Coléteres em Bathysa nicholsonii K. Schum. (Rubiaceae): ultraestrutura, composição protéica da secreção e sua atividade antifúngica Emilio de Castro Miguel Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro Campos dos Goytacazes Março de 2006 1 Coléteres em Bathysa nicholsonii K. Schum. (Rubiaceae): ultraestrutura, composição protéica da secreção e sua atividade antifúngica Emilio de Castro Miguel Dissertação a ser apresentada ao Centro de Biociências e Biotecnologia como parte das exigências do Programa de Pósgraduação em Biociências e Biotecnologia para a obtenção do título de Mestre em Biociências e Biotecnologia. Orientadora: Dr. Maura Da Cunha Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro Campos dos Goytacazes, RJ Março de 2006 2 Coléteres em Bathysa nicholsonii K. Schum. (Rubiaceae): ultraestrutura, composição protéica da secreção e sua atividade antifúngica Emilio de Castro Miguel Dissertação a ser apresentada ao Centro de Biociências e Biotecnologia como parte das exigências do Programa de Pósgraduação em Biociências e Biotecnologia para a obtenção do título de Mestre em Biociências e Biotecnologia. Aprovada em 21 de Março de 2006 Comissão Examinadora ___________________________________________________ Dr. Ulysses Garcia Casado Lins – IM-UFRJ ___________________________________________________ Dra. Claudia Franca Barros - IPJBRJ ___________________________________________________ Dra. Kátia Valevski Fernandes - LQFPP-CBB-UENF ___________________________________________________ Dra. Maura Da Cunha LBCT-CBB-UENF (orientadora) 3 Este trabalho foi desenvolvido no Laboratório de Biologia Celular e Tecidual em colaboração com o Laboratório de Bioquímica e Fisiologia de Microorganismos do Centro de Biociências e Biotecnologia da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, sob orientação da Dr. Maura Da Cunha e com financiamento da CAPES, PETROBRAS, CNPq e FAPERJ e bolsa de mestrado concedida pela UENF/FAPERJ, durante a vigência do curso. 4 Agradecimentos À Dra. Maura Da Cunha pelo aprendizado, orientação, estímulo, amizade e dedicação durante todo o tempo de nossa convivência. À Dra. Valdirene Moreira Gomes pela ajuda nas análises bioquímicas e ensaios antifungicos. Ao Dr. Marco Antonio de Oliveira pela ajuda nos microscópios e excelentes dicas técnicas. Ao Dr. Flávio Costa Miguens, pela criteriosa e bem humorada revisão. Aos membros da Banca Examinadora Dra. Claudia Barros, Dr. Ulysses Lins e Dra. Kátia Valevski, por aceitarem o convite. À Érica, Isabela, André, Felipe e Suzana, pela ajuda no LFBM. Ao Sr. Walter Silva pela ajuda da coleta do material botânico. Ao Msc. Sebastião José da Silva Neto pela identificação no material botânico. Ao Laboratório de Biologia Celular e Tecidual, especialmente na figura dos seus técnicos, Beatriz Ribeiro; Márcia Adriana Carvalho; Giovana Alves e Noil Freitas, pelo auxílio nos microscópios e no setor de Preparo de Amostras para Microscopia. Ao Programa Mata Atlântica pelo suporte técnico, e financeiro através da PETROBRAS. Ao IBAMA e ao Dr. Luis Henrique (Diretor da Reserva Biológica de Tinguá), pela permissão para a coleta de material botânico. Aos colegas do nosso grupo de pesquisa. Aos amigos Marcus Vinicius Oliveira e Leandro Mattos. A Lucas Miguel, meu querido irmão. A todos que eu me esqueci de agradecer mas, de alguma forma, foram importantes para a realização desse trabalho. Vocês sabem como é final de tese..... 5 Dedicatória Dedico esse trabalho à: Emil Miguel Rosa, Izaura de Freitas Castro Miguel Lucas de Castro Miguel 6 ÍNDICE 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................... 1.1 Floresta Atlântica ............................................................................... 1.2 Família Rubiaceae e Bathysa nicholsonii K. Schum ......................... 1.3 Estípulas ............................................................................................. 1.4 Tecidos secretores em plantas ........................................................... 1.5 Coléteres .......................... ................................................................. 1.6 Aspectos subcelulares do processo de secreção vegetal .................... 1.6.1 Sistema endomembranar ........................................................ 1.6.2 Transporte de substâncias em células vegetais ....................... 1.6.3 Morte celular programada em plantas .................................... 1.7 Parede periclinal externa ................................................................... 1.7.1 Passagem de moléculas pela parede periclinal externa ......... 1.8 Exsudatos vegetais: Características gerais e propriedades ............... 01 02 03 04 05 06 08 09 10 11 13 13 14 2 OBJETIVOS ..................................................................................................... 16 2.1 Objetivo geral .................................................................................... 16 2.2 Objetivos específicos ......................................................................... 16 3 MATERIAL E MÉTODOS .............................................................................. 3.1 Área de coleta .................... ............................................................... 3.2 Material botânico ............................................................................... 3.3 Microscopia........................................................................................ 3.3.1 Microscopia Óptica................................................................. 3.3.2 Histoquímica............................................................................ 3.3.3 Microscopia Eletrônica de Transmissão.................................. 3.3.4 Citoquímica.............................................................................. 3.3.5 Microscopia Eletrônica de Varredura...................................... 3.3.6 Microanálise de Raio-X (Energia dispersiva de Raios-X)....... 3.4 Detecção de proteínas totais na secreção (SDS-PAGE)..................... 3.5 Detecção de glicoproteínas................................................................ 3.6 Detecção de atividade antifúngica no extrato total da secreção.......... 17 17 17 18 18 18 19 19 21 21 22 23 23 4. RESULTADOS ............................................................................................... 25 5. DISCUSSÃO ................................................................................................... 44 6. CONCLUSÃO ................................................................................................. 52 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................ 53 8. ANEXO: Artigo aceito para publicação na revista Plant Biology ................... 66 7 RESUMO Os coléteres são estruturas secretoras que podem ser encontrados em diversas famílias de Angiospermae. Por definição, são estruturas secretoras constituídas por um eixo central alongado, formado por parênquima fundamental, circundado por um estrato epidérmico em paliçada, sendo as células epidérmicas responsáveis pela secreção. A função protetora dos coléteres conferida pela sua secreção ainda é bastante discutível e pouco conhecida. A secreção trata-se de um complexo fenômeno de separação ou isolamento de certas substâncias do protoplasto, podendo incluir processo de síntese, acúmulo em determinados compartimentos intracelulares, assim como liberação ou eliminação extracelular para dentro de espaços internos próximos ou, então, para fora da superfície da planta. Durante esse processo, alterações ocorrem não só no citoplasma, mas também na parede celular. Para estudar a anatomia e ultraestrutura dos coléteres de Bathysa nicholsonii foram utilizadas técnicas de microscopia óptica; eletrônica de varredura, incluindo microanálise de Raios-X e eletrônica de transmissão. Para a detecção de proteínas na secreção foi feita eletroforese em gel de poliacrilamida na presença de SDS. Foram feitos, ainda, testes de inibição de crescimento de esporos de fungos fitopatogênicos. Na sua anatomia, os coléteres são do tipo cilindriforme, com eixo central parenquimático e células epidérmicas secretoras, apresentando estruturas lipídicas fortemente marcadas. Diversas fases de maturação do citoplasma puderam ser notadas. As mudanças citoplasmáticas sugerem que as células secretoras passam por um processo de morte celular programada não lisossomal durante o seu desenvolvimento. A parede periclinal externa também apresentou mudanças em sua organização durante a maturação. Foram notadas diversas fases, possivelmente envolvidas com o processo de passagem das moléculas para o meio externo. A secreção mostrou através de eletroforese a presença de várias bandas protéicas, com massas moleculares variando entre 66 e 24 kDa. Foram observadas duas proteínas majoritárias com massas moleculares de aproximadamente 26 e 36 kDa. O efeito da secreção obtida após processamento protéico sobre a inibição do desenvolvimento dos fungos causou uma significativa inibição no fungo Coletotrichum lindemuthianum, desde as primeiras horas de crescimento. 8 ABSTRACT Colleters are secretory structures present in many Angiospermae families. These structures are constituted by an elongated central axis formed by fundamental parenchyma, surrounded by a palisade epidermis, being the epidermal cells responsible for the secretion. The protective function of colleters conferred by their secretion is still controvesal. The secretion is a complex phenomenon of separation and isolation of certain protoplast substances. It may include synthesis and accumulation process in certain intracellular compartments, well as liberation and extracelular elimination to nearby inner spaces or to the outer side of plant surface. During this process, alteration occur not only the cytoplasm but also in the cell wall. In orther to study the anatomy and ultrastructure of Bathysa nicholsonii colleters, light microscopy, electron scanning microscopy, including X-Ray microanalysis, and transmission electron microscopy were utilized. For protein detection, the secretion was analysed by SDS-PAGE. Tests on the inhibitory potential of secretion on the spore growth of phytophatogenic fungus were performed. In their anatomy, colleters are cilindriform, with a parenchymatic central axis and epidermal secretory cells, presenting lipophylic structures strongly stained. Many cytoplasm maturation phases could be noted. Cytoplasmic changes, observed in secretory cells are indicative or a possible event of non lisossomal programmed cell death occurring during the course of their development. The outer cell wall was also presented organizational changes during maturation. Several phases were noted, probably involved with molecules passage to the outside media. By electrophoresis, the presence of different proteins, covering the range of66 to 24 kDa were visualized in colleters secretion. Two majoritary proteins, with molecular masses of approximately 26 and 36 kDa were noted. secretion extracted proteins presented a inhibitory effect ont the growth of Colletotrichum lindemuthianum fungus, since the first hours of growth. 9 10 1. INTRODUÇÃO Estruturas ou tecidos secretores podem estar presentes em diferentes regiões das plantas e possuir formas variadas (Dickinson, 2000). Partindo do princípio que estruturas secretoras formam um grupo polifilético, divergências evolutivas deram origem a diferentes mecanismos de síntese e externalização de variados exsudatos (Dickinson, 2000). Estas variações podem ser identificadas na anatomia e ultraestrutura das estruturas secretoras dos coléteres, que são constituídas por um eixo central vascularizado circundado por uma epiderme secretora, disposta em paliçada. Coléteres podem estar presentes na base das estípulas, cálices, folhas, flores e ápices caulinares. A morfologia, anatomia e ultraestrutura de coléteres em diversos gêneros da família Rubiaceae foram recentemente descritas (Klein et al., 2004; Miguel, 2004; Miguel et al., 2005-submetido; Moraes et al., 2005). Contudo, muitas questões permanecem em aberto. Dentre estas, a morfofisiologia do processo de secreção em coléteres tem sido objetivo do nosso grupo no setor de Citologia Vegetal – LBCT/UENF, contribuir para elucidar os aspectos anatômicos e ultraestruturais da secreção em plantas, enfocando essas estruturas em espécies da família Rubiaceae que ocorrem na Floresta Atlântica. O ambiente encontrado em regiões de Floresta Atlântica é úmido, sendo propício para o desenvolvimento de microrganismos, que apresentam diversas interações com estas plantas, inclusive patogenia. Estudos envolvendo estas relações microrganismos/plantas são necessários para elucidar os mecanismos de interação. Exemplifica esta abordagem, o fato de que tem sido sugerido que o exsudato de coléter apresente papel importante na interação bactéria/planta nos gêneros onde pode ser observada nodulação de bactérias (Horner e Lersten, 1968; Lersten, 1975). Assim, acredita-se que a caracterização da secreção e a avaliação de sua atividade biológica podem proporcionar o melhor entendimento do envolvimento da secreção no mecanismo de defesa das espécies em questão. Pelo exposto, o presente estudo tem como objetivo a análise anatômica e ultraestrutural dos coléteres de Bathysa nicholsonii K. Schum (Rubiaceae), bem como, analisar parcialmente a composição protéica e atividade antifúngica da secreção produzida por estas estruturas secretoras. 11 1.1 Floresta Atlântica O bioma Floresta Atlântica engloba vários tipos de vegetação (Rizzini, 1997) como florestas ombrófilas densas ou mistas, florestas estacionais e ecossistemas associados como restingas e manguezais. É uma das formações vegetais tropicais mais ameaçadas do mundo pelo crescente desmatamento (Myers et al., 2000). Desde o início da colonização, com a ocupação dos primeiros espaços territoriais próximos à região costeira, o Brasil passou por diferentes ciclos de exploração como: o do pau-brasil; da cana-de-açúcar; da pecuária; do ouro; e do café que contribuíram para a perda da cobertura florestal. Também a industrialização e conseqüente urbanização com o surgimento das principais cidades e metrópoles brasileiras fizeram com que a área originalmente ocupada pela Floresta Atlântica fosse reduzida drasticamente (Quinet et al., 2000). Mundialmente, apenas da década de 80 foram extintos cerca de 154 milhões de hectares de florestas tropicais (FAO, 1993). Na Floresta Atlântica, possuindo altos índices de endemismo (WCMC, 1992), estima-se que ocorram cerca de 8000 espécies de plantas (Conservation International, 2006). No entanto, ainda é pouco conhecida em relação à composição florística e aos processos ecológicos que envolvem suas comunidades e populações. Originalmente, esta formação vegetal ocupava cerca de 1,2 milhões de km2, hoje ocupa apenas 7 % do território original, sendo que desta área, somente 1-2 % tem chances de ser preservada (Myers et al., 2000). Atualmente, a Floresta Atlântica compreende remanescentes de cobertura florestais bastante diversificadas na sua fisionomia e florística. Com uma grande população humana vivendo em seu domínio, ocorre uma grande pressão sobre este conjunto de ecossistemas e sua biodiversidade. Esta ocupação desordenada acaba por causar utilização irracional de recursos naturais. Dentre as principais atividades presentes hoje nesse ecossistema, resultam da ação direta do homem sobre as florestas: expansão agropecuária e urbana, inclusive loteamentos clandestinos; empreendimentos de infra-estrutura; exploração predatória de recursos florestais, sendo exemplos a extração de madeira e o turismo desordenado; dentre outras (Fundação SOS Mata Atlântica, 2003).A cobertura atual desta formação vegetal apresenta uma alta diversidade de famílias botânicas. Em alguns trechos, a família Rubiaceae está dentre aquelas que apresentam grande número de indivíduos (Lima e Guedes-Bruni, 1997). 12 1.2 Família Rubiaceae e Bathysa nicholsonii K. Schum. A família Rubiaceae encontra-se entre as quatro maiores famílias de Angiospermas, considerando-se o número de espécies, depois das famílias Asteraceae, Orchidaceae e Fabaceae (lato sensu = Leguminosae), com cerca de 13.000 espécies e 650 gêneros (Robbrecht, 2004). No Brasil, segundo Delprete (1998), a família compreende aproximadamente 118 gêneros e 1.600 espécies. A última revisão taxonômica da família foi feita por Robbrecht (1988). Desde então, muitos trabalhos descrevendo novas espécies nessa família são encontrados na literatura como, por exemplo, Devesa e Ortega-Olivencia (2003), Ortega-Olivencia e Devesa (2003), Markey e de Lange (2003), Norton e de Lange (2003). Também são reportadas revisões do gênero Xantophytum (Axelius, 1990); Ernode (NegronOrtiz e Hickey, 1996) e Simira (Silva Neto, 2000) Diversas espécies da família Rubiaceae apresentam um alto valor importância (VI) no bioma Floresta Atlântica. Lima e Guedes-Bruni (1997) demonstraram que aproximadamente 5 % das espécies catalogadas no remanescente de Floresta Atlântica da Reserva Biológica de Macaé de Cima pertenciam a esta família. Guedes-Bruni (1998) demonstra a importância desta família em outros remanescentes de Floresta Atlântica do Estado do Rio de Janeiro. Desde o início do século XIX, com a extração e caracterização da cafeína, a família Rubiaceae tem se destacado pela presença de substâncias de propriedades terapêuticas em suas estruturas. Atualmente, a família Rubiaceae vem se destacando pela produção de substâncias medicinais ou potencialmente medicinais, por exemplo, microbicidas, anti plasmódio, analgésicos, anti inflamatórios, anti tumores dentre outras (Abdel-Kader et al., 1997; Capasso et al., 1997; Germano et al., 1999; Staerk et al., 2000; Kayser et al., 2001; Jayasinghe et al., 2002; Hamerski et al., 2003; Dongmo et al., 2003; Suksamrarn et al., 2003; Jangde e Bansod, 2004; Gattuso et al., 2004; Lorence et al., 2004). Muitas características são marcantes na família Rubiaceae como folhas opostas com estípulas e ovário ínfero, além da presença de estípulas cobrindo e protegendo o meristema apical caulinar (Robbrecht, 1988). Embora, seja bem caracterizada como uma família, as delimitações de subfamílias, de tribos, e de gêneros têm sido discutidas em razão da grande riqueza e da variedade morfológica de seus caracteres, o que vem provocando muitas 13 mudanças na classificação hierárquica infrafamiliar (Andersson e Rova, 1999; Andreasen e Bremer, 2000; Piesschaert et al., 2000). O gênero Bathysa é representado por cerca de 15 espécies, sendo árvores, arvoretas ou arbustos, distribuídos no Panamá, Guiana Francesa, Venezuela, Colômbia, Peru, Bolívia e Brasil. B. nicholsonii foi escolhida para este estudo pela presença de estípulas grandes que, em suas bases, apresentam coléteres com secreção abundante (Miguel, 2004). Bathysa nicholsonii K. Schum. é uma árvore com até sete metros que apresenta casca castanha, com placas longitudinais e ramos crassos, possuindo estípulas persistentes. No Estado do Rio de Janeiro, ocorre no Parque Nacional da Tijuca e na Reserva Biológica de , onde é encontrada na orla da mata associada com indivíduos de B. cuspidata, sendo conhecida vulgarmente por “bapebucu” e “quina-do-mato”. Segundo os critérios da IUNC (International Union for Nature Conservation), a espécie pode ser considerada rara. Indícios levam a crer que B. nicholsonii tenha populações de tamanho reduzido, nos Estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais (Germano-Filho, 1999). 1.3 Estípulas São apêndices presentes aos pares na base do pecíolo e, em sua maioria, fusionadas a uma estrutura interpeciolar em ambos os lados do caule, entre as folhas opostas, podendo ser de diferentes formas (Robbrecht, 1988). Em determinadas plantas, estas estruturas podem ser verdes, semelhantes às folhas e tendo capacidade fotossintética, mas sua principal função é, de fato, a proteção das folhas jovens em desenvolvimento (Fahn, 1990). A presença de estípulas é uma das características vegetativas mais importantes da família Rubiaceae. Contudo, pouco se sabe sobre a origem evolutiva e as funções das estípulas em dicotiledôneas (Cronquist, 1968; Rutischauser e Dickinson, 1989). Em Rubiaceae sabe-se que, após o crescimento do ápice caulinar, as estípulas podem ser decíduas ou persistentes. Ocorrendo no ápice caulinar, sendo decíduas ou persistentes, freqüentemente, cobrem-no inteiramente. Estípulas persistentes são encontradas próximas às gemas axilares, cobrindo-as (Robbrecht, 1988). Assim, oferecem proteção aos meristemas apicais e/ou axilares na forma de uma barreira física. Esta forma de proteção em camadas de estípulas sobre o ápice é encontrada, principalmente, em dicotiledôneas arbóreas (Fahn, 1990). Em diversas espécies, podemos encontrar, na 14 superfície adaxial das estípulas, estruturas secretoras denominadas de coléteres. Ocasionalmente, as estípulas assumem uma tonalidade marrom em seus ápices, sendo indício de sua senescência. 1.4 Tecidos secretores em plantas Estruturas ou tecidos secretores podem estar presentes em diferentes órgãos das plantas, possuindo formas variadas (Dickinson, 2000). A variação de formas destas estruturas reflete a variação de exsudatos produzidos. Atualmente, a classificação das estruturas secretoras é feita com base na morfologia ou no conteúdo do exsudato. Tal classificação é discutível devido ao fato de que tecidos secretores, geralmente, sofrem transformações relativamente rápidas. Em função disto, a estrutura, a ultraestrutura e o conteúdo bioquímico das células podem ser modificados em dias ou até em horas. Tal fato dificulta a classificação, pois tecidos iguais podem ser considerados diferentes somente por se encontrarem em uma etapa diferente da maturação (Fahn, 1979). Fahn (1988) organizou uma listagem de diferentes tipos de estruturas secretoras de plantas e classificou-as, principalmente, quanto à sua morfologia e à composição química da secreção, sendo estas características complementares. No entanto, é senso comum na literatura que estruturas secretoras formam um grupo polifilético (Fahn, 1979; Laurence et al., 2000). Estudos morfofisiológicos têm sido realizados sobre estruturas secretoras em diferentes famílias. Dentre estes, se destacam os estudos de Gaffal e Heimler (1998), investigando a estrutura do nectário floral de Digitalis purpurea; Fahn e Shimony (1998), sobre a ultraestrutura das células secretoras de duas espécies de Fagonia (Zygophyllaceae); Silva e Machado (1999a e 1999b), com relação aos tricomas secretores em folhas de Piper regnellii (Piperaceae); Fahn (2000), investigando a estrutura e função das células secretoras; Bottega e Corsi (2000), sobre a estrutura e função de tricomas glandulares do cálice de Rosmarinus officinalis (Labiatae); Knight et al. (2001), sobre as glândulas de óleo do fruto de Citrus sinensis; Machado e Carmello-Guerreiro (2001), investigando a estrutura e desenvolvimento de canais secretores em frutos de Schinus terebinthifolius (Anacardiaceae); Miguel (2004), investigando os coléteres de espécies de Bathysa (Rubiaceae); e Klein et al. (2004), estudando coléteres de Simira (Rubiaceae). 15 Ultraestruturalmente, tem sido observado que células de tecidos secretores são caracterizadas por conterem numerosas mitocôndrias, pequenos vacúolos e citoplasma denso (Fahn, 1988). Segundo Fahn e Shimony (1998), células secretoras de Fagonia mollis (Zygoplhylaceae) possuem núcleo relativamente grande e numerosas mitocôndrias modificadas. Nas células secretoras dos ductos de goma de Lannea coromandelica (Anacardiaceae), o citoplasma é rico em ribossomos, retículo endoplasmático rugoso, mitocôndrias, vacúolos, corpos paramurais e inclusões lipídicas e, em algumas etapas de sua diferenciação, foram encontrados dictiossomos em abundância (Venkaiah, 1992). Werker e Kislev (1978) argumentam que a produção de secreção, em tricomas secretores da raiz de Sorghum, está relacionada ao complexo de Golgi. 1.5 Coléteres São estruturas secretoras que podem ser encontradas em diversas famílias de Angiospermae. Por possuírem forma e funções variadas e estarem presentes em diversos grupos taxonômicos, estas estruturas foram descritas sob vários nomes. Os mais usuais são: squamallae (Ramayya e Bahadur, 1968); glândulas estipulares (Van Hove e Kagoyre (1974); nectário extra-floral (Dave e Patel, 1975); e glândula de resina (Curtis e Lersten, 1980). Coléteres têm sido definidos como estruturas secretoras constituídas por um eixo central alongado, formado por parênquima fundamental, circundado por um estrato epidérmico em paliçada, sendo as células epidérmicas responsáveis pela secreção (Thomas, 1991; Da Cunha e Vieira, 1997). Essas estruturas foram inicialmente, descritas em 1848, por Hanstein (apud Thomas, 1991). Curiosamente, estes não constam na classificação de estruturas secretoras, proposta por Fahn (1988); embora sejam reconhecidos como estruturas secretoras por outros autores (Esau, 1974). O termo coléter deriva do termo grego “colla”, que quer dizer cola e refere-se à secreção pegajosa que o mesmo libera (Thomas, 1991). Lersten (1974a; 1974b) caracterizou morfologicamente dois tipos de coléteres em Rubiaceae, o "dendroid" e o "brushlike", classificando o tipo mais comum (padrão) como "standard". Da Cunha (2005) subdividiu morfologicamente o tipo standard em: cilindriforme e claviforme. Para a distinção de famílias, as variações dos coléteres 16 afazem-se pouco úteis, mas em termos de gêneros e subgêneros em Rubiaceae, esta característica se torna bastante consistente (Robbrecht, 1988). De acordo com Thomas (1991), este tipo de estrutura secretora é encontrado na face adaxial de diferentes órgãos de membros de 60 famílias de Angiospermae. Robbrecht (1988) aponta que os coléteres podem ocorrer também em partes florais de Rubiaceae, Loganiaceae, Apocynaceae e outras famílias. González (1998) mostra que os coléteres de diferentes espécies da família Turneraceae estão distribuídos nos primórdios foliares. O número de coléteres e a sua distribuição nos órgãos são variáveis. Estas estruturas podem estar; cobrindo o interior da estípula e/ou do cálice, com gradação variável; na estípula podem estar localizadas na borda ou podem estar inseridos em uma fileira única na base, sendo a última a ocorrência mais freqüente. Klein et al. (2004) mostraram que os coléteres de Simira pikia se encontram distribuídos em uma linha na base da estípula enquanto o conjunto dos coléteres de S. glaziovii forma dois triângulos na base da estípula. Miguel (2004) mostrou que os coléteres em três espécies de Bathysa são distribuídos na base das estípulas. A variação de formas, que acarreta uma variação de nomenclatura, pode ser claramente notada na literatura. Robbrecht (1988) aponta que as estruturas secretoras pluricelulares que ocorrem no interior das estípulas e em outros órgãos, como encontrado em partes florais, de Rubiaceae, Loganiaceae, Apocynaceae e outras famílias de Asteridae, já foram chamadas por uma longa série de termos, como “Squamallae” por Ramayya e Bahadur (1968), "glândulas estipulares" por Van Hove e Kagoyre (1974), nectário extrafloral por Dave e Patel (1975) ou glândulas de resina por Curtis e Lersten (1980). González (1998) reconhece a variação de formas nos coléteres de Turneraceae e adiciona termos, à classificação, para os coléteres observados em gêneros de Turnera e Piriqueta. Coléteres do tipo "standard" se mostram similares em muitos aspectos , contudo, é descrita uma grande diversidade de tamanhos, formatos, grau de desenvolvimento e diâmetro relativo do eixo central além da presença ou não do desenvolvimento da constrição basal (Robbrecht, 1988; Klein, 2002; Miguel, 2004). Há, ainda, estruturas vascularizadas e outras não vascularizadas. Tal fato é discutido por Thomas (1991) e Apezzato-da-Gloria e Estelita (2000), devido a sua importância para a nutrição da estrutura. Estas variações podem apresentar valor taxonômico (Robbrecht, 1988). 17 Em relação à ultraestrutura dos coléteres, Miller et al. (1983) mostram que as células secretoras dos coléteres de Allamanda cathartica (Apocynaceae) possuem retículo endoplasmático perinuclear, numerosas mitocôndrias, vacúolos ocupando grandes áreas do citoplasma, complexo de Golgi e plastídeos. Em Bathysa gymnocarpa, há evidências de que as células secretoras dos coléteres apresentam complexo de Golgi com cisternas mais abundantes do que B. stipulata (Miguel, 2004). Idioblastos cristalíferos e taníferos foram observados no eixo central de coléteres de Psychotria kirkii (Rubiaceae) (Thomas e Dave, 1989) e P. nuda (Moraes et al., 2005). Tem sido proposto que a função protetora dos coléteres é conferida pela sua secreção (Mueller, 1985; Williams et al., 1982; Ramayya e Bahadur, 1968). De acordo com estes autores, o exsudato protege o meristema, que fica, algumas vezes, completamente coberto por secreção. Em espécies de Rubiaceae, esta secreção pode estar envolvida na formação de nódulos de bactérias (Horner e Lersten, 1968). No entanto, não é elucidada ainda a nodulação nestas plantas. Paralelamente ao desenvolvimento do meristema apical, os coléteres tendem a senescer. Durante este processo, sua coloração torna-se gradativamente marrom. O processo de senescência inicia-se na epiderme da parte apical da estrutura e finda na basal central. A lignificação, intimamente ligada ao processo de senescencia dos coléteres, é um fenômeno centrípeto iniciando-se pelas paredes celulares da epiderme (Thomas e Dave, 1989; Miguel, 2004). A anatomia dos coléteres durante o processo de senescência encontrase parcialmente descrita. No entanto, persiste a lacuna quanto às descrições ultraestruturais. 1.6 Aspectos subcelulares do processo de secreção vegetal A secreção é um fenômeno complexo que, usualmente, envolve síntese, compartimentalização intracelular, liberação ou secreção propriamente dita para o apoplasto e, alternativamente, para a superfície da planta (Castro, 2000; Machado, 2000). Por isso, têm sido descritas peculiaridades intracelulares no processo de secreção. Dentre estas, Machado (2005) descreve características das células secretoras durante a secreção. Entre as organelas que mostram variações consideráveis, ao longo do processo secretor, estão os plastídios dos tricomas glandulares no gineceu de Zeyheria digitalis 18 (Bignoniaceae) (Machado et al., 1995) e os cloroplastos no parênquima secretor de Citharexylum mirianthum (Verbenaceae) (Machado, 1999). Considerando, ainda, que a secreção é um processo que envolve peculiaridades intracelulares, o estudo detalhado das células secretoras permite avaliar tanto a dinâmica do processo secretor, como fazer correlações entre a estrutura e o funcionamento de determinadas organelas envolvidas na secreção. Estruturas secretoras, como tricomas glandulares e nectários, podem combinar simplicidade estrutural com atividade secretora intensa, mostrando-se modelos adequados para a investigação de questões fundamentais da biologia celular de plantas. Dentre estas, transporte à curta distância; síntese e transporte intracelular de macromoléculas; origem de vacúolos de estocagem ou com função lisossomal (Silva e Machado 1999a; Machado, 1999). Ultraestruturalmente, estas células possuem características particulares. Segundo Fahn e Shimony (1998), as células secretoras de Fagonia mollis (Zygoplhylaceae) possuem núcleo relativamente grande e numerosas mitocôndrias modificadas. Nas células secretoras dos ductos de goma de Lannea coromandelica (Anacardiaceae), o citoplasma é rico em ribossomos, retículo endoplasmático rugoso, mitocôndria, vacúolos, corpos paramurais e gotas lipídicas e em algumas etapas de sua diferenciação foram encontrados complexos de Golgi (Venkaiah, 1992). Werker e Kislev (1978) argumentam que a produção de secreção, em tricomas secretores da raiz de Sorghum (Poaceae), está relacionada com o complexo de Golgi. 1.6.1 Sistema endomembranar O retículo endoplasmático é uma projeção do envelope nuclear para as regiões corticais da célula e pode ser subdividido em domínios funcionais distintos (Staehelin, 1997). O retículo endoplasmático é o ponto de entrada no sistema endomembranar para proteínas recém sintetizadas. Depois da remoção da seqüência sinal, por peptidases do lúmem do retículo, as proteínas mudam sua estrutura com a ajuda de chaperonas (Vitale e Denecke, 1999). Proteínas defeituosas parecem ser reconhecidas por um mecanismo de controle de qualidade, sendo transportadas para o citosol, onde são degradadas (Brandizzi et al., 2003). A glicosilação de proteínas tem um papel fundamental na entrada destas no retículo (Vitale e Denecke, 1999). Arabidopsis mutantes, defeituosas para N-glicosilação 19 ou faltando α-glicosidase I, são letais no embrião (Lukowitz et al., 2001; Gillmor et al., 2002; Boisson et al., 2001). Proteínas residentes do retículo são retidas nessa organela ou recicladas de volta do complexo de Golgi (Vitale e Denecke, 1999). O retículo endoplasmático segrega, ainda, compartimentos de membrana para seqüestro de lipídios ou proteínas, alguns desses evoluem para vacúolo de estocagem (Chrispeels e Herman, 2000). O complexo de Golgi é conhecido desde 1843, quando foi descrito por Camillo Golgi. Em microscopia eletrônica de transmissão, foi visualizado nos anos 50. Essa organela não foi alvo de muitos estudos nas décadas seguintes, contudo, a partir da década de 90, foi redescoberta (Mollenhauer e Morré, 1994). Em células vegetais, é formado por várias pequenas pilhas de cisternas, reconhecidas, individualmente, também pelo nome de dictiossomos (Dupree e Sherrier, 1998). A quantidade dessas pilhas pode variar muito de acordo com a função da célula em questão. A variação é notada não somente na quantidade das cisternas, mas também na sua morfologia. Essas pilhas são polarizadas individualmente, diferenciando as faces cis e trans. Essa organela é extremamente dinâmica e móvel no citoplasma da célula, principalmente, no inicio do processo de divisão celular (Nebenführ e Staehelin, 2001) tendo grande importância na síntese de precursores de parede celular. Dentre as muitas funções atribuídas ao complexo de Golgi se destacam, além da síntese de polissacarídeos da parede celular, a modificação de proteínas, como, por exemplo, proteínas de estocagem ou enzimas, que serão subseqüentemente distribuídas para outras partes da célula como o vacúolo e a membrana plasmática. Para exercer com precisão essas funções, a organela possui compartimentalização bioquímica, sendo as cisternas da face cis diferentes das da face trans. Pakelka e Robinson (2003) confirmam a existência de relação estrutural e funcional do complexo de Golgi com o retículo endoplasmático. 1.6.2 Transporte de substâncias em células vegetais O movimento intracelular de moléculas é de vital importância na manutenção da identidade e funcionalidade dos compartimentos intercelulares (Jürgens, 2004). O transporte e endereçamento de proteínas para os vários compartimentos foram estudados extensivamente em células vegetais (Jürgens, 2004). Estes estudos permitiram a 20 identificação de várias seqüências de sinais de endereçamento. Essas seqüências são especificas não só para organelas, mas também para seus subcompartimentos. O tráfego vesicular entre retículo endoplasmático, complexo de Golgi, vacúolo e membrana plasmática é complexo, podendo seguir muitas vias diferentes do transporte das vesículas (Hawes et al., 1999). Diferentes tipos de estresse podem afetar essas vias e modificá-las de várias formas. Estes efeitos podem ser suprimidos por mecanismos celulares (Levine, 2002). Os mecanismos de tráfego vesicular em plantas têm se demonstrado semelhantes aos de mamíferos e fungos com respeito ao transporte, ao ancoramento e a fusão vesicular. Contudo, moléculas únicas de vegetais também controlam esse fenômeno (Ueda e Nakano, 2002). Estudos mostram o envolvimento do gradiente de concentração de íons, especialmente cálcio e cloro, no processo de exocitose de células animais (Marengo, 2005) e em células vegetais (Zonia et al., 2001). 1.6.3 Morte celular programada em plantas O processo de morte celular programada (MCP) muda a ultraestrutura e dinâmica da célula vegetal (Doorn e Woltering, 2005). Durante esse processo as vias metabólicas são desviadas; ou seja, toda a maquinaria celular que funciona para a manutenção celular, e/ou processos secretores, passa ser direcionada para suprir as necessidades do processo de MCP (Rose et al., 2006). Tal processo é de fundamental importância no desenvolvimento, resposta de defesa contra patógenos (McCabe e Leaver, 2000) e senescência (Doorn e Woltering, 2005). De um modo geral, dois tipos de MCP são predominantes: autofagia e apoptose. Há, ainda, uma forma incomum, chamada de morte celular programada não-lisossomal (Doorn e Woltering, 2005). Uma das abordagens na diferenciação entre autofagia e apoptose é baseada na ultraestrutura das células durante o processo e pelas organelas que estão envolvidas. Resumidamente, autofagia é um processo altamente regulado, durante o qual materiais citoplasmáticos são envolvidos por vesículas, constituídas de dupla membrana, que são então destinadas aos vacúolos ou lisossomos para degradação (Levine e Klionsky, 2004). 21 Em linhas gerais, a autofagia é um mecanismo pelo qual a célula degrada parte ou o citoplasma completo, exceto núcleo (Aubert et al., 1996). Esse processo pode ocorrer em todos os organismos eucariontes, seja como um processo natural, no curso do desenvolvimento ou em reposta aos estresses ambientais, como, por exemplo, depleção de nutrientes (Rose et al., 2006). A via do processo autofágico envolve o seqüestro de porções do citoplasma por endomembranas, formando então o vacúolo autofágico. Em seguida, ocorre a degradação das estruturas capturadas por essas endomembranas, ao invés de sua reciclagem para manter as funções essenciais e homeostase celular (Rose et al., 2006). Podem existir variações, e outras classificações para o processo de autofagia em plantas, como a micro e macroautofagia (Doorn e Woltering, 2005). A apoptose tem sido alvo de algumas revisões recentes (Yoshida et al., 2005; Doorn e Woltering, 2005; Selga et al., 2005). Três características principais podem ser observadas durante esse processo: fragmentação nuclear; formação de corpos apoptóticos; e engolfamento e degradação dos corpos apoptóticos nos lisossomos de outras células (Clarke, 1990). Outras características também são marcantes na apoptose como, por exemplo, a participação das caspases e a condensação da cromatina com degradação do DNA (Doorn e Woltering, 2005). Já que a apoptose inclui a degradação dos corpos apoptóticos em outras células, alguns autores argumentam que a apoptose verdadeira não ocorre em plantas (Doorn e Woltering, 2005). Alguns exemplos de MCP em células de mamíferos mostram uma morfologia intermediária. Em algumas células, o processo autofágico precede a formação dos corpos apotóticos (Doorn e Woltering, 2005). O processo de morte celular programada menos comum é a morte celular programada não lisossomal, que se diferencia das demais por não envolver lisossomos. A célula se mata, aparentemente, pela inibição das principais vias biossintéticas, pela desestabilização das membranas, ou por vias ainda não elucidadas (Doorn e Woltering, 2005). Esse processo também é chamado morte celular programada necrosis-like (Doorn e Woltering, 2005). Por ser menos freqüente, pouco se sabe sobre esse processo. 22 1.7 Parede periclinal externa A parede periclinal externa é a fronteira entre a planta e o ambiente. Esta estrutura é formada por macromoléculas e constitui uma barreira ao fluxo bidirecional em grande parte dos tecidos de revestimento nas plantas. A parede periclinal externa tem sido relacionada também à proteção contra radiação, danos mecânicos, patógenos e pragas. A variedade de funções dessa estrutura tem sido associada à sua estrutura, complexidade e diversidade. A distribuição de seus componentes, usualmente, é heterogênea. A nomenclatura de seus estratos tem sido baseada nesta peculiaridade. Tenberge (1992) propõe que a parede celular é dividida em cera epicuticular e três camadas distintas: a cutícula propriamente dita, as camadas cuticulares, divididas em camada reticulada e camada arborescente, e camada rica em polissacarídeos. Outros autores também utilizam esta nomenclatura (Barros e Miguens, 1998; Klein et al., 2004 e Miguel, 2004, Moraes et al., 2005). A composição e estrutura das paredes celulares vegetais podem variar durante o crescimento e a diferenciação da célula e em resposta a fatores ambientais (Barros e Miguens, 1998; Marques, 1998). No entanto, a morfologia e fisiologia, sobretudo os mecanismos de secreção, da parede periclinal externa têm sido considerados espécie-específicas. 1.7.1 Passagem de moléculas pela parede periclinal externa O transporte de moléculas pela parede periclinal externa ainda não foi elucidado. A maioria dos trabalhos, que se referem de alguma forma a passagem de moléculas pela parede periclinal externa, utilizou microscopia eletrônica de transmissão, e apenas citam a presença ou ausência de cutícula. Quanto ao mecanismo de secreção, Ascensão e Pais (1998) relatam o acúmulo da secreção no espaço periplasmático. A secreção passa pela parede celular e se deposita em um espaço subcuticular, formado pelo deslocamento da cutícula. Esse espaço recebe o nome também de espaço subcuticular (Possobom e Machado, 2005). Kim e Mahlberg (1997), utilizando técnicas de imunolocalização, marcaram o Tetra-hidro-canabinol na parede periclinal externa de tricomas criofixados, reafirmando a função dessa cavidade na passagem de substâncias pela parede. Os mesmos autores descreveram a formação de vesículas secretoras em tricomas de espécies da família 23 Cannabacea (Kim e Mahlberg, 2003). Mesmo assim ainda ficam duvidas com relação a esta passagem. Mahlberg e Kim (1992) e Kim e Mahlberg (1995 e 2000) sugerem que, em tricomas glandulares de Cannabis, a passagem da secreção através da parede periclinal externa é feita através de “cavidades secretoras” na parede que servem para a saída do exsudado após toda a passagem pelo tráfego de vesículas, sendo a parede celular o meio de exteriorização da secreção. Alguns aspectos dessa passagem ainda permanecem obscuros, pois nenhum estudo mostrou de maneira convincente todo esse processo em células de estruturas secretoras de vegetais. Estruturas semelhantes a essas “cavidades secretoras” forma descritas na parede periclinal externa dos coléteres de B. nicholsonii (Miguel, 2004). Estas estruturas tiveram a sua formação descrita (Miguel et al., 2005) e aparentemente estão envolvidas no processo de tráfego da secreção pela parede periclinal externa. No entanto, Jefree (1996) aponta outros mecanismos para este tráfego, dentre os quais, microcanais perpendiculares ao maior eixo da parede periclinal e acúmulo da secreção nas camadas cuticulares da parede celular. Esse acúmulo acaba por levar a ruptura física dessa camada. 1.8 Exsudatos vegetais: Características gerais e propriedades Os exsudatos vegetais, que são classificados de acordo com sua composição química, têm uma ampla distribuição entre as famílias de vegetais superiores chamando a atenção de muitos pesquisadores, não só pela sua função na planta, como também pelo seu aproveitamento econômico. Os materiais secretados podem exercer várias funções na própria planta e, após serem eliminados das estruturas secretoras, geralmente não são reutilizados nos processos metabólicos do organismo produtor (Fahn, 1979). Diferentes espécies exsudam diferentes produtos, como pode ser visto ao se comparar os trabalhos de Curtis e Lersten (1974; 1980) e Durkee et al. (1984), em que o exsudato, nas espécies estudadas, é classificado como uma resina. Mueller (1985) classifica o exsudato de Alstonia scholaris como sendo semelhante ao látex. Os trabalhos de Dexheimer e Guenin (1981) e Horner e Lersten (1968) em Psychotria bacteriophila (Rubiaceae) e Miller et al. (1983) em Psychotria kirkii (Rubiaceae) mostram que os coléteres destas espécies secretam substâncias mucilaginosas. Ramayya e Bahadur (1968) caracterizaram o exsudato do coléter de Allamanda cathartica (Anacardiaceae) como uma substância parda e 24 transparente, considerada como resina de grandes polímeros. Ao investigar esta mesma secreção, Thomas e Dave (1989) não encontraram aminoácidos, no entanto, acharam alguns açúcares (glicose e rhamanose) e caracterizaram seus elementos químicos majoritários: Na (25 %), Fe (14 %) e Zn (13 %). A presença de proteínas na secreção dos coléteres foi identificada por Klein et al. (2004). Kristen (1976) aponta a necessidade de análises bioquímicas para determinação da composição de mucilagens. O uso dos exsudatos vegetais na medicina popular é bastante amplo. Por isso, a etnofarmacologia pode crescer bastante nos últimos anos. O exsudato de Plectranthus (Lamiaceae) é utilizado em casos de dores de cabeça, dores de garganta, queimaduras, dermatite, náuseas e, até, picadas de escorpião (Riviera Nuñez e Óbon de Castro, 1992 e Bown, 1995). O extrato foliar de Piper regnellii (Piperaceae) é utilizado no tratamento de dores, infecções, febres reumáticas já que apresenta uma forte propriedade analgésica (Di Stasis, 1987 apud Silva e Machado, 1999b). Muitas espécies de Plectranthus são cultivadas como plantas ornamentais e como fontes de óleos essenciais utilizados na culinária, pelo seu sabor (Ascenção et al., 1999). Existem registros do uso da secreção dos coléteres de Bathysa como cicatrizante (Sr. Walter Silva, comunicação pessoal). A utilização em medicina popular dos exsudatos vegetais sugere o potencial terapêutico destas secreções. 25 2. OBJETIVOS 2.1 Objetivo geral Caracterizar a anatomia e a ultraestrutura dos coléteres de Bathysa nicholsonii K. Schum., bem como analisar o perfil protéico da secreção e sua ação antifúngica. 2.2 Objetivos específicos ü Descrever a anatomia e ultraestrutura de coléteres de B. nicholsonii; ü Caracterizar morfológica e temporalmente as células da epiderme secretora dos coléteres de B. nicholsonii; ü Caracterizar citoquimicamente as células da epiderme secretora de coleteres de B. nicholsonii; ü Investigar preliminarmente a presença de proteínas na secreção dos coléteres de B. nicholsonii; ü Examinar a atividade antifúngica do extrato protéico da secreção dos coléteres de B. nicholsonii; 26 3. MATERIAL E MÉTODOS 3.1 Área de coleta O material foi coletado na Reserva Biológica de Tinguá, com licença concedida pelo IBAMA (171/2003). Esta reserva localiza-se na porção central da cadeia da Serra do Mar, no trecho compreendido pelas serras do Tinguá, de São Pedro e do Macuco (22º28’ e 22º39’ S, 22°35' e 43º34’ W), municípios de Nova Iguaçu e Duque de Caxias. Os desníveis altimétricos da reserva variam entre 220 e 1.600 metros, destacando-se o maciço do Tinguá como a maior elevação. O solo é representado pelos tipos Cambissolos, Latossolos e Podzólicos. A temperatura média anual é de 21,6 °C e pluviosidade média anual de 2.268 mm. A vegetação local é reconhecida como Floresta Ombrófila Densa. A Reserva Biológica de Tinguá foi criada pelo Decreto de Lei Federal número 30.97.780 de 1989; sendo considerada Reserva de Biosfera pela Unesco em 1992. É a maior reserva florestal do Estado do Rio de Janeiro e, sofre sérios problemas com caça predatória, despejo de lixo, grileiros e extrativismo, representado principalmente pela presença de palmiteiros e madeireiros (SOS Mata Atlântica, 2002). 3.2 Material botânico Ápices caulinares de indivíduos adultos, incluindo as estípulas e o meristema apical caulinar, de Bathysa nicholsonii K. Schum. (Rubiaceae) foram coletados com o auxílio de podão. Amostras testemunhas foram depositadas no Herbário do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. As estípulas foram dissecadas dos ápices caulinares com o emprego de bisturis e pinças. Para microscopia, este material foi fixado quimicamente no local de coleta; e, para extração da secreção as estípulas foram levadas ao laboratório, acondicionadas de maneira a preservar as estruturas a temperatura ambiente, para os procedimentos. Na identificação das estípulas, seguiu-se descrição proposta por Klein (2002); o par de estípulas mais próximo ao meristema apical caulinar foi denominado estípulas do primeiro nó e o par seguinte, como do segundo nó. 27 3.3 Microscopia 3.3.1 Microscopia Óptica Fragmentos da base da estípula, contendo coléteres, foram fixados em solução aquosa contendo glutaraldeído 2,5 %, formaldeído 4,0 % diluídos em tampão cacodilato de sódio 0,05 M, pH ~ 7,2, sob temperatura ambiente, durante 2 horas. Após serem lavados por 45 minutos no mesmo tampão, os fragmentos foram pós-fixados em solução aquosa contendo tetróxido de ósmio 1,0 % diluído em tampão cacodilato de sódio 0,05 M, pH ~ 7,2, temperatura ambiente, durante 1 hora na ausência de luz. Após três lavagens de 45 minutos no mesmo tampão, os fragmentos foram submetidos à série cetônica ascendente [50 %, 70 %, 90 %, 100 % (3X)], durante 1 hora em cada etapa, para desidratação. Então, os fragmentos foram infiltrados com resina epóxi (Epon Polibed), utilizando-se serie crescente de resina em propanona. A polimerização da resina foi realizada a 60 ºC. Cortes semifinos, aproximadamente 1 µm de espessura, foram obtidos com navalhas de vidro em ultramicrótomo (REICHERT ULTRACUT-S®). A coloração foi realizada com solução aquosa de azul de toluidina 1,0 % acrescido de 0,1% de Bórax. Lâminas permanentes foram montadas com Entellan®. A documentação analógica foi realizada em microscópio óptico Axioplan ZEISS (Oberkohen, Germany), utilizando-se filme fotográfico Kodalit, 35 mm, 32 ASA (Kodak, USA); dados digitais foram obtidos no mesmo equipamento, utilizando-se câmera digitalizadora Hamamatsu C3077 e software Analysis®- LINK/ISIS/ZEISS (Oxford, UK). 3.3.2 Histoquímica Os testes histoquímicos da estípula foram realizados em cortes a mão livre de material recém coletado. A documentação analógica e digital foi realizada conforme descrito anteriormente. Carboidratos (hidroxilas vicinais) Cortes a mão livre de ápices caulinares foram lavados em água destilada e imersos em solução aquosa de ácido periódico de Schiff 1,0%, durante 5 minutos a temperatura ambiente. Após lavagem em água destilada, estes foram imersos em reagente de Schiff 28 durante 15 minutos, a temperatura ambiente, sendo então, lavados em água destilada, durante 5 minutos a temperatura ambiente (Hotchkiss, 1948). Proteínas totais Proteínas totais foram evidenciadas em cortes expostos a solução aquosa de Azul Brilhante de Coomassie G 0,25 % contendo 5 % de ácido acético, durante trinta minutos. Este procedimento foi seguido de lavagem em solução aquosa de ácido acético 5 % por três vezes, durante 5 minutos em cada etapa. Lâminas permanentes foram obtidas com glicerina 50%. 3.3.3 Microscopia Eletrônica de Transmissão Para microscopia eletrônica de transmissão foram utilizados os mesmos procedimentos que para microscopia óptica, exceto a ultramicrotomia e a contrastação. Cortes ultrafinos, com aproximadamente 70 nm de espessura, foram obtidos, utilizando-se navalha de diamante (Diatome®) em ultramicrótomo (REICHERT ULTRACUT-S®); os cortes, foram coletados em grades de cobre de 300 mesh. A contrastação foi realizada em solução aquosa saturada de acetato de uranila, durante 40 minutos, seguida de lavagem em água destilada e de 5 minutos em citrato de chumbo 1% (Reynolds, 1963). A documentação analógica foi realizada em microscópio eletrônico de transmissão (ZEISS EM 900), operando a uma aceleração de voltagem de 80 kV, em chapas fotográficas, 6” x 9”, Kodak 4489. 3.3.4 Citoquímica As características ultraestruturais evidenciadas pelos métodos citoquímicos empregados foram documentadas como descrito no tópico anterior, relativo a microscopia eletrônica de transmissão. Carboidratos (hidroxilas vicinais) Para detecção de hidroxilas vicinais, predominantemente carboidratos, foi utilizado o método de Thiéry (1967), utilizando-se tiosemicarbazida-proteinato de prata (PATAg). Cortes ultrafinos, das amostras processadas para microscopia eletrônica de transmissão, 29 foram coletados em grades de ouro de 300 mesh e tratados com solução aquosa de ácido periódico 1 %, durante 30 minutos. Após lavagem em água destilada, as grades foram sobrepostas em gotas de solução aquosa de tiosemicarbazida 1 % contendo ácido acético a 10 %, durante 72 horas; segue-se uma série decrescente de ácido acético (10 %, 5 %, 2 % em água destilada). Então, os cortes ultrafinos foram expostos à solução aquosa de proteinato de prata 1 %, durante 30 minutos, seguindo-se lavagem em água destilada. O controle foi realizado pela exclusão do tratamento com solução aquosa de ácido periódico. Detecção de lipídios insaturados Objetivando detectar lipídios insaturados foi utilizada a técnica de tetróxido de ósmio-imidazol (Angermüller e Fahimi, 1982). Para tanto, fragmentos da base da estípula, contendo coléteres, foram fixados em uma solução aquosa contendo glutaraldeído 2,5 %, formaldeído 4,0 % diluídos em tampão cacodilato de sódio 0,05 M, pH ~ 7,2, em temperatura ambiente, durante 24 horas. Posteriormente, imersos em tampão imidazol 0,05 M, pH 7,2, temperatura ambiente, durante 24 horas, sendo, então, pós-fixados em solução aquosa de tetróxido de Ósmio 1,0 % e tampão imidazol 0,05 M, por 72 horas, na ausência do espectro visível da radiação eletromagnética. Em seguida, as amostras foram lavadas no mesmo tampão e, posteriormente, em tampão cacodilato de sódio 0,05 M As etapas subseqüentes foram as mesmas utilizadas para análise por microscopia eletrônica de transmissão. No material controle, o tampão imidazol 0,05 M foi substituído por tampão cacodilato de sódio 0,05M. Detecção de moléculas orgânicas insaturadas Fragmentos, após a fixação descrita anteriormente, foram tratados com solução aquosa contendo tetróxido de ósmio 1,0 % e iodeto de potássio 1,0 % diluídos em água destilada, durante 48 horas na ausência do espectro visível da radiação eletromagnética, a temperatura ambiente. Em seguida, as amostras foram lavadas, por duas vezes, em solução aquosa de iodeto de potássio 1,0% diluído em água destilada, durante 1 hora na ausência do espectro visível da radiação eletromagnética, a temperatura ambiente (Locke e Huie, 1983). Seguiram-se, então, os procedimentos para microscopia eletrônica de transmissão, descrita anteriormente. O controle foi realizado pela exclusão do iodeto de potássio. 30 3.3.5 Microscopia Eletrônica de Varredura Foram utilizados para a microscopia eletrônica de varredura os procedimentos para microscopia eletrônica de transmissão como descrito anteriormente. Após a desidratação, as amostras foram secas pelo método do ponto crítico de CO2 utilizando o aparelho CPD-030 BAL-TEC (Liechtenstein). Fragmentos secos de estípula e ápices contendo coléteres foram aderidos com fita adesiva de carbono dupla-face (3M) e cola de carbono em suportes adequados. As amostras foram cobertas por sputtering com uma camada de aproximadamente 20 nm de ouro, utilizando-se aparelho SCD-050 BAL-TEC (Liechtenstein). A observação e documentação digital (512X480 TIFF) foram realizadas em microscópio eletrônico de varredura (DSM 962 – ZEISS), a uma aceleração de voltagem de 15 kV ou 25 kV. 3.3.6 Microanálise de Raio-X (Energia Dispersiva de Raios-X) A análise qualitativa dos elementos químicos constituintes presentes na secreção dos coléteres e das estípulas foi realizada pela detecção da energia dispersiva de Raios-X em microscopia eletrônica de varredura. Estípulas, de ápices caulinares recém coletados, foram congeladas em nitrogênio líquido, por aproximadamente um minuto e, em seguida, liofilizadas. Pequenos fragmentos de estípula foram aderidos em suportes em fita adesiva de carbono dupla-face e com adesivo líquido a base de carbono e cobertos com carbono em aparelho XCD-010 BAL-TEC (Liechtenstien). A análise qualitativa e o mapa de distribuição dos elementos foram realizados em microscópio eletrônico de varredura DSM 962 ZEISS (Oberkohen, Germany), acoplado a detector de raios-x de silício/lítio OXFORD Microanalysis Group (Oxford, UK) com resolução nominal de 138 eV, operando nas condições apresentadas abaixo (Quadro 1). Os resultados foram analisados em software LINK-ISIS, OXFORD Microanalysis Group (Oxford, UK). 31 Quadro 1 Microscópio Eletrônico de Varredura DSM 962 ZEISS EDX - condições de operação Parâmetro Configuração Aceleração de voltagem 30 KeV (SE) Distância de trabalho 12-16 mm Detector de Si/Li 1024 canais 0 - 15 KeV Tempo de captação da microanálise 300 seg Janela do detector UTW Calibração EDX 99.9 Cu MEV Imagens SE e BSE 3.4 Detecção de proteínas totais na secreção (SDS-PAGE) A secreção foi analisada com relação ao perfil protéico utilizando o método de eletroforese em gel de poliacrilamida na presença de SDS (SDS-PAGE) em sistema de gel descontínuo como descrito por Laemmli (1970). Para tanto, aproximadamente 70 ápices caulinares, que se encontravam visualmente mais cobertos pela secreção, tiveram as estípulas dissecadas. A parte interna das estípulas foi lavada em solução contendo tampão Tris-HCl 0,1 M e Triton X-100 0,1 %, pH 8,0, para extrair a secreção. As amostras resultantes foram filtradas em papel de filtro e submetidas à precipitação de proteínas com solução aquosa de sulfato de amônio 90 %. Após 16 horas do tratamento de precipitação, as amostras foram centrifugadas a 10.000 g, por 30 minutos sendo o sobrenadante descartado e o precipitado diluído em água destilada. A suspensão foi então dialisada com membrana de diálise Merck, a 4 oC por 48 horas e, posteriormente liofilizado. Para eletroforese, as proteínas liofilizadas, extraídas de 1 mL de secreção foram ressuspendidas em 100 µL de tampão de amostra (Tris-HCl 0,1 M em pH 8,0 contendo SDS 2 %, sacarose 10% e azul de bromofenol 0,025 %) com e sem a presença de 5 % de βmercaptoetanol. As amostras foram aquecidas por 5 min a 100 °C e centrifugadas a 16 000 rpm por 3 min. Após este procedimento, 25 µL das amostras foram aplicadas no gel 15 % 32 de concentração. A corrida do gel se processou a uma corrente constante de 100 V por 2 horas. A coloração foi realizada por imersão em solução corante de Azul brilhante de Coomassie R 0,05 %, durante 1 hora. Após este período, o corante foi retirado e o gel mantido em uma solução descorante de ácido acético glacial 10 %, metanol 20 % em água destilada, até visualização das bandas protéicas. 3.5 Detecção de glicoproteínas Para a detecção de glicoproteínas, os procedimentos foram realizados de acordo com as recomendações do fabricante do kit de detecção de glicoproteínas, SIGMA ALDRICH. Os géis obtidos foram fixados em metanol 100 %, durante 30 minutos, seguindo-se de lavagem em água mili-Q, durante de 20 minutos, por duas repetições. Em seguida, o gel foi exposto à solução de oxidação (acido periódico), durante 30 minutos. Após lavagem em água mili-Q, durante de 20 minutos, por duas vezes, a coloração do gel foi realizada com solução corante por 2 horas, na ausência do espectro visível da radiação eletromagnética. Subseqüentemente, os géis foram expostos à uma solução aquosa de redução (metabisulfito de sódio) e estocados em solução aquosa de acido acético 5 % por 12 horas. A documentação fotográfica foi realizada com câmera digital SONY P-63, com 3,2 megapixels/polegada2. 3.6 Detecção de atividade antifúngica no extrato total da secreção Para o ensaio de atividade antifúngica do extrato total da secreção, amostras de fungos filamentosos fitopatogênicos foram retirados de culturas mantidas no Laboratório de Fisiologia e Bioquímica de Microrganismos. Foram inicialmente colocados para crescer em placas de Petri contendo o meio ágar Saboraud durante 10 dias a temperatura ambiente. Após esse período de crescimento, 10 mL de solução salina estéril de 0,15 M foi vertida sobre as placas e para a liberação de esporos foi utilizada uma alça de Drigalski. Os esporos extraídos foram recuperados e quantificados em câmara de Neubauer. Para o ensaio de atividade antifúngica do extrato total da secreção amostras dos fungos C. musae, C. lindemutianum e F. oxysporum, mantidos no Laboratório de Fisiologia e Bioquímica de Microrganismos, foram inoculados em meio sólido ágar Sabouraud em 33 placas de Petri, durante dez dias, a temperatura ambiente. Após este período, 10 mL de solução salina estéril de 0,15 M foi vertida no recipiente e para a liberação de esporos foi utilizada uma alça de Drigalski. Os esporos extraídos foram recuperados com uma pipeta e quantificados em câmara de Neubauer. A germinação foi determinada através da inoculação de esporos em meio líquido, 1x104 esporos/200 µL de meio de cultura Saboraud, contendo 250 µg/mL de proteínas do extrato total da secreção. O ensaio foi realizado em placas de cultura de células de 96 poços, a temperatura de 28 ºC, por um período de 60 h. O crescimento micelial foi determinado por densidade óptica com leitura de 6 em 6 h em um leitor de ELISA a 600 nm. Todo o ensaio foi feito sob condições estéreis em capela de fluxo laminar e em triplicatas (Broekaert et al., 1990). 34 4. RESULTADOS Os exemplares coletados de Bathysa nicholsonii na Reserva Biológica de Tinguá mostraram poucos sinais de herbivoria nas estípulas no ápice caulinar (fig. 1A). Nas estípulas, que medem aproximadamente 5 cm (fig. 1C e 1D) a herbivoria foi menor que nas folhas. Quando as estípulas são destacadas do ápice caulinar é possível identificar, macroscopicamente, os coléteres (fig. 1E e 1F). Estas numerosas estruturas ocorrem distribuídas na forma de dois triângulos na base da face adaxial (fig. 1E), contornando o primórdio foliar do nó subseqüente. Ao destacar as estípulas, observou-se que a secreção produzida pelos coléteres, freqüentemente, se apresentava translúcida ou raramente amarelada e cobria as estruturas do ápice caulinar. Após exposição ao ambiente, esta secreção torna-se vítrea e friável. A secreção encontrada no ápice caulinar dificultou a separação das estípulas devido a sua viscosidade. Sob estereomicroscópio, coléteres caracterizavam-se por formato cilíndrico, superfície lisa e coloração uniformemente amarela brilhante (fig. 1F). Alguns coléteres apresentavam ápice com coloração amarronzada, sugerindo a sua senescência. A microscopia eletrônica de varredura confirmou que os coléteres de B. nicholsonii são estruturas cilíndricas de base estreita, às vezes de ápice afinalado, sendo este um sinal de senescência (fig. 2A) na base das estípulas. Freqüentemente, a secreção cobria parte dos coléteres (fig. 2B), sendo este um indicativo de sua abundância. Em vista frontal, as células epidérmicas apresentavam perfil retangular e superfície lisa (fig. 2 A e 2B). Em cortes longitudinais (fig. 2C) e transversais (fig. 2D) foi identificado uma epiderme unisseriada dispostas em paliçada, e o eixo central parenquimático. Na região de ocorrência dos coléteres na estípula, foram identificados tricomas próximos a estas estruturas (dado não mostrado). Em microscopia óptica, cortes transversais e longitudinais revelaram que coléteres de B. nicholsonii apresentavam eixo central vascularizado, formado por parênquima fundamental circundado por um estrato epidérmico em paliçada (fig. 3A-B, D-F). Estas estruturas inserem-se na estípula por uma região basal de menor diâmetro, apresentando constricção na base. Nesta foram observadas 2 ou 3 células epidérmicas isodiamétricas, seguidas de células de aspecto cilíndrico, cujo maior eixo aumenta gradativamente (fig. 3A). Em cortes longitudinais, evidenciou-se o formato cilíndrico das células 35 parenquimáticas, dispostas, tendo como referencial seu maior eixo, perpendicularmente à epiderme (fig. 3A e 3C). Neste eixo central, os feixes vasculares apresentavam-se discretos, em forma de traços vasculares. Em cortes transversais, eram observados o eixo central parenquimático e a epiderme. Estruturas grandes e osmiofílicas eram evidentes no citoplasma das células epidérmicas (fig. 3B e 3D). Em maiores aumentos, era clara a distinção entre estas estruturas e o núcleo celular, sendo também evidente a densidade citoplasmática (fig. 3C). Cortes a mão livre de material fresco não revelaram diferenças na organização tecidual dos coléteres (fig. 3E e 3F) quando comparados com material processado para microscopia (fig. 3A-3D). O método histoquímico de Schiff revelou a presença de açúcares, predominantemente no ápice das células epidérmicas e na secreção (fig. 3G e 3H); enquanto que a coloração com Azul Brilhante de Coomassie revelou proteínas com localização similar a dos polissacarídeos revelados pelo método de Schiff (fig. 3I). Em microscopia eletrônica de transmissão foi possível flagrar diferentes momentos da epiderme secretora dos coléteres. No momento secretor, as células epidérmicas encontravam-se túrgidas e com aparato ultraestrutural típico de células altamente envolvidas em processos de síntese (fig. 2 a 5); e, um segundo momento senescente, em que eram evidentes o desmantelamento do aparato celular e progressiva plasmólise (fig. 6 e 7). No primeiro momento, o citoplasma apresentou abundância de organelas, característica típica de células altamente funcionais, sendo evidente a distinção entre núcleo celular e inclusões osmiofílicas (fig. 4A). Tais inclusões são freqüentes no citoplasma e as imagens fortemente sugerem que se formam a partir de acréscimo de inclusões menores (fig. 4B). Elementos do retículo endoplasmático liso foram comumente observados lateralmente às inclusões (fig. 4B e 4C). O teste citoquímico de tetróxido de ósmio/imidazol confirmou a natureza lipídica desta estrutura (fig. 4C). O núcleo apresentou distinção clara entre eucromatina e heterocromatina, seu envelope nuclear aparece preservado (fig. 4D). Dispersos no citoplasma foram observados elementos do retículo endoplasmático rugoso dispostos concentricamente (fig. 4E) e paralelamente (fig. 4F). Retículo endoplasmático liso e rugoso e complexos de Golgi eram abundantes no citoplasma (fig 4F – 4H); enquanto que, as mitocôndrias, apresentando um grande número 36 de cristas na membrana interna, e pequenos vacúolos, com conteúdo eletronluscente, foram menos freqüentes (fig. 4F). Complexos de Golgi apresentando profícuo trans-Golginetwork (fig. 4G) e ribossomos livres (fig. 4H) também foram abundantes. Não foram observados espaços entre a parede celular e a membrana plasmática. Vesículas osmiofílicas foram identificadas emergindo de complexos de Golgi desde a região cis até a região de trans-Golgi-network, em amostras processadas por métodos de rotina para microscopia eletrônica de transmissão (Fig. 5A). A proximidade de elementos do retículo endoplasmático rugoso (fig. 5B – 5D) e de extremidades dilatadas destas estruturas com a membrana celular foi identificada (fig. 5B). No entanto, figuras de fusão de membrana do retículo endoplasmático rugoso com a membrana celular não foram observadas. Fusões de membrana de grandes vesículas com a membrana plasmática, e conseqüente extravasamento de seu conteúdo para o apoplasto, foram identificados (fig. 5F). Plastídios (fig. 5E) e retículo endoplasmático liso (fig. 5F) foram abundantes. Um marco da transição do momento de síntese para o de senescência é o surgimento de um espaço entre a membrana celular e a parede celular (fig. 5E e 5F). No momento senescente era evidente a gradativa desestruturação citoplasmática paralelamente à plasmólise. A principal evidência da desestruturação citoplasmática era a degradação do sistema de membranas das organelas. No início deste processo, determinadas organelas, como complexo de Golgi e retículo endoplasmático (fig. 6A), podiam ser identificadas apresentando membranas fragmentadas. Inclusões lipídicas de diferentes diâmetros eram freqüentes (fig. 6A). O núcleo celular era identificável, porém apresentando-se parcialmente degradado, com discreta diferenciação entre eucromatina e heterocromatina; o envelope nuclear apresentava-se estruturalmente alterado (fig. 6B). Em outros casos, era perceptível a diferenciação entre eucromatina e heterocromatina (fig. 6C). Núcleos celulares condensados não foram identificados. As membranas dos plastídios também se encontravam desorganizadas (fig. 6B). A degradação citoplasmática avançou paralelamente à plasmólise (fig. 6C e 6D). Em áreas destas células, não foram observadas membranas estruturadas, exceto as do envelope nuclear (fig. 6C). Endomembranas com morfologia atípica foram identificadas (fig. 6E), as quais se assemelhavam a elementos do retículo endoplasmático. Mitocôndrias puderam ser identificadas, porém apresentando diferentes níveis de desorganização de suas membranas (fig. 6F e 6G) e matriz condensada 37 (fig. 6G). Finalmente, o citoplasma se apresentava praticamente degradado, com grandes vacúolos, e não justaposto à membrana (fig. 7A e 7B). Ausência de limites celulares, ruptura dos grandes vacúolos (fig. 7A e 7B), debris eletrondensos (fig. 7C) e estruturas que morfologicamente podiam ser inferidas como mitocôndrias (fig. 7C), e retículo endoplasmático rugoso (fig. 7D) evidenciam o término da degradação celular. De forma assincrônica em relação aos fenômenos citoplasmáticos, foi possível identificar diferentes fases de diferenciação da parede periclinal externa das células das epidermes secretoras. Assim, a parede periclinal externa de B. nicholsonii apresentou três camadas morfologicamente distintas. Uma camada basal rica em polissacarídeos, uma membrana cuticular, rica em lipídios, subdividida em arborescente e reticulada, e uma fina camada de cutícula propriamente dita (fig. 8A), sendo inicialmente, estruturalmente similar à parede celular da estípula (fig. 8B). Sítios de acúmulo de secreção, presentes exclusivamente na camada basal e caracterizados por serem regiões da parede celular pobres em material fibrilar, foram identificados durante o processo de diferenciação da parede periclinal externa (fig. 8C). Estes sítios apresentaram-se fortemente marcados pelo método do iodeto de potássio (fig. 8D) e pelo método do tetróxido de ósmio/imidazol; enquanto que, a marcação pelo método de Thiéry foi fraca ou inexistente (fig. 8F). Em relação à parede periclinal externa, polissacarídeos, revelados pelo método de Thiéry, apresentaram forte marcação na camada basal, nas regiões arborescentes da membrana cutícula e fraca ou ausência de marcação nas outras regiões (fig. 8F). A cutícula propriamente dita não apresentou marcação por este método. O método do tetróxido de ósmio/imidazol revelou intensa marcação na membrana cuticular e nos sítios de acúmulo de secreção (fig. 8E); a camada basal e a cutícula propriamente dita foram fracamente marcadas. A marcação pelo método de iodeto de potássio revelou-se heterogênea na membrana cuticular, sendo intensa nas regiões próximas à camada basal (fig. 8D), em contraste com a fraca marcação observada na camada basal e na cutícula propriamente dita. Os sítios de acúmulo de secreção aumentam gradativa e relativamente de tamanho em relação à camada basal, sendo que, em determinadas regiões atingem a membrana cuticular (fig. 9A e 9B). Os métodos citoquímicos apresentaram resultados similares aos descritos anteriormente; ressaltando-se a intensa marcação da membrana cuticular próxima 38 à camada basal pelo método do iodeto de potássio (fig. 9C), a continuidade de marcação pelo do tetróxido de ósmio/imidazol na membrana cuticular (fig. 9D), e a marcação dos sítios de acúmulo de secreção por estes dois métodos. A partir de determinado momento, os sítios de acúmulo de secreção não eram mais individualmente identificáveis; e, as imagens fortemente sugerem a dispersão do material acumulado pela parede periclinal externa (fig. 9E). Cortes transversais aparentemente revelaram um aumento relativo da membrana cuticular em comparação com a camada basal, a qual se projetam regiões pontuais da membrana cuticular (fig. 9E – 9G). Os métodos citoquímicos revelaram o mesmo padrão de marcação, anteriormente descrito, diferindo no aumento de intensidade de marcação. Subseqüentemente, evidenciou-se desestruturação da parede periclinal externa (fig. 10A - 10D). A camada basal apresentou-se menos condensada que anteriormente (fig. 10A) e os sítios de acúmulo de secreção não foram identificáveis (fig. 10A e 10B). As projeções da camada polissacarídica, nos estratos cuticulares, tornam-se menos evidentes (fig. 10A). A marcação com iodeto de potássio revelou-se heterogênea na membrana cuticular (fig. 10B); enquanto que, o emprego de tetróxido de ósmio/imidazol foi homogênea nesta região. Finalmente, evidenciou-se a desestruturação da camada arborescente da membrana cuticular (fig. 10C), que praticamente desapareceu ao termino da diferenciação (fig. 10D). A diferenciação da parede periclinal externa das células da epiderme secretora dos coléteres foi observada. A análise qualitativa dos elementos químicos, realizados por energia dispersiva de elétrons em microscopia eletrônica de varredura (MEV/EDX), revelou predominância de potássio na parede periclinal externa dos coléteres (fig. 11A) e das estípulas (fig. 11B); enquanto que, na secreção, a predominância foi de cálcio (fig. 11C). A presença de proteínas na secreção dos coléteres, com massas moleculares variando entre 66 e 24 kDa, foi revelada por eletroforese (SDS-PAGE), havendo duas proteínas majoritárias, com massas moleculares de aproximadamente 26 e 36 kDa (fig. 12 raia A). Não foram notadas diferenças nas amostras quando submetidas ao tratamento com β-mercaptoetanol; exceto, uma única banda protéica de aproximadamente 29 kDa (fig. 12 raia B). O tratamento do gel para detecção de glicoproteínas também revelou um padrão 39 similar ao anteriormente descrito (fig. 12 raia C); inclusive, quando tratado com βmercaptoetanol (fig. 12 raia D). As curvas de crescimento de Fusarium oxysporum, Colletotrichum musae em meio sólido Sabouraud revelaram uma discreta inibição de crescimento destes patógenos quando tratados com 200 mg.mL-1 do estrato total da secreção. Esta inibição pode ser detectada no intervalo entre 50 e 60 horas de cultivo (Figura 13 A e 13 B). Em relação a C. lindemuthianum, o mesmo procedimento revelou uma significativa inibição de crescimento após 26 horas de incubação, culminando com cerca de 60 % de inibição do crescimento após 62 horas de tratamento (Figura 13 C). 40 Figura 1: Folhas, ápices caulinares e base da estípula de Bathysa nicholsonii. A – Folhas e ápice caulinar; B – Detalhe do ápice caulinar mostrando a estípula (seta); C e D – Ápices caulinares com sinais de herbivoria. E – Base da face adaxial da estípula vista ao microscópio estereoscópico. Note a distribuição dos coléteres em dois triângulos, na base das estípulas; F – Detalhe dos coléteres vistos em microscópio estereoscópico. Barras: E 0,6 cm; F - 0,5 mm. 41 Figura 2: Microscopia eletrônica de varredura dos coléteres de Bathysa nicholsonii. A – Visão da base da estípula mostrando coléteres cilindriforme embebido, em parte, na secreção; B – Detalhe dos coléteres embebidos na secreção; C – Corte longitudinal de um coléter evidenciando a superfície, a epiderme em paliçada e o eixo central parenquimático. D – Corte transversal do coléter. Note epiderme e eixo central parenquimático. Coléteres (asterisco); Secreção (triângulo); Superfície (S); Epiderme em paliçada (EP); Traço vascular (TV); Eixo central vascularizado (quadrado). Barras: A - 250 µm; B - 200 µm; C e D - 20 µm. 42 Figura 3: Microscopia óptica dos coléteres de Bathysa nicholsonii. A-D – Coloração com azul de toluidina. A – Corte longitudinal do coléter evidenciando a constricção na base (seta), eixo central e epiderme em paliçada; B e D – Cortes transversais dos coléteres mostrando estruturas lipídicas fortemente marcadas (circuladas) nas células da epiderme; C – Detalhe da epiderme mostrando estruturas fortemente marcadas (circuladas) em contraposição ao núcleo (cabeça de seta); E-I – Cortes à mão livre dos coléteres submetidos a testes citoquímicos; E e F – Controle; G e H – Amostras submetidas ao reagente de Shiff; I – Amostra submetida ao teste com Azul Brilhantes de Comassie. Note, em ambos os casos, marcação na secreção, predominantemente. Epiderme em paliçada (EP); eixo central parenquimático (quadrado). Barras: A e E - 100 µm; C - 20 µm; B, D, F , G e H - 50 µm; 43 Figura 4: Microscopia eletrônica de transmissão das células secretoras dos coléteres de Bathysa nicholsonii. A – Visão geral do citoplasma evidenciando o núcleo e as estruturas lipídicas; B – Detalhe da formação das estruturas lipídicas com contrastação de rotina; C – Detalhe das estruturas lipidicas marcadas com a técnica Ósmio-Imidazol; D – Núcleo mostrando individualização entre eucromatina e heterocromatina; E – Citoplasma mostrando retículo endoplasmático digitiforme; F e H – Detalhe do citoplasma mostrando cisternas do reticulo endoplasmático rugoso e complexo de Golgi; G – Visão geral do citoplasma. Note a grande quantidade de retículo endoplasmático e complexo de Golgi. Nu - núcleo; Lip - corpos lipidicos; Seta - corpos lipidicos; RER - retículo endoplasmático rugoso; RED - retículo endoplasmático digitiforme; CG - complexo de Golgi; V - vesícula. Barras: A - 2,5 µm; B, C e D - 0,6 µm; E e F - 0,4 µm; G - 0,12 µm; e H - 0,25 µm. 44 Figuras 5: Microscopia eletrônica de transmissão das células secretoras dos coléteres de Bathysa nicholsonii. A – Citoplasma das células epidérmicas mostrando vesículas elentrondensas do complexo de Golgi; B – Área do citoplasma onde o RE se encontra muito próximo a membrana plasmática; C e D – Detalhe da eletromicrografia anterior. Não foi observada conexão entre as duas membranas; E – Visão do citoplasma no inicio do processo de contração do citoplasma para a formação do espaço intermembranar; F – Detalhe fusão de uma vesícula com a membrana plasmática, descarregando seu conteúdo no espaço intramembranar. CG – Complexo de Golgi; RER – Retículo endoplasmático rugoso; PC – Parede periclinal externa; V – Vesícula; P – Plastídeo; EIM – Espaço intremembranar; REL – Retículo endoplasmático liso. Barras: A e B - 0,25 µm; C - 0,9 µm; D - 0,05 µm; E - 0,4 µm e F - 0,15 µm. 45 Figura 6: Microscopia eletrônica de transmissão das células secretoras dos coléteres de Bathysa nicholsonii. A – Visão geral do citoplasma no início da formação do espaço intramembranar. Note a desorganização das membranas e a presença das estruturas lipidicas, um pequeno vacúolo e retículo endoplasmático; B –Citoplasma mostrando o núcleo, sem individualização de eucromatina e heterocromatina, e plastídeos; C e D – Corte transversal das células secretoras evidenciando o espaço intramembranar e raros vacúolos; E – Citoplasma desorganizado; F e G – Mitocôndrias em estágios de degradação. EIM – Espaço intremembranar; Lip – Inclusões lipidicas; Vac – Vacúolo; PC – Parede celular; RE – Retículo endoplasmático; Nu – Núcleo; P – Plastídeo. Barras: A - 0,6 µm; B e E - 0,4 µm; C e D - 2,5 µm; F - 0,25 µm e G - 0,15 µm. 46 Figura 7: Microscopia eletrônica de transmissão das células secretoras dos coléteres de Bathysa nicholsonii. A e B – Visão geral do citoplasma das células secretoras com o citoplasma degradado. Note o grande vacúolo central, algumas vezes rompido; C – Detalhe do citoplasma degradado, em uma região onde é impossível diferenciar organelas; D – Detalhe de uma região onde é possível notar o retículo endoplasmático rugoso com grandes espaços entre as cisternas. EXT – Espaço extracelular; PPE – Parede Periclinal Externa; EIM – Espaço intremembranar; Seta – Provável sítio de ruptura do vacúolo; PC – parede celular; Cit – Citoplasma; VAC – Vacúolo; RER – Retículo endoplasmático rugoso; M – Mitocôndria. Barras: µm. 47 Figura 8: Microscopia eletrônica de transmissão da parede periclinal externa das células secretoras dos coléteres e da estípula de Bathysa nicholsonii. A – Parede periclinal externa no primeiro estágio de desenvolvimento contrastada com acetato de uranila/citrato de chumbo (rotina); B – Parede anticlinal das células secretoras; C a F – Segundo estágio de desenvolvimento da parede periclinal externa. C – Marcação de rotina. Note o inicio da formação dos sítios de acúmulo de secreção na camada polissacarídica. D – Marcação com KI. Note marcação heterogênea das camadas lipidicas e fraca marcação na camada polissacarídica. E – Marcação com Ósmio/imidazol. Note marcação homogênea nos sítios de acúmulo de secreção e camadas lipidicas. F – Marcação pelo método de Thiéry. Camada polissacaridica fortemente marcada, contudo os sítios de acúmulo de secreção não são marcados. Pol – camada polissacarídica da parede periclinal externa; Ext cut – Extratos cuticulares, subdivididos em camada reticulada (Ret) e arborescente (Arb); Cut – Cutícula propriamente dita; SAS – Sítio de acumulo de secreção. Barras: A e C – 0,15 µm; B e F – 0,09 µm; D e E – 0,4 µm. 48 Figura 9: Microscopia eletrônica de transmissão da parede periclinal externa das células secretoras dos coléteres de Bathysa nicholsonii. A-D – Terceiro estágio de diferenciação da parede periclinal externa; A e B – Marcação de rotina. Note os sítios de acumulo de secreção ocupando a maior parte da camada polissacarídica, invadindo as camadas lipidicas; C – Marcação com iodeto de potássio. Note marcação heterogênea das camadas lipidicas e fraca marcação na camada polissacarídica. Os sítios de acúmulo de secreção também são marcados; D – Marcação com Ósmio/imidazol; E-G – Quarto estágio de diferenciação da parede periclinal externa; E - Marcação de rotina. Observe as projeções das camadas polissacaridicas nas camadas lipidicas; F – Marcação com KI; G – Marcação com Ósmio/imidazol. Os padrões de marcação são os mesmos descritos anteriormente. Ext – Espaço extracelular; Cit – Citoplasma; Pol – camada polissacarídica da parede periclinal externa; SAS – Sítio de acumulo de secreção; Seta – Projeções das camadas polissacaridicas nas camadas lipidicas. Barras: A – 0,12 µm; B – 0,3 µm; C-G – 0,4 µm. 49 Figura 10: Microscopia eletrônica de transmissão da parede periclinal externa das células secretoras dos coléteres de Bathysa nicholsonii. A e B – Quinto estágio de maturação da parede periclinal externa; A – Marcação de rotina. Observe desorganização dos estratos cuticulares, especialmente na suas camadas arborescentes; B – Marcação com iodeto de potássio, revelando marcação heterogênea nos extratos cuticulares; C e D – Sexto estágio de maturação da parede periclinal externa, marcação de rotina. Desorganização, seguida de provável degradação, da camada arborescente dos estratos cuticulares Barras: A – 0,25 µm. B, C, D – 0,4 µm. 50 Figura 11: Microanálise de Raios-X (janela UTW) da parede periclinal externa dos coléteres, das estípulas e da secreção. A – Gráfico do perfil de elementos químicos da parede periclinal externa dos coléteres. Note predominância de potássio; B – Gráfico do perfil de elementos químicos da parede periclinal externa das estípulas. Note predominância de potássio; C – Gráfico do perfil de elementos químicos da secreção dos coléteres. Note predominância de cálcio. A – Janela de berílio; B e C – janela UTW. 51 Figura 12: Eletroforese das proteínas da secreção de Bathysa nicholsonii. A – Amostra da secreção sem o tratamento com β-mercaptoetanol; B – Amostra da secreção tratada com βmercaptoetanol; C e D – Marcação de Glicoproteínas nas mesmas amostras. Setas indicam bandas de proteínas majoritárias. MA- marcador de massa molecular de alto peso; albumina bovina (66KDa), ovalbumina (45KDa), anidrase carbônica (29KDa), tripsinogênio (24KDa) e α-lactoalbumina (14KDa) 52 Figura 13: Gráfico do ensaio de inibição do crescimento de esporos de fungos fitopatogênicos. A - Fusarium oxysporum; B - Colletotrichum musae; C - Colletotrichum lindemuthianum. A fração causou uma significativa inibição no fungo C. lindemuthianum, desde as primeiras horas de crescimento e nenhuma inibição significativa foi visualizada quando testamos essa fração sobre os fungos F. oxysporum e C. musae durante o decorrer da curva de crescimento na mesma concentração de 200 mg.mL-1. (▲) Controle; (■) Tratamento. 53 5. DISCUSSÃO Coléteres, presentes na base das estípulas, encontradas nos ápices caulinares vegetativos de Bathysa nicholsonii foram caracterizados estruturalmente. Este estudo contribuiu para elucidar a anatomia, a ultraestrutura e os fenômenos temporais nas células da epiderme secretora dos coléteres de B. nicholsonii. Os métodos microscópicos utilizados permitiram investigar o mecanismo de secreção, focando na extrusão desta através da parede periclinal externa das células da epiderme secretora. Foram determinadas, preliminarmente, as proteínas presentes na secreção e avaliadas as atividades antifúngicas do extrato protéico total. As estípulas apresentam capacidade fotossintética, mas sua principal função é a de proteção das folhas jovens em desenvolvimento (Fahn, 1990). Os resultados obtidos neste trabalho, para B. nicholsonii corroboram esta afirmativa generalista. O tamanho das estípulas de B. nicholsonii variou pouco, sendo as suas medidas semelhantes às citadas por Germano-Filho (1999). A morfologia e tamanho das estípulas aparentemente não influenciam na função protetora (Miguel, 2004). Os ápices caulinares de B. nicholsonii apresentavam reduzidos sinais de herbivoria, em contraste com as folhas, sendo este um indicio da eficiência das estipulas e coléteres. Nesta espécie, a secreção é viscosa tornandose vítrea após seca, podendo ser indicativos de proteção física por dificultar o acesso ao meristema apical caulinar. Por outro lado, tem sido sugerido que o aumento na produção de goma do cajueiro representa uma resposta à infecção microbiana (Marques e Xavier-Filho, 1991). Os resultados apresentados, ainda que preliminarmente, sugerem que a secreção dos coléteres de B. nicholsonii pode interferir na interação microrganismo/planta, considerando-se, ainda, a abundância nesta espécie, quanto comparada a outras espécies do gênero (Miguel, 2004). A distribuição dos coléteres nas estipulas de B. nicholsonii são compartilhadas com outros gêneros da família Rubiaceae, formando conjuntos em Simira glaziovii (Klein et al., 2004), em Rustia formosa (Miguel et al., 2002) formam dois triângulos na base da estípula, em B. gymnocarpa, B. stipulata (Miguel et al., 2005), S. pikia, S. rubra (Klein et al., 2004) e Psychotria nuda (Moraes et al., 2005) estão distribuídos em linhas na base da estípula. A 54 distribuição dos coléteres em dois triângulos na base da estípula parece ser característica diagnóstica para B. nicholsonii em relação ao gênero Bathysa (Miguel, 2004). A morfologia dos coléteres tem gerado diversas classificações. Lersten (1974a; 1974b) identificou tipos distintos de coléteres e os classificou em: dendróides, tipo escova (“brush-like”) e padrão. Thomas (1991) enriquece a classificação e acrescenta os tipos: reduzido, alado e filiforme. Da Cunha (2005) sugere os termos cilindriforme e claviforme, subdividindo o tipo padrão em duas categorias. De acordo com essa classificação, os coléteres de B. nicholsonii são denominados cilindriformes. No entanto, as características morfológicas, como a constrição da base, e anatômicas, como a vascularização no eixo central, dos coléteres desta espécie são compartilhadas com espécies do mesmo gênero (Miguel et al., 2005), de outros gêneros da família Rubiaceae, Pavetta, Neorosea e Tricalysia (Lersten, 1974a) e Simira (Klein et al., 2004), e de outras famílias, Mandevilla illustris e M. velutina, Apocynaceae (Appezzato-da-Gloria e Estelita, 2000). Estas características parecem não ser importantes para diagnóstico à família Rubiaceae, mas podem auxiliar a classificação no nível genérico; uma vez que, pequenas variações presentes em poucos casos, devem ser consideradas como caracteres taxonômicos (Lersten, 1975; Da Cunha, 2005). A definição de coléteres é controversa; principalmente, em nossa opinião, por ser baseada exclusivamente na estrutura desconsiderando outros parâmetros. Thomas (1991) sugeriu que as estruturas descritas por Mohan e Inamdar (1986) e Durkee e colaboradores (1984) como nectários extraflorais em Plumeria e Passiflora, respectivamente, sejam denominadas coléteres, devido às semelhanças morfológicas destas estruturas com coléteres. Horner e Lersten (1968) e Williams et al. (1982) enquadram coléteres como tricomas. Há estruturas denominadas de tricomas elaióforos em flores de Monttea da família Scrophulariaceae (Sersic e Cocucci, 1999) que possuem células secretoras colunares no ápice e células basais parenquimáticas e, apesar de apresentarem tênue semelhança, poderiam ser enquadradas como coléteres. Os tricomas secretores descritos por Renobales et al. (2001) poderiam ser classificados como coléteres. Objetivando aumentar o grau de precisão do tema, preconizamos uma classificação que abranja anatomia, ultraestrutura, fisiologia e composição da secreção para coléteres. Neste contexto, coléteres são estruturas secretoras, de origem epidérmica e de camadas subepidérmicas, constituídas 55 por eixo central alongado, formado por parênquima fundamental, podendo apresentar traço vascular, limitado por extrato epidérmico em paliçada, sendo as células epidérmicas responsáveis pela secreção; esta é uma estrutura de defesa constitutiva da planta. Em células secretoras, durante o processo de secreção, mudanças citoplasmáticas são comuns. No entanto, grande parte da literatura enfoca a ontogênese da estrutura secretora, desconsiderando etapas terminais, como a senescência (Unzelman e Healey, 1974; Ascenção et al., 1999; Sacchetti et al., 1999; Silva e Machado; 1999; Pascal et al., 2000; Rio et al., 2002; Rocha et al., 2002). De acordo com Unzelman e Healey (1974), o desenvolvimento de tricomas secretores de Pharbitis pode ser dividido em quatro fases: fase de crescimento, fase de atividade de secretora, fase de maturidade e fase de senescência; sendo a ultima fase, aparentemente, relegada a uma importância inferior. Estes autores fazem uma descrição sucinta, relatando a redução do número de cisternas do complexo de Golgi, vesículas cobertas e mitocôndrias, além da diminuição da fusão de membranas entre retículo endoplasmático rugoso e vesículas cobertas com a membrana plasmática. Sacchetti et al. (1999) descreve a ontogênese de tricomas glandulares de Calceolaria adscendens (Scrophulariaceae). A estrutura é descrita; contudo, nada é mencionado com relação à sua senescência. Outros estudos têm ainda um enfoque apenas morfológico, tais como: Rio et al. (2002) apenas descreve anatomicamente os coléteres foliares de Prestonia coalita, não mencionando aspectos ultraestruturais ou do seu desenvolvimento; Rocha et a. (2002) descreve vários tipos de estruturas secretoras que denomina coléteres em folhas de Hibiscus tilianceus e H. pernambucensis, utilizando microscopia óptica de campo claro. Assim, o presente trabalho caracteriza morfologicamente e ultraestruturalmente a estrutura; e, sugere etapas de desenvolvimento das células secretoras, fornecendo uma visão desde a síntese da secreção até a senescência dessa estrutura , levando em conta o conjunto dos parâmetros analisados. As células das estruturas secretoras, em geral, são caracterizadas por apresentar citoplasma denso, núcleo, numerosas mitocôndrias, retículo endoplasmático e numerosos complexo de Golgi e inúmeros vacúolos (Rachmilevitz e Fahn, 1972; Fahn, 1979; Da Cunha et al., 1998). Vários estudos mostram que o complexo de Golgi e o retículo endoplasmático são as organelas mais importantes na produção de mucilagem (Dexheimer e Guenin, 1981). Contudo, Werker e Kislev (1978) mostram que as mitocôndrias também 56 podem participar ativamente no processo de produção de mucilagem em pêlos radiculares de Sorghum. Embora, de uma forma geral, o processo de secreção seja complexo e o exsudato constituído por numerosos compostos, ou grupos de compostos, nota-se uma especificidade na atividade das células secretoras, evidenciada ultraestruturalmente. Sendo assim, análises ultraestruturais permitem correlacionar as características celulares com a natureza do material secretado e a dinâmica do processo de secreção. Assim, as células que secretam material de natureza predominantemente hidrofílica mostram complexo de Golgi evidente, especialmente em células secretoras. As células secretoras de substâncias predominantemente lipofílica apresentam retículo endoplasmático liso desenvolvido e numerosos plastídios. A presença de retículo endoplasmático rugoso está ligada à produção de proteínas (Machado e Carmelo-Guerreiro, 2001). Outras características como a abundância de mitocôndrias, ribossomos, corpos multivesiculares, presença ou ausência de espaços periplasmáticos devem ser utilizadas na compreensão da dinâmica das estruturas secretoras (Machado e Carmelo-Guerreiro 2001). Durante o estudo dos coléteres de B. nicholsonii foi possível identificar ultraestruturalmente diferentes estágios das células secretoras, baseado na freqüência de organelas como o complexo de Golgi, o retículo endoplasmático e as mitocôndrias; da presença ou ausência de vacúolo, espaços periplasmáticos e de inclusões lipídicas no citoplasma; e na integridade das estruturas citoplasmáticas e, finalmente, na integridade celular. Os presentes resultados sugerem que o processo secretor nos coléteres de B. nicholsonii é temporal. Uma evidência para tanto é a ocorrência de alterações morfológicas nas organelas das células secretoras durante a o processo global de secreção. Por exemplo, o complexo de Golgi que hora apresenta vesículas eletrondensas, hora apresenta vesículas eletronluscentes. Um exemplo polêmico são os plastídios. Esta organela já foi descrita em diversas estruturas secretoras, inclusive em coléteres. Especula-se a participação no processo de síntese, acumulo e liberação de substâncias lipídicas da secreção (Horner e Lersten, 1968; Kristen, 1976; Miller et. al., 1983; Mohan e Inamdar, 1986; Klein et al., 2004). Alterações dos produtos secretados durante diferentes fases das células secretoras dos coléteres foram observadas por Thomas e Dave (1968) e Mohan e Inamdar (1986). De acordo com Machado (2001), mudanças citoplasmáticas ao longo do ciclo secretor também 57 são comuns. Estes dois eventos, mudança de exsudato e ultraestrutura, sugerem ser bastante íntimos e dependentes. Por decorrência, as mudanças no citoplasma em células secretoras podem ser relacionadas com o processo intrínseco do ciclo de vida, como a morte celular programada. O processo de morte celular programada é de fundamental importância para a planta, desde o inicio do desenvolvimento do corpo vegetal (McCabe e Leaver, 2000). A apoptose pode ser reconhecida morfologicamente por sinais clássicos como a contração do citoplasma, alteração na morfologia nuclear e posterior clivagem do DNA (Green e Kroemer, 1998; McCabe e Leaver, 2000; Doorn e Woltering, 2005). Alguns autores afirmam que, em células vegetais, não existe o processo de apoptose real, já que para esse processo é necessário que os corpos apoptóticos sejam degradados em outras células (Doorn e Woltering, 2005). De fato, a ultraestrutura das células secretoras sugerem que o processo corrente é do tipo menos comum de morte celular programada, a morte celular programada não lisossomal (Doorn e Woltering, 2005). Nossos dados sugerem que as mudanças estruturais em coléteres de B. nicholsonii são decorrência do processo de morte celular programada não lisossomal que normalmente ocorre nestas células secretoras. Em Biologia Celular Vegetal o fluxo apoplástico pela parede periclinal externa da epiderme das partes aéreas é motivo de debate. No entanto, tem sido considerado que a parede periclinal externa da epiderme constitui uma barreira física na fronteira entre o vegetal e o ambiente (Tenberge, 1992). A construção tridimensional das macromoléculas é marcante e heterogênea, formando camadas características. Em coléteres, a microscopia eletrônica de transmissão tem sido utilizada para enfocar a presença ou ausência de cutícula (Klein, 2002). Os resultados permitiram distinguir três camadas na parede periclinal externa das células secretoras da epiderme dos coléteres de B. nicholsonii, similares as presentes em tricomas secretores de Cannabis sativa (Mahlberg e Kim, 1992); coléteres de Simira glaziovii e S. pikia (Klein et al., 2004), Bathysa stipulata e B. nicholsonii (Miguel, 2004). Diversas imagens, por microscopia eletrônica de transmissão, das células secretoras da epiderme dos coléteres de B. nicholsonii fortemente sugerem alterações estruturais da parede periclinal externa, durante o processo de secreção. Assim, inicialmente surge um sítio de acúmulo de secreção na camada basal. Posteriormente, este sítio expande-se em direção ao meio externo. Neste momento, há aparentemente uma inversão em espessura relativa entre a camada basal e a membrana cuticular, sugerindo o 58 fluxo da secreção. A literatura revela processos semelhantes. Já que a secreção é lipídica e protéica, ela passa mais fácil pelas camadas lipídicas, nesse momento maior. Mahlberg e Kim (1992) e Kim e Mahlberg (1995 e 2000) sugerem que, em tricomas glandulares de Cannabis sativa, a passagem da secreção pela parede periclinal externa se da através de estruturas semelhantes, demoninadas cavidades secretoras. Kim e Mahlberg (1997) localizaram o tetra-hidro-canabinol (THC) nas cavidades secretoras, fortalecendo esta idéia. Utilizando criofixação e criosubstituição, os mesmos autores, observaram a formação de vesículas secretoras que se encaminham para as cavidades secretoras (Kim e Mahlberg, 2003). Possobon e Machado (2005) denominaram estruturas semelhantes às cavidades secretoras de sítios de acúmulo de secreção. Veys et al. (2002) mostra que a externalização de moléculas em cavidades secretoras de folhas de Azolla se dá por projeções na parede periclinal externa. Sugerimos, então, que as paredes periclinais externas de estruturas secretoras assumam uma dinâmica diferente. Jefree (1996) aponta mecanismo diverso do citado anteriormente para o fluxo de secreção, sugerindo a presença de microcanais, perpendiculares a membrana plasmática, e acúmulo da secreção nas camadas cuticulares da parede celular. Este acúmulo acaba por levar a ruptura física da parede periclinal externa. Outros autores argumentam que não existem microcanais ou estruturas equivalentes, e que a secreção flui através da parede periclinal externa por difusão (Veys et al., 2002). Nenhuma estrutura semelhante às vesículas secretoras foi observada, provavelmente pela técnica utilizada. Mais estudos utilizando técnicas de criofixação, criosubstituição e marcadores imunológicos devem ser conduzidos para melhor elucidar a passagem da secreção pela membrana plasmática, até a parede celular, bem como sua passagem por essa. O método citoquímico de iodeto de potássio (Locke e Huie, 1983) evidenciou os compostos lipídicos da membrana cuticular, marcando-a heterogeneamente; enquanto que, método do tetroxido de ósmio / imidazol (Angermuller e Fahimi, 1972) revelou marcação homogênea dos mesmos compostos nesta mesma camada. A diferença entre os dois métodos indica a necessidade de refinamento metodológico que permita esclarecer tal questão. O primeiro teste aponta para que a heterogeneidade desses extratos possa estar relacionada com o processo de passagem de moléculas pela parede periclinal externa. 59 Nenhum estudo relacionou, ainda, a composição das camadas lipídicas da parede celular com o mecanismo de passagem de moléculas por essa. A presença de açúcares na secreção dos coléteres for observada inicialmente por Thomas e Dave (1989), estudando coléteres de Allamanda (Apocynaceae). Resultados similares foram obtidos na secreção dos coléteres de B. Nicholsonii. No entanto, pode-se questionar a marcação positiva exclusivamente na secreção pelos métodos histoquímicos utilizados, Azul de Comassie e reagente de Shiff. Inferimos que tempos de incubação maiores poderiam revelar marcação em estruturas intracelulares nas células da epiderme secretora. A microanálise de raio-X revelou predominância de potássio na parede periclinal externa dos coléteres e das estípulas de B. Nicholsonii; enquanto que, na secreção identificou-se a predominância de cálcio. A presença de cálcio na secreção pode fornecer informações sobre o mecanismo de secreção. Zonia et al. (2001) mostram que o gradiente de íons cloro e cálcio influenciam diretamente na exocitose durante o crescimento do tubo polínico. No entanto, não foram encontrados relatos sobre a composição elementar em coléteres. Os exsudatos vegetais têm amplo uso terapêutico na medicina popular e podem ser utilizados no tratamento de dores de cabeça, garganta, queimaduras, dermatites, náuseas, picadas de escorpião, infecções, febre reumática, cicatrizante, entre outros (Riviera Nuñez e Óbon de Castro, 1992; Bown, 1995; Ascenção et al., 1999; Di Stasis, 1987 apud Silva e Machado, 1999). Este amplo emprego dos exsudatos vegetais reflete sua diversidade. A presença de proteínas na secreção dos coléteres foi descrita por Klein (2002). O perfil protéico da secreção de B. nicholsonii mostrou-se diferente do perfil obtido da secreção de S. glaziovii (Klein, 2002), havendo aparentemente uma proteína comum, com aproximadamente 29 kDa. Aparte o papel físico-químico, outras funções destas proteínas não são claramente descritas. Whitmoyer e Horner (1970) mostram que, em folhas de Psychotria bacteriophila, se estabelece uma relação harmônica entre bactérias e plantas através de nódulos bacterianos. Em Rubiaceae, tem sido sugerida sua importância na nodulação bacteriana (Lula, 2010). Pode-se também especular, um papel inibitório ao crescimento de bactérias e fungos. Uma gama de produtos vegetais é notoriamente conhecida por sua atividade antimicrobiana (Cowan, 1999). Klein et al. (2004) sugerem 60 que proteínas presentes na secreção de coleteres de Symira servem para a defesa da planta, por isso, é possível que as proteínas não sejam a única a atuar nesse sentido. A função antimicrobiana da secreção ainda é questionável, apesar dos resultados promissores na inibição de crescimento de fungos fitopatogênicos revelados neste estudo. Pelo exposto, novas abordagens devem ser empregadas para compreensão do papel da secreção de coléteres na interação microrganismo/planta. 61 6. CONCLUSÃO ü As estipulas, junto com as propriedades físicas da secreção dos coleteres, reforçam o mecanismo de defesa para os ápices caulinares. ü Coléteres de Bathysa nicholsonii são do tipo cilíndrico e se encontram distribuídos na base das estípulas formando dois triângulos. ü As características citológicas das células epidérmicas sugerem a temporização do processo secretor dos coléteres. ü As células secretoras dos coléteres de B. nicholsonii, durante seu desenvolvimento, passam por mudanças citoplasmáticas indicando um processo de morte celular programada não lisossomal. ü A dinâmica dos sítios de acúmulo de secreção, na parede periclinal externa, sugere o envolvimento destes na externalização das moléculas. ü Métodos histoquímicos e citoquímicos reforçam o aspecto temporal do processo de secreção em coleteres. A parede periclinal externa das células secretoras foi marcadas de forma heterogeneamente no teste citoquímico de KI e homogeneamente no teste de ósmio-imidazol; ü A microscopia analítica – SEM/EDX - revelou presença de potássio na parede periclinal externa dos coléteres e das estípulas de B. Nicholsonii; enquanto que, na secreção, a presença foi de cálcio. ü As proteínas presentes na secreção dos coléteres de B. Nicholsonii, são predominantemente glicoproteínas e sua função ainda é obscura. Contudo, experimentalmente esta secreção apresentou papel inibitório no crescimento de fungos, sugerindo envolvimento no mecanismo de defesa de plantas. 62 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Abdel-Kader, M. S.; Wisse, J.; Evans, R.; Werff, H.; Kingston, D. G. I., 1997. Bioactive iridoids and a new lignan from Allamanda cathartica and Himatanthus fallax from the Suriname Rainforest. J. Nat. Prod. 60: 1294 - 1297. Andersson, L.; Rova, J. H. E., 1999. 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