicas. Grata Pedro de Bona, por cada troca e
aprendizado sobre o que é a relação humana. Grata Rita Monte, por me
lembrar do valor que tem ser genuína comigo em relação ao mundo. Grata
Brian Gray, pela torcida na reta final e por me apresentar uma realidade toda
nova. Grata Eu, por insistir na busca em servir ao mundo de um jeito delicioso
para mim e para o todo.
Dedico esse trabalho àqueles que buscam uma forma de servir à construção
de um mundo melhor através da comunicação.
Por quê eu escolhi Relações Públicas
“Do que se trata essa carreira, de Relações Públicas?”, foi o que me
perguntei em 2006 quando me inscrevia no vestibular para ingresso na
Universidade de São Paulo. Sinceramente nunca tinha ouvido falar dessa
profissão e não conhecia suas funções. Mas o nome me chamou a atenção,
Relações Públicas.
Com certo nível de inocência, que poderia ser melhor denominado de
ignorância, entendi que deveria ser algo como o estudo das “Relações
Públicas”, ou seja, dos encontros que acontecem entre as pessoas não na vida
privada, mas na vida pública?
Isso me interessou profundamente, e me lembro do momento em que
assumi que tentaria essa carreira. Era algum dia do ano de 2006 e eu estava
no carro com meu pai, atravessando a ponte da cidade universitária. Meu
coração bateu forte ao imaginar-me ingressando na Escola de Comunicações e
Artes. Cursando Comunicação Social com habilitação em Relações Públicas.
Tudo correu como esperado no vestibular e pude começar o curso. E,
como acontece na maioria das vezes em que levantamos muitas expectativas
em relação a algo, percebi que a formação era muito diferente do que eu tinha
imaginado – mesmo porque o imaginado era muito mais próximo de um sonho
fantástico que mesclava intervenções artísticas com comunicação, tudo
colorido e de pura criação e felicidade, sempre com pessoas incríveis à volta.
Sair do abstrato e me deparar com o mundo real resultou em um período de
frustração e vontade de abandonar curso. Período esse que durou pouco, pois
felizmente tomei consciência do potencial de relações públicas e de tudo que
eu poderia realizar a partir dessa formação.
Foi assim que tudo mudou e percebi o amplo leque de possibilidades de
atuação da profissão. Aquele sonho primeiro que eu tinha de capacitar-me para
entender e facilitar o desenvolvimento das pessoas através de suas relações
de trabalho era perfeitamente compatível com o curso e que a autonomia
concedida a mim nessa fase de meus estudos me permitia sim, focar-me na
área que em que eu quero atuar como profissional gestora de comunicação.
Essa é minha proposta nesse trabalho de conclusão de curso:
aprofundar-me um pouco mais na prática do profissional de relações públicas
que atua com o objetivo de integrar o grupo de pessoas no qual está focado,
seja esse uma empresa privada, uma ONG, uma equipe de trabalho de um
órgão público ou qualquer outro gênero de grupo que tenha a intenção de
evoluir enquanto unidade integrada, sempre buscando na prática do trabalho
um espaço educativo e de desenvolvimento humano que atenda as
necessidades individuais e da organização, desde as financeiras até as
emocionais.
10
INTRODUÇÃO
O cuidado com a comunicação vem ganhando importância no mundo do
trabalho, o que se deve muito ao desenvolvimento de novas tecnologias e à
crescente quantidade de troca de informações que geram conflitos e dificuldades de
compreensão. Em outras palavras, manter uma boa relação, tanto entre os membros
de uma mesma instituição (comunicação interna) quanto entre a instituição e seus
públicos (comunicação externa), vem se tornando uma tarefa cada vez mais
complexa. Além disso, a capacidade de realização de novos projetos e elaboração
de novas idéias vem sendo aprimorada pelos profissionais da área. Um outro ponto
que influi para o crescimento da área de comunicação no mercado de trabalho é o
refinamento da consciência – tanto do profissional de comunicação quanto da
sociedade em geral – em relação à importância da cultura e do potencial da
comunicação em si. Por isso se faz importante que tanto os profissionais que se
dedicam às relações públicas quanto à sociedade como um todo se conscientizem
do poder que tem o conhecimento da gestão da comunicação e o contexto de fluxo
de informação dentro do qual o indivíduo esta inserido, uma vez que a partir deste
se constitui a realidade percebida pelo Homem e sua subjetividade em relação ao
mundo.
A partir da relação entre comunicação e subjetividade a atuação do
profissional de relações públicas se dá sob o filtro de uma intenção específica, que
pode dar maior ou menor peso para fatores como desenvolvimento do trabalhador,
harmonia social no grupo, lucro, espaço de educação e criatividade, necessidades
emocionais, intelectuais, sociais, etc. A questão da intenção do profissional é no
presente trabalho abordada com maior profundidade devido ao objetivo do mesmo
em questionar a atuação do profissional de relações públicas no mundo do trabalho
de hoje. Com cuidando para fazê-lo de forma abrangente, ou seja, abordando
diferentes modelos de atuação no mercado e, portanto, retratando distintas
intenções presentes na gestão da comunicação.
Uma coisa é certa: a partir do momento em que há a consciência a respeito
do poder da comunicação, a atuação do comunicador deixa de ser inocente e esse
se faz responsável pelas suas ações. Em outras palavras, aquele que deixa de ser
11
ignorante nao pode mais agir como se não conhecesse seus atos de forma mais
ampla. Isso pode surpreender no que diz respeito à comunicação, uma vez que
muito do que se faz nesse campo passa a ser quase absurdo quando tomamos
consciência do poder do uso da comunicação para controle de subjetividade e
alienação do trabalhador e outros públicos organizacionais. A essa função de
relações públicas denominamos no presente trabalho de ideológica.
Por outro lado, tomar conhecimento do potencial da comunicação abre um
leque de possibilidades incríveis para atuação do profissional de Relações Públicas,
que pode assumir uma função integradora no contexto organizacional a partir do
momento que se propõe a gerir espaços de desenvolvimento e aprendizado no
ambiente de trabalho.
O afloramento de tal consciência é parte do objetivo desse trabalho, uma vez
que busca evidenciar o potencial da gestão da comunicação dentro do contexto
organizacional.
Além disso, profissionais com cargos como gerente de comunicação, relações
públicas ou diretor de relacionamentos são cada vez mais comuns, o que evidencia
o crescimento da área profissional como um todo. Isso porque a importância da
comunicação, já citadas no parágrafo anterior, é cada vez mais reconhecida pelas
empresas e, consequentemente, envolve um número crescente de práticas
profissionais que geram demanda de trabalho na área.
Dentro desse novo contexto de trabalho em comunicação, o relações públicas
entra com um papel importante que tem tanto a função de manter o público
consumidor e cuidar para que a empresa gere renda, quanto de colaborar para o
desenvolvimento de uma consciência em relação à importância da cultura, do meioambiente e das relações de forma geral no cotidiano de hoje. O que propomos aqui
é a possibilidade de relacionar ambas funções de forma integrada, entendendo que
é possível cuidar para que o espaço de trabalho seja um espaço de manifestação do
indivíduo, onde esse se auto-realize em diversas faces de sua existência. Um
espaço onde esse possa servir ao mundo e receber do mesmo. Trata-se de saber
que fazer comunicação é uma função que envolve indivíduos, um conjunto de
pessoas que receberá aquelas informações e responderá a elas. Um conjunto de
pessoas que, por ser parte da sociedade, deve ser considerado como tal e incluído
12
no contexto de trabalho enquanto indivíduos pensantes e com direitos e
necessidades financeiras, culturais, emocionais, sociais, legais, entre outras.
Sobre o conteúdo desse trabalho
Sendo um trabalho de conclusão de curso, o conteúdo deste é formado
a partir de todos os estudos e reflexões a cerca da prática do profissional de
comunicação que ocorreram durante o período de graduação em Comunicação
Social com habilitação em Relações Públicas.
Além de conter toda a grade horária de disciplinas da formação, as quais
estão presentes em maior ou menor escala nesse trabalho, há uma relação de
continuidade do que aqui se apresenta com os estudos realizados na pesquisa
de
iniciação
científica
“O
Profissional
responsável
pela
Política
de
Comunicação Organizacional”1, realizada no ano 2009 sob orientação da Prof.
Dra. Roseli Fígaro. Esse estudo de iniciação científica fez parte de um conjunto
maior, representado pela pesquisa As mudanças no mundo do trabalho nas
empresas de comunicação, realizada pelo Grupo Comunicação e Trabalho2,
que é coordenado pela Profa. Dra. Roseli Fígaro.
Em função dessa relação de continuidade, faz-se nesse trabalho um
resgate de alguns conceitos apreendidos na iniciação científica, a partir dos
quais se desenvolvem novas reflexões e análises que são apresentadas a
seguir.
1
JESUS, Ligia Ungaretti. “O Profissional responsável pela Política de
Comunicação Organizacional”. Relatório final com os resultados da pesquisa
de Iniciação Científica, Pibic/CNPq-ECA-USP. São Paulo, 2009
2
GRUPO DE PESQUISA COMUNICAÇÃO E TRABALHO.
http://www.eca.usp.br/comunicacaoetrabalho.
Disponível em
13
1. A CONSTRUÇÃO DA REALIDADE
1.1 O surgimento da Linguagem
O desenvolvimento de uma sociedade depende da comunicação entre os
indivíduos, e a linguagem é que serve de ponte entre os conhecimentos de cada um.
Mas a questão é como se dá origem à linguagem e como essa se torna de comum
entendimento entre aqueles que compõem certa comunidade?
Quando uma criança nasce se inicia um processo de contato com um mundo,
uma sociedade, uma família as quais ela desconhece, assim como desconhece
qualquer tipo de mundo, sociedade ou família. Conforme essa criança cresce, lhe
são apresentadas comidas, roupas, animais, tudo com um nome pré-estabelecido. E
não para por aí, pois ela aprende que há nomes para as ações, para avaliações e
ainda, nomes que ajudam a fazer a relação entre outros nomes. Pouco a pouco essa
pessoa tem acesso à realidade e às suas representações e cada vez mais se revela
capaz de absorver e desenvolver ideias complexas e abstratas. Tais ideias são,
inevitavelmente, baseadas pelas realidades e representações que aprendeu no meio
onde vive. A esse aprendizado damos o nome de práxis social.
Inicia-se aí um processo contínuo de apreensão e relação entre signos, o que
resulta na formação do pensamento em si, assim como do desenvolvimento
individual e de novos conhecimentos na sociedade (BAKHTIN, 2002).
Detalhando um pouco mais, a práxis social diz respeito à convivência em
sociedade, através da qual o indivíduo tem acesso aos chamados signos. Os signos
são explicados por uma teoria semiótica, como uma unidade de três faces, o
referente, o significante e o significado. O referente corresponde ao dado apreendido
na realidade (tal apreensão não é feita de forma livre, e sim por meio de um
processo cheio de subjetividade). No caso da criança podemos usar como exemplo
de referente uma maçã que lhe é dada. Logo alguém fará com que esse novo
cidadão aprenda que aquela fruta se chama “maçã”, e ainda, que pode ser
desenhada no papel. Tanto a palavra quanto o desenho são exemplos de
significante, ou seja, representações da realidade. Uma vez entendidos e
devidamente relacionados pela criança o referente e o significante, um novo
14
conceito será armazenado na sua mente, uma compreensão parcial do que é a
maçã. A esse conceito damos o nome de significado.
Diz-se compreensão parcial, pois a coisa maçã oferece muitos signos, cuja
relação forma o conceito completo de maçã (se é que é possível chegar a tal nível
de entendimento). A criança, por exemplo, entenderá melhor o que é uma maçã
quando entender o que é uma fruta, o que é uma maçã podre, uma maçã verde ou
uma maçã doce.
Quanto maior o número de signos aos quais se tem acesso, maior é o nível
de abstração ao qual o indivíduo pode chegar com seus pensamentos. Em outras
palavras, os signos são a base para a construção do pensamento; quanto maior a
complexidade do sistema de signos ao qual se tem acesso, mais complexos os
pensamentos formados pela relação entre esses.
Não só elementos como os seres vivos, o idioma e o comportamento, mas também
noções de espaço e tempo dependem da práxis social.
Mas por mais que o pensamento se estruture nos signos, ou seja, na
linguagem, sua origem está na percepção, afinal uma pessoa antes percebe que
está com frio para depois relacionar as causas, os termos e as prevenções que
conhece em relação a essa sensação térmica. Essa percepção é a forma como o
indivíduo percebe a realidade e tenta descobrir uma maneira de interagir com esta,
surgindo assim os pensamentos.
1.1.2 A percepção da realidade como uma imagem da mesma
Será que toda criança que está aprendendo a reconhecer o mundo não
recebe os significantes como espécie de instrução sobre como reconhecer as partes
da realidade, ou os referentes? Isidoro Blikstein(1990) esclarece isso quando
escreve que “(...) o real é o universo desordenado e contínuo (...). O que vemos, na
verdade, é um referente (...) balizado pelos estereótipos de percepção”. A realidade
é única, nós é que a picamos em pedacinhos, ou melhor, recebemos a realidade já
picada pela linguagem.
15
Nesse sentido se faz importante a consciência de que a percepção da
realidade é uma imagem resignificada pelo Homem a partir de suas percepções
sensoriais e interações social com o mundo(Blikstein,1990). Ou seja, nao é possível
ter acesso à realidade em si, mas sim ter uma percepção da realidade que seja, em
parte, comum entre um grupo de indivíduos.
Tal consciência abre uma série de possibilidades de atuação tanto no âmbito
profissional, quanto de relações amorosas ou questões individuais. Enfim, há
aplicação para qualquer interação entre Homem e mundo a partir do conceito de que
a realidade que percebemos é uma imagem da mesma. E é aí que entra, no campo
da comunicação organizacional, a função integradora do profissional de Relações
Públicas, cuja intenção de servir a um bom fluxo de informação está paralela à
facilitação da construção de significados dentro do ambiente organizacional (ver item
2.4 Função Integradora)
1.1.3 Importância de um sistema de signos em comum
Qualquer atividade que envolva duas ou mais pessoas é inerente ao processo
de troca de informações entre elas. Em outras palavras, toda atividade em grupo
tem a comunicação como elemento essencial à sua viabilização. Para que se
possibilite essa comunicação é necessário que exista um sistema de signos de
conhecimento comum por parte dos indivíduos constituintes de um mesmo grupo,
sendo assim possível a troca de informações entre os mesmos.
Na verdade, é impossível que dois indivíduos tenham entendimento único dos
sistemas de signos como meio de representação da realidade. Isso porque é
impossível que duas pessoas tenham vivências idênticas, conversas idênticas,
sensações idênticas, enfim, cada um tem uma experiência individual na práxis social
e, sendo essa a base para a formação dos sentidos que adquirem os sistemas de
signos, resulta que cada um forma seu próprio sistema de signos.
Mas apesar dos sistemas de signos serem individuais, grande parte da
construção de significados se dá de forma coletiva, o que permite que nos
comuniquemos uns com ou outros.
16
Voltando ao exemplo que parte da construção coletiva do signo “maça”, é a
parte em comum do mesmo que permite que o leitor, ao ler essa palavra, imagine
uma maçã, assim como imaginamos no momento de produção desses texto. Porém,
parte do entendimento desse signo não é compartilhada, o que faz que a imagem de
maçã criada por cada indivíduo que lê essa mesma palavra seja, em parte, distinta
das demais imagens.
A partir disso, para se fazer entender, um indivíduo faz uso de uma relação
entre signos, o que origina um conceito; cada um desses signos deve ser de
conhecimento das outras pessoas – o que se faz possível apenas em parte, como
vimos acima - com quem convive, o que possibilitará ao grupo fazer uso desse
conceito para trocar informações. E a troca de informações é essencial para a
sobrevivência da sociedade e sua cultura. Fica evidente assim a importância de um
sistema de signos comum para que haja comunicação. E quanto mais amplo for
esse sistema, mais complexa será a linguagem usada e mais desenvolvido e
abstrato o raciocínio construído pelo grupo.
Qualquer grupo pode, mesmo sendo formado por indivíduos nivelados por um
idioma comum, sofrer dificuldade de comunicação em função de variações
significativas dentro do sistema de signos, pois dentro de uma mesma língua e de
uma mesma norma ainda existem diferenciações como os dialetos regionais e
sociais.
Estreitando um pouco mais esse grupo, ainda podemos encontrar níveis
distintos de fala, dependentes do grau de intimidade entre os falantes, da situação
emocional e do ambiente em que se encontra o indivíduo.
17
1.2 Um zoom na organização
Com cuidado para não recortar parte da realidade e analisá-la como elemento
desconectado do restante de seu contexto, assumimos nesse trabalho a
organização como objeto de estudo, entendendo-a como uma parte de um sistema,
mas também como unidade em si. Além disso, assumimos que cada parte tem
semelhanças com o todo, o que é explicado pelo conceito de fractal3 aplicado às
organizações(Torres, 2010). Isso permite que a organização, parte do objeto de
estudo desse trabalho, seja comparada à sociedade ou ao indivíduo. Mais além
disso, isso explica porque teorias originalmente aplicadas à sociedade – política – ou
ao indivíduo –psicologia – foram adaptadas para a organização e hoje servem de
base para práticas do profissional de Relações Públicas.
A seguir apresenta-se análise da organização sob o filtro de outras unidades:
a sociedade e o indivíduo.
1.2.1 A organização como sociedade
É possível entender a organização como uma micro-sociedade com
semelhanças em relação à sociedade macro à qual estamos acostumados a nos
referir. Uma dessas semelhanças é a existência de uma linguagem específica e,
inerentemente, uma cultura organizacional própria de sua unidade. Afinal, assim
como na vida em sociedade de forma geral (macro), no mundo do trabalho (micro)
se faz necessário o uso de um sistema de signos relativamente comum por parte
dos membros de uma mesma equipe profissional, ou ainda, por parte de diferentes
equipes profissionais que se relacionem, alcançando assim um maior nível de
entendimento por parte dos diferentes públicos, sejam internos ou externos, de uma
mesma organização.
Isso pelo motivo já citado que se repete aqui: é necessária a comunicação
entre os indivíduos que realizam atividade profissional em conjunto. Quanto mais
eficiente for tal processo, melhor será o resultado do trabalho e menores serão os
3
O conceito de fractal analisa a formação de unidades a partir de partes que
são semelhantes à mesma, ou seja, a soma de partes dá origem a um todo
semelhante a cada uma das partes que o compões. Mais em Torres, 2010.
18
conflitos e frustrações em função de erros de comunicação. Paralelamente, quanto
mais complexo e comum for o sistema de signos entre as pessoas envolvidas em
um mesmo contexto de trabalho, mais eficiente será a comunicação entre as
mesmas, resultando em um trabalho cuja efetividade e satisfação são diretamente
proporcionais à eficiência de comunicação.
A linguagem específica do mundo do trabalho não deixa de se fazer
específica em contextos menores, como nas empresas, por exemplo. Afinal não
existe um sistema de signos absolutamente padronizado no mundo do trabalho, mas
sim uma infinidade de particularidades que podem tanto colaborar para a formação
de identidade grupal quanto se tornar um obstáculo na hora da interação com outros
públicos ou na inserção de novos membros na equipe.
1.2.2 A organização como indivíduo
Não é difícil estabelecer uma forte analogia entre um indivíduo humano e uma
empresa. Uma obra que o faz de forma provocadora é o filme “The Corporation”,
dirigido por Mark Achbar (2003) e Jennifer Abbott e produzido no Canadá, no ano de
2004. O documentário explicita a personificação de uma empresa, dando ênfase no
aspecto legal e de responsabilidade socioambiental em relação ao planeta.
Ora, se a unidade formada por um grupo pode ser comparada à unidade de
um ser humano, apresenta-se a possibilidade de analogia com um organismo vivo
qualquer, o qual é composto pela união de diversas partes com diferentes funções.
Freud(1918), ao referir-se a um grupo formado por diversos indivíduos, diz: “o grupo
psicológico é um ser provisório, formado por elementos heterogêneos que por um
momento se combinam exatamente como as células que constituem um corpo vivo
formam, por sua união, um novo ser que apresenta características muito diferentes
daquelas possuídas por cada uma das células isoladamente.” Essa declaração foi
dada no congresso de Budapeste, em 1918, a cerca da preocupação com os limites
de acesso da sociedade à teoria psicanalítica.
Talvez caiba aqui uma grande premissa para que o trabalho do relações
públicas se dê com sucesso: a consciência de que o grupo deve ser tratado como
um todo, pois o é. Indo além, reconhecer que esse todo é formado por partes, e que
19
muitas vezes o diagnóstico, assim como o tratamento, deve ser feito nas partes para
que se reflita no todo posteriormente.
1.3 A importância da cultura dentro das organizações
1.3.1 Cultura
O entendimento do conceito cultura foi, e ainda é, objetivo de muitos
estudiosos. A tentativa de contextualizá-la levaria à percepção de como é complexa
a compreensão de cultura. Porém há alguns caminhos que nos distanciam do uso
descompromissado e de senso comum que se faz do termo cultura hoje em dia.
Segue a definição usada no dicionário Aurélio:
“1. Ato, efeito ou modo de cultivar. 2. Cultivo. 3. O complexo dos padrões de comportamento,
das crenças, das instituições e doutros valores espirituais e materiais transmitidos
coletivamente e característicos de uma sociedade: civilização. 4. O desenvolvimento de um
grupo social, uma nação, etc., que é fruto do esforço coletivo pelo aprimoramento desses
valores; civilização, progresso. 5. Apuro, esmero, elegância. 6. Criação de certos animais, em
4
particular os microscópicos” .
A partir dessa, faz-se claro o múltiplo uso do termo “cultura”, uso esse que vale
ser analisado para que a palavra seja, dentro do contexto desse trabalho de
conclusão de curso, entendida de forma mais alinhada entre aqueles que tiverem
acesso a esse conteúdo.
O significado original da palavra em questão se referia à cultura de plantas e
animais, ou seja, a cultura de algo significava o cuidado e a dedicação a longo prazo
para que determinada planta ou animal se desenvolvesse. Ainda hoje a palavra
cultura é empregada com esse sentido. Por exemplo, para designar uma plantação
de uma espécie única, a monocultura, ou em laboratórios, quando são realizadas as
culturas de bactérias.
4
FERREIRA, Aurélio B. de H. Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro:
Editora Nova Fronteira, 1980.
20
No livro “Cultura”, Raymond Williams faz uma analogia do significado original
com o significado atual, quando cultura passaria não só a designar o cultivo de
plantas e animais, mas também o cultivo de mentes.
Nesse último argumento, a cultura como a conhecemos hoje passa a ser
fundamental para o desenvolvimento do indivíduo humano como ser pensante. Uma
espécie de elemento indispensável ao crescimento saudável em sociedade. Nesse
contexto se vê a palavra “cultura” ligada a processos de desenvolvimento, como as
chamadas “atividades culturais”, nas quais se pressupõem um desenvolvimento de
mente e espírito do indivíduo, e os “centros culturais”, que se propõem não só a
oferecer esse tipo de atividade, como a transmitir conhecimentos relacionados a
uma determinada “cultura”. Esta última implicação do termo nos leva a mais uma de
suas definições, onde “cultura” se refere a um conjunto de padrões de
comportamento e crenças específico. Aqui se aplicam os conceitos de “cultura
indígena” ou “cultura européia”, por exemplo.
Um outro significado para o termo cultura se dá quando este é empregado
com a finalidade de designar uma pessoa que tem amplo conhecimento, ou
conhecimento erudito. Nesse caso o conceito formado é o de “pessoa culta”.
Para melhor visualização, apontamos aqui as diferentes aplicações para a
palavra cultura:
•
Cultivo de plantas ou animais
•
Meio de desenvolvimento de pessoas e sociedades – “atividades culturais”
•
Padrão de crenças e comportamentos – “cultura indígena”
•
Indivíduo que dispõe de amplo conhecimento - “pessoa culta”
Ainda no livro Cultura, de Raymond Williams, o autor propõe a distinção entre
duas definições de cultura: a materialista e a idealista. A principal diferença entre as
duas está em ter a cultura como um produto das atividades sociais, ou seja, algo
que poderia ser recortado como um elemento resultado da forma como a sociedade
funciona, ou entender a cultura como o espírito formador da sociedade, elemento de
conexão e construção de significados em comum, o que permite que indivíduos se
relacionem e deem origem à práxis social em si.
21
Talvez essas duas definições possam ser reelaboradas e compreendidas de
maneira dialética, uma vez que sem atividade o homem não produz sua vida em
sociedade e portanto não existiria sequer sociedade humana, tampouco cultura; mas
ao produzir-se materialmente e socialmente, o homem produz-se também
espiritualmente, intelectualmente, com valores e princípios, os quais também são o
fundamento das relações sociais, necessários à vida em sociedade.
Raquel Sousa Lima, ao analisar o conceito de cultura materialista de Raymond
Williams, coloca como problema que deu origem ao conceito a concepção de cultura
como algo dado, fora da realidade social. A partir da discordância com essa
definição, o autor propõe o entendimento de cultura como característica da práxis
social, inerente ao processo da atividade humana de qualquer espécie. Nesse
sentido, cultura se equipara ao conceito de linguagem, a qual está inserida no
próprio conceito de cultura.
“Williams recuperou os estudos de Mikhail Bakhtin que, segundo ele, seriam originais já que
definiram a linguagem como sendo uma atividade social prática, dependente de uma relação
social. Bakhtin trabalhou com a idéia de que a linguagem era consciência prática e, como tal,
estava saturada por toda atividade social e a saturava, inclusive a atividade produtiva. Nesse
sentido, “a linguagem é a articulação dessa experiência ativa e em transformação; uma
presença social e dinâmica no mundo”. (WILLIAMS, R. op. cit., p. 11) Bakhtin trabalhou com a
idéia de que a consciência era social, mas que deveria ser entendida em um processo
dialético, uma vez que ela, em termos práticos, operava na transformação dos seres humanos.
Assim, o autor conclui que ela é uma atividade material prática e, portanto, é um meio de
5
produção” .
Portanto, a vida na sociedade depende da comunicação através da linguagem.
Ela marca o ingresso do homem na cultura, através da convivência entre os
indivíduos, por meio da qual são passados conhecimentos e experiências.
5
LIMA, Raquel Sousa . “O conceito de cultura em Raymond Williams e Edward
P. Thompson: breve apresentação das idéias de materialismo cultural e
experiencia”. Disponível em:
http://www.historia.uff.br/cantareira/novacantareira/artigos/edicao8/artigo02.pdf
Consultado em: 5/10/2011, p.3
22
O que rejeitamos é a pressuposição de que a vida em sociedade ou a
sociedade humana, é um ato de vontade individual que se coloca acima das
atividades humanas na sociedade. Assim a cultura é tanto produto das atividades
sociais, ou do trabalho remunerado, quanto é a origem da estrutura que pede a
produção na atividade social.
1.3.2 Cultura organizacional
Nesse trabalho dá-se ênfase na cultura organizacional, que nada mais é do
que um conceito que tenta definir um tipo de cultura específico que se analisa dentro
de organizações e, como dito anteriormente, pode ser entendido como um
microuniverso representativo de uma unidade, uma parte que, para fins didáticos, é
aqui recortada do conjunto e sociedade onde está inserida e analisada enquanto
campo de atuação do profissional de Relações Públicas.
Compreender a importância da cultura dentro de uma determinada
organização é extremamente importante para que se entendam as práticas do
profissional responsável pelas políticas de comunicação de uma instituição, ou seja,
o responsável pelas relações publicas.
No artigo “Faces da cultura e da comunicação organizacional”, Marlene
Marchiori (2009) chama atenção para o fato de que já se sabe que a realidade das
organizações transpassa os limites da empresa e chega aos seus públicos externos
como fator determinante da imagem que o cliente concebe a respeito de
determinada organização. Portanto, é dedutível que deve-se ter um cuidado especial
com tal realidade.
Esse cuidado pode ser direcionado para a chamada comunicação interna,
cuja definição abrange todas as relações que gerem uma organização no seu âmbito
interno, ou seja, toda a comunicação que acontece entre os membros inseridos na
organização, além de todas as formas pelas quais essa comunicação pode
acontecer. Nesse campo entra a função do gestor de comunicação de colaborar
para que a cultura organizacional formada a partir da comunicação interna seja
favorável a todos os públicos.
23
Ainda fazendo referência ao artigo de Marchiori(2009), ao abordar a cultura
organizacional não se deve de forma alguma subestimar a comunicação externa,
pois essa é responsável pelo como a organização é vista, e quando comparada à
comunicação interna não perde em importância, pois uma influencia a outra
profundamente, uma vez que a imagem depende de ambas, assim como a
formatação da identidade organizacional.
Esta última, embora sejam todos os aspectos comunicacionais fatores
inerentes à sua configuração, depende em grande escala da comunicação interna,
pois é a partir dessa que cada indivíduo participante na empresa definirá nada
menos que sua realidade no ambiente de trabalho. Afinal é a partir da cultura
organizacional e da linguagem presente na mesma que o indivíduo percebe o
mundo, se relaciona com o mesmo e se coloca com sua subjetividade na prática
social.
A partir disso se faz claro o poder que tem o Relações Públicas, o que nos
leva a ver a enorme importância da consciência e intenção desse profissional ao
propor-se a atuar em gestão da comunicação ( ver item 2.1.2 Sobre a intensão do
profissional de Relações Públicas).
Sendo assim, há a necessidade de que se continuem os estudos para que os
profissionais da comunicação formulem novas formas de atuar nas relações que
gerem a organização, agindo de forma ativa perante a realidade e cultura
organizacionais (ver item 3.2 A presença do novo na prática do Relações Públicas)
1.3.3 Cultura ideal x Cultura real
A principal fonte de pesquisa para esse grande item foi uma dissertação de
mestrado com o título “Cultura de Empresa, um estudo de caso”, de Marco A.
Oliveira (1995). Nesse trabalho o autor, para analisar o caso específico da empresa
na qual trabalha, oferece conceitos gerais que são de suma importância para o
entendimento do restante desse trabalho de conclusão de curso. Um deles é a
definição de cultura ideal e cultura real, que é explicada a seguir.
Segundo Oliveira(1995), a cultura ideal corresponde à utopia organizacional
criada na mente do grupo dirigente da mesma. É a empresa perfeita, em que os
24
funcionários trabalham motivados e felizes, mesmo que seus salários não
correspondam à sua função e trabalho; a comunicação é fluída e sem conflitos e não
existe nada acontecendo na empresa sobre o que ele, o grupo dirigente, não tenha
controle.
Já a cultura real é o conjunto de pensamentos e comportamentos que se
verificam na realidade da empresa. São as condições de comunicação reais, a
satisfação ou não no trabalho real, o que a empresa é como um todo. Ela é o todo,
incluindo até a cultura ideal, uma vez que essa faz parte da formação real da
organização.
Enquanto a cultura ideal pressupõe um grupo hegemônico dentro da
organização, onde todos ouvem e estão de acordo, sempre, a cultura real admite a
existência de grupos heterogêneos, que apresentam características distintas entre
si. Esse é um ponto que evidencia a viabilidade da cultura real, admitindo
características (inclusive opiniões) distintas. Já a cultura ideal supõe uma só
mentalidade, um acordo absoluto entre as partes, uma espécie de conformismo de
todo funcionário em relação às imposições do grupo dirigente. Essa suposição da
cultura ideal chega a ser classificada por Oliveira como performativa.
Fato é que tanto a cultura real quanto a ideal são, em grande parte, formadas
a partir do grupo dirigente. A ideal o é por motivos óbvios, afinal o grupo dirigente é
que estabelece a cultura supostamente perfeita para os demais componentes da
organização. São eles que criam os comunicados, as novas premissas, os
concursos e os “cafés da manhã com o diretor”. Já a cultura real é por eles
influenciada porque, uma vez detentores do poder, passam a ser observados e
respeitados, mesmo que seja um respeito baseado no medo de superiores.
Um pensamento equivocado pode levar o pesquisador a concluir que, uma
vez representantes tanto da cultura real quanto da ideal, os dirigentes são uma fonte
suficiente de pesquisa organizacional. Assim, um profissional interessado em
reconhecer a cultura organizacional faria entrevistas com alguns dos dirigentes e se
daria por satisfeito... Porém, isso não está correto. A cultura real presente nos
grupos heterogêneos que não incluem o grupo dirigente é extremamente
significativa para que se compreenda o funcionamento da instituição. E ainda, na
maior parte das vezes, o grupo dirigente não toma conhecimento dessa cultura real.
25
Ou por esta não estar ao seu alcance – afinal seria difícil um funcionário dizer o que
realmente pensa para seu superior, sabendo que corre o risco de ser despedido a
qualquer momento – ou porque simplesmente não lhes interessa ver o que se passa
na realidade da empresa.
26
2. A FUNÇÃO DO PROFISSIONAL DE RELAÇÕES PÚBLICAS
Nesse ponto do trabalho já apresentamos uma breve análise sobre cultura,
contextualizando-a em relação à linguagem e à atividade social como um todo.
Verificou-se como esses três elementos estão intrinsicamente ligados e são, em si,
parte do contexto de interação entre Homem e mundo, não podendo ser separados
da práxis social. Além disso, mostramos que a denominada cultura organizacional
pode ser entendida como um micro universo correspondente a uma cultura e uma
linguagem específicas, parte de um todo maior, compondo em si uma unidade
passível de ser tomada como objeto de estudo.
Pode-se concluir a partir disso que a importância da cultura organizacional
para a organização é de grande relevância, uma vez que está não só relacionada
como é em si parte dos processos e atividades realizadas dentro da organização.
Por sua vez, a gestão da comunicação está intimamente relacionada à cultura
organizacional, uma vez que atua no contexto da mesma. Em outras palavras, o
profissional de Relações Públicas, ao assumir a função de gestor de comunicação,
se propõe não só a analisar a compreender a cultura organizacional específica de
um ambiente de trabalho, como modificá-la, transformando-a através de sua
atividade como profissional.
Portanto, gerir a comunicação é, entre outras coisas, gerir a produção de
significados dentro de um contexto, o que é nada menos que participar ativamente
na construção da realidade específica.
2.1 Questionamento por uma nova consciência em Relações Públicas
A pergunta que surge aqui é: qual a intenção de um relações públicas ao gerir
a comunicação de uma organização? Que função social tem não só o direito, como
o dever de assumir no âmbito social e de trabalho? A que demanda se propõe a
atender? A que interesses?
Se procurarmos pela definição de relações públicas encontraremos uma série
de especificações a cerca do que cabe a essa profissão. Mas de modo geral, define-
27
se que se trata do esforço pela compreensão mútua da organização e seus públicos
no processo de comunicação entre os mesmos.
No site da Associação Brasileira de Relações Públicas está a seguinte definição:
“Entende-se por Relações Públicas o esforço deliberado, planificado, coeso e contínuo da Alta
Administração para estabelecer e manter uma compreensão mútua entre uma organização
pública ou privada e seu pessoal, assim como entre essa organização e todos os grupos aos
6
quais está ligada direta ou indiretamente” .
A partir de “estabelecer e manter uma compreensão mútua” entendemos que a
função do profissional de Relações Públicas seja facilitar o entendimento entre as
partes de uma organização. Em outras palavras, as Relações Públicas trabalham
para que se alcance a harmonia social.
Porém, o que se tem por harmonia social no contexto capitalista em que nos
encontramos? Afinal é irrefutável o argumento de que o modo que vigora hoje
apresenta uma desigualdade extrema entre setores da sociedade. Sendo assim, que
tipo de harmonia social objetiva as Relações Públicas? A genuína, na qual todos os
setores da empresa, ou da sociedade, têm seu trabalho reconhecido e
recompensado – tanto em forma financeira quanto social – ou a mantenedora do
modo de vida capitalista, quando o objetivo é provocar o conformismo e a sensação
de ser valorizado por parte dos públicos explorados, a fim de manter a “harmonia
social” em uma sociedade que de harmônica não tem muito?
Abre-se um leque de possibilidades de atuação a partir dessa pergunta, as
quais são inúmeras. Afinal, alcançar a harmonia social é o objetivo final, mas o
caminho pelo qual fazê-lo pode ser construído de diversas formas.
Nesse trabalho definimos dois desses caminhos para fins didáticos, com a
intenção de exemplificar duas distintas posturas que pode assumir o Relações
6
Definição de Relações Públicas. Disponível em:
http://abrpsp.wordpress.com/about/definicao-rp/ Consultado em: 5/10/2011
28
Públicas. Tais posturas nos servem aqui de estereótipos, facilitando o entendimento
da análise proposta nesse trabalho.
Porém, mais tarde pode-se concluir que essas duas posturas não são
excludentes e sim complementares; que ambos os estereótipos apresentados se
relacionam dialeticamente, sendo componentes de um caminho do meio. Eles
podem ser abordadas sob a analogia de uma ponte que os conecta (MONTE,2009)
e permite que a atuação do profissional de Relações Públicas se equilibre entre as
demandas do mundo de hoje, dando espaço para que o novo se manifeste e seja
compreendido no mundo da gestão da comunicação7.
2.1.1 Dois caminhos que servem de estereótipos na atuação do Relações
Públicas
Os dois caminhos que nos servem aqui de estereótipos são: 1- gerir a
comunicação organizacional com a intensão de dar participação e igualdade de
direitos à informação por parte de todos os públicos da organização e fazer do
contexto do trabalho um espaço de desenvolvimento e educação ou 2- fazer uso da
comunicação para persuadir públicos específicos a fim de manter a ordem entre
explorados e exploradores, criando um clima de boa vontade e alienação dentro da
empresa.
Para a viabilização da primeira opção é necessária uma mudança nos
interesses a partir do diálogo entre as partes, para que todos – gerência,
trabalhadores, entre outros - sejam atendidos da melhor maneira possível. Já a
segunda exige práticas de persuasão que levem ao conformismo de alguns, quando
os que detêm o poder trabalham para que aqueles que são prejudicados não se
dêem conta de sua situação e aceitem as ações do grupo dirigente sem questionar
qualquer coisa a respeito.
Aqui está a perigosa possibilidade de fazer uso da gestão da comunicação
com a intenção de controlar a subjetividade dos públicos organizacionais, o que é
7
A proposta de conceptualização do novo é melhor abordada no decorrer do
trabalho, principalmente no item 3.2 A presença do novo na prática do
Relações Públicas
29
manipulação da subjetividade. Isso se dá quando o objetivo da gerência é único e
exclusivamente acelerar o processo produtivo aumentando a produção de maisvalia, onde relações públicas se faz uma função mantenedora e intensificadora do
modo de vida capitalista. A essa definição da profissão chamamos nesse presente
trabalho de função ideológica.
Mas se a intenção do profissional é de gerir os processos comunicativos com
a intenção de criar um espaço educativo no ambiente de trabalho, onde todo e cada
um dos indivíduos que dela fazem parte sejam contemplados tendo poder de voz de
fato, a função de relações públicas se faz integradora. Afinal, através das relações
humanas o indivíduo se desenvolve social, espiritual e culturalmente. E por que não
fazer do ambiente de trabalho um espaço de desenvolvimento individual e de grupo?
Por que não facilitar a resolução de conflitos para que o potencial da organização
seja aproveitado, sem que esta estanque em função de obstáculos que, através da
gestão da comunicação, podem ser trabalhados e transpassados?
O cuidado com a gestão da comunicação permite que uma organização
aconteça de maneira mais fluída e consciente de seus processos e desafios
relacionados à interação entre os públicos e membros componentes de uma
empresa.
Mais uma vez vale ressaltar que esses dois caminhos, ou funções
denominadas nesse trabalho ideológica e integradora são complementares e estão
presentes em toda atividade de relações públicas em diferentes escalas. O recorte
desses dois estereótipos se faz com a intensão de facilitar a identificação desses na
atividade de gestão da comunicação, o que permite uma ampliação da consciência
em relação à atividade profissional de Relações Públicas.
2.1.2 Sobre a intenção do profissional de Relações Públicas
Sendo assim, faz-se claro o potencial que tem a gestão da comunicação
dentro de um contexto organizacional, uma vez que essa atividade está diretamente
relacionada à comunicação interna e externa, à cultura da organização e sua
identidade. Em outras palavras, aflora a consciência do poder assumido pelo
30
profissional que tem compreensão e capacidade de atuação nos processos
comunicacionais de uma organização.
Isso porque o profissional de Relações Públicas, uma vez capaz de entender
em parte o funcionamento da comunicação organizacional, identificar o uso e
características específicas da linguagem no contexto e levantar um diagnóstico
organizacional, entendendo um pouco das necessidades e desejos de cada um dos
públicos componentes da organização, tem um poder em relação a subjetividade
dos públicos internos e externos e, como em qualquer posição de poder, pode fazer
uso do mesmo com distintas intenções e objetivos.
Por isso se faz essencial a análise em relação à intenção do profissional. Com
que objetivo se assume essa posição, de analisar, compreender e atuar nos
processos de comunicação de uma organização? Qual o objetivo do profissional que
assume essa função? Entendê-la, somente? Ou atuar frente a ela, propondo ações?
Qual o objetivo dessas ações?
2.1.3 A consciência em relação ao potencial da comunicação na construção da
realidade
Talvez um dos pontos mais graves da questão seja a inconsciência por parte
dos comunicadores a respeito do poder e da relevância social que tem a
comunicação. Em função disso, verifica-se ainda hoje um alto grau de inocência
entre os profissionais e até o discurso de que a boa comunicação organizacional é
aquela realizada sem a interferência da subjetividade do comunicador, ou seja, uma
comunicação “chapa branca”. Isso sabemos que não acontece, pois qualquer
trabalho de comunicação tem na emissão da informação a primeira etapa do
processo. Em certo ponto da comunicação há produção de conteúdo por parte
daqueles que eram receptores num primeiro momento, mas se tornaram emissores
numa nova etapa do processo. Em outras palavras, é necessária a consciência de
que processos comunicacionais acontecem entre pessoas, e todas interagem com a
mesma a partir de tais processos.
Embora esse princípio não vigore no mundo do trabalho de forma geral, muito
se deve não às más intenções dos profissionais, mas à inconsciência dos mesmos.
31
Muitas das práticas de comunicação, ou relações públicas que são aqui
apresentadas como alienantes e persuasivas são realizadas pelos profissionais de
comunicação sem a consciência de que estes estão colaborando para a submissão
de uma classe social em relação à outra.
Em função disso se faz necessário o maior entendimento do público gestor de
comunicação em relação à mesma, para que esse assuma e faça uso consciente do
poder que lhe é conferido através do conhecimento, tendo o poder como meio, não
como fim na atuação dentro de organizações.
Esse público atuante na comunicação, aliás, não é tão específico quanto
muitos dos profissionais acreditam. Há aqueles cuja função é gerir a comunicação
organizacional, seguramente. Mas a comunicação de forma geral é produzida por
todo e qualquer indivíduo que interaja com mais pessoas, seja no contexto social ou
do trabalho. Em função disso, faz-se necessária a conscientização ou a educação
por parte da população em geral para que esta seja capacitada a interpretar as
informações que fluem no cotidiano da sociedade e ainda, seja capaz de interagir
com esse processo. Essa é uma das principais propostas da Educomunicação
(MONTE,2009), conceito melhor abordado no capítulo 2.
Os públicos, de forma geral, não devem se colocar como meros receptores
passivos daquilo que é veiculado pelos meios de comunicação. Para tanto, é
necessário que cada pessoa exercite sua atitude crítica, filtrando as informações
recebidas, questionando-as, fazendo um contraponto e buscando, na opinião
pública, uma opinião própria, particular, com a qual se identifique e na qual acredite.
Porém, o que normalmente ocorre é o oposto. A mídia costuma distorcer os dados e
passa a descrevê-los incompletos transformando-os em “verdadeiros espetáculos”,
como avalia Baccega(2009).
Nesse sentido entra o gestor de comunicação como um educador no contexto
organizacional, que tem a função de fazer com que a comunicação seja um caminho
para o desenvolvimento de indivíduos e de grupo dentro do contexto de trabalho
específico onde está atuando.
Afinal, o profissional de relações públicas que assume o papel de educomunicador,
assume a responsabilidade de educar e colaborar para que cada vez mais
32
indivíduos e mais públicos sejam incluídos, verdadeiramente, na produção de
conteúdo informacional.
2.2 Uma função ideológica
Quando uma empresa prioriza a produção de lucros e deixa de lado a função
social que tem, destaca-se o estereótipo denominado no presente trabalho de
função ideológica de Relações Públicas, a qual assume a função de pacificar uma
situação extremamente conflituosa no mundo do trabalho.
Como exemplifica Rebechi(2009), relações públicas podem servir única e
exclusivamente aos interesses da gerência:
“(!) a partir do momento em que o trabalho foi dividido entre aqueles que administram a
maneira de produzir e os que realizam o trabalho, a comunicação acaba tornando-se
representante daqueles que possuem mais força nesse processo, ou seja, dos controladores
dos modos de produção. Se antes a comunicação existia para possibilitar a ação conjunta
entre homens, agora é apropriada como instrumento político no embate de interesses entre
aqueles que possuem os meios de produção e entre aqueles que vendem a sua força de
8
trabalho, ou seja, entre organizações e trabalhadores.”
Nesse contexto a comunicação é utilizada com o objetivo de controlar a
subjetividade dos públicos cuja manifestação de interesses verdadeiros não
interessa à gerência, uma vez que isso afeta o perfil de organizações voltadas para
a produção de lucro através da exploração de trabalhadores”.
8
REBECHI, Claudia Nociolini. “Comunicação nas relacoes de trabalho: análise
crítica de vozes da comunicação organizacional no Brasil. 2009. 145 f.
Dissertação (Mestrado em Ciencias da Comunicacao) – Escola de
Comunicaçao e Artes, Univesidade de Sao Paulo, Sao Paulo, 2009, p.89
33
2.2.1 Controle da subjetividade
Nesse ponto volto ao conceito de cultura real e cultura ideal proposto por
Marco A. de Oliveira (2009) para associar o conformismo dos trabalhadores
almejado pelo grupo dirigente à cultura ideal criada pelos mesmos. Afinal, o que
mais desejaria um capitalista além de que os trabalhadores que explora se
deixassem explorar sem reclamações? Em outras palavras, faz parte da cultura ideal
de muitas empresas que não haja reivindicações trabalhistas de quaisquer gênero. E
é aí que entram os serviços de relações públicas quando os mesmos visam criar um
ambiente simulado de satisfação e reconhecimento.
Claro que essas práticas satisfazem necessidades reais de lazer dos
trabalhadores, mas o problema é a função de convencer e distrair o público
explorado. Vejamos o caso do famoso concurso de “funcionário do ano”. Quem é
ele? Um trabalhador cuja fotografia é pendurada na parede e sua descrição, seguida
de seu depoimento são publicados no jornal da empresa. Normalmente se trata do
funcionário que “tem garra” – leia-se trabalha além do horário de expediente – é bem
humorado – não causa problemas levantando causas trabalhistas – e tem
comprometimento com o trabalho – não falta em caso de doença.
Ou o café da manhã com o diretor, quando alguns funcionários são sorteados
(dependendo da dimensão da empresa) para tomar café da manhã com um
representante da direção. A intenção é demonstrar o quão humilde e acessível o
grupo dirigente é, mas na prática a coisa é bem diferente, porque no dia seguinte
esse homem estará o dia inteiro na sua sala e se algum operador de máquinas
tentar ter acesso ao mesmo, o fará sem sucesso.
Já os cursos oferecidos pela empresa são claramente embebidos na cultura
ideal da empresa. Muitos são técnicos e objetivam melhorar a capacitação de seus
funcionários, porém há os que moldam comportamentos. Em entrevista concedida à
autora do presente trabalho9, Gilberto Colorni, questionado sobre a atenção da Arcor
em manter seus funcionários atualizados, descreveu a promoção de módulos pela
9
entrevista realizada em 2009 como parte de Iniciação Científica realizada por
Ligia Ungaretti e utilizada aqui como referencia. A então pesquisa teve como
objeto de estudo o perfil do profissional responsável pelas políticas de
comunicação organizacional. Tanto a entrevista quanto o questionário estão na
íntegra em Anexos
34
empresa. “(...) a empresa está fazendo um trabalho muito interessante para educar,
treinar cada gestor. Tem os módulos, inclusive teve um anteontem (...) que era como
dar o feedback e desenvolver o personagem. Existem profissionais nisso, é uma
coisa que se ensina.” Mais tarde o entrevistado afirmou serem todos os gestores
obrigados a cursar esses módulos. Os temas das aulas dizem respeito a como lidar
com funcionários sem desagradá-los ou como despedir uma pessoa sem que ela se
sinta injustiçada. O problema aqui é a realidade do que acontece. Essa pessoa está
sendo injustiçada e merece uma explicação ou receber direitos que lhe estão sendo
negados? Se sim, optar pela alternativa de convencer esse ex-funcionário de que
está tudo bem e de que ele está sendo respeitado, tudo isso através de jogos de
comunicação, faz parte do caráter persuasivo e alienante dos serviços de Relações
Públicas.
Nesse sentido, pode-se dizer que “(...) as Relações Públicas têm por
finalidade fazer com que o interesse privado adquira uma roupagem de interesse
público.” (Peruzzo, 1986), uma vez que se procura criar uma atmosfera de
coletividade em um contexto extremamente individualista e exploratório.
Para isso, as Relações Públicas fazem uso de práticas como as já citadas,
sempre cuidando para trabalhar toda a informação passada a fim de alcançar o
conformismo almejado. Tudo isso permeado pela persuasão, cujo uso é feito de
forma extremamente sutil para que tenha efeito, porém sem ser percebida.
Alguns justificam o uso da persuasão como sendo um meio de iniciar o
diálogo, para então se iniciar o processo de participação de todos nos processos
comunicacionais, mas não é o que se verifica na prática. A persuasão permanece
nas informações que chegam aos públicos explorados, seja em forma de aula, de
jornal, de concurso ou de premiação. E assim os funcionários são convencidos de
que fazem parte da “grande família” que é a empresa, na qual todos são
colaboradores e participantes de todos os processos.
Proporcionar atividades de lazer e reconhecimento do funcionário são práticas
que sim, atendem uma demanda real do indivíduo. Porém para que de fato cumpram
essa função devem considerar verdadeiramente todos os públicos envolvidos nesse
processo como partes pensantes e com direitos a ter voz e reconhecimento real por
35
seu trabalho. Dessa forma sim, tais atividades podem ter seus méritos em relação
ao objetivo de oferecer lazer e reconhecimento, afinal
“O lazer satisfaz necessidades físicas e mentais do ser humano. (...)Tudo isso é importante, é
um ganho para o trabalhador. Porém, ao mesmo tempo em que essas manifestações inspiram
a respeitabilidade por parte da empresa a interesses e direitos do trabalhador, da forma como
são trabalhadas são também formas de submissão.”(Peruzzo, 1986).
Quando as Relações Públicas assumem a função de controlar a subjetividade
de determinados públicos, os resultados não só procuram dar caráter público a
interesses privados, como transformar o impulso ao trabalho normal, que é tanto a
remuneração quanto a atividade de realização do Homem como ser social
participante, em um impulso de prazer. Quando a motivação do trabalhador é ganhar
uma premiação ou jogar futebol na quadra da empresa depois do expediente, o
efeito final disso é um indivíduo que produz um montante de riquezas e não recebe
por seu trabalho o valor real correspondente a elas (o que leva à produção da maisvalia, que é a origem do capital acumulado pelos dirigentes). E para que essa maisvalia seja produzida pelo trabalhador sem que esse se sinta explorado, é necessário
criar um ambiente de boa-vontade e alienação.
2.3 Então, por que se faz a gestão da comunicação?
Nesse ponto vale resgatar o questionamento em relação à atuação do
relações públicas. Assim evidenciamos que mais importante do que as práticas em
si do profissional, faz-se necessário perguntar: por quê se faz a gestão da
comunicação?
Insistimos
nesse
ponto
porque
acreditamos
que,
de
fato,
é
do
aprofundamento nessa pergunta que surge uma nova função do Relações Públicas,
alinhada com a vontade de servir à sociedade e a si mesmo da melhor forma
possível enquanto profissional e indivíduo em interação com o mundo.
36
2.4 Função Integradora
“Se o que de fato se deseja é um mundo melhor, por que ignorar
o poder da Comunicação nessa construção?”
10
Uma vez consciente do potencial da gestão da comunicação em relação à
percepção da realidade e ligação entre as partes – indivíduos, públicos, máquinas,
recursos todos – de uma organização, abrem-se possibilidades de atuação que
visam nada menos do que a construção de um mundo melhor, onde cada indivíduo
seja reconhecido e tenha espaço para desenvolver-se e atender suas necessidades.
E porquê não fazer do espaço de trabalho um espaço para que tal desenvolvimento
ocorra?
Afinal é através do trabalho que o individuo se manifesta no mundo e produz
no mesmo, interagindo com a realidade e fazendo parte da construção da mesma.
“A atividade humana é essencial para o trabalho ou, melhor ainda, o trabalho é uma
atividade humana” (Claudia,2009, p. 73). É através do trabalho que acontece a troca
entre Homem e mundo, uma vez que um serve ao outro em forma de produção,
dinheiro, aprendizados, desenvolvimento e auto-realização.
Tal interação de troca pode acontecer de inúmeras formas, com diferentes
níveis de cuidado em relação a fatores como o humano, econômico, social,
ambiental, entre outros presente nas organizações. Porém o que se verifica em
grande parte do mundo do trabalho é um desequilíbrio entre alguns fatores citados,
resultando na frustração do trabalhador.
10
MONTE, Rita. “Educomunicação e Reputação organizacional: Pontes
possíveis na Gestão de Comunicação de uma Rede Social no Terceiro Setor”.
2009. Dissertacao (especialização em Gestão de Comunicação: Políticas,
Educação e Cultura) – Escola de Comunicaçao e Artes, Univesidade de Sao
Paulo, Sao Paulo, 2009, p.87
37
"Se por um lado levarmos em consideração que o trabalho faz parte da realização do ser
humano como ser social e leva o individuo a sentir-se parte da sociedade em que vive, por
outro lado, o trabalhador encontra-se numa dinâmica organizacional que tem lhe causado
muitos constrangimentos, sofrimento e pouca visibilidade verdadeira de apropriar-se do
trabalho que desenvolve. Ao trabalhador, no geral, há pouco espaço para efetivamente criar e
transformar o trabalho que realiza sem receber a interferência da empresa ou organização,
com o objetivo principal de direcioná-lo ao que somente interessa ao seu sistema produtivo, ou
seja, para a auto-reprodução do capital"
11
Segundo a autora, o trabalho deixou de representar o espaço de manifestação
do indivíduo no mundo para tornar-se uma obrigação cujo único fim é a renda,
muitas vezes suficiente para sobrevivência, nada mais.
Essa situação no mundo do trabalho pode representar o principal campo de
atuação do Relações Públicas gestor de comunicação, quando esse assume a
missão de dar voz a todos os públicos e mediar a construção de um espaço criativo
e de desenvolvimento no ambiente de trabalho.
Aqui entra em campo o profissional de Relações Públicas com a função
integradora de cuidar para que o espaço de trabalho seja um espaço que integre
todos esses fatores de forma equilibrada, servindo a cada uma das necessidades
individuais e organizacionais presentes no mundo do trabalho. Para isso, faz-se
necessária uma nova postura profissional, a qual passa a considerar não só a
produção de lucro, mas o individuo trabalhador de forma holística e integrado à teia
de relações no ambiente de trabalho, afinal “(...)é nessa teia que, por meio do
discurso e da ação, interconectados uns com os outros, os indivíduos devem poder
revelar sua identidade e construir sua história de vida. Trata-se de um contexto no
qual a comunicação nas organizações tem uma importante missão a cumprir”12
11
REBECHI, Claudia Nociolini. “Comunicação nas relacoes de trabalho:
análise crítica de vozes da comunicação organizacional no Brasil. 2009. 145 f.
Dissertação (Mestrado em Ciencias da Comunicacao) – Escola de
Comunicaçao e Artes, Univesidade de Sao Paulo, Sao Paulo, 2009. p.71.
12
KUNSH, Margarida. “A Comunicação como fator de humanização das
organizações”. 1 ed. São Caetano do Sul. São Paulo: Difusão Editoria, 2010.
p.57
38
2.4.1 Uma Nova Era
Assumir a missão à qual se refere Kunsh pode ser uma tarefa cheia de
incertezas, pois a verdade é que há pouco se começou a falar sobre o tema, e
pouco foi escrito a respeito. Há teorias que abordam o assunto (crítica, integralista,
entre outras) e muito se pode aprender das mesmas, porém o Relações Públicas
que assume a função integradora deve estar disposto a caminhar em um terreno
desconhecido, deve ter abertura para o novo, o inédito. Aquilo para o qual não há
parâmetros, tampouco referências no passado.
“No contexto de humanização das organizações, não vejamos as teorias como pontos finais,
como afirmações conclusivas ou respostas definitivas. É preciso considera-las loci de descanso
temporário que oferecem oportunidades de pensar e agir de certas formas, que irão, em troca,
dar lugar a outros vocabulários e outras possibilidades.
A certeza leva ao encerramento de uma questão. A dúvida e o pensamento provisório
13
conduzem à abertura e a novas possibilidades para o engajamento com os outros.”
Trata-se de uma nova era (Kunsh, 2010), uma nova forma de trabalhar, de
gerir, de construir coletivamente considerando fatores que até então não eram
considerados.
2.4.2 O que nasce do novo
Para compreender o novo no contexto organizacional o profissional de
Relações Públicas pode colocar-se disposto a perceber o que não conhece. Isso
pode ser entendido como propor-se a desconsiderar todo conhecimento apreendido
para então abrir espaço para que algo novo se manifeste. Esse é o processo de
13
MUNBY, Dennis K. “Reflexoes críticas sobre comunicação e humanização
nas organizações. In KUNSH, Margarida. “A Comunicação como fator de
humanização das organizações”. 1 ed. São Caetano do Sul. São Paulo:
Difusão Editoria, 2010, p.37
39
percepção da realidade que propõe a fenomenologia14, onde é necessário partir do
zero, permitindo-se conceber o geral da organização como uma massa caótica, para
só então entrar em contato com a essência do contexto e fazer os recortes que
darão origem aos signos que compõem a configuração organizacional.
Isso significa deixar para trás por um momento todo e qualquer recorte da
realidade aprendido até então, para poder rever a forma mais adequada de
compreender tal realidade. Aí sim, os recortes que melhor servem para a
compreensão do que é o contexto organizacional na realidade se apresentarão e
poderemos definir novas denominações, dando origem a novos signos que
complementam
a
linguagem
correspondente
ao
mundo
da
comunicação
organizacional.
Essa proposta é difícil de se por em prática, uma vez que nossa realidade
está profundamente embasada na linguagem aprendida (ver recortes da realidade),
porém não invalida as descobertas que podem surgir a partir da proposta do “olhar
zerado” do comunicador em relação ao contexto organizacional. Há que praticar,
sempre exercitando o olhar fenomenológico para que o novo se apresente.
2.4.3 O surgimento de uma nova linguagem
Aos poucos o novo é percebido e nominado, passando a corresponder a
novos signos. Alguns destes signos podem corresponder a idéias já existentes, mas
outros serão inéditos, e a definição destes é extremamente importante para que o
pensamento relacionado ao entendimento do contexto organizacional se estruture
adequadamente.
Esse processo requer uma lapidação de linguagem que não se
alcança rapidamente. Mas há que começar de alguma forma... Iniciam-se as
pesquisas a respeito e logo surge uma nova linguagem, específica da prática de
reconhecimento do contexto organizacional.
14
Corrente filosófica que propõe a percepção de fenômenos sem subjetividade
do observador, num processo que busca o conhecimento da essência do
fenômeno através da apropriação da essência do mesmo a partir da
observação e abertura entre partes que analisam e são analisadas. Para mais
ver PONTY, 1999
40
Essa linguagem passa a ser usada, e logo novos termos surgem e outros,
que existiam desde a primeira fase da pesquisa, sofrem alterações. O processo de
semiose do signo se repete inúmeras vezes(GINZBURG,1991) e a linguagem pode
ser transformada, sempre em vias de alcançar uma representação mais próxima do
que seria nossa realidade. Porém esse processo não é linear, o que significa que a
mudança de um signo não implicará, necessariamente, na aproximação da
representação deste com a realidade.
Toda essa procura visa tornar mais complexa e adequada a interação na
realidade que vivemos, e no caso visa desenvolver a capacidade do gestor
comunicacional de compreender a rede de comunicação que permeia um grupo
específico para então analisá-la, fazer um possível diagnóstico de problema e ainda,
ser capaz de contribuir para que esse impasse seja superado. Para tudo isso, é
importante que nos permitamos descobrir esse “novo”, originando uma linguagem
para o mesmo, afinal, “(...) a linguagem é a representação projetiva da
realidade(...)”(Wittgenstein, 2004).
Quando considerada a linguagem específica do contexto de organização, há
referência ao conceito de “jogos de linguagem” fornecido por Wittgenstein. Segundo
este, cada linguagem assume uma determinada forma em função do que está ao
seu redor, das regras e códigos vigentes no campo semântico em que está inserida.
É como uma brincadeira de criança, que tem normas e pressupostos exclusivos que
permitem uma determinada compreensão do comportamento dos jogadores. E é
exatamente com esse tipo de experiência empírica na infância que o indivíduo
adquire a capacidade de reconhecer as regras dos jogos de linguagem.
A partir dessa idéia faz-se uma analogia entre o ambiente de trabalho e a
brincadeira de criança, uma vez que em ambas as situações há a reunião de várias
pessoas em torno de um mesmo objetivo e o respeito implícito a uma série de
códigos. Em outras palavras, cada linguagem respeita seu jogo, e dificilmente pode
ser dissociada deste sem alterações.
41
2.4.5 A importância de rever a prática do profissional de comunicação
Há o risco de se perder no caminho durante essa pesquisa, pois muitas vezes
o processo assume significados que não servem ao contexto, mas são de
entendimento comum dos que fazem uso dessa. É o que ocorre com algumas
teorias e métodos tidos como eficientes na profissão do gestor de comunicação.
Existem métodos cuja teoria não foi desenvolvida no contexto atual e local do
trabalho desse profissional, mas como há um consenso de que esses métodos
funcionam, os manuais mantém seus registros e instruções na direção dos mesmos.
Por isso cabe ao Relações Públicas questionar constantemente a eficiência
de seus embasamentos teóricos e métodos, visto o momento de construção de uma
nova maneira de trabalhar a comunicação. É importante que os processos se
constituam com base nesse questionamento e não se cristalizem antes de que o
novo presente nesse contexto de trabalho seja adequadamente explorado.
Claro que esse processo é continuo e não terá um fim marcado onde se
poderá conceber um entendimento final da realidade do mundo do trabalho. Trata-se
de um caminho circular de ir-e-vir através do qual o indivíduo apreende e constrói na
realidade do mundo do trabalho. O que reforçamos aqui é a proposta de que o
Relações Públicas cuide do fator inovação nas suas práticas, visto
o momento
particular por que atravessa suas profissão.
2.4.6 Uma nova forma de atuar como Relações Públicas gestor de
comunicação
Se há um novo contexto de trabalho no mundo da gestão da comunicação,
surge também uma nova proposta de atuação do Relações Públicas dentro desse
contexto. Como é essa nova forma de atuar? A que atenta esse profissional?
Uma
das
bases
para
o
entendimento
dessa
nova
função
é
a
Educomunicação, já citada no início desse trabalho e abordada com maior
profundidade nesse capítulo.
Segundo a Educomunicação, a comunicação e a educação podem ser
integradas e, quando aplicadas à cultura organizacional e a comunicação existente
42
na mesma, resultam em práticas alinhadas com a função integradora de Relações
Públicas.
Rita Monte(2009) faz uma análise da Educomunicação aplicada à gestão da
comunicação, propondo não só uma integração entre esses campos como
evidenciando que um contém o outro.
A partir de seu trabalho, a função integradora do Relações Públicas ganha
traços e sua prática se enche de otimismo, uma vez que se visualiza o potencial da
comunicação para a construção de um mundo melhor e pleno de sentido
(MONTE,2009).
No mesmo trabalho há a seguinte citação ao Prof. Dr. Ismar de Soares quando
esse oferece uma definição acerca de Educomunicação:
“O conjunto das ações de caráter multidisciplinar voltadas ao planejamento e implementação
de práticas destinadas a criar e desenvolver “ecossistemas comunicativos” abertos e criativos
nos distintos espaços educativos – dos não formais aos formais –, de forma a garantir
condições de expressão a todos os membros das comunidades educativas, envolvendo, em
igualdade de condições, gestores, comunicadores, ensinantes, receptores e educandos. Ou
seja, a comunicação – promovida a partir da perspectiva da dialogicidade – colocando-se como
missão romper fundamentalmente o conceito de verticalidade de relações, possibilitando e
ampliando o uso da palavra.”
15
15
SOARES, I.O. Teorias da Comunicação e Filosofia da Educação:
fundamentos epistemológicos da educomunicação. Texto apresentado ao
Concurso de Professor Titular da USP, em 05 de novembro de 2009. In
MONTE, Rita. “Educomunicação e Reputação organizacional: Pontes possíveis
na Gestão de Comunicação de uma Rede Social no Terceiro Setor”. 2009.
Dissertacao (especialização em Gestão de Comunicação: Políticas, Educação
e Cultura) – Escola de Comunicaçao e Artes, Univesidade de Sao Paulo, Sao
Paulo, 2009, p.22
43
Assim, visualiza-se o papel do gestor de comunicação cuja ação se pauta na
Educomunicação, uma vez que
“O trabalho de observar, articular e propor processos complexos de comunicação que
envolvem subjetividades, objetividades, seres humanos, organizações, em relação uns com
16
outros é exatamente do que a gestão de comunicação se ocupa” .
Além disso,
“É pela gestão – planejamento, vontade, execução, emoção, avaliação, aprendizagem –,
orientada pelos princípios fundantes da Educomunicação (participação, diálogo, igualdade,
autonomia, cidadania, solidariedade), que se pode criar ecossistemas comunicativos
17
efetivamente voltados para a “construção de indivíduos e comunidades” .
É exatamente esse o papel do gestor de comunicação: o de mediar a
construção de espaços criativos onde cada individuo tenha espaço para manifestarse e desenvolver-se enquanto ser participante da realidade. Esse pode ser o filtro do
Relações Públicas ao perceber o potencial da cultura organizacional, uma vez que
trata-se de um campo fértil, que oferece oportunidades incríveis de vivências e
aprendizados para os membros que a compõem.
16
MONTE, Rita. “Educomunicação e Reputação organizacional: Pontes
possíveis na Gestão de Comunicação de uma Rede Social no Terceiro Setor”.
2009. Dissertacao (especialização em Gestão de Comunicação: Políticas,
Educação e Cultura) – Escola de Comunicaçao e Artes, Univesidade de Sao
Paulo, Sao Paulo, 2009, p.54
17
MONTE, Rita. “Educomunicação e Reputação organizacional: Pontes
possíveis na Gestão de Comunicação de uma Rede Social no Terceiro Setor”.
2009. Dissertacao (especialização em Gestão de Comunicação: Políticas,
Educação e Cultura) – Escola de Comunicaçao e Artes, Univesidade de Sao
Paulo, Sao Paulo, 2009, p.51
44
Uma vez percebida essa fertilidade no ambiente de trabalho, resta ao Relações
Públicas capacitar-se para mediar a construção de sentido nesse contexto, fazendo
com que a realidade aí constituída permita a auto-realização dos participantes na
mesma.
“Nesse panorama, o projeto de mundo que a Educomunicação sustenta – autonomia,
cidadania e solidariedade, por meio de leitura crítica dos meios; mediação tecnológica;
expressão comunicativa através das artes; gestão de comunicação em espaços educativos e
reflexão epistemológica – se encaixa sincronicamente nas demandas da era atual e, não só
isso, oferece um norte ético para fundar práticas comunicativas e educativas de fato
18
comprometidas com o desenvolvimento humano e socioambiental” .
Ao propor “práticas comunicativas e educativas de fato comprometidas com o
desenvolvimento humano e socioambiental”, Rita Monte refere-se ao que denomina
aproximação de discurso e prática.
“Legitimidade e reputação, no entanto, estão longe de serem construídas apenas com discurso.
E, em se tratando de “transformações sociais”, o que se espera de organizações e movimentos
sociais é a ação transformadora, o exemplo. De modo que o passo-a-passo do gestor de
comunicação (!) possa ganhar mais consistência e poder na medida em que as ações de
comunicação planejadas, por si mesmas, pratiquem a missão organizacional e aproximem o
discurso e a prática organizacionais em qualquer ação de comunicação. Realizar a missão da
organização e sua causa em ações de comunicação aumenta dramaticamente a amplitude da
causa, porque faz com que ela seja experimentada em maior escala por qualquer pessoa que
participe da relação de comunicação. Isto é possível? Sim. E um dos modos de fazer é pela
19
Educomunicação” .
18
MONTE, Rita. “Educomunicação e Reputação organizacional: Pontes
possíveis na Gestão de Comunicação de uma Rede Social no Terceiro Setor”.
2009. Dissertacao (especialização em Gestão de Comunicação: Políticas,
Educação e Cultura) – Escola de Comunicaçao e Artes, Univesidade de Sao
Paulo, Sao Paulo, 2009, p.60.
19
Ibden, p.136
45
Segundo a autora, cada vez um maior número de empresas se dá conta de
que o consumidor já é capaz de colocar-se crítico frente à imagem organizacional,
combinando diversas fontes de informação e formando, assim, uma imagem
organizacional que já não é dependente do discurso da organização na mesma
escala que era no passado. O público agora é formado por “leitores emancipados de
fontes únicas de narrativas”20, o que faz da postura de aproximar o discurso e a
prática organizacionais não só o caminho mais embasado para que uma empresa
zele por sua imagem, como a forma mais respeitosa e genuína de apresentar-se à
sociedade, uma vez que o discurso de imagem verdadeiro é correspondente ao que
a organização realiza, e não ao que gostaria de realizar ou acredita que seus
consumidores esperam da mesma (MONTE, 2009).
2.4.7 O fazer político em Relações Públicas
É de responsabilidade do Relações Públicas selecionar as informações e
adequá-las a meios específicos, o que dará origem a uma determinada narrativa
dentro da empresa. Tal seleção se dá a partir da já abordada intenção desse
profissional e é de enorme importância, uma vez que essa narrativa resulta em
construção de sentido e formação de realidade específica dentro do contexto
organizacional. O Prof. Dr. Paulo Nassar, ao referir-se ao educomunicador e seu
papel de mediar a comunicação, afirma:
“Escolher o que narrar é um dos maiores desafios para os educadores e comunicadores
contemporâneos. Na atualidade, narrar é um ato radicalmente político, já que as palavras e as
imagens em fluxo são organizadoras ou desorganizadoras de cidades, comunidades, grupos,
empresas e indivíduos.(!) Nas empresas, um dos aspectos do desafio é entender que a
narrativa é uma construção que ganha significado no plano da memória coletiva, transcende a
técnica, racionalidade, tempos, controles e temas da administração”.(grifo nosso)
21
20
NASSAR, Paulo. “O que narrar?” Disponível em:
http://www.aberje.com.br/acervo_colunas_ver.asp?ID_COLUNA=593&ID_COL
UNISTA=28 Consultado em: 28/8/2011
21
NASSAR, Paulo. “O que narrar?” Disponível em:
http://www.aberje.com.br/acervo_colunas_ver.asp?ID_COLUNA=593&ID_COL
UNISTA=28 Consultado em: 28/8/2011
46
Entender o ato de narrar como algo político evidencia, mais uma vez, o poder
assumido pelo profissional de gestão da comunicação, que realiza a mediação da
construção de sentido a partir da relação social entre partes de um todo, sejam
essas pessoas, organizações, cidades ou máquinas. E assim como se espera de um
político que atue em prol do bem geral, espera-se do Relações Públicas que suas
políticas de comunicação organizacional sejam voltadas para atender o interesse de
todos os públicos da organização.
Nesse sentido,
“O trabalho do gestor de comunicação assemelha-se ao de um tecelão. É seu ofício observar
significados e tramá-los em processos de comunicação de acordo com os desenhos que se
deseja. Os processos de comunicação, por sua vez, necessariamente se fazem em interação,
com o “outro”, na relação. Tais processos são compostos por elementos de alta intangibilidade,
o que demanda do gestor sensibilidade e perspicácia para observá-los, apreendê-los e articulá22
los em tramas plenas de sentido.”
O “outro” assume então um papel importante, sendo na interação com esse
que tudo o que acontece na organização se constrói. No espaço de trabalho
acontecem encontros desse gênero entre indivíduos que não interagiriam por outro
motivo senão um objetivo profissional em comum, que os leva ao envolvimento num
processo de comunicação e construção colaborativa de algo. Esse encontro entre
“outros” na comunidade que é o ambiente de trabalho é veículo para aprendizados,
tendo um valor enorme cujo cuidado merece atenção do Relações Públicas.
Cuidado merecido não só por ser espaço de desenvolvimento humano, mas
também por ser fator importante para o bom funcionamento de uma empresa, afinal
22
MONTE, Rita. “Educomunicação e Reputação organizacional: Pontes
possíveis na Gestão de Comunicação de uma Rede Social no Terceiro Setor”.
2009. Dissertacao (especialização em Gestão de Comunicação: Políticas,
Educação e Cultura) – Escola de Comunicaçao e Artes, Univesidade de Sao
Paulo, Sao Paulo, 2009. P.136.
47
“(!) muitas – se não todas – as coisas que nós, humanos, fazemos no trabalho, são realizadas
colaborativamente. Uma conseqüência disso é que a unidade da comunidade de pessoas que
23
trabalham juntas se torna um importante pré-requisito para o sucesso” .
2.4.8 Uma pequena revolução – integração de partes
Até agora, o que denominamos função ideológica e função integradora foram,
até certo ponto, apresentadas em diferentes itens. Porém, como já dito
anteriormente, tal separação se deu por fins didáticos, uma vez que a construção de
tais estereótipos pode facilitar o entendimento da análise proposta. Mas entende-se
que ao final, ambas as funções não são opostas, mas sim complementares. Ou seja,
a função integradora abarca a função ideológica, isso porque o profissional de
Relações Públicas atua num contexto específico de trabalho e, portanto, não faz
sentido assumir práticas que o impeçam de trabalhar. Por mais que se visualize um
mundo ideal, há que reconhecer a realidade presente e propor-se a mudá-la em
pequenos passos. Caso contrário, o próprio sistema expele o profissional que não
consegue se adaptar, e esse deixa de ter qualquer atuação na construção do mundo
através do trabalho.
Trata-se de propor uma pequena revolução, consciente, que sabe das
necessidades de atender às demandas do mundo corporativo e, ao mesmo tempo,
atende às novas demanda que se apresentam na sociedade atual. Afinal há que
considerar que o universo organizacional, muitas vezes, ainda visa único e
exclusivamente o lucro. Porém a sociedade, o consumidor e o trabalhador têm
novas necessidades, como reconhecimento, espaço de manifestação e crescimento,
melhor distribuição de riquezas, voz para todos os públicos e responsabilidade
socioambiental verdadeira por parte da organização.
Para atender essas demandas, o profissional tem um papel de “regente”,
manejando cada um dos elementos presentes numa arte de manter a música
23
VILAÇA, Wilma Pereira. “Comunicação organizacional: um olhar brasileiro
sobre o pensamento da Escola de
Montreal” Disponível em:
http://www.alaic.net/alaic30/ponencias/cartas/com_org_yRP/ponencias/GT2_17
wilma.pdf Consultado em: 4/10/2011
48
tocando e se desenvolvendo numa harmonia possível para o todo organizacional.
Em outras palavras, não faz sentido assumir uma postura radical em relação à
comunicação organizacional, qualquer que seja o radicalismo, porque isso impediria
a prática do trabalho em muitos contextos do mundo de hoje, além de não atender a
todas as necessidades do indivíduo.
Faz-se viável a atuação através do equilíbrio, da constante reflexão e
questionamento a respeito da prática de gestão da comunicação e da proposta de
mudar num ritmo saudável.
“São pontes delicadas, instáveis – a imagem de uma “ponte pênsil” é perfeita para esta
reflexão: uma ponte suspensa, cujo equilíbrio é dinâmico, cujo centro se desloca ora para um
lado, ora para o outro e, por isso mesmo, exige atenção e cuidado para cruzá-la. No entanto, a
ponte existe, e cumpre seu papel de não só ligar pontos polares, mas possibilitar caminhos
24
entre eles” .
Esse caminhar entre pontos polares traça características do mundo em que
vivemos e, em menor âmbito, define a forma de relação entre pessoas no trabalho,
que é um campo extremamente significativo no que diz respeito à formação da
identidade e interação Homem/mundo.
Afinal, pessoas se encontram em função do trabalho a partir de um objetivo,
mas a partir disso uma série de transformações acontecem em cada uma das partes
envolvidas.
“É fato que as interações humanas possuem sempre um objeto social ou material, como
também o é a premissa de que assim como os sujeitos agem sobre o mundo objetivo, este
mundo objetivo também age sobre os sujeitos. O ambiente seria, então, resultado e condição
dessas interações. Ao lidar com o complexo meio-ambiente em que vivem, as organizações
humanas fazem funcionar a contribuição de muitas pessoas ligadas a uma parte do mundo de
25
maneira especial” .
24
MONTE, Rita. “Educomunicação e Reputação organizacional: Pontes
possíveis na Gestão de Comunicação de uma Rede Social no Terceiro Setor”.
2009. Dissertacao (especialização em Gestão de Comunicação: Políticas,
Educação e Cultura) – Escola de Comunicaçao e Artes, Univesidade de Sao
Paulo, Sao Paulo, 2009. P.86
25
VILAÇA, Wilma Pereira. “Comunicação organizacional: um olhar brasileiro
sobre o pensamento da Escola de Montreal” Disponível em:
http://www.alaic.net/alaic30/ponencias/cartas/com_org_yRP/ponencias/GT2_17
wilma.pdf Consultado em: 4/10/2011
49
3. SOBRE PROCESSOS DE TRABALHO
3.1 Reflexão epistemológica
Apresentam-se aqui algumas reflexões e análises a respeito da prática do
profissional de Relações Públicas. Esse conteúdo foi elaborado a partir de leituras,
entrevistas e orientações recebidas até o presente momento, porém não há um
montante de informações suficiente para fechar uma análise a cerca de processos
de trabalho desse profissional.
Essa consciência a respeito do conhecimento por ser adquirido é animadora e
impulsiona para novos estudos. Por isso se elegeu registrar o que já foi analisado,
mesmo com a lacuna a ser preenchida em relação às práticas de trabalho.
Portanto, há que considerar que o que é apresentado aqui é o momento de
um estudo em andamento.
3.2 A presença do novo na prática do Relações Públicas
Todo indivíduo se depara, cotidianamente, com situações inéditas na
sua vida. Seja um grupo de desconhecidos, um livro recém começado, um mal
estar no corpo ou uma comida exótica, esse indivíduo se vê perante o desafio
de reconhecer o novo e entendê-lo da melhor forma possível, possibilitando
assim um diálogo entre si, enquanto ser humano, e o contexto no qual se está
inserido.
Para isso bastaria que o indivíduo desse “uma geral” na situação para
que a interação entre ambos ocorresse com qualidade, porém essa suposição
parte de dois pressupostos: o primeiro é de que o indivíduo possua todo
conhecimento a respeito de determinado tipo de situação. O segundo, de que o
sujeito tenha livre acesso a toda informação contida no contexto.
Tanto um quanto outro são inválidos para a maioria dos casos. Afinal,
não há como negar que cada interação é diferente de todas as outras; a
possibilidade do sujeito viver duas vezes momentos idênticos é muito pequena,
para não dizer nula. E cai por terra o primeiro pressuposto, dando espaço para
a definição de que a partir de agora, o mundo cotidiano e científico deve ser
50
considerado a partir do ponto zero, pois o que se apresenta é o novo, sempre.
Isso não significa que devemos esquecer todo o conhecimento já produzido e
perder base para qualquer análise, mas que criemos novas teorias
desvinculadas do paradigma até então vigente. Paradigma esse que foi
adequado para a atuação prática/teórica do indivíduo até pouco tempo atrás,
mas que se torna ultrapassado no mundo de hoje(Kunsch2010), não só
deixando de acompanhar o desenvolvimento humano como limitando este.
Se um paradigma se torna obsoleto, é fácil deduzir que um outro surja
para substituí-lo. Porém antes de abordar esse ponto há que invalidar o
segundo pressuposto, no que não há muita dificuldade, pois para provar que
nem toda informação é de fácil acesso basta um exemplo simples que serve de
analogia para toda situação relacional indivíduo/mundo: um bolo que assa no
forno começa a soltar um aroma específico depois de certo tempo, o que é
entendido pelo cozinheiro como sinal de que a hora de retirá-lo do calor está se
aproximando. Quem fez o bolo não pode provar um pedaço nesse momento
para certificar-se de que o doce está quase pronto, pois queimaria a boca e
desandaria a massa. Tampouco precisou vê-la ou checar o relógio para chegar
a essa conclusão. Bastou um detalhe do contexto, o cheiro, para que o todo
fosse relativamente compreendido. Não satisfeito com o seu entendimento a
respeito do que está acontecendo no fogão, o cozinheiro abre o forno e espeta
o bolo com um palito de dente, verificando que este sai melado de massa crua.
A conclusão de que mais partes do bolo estão por assar não requer que o bolo
todo seja espetado, sendo um ponto suficiente para que o forno permaneça
aceso.
A partir desse exemplo pode-se fazer a prometida introdução do novo
paradigma, segundo o qual o entendimento do novo se faz com base em
evidências, detalhes, coragem para enfrentar o desconhecido e confiança na
capacidade de percepção do contexto. Tudo isso sem menosprezar a
importância da base teórica para produzir conhecimento, a qual pode ter
origem teórica ou empírica.
Voltando à metáfora do bolo: assim como o cozinheiro fez uso do seu
conhecimento culinário para reconhecer o todo nas partes, o gestor
51
comunicacional deve ser capaz de deduzir características de um grupo
específico com base na experiência e teoria adquiridas anteriormente. Esse
profissional passa a ser um detetive dentro da empresa, a procura de pistas e
com a missão de traçar o perfil do problema que impede o fluxo ideal de
informação.
Essa inovação se aplica à comunicação no que diz respeito ao mundo
organizacional do trabalho. O desenvolvimento de técnicas comunicacionais
que se praticam nesse campo deve mudar, ou melhor, multiplicar suas
direções, pois determinados procedimentos vigentes até hoje já não
correspondem à realidade, embora continuem a constar no “manual do
comunicador”.
Porém há profissionais que já aplicam características do novo
paradigma às suas práticas profissionais, como é o caso da Prof. Dra. Maria
Schuler, a qual cedeu uma entrevista 26 a respeito de sua atuação como
publicitária, relações públicas e comunicadora organizacional. A conversa
revelou relação direta de seu trabalho com teorias que embasam essa nova
forma de lidar com o conhecimento.
E é esse trabalho que nos interessa; o de analisar uma organização e
fazer, a partir de informações coletadas e conhecimentos pré-adquiridos, um
diagnóstico do problema que o grupo apresenta em termos de comunicação. O
profissional responsável por tal estudo pode ter vários nomes, visto que a
comunicação ganha cada vez mais importância e seu cuidado é assumido por
uma crescente variedade de profissionais.
“ ‘Comunicação Corporativa é tão importante que não pode ficar nas mãos só de
comunicadores’. Para que a expressão não pareça demasiadamente depreciativa para
os comunicadores tradicionais - entre eles, os relações públicas, jornalistas, publicitários,
designers -, lembre-se do tempo em que tudo o que não fosse publicidade e promoção
27
era assunto menor nas empresas.”
26
Tanto o questionário aberto que serviu de base para a entrevista quanto as
anotações feitas a partir da mesma encontram-se em Anexos
27
NASSAR, Paulo. “VIVA A MESTIÇAGEM”. Disponível em:
http://www.aberje.com.br/imagens/2004/artigo_mesticagem.pdf Consultado
em:29/10/2011, p.1
52
Em função da crescente mestiçagem profissional do campo da gestão da
comunicação há que dar menos importância para a denominação do cargo
profissional e comemorar a interdisciplinaridade na área, o que abre
possibilidades para uma atuação mais completa e holística. Sendo assim, a
comunicação pode ser gerida pelo relações públicas, terapeuta organizacional,
gestor de comunicação, diretor superior e ainda, se servir de áreas mais
heterogêneas como arquitetura, matemática, engenharia, biologia. Segundo o
Prof. Dr. Paulo Nassar, “é essa mestiçagem profissional que garante o bom
futuro da comunicação corporativa”28 e permite uma evolução na área, para
que essa atenda ás novas demandas da sociedade.
No caso da profissional entrevistada, Schuler se autodenomina
comunicadora organizacional. O serviço prestado é uma consultoria a
empresas que percebem a existência de um problema de comunicação dentro
de sua organização e por isso procuram profissionais capacitados a solucionálos.
A partir daí começam os problemas relacionados ao jeito retrógrado de
lidar com a comunicação. Por exemplo, uma empresa solicita o serviço de
criação de um “teaser”29. Mas essa seria a solução de um possível problema,
que seria a razão para que se executasse o produto. Porém se os
responsáveis por tal decisão forem questionados a respeito da razão que os
levou a querer esse “teaser”, na maioria das vezes não haverá uma resposta
clara. Ou seja, parece que quando sobra uma verba no orçamento da firma,
investe-se em comunicação, sem objetivo claro ou o cuidado necessário. Como
prestadora do serviço, Schuler faz com que os seus clientes voltem alguns
passos e ajudem-na a realizar talvez a etapa mais importante do trabalho, que
servirá de base para definir a solução adequada para o contexto daquela
empresa: o diagnóstico do problema organizacional.
28
NASSAR, Paulo. “VIVA A MESTIÇAGEM”. Disponível em:
http://www.aberje.com.br/imagens/2004/artigo_mesticagem.pdf Consultado
em:29/10/2011, p.1
29
Exemplo fornecido em entrevista com Prof. Dr. Maria Schuler, em Anexos
53
Para isso, segundo a comunicadora, é importante o profissional ser
capaz de perceber as fendas que revelam o todo, muitas vezes escondido sob
a configuração das relações do grupo. Deve-se estar constantemente com o
“radar ligado”, percebendo uma conversa aqui, um olhar ali...Tudo isso é
extremamente relacionado a um ponto do novo paradigma que diz respeito à
importância dos detalhes para a percepção do contexto como geral. Aqui se
apresenta a função do comunicador mencionada acima, onde esse assume um
papel de detetive cujo objetivo é ter uma compreensão geral da organização e
seus fluxos de informação, podendo assim identificar onde estão os entraves
desse fluir, os nós que representam obstáculos para o pleno expressar do
potencial de cada indivíduo e da organização como um todo.
3.3 Levantamento da Memória Organizacional
Entender o valor da memória organizacional igualmente é interessante
para o profissional de comunicação, pois muitos dos comportamentos, os quais
moldam parte dos processos comunicacionais no ambiente de trabalho, têm
origem na memória organizacional. Fazer um levantamento do passado da
organização pode ajudar na compreensão da cultura atual, o que aproxima o
profissional e os membros da organização da realidade da qual fazem parte. E
não só comportamentos podem ser melhor compreendidos com o
levantamento dessa memória, mas o próprio conhecimento produzido na
empresa pode estar armazenado nesse passado.
“o conhecimento prático desenvolvido por meio do trabalho colaborativo de um grupo é
guardado, pertence ao grupo como um todo e não a um único indivíduo.
(!)coletivamente, sabemos não só mais sobre alguma coisa, mas mais coisas do que
qualquer um de nós sozinhos. Assim, o conhecimento subsimbólico não poderia ser
facilmente formulado porque ele é parte de um entendimento profundo que temos sobre
30
como realizar tarefas complexas, trabalhando em colaboração” .
30
VILAÇA, Wilma Pereira. “Comunicação organizacional: um olhar brasileiro
sobre o pensamento da Escola de Montreal” Disponível em:
http://www.alaic.net/alaic30/ponencias/cartas/com_org_yRP/ponencias/GT2_17
wilma.pdf Consultado em: 4/10/2011
54
A valorização do conhecimento produzido dentro da organização nao só
se faz válida para que esse conteúdo possa ser usado para uma melhor
compreensão da cultura organizacional, mas também consiste parte do fator
humano dentro da empresa, o qual ganha cada vez mais espaço dentro do
mundo corporativo.
“No campo da comunicação empresarial, as narrativas baseadas na memória de
inúmeros públicos, em suas formas de histórias, depoimentos e relatos de vida,
storytelling, nos suportes oral, escrito e audiovisual é uma das tentativas de responder
ao desafio de narrar, avivando e destacando o que é humano no mundo produtivo”.
31
Nesse contexto faz-se válido o cuidado com arquivos históricos da
organização, pois muito se perde em função do pouco que é arquivado. Esse
cuidado com a memória pode ser também função do Relações Públicas
quando esse faz, através da pesquisa de arquivos e entrevistas com membros
e ex-membros da organização, um levantamento da memória organizacional.
O resultado dessa prática combinado ao reconhecimento do contexto presente
no ambiente de trabalho é uma análise da cultura – crenças, comportamentos,
processos – dentro da organização. Porém, voltando ao conceito oferecido por
Oliveira(1995) de cultura ideal e cultura real, faz-se aqui necessário o cuidado
de que o profissional pesquisador saiba reconhecer o que representa cultura
real e o que representa cultura ideal no montante de dados coletados.
Por exemplo, realizar tal levantamento com base em depoimentos do
grupo dirigente, exclusivamente, deixa sérias lacunas no que diz respeito á
cultura real, uma vez que esse grupo só reconhece o que está sob seu controle
e dificilmente tem acesso ao que os outros grupos têm a dizer,
verdadeiramente. Portanto, em termos de entrevista, o correto é que ela seja
31
NASSAR, Paulo. “O que narrar?” Disponível em:
http://www.aberje.com.br/acervo_colunas_ver.asp?ID_COLUNA=593&ID_COL
UNISTA=28 Consultado em: 28/8/2011
55
realizada com representantes dos diversos grupos heterogêneos dentro da
organização.
Outro ponto a ser discutido na prática de levantamento organizacional em
relação às entrevistas é o gestor de comunicação dificilmente considerar a
possibilidade de entrevistar os funcionários que já não se encontram como
membros da organização analisada. As entrevistas são realizadas com os
funcionários que permaneceram na empresa; os funcionários que não
decidiram sair por alguma insatisfação ou foram despedidos por alguma razão.
Isso é uma seleção de informação que pode não interessar ao pesquisador,
dependendo do foco de sua pesquisa.
Aos dados de profissionais que não se encontram mais empregados o
pesquisador dificilmente terá acesso, a menos que se realizem entrevistas com
ex-trabalhadores. Afinal, é raro que uma empresa faça registro de informações
desse tipo. Aliás, é raro que qualquer tipo de arquivo de informações não
diretamente relacionado à área financeira seja feito dentro de uma
organização. Porém se apresentam situações em que esse tipo de registro é
necessário, e a empresa se vê obrigada a recuperar seus dados por vias
externas.
Foi o que aconteceu na empresa Arcor, quando essa se propôs a realizar
um anúncio que faria uso do histórico de imagens de uma marca de doces que
pertencia à própria corporação Arcor. Porém após dar início ao trabalho, os
comunicadores verificaram que simplesmente não havia arquivo de imagens de
tal marca. Essas imagens não estavam guardadas na empresa e passaram a
ser necessárias para a realização de um projeto.
“(...)nos demos conta de que não tem nada guardado de imagem, de história, de nada. A
gente teve que recorrer a um banco de imagens, pagar caríssimo para ter fotos de
anúncios nossos. O cuidado com a memória é um grande problema nas empresas.”
32
trecho de entrevista na íntegra em Anexos
32
56
Esse trecho do depoimento de Colorni deixa clara a necessidade de se
fazer um banco de dados de imagens produzidas para anúncios e outros fins
dentro da empresa. Porém o que defendemos aqui é que o mesmo se aplica a
todo tipo de informação organizacional, ao conhecimento produzido dentro da
organização como um todo. Inclusive aos relatos históricos sem aparente
importância, uma vez que esses podem vir a representar o fator humano da
organização no futuro (NASSAR, 2011).
Todo esse cuidado com a memória organizacional se faz mais
significativa nos tempos de hoje em função da rotatividade de funcionários que
se verifica nas empresas, o que pode ser exemplificado a partir de mais um
trecho transcrito da entrevista com Colorni:
“(...)eu acredito que muitas empresas têm esse problema, porque hoje as empresas são
muito mais rotativas, não existe mais aquele funcionário fiel. O cara que está há muito
tempo na empresa tem tudo na cabeça, e quando um funcionário vai embora de uma
empresa ele está levando toda a memória da empresa junto. Eu estou aqui na Arcor há
11 anos e do escritório inteiro só tem uma pessoa que está aqui a mais tempo do que
eu. Se eu for embora a empresa perde um banco de dados. Tem gerente de produto que
às vezes vem me perguntar “já foi feito isso? já foi feito aquilo?”, por que não tem nada
guardado, né?”
33
O fato da rotatividade de funcionários ter se intensificado, e combinado à
escassa atividade de se fazer arquivo de memória organizacional, dificulta a
prática do profissional responsável pelas políticas de comunicação, uma vez
que fazer o levantamento da memória passa a depender, em grande parte, do
relato oral.
Esse é, geralmente, mais próximo à cultura real do que os relatos em
documentos escritos. Isso porque os relatos escritos sempre procuram registrar
os fatos de acordo com o ponto de vista que mais convém à direção da
organização, a qual é apresentada como absolutamente correta. As
demissões, por exemplo, sempre são justificadas de acordo com o que convém
33
trecho de entrevista na íntegra em Anexos
57
à cultura ideal.
Ou seja, a empresa é sempre apresentada como uma
instituição justa nos arquivos, o que esconde a realidade do que aconteceu no
passado. Dificilmente um aspecto negativo ou um erro de conduta empresarial
será devidamente registrado por documentos. Resta ao pesquisador recorrer
ao relato oral através de entrevistas, sempre cuidando para coletar dados de
diferentes grupos heterogêneos.
Fazer o levantamento da cultura organizacional pode ajudar muito a
compreensão de comportamentos dentro de um grupo. Marco A. Oliveira(1995)
relata seus estudos numa organização na qual se verificava uma atitude
constante entre os funcionários: havia ansiedade em realizar as coisas com
praticidade, assim como resistência a planejamentos e reflexões dentro do
ambiente de trabalho. Uma vez estudado o passado de tal empresa, descobriuse que por muitos anos essa fora vítima de enchentes que chegavam sem
aviso às suas instalações. Quando isso ocorria, todos os funcionários
deixavam de ocupar seus postos para dar início a um procedimento que
envolvia a todos e tinha de ser realizado extremamente rápido. Caso contrário
a água entrava nas instalações da fábrica, causando um prejuízo material e
impedia que as atividades continuassem.
A partir desse levantamento histórico, Oliveira(1995) teve base para
relacionar aspectos da cultura atual da empresa com o passado da mesma.
Por exemplo, na organização específica se verificava uma resistência a
planejamentos de forma geral. Todos os departamentos partiam rapidamente
para a realização dos projetos, aperfeiçoando os caminhos conforme esses se
desenvolviam.
Nesse
sentido
também
foi
atribuída
a
essa
cultura
organizacional a praticidade e a resistência à reflexão.
Assim, a relação de passado e presente organizacionais se faz clara e a
compreensão de comportamentos atuais, assim como da origem passada
desses comportamentos, ajuda não só o gestor comunicacional a desenvolver
um diagnóstico do contexto analisado como oferece aos próprios trabalhadores
componentes da organização uma possibilidade de conscientização de seus
comportamentos. Tal processo de conscientização aproxima o indivíduo
trabalhador à condição de funcionário com controle sobre suas ações, ou pelo
58
menos conhecimento sobre sua situação na empresa e entendimento sobre
sua própria atitude como membro de determinado grupo organizacional.
Mas por que não simplesmente constatar os aspectos culturais de uma
organização com base em análises do seu presente? Por que se faz
necessário um levantamento do passado organizacional? Essa é uma dúvida
que surge naqueles cuja mentalidade só vê sentido no conhecimento efêmero,
no presente e na busca pelo falsa perspectiva do lucro fácil e rápido.
Questionar a validade do estudo da memória organizacional é o mesmo que
questionar a validade do estudo de História. Afinal, fato é que a compreensão
das sociedades mundiais se vê facilitada através do estudo histórico. O mesmo
processo se dá quando é analisada a História de uma determinada
organização.
No caso da empresa vítima de uma série de enchentes, os aspectos nela
verificados
talvez
fossem
igualmente
percebidos
se
os
relatos
de
acontecimentos passados não tivessem sido recolhidos pelo pesquisador.
Porém a ligação entre o período de enchentes e o comportamento cotidiano
dos funcionários é clara, o que dá méritos ao levantamento de memória e
cultura organizacionais. Essa prática vem sendo valorizada no mundo do
trabalho e se torna cada vez mais comum entre os profissionais responsáveis
pelas políticas de comunicação organizacional.
3.4 O Relações Públicas como pesquisador
Como já abordado nesse trabalho, uma das atividade do profissional
gestor de comunicação é reconhecer o contexto organizacional no qual vai
atuar. E assim se faz possível chamar a atenção para as semelhanças entre as
atividades de um pesquisador e as de um profissional gestor de comunicação.
Afinal, uma das principais funções do gestor de comunicação é fazer o
diagnóstico organizacional, a partir do qual elaborará uma política de
comunicação. E esse primeiro passo, de fazer o diagnóstico, é pesquisa. Dito
em outras palavras, o Relações Públicas gestor de comunicação é, em grande
parte de sua atividade, um pesquisador. Essa capacidade de reconhecer o
59
todo da organização depende de uma série de fatores como disposição para o
novo, experiência na área, sensibilidade para captar situações e ainda,
facilidade de fazer uma entrevista de boa qualidade.
Frequentemente se verifica a subestimação a respeito da complexidade
dessa prática; como consequência a pesquisa dentro da organização acaba
por ser feita com base em manuais superficiais ou métodos obsoletos. O
resultado é a obtenção de dados que não correspondem à cultura real da
instituição(Oliveira, 1995) e, portanto, não oferecerão uma base satisfatória
para a elaboração de uma política de comunicação adequada.
A crença de que modelos de políticas de comunicação podem ser
adotados em qualquer contexto deixa de fora a etapa de diagnóstico
organizacional, uma vez que pressupõe todo contexto organizacional
suficientemente semelhante para que uma mesma conduta em comunicação
seja aplicada em todos eles. Isso não é verdade. Cada organização apresenta
um conjunto de características muito específicas e o processo de análise delas
é extremamente importante para que se reconheça a configuração da
organização em questão, assim como os problemas de comunicação na
mesma. Portanto, a atividade de pesquisa é uma das principais práticas do
profissional gestor de comunicação. Essa é uma importante base para que
uma política de comunicação seja elaborada e aplicada com êxito.
Fica clara a necessidade da adoção de procedimentos teóricometodológicos bem fundamentados para que a pesquisa possa ser incorporada
como ferramenta de trabalho. A partir do momento que este se permitir estudar
tais métodos e tomar controle dos processos, ganhará liberdade de atuação;
permitindo-se expandir seus limites além dos manuais já escritos a respeito do
assunto.
Assim o profissional não mantém a prática de seguir manuais
automaticamente, mas passa a aproveitar deles o que lhe parece conveniente,
adaptando-os ao seu objeto concreto de estudo.
Em outras palavras, o
profissional pode aproveitar o conhecimento acumulado na área, porém com
uma postura crítica perante os conceitos que foram utilizados até então. Além
disso, esses modelos já conceituados servem de referência para o
60
desenvolvimento da teoria e prática do profissional responsável pela gestão da
comunicação e podem ser atualizados com os novos conhecimentos
produzidos pelo profissional-pesquisador em atividade.
3.5 A entrevista
Segundo Gómez (1997), uma das principais diferenças entre a pesquisa
quantitativa e a qualitativa é que esta última tem como objeto de estudo a
linguagem viva, a conversa em si, enquanto a primeira limita-se ao questionário
fechado. Este carece de respostas alternativas às imaginadas pelo
pesquisador, porém permite que um número grande de pessoas seja
questionado. O dilema de escolha entre os métodos qualitativo e quantitativo é,
muitas vezes, solucionado pela fusão dos dois processos numa mesma
pesquisa, quando tanto um questionário fechado é aplicado quanto entrevistas
são realizadas, ambos os processos com foco em um mesmo objeto de estudo.
Conhecer profundamente o objeto de estudo pelo prisma qualitativo não
é possível em um único encontro. Trata-se de um processo de ir e vir. Verificase então uma das vantagens de se ter um profissional responsável pelas
políticas de comunicação da empresa como um funcionário dentro da mesma
ou, no máximo, como um consultor cujo tempo de permanência na organização
seja suficiente para a elaboração de um diagnóstico organizacional
satisfatório.34
34
O vínculo empregatício do profissional gestor de comunicação e a empresa
na qual esse trabalha pode se dar de diversas formas, sejam essas fixas, onde
o trabalhador é funcionário interno da empresa, ou terceirizadas, onde se
encaixam os trabalhadores temporários, consultores e freelancers. Fato é que,
para te acesso à cultura da organização, o profissional de comunicação
necessita relacionar-se com essa de alguma maneira. Uma análise mais
profunda a respeito dessas possibilidades de vínculo é apresentada no
relatório de iniciação científica cujo título é “O Profissional responsável pela
Política de Comunicação Organizacional” (Jesus, 2009)
61
3.6 Identificando os entraves no contexto da comunicação organizacional
É extremamente comum que, uma vez reunidos em torno de um mesmo
objetivo e convivendo por um largo período de tempo, indivíduos componentes
de um mesmo grupo desenvolvam termos de linguagem específicos e inéditos
até então. São palavras, gestos, comportamentos que adquirem um significado
específico no contexto daquele grupo.
Mas como o passar do tempo os componentes são renovados,
substituídos; uma pessoa deixa de fazer parte de um grupo para incluir-se em
um novo, e assim se faz necessária a adaptação a novos ambientes e a
construção de relações com novas pessoas.
Porém muitas vezes surgem disfunções na comunicação. É o clássico
problema de comunicação, quando uma mesma mensagem tem um significado
para alguns enquanto outros a interpretam de forma radicalmente distinta.
Esse tipo de impasse deve ser analisado sob os conceitos da lingüística,
uma vez que dizem respeito a desencontros comunicacionais em função de
diferentes sistemas de signos adotados. O gestor de comunicação entra nesse
contexto com a missão de diagnosticar a incongruência entre linguagens para
então fazer ambas as partes compreenderem de fato o que cada uma pretende
comunicar.
Para exercer tal tarefa é imprescindível que o profissional de
comunicação tenha consciência das nuances da linguagem e seu papel na
estruturação do pensamento para, a partir desse conhecimento, ser capaz de
abstrair seus próprios parâmetros de linguagem, alcançando o funcionamento
daqueles que não conseguem se expressar adequadamente por não
dominarem o sistema lingüístico do outro.
Se esse nó na rede de relações dentro da empresa seguisse um padrão,
seria fácil. Bastaria coletar algumas informações, cruzá-las com registros de
análises já realizadas e fechar o diagnóstico. Mas o fato é que cada problema
apresenta uma configuração específica, portanto não há como procurar um
modelo fechado de entrave comunicacional. Aí entra a necessidade de, como
já mencionado nesse trabalho, partir do zero quando se trata de comunicação.
62
É preciso chamar a atenção, como o faz M. A. de Oliveira(1995), para o
fato de que, no processo do diagnóstico organizacional, o gestor não deve ir
em busca de culpados, mas sim de nós que impeçam o funcionamento natural
da comunicação no grupo. Esse nó pode, sim, ser representado por uma
pessoa, porém muitas vezes trata-se de uma característica que se configurou
em função do todo, de uma deficiência na estrutura física da instituição ou ser
de outra natureza. As causas possíveis são inumeráveis. Por isso é importante
atentar para a limitação de teorias criadas e aceitas até hoje.
63
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O entendimento da cultura organizacional confere ao profissional de
Relações Públicas e comunicação um poder de atuação na construção da
realidade
que,
automaticamente,
lhe
confere
também
uma
grande
responsabilidade em relação à sua prática profissional. A que interesses o
Relações Públicas vai servir? Com que intensão se propõe a gerir a
comunicação de determinada organização?
A partir desse questionamento surgem diversas possibilidades de
atuação em comunicação, algumas delas sem um montante significativo de
referências
no
passado.
Nesse
trabalho
denominamos
uma
dessas
possibilidades de função integradora do Relações Públicas.
Muitos profissionais já se aventuram nessa nova forma de gerir a
comunicação organizacional e estão, cada um no seu caminho, desvendando e
criando esse novo território profissional. Fazer uma pesquisa mais completa a
respeito de suas práticas seria uma forma de dar continuidade a esse trabalho
de conclusão de curso, que não só se propôs ao aprofundamento e
questionamento da atual forma pela qual se faz a gestão da comunicação
organizacional, como espera incitar a reflexão e a coragem de comunicadores
que enfrentam o desafio de inovar nessa área.
Como são as práticas do profissional de comunicação que atua na
função integradora? Como se dá o vínculo empregatício desse com a
organização? Como acontece sua remuneração? Na prática, é possível fazer
do cotidiano de trabalho um espaço criativo e que gere renda para todos os
envolvidos?
Essas perguntam ficam em aberto e são um convite para que
profissionais de comunicação respirem fundo e assumam o dever de mediar a
construção de uma nova realidade, onde todos somos reconhecidos e fazemos
juntos.
64
5. REFERÊNCIAS
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Definição
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Relações
Públicas.
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67
6. ANEXOS
6.1 Roteiro de Entrevista
1. Histórico Profissional / Pessoal:
Dados e fatos marcantes sobre sua carreira - trajetória
O que o fez decidir ou trabalhar com comunicação?
Quais características pessoais ou profissionais que o fizeram trabalhar na área de
comunicação?
Se começasse hoje:
o O que faria diferente?
o O que não deixaria de fazer?
2. O profissional responsável pela Política de Comunicação Organizacional:
Qual o perfil do profissional:
o No passado
o Hoje
o No futuro
O que define - determina este profissional em cada momento considerado (acima)
Quais são / foram / serão os desafios para este profissional?
Quem são os profissionais de comunicação que representam bem estes 3 tempos
(exemplos e referencias)?
Qual e o perfil ideal do profissional de comunicação?
o Habilidades pessoais?
o Habilidades profissionais?
O Profissional de Comunicação e a tecnologia?
Com a evolução da tecnologia, o que muda para este profissional?
Afinal, atrapalha ou ajuda? Por quê?
3. As Práticas do Profissional responsável pela Política de Comunicação
Organizacional:
Como acontece o processo de um trabalho de consultoria?
! Como é encontrado pelos clientes
! Quanto tempo dura um projeto
o Qual o tempo médio de intervalo entre um projeto e outro
Quais são as práticas no cotidiano de trabalho?
o Como se faz o diagnóstico da comunicação
o Soluções - - Quais são as mais comuns e como são apresentadas
o Dá continuidade ao processo ou pára no planejamento
o Trabalha sozinho ou em grupo
Vínculo empregatício com a empresa
! Vantagens e desvantagens de ser terceirizado
o Como acontece a remuneração
4. O trabalho de comunicação e a globalização:
Como vê o profissional responsável pela Política de Comunicação Organizacional no Brasil vs. no
mundo?
Quais os impactos que a globalização traz para esse profissional
O que imagina que este profissional esteja fazendo para manter-se atualizado / empregado
diante deste cenário?
Que impactos a evolução das mídias (Internet, TV digital, telefonia digital) tem no perfil e nas
competências deste profissional?
68
6.2 Entrevista Gilberto Colorni - Gerente de Design Industrial da Arcor
Entrevistado: Gilberto Colorni - Gerente de Design Industrial da Arcor.
Entrevistadora: Ligia Ungaretti Jesus
Data: 6/11/2008
Local: Arcor. R. Olimpíadas, 205
Ligia: Como foi a sua trajetória profissional?
Gilberto: Eu sou formado em desenho industrial na FAAP. No tempo de
faculdade minha vontade era trabalhar com desenho de carro. No período do
curso eu fui vendo que era muito complicado, não porque eu não soubesse,
mas porque o mercado era muito pequeno. Aí eu comecei a descobrir a parte
gráfica,
vários
ramos,
trabalhei
num
estúdio
de
design
que
fazia
eletrodomésticos, trabalhei com Internet, com marketing interno e trabalhei com
embalagens. Daí que eu vi que embalagem é o que eu acho mais legal, por
que se comunica com as pessoas, ou seja, uma coisa que você faz e que tem
uma função muito interessante; a embalagem precisa vender o produto. Na
Internet é diferente, você faz ali o negócio e ele fica preso, você não pega na
mão.
Ligia: Você só começou a trabalhar depois de formado na FAAP?
Gilberto: Não, eu já trabalhava antes. Quando eu me formei eu já tava no
segundo, terceiro emprego. Quando eu entrei na Arcor, em 1997, eu já tinha
saído da faculdade em 1995.
Ligia: E você acha que foi bom começar a estagiar com a faculdade?
Gilberto: A minha decisão foi porque, pensar um pouco o que você quer para a
sua vida. Se você quer ser rico, ter uma carreira, você tem que partir para
estágio. Mas se os seus ideais são outros acho que você tem que seguir outro
caminho. Por que se para a gente que pegando estágio e trabalhando já é
69
dureza para caramba, para quem está seguindo carreira acadêmica é um
pouco mais complicado, imagino eu. A gente tem os nossos ideais, né? Mesmo
dentro desse mundo aqui, que eu vivo, a Arcor que é uma multinacional, a
minha carreira também tem um limite aqui dentro. Porque a empresa é uma
empresa de alimentos que tem diretores gerais, marketeros, pessoal de
desenvolvimento de produto, pessoal de finanças, pessoal de vendas. Agora,
design aqui é um pouco peixe fora d’água.
Ligia: Você está sozinho aqui?
Gilberto: Não, eu tenho uma equipe de seis pessoas que cuida de toda parte
de design gráfico. A gente tem em Manaus um estúdio, eu sou gerente da
área. Comecei sozinho e 1, 2,3,4,5,6.
Ligia: Se você começasse hoje, faria alguma coisa diferente?
Gilberto: Eu sempre me pergunto isso: “Será que eu fiz a coisa certa?” Eu sou
um cara que se dedica para caramba e eu vejo que tem carreiras que se eu me
dedicasse tanto quanto eu me dedico aqui, talvez eu fosse melhor sucedido.
Uma área de vendas, por exemplo. Eu vejo que eles conseguem rapidamente
subir, e os salários são melhores.
Ligia: E o que você não deixaria de fazer?
Gilberto: Experimentar tudo o que eu experimentei. Porque dentro de cada
carreira tem várias opções. É meio equivalente a se casar com a primeira
mulher que você encontra, você pode até ser feliz, mas sempre com aquela
pulga atrás da orelha. “Será que tem uma melhor melhor?” Acho que é legal
você conhecer outras coisas.
Ligia: Para você, qual o perfil ideal do profissional de comunicação?
Gilberto: Pessoas que mexem com comunicação geralmente têm que ser
comunicativas, mas passoals que mexem com parte gráfica, como eu, é
exatamente o oposto. Essas que trabalham com parte visual são muito
70
introspectivas. Eu sou um cara que consigo lidar bem com isso e, ainda bem,
né? Porque eu vejo que na minha equipe tem muita gente introspectiva. A
pessoa tem que ser expressiva, né.
Ligia: Normalmente os profissionais têm graduação?
Gilberto: Da minha área todos têm praticamente a mesma coisa: desenho
industrial. Na FAAP, Mackenzie, Belas Artes e Anhembi Morumbi. Nós estamos
falando aqui de comunicação visual, né? Não da comunicação verbal, sei lá.
Ligia: Esse profissional tem habilidades pessoais ou ele adquire isso?
Gilberto: Eu acho que na nossa área tem que ter um dom. No meu curso na
faculdade tinha muitas pessoas que você via que não tinha o dom. Você vê,
trabalha o outro lado do cérebro. Tem um limite para você se desenvolver.
Ligia: Na sua equipe tem homens e mulheres?
Gilberto: Eu sempre procuro formar ela de maneira que fique mista. Agora eu
tenho três homens e duas mulheres. Até outro dia, quando saiu uma design da
equipe, tinha mais mulher do que homem. E as mulheres trabalham bem,
trabalham direito. Eu gosto. É um outro perfil, é muito nítido.
Ligia: Para você, o que é a comunicação de maneira geral, dentro da Arcor? E
da sua equipe?
Gilberto: Você diz comunicação minha com eles?
Ligia: Isso.
Gilberto: Cada gestor de área tem seu jeito de gerir, sua personalidade.
Paralelo a isso a empresa está fazendo um trabalho muito interessante para
educar, treinar cada gestor. Para que eles consigam se comunicar melhor. É
um investimento que a empresa faz. Tem os módulos, inclusive teve um
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anteontem. Faz dois anos que estamos trabalhando com esses módulos. O
primeiro era como dar o feedback e anteontem foi a continuação, que era como
dar o feedback e desenvolver o personagem. Existem profissionais nisso, é
uma coisa que se ensina. Cada gestor tem suas qualidades nisso, mas isso é
possível aprender. È assim,vem um cara, é sempre ele na Arcor. São mais de
40 fábricas, 50.000 funcionários. Ele vai percorrendo aí. A gente faz até um
teatrinho, tem uma técnica, coisas chave. Fica um cara que é o chefe e outro
que é o funcionário. E se faz uso de técnicas para conversar. Existe essa
preocupação. Bom, eu tenho essa preocupação de como me relacionar mas aí
vai de cada chefe, né? Valorizar o funcionário, fazer tudo certo, tem chefe que
não fala nada, tem outro que só cobra ou só dá bronca. Existe sim uma
política.
Ligia: Se usa a palavra política?
Gilberto: Não se usa abertamente essa palavra, mas eu poderia falar “a minha
empresa tem uma política de treinar e se preocupar com isso”. A gente chama
isso de programa de liderança. São diferentes módulos; um deles é de como
despedir pessoas da forma correta, chega até esse nível. A gente aprende
isso, é muito legal. È uma coisa que me fascina e que eu não veria se
trabalhasse numa agência só de design, que não tem muito dinheiro.
Empresas grandes têm mais dinheiro e te proporcionam isso, e a gente vai
aprendendo muito, muito.
Ligia: A Arcor tem alguma preocupação em manter os profissionais de
comunicação atualizados?
Gilberto: Isso aí que eu te falei não é só para comunicação, é para todas as
áreas. Fora isso, cada área tem uma verba para cursos técnicos. Esse ano eu
tive três mil reais para mim, não é muito dinheiro. Eu posso usar isso para os
seis funcionários de design gráfico num cursinho aqui, outro ali. A gente fez
coisas legais, dá para fazer. Outra coisa é a verba que eles mesmos têm, e
disso a gente não sabe, e eles bancam esses programas de líderes, módulos e
tal. Isso é o RH que se preocupa.
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Ligia: Vocês são obrigados a fazer esses módulos?
Gilberto: Sim. Somos obrigados.
Ligia: Qual o impacto das novas tecnologias na sua equipe?
Gilberto:Hoje só se usa computador, não tem mais nada manual. A única coisa
manual que eu faço é montar MoCap, o protótipo. Aí vai lá na pranchinha,
corta, cola, monta. Mas muita coisa é repetida, só muda o sabor e a gente já
tem o expertise, então não precisa fazer sempre o protótipo. O resto é tudo
digital. A gente vai sempre se atualizando de acordo com os softwares que
têm, as máquinas também. Aqui existe um bom investimento com isso. E os
treinamentos que eu te falei.
Ligia: Em relação aos programas de liderança, que não deixam de ser uma
mudança na política de comunicação da empresa, como isso é colocado para
vocês? È a forma mais correta de agir? Por que isso foi feito?
Gilberto: Vamos ser realistas, por que esses programas de lideranças vem
sendo feitos de dois anos para cá? Porque a empresa vinha tendo muitos
problemas com perdas de funcionários, muita coisa errada, é uma empresa
machista que age de forma machista na hora de gerenciar, as pessoas querem
sempre mudar, a empresa não tem um afama de pagar muito bem...Você tem
três maneiras de segurar um funcionário: salário, que é a coisa menos
importante, perspectiva de crescimento dentro da empresa e clima interno da
empresa. Então, a Arcor tinha problema com essas coisas, tinha muita
rotatividade de pessoal, e o Rh percebeu que se eles não fizessem um trabalho
aprofundado com isso, estudar os problemas, ensinar as pessoas, a gente faz
às vezes reunião gerencial, vai 70 gerentes para um hotel e fica lá, se une.
Esse trabalho tem que ser feito para que você consiga motivar as pessoas.
Não é que é tudo uma alegria, é que tinha muito problema. Já estão fazendo
esse trabalho a dois anos e as pessoas começam a sentir que tem uma
melhora. Já clarificou a política de salário, agora todo mundo sabe como é que
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funciona. Tem uma política salarial, eles contrataram uma empresa de
consultoria que passa um método de como promover uma pessoa sem na base
do “ah, você é legal, vou te dar um aumento”. São vários trabalhos paralelos
para desenvolver as pessoas e fazer com que elas se sintam satisfeitas, não é
tão simples assim. A Arcor é uma empresa de tradição familiar, está se
profissionalizando agora, e empresa familiar é uma bagunça. Está se tornando
uma empresa multinacional e precisa profissionalizar as pessoas. Para isso
tem métodos.
Ligia: Tem muita resistência por parte dos gestores em relação a esses
treinamentos?
Gilberto: Não. Na verdade, a maior resistência vem de cima mesmo. È de cima
que vem, tem que mudar em cima para mudar em baixo. Eles, que são os
donos, o acionistas e tal, que são os mais resistentes. Não é que eles não
queiram mudar, se não não contratavam os treinamentos e consultorias, mas a
dificuldade é com eles mesmo, que já estão na empresa a 15, 20 anos.
Ligia: Quais são as principais funções de uma política de comunicação.
Gilberto: A principal delas é reter pessoas. Isso que eu falei do clima. Também
clareza, todo mundo quer saber o que está acontecendo. É compromisso, você
não
consegue
fazer
a
empresa
crescer
se
as
pessoas
estão
descompromissadas. È igual a uma família.
Ligia: Você falou que a Arcor está se tornando uma multinacional. Qual a
influência da globalização na empresa?
Gilberto: Muito. A globalização acontece e cada vez mais a gente vê que os
países em que a Arcor tem empresas estão se juntando. E cada vez tem mais
diretorias corporativas, aqui tem uma diretoria de RH e tem um chefão de RH
que cuida de tudo. Até marketing já começa a ter uma diretoria desse tipo. Já
tem essa coisa de globalizar a empresa internamente mesmo, não se pode
pensar individualmente. Sem contar para fora, até pouco tempo a Arcor era
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“Brasil, Brasil. Argentina, Argentina”. Agora isso já mudou. Minha área, por
exemplo, faz embalagens para exportação.
(...)
Gilberto: A gente foi fazer essa publicação sobre a marca “Amoré” e nos demos
conta de que não tem nada guardado de imagem, de história, de nada. A gente
teve que recorrer a um banco de imagens, pagar caríssimo para ter fotos de
anúncios nossos. O cuidado com a memória é um grande problema nas
empresas.
Ligia: Alguma coisa foi feita a respeito da memória organizacional depois desse
episódio?
Gilberto: Não é tão simples assim. O cara que descobriu isso é o gerente de
biscoitos da Amoré. O cara da Triunfo não teve esse problema.
Ligia: Por que ele tem o arquivo?
Gilberto: Não, ele não teve esse problema ainda. Não existe esse cuidado. E
eu acredito que muitas empresas têm esse problema, porque hoje as
empresas são muito mais rotativas, não existe mais aquele funcionário fiel. O
cara que está a muito tempo na empresa tem tudo na cabeça, e quando um
funcionário vai embora de uma empresa ele está levando toda a memória da
empresa junto. Eu estou aqui na Arcor a 11 anos e do escritório inteiro só tem
uma pessoa que está aqui a mais tempo do que eu. Se eu for embora a
empresa perde um banco de dados. Tem gerente de produto que às vezes
vem me perguntas “já foi feito isso? já foi feito aquilo?”, por que não tem nada
guardado, né?
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6.3 Entrevista Schuler – anotações
•
surgimento de novas culturas e fronteiras no mundo
•
cultura espalhada, presente em diversos pontos independentemente da
localização geográfica
•
comunicação organizacional=conjunto de relações que regem a
organização
•
contexto e indivíduo
o indivíduo é muito importante, pois dele depende em grande parte
o contexto
•
profissional da comunicação-comunicadora
•
práticas profissionais, processos
o diagnóstico organizacional feito a partir de sensibilidade, “radar
ligado”
•
colocar necessidades de comunicação para o cliente
o práticas de conhecimento comum são muito simples e
consciência a respeito da importância do cuidado com
comunicação ainda nao é grande
o exemplo da empresa que solicita “teaser”, mas que pode se
beneficiar muito mais se a gestão de comunicação for feita de
forma mais ampla
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Relações Públicas como uma Função Integradora